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Estudo de caso: Ouça Bem S/A

A Ouça Bem S/A era uma empresa brasileira no ramo de aparelhos auditivos, com mais de 50 anos de mercado.

A empresa tinha 57 pontos de venda em todo o território nacional, divididos quase que uniformemente entre lojas
próprias (filiais) e franquias.

O tipo de controle organizacional da Ouça Bem S/A era familiar. O presidente da companhia exercia um controle
extremamente centralizado das decisões.

O grande fornecedor da Ouça Bem era a Hearing Aids, uma empresa multinacional europeia, reconhecida mundialmente
pela alta qualidade tecnológica de seus produtos.

Em 2000, a Ouça Bem S/A devia um volume significativo à Hearing Aids, tão significativo que se tornou impagável.
Dessa forma, os administradores da Ouça Bem S/A se viram obrigados a entregar o controle de sua empresa para a
Hearing Aids, que a incorporou trocando dívidas por 100% das quotas da sociedade.

O presidente da Ouça Bem e os membros gerenciais que faziam parte de sua família foram destituídos. Um novo
presidente, pertencente ao quadro funcional da Hearing Aids, chegou ao Brasil com a missão de assumir a Ouça Bem
S/A e reestruturá-la.

Em 2002, o presidente sentiu a necessidade de contratar um novo controller para a companhia. Ele teria a missão de
auxiliar o presidente na elaboração do sistema de controle gerencial da empresa, direcionando-a rumo à lucratividade e
ao crescimento sustentável.

Era unânime entre a nova diretoria da Ouça Bem S/A que, para dar suporte ao crescimento sustentável, era necessário
um processo de descentralização que respeitasse os princípios da accountability.

As filiais, no modelo antigo, não tinham autonomia para dar descontos, prazos ou conceder crédito, que era feito por
meio de um departamento específico localizado na matriz.

A filial recebia uma tabela com preços e prazos predefinidos, sem autonomia para fazer vendas em situações diferentes
das expressas na tabela.

Naquela época, a maior parte da remuneração do gerente de filial estava associada à receita – percentual da receita.

Responsabilidade e autoridade

No modelo de controle para a descentralização tentado pela nova diretoria da Ouça Bem S/A, a responsabilidade e a
autoridade não estavam condizentes. À responsabilidade, cabia a receita; à autoridade, cabiam os descontos, os prazos
e a concessão de crédito.

Apesar de os descontos afetarem negativamente a receita, os prazos e a política de crédito não o faziam. Por esse
motivo, era de se esperar que a autoridade da filial, sem contrapartida de responsabilidade, fizesse os prazos serem bem
maiores do que a média de mercado, aumentando a necessidade de capital de giro – que é um ativo caro – e o índice
de inadimplência.

Problema de descentralização

O problema da Ouça Bem S/A não estava na descentralização, mas na falta de accountability do mecanismo de controle.
A nova diretoria da empresa acreditava que a descentralização do controle da matriz para as filiais era importante e
coube ao controller criar um mecanismo melhor.

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Vejamos a representação do mecanismo criado:

receita bruta - descontos ou abatimentos ou impostos = receita líquida

receita líquida - gastos diretos da filial fixos e variáveis = resultado operacional

resultado operacional - índice de inadimplência = resultado líquido da filial

Como resultado, temos:


 à responsabilidade, coube o resultado líquido da filial;
 à autoridade, couberam os descontos, os prazos e a concessão.

Solução

Depois de uma grande negociação com os gerentes de filial – mudanças em mecanismos de remuneração têm
implicações legais importantes que precisam ser observadas – explicando a importância da mudança no mecanismo de
remuneração, ocorrida após vários momentos de treinamento sobre mecanismos de controle, os gerentes passaram a
receber sobre o resultado líquido da filial, que era um mecanismo com quatro objetivos.

São eles:
 gerenciamento de descontos;
 gerenciamento de gastos;
 gerenciamento da concessão de crédito;
 gerenciamento de prazos.

No treinamento dos gestores, eles aprenderam o conceito de margem de contribuição (preço menos custo variável),
evitando que eles dessem descontos que deixassem o preço do produto inferior aos custos variáveis (margem de
contribuição negativa).

Tanto os gastos fixos quanto os variáveis afetavam o resultado da filial.

Por exemplo, antes desse modelo, as filiais que, usualmente, pediam para aumentar o número de funcionários
reduziram significativamente esse pleito.

Gerenciamento

A empresa descentralizou para a filial a concessão de crédito, dando ferramentas de análise de crédito para as filiais, tais
como máquina de consulta a cheque e SERASA, por exemplo.

O índice de inadimplência da empresa caiu de 16% para 6% no segundo mês, chegando a 3% – média do mercado –
seis meses após a implantação do novo modelo.

Além disso, a receita aumentou, segundo os gerentes, porque eles passaram a dar crédito a algumas pessoas que a
matriz, no modelo antigo, teria recusado.

A empresa passou a apurar a receita, que seria a base para a formação da remuneração dos gestores de filial, trazendo
os pagamentos das contas a prazo a valor presente, descontando o custo do capital da empresa – custo médio
ponderado de capital, CMPC.

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