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Trabalho da Aula III - Ciências Humanas e Ciências Exatas e o Tratamento

Epistemológico

Aluno: João Paulo de Lima

É possível transpor os instrumentos de conhecimento das ciências exatas e naturais para as


ciências humanas, como faz o objetivismo? Em primeiro lugar, deve-se levar em conta que
esses dois âmbitos do conhecimento (ciências humanas e ciências exatas) tem objetos de
estudo diferentes. Enquanto vemos uma objetividade nas ciências exatas, o mesmo não pode
ser visto nas ciências humanas, além de que nesta é impossível haver neutralidade, como
veremos mais adiante.
Para Lucien Goldmann, não é possível fazer essa transposição das ciências exatas para as
ciências humanas, tal qual faz o positivismo. O positivismo acredita que as leis que regem a
sociedade são como as leis da natureza, que são objetivas e neutras, e que as ciências
humanas devem buscar conhecer essas leis gerais da sociedade, de forma imparcial e neutra,
como se essas leis fossem fatos que independem da vontade ou da subjetividade do cientista
social e dos próprios individuos que compõem a sociedade, assim como é, por exemplo, a lei
da gravidade e as demais leis da física e das ciências exatas e naturais. Assim, para os
positivistas, é o que confere à sociologia e às demais ciências humanas o caráter de uma
ciência é essa mesma neutralidade que se encontra nas ciências da natureza. O sujeito, no
positivismo, é completamente separado do seu objeto de estudo. Assim como, por exemplo,
uma planta estudada por um biólogo é um objeto natural, objetivo e exterior ao sujeito (o
biólogo), para o positivismo o sujeito (o cientista social) é separado do seu objeto de estudo (a
sociedade).
Mas, para Goldmann, o sujeito e o objeto das ciências humanas não podem ser totalmente
separados, justamente porque o sujeito faz parte da própria sociedade a qual ele estuda. Além
disso, o seu objeto de estudo não apresenta a mesma regularidade e estabilidade que os
objetos das ciências naturais. Os seres humanos nem sempre apresentam essa regularidade, e
portanto nem sempre é possível prever as ações humanas, o que confere uma certa
imprevisibilidade sobre essas ações, levando a transformações bruscas na consciência, nas
ações e nas relações sociais.
Para Goldmann, essa unidade ou identidade entre sujeito e objeto nas ciências humanas, ainda
que sempre seja parcial e não total, vai ser uma questão fundamental para definir o que é
específico das ciências humanas.
Ele diz que nas ciências exatas e naturais existe, como já foi exemplificado, um objeto exterior
aos seres humanos, o que permite uma maior objetividade, já que o objeto é exterior aos seres
humanos, o que é não pode ser dito nas ciências humanas. E como já foi dito, para Goldmann,
nas ciências humanas, o objeto de pesquisa nunca é completamente exterior ao sujeito que o
estuda. Logo, para ele, o cientista social não pode ser completamente objetivo e
completamente neutro, justamente porque ele faz parte da própria sociedade, e ele interpreta
a sociedade à partir de sua própria perspectiva.
Nas natureza, é possível estabelecer leis gerais, objetivas e em grande parte inflexíveis,
enquanto que o mesmo não acontece na sociedade, onde vemos, ao longo da história
humana, diversas transformações das sociedades, onde formas anteriores de sociabilidade
(culturas, classes sociais, costumes, valores, ideias etc.) são transformadas, dando lugar a
novas formas de sociedade, que por si tem formas e leis de funcionamento diferentes das
sociedades anteriores. E ainda que essas diferentes épocas possam ter fatores em comum,
esses fatores geralmente são lugares comuns que mal se leva em consideração na hora de
compará-las, e o que na verdade mais salta a vista são as diferenças, do que as semelhanças,
que podem ser quase nenhuma. Por exemplo, toda as formas de vida em sociedade têm em
comum o fato de que todos os homens precisam trabalhar para poder sobreviver, isto é,
produzir ferramentas e transformar a natureza, a fim de obter os meios necessários para a sua
subsistência e para o seu desenvolvimento. Desde a pré-historia, passando por sociedades
tribais, a Antiguidade, o feudalismo, o capitalismo etc., vemos essa lei em comum, assim como
será em uma sociedade comunista. Mas essa lei é algo tão simples e um lugar-comum que não
nos permite conhecer essas sociedades em suas especificidades, e se não conhecemos o que
as diferencia, praticamente não conhecemos nada delas.
E essas transformações são feitas por sujeitos, que escolhem sua maneira de agir com maior
ou menor liberdade, com consciência ou não da consequência de seus atos. Logo, os humanos
tem certa autonomia, e suas ações nunca estão completamente pré-determinadas e nem são
ações inevitáveis que os humanos não tenham direito de decidir sobre seus atos, como por
exemplo defende Santo Agostinho, que encara os acontecimentos históricos como
regulamentados por Deus, e que portanto os homens não tem controle nenhum sobre si
mesmos, isto é, que são totalmente carentes de livre-arbítro, como se um indivíduo fosse
completamente impossível de agir diferentemente do que age.
Porém não significa que a ciência social não pode descobrir leis na sociedade e que tudo na
sociedade é relativo e impossível de captar tendências. Por exemplo, sabemos que existe uma
certa correlação entre mortalidade infantil e pobreza: as maiores taxas de mortalidade infantil
são referentes à crianças em situação de pobreza ou extrema-pobreza, enquanto que quanto
melhor é a situação econômica de uma criança, menos ela está propensa a morrer. Logo, aí se
vê um padrão, ou seja, uma lei tendencial. Tendencialmente, crianças pauperizadas tem mais
chances de morrerem. Ou seja, há uma correlação entre situação econômica e taxas de
mortalidade. Isso não explica todos os fatores que levam uma criança a morrer, e portanto é
uma explicação parcial, assim como todas as teorias, mas elabora leis tendenciais que captam
certos fatos concretos da realidade, permitindo que haja o fazer sociológico. Ao mesmo
tempo, são leis que, de acordo com as transformações da sociedade, podem perder toda a sua
validade, e é esse um dos motivos que dizemos que são leis tendenciais. O positivismo analisa
a realidade como algo dado; isto é, para o positivismo as coisas “são o que são”, e portanto,
não consegue captar a realidade como uma síntese de múltiplas transformações, que levam a
outras transformações, como já vimos, onde diferentes sociedades se sucedem ao longo da
história. Essas transformações e determinações só podem ser captados pelo método dialético.

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