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ONDE DIZ-

PADRÕES DE USO NO PORTUGUÊS ARCAICO

IANAÊ DE OLIVEIRA

UFF/2012
2

ONDE DIZ-

PADRÕES DE USO NO PORTUGUÊS ARCAICO

por

IANAÊ DE OLIVEIRA

Dissertação apresentada ao Curso de


pós-graduação em Estudos de
Linguagem da Universidade Federal
Fluminense, como requisito parcial ao
grau de Mestre. Linha de pesquisa:
teoria e análise linguística.

Orientadora: Professora doutora


Mariangela Rios de Oliveira.

UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

Niterói

2012
3

Ficha Catalográfica elaborada pela Biblioteca Central do Gragoatá

O48 Oliveira, Ianaê de.

Onde diz - padrões de uso no português arcaico / Ianaê de Oliveira.


– 2012.
88 f.
Orientador: Mariangela Rios de Oliveira.

Dissertação (Mestrado) – Universidade Federal Fluminense,


Instituto de Letras, 2012.
Bibliografia: f. 61-66.

1. Língua portuguesa - Gramática. 2. Mudança linguística. 3.


Funcionalismo (Linguística). I. Oliveira, Mariangela Rios de. II.
Universidade Federal Fluminense. Instituto de Letras. III. Título.

CDD 469.5

1. 371.010981
4

IANAÊ DE OLIVEIRA

ONDE DIZ-

PADRÕES DE USO NO PORTUGUÊS ARCAICO

Dissertação apresentada ao Curso de


pós-graduação em Estudos de
Linguagem da Universidade Federal
Fluminense, como requisito parcial ao
grau de Mestre. Linha de pesquisa: teoria
e análise linguística.

BANCA EXAMINADORA

Prof.ª Dr.ª MARIANGELA RIOS DE OLIVEIRA – Orientadora


Universidade Federal Fluminense

Prof.ª Dr.ª Maria Jussara Abraçado


Universidade Federal Fluminense

Prof. Dr. Gerson Rodrigues da Silva


Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro

Prof.ª Dr.ª Vanda Maria Cardozo de Menezes - suplente


Universidade Federal Fluminense

Prof.ª Dr.ª Eliete Figueira Batista da Silveira - suplente


Universidade Federal do Rio de Janeiro
5

A meus pais, que desde pequena me


ensinaram o valor dos estudos. A meu
esposo Péricles, companheiro de tantas
horas, incansável em afirmar que tudo
vai dar certo. E deu. A meu querido filho
Pedro, razão da minha vida, obrigada por
toda a compreensão.
6

AGRADECIMENTOS

Dedico este espaço a todos que estiveram presentes em minha vida e


principalmente,

Ao querido Pai do céu, por tantas vezes que vou a Ti;

A minha querida Ritinha, pela disposição de vir, fazer e acontecer tantas vezes;

Ao meu avô Baptista (in memorian);

Aos professores da graduação e pós-graduação da UFF. Aos membros da banca. A cara


Mariangela Rios de Oliveira, orientadora desta pesquisa e de momentos de minha vida;
A todos os colegas da graduação e pós-graduação com quem compartilhei questões,
dúvidas, trabalhos;

A todas da secretaria da coordenação pela atenção.


7

EPÍGRAFE

Não atinou que a frase do discurso não era [...] de


ninguém. Alguém a proferiu um dia, em discurso ou
conversa, em gazeta ou em viagem de terra ou de mar.
Outrem a repetiu, até que muita gente a fez sua. Era
nova, era enérgica, era expressiva, ficou sendo
patrimônio comum. Há frases assim felizes. Nascem
modestamente, [...]; quando menos pensam estão
governando o mundo, à semelhança das ideias.

(Assis, Machado de. Esaú e Jacó. Rio de Janeiro: Editora Globo,


1997, p. 85)
8

RESUMO

Este trabalho volta-se à análise qualitativa de onde diz, expressão encontrada


hodiernamente apenas em sentido espacial, mas que, há alguns séculos, cumpriu
trajetória espacial>textual. Onde diz, em função textual, é encontrado de modo
recorrente em textos portugueses específicos do período arcaico da nossa língua, textos
esses formadores do nosso corpus. Esse estudo é justificado pelo volume considerável
de onde diz entre os séculos XIV-XV, em contraponto com a falta de notícias em fontes
de sincronias mais recentes da língua. Essa expressão compõe contexto argumentativo
de molde discurso1 + onde diz [SN] + discurso2, sua função é identificar fonte indireta
de informação. Parte-se do pressuposto que certo modo específico de dizer fez com que
a expressão onde diz, de base locativa, cumprisse trajetória rumo à mudança linguística,
para atuar como mecanismo de persuasão e instrumento de evidencialidade. Nas
análises, são observadas pressões de subjetividade e inferência sugerida (Traugott;
Dasher, 2005), gramaticalização de evidenciais (Ainkhenvald, 2006; Barnes, 1984) e
Tradições Discursivas (Kabatek, 2004). O objetivo geral dessa pesquisa de cunho
funcionalista (Traugott; Dasher, 2005; Hopper, 1991; Cunha; Oliveira; Martelotta,
2003) é investigar as realizações do onde diz. Os objetivos específicos são: (a) analisar
qualitativamente, conforme a abordagem funcionalista, se a trajetória de abstratização
de onde diz pode ser fruto de tendências sócio-comunicativa-cognitivas utilizadas por
certa Tradição Discursiva; (b) verificar o grau de gramaticalidade do onde diz; (c)
confirmar, ou não, a tendência à gramaticalização de evidenciais (Ainkhenvald, 2006;
Barnes, 1984).
Palavras-chave: funcionalismo, Tradições Discursivas, evidencialidade.
9

ABSTRACT

This study aims to present a qualitative analysis of onde diz, found expression in
our times only in a space sense, but, a few centuries ago, fulfilled the trajectory space >
text. Onde diz, according to the textual function, is found recurrently in specific
Portuguese texts of the archaic period of portuguese language; these texts constitute this
corpus. This study is justified by the considerable use of onde diz in XIV-XV centuries,
in contrast to the lack of news in sources of synchronicities more recent of the language.
This expression consists of argumentative context of model argument 1 + onde diz [NS]
+ argument 2, and its function is to identify indirect source of information. It starts from
the assumption that a certain specific way of saying the expression onde diz, with basic
locative, carried out trajectory towards linguistics change, to act as a mechanism of
persuasion and an instrument of evidentiality. In the analysis, are observed pressures of
subjectivity and invited inferencing (Traugott; Dasher, 2005), grammaticalization of
evidentials (Ainkhenvald, 2006; Barnes, 1984) and Discursive Traditions (Kabatek,
2004). The general objective of this research functionalist (Traugott, Dasher, 2005;
Hopper, 1991; Cunha, Oliveira, Martelotta, 2003) is to investigate the achievements of
onde diz and specifically verify: (a) if the trajectory of abstratização of onde diz may be
the result of socio-communicative-cognitive tendencies used by some Discursive
Tradition (Kabatek, 2004); (b) the degree of grammaticality of onde diz; (c) to confirm
or not the tendency of grammaticalization of evidentials (Ainkhenvald, 2006; Barnes,
1984).

Keywords: functionalism (functional linguistic), Discursive Traditions, evidentiality.


10

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ............................................................................................... 10

1 REVISÃO DA LITERATURA ........................................................................ 16

1.1 Registro do onde em dicionários ........................................................... 16

1.2 Registro do onde em gramáticas ........................................................... 18

2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA ................................................................. 20

2.1 Abordagem funcional ........................................................................ 20

2.1.1 Gramaticalização .................................................................... 21

2.1.2 Metáfora, metonímia e inferência sugerida.............................. 24

2.1.3 Subjetividade e Intersubjetividade ......................................... 28

2.2 Evidencialidade ................................................................................ 30

2.3 Tradições Discursivas ....................................................................... 35

3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS ................................................... 38

4 ANÁLISE DE DADOS ................................................................................... 45

4.1 Tipo (+) locativo (+) textual ........................................................... 50

4.2 Tipo (+/-) locativo (+) textual ......................................................... 51

4.3 Tipo (-) locativo (+) textual ............................................................. 53

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ....................................................................... 59

6 REFERÊNCIAS .............................................................................................. 61

ANEXOS ........................................................................................................... 67
11

INTRODUÇÃO

Esta pesquisa se insere no contexto do grupo Discurso & Gramática1, voltada


para o projeto conjunto de pesquisa sobre advérbios. Desta feita, foi selecionada uma
expressão formada em torno do elemento onde. De posse de textos do português
arcaico, foi observado que esse elemento apresentava variação na sua função semântica
e que, por vezes, não estava sozinho, mas também integrava expressões junto a outros
elementos, dentre os quais: de onde em onde, onde quer que, onde diz. O objeto de
estudo contemplado nesta dissertação é justamente um desses usos, o onde diz, que,
partindo de referência a espaço, passa a exercer função textual com referência anafórica
ou catafórica, conforme fragmentos (1) e (2), extraídos de nosso corpus de pesquisa:

(1) E pera esquyvar este pecado da vaam gloria, tambem he boo remedio nom
fallar, screver ou dar aazo que se falle sem boo fundamento perante nos em
nossos proprios feitos. E nas cousas feitas com entençom de virtude, conssiirar
aquella pallavra de Davyd onde diz que o senhor quebrantará os ossos daquelles
que fazem seus feitos principalmente por prazerem aos homẽẽs, mostrandonos
que nom leixemos a nos meesmos fazer cousa que seja com proposito da vãã
gloria.
(Leal conselheiro, título 12, fólio 15r, grifo nosso )

(2) [...] e as treevas nom o compreenderom, porque os pecadores nom


conseguirom aquesta luz, nom por defeito da luz, mas por míngua sua deles.
Onde diz Agustinho: “Assi como o homem cego, posto ao sol, presente é a El a
luz do sol, mas el nom presente ao sol, [...]”.
(O livro de vita Christi, p. 35, grifo nosso)

No fragmento (1), observamos o onde diz no que se supõe ser o início da


trajetória de gramaticalização. O onde retoma aquella pallavra de Davyd, no entanto,
deixa transparecer sentido locativo mais virtual. Por sua vez, o verbo dizer se completa
com a oração objetiva direta que o segue. Em (2), o comportamento é outro, a
necessidade argumentativa imposta por certa tradição didático-religiosa permitiu que o
sentido locativo fosse ampliado em um sentido mais textual, de modo a onde diz

1
O grupo Discurso & Gramática é voltado às pesquisas em linguística funcional. Atualmente, possui
sedes no Rio de Janeiro (UFRJ), Niterói (UFF) e Rio Grande do Norte (UFRN). Informações pelo site
http://www.discursoegramatica.letras.ufrj.br/
12

retomar todo o contexto anterior e produzir uma sequência para todo o argumento
posterior, embora se mantenha independente sintaticamente dessas orações.

A expressão onde diz em formato mais gramatical, como visto em (2), é


encontrada em textos pedagógico-religiosos2 do português arcaico e, conforme
defendemos aqui, é utilizada em contextos específicos para identificar uma fonte
indireta de informação.

Como ponto de partida, realizamos uma pesquisa em busca de algum relato


científico sobre a expressão onde diz, mas até o fechamento desse trabalho não foram
encontrados registros em gramáticas, dicionários de língua portuguesa, ou mesmo,
pesquisas acadêmicas sobre ele. Damos, com a presente dissertação, portanto, um passo
para a investigação dessa expressão.

Necessária, ainda, foi a seleção do corpus. O texto de partida de que nos


valemos foi o Orto do esposo, com número relevante de ocorrências de nosso objeto de
pesquisa. Na sequência, vieram O livro de vita Christi, Leal Conselheiro, Livro das aves
e Demanda do Santo Graal, todos referentes ao final do século XIV e século XV. A
busca se direcionou para obras de outras sincronias, citamos o teatro de Gil Vicente,
Bíblia medieval portuguesa, Sermões de Padre Antonio Vieira, Padre Anchieta, Carta
de Caminha e, os corpus digitais Tycho Brahe, Alerj, PHPB, revista Veja, bem como,
revistas no segmento de games, de carros (referentes às marcas Mitsubishi, Audi), de
vôo das companhias Gol, Web Jet, Tam, publicações religiosas, etc. O onde diz não foi
encontrado nessas sincronias mais recentes. Buscamos, também, em encíclicas
(traduzidas para a língua portuguesa) de João Paulo II e de Bento XVI, nosso objeto de
pesquisa, sem sucesso. Por último, pesquisamos o onde diz no site de busca Google.
Obtivemos como resposta recortes do português contemporâneo em que o onde diz é
utilizado em função locativa, como segue:

(3) Ao abrir uma URL, aparece caixa de dialogo onde diz:__IEPNGFIX:


unclickable children of element: <DIV>__E não abre o site3. (grifo nosso)

2
Houaiss (2004, p. 247) define didático como “destinado a instruir, o que facilita a aprendizagem”. Nessa
mesma obra (p. 635), religioso é o “que tem elementos de adoração; ou que segue ou professa uma
religião”. Dessa forma, são aqui chamados de textos didáticos-religiosos, aqueles que têm o propósito de
educar socialmente, filosoficamente e/ou religiosamente. Esses textos impressos substituíram a tradição
em que os grandes feitos eram passados oralmente.
3
Disponível em <http://answers.microsoft.com/pt-br/windows/forum/windows_xp-networking/ao-abrir-
uma-url-aparece-caixa-de-dialogo-onde/592e4b35-e17a-4298-82e0-b329a5>, acesso dia 12/04/2011.
13

(4) A Dilma censurou o vídeo onde diz que nordestino não é brasileiro.
Acontece que a verdade pode mais4. (grifo nosso)

Sem encontrar o onde diz como um introdutor de argumento de autoridade,


conforme apresentado no fragmento (2), em outras sincronias, optamos em desenvolver
o trabalho com o material referente aos séculos XIV e XV, representativo da fase mais
antiga do português. Os textos Orto do esposo, O livro de vita Christi, Leal Conselheiro
são de base argumentativa. Seus autores utilizam estratégia persuasiva que consiste em
tomar argumentos de outrem (reconhecidos como autoridades da fé cristã, reis,
filósofos, etc.) como alicerce para seus ditos. A Demanda do Santo Graal é uma novela
de cavalaria5 repleta de valores religiosos. O Livro das aves segue a tendência dos
bestiários6 medievais, discorrendo sobre os defeitos e virtudes de determinada ave.
Todos em prosa.

A seleção do onde diz nesta pesquisa, portanto, se justifica pelo volume


considerável desse uso na fase arcaica do português, em contraponto com a falta de
notícias dessa expressão em fontes de sincronias mais recentes da língua. Partimos do
pressuposto de que determinadas formas linguísticas, como onde diz, são usadas
considerando-se: (a) fatores de ordem social, cultural e cognitiva; (b) fatores internos à
linguagem, como por exemplo, as marcas de evidencialidade; (c) fatores externos, tais
como o ambiente comunicativo, gênero textual, entre outros.

Duas são as hipóteses gerais aqui assumidas. A primeira considera que a


estratégia argumentativa utilizada por certo modo específico de dizer fez com que a
expressão onde diz, de base locativa, cumprisse trajetória rumo à mudança linguística,
para atuar como mecanismo de persuasão e instrumento de evidencialidade. Essa
hipótese vai ao encontro da proposta da atuação de pressões de subjetividade e
inferência sugerida, defendidas por Traugott e Dasher (2005), bem como das pesquisas
de Kabatek (2004) sobre Tradições Discursivas. Define-se subjetividade como
“processo pelo qual o falante/escritor desenvolve, com o tempo, novos significados para

4
Disponível em <http://coturnonoturno.blogspot.com/2010/05/dilma-censurou-o-video-onde-diz-
que.html>, acesso dia 12/04/2011.
5
A Novela de cavalaria é um gênero medieval originário da Inglaterra e França que se estabelece em
Portugal com a tradução do francês para o português da Demanda do Santo Graal. Conforme MOISÉS
(2004, p. 38), novela de cavalaria é o modelo em prosa das poesias épicas.
6
Baseado em COSTA; MELO (19--, p. 203-204), a palavra “bestiário” no contexto acima, é adjetivo
designador de livro relativo a animais irracionais; quadrúpedes.
14

lexemas [e construções], os quais codificam ou externalizam suas perspectivas [...]”


(Traugott e Dasher, 2005, p. 30, 32, tradução livre). Por sua vez, inferência sugerida diz
respeito às complexidades de comunicação em que o falante/escritor evoca implicaturas
e convida o ouvinte/leitor a inferí-las (ibidem, 2005, p. 5). Por fim, Tradições
Discursivas são atinentes a elementos linguísticos que, em ocorrências de repetição,
podem ser representativos de determinadas culturas, grupos, instituições (Kabatek,
2005).
Traugott e Dasher (ibidem) tomam por base pesquisas sobre mudanças
semânticas semelhantes em línguas distintas e consideram que há princípios cognitivos
e comunicativos operantes a favor dessas semelhanças. Tal proposição aproxima as
abordagens funcionalista7 e cognitivista8. A subjetividade, entendida como a expressão
de si mesmo, estaria presente nas implicaturas conversacionais a serem inferidas pelo
interlocutor, as denominadas inferências sugeridas.
Por sua vez, Kabatek (ibidem) volta-se para o estudo das Tradições Discursivas.
O estudo da história dos textos preconiza que determinadas formas ou fórmulas
linguísticas são encontradas apenas em molde escrito que, em ocorrência de repetição,
podem estar associadas a determinadas culturas, grupos, instituições. Sob esse prisma, o
onde diz pode estar associado à determinada época, cultura, etc.
A segunda hipótese que assumimos é que evidenciais tendem a se
gramaticalizar. Define-se evidencial como a origem do conhecimento asseverado (Chafe
& Nichols, 1988). Pesquisas nessa área revelam que algumas línguas marcam a
evidencialidade em molde lexical ou gramatical. A evidencialidade é considerada
gramatical quando realizada por afixos, clíticos ou marcada em categorias também
responsáveis por outras funções. Esse é o caso da língua tariana e da língua colombiana
tuyuka. Nessas línguas a expressão da evidencialidade está associada a sufixos verbais
responsáveis também pelo tempo verbal (Ainkhenvald, 2006). Isso ocorre, por exemplo,
neste fragmento da língua tariana: Juse irida dimanika-mahka. O sufixo -mahka,

7
Funcionalismo é uma corrente linguística que, [...] se preocupa em estudar a relação entre a estrutura
gramatical das línguas e os diferentes contextos comunicativos em que elas são usadas. (Cunha, 2010, p.
158)
8
“Cognição é o “modo como nossa mente interage com o mundo que nos cerca, bem como os processos
que permeiam essa interação” (Martelotta; Palomanes, 2010, p. 177). Portanto, a abordagem cognitivista
acredita na mente como um complexo de captação de experiência que são refletidas, dentre outras formas,
na/pela linguagem.
15

fornece duas informações: a primeira diz respeito a origem da informação e a segunda,


revela que a ação ocorreu no passado.
Tendo em vista a gramaticalização de evidenciais em línguas distintas, a marca
de evidencialidade lexical em língua portuguesa, como também os estudos mais básicos
sobre gramaticalização, hipotetiza-se que a gramaticalização de evidenciais também
pode ocorrer sob forma de um cline em que um item gramatical se torna ainda mais
gramatical ao se unir a outro item em expressão. Dessa forma, estamos partindo do
entendimento de que a expressão onde diz manifesta gramaticalidade, em que o onde +
diz formam expressão vinculada, em termos semântico-sintáticos, cumpridora de função
pragmática específica, voltada para a evidencialidade.
O objetivo geral é investigar as realizações do onde diz entre os séculos XIV-
XV. Os objetivos específicos são: (a) analisar qualitativamente, conforme a abordagem
funcionalista, se a trajetória de abstratização de onde diz pode ser fruto de tendências
sócio-comunicativa-cognitivas utilizadas por certa Tradição Discursiva; (b) verificar o
grau de gramaticalidade do onde diz; (c) confirmar, ou não, a tendência à
gramaticalização de evidenciais (Ainkhenvald, 2006; Barnes, 1984).

Esta dissertação se divide em cinco capítulos, assim distribuídos: a primeira


seção, intitulada revisão bibliográfica, traz levantamento de gramáticos e dicionaristas
latinos e de língua portuguesa sobre como classificam e analisam o onde. No segundo
capítulo, são discriminados os fundamentos teóricos desta pesquisa nas seções 2.1, 2.2 e
2.3, referentes respecivamente a Abordagem funcional, Evidencialidade e Tradições
discursivas. A seção 2.1, Abordagem funcional, ainda conta com três subitens: o
primeiro destinado a gramaticalização, o segundo referente a metáfora, metonímia e
inferência sugerida e o último item é dedicado a subjetividade e intersubjetividade.
Disponibilizamos no terceiro capítulo a metodologia utilizada na seleção do corpus, no
levantamento dos fragmentos, bem como os diferentes aspectos observados e os
procedimentos utilizados na posterior análise. O quarto capítulo associa os níveis de
abstração (+) locativo, (+/-) locativo e (-) locativo a uma subseção respectiva: 4.1, 4.2 e
4.3. Alí os fragmentos são analisados especificamente e no seu grupo. No capítulo
destinado às considerações finais, são trazidas as respostas encontradas e são abertas
outras possibilidades de pesquisa a partir dos resultados alcançados. Em seção anexa
final, encontram-se os fragmentos trabalhados e sua análise correspondente.
16

1REVISÃO DA LITERATURA

1.1 Registro do onde em dicionários

Foram realizadas pesquisas em dicionários latinos e de língua portuguesa,


gramáticas históricas, tradicionais e funcionais a procura do onde diz, no entanto, não
foi encontrado nenhum registro. Na falta de algum dado, seguem notícias do onde.

Não há consenso em dicionários latinos ou gramáticas históricas quanto ao


correspondente latino de onde, podendo ser herdeiro de unde ou ubi. Sabe-se que muitos
autores latinos confundiam suas funções, o que permaneceu como característica também
nos textos portugueses.

O Dictionnaire Étymologique de la langue latine (Ernout; Meillet, 1967, p. 715,


747), por exemplo, afirma que onde é originado em ubi, que já em latim era empregado
como advérbio de lugar onde, relativo, interrogativo e com a ideia de tempo . Unde, que
pela forma poderia ter originado o onde, era o advérbio de lugar donde, como também
relativo e interrogativo. O Dictionnaire illustré (Gaffiot, 1934, p.1621, 1627) acrescenta
a função conjuntiva para ubi, fazendo referência ao sentido temporal. O Novíssimo
dicionário latino-português (Saraiva, 1993, p.1237, 1241) também afirma que ubi é
advérbio e relativo; acrescenta as funções temporal e conclusiva, bem como as
construções em qualquer lugar que, onde quer que. O autor confirma unde como
advérbio e relativo e, acrescenta as funções explicativa e causal. Por fim, o Dicionário
escolar latino-português (Farias, 1975, p.1037, 1041) faz referência ao caráter
adverbial, relativo, interrogativo e temporal para ubi e classifica unde como advérbio
relativo interrogativo.

Na sequência, o Quadro 1 ilustra as informações:


17

Quadro 1: Representativo das funções de ubi, unde e onde:

INTERROGATIVO

ADVERSATIVO

SUBSTANTIVO

EXPLICATIVO
PREPOSIÇÃO
CONCLUSÃO

CONJUNÇÃO
ADVÉRBIO
RELATIVO

PRONOME
CAUSAL
TEMPO
MEILLET X X X X

GAFFIOT X X X X X
UBI

SARAIVA X X X X

FARIAS X X X X

MEILLET X X X

GAFFIOT X X X
UNDE

SARAIVA X X X X X

FARIAS X X X

FREIRE X X X X X
DICIONÁRIO

GARCIA & X
ONDE

NASCENTES X X X

FERREIRA X X X

HOUAISS X X X

RIBEIRO X X X
ONDE GRAMÁTICA

SAID ALI X X
CUNHA &
CINTRA X X X

NEVES X X X X

CASTILHO X X X

Conforme o Quadro 1, apenas Saraiva discorda que ubi e unde tinham função
interrogativa e também o único que inclui em unde as funções explicativa e causal.
18

Destaca-se que as multifunções de onde são originadas no latim, encontrando


consenso para ubi e unde apenas na função adverbial e relativa, conforme visto no
Quadro 1.

Para as informações da língua portuguesa, foram consultados três dicionários. O


primeiro, o Dicionário da língua portuguesa (Freire, 1943, p. 3692) classifica o onde
como advérbio; explica a utilização como relativo, comenta sobre a ocorrência no
português lusitano das funções temporal e adversativa; cita o emprego de aonde por
onde, por fim, mostra a construção onde quer que, segundo o autor, uma locução
conjuntiva. O segundo, o Dicionário Caldas Aulete (Garcia; Nascentes, 1974, p. 2574)
não faz referencia a função pronominal e acrescenta a construção de onde em onde com
conotação espacial ou temporal. O Novo dicionário da língua portuguesa (Ferreira,
1986, p.1224) confirma a classificação do onde como advérbio e acrescenta a
pronominal. O último, Dicionário Houaiss da língua portuguesa (Houaiss; Villar;
Franco, 2001, p. 2064) traz na entrada do verbete a classificação adverbial, mas assume
que é utilizado como advérbio relativo e produz uma relação de subordinação, desta
feita, se trata também de uma conjunção. Esse volume faz referência ainda à construção
de onde em onde. Conforme os dicionários citados, permaneceu no português a função
latina espacial e a construção onde quer que. O onde diz não foi mencionado.

Observa-se no Quadro 1 o registro geral da função adverbial também em


dicionários, no entanto, a diferença entre o advérbio e pronome, advérbio e tempo é de
apenas um ponto, prova de que essas funções eram encontradas e possivelmente
confundíveis. Por outro lado, a função conjuntiva não é abonada por três autores.

1.2 Registro do onde em gramáticas

Somam-se aos dicionários as informações, em modo resumido, das gramáticas


de Ribeiro (1950, p. 448-449, 462, 474), Said Ali (1964, p. 185, 187), Cunha & Cintra
(2006, p. 343, 351, 543), Neves (2000, p. 239, 369, 386) e por fim, Castilho (2010, p.
325, 367-369, 542). Em seu Serões grammaticaes, Ribeiro detalha as funções
desempenhadas por onde, são elas: preposição, conjunção, advérbio de lugar. Said Ali
simplifica, afirmando que o onde pode ser advérbio ou pronome. Mais recentemente,
Cunha & Cintra limitam-se apenas a pronome relativo, advérbio relativo e interrogativo.
19

Neves assume que esse advérbio pode ser um locativo de constituinte relativo, pode ser
usado para interrogar, como também, corresponder a um pronome substantivo, ao lado
de que, quem e como. Castilho afirma que o onde é usado como pronome relativo em
substituição ao em que, podendo ser também advérbio de lugar e interrogativo. Os
gramáticos tomam por base a função adverbial e, a partir dela observam outras funções,
como ficou demonstrado no Quadro 1.

Constata-se também que o advérbio é novamente a categoria geral de referência


ao onde, seguida pelo pronome relativo.

Conclui-se que os autores, do latim à língua portuguesa, passando por


dicionários e gramáticas, ratificam o onde como uma categoria adverbial seguido pela
categoria de pronome relativo. Isso significa dizer que a forma onde tem como
prototípica a função adverbial, enquanto as demais (pronome relativo, interrogativo e
substantivo, preposição e conjunção) compartilham apenas algumas características do
advérbio em determinados contextos.
20

2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

Nesse capítulo serão apresentadas sumariamente as bases teóricas utilizadas


nessa pesquisa. A abordagem funcional é a base fundamental e, a partir dela, as
investigações sobre a possível gramaticalização se desenvolvem. Nessa seção também
são delineados os conceitos de Tradições discursivas e evidencialidade.

2.1 Abordagem funcional

A abordagem funcionalista concebe a língua como instrumento de interação


social, envolvendo o locutor, o seu interlocutor e o propósito de interação linguística. O
funcionalismo estuda unidades contextualizadas a partir do uso real e “procura
correlacionar as classes, as relações e as funções com as situações sociais concretas em
que elas foram geradas” (Castilho, 2010, p. 68) em busca de regularidades que
licenciem o discurso na relação não arbitrária entre uso e sistema.

O estudo que ressalta a função em detrimento da forma ganha força na


constatação da não sinonímia e de paráfrases perfeitas, como também na verificação de
uma mesma forma pode derivar distintos sentidos, no que se define como polissemia.

Os funcionalistas estabelecem a pragmática como fundamento da semântica e


essa da sintaxe, isto é, sua estrutura é influenciada pelo discurso. No arcabouço da
abordagem funcionalista, que contém nascedouros e trajetórias diferenciadas, a linha
adotada nesta pesquisa tem base norte-americana, à luz dos autores Traugott; Dasher
(2005), Hopper (1991), Cunha; Oliveira; Martelotta (2003).

O funcionalismo não exclui dos seus estudos a sincronia ou a diacronia, ao


contrário, acrescenta a possibilidade pancrônica. A arbitrariedade do signo observada
fora do uso real pelos formalistas é superada pela não arbitrariedade (em diferentes
graus) conforme conclusões empíricas em situações de uso efetuadas pelos
funcionalistas, citam-se o sufixo –inho, se comportando ora como designador de
afetividade, ora como pejorativo, ora como superlativo, bem como as diversas formas
de impessoalização do sujeito, tais como verbo na 3ª pessoa do plural, partícula
21

apassivadora, entre outros (Cunha; Costa; Cezario, p. 31. In: Cunha, Oliveira,
Martelotta (2003)).

A não arbitrariedade entre forma e função admitida pelos funcionalistas supõe a


iconicidade. Neves (2004, p. 104) afirma que

“a consideração de uma motivação icônica para a forma linguística


implica admitir (em maior ou menor grau, dependendo do nível de
radicalização), por exemplo, que a extensão ou a complexidade dos
elementos de uma representação linguística reflete a extensão ou a
complexidade de natureza conceptual”.

Portanto, a estrutura da língua reflete de algum modo a estrutura da experiência


e, por sua vez na conceitualização humana do mundo, chegando às propriedades da
mente humana. Eis um ponto de aproximação das abordagens funcionalista e
cognitivista (definidas acima), do qual se pode constatar que o onde diz é um produto
cognitivo e interativo.

2.1.1 Gramaticalização

A gramática de uma língua é composta por níveis de maior e menor estabilidade.


Esse movimento acontece inicialmente em nível de discurso e seu uso progressivo
constitui a gramática. Hopper (1987, apud Gonçalves, p. 15) com a noção de “gramática
emergente” entende a “gramática das línguas como constituídas de partes cujo estatuto
vai sendo negociado na fala, não podendo ser separado das estratégias de construção do
discurso”.

Nesse contexto, acredita-se que os diferentes graus de gramaticalidade do onde


diz foram estimulados por necessidade discursiva e negociados na interação por meio de
subjetividade e inferências sugeridas. Define-se subjetividade como processo pelo qual
o falante/escritor desenvolve, com o tempo, novos significados para lexemas [e
construções], os quais codificam ou externalizam suas perspectivas [...].” (ibidem, p. 30,
32, tradução livre). O termo inferência sugerida diz respeito às complexidades de
comunicação em que o falante/escritor evoca implicaturas e convida o ouvinte/leitor a
inferi-las (Traugott e Dasher, 2005, p. 5).
22

As categorias gramaticais, numa perspectiva prototípica (Givón, 1995; Taylor,


1989), possuem mais atributos compartilhados em posição central, ao passo que, nas
extremidades, há menos atributos compartilhados. Tal concepção prototípica concorre
para interpretar o onde diz em seu deslizamento de uma categoria para outra. Na seção
1, Revisão da literatura, conforme a bibliografia utilizada, constatou-se que as
categorias mais prototípicas para o onde são de advérbio e relativo. Acredita-se que em
algum ponto anterior na trajetória de onde diz, a função locativa fosse a mais prototípica
(conforme encontrado no corpus, embora se trate de um lócus (+) textual). Essa forma
sofre um processo de abstratização, se tornando o onde diz evidencial.

Da fluidez dos limites categóricos acima citados se concebe a concepção clássica


para a gramaticalização: processo pelo qual palavras de uma categoria lexical plena
(nomes, verbos e adjetivos) podem passar a integrar a classe das categorias gramaticais
(preposições, advérbios, conjunções), que, por sua vez, podem se tornar afixos.
Atualmente, essa visão foi ampliada para a passagem de qualquer material linguístico
para mais gramatical, saindo do limite das unidades, chegando a construções9 (Bybee,
2003). É sob a concepção de gramaticalização que se constitui a pesquisa, visto que
onde diz realiza funções em um continuum espacial>textual. No fragmento (5), é
observada sua função mais gramatical:

(5) [...] o seu nome glorioso deue seer chamado ẽ começo de toda boa obra, e
ẽno seu sancto nome deue o homẽ de fazer toda cousa, onde diz o apostolo:
Jrmããos, qualquer cousa que fezerdes, todo fazede ẽ nome do Senhor Jhesu
Christo, [...].

(Orto do esposo, livro 1, cap 1, fólio 2v, grifo nosso)

Conforme o fragmento acima, percebe-se que o onde diz exerce uma função
evidencial como introdutor de argumento de autoridade, o apóstolo. Ao se
gramaticalizar em formato de expressão, onde diz passou a ter sua colocação restrita e
funcionalidade mais específica.

9
A definição atualmente mais usada para construções tem base em Goldberg (2006, p. 4) ao afirmar que:
“construção é um pareamento de forma e significado <FS>, cujos aspectos de “F” e de “S” nem sempre
estão previstos por esses elementos individualmente presentes em sua composição, nem por outras
construções preexistentes na língua”. (tradução livre do original: “C is a CONSTRUCTION iff ᵈᵉᶠ C is a
form-meaning pair <F S> such that some aspect of F or some aspect of S is not strictly predictable from
C’s component parts or from other previously established constructions”).
23

Pode-se afirmar, então, que gramaticalização é um tipo específico de mudança


observada em unidades linguísticas, bastante produtiva, que pode ocorrer nas línguas
naturais nos níveis discursivo, semântico e sintático, promovendo alteração no estatuto
categorial dessas unidades. À medida que as propriedades vão se alterando, a unidade
passa a integrar novas categorias.

A motivação para a gramaticalização, segundo Neves (2004, p.130),

está tanto nas necessidades comunicativas não satisfeitas pelas formas


já existentes, como na existência de conteúdos cognitivos para os
quais não existem designações linguísticas adequadas, devendo
observar-se, ainda, que novas formas gramaticais podem desenvolver-
se a despeito da existência de estruturas velhas funcionalmente
equivalentes (Heine et al., 1991, p. 29-30).

A gramaticalização é entendida como um processo, nos termos de Heine et al


(1991, p. 4), que acontece de modo gradual. A trajetória de gramaticalização se dá de
modo unidirecional, caminhando em direção à abstração e à aquisição de novos
significados. Conforme Gonçalves et al. (2007, p. 37):

“parece que ao processo de gramaticalização só poderia ser atribuído


um único e fundamental princípio: o princípio da unidirecionalidade,
verificável, como hipótese, por meio da atuação dos vários
mecanismos, partes constitutivas do fenômeno da gramaticalização”.

Comprova-se o princípio da unidirecionalidade pelos graus de gramaticalidade


assumidos por onde diz conforme a trajetória espaço>texto. Isso vai ao encontro das
pesquisas de Heine et al (1991) e Martelotta (2004). Em sua tese, Martelotta (ibidem)
afirma “[...] exist[ir]em, no texto, elementos de organização interna que são
provenientes da gramaticalização de dados espaciais, que podem ou não, [...] expressar
intermediariamente expressões temporais” (p. 45).

Hopper (1991) destaca o surgimento de novas funções para as mesmas formas e


de novas formas para funções já existentes. O autor relaciona cinco princípios
identificáveis nos primeiros estágios de gramaticalização que “revelariam” os graus de
mudança, são eles, divergência, especialização, estratificação, persistência,
descategorização. Essa pesquisa dará conta dos dois primeiros princípios.
24

O princípio da divergência faz referência aos diferentes níveis de polissemia ou


gramaticalização de uma mesma unidade. A unidade mantém aspectos da forma de
origem, embora com funções diferentes. Para a função locativa textual nesses seis
séculos que separam o corpus da atualidade, ocorreu uma estabilização, enquanto que,
para a função textual houve gramaticalização e, na sequência, seu possível
desaparecimento.

A especialização é constatada quando a frequência de uso de uma unidade


suplanta a outra, confirmando o processo mais adiantado de gramaticalização da
primeira. Segundo esse princípio, ocorre um estreitamento nas possibilidades de uso. A
função onde diz evidencial tem um volume considerável de elementos acima do onde
diz locativo textual no corpus trabalhado.

Quanto ao recorte temporal, Traugott & Heine (1991) confirmam que a


gramaticalização atua nos recortes diacrônico ou sincrônico. Essa pesquisa tomará a
gramaticalização em perspectiva sincrônica, observando o fenômeno sintático e
pragmático-discursivo. Entende-se que o recorte sincrônico, integrando o final do século
XIV e século XV, amplia em detalhes uma trajetória que pode ter passado despercebida
em estudos de natureza temporal maior.

2.2.2 Metáfora, metonímia e inferência sugerida

Tradicionalmente, a metáfora e a metonímia são conhecidas como recursos para


o enriquecimento dos textos de escritores e poetas. No entanto, destacam-se seus usos
contínuos nos mais diversos gêneros textuais, como em meio jornalístico, político,
didático, etc. Bem mais que isso, metáfora e metonímia são processos cognitivo-
funcionais inerentes à linguagem humana (Traugott; Dasher, 2005).

A metáfora, no século XX, foi considerada como o principal veículo para a


mudança semântica, restando à metonímia a posição mais secundária (Traugott; Dasher,
ibidem, p. 28). Nesta virada de século, pesquisas empíricas têm reconhecido o valor da
metonímia, muito além da contiguidade e associação. Traugott; Dasher (ibdem, p. 27)
destacam a dimensão dinâmica desses mecanismos e passam a chamá-los de processos
de metaforização e metonimização, vistos a seguir:
25

“metaforização é basicamente um princípio analógico que envolve


conceptuar um elemento de uma estrutura conceitual Cᵃ, em termos de
outro elemento Cᵇ. Uma vez que opera ‘entre domínios’ (Sweetser
1990:19; original em itálico), os ditos processos motivados pela
metaforização são conceituados primeiramente nos termos da
comparação de ‘fontes’ e ‘alvos’ nos domínios conceptuais diferentes
(e descontínuos), embora limitados por relações paradigmáticas de
igualdades e diferenças”10 (ibidem, p. 28).

A metonimização é interpretada pelos mesmos autores como:

“[...] mecanismo conceptual que sugere inferências na associação; no


fluxo contínuo da fala/escrita passam a ser semantizados ao longo do
tempo”11. [Acreditam ainda que a] a metaforização é considerada [...],
em muitas vezes, como o resultado da mudança metonímica”12
(ibidem, p. 29)

Portanto, a transferência conceptual é desencadeada pela metáfora, que aproxima


domínios13 cognitivos diferentes. A gramaticalização por metáfora se revela quando o
sentido de um domínio (+) concreto é transferido para outro (+) abstrato, em relações
paradigmáticas. Por sua vez, a gramaticalização por metonímia resulta da contiguidade
de domínios conceptuais induzida pelo contexto discursivo, em relações sintagmáticas.

O olhar valorativo para a metonímia destaca o contexto do evento, os papéis do


falante/escritor - ouvinte/leitor14 comprometidos em “dizer não mais do que devem e,

10
“Metaphorization is primarily an analogical principle, and involves conceptualizing one element of a
conceptual structure Cᵃ in terms of an element of another conceptual structure Cᵇ. Since it operates
‘between domains’ (Sweetser 1990:19; italics original), processes said to be motivated by
metaphorization are conceptualized primarily in terms of comparison and of ‘sources’ and ‘targets’ in
different (and discontinuous) conceptual domains, though constrained by paradigmatic relationships of
sames and differences”.
11
“Construed as a conceptual mechanism by which invited inferences in the associative, continuous
stream of speech/writing come to be semanticized over time” (p. 29).
12
“Metaphorization is regarded as [not only a constraint on but also] often the outcome of metonymic
change” (p. 29).
13
Domínio, conforme Sardinha (2007, p. 31) é a “área do conhecimento ou experiência humana. [...]. Há
dois tipos de domínio: fonte e alvo. O domínio-fonte é aquele a partir do qual conceitualizamos alguma
coisa metaforicamente [...]; geralmente é algo concreto, advindo da experiência. O domínio-alvo é aquele
que desejamos conceitualizar; esse é o domínio abstrato. [...]. Um domínio-fonte pode servir a vários
domínios-alvo; [...].
14
O ato de escrever, apesar de não interativo e monológico, é direcionado a um público específico, o que
exige uma seleção linguística para alcançar o efeito desejado. Assim, o leitor também é considerado um
participante ativo da interação (Duranti; Goodwin, 1992; Chafe, 1994, apud Traugott; Dasher, 2005, p.
17-18)
26

portanto, significar mais”15 (ibidem, p. 29). A importância do papel do locutor e


interlocutor na busca do novo sentido está associada às impressões e aos sentimentos de
ambos, presentes na interação.

Dessa forma, a trajetória de mudança semântica de onde diz locativo textual em


direção a onde diz evidencial teria início no evento da construção do texto, quando o
ponto de vista do escritor foi codificado na/pela expressão de semântica evidencial, a
fim de ser interpretado pelo seu leitor, mediante processo de metonimização.

As relações metafóricas e metonímicas estão relacionadas ao pressuposto da


inferência sugerida. Esse termo, emprestado de Geis; Zwicky (1971), é tomado por
Traugott; Dasher (ibidem, p. 05) em formato ampliado, agora “destinado a elidir as
complexidades de comunicação em que o falante/escritor evoca implicaturas e convida
o seu ouvinte/leitor a inferi-las”16. Em outras palavras: um novo significado é sugerido
por um quadro discursivo sintagmático proposto pelo locutor, a ser inferido por seu
interlocutor; trata-se de processo que associa aspectos de raciocínio e estratégias
retóricas. Observa-se que o onde diz em formato evidencial ocorre em situação
discursiva específica, sendo encontrado recorrentemente no modelo discurso1 + onde
diz [SN] + discurso 2, tal como proposto nesta dissertação.

Sobre especificamente a metáfora e a metonímia, os autores admitem que, (1) a


princípio, esses processos não são excludentes17 (ibidem, p. 29), mas que, (2) a primeira
tanto pode fornecer o contexto antecedente, quanto o resultado da mudança18 (ibidem, p.
9), ou ainda que (3) há hipótese da segunda ser mais básica para linguagem e cognição
do que a primeira19 (ibidem, p. 28-29). Conclui-se, então, que metáfora e metonímia
podem ocorrer conjuntamente e sem predisposição para que aquela ocorra antes dessa,
ou vice-versa. No entanto, a metonímia tem sido apontada como antecendete da
metáfora no que concerne à mudança semântica no contexto.

15
“say no more than you must, and mean more thereby” (p. 29). Baseado na segunda máxima de Grice
(1989 [1975]).
16
“[…] it is meant to elide the complexities of communication in which the SP/W evokes implicatures
and invites the AD/R to infer them” (p. 05).
17
“Neither conceptual metaphorization nor conceptual metonymization in principle excludes the other”.
(p. 29)
18
“We will argue that metaphorical, analogical relationships often provide the background contexts for
and often appear as the resulting products of change […]”. (p. 9)
19
“[...] probably even more basic to language and cognition than metaphor [...]”. (p. 29)
27

Os graus de gramaticalidade de onde diz, com base no material trabalhado,


podem ser representados conforme segue:

Em ponto à esquerda na trajetória, o onde diz locativo textual torna-se (+)


gramatical na função de onde diz evidencial, conforme grifo nos fragmentos (6) e (7):

(6) Outrossy, taaes persoas como dito he, leterados e pertee[n]centes para ello,
podem leer e studar pellos liuro[s] dos filosafos gentiis pera emtender as Sanctas
Scripturas e pera exposiçom dellas e outrossy pera cõfirmaçom da fe, porque
muytas cousas ha ẽnos livros dos filosafos que uallem muyto pera confirmaçõ
da nossa fe, onde diz em hũũ começo de hũũ liuro da Trii[n]dade de Boecio
que a nossa fe he tirada das cousas mais dedentro da filosafia.
(Orto do esposo, livro 3, cap. 11, fólio 30r, grifo nosso)

(7) [...] Moisés empero nom braadava per clamor de boca, mas com desejo do
coraçom. Onde diz Santo Agustinho: “O braado ao Senhor é entençom de
coraçom e aficamento de devoçom e deleitaçom em ela”.
(O livro de vita Christi, p. 91, grifo nosso)

Onde diz, tal como verificado em (6), desencadeou uma recategorização20,


resultando na estabilização no que antes eram duas formas livres e, agora, é uma forma
presa, ou pelo menos dependente, em formato evidencial, encontrada recorrentemente,
conforme fragmento (7) acima.

Em estágio subsequente, a expressão onde diz sofre redução, o verbo dicědi


sofre erosão e o elemento onde assume a função de onde diz, utilizando o mesmo
ambiente semântico, como verificado no fragmento (8):

(8) E algũas vêzes, por tal que, tirado o ajudador, possa melhor veer sua
imperfecçom e se conhocer. Onde o Psalmista: “Eu disse na minha avondança
__ Nom me mudarei desto pera sempre”; [...].
(O livro de vita Christi, p. 113, grifo nosso)

Considerando a proposta de Traugot; Dasher (ibidem), falante/escritor e


ouvinte/leitor “selecionam elementos lexicais e outros recursos de conjuntos
paradigmáticos de construções [metáfora] e fazem uso em relações essencialmente

20
Define-se como recategorização o deslocamento de um item lexical de uma categoria para outra.
28

sintagmáticas e associações [metonímia]”21 (p. 9), ou seja, a significação se realiza na


interpretação das proposições no discurso.

2.1.3 Subjetividade e intersubjetividade

Tendências recorrentes no quadro da mudança semântica encontradas em


idiomas distintos e em épocas diferentes (citam-se, por exemplo, o verbo must no inglês
moderno, bem como o sufixo verbal japonês –beki (-besí), ambos utilizados ora com o
sentido de “obrigação”, ora de “possibilidade”), fizeram Traugott e Dasher (2005)
afirmar que há “caminhos previsíveis para as ocorrências de mudança semântica entre
diferentes estruturas conceituais e os domínios da função da linguagem” 22 (p. 01).

Para dar conta dessa previsibilidade seriam necessários mais que os fatores
tempo e uso. Dessa forma, os autores defendem “intrinsecamente a ligação com os
processos cognitivos e comunicativos através dos quais os significados pragmáticos são
convencionalizados e reanalisados como polissemias semânticas”23 (loc.cit.), bem como
a vinculação desses com os processos de inferência sugerida (vista acima) e
subjetividade-intersubjetividade (definidos na sequência).

Subjetividade, na pesquisa funcionalista, é um conceito relativamente novo e


uma das maiores motivações para a mudança semântica. Define-se como um “processo
pelo qual o falante/escritor desenvolve, com o tempo, novos significados para lexemas
[e construções], os quais codificam ou externalizam suas perspectivas [...]”24 (ibidem, p.
30, 32 tradução livre), mais que isso, a subjetividade “revela a perspectiva ou ponto de
vista no discurso”25 (Finegan, 1995, p. 1, apud Traugott; Dasher, 2005, p. 20). Percebe-
se que a subjetividade é tratada em perspectiva ampliada, na qual se enquadram não só

21
“[…] draw from paradigmatically organized sets of constructions, lexical items, and other resources, on-
line production and processing make use of essentially syntagmatic relations and associations.”
22
“[…] we show that there are predictable paths for semantic change across different conceptual
structures and domains of language function”.
23
“[…] we argue, intrinsically bound up with the cognitive and communicative processes by which
pragmatic meanings come to be conventionalized and reanalyzed as semantic polysemies.
24
“Subjectification is the semasiological process whereby SP/Ws come over time to develop meanings for
Ls that encode or externalize their perspective and attitudes as constrained by the communicative world of
the speech event, […]” (p. 30)
25
“[...] perspective or point of view in discourse […]” (Finegan, 1995, p.1).
29

constituintes lexicais e gramaticais como também conectores discursivos26 (ibidem, p.


11), tais como onde diz, que realiza uma suposta intenção persuasiva do locutor.

A pragmática, como “mola propulsora”, junto a cognição e estratégias retóricas


favorecem a utilização de formas linguísticas sob nova codificação de sentido, tal qual
ocorre com onde diz, que, partindo de um sentido locativo, desenvolve uma função mais
discursiva. Esse processo recebe influência do verbo dicěndi, que produz um
desbotamento no caráter espacial do onde ao se unir a ele em expressão. O resultado é
um onde diz que satisfaz o propósito cognitivo-comunicativo, ao ter o significado
evidencial alcançado no uso assim condicionado.

As atitudes do falante/escritor perante seu ouvinte/leitor envolvem intenções e


estratégias codificadas semasiologicamente27, portanto, a subjetividade é requisito para
a intersubjetividade. Clark e Carlson (1982, apud Traugott; Dasher, 2005, p. 31)
definem intersubjetividade como “uma mudança que resulta no desenvolvimento de
significados que revelam explicitamente a concepção do destinatário”28, ou seja, o
falante/escritor codifica significados (onde estão encravadas suas concepções)
direcionados a um ouvinte/leitor específico. Essas codificações podem se
convencionalizar em novas polissemias, as chamadas inferências sugeridas, definidas
anteriormente.

Portanto, a gramaticalização de onde diz em trajetória espacial>textual é parte


integrante de uma estratégia de (inter)subjetividade que se destina a convencer o
interlocutor a agir/pensar de determinado modo. Essa estratégia possui um “modelo”
composto de discurso1 + onde diz [SN] + discurso2. A persistência em usá-lo pode
estar ligada ao alcance dos resultados, a intersubjetividade.

26
Define-se conector discursivo como unidades linguísticas invariáveis que marcam na superfície textual
as relações lógicas entre orações, segmentos textuais ou entre macroproposições, de forma a interpretar
como pertencentes a uma unidade maior, o texto (Disponível em: <
http://cvc.cervantes.es/ensenanza/biblioteca_ele/diccio_ele/diccionario/conectordiscursivo.htm >. Acesso
15 dez 2011. Tradução livre do original: Los conectores son unidades lingüísticas invariables que marcan
en la superficie textual las relaciones lógicas que se dan entre oraciones, entre segmentos textuales o
entre macroproposiciones de forma que se puedan interpretar como pertenecientes a una unidad mayor,
el texto.
27
“[...] mudanças no significado específico de itens lexicais e construções (Traugott e Dasher, 2005, p. 32)
28
“Intersubjectification, […], is a change which results in the development of meanings that explicitly
reveal recipient design […]” (Clark e Carlson (1982, apud Traugott e Dasher, 2005, p. 31)
30

Foi visto, portanto, que Traugott; Dasher (ibidem) desenvolvem suas pesquisas
funcionalistas levando em conta aspectos cognitivistas. Ambas as abordagens revelam
que a relação entre linguagem, pensamento e experiência influencia na dinâmica da
significação. O sentido por sua vez, está envolvido em uma atividade conjunta de
diferentes domínios do conhecimento, sendo negociado pelos interlocutores em
situações contextuais específicas. Sobre isso, Martelotta; Palomanes (2010, p.183)
reiteram que “os conceitos humanos associam-se à época, à cultura e até mesmo a
inclinações individuais caracterizadas no uso da linguagem”.

2.2 Evidencialidade

Dendale;Tasmowski (2001) reconhecem a conferência em Berkeley (1981) e sua


posterior publicação em livro sob o título Evidentiality: the linguistic coding of
epistemology (Chafe; Nichols, 1986) como marco para a pesquisa de evidencialidade
como tópico em linguística. Chafe; Nichols (1986) postulam que a evidencialidade diz
respeito à origem do conhecimento asseverado. Daquela conferência para cá o conceito
permaneceu, embora revisto e refinado.

Considera-se que determinar, ou não, a fonte da informação, é parte de uma


estratégia comunicativa. Em cerca de 25% das línguas no mundo é de primeira ordem
informar a fonte da informação em que a declaração foi baseada (se foi vista, ouvida ou
inferida), no entanto, dentro desse quadro há uma variação. Umas só revelam se a
informação foi adquirida de modo direto ou indireto; em outras, se foi vista, ouvida, etc.
(Aikhenvald, 2006, p.1).

“Evidencialidade ou evidenciais, [embora o nome sugira], nada têm a ver com


evidências”29 (Aikhenvald, 2006, p. 04, tradução livre) ou com o grau de certeza sobre a
proposição. As pesquisas nesta linha teórica se direcionam conforme a língua estudada,
pois, segundo Lazard (2001, p. 360), “todas as línguas têm meios de qualificar suas
declarações de introdução de referências para a origem da informação”30. Umas se

29
“‘Evidential’ and ‘evidence’ as a linguistic category differs from ‘evidence’ in common parlance.
30
“[...] all languages have means of qualifying utterances by introducing references to the origin of
information, […]”.
31

utilizam do modo lexical e outras do modo gramatical, embora aspecto cognitivo seja
universal.

No português brasileiro, em geral, se utiliza do modo lexical na articulação da


evidencialidade. Conforme pesquisas de Casseb-Galvão (2004), há indícios, por
exemplo, da gramaticalização do diz que para asseverar a origem da informação. O uso
de verbos declarativos e perceptivos (Castilho, 2010, p. 358-365) resulta em evidenciais
como: eu vi, disseram-me, dizem que, nós percebemos, etc. As conjunções “segundo,
conforme, etc. geram uma declaração em conformidade com o que disse outro emissor”
(Neves, 2000, p. 926). Seguem exemplos do Leal conselheiro:

(9) Ca o siso, segundo nossa dereita linguagem, nom esta no entender e falar
soomente, [...].
(título 8, fólio 11v, grifo nosso)

(10) Contra os quaaes diz sancto Agostinho que se querem alegrar com os
sanctos, e as tribullaço~o~es nom querem soportar com elles.
(título 4, fólio 8r, grifo nosso)

Tal qual visto acima, onde diz [SN] corresponde à linha de evidenciais de ordem
lexical. Importante relatar que, embora se trate de um evidencial lexical, onde e diz
passaram por uma trajetória de gramaticalização se tornando uma expressão (conforme
visto em seção anterior). Juntos assumem uma função distinta das que possuíam
originalmente separados.

A evidencialidade também pode ser gramaticalizada com a ocorrência de


clíticos, afixos, como morfemas para a designação da fonte da informação. Estudos
como o de Barnes (1984) sobre a língua colombiana tuyuka, de Weber (1986) sobre o
quechua do Peru e, de Aikhenvald (2004) sobre a língua tariana (encontrada a noroeste
da Amazônia) apontam para essa direção. A língua tariana se utiliza de sufixos atrelados
a verbos para definir se a informação teve origem no autor da proposição, se constatada,
se tem origem em outrem, ou é de ordem não marcada31. Nessa língua, a não ocorrência
do sufixo resulta em uma expressão agramatical, a ver em (11). Todos os exemplos têm

31
No contexto evidencial, marcada tem sentido diferente da abordagem funcionalista. Aqui, marcada,
pode ser substituída por necessária.
32

a mesma proposição “José jogou futebol”, alternando o sufixo em negrito que informa a
origem da informação e a ação verbal no tempo passado (Aikhenvald, 2006, p. 02-03):

(11) a: Juse irida di32-manika33-ka34 (Vimos isso)


b: Juse irida dimanika-mahka (Ouvimos isso)
c: Juse irida dimanika-nihka (Inferimos por evidência visual)
d: Juse irida dimanika-sika (Assumimos pelo que sabemos)35
e: Juse irida dimanika-pidaka (Fomos informados)

Apesar do conceito de evidencialidade se limitar à indicação da fonte da


informação, Aikhenvald (2006, p. 6) reitera que “a evidencialidade pode adquirir
significados secundários como confiabilidade, probabilidade, possibilidade (como
extensões epistêmicas), mas que ela não tem”36. Nessa linha, Dall’aglio-Hattnher (2001)
e Lucena (2008) produziram estudos que tratam do nível de
envolvimento/comprometimento de políticos em seus discursos. A primeira autora
analisou o discurso do ex-presidente Collor e acrescentou postulados que dizem respeito
ao nível de compartilhamento da fonte. A segunda analisou os discursos dos deputados
da Assembleia Legislativa do Ceará fazendo uso do nível epistemológico.

Embora haja um dissenso no que diz respeito à sobreposição das categorias


evidencialidade e modalidade, Haan (1999), Lazard (1999, 2001), DeLancey (2001) e
Aikhenvald (2006) consideram evidencialidade como categoria cheia e não como uma
subcategoria da modalidade.

Em outra linha, Casseb-Galvão (2004) estuda os evidenciais sob a temática da


gramaticalização. Segundo a autora, o uso do diz que no PB incorreria em um
reportativo de mito, processo que aconteceria quando o sujeito não é preenchido.

No contexto da gramaticalização de evidenciais, há indícios de que a


gramaticalização que uniu onde + diz em uma expressão teve estágio subsequente, que
corresponderia à utilização apenas do onde para apontar a origem da informação.

32
Prefixo de 3ªpessoa do singular.
33
Verbo.
34
Sufixo evidencial.
35
A diferença entre ‘c’ e ‘d’, ou seja, entre ‘assumir’ e ‘inferir’, é que a primeira está relacionada a
evidência visual e a segunda, ao raciocínio lógico.
36
“Evidentials may acquire secondary meanings – of reliability, probability, and possibility (know as
epistemic extensions), but they do not have to”.
33

Importante afirmar que o contexto linguístico da ocorrência do onde como evidencial é


semelhante ao contexto da ocorrência de onde diz, conforme fragmento (12):

(12) Moralmente, a luz alumea nas treevas, porque a virtude se mostra nas
aversidades e a virtude na infirmidade se acaba. Onde Sam Gregório: “Nom
conhece alguém quanto aproveitou, salvo na aversidade; [...]

(O livro de vita Christi, p. 35, grifo nosso)

Os trabalhos dos pesquisadores brasileiros têm como base os postulados de


Willet (1988, apud Dall’Aglio-Hattnher, 2011). Segundo esse autor, há dois meios para
a obtenção da informação, direto ou indireto. Quando a fonte da informação é originada
no próprio falante, ou seja, é por ele atestada, tem-se a evidência direta. Se esta
informação chega por intermédio de outrem, é chamada indireta relatada. Do mesmo
modo, se a informação é deduzida por raciocínio, trata-se de evidência indireta inferida.
Veja-se a figura (1):

Figura 1: Tipologia para a evidencialidade conforme Willet (1988):

EVIDENCIALIDADE

DIRETA INDIRETA

ATESTADA INFERIDA RELATADA

O onde diz, conforme encontrado no corpus, corresponde a uma evidência


adquirida por meio de uma informação indireta relatada conforme destacado na Figura
1. Observe-se o fragmento (13):

(13) Zacarias, consiirando a sterilidade da molher e a velhice de ambos, nom o


creeo, e por êsto foi mudo atees o tempo do parto, significando que, já viindo
Cristo, a lei e as profecias seriam compridas e cessariam, calando-se. Onde diz
Sam Crisóstomo: “Portanto Zacarias, sacerdote dos Judeus, foi mudo, porque já
34

convém cessar e calarem-se os sacrifícios que por os pecados do pôoboo


ofereciam. [...]”.
(O livro de vita Christi, p. 57-59)

Extrapolando os limites do objeto de pesquisa aqui tratado e observando o


contexto de sua ocorrência, percebe-se que essa estrutura é encontrada recorrentemente
no molde: discurso1 + onde diz [SN] + discurso2. Em modo restrito, o primeiro
discurso (posicionado anteriormente ao onde diz) é a manifestação do enunciador1
(autor). O segundo discurso (posicionado posteriormente ao onde diz) é manifestação do
enunciador2, ou seja, exterior ao texto e a ele trazido a fim de compor uma estratégia
argumentativa do enunciador1, observe-se o Quadro 4:

Quadro 4: Contexto evidencial

DISCURSO 1 EVIDENCIAL DISCURSO 2


(ENUNCIADOR 1): Zacarias, Onde diz Sam Crisóstomo: (ENUNCIADOR 2): “Portanto
consiirando a sterilidade da Zacarias, sacerdote dos Judeus,
molher e a velhice de ambos, foi mudo, porque já convém
nom o creeo, e por êsto foi cessar e calarem-se os
mudo atees o tempo do parto, sacrifícios que por os pecados
significando que, já viindo do pôoboo ofereciam. [...]”.
Cristo, a lei e as profecias
seriam compridas e cessariam,
calando-se.

Detecta-se que os discursos 1 e 2 são semelhantes, inclusive utilizam os mesmos


sintagmas, citam-se Zacarias, mudo, cessar e calar. O segundo discurso é mais
valorado por dizer se tratar das palavras de São Crisóstomo. Isso indiretamente causa
alguns sentidos lógicos: (a) o enunciador concorda com São Crisóstomo; (b) o
enunciador tem conhecimento religioso, literário; (c) tendo São Crisóstomo a sabedoria
dos santos, da religião, da igreja, etc., reconhecidos pelo imaginário, suas verdades são
inquestionáveis para aquela sociedade; (d) se São Crisóstomo é inquestionável, o
enunciador também, e por consequência, a sua obra e aí alcança a persuasão; por outro
lado, se (e) as palavras ditas como sendo de autoria de São Crisóstomo, acaso a ele não
pertencerem, a estratégia persuasiva do enunciador é destruída. A partir desses itens
35

pode-se afirmar que, a subjetividade do enunciador é revelada pela informação que ele
enuncia.

O evidencial Onde diz Sam Crisóstomo é independente sintaticamente de ambos


os discursos. Do discurso 1 é separado pelo ponto final. Do discurso 2 é separado pelos
dois pontos. As partes não compartilham elementos.

Seguindo as pistas para a realização dessa pesquisa, possivelmente o onde diz,


como fonte indireta de informação é herdeiro de uma Tradição Discursiva com uso
específico em determinados contextos. Assim se explicaria a dificuldade em encontrá-lo
em outros tempos.

2.4 Tradições Discursivas

A origem do que viria a ser uma visão histórica sobre oralidade e


“escrituralidade” (Simões, 2009) se deve a Schlieben-Lange (1983, 1993), o que em
pouco mais de uma década se tornaria a proposta de Kabatec (2004), as Tradições
Discursivas.

Para definir esse conceito, é preciso voltar a Coseriu (1981), a Koch &
Oesterreicher (1997). Coseriu entende que a linguagem é uma atividade universal
executada dentro de uma tradição histórica, embora realizada individualmente, os quais
comporiam os três níveis da linguagem. Na sequência, Koch e Oesterreicher (ibidem)
entendem que é necessário haver uma ampliação do nível histórico da linguagem,
acrescentando os domínios da língua particular e tradições discursivas, conforme
Quadro 5:

Quadro 5: Explicativo das Tradições Discursivas conforme Koch (1997):

NÍVEL DOMÍNIO TIPO DE NORMA TIPO DE REGRA

UNIVERSAL ATIVIDADE DE FALAR NORMAS DO FALAR REGRAS DO FALAR

LÍNGUA PARTICULAR NORMAS LINGUÍSTICAS REGRAS DA LÍNGUA


HISTÓRICO
TRADIÇÕES DISCURSIVAS NORMAS DISCURSIVAS REGRAS DISCURSIVAS

INDIVIDUAL DISCURSO OU TEXTO


36

O nível universal refere-se à capacidade de se comunicar, para a qual é


necessário o uso dos signos linguísticos, independentemente da língua utilizada. No
nível histórico tem-se a língua dentro das suas tradições culturais, influenciada por
fatores sociais. No nível individual, a língua é parte da atividade discursiva de cada
usuário.

Considerando a ampliação do nível histórico, pode-se afirmar que a


concretização do ato comunicativo se efetiva pela passagem por dois “filtros”
simultâneos, um correspondente à língua (enquanto sistema e norma) e o outro
correspondente às Tradições Discursivas. Kabatek (2004, p. 2) reitera que “não se pode
falar ‘universalmente’ sem falar uma língua e sem produzir textos, e não se pode falar
uma língua como sistema de signos sem que seja mediante textos”.

O alargamento do nível histórico contribui para o entendimento de que há uma


história dos textos independente da, ou paralelamene à história das línguas. Segundo
Kabatec (2004, p. 7), Tradições Discursivas consistem

[n]a repetição de um texto ou de uma forma textual ou de uma


maneira particular de escrever ou falar que adquire valor de signo
próprio (portanto é significável). Pode-se formar em relação a
qualquer finalidade de expressão ou qualquer elemento de conteúdo,
cuja repetição estabelece uma relação de união entre atualização e
tradição; qualquer relação que se pode estabelecer semioticamente
entre dois elementos de tradição (atos de enunciação ou elementos
referenciais) que evocam uma determinada forma textual ou
determinados elementos linguísticos empregados. (grifo nosso)

As condições para que se constate uma tradição discursiva são, conforme


Kabatek (2004, p. 9), três: (1) a tradição deve ser discursiva, tal qual o nome determina;
(2) a imprescindibilidade da repetição dessa tradição; (3) análise da referência
discursiva, ou seja, análise dos contextos, que devem possuir situações de mesmo nexo.

Considera-se que onde diz é marcado pelo fator repetição ao evocar a mesma
forma com a mesma função reiterada vezes, no mesmo e em diferentes textos, tendo no
seu entorno contexto discursivo semelhante. Mais que isso, onde diz parece específico
de um tipo de dizer ligado à fase arcaica da língua, de forte tradição católica e
possivelmente ilustra uma variedade diafásica ou diastrática.
37

O fator repetição, no estudo das Tradições Discursivas, conforme Kabatek


(2004, p. 5), pode ser abordado de forma parcial ou total; no entanto, pode ser
pesquisada a ausência total de repetição, ou ainda, a repetição de apenas uma forma
textual. Esta pesquisa se enquadra na repetição apenas da forma onde diz, então,
investiga-se a história específica dessa Tradição Discursiva, que possivelmente esteve
em uso como evidencial entre os séculos XIV e XV. Observe-se a Figura 2:

Figura 2: Evocação (Kabatek, 2004, p. 7).

texto1 situação1

texto2 situação2

Conforme a Figura 2, pode-se afirmar que o objeto de pesquisa investigado nesta


dissertação apresenta-se como uma Tradição Discursiva utilizada nos textos de cunho
pedagógico-religioso de determinada sincronia do português e se desenvolveu a partir
do uso da forma onde diz em particular situação 1(texto 1), com característica
contextuais específicas. Ao serem encontradas situações semelhantes (situação 2), o
onde diz é evocado no texto2 e, assim sucessivamente.
38

3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

A pesquisa teve início na identificação da forma onde diz em molde mais


abstrato, ou seja, (-) locativo e (+) textual, encontrada primeiramente no texto português
Orto do esposo. Ali, reiteradas vezes, o onde diz foi utilizado para expressar a origem
indireta de informação, conforme fragmento (14)37 que segue:

(14) E pore~m o seu nome glorioso deue seer chamado e~ começo de toda boa
obra, e e~no seu sancto nome deue o home~ de fazer toda cousa, onde diz o
apostolo: Jrma~a~os, qualquer cousa que fezerdes, todo fazede e~ nome do
Senhor Jhesu Christo, e~no qual uiuemos, e em elle nos mouemos e somos. E
pore~ e~no começo desta obra puge o nome de Jhesu Christo, e e~no seu nome
a comecey, o qual nome he muy delectoso, onde diz Jhesu, filho de Sirac: Asi
como o mel seera doce a renebra~ça delle, convem a saber do nome que he
Jhesu, que quer dizer saude. Onde diz Sam Lucas e~nos Autos dos Apostolos
que no~ ha hi saude e~ outro nehu~u~ se~no~ em Jhesu Christo. E diz Salamo~
emnos Cantares do Amor: Oleo espargido he o teu nome.

(Orto do esposo, livro 1, cap 1, fólio 2v, grifo nosso)

A título ilustrativo, o fragmento (14) é representativo do universo discursivo do


texto supracitado, demonstrando a insistência do uso dessa forma, em detrimento de
outras, para identificar a origem da informação.

A partir desse ponto, foi realizada uma pesquisa sobre as possíveis grafias
utilizadas para onde para a formulação do corpus. Paiva (1988, p. 52) afirma que o
onde, no português dos séculos XV e XVI, pode ser encontrado nas seguintes grafias:
ũ, hu e ulo38. De posse dessa informação, a busca se direcionou para as formas ũ, hu e
onde.

A procura pelas grafias ũ, hu e onde acompanhadas, ou não, do verbo dicěndi


deu-se em textos primordialmente arcaicos. A seleção originou-se pela grafia,
entretanto, após a observação, outro critério, referente à função textual, também foi
utilizado. Do mesmo modo, os fragmentos compostos das grafias ũ, hu, onde, utilizadas
sem o verbo dicěndi, também só foram incorporadas à pesquisa se possuíssem o critério
(+) textual, conforme o fragmento (15), que segue:

37
Neste fragmento, excepcionalmente, estão contidas três ocorrências de onde diz, o que corresponde a
três dados de nossa pesquisa e a três fragmentos distintos, todos encontrados em seção Anexa final.
38
Ulo encontrada apenas em Gil Vicente.
39

(15) Moralmente, a luz alumea nas treevas, porque a virtude se mostra nas
aversidades e a virtude na infirmidade se acaba. Onde Sam Gregório: “Nom
conhece alguém quanto aproveitou, salvo na aversidade; [...]

(O livro de Vita Christi, p.35, grifo nosso)

O fragmento (15), portanto, compõe o corpus, pois se enquadra no critério acima


estabelecido.

Dentre as grafias39 reconhecidas para o onde, foram encontradas ocorrências


com função textual apenas para hu diz, onde diz e onde em Orto do esposo, O livro de
vita Christi, Leal Conselheiro, Livro das aves e Demanda do santo Graal, todos
referentes ao final do século XIV e século XV. A busca se direcionou para diferentes
textos do período arcaico da língua portuguesa40 e de outras sincronias, no entanto, não
foram levantados dados tais como os aqui referidos, configuradores de nosso objeto de
pesquisa, fora da fase arcaica. Assim, embora empreendendo busca indiscriminada em
diversas fontes empíricas de distintas fases da língua, não foram levantados registros de
nosso objeto de pesquisa, o que restringiu nosso olhar para a fase arcaica.

Portanto, o corpus deste trabalho se compõe de fragmentos do Orto do esposo,


Leal conselheiro, Demanda do santo Graal, O livro de vita Christi e Livro das aves,
correspondentes ao período arcaico da língua portuguesa (séculos XIV-XV), o que
permitiu analisá-los como representativos de uma sincronia específica. Esses textos
foram selecionados a partir do critério de ocorrência de hu diz, onde diz e onde
representativas do critério (+) textual.

A seleção foi previamente delimitada em número de cinquenta ocorrências para


cada texto, a fim de concorrer para certa uniformidade quantitativa. Destaca-se que as
ocorrências seguem a ordem de seu aparecimento e nenhuma foi descartada até aquele
limite, no entanto, a distribuição foi irregular. Em Leal conselheiro temos apenas um
dado, no Livro das aves e na Demanda do santo Graal temos duas ocorrências cada.
Esses três textos foram pesquisados em sua integralidade. Diferentemente, O livro de
vita Christi e Orto do esposo contribuíram com cinquenta dados cada um, contudo,

39
Ũ, hu e onde.
40
Bíblia medieval portuguesa, Crônica geral de Espanha, etc.
40

especificamente nesses dois textos há possibilidades para mais que o dobro das
ocorrências levantadas. O corpus totaliza, assim, 105 dados.

O levantamento dos dados procedeu-se de forma distinta. O Orto do esposo,


Leal conselheiro, Demanda do santo Graal são encontrados integralmente via
internet41, o que proporcionou a utilização da ferramenta localizar do Windows. O livro
de vita Christi42 e Livro das aves43 não são encontrados em formato virtual, desse modo,
fez-se necessária uma leitura para marcação dos objetos pesquisados. Reitera-se que a
seleção foi por amostragem limitada em cinquenta ocorrências para cada texto.

Dessa forma, optou-se pela análise qualitativa do corpus, observando as


motivações estruturais, cognitivas e comunicativas que levam locutores a ampliar as
possibilidades de uso de onde diz. Conforme Martelotta (2009, p. 3), consideramos que
“a importância da frequência em funcionalimo [está] em assinalar aquilo que o uso
consagra como estratégia de comunicação em determinado contexto e como isso
ocorre”.

Ainda sobre os textos, importante relatar que Orto do esposo e Leal conselheiro
são originalmente portugueses, Demanda do santo Graal, O livro de vita Christi e Livro
das aves são versões44 em língua portuguesa de originais latinos. Todos, em maior ou
menor grau, compartilham a temática didático-religiosa. Houaiss (2004, p. 247) define
didático como “destinado a instruir, o que facilita a aprendizagem”. Nessa mesma obra
(p. 635), religioso é o “que tem elementos de adoração; ou que segue ou professa uma
religião”. Dessa forma, são aqui chamados de textos didático-religiosos aqueles que têm
o propósito de educar social, filosófica ou religiosamente. Esses textos impressos
substituíram a tradição em que os grandes feitos eram passados oralmente.

A temática didático-religiosa reflete um tempo de instabilidades político-


econômico-religiosas pelo qual passa a Europa medieval, dentre as quais: o declínio das
relações feudais e do teocentrismo e a consolidação do Renascimento e do
antropocentrismo. Em Portugal, a população presencia o voto de pobreza dos

41
<cipm.fcsh.unl.pt/>
42
Edição fac-similar e crítica do incunábulo de 1493 cotejado com os apógrafos, outros dados na seção
destinada a Referências.
43
Edição fac-similar do manuscrito do século XIV, outros dados na seção destinada a Referências.
44
As versões davam liberdade ao tradutor português para digressões, simplificações e acréscimos.
41

franciscanos ir de encontro aos interesses da Igreja e, paralelamente, a divisão do clero


no Cisma. Em meio a esses acontecimentos, os fiéis abandonam a Igreja rumo ao
conservadorismo e a ortodoxia, que pouco a pouco se fortalecem, o que não agrada a
Igreja. De fato, urgem tentativas para assegurar os fiéis no Catolicísmo, o que se reflete
na produção textual da época. Os detentores do poder em Portugal, a Corte e a Igreja, na
defesa de seus interesses, investem em refinadas estratégias de persuasão agregadas a
textos que valoram os exempla e as autoridades, como Jesus Cristo, Espírito Santo,
apóstolos, santos, filósofos, reis, entre outros.

Uma dessas estratégias é articulada justamente por nosso objeto de pesquisa,


formada por dois discursos com temas semelhantes e entre eles o onde diz com função
textual: discurso1 + onde [diz]+SN + discurso2, cujo sintagma nominal, preenchido
pelas autoridades citadas anteriormente, era alterado conforme a temática. Portanto,
acredita-se em certa tendência para as ocorrências de onde [diz] (+) textual como
característica de determinados contextos. Daí, possivelmente, a dificuldade de encontrar
ocorrências, segundo os critérios estabelecidos, em outros textos, ou mesmo, em outros
tempos.

A análise das funções assumidas por onde diz se realiza considerando o contexto
de sua ocorrência. Dessa forma, os fragmentos contêm pelo menos uma oração anterior
e outra posterior ao objeto pesquisado, contemplando o formato: discurso1 + onde [diz]
+ SN + discurso2. Os fragmentos utilizados no corpo deste trabalho foram retirados do
corpus principal da pesquisa, a exceção dos fragmentos 6, 7, 8, 9 e 10 de caráter
explicativo ou ilustrativo. A seleção desse ou daquele fragmento priorizou tão somente
analisar adequadamente cada objeto ou fragmento. A enumeração dos fragmentos no
corpo do trabalho visa a sua orientação/identificação em sequência.

Na seção destinada às análises, estão dispostas três tabelas demonstrativas do


quantitativo da pesquisa. Especificamente, a Tabela 3, referente à separação/integração
do onde diz aos argumentos anterior e posterior, foi produzida com o auxílio de
símbolos matemáticos para melhor sistematização dos dados. O símbolo matemático U
(união), utilizado com essa mesma codificação, tem o intuito de apontar que onde diz é
integrado sintaticamente ao argumento a que esse símbolo se refere. Isso quer dizer que,
se esse símbolo estiver posicionado antes da expressão, faz referência ao argumento
anterior, ocorrendo do mesmo modo com o argumento posterior. Como contraponto, o
42

símbolo Ʉ (desunião) representa a separação sintática do argumento a que esse se


refere. Dessa forma, U ONDE DIZ Ʉ, lê-se “onde diz é unido sintaticamente com o
argumento anterior e separado sintaticamente do argumento posterior”.

Em seção anexa final, encontra-se a totalidade do corpus. Os fragmentos estão


agrupados por texto e recebem numeração sequencial diferente daquela utilizada no
corpo do trabalho. Cada fragmento é seguido de parênteses com informações sobre
título, fólio, paginação, etc., e de tabela com sua respectiva classificação.

O corpus é analisado considerando prioritariamente as variações quanto às


funções de onde [diz], isso se justifica pela observação de que, em determinados
contextos, essa expressão alcança níveis diferentes de abstratização, identificáveis na
sequência em que ocorre.

Considerando que todas as ocorrências contemplam o critério (+) textual,


realizado sob um continuum concreto>abstrato, a análise, quanto ao critério função,
tomará primeiro o ponto (+) locativo, ou seja, o mais concreto, seguido do ponto de
transição (+/-) locativo e, se encerra com o ponto mais abstrato, ou seja, (-) locativo. Os
fragmentos (16), (17) e (18) são exemplificativos dessa trajetória:

(16) O meu nardo deu blandeza de odor. Ca a palaura da Sancta Scriptura da


saude aas jnfirmidades da alma, onde diz o propheta Dauid: Emviou o Senhor
Deus a sua palaura e deu-lhe saude. [...].

(Orto do esposo, livro 2, cap 9, fólio 11v, grifo nosso)

Onde diz, nesse fragmento, é visto no papel (+) locativo, ao produzir um


movimento catafórico que retoma a palaura da Sancta Scriptura, embora a palaura a
Scriptura não se trate exatamente de um local físico. A condição de lugar físico fica
mais expressiva ao analisar que está na palavra da Santa Escritura aquilo que o profeta
David quer dizer.

(17) [...] o orto da Sancta Scriptura he cercado de muy fortes sebes, per que he
muy segura, em tal guisa que nõ emadam nẽ mĩguẽ em ella. Onde diz Sam
Joham ẽno Apocalissy: Se alguẽ posser sobre esto, apoera Deus sobre elle as
plaguas scriptas em este liuro, [...].

(Orto do esposo, livro 2 cap 13, fólio 15r, grifo nosso)


43

O fragmento (17) é diferente de seu antecessor. Onde diz não retoma nenhuma
parte do texto anterior, senão todo o texto anterior e dá sequência para todo o argumento
posterior. Percebe-se a ligação de onde com ẽno Apocalissy. Apocalipse é uma seção
bíblica e, em virtude disso, um lugar, embora não físico. Por sua vez, o verbo dizer se
liga ao argumento posterior, ou seja, às palavras de São João: se alguẽ posser sobre
esto, apoera Deus sobre elle as plaguas scriptas em este liuro, [...]. Portanto, onde diz
no fragmento (17) possui mais características textuais e (+/-) locativas e funciona de
modo mais abstrato que o fragmento (16).

(18) [...] seja demostrado que foi soomente de graça, a qual nom precederom
méritos alguũs de homeẽs. A graça é atribuída ao Spíritu Santo. Onde diz a
glosa: “Spiritu é nome de toda graça, a qual é spirada de Deus”.
(O livro de vita Christi, p.73, grifo nosso)

Em (18), percebe-se que onde diz é representativo da função (-) locativa (+)
textual, por não se referir especificamente a nenhum ponto anterior ou posterior no
texto. Isso acontece ao mesmo tempo em que onde diz se volta para todo o argumento
anterior e posterior. Esse é o ponto mais alto de abstratização identificável no corpus,
em que a identificação espacial desapareceu.

No entanto, não só aspectos referenciais são identificáveis, pois há fragmentos


que se destacam por outras peculiaridades, como, por exemplo, forma e integração.

O critério forma surge na identificação de dois grupos com a mesma função


textual: uma em que o verbo dicěndi se faz presente e a outra não, conforme fragmentos
que seguem:

(19) E aquell que aprender quer a Sancta Escriptura, cõpre-lhe que uiua bem e
estude ameude, onde diz Sancto Agostinho: Erra qualquer que pensa que pode
conhocer a uerdade, se ajnda mal uiue.

(Orto do esposo, livro 2 cap 10, fólio 12v, grifo nosso)

(20) Porém assi como sabedor e toda avergonhada, nom respondeu cousa,
cuidando em si meesma e examinando aquêlo que era dito. Onde Ambrósio:
“Maravilha-se da nova forma da saüdaçom, porque nunca fora ante achada e
soomente pera Maria se guardava esta saüdaçom”.
(O livro de vita Christi, p.69, grifo nosso)
44

Verifica-se que onde diz é encontrado em (19) com a função textual, no entanto
em (20), apenas o onde exerce a mesma função. No corpus não só há variantes quanto à
ocorrência, ou não, do verbo dicěndi, mas também quanto a pessoa, tempo e voz
nominal desse verbo, que são considerados no âmbito das análises.

Há ainda o critério integração citado anteriormente, que surge da observação de


que diferentes níveis de independência cercam a expressão estudada. De modo mais
específico, esse critério diz respeito à integração do onde ao diz associado à inserção, ou
não, de outros elementos na expressão, bem como à integração do onde diz ao contexto
anterior e posterior.

Os aspectos forma e integração merecem destaque em momento oportuno,


incorporados à análise funcional.
45

4 ANÁLISE DE DADOS

Esta seção destina-se à análise do objeto pesquisado, realizada com base na


observação de processos cognitivos e comunicativos que motivam o uso de onde diz no
português arcaico.

Do Quadro 1 da seção destinada a Revisão da literatura, conclui-se que a função


prototípica de onde é adverbial (local em que), seguida da função relativa.
Considerando essa informação e os dados levantados, observa-se que a função
locativa/relativa do onde, gradativamente, perde espaço para a função textual,
considerando-se a hipótese localista (Batoréo, 2000), segundo a qual ocorre derivação
espaço > (tempo) > texto na trajetória semântica das formas linguísticas. A função mais
textual é resultante de um nível de gramaticalidade alcançado por estratégias de
subjetivação e intersubjetivação, em que os elementos onde e diz formam uma
expressão de valor evidencial. Portanto, o locutor parece utilizar-se de “comandos”
linguísticos destinados a fazer seu interlocutor agir de determinado modo.

Tais “comandos” se destacam em textos portugueses da fase arcaica, no formato:


discurso1 + onde [diz] + SN + discurso2. Esse uso específico numa dada sincronia
enseja a busca de elementos históricos que, porventura, o influenciaram. De fato, a
Europa como um todo enfrentava situações econômicas, sociais, culturais e religiosas
muito específicas. Devido à posição geográfica portuguesa no extremo Ocidente, a
influência do contexto europeu chegou mais tarde a essa área. Em Portugal, isso se
refletiu mais diretamente em relação à corte e à Igreja. Sob tal contexto é que emerge
essa literatura didático-religiosa de riqueza persuasiva que marca os textos que são aqui
tomadas como fonte empírica.

Da observação dos dados da pesquisa, percebe-se que as funções exercidas por


onde diz apresentam o traço (+) textual, no entanto, esse traço possui diferentes nuances
relacionadas à dimensão espacial, são elas: (+) locativo, (+/-) locativo e (-) locativo. A
demonstração quantitativa dessas informações está na Tabela 1, que segue:
46

Tabela 1: Quantitativo das funções de onde [diz]:

FUNÇÕES + LOCATIVO + +/- LOCATIVO + - LOCATIVO TOTAL


TEXTUAL TEXTUAL +TEXTUAL

QUANTITATIVO 3 16 86 105

PERCENTUAL 3% 16% 86% 100%


(aproximado)

Pode-se constatar pela Tabela 1 que, no corpus trabalhado, a disposição do uso


(-) locativo (+) textual de onde [diz], expressos em 86 ocorrências, se destaca em
relação ao uso (+/-) locativo (+) textual, com apenas 16 ocorrências e mais ainda em
relação ao (+) locativo (+) textual, realizado em três momentos. Disso conclui-se que o
uso de onde diz com características evidenciais é uma tendência no corpus trabalhado,
tal qual é verificado no fragmento (21), exemplificativo dessa tendência:

(21) “Eu creo, mas da maneira per que se deve fazer pregunto”. Onde diz
Ambrósio: “Nom duvida seer fazedoiro aquela que preguntava per que maneira
se havia de fazer. [...]”.
(O livro de vita Christi, p. 73, grifo nosso)

Onde diz, conforme encontrado no fragmento (21), já não possui característica


espacial. Observa-se que a expressão não faz referência a nenhum lugar específico no
texto, ou mesmo, fora dele. Na perda da função espacial original, sobressai uma função
discursiva específica.

No entanto, não só aspectos relativos à função são explorados nesta pesquisa,


aspectos da forma e da integração também são observados. Suas representações
quantitativas estão respectivamente nas Tabelas 2 e 3.
47

Tabela 2: Quantitativo das disposições do verbo dicěndi:

SEM
VERBO dicěndi COM FORMA VERBAL FORMA TOTAL
VERBAL

3ª pessoa
3ª pessoa 3ª pessoa Gerúndio
singular
singular plural
PESSOAS E pretérito
presente presente
TEMPOS perfeito do Ø
indicativo indicativo
VERBAIS indicativo

DIZ DIZEM DIZENDO


DISSE

QUANTITATIVO 63 2 4 1 35 105

PERCENTUAL 100%
(aproximado) 60% 2% 4% 1% 33%

Em relação ao critério forma45, foi observado que as ocorrências de onde [diz]


possuem duas variantes referentes ao uso, ou não, do verbo dicěndi. De fato, como
relatado anteriormente, foram retiratadas do corpus duas formas exercendo função
correspondente: onde diz e onde. As ocorrências com verbo possuem maior quantitativo,
com 70 dados e as ocorrências sem verbo registram 35 dados. Depreende-se, portanto,
que a forma com verbo é a preferida para essa função, o que permite que o fragmento
(21) acima ilustrado seja exemplar desse padrão mais recorrente.

Ainda sobre critério formal, são encontradas 7% de variantes relacionadas a


pessoa, forma nominal e tempo verbal. Essas formas distintas podem estar localizadas
em algum ponto da trajetória de gramaticalização do objeto pesquisado.

Depreende-se, a partir dessas informações, que o representante mais prototípico


da função textual possui o traço com verbo, no formato onde + verbo dicěndi na 3ª
pessoa do singular do presente do indicativo. Segundo Castilho (2010, p. 432-433), o
uso do presente do indicativo pode estar associado tanto ao aspecto de simultaneidade
ao momento de fala, quanto ao aspecto atemporal. Portanto, o valor de verdade do onde
diz pode ser implicado a qualquer tempo de sua leitura.

45
O interesse pelas diferentes formas assumidas por onde nos séculos XIV-XV foram direcionadas à
seleção do corpus. Esta pesquisa não dará conta do estudo morfológico do onde.
48

Tabela 3: Quantitativo da separação/integração do onde diz aos argumentos anterior e


posterior:

SEPARAÇÃO
/INTEGRAÇÃO
U ONDE DIZ U Ʉ ONDE DIZ Ʉ Ʉ ONDE DIZ U U ONDE DIZ Ʉ TOTAL

QUANTITATIVO 1 89 11 4 105

PERCENTUAL 1% 88% 12% 4% 100%


(aproximado)

Quanto ao critério integração, observa-se que a independência sintática de onde


diz em relação aos argumentos anterior e posterior é a preferida com 89 ocorrências, um
total relevante acima dos outros casos, que juntos somam aproximadamente 17% do
total dos casos. A partir do reiterado uso “encaixado” de onde [diz] + SN, pode ser
constatada a tendência evidencial. Seguem fragmentos exemplificativos dos subgrupos
identificados pela Tabela 3:

(22) Zacarias, consiirando a sterilidade da molher e a velhice de ambos, nom o


creeo, e por êsto foi mudo atees o tempo do parto, significando que, já viindo
Cristo, a lei e as profecias seriam compridas e cessariam, calando-se. Onde diz
Sam Crisóstomo: “Portanto Zacarias, sacerdote dos Judeus, foi mudo, porque já
convém cessar [...]”.
(O livro de vita Christi p.57-59, grifo nosso)

O fragmento (22) representa o subgrupo com maior volume de dados (89


fragmentos) representados pela simbologia “Ʉ ONDE DIZ Ʉ”. A principal característica
desse subgrupo é sua independência sintática da cláusula onde diz. Assim, pode-se
inferir de (22) que onde não retoma nenhuma palavra anterior ou posterior. Do mesmo
modo, o período subsequente, “Portanto Zacarias, sacerdote dos Judeus, foi mudo,
porque já convém cessar [...]” não é o complemento sintático do verbo dizer, pois para
isso seria necessária uma conjunção integrante, trata-se, então, de período independente
(Bechara, 2009, p. 463-464). Acrescenta-se ainda que, o fragmento (22) também possui
características (-) locativo (+) textual, no molde discurso1 + onde diz [SN] + discurso2,
em que onde diz [SN] tem função específica textual diferente da sua original função
espacial. As propriedades função e integração são complementares neste subgrupo.
49

(23) A aruor da palma significa a uitoria da ressureyçom dos mortos, ẽ que sera
a morte uẽçuda, assy como diz Sam Paulo: Absoruuda he a morte ẽ uitorya.
Onde diz hũũ filossafo, que chamam Plynio, que emna terra da parte do meodia
ha hũa palma que, quando he tam uelha que seca e podrece, nace outra uez de sy
meesma e torna a seer uerde.

(Orto do esposo, livro 2 cap 6, fólio 10r, grifo nosso)

O fragmento (23) pertence ao subgrupo representado por “Ʉ ONDE DIZ U”, que
possui o total de 11 ocorrências. A principal característica desse subgrupo é o onde não
possuir relações em anáfora e catáfora. Por outro lado, o verbo dizer se complementa
com uma oração substantiva objetiva direta, que emna terra da parte do meodia ha hũa
palma [...]. Nesse fragmento, excepcionalmente, é encontrada uma oração adjetiva, que
chamam Plynio, intercalada entre diz e seu complemento oracional, o que não é comum.

(24) A sabedorya celestrial he asy como a agua que uem do ceeo pello canal dos
liuros, onde diz ella de sy meesma (falando)pella boca do sabedor: Eu assy
como o cano da agua saay do parayso. Cõuem a saber viindo pella scriptura dos
liuros, ca pello cano da sabedoria celestrial se alinpam as çugidades dos
peccados, [...].
(Orto do esposo, livro 3 cap 3, fólio 18r, grifo nosso)

Semelhante ao fragmento (24) há mais ainda três fragmentos representados pela


simbologia “U ONDE DIZ Ʉ”. Significa dizer que onde possui ligação sintática com
elemento anterior, trata-se do sintagma a sabedorya celestrial. De outro lado, ao que se
refere à complementarização do verbo dizer, esse subgrupo se caracteriza ainda pela
falta da conjunção integrante e pelo uso do sinal de dois pontos, ou seja, é utilizada a
oração encaixada para desempenhar aquela função, tal qual ocorre em (24). Não se pode
deixar de notar também a introdução da oração reduzida, (falando)pella boca do
sabedor, reconhecidamente atípica.

(25) E pera esquyvar este pecado da vaam gloria, tambem he boo remedio nom
fallar, screver ou dar aazo que se falle sem boo fundamento perante nos em
nossos proprios feitos. E nas cousas feitas com entençom de virtude, conssiirar
aquella pallavra de Davyd onde diz que o senhor quebrantará os ossos daquelles
que fazem seus feitos principalmente por prazerem aos homẽẽs, mostrandonos
que nom leixemos a nos meesmos fazer cousa que seja com proposito da vãã
gloria.
(Leal conselheiro, título 12, fólio 15r, grifo nosso)
50

O fragmento (25) é representante exclusivo desse subgrupo de símbolo “U ONDE


DIZ U”. Verifica-se que onde retoma aquella pallavra de Davyd , assim como o verbo
dizer é complementado por que o senhor quebrantará os ossos daquelles [...]. Portanto,
esse fragmento mantém fortes relações anteriores e posteriores a onde [diz], devido a
esses elementos conservarem suas características mais prototípicas.

Haja vista a distribuição acima descrita, a seção de análise se subdivide,


considerando o critério função em: (4.1) (+) locativo; (4.2) (+/-) locativo; (4.3) (-)
locativo. Em paralelo a essa análise, apresentam-se comentários a respeito dos critérios
forma e integração, demonstrados respectivamente nas Tabelas 2 e 3, anteriormente
referidas.

4.1 Tipo (+) locativo (+) textual

Neste tipo, destacam-se apenas três fragmentos, ou seja, o menor conjunto de


padrões de uso de onde diz, representados pelo traço (+) locativo do elemento onde.
Esses exemplares possuem relevância qualitativa ao ilustrar o ponto inicial da
gramaticalidade de onde diz. Vejam-se os fragmentos (26) e (27), que seguem:

(26) Ca a palaura da Sancta Scriptura da saude aas jnfirmidades da alma, onde


diz o propheta Dauid: Emviou o Senhor Deus a sua palaura e deu-lhe saude.
[...].
(Orto do esposo, livro 2 cap 9, fólio 11v, grifo nosso)

No fragmento (26), pertencente ao subgrupo U ONDE DIZ Ʉ, onde exerce sua


função mais prototípica, se comportando genericamente ao agregar funções adverbiais e
funções relativas (= na qual). Esse comportamento é revelado na sintaxe, no que onde
retoma a palaura da Sancta Scriptura, ou seja, faz referência a um local no texto em
que o propheta Dauid, sujeito do verbo dizer, traz uma informação.
Diferentemente ocorre com a cláusula posterior, pois o verbo dizer não possui
complemento sintático, visto que não há conjunção integrante que faça a ligação entre
este verbo e a oração que o complementa. Onde e diz ainda não formam um todo de
sentido único, conservando suas características individuais no nível lexical. Portanto,
aqui se destaca o quadro de referência mais concreto desta pesquisa.
De igual modo ocorre em (27):
51

(27) E pera esquyvar este pecado da vaam gloria, tambem he boo remedio nom
fallar, screver ou dar aazo que se falle sem boo fundamento perante nos em
nossos proprios feitos. E nas cousas feitas com entençom de virtude, conssiirar
aquella pallavra de Davyd onde diz que o senhor quebrantará os ossos daquelles
que fazem seus feitos principalmente por prazerem aos homẽẽs, mostrandonos
que nom leixemos a nos meesmos fazer cousa que seja com proposito da vãã
gloria.

(Leal conselheiro, título 12, fólio 15r, grifo nosso)

Nesse fragmento, observa-se que onde articula referência anafórica, que retoma
o sintagma aquela palavra de David, confirmando, em termos semânticos, tendência
locativa. Sintaticamente, aquela palavra de David é o sujeito do verbo dizer que, por
sua vez, se complementa com oração na função sintática de objeto direto, ou seja, no
que tange ao critério integração, esse fragmento está inserido no subgrupo U ONDE DIZ U.
Ambos os fragmentos apresentam o traço (+) locativo (+) textual e não podem
ser retirados de suas funções sem prejuízo para o entendimento, embora, à primeira
vista, o onde diz se mostre semelhante ao evidencial pesquisado.

4.2 Tipo (+/-) locativo (+) textual

Essa função conta com 16 exemplares do total de 105 ocorrências. Nesse nível
intermediário, há ocorrência de SAdv46. Nos fragmentos (28) e (29), a posição do SAdv
é posposta ao verbo dicěndi:

(28) E assy bem parece que o fruyto da Sancta Scriptura he muy deleytoso,
onde diz Salamõ ẽno Cantar do Amor: E o seu fruyto he doce ao meu
gorgomillo.
(Orto do esposo, livro 2 cap 7, fólio 11r, grifo nosso)

Nessa tipologia intermediária, que o fragmento (28) ilustra, é possível observar


a relativa independência sintático-semântica da cláusula onde diz Salamõ ẽno Cantar
do Amor em relação aos seus argumentos anterior e posterior, ora auxiliada pelos sinais

46
Sintagma adverbial.
52

gráficos vírgula e dois pontos. Tal independência é perceptível ao retirar-se aquela


cláusula sem prejuízo sintático-semântico para os discursos 1 e 2. Sintaticamente,
Salamõ poderia ser considerado o sujeito do verbo dizer, entretanto se comporta de
modo mais genérico, como a origem da informação relatada.
Embora a função textual esteja incrementada, a função locativa não é
abandonada. O onde produz referência catafórica, verificada na sua ligação com ẽno
Cantar do Amor, o que é traço de sua função mais prototípica, a adverbial.
O fragmento (29) também registra o formato onde diz [SN] + [SAdv]:

(29) E asy achou Sam Jheronimo ẽna Sancta Escriptura a mirra da mortificaçom
da sua carnẽ e as outras uirtudes, [...], e husou dellas pella graça de Deus, onde
diz Salamõ ẽno Cantar do Amor, falando pello Spiritu Sancto em persoa do
esposo Jhesu Christo aa esposa: Oo, minha jrmãã e minha esposa, eu vĩĩ ẽno
meu orto e mesturey a minha mirra con as minhas especias de bõõ odor.
(Orto do esposo, livro 2 cap 4, fólio 8v, grifo nosso)

O fragmento (29) se diferencia de seu antecessor pelo acréscimo de outro


componente à cláusula, a qual pode ser assim representada: onde diz [SN] +
[SAdv]+[OAdvRedGer]47. Os fragmentos (28) e (29) são semelhantes, devido ao
reforço igualmente produzido por ẽno Cantar do Amor em ambos os fragmentos. No
entanto, o fragmento (29) possui diferencial, por conta da inserção de falando pello
Spiritu Sancto em persoa do esposo Jhesu Christo aa esposa. Essa oração acentua o
efeito persuasivo não apenas sobre o onde diz, mas sobre todo o contexto
argumentativo, ao fazer uso de referências a personalidades do mais alto aceite cristão,
o Spiritu Sancto e Jhesu Christo.

Por fim, nesse mesmo fragmento (29), onde diz é separado do discurso anterior e
posterior e integrado a sua própria cláusula em função evidencial. Do mesmo modo que
em (28), exerce referência catafórica sobre o ẽno Cantar do Amor, o que destaca sua
tendência ainda locativa. Salamõ faz vezes de origem indireta da informação.

Neste grupo de tendência (+/-) locativa (+) textual, foi encontrado um dado em
que o SAdv se situa em meio a onde e a diz, o que acarreta desconexão desses
elementos, mas não o apagamento da função evidencial. Veja-se o fragmento (30):

47
Oração adverbial reduzida de gerúndio.
53

(30) E per que maneira poderia seer sôo aquela a que eram presentes tantos
livros, arcângeos e profetas? E onde Sam Gabriel, que a soía de visitar,
sobrechegou? [Em a cela]. Onde em outra parte diz Jerónimo: “Teerás cela
em que nom caiba outrem senom tu soo; mas não serás soo [...]
(O livro de vita Christi, p.65, grifo nosso)

Em (30), o onde adverbial é enfatizado pelo sintagma em outra parte, o que


reitera a sua função prototípica e produz movimento catafórico. Embora a função (+/-)
locativa se destaque, a função (+) textual não passa despercebida, devido ao efeito de
independência da cláusula (onde em outra parte diz Jerónimo) em relação ao argumento
anterior e posterior. A posição do sujeito permanece posposta ao verbo dizer, conforme
o padrão pesquisado.

4.3 Tipo (-) locativo (+) textual

Até aqui foram mostrados os níveis mais locativos dos dados levantados no
corpus desta pesquisa, agora se destacam os classificados como (-) locativos (+)
textuais, isto é, aqueles localizados no ponto mais avançado de gramaticalidade, em que
prepondera a função evidencial. Esse grupo registra 86 ocorrências do total de 105, ou
seja, 86% dos dados se situam no ponto mais alto de convencionalização de onde diz no
corpus. Nesse ponto, os elementos onde e diz estão altamente integrados, conforme os
fragmentos (31) e (32) que seguem:

(31) [...] e as treevas nom o compreenderom, porque os pecadores nom


conseguirom aquesta luz, nom por defeito da luz, mas por míngua sua deles.
Onde diz Agustinho: “Assi como o homem cego, posto ao sol, presente é a El a
luz do sol, mas el nom presente ao sol, [...].
(O livro de vita Christi, p.35, grifo nosso)

(32) Zacarias, consiirando a sterilidade da molher e a velhice de ambos, nom o


creeo, e por êsto foi mudo atees o tempo do parto, significando que, já viindo
Cristo, a lei e as profecias seriam compridas e cessariam, calando-se. Onde diz
Sam Crisóstomo: “Portanto Zacarias, sacerdote dos Judeus, foi mudo, porque já
convém cessar e calarem-se os sacrifícios que por os pecados do pôobo
ofereciam [...]
(O livro de vita Christi, p. 57-59, grifo nosso)
54

Observa-se que, tanto (31) quanto (32) estruturam-se no molde: discurso1 +


onde diz [SN] + discurso2, em que os argumentos 1 e 2 se complementam e
desenvolvem o mesmo tema. Em (31), têm-se as palavras: trevas, cego, luz, sol, em
ambos os argumentos. De modo semelhante ocorre em (32) com os termos: calar,
mudo, cessar, nos discursos anterior e posterior. Percebe-se que, o onde diz é uma
pequena parte de um grande contexto discursivo utilizado para fazer o leitor a agir de
determinado modo.
O uso reiterado de onde diz está associado a um contexto específico, no qual
preponderam persuasão48 e sedução49, como ilustrada em (31) e (32). A insistência
nesse formato revela a (inter)subjetividade do locutor/escritor, que organiza seu texto
em função de determinados propósitos comunicativos, no caso específico, trata-se de
estratégia evidencial, voltada para o convencimento do leitor.
Considerando o grau de gramaticalidade encontrado em (31) e (32), o onde diz
[SN] se configura como uma oração matriz separada sintático-semanticamente do
discurso anterior e do discurso posterior, exercendo função correspondente a operador
de evidencialidade. Tal é comprovado através da retirada do onde diz [SN]. Nesse caso,
os discursos 1 e 2 ainda seriam entendidos e compreendidos, assim como,
sintaticamente, não estaria faltando nenhum elemento estrutural em sua organização e
ordenação. Passível de destaque é a redundância no tema, tendo em vista a repetição
dos sintagmas.
Ao selecionar e reiterar positivamente as palavras de Jesus Cristo, Espírito
Santo, Salomão, apóstolos ou santos (enunciador2), colocando-os como fonte de

48
Persuasão consiste em tentar convencer o outro usando uma retórica que não seja obrigatoriamente
lógica, mas que tenha uma força argumentativa, ou seja, os argumentos devem ser válidos para esse tu em
particular segundo suas próprias referências e interesses, considerando que as apreciações do absoluto e
da evidência são sempre relativas a uma relação/situação particular e por isso, subjetivas”. (Charaudeau,
s/d, p. 2, tradução livre do original “Persuasión consiste en intentar convencer al outro usando una
retórica que no sea obligatoriamente lógica sino que tenga una fuerza augumentativa, [...]. O sea que los
argumentos que se usan sean válidos para este tú en particular [...], según sus proprias referencias, sus
próprios interesses. [...] las apriencias de lo absoluto y de la evidencia, es siempre relativa a uma situación
y a uma relación particular, y por ende es subjetiva”).
49
“A sedução não é tão rigorosa quanto ao que concerne à razão. Apenas lhe interessa tocar na emção do
interlocutor e fazer-lhe aderir a sua visão de mundo por força de seus valores afetivos, considerando que a
estrutura afetiva dos indivíduos tem sempre uma base social na medida em que passa sempre por
representações sociais coletivas” (Charaudeau, s/d, p. 2, tradução livre do original “Seducción no se toma
la moléstia de mostrarse muy rigurosa en cuanto a todo lo que concierne la razón. Sólo le interesa tocar la
emoción del interlocutor y hacerle adherirse a su visión del mundo por la fuerza de unos valores
afectivos. [...]. La estructura afectiva de los indivíduos tiene siempre uma base social em la medida que
pasa siempre por representaciones sociales colectivas”).
55

informação indireta relatada (evidencial), o escritor (enunciador1) revela que conhece o


assunto e indiretamente que aprova as palavras do segundo enunciador, isso o torna
legítimo para falar sobre os temas, que são, de modo geral, relacionados à fé e à retidão
de caráter. E ainda, o enunciador1, ao se dirigir aos temas de modo favorável, expressa
indiretamente sua própria fé e retidão de caráter, ou seja, torna-se autoridade para
realizar o que anuncia. De modo geral, os textos integrantes do corpus são práticas de
legitimidade50, credibilidade51.
Tendo em vista que (1) o corpus trabalhado é representativo de uma sincronia
inserida em contexto histórico específico (séculos XIV-XV); (2) seus autores fazem
parte do clero ou da burguesia, considerados autores hábeis e letrados de sua época; (3)
a reincidência no uso de onde diz do tipo evidencial é expressiva, pode-se afirmar que
onde diz (+) textual é uma manifestação linguística integrante de Tradição Discursiva da
fase arcaica da língua. Trata-se, portanto, de uma forma retórica específica de
determinados ambientes pragmático-discursivos, de uso cumpridor de funções
comunicativas mais específicas de uma época, para propósitos também mais
específicos.

Também fazem parte desse quadro (-) locativo (+) textual, outras formas
correspondentes. Uma delas é ilustrada a seguir:

(33) Mais, [...], a[s] Sanctas Escripturas emsinã o entendimẽto da mẽte e da alma
do homẽ e tiran-no das uaydades do mũdo e reduzẽ-no ao amor do Senhor Deus,
onde diz Sam Jheronimo que aquelle que nõ sabe a[s] sanctas leteras, este tal
nõ sabe leteras.

(Orto do esposo, livro 1, cap. 0, fólio 80r, grifo nosso)

50
“Legitimidade é o estado ou qualidade de quem está fundamentado em falar ou agir como o faz, em
nome de algo. É o mecanismo pelo qual alguém é legitimado, é o mecanismo de reconhecimento de um
sujeito por outros sujeitos em nome de um valor aceito por todos” (Charaudeau, s/d, p.1, tradução livre do
original “La ‘legitimidad’ es el estado o cualidad del que está fundamentado em hablar o actuar como lo
hace, em nombre de algo [...]. El mecanismo por el cual uno es legitimado, es el mecanismo de
reconocimiento de um sujeto por otros sujetos em nombre de um valor aceptado por todos [...].”)
51
“A credibilidade, ao contrário, é construída pelo próprio sujeito. É o sujeito que, preocupado em ser
considerado como alguém digno de fé, constrói uma imagem de si mesmo que garanta sua capacidade de
dizer a verdade e de poder realizar concretamente o que anuncia ou promete.” (Charaudeau, s/d, p.1,
tradução livre do original “La ‘credibilidad’, en cambio, es construída por le sujeto mismo. Es el sujeto
que, preocupado por la cuestión de ser considerado como alguién digno de fe, se construye uma imagen
de si mismo que garantice su capacidad em decir la verdad y em poder realizar concretamente lo que
anuncia o promete”).
56

Diferentemente de (31) e (32), o fragmento (33) mostra o onde diz independente


do argumento anterior, mas com ligações sintático-semânticas com o argumento
posterior, com quem compartilha a conjunção integrante que. Nesse sentido, reiteramos
as informações da Tabela 3 que apresenta mais outras 10 ocorrências semelhantes a
essa.
Nesse estágio mais avançado de gramaticalidade, ou seja, (-) locativo (+) textual,
verifica-se outro tipo de configuração estrutural, sem a presença do elemento verbal.
Neste grupo, o destaque é a erosão do verbo dicěndi, o que resulta no onde como
responsável por todo o conjunto evidencial, conforme os fragmentos (34) e (35) que
seguem:

(34) [...] per ojeito ou entrepoimento do corpo vivificado possas sofrer a


presença da majestade e sofrer a luz que o homem nom pode compreender nem
seer chegado a ela, assi como o sol se encobre a nós com algũa nuvem ou
cobrimento quando com a vista o nom podemos veer. Onde Bernardo: “Porque
Deus Spíritu é e nós carne, a soombra do seu corpo se temperou a nós, por que
per ojeito e antreposiçom da carne vivificada [...]”.

(O livro de vita Christi, p.73, grifo nosso)

(35) E teemos desto semelhança em três que vestem uũ de si mesmos, dos


quaaes se pode dizer que todos juntamente fazem ũa obra e aquêlo que faz uũ faz
o outro, e nom é porém vestido senom uũ. Onde Agustinho: “Quaaesquer obras
de cada ũa das pessoas da Trindade, a Trindade as obra e faz, e a qualquer que
obra, as outras duas pessoas ajudam. [...]”

(O livro de vita Christi, p. 75, grifo nosso)

Como os demais fragmentos (-) locativos (+) textuais, o evidencial de base onde
[SN] não participa da configuração sintático-oracional do fragmento em que está
inserido, embora os argumentos anterior e posterior, tanto em (34) quanto em (35),
desenvolvam a mesma temática. No fragmento (34) tem-se corpo, carne e sombra em
ambos os argumentos, o mesmo acontece em (35), com obra e Trindade. Nessa
tipologia de estrutura diferenciada (sem verbo), que conta com 35 ocorrências, a
ausência do elemento verbal não prejudica a função evidencial, ou seja, Onde Bernardo
57

e Onde Agustinho assumem a função desempenhada por onde diz [SN]. Na estrutura
mais usual de três elementos, o sintagma nominal é facilmente confundido com o
sujeito da cláusula, agora com a ausência verbal não mais, Bernardo e Agustinho são,
efetivamente, a fonte da informação.

Em se tratando das possibilidades do critério com verbo (conforme Tabela 2), há


um quantitativo de 7% em que são encontradas diferenças de singular-plural, presente-
passado e voz nominal em relação ao modelo recorrentemente encontrado em 60% dos
casos, ou seja, o verbo dizer na 3ª pessoa do singular do presente do indicativo. Tendo
em vista a trajetória de abstratização espaço > texto, bem como o discreto volume
mencionado para o critério com verbo de distintos dicěndi, é possível afirmar que o
comportamento formal indicado é superficial, correspondente a pontos diferentes da
trajetória de gramaticalidade, em que prevalece a função de operador de
evidencialidade. Observem-se os fragmentos (36), (37) e (38):

(36) [...] nom há i cousa que assi possa desordenar nossa vida como nom curar
de fazer boas obras e poê-las em trespasso sempre. Êsto é o que muitas vezes
nos faz caer de tôdolos beẽs. Onde disse uũ [saibo] que a boa obra nunca se
deve perlongar, por tal que nom venha alguũ acontecimento [...]
(O livro de vita Christi, p.89, grifo nosso)

Onde disse, conforme encontrado acima, também se inclui na tipologia (-)


locativo (+) textual, embora o verbo não tenha mantido o padrão pesquisado.
Sintaticamente, em um primeiro momento, uũ [saibo] é considerado sujeito em
posição posposta ao verbo, mas tendo em vista a integração entre os elementos que
compõem o evidencial, uũ [saibo] pode ser considerado também como fonte da
informação. A opção em utilizar artigo indeterminado pode sinalizar estratégia do
enunciador1 por não querer ou não poder especificar tal sábio. Onde disse [SN] é
separado do argumento anterior e unido ao posterior, com quem compartilha o elemento
que. O mesmo ocorre com o fragmento (37), que segue:

(37) E o nosso hũguentayro e buticayro Jhesu Christo ueo asy como piadoso
[fisico] aos enfermos pera os auiuẽtar, e porẽm entrou emno castello da sancta
jgreya, em que mora a sabedoria da Sancta Escriptura, que em outro tempo foy
chagada mais agora he ya sãã. Onde dizem os poetas que que Apollo cauou hũa
fonte emno seu orto, que, quando viinha o sol, era feyta tam frya, que a nõ
58

podiam beuer, mais, depois que se poynha o sol, aqueecia em tal maneyra que
aadur podya o homẽ teer as mããos em ella.

(Orto do esposo, livro 3 cap 1, fólio 17r, grifo nosso)

Do mesmo modo que o fragmento anterior, onde dizem [SN] pertence ao molde
(-) locativo (+) textual, confirmando a abstratização e a semântica evidencial.
Sintaticamente, o verbo no plural acompanha os poetas, o que desafia o apontamento de
seu status categorial. Trata-se de sujeito ou fonte de informação? A opção pelo uso do
substantivo comum no plural também pode recair na estratégia do enunciador1 de não
querer, não poder, ou mesmo não saber especificar esses poetas. Essa estratégia faz
extravasar do texto certa insegurança no que tange à veracidade da informação elencada
por tais poetas (enunciador2), bem como à possível credibilidade almejada pelo
enunciador1.

Observe-se o fragmento (34):

(38) [...] Santa Maria foi posta em perplexidade ou em maneira de abalamento,


porque, [...] nem devia nom creer ao ângeo, nem devia usurpar as cousas de
Deus nèiciamente. Onde, querendo ela certificar-se d[e] outra cousa, preguntou
por a maneira da concepçom, dizendo: “Como se fará êsto, scil., que tu
prometes, que eu parirei filho? [...]
(Vita Christi, p.71-73, grifo nosso)

Apesar de duas orações estarem inseridas entre o onde e o dizendo, a semântica é


(-) locativa (+) textual de tendência evidencial. O verbo dizer utilizado na forma
nominal de gerúndio é fortalecido por preguntou, também verbo de elocução. Nesse
caso, o preguntou poderia ter assumido as funções de dizer, mas não o fez,
possivelmente em razão de o último verbo ser mais recorrente nesta função. Importante
salientar que apenas esse fragmento possui tais características, representativas de um
ponto na trajetória de gramaticalidade em que a morfologia foi suplantada pela
semântica, talvez em direção ao desaperecimento dessa expressão.
59

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este trabalho volta-se à análise qualitativa de onde diz, expressão encontrada


hodiernamente apenas em sentido espacial, mas que, há alguns séculos cumpriu
trajetória espaço > texto. Onde diz, em função textual, é encontrado de modo recorrente
em textos portugueses específicos do período arcaico da nossa língua, textos esses
formadores do nosso corpus de pesquisa.

Da observação do objeto de estudo, identificamos o traço (+) textual associado a


três nuances que compõem a trajetória de gramaticalidade de onde diz, são elas: (+)
locativo, (+/-) locativo e (-) locativo. Relevantes também para esta pesquisa foram os
aspectos forma e integração. Portanto, as análises partem de três fatores distintos, mas
não independentes.

O emprego preferido de onde diz está em fragmentos de função (-) locativa,


seguida da função (+/-) locativa. Nesse contexto mais discursivo, há maior emprego da
forma verbal diz, o que resulta em onde diz. Na sequência desse quantitativo, há a forma
com ausência verbal, obtendo-se onde [Ø].

Nessa linha, também observamos que a função discursiva está associada à alta
integração dos elementos onde + diz, como também à separação sintática dessa
expressão de seus argumentos anterior e posterior, ou seja, quanto mais discursivo, mais
integrado entre si e mais separado dos demais elementos do contexto discursivo
(discurso 1 e discurso 2). A partir da seleção, posicionamento e contexto discursivo
supracitados de onde diz, constatamos a ação de forças discursivas e cognitivas
atinentes a (inter)subjetividade e inferência sugerida (Traugott e Dasher, 2005).

Verificamos que o uso de onde diz em contexto discursivo está associado a


determinados enunciadores pertencentes à classe social específica, em época marcada
por tensões político-religiosas. A essas informações, podemos acrescentar ainda que
onde diz com função textual é utilizado no molde discurso1 + onde diz [SN] +
discurso2, em que o último argumento dá suporte/evidencia/confirma o primeiro, na
maioria das vezes, fazendo uso de mesmos lexemas ou de seus sinônimos.

Do disposto acima, concluimos que onde diz integra estratégia de


persuasão/sedução, utilizada para fins específicos com ocorrência de repetição, no
60

mesmo e em diferentes textos, compondo ambientes textuais semelhantes no período


arcaico da língua, o que confirma onde diz pertencer ao quadro de Tradições
Discursivas (Kabatek, 2004). Dessa forma, podemos entender que o uso arcaico de onde
diz discursivo cessou, provavelmente, cedendo lugar a outras estratégias de articulação
de evidencialidade na língua.

Tendo em vista o corpus restrito e o recorte temporal sincrônico, não nos


precipitaremos sobre gramaticalização de onde diz. Podemos afirmar, no entanto, que
onde diz destituiu-se de suas características individuais prototípicas e se readaptou como
expressão, em função diversa de sua ocorrência espacial original. Dessa forma,
admitimos o cline de gramaticalidade espacial > textual (Batoréo, 2000). O ponto mais
concreto desse processo é representado por (+) locativo e o ponto mais abstrato por (-)
locativo, desse último fazem parte onde diz e onde, ambos (+) textuais.

Ainkhenvald (2006) e Barnes (1984) associam estudos de evidencialidade à


gramaticalização, embora a evidencialidade em línguas diversas se manifeste de modo
lexical ou gramatical. No PB, a evidencialidade se manisfesta em molde lexical.
Concluimos que a trajetória de abstratização de onde diz está associada à função
evidencial, ou seja, essa expressão funciona, nos casos específicos do português arcaico
aqui pesquisados, como indicadora de autoria relatada indireta. Onde diz tem indícios de
gramaticalidade na vinculação de seus constituintes internos e na abstratização de seu
sentido, que se torna uno.

Diante desses resultados, concluímos que onde diz, tal qual utilizado no
português arcaico, é altamente funcional, motivado por evidencialidade e Tradições
Discursivas. Os resultados desta pesquisa não se esgotam aqui e ensejam
aprofundamentos.
61

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ANEXOS

(1) [...] terras onde sse partio porque sõ já caentes. E esto he o que diz o propheta Isayas
en pessoa de Nostro Senhor, queyxando-sse do seu poboo de Israel hu diz: a tôrtor e a
andorĩha e a cegoonha conhoceron o tẽpo dassa viinda, [...]. (Livro das aves, p. 36, grifo
nosso)

FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

– LOCATIVO + TEXTUAL DIZ U ONDE DIZ Ʉ

(2) [...] o coraçõ do homen previsto faze-sse sabedor e arteyro que se guarde do laço que
lhi põẽ e armã na carreyra. Onde diz o outor que son três laços. (Livro das aves, p. 44, grifo
nosso)

FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

– LOCATIVO + TEXTUAL DIZ Ʉ ONDE DIZ U

(3) E pera esquyvar este pecado da vaam gloria, tambem he boo remedio nom fallar,
screver ou dar aazo que se falle sem boo fundamento perante nos em nossos proprios
feitos. E nas cousas feitas com entençom de virtude, conssiirar aquella pallavra de
Davyd onde diz que o senhor quebrantará os ossos daquelles que fazem seus feitos
principalmente por prazerem aos homẽẽs, mostrandonos que nom leixemos a nos
meesmos fazer cousa que seja com proposito da vãã gloria. (Leal conselheiro, título 12, fólio
15r, grifo nosso)

FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

+ LOCATIVO -TEXTUAL DIZ U ONDE DIZ U

(4) [...]. Mais, segundo diz Sancto Ysidro, a[s] Sanctas Escripturas emsinã o
entendimẽto da mẽte e da alma do homẽ e tiran-no das uaydades do mũdo e reduzẽ-no
ao amor do Senhor Deus, onde diz Sam Jheronimo que aquelle que nõ sabe a[s] sanctas
leteras, este tal nõ sabe leteras. (Orto do esposo, livro 1, cap 0, fólio 80r, grifo nosso)
FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

– LOCATIVO + TEXTUAL DIZ Ʉ ONDE DIZ U

(5) [...] porque nõ ouuerõ a sabedoria, morrerõ e per[e]cerom polla sua neicidade. Onde
diz Salamõ: Vãão he todo homẽẽ que nõ he a sciencia de Deus. (Orto do esposo, livro1, cap
0, fólio 80r, grifo nosso)

FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO


68

– LOCATIVO + TEXTUAL DIZ Ʉ ONDE DIZ Ʉ

(6) [...] o seu nome glorioso deue seer chamado ẽ começo de toda boa obra, e ẽno seu
sancto nome deue o homẽ de fazer toda cousa, onde diz o apostolo: Jrmããos, qualquer
cousa que fezerdes, todo fazede ẽ nome do Senhor Jhesu Christo, [...]. (Orto do esposo,
livro 1, cap 1, fólio 2v grifo nosso)

FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

- LOCATIVO + TEXTUAL DIZ Ʉ ONDE DIZ Ʉ

(7 e 8) [...]. E porẽ ẽno começo desta obra puge o nome de Jhesu Christo, e ẽno seu
nome a comecey, o qual nome he muy delectoso, onde diz Jhesu, filho de Sirac: Asi
como o mel seera doce a renebrãça delle, convem a saber do nome que he Jhesu, que
quer dizer saude. Onde diz Sam Lucas ẽnos Autos dos Apostolos que nõ ha hi saude ẽ
outro nehũũ sẽnõ em Jhesu Christo. (Orto do esposo, livro 1, cap 1, fólio 2v, grifo nosso).
FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

+/- LOCATIVO + TEXTUAL DIZ Ʉ ONDE DIZ Ʉ

FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

+/– LOCATIVO + TEXTUAL DIZ Ʉ ONDE DIZ U

(9) E este nome tragia Sam Paulo por candea ante os gentiis e ante os reis, onde diz
Sam Bernardo: Rogo-te que me digas donde ueeo tanta lux de fe ẽno mũdo sẽnõ do
nome de Jhesu Christo preegado. (Orto do esposo, livro 1, cap 1, fólio 2v, grifo nosso).
FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

– LOCATIVO + TEXTUAL DIZ Ʉ ONDE DIZ Ʉ

(10) [...]. Outrosy, este nome Jhesu he manyar, onde diz Sam Bernardo: Dy tu, homẽ!
Per uẽtura nõ recebes tu conforto quantas uezes te lenbras deste nome Jhesu? Certo sy.
(Orto do esposo, livro 1, cap 2, fólio 3v, grifo nosso)

FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

– LOCATIVO + TEXTUAL DIZ Ʉ ONDE DIZ Ʉ

(11) [...]. O nome Jhesu he meezinha, onde diz Sam Bernardo: Se algũũ de uos he
triste, uenha-uos ao coraçom Jhesu, e do coraçom salte emna boca, e, tanto que nacer
este nome e~no coraçom e ẽna boca, logo o lume dele afastara e derramara toda cousa
69

escura e triste e fara toda cousa clara e lomeosa. (Orto do esposo, livro 1, cap 3, fólio 4r, grifo
nosso)

FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

– LOCATIVO + TEXTUAL DIZ Ʉ ONDE DIZ Ʉ

(12) O seu nome sera chamado marauilhoso. Outrossy, este nome Jhesu he muyto pera
louuar, porque he grande, onde diz o propheta Malachias: O meu nome he grande ẽnas
gentes, dise o Senhor. (Orto do esposo, livro 1, cap 4, fólio 4v, grifo nosso)
FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

– LOCATIVO + TEXTUAL DIZ Ʉ ONDE DIZ Ʉ

(13) Outrossy, este nome Jhesu he espantoso, porque ha en sy poderio e dereytura, e


porẽm aquelles que som direytos ama~ Jhesu Christo, onde diz Salamõ ẽnos Cantares
do Amor, falando do esposo Jhesu Christo: Os que som direitos amam ty. (Orto do
esposo, livro 1, cap 4, fólio 5r, grifo nosso)

FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

+/– LOCATIVO + TEXTUAL DIZ Ʉ ONDE DIZ Ʉ

(14) [...], a uirtude deste nome Jhesu he de grande alteza e de grande excelencia, onde
diz Sam Bernardo: O nome do Saluador he nome de meu jrmãão e da minha carnẽ e do
meu sangue, nome marauilhoso. [...] (Orto do esposo, livro 1, cap 5, fólio 5v, grifo nosso)
FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

– LOCATIVO + TEXTUAL DIZ Ʉ ONDE DIZ Ʉ

(15) [...]. Este nome Jhesu subjuga todallas cousas, onde diz o apostolo: Eẽno nome de
Jhesu todo geolho se ĩclinẽ das cousas celestiaes, terreaaes e emfernaaes. (Orto do esposo,
livro 1, cap 5, fólio 5v, grifo nosso)

FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

– LOCATIVO + TEXTUAL DIZ Ʉ ONDE DIZ Ʉ

(16) [...], ẽ este tempo derredeyro, soom ẽçuyada e fea e corrupta e chea de desonrra
pellos maaos prelados, e porẽ pareço asy podre da parte de tras. Onde diz o propheta,
falando da egreya militante: A prata della tornada he em escoyra, e tirada he toda
fremusura da filha de Syom; per que se entende a egreya militante. (Orto do esposo, livro 2
cap 3, fólio 7v, grifo nosso)

FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

– LOCATIVO + TEXTUAL DIZ Ʉ ONDE DIZ Ʉ


70

(17) Todas estas especias acha o homẽ ẽno orto da Sancta Escriptura e todalas outras
especias de uirtudes que som pera saude e meezinha e cõforto das almas, onde diz
Salamõ ẽno Cantar do Amor, falando ẽ pesoa da esposa: O meu amado descendeo ẽno
seu orto aas leiras das especias. (Orto do esposo, livro 2 cap 4, fólio 8r, grifo nosso)

FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

+/– LOCATIVO + TEXTUAL DIZ Ʉ ONDE DIZ Ʉ

(18) E asy achou Sam Jheronimo ẽna Sancta Escriptura a mirra da mortificaçom da sua
carnẽ e as outras uirtudes, [...], e husou dellas pella graça de Deus, onde diz Salamõ
ẽno Cantar do Amor, falando pello Spiritu Sancto em persoa do esposo Jhesu Christo
aa esposa: Oo, minha jrmãã e minha esposa, eu vĩĩ ẽno meu orto e mesturey a minha
mirra con as minhas especias de bõõ odor. (Orto do esposo, livro 2 cap 4, fólio 8v, grifo nosso)

FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

+/– LOCATIVO + TEXTUAL DIZ Ʉ ONDE DIZ Ʉ

(19) Assy como ho orto do parayso terreal he muyto delectoso com flores muy
fremosas, bem asy ẽno orto da Sancta Scriptura ha muytas flores muy esplandecentes
em sua color, per que ella he conprida de muy preciosos e muy deleytosos odores, onde
diz Salamõ ẽno Cantar do Amor, falando pello Spiritu Sancto en pessoa do esposo:
Flores aparecerõ ẽna nossa terra. (Orto do esposo, livro 2 cap 5, fólio 9r, grifo nosso)
FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

+/– LOCATIVO + TEXTUAL DIZ Ʉ ONDE DIZ Ʉ

(20) E porẽ diz Sam Bernardo que o canpo [da Sancta Scriptura he hũũ ca~po muy]
grande e muy ancho, cheeo de muytos e desuayrados testemunhos de uerdade assy
como de flores fremosas, que dam mantiimẽto e refeyçom aos que per ella leem. Onde
diz Salamõ ẽno Cantar do Amor, falando en pessoa da esposa: Descendeo o meu
amado ẽno seu orto pera pacer ẽnas ortas e colher os lylios. (Orto do esposo, livro 2 cap 5,
fólio 9r, grifo nosso)

FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

+/– LOCATIVO + TEXTUAL DIZ Ʉ ONDE DIZ Ʉ

(21) Asy como ẽno orto do parayso terreal ha muytas aruores muy nobres de muytas
maneyras, bẽẽ assy ẽna Sancta Scriptha há aruores muy fremosas e de grande prazer,
onde diz Jhesu, filho de Syrac: A rrayz da sabedorya he temor do Senhor, e os seus
ramos muyto antygos. E em este orto da Sancta Scriptura he o cedro da esperança das
cousas celestriaes e a olyueira da piedade e a palma da uitoria. (Orto do esposo, livro 2 cap
6, fólio 10r, grifo nosso)

FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO


71

– LOCATIVO + TEXTUAL DIZ Ʉ ONDE DIZ Ʉ

(22) E em meo deste orto he o lenho desta uida, que he Jhesu Christo, que he fim e
perfeiçom da Sancta Escriptura, e todas as outras aruores nobres, uirtuosas e spirituaes,
que ha fazem muy alta e muy deleytosa, onde diz Jhesu, filho de Syrac, falando en
persoa da sabedoria da Sancta Escriptura: Eu soom exalçada como o cedro ẽno monte
de Libano e assy como o acipreste ẽno monte de Syom, e asy como a palma soom
exalçada em Cades e asy como a oliue[i]ra fremosa emnos campos. (Orto do esposo, livro
2 cap 6, fólio 10r, grifo nosso)

FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

– LOCATIVO + TEXTUAL DIZ Ʉ ONDE DIZ Ʉ

(23) A aruor da palma significa a uitoria da ressureyçom dos mortos, ẽ que sera a morte
uẽçuda, assy como diz Sam Paulo: Absoruuda he a morte ẽ uitorya. Onde diz hũũ
filossafo, que chamam Plynio, que emna terra da parte do meodia ha hũa palma que,
quando he tam uelha que seca e podrece, nace outra uez de sy meesma e torna a seer
uerde. (Orto do esposo, livro 2 cap 6, fólio 10r, grifo nosso)

FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

– LOCATIVO + TEXTUAL DIZ Ʉ ONDE DIZ U

(24) [...] e porẽm he dito que a aruor da palma, que significa victoria, nace ẽno orto da
Sancta Scriptura, e as outras aruores, que significam as uirtudes, onde diz Jhesu, filho
de Syrac, falando en pessoa da sabedoria da Sancta Scriptura: Eu asy como a aruor do
terebinto estendi os meus ramos, e os meus ramos som de õrra e de graça. (Orto do
esposo, livro 2 cap 6, fólio 10v, grifo nosso)

FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

– LOCATIVO + TEXTUAL DIZ Ʉ ONDE DIZ Ʉ

(25) Assy como ẽno orto do parayso terreal ha muy saborosos fruytos, bem asy ẽno
orto da Sancta Scriptura ha grande auõdamento de muy dilicados fruytos, onde diz
Salamõ emno Cantar do Amor (falando) ẽ perssoa da esposa ao esposo: Venha o meu
amado ẽno seu orto, por tal que coma os fruytos do[s] seus pomos. (Orto do esposo, livro 2
cap 7, fólio 10v, grifo nosso)

FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

+/– LOCATIVO + TEXTUAL DIZ Ʉ ONDE DIZ Ʉ

(26) [...], ca ẽna Sancta Scriptura acha o homẽ as hũũas da spiritual alegria e os figos da
dulçura perdurauil e as spigas da madureza das boas obras e as nozes da paciencia.
Onde diz Jhesu, filho de Syrac, falando em persoa da sabedoria da Sancta Scriptura:
72

As minhas flores som fruytos de honrra e de onestidade. (Orto do esposo, livro 2 cap 7, fólio
10v, grifo nosso)

FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

– LOCATIVO + TEXTUAL DIZ Ʉ ONDE DIZ Ʉ

(27) E assy bem parece que o fruyto da Sancta Scriptura he muy deleytoso, onde diz
Salamõ ẽno Cantar do Amor: E o seu fruyto he doce ao meu gorgomillo. (Orto do esposo,
livro 2 cap 7, fólio 11r, grifo nosso)

FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

+/– LOCATIVO + TEXTUAL DIZ Ʉ ONDE DIZ Ʉ

(28 e 29) Assy como o orto do parayso terreal recebe em sy muy temperados orualhos,
bem assy o orto da Sancta Scriptura he regado cõ orualhos muy blandos celestriaaes,
que a fazẽ muy auo~dosa e muy fructuosa, onde diz Job: Quẽ he aquel que geerou
stilaçom do orualho? E sobre esto diz Sam Gregorio geerar stilaçom do orualho he
spirar o Senhor Deus a Sancta Scriptura e os sanctos falamẽtos asy como stilamẽtos e
goteyras dorualho, onde diz Moyses: Corra asy como orualho a minha palaura. (Orto do
esposo, livro 2 cap 8, fólio 11r, grifo nosso)

FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

– LOCATIVO + TEXTUAL DIZ Ʉ ONDE DIZ Ʉ

FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

– LOCATIVO + TEXTUAL DIZ Ʉ ONDE DIZ Ʉ

(30 e 31) Assy como ho orto do parayso terreal he muy praziuel cõ muyta uerdura
deruas que sempre ẽ elle som, bem assy ẽno orto da Sancta Scriptura he todo
auõdamẽto de heruas pera meezinhas de toda ẽfirmidade da alma, ca hi ha ho ysope da
linpeza do coraçom e as alfaças montisinhas da amargura da peendença e o nardo da
humildade e todalas outras heruas uirtuosas. Onde diz Salamõ emno Cantar do Amor:
O meu nardo deu blandeza de odor. Ca a palaura da Sancta Scriptura da saude aas
jnfirmidades da alma, onde diz o propheta Dauid: Emviou o Senhor Deus a sua palaura
e deu-lhe saude. [...]. (Orto do esposo, livro 2 cap 9, fólio 11v, grifo nosso)
FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

+/- LOCATIVO + TEXTUAL DIZ Ʉ ONDE DIZ Ʉ

FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

+ LOCATIVO + TEXTUAL DIZ U ONDE DIZ Ʉ


73

(32) Asy como ẽno orto do parayso terreal ventom muy tenperados uẽtos que o fazem
muy tẽperado ẽ boõõs aares, bem asy o orto da Sancta Scriptura he muy praziuel e de
grande saude per muy tenperados ventos que em ella uẽtam muy mãsamente e soplam
muy tẽperadamente, onde diz Salamõ ẽno Cantar do Amor: Leuãta-te, aguiam, e tu,
auegro, vem e sopra ẽno meu orto e correrom as especias delle. Onde sabede que entõ
sopra o uẽto do auegro, que significa o Spiritu Sancto ẽno orto da Sancta Escriptura,
[...]. (Orto do esposo, livro 2 cap 10, fólio 12r, grifo nosso)
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(33) [...] per que os coraçõões dos fiees se estendam mais conpridamente e cõ mayor
feruor pera receber e cõprir a palaura de Deus, e quando a cõciencia escorregadia e a
maa cobiiça he refreada. E entom as especias uirtuosas e de boõõ odor escorrem,
porque aquel fructu que primeyro pendia ẽna aruor, gosta-o o homẽ ẽna obra muy
docemente, Onde diz o propheta Ysaias: Poera o deserto della asy como delectos e o
hermo della asy como o orto do Senhor. (Orto do esposo, livro 2 cap 10, fólio 12v, grifo nosso)
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(34) E aquell que aprender quer a Sancta Escriptura, cõpre-lhe que uiua bem e estude
ameude, onde diz Sancto Agostinho: Erra qualquer que pensa que pode conhocer a
uerdade, se ajnda mal uiue. (Orto do esposo, livro 2 cap 10, fólio 12v, grifo nosso)

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(35) E per estas absteenças e per outras muytas abscondidas e outras obras uirtuosas
pose em obra aquelo que aprendeo cõ o uẽto tẽperado do Spiritu Sancto, onde diz Sam
Jeronimo: Sempre reuolue em tuas mããos as Sanctas Escripturas e cõtinuadamẽte ẽna
tua mente, [...]. (Orto do esposo, livro 2 cap 10, fólio 13r, grifo nosso)
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(36) [...] ẽno orto da Sancta Scriptura ha muy doces soo[n]s e cantares daues que a
fazem muy delectosa, onde diz o propheta Ezechiel: As aues do ceeo cantarõ. (Orto do
esposo, livro 2 cap 11, fólio 13r, grifo nosso)

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(37) E pregũtou o papa ao bispo como soubera tam uerdadeyramente o luguar hu estauõ
aquelles liuros e esconjurou-o que lho dissesse en toda guisa, e o bispo lhe contou todo
cõmo lhe aueera, e dissy leuou os lyuros e foy-sse pera sua terra. E assy podemos
entender que os sanctos doutores cantam muy deleytosos cantares em suas scripturas,
que som muy deseiadoyras de ouuir a toda alma deuota, onde diz Salamõ ẽno Cantar
do Amor: Sooe a tua uoz ẽnas minhas orelhas, ca a tua uoz he doce e a tua face
fremosa, a qual he a herdade ẽnas ortas do amigo. Faze-me ouuir a tua uoz. (Orto do
esposo, livro 2 cap 11, fólio 14r, grifo nosso)

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(38) [...] ẽno orto da Sancta Scriptura ha rios de muy puras e claras auguas, de que he
regada muy auõdosamẽte, onde diz Sam Joham: Do seu uẽtre sayrõ auguas uiuas. (Orto
do esposo, livro 2 cap 12, fólio 14r, grifo nosso)

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(39) Esta he a ciencia dos ryos da Sancta Scriptura, que nacem da fonte que saae do
coraçõ do Padre perdurauil, onde diz o propheta Ysaias: [S]era fonte da qual nõ
falecerõ auguas. (Orto do esposo, livro 2 cap 12, fólio 14v, grifo nosso)
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(40) [...] o orto da Sancta Scriptura he cercado de muy fortes sebes, per que he muy
segura, em tal guisa que nõ emadam nẽ mĩguẽ em ella. Onde diz Sam Joham ẽno
Apocalissy: Se alguẽ posser sobre esto, apoera Deus sobre elle as plaguas scriptas em
este liuro, [...]. (Orto do esposo, livro 2 cap 13, fólio 15r, grifo nosso)

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(41) E ueerom muitos males e grandes destruyme~tos de mortes e de fogo aa cidade de


Constantinopola por esta nouidade maa que fezerõ aquelles homẽs, emadendo contra a
fe catolica e contra a Sancta Scriptura, que he çarrada e cercada. Onde diz Salamõ ẽno
Cantar do Amor: Orto çarrado he a minha jrmãã, orto çarrado e fonte seelada. (Orto do
esposo, livro 2 cap 13, fólio 15r, grifo nosso)

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(42) E per este edificio tam nobre se entende a sancta jgreya, que he ajuntamẽto dos
fiees, onde diz Sam Joham ẽno Apocalipsi, falando da jgreya: Eu vy a cidade de
Jherusalem, que descendia do ceeo, apostada cõ ouro linpo e ticida con pedras
preciosas, e o guarnimẽto do muro della era de jaspe. (Orto do esposo, livro 3 cap 1, fólio 16v,
grifo nosso)

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+/- LOCATIVO + TEXTUAL DIZ Ʉ ONDE DIZ Ʉ

(43) E porẽm diz Sancto Agostinho: O sangue do fisico foy espargido e foy fecta
meezinha pera o frenetico. Onde diz Jhesu, filho de Syrac: O buticayro fara confeyções
de blandeza e de saude. (Orto do esposo, livro 3 cap 1, fólio 17r, grifo nosso)
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(44) E o nosso hũguentayro e buticayro Jhesu Christo ueo asy como piadoso [fisico]
aos enfermos pera os auiuẽtar, e porẽm entrou emno castello da sancta jgreya, em que
mora a sabedoria da Sancta Escriptura, que em outro tempo foy chagada mais agora he
ya sãã. Onde dizem os poetas que que Apollo cauou hũa fonte emno seu orto, que,
quando viinha o sol, era feyta tam frya, que a nõ podiam beuer, mais, depois que se
poynha o sol, aqueecia em tal maneyra que aadur podya o homẽ teer as mããos em ella.
(Orto do esposo, livro 3 cap 1, fólio 17r, grifo nosso)

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(45) [...] ca a sancta sciencia da theoligia he huũũ pooço tam alto, que poucos podem
tirar a agoa delle sẽnõ com a ajuda da fe, onde diz Jhesu, filho de Syrac: Cheo he, assy
como o ryo, de sabedoria. (Orto do esposo, livro 3 cap 1, fólio 17r, grifo nosso)
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(46) [...]. A Sancta Escriptura contem em sy toda sabedoria, onde diz Sancto Agostinho
que qualquer cousa que o homẽ aprender fora da Sancta Escriptura, se cousa he danossa
que empeeça, aly achara per que seya condẽnada, [e sse cousa he proueytosa], emna
Sancta Escriptura a achara. (Orto do esposo, livro 3 cap 2, fólio 17r, grifo nosso)
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(47) [...] aly achara per que seya condẽnada, [e sse cousa he proueytosa], emna Sancta
Escriptura a achara. E diz outrosy que nõ ha hi leteras que seiam conparadas aos dous
preceptos do Senhor Deus, convem a saber amaras Deus sobre todallas cousas, e o teu
prouximo como ty meesmo, emnos quaaes he toda arte e toda sciencia, ca aly he a
fisyca, ca todallas cousas e as razõões das naturas som em Deus, aly he a filosafia, ca a
boa vida nõ se forma per outra guisa sẽnã amãdo o Senhor Deus, aly he a logica, ca o
lume da alma nõ he sẽnõ Deus, aly he a saude e a mãtẽẽça da prol comunal, ca a cidade
nõ pode seer edificada nẽ guardada sẽnõ per liamẽto da fe. E porẽm todos deuiã studar
e aprender-sse a ella, onde ella meesma diz per Salamõ a todos: Ouuyde-me, ca eu
falarey de grandes cousas, e os meus beyços seeram abertos pera preeguar cousas
dereytas, e o meu paadar pensara uerdade. (Orto do esposo, livro 3 cap 2, fólio 17r, grifo nosso)
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+ LOCATIVO + TEXTUAL DIZ U ONDE DIZ Ʉ

(48) E, assy como a Sancta Escriptura he mais excellente e mais nobre que toda outra
sciencia, bem assy todo aquel que em ella ouuer de studar e per ella leer deue seer mais
perfecto que os que leem e estudam pellas outras sciencias, onde diz meestre Hugo que
aquel que leer polla Sancta Scriptura deue asy studar, em guisa que obre per ella. (Orto
do esposo, livro 3 cap 2, fólio 17v, grifo nosso)

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- LOCATIVO + TEXTUAL DIZ Ʉ ONDE DIZ U

(49) Mais deue home~ studar e leer pella Sancta Escriptura pera seer preste pêra dar
razom da fe a aquelle que lha demãdar e pera destruir os emmiigos da uerdade e que
conheçam mais perfectamẽte o caminho da uerdade e que a ẽsinẽ a aquelles que nõ som
tanto ẽsinados, e en toda guisa conprir per obra aquello que leer, e asy auera a
sabedoria, onde diz Jhesu, filho de Syrac: A aquelles que piadosamente obrã deu o
Senhor Deus a sabedoria, s. da Sancta Scriptura. (Orto do esposo, livro 3, cap 2, fólio 18r, grifo
nosso)

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(50) [...]. A sabedorya celestrial he asy como a agua que uem do ceeo pello canal dos
liuros, onde diz ella de sy meesma (falando)pella boca do sabedor: Eu assy como o
cano da agua saay do parayso. Cõuem a saber viindo pella scriptura dos liuros, ca pello
cano da sabedoria celestrial se alinpam as çugidades dos peccados, [...]. (Orto do esposo,
livro 3 cap 3, fólio 18r, grifo nosso)

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(51) E os liuros das sanctas sciencias conteem em sy o mãyar da alma, que tira a fame da
palaura de Deus, a qual fame tiram as riquezas da Sancta Scriptura, onde diz Salamõ:
Nõ afligera o Senhor Deus a alma do justo cõ fame. (Orto do esposo, livro 3 cap 3, fólio 18r,
grifo nosso)

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- LOCATIVO + TEXTUAL DIZ Ʉ ONDE DIZ Ʉ

(52) E pore~m rey Tholameu fez liures triinta mil judeus, por lhe mãdarẽ mais tostemẽte
de Jherusalem treladadores que lhe treladasem a Sancta Escriptura do Testamento Uelho,
e pose rey Tholameu estes liuros emno seu thesouro, em que auia cinquoẽta mil liuros,
ca a sabedorya he thesouro. Onde diz o sabedor: Eu dixe que as requezas som nehũa
cousa em conparaçom della, nẽ conparey a ella toda [pedra] preciosa, [...]. (Orto do esposo,
livro 3 cap 3, fólio 19r, grifo nosso)

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- LOCATIVO + TEXTUAL DIZ Ʉ ONDE DIZ Ʉ

(53) E outrossy os sanctos liuros som asy como o ca~nal da agoa, em [que] parecem as
jmage~e~s das aues caçadores, e pore~ os sanctos home~e~s se ocupam de leer per elles
pera ueere~ os enganos dos emmiigos, pera se perceberem delles, onde diz Salamo~
e~no Cantar do Amor: Os olhos della - conuem a saber da alma do sancto baro~ - som
assy como de po~o~ba sobre os ryos das agoas, que estam acerca dos rryos muy cheos
dagoa. (Orto do esposo, livro 3 cap 3, fólio 19r, grifo nosso)
FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

+/- LOCATIVO + TEXTUAL DIZ Ʉ ONDE DIZ Ʉ

(54) Depois que el foi em terra, achou os coraço~es tam duros e tam envoltos nos
pecados mortaes, que tam maus lhe eram de tornar a si quam mau seria a u~u~ homem
molentar u~a pedra mui grande. Onde disse el pola boca do seu profeta Davi: “Eu som
selheiro na minha paixam”. (Demanda do Santo Graal, título 60, fólio 20B, grifo nosso)
FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

- LOCATIVO + TEXTUAL DISSE Ʉ ONDE DISSE Ʉ

(55) E, quando a vio decer pola montanha e os ca~es apo´s ela, começou-se a sinar pola
ligeirice que lhe viu. Onde o disse depois em Camaalot a rei Artur que lhe demandava
as novas: – Senhor, quando a seeta sae da beesta nom vai tam toste como a eu vi correr.
(Demanda do Santo Graal, título 101, fólio 31B, grifo nosso)

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- LOCATIVO + TEXTUAL DISSE Ʉ ONDE DISSE Ʉ

(56) “Contigo [é] o princípio, em o dia da tua virtude, nos splendores dos santos; do
ventre, scil., da sustância minha, ante do luzeiro, scil., ante da criaçom do mundo, eu te
geerei”. Onde, quando se diz: “Hoje te geerei”, entende-se do dia da eternidade, que
abrange todo o dia. (O livro de vita Christi, p. 33, grifo nosso)
FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

- LOCATIVO + TEXTUAL DIZ Ʉ ONDE DIZ Ʉ

(57) [...] e as treevas nom o compreenderom, porque os pecadores nom conseguirom


aquesta luz, nom por defeito da luz, mas por míngua sua deles. Onde diz Agustinho:
“Assi como o homem cego, posto ao sol, presente é a El a luz do sol, mas el nom
presente ao sol, [...]. (O livro de vita Christi, p. 35, grifo nosso)
FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

- LOCATIVO + TEXTUAL DIZ Ʉ ONDE DIZ Ʉ

(58) Moralmente, a luz alumea nas treevas, porque a virtude se mostra nas aversidades e
a virtude na infirmidade se acaba. Onde Sam Gregório: “Nom conhece alguém quanto
aproveitou, salvo na aversidade; [...] (O livro de vita Christi p.35, grifo nosso)
FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

- LOCATIVO + TEXTUAL DIZ Ʉ ONDE DIZ Ʉ

(59) O qual é virtude mui alta e sabedoria, no qual o Padre despõe tôdalas cousas de
sempre, per o qual fez os segres e os governa e ordena aa sua glória, em parte per graça
em parte per justiça, e em outra per misericórdia: e assi nom leixa em este mundo algῦa
cousa por ordenar. Onde Agustinho: “[Como] o esplendor nace da sustância do sol, assi
entendamos o Filho geerado da sustância do Padre; [...]. (O livro de vita Christi p.37, grifo
nosso)

FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

- LOCATIVO + TEXTUAL Ø Ʉ ONDE Ʉ

(60) [...] em tôdalas cinco idades deste mundo nunca cessou de prometer e afigurar e
denunciar a viinda de seu Filho per os patriarcas, per os juízes, sacerdotes, reis e
profetas, dês Abeel justo atees Sam Joam Bautista, por tal que, per muitos milhares de
tempos e de anos, e per grandes desvarios e multipricados ditos e demostranças,
alevantasse nossos entendimentos aa fé e esqueentasse nossas voontades per grandes e
79

vivos desejos. Onde diz Leo Papa: “Cessem as querelas que dizem e se queixam da
tardança da nacença de Deus, [...]. (O livro de vita Christi p.39, grifo nosso)
FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

- LOCATIVO + TEXTUAL DIZ Ʉ ONDE DIZ Ʉ

(61) Mas aí de nós, mezquinhos, deste tempo de agora, que nom havemos tam grande
afeiçom aa graça que nos já é dada, como haviam aquêles aa que lhe era prometida.
Onde Bernardo: “Recordando-me ameúde dos que desejavam e suspiravam por a
presença de Cristo em carne, [...]. (O livro de vita Christi p.39, grifo nosso)
FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

- LOCATIVO + TEXTUAL Ø Ʉ ONDE Ʉ

(62) “A misericórdia e a verdade se encontrarom, e a justiça e a paz se beijarom”. Onde


Leo Papa: “Porque o diáboo nom foi tam forçoso ao primeiro homem que o tirasse pêra
si entanto que el ficasse sem consentimento do livre alvidro [...]. (O livro de vita Christi
p.41, grifo nosso)

FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

- LOCATIVO + TEXTUAL Ø Ʉ ONDE Ʉ

(63) “Mas porque a geeraçom natural nom consentia de se êsto fazer, o Senhor David
foi feito filho de David, e da geeraçom prometida veeo e foi nacido filho sem pecado”.
Onde Anselmo outrossi diz: “A nossa natura no começo foi criada aa semelhança de
Deus, [...]. (O livro de vita Christi p.41, grifo nosso)
FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

- LOCATIVO + TEXTUAL DIZ Ʉ ONDE DIZ Ʉ

(64) Nem foi esta Virgem achada de sobreventa nem per acontecimento, mas
predestinada de sempre. Onde Damasceno: “Essa Madre de Deus, de sempre em tempo
previsto per conselho de Deus ante determinada, per desvairadas imageens e
santificaçoões dos profetas per o Spíritu santo foi primeiramente imaginada e
preegada”. (O livro de vita Christi, p. 43, grifo nosso)
FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

- LOCATIVO + TEXTUAL Ø Ʉ ONDE Ʉ


80

(65) E no ventre da madre, per privilégio singular, foi livre do pecado original. Onde
Bernardo: “É a Virgem Maria [cumulada] destes privilégios ajuntados, a qual sem
dúveda, ante foi santa que nada. (O livro de vita Christi, p.45, grifo nosso)
FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

- LOCATIVO + TEXTUAL Ø Ʉ ONDE Ʉ

(66) Pois ao feitor nom desapraz, louvemos a obra que fêz, por tal que quem quer que
desejar o galardam siga o exemplo dela. Êsto Ambrósio. Onde Anselmo: “Como naceu
e nos anos da meninice quam castamente, quam santa e quam digna ordenou e fêz sua
vida [...]. (O livro de vita Christi p. 47, grifo nosso)
FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

- LOCATIVO + TEXTUAL Ø Ʉ ONDE Ʉ

(67) E depois declarando cada uum o seu per palavra, prometerom ambos a Deus
virgindade. Onde diz Hugo que, como assi fosse que a bem-aventurada Virgem fezesse
voto de virgiindade e os padre e madre a mandassem casar, [...]. (O livro de vita Christi p.49,
grifo nosso)

FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

- LOCATIVO + TEXTUAL DIZ Ʉ ONDE DIZ U

(68) [...] e põe exemplo em Abraã, que houvera prometimento de haver Isac ou a sua
semente, e depois empero lhe foi mandado que o oferecesse em sacrifício; o qual
obedeeceu ao mandado, seendo certo que, ainda que, segundo razom humanal,
parecesse contrairo ao que lhe era prometido, que, segundo a virtude per que tôdalas
cousas eram a Deus possívees, se poderia comprir a promissom com a obediência do
mandamento. E assi foi feito, que el da obediência houvesse mérito, e houvesse o efecto
da promissom. E assi pôde seer no propósito da bendita Virgem. Onde Anselmo: “Estas
duas cousas ledamente guardava – virgindade e parto [...]. (O livro de vita Christi p.51, grifo
nosso)

FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

- LOCATIVO + TEXTUAL Ø Ʉ ONDE Ʉ

(69) Tam grande graça é que se nom pode dizer que ũa de tantas seja escolhida, porque
tôdalas outras sobrepujou per santidade. Onde Anselmo: “A esta sôo escoldrinhou Deus
o coraçom e as reẽs, e de tôdalas virgeẽs que havia no mundo a escolheu [...]. (O livro de
vita Christi p.53, grifo nosso)
81

FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

- LOCATIVO + TEXTUAL Ø Ʉ ONDE Ʉ

(70) Mas o boõ spíritu tem deferença do spíritu maao, porque o maao continua em seu
espantamento, [...] o boõ ângeo, logo a-cabo-de pouco, conforta e consola. Onde o
ângeo lhe disse: “Nom temas, Zacarias”. (O livro de vita Christi p.55, grifo nosso)
FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

- LOCATIVO + TEXTUAL DISSE Ʉ ONDE DISSE Ʉ

(71) E o nome que haveria o moço demostrou, dizendo que Joane haveria nome. Onde
Beda: “Joane quer dizer em que é graça, ou graça do Senhor. (O livro de vita Christi p.55,
grifo nosso)

FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

- LOCATIVO + TEXTUAL Ø Ʉ ONDE Ʉ

(72) [...] porque o dia da sua nacença nom sôo se festeja e honra dos cristaãos, mas dos
mouros e de outros. Onde Beda: “Com razom se alegra o padre, assi por [o filho] ser
havudo na velhice, [...]. (O livro de vita Christi p.57, grifo nosso)
FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

- LOCATIVO + TEXTUAL Ø Ʉ ONDE Ʉ

(73) Alegram-se ainda os outros, porque evangelizou a entrada do regno celestial, que
nunca fora ouvida”. Onde Ambrósio: “Solepne alegria se faz na nacença e geeraçom
dos justos. O santo nom sôo é graça do seu padre e madre, mas saúde de muitos; onde
somos amoestados que hajamos prazer na geeraçom dos santos”. (O livro de vita Christi
p.57, grifo nosso)

FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

- LOCATIVO + TEXTUAL Ø Ʉ ONDE Ʉ

(74) Zacarias, consiirando a sterilidade da molher e a velhice de ambos, nom o creeo, e


por êsto foi mudo atees o tempo do parto, significando que, já viindo Cristo, a lei e as
profecias seriam compridas e cessariam, calando-se. Onde diz Sam Crisóstomo:
“Portanto Zacarias, sacerdote dos Judeus, foi mudo, porque já convém cessar [...]. (O
livro de vita Christi p.57-59, grifo nosso)

FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO


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- LOCATIVO + TEXTUAL DIZ Ʉ ONDE DIZ Ʉ

(75) E ainda que do concebimento se alegrasse por lhe seer tirado o doesto da
sterilidade, empero por a idade da velhice havia vergonha, porque nom dissessem que
na velhice era luxuriosa, [ca] os antigos que nom haviam já sperança de geeraçom nom
se conheciam carnalmente. Onde Beda: “Quanto cuidado seja aos santos de nom
consentirem algῦa cousa de que devam haver vergonha, [...]. (O livro de vita Christi p.59,
grifo nosso)

FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

- LOCATIVO + TEXTUAL Ø Ʉ ONDE Ʉ

(76) [...] “grande necessidade é a nós de viver bem e haver bondade, porque nós todas
cousas fazemos ante os olhos do juiz que todas cousas vee”. Onde Agostinho:
“Qualquer cousa que eu fezer, Deus é presente assi como perpétuo oolhador de tôdolos
pensamentos, entençoões e obras. (O livro de vita Christi p.59, grifo nosso)
FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

- LOCATIVO + TEXTUAL Ø Ʉ ONDE Ʉ

(77) E quando com diligência oolho, assi com temor como com vergonha torvo-me,
porque em todo lugar o vejo star oolhando de presente as cousas que eu penso fazer em
ascondido. [...]. E porém diz Anselmo: “Ali peca tu onde souberes que nom é Deus”.
Onde diz outro doutor: “Que coisa torpe fazes tu que eu oolhe, que nom hajas
vergonha? (O livro de vita Christi p.59, grifo nosso)
FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

- LOCATIVO + TEXTUAL DIZ Ʉ ONDE DIZ Ʉ

(78) [...] e em sinal desto na nascença de Cristo apareceu a strela aos Magos, que os
guiou ao Menino que era nascido. Onde tôdolos olhos dos pecadores teem mentes a ela,
assi como os olhos dos marinheiros todos olham aa estrela. Onde Bernardo: “Nom
revolvas os olhos da claridade desta strela, se nom queres alargar-te com tormentas. (O
livro de vita Christi p.63, grifo nosso)

FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

- LOCATIVO + TEXTUAL Ø Ʉ ONDE Ʉ

(79) Foi, ergo, enviado o ângeo a Maria pera lhe denunciar que o Filho de Deus
cobiiçara a sua fremosura e que a escolhera pera seer sua madre, e que el a amoestasse e
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demovesse que ledamente recebesse tal Filho, porque per el tiinha Deus ordenado a
salvaçom do linhagem humanal. Onde Bernardo: “Bendita Maria, aa qual nom faleceu
humildade nem virrgiindade, [...]. (O livro de vita Christi p.65, grifo nosso)
FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

- LOCATIVO + TEXTUAL Ø Ʉ ONDE Ʉ

(80 e 81) Nom era, ergo, Maria nas praças nem morava em púbrico, mas dentro era em
suas câmaras e soo estava: nom sôo empero de quanta companhia de virtudes que em
ela eram. Onde Crisóstomo: “Achou o ângeo Maria nom de fora andando, mas solitária
e em contempraçom e porque nom buscou graça acerca do mundo, achou-a acêrca de
Deus. Onde Ambrósio: “Esta foi achada, como o ângeo entrou, nas trascâmaras da casa
sem companheira, [...]. (O livro de vita Christi p.65, grifo nosso)
FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

- LOCATIVO + TEXTUAL Ø Ʉ ONDE Ʉ

FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

- LOCATIVO + TEXTUAL Ø Ʉ ONDE Ʉ

(82) E ainda certamente entom lhe parecia que estava menos soo, quando nom era
alguém com ela. E per que maneira poderia seer sôo aquela a que eram presentes tantos
livros, arcângeos e profetas? E onde Sam Gabriel, que a soía de visitar, sobrechegou?
[Em a cela]. Onde em outra parte diz Jerónimo: “Teerás cela em que nom caiba outrem
senom tu soo; mas não serás soo [...]. (O livro de vita Christi, p.65, grifo nosso)
FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

- LOCATIVO + TEXTUAL DIZ Ʉ ONDE DIZ EM OUTRA PARTE DIZ Ʉ

(83) De creer é que ela jazia tôda enclinada em mui devota oraçom ou em
contempraçom de dentro do coraçom, e per ventura entom se levantava specialmente de
meditaçom sobre a saúde do linhagem humanal, scil., como per Virgem havia de seer
salvo. Onde dizem alguῦs que entom actualmente leera aquela profecia de Isaias: “Eis a
virgem conceberá e parirá” [...]. (O livro de vita Christi, p.65, grifo nosso)
FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

- LOCATIVO + TEXTUAL DIZEM Ʉ ONDE DIZEM Ʉ


84

(84) A qual, pois que ante que concebesse era chea de graça, quem poderá cuidar quanto
seria avondosa dela depois da concepçom? Onde Jerónimo: “E bem [diz] chea, porque a
todas outras per partes é dada graça [...]. (O livro de vita Christi, p.67, grifo nosso)
FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

- LOCATIVO + TEXTUAL Ø Ʉ ONDE Ʉ

(85) [...], por a forma da nova saüdaçom que sua plavra demostrava, porque nom soíam
os ângeos de a saüdar assi nem os ouvira jamais falar taaes cousas. Porém assi como
sabedor e toda avergonhada, nom respondeu cousa, cuidando em si meesma e
examinando aquêlo que era dito. Onde Ambrósio: “Maravilha-se da nova forma da
saüdaçom, porque nunca fora ante achada e soomente pera Maria se guardava esta
saüdaçom”. (O livro de vita Christi, p.69, grifo nosso)
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- LOCATIVO + TEXTUAL Ø Ʉ ONDE Ʉ

(86) As vontades santas dos humildosos, quanto [eles] som mais exalçados per
louvores, tanto sooem haver maior vergonha e temer: “turbata ergo fuit” torvada foi
com vergonha virtuosa e honesta, mas nom de vergonha maa. Onde Bernardo:
“Enquanto foi torvada, foi de vergonha virginal; e enquanto nom o foi, êsto procedeu de
fortaleza; e enquanto se calou e cuidou, foi de prudência e discreçom”. (O livro de vita
Christi, p.69, grifo nosso)

FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

- LOCATIVO + TEXTUAL Ø Ʉ ONDE Ʉ

(87) “Comprida já de graça, achou graça pera dispensá-la aos outros”. Onde Agustinho:
“Oo Maria, achaste graça acerca do Senhor e mereceste de a derramar per todo o
mundo”. (O livro de vita Christi, p.69, grifo nosso)
FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

- LOCATIVO + TEXTUAL Ø Ʉ ONDE Ʉ

(88) “Ela é leal e justa e piadosa e favorável, e nom se pode negar a nhuũ que a busca”.
Onde Bernardo: “Ela é feita a todas cousas e a todos abre o seo da misericórdia, [...]”.
(O livro de vita Christi, p.69, grifo nosso)

FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

- LOCATIVO + TEXTUAL Ø Ʉ ONDE Ʉ


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(89) E dar-lhe-á a seeda de David, nom per semelhança, mas verdadeiramente, nom
terreal, mas celestrial; o qual, portanto, se diz “haverá [a] seeda de David” porque
aquesta em que seve temporalmente representava a imagem daquela eternal. Onde
Beda: “Tomou a seeda ou o reino de David o Senhor, por tal que a gente a que David
temporalmente deu a governança de rei temporal [...]”. (O livro de vita Christi, p.71, grifo
nosso)

FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

- LOCATIVO + TEXTUAL Ø Ʉ ONDE Ʉ

(90) E do seu regno nom será fim. Cristo nom soo enquanto Deus, mas enquanto
homem, regnará pera sempre, nom soo sobre os homeẽs, mas sobre os ângeos. Onde
Bernardo: “Oo quam gloriosíssimo é aquel regno no qual se ajuntaróm os reis todos em
uũ, [...]”. (O livro de vita Christi, p.71, grifo nosso)
FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

- LOCATIVO + TEXTUAL Ø Ʉ ONDE Ʉ

(91) E como o ângeo houve ditas estas cousas, Santa Maria foi posta em perplexidade
ou em maneira de abalamento, porque, [...] nem devia nom creer ao ângeo, nem devia
usurpar as cousas de Deus nèiciamente. Onde, querendo ela certificar-se d[e] outra
cousa, preguntou por a maneira da concepçom, dizendo: “Como se fará êsto, scil., que
tu prometes, que eu parirei filho? (O livro de vita Christi, p.71-73, grifo nosso)
FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

Ʉ ONDE, QUERENDO ELA


- LOCATIVO + TEXTUAL DIZENDO CERTIFICAR-SE [...] DIZENDO Ʉ

(92) “Eu creo, mas da maneira per que se deve fazer pregunto”. Onde diz Ambrósio:
“Nom duvida seer fazedoiro aquela que preguntava per que maneira se havia de fazer.
[...]”. (O livro de vita Christi, p. 73, grifo nosso)
FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

- LOCATIVO + TEXTUAL DIZ Ʉ ONDE DIZ Ʉ

(93) [...] seja demostrado que foi soomente de graça, a qual nom precederom méritos
alguũs de homeẽs. A graça é atribuída ao Spíritu Santo. Onde diz a glosa: “Spiritu é
nome de toda graça, a qual é spirada de Deus”. (O livro de vita Christi, p. 73, grifo nosso)
FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

- LOCATIVO + TEXTUAL DIZ Ʉ ONDE DIZ Ʉ


86

(94) [...] per ojeito ou entrepoimento do corpo vivificado possas sofrer a presença da
majestade e sofrer a luz que o homem nom pode compreender nem seer chegado a ela,
assi como o sol se encobre a nós com algũa nuvem ou cobrimento quando com a vista o
nom podemos veer. Onde Bernardo: “Porque Deus Spíritu é e nós carne, a soombra do
seu corpo se temperou a nós, por que per ojeito e antreposiçom da carne vivificada [...]”.
(O livro de vita Christi, p.73, grifo nosso)
FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

- LOCATIVO + TEXTUAL Ø Ʉ ONDE Ʉ

(95) E teemos desto semelhança em três que vestem uũ de si mesmos, dos quaaes se
pode dizer que todos juntamente fazem ũa obra e aquêlo que faz uũ faz o outro, e nom é
porém vestido senom uũ. Onde Agustinho: “Quaaesquer obras de cada ũa das pessoas
da Trindade, a Trindade as obra e faz, e a qualquer que obra, as outras duas pessoas
ajudam. [...]”. (O livro de vita Christi, p.75, grifo nosso)
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- LOCATIVO + TEXTUAL Ø Ʉ ONDE Ʉ

(96) “E porém aquel que de ti nacer será chamado santo, Filho de Deus”. O qual,
empero da eternidade foi Filho, nom se chamava nem demostrava per nome alguũ
senom em tempo. Onde Bernardo diz que “tanto quer dizer _ será chamado Filho de
Deus_ [como]_ nom de homem, mas do Spíritu Santo conceberás [...]”. (O livro de vita
Christi, p.75, grifo nosso)

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- LOCATIVO + TEXTUAL DIZ Ʉ ONDE SN DIZ U

(97) E acabado o ofício da embaixada, o ângeo spera a resposta da Virgem. Onde


Bernardo: “Ouviste, Virgem, que conceberás; ouviste que nom per homem, mas per
Spíritu Santo. (O livro de vita Christi, p.77, grifo nosso)
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- LOCATIVO + TEXTUAL Ø Ʉ ONDE Ʉ

(98) “[...] oo assiinada graça, a qual, como deu fee humildosamente e creeu, logo
encorporou em si o fazedor do ceeu”. Onde Anselmo: “Oo fé a Deus acepta, oo
humildade prazível, oo obediência oferecida e a Deus mais leda que todo outro
sacrifício! [...]”. (O livro de vita Christi, p.77, grifo nosso)
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- LOCATIVO + TEXTUAL Ø Ʉ ONDE Ʉ

(99) “[...] Que cousa pode mais alta seer, e que cousa pode mais humildosa seer
sentida?” Onde Ambrósio: “Vee a humildade, vee a devaçom; foi escolhida por madre
do Senhor, e chamou-se serva. (O livro de vita Christi, p.77, grifo nosso)
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- LOCATIVO + TEXTUAL Ø Ʉ ONDE Ʉ

(100) [...]; e antre tôdalas virtudes tanto prougue a humildade da Virgem bendita ao
Filho de Deus, [...], porque tomasse carne da Virgem, per aquela maneira que o ferro é
tirado do adamante. Onde Agostinho: “Oo verdadeira humildade, que pariu Deus aos
homeẽs e trouxe vida aos mortaaes, abriu o paraíso e livrou as almas dos homeẽs! (O
livro de vita Christi, p.79, grifo nosso)

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(101) E por êsto Deus em ũa pessoa das suas fêz si meesmo supósito da natureza
humanal, de que se segue que solamente há em Cristo ũa pessoa e uũ ajuntamento de
pessoa da parte daquel que a tomou. E assi Cristo, segundo que é homem, nom é pessoa.
Onde diz Hugo que “depois que Deus tomou o homem, todo o tomou, scil.,carne e
alma; scil.,[...]”. (O livro de vita Christi, p.81, grifo nosso)
FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

- LOCATIVO + TEXTUAL DIZ Ʉ ONDE DIZ U

(102) [...] ou ao menos beijarás afundo ao pee da dita saũdaçom; e nom o leixes de fazer
por negligência, dizendo: Ave Maria, etc. Onde Bernardo: “Oo Virgem Maria, assi
como beijo é a ti ouvires êste verso_ Ave Maria. (O livro de vita Christi, p.83, grifo nosso)

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(103) [...] nom há i cousa que assi possa desordenar nossa vida como nom curar de fazer
boas obras e poê-las em trespasso sempre. Êsto é o que muitas vezes nos faz caer de
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tôdolos beẽs. Onde disse uũ [saibo] que a boa obra nunca se deve perlongar, por tal que
nom venha alguũ acontecimento [...]. (O livro de vita Christi, p.89, grifo nosso)
FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

- LOCATIVO + TEXTUAL DISSE Ʉ ONDE DISSE U

(104 e 105) “Ex aqui o Cordeiro de Deus, ex aqui o que tira os pecados do mundo”.
Onde Crisóstomo: “Portanto fêz Cristo saudar Maria a Elísabet, por tal que a palavra
que saísse do ventre onde o Senhor morava entrasse per as orelhas a Elísabet e
descendesse a Joane e o ungisse em profeta”. E logo como a voz da saüdaçom chegou
as orelhas dela, logo o moço com alegria, começou de profetizar, nom per voz, mas per
o movimento que fêz. Onde o meesmo Crisóstomo: “Dize, moço, dize, maior que
tôdolos profetas, que te chamarás dignamente mais que profeta, donde te veeo esta
alegria e movimento? (O livro de vita Christi, p.89-91, grifo nosso)
FUNÇÃO FORMA VERBAL INTEGRAÇÃO

- LOCATIVO + TEXTUAL Ø Ʉ ONDE Ʉ

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