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( A RETÓRICA DA IMAGEM
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( 5� Segundo uma antiga etimologia, a palavra imagem deveria estar


ligada à raiz de imitari. E chegamos, imediatamente, ao cerne do
( o problema mais importante que se possa apresentar à semiologia

::s das imagens: a representação analógica (a "cópia") poderá
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produzir. verdadeiros sistemas de signos, e não mais apenas
simples agluti-nações de símbolos? Será concebível um "código"
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(,) t:z analógico -e não mais digital? Sabe-se que os lingüistas eliminam
da linguagem toda comunicação por analogia, da "linguagem" das
( abelhas à "lin-guagem" gestual, pois que essas comunicações são
e o duplamente articuladas, isto é, definitivamente fundamentadas
·�- sobre uma com-binação ele unidades digitais, como são os

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( -S;) fonemas. Os lingüistas não são os únicos a suspeitar ela natureza

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( lingüística da imagem; a opinião geral também considera-


(
o confusamente-a imagem como um centro de resistência ao sentido,
cm nome ele uma certa idéia mítica da Vida: a imagem é
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J representação, isto é, ressurreição, e sabe-se que o inteligível é tido

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( como antipático ao vivenciado. Assim, ele ambos os lados, a
analogia é considerada como um sentido pobre: uns pensam que a
( imagem é um sistema muito rudimentar em re-lação à língua;
-- ..i;::, outros, que a significação não pode esgotar a riqueza indizível da
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\)) imagem. Ora, mesmo -e sobretudo -se imagem é, de uma certa
( � maneira, limite do sentido, permite-nos, no entanto, voltar a uma
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( � verdadeira ontologia da significação. Como o sentido
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ÇD '6 chega à ima�em? Onde termina o sentido? E, se termina, o que

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e existe alérh dele? E a pergunta que gostaríamos de propor,
submetendo a imagem a uma anál iseespectral elas mensagens que
e pode co'nter. Ten-taremos, inicialmente, facilitar -e muito:
e estudaremos apenas a 27

(
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im �gem pub'.icitária. Por quê? Porque,�;11 publicidade, a significação nos usos de umacivilizaçãomuito ampla,cm quc"fazcrsuas próprias
da 1111age �1 e, ccrtam �nt�, in�cn�i?nal: são certos atributos cio pro­ compras no mercado" opõe-se a uma forma mais prática e inde­
_
duto que_ 1 oi_ n:am a pnon os s1gnrf1cados da mensagem publicitária, pendente de abastecimento (conservas, congelados), característica
e est�s s1gnifi�ados devem ser transmitidos tão claramente quanto de uma civilização mais "mecanizada". Um segundo signo é quase
p�s�1vel; se a imagcm contém signos, teremos certeza que, em pu­ tão evidente quanto o primeiro; seu significante é o conjunto formado
_
bl�cidade,esses signos são plenos, formados com vistas a uma melhor pelo tomate e pelo pimentão e a correspondente combinação tricolor
leitura: a mensagem publicitária éji·anca, ou pelo menos, enfática. (amarelo, verde, vermelho) do cartaz; seu significado é a Itália, ou
antes, a italianidade; este signo está em relação ele redundância com
o signo conotado ela mensagem I ingüíslica (a assonância italiana cio
AS TRÊS MENSAGENS nome Panzani); o saber mobilizado por esse signo já é mais
específico: é um saber tipicamente "francês" (os italianos não per­
Temos aqui uma publicidade Panzani: pacotes de massas, uma ceberiam a conotação do nome próprio, tampouco a italianidadc do
la�a, tomates, cebolas, pimentões, um cogumelo, lodo o conjunto tomate e do p imentão), baseado no conhecimento de certos
saindo de uma sacola de compras entreaberta, em tons de amarelo e estereótipos turísticos. Continuando a explorar a ima&em (o que não
verde sobre f undo _ vermelho. 1 Vamos tentar selecionar o que há de significa que ela não seja límpida desde o primeiro 111omcnto), des­
me]h?r nas diferentes mensagens que contém essa publicidade. cobrimos, facilmente, pelo menos dois outros signos; cm um deles,
A �magc _ �11 rcv?}ª imediatamente uma primeira mensagem, cuja a presença compacta ele objetos diferentes transmite a idéia de um
_
_ u1 l1ca;
subslancia e l111 � � _ seus suportes são a legenda, marginal e as serviço culinário completo, co1110 se, por u111 lado, l'a11:a11i forne­
_
et 1q�etas, que sao inseridas no natural da cena, como en ab1me; 0 cesse lodos os ingredientes necessários a um prato variado, e, por
,
cod1go que expre�sa a mensagem é a língua francesa; para com­ outro lado, o molho de tomate concentrado da lata igualasse em
_
preende-la, P?1s, e apen?s necessário que se saiba ler e que se co­ qualidade e frescura os produtos llaturais que o ccrca111, a cena es­
nheça o franc�s. N� realidade, a própria mensagem pode, ainda, se tabelecendo, de certa maneira, a I igação entre a origem dos produtos
decompor, pois o signo Panza11i não se limita a informar o nome ela e seu estágio final; no outro signo. a composição, evocando a lem­
firma, com� tan:bém, por sua assonância, tem um significado sµpJe­ brança de tantas representações ele alimentos, remete a um signil"i­
, _
mentarque e a 'italiarudade"; a mensagem lingüística é,assim, dupla cado estético: é a "natureza-morta", ou, como é melhor dito em outras
(pelos 1�1enos _ nesta imagem): denotação e conotação; no entanto, línguas, o still /iving; 3 aqui, o saber necessário 6 essencialmente
com � ha, aqui: apenas um signo típico,� o da linguagem articulada cultural. Poderíamos sugerir que, a esses quatro signos, vcnha jus­
(escn�a), consideramos que há apenas uma mensagem. tar-se uma última informação, que nos diz que aqui se trata ele uma
Deixando de _lado a mensagem lingüística, resta a imagem pura publiciclaclc proveniente, ao mesmo 1e111po, da localização da ima­
.
� arnda que as etiquetas dela façam parte, a título anedótico). Essa gem na revista e ela repetição elas etiquetas Pa11za11i (deixando ele lado
in:a?cm apresenta, cm seguida, uma série ele signos descontínuos. a legenda); esta última informação é. porém, extensiva à cena; foge,
ln1c1almente (esta ordem é indiferente, já que os signos não são li­ de certa maneira, ü signific:1ção, na mcclicla cm que a natureza publ.i­
neares), a idéia de que se lrata, na cena representada, de uma volta citária da imagem é essencialmente funcional: expressar alguma
do mcrca�o; esta significação contém dois valores positivos: o bom coisa não significa forçosamente: eu falo, salvo cm sistemas deli­
estado, a J rescura �os ��·odutos e a refeição puramente caseira a que beradamente reflexivos, como a literatura.
se dcst,nam; _ _
seu s1gni11cantc é a sacola entreaberta, o que ra 7• com Temos. pois, quatro signos para essa imagem. formando pre­
que os produtos, sem embalagem, espalhem-se sobre a mesa. Para sumivelmente um conjunto coerente, pois são todos descontínuos.
ler este primeiro signo bastará um saber de certa forma implantado exigem um saber geralmente cultural e remetem a significados

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( globais (por exemplo. a ita!im,idade), impregnados de valores eul'óri­ se faz espontaneamente ao nível da leitura corrente:� espectador da
cos: seguindo-se ú mensagem lingüística, veremos uma segunda imagem recebe ao mesmo tempo a mensagem pe�cept1va e a cultural,
( mensagem, ele natureza icônica. Será tudo? Se retirarmos todos esses e veremos mais adiante que esta confusão de leitura corresponde à
( signos da imagem, restará, ainda, um certo material informativo; função da imagem de massa (de que tratamos aqui). A distinção te�,
privado de todo saber, continuo a "ler" a imagem, a "compreender" no entanto uma validade operatória, análoga àquela que permite
( que ela reúne, em um mesmo espaço, um certo número de objetos distinguir �o signo lingüístico um significante e um significado,
( identific,1veis (nomeáveis) e não somente formas e cores. Os signi­ embora na realidade, ninguém possa separar o "vocábulo" de seu
ficados dessa terceira mensagem são formados pelos objetos reais sentido' sem recorrer à metalinguagem de uma definição: se a
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da cena, e os significantes por esses mesmos objetos fotografados, distinção permite descrever a estrutura da imagem de manei�a co:­
( pois é evidente que, na representação analógica, a relação entre a rente e simples, e se a descrição assim feita pr�para uma exp_h�açao
( coisa significada e a imagem significante, nãqsendo mais "arbitrária" _
do papel de imagem na sociedade, nós a consideramos Justificada.
(como é na língua), dispensa o refoi de um terceiro tenno, soba forma É, pois, necessário rever cada tipo de mensagem, explorando-a em
( da imagem psíquica do objeto. O que especifica essa terceira men­ sua generalidade, sem esquecer que buscamos compreender a estru­
( sagem é, na realidade, que a relação do significado e do significante tura da imagem em seu conjunto, isto é, a relação final das três n;�n­
é quase tautológica; sem dúvida, a fotografia implica uma certa or­ sagens entre si. Todavia, uma vez que já não se trata?� uma analise
( ganização da cena (enquadramento, redução, achatamento), mas essa "ingênua", e sim de uma descrição estrutural,5 mod1f1caremos um
( passagem não é uma transformação (como pode ser uma codifi­ pouco a ordem das mensagens, invert�n?º a mens�ger:1 cult�ral e a
cação); há aqui uma perda da equivalência (característica cios ver­ .
( mensagem literal; das duas mensagens 1cb111cas, a pnmelfaest.icomo
dadeiros sistemas de signos) e a posição de uma quase identidade. que gravada sobre a segunda: a mensagem literal apa�·ece como
( Em outras palavras, o signo dessa mensagem já não provém de uma suporte da mensagem "simbólica". Sabemos que um _ s1s�ema que
( reserva institucional, não é codificado, e trata-se de um paradoxo _
adota os signos de outro sistema, para deles fazer seus s1gn1f1cantes,
(ao qual voltaremos adiante) de uma mensar:em sem código. 4 Esta é um sistema de conotação; podemos, pois, desde já afirmar que a
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( particularidade é reencontrada ao nível do saber investido na leitura imagem literal é denotada, e a imagem simbólica é conotada. Es­
( ele uma mensagem: para "ler" este último (ou este primeiro) nível tudaremos sucessivamente a mensagem lingüística, a imagem de­
( da imagem, não necessitamos apenas o saber que está ligado à nossa notada e a imagem conotada.
percepção: não é nulo, pois que devemos saber o que é uma imagem
(as crianças só o aprendem por volta dos quatro anos) e o que são um
( tomate, uma sacola de compras, um pacote de massas: trata-se, no A MENSAGEM LINGÜÍSTICA
entanto, de um saber quase antropológico. Esta mensagem corres­
ponde, de certa forma, ao sentido da imagem, e vamos chamá-la A mensagem lingüística será constante? Haverá ser:1pre texto no
( mensagem literal, por oposição ú mensagem precedente, que é uma interior, abaixo ou à volta da imagem? Para encontrar imagens sem
mensagem simbólica. palavras, será, talvez, necessário remontar a s_ociedad� s parcialmente
(
Se n�ossa leitura é satisfatória, a fotografia anal isa da propõe-nos, _
analfabetas, isto é, uma espécie de estado p1ctográf1co da unagem;
( então, três mensagens: uma mensagem lingüística, uma mensagem na verdade, desde o aparecimento do 1 ivro, a vinculação texto­
icônica codificada e uma mensagem icônica não codificada. A imagem é freqüente, ligação que parece ter sid_o P?�co estuda ?.ª do
mensagem lingiiísticadistinguc-sc l"acilmc11tcdas duas oulras, mas, ,
ponto ele vista estrutural; qual é a estrutura s1gnif1cante da ilus­
tl!ndo a mcsnw substância (icônica), até quG ponto é lícito separá­ tração"? A imagem duplica certas informações do texto, por um
las? É verdade que a distinção entre as duas mensagens ieônicas não fenômeno de redundância, ou é o texto que acrescenta à imagem uma

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