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Inclusão… que

futuro?

Alexandra Maria Domingues Leitão

ISEC – Instituto Superior de Educação e Ciências


Pós Graduação em Ensino Especial – Domínio Cognitivo e Motor

Ano Lectivo 2020/2021


Inclusão… que futuro?

Acreditamos e proclamamos que:

 Cada criança tem o direito fundamental à educação e deve ter a oportunidade de


conseguir e manter um nível aceitável de aprendizagem;
 Cada criança tem características, interesses, capacidades e necessidades de
aprendizagem que lhe são próprias;
 Os sistemas de educação devem ser planeados e os programas educativos
implementados tendo em vista a vasta diversidade destas características e
necessidades;
 As crianças e jovens com necessidades educativas especiais devem ter acesso às
escolas regulares, que a elas se devem adequar através duma pedagogia centrada na
criança, capaz de ir ao encontro destas necessidades;
 As escolas regulares, seguindo esta orientação inclusiva, constituem os meios capazes
para combater as atitudes discriminatórias, criando comunidades abertas e solidárias,
construindo uma sociedade inclusiva e atingindo a educação para todos; além disso,
proporcionam uma educação adequada à maioria das crianças e promovem a
eficiência numa óptima relação custo-qualidade, de todo o sistema educativo.
(Declaração de Salamanca, 1994, p. 1.)
Inclusão… que futuro?

Não podemos falar em inclusão sem antes percebermos do que trata este conceito.
Assim sendo, de acordo com Correia (2003, p.11) o conceito de inclusão, ou seja, a inserção do
aluno com NEE, em termos físicos, sociais e académicos nas escolas regulares, ultrapassa em
muito o conceito de integração, uma vez que não pretende posicionar o aluno com NEE numa
“curva normal, mas sim assumir que a heterogeneidade que existe entre os alunos é um factor
muito positivo, permitindo o desenvolvimento de comunidades escolares mais ricas e mais
profícuas. Também o Decreto-Lei nº54/2018, de 6 de julho, “estabelece os princípios e as
normas que garantem a inclusão, enquanto processo que visa responder à diversidade das
necessidades e potencialidades de todos e de cada um dos alunos, através do aumento da
participação nos processos de aprendizagem e na vida da comunidade educativa” (nº1 do
artigo 1º).

Em Portugal as primeiras tentativas do que hoje apelidamos de integração surgiram


nos anos 60 do século passado, com pessoas com deficiência visual e auditiva, nascendo assim
as primeiras equipas de educação especial. Em 1991 publica-se a primeira lei que organiza o
atendimento às NEE. Mas a principal mentora da mudança de paradigma da integração para
inclusão, surge em 1994 com a Declaração de Salamanca. Como é referido no ponto 2 da
declaração anteriormente citada “as crianças e jovens com necessidades educativas especiais
devem ter acesso às escolas regulares, que a elas se devem adequar através duma pedagogia
centrada na criança, capaz de ir ao encontro destas necessidades” e “as escolas regulares,
seguindo esta orientação inclusiva, constituem os meios capazes para combater as atitudes
discriminatórias, criando comunidades abertas e solidárias, construindo uma sociedade
inclusiva e atingindo a educação para todos; além disso, proporcionam uma educação
adequada à maioria das crianças e promovem a eficiência, numa óptima relação custo-
qualidade, de todo o sistema educativo.”. Hoje em dia encontra-se em vigor o Decreto-lei
nº54/2018 de 6 de julho que estabelece “a escola inclusiva onde todos e cada um dos seus
alunos, independentemente da sua situação pessoal e social, encontram respostas que lhes
possibilitam a aquisição de um nível de educação e formação facilitadoras da sua plena
inclusão social.”.

Mas será assim tão simples? Será que nos encontramos no caminho certo? Será que os
nossos profissionais têm formação adequada e suficiente? E será que as nossas escolas se
encontram preparadas? Sinto que a educação em Portugal se tornou permeável a modelos de
ensino, de avaliação e de organização que frequentemente se opõem a uma igualdade de
oportunidades para todos, como sejam quadros de mérito e rankings de escolas.
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De acordo com Pereira (2018, p.11) “Na reflexão sobre as escolas, não podemos
ignorar a necessidade de estas se afirmarem como espaços culturalmente mais significativos,
associando a dimensão do significado cultural que aí tem lugar à dimensão inclusiva. Isto
significa que as especificidades cognitivas, culturais e experienciais dos alunos deverão ser
entendidas como condição necessária, mas não suficiente, para configurar uma escola que se
afirme como inclusiva. ”ou seja, é necessário apostar numa gestão contextualizada e flexível
do currículo que promova a cooperação entre os alunos, a sua autonomia e a participação em
decisões quotidianas dos mais diversos níveis. Ainda de acordo com Pereira (2018, p.12) “A
gestão do tempo deverá romper com o pressuposto de que se deve ensinar tudo a todos como
se todos fossem um só.”.

Também Both e Ainscow citados por Rodrigues(2014:) referem alguns princípios


necessários para aproximar as escolas da inclusão:

a) Valorizar igualmente alunos e professores;


b) Aumentar a participação e reduzir a exclusão das culturas, dos currículos e
das comunidades;
c) Reestruturar culturas, políticas e práticas nas escolas para que possam
responder à diversidade dos alunos;
d) Reduzir os obstáculos à aprendizagem e participação para todos os alunos (e
não só os que têm deficiências ou os que são identificados como elegíveis
para os apoios da Educação Especial);
e) Ver as diferenças dos alunos como um recurso para apoiar a aprendizagem e
não um problema que precisa de ser resolvido;
f) Reconhecer o direito dos alunos a ter uma educação na comunidade em que
vivem;
g) Melhorar as escolas para professores e alunos;
h) Enfatizar o papel das escolas na construção de uma comunidade, no
desenvolvimento de valores e na melhoria dos sucessos;
i) Promover relações entre a escola e a comunidade;
j) Reconhecer que a inclusão na educação é parte integrante da inclusão na
sociedade.

Mas será só a escola, como instituição, que precisa de se adaptar? Segundo


Morgado(2003, p.132 ) o que se verifica em estudos realizados com os professores é que
”estes explicitam que a sua formação inicial não os prepara devidamente para a resposta a
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grupos de alunos cada vez mais heterogéneos”. É fundamental proporcionar aos professores
conhecimentos para uma prática inclusiva e sublinha-se na Declaração de Salamanca(1994,
p.27) que “As competências necessárias para satisfazer as necessidades educativas especiais
devem ser tidas em consideração na avaliação dos estudos e na certificação dos professores”.
Seguindo esta linha de pensamento compreendemos que a inclusão implica mudanças não só
ao nível da organização das escolas como também ao nível das atitudes e da prática
pedagógica dos professores. Neste sentido a Declaração de Salamanca(1994, p.11) refere “(…)
reconhecer e satisfazer as necessidades diversas dos alunos, adaptando vários estilos e ritmos
de aprendizagem, de modo a garantir um bom nível de educação para todos, através de
currículos adequados, de uma boa organização escolar, de estratégias pedagógicas, de
utilização de recursos e de uma cooperação com as respectivas comunidades.”. Nos dias de
hoje a inclusão de todas as crianças no ensino regular implica tarefas acrescidas de
diagnóstico, planificação e avaliação, que exigem ser realizadas em colaboração com o
professor de ensino especial. Acresce ainda dizer que a diversidade de NEE implica um
trabalho de reflexão acrescido e que os professores podem não ter
conhecimentos/competências suficientes (Estrela, 2002).

Não quero com isto dizer que o processo de inclusão em Portugal se trata de uma
mera utopia, de acordo com o DGEEC e com um inquérito realizado a 3 de Janeiro de 2018,
entre os anos lectivos 2016/2017 e 2017/2018 o número de crianças com Necessidades
Educativas Especiais, com Programa Educativo Individual, a frequentarem escolas regulares
aumentou 7%, como podemos verificar no gráfico abaixo.

30.000

25.000

20.000
Educação pré-escolar
1.º ciclo
2.º ciclo
15.000
3.º ciclo
Ensino secundário

10.000

5.000

0
2012/2013 2013/2014 2014/2015 2015/2016 2016/2017 2017/2018

Gráfico 1 – Evolução do número de crianças e alunos com necessidades educativas especiais de


educação por nível de educação e ensino (Fonte: DGEEC)
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Em suma chego à conclusão que embora a inclusão em Portugal seja uma realidade
cada vez mais proeminente, existe ainda um caminho muito longo a percorrer. Trata-se de um
grande desafio tanto do presente como do futuro e é da responsabilidade de todos nós
enquanto cidadãos. Temos tido uma evolução muito positiva a todos os níveis, mas
principalmente ao nível da legislação. Sei à partida que a legislação não é suficiente para
garantir a sustentabilidade das mudanças sendo também imprescindível as competências e o
empenho de todas as pessoas envolvidas (pais, profissionais, membros da comunidade), no
entanto, a relevância que a legislação tem como base do sistema educativo é indiscutível. É
por isso necessário continuar a legislar, apostar na formação dos profissionais, investir nos
centros de apoio e de recursos, deixar de lado os estigmas e mudar mentalidades.

(…) o desenvolvimento humano constrói-se em relação com o meio e com os outros. O


indivíduo influencia, mas também é influenciado. O ser humano desenvolve-se em interacção
social, especialmente através da cooperação entre pares. É nesta perspectiva que todos podem
contribuir para melhorar a nossa sociedade e contribuir para a construção de uma sociedade
inclusiva, sem preconceitos onde todos têm direito à sua individualidade.

(Simões, 2000, p.17)


Referências Bibliográficas

Correia, L. (2003).Inclusão e Necessidades Educativas Especiais. Porto Editora.


Estrela, M. (2002).Modelos de formação de professores e os seus pressupostos
conceptuais, Revista de Educação, 11(1), pp.17-29.
Morgado, J. (2003).Qualidade, inclusão e diferenciação. ISPA – Instituto Superior de
Psicologia Aplicada.
Pereira, F. (2018). Para uma educação Inclusiva Manual de Apoio à Prática. Ministério
da Educação/Direcção-Geral da Educação.
Rodrigues, D. & Armstrong, F. (2014).A Inclusão nas Escolas. Fundação Francisco
Manuel dos Santos.
Simões, A. (2000).Promover uma Educação Inclusiva. Revista O Professor, 70(3), pp.17-
19.
UNESCO (1994).Declaração de Salamanca e enquadramento da acção na área das
necessidades educativas especiais. Disponível em pnl2027.gov.pt Consultado em 28 de
Dezembro de 2020

Legislação
Decreto-lei nº54/2018 de 6 de julho
Declaração de Salamanca

Sites de Internet
https://www.dgeec.mec.pt/np4/dgeec/ consultado em 29 de Dezembro de 2020

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