Você está na página 1de 383

Copyright © 2015 por Richard H.

Thaler
Todos os direitos reservados.
TÍTULO ORIGINAL
Misbehaving
REVISÃO
Taís Monteiro
Victor Almeida
CAPA
Pete Garceau
IMAGEM DE CAPA
iStock/Thinkstock
ADAPTAÇÃO DE CAPA
Antonio Rhoden
REVISÃO DE E-BOOK
Manuela Brandão
GERAÇÃO DE E-BOOK
Intrínseca
E-ISBN
978-85-510-0414-2
Edição digital: 2019

1a edição
Todos os direitos desta edição reservados à
Editora Intrínseca Ltda.
Rua Marquês de São Vicente, 99, 3o andar
22451-041 – Gávea
Rio de Janeiro – RJ
Tel./Fax: (21) 3206-7400
www.intrinseca.com.br
Para:
Victor Fuchs, que me deu um ano para pensar, e Eric Wanner
e a Russell Sage Foundation, que apoiaram uma ideia maluca.

E para:
Colin Camerer e George Loewenstein, alunos dos primórdios
da economia comportamental.
SUMÁRIO
[Avançar para o início do texto]

Prefácio

I. PRIMÓRDIOS: 1970 – 78
1. Fatores supostamente irrelevantes
2. O efeito posse
3. A Lista
4. Teoria do Valor
5. California Dreamin’ – O sonho da Califórnia
6. A Manopla

II. CONTABILIDADE MENTAL: 1979 – 85


7. Pechinchas e enganações
8. Custos afundados
9. Baldes e orçamentos
10. Na mesa de pôquer

III. AUTOCONTROLE: 1975 – 88


11. Força de vontade? Não é problema
12. A planejadora e o fazedor

INTERLÚDIO
13. Desvios no mundo real

IV. TRABALHANDO COM DANNY: 1984 – 85


14. O que parece justo?
15. Jogos de justiça
16. Canecas

V. INTERAÇÕES COM ECONOMISTAS: 1986 – 94


17. Começa o debate
18. Anomalias
19. Formando uma equipe
20. Enquadramento estreito no Upper East Side

VI. FINANÇAS: 1983 – 2003


21. O concurso de beleza
22. A reação do mercado de ações é exagerada?
23. A reação à sobrerreação
24. O preço não está certo
25. A batalha dos fundos mútuos fechados
26. Moscas das frutas, icebergs e preços de ações negativos

VII. BEM-VINDO A CHICAGO: 1995 – PRESENTE


27. Instrução em direito
28. As salas de trabalho
29. Futebol americano
30. Game shows

VIII. PRESTANDO AJUDA: 2004 – PRESENTE


31. Save More Tomorrow
32. Indo a público
33. Nudge no Reino Unido

Conclusão: O que vem a seguir?

Notas
Bibliografia
Lista de figuras
Agradecimentos

Sobre o autor
Leia também
O alicerce da economia política e, em geral, de toda ciência
social é, evidentemente, a psicologia. Pode chegar o dia em que
seremos capazes de deduzir as leis da ciência social a partir dos
princípios da psicologia.1
— Vilfredo Pareto, 1906
PREFÁCIO

Antes de começarmos, eis aqui duas histórias sobre meus amigos e


mentores, Amos Tversky e Daniel Kahneman. Elas fornecem algumas
pistas sobre o que esperar deste livro.

Esforços para agradar Amos


Mesmo para aqueles que não conseguem lembrar onde deixaram as
chaves, a vida oferece momentos inesquecíveis. Alguns são acontecimentos
públicos. Se você for tão velho quanto eu, um desses momentos pode ser o
dia em que John F. Kennedy foi assassinado (primeiro ano de faculdade,
jogando basquete na quadra). Para qualquer um com idade suficiente para
estar lendo este livro, 11 de setembro de 2001 é outro desses momentos (eu
tinha acabado de acordar e escutava o rádio, tentando entender o que se
passava).
Outros acontecimentos são momentos pessoais: de casamentos até uma
tacada certeira de golfe. Para mim, um desses eventos foi um telefonema
de Danny Kahneman. Apesar de nos falarmos com frequência e haver
centenas de ligações que não deixaram nenhuma lembrança, recordo
precisamente de onde eu estava no momento em que recebi essa ligação
específica. Foi no começo de 1996, e Danny me ligou para dar a notícia de
que seu amigo e colaborador Amos Tversky estava com câncer terminal e
tinha uma expectativa de seis meses de vida. Fiquei tão atordoado que
precisei passar o telefone para minha esposa enquanto me recompunha.
Qualquer notícia de um bom amigo morrendo é chocante, mas a previsão
de falecimento de Amos Tversky aos 59 anos não parecia cabível. Amos,
cujos artigos e palestras eram perfeitos e cuja mesa tinha apenas um bloco
e um lápis alinhados em paralelo sobre ela, não encarou de forma
corriqueira a perspectiva de sua morte.
Ele tratou a notícia com discrição até não ser mais capaz de ir ao
trabalho. Antes disso, apenas um grupo pequeno sabia, no qual dois dos
meus amigos próximos estavam incluídos. Não tínhamos permissão de
contar o que sabíamos para ninguém exceto nossas esposas, então nos
revezamos para consolar uns aos outros durante os cinco meses em que
mantivemos essa terrível notícia apenas entre nós.
Amos não desejava tornar pública sua doença porque não queria
dedicar seus últimos meses representando o papel de moribundo. Havia
trabalho a fazer. Ele e Danny decidiram editar um livro, uma coletânea de
artigos de autoria deles e de outros no campo da psicologia no qual foram
pioneiros: o estudo do julgamento e da tomada de decisões. Chamaram o
livro de “Escolhas, valores e enquadramentos”.1 Amos queria basicamente
fazer as coisas de que mais gostava: trabalhar, passar o tempo com sua
família e assistir a jogos de basquete. Durante esse período, não incentivou
visitas de pessoas que desejassem lhe oferecer condolências, mas visitas “de
trabalho” eram permitidas, então fui vê-lo cerca de seis semanas antes de
ele morrer, sob o fino disfarce de terminar um artigo no qual vínhamos
trabalhando. Passamos algum tempo no artigo e aí assistimos a um jogo das
eliminatórias da NBA.
Amos foi sábio em praticamente todos os aspectos de sua vida, inclusive
ao lidar com a doença.2 Depois de consultar um especialista em Stanford
acerca de seu prognóstico, concluiu que arruinar seus meses finais com
tratamentos inúteis que o deixariam muito prostrado e, na melhor das
hipóteses, estenderiam sua vida em algumas semanas não era uma opção
muito tentadora. Sua sagacidade permaneceu afiada. Ele explicou ao seu
oncologista que o câncer não é um jogo de soma zero. “O que é ruim para
o tumor não é necessariamente bom para mim.” Um dia, em um
telefonema, perguntei-lhe como estava se sentindo. Ele respondeu: “Sabe,
é engraçado. Quando você pega uma gripe, parece que vai morrer, mas,
quando está morrendo, você se sente bem a maior parte do tempo.”
Amos faleceu em junho e o velório foi em Palo Alto, Califórnia, onde
ele e sua família moravam. Seu filho, Oren, fez um breve discurso na
cerimônia e citou um bilhete que Amos lhe escrevera dias antes de morrer:

Sinto que nos últimos dias a gente vem contando anedotas e eventos
com a intenção de que sejam lembrados, pelo menos por algum tempo.
Se bem me recordo, existe uma antiga tradição judaica de que história
e sabedoria são transmitidas de uma geração a outra não por meio de
aulas e livros, mas por meio de anedotas, eventos engraçados e piadas
apropriadas.

Depois do velório, os Tversky fizeram na sua casa a recepção da shivá,


tradicional luto judaico. Era uma tarde de domingo. Em certo momento,
alguns de nós fomos à sala de TV para pegar o fim de um jogo da NBA.
Sentimo-nos um pouco envergonhados, mas então o outro filho de Amos,
Tal, teve a iniciativa de dizer: “Se Amos estivesse aqui, teria votado a favor
de gravarmos o velório e assistir ao jogo.”
Desde que conheci Amos, em 1977, passei a aplicar um teste
extraoficial a todo artigo que eu escrevia: “Será que Amos aprovaria este
artigo?” Meu amigo Eric Johnson, que vocês conhecerão mais adiante,
pode atestar que um artigo que escrevemos juntos levou três anos para ser
publicado depois de ter sido aceito por uma revista especializada. O editor,
os pareceristas e Eric estavam todos contentes com o artigo, mas Amos
estava incomodado com um ponto e eu queria atender à sua objeção.
Fiquei atracado com aquele artigo, enquanto o coitado do Eric vinha
tentando uma promoção acadêmica sem ter o texto em seu currículo.
Felizmente, Eric havia escrito uma profusão de outros artigos fortes, então
meu entrave não lhe custou o cargo. Com o tempo, Amos acabou ficando
satisfeito.
Ao escrever este livro, levei a sério o bilhete de Amos para Oren. O livro
não é do tipo que se poderia esperar de um professor de economia. Não é
nem um tratado nem uma controvérsia. É claro que haverá discussões
sobre pesquisas, mas haverá também os episódios interessantes, as histórias
(possivelmente) engraçadas e até mesmo a piada peculiar.

Danny, a respeito das minhas melhores qualidades


Certo dia, no começo de 2001, eu estava visitando Danny Kahneman em
sua casa, em Berkeley. Estávamos na sala jogando conversa fora, como
muitas vezes fazemos. De repente, Danny se lembrou de que tinha
combinado uma ligação telefônica com Roger Lowenstein, um jornalista
que estava escrevendo um artigo sobre o meu trabalho para a New York
Times Magazine.3 Roger, autor do conhecido livro Quando os gênios
falham,4 entre outros, naturalmente queria conversar com meu velho
amigo Danny. Aqui surgiu um dilema. Eu devia sair da sala ou escutar a
conversa? “Fique”, disse Danny, “vai ser divertido.”
A entrevista começou. Ouvir um amigo contar uma velha história a seu
respeito não é muito empolgante, e ouvir alguém elogiando você é sempre
constrangedor. Peguei alguma coisa para ler, e a minha atenção vagou para
outros temas — até que ouvi Danny dizer: “Ah, a melhor coisa em relação
ao Thaler, o que realmente o torna especial, é que ele é preguiçoso.”
O quê? É isso mesmo? Eu jamais negaria que sou preguiçoso, mas será
que Danny achava que a minha preguiça era a minha única grande
qualidade? Comecei a agitar as mãos e balançar loucamente a cabeça, mas
Danny continuou, exaltando as virtudes da minha indolência. Até hoje, ele
insiste que foi um grande elogio. A minha preguiça, afirma ele, significa
que eu trabalho apenas em questões suficientemente intrigantes para
superar essa tendência negligente de evitar a labuta. Só mesmo Danny
para transformar a minha preguiça em qualidade.
Mas aí está. Antes de seguir com a leitura, você deve ter em mente que
este livro foi escrito por um homem comprovadamente preguiçoso. O lado
positivo é que, segundo Danny, só vou incluir coisas que sejam
interessantes, pelo menos para mim.5
I
PRIMÓRDIOS
1970 – 78
1

FATORES SUPOSTAMENTE IRRELEVANTES

Bem cedo na minha carreira de professor, sem querer consegui irritar a


maioria dos meus alunos do curso de microeconomia; e, por incrível que
pareça, não teve nada a ver com algo que eu tenha dito em aula. O
problema foi causado por um exame.
Eu tinha composto uma prova para distinguir três amplos grupos de
alunos: os astros, que realmente dominavam a matéria; o grupo
intermediário, que compreendia os conceitos básicos; e o grupo de baixo,
que simplesmente não entendia nada. Para ter sucesso nessa tarefa, o
exame devia ter algumas questões que apenas os alunos de nível mais alto
poderiam acertar, o que indicava a dificuldade do teste. Tive êxito na
minha meta — houve uma grande variação de resultados —, mas os alunos
ficaram em polvorosa quando receberam as notas. A principal queixa era
que a média tinha sido de só 72 pontos em 100.
A reação foi inusitada porque essa média numérica não tinha nenhum
efeito na distribuição das notas de avaliação, pois, nos critérios de
classificação de desempenho daquela escola, a nota média era B ou B+, e
apenas um reduzido número de alunos ficava com avaliação abaixo de C.
Eu havia antecipado a possibilidade de que uma média numérica baixa
pudesse causar alguma confusão, então informei em classe como os
números seriam traduzidos nas notas reais. Qualquer coisa acima de 80
ganharia A ou A–, resultados acima de 65 ficariam com alguma variação de
B, e somente resultados abaixo de 50 corriam perigo de ficar com uma
avaliação inferior a C. Essa distribuição de notas não era diferente da
usual, mas esse anúncio não teve nenhum efeito aparente no ânimo dos
alunos. Eles continuaram detestando meu exame e tampouco estavam
muito contentes comigo. Como jovem professor, preocupado em manter o
meu emprego, eu estava determinado a fazer alguma coisa em relação a
isso, mas não queria deixar os meus exames mais fáceis. O que fazer?
Finalmente, uma ideia me ocorreu. No exame seguinte, fiz com que o
número total de pontos possíveis fosse 137 em vez de 100. Essa versão
acabou ficando um pouquinho mais difícil que a primeira, com os alunos
acertando apenas 70% das respostas, mas a média numérica foi de
animadores 96 pontos. Os alunos ficaram encantados! A nota real de
ninguém foi afetada por essa mudança, mas todo mundo ficou feliz. Desse
momento em diante, sempre que ministrava o curso, dava exames com um
total de 137 pontos, número que escolhi por dois motivos. Primeiro,
porque produzia uma média acima dos 90 pontos, com alguns alunos
chegando a alcançar resultados acima de 100, o que gerava uma reação
que beirava o êxtase. Segundo: como a divisão por 137 não era fácil de
fazer de cabeça, a maioria dos alunos não se dava ao trabalho de converter
os resultados em porcentagens. Para que você não pense que eu os estava
enganando, em anos subsequentes incluí a seguinte declaração impressa
em negrito no programa de estudos do curso: “Os exames terão um total de
137 pontos em vez dos habituais 100. Este sistema de pontuação não tem
efeito na nota de avaliação que você recebe no curso, mas parece que
deixa você mais contente.” E, de fato, depois que fiz a mudança, nunca
mais ouvi uma única queixa de que meus exames eram difíceis demais.
Aos olhos de um economista, meus alunos estariam exibindo um
comportamento “desviante” (misbehave). Com isso, quero dizer que suas
ações eram inconsistentes com o modelo idealizado de comportamento
que está no cerne daquilo que chamamos teoria econômica. Para um
economista, uma pontuação de 96 em 137 (70%) em vez de 72 em 100
não apresenta motivos para deixar alguém mais contente, mas meus alunos
ficaram. Ao perceber isso, fui capaz de montar o tipo de exame que queria
e ainda assim impedir que os alunos ficassem resmungando.
Há quatro décadas, desde o meu tempo de estudante de pós-graduação,
venho me ocupando com relatos que contenham alguma das infinitas
maneiras pelas quais pessoas reais diferem das criaturas ficcionais que
habitam os modelos econômicos. Nunca foi minha intenção dizer que há
algo de errado com as pessoas; nós somos apenas seres humanos — Homo
sapiens. Na verdade, o problema está no modelo usado pelos economistas,
um modelo que substitui o Homo sapiens por uma criatura ficcional
chamada Homo economicus, que gosto de chamar abreviadamente de
Econ. Em comparação com esse mundo imaginário de Econs, os
Humanos incidem em vários desvios, e isso significa que os modelos
econômicos fazem uma porção de previsões ruins, que podem ter
consequências muito mais sérias do que aborrecer um grupo de
estudantes. Quase nenhum economista previu a chegada da crise de 2007-
08.1 Pior, muitos acharam que tanto o colapso quanto suas consequências
eram impossíveis de acontecer.
Ironicamente, a existência de modelos formais baseados nessa
concepção errônea do comportamento humano é o que confere à
economia sua reputação como a mais poderosa das ciências sociais, de
duas maneiras distintas. A primeira é indiscutível: de todos os cientistas
sociais, os economistas têm o predomínio da influência em políticas
públicas. Na verdade, a economia detém um controle quase integral sobre
a assessoria para políticas públicas. Até bem recentemente, cientistas
sociais de outras áreas quase não eram convidados à mesa e, quando isso
acontecia, ficavam relegados ao equivalente da mesa das crianças em um
encontro de família.
A segunda maneira é a intelectual, pois a economia é considerada a
mais potente das ciências sociais nesse quesito. Esse poder deriva do fato
de a economia ter uma teoria unificada, central, da qual provém quase
todo o restante. Se você usa a expressão “teoria econômica”, as pessoas
sabem a que você está se referindo. Nenhuma outra ciência social tem
uma fundação semelhante. Ao contrário, teorias em outras ciências sociais
tendem a se voltar a propósitos específicos, para explicar o que acontece
em um determinado conjunto de circunstâncias. Na verdade, os
economistas frequentemente comparam a economia com a física; assim
como a física, ela é construída a partir de algumas premissas centrais.
A premissa central da teoria econômica é que as pessoas escolhem por
otimização. De todos os bens e serviços a adquirir, uma família opta pelo
melhor dentro de suas possibilidades de compra. Mais ainda, presume-se
que as crenças que motivam as escolhas dos Econs sejam imparciais. Isto é,
nós escolhemos com base naquilo que os economistas chamam de
“expectativas racionais”. Se pessoas começando um novo negócio
acreditam que sua chance de dar certo é, em média, de 75%, então esta
deve ser uma estimativa boa do número real de negócios que dão certo. Os
Econs não incorrem em excesso de confiança.
Essa premissa de otimização condicionada, ou seja, escolher o melhor a
partir de um orçamento limitado, combina-se com outro cavalo de batalha
essencial da teoria econômica, o do equilíbrio. Em mercados competitivos
onde os preços são livres para subir e descer, eles flutuam de tal modo que
a oferta é igual à demanda. Para simplificar um pouco, podemos dizer que
Otimização + Equilíbrio = Economia. Essa é uma combinação poderosa,
algo a que as outras ciências sociais não conseguem se equiparar.
Existe, no entanto, um problema: as premissas sobre as quais a teoria
econômica se fundamenta são falhas. Em primeiro lugar, os problemas de
otimização que as pessoas comuns enfrentam são muitas vezes difíceis
demais para que elas os resolvam ou sequer cheguem perto de resolver. Até
mesmo uma ida a uma mercearia de tamanho razoável oferece ao
comprador milhões de combinações de itens que estão dentro do
orçamento familiar. Será que a família realmente escolhe a melhor? E, é
claro, nós nos deparamos com problemas muito mais difíceis do que uma
ida à mercearia, tais como escolher uma carreira, a hipoteca da casa ou um
cônjuge. Dados os índices de fracasso que observamos em todos esses
domínios, seria difícil defender o ponto de vista de que todas essas escolhas
são ideais.
Em segundo lugar, as crenças a partir das quais as pessoas fazem suas
escolhas não deixam de ser enviesadas. Excesso de confiança pode ser um
termo inexistente no dicionário dos economistas, mas é uma característica
bem estabelecida da natureza humana, e há incontáveis outros vieses que
têm sido documentados pelos psicólogos.
Terceiro: há muitos fatores que o modelo de otimização deixa de fora,
como ilustra a minha história sobre o exame de 137 pontos. Em um
mundo de Econs, há uma longa lista de coisas que são supostamente
irrelevantes. Mesmo faminto ao fazer compras no domingo, nenhum Econ
compraria uma porção particularmente grande daquilo que pretende
jantar só na terça-feira; a sua fome de domingo deveria ser irrelevante para
a escolha do tamanho da sua refeição de terça. Se já estivesse satisfeito, um
Econ não comeria toda a enorme refeição de terça-feira só porque pagou
por ela e detesta desperdício; para um Econ, o preço pago no passado por
algum alimento não é relevante para a decisão sobre quanto comer agora.
Um Econ também não esperaria um presente no aniversário de casamento
ou nascimento — que diferença faz uma data? — e ficaria perplexo com a
simples ideia de dar presentes. Um Econ saberia que o melhor presente
possível é dinheiro vivo; ele permite que o presenteado compre qualquer
coisa que considere ideal. Mas, a menos que você seja casado com uma
economista, não aconselho a dar dinheiro vivo no seu próximo aniversário
de casamento. Pensando bem, mesmo que a sua esposa seja economista,
provavelmente não é uma boa ideia.
Você sabe, e eu sei, que não vivemos em um mundo de Econs.
Vivemos em um mundo de Humanos. E, igualmente, a maioria dos
economistas também é humana, portanto sabem que não vivem em um
mundo de Econs. Adam Smith, o pai do pensamento econômico
moderno, reconheceu explicitamente esse fato. Antes de escrever A riqueza
das nações, seu opus magnum, escreveu um livro dedicado ao tópico das
“paixões” humanas,2 uma palavra que não aparece em nenhum livro-texto
de economia. Econs não têm paixões; são otimizadores de sangue-frio.
Pense no Sr. Spock de Star Trek.
No entanto, esse modelo de comportamento econômico baseado em
uma população constituída apenas de Econs floresceu, alçando a
economia ao pedestal de influência no qual ela agora se encontra. Críticas
ao longo dos anos têm sido varridas por uma profusão de desculpas pobres
e alternativas implausíveis cujas explicações partem de evidências
empíricas constrangedoras. Mas, uma a uma, essas críticas têm sido
amparadas por uma série de estudos que aumentaram progressivamente as
apostas em jogo. É fácil desconsiderar uma história acerca das notas de um
exame. É mais difícil desconsiderar estudos que documentam escolhas
ruins em domínios de altos montantes, como poupança para
aposentadoria, escolha de uma hipoteca ou investimentos no mercado de
ações. E é impossível desconsiderar a série de explosões de crescimento,
bolhas e colapsos que observamos nos mercados financeiros, a começar por
19 de outubro de 1987, dia em que os preços das ações caíram mais de
20% em todo o mundo, mesmo sem qualquer outra má notícia relevante.
Isso foi seguido por uma bolha e um colapso nas ações de tecnologia que
rapidamente viraram uma bolha no mercado imobiliário, a qual, por sua
vez, causou uma crise financeira global ao rebentar.
É hora de parar de inventar desculpas. Precisamos de uma abordagem
enriquecida para fazer pesquisas econômicas, uma abordagem que
reconheça a existência e relevância dos Humanos. A boa notícia é que não
precisamos jogar fora tudo que sabemos acerca do funcionamento de
economias e mercados. Teorias baseadas na premissa de que todo mundo é
um Econ não devem ser descartadas. Elas continuam sendo úteis como
ponto de partida para modelos mais realistas. E, em algumas circunstâncias
especiais, como problemas de fácil resolução ou com pessoas altamente
especializadas nas habilidades relevantes ao caso, modelos de Econs
podem fornecer uma boa aproximação do que acontece no mundo real.
Mas, como veremos, essas situações são a exceção, e não a regra.
Além disso, muito do que os economistas fazem é coletar e analisar
dados sobre o funcionamento dos mercados, trabalho feito com cuidado e
conhecimento estatístico, e, muito importante salientar, a maioria dessas
pesquisas não depende da premissa de que as pessoas otimizam. Duas
ferramentas de pesquisa que emergiram nos últimos 25 anos expandiram
imensamente o alcance dos economistas para o estudo do mundo. A
primeira é o uso de experimentos por meio de testes controlados
randomizados, há muito tempo em uso em outros campos científicos,
como a medicina. O estudo típico investiga o que acontece quando
algumas pessoas recebem algum “tratamento” de interesse. A segunda
abordagem é o uso tanto de experimentos que ocorram naturalmente —
por exemplo, quando algumas pessoas estão inscritas em um curso e outras
não — quanto de técnicas econométricas inteligentes que consigam
detectar o impacto de tratamentos, ainda que ninguém tenha planejado a
situação para esse propósito. Essas novas ferramentas geraram estudos sobre
uma vasta gama de tópicos importantes para a sociedade. Entre os
“tratamentos” estudados, incluem-se o aumento do nível educacional, o
ensino em uma turma menor ou com um professor melhor, o
oferecimento de consultorias administrativas, a ajuda na procura de
emprego, a condenação à prisão, a mudança para um bairro menos pobre,
o atendimento médico de um serviço público de saúde, e assim por diante.
Esses estudos mostram que é possível aprender muita coisa sobre o mundo
sem impor modelos baseados em otimização e, em alguns casos, fornecem
evidências seguras com as quais é possível testar tais modelos e averiguar se
eles se encaixam nas respostas humanas reais.
A premissa de que todos os agentes estão otimizando não é fundamental
para boa parte da teoria econômica, mesmo que a população em estudo
seja de especialistas. Por exemplo, é bastante segura a predição de que uma
baixa no preço do fertilizante faz com que os agricultores o utilizem em
maior quantidade, mesmo que muitos deles demorem a mudar suas
práticas em resposta às condições de mercado. A predição é segura porque
é vaga: ela revela apenas a direção para a qual se encaminha o resultado.
Isto equivale a prever que, quando maçãs caírem da árvore, elas cairão para
baixo e não para cima. A previsão está certa no que afirma, mas não é
exatamente a lei da gravidade.
Os economistas se metem em apuros quando fazem alguma previsão
altamente específica que depende de todo mundo ser economicamente
sofisticado. Voltemos ao exemplo da agricultura. Digamos que os cientistas
descubram que os agricultores teriam melhores resultados usando mais, ou
menos, fertilizante do que tem sido o costume. Caso se pressuponha que as
pessoas fazem a coisa certa uma vez que tenham a informação adequada,
então a única receita para uma política apropriada é tornar tal informação
acessível a todos. Publicar essas descobertas, torná-las prontamente
acessíveis aos agricultores e deixar a magia dos mercados cuidar do resto.
A menos que todos os agricultores sejam Econs, este é um mau
conselho. Talvez empresas multinacionais de alimentos sejam rápidas em
adotar os mais recentes achados de pesquisa, mas e o comportamento de
camponeses agricultores3 na Índia ou na África?
De maneira similar, se você acredita que todo mundo vai poupar
exatamente a quantia certa para a aposentadoria — como qualquer Econ
faria — e concluir a partir dessa análise que não há razão para ajudar as
pessoas a poupar — digamos, criando planos de previdência —, então
estará perdendo a chance de melhorar a situação de muita gente. E, se
você acredita que bolhas financeiras são teoricamente impossíveis e é o
responsável por um banco central, então poderá cometer erros sérios — o
que Alan Greenspan, para seu crédito, admitiu ter acontecido com ele.
Não precisamos parar de inventar modelos abstratos que descrevam o
comportamento de Econs imaginários. Porém, precisamos parar de
presumir que esses modelos são descrições acuradas do comportamento e
parar de basear decisões sobre políticas em tais análises falhas. E temos que
começar a prestar atenção àqueles fatores supostamente irrelevantes, que
daqui por diante chamarei abreviadamente de FSIs.
Se já é difícil mudar a mentalidade das pessoas em relação ao que
comem no café da manhã, imagine em relação aos problemas nos quais
trabalharam a vida toda. Durante anos, muitos economistas resistiram
intensamente ao apelo de basear seus modelos em caracterizações mais
precisas do comportamento humano. Mas graças a um influxo de
economistas jovens e criativos, dispostos a assumir alguns riscos e romper
com os modos tradicionais de fazer economia, o sonho de uma versão
enriquecida de teoria econômica está sendo realizado. O campo veio a se
tornar conhecido como “economia comportamental”. Não se trata de outra
disciplina: ainda é economia, mas é economia feita com fortes
contribuições de boa psicologia e de outras ciências sociais.
A razão básica para adicionar Humanos às teorias econômicas é
melhorar a acurácia das predições feitas a partir delas. Mas há outro
benefício em incluir pessoas reais à mistura. A economia comportamental
é mais interessante e mais divertida do que a economia tradicional. É a
ciência não sombria.4
A economia comportamental é agora um ramo em crescimento, e seus
adeptos podem ser encontrados nas melhores universidades ao redor do
mundo. Economistas e cientistas comportamentais estão se tornando, de
forma mais ampla, uma pequena parte do establishment responsável pela
criação de políticas públicas em tempos recentes. Em 2010, o governo do
Reino Unido formou uma equipe de análises comportamentais, o
Behavioural Insights Team, e agora outros países estão se juntando a esse
movimento para criar equipes especiais com a missão de incorporar os
achados de outras ciências sociais à formulação de políticas públicas. O
mundo dos negócios também está aderindo, percebendo que uma
compreensão mais profunda do comportamento humano é tão importante
para dirigir um empreendimento bem-sucedido quanto a compreensão de
demonstrações financeiras e a gestão de operações. Afinal, são Humanos
que dirigem empresas, e seus funcionários e clientes também são
Humanos.
Este livro é a história de como isso aconteceu, ou melhor, de como eu
vi acontecer. Embora não tenha feito toda a pesquisa — como vocês já
sabem, sou preguiçoso demais para isso —, eu estava por perto no começo
e participei do movimento que criou esse campo. Seguindo o dito de
Amos, haverá muitas histórias pela frente, porém os meus principais
objetivos são contar a narrativa de como tudo aconteceu e explicar algumas
das coisas que aprendemos pelo caminho. Sem nenhuma surpresa, houve
muitas querelas com tradicionalistas que defendiam a maneira usual de se
lidar com economia. Esses atritos nem sempre foram divertidos na época,
mas, como uma experiência de viagem ruim, dão boas histórias depois, e a
necessidade de lutar essas batalhas tornou o campo mais forte.
Como qualquer outra história, esta não segue em progressão linear, com
uma ideia levando naturalmente a outra. Muitas ideias foram se infiltrando
em épocas diferentes e com velocidades diferentes. Como resultado, a
estrutura organizacional do livro é, ao mesmo tempo, cronológica e por
tópicos. Eis uma breve prévia. Começamos nos primórdios, lá longe, na
época em que eu era aluno de pós-graduação e estava coletando exemplos
para uma lista de comportamentos estranhos que não pareciam se encaixar
nos modelos que estava aprendendo em aula. A primeira seção do livro é
dedicada àqueles primeiros anos em mata virgem e descreve alguns dos
desafios que foram lançados pelos muitos que questionavam o valor dessa
empreitada. Voltamo-nos então para a série de tópicos que ocuparam a
maior parte da minha atenção durante os primeiros 15 anos da minha
carreira de pesquisa: contabilidade mental, autocontrole, justiça e finanças.
Meu objetivo é explicar o que meus colegas e eu aprendemos ao longo do
caminho, de modo que você mesmo possa usar essas percepções para
melhorar a sua compreensão sobre seus colegas Humanos. Mas também
pode haver lições proveitosas sobre como tentar mudar a maneira como as
pessoas pensam sobre as coisas, especialmente quando fazem um grande
investimento na manutenção do status quo. Posteriormente, voltamo-nos
para esforços de pesquisa mais recentes, desde o comportamento dos
motoristas de táxi em Nova York, passando pelo recrutamento de jogadores
na NFL — a liga de futebol americano —, até o comportamento de
participantes em programas de apostas com valores altos na TV. No final,
chegamos a Londres, ao número 10 da Downing Street, onde está
emergindo um novo conjunto de desafios e oportunidades animadores.
Meu único conselho para ler o livro é parar de ler quando ele deixar de
ser divertido. Se fizer o contrário disso, bem, isso seria apenas mais um
desvio.
2

O EFEITO POSSE

Comecei a ter ideias divergentes sobre teoria econômica quando era aluno
de pós-graduação no departamento de economia da Universidade de
Rochester, localizada no interior do estado de Nova York. Embora tivesse
receios em relação a parte do material apresentado nas minhas aulas, não
conseguia afirmar se o problema estava na teoria ou na minha
compreensão falha da matéria. Eu não era nenhum gênio. Naquele artigo
de Roger Lowenstein para a New York Times Magazine, o orientador da
minha tese, Sherwin Rosen, fez a seguinte avaliação da minha carreira
como aluno de pós-graduação: “Não esperávamos muito dele.”
O tópico da minha tese soava provocativo — “O valor de uma vida” —,
mas a abordagem era convencional do início ao fim. Conceitualmente, o
modo apropriado de pensar nessa questão foi captado pelo economista
Thomas Schelling no seu maravilhoso ensaio intitulado “A vida que você
salva pode ser a sua”. Muitas vezes meus interesses se cruzaram com os de
Schelling, um dos primeiros simpatizantes e colaboradores do que agora
chamamos de economia comportamental. Eis uma passagem famosa do
seu ensaio:

Imagine uma menina com seis anos de idade e cabelos castanhos.


Ela precisa de milhares de dólares para uma operação que
prolongará sua vida até o Natal: a agência de correio receberá uma
enxurrada de moedas e trocados para salvá-la. Mas se sair uma
reportagem dizendo que, sem o repasse de impostos, as instalações
do hospital de Massachusetts se deteriorarão e haverá um aumento
quase imperceptível de mortes evitáveis, pouquíssimas pessoas vão
deixar cair uma lágrima ou correr para pegar o talão de cheques.1

Schelling escreve do mesmo jeito que fala: com um sorriso irônico e


um brilho travesso no olhar. Ele quer deixar você um pouco
desconfortável.2 Aqui, a história da menina doente é uma forma vívida de
captar a principal contribuição do artigo. O hospital representa o conceito
que Schelling chama de “vida estatística”, em oposição à menina, que
representa uma “vida identificada”. Ocasionalmente nos deparamos no
mundo real com exemplos de vidas identificadas em risco, tais como o
emocionante resgate dos mineiros soterrados. Conforme observa Schelling,
raramente permitimos que qualquer vida identificada seja extinta
unicamente pela falta de dinheiro. Mas é claro que milhares de pessoas
“não identificadas” morrem diariamente por falta de coisas simples como
mosquiteiros, vacinas ou água limpa.
Ao contrário da menina doente, uma típica decisão de política pública
em âmbito doméstico é abstrata. Carece de impacto emocional. Suponha
que estejamos construindo uma nova rodovia e os engenheiros de
segurança nos digam que fazer a faixa divisória central 1 metro mais larga
custará US$42.000.000,00 e evitará 1,4 acidentes fatais por ano durante 30
anos. Será que devemos fazer? É claro que não sabemos a identidade
dessas vítimas. São “meramente” vidas estatísticas. Mas para decidir a
largura da faixa central precisamos de um valor a ser atribuído a essas vidas
prolongadas, ou, mais nitidamente, “salvas” por essa despesa. Em um
mundo de Econs, a sociedade não pagaria mais para salvar uma vida
identificada do que para salvar 20 vidas estatísticas.
Conforme observou Schelling, a pergunta certa interroga quanto os
usuários dessa rodovia — e talvez seus amigos e familiares — estariam
dispostos a pagar para tornar cada viagem um pouquinho mais segura.
Schelling havia formulado a pergunta correta, mas ainda não tinha
aparecido ninguém com uma forma de respondê-la. Para resolver o
problema, precisa-se de alguma situação na qual as pessoas façam escolhas
que envolvam um trade-off entre dinheiro e risco de morte. Daí é possível
inferir a disposição delas em pagar por segurança. Mas onde observar tais
escolhas?
O economista Richard Zeckhauser, aluno de Schelling, observou que a
roleta-russa oferece um meio de se pensar sobre o problema. Eis aqui uma
adaptação do seu exemplo. Suponha que Aidan seja solicitado a jogar
roleta-russa com uma metralhadora com muitas câmaras, digamos 1.000,
das quais quatro foram escolhidas ao acaso para terem munição. Aidan
deve puxar o gatilho uma vez. (A arma está regulada para tiro único,
felizmente.) Quanto Aidan estaria disposto a pagar para remover uma bala?
3 Embora a formulação da roleta-russa de Zeckhauser apresente o
problema de forma elegante, não nos ajuda a obter nenhum número.
Conduzir experimentos nos quais sujeitos apontam uma arma carregada
para a própria cabeça não constitui um método factível para obtenção de
dados.
Enquanto ponderava sobre essas questões, tive uma ideia. Suponha que
eu pudesse obter dados sobre as taxas de mortalidade de diversas profissões,
inclusive ocupações perigosas como mineração, derrubada de árvores e
limpeza de vidraças em arranha-céus, e ocupações mais seguras como
agricultura, vendas e limpeza de janelas em casas baixas. Em um mundo
de Econs, os serviços mais arriscados teriam que pagar mais, caso contrário
ninguém os faria. Na verdade, os adicionais aos serviços mais perigosos
precisariam recompensar os trabalhadores por assumirem os riscos
envolvidos, além dos outros aspectos do trabalho. Assim, se eu também
pudesse obter dados sobre o salário de cada ocupação, poderia estimar o
número sugerido pela análise de Schelling, sem pedir a ninguém que
jogasse roleta-russa. Procurei, mas não consegui encontrar nenhuma fonte
de taxas de mortalidade por ocupação.
Meu pai, Alan, veio em meu auxílio. Ele era atuário, um desses tipos
matemáticos que desenvolvem maneiras de calcular risco para companhias
de seguros. Perguntei-lhe se ele seria capaz de conseguir dados de
mortalidade por ocupação. Logo recebi um exemplar fino, vermelho, de
capa dura, de um livro publicado pela Society of Actuaries que listava
exatamente os dados de que eu precisava. Associando dados de salário por
categoria profissional — os quais são facilmente acessíveis — com as taxas
de mortalidade por ocupação, pude estimar a quantia a oferecer para que
as pessoas aceitem um trabalho com um risco de morte mais alto.
Ter a ideia e obter os dados foi um bom começo, mas fazer o exercício
estatístico corretamente era essencial. Eu precisava achar um orientador no
departamento de economia que pudesse se interessar por minha tese. A
escolha óbvia era o promissor economista do trabalho mencionado antes,
Sherwin Rosen. Nunca tínhamos trabalhado juntos, mas o tema da minha
tese estava relacionado com um trabalho teórico que ele estava fazendo,
então Sherwin concordou em se tornar meu orientador.
Seguimos adiante e publicamos em coautoria um artigo baseado na
minha tese, intitulado, naturalmente, “O valor de salvar uma vida”.4
Versões atualizadas dos números que estimamos naquela época ainda são
usadas em análises governamentais de custo-benefício. A estimativa
corrente é de aproximadamente US$7.000.000,00 por vida salva.
Enquanto trabalhava na minha tese, achei interessante a ideia de fazer
algumas perguntas hipotéticas às pessoas, como outro modo de elicitar
preferências referentes aos trade-offs entre dinheiro e risco de morte. Para
redigir essas questões, primeiro eu precisava me decidir entre as duas
formas de fazer a pergunta: “disposição a pagar” ou “disposição a receber”.
A primeira indaga quanto você pagaria para reduzir a sua probabilidade de
morrer no próximo ano para, digamos, uma chance de 1 em 1.000.
Considerando essa mesma proporção, a segunda indaga quanto dinheiro
você exigiria para permitir um aumento em seu risco de morte. Como
contexto, tenha em mente que um morador de 50 anos nos Estados Unidos
enfrenta um risco de morte anual de aproximadamente 4 em 1.000.
Eis uma questão típica que apresentei no ambiente da sala de aula. Os
alunos responderam a ambas as versões da questão.

A. Suponha que, assistindo a esta aula, você tenha se exposto a uma


rara doença fatal. Caso contraia a doença, você terá uma morte
rápida e indolor em algum momento da próxima semana. A chance
de contágio é de 1 em 1.000. Contra a doença, temos uma única
dose de antídoto, a qual venderemos a quem fizer a oferta mais alta.
Se você tomar esse antídoto, o risco de morrer pela doença cai para
zero. Qual é o máximo que você estaria disposto a pagar pelo
antídoto? (Caso você não tenha dinheiro, nós lhe emprestaremos o
valor a ser pago pelo antídoto, com taxa zero de juros e 30 anos para
ressarcimento.)

B. Pesquisadores no hospital da universidade estão fazendo uma


pesquisa sobre a mesma doença rara. Eles precisam de voluntários
dispostos a ficar por cinco minutos em uma sala e se expor ao mesmo
risco de contágio (chance de 1 em 1.000 e de uma morte rápida e
indolor na próxima semana). Não haverá antídoto disponível. Qual é
a quantia mínima em dinheiro que você exigiria para participar dessa
pesquisa?

A teoria econômica tem uma forte premissa sobre como as pessoas


deveriam responder às duas versões dessa pergunta. As respostas deveriam
ser praticamente iguais. Para uma pessoa de 50 anos respondendo, o trade-
off entre dinheiro e risco de morte não deveria ser muito discrepante entre
as duas opções: passar de um risco de 0,005 (5 em 1.000) para 0,004 (4 em
1.000) na pergunta A; passar de um risco de 0,004 para 0,005 na versão B.
As respostas variaram largamente entre os participantes, mas um padrão
claro veio à tona: as respostas às duas perguntas não chegaram nem perto
de ser iguais. Respostas típicas seguiam mais ou menos esta linha: “Eu não
pagaria mais de US$2.000,00 na versão A, mas não aceitaria menos do que
U$500.000,00 na versão B.” Na verdade, muitos participantes afirmaram
na versão B que não participariam do estudo por valor nenhum.
A teoria econômica não está sozinha quando diz que as respostas
deveriam ser idênticas. A consistência lógica exige isso. Mais uma vez,
considere uma pessoa de 50 anos que, antes de cruzar comigo, tinha uma
chance de 0,004 de morrer no próximo ano. Suponha que ela dê as
respostas do parágrafo anterior: US$2.000,00 para o cenário A e
US$500.000,00 para o cenário B. A primeira resposta implica que o
aumento de 0,004 para 0,005 só deixa sua situação pior em US$2.000,00,
já que ele não estaria disposto a pagar mais para evitar o acréscimo no
risco. Porém, sua segunda resposta diz que ele não aceitaria o mesmo
aumento no risco por menos de $500.000,00. Claramente, a diferença
entre um risco de 0,004 e de 0,005 não pode ser no máximo $2.000,00 e no
mínimo $500.000,00!
Essa verdade não é visível para todo mundo. Na realidade, mesmo
quando explicada, muita gente resiste, como você deve estar fazendo neste
exato momento. Mas a lógica é inescapável.5 Para um economista, essas
descobertas recaem em um ponto entre o intrigante e o absurdo. Eu os
mostrei a Sherwin, e ele me disse para parar de perder meu tempo e voltar
a trabalhar na minha tese. Mas eu já tinha sido fisgado. O que estava
acontecendo ali? Com toda certeza, o cenário pôr-sua-vida-em-risco era
inusitado, mas uma vez tendo começado a buscar exemplos, eu os
encontrei por toda parte.
Um caso veio de Richard Rosett, o chefe do departamento de
economia. Como colecionador veterano de vinhos, ele me disse que na
sua adega tinha garrafas que havia comprado muito tempo atrás por
US$10,00 e que agora valiam mais de US$100,00. Na verdade, um
comerciante de vinhos local chamado Woody estava disposto a comprar
algumas das garrafas mais antigas de Rosett pelos preços correntes. Rosett
disse que abria uma dessas garrafas em ocasiões especiais, mas jamais
sonharia em pagar US$100,00 para adquirir uma delas. E também não
vendeu nenhuma de suas garrafas a Woody. Isto é ilógico. Se estava
disposto a tomar uma garrafa que podia vender por US$100,00, então
tomá-la tem que valer mais de U$100,00. Porém, por que não estava
disposto a comprar uma garrafa dessas? Na verdade, por que se recusava a
comprar garrafas que custavam por volta de US$100,00? Como
economista, Rosett sabia que tal comportamento não era racional, mas não
conseguia evitar.6
Todos esses exemplos envolvem o que os economistas chamam de
“custos de oportunidade”. O custo de oportunidade de alguma atividade é
aquilo a que você renuncia ao fazê-la. Se hoje eu sair para uma caminhada
em vez de ficar em casa assistindo ao futebol, então o custo de
oportunidade da caminhada é o prazer renunciado de assistir ao jogo. Para
a garrafa de US$100,00, o custo de oportunidade de tomar o vinho é o que
Woody estava disposto a pagar por ela. Quer Rosett beba seu próprio vinho,
quer compre uma garrafa, o custo de oportunidade de tomá-la permanece
o mesmo. Mas, como ilustra o comportamento de Rosett, até mesmo
economistas têm dificuldade em equiparar custos de oportunidade com
custos de tirar-o-dinheiro-do-bolso. Desistir da oportunidade de vender algo
não machuca tanto quanto tirar o dinheiro da carteira e pagar. Custos de
oportunidade são vagos e abstratos quando comparados a dar dinheiro de
fato.
Meu amigo Tom Russell sugeriu outro caso interessante. Naquela
época, o uso de cartões de crédito estava se popularizando e as
administradoras de cartões estavam em uma batalha judicial com os lojistas
em relação à cobrança de preços diferenciados para compras em dinheiro
ou no cartão de crédito. Como os cartões cobram do lojista pelo serviço,
alguns comerciantes, particularmente postos de gasolina, queriam cobrar
um preço mais alto dos usuários de cartões. É claro que a indústria dos
cartões de crédito detestava essa prática; queriam que os clientes vissem o
uso do cartão como gratuito. À medida que o caso foi percorrendo seu
tortuoso caminho pelo processo regulatório, o lobby dos cartões optou por
se garantir e alterou o foco do conteúdo para a forma. Insistiram que, se
uma loja de fato cobrasse preços diferentes entre compras em dinheiro ou
cartão, o “preço regular” seria o preço mais alto, o do cartão de crédito,
oferecendo-se um “desconto” para pagamento em dinheiro. A alternativa
determinava como preço regular aquele pago em dinheiro, com os clientes
do cartão de crédito sendo obrigados a desembolsar uma “sobretaxa”.
Para um Econ, essas duas políticas são idênticas. Se o preço para
pagamento com cartão de crédito é US$1,03 e o preço para pagamento em
dinheiro é US$1,00, chamar a diferença de US$0,03 de desconto ou
sobretaxa é irrelevante. Mesmo assim, a indústria de cartões de crédito
tinha justificadamente uma forte preferência pelo termo “desconto”.
Muitos anos depois, Kahneman e Tversky chamariam essa distinção de
enquadramento (framing), mas os comerciantes já tinham um instinto de
que o enquadramento tinha importância. Pagar uma sobretaxa é tirar
dinheiro do bolso, enquanto não receber um desconto é um “mero” custo
de oportunidade.
Chamei esse fenômeno de “efeito posse” porque, no jargão dos
economistas, aquilo que você possui é parte da sua dotação, e eu tinha
deparado com uma descoberta que sugeria que as pessoas valorizavam
mais as coisas que já faziam parte de suas posses do que coisas que tinham
apenas o potencial para isso, ou seja, acessíveis, mas não possuídas.
O efeito posse, também conhecido como efeito dotação, tem uma
influência significativa sobre o comportamento daqueles que cogitam ir a
um show ou evento esportivo. Com frequência, o preço no varejo de um
determinado ingresso é bem abaixo do preço de mercado. O sortudo que
conseguir um ingresso, seja por esperar na fila ou por clicar mais rápido
em um site de vendas, terá uma decisão a tomar: ir ao evento ou vender o
ingresso? Hoje em dia, há em muitas partes do mundo um mercado
simples, legalizado, para venda de ingressos em sites, de modo que os
detentores dos bilhetes não precisem mais ficar anunciando a venda na
frente do local do evento para poder concretizar o lucro inesperado que
conseguiram quando compraram um item altamente valorizado.
Pouca gente além de economistas pensa corretamente sobre essa
decisão.7 Um bom exemplo disso envolve o economista Dean Karlan, da
Universidade Yale. O tempo em que Dean esteve em Chicago — era
estudante de MBA na época — coincidiu com o reinado de Michael
Jordan no basquete profissional. O Chicago Bulls de Jordan ganhou seis
campeonatos enquanto ele esteve no time. No ano em questão, o Chicago
Bulls ia jogar contra o Washington Bullets na primeira rodada de
eliminatórias. Embora o Chicago Bulls fosse de longe o favorito, os
ingressos tinham uma alta procura, em parte porque os fãs sabiam que os
assentos seriam ainda mais caros em fases futuras das eliminatórias.
Dean tinha um colega de faculdade que trabalhou para o Washington
Bullets e deu a Dean dois ingressos. Dean também tinha um amigo, aluno
de pós-graduação da escola de teologia, que tinha o mesmo contato no
Washington Bullets e também ganhara um par de ingressos gratuitos.
Ambos enfrentavam as habituais atribulações financeiras comuns a
estudantes de pós-graduação, embora Dean tivesse melhores perspectivas
financeiras de longo prazo: MBAs tendem a render mais dinheiro do que
graduações em teologia.8
Tanto Dean quanto seu amigo acharam fácil a decisão de vender os
ingressos ou ir ao jogo. O aluno de teologia convidou alguém para ir junto
e se divertiu muito. Dean, por sua vez, ocupou-se em descobrir que
professor fã de basquete também tinha práticas lucrativas de consultoria. E
vendeu seus ingressos por várias centenas de dólares cada. Tanto Dean
quanto seu amigo acharam que a decisão do outro foi loucura. Dean não
entendeu como o amigo podia pensar em se dar ao luxo de ir ao jogo. Já o
amigo não conseguiu entender Dean, pois não teria gastado nenhum
tostão para assistir à partida.
Este é o efeito posse. Eu sabia que era real, mas não tinha ideia do que
fazer com ele.
3

A LISTA

Essa discrepância entre preços de compra e venda fez a minha mente


vagar. Que outras atitudes comuns são inconsistentes com o modelo de
escolha racional dos economistas? Após começar a prestar atenção,
brotaram tantos exemplos que comecei a fazer uma lista no quadro-negro
do meu escritório. Eis uns poucos que descrevem o comportamento de
alguns dos meus amigos:
Jeffrey e eu conseguimos ingressos gratuitos para um jogo de basquete
profissional em Buffalo, cidade que, em clima normal, fica a uma hora
e meia de carro de Rochester, onde moramos. No dia do jogo, caiu uma
assombrosa nevasca. Decidimos não ir, mas Jeffrey comenta que, se
tivéssemos comprado os (caros) ingressos, teríamos enfrentado a
tempestade e tentado ir de carro até o jogo.
Stanley apara a grama todo fim de semana e fica com uma terrível
rinite alérgica. Pergunto a ele por que não contrata um garoto para
aparar o gramado. Stan diz que não quer pagar US$10. Pergunto a ele
se apararia a grama do vizinho por US$20, e Stan responde que não,
claro que não.
Linnea está comprando um radiorrelógio. Ela encontra um modelo de
que gosta a US$45, um bom preço de acordo com sua pesquisa.
Quando está prestes a fechar a compra, o funcionário da loja menciona
que outra filial a dez minutos dali está fazendo uma grande venda de
inauguração e o mesmo item está em oferta por US$35. Será que ela
pega o carro e vai até a outra loja para fazer a compra?
Em outra compra, Linnea está em busca de um televisor e encontra um
com preço bom, a US$495. Mais uma vez, o funcionário informa que o
mesmo modelo está em oferta em outra loja a dez minutos de distância,
por US$485. Mesma pergunta... mas provavelmente uma resposta
diferente.
A esposa de Lee lhe dá de presente de Natal um suéter de caxemira
caro. Ele tinha visto o suéter na loja e concluído que não se sentiria
bem em comprá-lo, pois seria uma indulgência grande demais. Mesmo
assim, ficou encantado com o presente. Lee e sua esposa juntam todos
seus ganhos financeiros; nenhum dos dois tem uma fonte à parte.
Alguns amigos vêm jantar em casa. Estamos tomando drinques,
esperando alguma coisa terminar de assar no forno para podermos
sentar e comer. Pego uma enorme tigela de castanhas-de-caju para
irmos beliscando. Comemos metade da tigela em cinco minutos, o que
pode acabar estragando nosso apetite. Tiro a tigela e a escondo na
cozinha. Todo mundo fica contente.

Cada exemplo ilustra um comportamento que é inconsistente com a


teoria econômica. Jeffrey está desconsiderando a máxima dos economistas
para “ignorar custos afundados”, ou seja, dinheiro que já foi gasto. O preço
que pagamos pelos ingressos não deveria afetar a nossa escolha de ir ou não
ao jogo. Stanley está violando a regra de que preços de compra e venda
deveriam ser mais ou menos os mesmos. Se Linnea gasta 10 minutos para
economizar US$10 em uma compra pequena mas não faz o mesmo em
uma compra grande, está sendo inconsistente na valoração do tempo. Lee
se sente melhor gastando os recursos da família em um suéter caro se a
esposa toma a decisão, ainda que o suéter não tenha saído mais barato. E
tirar de vista as castanhas-de-caju acaba com a opção de comer um pouco
mais; para os Econs, muitas escolhas são sempre preferíveis a poucas.
Passei um bocado de tempo olhando para a Lista e acrescentando novos
itens, mas não sabia o que fazer com ela. “Coisas idiotas que as pessoas
fazem” não é um título satisfatório para um artigo acadêmico. Então dei
um tempo. No verão de 1976, Sherwin e eu fomos a uma conferência
perto de Monterey, Califórnia. Estávamos lá para falar sobre o valor de
uma vida. O que tornou a conferência especial para mim foi a presença de
dois psicólogos: Baruch Fischhoff e Paul Slovic. Ambos estudavam como
as pessoas tomam decisões. Foi como descobrir uma nova espécie. Eu
nunca tinha conhecido ninguém no meio acadêmico com o histórico
deles.
Acabei dando a Fischhoff uma carona para o aeroporto. No caminho,
ele me disse que havia completado seu ph.D. em psicologia na
Universidade Hebraica, em Israel. Lá, tinha trabalhado com dois sujeitos
cujos nomes eu nunca tinha ouvido: Daniel Kahneman e Amos Tversky.
Baruch me contou sobre sua agora famosa tese sobre o “viés da
retrospectiva”.1 A descoberta é que, após algum acontecimento, as pessoas
passam a acreditar que o resultado de tal ocorrência sempre fora previsível,
e até mesmo que essa era a conclusão antecipada por todos. Depois que
Barack Obama, então um senador afro-americano quase desconhecido,
derrotou a ultrafavorita Hillary Clinton para a indicação presidencial do
Partido Democrata, muita gente achou que tinha realizado tal prognóstico.
E não tinha. Estavam simplesmente lembrando de forma errônea.
Achei o conceito de viés da retrospectiva fascinante e de extrema
importância para a área de gestão. Um dos problemas mais difíceis que um
CEO enfrenta é convencer gerentes de que devem assumir projetos
arriscados se o ganho esperado for suficientemente alto. Por bons motivos,
os gerentes temem levar a culpa por um projeto que defenderam se ele der
errado, quer a decisão tenha ou não sido boa na época. O viés da
retrospectiva exacerba muito o problema, porque o CEO terá a convicção
equivocada de que, qualquer que tenha sido a causa do fracasso, deveria
ter sido prevista. E agora, com o benefício da retrospectiva, o CEO
acreditará que sempre soube que o projeto estava fadado ao fracasso. O que
torna esse viés particularmente pernicioso, porque todos nós reconhecemos
esse viés nos outros, mas não em nós mesmos.
Baruch sugeriu a leitura de alguns trabalhos de seus orientadores, pois
acreditava que seria do meu interesse. No dia seguinte, já de volta ao meu
escritório em Rochester, fui até a biblioteca. Por ter frequentado antes
somente a seção de economia, aquela era uma parte nova da biblioteca
para mim. Comecei pelo artigo síntese publicado na Science: “Julgamento
na incerteza: heurísticas e vieses”.2 Na época, eu não tinha certeza do que
era heurística, mas acabei descobrindo que é uma palavra bonita para
aquelas coisas que são feitas só a olho e que acabam se tornando praxe.
Enquanto lia, meu coração começou a bater forte, como acontece nos
minutos finais de um jogo de basquete difícil. Levei 30 minutos para ler o
artigo do começo ao fim, mas a minha vida tinha mudado para sempre.
A tese do artigo era simples e elegante. Humanos têm tempo e
capacidade cerebral limitados. Como resultado, se baseiam naquilo que é
de praxe — heurísticas — para ajudá-los a fazer julgamentos. Um exemplo
seria a “disponibilidade”. Suponha que eu lhe pergunte se Dhruv é um
nome comum. Na maioria dos países do mundo, não é, mas é um nome
muito comum na Índia, um país com muita gente. Assim, em uma escala
global, é de fato um nome bastante comum. Em tentativas de adivinhar a
frequência de algo, tendemos a avaliar a quantidade de ocorrências desse
tipo de que conseguimos nos lembrar. É uma boa praxe e, na comunidade
na qual você vive, a facilidade com que você consegue se lembrar de
conhecer alguém com um determinado nome pode fornecer uma boa
pista quanto à frequência real. Mas falha em casos nos quais o número de
ocorrências não esteja altamente correlacionado à facilidade de lembrar de
exemplos (como no caso do nome Dhruv). Esta é uma ilustração da grande
ideia desse artigo, uma ideia que fez minhas mãos tremerem enquanto eu
lia: usar essas heurísticas faz com que as pessoas cometam erros previsíveis.
Daí o título do artigo: heurística e vieses. O conceito de viés previsível
oferecia um arcabouço para o meu conjunto de ideias até então
desordenado.
Um precursor de Kahneman e Tversky foi Herbert Simon, um
acadêmico erudito que passou a maior parte de sua carreira na Carnegie
Mellon University. Simon teve grande reconhecimento em quase todos os
campos das ciências sociais, inclusive economia, ciências políticas,
inteligência artificial e teoria organizacional. Porém, o mais relevante para
este livro são seus escritos sobre aquilo que denominou “racionalidade
limitada”, bem antes de Kahneman e Tversky entrarem em cena. Ao dizer
que as pessoas têm racionalidade limitada, Simon indicava a carência da
capacidade cognitiva para resolver problemas complexos, o que
obviamente é verdade. Contudo, embora tenha recebido um Prêmio
Nobel em economia, infelizmente é justo dizer que ele teve pouco
impacto na profissão de economista.3 Acredito que muitos economistas
ignoraram Simon porque era muito fácil descartar a racionalidade limitada
como um conceito “verdadeiro, mas sem importância”. Economistas se
sentiam à vontade com a ideia de que seus modelos eram imprecisos e que
as previsões decorrentes desses modelos continham falhas. Nos modelos
estatísticos usados por economistas, lida-se com isso simplesmente
introduzindo na equação um “termo de erro”. Suponha que, para prever a
altura que uma criança atingirá na idade adulta, você use a altura de
ambos os pais como preditores. Esse modelo fará um serviço decente, já
que pais altos tendem a ter filhos altos, mas não será perfeitamente
acurado, e é isto que o termo de erro procura capturar. E enquanto os erros
forem aleatórios — isto é, as previsões do modelo forem altas demais ou
baixas demais com igual frequência —, está tudo bem. Os erros se anulam
mutuamente. Era este o raciocínio dos economistas para justificar por que
os erros produzidos pela racionalidade limitada podiam ser ignorados com
segurança. E voltamos ao modelo totalmente racional!
Kahneman e Tversky estavam alertando que esses erros não eram
aleatórios. Pergunte às pessoas se nos Estados Unidos as mortes por arma
de fogo decorrem mais de homicídio ou de suicídio, e a maioria chutará
homicídio, mas na realidade há quase o dobro de mortes por arma de fogo
por suicídios4 do que por homicídios.5 Este é um erro previsível. Mesmo
questionando um grande número de pessoas, os erros não se cancelarão na
média. Embora eu não tenha dado pleno valor a isto na época, os insights
de Kahneman e Tversky me impulsionaram um pouquinho adiante, de
modo que fiquei a apenas um passo de fazer algo sério com a minha lista.
Cada um dos itens da Lista era um exemplo de viés sistemático.
Os itens da Lista tinham outra característica digna de nota. Em cada
caso, a teoria econômica tinha uma previsão altamente específica em
relação a algum fator-chave — tal como a disponibilidade de castanhas-de-
caju ou o valor pago pelos ingressos do jogo de basquete — sobre o qual
dizia que não teria influência nas decisões. Eram todos fatores
supostamente irrelevantes, ou FSIs. Grande parte do trabalho subsequente
em economia comportamental tem sido mostrar que FSIs são, na verdade,
altamente relevantes em previsões de comportamento, muitas vezes
aproveitando os vieses sistemáticos sugeridos pelo artigo de Tversky e
Kahneman de 1974!6 Agora, a lista é extensa, ultrapassando de longe o que
estava escrito no meu quadro-negro muito tempo atrás.
Passei algumas horas empolgantes lendo tudo que Kahneman e Tversky
tinham escrito juntos, e deixei a biblioteca com a cabeça girando.
4

TEORIA DO VALOR

Depois do meu dia na biblioteca, liguei para Fischhoff com o intuito de


agradecer. Ele me disse que Kahneman e Tversky estavam trabalhando em
um novo projeto sobre tomada de decisões que certamente seria de meu
interesse. Fischhoff achava que Howard Kunreuther, um professor de
Wharton, poderia ter uma cópia. Telefonei para Howard e encontrei um
tesouro. Ele tinha o esboço e me mandaria.
O artigo, na época intitulado “Teoria do valor” (“Value Theory”, no
original) chegou repleto de comentários de Howard rabiscados nas
margens. Era uma versão inicial do artigo que daria a Danny o Prêmio
Nobel em 2002. (Amos teria dividido o prêmio com ele se ainda estivesse
vivo.) Após algum tempo, os autores mudaram o título para “Teoria da
perspectiva”,1 que hoje é também conhecida como teoria dos prospectos.
Esse artigo era ainda mais relevante para minha Lista do que o trabalho
sobre heurística e vieses. Duas coisas me mobilizaram imediatamente: um
princípio organizador e um gráfico simples.

Dois tipos de teorias


O princípio organizador era a existência de dois tipos diferentes de teorias:
normativas e descritivas. Teorias normativas prescrevem um jeito correto
de pensar sobre algum problema. Por “correto” não me refiro ao sentido
moral, mas à consistência lógica, semelhante àquela determinada pelo
modelo otimizador no cerne do raciocínio econômico, às vezes chamado
de teoria da escolha racional. Esse é o único sentido que darei ao termo
“normativo” neste livro. Por exemplo, o teorema de Pitágoras é uma teoria
normativa de como calcular o comprimento de um lado de um triângulo
retângulo se conhecidos o comprimento dos outros dois lados. Caso você
use qualquer outra fórmula, estará errado.
Eis um teste para ver se você é um bom pensador intuitivo pitagórico.
Considere dois trechos de uma ferrovia, cada um com 1 quilômetro de
comprimento, com as extremidades encostadas uma na outra (ver Figura
1). Os trilhos estão pregados nas outras extremidades, mas soltos no ponto
em que se encostam. Agora, suponha que o dia fique quente e os trilhos se
expandam, 1 centímetro cada trecho. Como estão presos ao chão pelas
extremidades externas, só podem se expandir erguendo-se como uma ponte
levadiça. Além disso, esses trilhos são tão rígidos que conservam sua forma
retilínea ao subir. (Isto é para facilitar o problema, então pare de reclamar
das premissas irrealistas). Eis a questão:

Considere apenas um dos lados da ferrovia. Temos um triângulo


retângulo com uma base de 1 quilômetro, uma hipotenusa de 1
quilômetro mais 1 centímetro. Qual é a altura? Em outras palavras,
quanto os trilhos sobem acima do chão?

Se você ainda se lembra da geometria do colégio, tem uma calculadora


com a função raiz quadrada e sabe que há 100 centímetros em 1 metro e
1.000 metros em 1 quilômetro, é capaz de resolver este problema. Mas
suponha que, em vez disso, você use a sua intuição. Qual é o seu palpite?
A maioria das pessoas calcula que, como os trilhos se expandiram 1
centímetro, devem subir aproximadamente o mesmo valor, ou talvez até 2
ou 3 centímetros.
A resposta real é praticamente 4,5 metros! Como é que chegamos a
isso?
Agora suponha que queiramos desenvolver uma teoria a respeito de
como as pessoas respondem a essa questão. Se somos teóricos da escolha
racional, vamos pressupor que as pessoas darão a resposta correta e, por
isso, usaremos o teorema de Pitágoras tanto no nosso modelo normativo
quanto no descritivo, concluindo que as pessoas dirão algo próximo a 5
metros. Seria uma previsão terrível para o desenvolvimento da teoria, pois
2 centímetros é a resposta mais comum.
Esse exemplo atinge a raiz do problema entre a economia tradicional e
o avanço conceitual oferecido pela teoria da perspectiva. A teoria
econômica naquela época — e a maioria dos economistas de hoje — usa
uma única teoria tanto para propósitos normativos quanto para descritivos.
Considere a teoria da firma. Essa teoria, um representante simples do uso
de modelos com base em otimização, estipula que empresas atuam de
modo a maximizar lucros (ou o valor da empresa). Elaborações adicionais
da teoria simplesmente detalham como isto deve ser feito. Por exemplo,
uma empresa deve fixar preços de maneira que o custo marginal se iguale
à receita marginal (quando economistas usam o termo “marginal”, isto
quer dizer apenas incremental). Assim, essa regra implica que a empresa
continuará produzindo até o ponto em que o custo do último item
produzido seja exatamente igual ao incremento de receita trazido. De
forma similar, a teoria da formação do capital humano,2 desbravada por
Gary Becker, pressupõe que a escolha de nível educacional e o
investimento de tempo e dinheiro para a obtenção de tais capacitações fica
a cargo do indivíduo, o qual prevê corretamente quanto dinheiro ganhará
(e quanto prazer terá) em suas futuras carreiras. Há muito poucos alunos
de ensino médio e superior cujas escolhas são consequências de uma
análise cuidadosa desses fatores. Em vez disso, muita gente estuda a
disciplina de que mais gosta, sem pensar detalhadamente no estilo de vida
que tal decisão acarretará.
A teoria da perspectiva buscou romper com a ideia tradicional de que
uma teoria única de comportamento humano possa ser tanto normativa
quanto descritiva. Especificamente, o artigo abordava a teoria da tomada
de decisão em situação de incerteza. A ideia inicial por trás dessa teoria
remonta a Daniel Bernoulli em 1738.3 Bernoulli foi estudioso de quase
tudo, inclusive matemática e física, e seu trabalho nesse campo foi resolver
o paradoxo de São Petersburgo, uma questão matemática apresentada pelo
seu primo Nicolas.4 (Eles eram de uma família de garotos muito precoces.)
Essencialmente, Bernoulli inventou a ideia de aversão ao risco. E o fez
postulando que a felicidade de uma pessoa — ou utilidade, como os
economistas gostam de chamar — aumenta à medida que fica mais rica,
mas em uma taxa decrescente. Este princípio é chamado de sensibilidade
decrescente. Conforme a riqueza cresce, o impacto de um dado
incremento de riqueza, digamos US$100.000,00, cai. Para um camponês,
um ganho inesperado de US$100.000,00 transformaria sua vida. Para Bill
Gates, passaria despercebido. Um gráfico que mostra essa dinâmica
aparece na Figura 2.
Uma função utilidade com esse formato está considerando a aversão ao
risco porque a utilidade dos primeiros US$1.000,00 é maior que a
utilidade dos segundos US$1.000,00, e assim por diante. Isto implica que
se a sua riqueza é de US$100.000,00 e eu lhe ofereço uma escolha entre
US$1.000,00 adicionais com certeza ou uma chance de 50% de ganhar
US$2.000,00, você optará pela alternativa segura, porque valoriza menos os
segundos US$1.000,00 que ganharia do que os primeiros US$1.000,00,
então não está disposto a arriscar aquele primeiro prêmio de US$1.000,00
em uma tentativa de ganhar US$2.000,00.
O tratado completo da teoria formal sobre a tomada de decisão em
situações de risco — chamada teoria da utilidade esperada — foi publicado
em 1944 pelo matemático John von Neumann e o economista Oskar
Morgenstern. John von Neumann, um dos maiores matemáticos do século
XX, foi contemporâneo de Albert Einstein no Instituto de Estudos
Avançados de Princeton e, durante a Segunda Guerra Mundial, decidiu se
dedicar a problemas práticos. O resultado foi a obra de mais de 600 páginas
“A teoria dos jogos e o comportamento econômico”,5 na qual o
desenvolvimento da teoria da utilidade esperada foi tratado apenas em
segundo plano.
Von Neumann e Morgenstern começaram a formular essa teoria com
anotações de uma série de axiomas de escolha racional. Depois inferiram
como se comportaria alguém que quisesse seguir tais axiomas. Os axiomas
trazem, em sua maioria, pressupostos incontroversos, tais como
transitividade, um termo técnico que diz que, se você prefere A a B e B a
C, então deve preferir A a C. De forma notável, Von Neumann e
Morgenstern provaram que, se você quiser satisfazer esses axiomas (e, sim,
você quer), então deve tomar decisões de acordo com a teoria criada por
eles. O argumento é completamente convincente. Se eu tivesse uma
decisão importante a tomar — fosse refinanciar minha hipoteca ou investir
em um novo negócio —, eu visaria tomar a decisão de acordo com a teoria
da utilidade esperada, da mesma forma como usaria o teorema de Pitágoras
para estimar a altura do nosso triângulo dos trilhos da ferrovia. A utilidade
esperada é a maneira certa de tomar decisões.
Com a teoria da perspectiva, Kahneman e Tversky se propuseram a
oferecer uma alternativa à teoria da utilidade esperada, mas sem a
pretensão de ser um manual para alcançar a escolha racional; em vez disso,
tornou-se uma bússola para a previsão das escolhas reais que as pessoas
fazem. É uma teoria sobre o comportamento dos Humanos.
Embora pareça um passo lógico, não é um a que os economistas gostam
de aderir. Simon cunhou o termo “racionalidade limitada”, mas não
dissecou muito como pessoas limitadamente racionais diferem de pessoas
totalmente racionais. Houve alguns termos predecessores, mas tampouco
eles chegaram a receber adesão. Por exemplo, William Baumol, o
proeminente (e, em sua maior parte, bastante tradicional) economista de
Princeton, propôs uma alternativa à tradicional (normativa) teoria da firma
(que pressupõe maximização do lucro).6 Ele postulou que as empresas
maximizam seu tamanho — que pode ser mensurado, por exemplo, pela
receita de vendas — sob a restrição de que certo nível mínimo de lucro
deva ser atingido. Acredito que a maximização de vendas é um modelo
descritivo que reflete muitas empresas. Na verdade, pode ser inteligente
um CEO seguir essa estratégia, já que o pagamento dele parece estar
estranhamente relacionado tanto ao tamanho da empresa quanto aos
lucros, mas, se assim for, isto também constituiria uma violação da teoria
de que empresas maximizam o seu valor.
A primeira coisa que extraí da minha primeira leitura da teoria da
perspectiva foi uma declaração de missão: Construir modelos econômicos
descritivos que retratem acuradamente o comportamento humano.
Um gráfico impressionante
A outra ideia-chave para mim foi uma figura retratando a “função valor”.
Esta também era uma grande mudança conceitual no pensamento
econômico e o verdadeiro motor da nova teoria. Desde Bernoulli, os
modelos econômicos se baseavam na simples premissa de que as pessoas
têm “utilidade marginal decrescente da riqueza”, conforme ilustrado na
Figura 2.
Este modelo da utilidade da riqueza capta corretamente o básico sobre
a psicologia da riqueza. Porém, para criar um modelo descritivo,
Kahneman e Tversky perceberam que era necessário mudar nosso foco dos
estados de riqueza para mudanças na riqueza. Isto pode soar como uma
artimanha sutil, mas a troca do foco para mudanças em oposição a estados
é uma jogada radical. Uma imagem da função valor baseada no conceito
deles é mostrada adiante, na Figura 3.
Kahneman e Tversky se concentram nas mudanças porque elas são o
modo como os Humanos experienciam. Suponha que você esteja em um
prédio comercial cujo sistema de ventilação em bom funcionamento
mantenha o ambiente no estado que consideramos como temperatura
ambiente. Agora você sai do escritório para participar de uma reunião em
uma sala. Quando você entrar na sala, como reagirá à temperatura? Se for
a mesma do seu escritório e do corredor, você nem pensará no assunto. Só
notará se a sala estiver especialmente quente ou fria em relação ao resto do
prédio. Quando estamos adaptados ao ambiente, tendemos a ignorá-lo.
O mesmo vale para assuntos financeiros. Considere Jane, que ganha
US$80.000,00 por ano. No fim do ano, ela recebe um inesperado bônus de
US$5.000,00. Como ela assimila esse fato? Será que ela calcula o impacto
dessa mudança de riqueza em toda sua vida, que é praticamente
imperceptível? Não, mas provavelmente ela pensa: “Uau, US$5.000,00 a
mais!” As pessoas pensam na vida em termos de mudanças, não de estados
de riqueza. Podem ser mudanças no status quo ou mudanças em relação
ao que era esperado; seja qual for a forma que assumam, são mudanças
que nos tornam felizes ou tristes. Essa era uma grande ideia.
A figura no artigo capturou tanto a minha imaginação que desenhei
uma versão dela no quadro-negro bem ao lado da Lista. Dê outra olhada
na imagem agora. Captada nessa curva em forma de S, há uma quantidade
enorme de sabedoria acerca da natureza humana. O quadrante superior
direito, para ganhos, tem o mesmo formato que a função usual de utilidade
da riqueza, capturando a ideia de sensibilidade decrescente. Mas note que
a função no domínio das perdas também captura essa sensibilidade. A
diferença entre perder US$10,00 ou perder US$20,00 provoca uma
sensação muito maior do que a diferença entre perder US$1.300,00 ou
US$1.310,00. Esse ponto difere do modelo-padrão porque, a partir de
determinado estado de riqueza mostrado na Figura 3, as perdas são
capturadas descendo pela linha de utilidade da riqueza, evidenciando que
cada perda se torna cada vez mais dolorosa. (Se você se preocupa cada vez
menos com aumentos na riqueza, infere-se então que se preocupa mais e
mais com diminuições na riqueza.)
O fato de vivenciarmos uma diminuição de sensibilidade em alterações
de status quo captura outro traço humano básico — um dos primeiros
achados em psicologia —, conhecido como Lei de Weber-Fechner. A Lei
de Weber-Fechner sustenta que a diferença infimamente perceptível em
qualquer variável é proporcional à magnitude dessa variável. Não noto se
ganho 1 quilo, mas a diferença entre 2 ou 3 quilos é óbvia se o caso se
refere à compra de verduras frescas. Os psicólogos se referem à diferença
apenas perceptível como JND (just noticeable difference, na expressão em
inglês). Se quiser impressionar um acadêmico da psicologia, adicione esse
termo aos seus gracejos em um coquetel. (“Eu peguei o sistema de som
mais caro no carro novo que acabei de comprar porque o aumento de
preço não era uma JND.”)
Você pode testar a sua compreensão do conceito por trás da Lei de
Weber-Fechner com o seguinte exemplo extraído do duradouro programa
de rádio da NPR chamado Car Talk. O programa consistia em dois irmãos,
Tom e Ray Magliozzi — ambos graduados do MIT — atendendo a
telefonemas dos ouvintes com perguntas sobre carros. Por incrível que
pareça, era muito engraçado, especialmente para os dois. Eles riam sem
parar das próprias piadas.7
Em um episódio, um ouvinte levou a seguinte questão: “Os meus dois
faróis dianteiros apagaram ao mesmo tempo. Levei o carro para a
concessionária, mas o mecânico disse que eu só precisava de duas
lâmpadas novas. Como pode ser? Não é coincidência demais que ambas as
lâmpadas tenham queimado ao mesmo tempo?”
Tom respondeu à pergunta num piscar de olhos: “Ah, a famosa Lei de
Weber-Fechner!” Acontece que Tom tinha um doutorado em psicologia e
marketing sob a orientação de Max Bazerman, um proeminente
acadêmico no campo de pesquisa sobre julgamento e tomada de decisão.
Então, como a pergunta do ouvinte se relaciona com a Lei de Weber-
Fechner, e como esse insight ajudou Tom a resolver o problema?
A resposta é que as duas lâmpadas não queimaram ao mesmo tempo. É
fácil dirigir só com uma lâmpada queimada sem sequer perceber,
especialmente se você está em uma cidade bem-iluminada. Passar de duas
lâmpadas acesas para uma nem sempre é uma diferença perceptível. Mas
passar de uma para nenhuma decididamente é perceptível. Esse fenômeno
explica o comportamento dos exemplos na Lista: estar mais disposto a
viajar 10 minutos para economizar US$10,00 em um radiorrelógio de
US$45,00 do que em uma televisão de US$495,00. Para esta última
compra, a economia não seria uma JND.
O fato de existir sensibilidade decrescente tanto a ganhos quanto a
perdas tem outra implicação. As pessoas terão aversão ao risco na procura
por ganhos, mas buscarão o risco para perdas, conforme é ilustrado pelo
experimento relatado abaixo, que foi administrado a dois grupos diferentes.
(Note que o enunciado inicial nas duas questões difere de uma maneira
que torna os dois problemas idênticos se os sujeitos estiverem tomando
decisões baseados em estados de riqueza, como se considerava
tradicionalmente.) A porcentagem de sujeitos escolhendo cada opção é
mostrada entre colchetes.

PROBLEMA 1. Presuma que você hoje fique mais rico em US$300,00. É


dada a você uma escolha entre:
A. Um ganho seguro de US$100,00; ou [72%]
B. Uma chance de 50% de ganhar US$200,00 e uma chance de 50% de
perder 0. [28%]

PROBLEMA 2. Presuma que você hoje fique mais rico em US$500,00. É


dada a você uma escolha entre:
A. Uma perda segura de US$100,00; ou [36%]
B. Uma chance de 50% de perder US$200,00 e uma chance de 50% de
perder 0. [64%]

A razão de as pessoas terem a tendência a buscar riscos para perdas é a


mesma lógica que se aplica a elas serem avessas ao risco para ganhos. No
caso do problema 2, a dor de perder mais US$100,00 é menor do que a de
perder US$100,00 na primeira vez, então os sujeitos estão prontos a
assumir o risco de perder mais para ter a chance de não perder nada. E são
especialmente propensos a eliminar totalmente a perda por causa da
terceira característica captada na Figura 3: aversão à perda.
Examine a origem da função valor nesta figura, onde ambas as curvas
começam. Note que a função perda é mais inclinada do que a função de
ganho: ela decresce mais depressa do que sobe a função de ganho.
Grosseiramente falando, as perdas doem cerca de duas vezes mais do que
os ganhos fazem você se sentir bem. Essa característica da função valor me
deixou perplexo. Ali, naquela figura, estava o efeito posse. Se eu tirar a
garrafa de vinho do professor Rosset, ele sentirá como uma perda
equivalente a duas vezes o ganho que sentiria se comprasse a garrafa; é por
isso que ele nunca compraria uma garrafa pelo mesmo preço de mercado
daquela que tem na adega. O fato de uma perda doer mais do que o prazer
de um ganho equivalente é chamado de aversão à perda. Esta se tornou a
ferramenta individual mais poderosa no arsenal do economista
comportamental.
Então, experienciamos a vida em termos de mudanças, temos uma
redução de sensibilidade tanto a ganhos quanto a perdas, e perdas
machucam mais do que o prazer dado por ganhos de tamanho
equivalente. É muita sabedoria em uma única imagem. Mal sabia eu que
estaria brincando com esse gráfico pelo resto da minha carreira.
5

CALIFORNIA DREAMIN’
O SONHO DA CALIFÓRNIA

Sherwin Rosen estava planejando passar o verão de 1977 em Stanford e me


convidou para acompanhá-lo ao Oeste com intuito de fazer algum trabalho
sobre o valor de uma vida. Em algum momento daquela primavera, fiquei
sabendo que Kahneman e Tversky planejavam passar o ano acadêmico em
Stanford. Depois de toda a inspiração que o trabalho deles me
proporcionou, não podia suportar a ideia de deixar a cidade logo antes da
chegada deles em setembro.
Durante a primavera, peguei um avião para a Califórnia com a intenção
de procurar moradia para o verão e, ao mesmo tempo, dar um jeito de ficar
em Stanford durante o período letivo de outono. Eu tinha esperança de
poder passar algum tempo com os desconhecidos que tinham virado meus
novos ídolos. Eu havia mandado a Tversky um rascunho inicial do meu
primeiro artigo comportamental, que na época ganhou o título “Escolha
do consumidor: uma teoria de comportamento dos economistas”,1 com a
sugestão implícita de que somente economistas se comportam como
Econs. Ele enviara uma breve mas amigável resposta dizendo que
estávamos traçando caminhos teóricos similares, mas foi só. Em tempos
anteriores ao e-mail, era muito mais difícil iniciar uma conversa a longa
distância.
Passei alguns dias rogando e implorando pelo campus algum tipo de
cargo para visitantes, mas não consegui nada nos primeiros dois dias.
Estava prestes a desistir quando tive uma conversa com o célebre
economista da saúde Victor Fuchs, que era o diretor do National Bureau
of Economic Research (NBER), a agência de pesquisa econômica de
âmbito nacional onde Sherwin e eu trabalharíamos. Dei a Victor minha
melhor declamação sobre a Lista, heurísticas e vieses, teoria da perspectiva
e sobre os deuses israelenses que estavam prestes a baixar em Stanford.
Victor ficou intrigado — ou simplesmente com pena de mim — e se
ofereceu para me incluir na sua verba durante o semestre. Depois que
cheguei a Stanford, em julho, Victor e eu tínhamos discussões frequentes
sobre as minhas ideias pouco convencionais e, em pouco tempo, ele
estendeu sua oferta para pagar meu salário até o verão seguinte.
A família Thaler fez uma despreocupada viagem de carro pelo país em
junho, visitando parques nacionais pelo caminho, e o passeio me
proporcionou tempo para deixar minha mente vagar sobre maneiras de
combinar psicologia e economia. Qualquer tópico era passível de análise.
Por exemplo: suponha que eu precise dirigir 400 quilômetros. A que
velocidade devo dirigir? Se a velocidade máxima por lei for de 80
quilômetros por hora e eu for a 90 quilômetros por hora, chegaremos ao
nosso destino 33 minutos antes, o que parece ser uma boa economia de
tempo para arriscar uma multa por excesso de velocidade. Mas quando
faltarem apenas 40 quilômetros, economizarei somente 3 minutos guiando
mais rápido. Isto parece não valer a pena. Mas então, será que devo
diminuir a velocidade à medida que for chegando mais perto do meu
destino? Isto não pode estar certo, especialmente porque amanhã vamos
pegar o carro de novo e seguir viagem. Eu não deveria ter uma política
uniforme para a viagem inteira? Hum, ponha na Lista.2
O último desvio no nosso caminho foi Eugene, Oregon, para ver
Baruch Fischhoff e Paul Slovic, os psicólogos que deflagraram o meu
interesse nessas ideias. Enquanto a família explorava a cidade, eu batia
papo com Baruch, Paul e Sarah Lichtenstein, sua colaboradora. Em visita
ao centro, também estava presente Maya Bar-Hillel, uma psicóloga que,
assim como Fischhoff, havia estudado com Kahneman e Tversky no curso
de pós-graduação. Todos eles entrariam para o meu time informal de
tutores em psicologia nos próximos anos.
No fim do verão, o clã de psicologia de Kahneman e Tversky chegou
com toda sua força. Amos e sua esposa, Barbara, visitaram o departamento
de psicologia de Stanford. Danny e sua futura esposa, a eminente psicóloga
Anne Treisman, visitariam o Center for Advanced Study in the Behavioral
Science, um centro de estudos avançados em ciências comportamentais
localizado no alto do morro junto ao NBER.
Victor Fuchs organizou o almoço em que Amos, Danny e eu nos
encontramos pela primeira vez. Não lembro muita coisa desse encontro,
exceto que eu estava nervoso. Creio que foi o volúvel Vic quem manteve a
conversa em andamento. Para mim, o mais importante foi ser apresentado
a eles no almoço, o que me deu a desculpa necessária para subir a colina e
aparecer por lá em visita a Danny. (O escritório de Tversky era no campus,
muito longe para dar as caras sem mais nem menos.) Tversky e ele estavam
terminando o artigo, àquela altura chamado “Teoria da perspectiva”, e eu
às vezes simplesmente entrava na sala enquanto estavam trabalhando. O
primitivo sistema telefônico do Centro fazia com que fosse mais fácil subir
a colina do que ligar para Danny e ver se ele estava por lá.
À
Às vezes, quando eu dava uma parada para ver Danny, encontrava os
dois trabalhando, montando a versão final da teoria da perspectiva.
Quando estavam escrevendo, com Danny no teclado, examinavam
detalhadamente todas as sentenças, discutindo cada palavra. Suas
conversas eram uma estranha mistura de hebraico e inglês. Uma troca de
ideias em uma língua podia de repente mudar para outra, sem tomada de
consciência da guinada. Às vezes a troca para o inglês parecia relacionada
com o uso de termos técnicos como “aversão à perda”, para os quais não
tinham se dado ao trabalho de inventar equivalentes em hebraico. Mas
fracassei em gerar uma teoria para explicar por que faziam a troca no
sentido contrário. Teria ajudado saber um pouco de hebraico.
Eles passaram meses lapidando o artigo. A maioria dos acadêmicos
considera as ideias iniciais da pesquisa a melhor parte, e conduzir a
pesquisa em si é quase igualmente divertido. Mas poucos apreciam o
trabalho de redação, e isso é visível. Chamar de enfadonho um texto
acadêmico é dar crédito demais. No entanto, para muitos, um texto
enfadonho é uma medalha de honra. Escrever com leveza sinaliza que
você não leva seu trabalho a sério, e os leitores também não devem levar.3
“Teoria da perspectiva” não pode ser considerada uma leitura fácil, mas o
texto é cristalino por causa da interminável edição de ambos e a
permanente meta de Amos de “deixar tudo certo”.
Danny e eu logo adquirimos o hábito de dar passeios pelas colinas perto
do Centro, simplesmente para conversar. Éramos igualmente ignorantes e
curiosos em relação ao campo um do outro, de modo que nossas conversas
ofereciam muitas oportunidades de aprendizagem. Um aspecto dessas
sessões de aprendizado mútuo envolvia compreender como pensam
membros de outra profissão, e o que é preciso para convencê-los de alguma
descoberta.
O uso de questões hipotéticas oferece um bom exemplo. Toda a
pesquisa de Kahneman e Tversky até aquele ponto se assentava sobre
cenários simples, tais como: “Imagine que, além de tudo que você possui
agora, ganhe mais US$400,00. Considere então a escolha entre uma perda
certa de US$200,00 ou uma aposta na qual você tem uma chance de 50%
de perder US$400,00 e uma chance de 50% de não perder nada.” (A
maioria nessa situação opta por apostar.) Como Kahneman deliciosamente
explica no seu livro Rápido e devagar: duas formas de pensar,4 eles faziam
esses experimentos mentais em si mesmos e, se concordassem com a
resposta, supunham provisoriamente que outros responderiam da mesma
maneira. Então faziam a verificação perguntando a sujeitos, em geral
estudantes.
Economistas não dão muita importância a respostas de perguntas
hipotéticas — a perguntas de pesquisas em geral, aliás. Eles dizem que se
preocupam mais com o que as pessoas fazem em oposição ao que elas
dizem que fariam. Kahneman e Tversky estavam cientes dessas objeções,
sem dúvida levantadas pelos economistas céticos que encontraram, mas
tinham pouca escolha. Uma predição-chave da teoria da perspectiva é que
a reação das pessoas a perdas é diferente da reação a ganhos. Mas é quase
impossível obter permissão para organizar experimentos nos quais os
sujeitos poderiam efetivamente perder quantias substanciais de dinheiro.
Mesmo que as pessoas estivessem dispostas a participar, os comitês das
universidades que analisam experimentos usando sujeitos humanos
poderiam não aprová-los.
Na versão publicada da teoria da perspectiva, Amos e Danny incluíram
a seguinte defesa de seus métodos: “Como padrão, o método de escolhas
hipotéticas emerge como o procedimento mais simples pelo qual um
grande número de questões teóricas pode ser investigado. O uso do método
se baseia na premissa de que as pessoas frequentemente sabem como se
comportariam em situações reais de escolha, e na premissa adicional de
que os sujeitos não têm razão especial para disfarçar suas verdadeiras
preferências.” Em linhas gerais, eles estavam dizendo que, se seus sujeitos
tivessem uma precisão razoável ao pressupor as escolhas que efetivamente
fariam em tais casos hipotéticos e se suas escolhas indicadas fossem
inconsistentes com a teoria da utilidade esperada, então isso ao menos
criaria uma suspeita acerca da eficácia da teoria como guia do
comportamento humano.
Essa defesa aparentemente satisfez o editor do periódico científico, mas
permaneceu um bicho-papão entre os economistas durante anos. A teoria
da perspectiva gradualmente ganhou aceitação porque provou ser útil em
explicar o comportamento em uma variedade de contextos de alto risco
onde era possível observar escolhas reais, desde investidores individuais até
concorrentes em game shows. Mas não creio que qualquer economista
fosse capaz de aparecer com essa teoria, mesmo se tivessem sido agraciados
com os insights de Kahneman e Tversky em psicologia. Uma falta de
disposição para se basear em questões hipotéticas os teria impedido de
aprender as nuances de comportamento que Kahneman e Tversky foram
capazes de discernir.
Achei libertadora a ideia de que podia simplesmente fazer perguntas às
pessoas e levar suas respostas a sério. Até então, os itens da Lista eram
meramente experimentos mentais. Parecia óbvio para mim que, se os
leitores se confrontassem com um dos meus exemplos hipotéticos,
verificariam sua intuição e então concordariam que o comportamento
existe. (Isto, obviamente, era algo ingênuo.) E, embora o método de
pesquisa não fosse considerado qualificado, seguramente era melhor do
que um levantamento das minhas próprias intuições.
Alguns anos depois, recebi dos próprios mestres uma bela lição de como
fazer isso. Eles pegaram na Lista meu exemplo da compra do radiorrelógio
e da televisão e o transformaram em uma compra de um paletó e uma
calculadora, e então perguntaram às pessoas o que fariam. Aqui está, com
as duas opções diferentes de preço indicadas pelo uso de parênteses ou
colchetes.

Imagine que você esteja prestes a adquirir um paletó por


(US$125,00)[US$15,00] e uma calculadora por (US$15,00)
[US$125,00] em uma mesma loja. O vendedor informa que na outra
filial da loja, localizada a 20 minutos de carro, o paletó continua com
o mesmo preço (US$125,00)[US$15,00], mas a calculadora que você
deseja comprar está em oferta por (US$10,00)[US$120,00]. Você
faria a viagem até a outra loja?

Seguramente, sujeitos reais disseram que estariam mais dispostos a pegar o


carro e ir até a outra filial para economizar US$5,00 no item mais barato,
conforme eu havia conjecturado, e agora havia dados para sustentar minha
opinião. Logo comecei também a usar esse método, mas com parcimônia.
Mas Danny e eu nos baseamos quase exclusivamente nas respostas a
perguntas hipotéticas sete anos depois, em um projeto sobre percepções de
justiça, discutidas no Capítulo 14.
Quando não estava perambulando pelas colinas com Danny, ficava
enfurnado no NBER sem nada para fazer a não ser pensar. Victor Fuchs
assumiu o papel da mãe judia que nos enche de culpa, perguntando-me
periodicamente a respeito do meu progresso. Estava diante de um
paradoxo. Eu tinha o que julgava ser uma grande ideia, mas a pesquisa
progride mediante uma série de pequenos passos. E eu não sabia quais
pequenos passos fariam avançar a minha grande ideia. Grandes ideias são
uma coisa boa, mas eu precisava publicar artigos para permanecer
empregado. Em retrospecto, eu tinha o que o escritor de ciência Steven
Johnson chama de “intuição lenta”.5 Uma intuição lenta não é uma
daquelas ideias iluminadas que acometem de repente, quando tudo fica
claro. Em vez disso, é mais uma impressão vaga de que existe alguma coisa
interessante acontecendo, e uma intuição de que poderia haver algo
importante não muito longe, à espreita. O problema com a intuição lenta é
que não é possível saber se ela vai conduzir a um beco sem saída. Tinha a
sensação de ter chegado ao litoral de um mundo novo, sem mapa e sem
saber por onde começar a procura, e nem se encontraria algo de valor.
Kahneman e Tversky conduziam experimentos, então era natural
pensar que eu deveria seguir o exemplo. Entrei em contato com os dois
fundadores do então nascente campo da economia experimental, Charlie
Plott e Vernon Smith, à época na Universidade do Arizona. Economistas
tradicionalmente têm usado dados históricos para testar hipóteses. Smith e
Plott eram praticantes — e partidários — da possibilidade de testar
proposições sobre economia no laboratório. Primeiro fiz uma viagem até
Tucson para visitar Smith.
A agenda de pesquisa de Smith era diferente, pelo menos na época,
daquela que eu estava imaginando para mim. Quando Danny e ele
dividiram o Prêmio Nobel de economia muitos anos depois, eu disse a um
repórter que a diferença entre suas respectivas agendas de pesquisa — que
lhes valeram o prêmio — era que Smith estava tentando mostrar quanto a
teoria econômica funcionava bem e Kahneman estava fazendo exatamente
o contrário.6
Na época em que o visitei, Smith advogava usar algo que chamava de
metodologia do valor induzido. Em vez de negociar bens reais ou apostas,
mercados eram criados com base em fichas, nos quais cada ficha tinha um
valor diferenciado de acordo com o sujeito do experimento.7 Determinada
ficha minha podia valer US$8,00 enquanto, para você, valeria US$4,00,
pois essas eram as quantias que receberíamos do pesquisador caso
terminássemos com tal ficha no fim do experimento. Usando esse método,
Smith foi capaz de testar alguns princípios econômicos, tais como análise
de oferta e demanda. Porém, eu tinha algumas preocupações em relação a
essa metodologia. Quando você vai a uma loja e decide sobre a compra de
uma jaqueta de US$49,00, ninguém está lhe dizendo quanto você está
disposto a pagar por ela. Você precisa decidir sozinho, e essa quantia pode
depender de uma variedade de questões, tais como o preço que o produto
tem no varejo, quanto você já gastou em roupas ao longo daquele mês e se
por acaso você acabou de receber sua restituição do imposto de renda.
Muitos anos depois, finalmente dei um jeito de testar a minha
preocupação em relação a esse método, substituindo fichas por canecas de
café, como veremos no Capítulo 16.
Combinei então uma viagem em família à Disney com uma
peregrinação à Caltech para encontrar Charlie Plott, que também estava
desbravando esse campo (e poderia facilmente ter dividido o Prêmio Nobel
com Smith). Talvez por causa do contexto da Caltech, Plott gostava de
descrever o que estava fazendo por meio de uma analogia com o uso de
túnel de vento para testes de veículos. Em vez de mostrar no laboratório
que os princípios básicos da economia funcionavam, ele estava mais
interessado em testar o que acontecia quando as regras do mercado eram
alteradas. Charlie, para quem a palavra tagarela parece ter sido inventada,
também era caloroso e amigável.
Por mais gentis e impressionantes que Smith e Plott tenham sido, eu
não estava pronto para me declarar como sendo exclusivamente, ou
mesmo prioritariamente, um economista experimental. Eu queria estudar
“comportamento” e permanecer de mente aberta para as técnicas que
utilizaria. Planejava montar experimentos quando esse método parecesse
ser o melhor modo de observar comportamentos, ou às vezes apenas para
fazer perguntas às pessoas, mas também queria estudar o comportamento
das pessoas em seus habitats naturais... só faltava descobrir como fazer isso.

––––––––

Em algum momento durante o meu ano em Stanford, decidi que ia


“mergulhar” nessa nova aventura. A Universidade de Rochester não era um
local ideal, dadas as propensões intelectuais do corpo docente, que estavam
profundamente casadas com a metodologia econômica tradicional, então
procurei outro lugar.8
Quando você é entrevistado para um cargo acadêmico, apresenta um
artigo em um workshop para o corpo docente, e essa apresentação, junto
com os artigos que já escreveu, determina se você vai conseguir o emprego.
O meu artigo “Valor de uma vida” com Rosen já era bastante conhecido, e
eu poderia ter tomado o caminho mais seguro e apresentado algum
trabalho adicional sobre esse tema, mas eu queria um ambiente que
tolerasse um pouco de heresia, então apresentei um artigo sobre a
economia de autocontrole, castanhas-de-caju e tudo mais. Qualquer lugar
que me contratasse depois de ouvir a palestra sobre o artigo tinha a
probabilidade de ser pelo menos moderadamente aberto ao que viria a
seguir. Felizmente, chegaram ofertas de Cornell e Duke, e eu optei por
Cornell. A minha nova mudança estaria a 140 quilômetros de distância de
Rochester.
6

A MANOPLA

Aceitei o emprego em Cornell mais ou menos na metade da minha estada


em Stanford e começaria lá em agosto de 1978. Eu tinha trabalho a fazer
em duas frentes. Primeiro, tinha de produzir pesquisas que mostrassem o
que podíamos apreender a partir da nova abordagem que eu estava
sugerindo. Segundo, e igualmente importante, eu tinha de ser capaz de
oferecer respostas convincentes para uma série de objeções
desqualificatórias que escutaria praticamente toda vez que apresentasse a
minha pesquisa. Economistas tinham seu jeito de fazer as coisas e resistiam
a mudanças, ainda que a única razão para isso fosse por terem investido
anos construindo seu aposento particular naquele edifício.
Esse fato ficou claro para mim em uma das primeiras conferências em
que ministrei uma palestra sobre minha recente linha de pesquisa.
Durante o período de perguntas e respostas que se seguiu, um conhecido
economista levantou a seguinte questão: “Se eu levar a sério o que você
está dizendo, o que devo fazer? Minha habilidade está em saber como
resolver problemas de otimização.” Seu ponto era que, se eu estivesse certo
e os modelos de otimização fossem uma descrição pobre do
comportamento real, a sua caixa de ferramentas estaria obsoleta.
A reação dele foi inusitadamente cândida. A atitude mais comum, para
aqueles que chegavam a se envolver, era apontar o que eu estava fazendo
de errado e os fatores óbvios que eu havia ignorado. Em pouco tempo eu
tinha uma nova lista: motivos pelos quais economistas podiam, com
segurança, ignorar comportamentos como aqueles da Lista. Entre amigos,
eu chamava essa série de perguntas de a Manopla, já que tinha sensação de
estar sendo estrangulado por uma manopla medieval toda vez que dava
uma palestra sobre o meu trabalho. Aqui estão algumas das mais
importantes, junto com as respostas preliminares que elaborei na época.
Em certa medida, as pessoas estão até hoje argumentando sobre esses
pontos; eles reaparecerão ao longo do livro.
Como se
Um dos passa-foras mais proeminentes tinha apenas duas palavras: “como
se”. Resumidamente, o argumento é que os economistas, mesmo que as
pessoas sejam incapazes de resolver os problemas complexos propostos por
eles, se comportam “como se” elas fossem capazes.
Para entender a crítica “como se”, é proveitoso dar uma pequena
recordada na história da economia. A disciplina passou por uma espécie de
revolução depois da Segunda Guerra Mundial. Economistas liderados por
Kenneth Arrow, John Hicks e Paul Samuelson aceleraram a tendência de
empregar maior formalidade matemática à teoria econômica. Os dois
conceitos centrais de economia permaneceram os mesmos — a saber, que
agentes otimizam e que os mercados atingem um equilíbrio estável —,
mas os economistas ficaram mais sofisticados em sua habilidade de
descrever soluções para os problemas de otimização, bem como em
determinar as condições sob as quais um mercado atinge o equilíbrio.
Um exemplo é a chamada teoria da firma, que se resume em dizer que
as empresas maximizam lucros (ou preços de ações). À medida que os
economistas modernos começaram a especificar seu sentido preciso,
alguns objetaram com base no argumento de que gestores de verdade não
eram capazes de resolver tais problemas.
Um exemplo simples era chamado de “análise marginal”. Conforme
mencionado no Capítulo 4, uma empresa lutando para maximizar lucros
estabelecerá o preço e a produção em um ponto em que o custo marginal
seja igual à receita marginal. A mesma análise se aplica à contratação de
funcionários. Continue a contratar até que o custo do último trabalhador
seja igual ao incremento de receita que este trabalhador produz. Esses
resultados podem parecer bastante inócuos, mas, no fim dos anos 1940, um
debate enfurecido ocorreu na American Economic Review sobre se gestores
reais efetivamente se comportavam dessa maneira.1
O pontapé inicial do debate foi dado por Richard Lester, um audacioso
professor assistente em Princeton. Ele teve a coragem de escrever aos
proprietários de empresas de manufatura para pedir que lhe explicassem
seus processos de decisão sobre quantos trabalhadores contratar e qual o
volume a ser produzido. Nenhum dos executivos relatou algo semelhante a
“igualar na margem”. Primeiro, não pareciam pensar sobre o efeito de
mudanças nos preços de seus produtos ou a respeito de mudar o que
pagavam aos trabalhadores. Contrariando a teoria, não pareciam considerar
que mudanças nos salários afetassem tanto as decisões de contratação
quanto o volume de produção. Em vez disso, informaram que tentavam
vender o máximo possível de produtos, e aumentar ou diminuir a força de
trabalho para atender a esse nível de demanda. Lester termina seu artigo
corajosamente: “Este artigo levanta graves dúvidas quanto à validade da
teoria marginal convencional e as premissas sobre as quais ela se assenta.”2
O time de defesa da teoria marginal era comandado por Fritz Machlup,
que estava na Universidade de Buffalo na época e se juntou mais tarde a
Lester em Princeton, talvez para continuar o debate pessoalmente.
Machlup jogou para escanteio os dados da pesquisa de Lester,
argumentando que economistas não estão realmente interessados no que
as pessoas dizem que estão fazendo. A teoria não demanda que empresas
calculem explicitamente custos e receitas marginais, argumentava ele, mas
suas ações, mesmo assim, se aproximarão das preditas pela teoria. E
apresentava a analogia de um motorista decidindo quando ultrapassar um
caminhão em uma estrada de mão dupla. Mesmo sem fazer nenhum
cálculo, o motorista consegue fazer a ultrapassagem. Um executivo, seu
argumento prosseguia, toma decisões praticamente da mesma maneira.
“Ele simplesmente confiava no seu instinto, na sua percepção da
situação... [e] ‘simplesmente sabia’ de modo vago e aproximado, se valia a
pena ou não contratar mais pessoas.”3 Machlup tinha fortes críticas aos
dados de Lester, mas não apresentava nenhum dado próprio.
Foi no contexto desse debate que Milton Friedman, um jovem
economista a caminho da fama, entrou em campo. No influente ensaio
chamado “A metodologia da economia positiva” [“The Methodology of
Positive Economics”, no original], Friedman argumentava que era
bobagem avaliar a teoria com base no realismo de suas premissas. O que
importava era a acurácia das previsões da teoria. (No seu título, ele
emprega a palavra “positiva” da maneira como eu uso “descritiva” neste
livro, ou seja, como contraste à normativa.)
Para ilustrar seu ponto, ele troca o motorista de Machlup por um
excelente jogador de sinuca. E observa que

seriam geradas predições excelentes seguindo as hipóteses de que um


jogador de sinuca realiza as jogadas como se soubesse as complicadas
fórmulas matemáticas que fornecem a direção ideal de percurso,
como se conseguisse estimar a olho nu os ângulos etc.; assim,
descreveria a localização das bolas, faria cálculos imediatos e, então,
faria a bola percorrer a trajetória indicada pelas fórmulas. A nossa
confiança nessas hipóteses não se baseia na crença de que jogadores
de sinuca, mesmo experientes, possam executar, ou de fato
executem, o processo descrito; ela deriva mais da crença de que, a
menos que, de um modo ou de outro, sejam capazes de alcançar o
mesmo resultado, não seriam excelentes jogadores de sinuca.4
Friedman era um debatedor brilhante, e seu argumento com certeza
parecia convincente. Para muitos economistas da época, isso resolvia a
questão. A American Economic Review deixou de publicar qualquer rodada
posterior do debate que estivesse preparando, e os economistas retornaram
a seus modelos, livres da preocupação de suas premissas serem ou não
“realistas”. Uma boa teoria, ao que parecia, não podia ser derrotada usando
dados de pesquisa, mesmo que os defensores da teoria não apresentassem
dados próprios. E essa continuava sendo a situação do jogo cerca de 30
anos depois, quando comecei a ter minhas ideias desviantes. Mesmo hoje,
grunhidos de “como se” pipocam em seminários de economia para
desconsiderar resultados que não apoiem as predições teóricas de
referência.
Felizmente, Kahneman e Tversky haviam apresentado uma resposta
para a questão “como se”. Tanto seu trabalho com heurísticas e vieses
quanto o trabalho com a teoria da perspectiva mostravam claramente que
as pessoas não agiam “como se” estivessem escolhendo de acordo com o
modelo econômico racional. Quando os sujeitos em um dos experimentos
de Kahneman e Tversky escolhiam uma alternativa dominada por outra —
isto é, escolhiam uma alternativa mesmo que a outra fosse melhor sob
todos os aspectos —, não há como dizer que estavam agindo como se
estivessem fazendo um julgamento correto. E também não havia como
declarar racionais os hábitos de comprar vinho do professor Rosett.
Em homenagem a Friedman, a quem eu genuinamente admirava, dei
ao meu primeiro artigo de economia comportamental o título “Rumo a
uma teoria positiva de escolha do consumidor” [“Toward a Positive Theory
of Consumer Choice”, no original]. A última seção continha uma resposta
detalhada à inevitável pergunta “como se”. E também comecei com o
exemplo da sinuca. Meu ponto principal era que a economia deve ser
supostamente uma teoria para todos, não só de especialistas. Um jogador
profissional de sinuca talvez jogue como se conhecesse toda a geometria e
a física relevantes, mas o típico jogador de bar geralmente mira a bola mais
próxima da caçapa e dá a tacada, muitas vezes errando. Se é para termos
teorias úteis sobre como pessoas comuns fazem compras, poupam para a
aposentadoria, procuram emprego ou preparam o jantar, é melhor que
essas teorias não pressuponham que as pessoas se comportem como se
fossem especialistas. Não jogamos xadrez como um grande mestre, nem
investimos como Warren Buffett, nem cozinhamos como um chef. É mais
provável que cozinhemos como Warren Buffett (que adora fast-food). Mas
uma réplica rápida para a crítica “como se” estava longe de ser suficiente;
para ganhar o debate, eu precisaria de fortes evidências empíricas que
convencessem os economistas.
Até hoje, a expressão “evidência de questionário” raramente é ouvida
em círculos econômicos sem o necessário adjetivo “mera”. Claro, esse
desdém é não científico. Dados em pesquisas de intenção, que provêm
simplesmente de perguntar às pessoas em que candidatos estão planejando
votar, produz previsões de acurácia ímpar quando usadas com cuidado por
estatísticos habilidosos como Nate Silver. O aspecto mais interessante dessa
atitude antiquestionário é que muitas variáveis macroeconômicas
importantes são produzidas por levantamentos como esses!
Por exemplo, a imprensa norte-americana fica obcecada com o anúncio
mensal dos mais recentes dados de “empregos”, com economistas de ar
sério convidados a interpretar os números. De onde vêm esses dados
numéricos sobre empregos? Vêm de levantamentos conduzidos pelo
censo. A taxa de desemprego, uma das variáveis básicas no modelamento
macroeconômico, também é determinada a partir de um levantamento
que pergunta às pessoas se estão à procura de trabalho. No entanto, usar os
dados publicados de taxa de desemprego não é considerado uma falha em
macroeconomia. Pelo visto, os economistas não se importam com dados
estatísticos contanto que tenham sido coletados por alguma outra pessoa
que não o pesquisador.
Em 1980, entretanto, as questões referentes a levantamentos estatísticos
não eram capazes de vencer os resmungos “como se”. Seria necessário
trazer para a cena alguns dados apropriados que demonstrassem que as
pessoas tinham um comportamento desviante em suas escolhas na vida
real.

Incentivos
Economistas botam muita fé em incentivos. O argumento diz que, se a
bolada aumenta, as pessoas terão maior incentivo para pensar mais, pedir
ajuda ou fazer o que for necessário para resolver o problema do jeito certo.
Era típico dos experimentos de Kahneman e Tversky serem feitos com
nada em jogo; para os economistas, isso indicava que podiam ser
tranquilamente ignorados. E quando incentivos reais eram introduzidos
em um contexto de laboratório, eram somas pequenas, apenas alguns
dólares. Seguramente, dizia-se com frequência, se os incentivos
aumentassem, as pessoas fariam as coisas do jeito certo. Essa afirmação,
sem qualquer sustentação em evidências, era tomada por verdadeira,
apesar do fato de que nada na teoria ou na prática econômica indicasse um
escopo exclusivo a problemas de larga escala. A teoria econômica deveria
funcionar bem tanto na compra de pipoca quanto na de automóveis.
Dois economistas da Caltech forneceram certa evidência inicial contra
essa linha de ataque: David Grether e Charlie Plott, um dos meus tutores
de economia experimental. Grether e Plott tinham deparado com uma
pesquisa conduzida por dois dos meus mentores em psicologia, Sarah
Lichtenstein e Paul Slovic. Lichtenstein e Slovic haviam descoberto
“reversões de preferência”,5 um fenômeno que se revelava desconcertante
para os economistas. Em poucas palavras, sujeitos eram induzidos a dizer
que preferiam a opção A em vez da opção B... e também que preferiam B
em vez de A.
Esse achado comprometia um dos fundamentos teóricos essenciais de
qualquer teoria econômica formal, o qual postulava que as pessoas têm
“preferências bem definidas”, ou seja, que nós sabemos com coerência do
que gostamos. Economistas não se importam se você gosta mais de um
colchão firme do que de um macio ou vice-versa, mas não podem tolerar
que você diga que gosta mais de um colchão firme do que de um macio e
de um macio mais do que de um firme. Isso, não pode. Os livros teóricos
de economia parariam na primeira página se essa premissa de preferências
bem ordenadas tivesse de ser abandonada porque, sem preferências
estáveis, não há nada para ser otimizado.
Lichtenstein e Slovic incitaram reversões de preferência quando
presentearam os sujeitos com um par de jogos de aposta: um relativamente
seguro, algo como 97% de chance de ganhar US$10,00, e outro mais
arriscado, algo como 37% de chance de ganhar US$30,00. Chamaram o
jogo quase certo de aposta “p”, significando alta probabilidade, e o jogo
mais arriscado de aposta “$”, já que oferecia uma chance de ganhar mais
dinheiro. Primeiro perguntaram às pessoas que jogo preferiam. A maioria
optou por p, uma vez que lhes agradava uma chance quase certa de
ganhar. Para esses sujeitos, isto significava que preferiam p a $. Então
perguntaram a esses sujeitos que preferiam p: “Suponha que você seja
dono de uma aposta p. Qual é o preço mais baixo que você pediria para
estar disposto a vendê-la?” E também lhes fizeram a mesma pergunta em
relação à aposta $. Estranhamente, a maioria desses sujeitos exigia mais
para desistir de $ do que para desistir de p, indicando que gostavam mais
da aposta $. Mas isso significa que preferiam a aposta p à aposta $, e a
aposta $ à aposta p. Blasfêmia!
Grether e Plott queriam saber o que estava provocando esses resultados
estranhos, e sua hipótese mais importante era a dos incentivos.6 Se as
apostas fossem reais, conjecturaram eles, esse absurdo deixaria de existir.
Então usaram dinheiro de verdade nos experimentos e, para sua grande
surpresa, a frequência e a seriedade das reversões de preferência na
realidade aumentaram. Aumentar o valor da aposta só intensificou os
resultados.7
Isso não pôs fim à objeção dos incentivos. Mas pelo menos era possível
citar a existência de um artigo que questionava a alegação de que dinheiro
resolveria todos os problemas que os economistas tinham com pesquisa
comportamental. Como veremos, esse tem sido um tema bem recorrente
no debate sobre a validade de evidência experimental.

Aprendizagem
O estilo de experimentos que Kahneman e Tversky conduziam era muitas
vezes criticado como um jogo de “rodada única”. No “mundo real”,
argumentavam os economistas, as pessoas têm oportunidade de aprender.
A ideia é bastante razoável. Não começamos a vida como bons motoristas,
mas a maioria de nós aprende a dirigir sem contratempos frequentes. O
fato de um psicólogo inteligente poder conceber uma pergunta capaz de
levar as pessoas no laboratório a cometer um erro não implica
necessariamente que o mesmo erro seria cometido no “mundo real”.
(Laboratórios são considerados como mundos irreais.) Lá fora, as pessoas
têm muito tempo para exercícios de tomada de decisão, de modo que não
vão cometer os erros que vemos no laboratório.
O problema com a história da aprendizagem é que ela pressupõe que
vivemos em um mundo como o de Bill Murray no filme O feitiço do
tempo. Toda vez que o personagem de Bill Murray acorda, revive o mesmo
dia, de novo e de novo. Ele só descobre o que estava acontecendo porque
foi capaz de aprender, modificando uma coisa de cada vez para ver o que
aconteceria. Felizmente, a vida real não é tão controlada assim. Mas, como
resultado, a aprendizagem pode ser difícil.
Psicólogos nos dizem que, para aprender por meio da experiência, são
necessários dois ingredientes: prática frequente e feedback imediato.
Quando essas condições estão presentes, tal como ocorre quando
aprendemos a andar de bicicleta ou dirigir um carro, nós aprendemos,
possivelmente com alguns contratempos ao longo do caminho. Mas
muitos dos problemas da vida não oferecem essas oportunidades, o que
levanta um ponto interessante. Os argumentos de aprendizagem e
incentivo são, em certa medida, contraditórios. Isto me ocorreu pela
primeira vez durante um debate público que tive com Ken Binmore,
especialista britânico em teoria dos jogos.
Em uma conferência organizada para estudantes de pós-graduação,
Binmore e eu ministrávamos uma palestra por dia cada um. Eu
apresentava novas descobertas de economia comportamental e, embora o
trabalho de Binmore não estivesse relacionado com o meu, ele aproveitava
a oportunidade no começo de cada uma de suas palestras para responder a
uma que eu dera na véspera. Depois da minha primeira palestra, Binmore
forneceu uma versão da crítica do “valor baixo”. Ele disse que, se estivesse
dirigindo um supermercado, gostaria de consultar minha pesquisa, porque,
para compras baratas, as coisas que eu estudava podiam possivelmente ter
importância. Mas se estivesse dirigindo uma concessionária de automóveis,
minha pesquisa seria de pouca relevância. Com valores mais altos, as
pessoas faziam a coisa certa.
No dia seguinte, apresentei o que agora chamo de “continuum de
Binmore” em homenagem a ele. Escrevi da esquerda para a direita no
quadro-negro uma lista de produtos que variavam com base na frequência
da compra. Do lado esquerdo, comecei com almoço na cafeteria (diário),
depois leite e pão (duas vezes por semana) e assim por diante até chegar a
roupas, carros e casas, escolhas de carreira e cônjuges (não mais do que
dois ou três para a maioria de nós). Note a tendência. Fazemos coisas
pequenas com frequência suficiente para aprender o jeito certo, mas
quando se trata de escolher uma casa, uma hipoteca ou um emprego, não
conseguimos muita prática ou oportunidades para aprender. E quando se
trata de poupar para a aposentadoria, nós só o fazemos exatamente uma
vez, salvo em outras encarnações. Binmore, na verdade, começou pelo
lado errado. Como a aprendizagem exige prática, temos mais
probabilidade de fazer a coisa certa com pequenos valores do que com
grandes valores. Isso significa que os críticos precisam decidir qual dos
argumentos querem aplicar. Se aprendizagem é crucial, então, à medida
que os valores aumentam, a qualidade da tomada de decisão
provavelmente irá cair.

Mercados: o gesto da mão invisível


O contra-argumento mais importante da Manopla envolve mercados. Eu
me lembro bem da primeira vez que este argumento foi apresentado a
Amos. Foi durante o jantar em uma conferência organizada por Michael
Jensen, expoente intelectual da escola de negócios de Rochester, onde eu
estava lecionando. Naquela época, Jensen acreditava firmemente tanto em
modelos de escolha racional quanto na eficiência dos mercados
financeiros. (Desde então, mudou sua visão de muitas maneiras.) Creio
que ele viu a conferência como uma chance de descobrir qual era todo
aquele alvoroço em torno de Kahneman e Tversky, bem como uma
oportunidade de colocar na linha dois psicólogos confusos.
No decorrer da conversa, Amos pediu a Jensen para avaliar as
capacidades de tomada de decisão da sua esposa. Mike logo começou a nos
regalar com histórias das ridículas decisões econômicas que ela tomava,
como comprar um automóvel caro e então se recusar a dirigi-lo porque
tinha medo de que sofresse um amassado. Então Amos perguntou a Jensen
acerca dos seus alunos, e Mike reclamou dos erros bobos que eles
cometiam, queixando-se de quanto eram lerdos para entender os conceitos
econômicos mais básicos. À medida que mais vinho era consumido, as
histórias de Mike iam ficando melhores.
Então Amos veio com o golpe fatal. “Mike”, disse ele, “você parece
acreditar que quase todos os seus conhecidos são incapazes de tomar
corretamente até mesmo as decisões econômicas mais simples, mas aí
considera que todos os agentes nos seus modelos são gênios. O que está
havendo?”
Jensen permaneceu imperturbável. “Amos”, disse, “você simplesmente
não entende.” Então deslanchou em um discurso que atribuo a Milton
Friedman. Não fui capaz de encontrar tal argumento nos escritos de
Friedman, mas naquela época em Rochester as pessoas o atribuíram ao Tio
Miltie, como era carinhosamente chamado. O discurso é mais ou menos
assim: “Suponha que houvesse pessoas fazendo coisas bobas — como os
sujeitos dos seus experimentos — e que essas pessoas tivessem de interagir
em mercados competitivos, então...”8
Chamo esse argumento de gesto da mão invisível porque, pela minha
experiência, ninguém jamais terminou essa sentença com ambas as mãos
permanecendo quietas, e acredito que esteja de alguma forma relacionado
com a mão invisível de Adam Smith,9 cujo funcionamento é ao mesmo
tempo superestimado e misterioso. O vago argumento é que os mercados,
de alguma maneira, corrigem os comportamentos desviantes das pessoas.
Gesticular é uma obrigação porque não existe maneira lógica de se chegar
a uma conclusão de que os mercados transformam as pessoas em agentes
racionais.10 Suponha que você preste atenção a custos afundados e acabe
com uma bela sobremesa depois de um grande jantar só porque pagou por
ela. O que acontecerá com você? Se você comete esse erro com
frequência, pode ser que esteja meio gordinho, mas, fora isso, tudo bem. E
se você sofre de aversão a perdas? Será que isso é fatal? Não. Suponha que
você resolva começar um novo negócio porque está com excesso de
confiança e avalia suas chances de sucesso em 90%, quando na verdade a
maioria dos novos negócios fracassa. Bem, ou você terá sorte e será bem-
sucedido apesar da sua decisão tola, ou viverá metido em problemas, mal
ganhando para sobreviver. Ou talvez resolva desistir, fechar o negócio e ir
fazer outra coisa. Por mais cruel que o mercado possa ser, ele não torna
você racional. E, exceto em raras circunstâncias, deixar de agir de acordo
com o modelo do agente racional não é algo fatal.11
Às vezes o gesto da mão invisível se combina com o argumento dos
incentivos para sugerir que as pessoas saem e contratam especialistas para
ajudá-las quando os valores são altos e as escolhas são difíceis. O problema
com esse argumento é que pode ser difícil achar um verdadeiro
especialista que não recaia em um conflito de interesses. É ilógico pensar
que alguém que não seja sofisticado o suficiente para escolher um bom
plano de poupança para sua aposentadoria será sofisticado o bastante para
buscar um consultor financeiro, corretor hipotecário ou corretor
imobiliário. Muita gente fez dinheiro vendendo poções mágicas e
esquemas de Ponzi,12 mas poucos ficaram ricos vendendo o seguinte
conselho: “Não compre essa coisa.”
Uma versão diferente do argumento é que as forças de concorrência
levam inexoravelmente as empresas a serem maximizadoras, mesmo que
sejam administradas por Humanos, inclusive alguns que não se destacaram
como estudantes. É claro que há algum mérito nesse argumento, mas
acredito que seja vastamente superestimado. Na minha vida, não consigo
me lembrar de nenhuma vez em que especialistas consideraram a General
Motors uma empresa bem administrada. Mas a GM seguiu aos tropeços
durante décadas com gerenciamento ruim. Na maior parte desse período,
também foi a maior fabricante de carros do mundo. Talvez tivesse
desaparecido da economia global em 2009 após a crise financeira, mas
com o auxílio de um resgate do governo, é agora a segunda maior
fabricante de carros do mundo, um pouquinho atrás da Toyota e pouco à
frente da Volkswagen. As forças da concorrência aparentemente agem de
forma vagarosa.
Para ser justo com Jensen, há uma versão mais coerente dessa ideia. Em
vez de argumentar que os mercados forçam as pessoas a ser racionais,
pode-se dizer que os preços de mercado ainda serão racionais, mesmo que
muitos indivíduos sejam, sem sombra de dúvida, Humanos. Tal linha de
pensamento com certeza é plausível, talvez até convincente. Porém, está
errada. Mas como e por que está errada é uma longa história que
abordaremos na Seção VI.
Para que o campo da economia comportamental tivesse êxito,
precisávamos de respostas para essas questões. E, em alguns redutos, ainda
precisamos. Mas agora, em vez de exemplos rápidos com uma única linha
de raciocínio, é possível citar estudos de pessoas reais interagindo em
mercados de grandes valores — até mesmo mercados financeiros, onde
seria de se esperar que o gesto da mão invisível tivesse toda a probabilidade
de ser válido.

––––––––

Foi com a Manopla em mente que cheguei a Cornell, em Ithaca, estado


de Nova York, no outono de 1978. Ithaca é uma pequena cidade rural com
longos invernos cheios de neve e sem muita coisa para fazer. Era um bom
lugar para trabalhar.
Enquanto estive na Califórnia, consegui terminar dois artigos. Um
apresentava a Lista, e o outro se chamava “Uma teoria econômica de
autocontrole”.13 Escrever os artigos foi a parte mais fácil; conseguir que
fossem publicados foi outra história. O primeiro deles, mencionado
anteriormente, “Rumo a uma teoria positiva de escolha do consumidor”,
foi rejeitado por seis ou sete das publicações científicas mais importantes;
fiz questão de esquecer a contagem exata. Em retrospecto, não fico
surpreso. O artigo tinha uma profusão de ideias, mas pouca evidência
sólida para apoiá-las. Cada rejeição era acompanhada de um conjunto de
comentários mordazes dos pareceristas, que eu tentava incorporar na
versão seguinte. Ainda assim, parecia que eu não estava fazendo progresso.
Em algum momento eu precisava ter esse artigo publicado, mesmo que
o único motivo fosse poder seguir adiante. Felizmente, dois economistas
de mente aberta estavam começando uma revista nova chamada Journal of
Economic Behavior and Organization. Tive o palpite de que eles deveriam
estar ansiosos para receber propostas, então mandei o artigo e eles o
publicaram na edição de estreia. Foi a minha primeira publicação em
economia comportamental, embora tivesse sido em uma revista da qual
ninguém nunca ouvira falar.
Se fosse para permanecer na área acadêmica e obter estabilidade em
uma universidade focada em pesquisa como Cornell, teria que começar a
publicar regularmente em revistas científicas de primeira linha. Eu voltara
da Califórnia com duas ideias na minha lista de tópicos a explorar. A
primeira era compreender a psicologia de gastar, poupar e outros
comportamentos financeiros domésticos, o que ficaria conhecido como
contabilidade mental. A segunda ideia era o autocontrole e, mais
genericamente, a escolha entre agora e mais tarde. As próximas duas seções
do livro abordam esses tópicos.
II
CONTABILIDADE MENTAL
1979 – 85
Depois do nosso ano juntos na Califórnia, Amos e Danny continuaram sua
colaboração e eu os via apenas ocasionalmente em conferências. Eles
estavam trabalhando em artigos de atualização da “Teoria da perspectiva”,
e eu continuava a refletir sobre escolha do consumidor. Havia um tópico,
porém, no qual tanto eles quanto eu estávamos pensando, de forma quase
independente. Em resumo, é o seguinte: “Como as pessoas pensam em
dinheiro?” Nos primeiros tempos, chamei esse processo de “contabilidade
psicológica”, porém, em um artigo posterior sobre o assunto, Amos e
Danny mudaram o nome para “contabilidade mental”,1 e eu os
acompanhei.
Continuei a pensar, escrever e falar sobre contabilidade mental desde
então. Ainda acho o tema fascinante, empolgante e incisivo; é uma lente
que me ajuda a entender o mundo. Os próximos capítulos são dedicados
ao básico da contabilidade mental, mas o tópico permeia todo o resto do
livro. Pensar em contabilidade mental pode ser contagioso. Em breve é
capaz de você deixar escapar: “Bem, isto é realmente um problema de
contabilidade mental.”
7

PECHINCHAS E ENGANAÇÕES

Minha amiga Maya Bar-Hillel estava tentando comprar uma colcha


para a sua cama de casal. Ela foi até a loja e achou uma em
liquidação que lhe agradou. Os preços habituais eram US$300,00
por uma king size, US$250,00 por uma queen size e US$200,00 por
uma de casal comum. Na semana em questão, todos os tamanhos
estavam no preço de US$150,00. Maya não conseguiu resistir:
comprou uma king size.

Para começar qualquer análise sobre contabilidade mental, vale a pena


entender o básico da teoria econômica do consumidor. Retomando a
discussão sobre o efeito posse, cabe lembrar que todas as decisões
econômicas são tomadas através da lente dos custos de oportunidade. O
custo de um jantar e cinema esta noite não se resume apenas ao
desembolso financeiro — depende também dos usos alternativos desse
tempo e dinheiro.
Se você entende os custos de oportunidade e tem um ingresso para um
jogo que poderia revender por US$1.000,00, não importa quanto você
pagou pelo ingresso. O custo de ir ao jogo é o que você poderia fazer com
esses US$1.000,00. Você só deve ir ao jogo se esse for o melhor uso
possível do dinheiro. É melhor do que 100 filmes a US$10,00 cada?
Melhor do que uma incrementada no seu visual já ultrapassado? Melhor
do que guardar o dinheiro para uma emergência ou um fim de semana
ensolarado? Essa análise não se limita a decisões que envolvem dinheiro.
Se você passa a tarde lendo um romance, então o custo de oportunidade é
qualquer outra coisa que você poderia ter feito com esse tempo.
Essa linha de raciocínio é uma caracterização correta e apropriada da
teoria normativa de escolha do consumidor. É o que os Econs fazem e, em
princípio, deveríamos todos nos esforçar a maior parte do tempo para
pensar desse jeito. Ainda assim, qualquer um que seguisse esses parâmetros
para tomar uma decisão ficaria paralisado. Como seria possível saber qual
das quase infinitas maneiras de usar US$1.000,00 me deixará mais feliz? É
um problema complexo demais, e é irrealista pensar que o consumidor
típico faz essas considerações. Poucos raciocinam assim. Para o problema
do ingresso de US$1.000,00, muita gente irá considerar apenas algumas
poucas opções. Eu poderia assistir ao jogo pela televisão e usar o dinheiro
para visitar a minha filha em Providence. Será que isso seria o ideal? Mas
descobrir a melhor alternativa de uso para o dinheiro não é algo de que eu
ou qualquer um seja capaz — nem mesmo de chegar a uma conclusão
aproximada.1
Então o que as pessoas fazem de fato? Eu estava inseguro sobre como
tratar esse e outros aspectos da tomada de decisão do consumidor, então
contratei um estudante para entrevistar famílias da região e averiguar o que
podíamos aprender sobre o comportamento de pessoas reais. Concentrei-
me em lares de classe média-baixa, porque as decisões de gastos são muito
mais importantes quando se tem um orçamento limitado.
As entrevistas eram planejadas com a intenção de dar aos participantes
tempo de sobra para falar sobre tudo que quisessem. (Nós lhes pagávamos
uma quantia fixa para participar, mas alguns falaram durante horas.) O
público-alvo das entrevistas era o responsável por lidar com o dinheiro nas
casas. Entre casais, essa responsabilidade recaía com mais frequência sobre
a esposa. O propósito das entrevistas não era coletar dados para um artigo
acadêmico. Eu simplesmente esperava obter uma impressão geral do
entendimento das pessoas a respeito da administração de suas finanças
domésticas. É notória a visita de Adam Smith a uma fábrica de alfinetes
para ver como era o processo de fabricação. Esta era a minha fábrica de
alfinetes. As entrevistas criaram uma base na realidade para mim e
influenciaram grandemente tudo que escrevi depois sobre contabilidade
mental.
A primeira questão a tratar era uma sobre a qual eu vinha ponderando
desde a época da Lista. “Quando um custo é uma perda?” Embora a tivesse
em mente havia muito tempo, minha “descoberta” da teoria da perspectiva
fez crescer meu interesse. Lembre-se de que função valor evidencia a
aversão a perdas: começando do zero, ela é mais íngreme na descida do
que na subida. O efeito negativo de uma perda é duas vezes mais intenso
do que o efeito positivo gerado por um ganho. Isso levanta a pergunta: se
você paga US$5,00 por um sanduíche, você sente que acabou de perder
US$5,00? Para transações de rotina, a resposta é claramente não. Por um
motivo: pensar dessa maneira deixaria você infeliz. Como as perdas pesam
duas vezes mais que os ganhos, até mesmo a troca de duas notas de
US$5,00 por uma de US$10,00 seria vista como perda, aplicando-se esse
tipo de contabilidade. “Perder” cada uma das notas de US$5,00 seria mais
doloroso do que o prazer associado a receber os US$10,00. Então o que
realmente acontece quando você faz uma compra? E o que Maya estava
pensando quando comprou aquela colcha gigante?
Enfim cheguei a uma formulação que envolve dois tipos de utilidade:
utilidade de aquisição e utilidade de transação. Utilidade de aquisição
baseia-se na teoria econômica padrão e é equivalente ao que os
economistas chamam de “excedente do consumidor”. Conforme explicita
o termo, é a parcela que sobra após o custo de oportunidade — ou seja, o
valor referente àquilo do qual desistimos — ser subtraído da utilidade
estimada do objeto adquirido. Para um Econ, a utilidade de aquisição é o
fim da história. Uma compra produzirá uma abundância de utilidade de
aquisição apenas se o consumidor valoriza algo muito mais do que o
mercado. Se você está com muita sede, então uma garrafa de água de
US$1,00 é uma utilidade que caiu do céu. E para um Econ que possui
uma cama de casal, a utilidade de aquisição de uma colcha que cabe
exatamente na cama seria maior do que de uma que fica sobrando 60
centímetros de cada lado em todas as direções.
Humanos, por outro lado, pesam um aspecto diferente da aquisição: a
qualidade percebida do negócio. É a isto que a utilidade de transação se
refere. Ela é definida como a diferença entre o preço efetivamente pago
pelo objeto e o preço que normalmente se esperaria pagar, o preço de
referência. Suponha que você esteja num evento esportivo e compre um
sanduíche idêntico ao que habitualmente costuma comprar para o almoço,
mas ele custa o triplo do preço. O sanduíche está gostoso, mas a oferta em
geral não cheira bem. Ele produz uma utilidade de transação negativa,
uma “enganação”. Em contraste, se o preço está abaixo do preço de
referência, então a utilidade de transação é positiva, uma “pechincha”,
como a colcha extragrande de Maya sendo vendida pelo mesmo preço que
a colcha menor.
Eis aqui uma pergunta de pesquisa que ilustra o conceito. Dois grupos
de estudantes em um programa de MBA executivo que relataram ser
consumidores habituais de cerveja foram indagados sobre uma das duas
versões do cenário a seguir. As variações parecem em parênteses e
colchetes.

Você está deitado na praia em um dia de calor. Só tem água gelada


para beber. Durante a última hora, você tem pensado em quanto
curtiria uma boa garrafa gelada da sua marca de cerveja predileta.
Um companheiro se levanta para dar um telefonema e se oferece
para trazer uma cerveja do único ponto de venda próximo (um hotel
sofisticado) [um boteco pequeno e precário]. Ele diz que a cerveja
pode ser cara, então pergunta quanto você está disposto a pagar. Ele
diz que vai comprar a cerveja se ela custar igual ou menos desse
valor. Mas se custar mais, não comprará. Você confia no seu amigo,
e não há possibilidade de pechinchar com o (barman) [dono do
boteco]. Que preço você diz a ele?

Há diversos pontos que demandam atenção nesse caso, o qual foi


elaborado com apuro para desviar antecipadamente das objeções que
escutaria de economistas. Como elemento crucial do exemplo, o ato de
consumo é idêntico nas duas situações. O participante quer tomar uma
garrafa da sua cerveja predileta na praia. Ele nunca entra no
estabelecimento no qual a cerveja foi comprada ou sequer o vê e, portanto,
não é submetido a nenhuma ambientação, nem positiva nem negativa.
Além disso, ao excluir negociações com o vendedor, os participantes não
têm motivo para disfarçar sua verdadeira preferência. Em jargão de
economistas, a situação é compatível em incentivos.
Estabelecidas essas condições, podemos prosseguir à essência da
questão. As pessoas estão dispostas a pagar mais pela cerveja se ela tiver sido
adquirida no hotel do que no boteco. As medianas das respostas,2
corrigidas pela inflação, foram US$7,25 e US$4,10.
Esses resultados demonstram que as pessoas estão dispostas a pagar
preços diferentes pela mesma cerveja, consumida no mesmo lugar da
praia, dependendo de onde ela é comprada. Por que os respondentes se
preocupam com o local onde a cerveja foi comprada? Uma das razões são
as expectativas. As pessoas esperam que os preços sejam mais altos em um
hotel sofisticado, em parte porque os custos são obviamente mais altos.
Pagar US$7,00 por uma cerveja em um hotel é desagradável, mas
esperado; pagar esse valor em uma espelunca é um insulto! Essa é a
essência da utilidade de transação.
Econs não vivenciam utilidade de transação. Para eles, o local da
aquisição é outro fator supostamente irrelevante (FSI). Não que os Econs
sejam imunes a pechinchas. Se alguém estivesse vendendo cerveja na praia
por US$0,10, então até um Econ ficaria feliz, mas essa felicidade é
plenamente capturada pela utilidade de aquisição. Aqueles que apreciam
utilidade de transação obtêm prazer (ou dor) puramente pelos termos do
negócio em si.
Como a utilidade de transação pode ser positiva ou negativa — isto é,
pode haver grandes negócios ou terríveis roubadas —, ela pode tanto
impedir aquisições que produzam bem-estar quanto induzir aquisições que
sejam perda de dinheiro. O exemplo da cerveja na praia ilustra um caso
em que alguém pode ser dissuadido de fazer uma aquisição que valha a
pena. Suponha que Dennis diga que pagaria no máximo US$4,00 pela
cerveja do boteco, mas US$7,00 pela cerveja do hotel. Seu amigo Tom
poderia deixar Dennis mais feliz se comprasse a cerveja no boteco por
US$5,00, mas dissesse que a comprou no hotel. Dennis beberia sua cerveja
É
pensando que foi um bom negócio. É apenas o fato de não gostar de pagar
caro que o impede de concordar com essa transação sem o subterfúgio de
Tom.
Para aqueles que estão vivendo pelo menos confortavelmente, utilidade
de transação negativa pode impedir experiências especiais de consumo
capazes de gerar boas lembranças que perdurarão por toda a vida, e a
parcela excessiva da quantia cobrada estará há muito esquecida. Bons
negócios, por outro lado, podem nos tentar a fazer aquisições de objetos de
pouco valor. Todo mundo tem itens no seu armário que são raramente
usados, mas foram “compras obrigatórias” simplesmente porque o negócio
era bom demais. Em algum lugar da garagem ou do sótão temos uma
versão particular da colcha de Maya.
Como os consumidores pensam dessa maneira, os vendedores têm um
incentivo para manipular o preço de referência percebido e criar a ilusão
de um “bom negócio”. Um exemplo que tem sido usado há décadas é
anunciar um “preço de varejo sugerido” amplamente fictício, que na
realidade serve apenas como um enganoso preço de referência sugerido.
Nos Estados Unidos, alguns produtos parecem estar sempre em oferta, tais
como tapetes e colchões, e em algumas lojas de varejo, ternos masculinos.
Bens comercializados dessa maneira compartilham duas características: são
comprados com pouca frequência e a qualidade é difícil de avaliar. Os
compradores esporádicos ajudam porque os consumidores muitas vezes
não percebem que há sempre uma liquidação acontecendo. A maioria de
nós fica agradavelmente surpresa ao descobrir, na ocasião da compra de
um colchão, que sempre há uma oferta. E quando a qualidade do produto
é difícil de avaliar — como a de um colchão —, o preço de varejo sugerido
pode exercer uma função dupla. Pode simultaneamente sugerir que a
qualidade é boa (aumentando assim a utilidade de aquisição percebida) e
insinuar a possível existência de uma utilidade de transação porque o
produto está “em oferta”.
Compradores habituais podem ser fisgados pela animação derivada da
utilidade de transação. Se um varejista conhecido por descontos frequentes
tenta demover seus fregueses de esperar por bons negócios, pode ter
dificuldade. Muitos lojistas têm tentado ao longo dos anos atrair seus
clientes com algo chamado “preço baixo todo dia”, mas esses experimentos
geralmente fracassam.3 Fazer um bom negócio é muito mais prazeroso do
que economizar uma quantia pequena e quase invisível em cada item.
Macy’s4 e JC Penney são apenas dois varejistas americanos que
notavelmente tentaram — e fracassaram — demover o vício dos fregueses
em ofertas frequentes. Em uma reformulação de imagem levada a cabo em
2006–07, a diretoria da Macy’s escolheu os cupons como alvo e quis
reduzir seu uso como recurso de redução de preços. A empresa via os
cupons como uma ameaça, vinculando muito de perto sua marca a
varejistas menos prestigiosos, como JC Penney ou Kohl’s. Na primavera de
2007, depois de incorporar diversas outras lojas de departamentos pelo país
e rebatizá-las todas como Macy’s, cortaram o uso de cupons em 30% em
comparação com a primavera anterior. Isto não caiu bem para os clientes.
As vendas despencaram, e a Macy’s rapidamente prometeu retomar sua
abundância de cupons na temporada de férias do mesmo ano.
A JC Penney, de maneira similar, evitou cupons por um breve período
em 2012 ao tentar uma estratégia de preços baixos diários. Notando que
menos de 1% das receitas provinha de transações com preço integral, o
CEO Ron Johnson, em um comunicado surpreendentemente ingênuo à
imprensa,5 anunciou o fim do que chamou de “preços falsos” — o mítico
preço de varejo sugerido — e o início de um esquema de precificação mais
simples. Além de abolir vendas tradicionais via cupons, o novo esquema
arredondou os preços terminando em “,99” para o preço cheio mais
próximo. A JC Penney alegou que o preço final pago pelo consumidor era
efetivamente o mesmo após todas essas mudanças.6
É provável que os consumidores não estivessem pagando a mais nesse
novo regime, mas estavam perdendo muito em utilidade de transação.
Perderam até mesmo o diminuto prazer de pagar “só um pouquinho
menos”, como US$9,99 em vez de US$10,00, por exemplo. O
experimento foi um fiasco. As vendas da JC Penney e o preço das ações
despencaram quando as mudanças foram efetivadas em 2012. Um ano
depois, Johnson foi demitido e os cupons voltaram aos fregueses da JC
Penney.7 Talvez os consumidores não tenham gostado de serem
informados de que os preços de varejo, a fonte de tanto prazer de utilidade
de transação, eram falsos.
Leitores (e compradores) espertos podem questionar varejistas que
trabalham com descontos em grande escala, tais como Walmart e Costco.
Esses varejistas operam com sucesso uma estratégia diária de preços baixos,
às vezes sem referência explícita a um preço original mais alto. Mas eles
não eliminaram a utilidade de transação; ao contrário. Eles convenceram
seus clientes de que toda a experiência de fazer compras é uma orgia de
caçar pechinchas, e fazem de tudo para reforçar essa imagem. Junto a
preços genuinamente baixos, o Walmart também oferece uma variação da
antiga prática de garantir que seus preços sejam efetivamente os mais
baixos do mercado, permitindo a compradores escanear seus recibos de
compra num aplicativo “caça ofertas”8 que promete devolver a diferença a
qualquer pessoa se houver um preço mais baixo. A menos que a Macy’s e a
JC Penney quisessem abrir mão de todas as pretensões de oferecer uma
experiência de compras sofisticada, não poderiam competir para prover
utilidade de transação aos seus clientes.
Para os consumidores, não há nada de errado em estar de olho nas
ofertas. Economizar dinheiro em uma compra torna possível mais uma.
Porém, não queremos ser impelidos a adquirir algo que não vamos usar
apenas por ser uma oportunidade boa demais para deixar passar. Para as
empresas, é importante perceber que todo mundo está interessado em um
bom negócio. Seja via ofertas ou preços baixos genuínos, a sedução de um
bom negócio sempre atrai clientes. O estacionamento na Costco, um
varejão famoso pelos preços baixos, sempre tem um grande número de
carros de luxo. Mesmo consumidores abastados adoram a utilidade de
transação.
8

CUSTOS AFUNDADOS

Vince pagava US$1.000,00 para frequentar um clube de tênis com


quadra coberta, o que lhe dava o direito de jogar uma vez por
semana na temporada de nevascas. Depois de dois meses,
desenvolveu cotovelo de tenista, o que tornava muito doloroso jogar.
Mesmo com dores, ele continuou a jogar durante três meses porque
não queria desperdiçar a taxa de associado. Só parou de jogar quando
a dor se tornou insuportável.

Quando certa quantia é gasta e o dinheiro não pode ser recuperado, diz-se
em economia que o dinheiro “afundou”, foi embora. Expressões como
“não chorar sobre o leite derramado” e “deixar o passado para trás” são
outras maneiras de expressar o conselho dos economistas para ignorar
custos impossíveis de serem recuperados. Mas é um conselho difícil de ser
seguido, como ilustram alguns exemplos contidos na Lista, como ir de
carro ao jogo de basquete em plena nevasca ou a história de Vince e seu
cotovelo de tenista.
Para deixar as coisas claras, vamos estipular que, se um amigo
convidasse Vince para jogar tênis (de graça) em outro clube, Vince
recusaria por causa do seu cotovelo dolorido. Em jargão de economia, a
utilidade de jogar tênis é negativa. Mas, por ter pago US$1.000,00, ele
continua a jogar, piorando seu estado cada vez que joga. Por que ele
haveria de fazer uma coisa dessas? Esta é a pergunta que eu queria
responder.
Ao longo dos anos, colecionei dezenas de exemplos de pessoas
preocupadas com custos afundados. Um deles envolvia uma amiga, Joyce,
que vivia brigando com sua filha de seis anos, Cindy, sobre o que ela devia
vestir para ir à escola. Cindy resolvera que não queria mais usar vestido, só
calças ou shorts. Joyce insistia que Cindy tinha que usar os três vestidos
que ela havia comprado para o início do primeiro ano. Muitos dias
começavam com berros de “Eu comprei esses vestidos, e você vai usá-los!”,
com Cindy retrucando que não iria à escola se tivesse que usar vestido. É
bem provável que Joyce perguntasse, inutilmente, se Cindy achava que
dinheiro crescia em árvores.
Fui trazido como mediador e expliquei a lógica econômica para Joyce.
O dinheiro pago pelos vestidos já se fora, e usá-los não o traria de volta.
Enquanto vestir calças ou shorts não exigisse uma nova compra de roupas,
insistir que Cindy usasse os vestidos não ajudaria em nada sua situação
financeira. Joyce ficou encantada ao ouvir essa informação. Ela detestava
brigar com a filha, mas genuinamente se sentia culpada por “desperdiçar”
a compra desses três vestidos. Escutar um economista lhe dizendo que
ignorar custos afundados é perfeitamente racional, até mesmo necessário,
era tudo de que ela precisava. Maya Bar-Hillel começou a dizer que eu era
o único economista clínico do mundo. (Depois do episódio da colcha, ela
se tornou minha primeira cliente.)
Posso ou não ter merecido o título, mas dificilmente era o único
economista a reconhecer que Humanos têm dificuldade com esse
conceito. Na verdade, o erro é tão comum que tem um nome oficial,
falácia de custo afundado, e a falácia é frequentemente mencionada em
livros de economia básica. Porém muita gente pode achar difícil seguir na
prática o conselho de ignorar custos afundados, mesmo entendendo o
conceito.
Dirigir debaixo de neve para ir ao jogo de basquete e jogar tênis
sentindo dor são erros que nenhum Econ cometeria. Apropriadamente,
eles tratam custos afundados como irrelevantes. Mas, para os Humanos,
custos afundados perduram e se tornam outro FSI, e não só para coisas
como jantares e shows. Muita gente acredita que os Estados Unidos
continuaram a sua fútil guerra no Vietnã porque investiram demais para
abandoná-la. Barry Staw, um professor de comportamento organizacional,
escreveu um artigo sobre o que chamou de “escalada do
comprometimento” e o intitulou de “Afundado até os joelhos no grande
lamaçal”,1 em referência a uma canção antiguerra do cantor folk Pete
Seeger.2 Na opinião de Staw, cada milhar de vidas perdidas e cada bilhão
de dólares gastos dificultavam cada vez mais declarar derrota e seguir
adiante. Alguns fatores supostamente irrelevantes podem ter bastante
importância.
Por que custos afundados importam? E porque as pessoas poderiam
pensar que prosseguir em certo curso de ação — ir ao jogo ou show, ou
continuar uma guerra inútil — vale a pena? Como vimos no capítulo
anterior, quando você faz uma compra a uma quantia que não gera
nenhuma utilidade de transação (ou desutilidade), não sente o preço da
compra como perda. Você pagou algum dinheiro e, quando consumir o
produto, terá o prazer da utilidade de aquisição e a contabilidade estará em
ordem; o seu custo inicial fica zerado pelo seu ganho posterior. Mas o que
acontece quando você compra um ingresso e não vai ao evento?
Pagar US$100,00 pelo ingresso de um show ao qual você não vai
transmite a sensação de perder US$100,00. Para continuar a analogia da
contabilidade financeira, quando você compra o ingresso e então deixa de
usá-lo, você precisa “reconhecer a perda” no livro-caixa mental que está
mantendo. Ir ao evento lhe permite ajustar essa contabilidade sem assumir
uma perda.
Da mesma maneira, quanto mais você usa uma coisa pela qual pagou,
melhor se sente em relação à transação. Eis aqui um experimento mental.
Você compra um par de sapatos, talvez porque estivesse em oferta. Ainda
que fossem caros, você não podia deixar passar essa utilidade de transação.
Um dia você calça os sapatos orgulhosamente para ir trabalhar e, na hora
do almoço, seus pés estão machucados. Depois que seus pés ficam
curados, você experimenta os sapatos outra vez, só para uma saída à noite,
mas os pés voltam a doer. Duas perguntas: admitindo que os sapatos nunca
se tornem confortáveis, quantas vezes mais você tentará calçá-los antes de
desistir? E, depois que parou de usá-los, quanto tempo ficarão no fundo do
seu armário antes de você jogá-los fora ou doá-los para alguma instituição
de caridade? Se você é como a maioria das pessoas, as respostas dependem
de quanto você pagou pelos sapatos. Quanto mais você pagou, mais dor
suportará até parar de usá-los e mais tempo eles ocuparão espaço no seu
armário.
O mesmo comportamento ocorre com academias de ginástica. Se você
paga a mensalidade da academia e não frequenta, terá que declarar a
compra como uma perda. Na verdade, algumas pessoas se matriculam
como forma de estímulo contra os problemas de autocontrole referentes a
exercícios. Se eu quero ir à academia e vou me sentir mal por jogar fora o
dinheiro da mensalidade,3 então a mensalidade pode me ajudar a superar a
minha inércia de duas maneiras: o valor desembolsado fica me
atormentando, e não há nenhum desembolso monetário imediato quando
eu de fato vou. Os professores de marketing John Gourville e Dilip Soman
conduziram um estudo inteligente em uma academia para demonstrar esse
ponto. O estabelecimento deles cobra por semestre. Gourville e Soman
descobriram que a frequência na academia dá um salto no mês em que a
conta chega, depois vai diminuindo até a chegada da próxima. Eles
chamaram esse fenômeno de “depreciação do pagamento”,4 que expressa o
desgaste que o efeito de custos afundados sofre com o tempo.
Um resultado similar foi encontrado pelo psicólogo Hal Arkes, agora na
Universidade Estadual de Ohio, que conduziu um belo experimento com
Catherine Blumer, sua aluna de pós-graduação. Estudantes que estavam na
fila para comprar ingressos para os eventos de uma companhia teatral do
campus foram escolhidos aleatoriamente para receber um desconto
pequeno ou grande no preço do ingresso. Uma característica importante
no desenho desse experimento é que os clientes já haviam assumido que
pagariam o preço cheio antes de receber o desconto, portanto os
pesquisadores puderam presumir que os sujeitos que pagassem com
desconto valorizariam o produto tanto quanto aqueles que pagaram o
preço total. Arkes e Blumer descobriram que custos afundados tinham
importância, sim, mas apenas por um semestre. Aqueles que pagaram
preço inteiro foram a mais eventos no semestre do outono-inverno, mas a
frequência na primavera-verão foi a mesma nos três grupos; aparentemente
os estudantes haviam ido o suficiente a peças para sentir que o dinheiro
gasto valera a pena, ou então haviam esquecido totalmente a compra
original. Conclui-se assim que custos afundados importam, pelo menos por
algum tempo, mas podem eventualmente ser esquecidos.5

––––––––

Em algumas situações, custos afundados e custos de oportunidade podem


estar entrelaçados. Tive a chance de investigar um caso como este com
Eldar Shafir, psicólogo em Princeton. Nós nos conhecemos quando eu
estava fazendo pós-doutorado com Amos em Stanford, em 1988-89. Eldar
está no pequeno grupo de psicólogos que conseguem tolerar economistas
por tempo suficiente, por isso colaborou com vários e fez importantes
contribuições para a economia comportamental.
Nosso projeto começou com uma conversa no aeroporto quando
descobrimos que tínhamos bilhete para o mesmo voo. Eu tinha dois
tíquetes que permitiam um upgrade para a primeira classe se houvesse
poltronas disponíveis. Naquela época, os programas de fidelidade
distribuíam alguns desses tíquetes de graça e era possível adquirir cupons
adicionais por US$35,00. Eu tinha acabado de usar um deles quando dei
de cara com Eldar e sugeri que tentássemos conseguir um upgrade para ele
também, para podermos sentar juntos. Eles tinham uma poltrona
disponível, então dei de presente a Eldar o meu cupom restante. Ele
objetou, insistindo em me reembolsar, e perguntou quanto o cupom havia
me custado. Eu respondi que dependia, já que alguns foram gratuitos e
outros custaram US$35,00. Então ele me perguntou que tipo de cupom eu
tinha usado. “Que diferença faz?”, indaguei. “Eu estou sem cupons agora e
vou ter que comprar mais, então não faz diferença o tipo de cupom que eu
lhe dei.” “Bobagem”, disse ele. “Se o cupom foi gratuito, então eu não lhe
pago nada, mas, se lhe custou US$35,00, insisto em pagar esse dinheiro.”
Continuamos a discussão durante o voo de volta, e ela levou a um artigo
interessante.
Nossa questão era: quanto tempo perdura na memória uma compra
passada? O artigo foi motivado pelo incidente com o tíquete de upgrade e
pelo recorrente membro da Lista, professor Rosett, que bebia as antigas
garrafas de vinho que já possuía, mas não comprava novas nem vendia as
que possuía. Organizamos um estudo usando os assinantes de um
informativo anual sobre preços de leilões de vinho chamado Liquid Assets.
A publicação era escrita pelo economista de Princeton Orley Ashenfelter,6
um aficionado por vinhos, e seus assinantes eram os ávidos consumidores
da bebida. Como tais, todos estavam cientes de que havia (e ainda há) um
mercado ativo de leilões para garrafas de vinho antigas. Orley concordou
em incluir uma pesquisa nossa junto com um de seus informativos.7 Em
troca, prometemos compartilhar os resultados com os assinantes.
Perguntávamos:

Suponha que você tenha comprado no mercado a futuro uma caixa


de um bom Bordeaux por US$20,00 a garrafa. O vinho agora está
sendo vendido em leilão por US$75,00. Você resolveu tomar uma
garrafa. Qual das alternativas seguintes capta melhor o seu
sentimento em relação ao custo de abrir a garrafa?
(A porcentagem de pessoas escolhendo cada opção é mostrada entre
colchetes.)
(a) US$0,00. Já paguei por ela. [30%]
(b) US$20,00, o valor que paguei por ela. [18%]
(c) US$20,00 mais os juros. [7%]
(d) US$75,00, o valor que eu poderia obter se vendesse a garrafa.
[20%]
(e) -US$55,00. Eu tomo uma garrafa que vale US$75,00 e pela qual
paguei apenas US$20,00, então economizei dinheiro tomando essa
garrafa. [25%]

Quando incluímos a opção (e), que consideramos bastante divertida,


não tínhamos certeza de que alguém a escolheria. Imaginamos se haveria
realmente pessoas tão sofisticadas em seu uso da contabilidade mental que
pudessem considerar o fato de tomar uma garrafa cara de vinho como um
ato de economia de dinheiro. Porém, muita gente levou essa opção a sério
e mais da metade dos respondentes disse que tomar a garrafa era ou de
graça ou lhes economizava dinheiro. É claro que a resposta correta
segundo a teoria econômica é US$75,00, já que o custo de oportunidade
de tomar o vinho é vendê-lo a esse preço. Todos os Econs escolheriam essa
resposta; foi o que fizeram muitos economistas que preencheram nossa
pesquisa. De fato, a maioria das pessoas que deu essa resposta era formada
por economistas. Sei disso porque as respostas não eram anônimas.
Fizemos um sorteio entre os que responderam, com uma garrafa de
Bordeaux como prêmio, e o respondente precisava fornecer seu nome e
endereço8 para ser elegível ao prêmio.
Há uma pequena modificação a essa pergunta que faz com que a
maioria das pessoas responda como economista. Em vez de perguntar
sobre tomar uma garrafa de vinho, perguntamos aos sujeitos qual seria a
sensação se tivessem deixado cair e quebrado a garrafa. A maioria disse que
teria a sensação de que quebrar a garrafa lhes custaria US$75,00, aquilo
que poderiam conseguir se a vendessem.
O endereço de resposta para a pesquisa não era reconhecível, portanto
os respondentes não sabiam que Eldar e eu estávamos envolvidos. Muitos
ofereceram voluntariamente explicações para suas respostas. Um deles, um
engenheiro aposentado, escreveu: “Entendo que, emoção à parte, o custo
de reposição é relevante para decisões econômicas. No entanto, o ideal
para mim seria que os vinhos das safras de 89 e 90 que adquiri a futuro
aumentem de valor o suficiente para vender metade pelo meu custo total e
beber o restante tendo em mente apenas prazer, não dinheiro.”
Você vê o que ele está dizendo? Se o vinho dobrar de valor e ele vender
metade das garrafas, então poderá beber o restante “de graça”. Brilhante!
Esse expediente fará com que cada garrafa que ele tome proporcione
considerável utilidade de transação. Uma carta veio de um conhecido
professor de contabilidade da Universidade de Chicago, Roman Weil.
Roman, que se tornou um amigo quando trabalhamos em Chicago, chega
pertíssimo de ser um Econ:
“Vocês deixaram de fora a resposta correta. Eu sinto que a perda é
US$75,00 menos os custos de transação de vender (que são de mais ou
menos US$15,00). Então, associo à garrafa um custo de US$60,00. Como
tenho vinho de sobra para o resto da vida, o valor líquido realizável está
correto. Se eu não tivesse um estoque de vinho suficiente, usaria o custo de
substituição, US$75,00 mais comissão, mais taxa de entrega — cerca de
US$90,00. E, também, vocês não dão o tratamento correto ao imposto
sobre o ganho. Eu desfruto o ganho de capital livre de impostos. A uma
taxa de 40%...”
Mas, voltemos à pesquisa, na qual mais da metade dos respondentes
dizem que beber uma garrafa a US$75,00 ou não lhes custa nada ou lhes
economiza dinheiro. A resposta levanta outra questão: se ao tomar a garrafa
eles a consideram de graça, o que pensam quando compram uma garrafa?
No ano seguinte voltamos aos leitores de Orley com um novo questionário.
Desta vez perguntamos:
Suponha que você compre uma caixa de Bordeaux no mercado a
futuro a US$400,00. O vinho será vendido no varejo a cerca de
US$500,00 a caixa após o transporte. Você não tem intenção de
começar a tomar esse vinho por uma década. Na época em que você
adquire o vinho, que afirmação capta mais precisamente os seus
sentimentos? Indique a sua resposta fazendo um círculo em volta de
cada uma das escalas fornecidas.

(a) Sinto que acabei de gastar US$400,00, do mesmo modo que


sentiria se gastasse US$400,00 numa viagem de fim de semana.
1 2 3 4 5
Concordo fortemente | Discordo fortemente
Média: 3,31

(b) Sinto que fiz um investimento de US$400,00, que consumirei


gradualmente após um período de anos.
12345
Concordo fortemente | Discordo fortemente
Média: 1,94

(c) Sinto que acabei de economizar US$100,00, a diferença entre o


que o mercado futuro custa e o preço do vinho quando for
enviado.
12345
Concordo fortemente | Discordo fortemente
Média: 2,88

A resposta mais popular revela que, ao comprar vinho para deixar


guardado por uma década antes de beber, as pessoas pensam nos gastos
como investimento. A segunda escolha mais frequente foi que estavam
economizando dinheiro. Chamar de gasto veio em último lugar.
Embora a teoria econômica não estipule qual dessas respostas é a
correta, vemos claramente a ocorrência de algum pensamento
inconsistente quando elas são conectadas aos resultados da pesquisa
anterior. Não pode estar certo que adquirir o vinho seja apenas um
“investimento” e que o eventual consumo do vinho acarrete custo zero ou
economia de dinheiro. Seguramente, sustentar um hábito de beber vinhos
caros deve demandar gasto de dinheiro em algum momento! Eldar e eu
publicamos um artigo sobre isso, com um título que sintetiza totalmente os
achados: “Invista agora, beba depois, não gaste nunca” [“Invest Now, Drink
Later, Spend Never”, no original].
Perceba que essa linha de raciocínio é muito boa para a indústria de
vinhos finos, já que elimina a parte dos gastos de consumo, uma boa
jogada para quem consegue fazê-la. Propriedades com sistema time-share
para férias adotam um pensamento similar. Tipicamente, quem planeja
férias “investe” uma soma de dinheiro, digamos US$10.000,00, o que lhe
dá o direito vitalício de passar uma semana no imóvel, ou pelo menos até o
imóvel desabar ou a empresa falir. A contabilidade mental funciona da
seguinte maneira: o pagamento original é um investimento (não uma
compra), a “taxa de manutenção” anual é um aborrecimento, mas futuras
férias no imóvel são “gratuitas”. Se esse investimento faz sentido ou não
para uma família vai depender, em parte, de quão dolorosa é para ela
gastar dinheiro em férias. Mas tais investimentos devem ser vistos pelo que
são: uma forma de disfarçar o custo de tirar férias.
Costco, o varejista de descontos mencionado no capítulo anterior,
também utiliza uma versão desta estratégia. Para poder comprar na Costco,
o freguês precisa se tornar “membro”, o que atualmente custa US$55,00
anuais por família. Parece provável que os membros encarem a taxa anual
como um “investimento”, sem fazer nenhuma tentativa de distribuir esse
custo por todas as várias compras feitas durante o ano. Ao contrário, ela
representa o papel de custo afundado, oferecendo mais uma razão para
fazer compras na Costco. Da mesma maneira, a Amazon cobra dos clientes
US$99,00 por ano para se tornarem “membros preferenciais”, o que lhes
dá o direito de frete “gratuito”. Mais uma vez, o custo de se associar pode
muito bem ser visto como um investimento que não “conta” no custo de
uma compra particular.

––––––––

É hora de duas confissões. Embora eu defenda na maior parte do tempo


que pensemos como um Econ, tenho algumas tendências notavelmente
Humanas quando se trata de contabilidade mental. Geralmente sou muito
bom em ignorar custos afundados, especialmente se eles forem de natureza
puramente monetária. Mas, como a maioria das pessoas, caso eu invista
muito tempo de trabalho em algum projeto, acho difícil abandoná-lo,
mesmo que esteja claríssimo que é a coisa certa a ser feita. Ao escrever este
livro, por exemplo, a minha estratégia para aprontar um primeiro rascunho
foi seguir escrevendo sem me preocupar se uma passagem específica
chegaria à edição final. Esse processo conseguiu produzir uma primeira
versão obviamente longa demais. Alguns trechos precisariam ser cortados, e
aceitei sugestões de exclusão provindas de amigos e editores que leram a
versão inicial. Muitos mencionaram o conselho frequentemente atribuído
a William Faulkner — mas aparentemente dito por muitos — de que os
escritores precisam aprender a “matar seus queridinhos”.9 O conselho tem
sido dado com tanta frequência, desconfio eu, porque é difícil um escritor
conseguir segui-lo.
Quando chegou a hora de revisar o manuscrito, decidi criar um arquivo
de “excluídos” para o material da primeira versão que foi cruelmente
assassinado. Meu plano é postar no site do livro algumas dessas preciosas
obras-primas de gloriosa verborragia. Não sei quantas dessas passagens
serão efetivamente postadas, mas a beleza desse plano é que não importa.
O simples fato de ter uma pasta no meu computador nomeada “excluídos”,
onde esses trechos são guardados, já foi suficiente para reduzir a dor de
cortar algumas das minhas passagens favoritas, uma dor que pode
machucar tanto quanto calçar aqueles sapatos caros e desconfortáveis. A
lição maior é que, uma vez que você entende um problema
comportamental, pode às vezes inventar uma solução comportamental
para ele. A contabilidade mental nem sempre é um jogo de tolos.
Minha segunda confissão diz respeito ao vinho, que, como vocês já
adivinharam a essa altura, é um dos meus vícios. Embora eu entenda
totalmente o conceito de custo de oportunidade, admito ser vítima de uma
versão do mesmo pensamento articulado em nosso questionário pelos
entrevistados. Se eu tiro da adega uma velha garrafa que estoicamente me
refreei de beber durante muitos anos, a última coisa que tenho em mente é
o preço que poderia ter conseguido pelo vinho se eu o tivesse vendido em
leilão. Na verdade, nem quero saber o preço! Acabo como o professor
Rosett. Nem sonharia em comprar uma garrafa de vinho de 30 anos, mas
estou feliz em tomar uma em ocasiões especiais. Podem me chamar de
Humano.
9

BALDES E ORÇAMENTOS

Com aquelas entrevistas que usei para adquirir conhecimento sobre como
as famílias administram suas finanças, aprendemos que muitos lares,
especialmente aqueles com orçamento apertado, usavam regras explícitas
em seus orçamentos. Para famílias que lidavam basicamente com dinheiro
vivo (cartões de crédito estavam começando a entrar em uso na época, no
final dos anos 1970), era muito frequente o uso de alguma versão do
sistema de envelopes. Um envelope (ou pote) para o aluguel, outro para
comida, outro para serviços, e assim por diante. Em muitos casos, o
método usado era o que tinham aprendido com os pais.
Organizações fazem algo semelhante. Departamentos têm orçamentos,
e há limites para categorias específicas dentro desses orçamentos. A
existência de orçamentos pode violar o primeiro princípio da economia: o
dinheiro é fungível, ou seja, ele não tem rótulos restringindo as opções de
seu gasto. Como a maioria dos princípios econômicos, este se apoia em
uma lógica concreta. Se a conta de luz veio baixa por causa de um inverno
brando, o dinheiro que sobrou será muito bem gasto na compra de sapatos
para crianças.
Orçamentos existem por razões sensatas e compreensíveis. Em uma
organização, o chefe não quer ter que aprovar cada despesa feita, e
orçamentos servem como uma forma direta de manter os custos sob
controle ao mesmo tempo que dão aos empregados licença para gastar
como julgarem apropriado. Ainda assim, regras de orçamento podem levar
a resultados simplórios. Qualquer um que tenha trabalhado em uma
grande organização já deparou com o problema de falta de dinheiro em
um orçamento específico para cuidar de alguma necessidade urgente, e
não há meio de recorrer ao dinheiro que está ocioso em outro orçamento.
O dinheiro deveria ser gasto da maneira que melhor servisse aos interesses
da organização ou do lar; se esses interesses mudam, devemos ignorar os
rótulos que foram atribuídos aos vários potes de dinheiro. Mas não fazemos
isso. Rótulos são FSIs.
Indivíduos e famílias estabelecem suas próprias regras, é claro, mas
usam orçamentos mais ou menos da mesma maneira. O quão manifestas
são as regras de orçamento depende muitas vezes da folga no orçamento.
Um estudo feito pelos psicólogos Chip Heath e Jack Soll descobriu que a
maioria dos estudantes de MBA tinham orçamentos semanais para comida
e diversão1e orçamentos mensais para roupas. Uma vez graduados e
começando a ganhar mais, as regras provavelmente ficaram menos
específicas.
Mas enquanto estavam na pós-graduação, os orçamentos e as resultantes
violações de fungibilidade influenciavam seu comportamento. Por
exemplo, Heath e Soll perguntaram a dois grupos de sujeitos se estariam
dispostos a comprar um ingresso para uma peça no fim de semana. A um
dos grupos foi dito que haviam gastado US$50,00 mais cedo naquela
semana indo a um jogo de basquete (mesmo orçamento); ao outro grupo,
disseram que tinham levado uma multa de US$50,00 por estacionamento
em local proibido (outro orçamento) na mesma semana. Aqueles que já
tinham ido ao jogo tiveram uma propensão bem menor de ir ao teatro,
presumivelmente porque seu orçamento de diversão para a semana já fora
gasto.
Um estudo dos economistas Justine Hastings e Jesse Shapiro oferece
uma rigorosa demonstração dos efeitos do orçamento mental.2 A questão
investigada por Hastings e Shapiro é o que acontece com a escolha de
gasolina — comum ou premium — quando o preço do combustível muda.
Nos Estados Unidos, a gasolina é tipicamente vendida em três graus
diferentes, baseados na octanagem: comum, intermediária e premium.
Embora permaneça a necessidade de uma gasolina diferente da comum
para carros, um grau mais alto é recomendado para alguns modelos, e
alguns consumidores usam grau mais alto por outros motivos, tais como a
crença provavelmente equivocada de que é melhor para o motor. Os
autores estudaram o que aconteceu com as vendas da gasolina premium
quando o preço caiu aproximadamente 50% em 2008, de um máximo de
cerca de US$4,00 o galão (cerca de US$1,00 o litro) para um mínimo de
US$2,00 o galão (US$0,50 o litro, aproximadamente). Hastings e Shapiro
puderam estudar o fato porque tinham dados de uma rede de mercearias
que também vendia gasolina.
Vamos pensar primeiro no que um Econ faria nessa situação. Suponha
uma família gastando US$80,00 por semana em gasolina quando o preço
da gasolina comum é US$4,00. Seis meses depois, o preço caiu para
US$2,00 e a despesa da casa em gasolina caiu para US$40,00 por semana.
Um Econ pensaria do seguinte modo: primeiro, a gasolina está mais
barata, então deveríamos fazer mais viagens de carro. Segundo, ganhamos
o equivalente a US$40,00 por semana nas despesas da casa, então podemos
gastar isso em qualquer outra coisa, desde mais noitadas até cerveja de
melhor qualidade. Os US$40,00 de renda extra seriam gastos de maneira a
maximizar a utilidade. Parte desse dinheiro poderia ser gasta em uma
gasolina melhor, mas só em quantidade minúscula. Em média, se a receita
de uma família aumenta US$1.000,00 em um ano, sua propensão de
comprar gasolina diferente da comum aumenta em apenas 0,1%. Então a
família de Econs decide agradar o carro com um tanque de gasolina média
por ano e gastar em coisas mais valiosas o resto do dinheiro caído do céu.
Suponha, em vez disso, uma família de Humanos com orçamento para
gasolina, possivelmente com o dinheiro guardado em um pote na cozinha.
Como a família de Econs, ela gastará parte desse dinheiro fazendo mais
viagens de carro, mas também pode pensar: “Ei, a gasolina está tão barata
agora que eu poderia muito bem comprar a melhor.” E foi exatamente isso
que Hastings e Shapiro descobriram. A mudança para graus mais altos de
octanagem na gasolina foi 14 vezes maior do que seria de esperar em um
mundo onde o dinheiro é tratado como fungível. Para respaldar ainda mais
a interpretação dos resultados via contabilidade mental, os autores
descobriram que não houve tendência de as famílias fazerem uma melhora
na qualidade de dois outros itens vendidos nas mercearias, leite e suco de
laranja. Isso não é surpresa, já que o período em questão esteve exatamente
no começo da crise financeira de 2007, o acontecimento responsável por
deflagrar a queda nos preços da gasolina. Nesses tempos de medo, a
maioria das famílias estava tentando cortar o máximo possível de gastos. A
única exceção a essa tendência foi esbanjar em gasolina de mais qualidade.

––––––––

A riqueza também é frequentemente separada em várias contas mentais.


Na base dessa hierarquia está o dinheiro que é mais fácil de gastar:
dinheiro vivo.
Dinheiro em conta-corrente está ligeiramente menos acessível que
dinheiro vivo, porém, se o dinheiro estiver em uma conta com rótulo de
“poupança”, as pessoas ficam mais relutantes em tirar dinheiro dessa conta.
Isso pode levar ao estranho comportamento de pedir empréstimos com
taxas de juros altas e, ao mesmo tempo, manter uma poupança com juros
baixos; por exemplo, às vezes não se ganha praticamente nada de juros na
poupança ao mesmo tempo que se mantém um saldo elevado no cartão de
crédito, que, nos Estados Unidos, cobra juros de mais de 20% ao ano.
Parece haver uma óbvia e atraente oportunidade em termos financeiros,
que é pagar os empréstimos com as economias da poupança. No entanto,
as pessoas podem prever que essa estratégia sairá pela culatra se nunca
conseguirem pagar de volta o dinheiro “emprestado” da poupança.
As contas mais sagradas são as contas de poupança de longo prazo,
geralmente aquelas reservadas para gastos futuros, tais como contas de
aposentadoria ou para a educação dos filhos. Nos Estados Unidos, ainda
que alguns planos de previdência permitam que o contratante use parte do
dinheiro aplicado, esses empréstimos costumam ser relativamente
pequenos e são devolvidos em poucos anos. Para a acumulação de riqueza,
mudanças de emprego são mais perigosas do que esses empréstimos. De
acordo com a legislação trabalhista de alguns países, quando empregados
mudam de emprego, muitas vezes lhes é oferecida a possibilidade de
receber em dinheiro o saldo da sua conta. Mesmo que seja uma renda
passível de tributação, podendo além disso sofrer uma sobretaxação de
10%, muitos empregados optam por retirar o dinheiro, especialmente se o
saldo for pequeno. Essa perda pode e deve ser contida, optando-se por
passar o dinheiro para outra conta da previdência da forma mais fácil
possível, preferivelmente seguindo o procedimento-padrão.
A garantia de imóvel oferece um interessante caso intermediário.
Durante décadas, as pessoas consideravam o dinheiro da casa própria da
mesma forma que a poupança para aposentadoria: era sacrossanto. Na
verdade, na geração dos meus pais, famílias lutavam para liquidar suas
hipotecas o mais depressa possível e, ainda no começo da década de 1980,
pessoas com mais de 60 anos tinham pouca ou nenhuma dívida de
hipoteca. Com o tempo, essa atitude começou a mudar nos Estados
Unidos, em parte como um efeito imprevisto da reforma tributária da era
Reagan. Antes dessa mudança, todos os juros pagos, inclusive os juros de
empréstimos para automóveis e cartões de crédito, eram dedutíveis em
imposto; depois de 1986, apenas juros de hipotecas residenciais se
qualificavam para dedução. Isto criou um incentivo econômico para os
bancos elaborarem linhas de crédito com garantia de imóvel (home equity),
as quais as famílias podiam usar para tomar emprestado dinheiro dedutível
do imposto. E certamente fazia sentido usar um empréstimo com garantia
de imóvel para financiar a compra de um carro em vez de tomar um
empréstimo para a compra do veículo, porque geralmente os juros, além
de serem mais baixos, eram dedutíveis do imposto. Mas a mudança erodiu
a norma social de que a garantia de imóvel era sacrossanta.
Essa norma acabou sendo destruída por dois outros fatores: o declínio
no longo prazo das taxas de juros e a ascensão dos corretores de hipoteca.
Nas últimas três décadas, as taxas de juros nos Estados Unidos caíram de
dois dígitos para essencialmente zero (ou menos, se você corrigir pela
inflação). Acrescentar corretores de hipoteca à mistura provou ser fatal para
o velho e não escrito décimo primeiro mandamento: “Saldarás tua
hipoteca.” A erosão da norma de saldar hipotecas o quanto antes foi
agravada por esses corretores ao tornarem muito mais fácil o processo de
refinanciamento. Eles tinham informação relevante em seus computadores
e, com as taxas de juros caindo, tinham numerosas oportunidades de ligar
e dizer: “Ei, você quer reduzir o seu pagamento de hipoteca?” Quando a
bolha dos imóveis chegou e jogou os preços lá em cima, foi dito aos donos
de imóveis que podiam baixar o pagamento de suas hipotecas e, além disso,
conseguir um dinheirinho extra para reformar o porão e comprar uma
televisão de tela plana.
Àquela altura, a garantia de imóvel deixou de ser uma contabilidade
mental “segura”. Esse fato é ilustrado por uma mudança no
comportamento na tomada de empréstimos por lares em que o chefe da
casa tem 75 anos ou mais. Em 1989, apenas 5,8% dessas famílias tinham
alguma dívida de hipoteca. Em 2010, a fração com débitos tinha subido
para 21,2%. Para aqueles com dívida de hipoteca, a quantia mediana
devida também aumentou nesse período, de US$35.000,00 para
US$82.000,00 (em dólares de 2010). Durante o boom imobiliário no
começo dos anos 2000, proprietários de imóveis gastavam os ganhos que
tinham acumulado no papel em garantia de imóvel com a mesma
facilidade que fariam se tivessem ganhado na loteria.
Como está documentado em House of Debt,3 livro dos economistas Atif
Mian e Amir Sufi, os aumentos de operações com garantia de imóvel
tinham se tornado um forte estímulo ao consumo em 2000, especialmente
de bens de consumo duráveis. Por exemplo, em cidades onde os preços de
imóveis estavam em ascensão, as vendas de automóveis também deram um
salto, pois os proprietários tomavam empréstimos dando como garantia o
valor do seu imóvel aumentado e usando os rendimentos para financiar
um carro novo. Depois, na descida, aconteceu o contrário; as vendas de
carros despencaram junto com os preços dos imóveis, pois não havia como
financiar um carro novo se o proprietário tivesse zero de garantia
imobiliária ou se esta estivesse “submersa”, termo que significa que o saldo
da hipoteca excedia o valor do imóvel. Este fenômeno ajuda a explicar por
que o estouro da bolha tecnológica em 2000-01 não causou a mesma
recessão profunda que o estouro da bolha imobiliária. A maioria das
famílias não endinheiradas mantém ações apenas em suas contas de
aposentadoria, que são locais relativamente viciantes para se manter
dinheiro, especialmente para aqueles com saldos de conta não triviais.
Assim, a queda nos preços das ações não causou um impacto tão grande
quanto a queda nos preços das habitações.
Ainda não se sabe se a norma de saldar a hipoteca antes da
aposentadoria ressurgirá algum dia. Se a tendência longamente esperada
do aumento das taxas de juros começar, pode ser que vejamos as pessoas
retomando o hábito de saldar a hipoteca, pois o refinanciamento será
menos atraente com taxas mais altas. Caso contrário, a garantia de imóvel
poderá continuar sendo um balde furado.
Como a maioria dos aspectos da contabilidade mental, estabelecer
orçamentos não fungíveis não é uma coisa inteiramente ingênua. Seja com
potes de vidro, envelopes ou sofisticados aplicativos financeiros, um lar que
faz um esforço sério para criar um plano financeiro terá mais facilidade
para viver dentro do orçamento. O mesmo vale para os negócios, grandes
ou pequenos. Mas às vezes esses orçamentos podem levar a tomadas de
decisão ruins, tais como concluir que a Grande Recessão é uma época boa
para melhorar o tipo de gasolina com que você abastece o carro.
10

NA MESA DE PÔQUER

Durante a minha estada em Cornell, um grupo do corpo docente da


faculdade de economia se reunia periodicamente para jogar pôquer de
limite inferior. Era raro alguém ganhar ou perder mais que US$50,00 em
uma noite,1 mas eu notava que alguns jogadores, em particular aqueles
que reportavam o resultado do jogo às esposas, se comportavam de maneira
diferente quando estavam ganhando e quando estavam perdendo. Seu
desempenho no jogo certa noite, especialmente com apostas tão pequenas,
deveria ser irrelevante ao se deliberar sobre determinada mão de cartas.
Compare um participante no pôquer daquela noite que estivesse perdendo
US$50,00 com alguém que possua 100 cotas de um papel que tenha caído
US$0,50 no fechamento da Bolsa. Ambos perderam uma parcela trivial da
sua riqueza, mas apenas uma das perdas influencia o comportamento.
Perder dinheiro na conta do pôquer só altera o comportamento enquanto
você permanece no jogo.
Essa situação, na qual a pessoa está “para trás” em determinada
contabilidade mental, é complicada de enquadrar com a teoria da
perspectiva, algo que Kahneman e Tversky sabiam muito bem. No seu
artigo original, discutiam um caso semelhante nas corridas de cavalos.
Como as apostas em corridas tomam 17% de cada dólar apostado, os
apostadores estão coletivamente perdendo dinheiro a uma taxa de 17% por
corrida. Quando chega o último páreo do dia, a maioria dos apostadores
está no vermelho em sua contabilidade mental da corrida. Como isso afeta
suas apostas? A predição normativa é: “praticamente nada”. Exatamente
como no exemplo do jogo de pôquer, uma perda de US$100,00 nas
corridas não deveria causar uma preocupação maior no apostador do que
sofrer perda similar em sua conta de aposentadoria, a qual passaria
despercebida. Todavia, Danny e Amos citam um estudo mostrando que
apostas em azarões2 (cavalos com pouca chance de ganhar) são agravadas
na última corrida do dia, ou seja, mais gente está apostando nos cavalos
com menor probabilidade de ganhar.
Para explicar o fenômeno, Kahneman e Tversky se apoiam em um dos
aspectos da teoria da perspectiva, o qual diz que as pessoas são propensas a
arriscar quando há uma possibilidade de perda. Conforme discutido no
Capítulo 4, se você perguntar às pessoas se elas preferem a certeza de
perder US$100,00 ou uma aposta na qual tenham 50% de chance de
perder US$200,00 e 50% de chance de não perder nada, a maioria
escolherá a aposta. Esses resultados são o oposto daqueles encontrados
quando a escolha é entre um ganho garantido de US$100,00 e uma
chance de 50% de ganhar US$0,00 ou US$200,00; neste caso, as pessoas
preferem o garantido.
Ao observar como meus colegas de pôquer jogavam quando estavam
perdendo, percebi que a explicação de Kahneman e Tversky era
incompleta. Suponha que eu esteja perdendo US$100,00 no turfe e
gostaria de sair zerado para evitar fechar a conta no vermelho. Sim, eu
poderia apostar US$2,00 em um azarão que pagasse 50 por 1 e ter uma
pequena chance de recuperar meu prejuízo, mas, em vez disso, poderia
apostar outros US$100,00 em um favorito pagando 1 por 1 e ter uma
chance de 50% de sair no zero a zero. Se sou do tipo que gosta de arriscar
(ou seja, que prefiro uma aposta em vez da certeza de algo que seja igual
ao resultado esperado da aposta), por que não aposto US$100,00 no
favorito e aumento as minhas chances de break-even, ou seja, de sair sem
perdas nem ganhos? A teoria da perspectiva se abstém a esse respeito, mas a
minha experiência no pôquer sugeria que a intuição de Amos e Danny
estava certa. Minha impressão era de que os jogadores que estavam
perdendo eram atraídos para apostas pequenas que ofereciam uma
pequena chance de um ganho grande (como torcer para receber cartas do
meio de uma sequência), mas não gostavam de apostas grandes que
traziam o risco de um aumento substancial da sua perda, mesmo que
oferecessem uma probabilidade maior de recuperar as perdas.
As minhas observações no pôquer fizeram outro arranhão na
contabilidade mental. Jogadores ganhando transmitiam a impressão de não
tratar seus ganhos como “dinheiro real”. Esse comportamento é tão
comum que jogadores em cassinos têm um termo para ele: “jogar com o
dinheiro da casa”. (No caso, o cassino é “a casa”.) Empregando esse
raciocínio, quando alguém está ganhando, suas apostas são com o dinheiro
do cassino, não com o próprio. Você pode presenciar esse comportamento
em qualquer cassino. Observe um jogador (amador) que ganha algum
dinheiro no começo da noite e você poderá testemunhar o que chamo de
contabilidade mental “de dois bolsos”. Tome o exemplo de um jogador
que levou US$300,00 ao cassino e se encontra com um ganho de
US$200,00 logo no começo da noite. Ele vai colocar US$300,00 em um
bolso e pensar nesse dinheiro como seu próprio, e colocará em outro bolso
os US$200,00 que ganhou em fichas (ou, mais provavelmente, sobre a
mesa, pronto para apostar). Quando se trata do “dinheiro da casa”, a
expressão “vem fácil, vai fácil” se aplica. Essa é uma flagrante violação da
regra de que o dinheiro é fungível. Afinal, o dinheiro de qualquer um dos
bolsos pode ser gasto com a mesma facilidade.
Tirar dinheiro de colegas é divertido,3mas está longe de ser um método
científico. Então Eric Johnson — agora um professor de marketing em
Columbia — e eu começamos a trabalhar num artigo de verdade.4
Conforme mencionei no prefácio, foi esse o artigo que levou algum tempo
para satisfazer Amos. Essencialmente, queríamos replicar em um
experimento o que eu tinha visto na mesa de pôquer. Mas primeiro
precisávamos abordar o problema que originalmente levara Kahneman e
Tversky a usar questões hipotéticas como base dos estudos. Como é
possível organizar experimentos éticos nos quais sujeitos podem perder
dinheiro, e como obter a aprovação do órgão de fiscalização da
universidade que supervisiona tais experimentos? Resolvemos o problema
fazendo com que os sujeitos fizessem uma série de escolhas entre certezas
e apostas — algumas envolvendo perdas e outras, ganhos — e fomos
sinceros ao dizer que uma das escolhas seria selecionada ao acaso para
“contar” para o estudo. Mas nem todas as apostas tinham a mesma
probabilidade de serem escolhidas, e fazendo das apostas favoráveis as mais
prováveis de serem jogadas, pudemos garantir aos sujeitos que as chances
de perder dinheiro eram mínimas, embora tenhamos deixado claro que
pretendíamos realmente cobrar daqueles que perdessem dinheiro. Se eles
quisessem, podiam saldar a dívida trabalhando como assistentes de
pesquisa. No final, ninguém perdeu dinheiro, então não tivemos que
cobrar.
Aqui estão as três questões que foram incluídas no nosso estudo. Os
números em colchetes são as porcentagens de sujeitos que escolheram a
resposta selecionada. Nesse exemplo, um Econ com aversão a risco
escolheria a certeza em cada um dos problemas, uma vez que, em cada
caso, o resultado esperado da aposta é igual ao da certeza.

PROBLEMA 1. Você acabou de ganhar US$30,00. Agora escolha entre:


(a) Uma chance de 50% de ganhar US$9,00 e uma chance de 50% de
perder US$9,00. [70%]
(b) Nenhum ganho ou perda adicional. [30%]

PROBLEMA 2. Você acabou de perder US$30,00. Agora escolha entre:


(a) Uma chance de 50% de ganhar US$9,00 e uma chance de 50% de
perder US$9,00. [40%]
(b) Nenhum ganho ou perda adicional. [60%]
$
PROBLEMA 3. Você acabou de perder US$30,00. Agora escolha entre:
(a) Uma chance de 33% de ganhar US$30,00 e uma chance de 67% de
não ganhar nada. [60%]
(b) A certeza de ganhar US$10,00. [40%]

O problema 1 ilustra o “efeito dinheiro da casa”. Embora os sujeitos


apresentem uma tendência de aversão a riscos para ganhos — ou seja, a
maioria deles normalmente evitaria um cara ou coroa para ganhar ou
perder US$9,00 —, eles ficaram empolgados em fazer a aposta ao serem
informados que tinham acabado de ganhar US$30,00. Os problemas 2 e 3
ilustram as preferências complexas que entram em cena quando as pessoas
se consideram “para trás” em alguma contabilidade mental. Em vez da
predição simples da teoria da perspectiva — a qual diz que as pessoas são
propensas a risco quando perdem —, no problema 2, uma perda de
US$30,00 não gera tendência à atração pelo risco, pois não há chance de
sair no zero a zero5(break even). Mas quando essa chance aparece no
problema 3, a maioria dos sujeitos opta por apostar.
Uma vez que você reconhece o efeito break-even e o efeito “dinheiro da
casa”, é fácil identificá-los na vida diária. Ocorrem sempre que há dois
pontos de referência salientes — onde você começou e onde você está no
momento atual, por exemplo. O efeito dinheiro da casa — junto com uma
tendência de extrapolar retornos recentes para o futuro — facilita bolhas
financeiras. Durante a década de 1990, investidores individuais
aumentavam regularmente a proporção das suas contribuições para o
fundo de aposentadoria em ações, fazendo crescer a parcela dos seus novos
investimentos alocada em ações. Ao que parece, o pensamento era que,
com a enorme quantia em dinheiro que haviam ganhado em anos
recentes, até mesmo se o mercado caísse eles só perderiam aqueles ganhos
mais novos. É claro que o fato de ter ganhado recentemente parte do
dinheiro não deveria diminuir a sensação de perda se aquele dinheiro
evaporasse. O mesmo pensamento permeava os pontos de vista de
investidores especulativos no boom do mercado imobiliário anos depois. As
pessoas que vinham revendendo propriedades em Scottsdale, Las Vegas e
Miami eram acometidas de certa indulgência proporcionada pelo efeito
dinheiro da casa (sem intenção de trocadilho) que as seduzia a pensar que,
no pior dos casos, estariam de volta aonde tinha começado. É claro que,
quando os mercados despencaram subitamente, esses investidores que
estavam altamente alavancados perderam muito mais que o dinheiro “da
casa”. Muitos também perderam seus próprios lares.
Apostar quando se está perdendo num esforço de recuperar as perdas
também pode ser visto como o comportamento dos investidores
profissionais. Gerentes de carteiras de fundos mútuos assumem mais riscos
no último trimestre do ano,6 quando o fundo que gerenciam está
acompanhando um índice de referência (como o S&P 500) com o qual os
retornos são comparados. E, muito pior, inúmeros corretores desonestos,
que perderam bilhões para seus empregadores, no fim assumiam volumes
cada vez maiores de risco, um esforço desesperado de recuperar o prejuízo.
Tal conduta pode ter sido racional do ponto de vista do corretor desonesto,
que estava em vias de perder seu emprego ou algo pior caso não
recuperasse a perda. Mas, se era verdade, isso significa que a administração
precisa prestar mais atenção ao comportamento de empregados que estão
perdendo dinheiro. (Bem, pensando melhor, a administração deveria ter
prestado mais atenção antes que esses corretores acumulassem suas grandes
perdas.) Uma boa regra a ser lembrada é que as pessoas que estão à beira
de grandes perdas e têm uma chance de sair no zero a zero estarão
extraordinariamente dispostas a assumir riscos, mesmo que normalmente
tenham aversão a eles. Cuidado!
III
AUTOCONTROLE
1975 – 88
A teoria da perspectiva e os insights fornecidos pela sua função valor
facilitaram imensamente minha tentativa de compreender a contabilidade
mental, o que, por sua vez, me ajudou a dar sentido a muitos dos itens da
Lista. Mas um dos exemplos parecia estar em uma categoria diferente: o
incidente de tirar as castanhas-de-caju de alcance enquanto aguardava o
jantar. Para um economista, remover uma opção nunca pode deixar você
melhor. Então por que ficamos tão felizes com a tigela de castanhas-de-
caju escondida em segurança na cozinha?
Comecei a colecionar outros exemplos do fenômeno das “castanhas-de-
caju”. Fumantes pagam mais caro pelos seus cigarros ao comprar um maço
por vez em vez de um pacote inteiro. Gente que faz dieta não guarda
sorvete no freezer. Acadêmicos (inclusive eu) se comprometem a
apresentar numa conferência dentro de poucos meses um artigo ainda em
elaboração, usando o comprometimento como incentivo para terminar o
artigo. Pessoas com dificuldade de levantar de manhã e que põem o
despertador do outro lado do quarto para serem obrigados a levantar em
vez de apenas esticar o braço ao desligar o alarme.
O que esses exemplos têm em comum é a presença de problemas de
autocontrole. Nós queremos comer mais castanhas, mas ficamos com medo
de sucumbir à tentação caso a tigela permaneça sobre a mesa.
Essa distinção entre o que queremos e o que escolhemos não tem
relevância para a economia moderna, na qual as preferências são
literalmente definidas pelo que escolhemos. Diz-se que as escolhas
“revelam preferências”. Imagine a seguinte conversa entre um Humano
que acabou de remover uma tigela de castanhas-de-caju com um Econ
que está assistindo.

ECON: Por que você tirou as castanhas da mesa?


HUMANO: Porque não queria comer mais.
ECON: Se não queria comer mais castanhas, então por que se deu ao
trabalho de tirá-las? Você poderia simplesmente ter agido conforme as
suas preferências e parado de comer.
HUMANO: Tirei a tigela porque, se as castanhas ainda estivessem à
disposição, eu teria comido mais.
ECON: Nesse caso, você prefere comer mais castanhas, então foi bobagem
tirá-las.

Este diálogo, que obviamente não leva a nada, é semelhante a muitas


outras conversas que tive com economistas na época. Embora nunca seja
enunciada explicitamente como premissa em livros de economia, na
prática a teoria econômica presume que problemas de autocontrole não
existem. Então meu grande projeto seguinte foi estudar um problema
supostamente inexistente.
11

FORÇA DE VONTADE?
NÃO É PROBLEMA

Economistas nem sempre foram tão insensíveis em relação a problemas de


autocontrole. Por aproximadamente dois séculos, os economistas que
escreveram sobre esse tópico conheciam seus Humanos. Na verdade, um
dos pioneiros do que hoje pode ser chamado de tratamento
comportamental do autocontrole foi ninguém menos do que o sumo
sacerdote da economia de livre mercado: Adam Smith. Ao pensar em
Adam Smith, a maioria das pessoas lembra de sua obra mais famosa, A
riqueza das nações. Esse extraordinário livro criou o alicerce do
pensamento econômico moderno — a primeira edição foi publicada em
1776. Estranhamente, a expressão mais conhecida do livro, a alardeada
“mão invisível”1 mencionada anteriormente, aparece apenas uma vez,
tratada por Smith como um mero adorno. Ele observa que o homem de
negócios típico, ao buscar lucros pessoais, é “levado por uma mão invisível
a promover um objetivo que não era parte de sua intenção. E nem sempre
é pior para a sociedade que tal objetivo não faça parte de tais intenções”.
Note a linguagem cautelosa da segunda sentença, que raramente é
incluída (ou lembrada) por aqueles que tomam de empréstimo a famosa
expressão, ou que invocam alguma versão do gesto da mão invisível. “E
nem sempre é pior para a sociedade” não chega a ser uma afirmação de
que as coisas vão acontecer para melhor.
O restante do robusto livro aborda praticamente qualquer tópico de
economia que se possa imaginar. Por exemplo, Smith forneceu a base
teórica para a minha tese de doutorado, sobre o valor de uma vida. Ele
explica por que trabalhadores tinham que receber pagamento maior como
compensação por assumir tarefas insalubres, arriscadas ou desagradáveis.
George Stigler, o famoso economista de Chicago, gostava de dizer que não
havia nada de novo em economia; Adam Smith já tinha dito tudo. É
possível dizer o mesmo de grande parte da economia comportamental.2
Dos escritos de Smith sobre o que agora consideraríamos economia
comportamental, a maior parte aparece em seu livro anterior, Teoria dos
sentimentos morais, publicado em 1759. É nele que Smith discorre sobre
autocontrole. Com grande perspicácia, ele retrata o tópico como uma luta
ou conflito entre nossas “paixões” e o que ele chamou de nosso
“espectador imparcial”. Como muitos dos economistas, só descobri que
Smith apresentou essa formulação antes de mim quando propus minha
própria versão, à qual chegaremos mais adiante nesta seção. A
característica crucial da concepção de Smith sobre nossas paixões é que
elas são míopes, ou seja, só enxergam o que está perto. Na sua colocação, o
problema é que “o prazer que poderemos desfrutar daqui a 10 anos nos
interessa muito pouco quando comparado com o que podemos desfrutar
hoje.”3
Adam Smith não foi o único dentre os economistas dos primeiros
tempos a intuir com sensatez sobre problemas de autocontrole. Conforme
documentou o economista comportamental George Lowenstein, outros
tratamentos iniciais da “escolha intertemporal” — isto é, escolhas que são
feitas sobre o momento do consumo — também ressaltaram a importância
de conceitos tais como “força de vontade”, uma expressão que não tinha
significado na economia praticada em 1980.4 Smith reconheceu que a
força de vontade é necessária para lidar com a miopia.
Em 1871, William Stanley Jevons, outro luminar da economia, refinou
a observação de Smith sobre miopia, observando que a preferência por
consumo presente sobre consumo futuro diminui com o tempo.5 Podemos
dar muita importância em tomar aquela taça de sorvete agora em vez de
amanhã, porém nos incomodaríamos muito pouco em ter que escolher
entre o dia anterior ou posterior de uma data a um ano de distância.
Alguns economistas dos primeiros tempos viam como erro qualquer
desconto de consumo futuro — algum tipo de falha. Seria uma falha de
força de vontade ou, como escreveu Arthur Pigou em 1920 de forma
notória, poderia ser uma falha de imaginação: “A nossa capacidade
telescópica é defeituosa, e (...) nós, portanto, vemos prazeres futuros, por
assim dizer, em escala reduzida.”6
Irving Fisher forneceu a primeira abordagem econômica de escolha
intertemporal que pode ser considerada “moderna”. Em seu clássico de
1930, A teoria do juro, ele usou o que se tornou a ferramenta básica de
ensino de microeconomia — curvas de indiferença — para demonstrar as
escolhas de consumo de um indivíduo em dois momentos diferentes no
tempo, dada uma taxa de juros do mercado. Sua teoria se qualifica como
moderna devido às ferramentas e por ser normativa. Ele explica o que uma
pessoa racional deveria fazer. Mas Fisher também deixa claro que não
considerava sua teoria um modelo descritivo satisfatório porque omitia
importantes fatores comportamentais.
Para começar, Fisher acreditava que a preferência no tempo depende
do nível de renda do indivíduo, sendo o pobre mais impaciente do que
pessoas bem-sucedidas. Além disso, Fisher enfatizava que encarava o
comportamento impaciente exibido por trabalhadores de baixa renda
como parcialmente irracional, o que descreveu com exemplos vívidos:
“Isto é ilustrado pela história do fazendeiro que nunca consertava as
goteiras de seu telhado. Quando chovia, ele não conseguia fazer o
conserto, e quando não chovia, não havia goteira para consertar!”7 E
fechava a cara para “aqueles trabalhadores que, antes da proibição, não
podiam resistir ao apelo do bar a caminho de casa no sábado à noite”,8 que
era dia de pagamento na época.
De forma clara, desde Adam Smith, em 1776, até Irving Fisher, em
1930, os economistas pensavam sobre escolha intertemporal tendo em vista
os Humanos. Os Econs começaram a se infiltrar na época de Fisher,
quando ele começou com a teoria de como Econs devem se comportar, mas
coube a um rapaz de 24 anos chamado Paul Samuelson, então um
mestrando, terminar a tarefa. Samuelson, que muitos consideram o maior
economista do século XX, foi um prodígio que se propôs a dar à economia
um alicerce matemático apropriado. Matriculou-se na Universidade de
Chicago aos 16 anos e logo foi para Harvard, para o mestrado. Sua tese de
doutorado tem um título audacioso, mas preciso: “Fundações da análise
econômica” [“Foundations of economic analysis”, no original]. Sua tese
refez a economia por inteiro com o que ele considerava ser um rigor
matemático apropriado.
Enquanto estava no doutorado em 1937, Samuelson elaborou um artigo
de sete páginas com o modesto título “Nota sobre a mensuração da
utilidade” [“A note on measurement of utility”, no original]. Como o título
indica, ele esperava oferecer um meio de mensurar esse elemento fugidio
que os Econs sempre maximizam: utilidade (isto é, felicidade ou
satisfação). Enquanto escrevia o artigo, Samuelson formulou o que acabou
se tornando o modelo econômico padrão de escolha intertemporal: o
modelo de utilidade descontada. Não vou forçar você (nem a mim mesmo)
com alguma tentativa de resumir o cerne desse artigo, porém vou
meramente extrair a essência que a nossa história requer.
A ideia básica é que o consumo vale mais para você agora do que mais
tarde. Dada a escolha entre um belo jantar nesta semana ou daqui a um
ano, a maioria de nós preferiria o jantar quanto antes. Usando a
formulação de Samuelson, dizemos que é “descontada” alguma taxa sobre
o consumo futuro. Se o jantar daqui a um ano for considerado como
apenas 90% de um jantar agora, dizemos que estamos descontando do
jantar futuro uma taxa anual de cerca de 10%.9
A teoria de Samuelson não tinha nada de paixões ou telescópios
defeituosos, apenas descontos constantes e metódicos. O modelo era tão
fácil de usar que até mesmo economistas daquela geração podiam lidar
facilmente com a matemática e continua sendo a formulação padrão até
hoje. Isso não quer dizer que Samuelson acreditasse que sua teoria era
necessariamente uma boa descrição do comportamento. As duas últimas
páginas do seu breve artigo são dedicadas a discutir o que ele chamou de
“sérias limitações” do modelo. Algumas delas são de aspecto técnico, mas
uma merece um escrutínio mais profundo. Samuelson observa
corretamente que, se as pessoas descontam do futuro taxas que variam com
o tempo, então pode ser que os indivíduos não se comportem de forma
consistente, ou seja, podem mudar de ideia à medida que o tempo avança.
O caso específico com o qual ele se preocupa é o mesmo que incomodou
Jevons, Pigou e outros economistas anteriores, tais como, a saber, o caso
em que ficamos mais impacientes para uma recompensa imediata.
Para compreender como funcionam os descontos, suponha que haja
algum bem, talvez a chance de assistir a um jogo de tênis em Wimbledon.
Se o jogo for assistido esta noite, ela valeria 100 “unidades de utilidade”, a
unidade arbitrária que os economistas usam para descrever níveis de
utilidade ou felicidade. Considere Ted, que desconta a uma taxa constante
de 10% ao ano. Para ele, o jogo valeria 100 unidades de utilidade este ano,
90 no ano que vem, depois 81, 72 e assim por diante. Alguém que
desconta dessa maneira está descontando com uma função exponencial.
(Se você não sabe o que isto quer dizer, não se preocupe.)
Agora considere Matthew, que também valoriza o jogo hoje em 100,
mas apenas em 70 após o primeiro ano, depois 63 no segundo ano ou em
qualquer época posterior. Em outras palavras, Matthew desconta 30% de
qualquer coisa pela qual precise esperar um ano para consumir, depois
10% no ano seguinte, e aí para totalmente de descontar (0%). Matthew
encara o futuro olhando através do telescópio defeituoso de Pigou, e
enxerga os anos 1 e 2 como se estivessem separados por apenas 1/3, e com
nenhum atraso real entre datas posteriores a essas. Sua impressão do futuro
tem muita semelhança com a famosa capa de uma edição da revista The
New Yorker, “View of the World from 9th Avenue”. Nessa capa, olhando
para oeste a partir da 9th Avenue, a distância até a 11th Avenue (a duas
quadras) é aproximadamente a mesma que da 11th Avenue até Chicago,
que parece ser aproximadamente 1/3 do caminho até o Japão. A conclusão
é que Matthew acha esperar mais doloroso no começo, porque parece
demorar mais.
FIGURA4. View of the World from 9th Avenue. Saul Steinberg, capa da
The New Yorker, 29 de março de 1976. © The Saul Steinberg Foundation / Artists Rights Society
(ARS), Nova York. Capa reimpressa com permissão da revista The New Yorker. Todos os direitos reservados.

O termo técnico para descontos cujo padrão é começar alto e então


declinar é desconto quase-hiperbólico. Se você não sabe o que significa
“hiperbólico”, isso demonstra um bom julgamento da sua parte sobre quais
palavras incorporar ao seu vocabulário. Apenas tenha em mente a imagem
do telescópio defeituoso quando o termo aparecer. Durante a maior parte,
vou evitar esse termo e usar viés do presente,10 a expressão atual para
descrever preferências desse tipo.
Para compreender por que descontos exponenciais fazem as pessoas se
aterem aos seus planos enquanto descontos hiperbólicos (com viés do
presente) não o fazem, consideremos um exemplo numérico simples. Ted
e Matthew moram em Londres e são ávidos fãs de tênis. Cada um ganhou
um sorteio oferecendo um ingresso para um jogo em Wimbledon, com
uma opção intertemporal. Eles podem escolher entre três alternativas. A
opção A é um ingresso para um jogo de primeira rodada no ano atual; na
verdade, o jogo é amanhã. A opção B é um jogo de quartas de final no
torneio do próximo ano. A opção C é a final no torneio que vai acontecer
daqui a dois anos. Todos os ingressos são garantidos, então podemos deixar
fora da nossa análise considerações quanto ao risco, e Ted e Matthew têm
gostos idênticos no que se refere a tênis. Se os jogos fossem todos para o
torneio do ano atual, as utilidades que atribuiriam a cada uma das opções
seriam: A = 100; B = 150; C = 180. Mas para irem à opção favorita, C,
terão que esperar dois anos. O que eles fazem?
Se Ted tivesse essa escolha, optaria por esperar dois anos e ir à final.
Faria isso porque o valor que atribui agora a ir à final em dois anos (seu
“valor presente”) é cerca de 146 (81% de 180), que é maior que o valor
presente de A (100) ou de B (135, ou 90% de 150). Além disso, após
passado um ano, se perguntarem a Ted se quer mudar de opinião e ir para
a opção B, a quarta de final, ele dirá não, uma vez que 90% do valor de C
(162) ainda é maior que o valor de B. É isto que significa ter preferências
consistentes no tempo. Ted sempre se aterá ao plano que fez no começo,
não importa quais sejam suas opções.
E quanto a Matthew? Quando lhe apresentam inicialmente a escolha,
ele também escolhe a opção C, a final. Neste momento ele avalia A em
100, B em 105 (70% de 150) e C em 113 (63% de 180). Mas,
diferentemente de Ted, Matthew mudará de ideia passado um ano e
trocará para B, a quarta de final, porque o desconto de esperar um ano
deixa C em 70% do valor, dando 126, que será menor que o valor de B,
então 150. Ele é inconsistente no tempo. Aplicando a analogia do telescópio
à capa da New Yorker, de Nova York ele não podia saber que a China era
mais longe que o Japão, mas se carregasse o telescópio para Tóquio,
começaria a notar que a viagem de lá para Shanghai é até mais distante do
que a de Nova York para Chicago.
A inconsistência no tempo demonstrada pelas pessoas incomodava
Samuelson. Sem a chegada de novas informações, não há por que Econs
mudarem de planos, mas Samuelson deixa claro sua consciência sobre a
realidade de tal comportamento. Ele cita exemplos equivalentes ao de
remover a tigela de castanhas-de-caju como meio de garantir que planos
presentes sejam concretizados. Por exemplo, ele menciona adquirir seguro
de vida integral como medida de poupança compulsória. Mas com essa
precaução devidamente anotada, ele segue em frente e o restante do
campo acompanha. Seu modelo de utilidade descontada com desconto
exponencial se tornou o carro-chefe da escolha intertemporal.

Pode ser injusto pegar esse artigo específico como ponto de virada. Por
algum tempo, economistas vinham se afastando do tipo de psicologia
popular que fora comum anteriormente, liderados pelo economista
italiano Vilfredo Pareto, que foi um dos precursores na aplicação do rigor
matemático à economia.11 Mas uma vez que Samuelson registrou esse
modelo e ele se tornou amplamente adotado, a maioria dos economistas
desenvolveu uma doença que Kahneman chama de cegueira induzida pela
teoria. Entusiasmados para incorporar seu recém-descoberto rigor
matemático, esqueceram todos os artigos altamente comportamentais sobre
escolha intertemporal que haviam sido escritos antes, até mesmo os de
Irving Fisher, que tinham aparecido meros sete anos antes. E também
esqueceram as advertências de Samuelson de que seu modelo poderia não
ser descritivamente preciso. Era necessário que descontos exponenciais
fossem o modelo correto de escolha intertemporal porque Econs não
ficariam mudando de ideia, e o mundo que agora estudavam não continha
mais quaisquer Humanos. Essa cegueira induzida pela teoria agora atinge
quase todos com doutorado em economia. O treinamento em economia
que os estudantes recebem provê grande conhecimento sobre o
comportamento de Econs, mas à custa de perder a intuição do senso
comum acerca da natureza humana e das interações sociais. Estudantes de
pós-graduação nem se dão conta de que vivem em um mundo habitado
por Humanos.

––––––––

Escolha intertemporal não é apenas um conceito abstrato usado em


economia teórica. Ela desempenha um papel vital em macroeconomia,
onde está por trás da chamada função de consumo, a qual nos diz como os
gastos de um lar variam com a renda doméstica. Suponha que o governo
tenha visto sua economia mergulhar em uma profunda recessão e resolva
conceder um corte único nos impostos de US$1.000,00 por pessoa. A
função de consumo nos diz quanto do dinheiro será gasto e quanto será
poupado. O pensamento econômico sobre a função de consumo mudou
drasticamente entre meados da década de 1930 e meados da década de
1950. A forma como os modelos da função de consumo evoluíram ilustra
uma interessante característica sobre como a teoria econômica se
desenvolveu desde que a revolução de Samuelson começou. À medida que
os economistas ficavam mais sofisticados matematicamente e seus modelos
incorporavam esses novos níveis de sofisticação, as pessoas que eles
descreviam também foram evoluindo. Primeiro, os Econs ficaram mais
inteligentes. Segundo, curaram todos seus problemas de autocontrole.
Calcular o valor presente dos benefícios da Previdência Social que
começarão daqui a 20 anos? Sem problema! Parar no boteco a caminho de
casa no dia de pagamento e gastar o dinheiro reservado para comida?
Nunca! Os Econs pararam o comportamento desviante.
Esse padrão na evolução da teoria econômica pode ser visto ao
examinarmos os modelos da função de consumo propostos por três peso
pesado da economia: John Maynard Keynes, Milton Friedman e Franco
Modigliani. Podemos começar com Keynes, que advogou de maneira
explícita o tipo de corte de imposto usado nesse exemplo. Em sua obra-
prima Teoria geral do emprego, do juro e da moeda,12 ele propõe um
modelo muito simples para a função de consumo. Ele sugere que, se um
lar recebe alguma renda incremental, consumiria uma proporção fixa
dessa renda extra. O termo que usou para descrever a proporção de renda
adicional que seria consumida é propensão marginal a consumir (PMgC).
Embora Keynes pensasse que a propensão marginal a consumir de um
determinado lar fosse relativamente constante se sua renda não mudasse
drasticamente, concordava com seu contemporâneo Irving Fisher quanto à
afirmação de que a PMgC variaria consideravelmente através da gama de
classes socioeconômicas. Especificamente, pensava que a propensão a
gastar seria a mais alta (perto de 100%) para famílias pobres e diminuiria
com o aumento de renda. Para os ricos, o dinheiro inesperado de
US$1.000,00 mal afetaria o seu consumo, então a PMgC ficaria perto de
zero. Se pegarmos o caso de uma família classe média que poupa 5% de
qualquer renda adicional conseguida, então Keynes prediz que uma
PMgC de uma quantia extra inesperada de US$1.000,00 seria 95%, ou
US$950,00.
Duas décadas depois, em um livro publicado em 1957, Milton
Friedman fez a plausível observação de que os lares poderiam ter a
precaução de distribuir seu consumo ao longo do tempo, então propôs a
hipótese da renda permanente.13 No seu modelo, uma família que poupa
5% de sua renda não gastaria os US$950,00 adicionais no mesmo ano em
que recebeu tal dinheiro inesperado. Em vez disso, o distribuiria.
Especificamente, ele propôs que lares usariam um horizonte de três anos
para determinar qual é a sua renda permanente, então dividiriam os gastos
extras regularmente ao longo dos três anos seguintes. (Isto implica uma
taxa de desconto de 33% ao ano.)14 Isto significa que no primeiro ano a
família gastaria cerca de US$950,00/3, ou seja, US$317,00.15
Em termos de aumento de sofisticação, o passo seguinte veio de Franco
Modigliani, escrevendo com seu aluno Richard Brumberg.16 Embora seu
trabalho fosse quase contemporâneo ao de Friedman, seu modelo estava
um patamar acima na escalada econômica rumo à concepção moderna de
um Econ. Em vez de se concentrar em períodos de curto prazo como um
ano ou até mesmo três anos, Modigliani baseou seu modelo na renda total
da vida do indivíduo, e, adequadamente, sua teoria foi chamada de
hipótese do ciclo de vida. A ideia é que as pessoas determinariam quando
jovens um plano de como distribuir seu consumo ao longo da vida,
incluindo a aposentadoria e até mesmo heranças.
Ao se manter fiel à sua orientação a um decurso vitalício, Modigliani
mudou seu foco, da renda para a riqueza total na vida. Para tornar as coisas
mais simples e concretas, vamos supor que estejamos lidando com alguém
que saiba que vai viver exatamente mais 40 anos e não planeje deixar
heranças. Com essas premissas simplificadoras, a hipótese do ciclo de vida
prediz que o dinheiro extra será consumido equitativamente durante os
próximos 40 anos, ou seja, a propensão marginal a consumir será de apenas
US$24,00 por ano (US$1.000,00/40) para o resto da vida.
Note que, quando vamos de Keynes para Friedman e depois para
Modigliani, os agentes econômicos estão pensando cada vez mais à frente,
e se presume de forma implícita que sejam capazes de exercer força de
vontade suficiente para postergar o consumo — no caso de Modigliani, por
décadas. Vemos também previsões completamente diferentes da parcela do
dinheiro extra que será gasta de imediato, variando de quase tudo a
próximo de nada. Caso julgássemos um modelo pela acurácia de suas
previsões, como é defendido por Friedman, acredito que o vencedor entre
os três modelos — em termos da capacidade de explicar o que as pessoas
fazem com alterações temporárias na sua renda — seria Keynes, se
levemente modificado em direção a Friedman e sua tendência natural de
eliminar flutuações de curto prazo.17 Mas se elegêssemos modelos segundo
a engenhosidade do modelador, então Modigliani sairia vitorioso. Talvez
porque os economistas tenham adotado a heurística “mais engenhoso é
melhor”, o modelo de Modigliani foi declarado o melhor e se tornou o
padrão da indústria.
Mas é difícil ser o garoto mais engenhoso da classe para sempre, e é
possível levar o modelo a um nível maior de sofisticação, como mostra
Robert Barro,18 um economista de Harvard. Primeiro, ele presume que
pais cuidam da utilidade de seus filhos e netos, e, como esses descendentes
cuidarão de seus próprios netos, seu horizonte de tempo é efetivamente
eterno. Assim, os agentes de Barro planejam deixar herança para seus
herdeiros e percebem que seus herdeiros farão o mesmo. Nesse mundo, as
previsões acerca de quanto dinheiro será gasto dependem da origem do
dinheiro. Se os inesperados US$1.000,00 tiverem sido ganhos em uma
noite de sorte no cassino, Barro faria a mesma predição que Modigliani
sobre o consumo. Mas se advém de um corte temporário de impostos que
está sendo financiado por emissão de títulos do governo, então a predição
de Barro muda. Tais letras do governo precisarão ser pagas em algum
momento. O beneficiário do corte de imposto compreende tudo isto e
percebe que os impostos de seus herdeiros eventualmente terão de subir
para pagar o corte de imposto que ele está recebendo. Então, não gastará
nada. Em vez disso, aumentará sua herança exatamente no mesmo valor
do corte de imposto.
A percepção de Barro é engenhosa, mas, para que ela seja
descritivamente acurada, precisamos de Econs que sejam tão espertos
quanto Barro.19 Onde essa análise deveria ser interrompida? Se alguém
ainda mais brilhante que Barro chega e pensa em um jeito ainda mais
engenhoso de as pessoas se comportarem, será que esse deveria se tornar o
nosso modelo mais recente de como pessoas reais se comportam? Por
exemplo, suponha que um dos agentes de Barro seja um rígido keynesiano
— uma ideia que Barro detestaria —que acredita que o corte de imposto
estimulará a economia o suficiente para saldar os títulos do governo por
meio do aumento do recolhimento do imposto de renda; nesse caso, ele
não precisará alterar suas doações de herança programadas. Na verdade, se
o corte de imposto estimular suficientemente a economia, ele poderá até
mesmo ser capaz de reduzir suas heranças, porque seus herdeiros se
beneficiarão da taxa de crescimento econômico mais elevada. Mas note
agora que, para saber que modelo econômico incorporar em seu
pensamento, seriam necessários Econs plenamente versados tanto em
teoria econômica quanto nos testes empíricos sobre os efeitos da política
fiscal. Claramente, deve haver limites para o conhecimento e a força de
vontade tomados como verossímeis na descrição dos agentes na economia,
poucos dos quais são tão engenhosos quanto Robert Barro.
A ideia de modelar o mundo como se ele consistisse em uma nação de
Econs, todos eles com ph.D. em economia, não é a maneira como
psicólogos pensariam o problema. Isso me foi mostrado quando dei uma
palestra no departamento de psicologia da Cornell. Comecei minha fala
esboçando a hipótese do ciclo de vida de Modigliani. Minha descrição era
simples e direta, mas, a julgar pela reação da plateia, você pensaria que
essa teoria de poupança era hilária. Felizmente, o economista Bob Frank
estava lá. Quando o alvoroço diminuiu, ele assegurou a todos que eu não
tinha inventado a teoria. Os psicólogos permaneceram estarrecidos em
descrença, imaginando como seus colegas do departamento de economia
podiam ter ideias tão tresloucadas a respeito do comportamento humano.20

––––––––

A hipótese do ciclo de vida de Modigliani, na qual as pessoas decidem


quanto da riqueza do seu tempo total de vida vão consumir em cada
período, não somente pressupõe que as pessoas sejam espertas o suficiente
para fazer todos os cálculos necessários (com expectativas racionais) de
quanto vão ganhar, quanto tempo vão viver e assim por diante, mas
também que possuam autocontrole suficiente para implementar o plano
ideal que resultar disso. Há uma premissa adicional não declarada: a saber,
a riqueza é fungível. No modelo, não importa se a riqueza é mantida em
dinheiro, garantia de imóvel, plano de aposentadoria, um quadro herdado
ou uma relíquia de família passada adiante por uma geração anterior.
Riqueza é riqueza. Sabemos, a partir dos capítulos anteriores sobre
contabilidade mental, que essa premissa não é mais inócua ou precisa do
que a premissa sobre capacidades cognitivas e força de vontade.
Para amenizar a premissa de que a riqueza é fungível e incorporar a
contabilidade mental à teoria do comportamento de consumo e poupança,
Hersh Shefrin e eu propusemos o que chamamos de hipótese do ciclo de
vida comportamental.21 Consideramos que o consumo de um lar em dado
ano não dependerá apenas da sua riqueza vitalícia, mas também das contas
mentais onde a riqueza é mantida. A propensão marginal a consumir a
partir de um ganho inesperado de US$1.000,00 na loteria provavelmente
será muito mais alta do que um aumento semelhante no valor das
economias de aposentadoria da casa. Na verdade, um estudo descobriu
que a PMgC oriunda de um aumento no valor da poupança de
aposentadoria pode até mesmo ser negativa! Especificamente, uma equipe
de economistas comportamentais mostrou que, quando investidores em
planos de aposentadoria obtêm altos rendimentos,22 que os tornam mais
ricos, eles aumentam suas proporções de poupança, provavelmente porque
extrapolam o sucesso de investimentos para o futuro.
Para compreender o comportamento de consumo dos lares,
necessitamos claramente voltar a estudar Humanos em vez de Econs.
Humanos não têm o cérebro de Einstein (ou Barro) nem possuem o
autocontrole de um ascético monge budista. Em vez disso, possuem
paixões, telescópios defeituosos, tratam de maneira bem diferente os vários
potes de riqueza e podem ser influenciados por retornos de curto prazo no
mercado de ações. Necessitamos de um modelo desses tipos de Humanos.
Minha versão favorita de tal modelo é o tema do próximo capítulo.
12

A PLANEJADORA E O FAZEDOR

Quando comecei a pensar seriamente sobre questões de autocontrole,


havia pouca coisa na literatura econômica à qual recorrer. Como a maioria
dos estudantes de pós-graduação, eu não sabia nada acerca dos primeiros
estudiosos cujo trabalho foi discutido no capítulo anterior. Estudantes de
pós-graduação raramente leem algo escrito há mais de 30 anos. E
tampouco havia muita coisa nova. No entanto, eu me sentia motivado pelo
trabalho de três acadêmicos: um economista e dois psicólogos.
Robert Strotz, um economista da Northwestern University, escreveu o
único artigo de economia sobre autocontrole que encontrei.1 Embora
muitos economistas estivessem usando o modelo de utilidade descontada
que Samuelson formulara, poucos além de Strotz haviam prestado
qualquer atenção às suas advertências sobre inconsistência temporal.
Nesse artigo, publicado em 1955, Strotz foi a fundo no problema,
investigando as propriedades matemáticas que a preferência de uma pessoa
deve satisfazer para assegurar que, uma vez feito um plano, ela não há de
querer mudá-lo. Não precisamos entrar nos detalhes técnicos do artigo.
Basta dizer que havia um único caso extremamente específico (desconto
exponencial) no qual era possível ter certeza de que as pessoas seriam
temporalmente consistentes, e, como Samuelson, Strotz se preocupava
com os casos em que essas condições não fossem satisfeitas.
Essas preocupações levaram Strotz a se envolver naquilo que veio a se
tornar uma discussão obrigatória do relato de Homero sobre Ulisses e as
Sereias. Quase todos os estudiosos do autocontrole — de filósofos a
psicólogos e economistas — acabam falando dessa antiga história de um
jeito ou de outro. Ao menos dessa vez, vou seguir o caminho tradicional.
Lembre-se do contexto. As Sereias eram uma versão antiga de uma ban-
da de rock só de mulheres. Nenhum marinheiro conseguia resistir ao
chamado de suas canções. Mas qualquer marinheiro que sucumbisse à
tentação de conduzir seu navio para perto das rochas acabaria
naufragando. Ulisses queria as duas coisas: ouvir a canção e contar sobre
ela. Para ter êxito, então, concebeu um plano em duas partes.2 A primeira
parte era garantir que sua tripulação não ouvisse o chamado das Sereias,
então instruiu seus homens a encher os ouvidos de cera. A segunda parte
do plano era fazer com que a tripulação o amarrasse ao mastro, o que
permitiria curtir o show sem correr o risco da inevitável tentação de levar o
navio em direção às rochas.
A história ilustra duas ferramentas importantes que as pessoas usam para
enfrentar problemas de autocontrole. Para os integrantes da tripulação, a
estratégia foi remover os estímulos que os tentariam a fazer algo estúpido.
O que os olhos não veem, o coração não sente. Para si mesmo, Ulisses
escolheu uma estratégia de comprometimento: limitou as próprias opções
para evitar a autodestruição. Foi a sua versão de remover a tigela de
castanhas-de-caju. Até mesmo Strotz, acostumado com as datas
diferenciadas do pagamento dos profissionais de educação nos Estados
Unidos, confessou utilizar uma estratégia de comprometimento para
recebimento de salário: “Em vez de dividir o recebimento do meu salário
anual nas nove parcelas correspondentes aos meses do ano acadêmico,
escolho a opção de ter o meu salário anual distribuído numa base de 12
meses, embora pudesse usar os juros!”
Em 1978, época em que eu estava explorando questões sobre
autocontrole, o artigo de Strotz já tinha mais de 20 anos e não havia
qualquer outro economista que parecesse interessado nele (embora Tom
Schelling logo viesse a embarcar também). Voltei-me para a psicologia em
busca de inspiração. Eu pensava que, claro, haveria uma vasta literatura
sobre gratificação atrasada em psicologia. Ledo engano. Apesar de muitos
psicólogos estarem agora interessados em problemas de autocontrole, não
era esse o caso no fim dos anos 1970. Mas desenterrei dois tesouros.
O primeiro foi o trabalho de Walter Mischel, que agora é bem
conhecido. Mischel, então em Stanford, vinha realizando experimentos
em uma creche no campus da escola. O pesquisador pedia a uma criança
(de quatro ou cinco anos) que entrasse em uma sala e escolhesse entre
uma pequena recompensa agora ou uma recompensa maior um pouco
mais tarde. As recompensas eram guloseimas como marshmallows ou
biscoitos recheados. A criança era informada de que podia pegar um
biscoito na hora que quisesse, mas, se conseguisse esperar até a volta do
pesquisador, poderia pegar três biscoitos. A criança podia tocar uma
campainha a qualquer momento e o pesquisador voltaria e lhe daria a
recompensa pequena.
A maioria das crianças considerou a tarefa muito dura e difícil, mas as
circunstâncias em que a criança esperava tinham importância. Em
algumas versões do experimento, os doces estavam em uma bandeja bem
na frente da criança. A visão daquelas guloseimas tinha para a criança o
mesmo efeito que as melodias das Sereias tinham sobre Ulisses. O tempo
de espera variava em torno de 1 minuto. Mas se a recompensa estivesse
longe do campo de visão (e, portanto, sem ser percebida pela mente), o
tempo de espera podia chegar a até 11 minutos. As crianças também
conseguiam esperar mais tempo se lhes dissessem para pensar em algo
“divertido” em vez de pensar na recompensa em si.
Os primeiros desses experimentos foram realizados no fim da década de
1960 e começo da década de 1970. Cerca de 10 anos depois, como
reflexão posterior, Mischel e seus colegas acharam que seria interessante
ver o que tinha acontecido com as crianças que haviam sido os sujeitos
desses experimentos. Assim, rastrearam o maior número possível dos cerca
de 500 sujeitos originais que conseguiram encontrar, e acabaram achando
aproximadamente 1/3 deles que concordaram em ser entrevistados uma
vez a cada década. De forma um tanto surpreendente, a quantidade de
tempo que a criança esperava em um daqueles experimentos acabou se
revelando um preditor válido de muitos marcos importantes, desde
pontuação em exames de encerramento no curso escolar (SAT) e sucesso
na carreira até uso de drogas. Foi um resultado particularmente
surpreendente até para o próprio Mischel, que já havia feito anteriormente
um considerável número de pesquisas apontando que os chamados traços
de personalidade não eram muito úteis em prever comportamentos mesmo
no presente, quanto mais no futuro.3
Mischel tem gravações inestimáveis de alguns dos primeiros
experimentos, as quais exibem a dificuldade das crianças em exercer
autocontrole. Há um garoto sobre o qual nutro uma particular curiosidade.
Ele estava no contexto mais difícil, no qual o grande prêmio, três deliciosos
biscoitos recheados, estava colocado bem à sua frente. Após uma breve
espera, ele não aguentou mais. Mas, em vez de tocar a campainha, abriu
cuidadosamente cada biscoito, lambeu o saboroso recheio branco e, então,
pôs os biscoitos de volta no lugar, arrumando-os da melhor forma que pôde
para evitar ser descoberto. Na minha imaginação, esse garoto cresceu para
se tornar Bernie Madoff.
Outro trabalho de um cientista comportamental que capturou minha
atenção foi o de George Ainslie, um psiquiatra clínico que tratava
pacientes em seu emprego num hospital de veteranos e que fazia pesquisa
no seu tempo livre. Em um artigo publicado em 1975 — que eu tinha
estudado cuidadosamente durante o meu ano em Stanford —, Ainslie
resumia tudo que os acadêmicos sabiam sobre autocontrole na época.
Aprendi com Ainslie que havia ampla literatura sobre gratificação
atrasada4 em animais não humanos, tais como ratos e pombos. Com um
paradigma similar ao de Mischel, pesquisadores davam a um animal a
escolha entre uma recompensa pequena e imediata ou uma recompensa
maior, porém atrasada. Os animais precisavam pressionar (ou bicar) uma
alavanca para obter a recompensa e, após um extensivo treinamento,
aprendiam a prever a duração da espera e a quantidade de comida após
pressionar uma alavanca ou a outra. Ao variar a duração da espera e o
tamanho da recompensa, o pesquisador podia estimar as preferências dos
animais em termos de tempo. A maioria dos estudos descobriu que os
animais exibem o mesmo padrão de desconto que leva a reversões de
preferência em humanos. Os animais descontam hiperbolicamente e
também têm problemas de autocontrole!5
O artigo de Ainslie também provê uma longa argumentação sobre várias
estratégias para lidar com problemas de autocontrole. Um dos cursos de
ação é o comprometimento: esconder as castanhas ou se amarrem ao
mastro. Por exemplo, se você quer parar de fumar, poderia preencher um
vultoso cheque para alguém que encontra com frequência, com a
permissão de descontar o cheque se você for visto fumando. Ou poderia
fazer uma aposta consigo mesmo, o que Ainslie chamou de “aposta lateral
privada”. Você diria a si mesmo: “Não vou assistir ao jogo na televisão esta
noite até acabar [alguma tarefa que você está tentado a adiar].”

––––––––

Com os insights de Strotz, Mischel e Ainslie em mãos, eu me propus a


criar uma estrutura conceitual para discutir esses problemas, a qual os
economistas ainda reconhecessem dentro do campo da economia. A
questão teórica crucial que eu queria responder era a seguinte: se eu sei
que vou mudar de ideia em relação às minhas preferências (não vou me
limitar apenas a mais umas poucas castanhas-de-caju, como pretendo, e
sim comer a tigela inteira), quando e por que vou tomar alguma atitude
para restringir minhas escolhas futuras?
Todos nós temos ocasiões em que mudamos de ideia, mas geralmente
não fazemos grandes esforços para nos mantermos fiéis ao plano original.
As únicas circunstâncias nas quais você gostaria de se comprometer com
seu plano de ação seriam quando tivesse um bom motivo para acreditar
que, se mudar suas preferências mais tarde, essa mudança de preferências
será um erro.
Remover as castanhas é algo inteligente, porque comer a tigela inteira
arruinará seu apetite, e você prefere um jantar que não consista apenas de
castanhas-de-caju. Da mesma maneira, uma criança esperta participando
de um dos testes de Mischel seria suficientemente sábia para dizer ao
pesquisador: “Da próxima vez que você quiser distribuir biscoitos
recheados, por favor, não me dê a opção ‘um biscoito agora’ nem
mencione o termo ‘biscoito recheado’. Só espere 15 minutos e me traga os
três biscoitos.”
Em algum momento em que ponderava sobre essas questões, deparei
com uma citação do cientista social Donald McIntosh, a qual influenciou
profundamente o meu pensamento: “A ideia de autocontrole é paradoxal a
menos que se considere que a psique contém mais de um sistema de
energia, e que esses sistemas de energia têm algum grau de independência
um do outro.”6 O trecho é de um livro obscuro, The Foundations of
Human Society. Não sei como cheguei à citação, mas ela me pareceu
obviamente verdadeira. Autocontrole diz respeito, essencialmente, a
conflito. E, como o tango, são necessários (pelo menos) dois para ter um
conflito. Talvez fosse necessário um modelo dual.
Por mais intuitivamente convidativa que essa ideia fosse para mim,
qualquer tipo de modelo dual tinha a desvantagem de ser considerado
radical em economia, mas ultrapassado em psicologia: uma combinação
não muito boa. Poucos economistas, inclusive eu quando comecei a me
dedicar a esse trabalho, tinham consciência da discussão de Adam Smith
sobre a batalha entre as nossas paixões e o nosso espectador imparcial. Para
a maioria, a ideia simplesmente parecia maluca. Psicólogos acadêmicos
naquela época já não estavam mais enamorados de Freud com seu id, ego
e superego, e a visão de sistema dual7 — que agora está muito em voga —
ainda estava por emergir.8 Com muito receio, discretamente aventei a
ideia entre amigos. Um esboço do conceito apareceu no meu artigo
“Rumo a uma teoria positiva da escolha do consumidor” [“Toward a
Positive Theory of Consumer Choice”, no original], mas eu sabia que
precisava de algo mais formal, o que representa em economia uma boa
quantidade de matemática. Recrutei Hersh Shefrin, um economista
matemático que estava na Universidade de Rochester na mesma época que
eu, para se juntar a mim nesse esforço.9
Hersh foi o primeiro de muitos coautores com quem trabalhei ao longo
dos anos. Quando começamos a conversar sobre essas questões, suas
principais qualificações eram que ele era bom em matemática e não
considerava malucas as minhas ideias. Esta última era mais importante, já
que é bem fácil encontrar economistas melhores do que eu em
matemática. Sob muitos aspectos, Hersh e eu éramos polos opostos. Ele
era sério, meticuloso, estudioso e religioso, sendo inclusive estudante do
talmude, o compêndio enciclopédico de antigos escritos judaicos. Eu não
tinha nenhuma dessas qualidades. Ainda assim, conseguimos nos dar bem.
E, o mais importante: Hersh ria das minhas piadas. Trabalhamos juntos da
maneira que vi Amos e Danny trabalharem, por meio de conversas
intermináveis. E quando chegou a hora de escrever nosso primeiro artigo,
analisávamos cada sentença, exatamente como vi os dois fazerem. Apesar
de termos começado nossas conversas enquanto ainda éramos colegas de
trabalho em Rochester, logo me mudei para Cornell e Hersh partiu para a
Universidade de Santa Clara, na ensolarada Califórnia, perto de Stanford.
Escrevemos apenas dois artigos juntos, mas Hersh foi fisgado pela
economia comportamental e logo formou uma colaboração de muito
sucesso com Meir Statman, um colega de trabalho em Santa Clara,
fazendo pesquisas em finança comportamental.
Nosso modelo é, na verdade, baseado em uma metáfora. Nós
propusemos que, em qualquer ponto no tempo, um indivíduo consiste em
dois eus. Há uma “planejadora” que olha para a frente, tem boas intenções
e se importa com o futuro, e um “fazedor” despreocupado que vive para o
presente.10 A questão-chave para qualquer modelo desse comportamento
era decidir como caracterizar interações entre os dois. Uma possibilidade
seria analisar a planejadora e o fazedor como competidores em um jogo,
usando o ramo da matemática e economia chamado teoria dos jogos como
modelo central. Rejeitamos essa ideia porque não pensávamos que o
fazedor se engajasse em comportamento estratégico; ele é mais uma
criatura passiva que simplesmente vive o momento. Ele reage àquilo que
está à sua frente e o consome até ficar saciado. Em vez disso, escolhemos
uma formulação baseada na teoria das organizações, a saber, um modelo
principal-agente. Nessa opção, fomos sem dúvida influenciados pelo fato
de que a teoria do agenciamento, como era chamada, era foco de discussão
na escola de pós-graduação em negócios da Universidade de Rochester
quando eu lecionava lá. Michael Jensen e William Meckling, então deão
da escola, haviam escrito um famoso artigo sobre o assunto em 1976.11 Eu
não tinha certeza de que eles aprovariam tal emprego de suas ideias, mas
isso era parte da diversão.
Em um modelo principal-agente, o principal é o patrão,
frequentemente o dono de uma empresa, e o agente é alguém a quem é
delegada autoridade. No contexto de uma organização, as tensões surgem
porque o agente sabe algumas coisas que o principal não sabe e é muito
custoso para o principal monitorar toda atitude tomada pelo agente. O
agente nesses modelos tenta ganhar o máximo dinheiro possível ao mesmo
tempo com o mínimo esforço. Em resposta, a empresa adota um conjunto
de regras e procedimentos (esquemas de incentivo e sistemas de prestação
de contas, por exemplo) destinados a minimizar os custos dos conflitos de
interesse entre o principal e os agentes empregados. Por exemplo, um
vendedor que pode ser pago quase totalmente por comissão precisa
apresentar recibos de despesas de viagem e ser proibido de voar de primeira
classe.
No nosso framework intrapessoal, os agentes são uma série de fazedores
de vida curta; especificamente, pressupomos que há um novo fazedor em
cada período de tempo — digamos que seja por dia. O fazedor quer curtir
a vida e é completamente egoísta, pois não se importa nem um pouco com
nenhum fazedor futuro. A planejadora,12 por outro lado, é completamente
altruísta. Ela se importa apenas com a utilidade da série de fazedores.
(Pense nela como uma ditadora benevolente.) Ela gostaria que,
coletivamente, eles fossem o mais feliz possível, mas tem controle limitado
sobre as ações dos fazedores, especialmente se um fazedor é estimulado de
alguma maneira, tal como comida, sexo, álcool ou um desejo urgente de
sair e aproveitar um dia bonito sem fazer nada.
A planejadora tem dois tipos de ferramenta que pode usar para
influenciar as ações dos fazedores: pode tentar influenciar nas decisões que
os fazedores tomam mediante recompensas ou penalidades (financeiras ou
outras), o que ainda lhes permite arbítrio; ou pode impor regras, tais como
estratégias de comprometimento, que limitem as opções dos fazedores.
À guisa de ilustração, considere um exemplo simples, ainda que fictício.
Suponha que Harry esteja fora, hospedado sozinho em uma remota cabana
sem meio de se comunicar com o mundo exterior. Foi largado ali por um
pequeno avião e será pego de volta em 10 dias. Originalmente, ele tinha
comida de sobra (a água é abundante), mas um urso faminto invadiu a
cabana e acabou com quase toda a comida que ele tinha, exceto por 10
barras energéticas que escaparam da atenção do urso ou não satisfaziam
seu apurado paladar. Como não há meio de se comunicar com o avião e
Harry não é bom em arranjar comida, terá que se virar com as 10 barras
energéticas até o avião voltar para pegá-lo. É claro que Harry está equipado
com uma planejadora e um fazedor. Como sua planejadora lidará com
esse problema?
Vamos pressupor que a planejadora avalie igualmente o consumo de
cada fazedor (então não há desconto sobre o consumo de fazedores
posteriores). Para os fazedores, a comida tem utilidade marginal
decrescente, ou seja, a primeira barra energética é mais prazerosa que a
segunda, e assim por diante, mas comem até a última mordida não gerar
prazer adicional nenhum, e então param. Nesse contexto, a planejadora
consideraria como melhor resultado comer uma barra por dia, concedendo
a cada um dos fazedores uma igual percepção de utilidade.13 Em outras
palavras, a planejadora gostaria de impor o mesmo tipo de regularidade de
consumo que os Econs supostamente fazem se seguirem a hipótese do
ciclo de vida. Em alguma medida, a planejadora tenta conseguir que os
fazedores ajam mais como Econs. Se fosse tecnologicamente viável, ela
adotaria uma estratégia de comprometimento que não deixasse nenhum
arbítrio para os fazedores, eliminando assim qualquer risco de desvio. Uma
cabana equipada com 10 cofres programáveis, cada um regulado para ser
aberto em um momento específico, seria ideal.14 Na perspectiva da
planejadora, esse seria o melhor resultado possível.
Mas a cabana provavelmente não tem esses cofres, então o que a
planejadora pode fazer? Todas as 10 barras estão guardadas no armário,
prontas para serem comidas. O que acontece então? Se a planejadora não
intervier, o primeiro fazedor, que não dá a mínima importância ao bem-
estar dos futuros fazedores, vai comer até ficar cheio, ou seja, até o ponto
em que dar mais uma mordida na barra energética o deixará menos feliz.
Digamos que esse ponto chega após três barras. No segundo dia, o fazedor
também come mais três barras, e o mesmo ocorre com o fazedor do
terceiro dia. Então, quando chega o quarto dia, o fazedor atual come uma
barra no café da manhã — a última das 10 — e logo começa a ficar
faminto. O resto da semana não é muito divertido.
De algum modo, a planejadora precisa evitar que a compulsão dos
fazedores os leve a atacar as barras nos primeiros dias. Se não houver
estratégias de comprometimento disponíveis, a única outra ferramenta que
a planejadora tem no nosso modelo é a culpa. Mediante algum processo de
doutrinação, seja por parte da própria planejadora ou por parte dos pais e
da sociedade, os fazedores podem ser levados a se sentir mal em relação a
deixar futuros fazedores sem nada para comer. Mas impor culpa é custoso.
No exemplo da barra energética, a planejadora é incapaz de levar o fazedor
a se sentir mal logo após consumir a primeira barra. Em vez disso, ela tem
que fazer com que cada mordida na barra seja menos prazerosa.
Isto é ilustrado na Figura 6. A linha mais alta representa a utilidade
gerada quando o fazedor come barras energéticas sem culpa, e o fazedor
consome até o ponto em que a utilidade é maximizada, no caso, três
barras. A linha intermediária ilustra o caso em que foi aplicada culpa
suficiente para levar o fazedor a parar de comer após duas barras, e a linha
inferior mostra o caso em que o fazedor para de comer depois da primeira
barra. O importante a se notar nessa figura é que, quando se emprega a
culpa, a vida é menos prazerosa. O único jeito de levar o fazedor a comer
menos barras é fazê-lo comê-las com menos prazer. Em outra maneira de
ver a questão, empregar força de vontade requer esforço.
Essa análise sugere que, se for possível implementar restrições perfeitas,
a vida será melhor. A estratégia de usar cofres programáveis, cada um
contendo uma barra energética, produz muito mais satisfação do que a
dieta induzida pela culpa. Strotz atingiu esse objetivo pedindo ao seu
empregador que lhe pagasse seu salário anual em 12 parcelas mensais, de
setembro até agosto do ano seguinte, em vez de nove parcelas mensais, do
começo do ano letivo, em setembro, ao seu fim, em maio. Esse último
plano renderia mais juros, já que o dinheiro entre mais depressa, mas ele
também precisa economizar o suficiente no decorrer do ano acadêmico
para garantir que tenha dinheiro durante o verão, isso sem contar a viagem
de férias com a família.
Por que não usar sempre restrições? Uma das razões é que restrições
externas podem não ser facilmente acessíveis. Mesmo que você dê um
jeito de ter um jantar saudável sendo enviado para sua casa toda noite,
pronto para ser comido, não haverá nada que impeça você de também
pedir uma pizza. E também, mesmo que essas restrições sejam acessíveis,
elas são inflexíveis por seu próprio desígnio. Se Strotz opta pelo esquema
de pagamento por ano letivo, o dinheiro entrará mais cedo e, assim, o
professor poderá tirar vantagem de uma oportunidade de comprar alguma
coisa em promoção durante o inverno — digamos, um novo cortador de
grama, que estará mais caro no verão. Porém, se o seu salário é distribuído
em 12 meses, pode ser que ele não tenha folga suficiente no orçamento
para comprar um cortador de grama no inverno. Do outro lado da moeda,
se ele recebe o dinheiro antes, precisa ter disciplina para fazê-lo durar até o
fim do verão.
O mesmo princípio se aplica a organizações. Se o principal sabe
exatamente o que o agente deveria fazer em cada situação, então pode
criar um regulamento que nunca deve ser violado. Mas todos já tivemos a
frustração de lidar com um agente de nível baixo que trabalha sob tais
restrições e não tem o arbítrio para fazer algo que seja obviamente sensato,
mas que não foi previsto e, portanto, “não é permitido”.
É claro que há outras técnicas de controle, usadas tanto por
organizações como por indivíduos, que envolvem acompanhamentos
constantes de despesas. Em organizações, essas técnicas são chamadas de
contabilidade. De maneira semelhante, como já vimos, Humanos usam
contabilidade mental — com auxílio de envelopes, potes e planos de
aposentadoria — para alcançar o mesmo objetivo. Note que o fracasso em
tratar vários potes de dinheiro como fungíveis, como Econs fariam, é o que
torna viáveis tais estratégias de contabilidade.
Devo ressaltar que Shefrin e eu não achávamos que, de fato, sua mente
abrigasse duas pessoas diferentes. O nosso modelo é do tipo “como se”, que
pretende oferecer uma perspectiva útil para avaliação de problemas de
autocontrole. Nós incluímos uma nota de rodapé no nosso segundo artigo,
observando que seria possível pensar na planejadora como residente da
região do córtex pré-frontal, associado ao pensamento consciente e
racional, ao passo que o fazedor pode ser associado ao sistema límbico.
Para os que estão familiarizados com o modelo de sistema dual tal como
Kahneman descreve em Rápido e devagar: duas formas de pensar, é
razoável pensar na planejadora como o Sistema 2 — lento, reflexivo,
contemplativo — enquanto os fazedores são o rápido, impulsivo e intuitivo
Sistema 1. Pesquisas recentes em neuroeconomia oferecem alguma
sustentação para esta interpretação.15 Mas, para propósitos práticos, não
importa se o modelo tem uma base fisiológica. É uma metáfora que nos
ajuda a pensar sobre maneiras de incorporar o autocontrole em economia.
Ainda acho o modelo planejadora/fazedor a forma mais proveitosa de
pensar a respeito de autocontrole, mas ele não foi abraçado como modelo
formal favorito da próxima geração de economistas comportamentais.
David Laibson, um economista comportamental de Harvard, na sua
dissertação de doutorado16 publicada em 1997, foi pioneiro em introduzir
aquele que se tornou o modelo adotado. Dois outros teóricos de economia
comportamental,17 Matthew Rabin e Ted O’Donoghue, elaboraram essa
abordagem, à qual agora a maioria dos economistas se refere simplesmente
usando as duas letras gregas que representam as variáveis importantes: beta
(b) e delta (d). As sutilezas do modelo são difíceis de explicar sem entrar
em alguns detalhes, mas nas notas do final do livro são fornecidas
referências aos principais artigos.18 A vantagem crucial que o modelo
beta/delta tem sobre o planejadora/fazedor é a simplicidade matemática. É
a menor modificação possível ao modelo básico de Samuelson capaz de
capturar os aspectos essenciais do autocontrole.
Eis aqui uma forma simples de entender como o modelo beta/delta
funciona: suponha que, para qualquer período de tempo distante o
suficiente para ser considerado “mais tarde”, uma pessoa não desconte
nada referente a tempo, ou seja, a taxa de desconto é zero. Mas qualquer
coisa considerada “agora” é privilegiada e tentadora, e qualquer coisa
considerada “mais tarde” só tem metade do valor. No exemplo de
Wimbledon discutido anteriormente, o jogo de primeira rodada que
receberia valor 100 no ano corrente só valeria 50 no ano seguinte ou em
qualquer ano posterior. Tais preferências têm “viés do presente”, já que
colocam muito peso no agora comparado a mais tarde, e levam a escolhas
temporalmente inconsistentes.
Mesmo nessa versão altamente simplificada do modelo, é possível
ilustrar muitas sutilezas interessantes sobre escolha intertemporal; essas
sutilezas dependem em parte da autoconsciência das pessoas a respeito de
seus problemas de autocontrole. Quando David Laibson escreveu seu
primeiro artigo sobre o assunto, pressupôs que os agentes eram
“sofisticados”, cientes desse padrão de preferências temporais. Como
estudante de pós-graduação tentando conseguir um emprego com um
artigo sobre teoria econômica comportamental (uma categoria que era
essencialmente desconhecida na época), foi inteligente da parte de David
caracterizar o modelo desta maneira. Os agentes de David eram puros
Econs, exceto por um detalhe: tinham preferências temporais
problemáticas. Quando O’Donoghue e Rabin decidiram se juntar ao
grupo, consideraram uma abordagem mais radical, na qual agentes têm
preferências com viés temporal no presente mas não têm consciência de
sua aflição. Tais agentes são considerados “ingênuos”.
Não é surpresa que nenhuma dessas formulações simples retrate uma
descrição totalmente acurada do comportamento. Compartilho uma
opinião sustentada por todos os três autores de que a “verdade” está em
algum ponto intermediário entre os dois extremos: ingenuidade parcial. A
maioria de nós percebe que temos problemas de autocontrole, mas
subestimamos sua gravidade. Somos ingênuos em relação ao nosso nível de
sofisticação. Em particular, sofremos do que George Lowenstein chamou
de “lacuna da empatia quente-frio”.19 Quando estamos em um estado frio
e reflexivo — digamos, contemplando o que comer no jantar de quarta-
feira logo depois de ter terminado um satisfatório brunch no domingo —,
pensamos que não teremos dificuldade em nos ater ao nosso plano de
jantares saudáveis e pouco calóricos durante a semana. Mas quando chega
a noite de quarta-feira e amigos sugerem uma visita à nova pizzaria com
várias cervejas artesanais, acabamos comendo e bebendo mais do que o
previsto no domingo, ou mesmo na quarta-feira antes de chegar ao
restaurante, com seus tentadores aromas exalando do forno a lenha, isso
sem mencionar a intrigante lista de marcas especiais de cerveja para
provar. Para tais casos, talvez necessitemos que uma planejadora tenha
estabelecido uma restrição — nada de cerveja no meio da semana nem
saídas para comer pizza —, e então pensaremos em um jeito de fazer
vigorar essa regra.
Desde o tempo em que tirei da sala pela primeira vez a tigela de
castanhas, os cientistas comportamentais aprenderam muita coisa sobre
problemas de autocontrole. Esse conhecimento está se mostrando
importante para lidar com muitos dos maiores problemas da sociedade,
como veremos mais adiante.
INTERLÚDIO
13

DESVIOS NO MUNDO REAL

Se é tarefa da economia comportamental oferecer uma descrição mais


realista do comportamento humano, então ela deveria ser útil em contextos
empíricos. Embora o começo da minha carreira tenha sido dedicado à
pesquisa acadêmica sobre contabilidade mental e autocontrole, tive de fato
oportunidades ocasionais de me aventurar no mundo real, ou tão perto
dele quanto se pode chegar em Ithaca. Logo descobri que essas ideias
tinham aplicações práticas nos negócios, especialmente relacionadas com
a determinação de preços. Aqui estão dois exemplos.

Greek Peak
Em Cornell conheci um aluno, David Cobb, que me incentivou a
conhecer seu irmão, Michael. Morador da área e ávido esquiador, Michael
estava determinado a fazer carreira no negócio de esqui e conseguira um
emprego como diretor de marketing em Greek Peak, um empreendimento
familiar perto de Ithaca. Na época, o resort estava em sérias dificuldades
financeiras. Alguns invernos com um volume de neve inferior ao usual
aliados a um período econômico difícil haviam criado uma situação em
que a empresa foi obrigada a pedir pesados empréstimos para atravessar a
baixa temporada, e isso numa época em que as taxas de juros estavam altas,
mesmo para empresas com baixo risco de crédito, o que não era o caso de
Greek Peak. O resort simplesmente tinha que aumentar a renda e reduzir
as dívidas, ou iria à falência. Michael precisava de ajuda e sugeriu uma
permuta. Ele daria a mim e meus filhos bilhetes para o teleférico e
arranjaria equipamento de esqui para meus filhos. Em troca, eu tentaria
ajudá-lo a tirar seu negócio do vermelho.
Logo ficou evidente que Greek Peak teria que aumentar os preços se
quisessem passar a ter lucro. Mas qualquer aumento grande o suficiente
para gerar lucro deixaria seus preços quase iguais aos de estações de esqui
famosas em Vermont ou New Hampshire. Os custos operacionais por
esquiador não eram muito diferentes dos praticados naqueles resorts
maiores, mas Greek Peak tinha apenas cinco teleféricos e um terreno
menos esquiável. Como poderíamos justificar a cobrança de um preço
semelhante ao das estações de esqui maiores e fazê-lo sem uma redução
significativa no número de visitantes? E como poderíamos reter o mercado
local, tão sensível aos preços, que incluía estudantes de Cornell e outras
faculdades próximas?
Em termos de contabilidade mental, os preços das passagens de
teleférico das famosas estações de esqui de Vermont seriam um ponto de
referência saliente para os clientes de Greek Peak, e eles esperavam pagar
significativamente menos, já que o produto era distintamente inferior. O
que Greek Peak tinha a seu favor era a proximidade. Era o lugar mais
bacana para esquiar na região central do estado de Nova York, e chegar a
Vermont exigia uma viagem de carro de cinco horas. Greek Peak também
era a opção mais próxima para pessoas morando no sul, inclusive Scranton,
Filadélfia e até mesmo Washington, D.C. Ônibus lotados de esquiadores
chegavam dessas cidades todo fim de semana.
Pressionei Michael a rever o modelo de receita de Greek Peak, fazendo
uso da economia comportamental. O primeiro problema a ser resolvido era
encontrar um jeito de aumentar o preço dos bilhetes sem perder fregueses.
Adotamos um plano de subir gradualmente o preço ao longo de um
período de anos, evitando assim um salto repentino que pudesse criar uma
reação adversa. Para justificar parcialmente os preços mais altos, tentamos
melhorar a experiência do esquiador, assim a compra não pareceria uma
extorsão.1 Lembro-me de uma das primeiras ideias que tive nessa linha.
Havia uma pequena pista de competição ao lado de uma das trilhas de
descida, onde o esquiador podia passar por uma série de portões de slalom
e receber um tempo oficial que era divulgado pelos alto-falantes.
Esquiadores mais jovens apreciavam esse aspecto competitivo, e os portões
estavam suficientemente próximos para manter a velocidade segura. O
preço cobrado para usar a pista de competição era um dólar. Um dólar não
era muito, mas a cobrança era um estorvo. Ter acesso a dinheiro em uma
pista de esqui é muito chato. Você tem que tirar as suas grossas e
desajeitadas luvas, e enfiar a mão através de camadas e camadas de roupa
para chegar ao dinheiro. Depois, tinha que pôr a nota de um dólar em
uma máquina automática. Considerando a qualidade de funcionamento
dessas máquinas nas melhores circunstâncias, dá para imaginar a taxa de
defeitos uma vez expostas àquelas condições climáticas.
Perguntei a Michael e ao dono, Al, quanto estavam ganhando com a
pista de competição. Era uma quantia bem pequena, talvez uns poucos
milhares de dólares por ano. Por que não a tornar gratuita? Assim seria
possível melhorar a experiência do esquiador a um custo trivial. Não havia
muito o que pensar. E permitiu que Michael e Al refletissem sobre outras
coisas que podiam fazer para melhorar a qualidade e, muito importante, o
valor percebido do seu produto.
Outro exemplo envolvia instrutores de esqui. O principal negócio dos
instrutores era ensinar esquiadores novos, especialmente crianças em
excursão escolar — obviamente uma maneira importante de fazer crescer a
clientela. Mas os instrutores tinham muito tempo ocioso. Alguém teve a
brilhante ideia de montar uma oficina de esqui gratuita na montanha. O
esquiador esperava em determinado ponto da trilha e então esquiava
através de alguns portões com a ação captada em vídeo. Um instrutor
estacionado no pé da trilha mostrava ao esquiador o vídeo e dava algumas
dicas: “Lições gratuitas!”
Mesmo que esses aprimoramentos estivessem deixando mais palatáveis a
alta de preço do teleférico, ainda assim tínhamos que nos preocupar com a
sensibilidade aos preços do mercado local. Aqui tínhamos um belo modelo
existente a partir do qual trabalhar. O resort oferecia aos universitários um
pacote de passagens de teleférico por seis dias com um enorme desconto se
fosse adquirido até 15 de outubro. Esses pacotes eram populares e
significavam uma boa fonte de renda antecipada. Desconfio que os
estudantes também gostavam do fato de a oferta ser chamada pack-de-seis.
Até mesmo referências sutis a cerveja são atraentes para a galera
universitária.
Especulamos se valia a pena oferecer algo como o pack-de-seis também
para a clientela local não universitária. O objetivo era oferecer aos locais
uma promoção que não estaria disponível aos esquiadores de fora que
vinham de carro uma ou duas vezes ao ano. Para esses esquiadores, o preço
da passagem do teleférico era apenas uma pequena parcela dos custos de
viagem, que incluíam transporte, comida e hospedagem. Alguns dólares a
mais para a passagem do teleférico tinham pouca probabilidade de alterar a
decisão sobre fazer ou não a viagem, especialmente dada a falta de
concorrência nas proximidades. Terminamos bolando uma solução
chamada pack-de-dez. Ele incluía passagens para cinco fins de semana e
cinco dias de semana, e era vendido com desconto de 40% em relação ao
preço normal se adquirido até 15 de outubro.
O pack-de-dez acabou se tornando extremamente popular entre
moradores das redondezas. Existem alguns fatores comportamentais que
explicam sua popularidade. O primeiro é óbvio: 40% de desconto soa
como um grande negócio. Uma boa quantidade de utilidade de transação.
Segundo, a compra antecipada dissocia a decisão de compra e a decisão de
esquiar.2 Como ocorrido na contabilidade mental do vinho, a compra
inicial pode ser vista como um “investimento” que economiza dinheiro,
tomando a decisão de esquiar no calor do momento, em uma sexta-feira de
sol após uma queda de neve recente, sem custo para ser implementada. O
fato de ter saído para um belo jantar no fim de semana anterior não põe no
vermelho a contabilidade mental da recreação; esquiar está saindo “de
graça”. E, do ponto de vista do resort, ainda melhor que de graça — era
um custo afundado.3 À medida que a alta temporada avançava, os
esquiadores ficavam ansiosos para usar algumas das suas passagens para
evitar perder o dinheiro investido no pack-de-dez, e podiam trazer algum
amigo que pagaria o preço integral. (Os bilhetes eram intransferíveis.)
O pack-de-dez também era popular porque esquiar é uma dessas
atividades que entram nas resoluções de ano-novo. “No ano passado só saí
três vezes, o que é ridículo, pois o Greek Peak fica aqui pertinho. Este ano
vou tirar alguns dias de folga do trabalho e vir quando não estiver tão
lotado.” Da mesma forma que pagar a mensalidade de uma academia
estimula mais exercício, quem planeja esquiar gosta da ideia de se
comprometer mais com o esqui. Comprar um pack-de-dez era uma boa
maneira de fazer isso e economizar dinheiro ao mesmo tempo.
Depois de alguns anos, packs-de-seis, packs-de-dez e bilhetes para a
temporada contribuíam com uma parcela substancial da renda do resort, e
esse dinheiro adiantado eliminava a necessidade de tomar empréstimos
para permanecer solvente até o começo da alta temporada em dezembro. A
venda antecipada de todos esses bilhetes também servia como proteção
para um inverno quente, sem muita neve. Ainda que estações de esqui
possam fabricar neve, é preciso que esteja frio o suficiente para que as
máquinas funcionem. E também — e isto é algo que deixa loucos os donos
de resorts —, mesmo que tenha feito frio, se não houver neve no chão da
cidade, as pessoas ficam menos propensas a pensar em esquiar,
independentemente das condições no resort.
Depois de três anos vendendo packs-de-dez, Michael fez uma análise e
me chamou para apresentar os resultados. Lembre-se de que os packs-de-
dez eram vendidos a apenas 60% do preço normal da temporada.
“Adivinhe qual é a porcentagem dos bilhetes que está sendo resgatada?”,
perguntou Michael. “Sessenta por cento!” A estação estava vendendo os
bilhetes a 60% do preço normal de temporada, mas apenas 60% deles
estavam sendo utilizados. Em essência, estavam vendendo os bilhetes no
preço normal e recebendo o dinheiro vários meses antes: um ganho
enorme.
Tal resultado não parecia aborrecer a clientela, cuja maioria voltava a
adquirir os packs-de-dez no ano seguinte. Mesmo aqueles que não tinham
utilizado muitos dos seus bilhetes culpavam a si mesmos, e não o resort. É
claro que no fim da temporada havia clientes que não usaram quase
nenhum de seus bilhetes. Alguns perguntavam, esperançosos, se podiam
usar os bilhetes na temporada seguinte. Educadamente, eram informados
de que não, os bilhetes estavam sendo vendidos explicitamente apenas para
aquele ano. Mas Al concebeu uma oferta especial para esses clientes. Eles
foram informados de que, se comprassem outro pack-de-dez no ano
É
corrente, os bilhetes não utilizados no ano anterior continuariam válidos. É
claro que um cliente que só esquiou duas ou três vezes no ano anterior
tem pouca probabilidade de ir mais de 10 vezes no ano atual, mas a oferta
soava bem. Embora eu não acredite que muita gente tenha sido boba o
suficiente para comprar outro pack, os clientes apreciaram o fato de o
resort estar fazendo um esforço para ser “justo”, algo que, conforme
veremos em breve, é importante para manter os clientes felizes.
Um desafio final na fixação de preços para Greek Peak era descobrir o
que fazer no começo da temporada, quando o resort abria logo depois da
primeira neve, porém com apenas um teleférico funcionando na maior
parte das vezes. Esquiadores ávidos que vinham esperando desde o mês de
março anterior apareciam para as primeiras descidas de uma nova
temporada. Que preço deveria ser cobrado deles? A política de Al sempre
fora olhar o clima da montanha pela sua janela, e então dizer aos
bilheteiros o preço, frequentemente metade do preço normal. É claro que
a maioria dos esquiadores que vinham não tinha a menor ideia de qual
seria o preço; eles só sabiam o preço de venda sugerido na temporada. Só
os mais obstinados poderiam ser capazes de detectar a estratégia de preços
de Al para o começo da temporada. Eu chamo isto de “venda secreta”. Um
cliente chega na caixa registradora pronto para pagar o preço normal e o
vendedor diz: “Oh, esse item está com 50% de desconto.” Isto pode gerar
boa vontade, mas não é uma estratégia de preços brilhante, porque o
cliente estava disposto a pagar o preço integral. Reduzir o preço só faz
sentido se aumentar as vendas atuais ou talvez vendas futuras, formando a
lealdade do cliente.
Michael e eu bolamos uma estratégia. No começo da temporada — ou
em qualquer hora que apenas parte da montanha estivesse aberta para
esquiar —, os preços seguiam uma fórmula estabelecida. Esquiadores
pagariam preço integral para esquiar nesse dia, mas receberiam um cupom
com descontos de até 50% na visita seguinte, dependendo de quantos
teleféricos estivessem operando. Como os clientes tinham expectativa de
pagar preço integral, essa oferta parecia generosa, e o cupom podia induzi-
los a voltar e talvez comprar também um almoço e uma cerveja.
Michael me contou certa vez uma história que capta quanto esses
cupons eram populares. Um sujeito aparece para dar sua primeira esquiada
no ano e opta por um novo pack-de-dez. Parado na fila para trocar um
desses cupons por um bilhete do teleférico, entreouve o bilheteiro explicar
à freguesa à sua frente que ela terá um cupom com 50% de desconto que
poderá usar na próxima vinda. Isto lhe parece tão bom que ele põe o pack-
de-dez de volta no bolso e dá o dinheiro para um bilhete integral. Eu
sempre quis saber se ele usou aquele cupom de metade do preço antes de
terminar seu pack-de-dez. Nunca saberemos.
Porém sabemos que formar uma base sólida de receita antes do começo
da temporada alcançou a meta de acabar com as dívidas do resort e reduzir
sua dependência do volume de neve durante a temporada. Tanto Michael
como eu seguimos nosso caminho,4 mas posso informar que Greek Peak
ainda está operando.

Meu dia na GM
Durante anos, as fábricas de automóveis americanas tinham um problema
de vendas sazonal. Novos modelos de carros eram apresentados no outono
de cada ano e, na expectativa pelos modelos novos, os fregueses relutavam
em comprar modelos do “ano passado”. Os fabricantes não pareciam
prever esse padrão e, em agosto, sempre tinham um estoque substancial de
carros não vendidos nos pátios das concessionárias, ocupando o espaço
necessário para exibir os modelos novos. Inevitavelmente, as empresas de
carros ofereciam promoções de vendas para se livrar do excesso de
estoque.5
Uma inovação foi o reembolso,6 introduzida pela Chrysler em 1975 e
rapidamente acompanhada pela Ford e pela GM. As empresas de
automóveis anunciavam uma promoção temporária na qual o comprador
de um carro recebia de volta uma quantia em dinheiro, geralmente
algumas centenas de dólares. O reembolso parece ser apenas outro nome
para uma promoção temporária, mas parecia mais popular do que uma
redução de preço equivalente, como seria de se esperar com base na
contabilidade mental. Suponha que o preço de lista do carro fosse
US$14.800,00. Reduzir o preço para US$14.500,00 não parecia grande
negócio, uma diferença que mal se notava. Mas chamando essa redução de
preço de reembolso, o consumidor era incentivado a pensar
separadamente nos US$300,00, o que intensificava sua importância. Esse
pouquinho de contabilidade mental saía caro, pelo menos no estado de
Nova York, onde eu vivia, porque o consumidor tinha que pagar o imposto
sobre venda desse reembolso. Usando os números no exemplo acima, o
consumidor pagava imposto sobre o preço de aquisição pleno de
US$14.800,00, e então recebia de volta um cheque do fabricante no valor
de US$300,00, e não de US$300,00 mais 8% do imposto. Mas, indo mais
diretamente ao ponto, as restituições estavam começando a perder parte do
seu atrativo e os carros voltaram a se acumular nos pátios das
concessionárias.
Então alguém na sede da GM teve uma ideia. A Ford e a Chrysler
vinham tentando descontos em empréstimos para carros7 como alternativa
ou suplemento para os reembolsos. E se a GM tentasse oferecer uma taxa
altamente reduzida como estímulo de vendas? Em uma época em que os
juros vigentes para empréstimos de carros eram de 10% ou mais, a General
Motors oferecia um empréstimo a apenas 2,9%. Os consumidores podiam
escolher ou um reembolso ou um empréstimo com desconto. A oferta de
empréstimo teve um efeito sem precedentes sobre as vendas. Havia notícias
de consumidores na concessionária deitados sobre o capô de um carro
específico para o reivindicar antes que qualquer outra pessoa pudesse
comprá-lo.
Mais ou menos nessa época, notei uma historinha no Wall Street
Journal. Um repórter tinha feito as contas8 e descoberto que o valor do
empréstimo a juros baixos era menor que o valor do reembolso. Em outras
palavras, se o consumidor usasse o reembolso como pagamento da entrada
para o carro, reduzindo assim a quantia que precisasse pegar emprestada
(embora a juros mais altos), economizaria mais dinheiro. Aceitar o
esquema do empréstimo era uma tolice! Mas os carros estavam sendo
vendidos aos montes. Interessante.
Nessa época, Jay Russo, um dos meus colegas de Cornell, estava dando
consultoria para a GM, então fui conversar com ele. Contei a Jay sobre
essa charada e disse que eu poderia ter uma explicação psicológica simples.
O reembolso era uma pequena porcentagem do preço do carro, mas o
empréstimo sendo oferecido era menos de 1/3 das taxas de juros habituais.
Isto soa como um negócio muito melhor. E pouca gente além de
contadores e repórteres do Wall Street Journal se daria ao trabalho de fazer
o cálculo, especialmente por ser uma era anterior às planilhas prontas e
computadores domésticos.
Jay me pediu para redigir uma breve nota sobre a minha observação, e
ele a dividiria com o pessoal da GM. Fiz a nota e, para minha surpresa,
recebi uma ligação da sede da General Motors cerca de uma semana
depois. Minha nota tinha chegado até alguém do departamento de
marketing, e ele queria conversar comigo pessoalmente sobre o assunto.
Eu disse: “Claro, dê uma passada aqui.”
Esse cavalheiro pegou o voo de Detroit para Syracuse e dirigiu por uma
hora e pouco até Ithaca. Batemos um papo sobre a minha ideia por cerca
de uma hora, no máximo. Ele foi embora, passeou pelo campus por
algumas horas e voltou para Detroit. Fui até Jay para descobrir do que se
tratava e ele falou com toda franqueza: “Ele veio aqui para contar as suas
cabeças.” “Como assim?” “É isso mesmo, ele queria saber se você tinha
duas cabeças, não tomava banho ou se, de algum outro modo, não seria
seguro levar você para se encontrar com seus patrões. Ele vai mandar o
relatório à matriz.”
Aparentemente, passei no teste. Alguns dias depois, recebi uma ligação
perguntando se eu estaria disposto a ir a Detroit. Isso tinha o potencial de
ser o meu primeiro trabalho de consultoria pago, e o dinheiro viria a
calhar, então concordei. Além disso, estava morrendo de curiosidade.
Se você assistiu Roger e eu, o documentário de Michael Moore, já
entendeu o meu destino: o edifício-sede da GM. Achei o prédio muito
estranho. Era imenso, e havia carros novos em exibição por toda parte no
interior, nos saguões e corredores. No meu primeiro encontro, um vice-
presidente de marketing me deu um cronograma para o dia. Eu tinha uma
série de reuniões de meia hora com diferentes pessoas no departamento de
marketing. Muitas dessas pessoas também pareciam ser vice-presidentes.
Naquela primeira reunião, perguntei quem estava encarregado de avaliar a
promoção de empréstimo com juros baixos, que reduzia em centenas de
milhões de dólares o preço dos carros vendidos. Meu anfitrião não tinha
certeza, mas me garantiu que seria uma das pessoas com quem eu me
reuniria. No fim do dia, estaria sabendo.
Durante o dia, várias pessoas descreveram como a taxa de juros de 2,9%
havia sido determinada. Ao que parecia, Roger Smith, o CEO, tinha
convocado uma reunião para determinar como lidariam com o excesso de
estoque naquele ano, e alguém sugeriu uma promoção baseada em
empréstimos com taxas de juro mais baixas. Todo mundo concordou que
era uma ótima ideia. Mas que taxa de juros usariam? Um gerente sugeriu
4,9%. Outro disse 3,9%. Após cada sugestão, mandavam alguém fazer
alguns cálculos. Finalmente, alguém sugeriu 2,9% e Roger decidiu que
gostava da sonoridade desse número. O processo todo levou menos de uma
hora.
Mas quando eu perguntava às pessoas quem avaliaria a promoção e
decidiria o que fazer no próximo ano, recebia olhares vagos seguidos de
“Eu não”. O dia terminou no escritório do meu anfitrião. Reportei que, até
onde pude saber, não havia ninguém pensando nessas questões, e isso me
parecia um erro. Ele sugeriu que eu lhe escrevesse uma proposta sobre o
que poderia ser feito.
Depois do que fiquei sabendo durante a minha visita, tive certeza de
que não queria esse trabalho de consultoria, mas lhe enviei uma breve
proposta fazendo duas sugestões. Primeiro, descobrir por que a promoção
tinha funcionado tão bem. Segundo, fazer um plano para o futuro,
sobretudo porque a Ford e a Chrysler provavelmente copiariam a bem-
sucedida promoção da GM.
Depois de um mês, recebi uma resposta curta. Minha recomendação
havia sido discutida pela alta chefia e fora rejeitada. A empresa resolvera,
em vez disso, planejar melhor sua produção e evitar estoques excedentes
de verão. Isto eliminaria a necessidade de avaliar a promoção e planejar
para o futuro, pois não haveria mais vendas promocionais para modelos
fora de linha. Fiquei embasbacado. Uma empresa gigantesca gastara
centenas de milhões de dólares em uma promoção e não se dera ao
trabalho de descobrir como e por que tinha dado certo. Michael Cobb, na
minúscula estação de esqui Greek Peak, pensava mais analiticamente do
que a gigante industrial General Motors.
Conforme aprendi ao longo dos anos e discutirei mais em capítulos
posteriores, a relutância em experimentar, testar, avaliar e aprender que
vivenciei na General Motors é extremamente comum. Continuei vendo
essa tendência desde então, nos negócios e no governo, embora
recentemente tenha tido a oportunidade de mudar esse ethos em contextos
governamentais.
Ah, e quanto àquela alegação de que tinham um plano para eliminar
estoques excedentes em verões futuros? O plano foi violado no verão
seguinte, e no verão depois desse, e, pelo que eu saiba, em todo verão
desde então. O excesso de confiança é uma força muito poderosa.
IV
TRABALHANDO COM DANNY
1984 – 85
Após o nosso ano em Stanford, Amos e Danny resolveram imigrar para a
América do Norte. Amos ficou no departamento de psicologia de Stanford,
e Danny se mudou para o departamento de psicologia da Universidade da
Colúmbia Britânica, em Vancouver. Parte do fascínio pela universidade
canadense era que eles estariam a duas horas de voo um do outro e no
mesmo fuso horário. Continuaram a trabalhar juntos, conversando
diariamente e se visitando com frequência.
Como todos começamos em empregos novos no mesmo ano, estávamos
no mesmo cronograma sabático. Em 1984–85, tirei meu primeiro ano
sabático, e Amos e Danny também estariam de licença. Nosso ano em
Stanford havia sido tão transformador para mim que, quando chegou a
hora de pensar na minha licença de pesquisa, naturalmente tive esperança
de grudar em um deles, ou em ambos. Após várias maquinações, acabei
em Vancouver com Danny. Amos, nesse meio-tempo, viajou para Israel.
Em Vancouver, consegui um escritório na escola de negócios da
universidade, que era um bom lugar para eu circular, uma vez que tinha
um excelente departamento de finanças e eu estava no meio da empreitada
de aprofundar meus conhecimentos sobre esse campo. Mas minha
principal atividade naquele ano foi trabalhar com Danny e seu
colaborador, o economista ambiental Jack Knetsch, que lecionava na
Universidade Simon Fraser, nas proximidades da Universidade da
Colúmbia Britânica. Como no ano em Stanford, esse ano em Vancouver
me ofereceu a rara oportunidade de uma imersão plena em pesquisa. Com
exceção do ano em Stanford, seria o ano mais produtivo da minha vida.
14

O QUE PARECE JUSTO?

Danny e Jack me convidaram para um projeto que tinham iniciado havia


pouco tempo e que estava intimamente relacionado com a minha questão
da “cerveja na praia”, a qual investigava os elementos que levam uma
transação econômica a parecer um “bom negócio” (isto é, aquilo que faz as
pessoas se disporem a pagar mais por uma cerveja comprada em um local
chique do que em um boteco). Este era o tópico que Danny e Jack tinham
começado a estudar: o que faz uma transação econômica parecer “justa”?
Alguém poderia resistir a pagar o mesmo valor por uma cerveja vendida em
um boteco que por uma vendida em um local chique porque, na cabeça
dele ou dela, não é justo que o dono do boteco cobre um preço tão alto.
Esse projeto foi possibilitado por um arranjo que Jack Knetsch fizera
com o governo canadense, dando-nos acesso gratuito a pesquisas por
telefone. Ao que parecia, havia um programa treinando desempregados
para serem entrevistadores telefônicos, seja lá o que isso signifique, e eles
precisavam de perguntas a serem feitas pelos participantes do treinamento.
Se em cada manhã de segunda mandássemos por fax um monte de
perguntas, eles nos enviariam as respostas por fax na quinta à noite. Isto nos
dava a sexta-feira e o fim de semana para descobrir o que tínhamos
aprendido com as perguntas da semana e para formular perguntas novas
para a semana seguinte. Hoje esse tipo de pesquisa pode ser feito on-line
usando serviços como o “Mechanical Turk” da Amazon, mas o acesso
semanal a uma amostra aleatória de algumas centenas de moradores de
Ontário (e mais tarde na Colúmbia Britânica) era um luxo incrível
naquele tempo. Fomos capazes de testar uma porção de ideias, obter
feedback rápido e aprender da melhor maneira possível: intuição guiada
pela teoria e testada por tentativa e erro.
Eis aqui um exemplo do tipo de pergunta que fazíamos:

Uma loja de ferragens vende pás para neve por US$15,00. Na manhã
seguinte a uma forte nevasca, a loja aumenta o preço para US$20,00.
Avalie essa atitude como: completamente justa; aceitável; um tanto
injusta; muito injusta.

Resolvemos simplificar a apresentação dos dados, agrupando as duas


primeiras na categoria de “aceitável” e as duas últimas na categoria de
“injusta”. Eis as respostas para a pergunta (cada pergunta tinha cerca de
100 respondentes):

Aceitável 18% | Injusta 82%

Agora, você pode estar dizendo: “Dãã! Que idiota aumentaria o preço
das pás de neve na manhã seguinte a uma nevasca?” Mas aumentar o
preço é exatamente o que a teoria econômica diz que vai e deveria
acontecer! A pergunta poderia constar facilmente em um curso básico de
economia numa escola de administração. “Há uma oferta fixa de pás de
neve e um súbito aumento na demanda. O que acontece com o preço?”
Nessa aula, a resposta correta seria dizer que o preço aumentará o
suficiente para que todo mundo que esteja disposto a pagar a quantia
compre uma pá. Aumentar o preço é a única maneira de garantir que as
pás de neve acabem sendo adquiridas por aqueles que as valorizam mais
(conforme mensurado pela sua disposição de pagar).
Uma das coisas que estudantes de MBA aprendem na escola de
administração é a pensar como um Econ, mas eles também esquecem
como é pensar como Humano. Aqui está outro exemplo da noção de
Kahneman de cegueira induzida pela teoria. De fato, quando apresentei
aos meus alunos de MBA a pergunta sobre o preço justo da pá de neve,
suas respostas seguiram de acordo com a teoria econômica padrão.

Aceitável 76% | Injusta 24%

Nosso exercício era puramente descritivo. Não pretendíamos ser


filósofos morais nem julgar sobre o que “é” ou “deveria ser” justo. Em vez
disso, estávamos tentando fazer o que se poderia chamar de filosofia
experimental.1 Nossa intenção era descobrir o que cidadãos comuns
consideram justo. Mais especificamente, estávamos tentando descobrir
quais ações por parte das empresas deixam as pessoas irritadas. E aumentar
o preço das pás de neve logo depois de uma nevasca deixa as pessoas
realmente possessas. Existe até mesmo uma expressão popular para essa
prática: meter a faca. Pois é essa a sensação quando uma loja aumenta o
preço das pás de neve no dia seguinte a uma nevasca: as pessoas sentem
mesmo que estão sendo agredidas. E, de fato, em muitos lugares existem
leis contra essa prática, sugerindo que as pessoas a consideram ofensiva.
Nós queríamos descobrir que outras práticas comerciais os Humanos
odeiam.
Qualquer pergunta de pesquisa que produzisse algo interessante era
repetida usando diferentes variações para assegurar que não havia nenhum
elemento especial, como pás de neve, por exemplo. Eis outro caso análogo,
inspirado por Jessie e Joey — minha filha de três anos e sua onipresente
boneca, respectivamente. Joey não era uma boneca comum; era uma
boneca Cabbage Patch, a qual — por razões misteriosas para mim, mas
óbvias para muitas meninas pequenas — tinham se tornado mania entre o
público da pré-escola. Na época do Natal, não se encontravam bonecas
dessa marca em lugar nenhum e muitos pais ficavam desesperados. Daí, o
seguinte item:

Uma loja esgotou o estoque de bonecas Cabbage Patch para um


mês. Uma semana antes do Natal é descoberta uma única boneca
em um depósito. Os gerentes sabem que muitos fregueses gostariam
de comprar a boneca. Então anunciam pelo sistema de som da loja
que a boneca será vendida em leilão para o freguês que oferecer o
maior valor.

Aceitável 26% | Injusto 74%

A resposta levanta uma questão interessante: o que torna o leilão


impopular? Será que é porque a boneca irá para alguém rico o suficiente
para ganhar o leilão, ou será porque o dono da loja optou por extrair cada
centavo possível de um pai ou mãe desesperado com uma filha pequena
ansiosa pela noite de Natal?
Para descobrir, fizemos a mesma pergunta para outro grupo, mas
acrescentamos uma frase adicional declarando que os lucros serão doados
para a UNICEF. Isso gerou uma proporção de 79% de aceitável. Leiloar
uma boneca é íntegro se os lucros forem para caridade, a menos que a
“caridade” seja a carteira do proprietário.
Mesmo essa conclusão precisa ser contemporizada. Em outro cenário,
dissemos que uma cidadezinha estava sofrendo de uma epidemia de gripe
e que restava apenas um pacote de medicamentos. Seria justo o
farmacêutico leiloar o medicamento? É claro que as pessoas detestariam o
leilão, mesmo que o dinheiro fosse para caridade. As pessoas entendem
que muitos luxos são acessíveis apenas aos ricos. Mas, pelo menos para a
maioria, a saúde pública ocupa outra categoria. Grande parte dos países
europeus (assim como o Canadá) oferece serviços de saúde para seus
cidadãos como direito básico, e mesmo nos Estados Unidos, onde essa
visão sofre resistência em certos setores, acidentados sem plano de saúde
não são expulsos de um pronto-socorro. De maneira similar, nenhum país
permite um mercado de órgãos, embora o Irã tenha um para rins. Para a
maior parte do mundo, a ideia de que uma pessoa rica precisando de um
rim possa pagar a uma pessoa pobre para doá-lo é considerada
“repugnante”,2 para usar a palavra predileta do economista Alvin Roth para
descrever tais transações de mercado.
Em muitas situações, a justiça percebida de uma ação depende não só
de quem ela ajuda ou prejudica, mas também de como é formulada. Para
testar esse tipo de efeito, fazíamos duas versões de uma pergunta para
diferentes grupos de respondentes. Por exemplo, considere esse par de
perguntas com as diferenças ressaltadas em itálico:

Ocorreu uma escassez em certo modelo popular de automóvel, e os


fregueses agora precisam esperar dois meses pela entrega. Uma
concessionária tem vendido esses carros a preço de tabela. Agora os
preços do modelo nessa concessionária estão US$200,00 acima do
preço de tabela.

Aceitável 29% | Injusto 71%

Ocorreu uma escassez em certo modelo popular de automóvel, e os


fregueses agora precisam esperar dois meses pela entrega. Uma
concessionária tem vendido esses carros com um desconto de
US$200,00 sobre o preço de tabela. Agora está vendendo o modelo só a
preço de tabela.

Aceitável 58% | Injusto 42%

Este par de perguntas ilustra um ponto útil que surgiu na nossa


discussão no Capítulo 2 a respeito de comerciantes impondo sobretaxas
para o uso do cartão de crédito. Qualquer empresa deveria estabelecer o
preço mais alto que pretende cobrar como preço “regular”, nomeando
como “promoções” ou “descontos” quaisquer desvios desse preço. Remover
um desconto não é nem de perto tão censurável quanto adicionar uma
sobretaxa.
Um aspecto que veio à tona a partir da nossa pesquisa é a relação entre
percepção de justiça e o efeito posse. Tanto compradores quanto
vendedores se sentem no direito aos termos de negócio a que se
acostumaram e tratam qualquer deterioração desses termos como uma
perda. Tal sentimento sobre as condições usuais do negócio é
particularmente verdadeiro quando o vendedor começa a cobrar por algo
que ele tradicionalmente tem dado de graça ou incluído no preço. Dessa
maneira, o status quo se torna um ponto de referência. Se restaurantes
começassem a cobrar um adicional para você poder se sentar enquanto
come, estariam violando a norma existente de que as refeições em
restaurantes incluem uma cadeira, embora ela não tenha que ser
confortável. Mesmo assim, cidadãos pensam que empresas e empregadores
têm o direito de obter um lucro (razoável). Não se espera que as empresas
deem seus produtos de presente. Tanto que um aumento de preços devido
a um aumento de custos quase sempre é considerado justo.
A percepção de justiça também ajuda a explicar um antigo quebra-
cabeça em economia: em uma recessão, por que os salários não caem o
suficiente para manter todo mundo empregado? Em uma terra de Econs,
quando a economia encolhe e empresas enfrentam uma queda na
demanda por seus bens e serviços, a primeira reação não seria
simplesmente dispensar funcionários. A teoria do equilíbrio diz que,
quando a demanda por algo cai — trabalho, neste caso —, os preços para a
oferta também deveriam cair o suficiente para igualar a demanda. Então
deveríamos esperar que, quando a economia contrai, as empresas reduzam
salários, permitindo-lhes também cortar o preço de seus produtos e, ainda
assim, ter lucro. Mas não é isso que vemos: os salários e ordenados
parecem ficar congelados.3 Quando chega uma recessão, ou os salários não
caem nada ou caem muito pouco para manter todo mundo empregado.
Por quê?
Uma explicação parcial para esse fato é que cortar salários deixa os
trabalhadores tão irados que as empresas acham melhor manter fixos os
níveis de pagamento e simplesmente dispensar o excedente de
funcionários (que não estarão por perto para reclamar). Porém, com a
ajuda de um pouco de inflação, é possível reduzir salários “reais” (isto é,
corrigidos pela inflação) com bem menos pressão dos trabalhadores. O
próximo par de questões ilustra esse ponto.

Uma empresa está tendo um pequeno lucro. Ela se localiza em uma


comunidade que vivencia uma recessão com desemprego
substancial, mas sem inflação. Há muitos trabalhadores ansiosos para
trabalhar nessa empresa. Ela decide diminuir os salários e as
remunerações este ano em 7%.

Aceitável 38% | Injusto 62%


Uma pequena empresa está tendo um pequeno lucro. Ela se localiza
em uma comunidade que vivencia uma recessão com desemprego
substancial e uma inflação de 12%. A empresa decide aumentar os
salários este ano em apenas 5%.

Aceitável 78% | Injusto 22%

Repare que o poder de consumo dos empregados é o mesmo para as


duas versões do problema, mas as reações são bem diferentes. Um corte
real no salário nominal é visto como perda e, portanto, é injusto, ao passo
que deixar de acompanhar a inflação é julgado aceitável, uma vez que o
salário nominal ainda está subindo. Esta é uma das muitas razões pelas
quais os economistas (inclusive eu) sentiam que os bancos centrais
deveriam ter estado dispostos a tolerar um pouco mais de inflação após a
crise financeira. Até mesmo 3% de inflação poderia ter permitido às
empresas cortar o suficiente de salários reais para acelerar a recuperação
dos empregos, que tem sido muito lenta na maior parte do mundo.

––––––––

Obviamente, uma coisa é descobrir quais ações das empresas deixam as


pessoas iradas, e outra bem diferente é perguntar se as empresas obedecem
a esses postulados de justiça. Não conheço nenhum estudo sistemático
dessa questão, mas desconfio que a maioria das empresas bem-sucedidas
entende intuitivamente as diretrizes que descobrimos e tentam pelo menos
evitar que suas ações transpareçam como injustas.
A aparência de justiça deveria ser um valor especialmente elevado para
empresas que planejam vender para os mesmos clientes durante um tempo
longo, uma vez que essas empresas têm mais a perder parecendo agir
injustamente. Na verdade, após um furacão, o lugar do país mais barato
para se comprar madeira compensada é frequentemente a área que foi
mais atingida.4 Por exemplo, depois que o furacão Katrina devastou Nova
Orleans, a Home Depot e outras redes carregaram caminhões com
suprimentos de emergência de alimentos e garrafas d’água para doação. Ao
mesmo tempo, um desastre natural desses induz alguns sujeitos de espírito
empreendedor numa cidade próxima a carregar um caminhão com
madeira compensada e vendê-la nas áreas devastadas ao maior preço que
conseguir. Nesse caso, ambos os vendedores estão maximizando seus
lucros. A rede de lojas está restabelecendo uma reputação de negócios
justos que dará retorno no longo prazo, enquanto os “empreendedores
temporários” voltarão para casa em alguns dias com um bom lucro e
carregando, dependendo do ponto de vista deles, uma consciência culpada
ou orgulho pelos seus esforços de ajudar a melhorar a alocação de recursos
escassos.
Mas as empresas nem sempre fazem essas coisas direito. O fato de meus
alunos de MBA considerarem aceitável aumentar o preço das pás de neve
após uma nevasca deveria servir de alerta para todos os executivos, um
aviso de que suas intuições acerca do que parece justo para seus clientes e
empregados poderia precisar de um pouco de sintonia fina.
Considere o caso de uma iniciativa tomada pelo First Chicago Bank em
meados da década de 1990, quando era o maior banco na área
metropolitana de Chicago. A alta administração estava preocupada com o
fato de a divisão comercial do banco não estar dando lucro suficiente. Para
reduzir os custos, decidiram incentivar os clientes a fazer mais uso dos
recém-introduzidos caixas automáticos. Embora a maioria das pessoas
tivesse se sentido à vontade em tirar dinheiro da máquina, alguns clientes
relutavam em usar o caixa automático para depositar cheques. Em vez
disso, iam ao caixa físico para esse serviço, e os absolutamente tecnófobos
continuaram a ir ao caixa para tirar dinheiro (e talvez bater um papo com
seu caixa favorito). O banco resolveu estimular os clientes a adotarem
máquinas automáticas, cobrando US$3,00 para usar o caixa físico em
transações que pudessem ser feitas na máquina.
O banco ficou orgulhoso desta inovação e a anunciou com grande
alarde, junto com uma nova linha de opções para contas-correntes. A
reação do público foi imediata e feroz. A primeira página de um jornal
local dizia: “O First Chicago perde contato com os humanos”.5 A matéria
prosseguia dizendo: “O First National Bank of Chicago introduziu hoje
uma inovadora linha de contas-correntes destinada a atualizar seus serviços
e adequá-los à maneira como os clientes preferem interagir com bancos
nos anos 1990. E o que o banco acha que os clientes preferem nos anos
1990? Pagar US$3,00 pelo privilégio de lidar com um caixa de banco.”
A concorrência foi rápida no ataque. Um banco botou um cartaz de
“Caixa Gratuito” na sua filial bem diante de uma das principais vias locais.
Outro transmitiu um anúncio de rádio:

HOMEM: Vi algo estranho no meu extrato bancário, sabe?


CAIXA: Isto é uma pergunta?
HOMEM: O quê? Bem, é sim.
CAIXA: Há uma cobrança extra para perguntas: seis dólares.
HOMEM: O quê?
CAIXA: Nove dólares.
Você captou a ideia. Até mesmo o humorista do programa noturno Jay
Leno aproveitou a deixa: “Então, se você quiser falar com uma humana,
são US$3,00. Mas a boa notícia é que, por $3,95, você pode falar
sacanagem para ela, então tudo bem.”
O banco atraiu toda essa publicidade ruim por uma tarifa de US$3,00
que muito pouca gente de fato pagaria. Contudo, foi só em dezembro de
2002, quando o First Chicago foi comprado por um banco nacional, que a
nova equipe administrativa anunciou que estavam abandonando essa
política. “Fomos presunçosos em relação a nossa participação no mercado
aqui. Não temos feito um bom trabalho em Chicago.”
O CEO da Coca-Cola também descobriu do jeito mais difícil que
violar as diretrizes de justiça pode ter um efeito inverso ao esperado.
Douglas Ivester, de 52 anos, parecia estar a caminho do cargo de
presidente quando abruptamente renunciou após pressão de diversos
membros do conselho, inclusive do lendário investidor Warren Buffett.
Embora diversas atitudes tenham contribuído para sua queda, um discurso
no Brasil foi o que atraiu mais atenção. Em uma coletiva de imprensa,
perguntaram ao sr. Ivester acerca de testes que a Coca-Cola estava fazendo
com máquinas automáticas de venda que podiam mudar o preço
dinamicamente. Ele respondeu: “A Coca-Cola é um produto cuja
utilidade varia de momento em momento. Em uma final de campeonato,
quando as pessoas se encontram em um estádio para se divertir, a utilidade
de uma Coca-Cola gelada é muito alta. Então é justo que ela seja mais
cara. A máquina simplesmente torna automático esse processo.” Conforme
declarou o Wall Street Journal em uma matéria sobre sua queda, o sr.
Ivester parecia ter “cera no ouvido”.6 Uma charge editorial capturava
perfeitamente os sentimentos do público geral, mostrando a imagem de
um freguês se afastando de uma máquina automática da Coca-Cola com
uma lata na mão e se deparando, ao olhar para trás, com um braço saindo
da máquina e tirando a carteira do seu bolso.
As empresas continuam a falhar em questões básicas de justiça nos
negócios. Considere o caso de Whitney Houston, a cantora pop que
morreu subitamente em 11 de fevereiro de 2012. Era de se esperar que
houvesse um pico na demanda de suas gravações, agora largamente
vendidas on-line em sites como iTunes. Como foi que a Apple e a Sony
(detentora dos direitos de gravação) reagiram à morte? Era esse um
momento propício para jogar os preços lá em cima?
Alguém (ou, possivelmente, algum algoritmo de precificação) achou
que sim. Cerca de 12 horas depois da sua morte, o preço do álbum de
Houston de 1997, The Ultimate Collection, saltou no site iTunes do Reino
Unido de £4,99 para £7,99, um aumento de 60% no preço. O preço de
Whitney – The Greatest Hits posteriormente saltou de £7.99 para £9.99,
um aumento de 25%.
O Guardian foi a primeira organização de notícias a divulgar a história.7
Inicialmente a ira do consumidor foi dirigida à Apple, porém mais tarde a
Sony foi culpada pelo aumento. Independentemente de quem foi culpada,
os fãs ficaram possessos. O Daily Mail citou um comprador: “Dizer que
estou zangado é muito pouco, pois para mim é claro que o iTunes quis
faturar em cima da morte da cantora, o que, na minha opinião, é
totalmente parasítico.”8 A raiva nessa situação pode ter sido especialmente
aguda porque, no caso dos downloads, não há como dizer que os álbuns
ficaram mais escassos. Ao contrário de pás de neve após a nevasca, o
iTunes não pode esgotar suas cópias de um álbum a ser baixado.
Essa história não é amplamente conhecida nos Estados Unidos, onde os
preços não subiram, e com certeza não pareceu afetar as vendas. Segundo
a Nielsen SoundScan, foram vendidos 101.000 álbuns de Whitney
Houston nos Estados Unidos9 durante a semana seguinte à sua morte
(haviam sido 1.700 na semana anterior) e 887.000 downloads de canções
individuais (em comparação com 15.000 na semana anterior). Não sei se
as vendas no Reino Unido foram tão fortes, porém, mesmo que tenham
sido, o aumento no preço não foi muito sensato. Como sempre, quando a
demanda subitamente aumenta, o vendedor precisa escolher entre um
ganho de curto prazo e uma possível perda de boa vontade no longo prazo,
que pode ser difícil de mensurar.
A esta altura, é razoável questionar se as empresas sempre são punidas
por agirem “de forma injusta”. É certo que o First Chicago foi massacrado
pela mídia devido à cobrança de US$3,00 para ser atendido por um caixa,
mas as linhas aéreas vêm empilhando novas tarifas sem aparente prejuízo
irreparável às empresas que lideram essa conduta ou ao setor como um
todo. Por quê? Os passageiros não ficam felizes com as novas tarifas sobre
bagagem despachada nem com os bagageiros atulhados acima de suas
cabeças, algo que se tornou a norma desde que foram instituídas essas
novas tarifas. Como em muitos outros casos, a chave aqui é o que acontece
depois que a primeira companhia acrescenta uma tarifa nova que pode ser
percebida como injusta. Se os concorrentes seguem a iniciativa desse
passo, então os clientes podem ficar irritados, mas têm pouca escolha se
precisam consumir o produto em questão. Se os outros principais bancos
da área tivessem seguido o exemplo do First Chicago e adicionado uma
tarifa de caixa, os clientes poderiam muito bem ter se acostumado com a
ideia e aceitado com relutância. Mas qualquer empresa grande que tenha
a iniciativa de tomar uma atitude que viole as diretrizes de justiça corre
consideráveis riscos se os concorrentes não a acompanharem logo em
seguida.
A lição que extraio desses exemplos é que picos temporários de
demanda, desde nevascas até morte de estrelas de rock, são um momento
especialmente ruim para uma empresa parecer gananciosa. (Não há
nenhum bom momento para parecer ganancioso.) Uma empresa
proeminente que parece estar ignorando esse conselho é a Uber, o
inovador serviço de transporte via smartphones que já penetrou em muitos
mercados ao redor do mundo. Uma das características do modelo de
negócio da Uber é que os preços podem flutuar dependendo da demanda.
A empresa se refere a essa prática como “preço dinâmico”. Quando a
demanda é alta, qualquer que seja o motivo, os preços sobem, e os
fregueses que requisitam um carro são notificados do fator de
multiplicação do preço corrente. Eles podem escolher aceitar o preço mais
alto, rejeitar e buscar transporte alternativo, ou esperar que a tarifa retorne
ao padrão. A Uber não divulga suas fórmulas de precificação, mas tem
havido informes na mídia de altas com fator multiplicador de mais de 10
vezes o preço regular. Não é surpresa que multiplicadores tão grandes
tenham provocado reclamações.
A Uber tem defendido o preço dinâmico com argumentos de que
preços mais altos agirão como incentivo para que mais motoristas
trabalhem durante os períodos de pico. É difícil avaliar essa alegação sem
examinar os dados internos sobre a resposta de oferta por parte de
motoristas, mas o argumento não parece convincente à primeira vista. Em
primeiro lugar, não se pode simplesmente decidir trabalhar como
motorista da Uber no calor do momento, e mesmo motoristas que estejam
relaxando em casa ou trabalhando em outro emprego têm capacidade
limitada de saltar para dentro do carro e sair dirigindo toda vez que uma
alta na tarifa é anunciada. Um indício dos limites para a rapidez da
resposta de oferta de motoristas é o simples fato de ter havido fatores
multiplicadores tão altos como 10. Se milhares de motoristas estivessem
prontos para entrar em seus carros quando é anunciado o início de tarifas
dinâmicas, preços dinâmicos elevados seriam raros.
Independentemente do fato de a Uber poder ou não aumentar sua
oferta de motoristas de forma instantânea, os elevados multiplicadores
cobrados durante uma tempestade de neve em Nova York atraíram a
atenção do procurador-geral do estado de Nova York.10 (Aumentar o preço
de pás de neve não é a única coisa que deixa as pessoas possessas em meio
a uma nevasca.) Acontece que Nova York tem uma dessas leis antiextorsão
às quais me referi antes. Especificamente, as empresas estão proibidas de
cobrar “preços exorbitantes inescrupulosos” durante qualquer “distúrbio
anormal do mercado”, o que pode ser qualquer coisa, desde uma
tempestade e falta de energia até desordem civil. Note que a linguagem da
lei capta algumas das emoções que as pessoas têm em relação a esse
assunto. O termo “excessivo” poderia parecer suficiente, mas a lei bane
preços excessivos inescrupulosos.
O estado de Nova York e a Uber chegaram a um acordo que, em tais
distúrbios anormais do mercado, a empresa limitaria o preço dinâmico
usando uma fórmula. Primeiro procuraria os multiplicadores mais elevados
cobrados em quatro dias diferentes durante os 60 dias que precederam o
“distúrbio anormal”. O quarto preço mais alto serviria então como teto
para o surto do preço que poderia ser cobrado no período de emergência.
Além disso, a Uber se ofereceu para doar 20% de suas rendas adicionais
durante esses períodos para a Cruz Vermelha Americana.
Penso que foi uma demonstração de mau julgamento por parte da
direção da Uber esperar até que o procurador-geral os forçasse a essa
concessão. Se queriam estabelecer boas relações de longo prazo com seus
clientes, deveriam eles mesmos ter pensado em algo desse tipo. Imagine só
se a Uber existisse em 11 de setembro de 2001, quando os aviões atingiram
o World Trade Center. Seria inteligente ter uma “alta de preço especial de
11/9” custando 20 vezes mais que a corrida comum, mandando muitos dos
carros para as proximidades de Greenwich?”11 Essa insensibilidade às
diretrizes de justiça poderia ser particularmente custosa para a Uber, já que
a companhia tem sido obrigada a travar batalhas políticas em muitas das
cidades onde entra. Por que criar inimigos para aumentar lucros alguns
dias por ano?12
Não me entenda mal. Eu adoro a Uber como serviço. Mas se fosse
consultor ou acionista deles, sugeriria que simplesmente estabelecessem
um teto para as altas, algo como três vezes a tarifa habitual. Você pode se
perguntar por que pensei em três como multiplicador. Essa é a minha vaga
impressão da gama de preços que geralmente se vê para produtos tais como
quartos de hotel ou passagens de avião, cujos preços são vinculados a oferta
e demanda. Além disso, esses serviços são vendidos integralmente nas
épocas mais populares, indicando que os proprietários estabelecem de
forma intencional os preços bem baixos durante a temporada de pico.
Certa vez perguntei ao dono de um alojamento numa estação de esqui
por que não cobrava mais durante a semana do feriado de Natal, quando a
demanda está no seu auge e os quartos precisam ser reservados com quase
um ano de antecedência. No começo, ele não entendeu a minha
pergunta. Ninguém jamais lhe perguntara por que os preços são tão baixos
nesse período, quando na realidade estão no valor máximo. Mas na hora
que expliquei que era economista, ele entendeu e respondeu depressa: “Se
você mete a faca neles no Natal, eles não voltam em março.” Este continua
sendo um bom conselho para qualquer negócio que esteja interessado em
formar uma clientela fiel.
Um empresário que compreende essa lição melhor do que a maioria é
Nick Kokonas, coproprietário, junto com o célebre chef Grant Achatz, de
dois dos melhores restaurantes de Chicago: o Alinea e o Next. O conceito
do Next é altamente original. O menu muda completamente três vezes por
ano. Os temas podem variar desde uma ceia em Paris de 1906 até comida
de rua tailandesa, passando por uma homenagem ao El Bulli, um
restaurante na Catalunha, Espanha, que foi uma meca da boa comida até
fechar em 2011. Em abril de 2011, quando o Next estava programado para
abrir, anunciaram que todas suas refeições (assim como as do Alinea)
seriam vendidas por meio de bilhetes, com os preços variando de acordo
com o dia da semana e a época do ano. Seguindo as diretrizes de justiça
usuais, os preços não variam tanto. O preço mais caro, para sábado às 20h,
é apenas cerca de 25% mais caro do que o da hora mais barata, às 21h45 da
noite de quarta-feira. Como resultado, as mesas nobres são vendidas quase
de imediato (algumas para clientes que compram bilhetes para todos os
três cardápios do ano), e se tornou típico que as únicas mesas disponíveis
são as das horas mais baratas, fora dos horários de pico.
Quando o Next abriu e a empolgação estava no auge, dois economistas
da Northwestern University tentaram explicar ao sr. Kokonas que ele estava
fazendo tudo errado e que, em vez disso, deveria ter leiloado cada reserva
de modo a maximizar seus lucros. Kokonas discordou intensamente desse
conselho, e tem uma longa postagem no seu blog explicando a razão. Eis a
sentença-chave no blog: “É incrivelmente importante para qualquer
negócio, não importa quão grande seja a demanda, não cobrar do cliente
mais do que vale o bem ou serviço — mesmo se o cliente estiver disposto a
pagar mais.”13 Ele sentia que, mesmo disposto a pagar US$2.000,00 para
comer no Next, o cliente sairia com a sensação “Ah, foi ótimo, mas não
vale US$2.000,00”. E, acima disso, Kokonas acredita que esse cliente não
voltará, e poderá dividir sua decepção com outros potenciais clientes.14
Kokonas está oferecendo agora um software de venda de bilhetes on-line
para outros restaurantes sofisticados. Será interessante ver se os
estabelecimentos que adotarem o modelo de bilhetes acompanharão sua
estratégia de “dar preço baixo” às mesas (caras) em horários de pico.
Aqueles que querem permanecer no negócio por bastante tempo são
aconselhados a fazer isso.
15

JOGOS DE JUSTIÇA

Danny, Jack e eu tínhamos uma pergunta que não saía da nossa cabeça
enquanto estávamos envolvidos no nosso projeto sobre justiça. Estariam as
pessoas dispostas a punir uma empresa que não se comporta de forma
justa? Será que um cliente de quem foram cobrados US$500,00 por uma
corrida de táxi que geralmente custa US$50,00 evita usar novamente o
serviço, mesmo que tenha gostado dele? Para investigar, concebemos um
experimento em formato de jogo.
Um jogador, o Proponente, recebe uma soma de dinheiro conhecida
como “bolo”. Ele é informado que deve oferecer a outro jogador, o
Respondente, uma porção do bolo. O Respondente pode aceitar a oferta,
deixando a quantia restante para o Proponente, ou rejeitá-la, e nenhum dos
dois jogadores ganha nada nesse caso.
Era importante que esse jogo fosse jogado com dinheiro real, então
abandonamos nosso escritório de pesquisa telefônica e fizemos o
experimento com estudantes da Universidade da Colúmbia Britânica e de
Cornell. Concebemos uma forma muito simples de jogar e extrair o
máximo possível de informação para um determinado orçamento de
pesquisa. Os jogadores eram escolhidos ao acaso para desempenhar o papel
do Proponente e do Respondente. Então preenchiam um formulário
simples para Respondentes, conforme o modelo abaixo. No nosso jogo, o
bolo era de US$10,00.

Se lhe oferecerem US$10,00, você aceitará? Sim____ Não____


Se lhe oferecerem US$9,50, você aceitará? Sim____ Não____
...
...
Se lhe oferecerem US$0,50, você aceitará? Sim____ Não____
Se não lhe oferecerem nada, você aceitará? Sim____ Não____

Estruturamos assim as perguntas porque estávamos preocupados com a


possibilidade de muitos Proponentes oferecerem a metade do valor, o que
não nos daria muita informação sobre as preferências dos Respondentes,
que eram o nosso foco principal.
Usando as premissas econômicas padrão, as quais caracterizam as
pessoas como egoístas e racionais, a teoria dos jogos tem uma previsão clara
para este jogo. O Proponente oferecerá a menor quantia positiva possível
(US$0,50 na nossa versão) e o Respondente aceitará, já que US$0,50 é
mais do que nada. Contrariando esse raciocínio, nós conjecturamos que
ofertas pequenas seriam rejeitadas como “injustas”. Essa conjectura acabou
se revelando correta: tipicamente, as ofertas que não excederam 20% do
bolo — US$2,00 no nosso jogo — foram rejeitadas.
Ficamos encantados com o resultado do nosso belo joguinho, mas logo
descobrimos que três economistas alemães,1 liderados por Werner Güth,
haviam publicado um artigo precisamente sobre esse jogo três anos antes.
Eles usaram exatamente os mesmos métodos e deram ao jogo um nome
sonoro: Jogo do Ultimato. Danny ficou abatido quando soube, sempre
preocupado que sua ideia corrente seria a sua última. (Este é o mesmo
homem que publicaria um best-seller mundial aos 77 anos.)
Jack e eu garantimos a Danny que provavelmente ainda lhe sobravam
algumas boas ideias, e todos nos esforçamos para criar outro jogo a ser
associado ao primeiro. Como pesquisa, esse jogo foi conduzido em duas
etapas. Na primeira, demos a alunos em um ambiente de sala de aula a
seguinte escolha: “Você tem a oportunidade de dividir US$20,00 entre
você mesmo e outro estudante anônimo desta classe. Há duas opções: você
pode pegar US$18,00 e dar US$2,00 a outro aluno, ou pode dividir o
dinheiro por igual, de modo que cada um receba US$10,00.” (Enquanto
faziam a escolha, os sujeitos foram informados de que apenas alguns deles
seriam selecionados aleatoriamente para serem pagos.) Como o segundo
jogador é obrigado a aceitar o que lhe for oferecido, o jogo passou a ser
conhecido como Jogo do Ditador.2
Não tínhamos uma opinião muito forte sobre qual seria o resultado do
Jogo do Ditador. Nosso interesse básico estava no segundo jogo, que vamos
chamar de Jogo da Punição, no qual fomos a outra classe e contamos aos
alunos acerca do experimento com o Jogo do Ditador. Aí demos aos alunos
uma escolha: “Você foi associado com dois alunos que jogaram [o Jogo do
Ditador], mas não foram escolhidos para serem pagos. Um deles, D,
dividiu igualmente o dinheiro, enquanto o outro, ND, não dividiu por
igual. Ficou com US$18,00 e deu US$2,00 ao seu colega. Você tem a
seguinte escolha: Você preferiria dividir igualmente US$12,00 com ND ou
US$10,00 com D?”
Outro modo de formular a escolha no Jogo da Punição é: “Você está
disposto a abrir mão de US$1,00 para dividir algum dinheiro com o aluno
que se comportou de maneira bacana com outra pessoa, em vez de dividir
com o estudante que foi ganancioso na mesma situação?” Pensávamos que
o Jogo da Punição, assim como o Jogo do Ultimato, nos diria se as pessoas
estão dispostas a abrir mão de alguma coisa para punir alguém que se
comportou de uma maneira que consideram “injusta”.
De forma um tanto surpreendente para nós (pelo menos para mim), os
alunos na etapa do Ditador do nosso jogo foram notavelmente bacanas.
Quase 3/4 (74%) optaram por dividir o dinheiro igualmente. E o mais
interessante para nós, os resultados da etapa de Punição foram ainda mais
fortes: 81% dos sujeitos escolheram dividir US$10,00 com um jogador
“justo” em vez de US$12,00 com um jogador “injusto”.
É importante ressaltar o que deve e o que não deve ser inferido dos
resultados de ambos os experimentos. Há uma evidência clara de que as
pessoas não gostam de ofertas injustas e estão dispostas a assumir uma
perda financeira para punir aqueles que as fazem. Fica menos claro que as
pessoas se sintam moralmente obrigadas a fazer ofertas justas. Embora seja
verdade que no Jogo do Ultimato a oferta mais comum seja em geral de
50%, não se pode concluir que os Proponentes estejam tentando ser justos.
Em vez disso, podem estar racionalmente preocupados com a possibilidade
de serem rejeitados. Dada evidência empírica sobre o comportamento dos
respondentes, a estratégia maximizadora de lucro no Jogo do Ultimato é o
Proponente oferecer cerca de 40% do bolo. Ofertas mais baixas correm o
risco de serem rejeitadas, então uma oferta de 50% não está longe de ser
uma estratégia racional egoísta.
Quer as ofertas feitas pelos Proponentes sejam motivadas pelo senso de
justiça ou por motivos egoístas, os resultados do Jogo do Ultimato parecem
ser bastante robustos. Proponentes fazem ofertas próximas a 50% do bolo, e
Respondentes tendem a rejeitar as de menos de 20%. O jogo tem sido
aplicado em locais ao redor do mundo inteiro e, com exceção de algumas
tribos remotas,3 os resultados foram bastante semelhantes. Contudo, uma
questão sobre a qual as pessoas vêm há muito se perguntando é se a
tendência de rejeitar ofertas pequenas no Jogo do Ultimato persiste à
medida que os valores aumentam. Uma intuição natural compartilhada
por muitos é que, à medida que os valores aumentam, a oferta mínima a
ser aceita cai como fração da torta inteira. Ou seja, se estamos jogando por
US$10,00 a oferta média minimamente aceitável é US$2,00, então
quando o valor subir para US$1.000,00, será que as pessoas aceitarão
menos de US$200,00?
A investigação dessa hipótese tem sido perturbada por dois problemas:
organizar uma versão de valor alto do Jogo do Ultimato sai caro, e a
maioria dos Proponentes faz ofertas “justas”. Pesquisadores nos Estados
Unidos organizaram uma versão do Jogo do Ultimato a US$100,00, e os
resultados não diferiram muito dos jogos com valores mais baixos.4 Ainda
mais significativa é a evidência quando se organiza o jogo em países
pobres, onde o custo de vida permite aos experimentadores elevar ainda
mais o valor. Por exemplo, Lisa Cameron fez experimentos com o Jogo do
Ultimato em Java usando tanto valores baixos quanto valores realmente
altos (aproximadamente a renda de três meses para os pesquisados). Ela
não descobriu praticamente nenhuma diferença no comportamento dos
Proponentes ao aumentar os valores.5

––––––––

Há outra classe de jogos que se ocupa em descobrir se as pessoas são tão


egoístas (pelo menos quando lidam com estranhos) quanto se presume que
sejam os Econs. São jogos sobre cooperação. O jogo clássico dessa
variedade é o conhecidíssimo Dilema do Prisioneiro. Na configuração
original, há dois prisioneiros que foram detidos por cometer algum crime e
estão sendo interrogados separadamente. Cada um tem uma escolha: pode
confessar o crime ou permanecer calado. Se ambos permanecem calados,
a polícia só pode condená-los por um delito menor, com uma sentença de
um ano. Se ambos confessam, cada um passa cinco anos na cadeia. Mas se
um confessa e o outro permanece calado, aquele que confessou sai livre
enquanto o outro cumpre 10 anos de cadeia.
Na versão mais comum desse jogo sem a história de cobertura do
prisioneiro, há duas estratégias: cooperar (ficar calado) ou trair (confessar).
A previsão teórica do jogo é que ambos os jogadores desertarão porque, não
importa o que o outro jogador fizer, essa atitude responde ao interesse
egoísta de cada jogador. Contudo, quando o jogo é jogado em laboratório,
40-50% dos participantes cooperam, o que significa que cerca da metade
dos jogadores ou não entende a lógica do jogo ou sente que cooperar é
simplesmente a coisa certa a fazer, ou possivelmente ambas as coisas.
O Dilema do Prisioneiro vem junto com uma boa história, mas a
maioria de nós não é presa com muita frequência. Quais são as
implicações desse jogo para a vida normal? Considere um jogo afim
chamado Jogo dos Bens Públicos. Para entender o significado econômico
de tal jogo, voltamo-nos outra vez para o grande Paul Samuelson, que
formalizou o conceito de bem público em um artigo de três páginas
publicado em 1954. O cara não ficava de blá-blá-blá.
Um bem público é um bem que todo mundo pode consumir sem
diminuir o consumo de outra pessoa, e é impossível excluir qualquer
pessoa desse consumo. Um exemplo clássico é um espetáculo de fogos de
artifício. Samuelson provou que uma economia de mercado terá uma
suboferta de bens públicos porque ninguém terá incentivo de pagar muito
por eles, já que podem ser consumidos de graça. Por muitos anos após o
artigo de Samuelson, os economistas presumiram que o problema dos bens
públicos não podia ser resolvido a menos que o governo entrasse na jogada
e fornecesse o bem, usando impostos para fazer todo mundo pagar um
pouquinho.
É claro que, ao olharmos ao redor, vemos o tempo todo contraexemplos
para esse resultado. Algumas pessoas fazem doações para instituições de
caridade, limpam áreas comuns e, milagrosamente, pelo menos nos
Estados Unidos, a maioria dos donos de cachorros urbanos agora carrega
um saquinho plástico para guardar os detritos quando levam o cachorro
para “passear”. (Embora haja leis que supostamente façam vigorar essa
norma, elas raramente eram cumpridas.) Em outras palavras, algumas
pessoas cooperam, mesmo quando fazê-lo não é de seu interesse.
Economistas, psicólogos e sociólogos, todos estudaram esse problema
usando variações do simples jogo a seguir. Suponha que convidemos 10
estranhos para o laboratório, dando a cada um deles cinco notas de R$1,00.
Cada sujeito pode decidir com quantas notas (se alguma) deseja contribuir
para o “bem público”, colocando reservadamente o dinheiro dentro de um
envelope em branco. As regras do jogo são que o total de contribuições
para o envelope do bem público será duplicado, e então o dinheiro será
dividido igualitariamente entre todos os jogadores.
A estratégia racional — egoísta — no Jogo dos Bens Públicos é não
contribuir com nada. Suponha que Brendan resolva contribuir com
US$1,00. Esse dólar é duplicado pelo pesquisador, alcançando US$2,00,
que são então divididos entre todos os jogadores, fazendo com que a parte
de Brendan nessa distribuição seja US$0,20. Para cada dólar de
contribuição, Brendan perde US$0,80. É claro que outros sujeitos ficam
felizes com a contribuição anônima de Brendan, já que cada um também
recebe US$0,20, mas não serão gratos a ele pessoalmente, porque sua
contribuição foi anônima. Seguindo a lógica de Samuelson, a previsão da
teoria econômica é que ninguém dará contribuição nenhuma. Repare que,
ao ser racionalmente egoísta, o grupo termina com metade do dinheiro
que teria caso todo mundo contribuísse com toda sua parcela, porque, se
todo mundo contribuísse com US$5,00, essa quantia seria duplicada e
todo mundo iria para casa com US$10,00. O distinto economista e filósofo
Amartya Sen notoriamente chamava as pessoas que nunca dão nada nesse
jogo de tolos racionais, por seguirem cegamente apenas seu próprio
interesse material: “O homem puramente econômico está de fato próximo
de ser um idiota social. A teoria econômica tem se preocupado demais
com este tolo racional.”6
Como no Dilema do Prisioneiro, a predição econômica padrão de que
ninguém cooperaria no Jogo dos Bens Públicos acabou se revelando falsa.
Em média, as pessoas contribuem com cerca da metade do seu dinheiro
para o bem público. Ainda há um problema a respeito dos bens públicos,
pois não são fornecidos em quantidade tão grande quanto as pessoas
gostariam se pudessem de algum modo fazer um acordo para serem
cooperativas, mas a suboferta tem mais ou menos a metade da gravidade
prevista pelo modelo do egoísmo racional — bem, com uma importante
reserva. Quando o jogo foi jogado por estudantes de pós-graduação em
economia, o índice de contribuição foi de apenas 20%, levando os
sociólogos Gerald Marwell e Ruth Ames a escrever um artigo intitulado “A
carona grátis dos economistas: Alguém mais?”.7
Um economista metido a engraçadinho diante da pergunta formulada
pelo título de Marwell e Ames poderia responder: “jogadores experientes”.
Um achado consistente em experimentos de bens públicos é que, se um
grupo de sujeitos joga repetidas vezes, os índices de cooperação caem de
forma constante, dos habituais 50% para quase zero. Quando esse
resultado foi inicialmente descoberto, alguns economistas argumentaram
que os altos índices de cooperação inicial se deviam a alguma confusão por
parte dos sujeitos, e que, quando jogavam o jogo repetidamente,
aprendiam que a estratégia egoísta racional era a correta. Em 1999, o
economista experimental James Andreoni testou essa interpretação com
uma reviravolta brilhante.8 Depois que grupos de cinco sujeitos jogaram as
10 rodadas do jogo anunciadas, assistindo à queda dos índices de
cooperação, os sujeitos foram informados de que jogariam outras 10
rodadas com os mesmos jogadores. O que você acha que aconteceu?
Se as pessoas aprenderam que ser egoísta é a coisa inteligente a ser feita,
então os índices de cooperação deveriam permanecer baixos após o jogo
reiniciar, mas não foi o que ocorreu. Em vez disso, na primeira rodada do
novo jogo, os índices de cooperação saltaram de volta ao mesmo nível da
primeira rodada do experimento inicial. Logo, a repetição do Jogo dos
Bens Públicos não ensina as pessoas a serem canalhas; ao contrário, ensina-
lhes que estão jogando com (alguns) canalhas, e ninguém gosta de fazer
papel de otário.
Pesquisas adicionais feitas por Ernst Fehr e seus colegas demonstraram
que, de forma consistente à descoberta de Andreoni, uma grande
proporção de pessoas pode ser classificada na categoria de cooperadores
condicionais,9 ou seja, estão dispostas a cooperar se houver bastante gente
cooperando. As pessoas começam esses jogos dispostas a darem aos seus
colegas jogadores o benefício da dúvida, contudo, se os índices de
cooperação forem baixos, esses cooperadores condicionais se transformam
em caronistas. No entanto, a cooperação pode ser mantida mesmo em
jogos repetidos se for dada aos jogadores a oportunidade de punir aqueles
que não cooperam. Conforme é ilustrado pelo Jogo da Punição, descrito
anteriormente, as pessoas estão dispostas a gastar algum dinheiro das suas
próprias economias para ensinar uma lição àqueles que se comportam
injustamente, e essa disposição de punir disciplina caronistas potenciais e
mantém robustos índices de cooperação estáveis.

––––––––

Alguns anos depois do tempo que passei com Danny em Vancouver,


escrevi um artigo sobre cooperação com o psicólogo Robyn Dawes.10 Na
conclusão, traçamos uma analogia com as barracas ao lado das estradas que
muitas vezes vemos nas áreas rurais perto de Ithaca. O agricultor punha
alguns produtos à venda sobre uma mesa na frente do seu sítio. Havia uma
caixa com uma pequena fenda para introduzir o pagamento, então era
possível colocar o dinheiro, mas não tirar. A caixa também era pregada à
mesa. Na época, eu pensava — e ainda penso — que os agricultores que
usam esse sistema têm em mente um modelo de uma natureza humana
muito boa. Há por aí gente honesta o suficiente (especialmente em uma
cidade pequena) para que valha a pena para o agricultor dispor dessa
maneira a venda de milho fresco ou de ruibarbo. Mas eles também sabem
que, se o dinheiro for deixado em uma caixa aberta onde qualquer um
possa pegar tudo, alguém acabaria pegando.
Como os agricultores, os economistas precisam adotar uma visão mais
matizada da natureza humana. Nem todo mundo pega carona o tempo
todo, mas algumas pessoas estão prontas a meter a mão no seu bolso se
você não tomar cuidado. Eu guardo uma fotografia de uma dessas barracas
de estrada no meu escritório, para inspiração.
16

CANECAS

Em algum momento durante o ano em Vancouver, o economista Alvin


Roth, que estava então profundamente envolvido com métodos
experimentais, organizou uma conferência na Universidade de Pittsburgh.
O objetivo era apresentar os primeiros esboços de artigos que
posteriormente seriam publicados em um pequeno livro chamado
Laboratory Experimentation in Economics: Six Points of View.1 Os
colaboradores eram figuras importantes na comunidade da economia
experimental, incluindo Al, Vernon Smith e Charlie Plott. Danny e eu
representávamos a nova ala comportamental na comunidade da economia
experimental.
Para Danny e para mim, a discussão mais interessante foi sobre o meu
querido efeito posse. Tanto Vernon como Charlie alegaram que não
tínhamos evidência empírica suficiente para esse fenômeno. A evidência
que apresentei baseava-se em um artigo escrito por Jack Knetsch2 junto
com um colaborador australiano, John Sinden. Seu experimento era
deliciosamente simples. Metade dos sujeitos era escolhida ao acaso para
receber US$3,00; a outra metade recebeu bilhetes de loteria. O ganhador
da loteria poderia escolher receber US$50,00 em dinheiro ou US$70,00
em vales para usar na livraria local. Após algum tempo durante o qual os
sujeitos completaram outra tarefa, cada grupo teve uma escolha. Aqueles
que não tinham recebido bilhetes de loteria foram informados de que
poderiam comprar um por US$3,00, enquanto aos outros foi dito que
poderiam vender seus bilhetes de loteria por US$3,00.
Perceba que a ambos os grupos é feita a mesma pergunta: “Você prefere
ter um bilhete de loteria ou US$3,00?” Segundo a teoria econômica, não
deveria fazer muita diferença se os sujeitos tivessem recebido
originalmente ou dinheiro ou o bilhete. Se avaliarem o bilhete em mais de
US$3,00, devem chegar ao fim com um; se avaliarem o bilhete em menos
de US$3,00, devem chegar ao fim com o dinheiro. Os resultados refutaram
claramente essa previsão. Daqueles que começaram com o bilhete de
loteria, 82% decidiram mantê-lo, ao passo que, entre aqueles que
começaram com o dinheiro, apenas 38% quiseram comprar o bilhete. Isto
significa que as pessoas têm mais propensão a manter aquilo com que
começaram, mesmo que as seleções iniciais tenham sido feitas
aleatoriamente. O resultado não poderia ser mais incisivo ou mais
evidente.
A crítica de Charlie e Vernon vinha diretamente da lista de queixas
discutida no Capítulo 6, “A Manopla”. Primeiro, achavam que os sujeitos
poderiam ter feito confusão; prefeririam um experimento no qual os
sujeitos tivessem oportunidade de aprender. Segundo, invocaram uma
versão do gesto da mão invisível para argumentar que o desvio observado
no experimento de Knetsch e Sinden desapareceria se os sujeitos
estivessem fazendo escolhas em um contexto de mercado, com
compradores e vendedores comerciando e preços flutuando. Danny e eu
retornamos a Vancouver com uma missão: planejar um experimento que
convencesse Plott e Smith de que o efeito posse era real.
Naturalmente, como Jack havia conduzido o experimento original e era
parte do nosso time que estudava justiça, nos aliamos a ele nesse novo
projeto.3 A discussão com Charlie e Vernon também nos levou a
reconhecer que o efeito posse, se verdadeiro, reduzirá o volume de
transações no mercado. Aqueles que começarem com algum objeto
tenderão a ficar com ele, enquanto aqueles que não têm tal objeto não
ficarão ansiosos por comprá-lo. Queríamos chegar com um projeto que
pudesse explorar essa predição.
A ideia básica era elaborar a partir do estudo original de Jack e
acrescentar o mercado. Para tornar o caso irrefutável, queríamos mostrar
que os resultados não eram uma consequência involuntária dos métodos
específicos que empregamos. Resolvemos usar um dos dispositivos
experimentais favoritos de Smith — metodologia do valor induzido — em
nosso próprio proveito. Como foi mencionado no Capítulo 5, Vernon
tinha usado essa metodologia em muitos dos seus experimentos pioneiros
demonstrando como os mercados podem funcionar bem. Recorde que, ao
usar esse método, sujeitos compram e vendem fichas que não valem nada
fora do laboratório. Cada um é informado do seu próprio valor pessoal para
uma ficha, um valor que é resgatável no fim do experimento se o sujeito
estiver com a ficha. Seth é informado de que, se acabar com uma ficha no
fim do experimento, pode vendê-la de volta ao experimentador por
(digamos) US$2,25, enquanto Kevin é informado de que pode conseguir
US$3,75 pela ficha. Usamos esse método porque não esperávamos que
alguém fosse afetado pelo efeito posse sobre uma ficha mais do que seria
afetado pelo efeito posse sobre uma nota específica de US$20,00.
A Figura 7 ilustra como este mercado deveria supostamente funcionar.
Suponha que tenhamos 12 sujeitos e tenhamos atribuído valores induzidos
a eles aleatoriamente, variando de US$0,25 a US$5,75. Então fazemos
uma fila, com o sujeito com maior valor induzido à esquerda e aquele com
valor induzido mais baixo à direita, como mostra o painel A. Entregamos
então seis fichas ao acaso para esses sujeitos, conforme ilustrado no painel
B. Então conduzimos um mercado pedindo aos sujeitos que respondessem
a uma série de perguntas simples. Aqueles que possuíam uma ficha
receberiam um formulário do tipo:

Ao preço de US$6,00 Eu vendo____ Eu não vendo____


Ao preço de US$5,50 Eu vendo____ Eu não vendo____

O preço mais baixo pelo qual um vendedor está disposto a abrir mão da
ficha é chamado preço de reserva. Alguém com avaliação de US$4,25
estaria disposto a vender ao preço de US$4,50 mas não a US$4,00, então
seu preço de reserva seria US$4,50. Compradores potenciais receberiam
um formulário similar perguntando sobre sua disposição de comprar uma
ficha na mesma gama de preços. O que a teoria econômica prevê que vai
acontecer? Se o mercado funcionar direito, os seis sujeitos que dão maior
valor à ficha, os que estão à esquerda, acabarão possuindo as fichas. Nesse
exemplo, isto significa que os sujeitos 7, 8 e 11 comprarão fichas dos
sujeitos 2, 5 e 6, conforme ilustrado da direita para a esquerda no painel C.
Podemos descobrir o preço que deixará esse mercado “em equilíbrio”,
ou seja, com oferta e demanda iguais, trabalhando a partir das duas
extremidades da distribuição em direção ao centro. O Sujeito 11 não terá
problema em achar um preço pelo qual o Sujeito 2 fique disposto a abrir
mão de sua ficha, então eles estarão propensos a fazer negócio. O mesmo
se aplica ao Sujeito 8 e Sujeito 5. Contudo, para fazer o Sujeito 7 comprar
uma ficha do Sujeito 6, o preço precisará estar entre seus preços de reserva.
Como só permitimos preços em incrementos de US$0,50, o preço de
equilíbrio do mercado será US$3,00.
Como tanto os valores como as fichas estão sendo atribuídos
aleatoriamente, o resultado específico vai ser diferente todas as vezes, mas,
em média, metade das fichas terá sido alocada às seis pessoas com os
maiores valores e, como neste exemplo, elas terão que comprar três fichas
para equilibrar o mercado. Em outras palavras, o volume previsto de
negócios é metade do número de fichas distribuídas.
Agora suponha que repitamos o experimento, mas desta vez o façamos
com algum bem, como uma barra de chocolate, por exemplo. Poderíamos
classificar de novo os sujeitos a partir do valor mais alto para o mais baixo
com base em quanto gostam de chocolate, mas aqui não vamos dizer aos
sujeitos quanto gostam do bem; eles próprios determinarão isto. Agora
distribuímos as barras de chocolate aleatoriamente, exatamente como no
experimento com fichas, e fazemos a mesma série de perguntas. O que
deve acontecer? A teoria gera exatamente a mesma predição. Em média,
metade das barras de chocolate vai mudar de mãos, passando daqueles que
não dão muita importância a chocolate (ou estão de dieta) para os
chocólatras que mal podem esperar para devorar uma barra dessas. Mas se
há um efeito posse, as pessoas a quem são atribuídas aleatoriamente barras
de chocolate lhes darão mais valor do que aquelas que não receberam e,
como resultado, o volume de negócios será menor. Esta é a previsão que
queríamos testar.
O primeiro experimento com essa arquitetura foi feito quando regressei
a Cornell no outono de 1985. Convoquei uma turma avançada de
graduação em análise econômica do direito para realizar o experimento.
No caso, havia 44 estudantes, então usamos 22 fichas distribuídas
aleatoriamente, e cada sujeito recebeu seu valor particular. Então, os donos
de fichas foram informados de que haveria um mercado para fichas com
um preço a ser determinado por oferta e demanda. Sua tarefa era
responder a uma série de perguntas, citando diferentes preços, por
exemplo:

Ao preço de US$6,25 Eu vendo____ Eu não vendo____


Ao preço de US$5,75 Eu vendo____ Eu não vendo____

Para compreender a tarefa, os sujeitos simplesmente tinham que


perceber que, se seu valor particular era de, digamos, US$6,50, deveriam
concordar em vender a qualquer preço superior a US$6,50 e se recusar a
vender a qualquer preço abaixo dessa quantia. O preço mais baixo pelo
qual estariam dispostos a vender é chamado “preço de reserva” do
vendedor. Os compradores também recebiam valores particulares e um
formulário semelhante para preencher, que gerava seus preços de reserva,
ou seja, o preço mais alto pelo qual estariam dispostos a comprar. Para ter
certeza de que todo mundo tinha entendido o que se passava, fizemos esse
processo três vezes.
Organizamos então os mercados bem diante da classe enquanto eles
assistiam. Para fazer isso, usam-se simplesmente as ferramentas de oferta e
demanda ensinadas em qualquer aula de introdução à economia.
Especificamente, pegamos todos os preços de reserva dos vendedores e os
ranqueamos do mais baixo para o mais alto. Depois, ranqueamos os preços
de reserva dos compradores do mais alto para o mais baixo. Se o lance mais
alto de um comprador for maior que a oferta mais baixa de um vendedor,
então temos ao menos uma venda. Se o segundo lance mais alto de um
comprador for maior que a segunda oferta mais baixa de um vendedor,
então temos duas vendas, e assim por diante, até o lance mais alto ser
inferior ao pedido mais baixo. Todos os negócios acontecem no mesmo
preço, ou seja, aquele no qual o número de fichas demandadas é igual ao
número oferecido.
Lembre-se de que ocorreriam 11 transações em nossa previsão —
combinando metade dos 22 compradores com metade dos 22 vendedores.
Nas três tentativas, o número real de transações foi 12, 11 e 10, de modo
que o mercado estava funcionando bem e os sujeitos evidentemente
entenderam o que foi pedido deles.
Estávamos agora prontos para o experimento que importava, no qual
usaríamos bens reais em vez de fichas. Nos preparativos para o
experimento, fui até a livraria do campus para ver quais produtos eu podia
comprar para usar no estudo. Queria algo que os estudantes desejassem e
que não fosse caro demais, já que precisávamos comprar 22 unidades de
cada item. Acabei optando por dois objetos: uma caneca de café com a
insígnia de Cornell e uma bela caneta esferográfica que vinha em uma
caixa. As canecas custaram US$6,00 cada, e as canetas US$3,98 cada. No
caso das canetas, a etiqueta do preço foi deixada na caixa.
Começamos dispondo as canecas em frente a alguns alunos — aluno
sim, aluno não. Os alunos que receberam as canecas eram donos e
potenciais vendedores; os outros eram potenciais compradores. Todo
mundo foi solicitado a examinar a caneca, ou a sua própria ou a do
vizinho, para garantir que todos tivessem a mesma informação sobre os
produtos. Então conduzimos exatamente o mesmo mercado que tínhamos
usado com as fichas. Para permitir aprendizagem — uma das exigências de
Plott e Smith —, dissemos que faríamos aquilo quatro vezes e que uma das
quatro seria escolhida ao acaso como válida. Assim como ocorrido com as
fichas, a teoria econômica prediz que o número de transações será cerca de
11, mas nós estávamos prevendo que ocorreriam significativamente menos
transações por causa do efeito posse.
A nossa previsão estava certa. Na sequência de quatro mercados, o
número de transações foi quatro, um, dois e dois respectivamente: nem
perto de 11. O motivo era visível. Aqueles que ganharam as canecas
estavam relutantes em vendê-las; o preço de reserva mediano para
vendedores foi de US$5,25 em cada uma das quatro rodadas. Mas aqueles
que não tinham caneca não estavam ansiosos para comprar uma; o preço
de reserva mediano para compradores foi de US$2,75 em uma rodada e
US$2,25 nas outras três.
Repetimos o experimento com as canetas. Os alunos que não
receberam caneca receberam a caneta, de modo que todo mundo teve
chance de ser comprador e vendedor. Os alunos não se empolgaram muito
com as canetas, mas os resultados foram aproximadamente os mesmos. O
número de transações variou entre quatro e cinco, e a proporção dos
preços de venda para os preços de compra foi novamente cerca de dois por
um.
Organizamos diversas versões desses experimentos para responder às
reclamações de vários críticos e pareceristas de revistas científicas, mas os
resultados sempre saíam iguais. Os compradores estavam dispostos a pagar
cerca da metade do que os vendedores pediam, mesmo com os mercados e
a aprendizagem. Mais uma vez, vemos que as perdas geram uma sensação
negativa aproximadamente duas vezes maior do que a sensação positiva
gerada pelos ganhos, uma descoberta que tem sido replicada numerosas
vezes ao longo dos anos.

––––––––

Os experimentos com o efeito posse mostram que as pessoas têm a


tendência de se apegar àquilo que possuem, pelo menos em parte por
causa da aversão à perda. Uma vez que eu tenho a caneca, penso nela
como minha. Abrir mão dela seria uma perda. E o efeito posse pode se
manifestar rapidamente. Nos nossos experimentos, os sujeitos “possuíam” a
caneca por alguns minutos antes de começarem as negociações. Danny
gostava de chamar isto de “efeito posse instantâneo”. E, ainda que a
aversão a perdas seja certamente parte da explicação para os nossos
achados, há um fenômeno relacionado: inércia. Em física, um objeto em
estado de repouso permanece nesse estado, a menos que aconteça alguma
coisa. As pessoas agem da mesma maneira: apegam-se àquilo que têm a
menos que haja uma boa razão para mudar, ou mesmo uma boa razão
para trocar. Os economistas William Samuelson e Richard Zeckhauser
apelidaram este comportamento de “viés do status quo”.4
A aversão a perdas e o viés do status quo frequentemente trabalham
juntos como forças para inibir mudança. Pense em pessoas que perdem
seu emprego porque uma fábrica ou uma mina fecha e, para conseguir
trabalho, precisariam simultaneamente assumir outra linha de trabalho e
abrir mão de seus amigos, família e casa à qual ficaram ligados. Ajudar
pessoas a voltar ao trabalho pode muitas vezes ser recebido com inércia.
Voltaremos a esse conceito mais tarde, no contexto de políticas públicas.
Por enquanto, quero apenas oferecer um exemplo divertido de viés do
status quo.
Nos anos que se passaram desde que o artigo das canecas foi publicado,
em 1990, houve dezenas, talvez centenas, de estudos que lhe deram
sequência, alguns críticos aos nossos achados, outros explorando o que os
psicólogos chamam de condições limites do fenômeno, referindo-se aos
limites de quando o fenômeno será observado e quando não será. Há uma
coisa que quase todos esses estudos têm em comum: canecas de café.
Milhares de canecas de café com insígnias têm sido compradas e
distribuídas por economistas e psicólogos, tudo porque um dia na livraria
de Cornell uma caneca de café chamou a minha atenção. Alguém que
fabrica canecas de café com insígnias de universidades me deve um jantar.

––––––––

Perto do fim do meu ano em Vancouver, Danny fez um comentário casual


que foi, como sempre, sábio. Estávamos fofocando sobre algum acadêmico
que ambos conhecíamos e Danny disse: “Sabe, em algum momento as
pessoas chegam a uma idade na qual não podem mais ser consideradas
‘promissoras’. Acredito que seja mais ou menos na época em que fazem 40
anos.” Tenho certeza de que Danny não sabia minha idade exata, mas eu
estava com 39. Quando as aulas recomeçassem e eu voltasse a Cornell,
teria 40 anos. Droga. Eu meio que tinha gostado de ser “promissor”.
V
INTERAÇÕES COM ECONOMISTAS
1986 – 94
Na época em que retornei a Cornell após meu ano em Vancouver, estava
trabalhando em tempo integral na minha arriscada empreitada de oito
anos em economia. E, devido a essa empreitada — ou apesar dela,
dependendo de a quem você perguntar —, tinha conseguido estabilidade
em Cornell e estava com diversos artigos no forno para serem publicados
nas melhores revistas científicas. O projeto que um dia me parecera uma
grande tolice estava mais interessante que nunca e me ajudava a manter
um teto para a minha família. O grande problema era que, à parte o nosso
envolvimento com a comunidade de economia experimental, Amos,
Danny e eu basicamente conversávamos só entre nós. Essa situação estava
prestes a mudar.
17

COMEÇA O DEBATE

A economia comportamental teve sua primeira audiência pública


importante logo depois que retornei de Vancouver para Cornell. Em
outubro de 1985, dois professores da escola de pós-graduação em negócios
da Universidade de Chicago — Robin Hogarth, psicólogo, e Mel Reder,
economista — organizaram uma conferência1 na instituição, lar de muitos
defensores veementes da abordagem tradicional da economia.
Racionalistas e comportamentalistas deveriam se juntar e tentar decidir se
realmente havia alguma razão para levar a psicologia e a economia
comportamental a sério. Se alguém estivesse apostando sobre quem
venceria o debate, o time da casa teria sido considerado franco favorito.
O time comportamental era liderado por Herb Simon, Amos e Danny e
apoiado por Kenneth Arrow, um teórico de economia que, como Paul
Samuelson, merecia ganhar vários Prêmios Nobel de economia, mas teve
que se contentar com apenas um. À turma comportamental mais jovem,
que incluía Bob Shiller, Richard Zeckhauser e eu, foram dados papéis de
oradores nos debates.
O time dos racionalistas era formidável, com o pessoal local servindo de
capitães: Robert Lucas e Merton Miller. Eugene Fama e meu orientador
de tese, Sherwin Rosen, receberam os papéis de moderadores nos painéis,
mas claramente faziam parte do lado racionalista com base em Chicago. O
encontro de dois dias teve lugar em um grande auditório, e todos os lugares
foram ocupados. Ao pensar nisso hoje, essa conferência foi um evento
altamente inusitado. Não creio que tenha havido algum outro parecido.
Amos apresentou um novo artigo que Danny e ele tinham escrito para a
ocasião. O texto expunha algumas violações de princípios econômicos que
os economistas achavam especialmente desconcertantes. Um deles era o
hoje famoso problema da doença asiática, que é o seguinte:

Dois grupos de sujeitos são informados de que 600 pessoas estão


sofrendo de uma doença asiática, e precisa-se fazer uma escolha
entre dois planos de ação. As opções oferecidas para o primeiro grupo
são:
O plano de ação A salvará com certeza 200 pessoas.
O plano de ação B oferece 1/3 de chance de salvar todo mundo,
mas 2/3 de chance de que todas as 600 pessoas morram.
Quando apresentada esta escolha, a maioria das pessoas adota a
opção A.

Na versão alternativa, os sujeitos mais uma vez têm duas opções:


Com a opção C, 400 pessoas morrerão com certeza.
Se escolherem a opção D, há 1/3 de chance de não matar
ninguém e 2/3 de chance de matar todo mundo.
Neste caso, a maioria preferiu a arriscada opção D.

À primeira vista, não há nada de extraordinário em relação a essas opções,


mas um pouco de matemática revela que o plano A é o mesmo que o C, e
que o plano B é o mesmo que o D, então não é lógico que os respondentes
prefiram A em lugar de B, mas D em lugar de C. No entanto, foi o que
aconteceu, e os mesmos resultados foram obtidos com um problema
semelhante apresentado a um grupo de médicos. Resultados como este
claramente levavam desconforto para o campo racional. Econs, com toda
certeza, não seriam tão desviantes.
Danny então apresentou parte do nosso trabalho sobre justiça,
incluindo nossos experimentos com os jogos do Ultimato e do Ditador.
Esses achados não angariaram mais simpatia do público. Os economistas
achavam que justiça era um conceito tolo, usado principalmente por
crianças que não conseguem as coisas do jeito que querem, e os céticos
simplesmente deixaram de lado os dados do nosso levantamento. Os
experimentos com o Jogo do Ultimato foram um pouco mais
problemáticos, uma vez que havia dinheiro real envolvido, mas é claro
que, como não eram quantias tão grandes, podiam ser levantadas todas as
desculpas costumeiras.
A palestra que mais me deu o que pensar, e aquela que tenho voltado a
ler com mais frequência, foi a de Kenneth Arrow. A mente de Arrow
funciona na velocidade da luz, e suas palestras tendem a ser como fugas
musicais com múltiplas camadas, com digressões inseridas em digressões,
às vezes acompanhadas por notas de rodapé verbais com referência a
eruditos obscuros de séculos anteriores, seguidas de um salto repentino
dois ou três degraus acima no esboço que ele tem na cabeça. Enquanto
você está trabalhando para assimilar uma pérola disfarçada de comentário
casual, ele já saltou de volta para o argumento principal, e você fica se
debatendo para conseguir acompanhar. Nessa ocasião, porém, sua palestra
pode ser facilmente resumida: racionalidade (representando otimização)
não é necessária nem suficiente para uma boa teoria econômica.
Arrow começou atacando a ideia de que a racionalidade é necessária:
“Deixem-me declinar um ponto de vista que talvez nem sempre seja
articulado, mas parece implícito em muitos escritos. Parece ser afirmado
que a teoria econômica precisa ser baseada na racionalidade, como
questão de princípio. De outra forma não pode haver teoria.”2 Arrow
observou que podia haver muitas teorias formais baseadas em
comportamento, as quais os economistas não estariam dispostos a chamar
de racionais. Como exemplo, observou que a teoria padrão do consumidor
afirma que, quando os preços mudam, o consumidor resolve o novo
problema de otimização e escolhe um conjunto “melhor” de bens e
serviços que ainda satisfaça as restrições orçamentárias. Todavia, observou
ele, seria possível construir com facilidade uma teoria baseada em hábitos.
Quando os preços mudam, o consumidor escolhe o pacote acessível ao seu
orçamento que seja mais similar ao que ele estava consumindo antes.3
Arrow poderia até ter ido além. Por exemplo, poderíamos ter teorias
rigorosas tão bizarras quanto “escolher o pacote com marcas para
maximizar as ocorrências da letra K”. Em outras palavras, modelos formais
não precisam ser racionais; não precisam sequer ser razoáveis. Então não
se deve defender a premissa da racionalidade com o argumento de que não
existem alternativas.
Sobre a questão de a racionalidade sozinha ser “suficiente” — que ela
em si pode fornecer previsões importantes —, Arrow argumentou
convincentemente que a racionalidade sozinha não traz muita coisa. Para
obter resultados úteis, os teóricos precisam adicionar premissas auxiliares,
tais como presumir que todo mundo tem a mesma função utilidade, ou
seja, os mesmos gostos. Tal premissa, cuja falsidade pode ser demonstrada,
leva imediatamente a todo tipo de previsões inconsistentes com os fatos.
Nós não somos Econs e, com toda certeza, não somos Econs idênticos.
Arrow também observou uma inconsistência inerente no
comportamento do teórico de economia que labuta durante meses para
desenvolver a solução ótima para algum complexo problema econômico e
então presume alegremente que os agentes em seu modelo sejam capazes
de solucionar o mesmo problema. “Observamos a curiosa situação em que
a análise científica imputa comportamento científico aos seus sujeitos.”4
No fim da palestra, Arrow declarou sua lealdade: “Obviamente estou
aceitando a percepção de Herbert Simon sobre a importância de
reconhecer que a racionalidade é limitada.”5
Quanto a meu papel, não fiquei apenas escutando os acadêmicos que
eu admirava; recebi a intimidadora tarefa de agir como debatedor para um
conjunto de três artigos de autoria respectivamente de Herbert Simon,
Danny Kahneman com Amos Tversky, e Hillel Einhorn com Robin
Hogarth (o organizador da conferência). Nessa situação, eu concordava em
grande parte com o que os autores diziam, então não tinha certeza do que
fazer. Espera-se que os debatedores critiquem e elaborem. Não me serviria
muito bem apenas dizer: “É, é isso mesmo.” Os artigos que, sob meu ponto
de vista, tinham problemas reais nos conceitos foram agendados para
palestras que ainda estavam por vir. Eu também precisava ter em mente
que estava na “mesa das crianças”; havia dois laureados com o Prêmio
Nobel no programa (Arrow e Simon), vários outros na plateia e mais meia
dúzia de futuros ganhadores de prêmios. Como eu podia apresentar meus
pontos para um pessoal tão graúdo sem parecer presunçoso?
Acabei decidindo que a melhor estratégia seria empregar algum humor.
Era arriscado, mas descobri que pessoas que estão rindo tendem a ser mais
complacentes. Baseei minha palestra em um ensaio obscuro de George
Stigler, um dos economistas mais espirituosos da sua geração. E, como
membro do corpo docente de Chicago, ele estava sentado no setor da
torcida racionalista da audiência. O ensaio de Stigler se intitulava “Manual
da conferência” e, por sua vez, baseava-se numa antiga piada:

Um novo prisioneiro chega a uma prisão onde todo mundo já está


trancafiado há um longo tempo. Ele nota que ocasionalmente
alguém grita um número, e todos os outros caem na risada. Ao
perguntar a seu companheiro de cela o que está acontecendo, é
informado de que eles estão juntos na cadeia há tanto tempo que já
ouviram todas as piadas que se conhece, então, para economizar
tempo, as numeraram. Depois de ouvir mais alguns números
seguidos por explosões de gargalhadas, ele decide tentar uma piada e
berra “Trinta e nove!” Ninguém ri. Ele pergunta ao companheiro de
cela por que ninguém riu, e ele responde: “Bem, tem gente que
simplesmente não sabe contar piada.”6

O ensaio de Stigler propunha a aplicação do sistema de numeração de


piadas a conferências e seminários departamentais, nos quais são feitos os
mesmos comentários cansativos repetidas vezes. Stigler oferecia diversas
observações introdutórias, indicadas por letras, seguidas de 32 comentários
específicos, cada qual com um número de referência. Citei seu
comentário introdutório F, imaginando que poderíamos ouvir uma versão
dele em breve: “É bom ter um não especialista examinando nosso
problema. Existe sempre a chance de uma perspectiva nova, embora
geralmente, como neste caso, as vantagens da divisão do trabalho sejam
reafirmadas.”7
Foi com esse espírito que ofereci o que chamei de “Psychology and
Economics Conference Handbook” [“Manual da conferência de
psicologia e economia”]. Minha ideia era listar os comentários cansativos
que eu ouvia toda vez que dava uma palestra, aqueles descritos no
Capítulo 6, “A Manopla”, junto com sugestões de réplicas. Esperava que
anunciá-los antecipadamente poderia inibir a manifestação futura de
alguns participantes. A esta altura você já pode adivinhar alguns dos
comentários: 1) “Se os valores forem altos o suficiente, as pessoas farão a
coisa certa”; 2) “No mundo real, as pessoas aprenderão e evitarão esses
erros”; 3) “Na soma final, os erros vão se cancelar”, e assim por diante. Para
cada um, eu explicava por que o comentário não era tão devastador quanto
a pessoa que o fazia poderia ter imaginado.
Então concluí:

Encerrarei minhas observações com as seguintes afirmações falsas:


1. Modelos racionais são inúteis.
2. Todo comportamento é racional.
Forneci essas afirmações falsas porque ambos os lados do debate
que ocorrerá nesta conferência e em conferências semelhantes no
futuro têm a tendência de deturpar os pontos de vista do outro lado.
Se todos concordassem que essas afirmações são falsas, então
ninguém precisaria perder tempo as repudiando.8

As pessoas pareceram gostar da discussão. Cheguei até a receber de Stigler


um gesto de aprovação com o polegar quando estava descendo da tribuna.
O resto do primeiro dia da conferência foi razoavelmente calmo.
A manhã do seguinte começou com o anúncio de que Franco
Modigliani ganhara o Prêmio Nobel de economia, em parte pelo trabalho
que fizera em conjunto com Merton Miller, um dos principais palestrantes
programados para o segundo dia. Modigliani na época estava no MIT, mas
antes fora colega de Herb Simon em Carnegie Mellon, e, por iniciativa de
Simon, a conferência mandou para Modigliani um telegrama de parabéns.
Naquela manhã, Miller não podia ser culpado se estivesse pensando que a
boa notícia para seu mentor e colaborador era uma má notícia para ele.
Modigliani ganhou o prêmio sozinho, e Miller talvez sentisse que sua
chance lhe escapara. Porém ele acabou ganhando um Prêmio Nobel cinco
anos depois, algo impossível de prever. E tampouco sabia naquela manhã,
nessa era pré-internet, que o prêmio fora concedido ao trabalho de
Modigliani com poupança e consumo — a hipótese do ciclo de vida —, e
não pelo seu trabalho com Miller no campo de finanças corporativas.
Nas celebrações matinais em torno da notícia, Miller falou brevemente
sobre a pesquisa de Modigliani. A imprensa lhe pedira para resumir o
trabalho que tinha feito com Modigliani e, com seu humor afiado
habitual, ele disse que ambos haviam demonstrado que, se você mover
uma nota de US$10,00 de um bolso para o outro, a sua riqueza não se
altera. Esse gracejo provocou grandes risadas, ao que Miller replicou: “Não
riam. Nós provamos isso com todo o rigor!”9
A piada se referia ao chamado “teorema da irrelevância”, que provava
que, sob certas premissas, não tinha importância se uma empresa optasse
por pagar um dividendo ou, em vez disso, usasse esse dinheiro para
recomprar suas próprias ações ou reduzir suas dívidas. A ideia é que
investidores não deveriam se preocupar com o local onde o dinheiro é
armazenado ou como é desembolsado. A piada, no entanto, também se
aplicava à hipótese do ciclo de vida, pois o único determinante do
consumo de um lar nessa teoria é sua riqueza, não a maneira como essa
riqueza é mantida, digamos em dinheiro vivo ou economias para
aposentadoria. Ambas as teorias presumem que o dinheiro é fungível. Já
vimos que, no caso da hipótese do ciclo de vida, essa premissa está errada.
Acontece que, deixando as piadas de lado, a premissa era igualmente
questionável em finanças corporativas, que era o tópico da palestra de
Miller naquela tarde.
O artigo de Miller havia sido incitado por uma publicação sobre
finanças corporativas10 escrita por Hersh Shefrin, meu colaborador no
trabalho sobre autocontrole, e Meir Statman, um colega de Shefrin na
Universidade de Santa Clara. Mais especificamente, eles estavam
fornecendo uma explicação comportamental para um fato constrangedor.
Uma das premissas-chave no teorema da irrelevância de Miller-Modigliani
era a ausência de impostos. Pagar dividendos deixaria de ser irrelevante se
eles fossem tributados de forma distinta daquelas que as empresas usam
para devolver dinheiro aos acionistas. E, dado o código tributário nos
Estados Unidos na época, as empresas não deveriam estar pagando
dividendos. O fato constrangedor era que a maioria das grandes empresas
pagava, sim, dividendos.11
Os impostos entravam em cena quando a renda, inclusive renda de
dividendos, era então tributada com taxas elevadas, de 50% ou mais,
enquanto ganhos de capital sofriam tributação por volta de 25%. Além
disso, nesse último caso o imposto só era pago quando o ganho de capital
era realizado, ou seja, quando as ações eram vendidas. O efeito dessas
regras de tributação era a preferência dos acionistas por ganhos de capital
em vez de dividendos — caso os acionistas fossem Econs. Também é
importante ressaltar que a empresa podia facilmente transformar um
dividendo em ganho de capital usando os fundos que seriam destinados a
pagar dividendos para recomprar ações da empresa. Em vez de receber um
dividendo, os acionistas veriam o preço de suas ações subir e
economizariam dinheiro no pagamento de imposto. Eis o quebra-cabeça:
por que as empresas puniam seus acionistas com dividendos, que seriam
taxados? (Aqueles que não pagam imposto, tais como doações, ou aqueles
que poupam em contas não tributáveis seriam indiferentes entre as duas
políticas.)
A resposta de Shefrin e Statman se baseava em uma combinação de
autocontrole e contabilidade mental. A noção era que alguns acionistas —
aposentados, por exemplo — apreciavam os influxos, pois são mentalmente
classificados como “renda”, e assim não se sentiriam mal gastando o
dinheiro que usam para viver. Em um mundo racional, isto não faz
sentido. Um Econ aposentado poderia comprar ações em companhias que
não pagam dividendos, vender periodicamente uma porção de seu
portfólio de ações e viver desses rendimentos taxados com menos impostos.
Mas há uma antiga e duradoura ideia de que é prudente gastar o
rendimento e não mexer no principal, e tal noção predominou de forma
peculiar na geração de aposentados por volta de 1985, todos eles tendo
vivido a Grande Depressão.12
É justo dizer que Merton Miller não era fã do artigo de Shefrin e
Statman. Na sua palestra, ele não disfarçou esse desdém, dizendo que a
abordagem comportamental poderia ter sido aplicada à sua tia Minnie e
algumas outras como ela, mas não foi além disso.
A versão escrita do artigo de Miller era menos estridente do que sua
apresentação, mas bem estranha mesmo assim. A maior parte do artigo era
dedicada a um tutorial lúcido sobre o quebra-cabeça que Shefrin e
Statman tentavam explicar, em vez de uma crítica à hipótese deles. Na
verdade, não conheço explicação mais clara para o motivo, numa terra de
Econs, que levaria empresas a não pagar dividendos sob o regime de
tributação então vigente. Miller concordava que as empresas não deviam
pagar dividendos, mas a maioria pagava. E também concordava que o
modelo que melhor descrevia como as empresas decidiam quanto pagar
em dividendos era aquele proposto pelo economista financeiro John
Lintner, um modelo que Miller rotulou de “comportamental”. No modelo
de Lintner,13 as empresas só aumentam dividendos quando têm confiança
de que os ganhos subiram o suficiente para que tais dividendos não
tenham que ser cortados no futuro. (Se o modelo tivesse sido escrito mais
tarde, Lintner poderia ter usado a aversão a perdas para explicar por que as
firmas relutam em cortar dividendos.) Lintner havia chegado a esse
modelo depois de usar a antiquada estratégia de entrevistar os principais
encarregados financeiros de muitas grandes companhias. Acerca desse
modelo, Miller disse: “Admito que seja um modelo comportamental, não
só pela sua forma, mas porque ninguém até agora foi capaz de derivá-lo
como solução para um problema de maximização, apesar de 30 anos de
tentativas!”14
Então, façamos um resumo do artigo de Miller. A teoria nos diz que
empresas não deveriam pagar dividendos. No entanto, elas pagam. E um
modelo comportamental é reconhecidamente o que melhor descreve o padrão
pelo qual elas pagam os dividendos. Isto soa como um elogio às finanças
comportamentais, e não um artigo para refutá-la. Mas Miller não estava
pronto para elogiar nem para reconhecer. Escreveu: “O propósito deste
artigo tem sido mostrar que os modelos de equilíbrio de mercado com base
na racionalidade, aplicados a finanças em geral e dividendos em particular,
estão vivos e bem — ou, pelo menos, não estão em estado pior que outros
modelos comparáveis em economia no seu nível de agregação.”15 Assim, a
declaração mais forte que Miller conseguiu invocar foi dizer que o modelo
padrão racional de mercados financeiros — a hipótese do mercado
eficiente, à qual nos voltaremos na próxima seção, sobre finança — ainda
não estava morto.
Miller não só reconheceu que o melhor modelo de como as empresas
pagam dividendos é comportamental, como também ficou contente em
fazer o mesmo acerca de como investidores individuais se comportam.
Disse: “Por trás de cada holding pode haver uma história de negócios
familiares, brigas familiares, heranças recebidas, acordos de divórcio e uma
gama de outras considerações quase totalmente irrelevantes para a nossa
teoria de escolha de portfólio. O motivo pelo qual nos furtamos de todas
essas histórias ao construir nossos modelos não é porque as histórias não
sejam interessantes, mas porque podem ser interessantes demais e,
portanto, nos distrair das forças de mercado onipresentes que deveriam ser
a nossa principal preocupação.”16 Dedique um momento para absorver
isto: devemos ignorar as razões pelas quais as pessoas fazem as coisas, não
porque não sejam interessantes, mas porque são interessantes demais. De
minha parte, tive dificuldade de perceber de que lado Miller estava
argumentando.
A palestra dele entrou na sessão da tarde do último dia, presidida por
Eugene Fama, outro membro do corpo docente de Chicago e forte
defensor da visão racional. O outro orador durante essa sessão foi Allan
Kleidon, que, como Miller, não parecia estar apresentando uma nova
pesquisa própria, mas sim atacando um artigo de Robert Shiller que
discutiremos em detalhe no Capítulo 24. A Shiller foi dado o papel de
debatedor, junto com dois eficientes defensores do mercado, Richard Roll
e Steve Ross. Shefrin e Statman só puderam resmungar da plateia. Durante
essa parte do programa as cartas estavam claramente marcadas; vantagem
para o time da casa.
A Shiller foi imposto o inusitado papel de discutir um artigo que
criticava seu próprio trabalho sem ter a chance de apresentar qualquer
explicação sobre sua pesquisa original. Ainda assim, seus comentários
foram, como é seu costume, calmos e ponderados. Ele observou que tanto
Miller como Kleidon haviam se referido ao modelo das revoluções
científicas de Thomas Kuhn, no qual paradigmas mudam apenas depois
que um número significativo de anomalias empíricas é aceito como
violação válida do paradigma prévio. Os artigos de Kleidon e Miller
redundavam em uma declaração de que a revolução, felizmente, ainda
não tinha nos atingido. Eis o começo da resposta de Shiller: “Talvez algo
dramático como uma revolução científica esteja sendo reservado para nós.
Isso não significa, porém, que a revolução levaria ao ‘abandono de
premissas das expectativas racionais em favor da psicologia de massa’.” Pelo
contrário, explicou ele: “Tenho a tendência de enxergar o estudo das
extensões comportamentais desses modelos de mercado eficiente como
conduzindo, em certo sentido, ao aprimoramento desses mesmos modelos.
Eu poderia ensinar os eficientes modelos de mercado aos meus alunos
com muito mais prazer se pudesse descrevê-los como casos especiais
extremos antes de passar para modelos mais realistas.”17 Um comentário
pertinente e válido até hoje.
Como de hábito após esses encontros, ou após debates entre candidatos
na política, os dois lados estavam confiantes de terem vencido. O debate
entre pesquisadores de finança comportamental e defensores da hipótese
do mercado eficiente estava apenas começando, e tem continuado durante
os últimos 30 anos. Mas, de certa forma, tudo começou naquela tarde em
Chicago. Veremos aonde o debate nos levou na próxima seção do livro.
18

ANOMALIAS

Um aspecto importante em Thomas Kuhn e seu modelo de revoluções


científicas, que veio à tona no fim da conferência de Chicago, é que
paradigmas só mudam depois que especialistas passam a acreditar na
existência de um grande número de anomalias não explicadas pelo
paradigma corrente. Alguns fatos dispersos e sem explicação não são
suficientes para pôr fim à sabedoria convencional. Mesmo antes daquela
conferência, já haviam passado pela minha cabeça as conexões entre as
ideias de Kuhn e o meu trabalho. Era um tópico no qual eu havia pensado,
mas sem revelar a ninguém. Por eu ser alguém cuja carreira estivera na
fase “promissora” havia pouco tempo, seria encarado como impertinente,
inconveniente e autodestrutivo falar do meu próprio trabalho como algo
que podia ser parte de uma “revolução”. Meu objetivo era muito mais
modesto: simplesmente conseguir publicar mais alguns artigos e começar a
estabelecer a prerrogativa de que adicionar um pouco de psicologia à
economia era uma atividade que valia a pena. Mas, com toda certeza, eu
havia lido o desbravador livro de Kuhn, A estrutura das revoluções
científicas¸1 e secretamente passara momentos ociosos me perguntando se
algo como uma mudança de paradigma podia chegar a ser possível em
economia.
Uma mudança de paradigma é um dos raros eventos cataclísmicos na
ciência, no qual as pessoas fazem uma ruptura substancial com a maneira
como o campo vinha progredindo e partem para uma nova direção. A
revolução de Copérnico, que colocou o Sol no centro do sistema solar,
talvez seja o exemplo mais famoso. Ele substituiu o modelo ptolomaico, no
qual todos os objetos no nosso sistema solar giravam em torno da Terra.
Considerando que os planetas não giram em torno da Terra, agora parece
estranho pensar que alguém tivesse conseguido fazer o modelo geocêntrico
funcionar. Porém, mesmo com o sistema geocêntrico, astrônomos
conseguiram durante séculos fazer um bom trabalho ao explicar os
movimentos dos planetas, apesar de numerosas modificações ad hoc do
modelo básico, que foram chamadas epiciclos: minicírculos em torno de
uma trajetória circular principal ao longo da qual se acreditava que os
planetas circundassem a Terra.
Na conferência de Chicago, os oradores que defendiam o status quo
geralmente mencionavam com evidente horror a ideia de uma mudança
de paradigma, com comentários cuja essência não deixava transparecer
nenhum vestígio de que estivéssemos parados à beira de uma revolução. É
claro que a repetição de tal mensagem era suficiente para instigar a
preocupação entre os tradicionalistas. Como defesa, geralmente separavam
algum resultado dado e explicavam por que ele não era tão grave quanto
aparentava ser. Se necessário, defensores do paradigma tradicional sempre
podiam encontrar uma versão econômica de um epiciclo com o qual
racionalizar um fato que, de outra maneira, seria embaraçoso. E cada
anomalia sozinha podia ser desprezada como um enigma isolado, para o
qual seguramente existia uma explicação satisfatória caso fosse procurada
com muito afinco. Para criar uma verdadeira mudança de paradigma, senti
que teríamos que exigir toda uma série de anomalias, cada uma
requerendo sua própria explicação ad hoc. Precisamente no lugar certo e
na hora certa, uma oportunidade de compilar e documentar tal lista de
anomalias caiu no meu colo, e eu tive o bom senso de aproveitar a chance.

––––––––

Algum tempo depois de deixar Vancouver e voltar a Ithaca, eu estava em


uma conferência sentado perto do economista Hal Varian, um conhecido
teórico que mais tarde veio a se tornar o economista-chefe do Google. Hal
estava me contando sobre uma nova publicação científica que a American
Economic Association (AEA) estava lançando, chamada Journal of
Economic Perspectives. Hal era consultor editorial da revista. A direção
editorial estava pensando em encomendar colunas regulares à revista. O
perspicaz Barry Nalebuff escreveria sobre charadas e quebra-cabeças com
base econômica. Hal e eu viemos com uma ideia para uma coluna sobre
anomalias que eu escreveria. O editor da revista, Joseph Stiglitz, que adora
ver o circo pegar fogo, foi facilmente convencido, e o conceito foi
aprovado. Quatro vezes por ano eu tinha uma plataforma para escrever
sobre anomalias. Estas podiam servir de documentação de que fatores
supostamente irrelevantes tinham importância, ou qualquer outro
conjunto de fatores que fossem inconsistentes com a maneira padrão de se
fazer teoria econômica.
Citei Thomas Kuhn na inauguração da série de textos, que apareceu no
primeiro número da revista, publicado em 1987.
“A descoberta começa com a consciência da anomalia, isto é, com o
reconhecimento de que a natureza, de alguma forma, violou as expectativas
induzidas pelo paradigma que governa a ciência normal.”
– Thomas Kuhn

POR QUE UMA COLUNA SOBRE ANOMALIAS?


Considere o seguinte problema. Na mesa à sua frente estão dispostas
quatro cartas, exibidas da seguinte maneira:

Sua tarefa é virar o mínimo possível de cartas para verificar se a


seguinte afirmação é verdadeira: Toda carta com uma vogal de um
lado tem um número par do outro lado. Você deve decidir de
antemão que cartas vai examinar. Tente você mesmo antes de seguir
lendo.
Quando apresento esse problema em aula, a classificação das
cartas em termos da mais virada para a menos virada é A, 2, 3, B. Não
é surpresa que quase todo mundo decida corretamente virar o A. Claro,
se a carta não tiver um número par do outro lado, a afirmação é falsa.
No entanto, a segunda escolha mais popular (o 2) é inútil. A
existência de uma vogal do outro lado de fato gera uma observação
consistente com a hipótese, mas virar a carta jamais provará que a
afirmação está correta e tampouco a refutará.
Em vez disso, para refutar a afirmação, o 3 deve ser virado, uma
escolha bem menos comum. Quanto à alternativa menos popular, o B,
essa carta também precisa ser virada, já que uma vogal pode estar à
espreita do outro lado. (O problema, conforme enunciado aqui, não
especifica que números estão sempre de um lado e letras do outro —
embora muitos participantes acolham tal premissa.) Duas lições
emergem desse problema (baseado em Wason, 1968). Primeira: as
pessoas têm uma tendência natural de buscar confirmar em vez de
refutar evidência, como mostra a relativa popularidade do 2 em
relação ao 3. Tal tendência é chamada viés da confirmação. Segunda:
o viés da confirmação pode ser acentuado quando premissas
infundadas fazem com que algum tipo de evidência de refutação
pareça improvável, como é ilustrado pela impopularidade de se virar o
B.
Esta coluna veiculará tentativas bem-sucedidas de refutação de
evidências — anomalias econômicas. Conforme sugerido por Thomas
Kuhn, uma anomalia econômica é um resultado inconsistente com o
paradigma econômico vigente. A economia se distingue de outras
ciências sociais pela crença de que a maior parte (todos?) dos
comportamentos pode ser explicada ao presumir que os agentes têm
preferências estáveis, bem-definidas, e que fazem escolhas racionais
consistentes com essas preferências em mercados que (eventualmente)
acabam se equilibrando. Um resultado empírico é anômalo se for
difícil de “racionalizar”, ou se forem necessárias premissas implausíveis
para explicá-lo dentro do paradigma. É claro que “difícil” e
“implausíveis” são opiniões, e outros poderiam discordar da minha
avaliação. Portanto, convido os leitores a submeter breves explicações
(dentro do paradigma ou não) para qualquer uma das anomalias que
reporto. Para serem consideradas para publicação, porém, as
explicações propostas devem ser verificáveis, pelo menos em princípio.
Um leitor que afirme que uma suposta anomalia é na verdade a
resposta racional a impostos deve estar preparado para fazer alguma
predição com base nessa hipótese; por exemplo, a anomalia não será
observada em um país sem impostos, ou para agentes não tributados,
ou em períodos de tempo anteriores à existência do imposto relevante.
Alguém que ofereça uma explicação baseada em custos de transação
poderia sugerir um teste experimental no qual os custos de transação
fossem eliminados, e deve estar disposto a predizer que o efeito
desaparecerá nesse ambiente.

Escrevi uma coluna para cada nova edição, ou seja, trimestralmente,


por quase quatro anos. Os artigos ocupavam entre 10 e 12 páginas
publicadas, curtos o suficiente para uma leitura rápida, mas longos o
bastante para dar uma bela quantidade de detalhes. Cada artigo terminava
com uma seção “Comentário”, na qual eu tentava explicar a importância
das descobertas.
Não posso dizer que tivesse um plano grandioso quando comecei a
escrever essas colunas. Fiz uma lista de tópicos e, mesmo sem contar, já
sabia que podia escrever pelo menos 10, então a questão era o que escrever
primeiro e como dar o tom certo. Tendo redigido à época dois artigos
sobre o que deixa as pessoas zangadas, eu tinha plena consciência de que a
empreitada podia sair pela culatra. E também consumia um tempo
incrível. Muitos dos tópicos estavam longe do meu campo de
especialização, então para esses casos recrutei um coautor com autoridade
no assunto. Mesmo assim, ainda precisava estudar muito os novos tópicos,
pois eu acabava fazendo a redação da versão final da maioria deles. Por isso
essas colunas acabavam tirando o meu tempo do que a maioria dos
acadêmicos considera como “pesquisa real”, ou seja, descobrir fatos novos,
desenvolver novas teorias e publicar artigos em revistas científicas
arbitradas por pares.2
O potencial de retorno, porém, era enorme. Em certo momento, a AEA
conduziu um levantamento de seus membros para ver o que achavam da
nova publicação. Perguntaram aos membros se liam a revista e,
especificamente, se liam as colunas. Metade dos membros da AEA que
responderam à pesquisa reportou que lia a coluna “Anomalias” com
“regularidade”, seja lá o que isso queira dizer. Para dar um pouco de
perspectiva, se um artigo comum de uma revista acadêmica especializada
encontrar 100 leitores, pode ser classificado como afortunado. Os artigos
sobre anomalias chegavam a mais de 5.000 economistas. Ao recrutar
coautores, eu podia lhes dizer com sinceridade que o artigo teria um
público maior do que qualquer outro que escrevessem na vida. E o mesmo
valia para mim, é claro. Eu tinha olhos para enxergar. O que devia colocar
diante deles?
Minha meta era cobrir um amplo espectro de anomalias e descobrir
exemplos que se apoiassem em uma larga variedade de métodos empíricos,
inclusive muitos que usavam dados de mercado, para ajudar a acabar com
o mito de que anomalias só ocorrem no laboratório. Das 14 colunas que
escrevi naqueles primeiros quatro anos, apenas cinco se baseavam em
dados de experimentos. As outras provinham de um amplo espectro,
embora muitas estivessem relacionadas a finanças pelo simples motivo de
que essas eram as mais surpreendentes e mais perturbadoras para os
defensores do paradigma padrão.
Devo observar que eu não tinha uma explicação comportamental
satisfatória para toda anomalia. Algumas eram apenas fatos empíricos que
não se alinhavam com previsões teóricas. Por exemplo, as duas primeiras
colunas foram a respeito de efeitos do “calendário” sobre o mercado de
ações.3 Esses resultados eram simplesmente esquisitos. Considere apenas
uma amostra deles: ações tendem a subir às sextas-feiras e cair nas
segundas; janeiro é um bom mês para manter ações, sobretudo na primeira
parte do mês, e singularmente ações de companhias pequenas; por fim, os
dias que antecedem feriados, muitas vezes sextas-feiras, são bons para as
ações. Uma profusão de artigos documentava tais resultados.4 Todas as
explicações lógicas — e algumas ilógicas — para esses efeitos podiam ser
rejeitadas. Eu também não tinha explicação, mas com toda certeza eram
anomalias.
Outra anomalia vinha de apostadores de turfe.5 Os hipódromos de
cavalos nos Estados Unidos — e em muitas outras partes do mundo (exceto
na Grã-Bretanha) — usam o chamado sistema de apostas parimutual, em
que os odds são determinados pela quantia de dinheiro apostada em cada
cavalo, em vez de uma quantia fixa determinada de antemão. No caso
mais simples de aposta no vencedor, o hipódromo primeiro tira sua cota
predeterminada do bolo das apostas, costumeiramente em torno de 17%, e
então os que apostaram no vencedor dividem o restante do dinheiro. O
cavalo que a maior parte do público acha que tem a melhor chance de
vencer é chamado favorito, enquanto cavalos com poucas chances de
vitória, digamos paridade maior do que 10 para 1, são chamados de
azarões.
Se o hipódromo tira 17% e o mercado de apostas é eficiente, então todas
as apostas deveriam ter o mesmo retorno esperado, ou seja, menos 17%. Se
você aposta US$100,00, espera receber de volta US$83,00 em média,
desde o grande favorito até o maior dos azarões. Mas não é isso que
mostram os dados. O retorno em apostar nos favoritos é muito melhor do
que apostar em azarões. Por exemplo, uma aposta 1 para 1 feita em um
favorito tem como retorno US$0,90 para cada US$1,00 apostado, mas uma
aposta 100 para 1 em um azarão só retorna cerca de US$0,14 em cada
US$1,00. E lembre-se da nossa discussão anterior sobre jogatina e efeito
break-even (Capítulo 10), o retorno quando se aposta em azarões é ainda
pior na última corrida do dia.
Depois de escrever 14 colunas em edições consecutivas, fiz um
intervalo. Essas colunas foram ligeiramente editadas e publicadas em
forma de livro com o título The Winner’s Curse (título de uma das
colunas). Escrevi então mais algumas em frequência ocasional, e a falta do
prazo trimestral fez sua presença na revista se tornar cada vez mais
irregular. A última apareceu em 2006. Pouco depois, a coluna foi
oficialmente aposentada. O editor da revista na época, Andrei Shleifer,
declarou que seu propósito havia sido alcançado. Foi uma maneira polida
de dizer que meu serviço de relatar anomalias tinha chegado ao fim. Eu
tinha sido demitido.
19

FORMANDO UMA EQUIPE

Os artigos da coluna “Anomalias” serviram ao propósito de mostrar aos


economistas que muitos fatos não se alinhavam aos modelos tradicionais.
Ajudaram a promover a adoção de uma nova maneira de fazer economia,
baseada em Humanos em vez de Econs. Mas economia é uma disciplina
vasta, e eu era um preguiçoso. Criar um campo novo requeria uma equipe.
Como eu podia fazer algo para encorajar outras pessoas a entrar na
brincadeira? Não havia manual para consultar o assunto.
É claro que novos campos surgem o tempo todo, e geralmente isso
acontece sem qualquer coordenação. Alguém escreve um artigo científico
sobre um tópico inédito que abre novas linhas de indagação, tal como a
teoria dos jogos na década de 1940.1 Logo outros leem a respeito, o tópico
lhes parece interessante e decidem tentar fazer uma contribuição própria.
Se as coisas caminharem bem, em pouco tempo haverá gente suficiente
fazendo pesquisa na área e conferências sobre o tópico começarão a ser
organizadas, e pode até surgir uma publicação dedicada ao assunto. Mas
esse é um processo lento, e eu ansiava por ter outras pessoas para conversar
além de Amos e Danny. No fim dos anos 1980, havia apenas três pessoas
além de mim que se consideravam economistas comportamentais. Uma
era George Loewenstein, cujo trabalho foi mencionado na seção sobre
autocontrole. Outra era Robert Shiller, citado anteriormente e que estrela
a próxima seção; a terceira pessoa era Colin Camerer.
Conheci Colin quando ele estava no mercado de trabalho acadêmico.
Naquele momento, ele já tinha um MBA e estava quase terminando seu
doutorado na Universidade de Chicago, e ainda nem completara 21 anos.
Colin fez muitas contribuições importantes para a economia
comportamental. Duas se destacaram. Em primeiro lugar, ele mais ou
menos inventou o campo da teoria dos jogos comportamental,2 o estudo de
como as pessoas realmente se comportam em jogos, que contrasta com a
teoria dos jogos padrão, que estuda como Econs jogariam se soubessem
que todas as outras pessoas que estão jogando também são Econs. Mais
recentemente, ele esteve na linha de frente da neuroeconomia, que utiliza
técnicas como escaneamento cerebral para aprender mais sobre como as
pessoas tomam decisões.
Colin tem muitos talentos. Quando ainda era adolescente no colégio,
criou uma gravadora e assinou contrato com a famosa banda punk satírica
Dead Milkmen. Um dos “sucessos” da banda foi “Watching Scotty Die”.
Colin também é um talentoso imitador. Suas imitações de Gene Fama e
Charlie Plott são particularmente boas. Pessoalmente, acho que sua
imitação de Thaler é só mais ou menos.
Embora as contribuições de Camerer, Loewenstein e Shiller ao campo
tenham sido marcos importantes, eu sabia que a economia
comportamental como empreitada acadêmica fracassaria a menos que
conseguisse uma massa crítica de pesquisadores com aptidões
diversificadas em pesquisa. Felizmente, havia mais alguém com o mesmo
objetivo e que podia contribuir com alguns recursos. Esse homem era Eric
Wanner.

––––––––

Eric Wanner era um gestor de programas na Alfred P. Sloan Foundation


quando se interessou em combinar psicologia e economia. Eric é
psicólogo por formação, mas penso que é economista por predileção, e
saboreou a chance de ver se esses dois campos podiam de algum modo ter
um terreno comum. Ele buscou conselhos com Amos e Danny sobre
como podia fazer isso acontecer. Danny, que se orgulha de ser um
pessimista, lembra-se de ter dito a Eric que “não podia sinceramente ver
nenhum jeito de gastar muito dinheiro nessa empreitada”, mas ambos
sugeriram a Eric que falasse comigo. Depois que nós dois nos reunimos na
Sloan Foundation, em Nova York, Eric convenceu a fundação a prover a
verba para sustentar meu ano em Vancouver visitando Danny.
Logo depois que voltei à Cornell, Eric deixou a Sloan Foundation para
se tornar presidente da Russell Sage Foundation, também localizada em
Nova York. Embora a fundação não colocasse a economia comportamental
no centro de sua declaração de missão — que é tratar de importantes
questões de políticas sociais, tais como pobreza e imigração —, a diretoria
estava tão ansiosa para contratar Eric que concordou em deixá-lo trazer a
sua pauta de economia comportamental. Assim como eu, ele não fazia a
menor ideia de como criar um campo novo, mas juntamos as nossas
mentes e tentamos descobrir isso o mais depressa possível.
Nossa primeira ideia pareceu muito boa na época. Como o objetivo era
combinar economia e psicologia, decidimos organizar encontros
ocasionais de psicólogos e economistas, na esperança de que surgissem
ideias. Convidamos três grupos de pessoas: psicólogos renomados que
estivessem dispostos a aguentar um dia conversando com economistas,
alguns economistas consagrados e com a cabeça aberta para novas
abordagens em economia, e os poucos pesquisadores de raiz engajados na
pesquisa.
Eric é um cara persuasivo. Como resultado do seu charme e insistência,
a gama de psicólogos que apareceu no nosso encontro inicial foi realmente
impressionante. Além de Amos e Danny, também compareceram: Walter
Mischel, famoso pelo experimento do marshmallow e biscoitos recheados;
Leon Festinger, que formulou a ideia de dissonância cognitiva; e Stanley
Schachter, um dos pioneiros do estudo das emoções. Juntos, eles eram
para a psicologia o que o Dream Team foi para o basquete. Alguns dos
economistas amigáveis que concordaram em participar também formavam
um elenco de estrelas: George Akerlof, William Baumol, Tom Schelling e
Richard Zeckhauser. O grupo de raiz era composto por Colin, George,
Bob e eu. Eric também convidou Larry Summers para o encontro
inaugural, mas Larry não pôde e sugeriu convidar um de seus novos
alunos, Andrei Shleifer. Foi nesse encontro que conheci o impetuoso
Andrei, que mais tarde viria a se tornar meu colaborador. Jon Elster, o
eclético filósofo norueguês conhecido em quase todos os campos
intelectuais, fechava o grupo.
Considerando a impressionante escalação, as poucas reuniões que
tivemos acabaram não se revelando muito produtivas. Tenho duas
lembranças vívidas. Uma é de Leon Festinger fazendo comentários
irônicos, só interrompidos pelas suas frequentes excursões ao pátio da
fundação para uma pausa para fumar. A outra foi um pedido de William
Baumol para que passássemos adiante e fôssemos além da descoberta de
anomalias. Ele achava que a nosso garimpo de anomalias, como
denominou a atividade, já cumprira seu propósito, mas agora devíamos
seguir adiante para uma agenda mais construtiva. Mas não tinha nenhuma
sugestão sobre o que essa agenda construtiva deveria ser.
Acredito que enfrentamos um problema generalizado que descobri com
a experiência. Encontros interdisciplinares, especialmente aqueles com
agendas de alto nível (redução de pobreza, solução de mudanças
climáticas) tendem a ser decepcionantes, mesmo com participantes
eruditos, porque acadêmicos não gostam de falar sobre pesquisa em termos
abstratos — eles querem ver resultados científicos reais. Mas se cientistas
de um campo começam a apresentar suas descobertas da maneira que os
colegas do seu campo esperam, os cientistas de outras disciplinas logo
ficam oprimidos por detalhes técnicos que não entendem, ou entediados
por exercícios teóricos que consideram sem sentido.3
Esteja ou não correta a minha sombria avaliação de conferências
interdisciplinares, a presença e a participação entusiasmada do time de
astros da psicologia nesses encontros, realizados na sede da Russell Sage
Foundation, em Nova York, foram ao mesmo tempo encorajadoras e
enganosas com referência ao futuro do campo — encorajadoras porque tais
luminares estavam dedicando seu tempo para aquilo e pareciam pensar
que a missão valia a pena e era sensata; mas enganosas porque reforçavam
a crença que todos tínhamos na época: se fosse para haver um campo bem-
sucedido chamado economia comportamental, teria que existir um
empenho verdadeiramente interdisciplinar, com psicólogos e economistas
trabalhando juntos. Era natural para Amos, Danny e eu pensarmos assim,
porque tínhamos aprendido muito uns com os outros e começado a
produzir uma pesquisa conjunta de verdade.
Essa previsão acabou se revelando fraca. Embora haja um punhado de
psicólogos que formaram colaborações bem-sucedidas com economistas ao
longo dos anos — destaque para Drazen Prelec e Eldar Shafir —, a
economia comportamental mostrou ser primeiramente um campo no qual
economistas leem os trabalhos dos psicólogos e continuam fazendo suas
pesquisas independentes.4 Um dos nossos primeiros participantes, Stanley
Schachter,5 é um caso típico. Ele tentou pelo seu lado fazer alguma
pesquisa sobre a psicologia do mercado de ações, mas ficou frustrado com
as reações que teve de pareceristas das revistas convencionais
especializadas em finanças e economia, e acabou abandonando o
programa de pesquisa.
Há diversos motivos possíveis para explicar o baixo envolvimento de
psicólogos. Primeiro, como poucos têm alguma ligação com o modelo de
escolha racional, estudar afastamentos desse modelo não é considerado
inerentemente interessante. Uma reação típica seria: “É claro que as
pessoas prestam atenção a custos afundados. Quem haveria de pensar de
outro modo?” Segundo, a psicologia que economistas comportamentais
acabaram usando não é considerada pelos psicólogos uma psicologia de
ponta. Se psicólogos começassem a usar curvas de oferta e demanda em
seus trabalhos de pesquisa, os economistas não achariam a ideia muito
empolgante. Finalmente, por algum motivo, o estudo de problemas
“aplicados” em psicologia tem sido tradicionalmente considerado uma
atividade de baixo status. Estudar os motivos que levam pessoas a
mergulhar em dívidas ou largar a escola não tem sido o tipo de pesquisa
que conduz acadêmicos de psicologia para a fama e a glória, com a notável
exceção de Robert Cialdini.
Além disso, nós, economistas comportamentais, não fomos exatamente
bem-sucedidos em criar para o campo uma nova psicologia,6 que poderia
promover o tipo de fertilização cruzada que originalmente esperávamos. A
maioria dos avanços no campo tem sido no sentido de descobrir melhores
formas de modificar as ferramentas da economia para acomodar tanto
Humanos como Econs, em vez de fazer novas descobertas sobre
comportamento. Do grupo emergente de economistas que se tornaram os
líderes do campo, apenas George Loewenstein realmente criou bastante
psicologia nova. Embora economista por formação, George é também um
psicólogo realmente talentoso, fato que pode ser parcialmente atribuído a
bons genes. A inicial do seu nome do meio, F, significa Freud; Sigmund
era seu bisavô.
––––––––

Embora esse esforço de fazer economistas e psicólogos trabalharem juntos


não tenha sido bem-sucedido, Eric Wanner permaneceu comprometido
em ajudar a alimentar o campo, mesmo que esse fosse constituído quase
inteiramente de economistas. O tamanho reduzido da Russell Sage
Foundation não permitia que ela fosse a fonte básica de financiamento de
pesquisa caso a intenção do campo fosse se expandir para além de algumas
figuras de peso; Eric então convenceu a diretoria a continuar a apoiar o
campo de forma limitada e altamente incomum. E, ao contrário do esforço
inicial, tem sido um enorme sucesso.
Eis o plano concebido por Eric: em 1992, a fundação formou um grupo
de pesquisadores chamado Behavioral Economics Roundtable, deu a ele
um orçamento modesto e o encarregou de fomentar o crescimento no
campo. Os membros iniciais do grupo eram George Akerlof, Alan Blinder,
Colin Camerer, Jon Elster, Danny Kahneman, George Loewenstein, Tom
Schelling, Bob Shiller, Amos Tversky e eu; dentro dos limites do razoável,
podíamos gastar o dinheiro que nos era dado da maneira como bem
quiséssemos.
Os membros da Roundtable decidiram que a maneira mais proveitosa
de gastar nossa limitada verba (que começou com US$100.000,00 por ano)
era fomentar e estimular a entrada de jovens estudiosos no campo. Para
fazer isso, organizamos programas de treinamento intensivo de duas
semanas para estudantes graduados a serem realizados durante o verão.
Naquela época, não havia nenhuma universidade oferecendo um curso de
pós-graduação em economia comportamental, então esse programa seria
uma maneira de estudantes do mundo todo aprenderem sobre o campo.
Esses programas de duas semanas eram oficialmente chamados de Russell
Sage Foundation Summer Institutes in Behavioral Economics, mas desde
o começo todo mundo se referia a eles como colônia de férias da Russell
Sage.
A primeira colônia de férias foi realizada em Berkeley, no verão de
1994. Colin, Danny e eu fomos os organizadores, com diversos outros
membros da Roundtable se juntando a nós por alguns dias como parte do
corpo docente. Também tivemos algumas estrelas como convidados, tais
como Ken Arrow, Lee Ross (um psicólogo social) e Charlie Plott. No
espírito de incentivar jovens acadêmicos a aderir ao campo, também
convidamos dois economistas recém-formados para participar: Ernst Fehr e
Matthew Rabin. Ambos resolveram seguir carreira em economia
comportamental.
Ernst Fehr é o economista que conheço que mais faz jus ao nome da
profissão. Se fosse preciso pensar em um único adjetivo para descrevê-lo,
seria “diligente”, e o tópico que mais o interessava era a justiça. Austríaco
de nascimento, Ernst tornou-se uma figura central no movimento de
economia comportamental na Europa, com base na Universidade de
Zurique, na Suíça. Como Colin, também virou um proeminente
praticante de neuroeconomia.
O primeiro artigo de Fehr que chamou nossa atenção era
experimental.7 Ele e seus coautores mostraram que, em contexto de
laboratório, “firmas” que optavam por pagar mais que o salário mínimo
eram recompensadas com níveis de esforço mais altos por parte dos seus
“funcionários”. Esse resultado respaldava a ideia, inicialmente proposta por
George Akerlof, de que contratos de emprego podem ser vistos
parcialmente como uma troca de presentes.8 A teoria é que, se o
empregador trata bem o funcionário em termos de pagamento e condições
de trabalho, esse presente é retribuído com níveis de esforço mais altos e
menor rotatividade, tornando assim o pagamento de salários acima do
mercado economicamente lucrativo.
Em contraste, o primeiro artigo científico de Matthew Rabin era
teórico, e foi naquela época o artigo teórico mais importante em economia
comportamental desde a “Teoria dos prospectos”. Seu artigo era a primeira
tentativa séria de desenvolver uma teoria que pudesse explicar o
comportamento aparentemente contraditório observado em situações
como os Jogos do Ultimato e do Ditador. A contradição é que as pessoas
parecem altruístas no Jogo do Ditador, distribuindo dinheiro para um
estranho anônimo, mas também parecem ser más com outras que as tratam
de forma injusta no Jogo do Ultimato. Então, aumentar a felicidade de
outra pessoa também nos deixa mais felizes ou nos deixa menos felizes,
talvez por causa da inveja? A resposta, sugere Rabin, pende para a
reciprocidade. Somos bons para pessoas que nos tratam bem e maus com
pessoas que nos tratam mal. O achado discutido anteriormente, de que
pessoas agem como “cooperadores condicionais”, é consistente com o
modelo de Rabin.9
Além de tudo, Matthew é uma figura. Seu traje normal é uma camiseta
tie-dye, e ele parece ter um estoque infinito delas. E também é muito
engraçado. Fui um dos pareceristas solicitados a analisar seu artigo sobre
justiça quando ele o submeteu a publicação no American Economic
Review. Escrevi uma resenha entusiástica apoiando a publicação, mas
acrescentei, sem fornecer quaisquer detalhes, que fiquei perturbado por
ele ter deixado de fora uma importante nota de rodapé que tinha aparecido
em uma versão anterior. A nota de rodapé dizia respeito ao jogo ao qual os
economistas se referem como “frangote”, no qual a primeira pessoa a se
render é a derrotada. Aqui está a nota de rodapé, que foi restaurada na
versão publicada: “Mesmo mantendo o nome convencional desse jogo,
ressalto que ele é extremamente preconceituoso em relação a essa espécie
— há pouca evidência de que frangos sejam menos corajosos do que os
humanos ou outros animais.”
Então tínhamos um corpo docente cheio de estrelas escalado para nossa
colônia de férias, além dos promissores rapazes recém-chegados, Fehr e
Rabin. Mas, por nunca ter feito isso antes, não sabíamos se alguém se
inscreveria. Enviamos um anúncio aos chefes dos principais
departamentos de economia ao redor do mundo na esperança de que
alguém quisesse vir. Felizmente, mais de 100 estudantes se inscreveram, e
o grupo de 30 que selecionamos estava lotado de futuras estrelas do campo.
Essas colônias de férias continuaram em anos alternados desde então.
Depois que Danny e eu ficamos ocupados/cansados/velhos/preguiçosos
demais para organizar e participar do programa inteiro de duas semanas, a
organização foi assumida por gerações mais novas. Durante algum tempo
os organizadores foram Colin e George, e David Laibson e Matthew Rabin
dirigiram as últimas colônias.
Um indicador do sucesso do programa de verão é que David foi aluno
no primeiro deles, então o grupo está se tornando autogerador. Muitos dos
outros membros do corpo docente que agora participam também foram
graduados nas colônias. Devo ser claro: não fazemos qualquer
reivindicação sobre ter transformado esses jovens acadêmicos em estrelas.
Por exemplo, David Laibson já havia se graduado no MIT e assumido um
emprego em Harvard antes de chegar ao nosso curso. Outros também eram
claramente estrelas em ascensão. Em vez disso, a realização básica dos
acampamentos de verão foi aumentar a probabilidade de que alguns dos
melhores jovens acadêmicos do mundo considerassem seriamente a ideia
de se tornarem economistas comportamentais, e então lhes fornecer uma
rede de economistas de mentalidade semelhante com quem pudessem
conversar.
O nível de talento dos participantes daquela primeira colônia é
evidenciado pelo número daqueles que atingiram a fama. Um deles foi
Sendhil Mullainathan, que acabara de completar seu primeiro ano de
trabalho de pós-graduação em Harvard. Eu havia conhecido Sendhil
quando ele era aluno em Cornell, completando a graduação em
economia, matemática e ciência da computação em três anos. Não era
difícil ver que ele tinha o talento para fazer praticamente qualquer coisa, e
tentei despertar seu interesse em psicologia e economia o melhor que
pude. Felizmente para o campo, minha lábia funcionou e foi seu
florescente interesse em economia comportamental que o desviou da
ciência da computação para a economia na sua pós-graduação. Entre suas
outras realizações, Sendhil fundou o primeiro think tank sem fins
lucrativos de economia comportamental, chamado ideas42. Matthew,
Colin e ele receberam o chamado prêmio de “gênio” da MacArthur
Foundation.
Outros participantes notáveis do primeiro ano foram: Terry Odean, que
essencialmente inventou o campo “comportamento do investidor
individual”; Chip Heath, que, junto com seu irmão Dan, publicou três
livros de sucesso sobre gestão em negócios; e Linda Babcock e Christine
Jolls, duas das minhas futuras coautoras que logo farão sua aparição neste
livro.
No verão de 2014 organizamos nossa décima colônia de férias, e eu
nunca perdi uma. Há agora cerca de 300 graduados, muitos detendo
posições em universidades de primeira linha ao redor do mundo. É em
grande parte a pesquisa produzida pelos graduados nessas colônias de férias
que transformou a economia comportamental de um culto excêntrico em
uma parte vibrante da economia convencional. Todos podem agradecer a
Eric Wanner por tê-los ajudado a começar. Ele é o pai financiador da
economia comportamental.
20

ENQUADRAMENTO ESTREITO NO UPPER EAST SIDE

As contribuições da Russell Sage Foundation para a economia


comportamental não se limitaram à criação da Behavioral Economics
Roundtable. A fundação também tem um maravilhoso programa para
acadêmicos visitantes, que passam um ano em Nova York vivendo em um
apartamento subsidiado próximo à sede da fundação, no Upper East Side.
A única responsabilidade do visitante é aparecer para um delicioso — e
ouso dizer, gratuito — almoço. O restante do tempo está disponível para
ser gasto pensando e escrevendo. Para o ano acadêmico de 1991–92, Colin
Camerer, Danny e eu nos candidatamos como equipe, e a esposa de
Danny, Anne Treisman, também psicóloga, aderiu como acadêmica
visitante. E, de quebra, Amos fez visitas periódicas, então estávamos
prontos para ter um grande ano. Danny e eu esperávamos de algum modo
recriar a magia que tínhamos vivido antes em Stanford e Vancouver. Mas
os astros não estavam alinhados.
Não ajudou o fato de eu estar passando por um divórcio, e um incêndio
enorme destruiu totalmente a casa de Anne e Danny em Berkeley. Mas
essas foram apenas duas das distrações que tivemos que superar. Nos seis
anos após nossa estada em Vancouver, ficamos ocupados demais para
conseguir ignorar todo o restante e trabalhar de forma intensiva em um
projeto conjunto. Tínhamos alunos de doutorado que necessitavam de
atenção, Danny e Anne estavam responsáveis por um laboratório cheio de
alunos de pós-graduação em Berkeley, e todos tínhamos colegas nas nossas
universidades de origem que queriam que opinássemos em vários conflitos
departamentais. Havia ficado para trás aquele tempo em que podíamos
trabalhar em uma única coisa sete dias por semana durante meses a fio.
Mas havia uma ideia no ar, e ambos estávamos pensando nela
independentemente. Tal conceito se encaixava no projeto em que eu
estava trabalhando com Colin. A ideia chama-se enquadramento estreito
(narrow framing) e está relacionada com uma questão mais geral de
contabilidade mental: quando transações ou eventos econômicos são
combinados e quando são tratados separadamente? Por exemplo, se você
sai de férias, cada componente do custo da viagem (passagens, hotel,
refeições, passeios, presentes) é considerado em separado ou são todos
reunidos na categoria férias e calculados juntos, como seriam em um
cruzeiro com tudo incluso? A questão específica sobre a qual Danny e eu
estávamos ponderando era: em que situações as pessoas geram problemas
ao lidar com um evento de cada vez, em vez de tratá-los como um
portfólio?
O trabalho de Danny sobre esse problema surgiu em um projeto com
Dan Lovallo, um aluno de pós-graduação em Berkeley que se juntou a nós
naquele ano como assistente de pesquisa. Segundo eles, a tomada de
decisão gerencial era guiada por dois vieses divergentes, mas não
necessariamente contrabalançados: previsões audaciosas e escolhas
tímidas.1 As previsões audaciosas provêm da distinção que Danny fazia
entre a “visão de dentro” e a “visão de fora”.
Para transmitir essa distinção, Danny conta a história do projeto de um
livro. A história inteira é descrita em detalhe em Rápido e devagar: duas
formas de pensar,2 mas para aqueles que falharam vergonhosamente em
memorizar o livro, eis aqui um resumo. Uma equipe de estudiosos com
diferentes formações foi encarregada da tarefa de conceber uma ementa
sobre tomada de decisões para alunos do ensino médio. Depois de
trabalhar no projeto por vários meses, Danny começou a se perguntar
quanto tempo levaria para completá-lo. Ele fez uma pesquisa com os vários
membros da equipe, tendo cada um escrito seu palpite em separado para
se conseguir um conjunto de palpites independentes. As estimativas para o
tempo de conclusão variavam de 18 a 30 meses. Então Danny percebeu
que um integrante da equipe era especialista em desenvolvimento de
grades curriculares, e havia observado várias equipes como essa ao longo
dos anos. Dessa maneira, Danny pediu a esse perito para avaliar aquela
equipe, compará-la com outras que tinha visto e, com base na sua
experiência, dizer quanto tempo o projeto levaria para ser concluído. O
especialista, cujo próprio palpite estava entre os 18 e 30 meses, ficou um
tanto acanhado. Com relutância, disse ao grupo que, pela sua experiência,
nenhuma equipe terminara uma tarefa similar em menos de 7 anos e, pior,
40% das equipes sequer terminaram.
A diferença entre as duas estimativas do especialista ilustra a distinção
de Danny entre as visões de dentro e de fora. Ao analisar o problema
enquanto membro da equipe do projeto, o especialista estava confinado à
visão de dentro — imerso no otimismo que acompanha os esforços em
grupo — e não se preocupou em pensar naquilo que os psicólogos
chamam de “taxas-base”, isto é, o tempo médio para projetos semelhantes.
Quando pôs seu chapéu de especialista, adotando assim a visão de fora,
naturalmente pensou em todos os outros projetos de que tinha
conhecimento e deu um palpite mais preciso. Se a visão de fora for exposta
com cuidado e informada com dados de taxas-base apropriados, será muito
mais confiável do que a visão de dentro.
O problema é que a visão de dentro é tão natural e acessível que pode
influenciar o julgamento mesmo de pessoas que entendem o conceito —
até mesmo da pessoa que cunhou o termo. Depois de descobrir sobre a
doença de Amos e sua breve expectativa de vida, Amos e Danny decidiram
editar um livro, uma coletânea de artigos sobre tomada de decisões, mas
Amos faleceu antes de o livro ser completado. Danny teve a desoladora
tarefa de escrever a introdução, a qual fariam juntos. Amos morreu em
junho de 1996, e eu me lembro de conversar com Danny sobre o livro
naquele outono e sobre a data de conclusão prevista. Ele disse que não
deveria levar mais de seis meses. Comecei a rir. Danny entendeu a piada e
disse, envergonhado: “Ah, você está pensando naquele livro [referindo-se
àquele que aparecia na sua história sobre a visão de dentro]. Este livro é
completamente diferente. É só uma coletânea de artigos, a maioria deles já
publicada. Só preciso pressionar uns retardatários para terminarem seus
artigos e completar a introdução.” O livro saiu quase quatro anos depois,
em 2000, pouco após o recebimento do último artigo e de terminada a
introdução.
A parte das “escolhas tímidas” da história de Kahneman e Lovallo se
baseia na aversão a perdas. Cada gestor tem aversão a perdas referentes a
qualquer resultado que seja atribuído a ele. Em contexto corporativo, o
sentimento natural de aversão a perdas pode ser exacerbado pelo sistema
de recompensa e punição. Em muitas empresas, criar um ganho grande
leva a recompensas modestas, enquanto criar uma perda de igual dimensão
faz com que você seja demitido. Sob esses termos, até mesmo um gestor
que comece neutro em termos de risco, disposto a assumir qualquer aposta
que traga dinheiro, em média passará a ter alta aversão a riscos. Em vez de
resolver um problema, a estrutura organizacional só torna as coisas piores.
Eis um exemplo para mostrar como isso funciona. Logo depois do nosso
ano em Nova York, eu estava dando um curso sobre tomada de decisão
para um grupo de executivos de uma empresa da indústria da mídia
impressa. A empresa possuía um punhado de publicações, basicamente
revistas, e cada executivo da plateia era chefe de uma delas, que eram
geridas de forma bastante independente. O CEO da empresa também
estava participando, sentado no fundo da sala, observando e escutando.
Apresentei o seguinte cenário aos executivos: “Suponha que lhe fosse
oferecida uma oportunidade de investimento para sua divisão capaz de
gerar um entre dois retornos possíveis. Depois de feito o investimento, há
uma chance de 50% de que ele gere um lucro de US$2.000.000,00 e uma
chance de 50% de que perca US$1.000.000,00.” Note que o retorno
esperado desse investimento é de US$500.000,00, já que metade das vezes
eles ganham US$2.000.000,00 (um ganho esperado de US$1.000.000,00)
$
e metade das vezes perdem US$1.000.000,00 (uma perda esperada de
US$500.000,00). A empresa era suficientemente grande para que uma
perda de US$500.000,00, ou até mesmo de vários milhões, não ameaçasse
sua solvência. Então pedi que levantassem a mão aqueles que assumiriam
o projeto. Dos 23 executivos, só três disseram que o fariam.
Fiz então uma pergunta ao CEO. Se esses projetos fossem
“independentes” — ou seja, se o sucesso de um não tivesse qualquer
relação com o sucesso de outro —, quantos desses projetos ele estaria
disposto a assumir? Sua resposta: todos eles! Assumindo os 23 projetos, a
empresa espera ganhar US$11.500.000,00 (já que cada um vale um ganho
esperado de US$500.000,00), e um pouco de matemática revela que a
chance de perder algum dinheiro no total é menor do que 5%. Ele
considerava que não havia muito o que pensar para assumir uma coleção
de projetos como aqueles.
“Bem, isso significa que você tem um problema”, respondi ao CEO.
“Porque não vai receber 23 desses projetos: vai receber só três. Você deve
estar fazendo algo errado, ou contratando gerentes medrosos que não estão
dispostos a assumir riscos ou, mais provavelmente, criando um sistema de
incentivos no qual esse tipo de risco não é recompensado.” O CEO sorriu
com ar de quem sabia, mas permaneceu em silêncio, vendo o que os
outros participantes diriam. Voltei-me para um dos gerentes que tinham
dito que não assumiriam o projeto e lhe perguntei por que não. Ele disse
que, se o projeto fosse um sucesso, provavelmente ganharia um tapinha nas
costas e possivelmente uma gratificação em dinheiro equivalente a,
digamos, três meses de salário. Mas se o projeto desse errado, acreditava
que havia uma chance razoável de ser demitido. Ele gostava do emprego e
não queria arriscá-lo num cara ou coroa em que o máximo que ganharia
seria três meses de salário.
O enquadramento estreito impede o CEO de receber os 23 projetos que
gostaria, recebendo apenas três em vez disso. Ao abordar de forma ampla os
23 projetos como um portfólio, é claro que a empresa acharia a coleção de
investimentos altamente atraente, mas com uma abordagem estreita de
cada um isoladamente, os gerentes relutarão em correr o risco. A empresa
acaba assumindo risco de menos. Uma solução para esse problema é
agregar investimentos em um conjunto em que possam ser considerados
como um pacote.
O valor desse tipo de agregação veio à tona em um breve serviço de
consultoria que prestei a uma grande empresa farmacêutica. Como todas
as grandes empresas do setor, essa gastava mais de US$1.000.000.000,00
por ano em pesquisa e desenvolvimento, investigando milhares de novos
compostos na esperança de encontrar o próximo medicamento de sucesso.
Mas medicamentos de sucesso são raros. Mesmo para uma firma grande,
encontrar um a cada dois ou três anos seria considerado bom, e com tantos
medicamentos sendo pesquisados, o retorno esperado tem características
muito parecidas com um bilhete de loteria — existe uma chance muito
pequena de um prêmio muito grande. Você deve achar que uma empresa
dessas, que despende bilhões em investimentos que oferecem chances
muito pequenas de um grande ganho ocasional, já resolveu a questão do
risco. Mas você está errado, porque eles só calcularam isso em relação à
pesquisa e ao desenvolvimento.
O projeto em que por acaso trabalhei estava relacionado com marketing
e fixação de preços, e não pesquisa e desenvolvimento. Um funcionário
trouxe uma proposta para realizar experimentos que investigassem
diferentes maneiras pelas quais certos medicamentos poderiam ter seu
preço fixado, sendo um dos objetivos melhorar a “observância”, que é o
jargão médico para o ato de tomar o medicamento da forma que o médico
prescreveu. Em alguns casos, especificamente os que não aliviam a dor
nem têm outros efeitos benéficos óbvios para o usuário, muitos pacientes
param de tomar o medicamento. Em outros, tais como tomar o
medicamento recomendado após um ataque cardíaco, os benefícios são
demonstravelmente grandes.3 Qualquer melhora na observância oferecia a
chance de um verdadeiro ganha-ganha. Os pacientes ficariam mais
saudáveis, as despesas médicas cairiam e a empresa farmacêutica ganharia
mais dinheiro, já que venderia mais pílulas. Apesar desse quadro benéfico
geral, disseram-nos que fazer os testes que havíamos concebido para uma
comunicação direta com os consumidores seria arriscado demais. Era um
raciocínio equivocado. É claro que a ideia poderia não vingar — é por isso
que experimentos são conduzidos.4 Mas o custo do experimento era
mínimo frente ao tamanho da empresa. Ele só parecia arriscado em
comparação com o orçamento daquele gerente específico. Nesse exemplo,
o enquadramento estreito impedia a inovação e a experimentação, dois
ingredientes essenciais para o sucesso de longo prazo em qualquer
organização.
Tanto esse exemplo de gerente com aversão ao risco como a história do
CEO que teria gostado de receber 23 projetos de risco, mas que só
receberia três, ilustram um ponto importante sobre problemas do tipo
principal-agente. Na literatura de economia, tais falhas são geralmente
descritas de uma maneira que implicitamente joga a “culpa” no agente por
tomar decisões em prol do interesse próprio que deixam de maximizar a
firma. É dito que eles tomam decisões ruins porque estão maximizando seu
próprio bem-estar em vez dos interesses da organização. Embora essa
descrição muitas vezes seja adequada, em muitos casos o verdadeiro
culpado é o patrão, não o funcionário.
Para fazer com que os gerentes estejam dispostos a assumir riscos, é
necessário criar um ambiente no qual esses gerentes sejam recompensados
por decisões que sejam maximizadoras de valor ex ante, ou seja, com
informação disponível na época em que forem tomadas, mesmo que
acabem provocando perdas de dinheiro ex post. A implementação de uma
política desse tipo é dificultada pelo viés de retrospectiva. Sempre que há
um lapso de tempo entre o momento em que uma decisão é tomada e
aquele em que chegam os resultados, o chefe pode ter dificuldade em se
lembrar que originalmente também pensou que era uma boa ideia. O que
deve ser ressaltado é que, em muitas situações em que os agentes tomam
decisões ruins, o comportamento desviante com frequência é do principal,
não do agente. O erro está em falhar na criação de um ambiente no qual
os empregados sintam que podem assumir bons riscos sem serem punidos
caso o risco não dê o retorno esperado. Chamo essas situações de
problemas de “principal estúpido”. Discutiremos um exemplo específico
de tal caso logo adiante, no contexto de tomada de decisões nos esportes.

––––––––

As histórias anteriores ilustram a abordagem de Danny ao enquadramento


estreito. Já meu projeto neste tópico foi com um aluno de doutorado que
havia chegado recentemente a Cornell para estudar finanças, Shlomo
Benartzi. Shlomo acabaria se revelando uma importante solução para o
meu problema de preguiça. Ele é cheio de energia e impossível de
desestimular. Também dominava a fina arte de “me dar um empurrão”,
como viemos a definir a ação. Muitas vezes eu dizia para Shlomi, como
todo mundo o chama: “Estou ocupado demais, não posso pensar nisso
agora.” Shlomi: “Tudo bem, quando você acha que vai conseguir pensar?”
Eu: “Ah, talvez daqui a dois meses, não antes.” Dois meses depois do dia
seguinte, Shlomi ligava: “Estamos prontos para trabalhar?” É claro que ele
tinha percebido que eu estava assumindo a visão de dentro ao pensar que
em apenas dois meses eu teria mais tempo.Mesmo assim, ele ligava e eu
acabava dando um jeito de trabalhar no seu projeto corrente. Como
resultado desses “empurrões”, além de Shlomo ser uma fonte de ideias
interessantes, escrevi mais artigos com ele do que com qualquer outra
pessoa.
Shlomo e eu estávamos interessados em uma anomalia chamada equity
premium puzzle.5 Este quebra-cabeça foi enunciado pela primeira vez por
Raj Mehra e Edward Prescott em um artigo de 1985. Era de surpreender
que Prescott enunciasse uma anomalia, pois ele era — e continua sendo
— um membro inveterado do establishment conservador, de expectativas
racionais. Seu trabalho nesse domínio, chamado “ciclos de negócios reais”,
lhe valeria um Prêmio Nobel. E, ao contrário de mim, Prescott não tinha
como parte da sua agenda declarar anomalias. Desconfio que, devido a sua
visão, essa anomalia fosse um tanto constrangedora, mas Mehra e ele
sabiam que estavam lidando com algo interessante.
O termo equity premium é definido como o diferencial de rentabilidade
entre equities e algum ativo livre de risco, tal como títulos do governo. A
magnitude do equity premium histórico depende do período de tempo
usado e várias outras definições, mas para o período que Mehra e Prescott
estudaram, 1889-1978, o equity premium foi de aproximadamente 6% ao
ano.
O fato de ações terem taxas de rentabilidade mais elevadas do que letras
do Tesouro não é surpresa. Qualquer modelo no qual investidores tenham
aversão ao risco prediz isto: como ações são arriscadas, investidores exigirão
um prêmio — um excedente em relação ao valor nominal — em relação a
um ativo sem riscos. Em muitos artigos de economia, a análise cessaria
neste ponto: a teoria prediz que um ativo terá maior rentabilidade que
outro porque é mais arriscado; os autores encontram evidência
confirmando essa predição; e o resultado é computado como outra vitória
para a teoria econômica.
O que torna a análise de Mehra e Prescott especial é que eles foram
além de indagar se a teoria econômica pode explicar a existência do equity
premium: indagaram se a teoria econômica pode explicar a real dimensão
do equity premium. É um dos poucos testes que conheço em economia em
que os autores fazem uma afirmação acerca da magnitude permissível de
algum efeito.6 Depois de fazer os cálculos, Mehra e Prescott concluíram
que o maior valor do equity premium que podiam predizer a partir do seu
modelo era de 0,35%, bem longe dos 6% históricos.7 Investidores teriam
que ser implausivelmente avessos a riscos para explicar os rendimentos
históricos. Seus resultados eram controversos, e eles levaram seis anos para
publicar o artigo.8 No entanto, uma vez publicado, atraiu considerável
atenção de muitos economistas que se apressaram a oferecer desculpas ou
explicações. Mas na época que Shlomo e eu começamos a pensar no
problema, nenhuma das explicações havia se provado satisfatória,9 pelo
menos para Mehra e Prescott.
Decidimos tentar encontrar uma solução para o equity premium puzzle.
Para entender a nossa abordagem, será útil considerar outro artigo clássico
de Paul Samuelson, no qual ele descreve uma conversa durante um
almoço com um colega no clube dos professores do MIT. Samuelson
comentou que tinha lido em algum lugar que a definição de covarde é
alguém que se recusa a assumir algum lado em uma aposta com chances
de 2 para 1. Então se virou para um dos seus colegas, um historiador de
economia chamado E. Carey Brown, e disse: “Como você, Carey.”
Para provar seu ponto, Samuelson ofereceu uma aposta a Brown. Lance
uma moeda; se der cara você ganha US$200,00, coroa você perde
$
US$100,00. Como Samuelson antecipara, Brown declinou da aposta,
dizendo: “Não vou apostar porque sentiria a perda de US$100,00 mais do
que o ganho de US$200,00”. Em outras palavras, Brown estava dizendo:
“Tenho aversão a perdas.” Mas então Brown disse algo que surpreendeu
Samuelson. Falou que não gostava de uma só aposta, mas ficaria feliz em
topar 100 dessas apostas.
Isso fez Samuelson pensar, e ele logo voltou com uma prova de que as
preferências de Brown não eram consistentes e, portanto, não racionais
segundo os padrões econômicos. Especificamente, ele provou, com uma
ressalva, que, se alguém não está disposto a topar uma aposta, então não
deveria concordar em fazer múltiplas jogadas envolvendo aquela aposta. A
ressalva é que sua relutância em aceitar uma única aposta não é sensível a
mudanças relativamente pequenas na sua riqueza, especialmente os níveis
de riqueza que poderiam ser alcançados se ele topasse todas as jogadas.
Nesse caso, ele poderia perder até US$10.000,00 (se perdesse todas as 100
apostas) e ganhar até US$20.000,00 (se ganhasse todas elas). Se Brown
tivesse um pé de meia substancial acumulado, ele provavelmente ganharia
ou perderia aquela quantia com frequência. Com certeza seria seguro
declarar que sua resposta à pergunta de Samuelson não mudaria se de
repente ficasse US$5.000,00 mais rico ou mais pobre.10
Eis aqui a lógica do argumento de Samuelson: suponha que Brown
concorde em jogar as 100 apostas, mas depois de jogar 99, Samuelson lhe
ofereça a chance de parar, tornando assim a última aposta opcional. O que
Brown fará? Bem, sabemos que ele não gosta de uma aposta só e que
estamos na faixa de riqueza para a qual isso se aplica, então ele para. Agora,
suponha que façamos a mesma coisa após 98 apostas. Dizemos a ele que
cada uma das duas últimas agora é opcional. O que Brown fará? Como
economista treinado, ele usará a indução retroativa, o que simplesmente
significa começar do fim e vir de trás para a frente. Ao fazer isso, ele saberá
que, no momento da aposta única número 100, ele a recusará, percebendo
que isso implica que a aposta 99 essencialmente também é uma aposta
única, coisa de que ele mais uma vez não gosta, então também diz não
para a aposta 99. Mas se você continuar aplicando essa lógica em
sequência, chegará ao resultado de que Brown não aceitará a primeira
aposta. Daí a conclusão de Samuelson: se você não gosta de uma aposta só,
não deveria aceitar muitas.
Esse resultado é bastante surpreendente. Não parece insensato recusar
uma aposta quando você tem 50% de chance de perder US$100,00,
especialmente porque US$100,00 no começo dos anos 1960 valiam mais
do que US$750,00 agora na década de 2010. Não há muita gente disposta
a se arriscar a perder tanto dinheiro no cara ou coroa, mesmo com a
chance de ganhar o dobro. Embora a combinação de 100 apostas pareça
bastante atraente, a lógica de Samuelson é inatacável. Conforme ele voltou
a enunciar uma vez em outro dos seus breves artigos: “Se não vale a pena
fazer um ato uma vez, não valerá fazê-lo duas, três... ou sequer chegar a
fazê-lo.”11
Samuelson fez mais do que mostrar que seu colega havia cometido um
erro. Ofereceu um diagnóstico com uma provocação no título do artigo:
“Risco e incerteza: uma falácia dos grandes números”.12 Na opinião de
Samuelson, o erro cometido por Brown foi aceitar as 100 jogadas da aposta,
e ele achava que Brown tinha cometido o erro porque não compreendera o
princípio estatístico chamado lei dos grandes números. A lei dos grandes
números diz que, se você repetir algum jogo de aposta vezes suficientes, o
resultado será bastante próximo do valor esperado. Se você lança uma
moeda 1.000 vezes, a quantidade de caras que obterá será bastante próxima
de 500. Então Brown tinha razão em esperar que, em 100 jogadas da
aposta de Samuelson, fosse improvável ele perder dinheiro. Na verdade,
sua chance de perder dinheiro é apenas 1 em 2.300. O erro que
Samuelson achava que Brown estava cometendo era ignorar a
possibilidade de perder uma quantia substancial. Se você joga a aposta
uma vez, tem uma chance de 50% de perder, mas o máximo que pode
perder é US$100,00. Se você joga 100 vezes, a sua chance de perder é
pequena, mas existe alguma, reconhecidamente infinitesimal, de perder
US$10.000,00 caindo 100 coroas seguidas.
Na nossa abordagem frente a esse tópico, Benartzi e eu considerávamos
Samuelson parcialmente correto. Estava certo ao dizer que seu colega
tinha cometido um erro. É ilógico, na configuração de Samuelson, recusar
uma aposta mas aceitar muitas. Porém, se Samuelson criticou Brown por
aceitar muitas apostas, nós achamos que seu erro foi recusar uma. O
enquadramento estreito foi o responsável. A crítica à aceitação da opção de
100 apostas na realidade está fora de lugar. Em média, era esperado que
Brown ganhasse US$5.000,00 aceitando o conjunto de apostas, e a chance
de perder dinheiro era minúscula. A possibilidade de perder muito
dinheiro era ainda menor. Especificamente, a chance de perder mais de
US$1.000,00 é de 1 em 62.000. Conforme escrito por Matthew Rabin e
por mim sobre esse tópico na coluna “Anomalias”: “Um bom advogado
poderia declarar você insano por recusar essa jogada.” Mas se é loucura
recusar 100 apostas, a lógica do argumento de Samuelson é simplesmente
reversa: você não deve recusar uma! Shlomo e eu chamamos esse
fenômeno de “aversão míope à perda”.13 O único jeito de algum dia você
conseguir fazer 100 apostas atraentes14 é primeiro fazer a primeira, e
apenas a ideia de uma aposta isolada é que leva você a se enganar e recusá-
la.
A mesma lógica se aplica a investimentos em ações e títulos de renda
fixa. Lembre-se de que o equity premium puzzle indaga por que as pessoas
guardam tantos títulos se esperam que o rendimento das ações seja 6% ao
ano mais alto. A nossa resposta era que elas estavam adotando uma visão de
curtíssimo prazo nos seus investimentos. Com uma margem de 6% a mais
na rentabilidade, em períodos de tempo longos como 20 ou 30 anos, a
chance de as ações terem desempenho pior que os títulos é pequena,
exatamente como (embora talvez não com uma chance tão grande quanto)
a chance de perder dinheiro no jogo de 100 apostas de Samuelson.
Para testar essa hipótese, Shlomo e eu realizamos um experimento
usando funcionários não docentes recentemente contratados15 na
University of Southern California. A universidade tem um plano de
contribuição de aposentadoria bem definido, no qual os funcionários
precisam decidir como investir seus fundos de aposentadoria. Nos Estados
Unidos, esses planos são por vezes chamados de 401(k), um termo derivado
da disposição legal que os legitima no código tributário. Dissemos a cada
sujeito para imaginar que havia apenas duas opções de investimento no seu
plano de aposentadoria, uma mais arriscada, com rendimentos esperados
maiores, e outra mais segura, com rendimentos esperados mais baixos. Isso
era acompanhado por gráficos mostrando a distribuição dos rendimentos
para ambos os fundos, baseadas nos rendimentos dos últimos 68 anos. O
fundo mais arriscado se baseava nos rendimentos de um índice de grandes
empresas americanas, enquanto o fundo mais seguro se baseava nos
rendimentos de um portfólio de títulos do governo em um período de
cinco anos. Mas não contamos isso aos sujeitos para evitar quaisquer
preconceitos em relação a ações e títulos do governo.
O foco do experimento era a maneira como os rendimentos eram
mostrados. Em uma versão, foi exibida aos sujeitos a distribuição das taxas
de rentabilidade anuais; em outra, foi mostrada a distribuição da média
simulada das taxas anuais para um horizonte de 30 anos (ver Figura 9). A
primeira versão capta os rendimentos que as pessoas veem quando olham
seus extratos de aposentadoria uma vez por ano, enquanto a outra
representa a experiência que poderiam esperar de uma estratégia de 30
anos, do tipo a-perder-de-vista. Perceba que os dados usados nos dois
gráficos são exatamente os mesmos. Isso significa que, em um mundo de
Econs, as diferenças nos gráficos são FSIs e não teriam efeito nas escolhas
feitas.
Para os nossos sujeitos Humanos, a apresentação dos dados teve um
efeito enorme. Os funcionários a quem foram mostradas as taxas de
rendimento anuais optaram em colocar 40% de seu portfólio hipotético em
ações, enquanto aqueles que viram as médias de longo prazo elegeram
colocar 90% do seu dinheiro em ações. Esses e outros resultados vão contra
a hipótese de Samuelson sobre pessoas superestimando o efeito da redução
de risco de jogadas repetidas. Quando as pessoas veem os dados reais,
adoram o portfólio mais arriscado.
Uma implicação dessa análise é que, quanto maior a frequência com
que as pessoas olham seu portfólio de investimentos, menos dispostas estão
a assumir o risco, porque se você olhar com mais frequência, verá mais
perdas. E, de fato, essa é uma implicação que mais tarde explorei com
Kahneman e Tversky. Esse é o único artigo que Amos, Danny e eu
publicamos juntos (em conjunto com o então aluno de Danny, Alan
Schwartz, agora professor de tomada de decisões médicas na Universidade
de Illinois em Chicago). O artigo foi publicado em 1997 em um número
especial do Quarterly Journal of Economics16 dedicado à memória de
Amos. Tivemos que terminar a redação do artigo sem ele.
O artigo relata um experimento no qual sujeitos que eram estudantes
em Berkeley receberam a tarefa de investir dinheiro como gestores de
portfólio para uma universidade. É claro que estavam apenas fingindo ser
gerentes do portfólio, mas a quantia que ganhariam no experimento
dependia dos resultados dos investimentos. Seus ganhos variavam de
US$5,00 a US$35,00 em menos de uma hora, então era realmente
suficiente para eles. Como no experimento anterior, os sujeitos tinham
apenas duas opções de investimento: uma de maior risco com
rentabilidade mais alta, outra mais segura com rentabilidade menor. Nesse
caso, variamos a frequência com que os sujeitos olhavam os resultados de
suas decisões. Alguns viam oito vezes por ano os resultados simulados,
enquanto outros só viam os resultados uma vez por ano ou uma vez a cada
cinco anos. Conforme predito pela aversão míope à perda, aqueles que
viam seus resultados com mais frequência eram mais cautelosos. Aqueles
que os viam oito vezes por ano só puseram 41% do seu dinheiro em ações,
enquanto aqueles que os viam apenas uma vez por ano investiram 70% em
ações.
Essas descobertas foram recentemente replicadas em um experimento
natural possibilitado por uma mudança regulatória em Israel. Um artigo da
estudante de doutorado Maya Shaton17 da Booth School of Business de
Chicago investiga o que aconteceu em 2010 quando a agência
governamental que regula poupanças de aposentadorias mudou a maneira
como os fundos reportavam seus rendimentos. Anteriormente, quando um
investidor checava seus investimentos, o primeiro número que aparecia
para um dado fundo era o rendimento para o mês mais recente. Depois da
nova regulamentação, os investidores passaram a ver os rendimentos para o
último ano. Conforme predito pela aversão míope a perda, os investidores
passaram mais dos seus ativos para ações depois da mudança. E também
passaram a negociar menos, e ficaram menos propensos a passar dinheiro
para fundos com altos rendimentos recentes. De forma geral, foi uma
regulação muito sensata.
Esses experimentos demonstram que olhar os rendimentos de seu
portfólio com mais frequência pode deixar você menos disposto a correr
risco. No nosso artigo sobre “aversão míope a perda”, Benartzi e eu usamos
a teoria da perspectiva e a contabilidade mental para tentar explicar o
mistério do equity premium puzzle.18 Usamos dados históricos sobre ações
e títulos de renda fixa e perguntamos com que frequência os investidores
teriam que avaliar seus portfólios para que ficassem indiferentes entre
ações e títulos, ou se quisessem manter um portfólio que fosse uma
composição 50-50 dos dois ativos. A resposta que obtivemos foi
aproximadamente um ano. É claro que investidores diferem na frequência
com que examinam seus portfólios, porém uma vez por ano soa como algo
altamente plausível. Indivíduos recebem restituições de impostos uma vez
por ano; da mesma maneira, enquanto fundos de pensão e dotações fazem
relatórios a suas diretorias com uma frequência regular, o relatório anual é
provavelmente o que mais se destaca.
A implicação da nossa análise é que o equity premium — ou a taxa de
rendimento requerida em ações — é tão alta porque investidores
examinam seus portfólios com demasiada frequência. Sempre que alguém
me pede algum conselho sobre investimentos, eu sugiro um portfólio
diversificado com forte propensão a ações, especialmente se a pessoa for
jovem, e então evitar escrupulosamente ler qualquer coisa no jornal além
da seção de esportes. Palavras cruzadas são aceitáveis, mas assistir ao
segmento de economia é estritamente proibido.19

––––––––

Durante o nosso ano na Russell Sage, Colin e eu frequentemente


pegávamos táxi juntos. Às vezes era difícil achar um táxi vazio, sobretudo
nos dias frios ou quando havia alguma grande convenção na cidade.
Ocasionalmente conversávamos com os motoristas e perguntávamos como
decidiam o número de horas a trabalhar por dia.
A maioria dos taxistas trabalha para uma empresa com uma grande frota
de carros. Eles alugam o táxi por um período de 12 horas, com começo
sempre às cinco, seja da madrugada ou da tarde.20 O taxista paga um valor
fixo para alugar o carro e precisa devolvê-lo com o tanque de combustível
cheio. Ele guarda todo o dinheiro que ganha com a marcação do
taxímetro, mais as gorjetas. Começamos a perguntar aos motoristas: “Como
você decide quando dar o dia por encerrado? Doze horas é muito tempo
para guiar no trânsito de Nova York, especialmente tendo que ficar de olho
para pegar possíveis passageiros. Alguns taxistas disseram que adotaram
uma estratégia de meta de receita. Estabeleciam uma meta de quanto
dinheiro queriam ganhar depois de pagar pelo carro e pelo combustível, e
encerravam o dia após atingir a meta.
A pergunta a respeito de quanto trabalhar estava relacionada com um
projeto sobre o qual Colin, George Loewenstein e eu vínhamos refletindo;
chamamos de projeto “esforço”. Havíamos discutido a ideia por algum
tempo e feito alguns experimentos de laboratório, mas ainda precisávamos
achar um ângulo que nos agradasse. Decidimos que estudar a real tomada
de decisão de taxistas era aquilo que estávamos procurando.21
Todos os taxistas mantinham um registro de cada corrida numa folha de
papel, que chamavam de planilha de corrida. A informação registrada
incluía a hora em que o taxista pegava o passageiro, o destino e o valor da
corrida. A planilha também incluía a hora que o taxista devolvia o carro.
De algum modo, Colin conseguiu achar o gerente de uma dessas empresas
de táxi que concordou em nos deixar fazer cópias de uma pilha dessas
planilhas de corrida. Mais tarde suplementamos esse conjunto de dados
com outros dois que obtivemos do encarregado da New York City Taxi and
Limousine. A análise dos dados ficou complicada, então recrutamos Linda
Babcock, uma economista do trabalho e graduada pelo acampamento de
verão Russell Sage, com boas habilidades econométricas.
A questão central formulada pelo artigo é se taxistas trabalham mais
tempo em dias em que o ganho efetivo é mais alto. O primeiro passo é
mostrar que ocorrem dias de ganhos mais altos e mais baixos, e que os
ganhos mais tarde no dia podiam ser preditos pelos ganhos durante a
primeira parte do dia. Isso é verdade. Em dias movimentados, os taxistas
ganham mais por hora e podem esperar ganhar mais se trabalharem uma
hora adicional. Tendo estabelecido isso, olhamos para a nossa questão
central e obtivemos um resultado que os economistas acharam chocante.
Quanto mais alto o ganho, menos os taxistas tinham trabalhado.22
O básico da economia nos diz que curvas de demanda são descendentes
e curvas de oferta são ascendentes. Ou seja, quanto mais alta a
remuneração, maior o trabalho fornecido. Aqui estávamos encontrando
exatamente o resultado oposto! É importante esclarecer exatamente o que
esses resultados dizem e o que não dizem. Como outros economistas,
acreditávamos que, se os ganhos dos taxistas dobrassem, mais pessoas
gostariam de guiar táxis como meio de vida. E mesmo quando há razões
para se pensar que o dia vai ser movimentado, menos taxistas decidirão
tirar folga nesse dia. Até mesmo economistas comportamentais acreditam
que as pessoas compram menos quando o preço sobe e fornecem mais
quando a remuneração sobe. Mas, ao decidir quanto tempo trabalhar num
determinado dia, os taxistas estavam caindo numa cilada de
enquadramento estreito sobre seus ganhos um dia de cada vez, e isso os
levava a cometer o erro de trabalhar menos em dias bons que em dias
ruins.23
Bem, nem todos os taxistas cometiam esse erro. Guiar um táxi é uma
experiência de aprendizagem tipo Feitiço do tempo, na qual a mesma coisa
acontece todo dia, e os taxistas parecem aprender a superar esse viés com o
tempo. Descobrimos que, se dividíssemos cada uma das nossas amostras
pela metade de acordo com o tempo de profissão dos sujeitos como
taxistas, em cada caso os mais experientes se comportavam de maneira
mais sensata. Na maior parte, trabalhavam mais tempo quando a
remuneração era mais alta, e não mais baixa. Mas é claro, isso torna o
efeito ainda mais forte do que a média no caso dos motoristas
inexperientes, que parecem ter uma meta de ganhos e, quando atingem
essa meta, vão para casa.
Para relacionar isso com o enquadramento estreito, suponha que os
taxistas mantivessem o controle de seus ganhos em uma base mensal em
vez de diária. Se decidissem trabalhar durante o mesmo tempo todo dia,
ganhariam cerca de 5% a mais do que ganham na nossa amostra. E se
trabalhassem mais em dias bons e menos em dias ruins, ganhariam 10% a
mais durante a mesma quantidade de horas. Desconfiamos que,
especialmente para taxistas inexperientes, a meta de ganho diária age como
um dispositivo de autocontrole. “Continue trabalhando até atingir sua
meta ou se esforce até o máximo de 12 horas” é uma regra fácil de seguir, e
também para justificar para si mesmo ou para a esposa esperando em casa.
Imagine, em vez disso, ter que explicar que você largou cedo hoje porque
não ganhou muito dinheiro. Será uma longa conversa, a não ser que a
esposa seja economista.
O artigo sobre os táxis também foi publicado naquele número especial
do Quarterly Journal of Economics dedicado à memória de Amos.
VI
FINANÇAS
1983 – 2003
Além da discussão do meu trabalho com Benartzi sobre o equity premium
puzzle, deixei algo de fora da história até agora: a investigação de
fenômenos comportamentais em mercados financeiros. Esse era,
apropriadamente, um tópico arriscado de se lidar, mas que oferecia a
oportunidade de grandes recompensas. Nada contribuiria mais para a
causa da economia comportamental do que demonstrar quais vieses
comportamentais têm importância em mercados financeiros, onde não há
somente altas somas em jogo, mas também amplas oportunidades para
investidores profissionais explorarem os erros cometidos por outros.
Qualquer não Econ (amadores) ou comportamento não Econ (até mesmo
por especialistas) não deveria, teoricamente, ter nenhuma chance de
sobrevivência. O consenso entre economistas, e sobretudo entre aqueles
que se especializaram em economia financeira, era que seria menos
provável encontrar evidências de comportamento desviante em mercados
financeiros. O simples fato de mercados financeiros serem o lugar menos
provável para abrigar anomalias comportamentais significava que uma
vitória ali chamaria a atenção das pessoas. Ou, como meu amigo
economista Tom Russell me disse uma vez, as finanças eram como Nova
York na famosa canção de Frank Sinatra: “If you can make it there, you
can make it anywhere.”
Mas o smart money era apostar contra a possibilidade de conseguirmos
alguma coisa perto de “New York, New York”. Era provável que ficássemos
encalhados em Ithaca, estado de Nova York.
21

O CONCURSO DE BELEZA

É difícil descrever quanto as pessoas estavam em dúvida em relação a


estudar a economia comportamental de mercados financeiros. Uma coisa
era alegar que consumidores fazem coisas estranhas, mas o mercado
financeiro era considerado um lugar onde comportamento tolo não movia
uma vírgula nos preços do mercado. A maioria dos economistas partia da
hipótese — e era uma boa hipótese — de que, mesmo que algumas pessoas
cometessem erros com seu dinheiro, umas poucas pessoas espertas podiam
negociar contra elas e “corrigir” os preços — de modo que não haveria
efeito sobre os preços do mercado. A hipótese do mercado eficiente,
mencionada no Capítulo 17 sobre a conferência na Universidade de
Chicago, era considerada como fato pela profissão. Na verdade, quando
comecei a estudar a psicologia do mercado financeiro nos idos da década
de 1980, Michael Jensen, meu colega na escola de negócios de Rochester,
havia acabado de escrever: “Acredito que não haja nenhuma outra
proposição em economia que tenha mais evidência empírica sólida a
sustentando do que a hipótese do mercado eficiente.”1
O termo “hipótese do mercado eficiente” (HME) foi cunhado por
Eugene Fama, economista da Universidade de Chicago. Fama é uma
lenda viva não só para os economistas financeiros, mas também na Malden
Catholic High School, perto de Boston, Massachusetts, onde foi eleito para
o hall da fama do mundo esportivo, uma das suas conquistas mais
valorizadas.2 Depois de se graduar em francês pela Tufts University, Fama
foi para a pós-graduação na Universidade de Chicago. Ele era um talento
tão óbvio que a escola lhe ofereceu um emprego no corpo docente ao se
graduar (algo extremamente inusitado), e ele nunca saiu de lá. A Booth
School of Business recentemente celebrou o quinquagésimo aniversário
dele como membro do corpo docente. Merton Miller e ele eram os líderes
intelectuais do grupo de finanças em Chicago até Miller morrer. Ainda
hoje, Fama leciona a primeira matéria ensinada aos alunos de doutorado,
para garantir que eles comecem da forma correta.
A HME tem dois componentes, que estão um tanto relacionados, mas
são conceitualmente distintos.3 Um componente diz respeito à
racionalidade dos preços; o outro diz respeito à possibilidade de “vencer o
mercado”. (Mais adiante abordarei um pouco a maneira como os dois
conceitos estão relacionados.)
Chamo a primeira dessas proposições de “o preço está certo”, um termo
para descrever o mercado de ações que ouvi sendo usado pela primeira vez
por Cliff Smith, um colega da Universidade de Rochester. Cliff podia ser
ouvido berrando na classe no seu forte sotaque sulista: “O preço está
ceeeeerto!” Essencialmente, a ideia é que qualquer ativo será vendido pelo
seu “valor intrínseco” verdadeiro. Se a avaliação racional de uma
companhia é de US$100.000.000,00, a ação será negociada de maneira tal
que o valor de mercado da empresa seja US$100.000.000,00. Esse
princípio é considerado válido tanto para títulos individuais como para o
mercado em geral.
Durante anos, os economistas financeiros viveram com uma falsa
sensação de segurança gerada pela ideia de que o componente o preço está
certo da HME não podia ser testado diretamente — razão pela qual é
chamado de hipótese. O valor intrínseco, ponderavam eles, não é
observável. Afinal, a quem cabe dizer qual é realmente o preço correto de
uma ação da General Electric, da Apple ou da Dow Jones Industrial
Average? Não há meio melhor de gerar confiança em uma teoria do que
acreditar que ela não é testável. Fama tende a não enfatizar esse
componente da teoria, mas sob muitos aspectos ele é a parte mais
importante da HME. Se os preços estão “certos”, nunca pode haver bolhas.
Se alguém conseguisse refutar esse componente da teoria, seria uma
grande notícia.4
A maior parte da pesquisa acadêmica sobre HME dos primeiros tempos
enfatizava o segundo componente da teoria, que chamo de princípio “não
existe almoço grátis” — a ideia de que não há maneira de vencer o
mercado. Mais especificamente, diz que, como toda informação disponível
ao público é refletida nos preços correntes das ações, é impossível prever
confiavelmente os preços futuros e ter lucro.
O argumento que sustenta essa hipótese é intuitivamente atraente.
Suponha que uma ação esteja sendo vendida por US$30,00 a unidade, e
eu sei com certeza que será vendida por US$35,00 em breve. Então seria
fácil ficar fabulosamente rico comprando ações a preços inferiores a
US$35,00 e depois vendê-las quando minha predição se realizasse. Mas é
claro que, se a informação que estou usando para fazer a predição é
pública, então é improvável que eu seja o único a perceber isso. Logo que
a informação ficar disponível, todo mundo de posse dessa notícia começará
a comprar ações, e o preço saltará quase instantaneamente para US$35,00,
fazendo com que a oportunidade de lucro seja fugaz. Essa lógica é
convincente, e os primeiros testes da teoria pareciam confirmá-la. Em
alguns casos, a tese de doutorado de Michael Jensen5 fornecia a análise
mais convincente. Ela mostrava que gestores financeiros profissionais não
têm desempenho melhor que as simples médias de mercado, um fato que
permanece verdadeiro até hoje. Se os profissionais não conseguem vencer
o mercado, quem consegue?

––––––––

É um tanto surpreendente que a hipótese do mercado eficiente não tenha


sido formalmente proposta antes da década de 1970, considerando que ela
se baseia nos mesmos princípios de otimização e equilíbrio que outros
campos da economia adotaram muito mais cedo. Uma possível explicação
é que a economia financeira como campo foi um pouco mais lenta para se
desenvolver do que outros ramos da economia.
Finanças é um ramo da economia altamente respeitado, e numerosos
Prêmios Nobel foram concedidos a economistas cujo trabalho principal
era sobre finanças, incluindo um prêmio recente de 2013.6 Mas nem
sempre foi assim. Embora alguns dos gigantes intelectuais do campo —
tais como Kenneth Arrow, Paul Samuelson e James Tobin — tenham
feito, todos eles, importantes contribuições para a economia financeira nos
anos 1950 e 1960, finanças não era um tópico da corrente principal nos
departamentos de economia. E antes da década de 1970, o campo de
finanças nas faculdades era mais ou menos um deserto acadêmico. Cursos
de finanças eram muitas vezes semelhantes a cursos de contabilidade, onde
os estudantes aprendiam os melhores métodos para descobrir que ações
eram um bom investimento. Havia pouca coisa em termos de teoria, e
ainda menos em termos de trabalho empírico rigoroso.
A economia financeira moderna começou com teóricos como Harry
Markowitz, Merton Miller e William Sharpe, mas o campo como
disciplina acadêmica decolou por causa de dois fatores-chave de
desenvolvimento: poder computacional barato e ótimos dados. O grande
progresso nos dados ocorreu na Universidade de Chicago, onde a escola de
negócios recebeu uma verba de US$300.000,00 para desenvolver uma base
de dados de preços de ações remontando até 1926. Isso deslanchou um
núcleo de pesquisa em preços de títulos mobiliários, o Center for Research
in Security Prices, também conhecido como CRSP (pronuncia-se “crisp”).
O CRSP liberou sua primeira base de dados em 1964, e a pesquisa no
campo decolou imediatamente, com os economistas locais na
Universidade de Chicago liderando o caminho. Entre esses, os mais
importantes eram Miller, Fama e um grupo excepcional de estudantes de
pós-graduação, incluindo Michael Jensen, Richard Roll (distinto estudioso
e professor de longa data na UCLA) e Myron Scholes, o coinventor do
modelo Black-Scholes de Precificação de Opções. A pesquisa avançou
rapidamente. Já em 1970, a teoria e as evidências sustentando a HME
estavam tão estabelecidas que Fama pôde publicar uma abrangente
resenha da literatura que, por muitos anos, foi a bíblia do mercado
eficiente. E apenas oito anos depois de Fama ter fincado esse alicerce,
Jensen viria a publicar a frase declarando provada a hipótese do mercado
eficiente. Ironicamente, a frase aparece no prefácio de um número
especial do Journal of Financial Economics dedicado a anomalias, isto é,
artigos reportando supostos desvios da hipótese do mercado eficiente.
A confiança que Jensen e outros tinham na HME talvez estivesse
baseada tanto na irresistível lógica da ideia quanto nos dados empíricos.
Quando se tratava de mercados financeiros, a ideia da mão invisível era
extremamente convincente e ninguém oferecia muita resistência. Além
disso, os anos 1970 foram um período no qual uma revolução similar
estava ocorrendo em macroeconomia. Modelos baseados em expectativas
racionais estavam em alta e a popularidade da economia keynesiana entre
economistas acadêmicos estava em declínio. Talvez por essa razão, os
escritos de Keynes não fossem mais leitura obrigatória para alunos de pós-
graduação. Isso é uma infelicidade, pois, se estivesse vivo, Keynes poderia
ter tornado o debate mais equilibrado. Ele foi um verdadeiro precursor das
finanças comportamentais.

––––––––

Keynes é agora lembrado primordialmente por suas contribuições para a


macroeconomia e, de forma especial, pelo seu controverso argumento de
que governos deveriam usar política fiscal para estimular a demanda
durante recessões ou depressões. Independentemente da sua opinião sobre
a macroeconomia keynesiana, você seria tolo de desprezar as ideias dele
sobre mercados financeiros.7 Para mim, o capítulo mais perspicaz do seu
famosíssimo livro A teoria geral do emprego, do juro e da moeda é dedicado
a esse tema. As observações de Keynes se baseavam em parte na sua
considerável experiência como investidor. Por muitos anos, ele
administrou com sucesso o portfólio da sua faculdade em Cambridge,
onde foi pioneiro da ideia de fundos investindo em ações.
Como discutimos anteriormente, diversos economistas da sua geração
tinham intuições muito boas sobre o comportamento humano, mas Keynes
era particularmente perspicaz nessa área. Ele achava que as emoções, ou o
que chamou de “espíritos animais”, desempenhavam um papel importante
na tomada de decisão individual, inclusive em decisões de investimentos.
Era interessante que Keynes considerasse os mercados mais “eficientes” —
para usar a palavra moderna — em um período anterior, no começo do
século XX, quando os gerentes possuíam a maioria das ações de uma
empresa e sabiam quanto a empresa valia. Ele acreditava que, à medida
que as ações se tornavam mais espalhadas, “o elemento de conhecimento
real na avaliação de investimentos por parte daqueles que as possuem ou
contemplam adquiri-las... declinava seriamente.”8
Na época em que estava escrevendo Teoria geral, em meados da década
de 1930, Keynes havia concluído que os mercados tinham ficado meio
loucos. “Flutuações diárias nos lucros de investimentos existentes, que são
obviamente de caráter efêmero e não significativo, tendem a ter uma
influência absolutamente excessiva, e até mesmo absurda, sobre o
mercado.”9 Para reforçar seu ponto, observou o fato de que as ações de
companhias de gelo eram mais altas nos meses de verão, quando as vendas
são mais altas. Esse fato é surpreendente porque os preços das ações
refletem o valor da empresa no longo prazo em um mercado eficiente,
valor este que não deveria refletir o fato de que o verão é quente e que o
inverno é frio. Um padrão sazonal previsível como esse nos preços das
ações é estritamente proibido pela HME.10
Keynes também era cético de que gestores profissionais pudessem fazer
o papel do “smart money”, no qual os defensores da HME se apoiam para
manter os mercados eficientes. Ao contrário, achava que os profissionais
tinham maior probabilidade de serem levados por uma onda de
exuberância irracional do que de combatê-la. Um dos motivos é que é
arriscado se opor à onda. “A sabedoria mundana ensina que é melhor para
a reputação falhar convencionalmente do que ter êxito sem ser
convencional.”11 Em vez disso, Keynes achava que os gestores de dinheiro
profissionais jogavam um intrincado jogo de adivinhação. Ele comparou
escolher as melhores ações com uma competição comum na cena
financeira londrina dominada por homens nos anos 1930: escolher os
rostos mais bonitos de um conjunto de fotografias:

O investimento profissional pode ser comparado àquelas


competições organizadas por jornais em que os concorrentes
precisam escolher os seis rostos mais bonitos dentre uma centena de
fotografias, sendo o prêmio concedido ao competidor cuja escolha
fique mais próxima às preferências médias dos competidores como
um todo. Então cada concorrente precisa escolher não aqueles rostos
que ele próprio acha os mais bonitos, mas aqueles que ele acha que
têm maior probabilidade de captar a imaginação dos outros
concorrentes, todos eles olhando o problema do mesmo ponto de
vista. Não é o caso de escolher aqueles que, segundo seu próprio
juízo, sejam realmente os mais bonitos, nem mesmo aqueles que a
opinião média genuinamente considera os mais bonitos. Chegamos
ao terceiro degrau, onde dedicamos a nossa inteligência a antecipar o
que a opinião média espera que seja a opinião média. E existem
aqueles, creio, que praticam o quarto, quinto e ainda outros degraus
mais altos.12

Acredito que a analogia de Keynes com o concurso de beleza


permanece uma boa descrição de como os mercados financeiros
funcionam, bem como o papel-chave desempenhado por fatores
comportamentais, embora possa ser um pouco difícil mudar a sua cabeça.
Para compreender a essência da analogia e apreciar sua sutileza, tente o
seguinte quebra-cabeça:

Adivinhe um número de 0 a 100 com o objetivo de escolher o valor


mais próximo de 2/3 do valor médio de todos os que participam desta
disputa.

Para ajudar você a pensar nesse quebra-cabeça, suponha que haja três
jogadores cujos palpites foram 20, 30 e 40 respectivamente. O palpite
médio seria 30, cujos 2/3 seria 20, então a pessoa que chutou 20 ganharia.
Dê um palpite antes de continuar. Realmente, você deve experimentar:
o resto deste capítulo será mais divertido se você mesmo tiver
experimentado o jogo.
Há alguma coisa que você gostaria de perguntar antes de chutar seu
palpite? Se houver, o que seria? Voltaremos a você em um minuto. Agora,
vamos ponderar como alguém poderia pensar em como jogar esse jogo.
Considere o que chamarei de pensador nível zero. Ele diz: “Não sei,
mas isso parece um problema de matemática e eu não gosto de problemas
de matemática, especialmente problemas com palavras. Acho que vou
chutar um número ao acaso.” Um monte de gente chutando números de 0
a 100 ao acaso irá produzir um palpite médio de 50.
E uma pensadora de primeiro nível? Ela diz: “O resto dos jogadores não
gosta de pensar muito, provavelmente escolherão um número ao acaso, o
que dará uma média de 50, então eu deveria chutar 33, dois terços de 50.”
Um pensador de segundo nível dirá algo do tipo: “A maioria dos
jogadores será de pensadores de primeiro nível e acharão que os outros
jogadores serão meio fracos, então vão chutar 33. Portanto eu chuto 22.”
Uma pensadora de terceiro nível: “A maioria dos jogadores vai discernir
como o jogo funciona e descobrirá que a maioria chutará 33. Como
resultado chutarão 22, então vou chutar 15.”
É claro que não há lugar conveniente para saltar desse trem de
pensamento. Quer mudar o seu palpite?
Aqui está outra pergunta para você: qual é o equilíbrio de Nash para
este cenário? Batizado em homenagem a John Nash, o tema do popular
livro (e filme biográfico) Uma mente brilhante,13 o equilíbrio de Nash
nesse jogo é um número que, se todo mundo chutasse, ninguém gostaria
de mudar seu palpite. E o único equilíbrio de Nash nesse jogo é zero. Para
entender por quê, suponha que todo mundo tenha chutado 3. Então o
palpite médio seria 3 e você chutaria dois terços de 3, que é 2. Mas se todo
mundo chutasse 2 você iria querer chutar 1,33 e assim por diante. Se, e
somente se, todos os participantes chutassem zero, ninguém gostaria de
mudar seu palpite.
Talvez você já tenha agora formulado a pergunta que poderia ter valido
a pena fazer antes de apresentar seu palpite: quem são os outros jogadores,
e quanto eles sabem de matemática e teoria dos jogos? Se você está
jogando no seu bar local, especialmente tarde da noite, as outras pessoas
provavelmente não estão pensando com tanta profundidade, então você
poderia chutar por volta de 33. Se você está numa conferência de teóricos
dos jogos, com certeza gostaria de chutar um número perto de zero.
Agora vejamos como esse jogo está relacionado com o concurso de
beleza de Keynes. Formalmente, as configurações são idênticas. No jogo
de adivinhar o número, você precisa adivinhar o que outras pessoas estão
pensando que outras pessoas estão pensando, exatamente como no jogo de
Keynes. Na verdade, em economia, é comum chamar o “jogo de adivinhar
o número” de “concurso de beleza”.14
O primeiro estudo experimental desse delicioso jogo foi feito pela
economista alemã Rosemarie Nagel,15 que leciona na Universidade
Pompeu Fabra, de Barcelona. Graças ao jornal Financial Times, em 1997
tive a oportunidade de replicar seus achados em um experimento de larga
escala. O FT havia me pedido para escrever um breve artigo sobre finanças
comportamentais, e eu quis usar o jogo de adivinhar o número para ilustrar
o concurso de beleza de Keynes. Então tive uma ideia: será que, algumas
semanas antes de meu artigo aparecer, eles poderiam publicar o jogo na
forma de competição? Dessa maneira, eu poderia apresentar dados
recentes dos leitores do FT junto com meu artigo. O FT concordou, e a
British Airways ofereceu como prêmio duas passagens de Londres para os
Estados Unidos na classe executiva. Com base no que você sabe agora,
qual seria o seu palpite para esse público?
O palpite vencedor foi 13. A distribuição dos palpites é mostrada na
Figura 10. Como você pode ver, muitos leitores do Financial Times foram
suficientemente perspicazes para descobrir que zero era o equilíbrio de
Nash para esse jogo,16 mas também tinham muito poucas pistas para achar
que seria o palpite vencedor.17 Houve também algumas pessoas que
chutaram 1, permitindo a possibilidade de que alguns palermas “não
entendessem” totalmente e então subir a média para acima de zero.18

Muitos pensadores de primeiro e segundo nível chutaram 33 e 22. Mas


e os palpites de 99 e 100; qual era a desses caras? Descobrimos que todos
vinham de uma residência estudantil na Universidade de Oxford. Os
concorrentes estavam limitados a uma única participação, mas alguém a
fim de aprontar tinha preenchido cartões em nome de todos seus colegas
da casa. Coube a meus assistentes de pesquisa e a mim resolver se tais
participações eram válidas. Decidimos que, como cada cartão tinha um
nome diferente de participante, nós os aceitaríamos, e coletivamente eles
mudaram o palpite vencedor de 12 para 13. Por sorte, ninguém naquela
casa havia chutado 13.
Pedimos aos participantes que escrevessem uma breve explicação da sua
lógica, que usaríamos como critério de desempate. Suas explicações
forneceram um bônus inesperado. Algumas eram bastante inteligentes.19
Houve um poeta que chutou zero: “So behaviourists observe a bod, an
FT reader, ergo clever sod, he knows the competition and will fight’em, so
reduces the number ad infinitum.” [“Assim comportamentalistas observam
um corpo, um leitor do FT, ergo sujeito esperto, ele conhece a competição
e os combaterá, então reduz o número ad infinitum.”]
E eis aqui um membro do partido conservador que, tendo decidido que
o mundo não pode ser considerado racional, chutou 1:
“A resposta deveria ser nada [0] . . . mas os trabalhistas ganharam.”
Um estudante que chutou 7 justificou sua escolha: “Porque o meu pai
tem um conhecimento médio sobre números e mercados, e ele desistiu
quando chegou a 10.” Note que, como muitos jovens, ele subestimou seu
pai. Se tivesse dado crédito ao pai por raciocinar um nível além do
competidor médio, poderia ter ganhado!
Finalmente, outro poeta que chutou 10: “Over 67 only interests fools; so
over 45 implies innumeracy rules. 1 to 45 random averages 23. So logic
indicates 15, leaving 10 to me.” [“Acima de 67 interessa apenas aos tolos;
então acima de 45 implica regras de desconhecimento de números. 1 a 45
ao acaso dá média 23. Então a lógica indica 15, deixando 10 para mim.”]
Conforme ilustrado por todos esses adivinhadores do FT, com vários
níveis diferentes de sofisticação, vemos que a analogia do concurso de
beleza de Keynes ainda é uma apta descrição do que os gestores de
dinheiro tentam fazer. Muitos investidores se autodenominam “gestores de
valor”, indicando que tentam comprar ações que estão baratas. Outros se
autodenominam “gestores de crescimento”, indicando que tentam
comprar ações que crescerão rapidamente. Mas é claro que ninguém
busca comprar ações que estejam caras nem ações de empresas que vão
encolher. Então, o que todos esses gestores estão realmente tentando fazer?
Estão tentando comprar ações que subirão de valor — ou, em outras
palavras, ações que eles consideram que outros investidores posteriormente
decidirão que deveriam valer mais. E esses outros investidores, por sua vez,
estão fazendo suas próprias apostas em avaliações futuras de outros.
Não há problema em comprar uma ação que o mercado não aprecia
totalmente hoje, contanto que o resto do mercado vá logo ao encontro de
seu ponto de vista! Lembre-se de outra famosa frase de Keynes: “A longo
prazo, todos estaremos mortos.”20 E o longo prazo típico para o gestor de
um portfólio não é mais do que uns poucos anos — talvez até mesmo
poucos meses!
22

A REAÇÃO DO MERCADO DE AÇÕES É EXAGERADA?

A oportunidade de fazer alguma pesquisa sobre mercados financeiros me


foi possibilitada por Werner de Bondt, o primeiro estudante de pós-
graduação que convenci a se juntar a mim no estudo de psicologia e
economia. Conheci Werner no outono de 1978, meu primeiro semestre
em Cornell. Werner, um estudante belga de intercâmbio, foi de longe o
melhor aluno da classe para a qual dei aulas sobre economia e políticas
públicas naquele outono, e voltou a se sobressair em outro curso que dei
na primavera. Incentivei-o a continuar seus estudos e entrar no doutorado,
o que ele fez depois de servir um período no exército belga. Só tínhamos
um problema: o verdadeiro amor de Werner eram finanças, um tópico
sobre o qual eu sabia muito pouco.
Felizmente, embora eu nunca tivesse feito um curso de finanças, havia
aprendido o básico quando estava no corpo docente da escola de pós-
graduação em negócios da Universidade de Rochester. Muitos dos
principais membros da faculdade estavam em finanças, e o tópico
permeava o lugar. Meu plano era supervisionar a tese de Werner se
conseguíssemos bolar um jeito de injetar psicologia na mistura, e a
faculdade de finanças asseguraria que usássemos todos os métodos de
economia financeira geralmente aceitos para que, no improvável caso de
tropeçarmos em algo interessante, os resultados fossem levados a sério.
Alguns dos meus colegas me disseram que eu estava cometendo
negligência professoral ao incentivar Werner a perseguir esse tópico, mas
ele não estava preocupado. De Bondt era — e ainda é — um verdadeiro
intelectual, interessado apenas em encontrar a verdade. Então aprendemos
finanças juntos, com ele responsável pela maior parte do ensino.
Para sua tese, Werner queria pegar uma hipótese da psicologia e usá-la
para fazer uma predição sobre algum efeito já ocorrido no mercado de
ações, mas que não fora observado. Havia coisas mais fáceis para tentar.
Por exemplo, ele poderia ter oferecido uma explicação comportamental
plausível para algum efeito já observado no mercado de ações, como
Benartzi e eu tínhamos feito para explicar por que as ações obtêm
rendimentos muito mais altos do que títulos (o equity risk premium). Mas o
problema com uma explicação nova para um efeito antigo é que é difícil
provar que a sua explicação está correta.
Peguemos, por exemplo, o alto volume de negócios em mercados de
títulos. Em um mundo racional não haveria muitos negócios — na
verdade, quase nenhum. Os economistas às vezes chamam isto de teorema
de Groucho Marx.1 Uma frase famosa de Groucho diz que ele jamais
gostaria de ser sócio de um clube que o aceitasse como sócio. A versão dos
economistas dessa piada — previsivelmente, não tão engraçada — é que
nenhum agente racional desejará comprar uma ação que algum outro
agente racional esteja querendo vender. Imagine que dois analistas
financeiros, Tom e Jerry, estejam jogando uma rodada de golfe. Tom
menciona que está pensando em comprar 100 ações da Apple. Jerry diz
que isso é conveniente, pois estava justamente pensando em vender 100
ações. “Poderia vender as minhas ações a você e evitar a comissão do
corretor.” Antes de chegarem a um acordo sobre o negócio, ambos pensam
melhor. Tom percebe que Jerry é um cara esperto, então se pergunta: por
que será que ele está vendendo? Jerry está pensando a mesma coisa sobre
Tom, então resolvem desfazer o negócio. De maneira semelhante, se todo
mundo acreditasse que toda ação já está no seu preço correto — e sempre
estivesse no preço correto —, não haveria muito sentido em negociá-las,
pelo menos não com a intenção de vencer o mercado.
Ninguém adota de forma literal a versão extrema deste “teorema de
nenhuma troca” (no trade theorem), mas a maioria dos analistas financeiros
concorda, pelo menos quando pressionados, que o volume de negócios é
surpreendentemente alto. Em um modelo racional há lugar para
diferenças de opinião sobre o preço, mas é difícil explicar por que ações
trocariam de mãos a uma taxa de 5% ao mês2 em um mundo de Econs.
Entretanto, se você admite que alguns investidores têm excesso de
confiança, o alto volume de negócios emerge naturalmente. Jerry não tem
problema em fazer negócio com Tom, porque pensa que é mais esperto
que ele, e Tom pensa que é mais esperto que Jerry. Eles negociam
alegremente, cada um sentindo uma pontada de culpa por tirar vantagem
da falta de bom senso do amigo.
Considero altamente plausível a explicação do excesso de confiança
para explicar por que observamos um volume tão elevado de negócios, mas
também é impossível provar que esteja correta. Werner e eu queríamos
fazer algo mais convincente. Queríamos usar uma descoberta da psicologia
para predizer algo desconhecido acerca dos mercados financeiros e,
melhor ainda, algo que os economistas financeiros achavam que não
pudesse acontecer. Fácil, fácil.
Nosso plano era usar uma descoberta de Kahneman e Tversky: que as
pessoas estão dispostas a fazer previsões extremas baseadas em dados
frágeis. Em um dos experimentos clássicos da dupla ilustrando esse ponto,
os sujeitos foram solicitados a predizer o GPA — grade point average,
similar à média escolar — para um grupo de estudantes com base em um
único fato acerca de cada um. Havia duas condições.3 Em uma delas, os
sujeitos eram informados do decil de GPA dos alunos — isto é, se estava
nos 10% de GPA máximo (decil superior, entre os percentis 90 e 100), nos
10% inferiores seguintes (entre os percentis 80 e 90), e assim por diante. O
outro grupo não foi informado de nada a respeito de notas, e em vez disso
cada aluno teve uma pontuação de decil num teste de “senso de humor”.4
O decil do GPA é um excelente preditor do GPA real, é claro; então se
você tem a informação de que Athena está no decil de GPA superior, pode
predizer de forma razoável que ela tem notas condizentemente altas,
digamos 3,9 em 4,0. Mas qualquer correlação entre senso de humor e GPA
é provavelmente fraca, se é que chega a existir.
Se os sujeitos no experimento de Kahneman e Tversky se comportassem
racionalmente, aqueles em um dado percentil de GPA ofereceriam
predições muito mais extremas (muito altas ou muito baixas) do GPA real
do que aqueles que receberam medições de um teste de senso de humor.
Sujeitos que fossem informados apenas sobre o senso de humor deveriam
fazer previsões que diferem pouco do GPA médio da escola. Em suma,
não deveriam deixar a pontuação do senso de humor influenciar muito sua
predição, se é que deveriam levar isso em conta. Como vemos na Figura
11, isto não acontece. As previsões baseadas no senso de humor são quase
tão extremas quanto as baseadas em decis de GPA. Na verdade, o GPA
predito para alunos que pontuaram no decil superior em senso de humor
foi praticamente o mesmo que o GPA predito daqueles que estavam no
decil superior com base no GPA! Uma maneira de caracterizar esse
resultado é dizer que os sujeitos reagiram exageradamente à informação
sobre o senso de humor dos alunos.
Será que investidores se comportariam da mesma maneira, reagindo a
informações cotidianas “efêmeras e não significativas”, conforme afirmou
Keynes? E, se os investidores realmente incidissem em sobrerreação, como
poderíamos demonstrar isto?
Já existia evidência circunstancial para a sobrerreação, a saber, a antiga
tradição de “investimento em valor”, cujo pioneiro foi o guru Benjamin
Graham, autor dos clássicos de investimento Security Analysis, em
coautoria com David Dodd e publicado pela primeira vez em 1934, e O
investidor inteligente,5 publicado originalmente em 1949. Ambos os livros
ainda estão sendo impressos. Graham, como Keynes, era ao mesmo tempo
investidor profissional e professor. Lecionava na Universidade de
Columbia, onde um de seus alunos foi o lendário investidor Warren
Buffett, que considera Graham seu herói intelectual. Graham é
frequentemente considerado o pai do “investimento em valor”, no qual o
objetivo é encontrar títulos que estejam com preço abaixo do seu valor
intrínseco de longo prazo. O truque está em saber como fazer isso.
Quando é que uma ação está “barata”? Uma das medidas simples que
Graham advogava para decidir se uma ação estava barata ou cara era a
razão preço/lucro (P/E – price/earnings), o preço por ação dividido pelos
ganhos anuais por ação. Se a razão P/E for alta, os investidores estão
pagando muito por dólar de ganhos e, implicitamente, uma razão P/E alta
é uma previsão de que os ganhos crescerão rapidamente para justificar o
preço elevado atual. Se os ganhos deixarem de crescer com a rapidez
prevista, o preço da ação cairá. E, inversamente, para uma ação com razão
P/E baixa, o mercado está prevendo que os ganhos permanecerão baixos,
ou até mesmo cairão. Se os ganhos aumentarem, ou até mesmo
permanecerem estáveis, o preço da ação subirá.
Na última edição de O investidor inteligente escrita quando Graham
ainda estava vivo (desde então, outros revisaram o livro), ele inclui uma
tabela simples ilustrando a eficácia da sua abordagem. Começando por
1937, ele pegou 30 ações incluídas na Dow Jones Industrial Average
(algumas das maiores empresas dos Estados Unidos) e as classificou com
base no P/E. Então formou dois portfólios — um com as 10 ações com
P/Es mais altos e outra com as 10 ações com P/Es mais baixos — e mostrou
que as ações “baratas” tinham um desempenho superior às do grupo caro
por uma margem impressionante. Ao longo do período de 1937 a 1969,
um investimento de US$10.000,00 nas ações baratas teria aumentado seu
valor para US$66.900,00, enquanto o portfólio de ações mais caras só teria
aumentado para US$25.300,00. (A compra do portfólio original de 30
ações6 teria produzido US$44.000,00.) Implicitamente, Graham estava
oferecendo uma espécie de explicação comportamental para essa
descoberta. Ações baratas eram impopulares ou desprezadas, enquanto
ações caras eram bem consideradas. Sendo do contra, argumenta Graham,
você poderia vencer o mercado, embora não o tempo todo. Graham
observou que sua estratégia de comprar as integrantes mais baratas do
índice Dow Jones não teria dado certo durante o período anterior, 1917-33,
e advertiu que “Subavaliações causadas por descuido ou preconceito
podem persistir por um tempo inconvenientemente longo, e o mesmo se
aplica a preços inflados por excesso de entusiasmo ou estimulações
artificiais.”7 Esse conselho merecia ser seguido durante a bolha tecnológica
do fim dos anos 1990, quando o investimento em valor teve um
desempenho espetacularmente ruim, já que a maioria das ações caras, as
queridinhas da internet, continuava aumentando de preço, deixando para
trás aquelas ações de valor sem graça.
Muitos na comunidade de investimentos reverenciavam Benjamin
Graham, porém, no começo dos anos 1980, a maioria dos economistas
financeiros acadêmicos considerava seu trabalho ultrapassado. A estratégia
simples de comprar ações “baratas” era obviamente inconsistente com a
hipótese do mercado eficiente, e os métodos de Graham dificilmente eram
“estado de arte”. Os dados para os rendimentos dos vários portfólios Dow
Jones haviam sido sem dúvida construídos à mão. À época os pesquisadores
já tinham arquivos de dados digitais, tais como CRSP para preços de ações
e COMPUSTAT, que coletava dados de contabilidade financeira. Quando
essas duas fontes de dados foram reunidas, estudos muito mais abrangentes
se tornaram possíveis, e resultados como os de Graham, que utilizavam
uma pequena quantidade de ações durante um período de tempo
relativamente curto, passaram a ser considerados pouco mais do que
anedotas.
Não era o caso de alguém ter refutado a alegação de Graham sobre a
eficácia do investimento em valor; a teoria do mercado eficiente dos anos
1970 dizia que o investimento em valor não funcionaria. Mas funcionava.
No fim daquela década, o professor de contabilidade Sanjoy Basu publicou
um estudo competente do início ao fim sobre o investimento em valor que
sustentava por completo a estratégia de Graham. No entanto, para
conseguir ter tais artigos publicados naquela época, era preciso oferecer
desculpas abjetas pelos resultados. Eis como Basu terminava seu artigo:
“Em conclusão, o comportamento dos preços de títulos ao longo do
período de catorze anos estudado talvez não seja completamente descrito
pela hipótese do mercado eficiente.”8 Só faltou ele dizer “Sinto muito”.
De maneira similar, um dos alunos de Eugene Fama na Universidade de
Chicago, Rolf Banz, descobriu outro achado anômalo, a saber, que
portfólios de empresas pequenas tinham desempenho melhor que
portfólios de empresas grandes. Aqui está a sua própria conclusão
expiatória do artigo publicado em 1981: “Dada sua longevidade, não é
provável que isso se deva a uma ineficiência do mercado, mas é mais
evidência de uma especificação inadequada do modelo de fixação de
preços.”9 Em outras palavras, deveria estar faltando algo no modelo porque
a eficiência do mercado não poderia estar errada.
Um investidor chamado David Dreman fez alegações mais ousadas
relacionadas a Graham. Dreman fundara sua própria companhia de
investimentos e de algum modo tropeçara no trabalho de Kahneman e
Tversky. Ele foi a primeira pessoa a sugerir uma explicação explicitamente
psicológica para o efeito de valor, uma explicação baseada na tendência de
as pessoas extrapolarem no futuro o passado recente. Dreman publicou
suas ideias em 1982 em um livro dirigido para um público popular
chamado The New Contrarian Investment Strategy.10 Ao contrário de Basu
e Banz, ele não pedia desculpas pelas suas ideias, mas como era um livro
para público leigo, não causou grande impressão na comunidade
financeira acadêmica. Mas Werner e eu lemos o livro e tomamos
conhecimento.
Seguindo o pensamento de Dreman, fomos levados a uma hipótese
plausível. Suponha que o “efeito P/E” seja causado por uma sobrerreação:
ações com P/E alto (conhecidas como ações de crescimento porque terão
de crescer feito loucas para justificar seus preços elevados) subiram “alto
demais” porque os investidores fizeram previsões excessivamente otimistas
das taxas de crescimento futuro, e ações com P/E baixo (ou ações de valor)
afundaram “baixo demais” porque os investidores foram excessivamente
pessimistas. Se isso é verdade, os altos rendimentos subsequentes para
ações de valor e baixos rendimentos para ações de crescimento
representam simplesmente uma regressão à média.
Exemplos de regressão à média podem ser encontrados em todos os
aspectos da vida. Se um jogador de basquete marca 50 pontos em um jogo,
um recorde pessoal, é altamente provável que ele pontue menos no jogo
seguinte. De forma semelhante, se marcar três pontos, seu pior jogo em
dois anos, é quase certo que ele se sairá melhor no próximo jogo. Jogadores
de basquete com mais de 2 metros de altura têm filhos altos, mas
geralmente não tão altos quanto os pais. E assim por diante. Werner e eu
acreditamos que o mesmo processo também poderia estar acontecendo no
mercado de ações. Empresas que estão indo bem por vários anos seguidos
criam uma aura insinuando que são “boas empresas” e que continuarão a
crescer rapidamente. Por outro lado, empresas que tenham fracassado
durante vários anos são rotuladas de “empresas ruins”, que não conseguem
fazer nada direito. Pense nisso como um tipo de estereótipo em nível
corporativo. Se esse estereótipo corporativo for combinado com a
tendência de fazer previsões extremas, como no estudo do senso de humor,
você terá uma situação pronta para reversão à média. Essas empresas
“ruins” não são tão ruins quanto parecem e, na média, têm probabilidade
de causar boas surpresas no futuro.
Predizer a reversão à média no mercado de ações não seria uma
hipótese particularmente radical, exceto por uma coisa: a HME diz que
não pode acontecer. O componente o-preço-está-certo diz que os preços
das ações não divergirão do seu valor intrínseco, então, por definição, não
podem estar “baratos”. E o componente não-existe-almoço-grátis diz que
não se pode vencer o mercado porque toda a informação já está refletida
no preço corrente. Como o histórico dos rendimentos das ações e sua razão
P/E são claramente conhecidos, não podem predizer mudanças de preço.
Eles são FSIs. Encontrar evidência de reversão à média constituiria uma
clara violação da HME. Então resolvemos ver se conseguiríamos encontrar
essa evidência.
Nosso estudo era simples. Pegaríamos todas as ações listadas na Bolsa de
Valores de Nova York (que, na época, tinha quase todas as maiores
companhias) e classificaríamos sua performance durante algum período de
tempo longo o suficiente para permitir que os investidores ficassem
exageradamente otimistas ou pessimistas em relação a alguma companhia,
digamos de três a cinco anos. Chamaríamos as ações com melhor
performance de “Vencedoras” e as com pior performance de “Perdedoras”.
Então pegaríamos um grupo das maiores Vencedoras e Perdedoras (as 35
ações mais extremas, digamos) e compararíamos a performance a partir
daí. Se os mercados fossem eficientes, deveríamos esperar que as duas
carteiras tivessem desempenho semelhante. Afinal, de acordo com a HME,
o passado não pode prever o futuro. Mas se a nossa hipótese da
sobrerreação estivesse correta, as Perdedoras teriam performance melhor
que as Vencedoras.
Uma descoberta dessas alcançaria duas coisas. Primeiro, teríamos usado
psicologia para predizer uma nova anomalia. Segundo, estaríamos dando
respaldo para o que chamamos de “sobrerreação generalizada”. Ao
contrário do experimento de Kahneman e Tversky, em que os sujeitos
estavam reagindo exageradamente a medições do senso de humor ao
predizer GPA, não estávamos especificando as causas da sobrerreação dos
investidores. Estávamos simplesmente concluindo que, ao levar o preço de
alguma ação para cima ou para baixo o bastante para torná-la uma das
maiores vencedoras ou perdedoras durante um período de vários anos, os
investidores provavelmente estavam tendo uma sobrerreação a alguma
coisa.
Os resultados apoiaram fortemente a nossa hipótese. Testamos a
sobrerreação de várias maneiras, mas, desde que o período examinado para
criar os portfólios fosse longo o suficiente — três anos, digamos —, o
portfólio Perdedor se saía melhor do que o Vencedor. Muito melhor. Por
exemplo, em um dos testes usamos cinco anos de performance para criar
os portfólios Vencedor e Perdedor, e então calculamos os rendimentos de
cada um durante os cinco anos seguintes, em comparação com o mercado
total. Durante esse período de cinco, os Perdedores tiveram um
desempenho superior ao mercado em cerca de 30%, enquanto os
Vencedores tiveram um desempenho pior que o mercado em cerca de
10%.
Não muito depois de obtermos esses resultados, tivemos um golpe de
sorte. Hersh Shefrin fora chamado para organizar uma sessão do encontro
anual da American Finance Association (AFA) e convidou a Werner e a
mim para apresentarmos nossas descobertas. Naquela época, o Journal of
Finance, órgão de imprensa oficial da AFA, produzia por ano uma edição
inteiramente dedicada a artigos do encontro anual. As coisas funcionavam
assim: a pessoa que organizava a sessão podia indicar um artigo da sessão, e
o presidente em exercício da AFA escolhia alguns desses artigos para
publicação. Os artigos selecionados eram publicados apenas alguns meses
depois, e não passavam pelo processo formal de revisão dos pares. O pobre
Hersh tinha um dilema: deveria recomendar o artigo que apresentaria na
conferência, ou o nosso? (O terceiro artigo na nossa sessão não era elegível
porque já havia sido submetido para publicação.) Hersh combinou a
sabedoria de Salomão com um pouco de chutzpá à moda antiga e sugeriu
ambos os artigos. É aí que entra a sorte. O presidente da Associação
Americana de Finanças naquele ano era o saudoso Fischer Black, o
coinventor da fórmula de precificação Black-Scholes. Black tinha um quê
de rebelde e optou por publicar os dois artigos.
Meu artigo com Werner,11 publicado em 1985, tornou-se bem
conhecido desde então. Mas estou convencido de que, se Hersh não tivesse
oferecido a entrada pela porta dos fundos para a revista, teríamos levado
anos para ter nossos resultados publicados, ou o artigo nunca teria sido
publicado em momento algum. Em primeiro lugar, todo mundo “sabia”
que os nossos resultados — que eram violações claras da HME — só
podiam estar errados, então os pareceristas teriam sido altamente céticos. E
de modo algum teríamos concordado em escrever uma conclusão com um
pedido de desculpas, do tipo que fora impingido ao professor Basu. Werner
era um homem de princípios fortes, e eu era teimoso demais.
23

A REAÇÃO À SOBRERREAÇÃO

Com os fatos averiguados — ações “Perdedoras” tinham, sim, rendimentos


mais altos do que o mercado —, havia somente uma maneira de salvar o
componente não-existe-almoço-grátis da HME, que diz que é impossível
vencer o mercado. A solução para a galera da eficiência de mercado era
recorrer a uma tecnicalidade importante: não é uma violação da hipótese
do mercado eficiente quando você vence o mercado ao assumir mais risco.
A dificuldade é saber como mensurar o risco.
Essa sutileza foi articulada pela primeira vez por Eugene Fama.1 Ele
ressaltou corretamente que todos os testes do componente não-existe-
almoço-grátis da eficiência do mercado eram na realidade “testes
conjuntos” de duas hipóteses: eficiência de mercado e algum modelo de
risco e retorno. Por exemplo, suponha que alguém descobrisse que firmas
novas têm rendimentos mais altos que firmas velhas. Isso aparentemente
seria uma rejeição da eficiência do mercado; como a idade da firma é
conhecida, não pode ser usada para “vencer” o mercado. Mas não seria
uma rejeição definitiva da eficiência do mercado porque alguém
argumentaria plausivelmente que firmas novas são mais arriscadas que
firmas velhas e que rendimentos mais altos são simplesmente uma
compensação que investidores racionais requerem para suportar o risco
adicional.
O argumento da hipótese conjunta se aplica a qualquer violação
aparente da HME, inclusive as de Graham, Basu, Dreman e outros que
alegaram que ações de valor eram bons investimentos. Se nosso portfólio
de Perdedores fosse mais arriscado que o de Vencedores, então a taxa de
rendimento mais alta observada poderia ser a compensação que
investidores racionais exigem para investir em portfólios arriscados. A
questão central passou a ser se deveríamos aceitar nossa interpretação dos
achados como evidência de precificação inadequada2 (mispricing) — o que
vai contra a HME — ou dizer que eram atribuíveis ao risco.
Para responder a essa pergunta, é necessário ter um meio de se
mensurar o risco. Com toda certeza, as ações no portfólio de Perdedores
eram individualmente arriscadas, e algumas dessas empresas efetivamente
poderiam ir à falência. Mas já tínhamos levado em conta esse risco no
nosso estudo. Se alguma das ações em qualquer uma das carteiras fosse
excluída da lista da Bolsa de Valores de Nova York (por causa de falência,
por exemplo), então nosso programa de computador “vendia”
hipoteticamente as ações por qualquer preço que pudesse conseguir se
estivesse listada em alguma outra bolsa, ou então registrávamos o
investimento como perda total. Assim, a possibilidade de ações falirem não
era a fonte oculta de risco capaz de explicar os nossos resultados.
Ainda assim, as ações Perdedoras certamente pareciam arriscadas. E
ações de aspecto arriscado, tais como aquelas cujos preços haviam
despencado, não mereciam uma taxa de retorno mais elevada (um “prêmio
de risco”) no mercado? Você pode pensar assim, mas tal ideia não era
aceitável na economia financeira moderna. Na época, a maneira certa e
apropriada de mensurar o risco de uma ação era usar o modelo de
precificação de ativos financeiros (CAPM – Capital Asset Pricing Model)3
desenvolvido independentemente pelos economistas financeiros John
Lintner e William Sharpe.
De acordo com o CAPM, o único risco que é recompensado em um
mundo racional é o grau em que o rendimento de uma ação está
correlacionado com o resto do mercado. Se você forma um portfólio
composto por um punhado de ações de alto risco cujos preços oscilam
muito, o portfólio em si não será especialmente arriscado se as variações de
preço de cada uma das ações componentes forem independentes entre si,
porque então as variações em média se cancelarão. Mas se os rendimentos
das ações tiverem uma correlação positiva, o que significa que tendem a
subir e descer juntos, então um portfólio de ações voláteis continua sendo
bastante arriscado; os benefícios da diversificação concedidos pela posse de
um portfólio dessas ações não seriam tão grandes. Desse modo, segundo o
CAPM, a medida correta do risco de uma ação é simplesmente sua
correlação com o resto do mercado, uma medida que é chamada “beta”.4
Grosseiramente falando, se uma ação tem um beta de 1,0, então seus
movimentos são proporcionais à totalidade do mercado. Se uma ação tem
um beta de 2,0, então, quando o mercado sobe ou cai 10%, a ação
individual subirá ou cairá (em média) 20%. Uma ação que não tem
nenhuma correlação com o mercado tem beta de zero.
A hipótese do mercado eficiente poderia ser conciliada com os nossos
resultados se as ações Perdedoras tivessem beta elevado — portanto, alto
grau de risco segundo o CAPM — e as ações Vencedoras tivessem betas
baixos — ou seja, fossem menos arriscadas. Mas nós já havíamos verificado
isso por conta própria e reportado os resultados no artigo; na verdade,
tínhamos descoberto o padrão oposto. Por exemplo, nos testes que fizemos
usando portfólios de Vencedoras e Perdedoras baseados em “períodos de
formação” de três anos seguidos de “períodos de teste” de três anos, o beta
médio era de 1,37 para as Vencedoras e 1,03 para as Perdedoras. Então, na
verdade, as Vencedoras eram mais arriscadas que as Perdedoras. A correção
do risco usando os métodos-padrão da profissão tornou os nossos achados
anômalos ainda mais anômalos!
Para resgatar o aspecto não-existe-almoço-grátis da HME, alguém teria
de aparecer com outra maneira de mostrar que o portfólio de Perdedoras
era mais arriscado que o portfólio de Vencedoras. O mesmo valeria para
qualquer medida de “valor”, tal como baixa razão preço/lucro ou baixa
razão do preço da ação com seu valor contábil de ativos, uma medida
contábil que representa, em princípio, o que os acionistas receberiam se a
empresa fosse liquidada. Qualquer que fosse a medida usada, “ações de
valor” tinham performance superior a “ações de crescimento”, e, para
consternação dos defensores da HME, as ações de valor também eram
menos arriscadas, conforme medidas por beta.

––––––––

A alegação de que ações de valor “vencem o mercado” não era muita coisa
quando feitas por rebeldes como nós, gestores de portfólios como Dreman
e falecidos como Benjamin Graham. Mas esse fato foi declarado
oficialmente verdadeiro pelo sumo sacerdote dos mercados eficientes,
Eugene Fama, quando, junto com seu colega mais jovem e colaborador
regular, Kenneth French, publicou descobertas semelhantes. Em parte
instigados por nossos achados iniciais e pelos achados de Banz, que
documentara o efeito da pequena empresa,5 Fama e French começaram a
publicar uma série de artigos em 1992, documentando que tanto ações de
valor quanto ações de pequenas empresas de fato obtinham rendimentos
maiores do que os preditos pelo CAPM. Em 1996, declararam
oficialmente que o CAPM estava morto, num artigo com o provocativo
título “Procura-se o CAPM, Vivo ou Morto”.6
Mesmo que Fama e French estivessem prontos para declarar o CAPM
morto, não estavam preparados para abandonar a eficiência de mercado.
Em vez disso, propuseram o que agora é conhecido como Modelo de Três
Fatores Fama-French,7 ao qual, além do tradicional beta, foram
adicionados dois fatores explicativos a mais para racionalizar os altos
rendimentos anômalos em ações de valor e de pequenas empresas. Fama e
French mostraram que os rendimentos de ações de valor estão
correlacionados, isto é, a ação de valor tenderá a se sair bem quando outras
ações de valor estiverem se saindo bem, e o mesmo vale para ações de
empresas pequenas. Mas Fama e French foram francos em reconhecer
que não tinham nenhuma teoria para explicar por que tamanho e valor
deveriam ser fatores de risco. Ao contrário do modelo de precificação de
ativos financeiros, que pretendia ser uma teoria normativa de preços de
ativos com base no comportamento racional dos investidores, não havia
razão teórica para acreditar que tamanho e valor deveriam predizer
rendimentos. Esses fatores foram usados porque a pesquisa empírica
demonstrara a importância deles.
Até hoje, não há evidência de que um portfólio de ações de valor ou de
pequenas empresas transpareça mais risco do que um portfólio de grandes
ações de crescimento. Na minha mente, um artigo intitulado
“Investimento do contra, extrapolação e risco”,8 publicado em 1994 pelos
economistas financeiros Josef Lakonishok, Andrei Shleifer e Robert
Vishny, resolveu quaisquer questões remanescentes sobre ações de valor
serem ou não mais arriscadas. Elas não são. E também convenceu os
autores do artigo, já que posteriormente abriram uma firma de
administração financeira altamente bem-sucedida, a LSV Asset
Management, que é baseada em investimento de valor.
Embora seu artigo tenha me convencido, não convenceu Fama e
French, e durante anos o debate continuou com comportamentalistas
argumentando que ações de valor têm preço inadequado e racionalistas
alegando que elas são arriscadas. O tópico ainda é discutido, e até mesmo
Fama reconhece que é impossível dizer se o rendimento mais alto das
ações de valor se deve ao risco ou à sobrerreação.9 Mas a novidade veio à
tona quando Fama e French anunciaram um modelo de cinco fatores.10
Um dos novos fatores mede a lucratividade da empresa (o que prediz
rendimentos elevados), e o outro capta o grau de agressividade com que a
empresa investe (o que prediz rendimentos baixos). Em uma bela
reviravolta do destino, a lucratividade é outro traço que Benjamim Graham
procurava ao julgar a atratividade de uma firma como investimento. Assim,
de alguma forma, o venerável Ben Graham recebeu um selo de aprovação
Fama-French, já que eles também endossam valor e lucratividade. E é
difícil contar uma história plausível em que empresas altamente lucrativas
sejam mais arriscadas do que empresas que perdem dinheiro.
Assim, desde o momento em que Sharpe e Lintner criaram o CAPM,
no começo dos anos 1960, passamos de um modelo de um só fator para
um modelo de cinco fatores, e muitos praticantes adicionariam um sexto
fator: impulso. Empresas com bom desempenho nos últimos seis ou 12
meses tendem a continuar se saindo bem pelos próximos seis ou 12 meses.
Quer haja cinco ou seis fatores, acredito que, em um mundo racional, o
único fator que teria importância seria o primeiro: o bom e velho beta.
Mas o beta está morto. E os outros? Em um mundo de Econs, todos seriam
FSIs.
24

O PREÇO NÃO ESTÁ CERTO

Lembre-se de que a hipótese do mercado eficiente tem dois componentes:


não se pode vencer o mercado (“não existe almoço grátis”) e os preços
estão “certos”. O trabalho que Werner e eu fizemos questionou
basicamente o primeiro princípio. Enquanto isso, outra batalha estava
fermentando acerca da racionalidade do mercado de ações como um todo,
uma batalha que dizia respeito ao segundo princípio. Robert Shiller, agora
professor na Universidade de Yale, publicou em 1981 um artigo com um
resultado surpreendente.1
Para entender os achados de Shiller, vale a pena pensar primeiro no que
deveria determinar o preço de uma ação. Suponha que uma fundação
decida comprar hoje uma ação e guardá-la para sempre. Em outras
palavras, ela nunca venderá essa ação — então o único dinheiro que ela
ganhará são os dividendos que receberá com o tempo. O valor da ação
deveria ser igual ao “valor presente” de todos os dividendos que a fundação
receberá para sempre a partir de agora, isto é, a quantia em dinheiro que as
ações valerão, corrigida pelo fato de que o dinheiro amanhã vale menos
que o dinheiro hoje.2 Mas como não sabemos exatamente quanto dada
ação pagará em dividendos ao longo do tempo, o preço da ação na
realidade é apenas uma previsão — a expectativa de mercado do valor
presente de todos os futuros pagamentos de dividendos.
Uma importante propriedade de previsões racionais — como
supostamente o preço das ações deve ser — é que as predições não podem
variar mais do que aquilo que está sendo previsto. Imagine que você está
tentando prever a temperatura diária máxima em Singapura. O clima não
varia muito nessa cidade-Estado do Sudeste Asiático. Tipicamente, a
temperatura máxima é em torno de 32ºC. Em um dia realmente quente,
pode chegar a 35ºC. Um dia “frio” poderia ter uma máxima de 30ºC. Você
já entendeu a ideia. Predizer 32ºC todo dia nunca ficaria muito longe. Se
algum meteorologista muito bêbado em Singapura estivesse predizendo
10ºC um dia — mais frio do que realmente já esteve alguma vez — e 42ºC
no dia seguinte — mais quente do que já esteve —, estaria violando
flagrantemente a regra de que predições não podem variar mais do que
aquilo que está sendo previsto.
Shiller obteve um resultado surpreendente ao aplicar esse princípio ao
mercado de ações. Ele coletou dados de preços de ações e dividendos
recuando até 1871. Então, começando em 1871, computou para cada ano
o que chamou de previsão “racional ex post” do fluxo de dividendos
futuros que se acumulariam para alguém que comprasse um portfólio de
ações existentes na época. Ele fez isso observando os dividendos reais pagos
e os descontando de volta para o ano em questão. Depois de ajustar
considerando a bem estabelecida tendência de que os preços das ações
sobem durante longos períodos de tempo, Shiller descobriu que o valor
presente dos dividendos era, como a temperatura em Singapura, altamente
estável. Mas os preços das ações, que deveríamos interpretar como
tentativas de prever o valor presente dos dividendos, são altamente
variáveis. Você pode ver os resultados na Figura 12. A linha quase plana é
o valor presente dos dividendos, enquanto a linha que salta para cima e
para baixo, como as previsões de um meteorologista bêbado, são os preços
reais das ações, ambos tendo que ser corrigidos para remover a tendência
ascendente de longo prazo.
Shiller deu ao seu artigo o título de “Do Stock Prices Move Too Much
to Be Justified by Subsequent Changes in Dividends?” [“Os preços das
ações variam demais para serem justificados por subsequentes mudanças
nos dividendos?”]. A julgar pela Figura 12, a resposta era sim. Os resultados
de Shiller incendiaram os círculos financeiros. Vários artigos foram escritos
atacando seus métodos e conclusões, um dos quais foi jubilosamente
saudado pelos críticos como “Shiller Killer”. (Talvez você se lembre que
um desses artigos, escritos por Allan Kleidon, foi apresentado na
conferência de Chicago, abordada no Capítulo 17.)3
Economistas acadêmicos ainda discutem trivialidades sobre a maneira
certa de conduzir o teste de Shiller. Mas acredito que o debate foi
efetivamente resolvido alguns anos depois, em uma segunda-feira, dia 19
de outubro de 1987, e nos dias subsequentes. Naquela segunda-feira, os
preços das ações caíram drasticamente em todo o mundo. A carnificina
começou em Hong Kong e passou para o Ocidente, à medida que os
mercados foram abrindo na Europa e depois nos Estados Unidos. Em
Nova York, os preços caíram mais de 20%, depois de já terem caído mais
de 5% na sexta-feira anterior. Crucial para os nossos propósitos, a segunda-
feira do dia 19 foi um dia sem nenhuma notícia importante, financeira ou
não. Nenhuma guerra teve início, nenhum líder político foi assassinado e
não ocorreu nada que fosse digno de nota. (Para fins de comparação, o
mercado de ações americano caiu 4,4%4 no dia seguinte ao bombardeio
japonês de Pearl Harbor.) Ainda assim, os preços estavam caindo em alta
velocidade ao redor do mundo todo. Ninguém sabia dizer por quê. A
volatilidade prosseguiu pelos dias seguintes. Nos Estados Unidos, um forte
rebote fez o índice S&P 500 de ações de grandes empresas subir 5,3% na
terça-feira, saltar mais 9,1% na quarta, só para despencar em 8,3% na
segunda-feira, dia 26. A manchete do Wall Street Journal no fim daquele
mês deveria ter sido: “Robert Shiller comprovado: mercados financeiros
são voláteis demais.” Em um mundo racional, os preços só variam em
reação a notícias, e, durante aquela semana, as únicas notícias eram que os
preços estavam variando loucamente.
Se os preços estão variáveis demais, então, em certo sentido, estão
“errados”. É difícil argumentar que o preço no fechamento do pregão em
15 de outubro, uma quinta-feira, e o preço no fechamento do pregão na
segunda-feira seguinte — que estavam pelo menos 25% mais baixos —
podem ser ambos medidas racionais de valor intrínseco, dada a ausência de
notícias.
Quando Shiller escreveu seu artigo original, não pensou nele em
termos psicológicos. Estava apenas reportando fatos que eram difíceis de
racionalizar. Sem surpresa, li o artigo através de uma lente
comportamental, e o vi como um possível co-conspirador. Quando foi dar
uma palestra em Cornell na primavera de 1982, Werner de Bondt, ele e eu
demos uma longa caminhada pelo campus, e eu o encorajei a pensar no
seu artigo através de uma perspectiva que agora chamaríamos de
comportamental. Não sei se a nossa conversa teve algo a ver com isso, mas,
dois anos depois, ele escreveu um artigo que era um arraso em termos
comportamentais. O texto, intitulado “Preços de ações e dinâmica social”,5
abraçava a herética ideia de que fenômenos sociais poderiam influenciar
preços de ações da mesma forma que acontece com tendências de moda.
As barras das saias sobem e descem sem qualquer razão aparente; não
poderiam os preços das ações ser influenciados de outras maneiras
semelhantes que parecem estar além do alcance padrão de um
economista? A agenda de Bob nesse artigo era, sob alguns aspectos, mais
radical do que a minha. Imagine tentar convencer economistas de que a
moda tem importância, quando muitos deles só recentemente
aposentaram seus paletós de tweed com apliques de couro. Anos depois,
num livro com George Akerlof,6 Shiller usaria o termo de Keynes,
“espíritos animais”, para capturar a noção de mudanças caprichosas nas
atitudes de consumidores e investidores.

––––––––
Embora eu tenha retratado a pesquisa de Shiller como fundamentalmente
relevante para o aspecto o-preço-está-certo da HME, ela também é
relevante para a componente não-existe-almoço-grátis. Para entender por
quê, vale a pena recordar os achados acerca de value investing. Ações de
valor, sejam aquelas com razão preço/lucro muito baixa ou extremas
perdedoras no passado, previsivelmente têm performance melhor que a do
mercado. Pode-se também computar uma razão preço/lucro para o
mercado total. Será que o mesmo princípio se aplica — isto é, será que
você pode vencer o mercado comprando ações quando estão relativamente
baratas e as evitando quando estão relativamente caras? A minha melhor
resposta a essa pergunta, que Shiller audaciosamente assumiu, é: “Sim,
porém...”
Para um exercício como esse, o método preferido de Shiller é dividir o
preço de mercado de um índice de ações (como, por exemplo, o S&P 500)
por uma medida da média dos ganhos nos últimos 10 anos. Ele prefere
esse olhar retroativo de um longo período de tempo para os ganhos porque
suaviza as flutuações temporárias que ocorrem no curso de um ciclo de
negócios. Um gráfico dessa razão é mostrado na Figura 13.
Com o benefício da visão retroativa, é fácil ver a partir desse gráfico o
que um investidor teria gostado de fazer. Note que, quando o mercado
diverge de suas tendências históricas, ele acaba revertendo à média. As
ações pareciam baratas nos anos 1970 e acabaram se recuperando;
pareciam caras no fim da década de 1990 e acabaram despencando. Então
parece haver algum poder preditivo brotando da razão preço/lucro de
longo prazo usada por Shiller. O que nos leva àquele “porém”. O poder
preditivo não é muito preciso.
Em 1996, Shiller e seu colaborador John Campbell deram um aviso à
diretoria do Federal Reserve, advertindo que os preços pareciam estar
perigosamente altos. Essa notificação levou Alan Greenspan, então
presidente do Fed, a fazer um discurso no qual indagou, com o seu jeito
oblíquo habitual, como alguém poderia saber se os investidores haviam se
tornado “irracionalmente exuberantes”. Bob mais tarde tomou emprestada
essa frase para o título do seu livro best-seller,7 que, fortuitamente, foi
publicado em 2000, quando o mercado estava começando a escorregar.
Então a advertência de Shiller estava certa ou errada?8 Como ela veio
quatro anos antes de o mercado atingir o pico, ele esteve errado por um
longo tempo antes de estar certo! Essa falta de precisão significa que a
razão preço/lucro no longo prazo está longe de ser uma maneira infalível
de ganhar dinheiro. Qualquer um que tivesse levado a sério o conselho de
Shiller em 1996 e apostado pesadamente na queda do mercado teria
quebrado antes de ter uma chance de recuperar o dinheiro.
A mesma coisa vale para o mercado imobiliário. Uma das muitas
qualidades admiráveis de Bob Shiller é que ele tem sido há muito tempo
um ávido colecionador de dados, desde os dados históricos sobre preços de
ações lá em 1871 — que tornaram viável seu artigo original — até
questionários com levantamentos de sentimentos de investidores, passando
por medições dos preços de moradias. Essa última empreitada, levada a
cabo com seu amigo Chip Case, um economista imobiliário na
Universidade Tufts, criou o agora amplamente conhecido Índice de Preços
de Moradia Case-Shiller. Antes de Case e Shiller entrarem em cena, os
indicadores dos preços de moradias não eram muito confiáveis porque o
mix de imóveis vendidos em dado mês podia variar enormemente,
distorcendo a média. Case e Shiller tiveram a ideia sagaz de criar um
índice baseado em vendas repetidas do mesmo imóvel residencial,
controlando assim a qualidade da habitação e sua localização.
Um gráfico do crescimento de longo prazo nos preços das moradias nos
Estados Unidos desde 1960 é mostrado na Figura 14. O gráfico se baseia
em dados sobre os preços das vendas de moradias coletados pelo governo
até 2000; depois desse ano, os dados Case-Shiller se tornam disponíveis,
então são usadas ambas as fontes. Todos os preços estão corrigidos pela
inflação. O gráfico mostra que os preços de moradias cresceram
modestamente durante a maior parte do período até meados dos anos
1990, quando dispararam. Além disso, após um longo período durante o
qual a razão entre o preço de compra de uma moradia e o custo de aluguel
de uma moradia similar pairou em torno de 20:1, os preços divergiam
agudamente dessa marca de referência de longo prazo. Olhando para esses
dados, Shiller advertiu sobre os perigos de uma bolha imobiliária, um
alerta que acabou se revelando correto. Mas, na época, não era possível ter
certeza se estávamos em uma bolha ou se alguma coisa na economia havia
mudado, fazendo com que relações muito altas dos preços de aluguel
passassem a ser o novo normal.

Devo ressaltar que a imprecisão dessas previsões não significa que elas
sejam inúteis. Quando os preços divergem fortemente de níveis históricos,
em qualquer direção, existe algum valor preditivo nesses sinais. E, quanto
maior essa divergência dos preços em relação aos níveis históricos, mais os
sinais devem ser levados a sério. Investidores devem ter cautela em
despejar dinheiro em mercados que estão mostrando sinais de
superaquecimento, mas também não devem esperar ficar ricos por acertar
o timing do mercado. É muito mais fácil detectar que talvez estejamos em
uma bolha do que dizer quando ela vai estourar, e investidores que tentam
ganhar dinheiro acertando a hora das reviravoltas do mercado raramente
têm sucesso.

––––––––

Embora nossos caminhos de pesquisa tenham tomado rumos diferentes,


Bob Shiller e eu nos tornamos amigos e co-conspiradores. Em 1991, nós
começamos a organizar um workshop semestral de finanças
comportamentais patrocinado pelo National Bureau of Economic
Research. Muitos dos artigos seminais em finanças comportamentais foram
apresentados ali, e a conferência tem ajudado as finanças comportamentais
a se tornar um componente próspero e central da pesquisa em economia
financeira.9
25

A BATALHA DOS FUNDOS MÚTUOS FECHADOS

O trabalho de Shiller feriu a hipótese do mercado eficiente através de seu


componente o-preço-está-certo, mas não foi considerado um ataque fatal.
Discussões sobre metodologia ainda persistiam. E, apesar de ser difícil
justificar o que aconteceu naquela semana de outubro de 1987, os
defensores do mercado eficiente não estavam dispostos a descartar uma
explicação racional. Na primavera de 1988, a Universidade de Chicago
realizou uma conferência sobre o crash, e uma das mesas-redondas me
incluía ao lado de Eugene Fama. Gene falou primeiro e disse que o
mercado deveria ser parabenizado pela rapidez com que havia atingido seu
novo equilíbrio, sugerindo que talvez um acontecimento tenha levado as
pessoas a baixar suas estimativas de rendimentos futuros no mercado de
ações e, assim, os preços se ajustaram imediatamente, exatamente como
“deveriam”.
Quando chegou a minha vez de falar, perguntei aos especialistas ali
reunidos se achavam que o valor presente dos dividendos havia caído 20%
na Segunda-Feira Negra, como foi chamada. Apenas algumas mãos se
levantaram, e a de Gene estava entre elas. Arqueei as sobrancelhas como
quem diz: “E então?” Gene levantou a mão mais alto, sorrindo. Ele não
estava disposto a se render, mas manteve o senso de humor.
Seria preciso uma evidência muito forte para convencer Fama e o resto
do clã do mercado eficiente. Mas, como vimos antes, o valor intrínseco não
pode ser determinado com precisão, o que torna difícil provar que os
preços das ações se desviam do valor intrínseco. Uma abordagem possível
para testar se os preços estão “certos” é empregar um princípio importante
que está no cerne da HME: a lei do preço único. A lei afirma que, em um
mercado eficiente, o mesmo ativo não pode ser vendido simultaneamente
com dois preços diferentes. Se isso acontecesse, haveria uma oportunidade
imediata de arbitragem, ou seja, um meio de fazer uma série de operações
de compra e venda com a garantia de lucro sem nenhum risco. Imagine
que o ouro esteja sendo vendido por US$1.000,00 a onça em Nova York e
a US$1.010,00 a onça em Londres. Alguém poderia comprar contratos de
ouro em Nova York e vendê-los em Londres, pois assim, se os custos de
transação para essa operação forem pequenos, pode se ganhar dinheiro até
os dois preços convergirem. A existência de uma multidão de traders
inteligentes que estão constantemente à procura de violações da lei do
preço único garante que ela deve ser mantida, com precisão quase
instantânea. Encontrar uma violação atacaria o coração da HME.
No entanto, era surpreendentemente fácil encontrar uma violação. Na
verdade, já escreveram sobre ela, inclusive Benjamin Graham, entre
outros. O suspeito de quebrar a lei era um tipo de fundo mútuo chamado
fundo fechado.
No fundo aberto mais familiar, os investidores podem, a qualquer
momento, colocar ou tirar dinheiro do fundo, e todas as transações são
conduzidas a um preço determinado pelo valor dos recursos subjacentes ao
fundo, o chamado Valor de Recurso Líquido — ou NAV (Net Asset Value)
— do fundo. Imagine um fundo que apenas compre ações da Apple, e
uma cota do fundo Apple lhe dê uma ação da Apple. Suponha que a Apple
esteja vendendo a ação por US$100,00, e um investidor queira investir
US$1.000,00. O investidor envia US$1.000,00 e recebe de volta 10 cotas
do fundo. Se mais tarde o investidor quiser resgatar o fundo, a quantia
devolvida dependerá do preço atual das ações da Apple. Se o preço da ação
tiver duplicado para US$200,00, o investidor receberá de volta
US$2.000,00 (menos as taxas cobradas pelo fundo) quando fizer o resgate.
O termo “aberto” significa que os recursos administrados pelo fundo
podem aumentar ou diminuir, dependendo das preferências de seus
investidores.
Um fundo fechado funciona de maneira diferente. Gestores do fundo
levantam uma quantia inicial, digamos US$100.000.000,00, e pronto.
Nenhum dinheiro novo pode ser investido, e o dinheiro não pode ser
resgatado. (Você pode ver o apelo que começar um fundo desses tem para
os gestores de portfólio. Os investidores não podem resgatar seu dinheiro!)
Cotas do fundo são negociadas no mercado, então, se um investidor quiser
vender suas cotas, deve fazê-lo ao preço de mercado do fundo. Voltando ao
exemplo hipotético do fundo da Apple, suponha agora que o fundo seja
organizado como um fundo fechado, e, como antes, uma cota do fundo
lhe dê uma ação da Apple. Qual é o preço de mercado para o fundo
fechado da Apple? Seria de se presumir que é NAV, ou seja, o preço
corrente da Apple. Se fosse qualquer outra coisa, a lei do preço único
estaria sendo violada, já que seria possível comprar cotas da Apple com
dois preços diferentes, um determinado pelo preço de mercado das cotas
da Apple e o outro pelo preço do fundo Apple.
A HME faz uma predição clara sobre os preços de cotas de fundos
fechados: serão iguais ao NAV. Mas uma simples olhada na tabela de
preços de cotas de fundos fechados revela que não é assim (Figura 15).
Essas tabelas possuem três colunas: uma para o preço da cota do fundo,
uma para o NAV e outra para o desconto ou prêmio que mede a diferença
percentual entre os dois preços. O simples fato de haver três colunas já diz
que os preços de mercado são frequentemente diferentes do NAV.
Enquanto é típico os fundos venderem com descontos, geralmente na faixa
de 10-20% abaixo do NAV, às vezes eles vendem com prêmio. Essa é uma
violação flagrante da lei do preço único. E o investidor não precisa fazer
qualquer ginástica numérica para detectar a anomalia, já está exposta bem
ali na sua frente, na tabela. O que está acontecendo?

Eu não sabia muita coisa sobre fundos fechados até conhecer Charles
Lee. Charles era aluno de doutorado em contabilidade em Cornell, mas
seu histórico indicava que ele poderia ter algum interesse em finanças
comportamentais, então dei um jeito de atraí-lo como assistente de
pesquisa em seu primeiro ano no programa. Quando Charles participou do
meu curso sobre economia comportamental, sugeri os fundos fechados
como tópico para um projeto do curso. Ele aceitou o desafio.
Mais ou menos na época em que Charles terminou sua dissertação para
o meu curso, Larry Summers tinha acabado de escrever o primeiro de uma
série de artigos com três de seus ex-alunos sobre o que chamaram de noise
traders. O termo foi cunhado por Fisher Black, que transformara noise
(“ruído”, em português) em um termo técnico de finanças durante seu
discurso presidencial para a American Finance Association, usando-o
como contraste para a palavra “notícia”. A única coisa que faz um Econ
mudar de ideia em relação a investimento são notícias genuínas, mas
Humanos podem reagir a algo que não se qualifica como notícia — um
anúncio engraçado da companhia por trás do investimento, por exemplo.
Em outras palavras, FSIs são ruído, e noise traders — conforme Black e
Summers empregam o termo — tomam decisões com base em FSIs em
vez de notícias reais.
Summers havia usado anteriormente uma linguagem mais forte para
expressar a ideia da capacidade que ruídos têm de influenciar preços de
ativos. Ele é o autor de um artigo infame — não publicado — sobre esse
tema que começa da seguinte maneira: “EXISTEM IDIOTAS. Olhe em
volta.”1 Três estudantes de pós-graduação que se conheceram ao dividir
um alojamento no seu primeiro ano da faculdade — Brad de Long, Andrei
Shleifer e Robert Waldmann — juntaram-se a Summers para produzir
uma versão mais rigorosa, meticulosa e educada do artigo dos “idiotas”.2 O
modelo proposto por eles usava fundos fechados como exemplo para o tipo
de recurso que seu modelo poderia ajudar a entender, mas não tinham
feito nenhum teste empírico. Charles e eu acreditávamos que, com intuito
de preencher tal lacuna, poderíamos desenvolver mais o artigo que ele
tinha entregado para a conclusão de curso. Pedimos então a Andrei
Shleifer, que recentemente entrara para o corpo docente da Universidade
de Chicago, que se juntasse a nós nesse projeto. Charles, Andrei e eu
escrevemos então um artigo sobre fundos fechados, observando que havia
quatro enigmas associados a eles.
Quando fundos fechados são iniciados, geralmente são vendidos por
corretores, que adicionam uma robusta comissão de cerca de 7% ao preço
de venda. Mas, em seis meses, é típico que os fundos sejam negociados
com um desconto de mais de 10%. Então, o primeiro enigma é: por que
alguém compra um ativo por US$107,00, que previsivelmente valerá
US$90,00 em seis meses? Esse padrão induziu Benjamin Graham a se
referir aos fundos fechados como “um caro monumento erigido à inércia e
à estupidez dos acionistas”.3 Era um jeito mais polido de dizer “EXISTEM
IDIOTAS”, que continua sendo a única resposta satisfatória para o
primeiro enigma.4
O segundo enigma é a existência dos descontos e prêmios mencionados
anteriormente. Por que o fundo negocia a um preço que é diferente do
valor dos seus ativos?
O terceiro enigma é que os descontos (e prêmios) variam um bocado,
ao longo do tempo e entre os fundos. Esse é um ponto importante porque
exclui muitas explicações simples para a existência dos descontos. Uma
dessas explicações sustentava que o desconto era necessário para
compensar os investidores pelo fato de os fundos cobrarem taxas ou
gerirem mal o portfólio. Mas se fatores desse tipo fossem a explicação, por
que os descontos variam tanto? Nem as taxas nem a gestão variam tanto
com o tempo.
O quarto enigma é que, quando um fundo fechado vendendo com
desconto decide mudar sua estrutura para um fundo aberto, muitas vezes
sob pressão dos cotistas quando está vendendo com um desconto grande,
seu preço converge para o NAV. Esse fato exclui a possibilidade de que o
valor líquido do ativo tenha sido mal calculado. Coletivamente, os quatro
enigmas criavam um enigma para o mercado eficiente.
O objetivo básico do nosso artigo era chamar um pouco mais a atenção
para esses enigmas. Mas a principal contribuição da nossa pesquisa foi
compreender um pouco mais acerca de por que os descontos variam com
o tempo. Exploramos um fato importante sobre os fundos fechados com
sede nos Estados Unidos que estávamos estudando: investidores
individuais, em oposição a instituições, são os principais cotistas desses
fundos. Postulamos que investidores individuais agiam como noise traders
nesse mercado; seriam menos rigorosos do que os investidores profissionais,
como fundos de pensão e fundos patrimoniais, portanto estariam sujeitos a
variações de otimismo ou pessimismo, que apelidamos de “sentimento do
investidor”. Conjecturamos que, quando investidores individuais estão
alegres, os descontos dos fundos fechados encolhem; porém, quando ficam
deprimidos ou atemorizados, os descontos aumentam. Essa abordagem
estava bem alinhada com a visão de Shiller sobre a dinâmica social, e a
sensibilidade do investidor era claramente um exemplo de “espíritos
animais”.
A questão era como medir o sentimento dos investidores. Para isso,
exploramos o fato de que investidores individuais também têm maior
probabilidade do que investidores institucionais de possuir cotas de
empresas pequenas. Instituições evitam essas cotas porque elas não são tão
negociadas a ponto de prover a liquidez que um grande investidor
necessita. E fundos mútuos não compram cotas de fundos fechados nem
de outros fundos mútuos porque seus clientes não gostam da ideia de pagar
dois conjuntos de tarifas. Assim, se o sentimento de investidor dos
indivíduos varia, calculamos que isso se revelaria tanto nos descontos em
fundos fechados quanto na performance relativa de pequenas empresas em
relação às grandes empresas. (Embora cotas em pequenas empresas
tenham melhor performance em média, a diferença varia e, em alguns
períodos, grandes empresas têm performance melhor que as pequenas.)
Foi exatamente isso que descobrimos.5 O desconto médio em fundos
fechados estava correlacionado com a diferença de rendimentos entre
ações de pequenas e grandes empresas; quanto maior o desconto, maior a
diferença em rendimentos entre aqueles dois tipos de ações. Essa
descoberta era equivalente a descobrir pegadas do Abominável Homem das
Neves ou de alguma outra criatura mitológica.
Como eu disse, não fomos de forma alguma os primeiros a escrever
sobre fundos fechados. O economista Rex Thompson redigiu sua tese
sobre fundos fechados6 e descobriu que a estratégia de comprar os fundos
com os maiores descontos gerava rendimentos superiores (uma estratégia
também advogada por Benjamin Graham). O conhecido guru do mercado
eficiente Burton Malkiel, autor do perpétuo best-seller A Random Walk
Down Wall Street,7 também advogava tal estratégia. Não obstante, nosso
artigo deixou algumas pessoas chateadas e enfureceu Merton Miller, o
economista financeiro ganhador do Prêmio Nobel, com posição sênior em
relação a Shleifer na Universidade de Chicago.
Até hoje, não sei exatamente qual parte do nosso artigo deixou Miller
tão aborrecido, mas desconfio que, ainda que outros tenham escrito sobre
tais fundos antes, fomos os primeiros desde Graham a fazê-lo sem seguir o
procedimento cortês de pedir desculpas e encontrar justificativas para
nossos achados anômalos. Em vez disso, parecíamos estar nos divertindo. E
ainda por cima, estávamos usando uma anomalia irritante, o efeito da
pequena empresa, para ajudar a explicar outra: descontos persistentes em
fundos fechados. Isso, para um Econ, é o equivalente a proferir o nome do
Senhor em vão enquanto trabalha no Sabá.
Miller partiu para o ataque. Submetemos nosso artigo ao Journal of
Finance, e o editor, René Stulz, o enviou para os pareceristas. Nesse meio-
tempo, ficamos sabendo que Miller estava tentando convencer o professor
Stulz a rejeitar nosso artigo. Stulz aceitou o artigo e disse a Miller que, se
discordasse dos nossos achados, devia seguir o procedimento usual de
escrever um comentário sobre o artigo e submetê-lo ao Journal.
Miller aceitou a sugestão de Stulz. Recrutou Nai-fu Chen, um colega
professor de Chicago, e Raymond Kan, aluno de pós-graduação, para
ajudá-lo em sua pesquisa, e os três submeteram um comentário sobre o
nosso artigo. Miller era perspicaz, e o comentário foi escrito no seu
habitual estilo fanfarrão. Eles começavam o artigo dessa forma: “Charles
Lee, Andrei Shleifer e Richard Thaler (1991) alegam ter resolvido não um,
mas dois antigos enigmas — descontos em fundos fechados e efeito de
pequenas firmas. Ambos, segundo Lee et al., são motivados pelos mesmos
arroubos de sentimento do pequeno investidor. Acertar dois coelhos tão
fugidios com uma cajadada só seria de fato um belo truque se Lee et al.
conseguissem fazê-lo. Mas não conseguem.”8
Não vou entediar você com a essência do debate, que era, em sua maior
parte, sobre detalhes técnicos. Seguindo a tradição, escrevemos uma
“réplica” para aparecer no mesmo número da revista e apresentamos novos
dados para reforçar nossas alegações, algo que Miller considerou uma
violação do protocolo usual de tais debates. Ele insistiu em uma tréplica, o
que significava que, de acordo com a tradição, como autores originais,
tínhamos o direito de dar a última cajadada.9
Naturalmente, ambos os lados declararam vitória nos últimos
comentários. Não sei quem ganhou, mas sei, sim, que as quatro etapas de
nosso confronto sem precedentes atraíram um bocado de atenção. Graças
ao professor Miller, centenas de economistas financeiros se sentiram
compelidos a ler o nosso artigo original; então, ao nos atacar, Miller
acabou nos fazendo um grande favor. Não fosse isso, muitos leitores do
Journal of Finance poderiam nunca ter reparado em um artigo sobre
fundos mútuos fechados. Porém, nada atrai mais a atenção do que uma
boa briga.
26

MOSCAS-DAS-FRUTAS, ICEBERGS E PREÇOS DE AÇÕES NEGATIVOS

O debate com Merton Miller obscureceu o ponto mais importante acerca


dos fundos fechados: a flagrante violação da lei do preço único. Era como
se tivéssemos descoberto um unicórnio e então tivéssemos tido uma longa
briga sobre como deveríamos chamar a cor da pelagem do bicho. Anos
mais tarde, depois de eu ter ingressado na Universidade de Chicago,
revisitei a lei do preço único com um colega de Chicago, Owen Lamont.
Naquela época, Owen não era realmente um economista
comportamental. Era apenas um pesquisador de mente aberta que gostava
de agitar as discussões e tinha um bom faro para problemas interessantes.
Owen é sempre uma das principais escolhas para o papel de debatedor nos
seminários de finanças comportamentais que Shiller e eu organizamos no
National Bureau of Economic Research (NBER). Alfinetadas eram
frequentes nesses encontros, e Owen provavelmente detém o recorde.
Uma vez, solicitaram que ele debatesse sobre um artigo no qual os autores
haviam medido os níveis de ansiedade de traders de opções durante um dia
de negociação. A tecnologia do sensor empregada era refinada, mas muitos
de nós ficamos imaginando o que deveríamos absorver desse exercício.
Owen abriu a discussão com uma síntese: “Os autores definitivamente
rejeitaram a hipótese de que esses traders não passem de portas.”
O problema interessante que Owen tinha identificado era uma flagrante
violação da lei do preço único envolvendo uma companhia chamada
3Com. O principal negócio da 3Com era com redes de computadores
usando uma tecnologia chamada Ethernet, mas, por meio de uma fusão,
eles também tinham adquirido a Palm, o fabricante do que na época foi
considerado um elegantíssimo computador de mão chamado Palm Pilot.
No verão de 1999, quando a ação de qualquer empresa de tecnologia
respeitável do Vale do Silício parecia dobrar a cada um ou dois meses, a
3Com estava sendo negligenciada, e o preço da sua ação permanecia
constante. A administração da 3Com adotou um plano para aumentar o
preço da sua ação, e o plano envolvia desinvestir-se do seu interesse na
Palm. Em 2 de março de 2000, a 3Com vendeu uma fração de sua
participação na Palm para o público geral. Nessa transação, chamada
divisão de capital, a 3Com vendeu cerca de 4% de sua participação na
Palm em uma oferta pública inicial, vendeu cerca de 1% para um
consórcio de empresas e reteve a posse de 95% de suas cotas.
Esse ato deveria por si só preocupar os defensores da hipótese de
mercado eficiente. Que diferença faz se a Palm está localizada dentro da
3Com ou aí fora, por conta própria? Se os preços estão “certos”, então
dividir uma empresa em duas partes não deveria aumentar seu valor, a
menos que a empresa-mãe — a 3Com, nesse caso — estivesse fazendo algo
disfuncional na sua administração da Palm que estivesse impedindo a
prosperidade dessa divisão. No entanto, a administração da 3Com
obviamente não disse que estava se divorciando da Palm para permitir que
ela saísse de debaixo da sua má administração. Em vez disso, insinuaram
que a Palm, de alguma forma, passaria em um passe de mágica a valer
mais como companhia destacada do que como parte da empresa-mãe. Sem
dúvida, esperavam que, como companhia separada, a Palm fosse mais
valorizada, como as empresas quentes de tecnologia daquela época, tais
como eBay, AOL e Amazon. Um defensor do mercado eficiente ficaria
cético em relação a essa jogada. Em um mercado constituído apenas de
Econs, o valor da 3Com é igual ao valor da Palm mais o valor do resto da
3Com, e separá-las não teria efeito no valor total da empresa.
Mas Econs claramente não estavam guiando os preços das ações das
empresas de tecnologia naquele final dos anos 1990. Por mais intrigante
que seja, separar a Palm pareceu dar certo. Quando o plano de separar a
Palm do resto da empresa foi anunciado em 13 de dezembro de 1999, cada
ação da 3Com estava sendo vendida por US$40,00 cada. Na ocasião em
que ocorreu a oferta pública inicial para as ações da Palm, em 1o de março
de 2000, o preço da ação da 3Com havia subido para US$100,00. É um
belo retorno pelo dispendioso passo de transformar a Palm em empresa
separada! Mas a parte realmente bizarra ainda estava por vir.
A operação estava programada para vender inicialmente apenas 5% do
valor da Palm a investidores externos. A 3Com reteria o restante da
participação. Então, após um período de alguns meses, cada acionista da
3Com receberia 1,5 cota da Palm. É aqui que a lei do preço único entra
em ação. Assim que as cotas iniciais da Palm fossem vendidas e
começassem a ser negociadas, os acionistas da 3Com teriam
essencialmente dois investimentos separados. Uma única cota da 3Com
incluía 1,5 cota da Palm mais uma participação nas partes remanescentes
da 3Com, o que, em literatura financeira, é chamado “valor residual” (stub
value) da 3Com. Em um mundo racional, o preço da cota da 3Com seria
igual ao valor do resíduo mais 1,5 vez o preço da Palm.
Os bancos de investimento envolvidos na transação das cotas da Palm
que seriam vendidas na oferta pública inicial precisavam determinar o
preço a ser cobrado. À medida que a empolgação em torno dessa oferta
pública ia crescendo, eles continuaram a aumentar o preço, finalmente
estabilizando em US$38,00 a cota; mas quando as cotas da Palm
começaram a ser negociadas, o preço deu um salto e terminou o dia um
pouco acima de US$95,00. Uau! Os investidores pareciam loucamente
entusiasmados em relação à perspectiva de uma empresa Palm
independente.
Então o que deveria acontecer com o preço da 3Com? Façamos os
cálculos. Cada cota da 3Com incluía agora 1,5 cota da Palm. Se você
multiplicar US$95,00 por 1,5 obterá cerca de US$143,00. Mais do que
isso, as partes remanescentes da 3Com eram um negócio lucrativo, então é
preciso perceber que o preço das cotas da 3Com saltaria para pelo menos
US$143,00 e provavelmente um pouquinho mais. Mas, na realidade,
naquele mesmo dia o preço da 3Com caiu, fechando em US$82,00. Isto
significa que o mercado estava calculando que o valor residual da 3Com
era de -US$61,00 por cota, o que somado resulta em
US$23.000.000.000,00 negativos! Você leu corretamente. O mercado de
ações estava dizendo que o negócio remanescente da 3Com, um negócio
lucrativo, valia -US$23.000.000.000,00.
Há um princípio em finanças ainda mais fundamental que a lei do
preço único, que diz que o preço de uma ação nunca pode ser negativo.
Você pode jogar suas cotas fora se quiser, e os acionistas têm
responsabilidade limitada, então o preço absoluto mais baixo a que uma
ação pode cair é zero. Nenhuma empresa pode valer -US$100,00, e menos
ainda -US$23.000.000.000,00. Mas era isso que o mercado estava dizendo.
Pense nesse panorama de outra maneira. Suponha que um Econ esteja
interessado em investir na Palm. Ele poderia pagar US$95,00 e ter uma
cota da Palm, ou poderia pagar US$82,00 e ter uma cota da 3Com que
inclui 1,5 cota da Palm mais uma participação na 3Com. Não parece uma
decisão difícil! Por que comprar diretamente a Palm quando você pode
ganhar mais cotas por menos dinheiro comprando a 3Com, e ainda uma
participação em outra empresa gratuitamente?
Essa foi uma violação colossal da lei do preço único. Na verdade, foi tão
colossal que foi amplamente divulgada na imprensa popular. No entanto, o
valor remanescente da 3Com permaneceu negativo durante vários meses.
Como isso pôde acontecer? Dois ingredientes são necessários para que
uma violação da lei do preço único surja e persista. O primeiro é que você
precisa de alguns investidores com um inexplicável desejo de possuir uma
versão pura, não adulterada, da Palm em vez de uma versão diluída com
dinheiro extra e participação em uma empresa lucrativa. Em outras
palavras, você precisa de noise traders, também conhecidos como os
IDIOTAS de Summers. E note que, mesmo se algumas pessoas
comprarem as ações da Palm com intuito de vender mais tarde para idiotas
a um preço supervalorizado — bem, você ainda precisa de alguns idiotas
para fazer o plano dar certo.
A outra coisa necessária para que isso aconteça é algo que deve estar
impedindo o smart money de levar os preços de volta para onde
supostamente deveriam estar. O investidor meramente “sensato” apenas
compraria a 3Com em vez da Palm. Mas um verdadeiro Econ iria um
passo além. Nessa situação, a transação do smart money é comprar as
subvalorizadas cotas da 3Com e ficar vendido em uma quantidade
apropriada de cotas da Palm. Então, quando o negócio é completado, o
investidor vende as cotas da Palm que recebe, usa essas cotas para pagar
seu empréstimo e fica com um lucro igual ao preço que a 3Com está
valendo como empresa isolada. Esse é um negócio no qual nunca se
perde. Por que ninguém estava tentando isso, visto que era tão
amplamente conhecido? O problema era que foram vendidas tão poucas
cotas da Palm na oferta pública inicial que não havia o suficiente para
satisfazer todo mundo que queria tomá-las emprestadas: a demanda de
gente que queria tomar cotas emprestadas para ficar com a posição vendida
excedia a oferta de cotas disponíveis para serem emprestadas. Isto
significava que o smart money era incapaz de guiar os preços relativos da
Palm e da 3Com para um equilíbrio racional, no qual o preço da 3Com
fosse ao menos 1,5 vez o preço da Palm.1
A história Palm/3Com não é única.2 Nos idos de 1923, o jovem
Benjamin Graham notou que a DuPont possuía um grande número de
ações da General Motors; estranhamente, o valor de mercado da DuPont
era mais ou menos o mesmo que o da sua participação na GM. Apesar de a
DuPont ser uma empresa altamente lucrativa, seu valor remanescente era
próximo a zero. Graham fez a transação inteligente, comprando Dupont e
ficando vendido em GM, e ganhou uma bela grana quando o preço da
DuPont subiu.
Mas as coisas nem sempre dão tão certo para os traders inteligentes. Por
muitos anos, havia dois tipos de cotas da empresa fundida Royal Dutch
Shell. As cotas da Royal Dutch eram negociadas em Nova York e na
Holanda, e as da Shell eram negociadas em Londres. Segundo os termos
do acordo de fusão que criou essa empresa em 1907, 60% dos lucros iriam
para os acionistas da Royal Dutch e 40% para os acionistas da Shell. A lei
do preço único estipula que a razão entre os preços das duas classes de
cotas deveria ser 60/40 ou 1,5. Mas será que essas duas ações sempre foram
negociadas nessa razão? Não! Às vezes as cotas da Royal Dutch eram
negociadas com até 30% a menos, e outras vezes eram negociadas com até
15% a mais. Os noise traders parecem ter uma dificuldade especial de
multiplicar por 1,5.
Nesse caso, a transação inteligente seria comprar a versão mais barata da
ação, qualquer que seja ela, e ficar vendido na versão mais cara. Ao
contrário do caso da Palm e 3Com, ambas as versões da ação eram
amplamente negociadas e fáceis de tomar emprestadas; então o que
impedia o smart money de garantir que as ações fossem negociadas na sua
apropriada razão de 1,5? Estranhamente, nada! E, crucialmente, ao
contrário do exemplo da Palm, que com certeza terminaria em poucos
meses, a disparidade de preços na Royal Dutch Shell podia durar, como
durou, décadas.3 É aí que mora o risco. Alguns traders inteligentes, tais
como o fundo multimercado Long Term Capital Management (LTCM),
realizaram, sim, o negócio inteligente, ficando vendidos nas caras cotas da
Royal Dutch e comprando as cotas Shell baratas. Mas a história não teve
um final feliz. Em agosto de 1998, por causa de uma crise financeira na
Ásia e uma insolvência em títulos russos, o LTCM e outros fundos
multimercado começaram a perder dinheiro e precisaram reduzir algumas
de suas posições, inclusive sua operação com a Royal Dutch Shell. Mas,
sem nenhuma surpresa, o LTCM não foi o único fundo multimercado a
ter identificado a anomalia na precificação da Royal Dutch Shell, e outros
fundos também haviam perdido dinheiro na Rússia e na Ásia. Então, ao
mesmo tempo que o LTCM quis se desvencilhar da sua posição na Royal
Dutch Shell, outros fundos também quiseram, e a diferença de valores —
o spread — atuou contra eles, ou seja, a versão mais cara ficou ainda mais
cara. Dentro de semanas, o LTCM desabara4 com essa e outras
oportunidades de “arbitragem” que foram piorando antes de melhorar.
O exemplo do LTCM ilustra o que Andrei Shleifer e seu frequente
coautor Robert Vishny chamam de “limites de arbitragem”. Na verdade,
num artigo publicado sobre esse tópico em 1997,5 um ano antes de esses
eventos ocorrerem, eles descreveram de forma bastante cautelosa uma
situação hipotética muita parecida com a vivenciada pelo LTCM. Quando
preços começam a se movimentar contra um gestor de dinheiro e os
investidores começam a pedir de volta parte do seu dinheiro, os preços
serão guiados ainda mais contra eles, o que pode causar uma espiral
maligna. A lição básica é que os preços podem sair de controle e o smart
money nem sempre consegue consertar as coisas.

––––––––

Owen e eu escrevemos um artigo acadêmico sobre o episódio Palm/3Com


ousadamente intitulado “O mercado sabe somar e subtrair?”,6 o qual
apresentamos no workshop de finanças na Universidade de Chicago. No
fim do workshop, Gene Fama questionou o significado de exemplos como
esse e fundos fechados. Ele comentou que esses eram recursos financeiros
relativamente sem importância. Então, embora os resultados estivessem em
conflito com a HME, argumentou que os valores eram pequenos demais
para ter relevância.
Em minha opinião, esses casos especiais são o equivalente financeiro às
moscas-das-frutas do geneticista. Moscas-das-frutas não são uma espécie
particularmente importante no grande esquema das coisas, mas sua
capacidade de se reproduzir rápido oferece aos cientistas a chance de
estudar questões cuja análise seria difícil de outra forma. O mesmo ocorre
com as moscas-das-frutas financeiras. Essas são as raras situações nas quais
podemos dizer alguma coisa sobre valor intrínseco. Ninguém pode dizer
qual deveria ser o preço da 3Com ou da Palm, mas podemos dizer com
grande certeza que, após a separação, o preço da 3Com deveria ser pelo
menos 1,5 vez o preço da Palm. Sugeri que exemplos como este eram a
ponta de um iceberg de precificação inadequada no mercado. A opinião
de Gene era que tínhamos contemplado o iceberg inteiro.
Quais são as implicações desses exemplos? Se a lei do preço único pode
ser violada em casos tão transparentemente óbvios, então é absolutamente
claro que disparidades ainda maiores podem ocorrer no nível do mercado
total. Voltemos ao debate sobre a existência de uma bolha nas ações da
internet no fim da década de 1990. Não havia como provar na época, ou
mesmo agora, que os preços das ações de tecnologia estavam altos demais.
Mas se o mercado não podia acertar algo tão simples como Palm e 3Com,
certamente parecia possível que o índice NASDAQ de ações de tecnologia
também pudesse estar com preço elevado demais. Não parece
coincidência que a parte cara do negócio Palm/3Com fosse a sedutora
divisão Palm e a parte barata e sonolenta ficasse com a mãe 3Com. O
mesmo podia ser dito ao comparar o aumento nos preços das charmosas
ações de tecnologia versus as sonolentas industriais.
Então qual ponto da hipótese de mercado eficiente eu deveria criticar?
Deve-se ressaltar que, como referencial normativo de como o mundo
deveria ser, a HME tem sido extraordinariamente útil. Em um mundo de
Econs, acredito que a HME seria verdadeira. E não teria sido possível fazer
pesquisa em finanças comportamentais sem o modelo racional como
ponto de partida. Sem o referencial racional, não há anomalias a partir das
quais podemos detectar comportamentos desviantes. E mais, ainda não
existe uma teoria comportamental referencial de preços de ativos que possa
ser usada como substrato teórico de pesquisa empírica. Precisamos de
algum ponto de partida para organizar nossos pensamentos sobre qualquer
tópico, e a HME continua sendo o melhor que temos.
Quando se trata da HME como modelo descritivo de mercados de
ativos, minha ficha de avaliação é mista. Dos dois componentes, usando a
escala às vezes utilizada para julgar as alegações feitas por candidatos
políticos, eu julgaria a componente do não-existe-almoço-grátis como
“verdadeira na sua maior parte”. Decididamente há anomalias: às vezes o
mercado reage com exagero, e às vezes deixa de reagir como se espera. Mas
continua o caso de que a maioria dos gestores ativos de dinheiro fracassa
em vencer o mercado. E, como mostra a história da Royal Dutch Shell e
LTCM, mesmo quando investidores podem saber com certeza que os
preços estão errados, esses preços ainda podem continuar errados. Ou até
mesmo ficarem ainda mais errados. Isto deveria justificadamente assustar
investidores que se julgam espertos e querem explorar aparentes erros de
preços. É possível ganhar dinheiro, mas não é fácil.7 Certamente,
investidores que aceitam o evangelho da HME e investem em fundos de
índice de baixo custo não podem ser considerados culpados por essa
escolha.
Tenho uma opinião bem pior sobre o componente o-preço-está-certo da
HME e, por causa de muitas questões de importância, este é o
componente mais importante. Quão errado eu penso que ele é?
Notavelmente, no ensaio de Fisher Black sobre ruído, ele opina que
“poderíamos definir um mercado eficiente como aquele no qual o preço
está dentro de um fator de 2 do valor, isto é, o preço é mais do que a
metade do valor e menos que o dobro do valor. O fator de 2 é arbitrário, é
claro. Intuitivamente, porém, a mim parece razoável, à luz das fontes de
incerteza acerca do valor e a intensidade das forças que tendem a fazer
com que preço retorne ao valor. Por essa definição, penso que quase todos
os mercados são eficientes praticamente o tempo todo. Por ‘quase todos’
entendo pelo menos 90%.”8
Não tenho certeza se “90% do tempo” é uma definição satisfatória de
“quase o tempo todo”, porém, mais importante, o fator de 2 me parece
uma margem muito ampla para chamar o mercado de eficiente. Basta
pensar em todas as moradias construídas durante a bolha imobiliária que
ainda valem apenas a metade do seu valor quando este estava no pico. As
pessoas que compraram essas casas provavelmente discordariam da
avaliação de que o mercado imobiliário estava atuando de forma eficiente
durante o boom. Além disso, Black morreu em 1996, antes das bolhas de
tecnologia e imobiliária. Acredito que, se ele ainda estivesse por aí, poderia
ser convencido a rever a premissa para “certo dentro de um fator de 3”. O
índice NASDAQ perdeu mais de 2/3 do seu valor desde seu pico em 2000
até o fundo do poço em 2002, e o declínio quase certamente se deve à
exuberância inicial. (Com toda certeza a culpa não pode ser jogada no fato
de a internet provar ser uma decepção.)
Minha conclusão: o preço frequentemente está errado, e às vezes muito
errado. Além disso, quando os preços divergem do valor fundamental por
margens tão largas, a distribuição inadequada de recursos pode ser bastante
grande. Por exemplo, nos Estados Unidos, onde os preços das moradias
estavam subindo em nível nacional, algumas regiões experimentaram
aumentos de preços especialmente rápidos e proporções preço-aluguel
historicamente elevadas. Se os proprietários das residências e os locatários
tivessem sido Econs, teriam notado esses sinais de alerta e percebido que
uma queda nos preços de moradias estava se tornando cada vez mais
provável. Em vez disso, levantamentos feitos por Shiller mostraram que
essas eram as regiões nas quais as expectativas sobre a apreciação futura dos
preços das moradias eram as mais otimistas. Em vez de esperar a reversão à
média, as pessoas agiam como se aquilo que sobe fosse obrigado a subir
ainda mais.
Ademais, locatários racionais teriam feito exigências para tornar as
hipotecas mais estritas sob tais circunstâncias, mas acontecia justamente o
contrário. Hipotecas eram oferecidas com pouco ou nenhum pagamento
de entrada, e pouca atenção se prestava à credibilidade dos que tomavam
empréstimos. Esses “empréstimos de mentira”9 alimentaram os booms, e
os responsáveis pelas políticas não tomaram atitude para intervir.
Essa lição é uma das mais importantes a ser tirada da pesquisa sobre a
eficiência de mercado. Se os responsáveis pelas políticas simplesmente
tomam ao pé da letra que os preços estão sempre certos, jamais poderão ver
qualquer necessidade de ação preventiva. Mas quando reconhecemos que
bolhas são possíveis, e o setor privado parece estar alimentando o frenesi,
pode fazer sentido que os responsáveis pelas políticas se inclinem contra o
vento de alguma maneira.
Os bancos centrais ao redor do mundo tiveram que tomar medidas
extraordinárias para ajudar as economias a se recuperarem da crise
financeira. As mesmas pessoas que mais se queixam dessas medidas
extraordinárias para recuperação são também aquelas que contestariam
passos relativamente menores para reduzir a probabilidade de outra
catástrofe. Isto é simplesmente irracional.
VII
BEM-VINDO A CHICAGO
1995 – PRESENTE
Tive um almoço com diversos membros do corpo docente de finanças da
Universidade de Chicago, o que acabou se tornando uma entrevista de
emprego para uma posição na agora chamada Booth School of Business.
Ao deixarmos a escola de negócios para irmos a pé até o clube dos
professores onde seria o almoço, vi uma nota de US$20,00 caída na
calçada, bem na frente do prédio. Naturalmente, eu a peguei. E então todo
mundo começou a rir. Estávamos rindo porque todos percebemos a ironia
daquela situação. Há uma velha piada que diz que um economista de
Chicago não se daria ao trabalho de pegar uma nota de US$20,00 na
calçada porque alguém já a teria catado se ela fosse real. Não existe algo
como almoço grátis ou US$20,00 grátis. Mas, para um herege como eu, os
US$20,00 pareciam suficientemente reais para valer a pena eu me abaixar
para pegá-los.
Minha nomeação não transcorreu sem controvérsia na escola.
Previsivelmente, Merton Miller não ficou muito feliz com ela, mesmo que
minha designação básica não tenha sido em finanças. Em vez disso, eu me
juntaria ao grupo de ciências comportamentais, que era composto
basicamente de psicólogos, o que encarei como uma vantagem. Eu teria a
oportunidade de construir uma espécie de grupo de cientistas
comportamentais com forte formação disciplinar que havia muito eu
achava que devia existir em uma escola de negócios de primeira linha. E,
ao mesmo tempo, eu teria uma chance de aprender mais sobre psicologia,
um campo em que meu conhecimento ainda era bastante limitado.
Não tenho conhecimento das conversas internas que o corpo docente
teve na época em que minha designação foi considerada, mas o repórter de
uma revista entrevistou Gene Fama e Merton Miller depois que cheguei,
achando estranho que eles permitissem um renegado como eu se juntar a
eles. Gene, com quem eu sempre tive uma relação boa, respondeu, em
tom completamente jocoso, que eles me queriam por perto para ficarem
de olho em mim. O repórter pressionou Miller um pouco mais,
perguntando-lhe especificamente por que ele não havia impedido a minha
nomeação. Era obviamente uma pergunta impertinente, à qual Miller
podia muito bem ter respondido: “Não é da sua conta.” Em vez disso, ele
disse que não havia impedido a nomeação “porque cada geração tem que
cometer seus próprios erros”. Bem-vindo a Chicago!
27

INSTRUÇÃO EM DIREITO

Durante todo o ano acadêmico de 1994–95, atuei como professor visitante


na MIT Sloan School of Management para passar algum tempo com
France Leclerc, que na época estava no corpo docente do departamento de
marketing. Foi durante esse ano que nós dois aceitamos posições no corpo
docente da Graduate School of Business na Universidade de Chicago
(como era então chamada), e posteriormente nos casamos.1 Enquanto
estava no MIT, recebi uma ligação de Orley Ashenfelter — o economista
que deixara Eldar Shafir e eu usarmos seu informativo de vinhos para
estudar contabilidade mental — perguntando se eu poderia dar uma
palestra sobre aplicações de economia comportamental ao direito em uma
conferência que ele estava organizando. “Precisamos de um pouco dessa
economia maluca”, disse ele. Respondi a Orley que o tópico
decididamente era interessante, mas eu não sabia nada sobre o campo do
direito. Avisei que procuraria um colaborador especializado e retornaria o
contato.
Uma das participantes da nossa primeira colônia de férias, Christine
Jolls, era uma candidata de primeira linha. Estava acabando ao mesmo
tempo seu ph.D. em economia no MIT e sua graduação em direito em
Harvard, além de ser uma trabalhadora diligente. Christine estava disposta.
Quando começamos a considerar tópicos para abordar, logo definimos
material suficiente para uma palestra satisfatória, então comuniquei a
Orley que aceitava seu convite. A ideia básica era pensar como o campo de
análise econômica do direito, conforme praticado na época, devia ser
modificado para acomodar as descobertas recentes em economia
comportamental.
A abordagem tradicional da análise econômica do direito se baseava
exclusivamente em modelos de Econs. Muitos dos artigos se estendiam por
várias páginas até chegar à conclusão de que tudo daria certo se os
mercados fossem deixados por conta própria para resolver as coisas. Muitos
dos argumentos dependiam implicitamente de alguma forma da ideia da
mão invisível.
A nossa ideia era introduzir alguns dos elementos essenciais da
economia comportamental em tais argumentos e observar como
precisariam ser modificados. A essa altura eu tinha adotado o recurso
pedagógico de chamar esses elementos essenciais de “os três limites”:
racionalidade limitada, força de vontade limitada e interesse próprio
limitado. Em análise econômica do direito, essas propriedades dos
Humanos foram subentendidas como meticulosamente ilimitadas.
Acabei não podendo participar da conferência, deixando Christine dar a
palestra sozinha, mas tudo foi tão bem que julgamos válido expandi-la para
um artigo acadêmico. Planejávamos nos ocupar disso assim que tivéssemos
nos instalado cada um em seu novo emprego. Ela havia sido contratada
pela escola de direito de Harvard e entraria para a faculdade na mesma
época em que eu estaria chegando a Chicago.
Os astros deviam estar em algum alinhamento favorável, porque,
quando cheguei a Chicago, o primeiro membro da faculdade que conheci
fora da escola de negócios: Cass Sunstein, um professor da escola de
direito. Cass já vinha colaborando com Danny e estava empolgado com a
economia comportamental. No mundo do direito acadêmico, Cass era um
astro de rock. E, embora nominalmente sua especialidade seja direito
constitucional, ele escreveu artigos e livros sobre quase todo ramo do
direito, e é amplamente admirado. Almoçamos algumas vezes juntos e nos
demos bem. Seu entusiasmo é contagiante, e seu conhecimento
enciclopédico é estarrecedor. Em algum momento sugeri a Christine que
deveríamos considerar Cass como parceiro em nosso projeto de análise
econômica do direito comportamental. Não foi difícil vender a ideia.
Adicionar Cass ao nosso time de pesquisa foi um pouco como adicionar
Lionel Messi à pelada de fim de semana. Logo estávamos a todo vapor.
Digo “a todo vapor” porque Cass é muito rápido.
Nós três levamos apenas alguns meses para produzir uma primeira
versão de um artigo que intitulamos “Uma abordagem comportamental à
análise econômica do direito”. Foi o artigo mais longo que já escrevi. Para
professores de direito, quanto mais longo o artigo, melhor, e notas de
rodapé sempre são bem-vindas. A versão publicada do artigo2 tinha 76
páginas e 220 notas de rodapé, e só não foi mais longa porque fiquei o
tempo todo reclamando do seu tamanho excessivo.
Quando tínhamos a versão pronta para submeter a publicação, descobri
que o processo nos círculos legais é muito diferente daquele de economia.
Em economia, você só tem o direito de submeter seu artigo a uma revista
ou jornal de cada vez. Se rejeitarem, você pode tentar outro. Mas
publicações de direito permitem ao autor submeter um artigo a várias ao
mesmo tempo, e foi o que fizemos. The Stanford Law Review foi a primeira
a nos aceitar, e logo em seguida outra revista de direito também manifestou
interesse. Nós tínhamos poder de barganha, então fiz uma sugestão. Já que
os editores estavam tão ávidos em ter esse artigo com grande potencial para
a controvérsia, por que não conseguir deles que solicitassem um
comentário de algum proeminente representante do círculo interno de
análise econômica do direito a ser publicado no mesmo número, com um
espaço para uma réplica nossa? O debate com Merton Miller e seu time
havia atraído um bocado de atenção para o artigo sobre fundos fechados, e
pensei que o novo artigo poderia ter um efeito similar.
A escolha óbvia para prover o comentário crítico era o erudito em
direito Richard Posner. Posner é considerado por muitos como o fundador
da moderna análise econômica do direito e escreveu o tratado definitivo
sobre o assunto, muitas vezes revisto. O campo que Posner ajudou a criar
introduziu um raciocínio econômico formal no estudo do direito. Desde o
início, o campo da análise econômica do direito se baseou na economia
tradicional, ao estilo de Chicago, então ele teve um investimento
considerável na abordagem para a qual estávamos oferecendo uma
alternativa.
Sabíamos que Posner acharia muita coisa para criticar na nossa
abordagem, e também sabíamos que ele podia liquidar um argumento
rapidamente. Apesar de servir simultaneamente como professor de direito
em tempo parcial e juiz federal na 7a Região em Chicago (um degrau
abaixo da Suprema Corte), sua produtividade em pesquisa é lendária.
Como comentou de forma tão exuberante o economista Robert Solow:
“Outros homens respiram tanto quanto Posner escreve.”3 Escrever um
comentário sobre o nosso longo artigo não lhe exigiria muito tempo.
Embora tivéssemos um bom palpite sobre o que Posner poderia pensar
do nosso artigo, qualquer incerteza acerca de quais partes ele acharia mais
objetáveis foi resolvida na véspera do dia em que nós três apresentaríamos
o texto na escola de direito da Universidade de Chicago. Naquela manhã
recebemos uma carta dele com seus comentários. A carta, que percorria
muitas páginas com espaço simples, era altamente crítica e bastante
emotiva. Posner disse que anotara suas ideias para poder permanecer
calado durante a nossa fala, sabendo que outros também estariam ansiosos
para falar. Talvez tenha pensado que isso serviria como uma boa estratégia
de comprometimento.
Antes de chegar ao conteúdo dos argumentos, algum histórico é
necessário. Quando Richard Posner e outros da sua geração começaram o
movimento de análise econômica do direito, havia muitos acadêmicos do
direito que se sentiram desconfortáveis com algumas conclusões do
trabalho deles, mas careciam do treinamento em economia para encarar
uma boa briga. Naquela época, os poucos professores de direito que
tinham algum estudo formal em economia estavam usando a abordagem
tradicional baseada em modelos de Econs, e acadêmicos do direito que
tentaram questionar as conclusões de tais artigos muitas vezes se sentiram
q g
intimidados ao entrar no ringue contra a turma de análise econômica do
direito, que era capaz de rechaçar críticas com um condescendente “Bem,
você não entende”. Como resultado, no nosso workshop alguns
participantes estariam defendendo a religião dos velhos tempos, como
Posner, enquanto outros poderiam estar (silenciosamente) torcendo para
que os azarões conseguissem marcar alguns pontos contra os valentões.
Cass e Christine achavam que eu deveria apresentar o artigo.
Argumentaram que eu tinha mais experiência de batalha, ou pelo menos
essa foi a alegação deles. Eles ficaram por perto, e eu fiquei olhando para
ver se eles iam acabar se escondendo debaixo da mesa.
Comecei lembrando a todos que a análise econômica do direto usual
pressupõe que as pessoas têm crenças corretas e fazem escolhas racionais.
Mas suponha que não façam. Como a análise econômica do direito
deveria mudar? Nosso artigo oferecia um exemplo ilustrativo baseado em
uma nova política que havia sido adotada pelo departamento de polícia de
Chicago. As multas costumavam ser tradicionalmente colocadas no para-
brisa do carro, presas pela vareta do limpador. A nova política era emitir
multas impressas em papel brilhante laranja e coladas com alguma
substância grudenta na janela do motorista, onde ficavam bem evidentes a
todos que passavam. Comentamos que essa política era inteligente da
perspectiva comportamental, já que podia aumentar a probabilidade
percebida de levar uma multa, desencorajando dessa maneira o
estacionamento em local proibido a custo quase zero.4 Esse exemplo pode
não parecer profundo nem controverso, mas lembre-se de que uma parte
do conhecimento repassado pela análise econômica do direito diz que as
pessoas têm crenças corretas, inclusive acerca da probabilidade de serem
flagradas cometendo algum crime, e baseiam nisso suas decisões em
relação a cometer ou não um crime, desde estacionamento em local
proibido até assalto a banco, calculando os ganhos e perdas esperados. Se
fosse possível modificar a percepção da chance de ser pego simplesmente
mudando a cor e o local de colocação das multas de trânsito, sem alterar a
probabilidade real de ser pego, então poderia ser possível fazer o mesmo
com crimes mais sérios. Tal ideia era heresia pura.
O juiz Posner permaneceu em silêncio durante cerca de cinco minutos,
mas então não conseguiu mais se conter. Por que, perguntou ele sem mais
nem menos, estávamos ignorando a evolução? Por acaso a biologia
evolucionária não explicava muitos dos comportamentos estranhos
discutidos no artigo, tais como recusar ofertas pequenas no Jogo do
Ultimato, ou ignorar custos afundados? Será que a evolução não podia
explicar essas e todas as nossas outras “esquisitices cognitivas” (um termo
maliciosamente depreciativo que ele insistia em usar)? Seu raciocínio era
que, se os seres humanos tinham evoluído para prestar atenção em custos
afundados ou resistir a ofertas injustas no Jogo do Ultimato, então tal
comportamento deveria ser bom para nós em algum sentido e, portanto,
racional. Problema resolvido.
Garanti a ele que eu não era criacionista e aceitava a evolução como
fato científico. Acrescentei que não havia dúvida de que muitos dos
aspectos do comportamento humano dos quais estávamos falando tinham
raízes evolucionárias. Mas, argumentei, aceitar a teoria da evolução como
verdadeira não significa que ela precise ter proeminência em uma análise
econômica. Nós sabemos que as pessoas têm aversão à perda; não
precisamos saber se isto tem alguma explicação evolucionária. (Amos
costumava brincar que um dia existiram espécies que não apresentavam o
efeito posse, mas agora estão extintas.) Além disso, o verdadeiro motivo da
economia comportamental é esclarecer comportamentos que estão em
conflito com o modelo racional padrão. A menos que mudemos o modelo
para dizer que as pessoas prestam atenção a custos afundados, o modelo
fará predições ruins. A essa altura, Posner estava completamente
exasperado. “Você é totalmente não científico!”, ele exclamou em total
desespero. Eu resolvi permanecer calmo, então apenas sorri ante a sua
explosão, e disse: “Tudo bem, então.” Depois, segui adiante. Havia muito
mais material controverso ainda por vir, e eu estava determinado a não
entrar em uma disputa para ver quem fala mais alto, especialmente com
um juiz federal!
A briga maior foi em relação a algo chamado teorema de Coase. Este
teorema foi batizado com o nome do seu inventor, Ronald Coase, que fora
membro do corpo docente da escola de direito da Universidade de
Chicago por muitos anos. O teorema pode ser facilmente enunciado: na
ausência de custos de transação —isto é, que as pessoas possam negociar
facilmente entre si —, os recursos fluirão para o uso mais valorizado.5
A lógica é fácil de explicar. Vou seguir o caminho de Coase e explicar
por meio de um exemplo numérico simples. Suponha que Alexa e Julia
sejam colegas de quarto na faculdade. Julia é quieta e estudiosa, mas Alexa
é barulhenta e gosta de ouvir música no volume máximo enquanto estuda,
o que perturba Julia. Julia se queixa para Hallie, a responsável pelo
alojamento das alunas, que tem o poder de resolver disputas como essa.
Hallie pode escolher apenas uma das duas alternativas: pode dar a Alexa o
direito de ouvir música no volume que bem entender, ou pode dar a Julia
o direito ao silêncio durante certas horas. O teorema de Coase faz uma
forte e surpreendente predição: a decisão de Hallie não terá nenhum efeito
sobre a quantidade de música que Alexa vai tocar. Isso dependerá
simplesmente se Alexa gosta da sua música mais do que Julia a detesta.
O resultado é surpreendente, mas a lógica é simples. Suponha que
Alexa esteja disposta a pagar US$5,00 por noite para tocar sua música a
todo volume e que Julia esteja disposta a pagar US$3,00 por noite pelo
silêncio. Se for concedido a Julia o direito ao silêncio, então, de acordo
$
com o teorema de Coase, Alexa pagará a Julia algum valor entre US$3,00 e
US$5,00 pelo direito de tocar sua música, uma quantia que Julia aceitará.
Ambas ficarão mais felizes desta maneira do que se Alexa não pudesse
tocar a música e não houvesse dinheiro mudando de mãos; afinal, é a
razão por que ambas estão concordando com a transação. Mas se Alexa
ganha o direito de tocar sua música, Julia não estará disposta a lhe pagar o
suficiente para parar, já que o valor do silêncio é menor do que a alegria de
Alexa pela música. De um jeito ou de outro, Julia terá que encontrar
algum outro lugar para estudar se quiser ter silêncio.
A razão de esse resultado ser importante para o direito é que os juízes
frequentemente decidem quem possui um certo direito, e o teorema de
Coase diz que, se os custos de transação são baixos, então o que o juiz
decidir na realidade não determinará quais atividades econômicas
ocorrerão; o juiz simplesmente decide quem tem que pagar. O artigo que
inclui esse resultado, intitulado “O problema do custo social”,6 é um dos
artigos de economia mais citados de todos os tempos.
O argumento que esbocei até este ponto depende crucialmente da
premissa enunciada de que os custos envolvidos quando duas partes
chegam a um acordo econômico eficiente sejam pequenos ou inexistentes.
Coase é franco em relação a isso. Ele diz: “Esta é, obviamente, uma
premissa muito irrealista.”7 Embora muitas aplicações do teorema de
Coase ignorem sua advertência, queríamos mostrar que o resultado estava
errado, mesmo quando podia ser demonstrado que os custos de transação
eram essencialmente nulos. Para fazer isso, apresentamos os resultados dos
experimentos das canecas discutidos no Capítulo 16, resultados estes
resumidos na Figura 17.
Lembre-se de que a primeira fase do experimento envolvia fichas que
podiam ser resgatadas por dinheiro, com cada sujeito tendo um valor de
resgate pessoal diferente para a ficha, ou seja, o dinheiro que podiam obter
por ela se tivessem uma em seu poder no fim do experimento. O teorema
de Coase prediz que os estudantes que recebiam os valores pessoais mais
altos pelas suas fichas acabariam sendo donos delas; isto é o que significa
dizer que os recursos fluem para o uso mais valorizado. E foi isso que
aconteceu. O mercado funcionou perfeitamente, exatamente conforme a
teoria predisse, o que também indicava que os custos de transação não
deviam estar inibindo negócios de maneira significativa.
Mas o teorema de Coase não pretende se limitar a fichas para as quais
são atribuídos valores de acordo com as pessoas. Ele diz que a mesma coisa
deve acontecer quando substituímos as fichas por bens reais, tais como
canecas de café. Então, quando demos uma caneca de café a um estudante
sim e outro não, o teorema de Coase predisse que os estudantes que mais
gostaram das canecas deveriam acabar de posse delas, e, como as canecas
foram distribuídas aleatoriamente, cerca de metade das canecas deveria ser
negociada. Todavia, descobrimos que o volume de negócios foi bem
menor do que isso: os recursos não estavam fluindo na taxa prevista. E o
motivo era o efeito posse: as pessoas que ganharam canecas as valorizavam
mais ou menos o dobro do que as pessoas que não ganharam. A maneira
como os bens foram alocados afetou sim a posse final das canecas. Em
outras palavras, o teorema de Coase funcionava na teoria, negociando com
fichas resgatáveis por dinheiro, mas não funcionava na prática, ao negociar
objetos do mundo real como canecas de café. Questionar o teorema de
Coase em um workshop de análise econômica do direito! Isso era alta
traição.
Um dos aspectos lamentáveis da Universidade de Chicago na época,
que felizmente não é mais o caso, era que havia uma tolerância indevida
com acadêmicos que defendiam veementemente as linhas tradicionais da
Escola de Chicago com frequência. Um exemplo era o economista John
Lott, que havia encadeado uma série de compromissos como visitante que
lhe permitiram permanecer na universidade por vários anos. Lott é mais
famoso por seu livro intitulado Mais armas, menos crime.8 Como o título
sugere, a tese do livro é que basta assegurar que cada americano esteja
armado o tempo todo e ninguém ousaria cometer um crime, alegação esta
que outros pesquisadores têm questionado veementemente.9 Lott era um
participante frequente e ativo dos workshops. Seu estilo se assemelhava ao
de um pitbull.
Neste workshop, Lott estava presente e com ar irritado, então desejei
profundamente que ele não estivesse carregando uma arma. Sua esposa,
Gertrude (também economista), estava na plateia e fez uma pergunta sobre
o estudo das canecas. Seria possível que o baixo índice de negócios das
canecas fosse explicado por custos de transação? Informei que o
experimento com as fichas havia excluído essa explicação — afinal, as
fichas tinham os mesmos custos de transação que as canecas, e as fichas
foram negociadas com resultados bastante parecidos com o que a teoria
previa. Ela pareceu satisfeita, mas então Lott saltou para “ajudar”. “Bem”,
ele começou, “não poderíamos considerar o próprio efeito posse um custo
de transação?” Fiquei chocado com esse comentário; custos de transação
são supostamente o custo de fazer uma transação — não o desejo de fazer
uma transação. Se temos a liberdade de renomear à vontade preferências
como “custos” de modo que o comportamento pareça ser consistente com
a teoria padrão, então a teoria é ao mesmo tempo impossível de ser testada
e inútil. Assim, em vez de tentar ponderar com Lott, voltei-me para Posner
e lhe perguntei se ele agora reconhecia que eu não era a pessoa menos
científica na sala. Posner sorriu, fez um meneio de concordância, e todos
na sala que podiam vê-lo riram. Mas Posner não estava no campo de visão
de Lott, então o vi perguntando iradamente às pessoas em volta o que tinha
acontecido. Rapidamente passei para outro tópico.

––––––––

O fato de a resistência mais forte à economia comportamental vir daqueles


que tinham o maior investimento na construção do modelo do ator
racional levantava uma interessante possibilidade. Seriam suas objeções
mais uma evidência da falácia dos custos afundados? É claro que eu não
poderia dizer aos meus críticos que, ao se apegar a suas queridas teorias,
eles estavam meramente prestando atenção a custos afundados, mas eu
podia introduzir aquela pequena quantia de novos dados experimentais
que havíamos incluído no artigo. Os dados provinham de uma versão do
Jogo do Ultimato.
Na versão usual do jogo, o experimentador fornece dinheiro para os
participantes dividirem. Agora tínhamos criado uma versão na qual o
experimentador ganhava dinheiro! Pedimos aos estudantes para trazer à
aula US$5,00 com o propósito de uma demonstração em classe. (A
participação era voluntária.) Então cada aluno preencheu um formulário
indicando como jogaria uma versão de US$10,00 do jogo, com o dinheiro
proveniente dos US$5,00 de contribuição de cada jogador. Os jogadores
indicavam suas decisões de contingentes tanto como Proponente quanto
como Respondente, eram informados de que seriam aleatoriamente
designados para um desses papéis e, então, divididos em pares com outro
colega anônimo que recebera o outro papel.10
Se custos afundados não têm importância, então o resultado desse jogo
deveria ser idêntico àquele em que o experimentador fornece o dinheiro.
O custo irrecuperável de US$5,00 é um FSI. Mas economistas talvez
acreditassem que, se os estudantes tivessem que entrar com seu próprio
dinheiro, levariam o experimento mais a sério e, portanto, agiriam mais
racionalmente. Embora os Proponentes tivessem se comportado de forma
muito similar à dos participantes nas versões anteriores do jogo em que o
dinheiro provinha do experimentador, com a maioria se oferecendo para
dividir pelo menos 40% dos US$10,00, os Respondentes, aqueles nos quais
estávamos realmente interessados, mudaram seu comportamento de uma
maneira que tornou os resultados ainda mais inconsistentes com as
predições da teoria padrão.
Em vez da atitude racional voltada ao interesse próprio — pela qual
basta aceitar qualquer oferta positiva (a menor oferta permitida na nossa
versão era US$0,50) —, os Respondentes ficavam ainda mais preocupados
em serem tratados de forma justa quando estavam jogando com o dinheiro
que consideravam seu (e não com “dinheiro da casa”). Nos experimentos
que Kahneman, Knetsch e eu tínhamos feito anos antes, o pedido mínimo
médio dos Respondentes tinha sido US$1,94. Nesses novos experimentos,
a média pulou para US$3,21 para um grupo de estudantes de MBA do
MIT, US$3,73 para estudantes de MBA de Chicago, e US$3,35 para
estudantes de direito de Chicago. Em todos esses grupos, muitos dos
Respondentes exigiam os seus US$5,00 de volta. Deixar os experimentos
mais “reais” tornara os Respondentes menos consistentes com a
maximização da renda de interesse próprio! E, como esperávamos, a
audiência recebeu esse resultado com alguma consternação.
Esse experimento foi fundamental para a análise comportamental do
teorema de Coase. A disposição para se retirar de uma oferta “injusta” é
outra razão pela qual as predições do teorema muitas vezes falham. Fiz tal
descoberta em primeira mão muitos anos antes, em Rochester. O quintal
da nossa casa tinha um salgueiro que começava a perder as folhas no fim
do outono e continuava até mesmo depois da chegada da neve. Isso
tornava a limpeza das folhas especialmente árdua. A árvore estava
localizada muito perto da divisa do terreno ao lado, e o meu vizinho odiava
aquela árvore. Ele me pediu para removê-la.
Eu era ambivalente em relação à árvore. Era bonita de olhar e dava
alguma sombra, fatores que de certa forma compensavam o problema da
limpeza. Ainda assim, dando prioridade à harmonia com a vizinhança, me
informei sobre o custo de removê-la e descobri que o preço era
US$1.000,00, aproximadamente um mês do meu salário na época. Não
estava disposto a pagar tanto dinheiro para me livrar da árvore. Mas
conhecia o teorema de Coase. Na verdade, estava dando um curso no qual
o teorema desempenhava um papel central. Então fui conversar com o
meu vizinho e lhe disse que, embora a árvore não me incomodasse, se ele
fizesse muita questão, eu deixaria que ele a removesse caso estivesse
disposto a desembolsar a quantia. Ele achou que esta foi a sugestão mais
ultrajante que já tinha ouvido, bateu a porta na minha cara e nunca mais
tocou no assunto.
Quando as pessoas recebem ofertas que consideram injustas, podem
ficar suficientemente zangadas para castigar a outra parte, mesmo que isto
lhes custe alguma coisa. Esta é a lição básica do Jogo do Ultimato. Como a
história do salgueiro ilustra, o mesmo pode ocorrer em situações nas quais
o teorema de Coase é frequentemente aplicado. Após um processo
judicial, é típico que as partes estejam aborrecidas uma com a outra,
principalmente a pessoa que perdeu o processo. Para que o teorema de
Coase funcione, a parte perdedora precisa se dispor a fazer uma oferta para
o outro lado caso ele valorize mais o direito sobre a propriedade que
acabou de perder. Porém, as pessoas estão zangadas e a última coisa que
querem é conversar com o outro lado. O professor de direito Ward
Farnsworth documentou essa relutância entrevistando advogados de mais
de 20 casos civis nos quais se buscava uma medida cautelar e ela foi
concedida ou negada após questionada em juízo. Em nem um único caso
as partes sequer tentaram negociar após o tribunal ter emitido o veredito.11
Além do teorema de Coase, a outra parte do artigo que fez ferver o
sangue das pessoas foi algo que deixamos para o final da palestra — o
tópico do paternalismo. O princípio essencial subjacente às crenças
libertárias da Escola de Chicago é a soberania do consumidor: a noção de
que as pessoas fazem boas escolhas, e certamente escolhas melhores do
que qualquer outra pessoa poderia fazer por elas. Ao levantar aspectos de
racionalidade limitada e autocontrole limitado, estávamos minimizando
esse princípio. Se as pessoas cometem erros, é concebível, ao menos em
princípio, que alguém poderia ajudá-las a fazer uma escolha melhor.
Sabíamos que esse era um território traiçoeiro, inflamatório para o
pessoal de análise econômica do direito de Chicago, então abordamos o
tópico da forma mais suave possível, usando um termo que Cass tinha
cunhado: “anti-antipaternalismo”. O duplo negativo implicava que não
estávamos prontos para apresentar um argumento positivo a favor do
paternalismo. Em vez disso, observamos que a alegação automática de que
é impossível ajudar alguém a tomar uma decisão melhor é claramente
solapada pela nossa pesquisa. A seção breve, de duas páginas, sobre o tema
era seguida de uma seção maior sobre “burocratas comportamentais”. Foi,
para Cass e para mim, a primeira de muitas vezes que nos demos ao
trabalho de dizer que, se o burocrata do governo é a pessoa tentando
ajudar, deve-se reconhecer que o burocrata também é Humano, sujeito a
vieses. De maneira frustrante, não importa quantas vezes repetimos esse
refrão, continuamos a ser acusados de ignorá-lo.
Depois do workshop, nos retiramos para o clube dos professores.
Christine tomou uma taça de vinho, eu tomei um scotch duplo e Cass
tomou três Cocas Diet — seu elixir mais forte e preferido. Não havíamos
convertido nenhum dos participantes-chave, mas tínhamos sobrevivido.
Melhor ainda, tínhamos confirmado que o nosso artigo causaria rebuliço.

––––––––

Pós-escrito: Não é possível dizer qual foi o impacto que a nossa palestra
teve. Sabemos, sim, que ela tem sido frequentemente citada, mas não
podemos determinar se tivemos êxito em angariar alguém para a causa da
análise econômica do direito comportamental. O que posso dizer é que
hoje há um bocado de pesquisa sobre análise econômica do direito
comportamental sendo feita, o suficiente para encher o Oxford Handbook
of Behavioral Economics and the Law12 com suas 800 páginas, editado por
Eyal Zamir e Doron Teichman. Um dos proeminentes colaboradores
nesse campo, o professor de direito da UCLA Russell Korobkin, está pronto
para declarar vitória. “A batalha para tirar a análise econômica de regras e
instituições legais da camisa de força das estritas premissas da escolha
racional já foi vencida.”13 Sempre temeroso do excesso de confiança, não
estou pronto para declarar “missão cumprida”, mas certamente podemos
declarar com segurança “missão iniciada”.
28

AS SALAS DE TRABALHO

Normalmente, a Booth School of Business da Universidade de Chicago é


um manancial de pesquisa. Quase é possível sentir as fronteiras científicas
rachando à medida que vão sendo pressionadas por dentro. Exceto por
alguns meses na primavera de 2002. Durante esse período, as pesquisas —
pelo menos entre os docentes titulares da escola — tiveram uma pausa. As
salas de trabalho estavam sendo escolhidas.
A tarefa era aparentemente simples. Depois de anos alojada em salas
charmosas — apertadas e rústicas — no quadrilátero principal da
universidade, a escola de negócios estava construindo uma nova sede a dois
quarteirões de distância. Projetada pelo mundialmente conhecido
arquiteto Rafael Viñoly, seria um edifício moderno, impressionante, com
um saguão espetacular. O local ficava do outro lado da rua, bem em frente
à famosa Robie House, a primeira casa construída por Frank Lloyd Wright,
e Viñoly prestara uma sutil homenagem a Wright ao projetar o canto do
edifício que fica de frente para a icônica casa. A suntuosa edificação era
repleta de luz, e praticamente todo mundo estava ansioso pela mudança.
Só restava decidir quem ficaria com qual sala. O que podia dar errado?
Há muitas maneiras possíveis de distribuir salas de trabalho, mas os
chefes de departamento combinaram um processo inusitado. Haveria uma
sequência ordenada para a escolha das salas. A cada departamento foi
determinado um momento para a escolha, no qual poderia selecionar
qualquer sala livre, com pleno conhecimento de todas as escolhas feitas até
então. Parecia tudo bem, mas restava a importante questão: como
determinar a ordem de escolha? Senioridade era uma opção óbvia, mas em
Chicago existe um famoso ditado de que você só é tão bom quanto seu
último artigo. A senioridade como alternativa estava eliminada. Um sorteio
não foi considerado como opção; a localização das salas de trabalho era
algo importante demais para ser confiado apenas à sorte.
Os diretores resolveram que a ordem de escolha seria baseada em
“mérito”, e o juiz desse mérito seria o vice-reitor do corpo docente, John
Huizinga. Ele já tinha a função de negociar com novos professores os
termos de seus contratos, bem como de lidar com quaisquer docentes que
estivessem descontentes com suas atribuições de ensino, pagamento,
colegas, estudantes, orçamento de pesquisa ou qualquer outra coisa. Apesar
de vários anos na função, John era muito admirado pelo corpo docente,
que o considerava honesto, ainda que às vezes fosse muito franco e direto.1
Os outros diretores tiveram o bom senso de deixar claro que essa tarefa
seria de atribuição exclusiva de John, a quem deveriam ser encaminhadas
todas as reclamações. Após considerável deliberação, ele anunciou como a
ordem das escolhas seria determinada. Primeiro, haveria um certo número
de categorias (intervalos de classe, como são chamados em estatística).
John decidiria quantos intervalos haveria, mas a ordem dentro de cada
intervalo seria determinada por sorteio. O número de intervalos não foi
anunciado e não foi revelado até hoje. Como veremos, isso criou certa
ambiguidade em relação ao processo.
No dia da escolha, os professores teriam 15 minutos cada para escolher
sua sala de trabalho. Fariam isso com o auxílio de um dos arquitetos
trabalhando no projeto. Àquele ponto, o prédio era uma gaiola de aço, de
modo que não seria possível visitar as salas, mas as plantas e uma maquete
estavam à disposição. Duas outras regras de interesse: as salas não podiam
ser trocadas e, depois que um membro sênior sugeriu, os diretores dos
departamentos vetaram enfaticamente a possibilidade de comprar a
posição de um colega que fosse escolher antes. Essas regras, e o fato de a
escola não ter decidido simplesmente fazer um leilão da ordem de escolha,
revela que até mesmo na Booth School of Business — onde muita gente é
a favor de um mercado livre de bebês e órgãos — alguns objetos são
simplesmente sagrados demais para serem vendidos no mercado: salas de
trabalho dos professores.
A maior parte do corpo docente dava a impressão de que já antecipara
um processo vagamente semelhante, e quase todos os membros mais
antigos estavam contentes sabendo que seriam indicados para fazer as
primeiras escolhas. Seguiram-se algumas semanas de calma.
No devido tempo, todos os membros do corpo docente receberam um
e-mail anunciando que o processo de escolha ocorreria em algumas
semanas, e que o nosso horário de escolher seria, digamos, de 10h15 às
10h30 na quarta-feira. O e-mail não dava nenhuma dica sobre a ordem.
Estávamos no escuro... por cerca de 30 minutos. Anil Kashyap, um
hiperenergético professor sênior do grupo de finanças e economia, tomou
para si o encargo de tornar a ordem de escolha conhecida para todo
mundo. Um e-mail circulou pedindo às pessoas para responder
informando seu intervalo de tempo. Em poucas horas, o esquema geral da
ordem de escolha ficou claro.
A senioridade não havia sido totalmente ignorada. Todos os professores
titulares com plena estabilidade escolheriam antes dos professores
associados (sem estabilidade no nosso sistema), que escolheriam antes dos
professores assistentes, que escolheriam antes dos adjuntos, e assim por
diante. A ordem de escolha dentro dos grupos de docentes sem estabilidade
parecia claramente aleatória, e a essa altura os professores júniores
voltaram ao trabalho, tentando conseguir estabilidade e ter a chance de
algum dia trabalhar em uma daquelas salas dos professores sêniores.
Enquanto isso, o céu veio abaixo entre os membros sêniores do corpo
docente.
John nunca revelou a mim (ou a mais ninguém, que eu saiba)
exatamente como foi determinada a ordem de escolha para o corpo
docente sênior. O que se segue é o meu melhor palpite.2 Acredito que
havia três intervalos de classe de professores titulares. O primeiro (intervalo
A) tinha cerca de 12 pessoas que eram consideradas estrelas e/ou eram
figuras sêniores óbvias em seus respectivos grupos. Havia pelo menos um
docente de cada departamento, como, por exemplo, contabilidade,
economia e assim por diante, mas havia diversas pessoas de finanças, que é
de longe o maior departamento. Até aí, tudo bem. Ninguém teria
reclamado se Gene Fama tivesse recebido a primeira escolha. Ele era o
membro mais distinto do corpo docente.
O intervalo B continha a maior parte do restante dos docentes titulares,
com estabilidade, e o intervalo C consistia nos docentes que não estavam
mais fazendo pesquisa ativa. Em uma jogada elegante, John incluíra a si
mesmo como o último docente com estabilidade a escolher. Acredito que
John tenha selecionado as pessoas do intervalo A com diversos propósitos
em mente. Um deles era recompensar aqueles que tinham feito
contribuições significativas para a escola. Outro foi distribuir as estrelas da
faculdade por todo o prédio; as salas mais atraentes eram as que ficavam
nos cantos e, portanto, distantes umas das outras, já que o edifício de cinco
andares ocupa um quarteirão inteiro com as salas dos professores
espalhadas pelos três andares superiores.
O pessoal mais chateado era o que estava no grupo B, que achava que
merecia estar no A, e ainda teve azar no sorteio. Houve várias pessoas nessa
categoria, mas o mais irado de todos era “Archie”.3 Outro professor do seu
departamento, “Clyde”, havia sido incluído no intervalo A, e fora sorteado
para a segunda escolha. Enquanto isso, Archie ia fazer sua escolha quase
no fim do segundo grupo, depois de dois colegas muito mais jovens.
Chamar Archie de furioso a essa altura dos acontecimentos é pouco.
Dava literalmente pulos de raiva, se é que existe algo assim. Estava
totalmente frenético. Na opinião dele, todo o processo de escolha tinha
sido manipulado e as consideráveis evidências do contrário não eram
capazes de convencê-lo. A primeira escolha tinha sido para Doug
Diamond, um dos mais respeitáveis e queridos membros do corpo docente,
mas um nome desconhecido fora da academia. Fama foi o terceiro.
Lembro-me de ter pensado na época que a única pessoa realmente feliz
com sua posição na ordem de escolha era Doug. Mas ninguém ficou tão
descontente quanto Archie.
Cerca de um dia depois que a ordem de escolha se tornou pública, Anil
Kashyap voltou ao trabalho e resolveu que era essencial testar como sua
opção iria funcionar. Alguém em posição mais alta no processo podia estar
interessado em ver a “vizinhança” que se instalaria a partir das escolhas
posteriores. Conduzimos um processo de escolha “simulado”. Fizemos
circular uma planilha via e-mail, de Doug para Clyde, de Clyde para
Gene, e assim por diante, na qual todo mundo indicaria sua opção de sala
de trabalho.
Alguém fez circular plantas dos pisos, mas os professores queriam mais
informação, especificamente o tamanho de cada sala e se a sala tinha
termostato. Havia termostato em cerca de 1/3 das salas e, pelo menos
teoricamente, o ocupante da sala teria o poder de controlar a temperatura.
Sugeri a John que instalassem termostatos “placebo” no restante das salas
para deixar todo mundo feliz, e, baseado na minha experiência com o
termostato na sala que escolhi, os placebos teriam sido igualmente efetivos
em controlar a temperatura. A escolha simulada levou dias para ser
completada, provocando altas queixas de: “Onde está X, será que ele não
abre o e-mail?” Todo mundo estava fascinado pelo exercício, então o
repetimos para ver se as coisas mudariam. Isso era importante!
Finalmente, o dia da escolha chegou, e começamos o processo às 8h30
da manhã. O único entrave ocorreu quando alguém pegou uma sala que
alguém abaixo dele tinha reivindicado na simulação, produzindo uma
reclamação tipo: “Essa sala era minha, seu filho da mãe!” Parece que o
efeito posse pode ocorrer até mesmo para uma sala de trabalho escolhida
em um processo claramente rotulado como exercício prático. Então,
aconteceu algo estranho. Escolhendo às 13h15, o professor de finanças
Luigi Zingales estava de olho em uma sala no quinto andar, perto de onde
seus colegas de finanças corporativas estavam congregados. Luigi é
desconfiado por natureza — ele atribui isto à sua criação italiana — e
questionou a área estimada da sala que havia selecionado.
A arquiteta tentou desconversar, mas Luigi insistiu. Ela tirou da gaveta
as plantas reais dos pisos, só para descobrir que ele estava certo. A sala que
ele escolhera tinha cerca de 2 metros quadrados a menos do que o
indicado. (As salas são grandes, a maioria entre 18 e 21 metros quadrados.)
Luigi logo trocou sua escolha para outra maior nas proximidades, e voltou
ao seu escritório para divulgar sua descoberta. Naturalmente, não
mencionara sua suspeita a ninguém antes de escolher, para não perder sua
vantagem competitiva. A notícia se espalhou depressa. Pessoas que haviam
escolhido antes começaram a descer para o escritório onde estava sendo
feito o processo de seleção, exigindo que sua sala fosse medida novamente.
Foram descobertos outros erros nas estimativas dos tamanhos das salas, e as
pessoas quiseram trocar. Caos absoluto! John, que estava fora da cidade
para uma conferência, finalmente foi encontrado, e mais ou menos por
volta das 15h o processo de escolha foi suspenso para novas medições.
Foram necessários alguns dias para as novas medidas serem anunciadas.
Desta vez, alguns dos primeiros a escolher entraram para o grupo de
descontentes. Algumas de suas salas tinham “encolhido”, e eles quiseram
trocar para salas que outros, posteriores no processo, haviam escolhido.
John agora foi envolvido via e-mail. O processo de escolha seria totalmente
reiniciado na semana seguinte. As pessoas estavam livres para trocar a
opção anterior; no entanto, não podiam escolher nenhuma sala que alguém
já tivesse pegado, mesmo que essa pessoa tivesse uma posição posterior na
ordem de escolha. Mais alvoroço! Mais ou menos nessa época, John
circulou pelo saguão da faculdade durante a hora do almoço usando um
par de óculos de plástico Groucho Marx, como se estivesse incógnito. A
casa veio abaixo, mas aqueles que estavam fulos da vida não gargalharam
com tanto gosto.

Post mortem
Mais ou menos um ano depois, mudamos para o prédio novo e tudo estava
bem para a maior parte das pessoas. Em retrospecto, o aspecto mais notável
em relação a todo fiasco é que, exceto pelas nove salas de canto, as demais
salas eram praticamente iguais. Todas são boas, muito melhores do que as
que tínhamos no prédio antigo. É claro, algumas são um pouco maiores
que outras, algumas têm vistas um pouco mais bonitas, mas muitas das
diferenças que agora são visíveis não foram plenamente apreciadas na
época da escolha. Por exemplo, as salas do quinto andar foram escolhidas
primeiro, talvez com base numa heurística falha de que “mais alto é
melhor”, mas não há vantagem na vista do quinto andar em relação à do
quarto, e tem a desvantagem de ser servido apenas por um dos três
conjuntos de elevadores do prédio, o mais movimentado de todos. As salas
na face norte do edifício têm as vistas mais bonitas, inclusive da linha do
horizonte de Chicago, mas não estavam entre as primeiras escolhidas.
Se a face norte, com sua luz neutra e vista panorâmica atraente, era o
mais valioso nesse mercado, sem dúvida a metragem tinha sido
supervalorizada. A diferença entre uma sala de 18 metros quadrados e uma
de 21 metros quadrados não é uma diferença perceptível. A maioria das
pessoas que visita a escola nem sequer percebe que as salas diferem em
tamanho. Mas se a única coisa que você vê numa planilha é uma lista de
salas com suas respectivas medidas, esse fator tem propensão a ser
supervalorizado. Se há um número, as pessoas vão levá-lo em
consideração.4
Em retrospecto, penso que parte do furor criado por ranquear
explicitamente os membros do corpo docente poderia ter sido mitigada se
o processo tivesse sido um pouco mais transparente. Por exemplo, poderia
ter sido boa ideia tornar público o número de intervalos de classe. Isso ao
menos teria assegurado a Clyde que ele não fora encaixado
deliberadamente em uma das últimas posições de escolha.
Também jogo um pouco da culpa no arquiteto, Rafael Viñoly, e sua
equipe. Embora tenham passado respeitosamente centenas de horas
conversando com estudantes, professores e administradores sobre como o
prédio seria usado — e o resultado é um espaço tanto agradável
esteticamente quanto altamente funcional —, ninguém disse ao arquiteto
como as salas seriam escolhidas. Se ele soubesse, talvez tivesse evitado
totalmente salas de canto. Uma pequena mudança que ele poderia haver
datado, mesmo já em estado adiantado do jogo, era ter feito a sala de Doug
Diamond um pouco menor. A sala de Doug fica no quinto andar, no canto
nordeste, e, para jogar sal na ferida dos azarados, é a maior de todas. Na
época sugeri que, se possível, o arquiteto cortasse um pouco da sala e desse
um pedaço para um dos vizinhos, de modo que não fosse uma primeira
escolha tão óbvia. Mas ele era apenas um arquiteto; o termo “arquiteto de
escolhas” ainda não havia sido inventado.
29

FUTEBOL AMERICANO

Dos muitos aspectos exclusivos do chamado emprego de professor e


pesquisador em uma universidade de ponta, aquele que mais valorizo é a
liberdade de pensar em praticamente qualquer coisa que eu ache
interessante e ainda assim poder chamar isso de trabalho. Você já viu que
consegui escrever um artigo sobre contabilidade mental de consumidores
de vinho. Nos próximos dois capítulos mergulho em outros domínios que,
à primeira vista, podem parecer frívolos: escolha dos jogadores de futebol
americano da NFL (National Football League) e a tomada de decisões de
participantes de programas de jogos na televisão. O que os dois tópicos têm
em comum é que fornecem formas únicas de estudar tomadas de decisão
envolvendo altos montantes e, portanto, uma resposta aos críticos que
continuaram (e continuam) levantando a alegação da Manopla de que
vieses comportamentais somem quando os valores envolvidos são
suficientemente altos.
Uma versão dessa crítica, que se aplica ao estudo da NFL, vem de Gary
Becker, o mais distinto dos muitos praticantes da teoria dos preços de
Chicago.1 Chamarei essa crítica de “conjectura de Becker”. Becker
acreditava que, em mercados de trabalho competitivos, apenas pessoas
aptas a executar suas tarefas como Econs são capazes de alcançar as
posições-chave. Becker fez essa conjectura quando lhe pediram para dar
sua opinião sobre a economia comportamental. “A divisão de trabalho
atenua fortemente — se não elimina — quaisquer efeitos [causados pela
racionalidade limitada] (...) Não importa que 90% das pessoas não
consigam fazer a análise complexa requerida para calcular probabilidades.
Os 10% que conseguem acabarão em empregos onde isso for requerido.”2
Nesse capítulo, testamos a conjectura de Becker. Será que ela se aplica a
proprietários, gerentes gerais e treinadores dos times da NFL? Um spoiler:
não se aplica.
Minha pesquisa sobre a NFL foi feita com meu ex-aluno Cade Massey,
que agora leciona na Wharton School of Business. De forma semelhante à
minha experiência com Werner de Bondt, conheci Cade quando ele era
estudante de MBA, durante o meu primeiro ano na Universidade de
Chicago. Fiquei impressionado com a sua compreensão intuitiva daquilo
que motiva as pessoas e do que torna interessante um projeto de pesquisa.
Incentivei-o a continuar seus estudos e conseguir um doutorado.
Felizmente para nós, bem como para os estudantes suficientemente
afortunados de ter aulas com ele, ele concordou.
Nosso artigo sobre futebol americano3 é nominalmente sobre uma
instituição peculiar conhecida como Draft da NFL. Nos Estados, o
processo de escolha de novos jogadores para a liga profissional é similar à
forma como escolhemos nossas salas de trabalho. E não se preocupe: não é
necessário entender de futebol americano para compreender este capítulo
e suas implicações. No final, é um capítulo sobre um problema que toda
organização enfrenta: como escolher funcionários.
O Draft da NFL funciona da seguinte forma: uma vez por ano, no final
da primavera, os times selecionam novos jogadores em potencial. Quase
todos os candidatos estavam jogando futebol americano na faculdade ou
universidade, dando aos olheiros profissionais e gerentes gerais dos times a
oportunidade de ver como jogam. Os times se revezam escolhendo
jogadores, com a ordem de escolha determinada pelos resultados do time
no ano anterior. O time com pior desempenho escolhe primeiro, e o time
vencedor do campeonato escolhe por último. Há sete rodadas de escolha,
ou seja, cada time começa com sete “escolhas”, embora haja escolhas
adicionais conseguidas por razões que não são importantes para a nossa
história. Para o período inicial de contrato, geralmente quatro ou cinco
anos, o atleta só pode jogar pelo time que o escolheu. Quando o contrato
vence ou o jogador é dispensado pelo time, é declarado agente livre e pode
assinar com qualquer time de seu interesse.
Uma característica fundamental desse meio, que difere do processo de
escolha de salas da Booth School, é que os times têm permissão para
negociar suas escolhas. Por exemplo, o time com a quarta posição de
escolha pode concordar em desistir dela em troca de duas ou mais escolhas
posteriores. Há uma quantidade suficientemente grande de escolhas (mais
de 400 no nosso exemplo) para que seja possível inferir como os times
valorizam o direito de escolher primeiro. Os times também podem
negociar posições de escolha do ano corrente por posições em anos futuros,
o que provê um meio de examinar as preferências de tempo do time.
Antes de começarmos esse projeto, Cade e eu tínhamos um palpite de
que ocorria um sério “desvio” nesse meio. Especificamente, achamos que
os times estavam valorizando demais o direito de escolher mais cedo no
draft. Parte dessa sensação se baseava em observar alguns exemplos
extremos. Um dos mais famosos envolveu um cara magnífico chamado
Mike Ditka, um lendário ex-jogador que se tornou treinador do New
Orleans Saints.
No draft de 1999, Ditka decidiu que a única coisa que impedia os
Saints de ganhar um campeonato era a aquisição de um jogador, um
running back chamado Ricky Williams. Os Saints tinham a 12a posição na
sequência do draft, e Ditka estava preocupado que Williams pudesse ser
escolhido antes de chegar a vez dos Saints. Então anunciou publicamente
que estava disposto a trocar todas as suas escolhas se pudesse ficar com
Williams (não era a estratégia de negociação mais inteligente). Quando
chegou a vez dos Washington Redskins, o quinto time na ordem de
escolha, Ricky Williams ainda estava disponível e os Saints puderam fechar
o negócio que Ditka queria, embora a um preço exorbitante.
Especificamente, para passar da 12a posição para a quinta, os Saints
abriram mão de todas as escolhas que tinham naquele draft e mais as
posições de primeira e terceira rodadas do ano seguinte. A desistência
dessas últimas acabou se revelando particularmente custosa, porque os
Saints terminaram a temporada como o segundo pior time da liga em
1999, o que resultou em abrir mão da segunda posição de escolha no draft
inteiro de 2000. Ficou claro que abocanhar Williams não foi o suficiente
para dar a volta por cima, e Ditka foi demitido. Williams jogou pelos Saints
por quatro anos e foi um jogador muito bom, mas não causou nenhuma
grande mudança, e o time poderia ter se beneficiado de todos os jogadores
que teria adquirido se não tivesse aberto mão de todas aquelas escolhas.
Cade e eu nos perguntamos: por que alguém faria um negócio como esse?
A troca feita pelos Saints foi apenas um exemplo extremo do
comportamento generalizado que achávamos que encontraríamos, a saber,
supervalorizar o direito de escolher primeiro. Cinco achados da psicologia
da tomada de decisões apoiavam nossa hipótese de que escolhas
prematuras podem sair muito caro:

1. As pessoas têm excesso de confiança. Elas são propensas a achar que


sua capacidade de discriminar entre dois jogadores é maior do que
realmente é.
2. As pessoas fazem previsões extremas demais. Nesse caso, pessoas com a
função de avaliar a qualidade de possíveis jogadores futuros — os
olheiros — são afeitas demais a dizer que um jogador particular tem
probabilidade de ser um superstar, quando por definição superstars
não surgem com muita frequência.
3. A maldição do vencedor.4 Quando muitos interessados competem pelo
mesmo objeto, o vencedor do leilão é com frequência o licitante que
mais supervaloriza o objeto sendo vendido. O mesmo vale para
jogadores, especialmente os escolhidos logo na primeira rodada. A
maldição do vencedor diz que esses glorificados jogadores serão bons,
mas não tão bons quanto pensam os times que os escolhem. A maioria
dos times achava que Ricky Williams era uma excelente aposta, mas
ninguém o adorava mais que Mike Ditka.
4. O efeito do falso consenso.5 Em termos básicos, as pessoas tendem a
pensar que outras pessoas compartilham das suas preferências. Por
exemplo, quando o iPhone era novidade, fiz duas perguntas anônimas
aos alunos da minha classe: você possui um iPhone? Qual
porcentagem da classe você acha que possui um iPhone? Aqueles que
tinham iPhone achavam que a maioria dos seus colegas também
tinha, enquanto aqueles que não possuíam acreditavam que poucos
possuíam. Da mesma forma que o draft, quando um time se apaixona
por um certo jogador, simplesmente tem certeza de que todos os
outros times compartilham dessa mesma visão. Esse time tenta passar
à frente na fila antes que outro time lhe roube o jogador.
5. Viés do presente. Donos de times, técnicos e gerentes gerais, todos
querem ganhar agora. Para os jogadores selecionados no começo do
draft, sempre existe a possibilidade, muitas vezes ilusória, como no
caso de Ricky Williams, de que o jogador vá transformar
imediatamente um time perdedor em vencedor ou um time vencedor
no campeão do Super Bowl. Os times querem ganhar agora!

Então nosso pressuposto básico era que as primeiras escolhas eram


supervalorizadas, ou seja, o draft não satisfazia a hipótese do mercado
eficiente. Para nossa sorte, fomos capazes de obter todos os dados
necessários para testar com rigor essa hipótese.
O primeiro passo na nossa análise era simplesmente estimar o valor de
mercado das posições de escolha. Como elas são frequentemente
negociadas, pudemos usar dados de negociação históricos para estimar o
valor relativo das posições de escolha. Se você quer a quinta posição e tem
a 12a, como no caso de Ditka, quanto você normalmente precisa dar para
fazer essa troca? O resultado dessa análise é mostrado na Figura 18 a
seguir. Os pontos são trocas específicas que usamos para estimar a curva.
Duas coisas saltam à vista nesse gráfico. A primeira é que ela é bastante
íngreme: a primeira escolha vale cerca de cinco vezes a 33a, que é a
primeira da segunda rodada. Em princípio, um time com a primeira
escolha poderia fazer uma série de trocas e acabar com cinco escolhas
iniciais na segunda rodada.
A outra coisa a se notar nessa figura é como a curva se encaixa bem nos
dados. As trocas individuais, representadas pelos pontos, estão bem
próximas da linha estimada. Em trabalho empírico quase nunca se obtém
dados tão bem-comportados. Como isto pôde acontecer? Acontece que os
dados se alinham tão bem porque todo mundo confia numa coisa
chamada Chart, uma tabela que lista o valor relativo das posições de
escolha. Mike McCoy, um dos donos minoritários do Dallas Cowboys que
tinha formação de engenheiro, foi quem estimou originalmente o Chart.
O treinador na época, Jimmy Johnson, havia lhe pedido ajuda para decidir
como avaliar potenciais trocas. McCoy deu uma boa olhada nos dados
históricos de trocas e concebeu o Chart. Embora o Chart fosse informação
exclusiva do Cowboys, acabou se espalhando pela liga e agora todo mundo
o consulta. A Figura 19 mostra o alto valor que o Chart dá às escolhas de
primeira rodada.
Quando Cade e eu conseguimos encontrar o sr. McCoy, tivemos uma
boa conversa com ele sobre a história desse exercício. McCoy ressaltou que
nunca tinha sido sua intenção dizer o valor que as escolhas deviam ter,
apenas o valor que os times tinham usado com base em trocas anteriores.
Nossa análise tinha um propósito diferente. Queríamos perguntar se os
preços implícitos no Chart estavam “certos”, no sentido do termo adotado
pela hipótese do mercado eficiente. Será que um time racional deveria
estar disposto a abrir mão de tantas escolhas para conseguir uma entre as
primeiríssimas?
Mais dois passos eram exigidos para estabelecer nosso argumento de que
os times valorizavam exageradamente as primeiras escolhas. O primeiro
deles era fácil: determinar quanto custam os jogadores. Felizmente,
conseguimos obter dados sobre remuneração de jogadores. Antes de
adentrar em salários, é importante compreender outra característica
peculiar do mercado de trabalho da NFL para jogadores. A liga adotou um
teto salarial, ou seja, um limite superior de quanto um time pode pagar a
seus jogadores. Isto é muito diferente de inúmeros outros esportes, por
exemplo, da Major League Baseball, a liga de beisebol, e do futebol
europeu, onde proprietários ricos podem pagar quanto quiserem para
adquirir os melhores jogadores.
O teto salarial é o que torna o nosso estudo possível. Sua existência
significa que cada time tem que viver dentro do mesmo orçamento. Para
g q q
ganhar regularmente, os times são forçados a ser econômicos. Se um
oligarca russo quiser gastar centenas de milhões de dólares para comprar
um astro do futebol, é possível racionalizar essa decisão dizendo que ele
está obtendo utilidade ao assisti-lo jogar, assim como ocorre com a compra
de uma dispendiosa obra de arte. Mas na NFL, adquirir um jogador caro
ou ceder uma porção de escolhas para ter uma estrela como Ricky
Williams envolve custos de oportunidade explícitos para o time, tais como
os outros jogadores que poderiam ter sido contratados com aquele dinheiro
ou recrutados com essas escolhas. Essa restrição de um orçamento
limitante significa que o único meio de formar um time vencedor é
encontrar jogadores que ofereçam mais valor do que aquilo que custam.
A liga também tem regras para salários de estreantes. A remuneração
para jogadores no primeiro ano, pela ordem de escolha, é mostrada na
Figura 20. Os números que usamos aqui são o “teto” oficial cobrado do
time, que inclui o salário do jogador mais uma amortização por qualquer
bônus contratual pago como adiantamento. A Figura 20 tem muitas
características comuns com a Figura 18. Antes de mais nada, a curva é
bastante íngreme. Paga-se muito mais pelas escolhas iniciais do que por
aquelas feitas em rodadas posteriores. E, mais uma vez, os dados são
altamente regulares porque é a liga que determina quanto os jogadores
devem receber em seus contratos iniciais.
Então escolhas iniciais acabam saindo caras de dois modos. Primeiro, os
times precisam abrir mão de uma porção de escolhas para usar uma (ou
pagam para escolher primeiro, ou em custo de oportunidade, recusando
uma oferta para escolher depois). E, segundo, as escolhas iniciais acabam
custando um bocado de dinheiro. A pergunta óbvia é: elas valem a pena?
Outra maneira de fazer essa pergunta é: o que teria de ser verdade para
tornar racional o preço de uma escolha inicial, e tal fato seria mesmo
verdadeiro? O preço diz que, em média, o primeiro jogador escolhido no
draft é cinco vezes melhor que o 33o. Esse fato em si não nos diz nada, já
que os valores dos jogadores podem variar muito mais do que uma
proporção de 5:1. Alguns jogadores são estrelas perenes capazes de
transformar um time. Outros são completos fiascos que custam uma
fortuna ao time e dão pouco retorno. Na verdade, fiascos de alta
visibilidade acabam prejudicando o desempenho do time, porque os times
são incapazes de ignorar custos afundados. Se um time paga uma grande
soma de dinheiro a um dos primeiros escolhidos,6 ele se sente sob pressão
de escalá-lo, independentemente da performance dele em campo.
A chave parece ser a capacidade dos gerentes dos times em distinguir
entre as estrelas e os fiascos. Aqui está um simples experimento mental.
Suponha que você faça um ranking de todos os jogadores para uma
determinada posição (quarterback, wide receiver etc.) pela ordem em que
foram escolhidos. Agora pegue dois jogadores escolhidos
consecutivamente, como o terceiro e o quarto running backs, por exemplo.
Qual é a chance de o jogador escolhido antes ser melhor mediante alguma
mensuração objetiva? Se os times fossem previsores perfeitos, então o
primeiro escolhido seria melhor 100% do tempo. Se os times não têm essa
habilidade, então a escolha inicial será melhor metade do tempo, como
lançar uma moeda. Adivinhe só até que ponto os times são bons nessa
tarefa.
Na realidade, ao longo de todo o draft, a chance de um jogador
escolhido cedo ser melhor é de apenas 52%. Na primeira rodada, é um
pouco mais alta, 56%.7 Mantenha essa ideia em mente, tanto ao ler o
restante deste capítulo quanto da próxima vez que contratar alguém e tiver
“certeza” de ter encontrado o candidato perfeito.
Embora esse resultado nos dê um forte indício de como seria nossa
análise, vale a pena fornecer uma noção de nossa avaliação mais
meticulosa. Acompanhamos a performance de cada jogador recrutado
durante o nosso período de estudo, ao longo da vigência de seu contrato
inicial. Então, para cada jogador-ano, atribuímos um valor econômico para
a performance desse jogador; em outras palavras, estimamos o valor que o
jogador fornecia ao time naquele ano. Fizemos isso examinando quanto
custaria contratar um jogador equivalente (por posição e qualidade) que
estivesse no sexto, sétimo ou oitavo ano de contrato e, portanto, recebendo
como pagamento a taxa de mercado, porque ele se torna um agente livre
depois que o seu contrato inicial expira. O valor da performance de um
jogador para o time que o escolheu é então a soma dos valores anuais para
cada ano em que ele permanece no time até seu contrato inicial expirar.
(Depois disso, para reter o jogador, o time terá que pagar o preço de
mercado, ou ele pode ir para outro time.)
Na Figura 21, colocamos em um gráfico esse “valor de performance”
total para cada jogador, classificado pela ordem de escolha, bem como a
curva de remuneração mostrada na Figura 20. Note que a curva do valor
de performance é descendente, ou seja, os times têm certa habilidade ao
classificar jogadores. Jogadores que são escolhidos antes no draft são de fato
melhores, mas até que ponto? Se você subtrair o valor de remuneração do
valor de performance, obterá o “superávit” para a equipe, ou seja, quanto
valor de performance a mais (ou a menos) o time obtém em comparação
com quanto precisa pagar ao jogador. Você pode pensar nisso como o
lucro que o time tem com o jogador ao longo do seu contrato inicial.
A linha inferior do gráfico mostra o valor do superávit. O importante é
notar que esta curva é ascendente ao longo da primeira rodada. Isto
significa que as primeiras escolhas na verdade valem menos do que as
escolhas posteriores. Mas lembre-se, o Chart diz que escolhas iniciais
valem muito mais que escolhas posteriores! A Figura 22 mostra ambas as
curvas no mesmo gráfico e medidas em unidades comparáveis, com o eixo
vertical representando o valor relativo à primeira escolha, que recebe valor
1.
Se o mercado fosse eficiente, então as duas curvas seriam idênticas. A
curva do valor de escolha no draft seria uma previsão acurada do superávit
acumulado para o time que fez essa escolha; isto é, a primeira escolha teria
o superávit mais alto, a segunda, o segundo superávit mais alto etc. Isso
dificilmente ocorre. A curva do mercado de trocas (e o Chart) diz que você
pode trocar a primeira escolha por cinco escolhas no começo da segunda
rodada, mas estamos vendo que cada uma dessas escolhas de segunda
rodada gera mais superávit para o time do que a escolha de primeira
rodada, a qual estão trocando! Em todos os meus anos de estudo da
eficiência do mercado, essa é a violação mais flagrante que já vi.
Nós fizemos outra descoberta interessante em relação ao mercado de
escolhas. Às vezes os times trocam um lugar no draft do ano vigente por
um lugar no ano seguinte. Qual é a taxa para trocas desse tipo? Até mesmo
um olhar casual nos dados revela que é usada uma regra de praxe simples
para tais trocas: uma escolha em dada rodada do ano atual consegue uma
escolha em uma rodada anterior no próximo. Se você desistir de uma
escolha na terceira rodada deste ano poderá conseguir uma escolha na
segunda rodada no ano que vem. (Uma análise detalhada confirma que as
trocas seguem de perto esta regra.) Esta regra de praxe não soa descabida à
primeira vista, mas descobrimos que ela implica que os times estejam
descontando o futuro a 136% ao ano! E ainda falam em viés do presente!
Você consegue taxas melhores até com um agiota. Não é surpresa que
times espertos tenham descoberto isso e fiquem contentes em abrir mão de
uma escolha neste ano para obter uma escolha mais cedo no ano que
vem.8
Assim, nossa pesquisa gerou dois simples conselhos para os times.
Primeiro: troque “para baixo”. Troque posições de escolha elevadas de
primeira rodada por escolhas adicionais mais tarde no draft, especialmente
posições de segunda rodada. Segundo, seja um banqueiro de posições.
Ceda posições no ano vigente por melhores posições no ano seguinte.
Antes de discutir a importância dos nossos achados, especialmente o
conselho de “trocar para baixo”, é importante excluir algumas explicações
potenciais em que muitos leitores pensarão, especialmente aqueles que
raciocinam como economistas.
Será que a quantia ganha com vendas de camisas com o nome do
jogador é tão alta que os times ainda acham lucrativo recrutar um jogador
de destaque, mesmo que ele não se torne uma estrela? Não. Os times
dividem igualmente todas as vendas de camisas e outros produtos da NFL.
Será que a escolha de um jogador de destaque venda ingressos o
suficiente para fazer com que valha a pena sua seleção, mesmo que ele
não se torne uma estrela? Não. Antes de mais nada, a maioria dos times da
NFL tem listas de espera para comprar ingressos para a temporada. Porém,
acima de tudo, ninguém vai assistir a atuação de um jogador ruim mesmo
que ele seja famoso. Para investigar meticulosamente essa possibilidade,
refizemos a nossa análise usando apenas jogadores da linha ofensiva, os
mastodontes geralmente anônimos que tentam proteger o quarterback dos
gigantescos jogadores da defesa que procuram derrubá-lo. Embora apenas
os torcedores mais dedicados sejam capazes de nomear um número
considerável de jogadores da linha ofensiva do seu time favorito, nossa
análise resulta igual, então a “atração de estrela” não pode ser o fator
ausente que explique essa anomalia.
Será que a chance de conseguir um verdadeiro superstar poderia fazer a
aposta valer a pena? Não. A fim de demonstrar isso, fizemos uma análise
simples. A implicação básica da nossa análise é que times com posições de
escolha no início deveriam “trocar para baixo”, ou seja, trocar sua escolha
inicial por múltiplas escolhas posteriores. Para testar a validade dessa
estratégia, avaliamos toda troca dois-por-um que seria possível usando o
Chart como guia. Por exemplo, o Chart indica que o time com a primeira
escolha poderia trocá-la pelas escolhas sete e oito, quatro e doze, dois e
cinquenta, e assim por diante. Para cada uma dessas hipotéticas escolhas
potenciais, avaliamos como o time se saía usando dois critérios de medida
da atuação do jogador: jogos começados e número de anos eleito como all-
star. Descobrimos que trocar para baixo produzia um grande aumento em
jogos começados sem nenhum sacrifício para o número de temporadas
como all-star.
Como era possível que os responsáveis pelas decisões na liga errassem
tanto nesse aspecto? Por que as forças de mercado não dirigiam o preço das
escolhas no draft em direção ao valor do superávit que eles proporcionam
ao time? A resposta oferece uma boa ilustração dos limites para o conceito
de arbitragem que foi tão importante para compreender mercados
financeiros. Suponha que o time leia e compreenda o nosso artigo; o que
poderiam fazer? Se for um time bom, que geralmente está entre os líderes
da tabela, não há muito que possam fazer para tirar proveito da ineficiência
do mercado, além de estarem dispostos a ceder as escolhas deste ano por
escolhas melhores no ano que vem. Como não é possível uma escolha no
draft ser vendida entre as iniciais, não há oportunidade para um time
esperto, muito menos para investidores externos. O melhor que se pode
fazer é comprar um time ruim e, pelo menos por algum tempo, melhorar a
estratégia de escolhas no draft trocando para baixo.

––––––––

Antes mesmo de redigirmos o primeiro rascunho desse artigo, um dos


times da NFL já havia manifestado interesse, e até então havíamos
trabalhado informalmente com três times (um de cada vez, é claro). A
primeira interação que tivemos foi com Daniel Snyder, dono do
Washington Redskins. O sr. Snyder fora convidado pelo clube de
empreendedores da Booth School of Business para dar uma palestra, e um
dos organizadores me pediu para ser moderador de uma discussão com a
plateia. Concordei, sabendo que teria algum tempo para conversar em
particular com Snyder durante o almoço.
Dan Snyder é um self-made man. Abandonou a faculdade para começar
uma empresa de fretamento de jatos para vender viagens de férias
acessíveis a estudantes universitários. Mais tarde, entrou no negócio de
propaganda por mala direta e teve a sorte (ou sabedoria) de vender a
empresa em 2000, no pico do mercado. Usou o dinheiro dessa venda, mais
uma bela dívida, para comprar o Redskins, seu time do coração desde a
infância. (Sem nenhuma surpresa, muitos consideram o nome do time —
“peles-vermelhas” — pejorativo, mas Snyder defende que seja mantido.)
Ele era dono do time havia pouco tempo quando nos conhecemos.
Contei ao sr. Snyder sobre o projeto com Cade, e ele imediatamente
disse que mandaria “seus homens” nos visitarem logo em seguida, mesmo
que estivessem no meio da temporada. Disse: “Queremos ser os melhores
em tudo.” Aparentemente, quando o sr. Snyder quer alguma coisa, ele
consegue. Naquela segunda-feira, recebi um telefonema do seu diretor de
operações, que queria conversar com Cade e comigo o mais depressa
possível. Nós nos encontramos na sexta-feira daquela semana com dois de
seus associados, e tivemos uma discussão benéfica para ambas as partes.
Ensinamos a eles as coisas básicas sobre nossa análise, e eles puderam
confirmar alguns detalhes institucionais para nós.
Depois do término da temporada, tivemos discussões adicionais com a
equipe administrativa de Snyder. Àquela altura, tínhamos quase certeza de
que eles haviam dominado as nossas duas lições: trocar para baixo e trocar
posições de escolha do ano vigente por posições melhores do ano seguinte.
Naquele ano, Cade e eu assistimos ao draft pela televisão com especial
interesse, que acabou se transformando em profunda decepção. O time fez
exatamente o contrário daquilo que tínhamos sugerido! Trocaram para
cima no draft, e então trocaram uma posição alta no ano seguinte por outra
inferior no ano vigente. Quando perguntamos aos nossos contatos o que
tinha acontecido, recebemos uma resposta curta: “O sr. Snyder queria
ganhar agora.”
Essa foi uma boa previsão das decisões futuras de Snyder. Em 2012, o
Redskins teve a sexta escolha no draft, indicativo de que havia sido o sexto
pior time em 2011, e estava desesperado por um quarterback de alta
qualidade. Naquele ano havia dois quarterbacks altamente valorizados à
disposição, Andrew Luck e Robert Griffin III (conhecido abreviadamente
como RG3). Indianápolis tinha a primeira escolha e já anunciara sua
intenção de pegar Luck. O Redskins queria RG3. A segunda escolha
pertencia ao St. Louis Rams, que já possuía um jovem quarterback de
quem gostava, então o Redskins fez um acordo com o Rams. Avançou
quatro posições de escolha, mudando da sexta para a segunda, e, além de
abrir mão da sexta escolha, deu ao Rams suas posições de primeira e
segunda rodadas no ano seguinte, 2013, e sua posição de primeira rodada
em 2014. Foi um preço estarrecedor a ser pago para avançar apenas quatro
posições.
Qual foi o resultado de tudo isso? No primeiro ano, RG3 se esforçou ao
máximo para fazer a troca parecer inteligente, e nós, acadêmicos
sabichões, parecermos uns bobos. Ele era um jogador eficaz, empolgante
de assistir; o time estava ganhando e chegou aos playoffs, indicativo de que
a troca poderia ter chance de dar certo se RG3 se tornasse um superstar.
Contudo, no final da temporada, ele se contundiu e ficou no banco
durante uma partida. Quando retornou, possivelmente cedo demais,
agravou a contusão e precisou de cirurgia. No ano seguinte, não recuperou
a forma excepcional que mostrara como calouro, e o Redskins teve uma
temporada terrível, tão ruim que a escolha de primeira rodada de 2014 que
o Redskins tinha dado ao Rams acabou sendo a segunda daquele draft; a
desistência dessa segunda posição acabou se revelando extremamente cara.
(Lembre-se de que originalmente foi uma segunda posição de escolha que
levou o Redskins a fazer toda a troca para cima.) A temporada de 2014
também foi decepcionante para RG3. Em retrospecto, outro jogador
chamado Russell Wilson, que só foi escolhido na terceira rodada do draft,
parece ter sido melhor e menos propenso a contusões que RG3. Durante
seus três anos na NFL, Wilson levou seu time ao Super Bowl duas vezes,
vencendo uma.
É claro que não se deve julgar uma troca usando a visão retrospectiva, e
o Redskins com certeza teve o azar de Griffin sofrer contusões. Mas isto é
parte do argumento. Quando você abre mão de um punhado de boas
posições de escolha para selecionar um jogador, está colocando todos os
ovos na cesta dele, e jogadores de futebol americano, assim como os ovos,
podem ser frágeis.9
Nossa relação com o Redskins não durou muito, mas logo encontramos
outro time (cuja identidade deve permanecer confidencial) interessado em
conversar conosco sobre estratégia de draft. Em nossas tratativas com esse
time, ficamos sabendo que frequentemente ocorriam debates entre a
liderança sobre estratégia de draft. Alguns membros que se sentiam à
vontade com o pensamento analítico adotaram nossa análise e
argumentaram em favor de trocas para baixo e empréstimos. Outros, tais
como o dono ou um dos treinadores, frequentemente se apaixonavam por
um jogador e insistiam em trocas para cima para conseguir o sujeito. Além
disso, nas poucas ocasiões em que o time de fato fez trocas para baixo na
primeira rodada, obtendo uma posição de primeira rodada posterior mais
uma de segunda rodada adicional, a posição adicional não durava muito.
Essa escolha dava a sensação de “dinheiro da casa” e, em geral, era
rapidamente negociada para agarrar alguma outra “coisa segura”.

––––––––

O fracasso dos times em otimizar suas escolhas no draft é um bom exemplo


de situação em que o problema do principal-agente seria rotulado mais
acuradamente como problema de principal estúpido. Quando um
economista diz “Este é só um problema de agência” de um time que está
trocando para cima, quer dizer que o gerente-geral ou treinador está
É
preocupado com seu emprego e precisa vencer agora ou será demitido. É
perfeitamente racional que treinadores e gerentes se preocupem em perder
seus empregos — de fato, são demitidos com frequência. Mas penso que
jogar a culpa das suas más decisões nos tradicionais problemas de agência é
uma caracterização errônea. Em muitas dessas situações, e não só nos
esportes, o dono do time é no mínimo tão responsável por causar o
problema quanto seus empregados. Na maior parte das vezes, gerentes-
gerais fazem trocas para cima porque o dono do time quer vencer agora.
Isto é semelhante ao exemplo discutido no Capítulo 20 acerca do CEO
que queria que seus funcionários assumissem 23 projetos de risco, mas só
receberia três porque seus funcionários estavam preocupados com a
possibilidade de demissão caso o projeto não desse certo. Cabia ao CEO
resolver esse problema.
O mesmo se aplica a decisões dos treinadores. No futebol americano,
cada jogada é coreografada e há dezenas de decisões estratégicas
específicas que os treinadores podem tomar, ao contrário do futebol
convencional, que, por causa de sua natureza mais fluida, só oferece um
pequeno conjunto de jogadas ensaiadas, como nas cobranças de
escanteios, por exemplo. Algumas das oportunidades específicas de tomada
de decisão na NFL podem ser e têm sido analisadas. Uma decisão
específica é “ir com tudo” na quarta descida. Um time tem quatro jogadas
(downs, ou descidas) para tentar ganhar 10 jardas ou marcar. Se não
conseguir, a bola passa para o outro time. Se o time não consegue ganhar
essas 10 jardas nas três primeiras descidas, ele tem a opção de tentar ganhar
o que falta para completar as 10 jardas (chamado going for it), tentar um
field goal, ou chutar a bola através do campo concedendo a posse ao outro
time. David Romer, um economista de Berkeley, estudou esse problema e
descobriu que os times não optam pelo going for it o suficiente.10
A análise de Romer foi replicada e ampliada com muito mais dados por
um especialista em análise de futebol americano chamado Brian Burke.
Em 2013, o New York Times usou seu modelo11 para ajudar a criar um
aplicativo que calcula a estratégia ideal em qualquer situação de quarta
descida: punt, chutar um field goal ou going for it. Os torcedores podem
acompanhar o “4th Down Bot” do New York Times12 em tempo real e ver o
que a matemática diz que o time deveria fazer. Então, que efeito essa
pesquisa, juntamente com um aplicativo grátis, teve sobre o
comportamento dos treinadores de futebol americano? Essencialmente
nenhum. Desde que Romer escreveu seu artigo, a frequência do going for
it na quarta descida caiu marginalmente, isto é, os times ficaram ainda
mais burros! (De maneira similar, não houve nenhuma mudança
perceptível na estratégia de draft dos times desde que o nosso artigo saiu.)
Nate Silver, o ex-analista de esportes que ficou famoso por suas
previsões políticas e pelo excelente livro O sinal e o ruído,13 estima que
más decisões referentes à quarta descida custam em média meia vitória a
um time de futebol americano por temporada. Os analistas do Times
estimam que seja mais perto de 2/3 de vitória por ano. Pode não parecer
muito, mas a temporada é de apenas 16 jogos. Um time pode ganhar um
jogo extra a cada dois anos apenas tomando uma decisão inteligente duas
ou três vezes por jogo, uma decisão que podem inclusive checar on-line se
precisarem de ajuda.14
É claro que treinadores são Humanos. Tendem a fazer as coisas da
forma que sempre fizeram, pois suas decisões não serão questionadas pelo
patrão. Como observou Keynes, seguir a sabedoria convencional impede
que você seja demitido. Um proprietário esperto (que lê revistas de
economia ou contrata alguém para fazê-lo) encorajaria sua equipe a seguir
a estratégia que maximizasse a chance de ganhar e lhes diria que ir contra
as probabilidades é que os levaria ao olho da rua. Mas não há muitos
proprietários desse tipo. Então, ser dono de um time de futebol americano
de um bilhão de dólares não significa que você esteja no clube dos 10% de
Gary Becker, e com certeza não significa que você seja capaz de contratar
pessoas que estejam no clube e consiga que eles tomem as decisões ideais.
E onde isso nos deixa em relação à validade da conjectura de Becker —
que os 10% de pessoas que sabem calcular probabilidades acabarão em
empregos nos quais essa aptidão importa? Em algum nível, poderíamos
esperar que a conjectura seja verdadeira. Todos os jogadores da NFL são
realmente bons em futebol americano; todos os editores são bons em
ortografia e gramática; todos os traders de opções conseguem ao menos
achar a tecla nas suas calculadoras que compute a fórmula de Black–
Scholes, e assim por diante. Um mercado de trabalho competitivo faz, sim,
um bom serviço de canalizar pessoas para empregos que combinem com
elas. Mas, ironicamente, a lógica pode se tornar menos convincente à
medida que nos deslocamos para cima na escala administrativa. Todos os
economistas são pelo menos bastante bons em economia, mas muitos que
são escolhidos como chefes de departamento fracassam miseravelmente
nessa função. Este é o famoso Princípio de Peter:15 as pessoas continuam
sendo promovidas até chegarem ao seu nível de incompetência.
A tarefa de treinador de futebol, chefe de departamento ou CEO é
multidimensional. Para treinadores de futebol, ser capaz de administrar e
motivar um grupo de gigantes jovens e ricos durante uma longa temporada
é provavelmente mais importante do que ser capaz de descobrir se o going
for it na quarta descida vale a pena. O mesmo vale para muitos
administradores sêniores e CEOs, muitos dos quais foram notoriamente
estudantes fracos. Mesmo aqueles que foram bons alunos sem dúvida
esqueceram a maior parte do que aprenderam em estatística.
Uma maneira de resgatar a conjectura de Becker é argumentar que
CEOs, treinadores e outros administradores que são contratados porque
têm uma ampla variedade de aptidões, que podem não incluir raciocínio
analítico, poderiam contratar geeks que mereceriam ser membros dos 10%
de Becker para fazer os cálculos para eles. Mas meu palpite é que, à
medida que cresce a importância de uma decisão, a tendência de se apoiar
em análises quantitativas feitas por outros tende a encolher. Quando o
campeonato ou futuro da empresa está em jogo, os administradores
tendem a se apoiar em seus instintos viscerais.
Cade e eu mudamos então para um terceiro time que tem um dono
que aspira entrar no clube de elite de Becker. Porém, quanto mais
aprendemos sobre como times profissionais funcionam, mais
compreendemos como é difícil fazer todo mundo na organização adotar
estratégias que maximizem lucros e jogos vencidos, especialmente se essas
estratégias violarem a sabedoria convencional. Está claro que uma
condição necessária é ter carta branca de cima, a começar pelo
proprietário, mas aí o proprietário precisa convencer todo mundo que
trabalha para ele sobre as recompensas que terão por tomarem decisões
arriscadas e inteligentes, mas pouco convencionais, mesmo quando
(especialmente quando!) não dão certo. Poucos times conseguiram essa
fórmula vitoriosa, como é evidenciado pela falta de progresso na quarta
descida e nas decisões tomadas no dia do draft. Claramente, para entender
como times ou quaisquer outras organizações tomam decisões — e,
portanto, como melhorá-las —, precisamos estar totalmente conscientes de
que são possuídos e administrados por Humanos.
30

GAME SHOWS

Com toda a pesquisa sobre mercados financeiros, onde os valores em jogo


são seguramente altos, e mais o artigo sobre futebol americano, estávamos
claramente progredindo contra a crítica de que as anomalias
comportamentais observadas em laboratório não seriam replicadas no
chamado mundo real. Mas era cedo demais para declarar vitória. Mitos são
difíceis de matar. Além disso, havia uma limitação para esses achados: em
sua maior parte, diziam respeito a preços de mercado em vez de
comportamento individual específico. Sim, o preço das escolhas no draft
estava falho, mas não era possível identificar a causa comportamental
específica. Realmente, o fato de muitos fenômenos comportamentais,
desde o excesso de confiança até a maldição do vencedor, predizerem que
escolhas iniciais seriam supervalorizadas tornava impossível afirmar que
parte do comportamento desviante era o responsável pela precificação
inadequada. E, embora o comportamento de motoristas de táxi e
investidores individuais tivesse explicações plausíveis baseadas na teoria da
perspectiva, era impossível excluir outras explicações consistentes com a
maximização da utilidade esperada, talvez associadas com crenças
enviesadas. Economistas são realmente bons em inventar explicações
racionais para o comportamento, não importa quão tolo esse
comportamento pareça ser.
As perguntas altamente estilizadas que Kahneman e Tversky haviam
usado para construir a teoria da perspectiva eram planejadas para eliminar
todas as possíveis ambiguidades. Quando se pergunta a um sujeito: “Você
prefere ter US$300,00 com certeza ou uma chance de 50-50 de ganhar
US$1.000,00 ou perder US$400,00?”, a probabilidade de ganhar é
conhecida — precisamente 50% — e o problema é tão simples que não
pode haver nenhum outro fator de confusão contribuindo para a resposta
do sujeito. Danny e Amos “solucionaram” o problema dos valores altos
tornando as questões hipotéticas, então os sujeitos imaginavam estar
fazendo escolhas consideráveis, mas ninguém tinha a verba para tornar tais
escolhas reais. Até mesmo pesquisadores que iam a um país pobre para
aumentar os valores em jogo raramente usavam valores que fossem além
de poucos meses de renda; importante, mas não na mesma grandeza de
comprar uma casa, escolher uma carreira ou se casar. A busca por uma
maneira de replicar o tipo de perguntas de Amos e Danny com valores
realmente altos ainda não fora concretizada quando, em 2005, aconteceu
de eu achar uma resposta na Holanda.
A ocasião foi o recebimento de um título honorário na Universidade
Erasmus de Roterdã. Além da honraria, o ponto alto da visita foi um
encontro com três economistas: Thierry Post, um docente titular de
finanças; Martijn van den Assem, um novo professor-assistente; e Guido
Baltussen, estudante de pós-graduação. Eles tinham um projeto que
estudava as decisões tomadas em um game show na TV holandesa. Fiquei
intrigado com o projeto e empolgado com suas descobertas preliminares
dando sustentação à existência de um efeito dinheiro da casa em apostas de
valor muito alto. (Lembre-se de que o efeito dinheiro da casa, introduzido
no Capítulo 10, diz que as pessoas estão mais dispostas a arriscar quando
pensam que estão vencendo o jogo.) Nesse contexto, os competidores
enfrentavam decisões envolvendo centenas de milhares de dólares. Talvez
o mito de que achados comportamentais perdem a força face a apostas de
alto valor pudesse ser finalmente testado. Eles me perguntaram se eu
gostaria de me juntar ao grupo e trabalhar com eles no projeto, e eu
concordei.1
Se alguém tivesse me pedido para projetar um jogo com o objetivo de
testar a teoria da perspectiva e a contabilidade mental, eu não teria feito
um trabalho melhor do que aquele. A atração foi criada por uma empresa
chamada Endemol e, embora a versão original tivesse sido apresentada na
televisão holandesa, o programa logo se espalhou pelo mundo. Usamos
dados das versões holandesa, alemã e americana. O nome do programa em
holandês era Miljoenenjacht (“Caçando milhões”), mas em inglês
chamou-se Deal or No Deal.
As regras eram mais ou menos as mesmas em todas as versões do game
show, mas descreverei a versão holandesa original. A um competidor é
apresentado um quadro (ver Figura 23) mostrando 26 diferentes quantias
em dinheiro, variando de €0,01 a €5.000.000,00. Sim, tudo isso! O
competidor médio ganhava cerca de €225.000,00. Há 26 pastas, cada uma
contendo uma carta exibindo uma dessas quantias. O competidor escolhe
uma das pastas sem abri-la e pode, se quiser, mantê-la até o fim do
programa e receber a quantia que a pasta contém.
Tendo escolhido sua própria pasta, cujo conteúdo permanece secreto, o
competidor deve então abrir seis outras pastas, revelando as quantias em
dinheiro que cada uma contém. À medida que cada pasta é aberta, aquela
quantia é removida do quadro de prêmios possíveis, como mostra a figura.
O competidor tem então uma escolha: pode ganhar certa quantia, referida
como “oferta bancária” no alto do quadro, ou pode continuar a jogar
abrindo mais pastas. Ao enfrentar a escolha entre a oferta bancária e
continuar a jogar, o competidor precisa dizer “Deal” ou “No Deal”, pelo
menos na versão do programa em inglês. Se o competidor escolher
continuar (“No Deal”), terá que abrir pastas adicionais em cada rodada. Há
um máximo de nove rodadas, e o número de pastas a serem abertas nas
rodadas seguintes é: cinco, quatro, três, duas, uma, uma, uma e uma.
O tamanho da oferta bancária depende do prêmio em dinheiro
remanescente no quadro e do estágio do jogo. Para manter os
competidores no jogo e tornar o programa mais cativante, as ofertas
bancárias nos estágios iniciais são uma pequena proporção do valor
esperado dos prêmios remanescentes, onde o “valor esperado” é a média de
todas as quantias restantes. Quando o jogo começa, antes de qualquer pasta
ser aberta, o valor esperado é de aproximadamente €400.000,00. Na
primeira rodada, as ofertas são de cerca de 10% do valor esperado, mas
podem alcançar ou até mesmo exceder o valor esperado nas rodadas finais.
Na sexta rodada, o banco oferece em média cerca de 3/4 do valor esperado
e os competidores enfrentam decisões difíceis, de alto valor em jogo.
Como a oferta do banco sobe em termos de porcentagem do valor
esperado à medida que o jogo avança, os jogadores têm um incentivo para
continuar, mas, de fato, eles correm o risco de ter azar na escolha da pasta
a ser aberta. Quando pastas com grandes quantias em dinheiro são abertas,
o valor esperado cai e o mesmo ocorre com a oferta do banco.
Nosso objetivo principal no artigo era usar essas decisões de alto valor e
risco para comparar a teoria padrão da utilidade esperada com a teoria da
perspectiva,2 e, além disso, considerar o papel da “dependência da
trajetória”. A maneira como o jogo se desenrola influencia as escolhas que
as pessoas fazem? A teoria econômica diz que não deveria influenciar. A
única coisa que deveria ter importância é a escolha com a qual o
competidor está se defrontando naquele momento, não a sorte ou o azar
que ele teve ao longo da trajetória. A trajetória é um FSI.
Um achado aparentemente trivial tem muita importância na avaliação
das teorias concorrentes. Os jogadores têm só uma “aversão moderada ao
risco”. Muitos jogadores rejeitam ofertas de 70% do valor esperado e se
comprometem assim a continuar arriscando, mesmo que centenas de
milhares de euros estejam em jogo. Essa descoberta é relevante para a
literatura sobre o equity premium puzzle. Alguns economistas comentaram
que não haveria mistério se os investidores fossem altamente avessos ao
risco. Os resultados do programa não davam sustentação a essa hipótese.
Uma ilustração simples deste fato é que nenhum jogador no programa
holandês parou de jogar antes da quarta rodada, embora centenas de
milhares de euros estivessem ameaçados. Um jogador com um nível de
aversão ao risco suficientemente alto para explicar o risco do equity
premium puzzle jamais chegaria tão longe no jogo.
De maior interesse é o papel da dependência da trajetória. No meu
artigo com Eric Johnson3 que havia sido motivado pela propensão ao jogo
de pôquer do meu colega, encontramos duas situações que induzem as
pessoas a ter menos aversão ao risco que o normal, inclusive chegando a
buscá-lo ativamente. A primeira é quando estão ganhando o jogo e
“jogando com dinheiro da casa”. A outra é quando estão perdendo e têm
uma chance de sair no zero a zero (break even). Os participantes do Deal
or No Deal exibiam as mesmas tendências, e com valores altíssimos.
Para ter uma noção do que pode acontecer com alguém que se
considera “perdendo” no jogo, vejamos os apuros do pobre Frank, um
competidor no programa holandês. As seis pastas que Frank escolheu abrir
na primeira rodada eram na maioria com a sorte a seu favor, com apenas
uma delas contendo um valor alto, e seu valor esperado era superior a
€380.000,00. Mas na segunda rodada ele teve muito azar, escolhendo
quatro pastas com prêmios altos. Seu valor esperado despencou para cerca
de €64.000,00, e o banco estava lhe oferecendo apenas €8.000,00. Frank
estava no estado de espírito de alguém que tinha acabado de perder muito
dinheiro. Ele insistiu, sua sorte melhorou, e ele chegou a uma decisão
interessante no estágio seis. Os prêmios remanescentes eram €0,50,
€10,00, €20,00, €10.000,00 e €500.000,00, cuja média dá €102.006,00. O
banco lhe ofereceu €75.000, 74% do valor esperado. O que você faria?
Note que a distribuição dos prêmios é altamente distorcida. Se a
próxima pasta que ele abrir contiver o prêmio de meio milhão, ele terá
perdido a chance de um prêmio superior a €10.000,00. Frank, ainda
determinado a ganhar o dinheiro graúdo que vinha esperando, disse: “No
Deal.” Infelizmente, ele pegou em seguida a pasta de meio milhão,
derrubando seu prêmio esperado para €2.508,00. Abatido, Frank persistiu
até o fim. Na última rodada restavam duas quantias: €10,00 e €10.000,00.
O banqueiro, com pena de Frank, ofereceu-lhe €6.000,00, 120% do valor
esperado. Frank disse novamente: “No Deal.” E saiu do programa com
€10,00.
O outro extremo é ilustrado por Susanne, que participou da versão
alemã do programa. Menos lucrativa, o competidor médio ganhava
“apenas” €20.602,00, e o maior prêmio era de €250.000,00. Susanne teve
sorte com a sequência de escolhas, e na última rodada tinha apenas
€100.000,00 e €150.000,00 como prêmios remanescentes, duas das três
maiores quantias. Ela recebeu uma oferta de €125.000,00, exatamente o
valor esperado. Mesmo assim, disse “No Deal”, sem dúvida pensando que
estava arriscando apenas €25.000,00 do “dinheiro da casa”. A sortuda
Susanne deixou o programa com €150.000,00.
As decisões de Frank e Susanne ilustram os achados mais formais do
artigo, que mostram forte respaldo para a dependência da trajetória. Os
competidores claramente reagiam não só às jogadas que estavam
confrontando, mas também aos ganhos e perdas ao longo do caminho. O
mesmo comportamento que observei pela primeira vez nos meus colegas
de pôquer em Cornell, e depois testei com dezenas de dólares junto a Eric
Johnson, ainda aparece quando os valores em jogo são elevados a centenas
de milhares de euros.
Uma preocupação ao usar os dados de game shows para estudar
comportamento é que as pessoas podem agir de forma diferente quando
estão em público. Felizmente, Guido, Martijn e Dennis van Dolder, então
estudante de pós-graduação, realizaram um experimento para mensurar a
diferença entre decisões públicas e privadas.4
A primeira fase do experimento visava replicar os resultados dos game
shows com alunos diante de uma plateia. O programa de TV seria
simulado com a maior fidelidade possível, com um apresentador ao vivo,
um auditório lotado e fãs torcendo. A única coisa sem chance de ser
replicada era, é claro, o valor dos prêmios. Estes foram reduzidos em duas
versões: ou por um fator de 1.000 (valores altos) ou de 10.000 (valores
baixos). Os maiores prêmios eram €500,00 e €5.000,00 nas versões de
prêmios menores e maiores, respectivamente. Uma descoberta interessante
a partir desses experimentos é que as escolhas feitas não eram muito
diferentes daquelas da versão da TV. Conforme o esperado, os estudantes,
de maneira geral, tinham uma aversão ao risco um pouco menor nos
valores mais baixos, mas não drasticamente menor. E também ressurgiu o
padrão de dependência da trajetória, com grandes ganhadores e grandes
perdedores adotando uma postura de assumir risco maior.
O estudo foi adiante e comparou esses experimentos com outros que
envolviam estudantes tomando decisões privadas em um computador no
laboratório. Na forma como esses experimentos foram planejados, o
estudante no laboratório se defrontaria exatamente com o mesmo conjunto
de decisões e valores reais que ocorreram nos jogos disputados ao vivo
diante de uma plateia. Hora de um experimento mental: em que situação
os estudantes assumirão mais riscos, quando estiverem escolhendo
sozinhos ou diante do público?
Para mim os resultados foram uma surpresa. Eu pensava que escolher
na frente do público induziria os participantes a assumir mais riscos, mas
na verdade ocorreu o oposto. Diante do público, eles tiveram maior
aversão ao risco.5 Fora isso, os resultados foram bastante similares, o que é
reconfortante, já que a minha carreira como estudante de game shows
estava apenas começando.

––––––––

Outro domínio que atraía a queixa do tipo “e se você aumentar os valores


em jogo?” era o chamado “comportamento do outro”, como acontece no
Jogo do Ultimato e no Jogo do Ditador.6 Aqui, mais uma vez,
pesquisadores têm sido capazes de aumentar os valores para alguns meses
de renda, mas alguns ainda se perguntam o que aconteceria se houvesse
“dinheiro de verdade” em jogo. Algum tempo depois que nosso artigo Deal
or No Deal foi publicado, Martijn entrou em contato comigo sobre um
projeto que estava fazendo com Dennis van Dolder. A Endemol aparecera
com outro game show que estava implorando para ser analisado da
perspectiva comportamental. O programa se chamava, vejam só, Golden
Balls.
O final de cada episódio foi o que capturou nossa atenção. O programa
começa com quatro competidores, mas, em rodadas preliminares, dois
deles são eliminados, restando dois sobreviventes para disputar um jogo
final cujos valores podem ser bastante altos. Nessa fase final, eles jogam
uma versão do jogo mais famoso na teoria dos jogos: o Dilema do
Prisioneiro. Lembre-se da configuração básica: dois jogadores precisam
decidir se cooperam com o outro ou o abandonam. Em um jogo a ser
jogado apenas uma vez, a estratégia racional é egoísta, com os dois
abandonando um ao outro. Porém, se puderem cooperar de alguma forma,
o resultado é muito melhor. Contrariando a teoria padrão, em
experimentos do Dilema do Prisioneiro com valores baixos em jogo,7 40%
a 50% das pessoas cooperam. O que aconteceria se aumentássemos as
apostas? Os dados do Golden Balls nos permitiram encontrar uma resposta.
No programa, os dois finalistas acumulam uma bolada de dinheiro e
precisam tomar uma decisão para determinar como esse prêmio vai ser
dividido; eles podem escolher “repartir” ou “roubar”. Se ambos os
jogadores escolherem repartir, cada um fica com metade da bolada. Se um
deles diz “repartir” e o outro diz “roubar”, aquele que diz “roubar” fica
com tudo e o outro fica sem nada. E se os dois escolhem roubar, ambos
ficam sem nada. Os valores são suficientemente altos para fazer até mesmo
o economista mais teimoso reconhecer que são substanciais. O prêmio
médio é superior a US$20.000,00, e um grupo chegou a jogar por
aproximadamente US$175.000,00.
O game show foi apresentado durante três anos na Grã-Bretanha, e os
produtores foram bastante gentis em nos ceder as gravações de quase todos
os programas. Acabamos com uma amostra de 287 pares de jogadores para
estudar.8 Nossa primeira questão de interesse era se os índices de
cooperação cairiam com esses valores substanciais. A resposta, mostrada na
Figura 24, é ao mesmo tempo sim e não.
A figura mostra a porcentagem de jogadores que cooperam para várias
categorias de valores, de pequenos a grandes. Como muitos haviam
predito, os índices de cooperação caem à medida que os valores
aumentam. Mas uma comemoração dos defensores dos modelos
tradicionais de economia seria prematura. Os índices de cooperação de
fato caem, mas caem para mais ou menos o mesmo nível observado em
experimentos de laboratório jogados hipoteticamente ou para pequenas
quantias de dinheiro, isto é, 40% a 50%. Em outras palavras, não há
evidência que sugira que os altos índices de cooperação nas condições de
valores baixos não sejam representativos do que aconteceria se os valores
subissem.
Os índices de cooperação caem quando os valores sobem só porque,
quando os valores em jogo eram excepcionalmente baixos pelos padrões
desse programa, os índices de cooperação eram excepcionalmente altos.
Meus coautores e eu temos uma conjectura para explicar por que isso
acontece; nós a chamamos de hipótese da “grande mixaria”. A ideia é que
uma certa quantia pode parecer pequena ou grande dependendo do
contexto. Lembre-se da Lista, quando as pessoas estavam dispostas a
atravessar a cidade de carro para economizar US$10,00 em uma venda
pequena, mas não em uma grande. Dez dólares no contexto de comprar
uma televisão nova parecem “mixaria”, muito pouco para se preocupar.
Pensamos que a mesma coisa estava ocorrendo nesse programa. Lembre-se
que a bolada média de prêmio nesse jogo é de cerca de US$20.000,00,
então se dois competidores se veem em uma final em que a recompensa é
de apenas US$500,00, eles têm a sensação de que estão jogando por
mixaria. E se estão jogando por mixaria, por que não ser bacana,
especialmente em um programa de televisão nacional? É claro que, em
um contexto de experimento de laboratório, US$500,00 seria um prêmio
extraordinariamente grande para ser dividido.
Há evidência para o mesmo fenômeno de “grande mixaria” nos dados
do nosso Deal or No Deal. Lembre-se do azarado Frank, a quem foi
oferecida, na última rodada, a escolha entre €6.000,00 garantidos versus
uma chance 50-50 de ganhar ou €10.000,00 ou €10,00, e ele escolheu
arriscar. Desconfiamos que, depois de começar o jogo com um prêmio
esperado de aproximadamente €400.000,00 e tendo-lhe sido oferecidos até
€75.000,00 em rodadas anteriores, Frank achou que estava jogando por
mixaria e decidiu entrar de cabeça.
Nós investigamos outro aspecto do comportamento exibido em Golden
Balls: poderíamos predizer quem repartiria e quem roubaria? Analisamos
uma vastidão de variáveis demográficas, mas a única descoberta
significativa é que homens jovens são nitidamente menos propensos a
repartir. Nunca confie em um homem com menos de 30 anos.
Analisamos também os discursos que cada jogador faz antes da grande
decisão. Não é surpresa que todos eles tenham o mesmo tom: “Não sou o
tipo de pessoa que roubaria, e espero que você também não seja um desses
caras malvados.” Esse é um exemplo daquilo que a teoria dos jogos chama
de “conversa barata”. Na ausência de uma penalidade para a mentira, todo
mundo promete ser bacana. No entanto, acontece que há um sinal
confiável no meio de todo esse ruído. Se alguém faz uma promessa
explícita de repartir, há 30 pontos percentuais a mais de chance de que a
pessoa o faça. (Um exemplo de tal declaração: “Eu prometo que vou
repartir, 120%.”) Isto reflete uma tendência geral. As pessoas estão mais
dispostas a mentir por omissão do que por iniciativa. Se estou lhe
vendendo um carro usado, não me sinto obrigado a mencionar que o carro
está consumindo muito combustível, mas se você me pergunta
explicitamente “Seu carro queima muito combustível?”, você
provavelmente conseguirá arrancar de mim uma admissão de que, sim,
tem havido um pequeno problema nesse sentido. Para chegar à verdade,
vale a pena fazer perguntas específicas.
Colocamos estudantes para codificar tudo que aconteceu em cada
episódio, e só precisei assistir a mais ou menos uma dúzia para ter uma
ideia do mecanismo do jogo. Então, foi só depois que determinado
episódio de Golden Balls viralizou na internet que me dei conta de ter
visto um dos melhores momentos da TV — reconhecidamente uma
categoria com baixa concorrência. Os jogadores nessa ocasião eram Nick e
Ibrahim, e a estrela do jogo era Nick. Parece que Nick conseguiu fazer
uma bela carreira paralela como competidor em game shows, aparecendo
em mais de 30 programas diferentes. E ele pôs toda sua criatividade em
uso nesse programa.
Antes de descrever sua estratégia, preciso abordar um ponto técnico. O
jogo disputado em Golden Balls difere do Dilema do Prisioneiro padrão
sob um aspecto: se você reparte e o outro jogador rouba, você não está em
situação pior do que se também tivesse roubado. De um jeito ou de outro,
você fica com zero, enquanto no exemplo tradicional, se um prisioneiro
permanece calado e o outro confessa, o que permaneceu calado recebe
um severo castigo.9 Nick explorou essa pequena diferença ao elaborar seu
plano.
Tão logo o período de discussão começou, Nick tomou a iniciativa e fez
um anúncio surpreendente: “Ibrahim, quero que você confie em mim. Eu
lhe prometo que vou roubar, mas aí vou dividir os meus ganhos com
você.” Tanto Ibrahim quanto o apresentador tiveram muita dificuldade de
entender a lógica por trás dessa oferta. Como Ibrahim observou, havia um
jeito muito mais fácil de dividir por igual. Ambos os jogadores podiam
escolher a bola “repartir”. Porém Nick disse não, ele ia roubar. O
apresentador, que nunca tinha ouvido nada parecido, entrou para
esclarecer que qualquer promessa desse tipo não era autorizada nem
garantida pelo programa, e o único modo de assegurar que ambos os
jogadores recebessem metade era que ambos repartissem. Aparentemente,
a discussão extrapolou muito o tempo habitual reservado para isso, e a
maior parte foi editada para a exibição, que tem um limite de tempo
estrito. Você pode considerar o que faria no lugar de Ibrahim.
O coitado do Ibrahim estava claramente sob grande estresse e não
conseguia imaginar quais eram as intenções de Nick. A certa altura,
perguntou a Nick, em total desespero: “Onde você guarda o seu cérebro?”
Nick sorriu e apontou para a cabeça. Quando o apresentador finalmente
pôs fim à brincadeira e exigiu que os dois jogadores escolhessem que bola
jogar, Ibrahim, que parecera altamente cético em relação ao anúncio de
Nick, subitamente trocou a bola que tinha escolhido originalmente e
pegou a outra, dando todo o indício de que decidira entrar no jogo e
escolher a bola “repartir”, talvez sentindo que não tinha escolha. Ou talvez
tenha sido um blefe final.
Aí veio a revelação: Ibrahim realmente escolhera a bola “repartir”. E
quanto a Nick? Nick mostrou sua bola, onde também se lia “repartir”.
O programa Radiolab da National Public Radio dedicou todo um
episódio para esse programa específico. Os apresentadores perguntaram a
Ibrahim o que ele tinha planejado fazer, e ele disse que estava planejando
roubar até o derradeiro minuto. Os apresentadores o lembraram de que ele
tinha feito um discurso apaixonado sobre seu pai lhe dizer que um homem
vale tanto quanto sua palavra. “O que você diz disso?”, os apresentadores
indagaram, um tanto horrorizados com essa revelação. “Ah, isso aí”,
Ibrahim respondeu. “Na realidade, eu nunca conheci o meu pai. Só achei
que seria uma história eficaz.”10
As pessoas são interessantes.
VIII
PRESTANDO AJUDA
2004 – PRESENTE
Em meados da década de 1990, os economistas comportamentais tinham
dois objetivos básicos. O primeiro era empírico: encontrar e documentar
anomalias, tanto no comportamento individual quanto no empresarial,
bem como nos preços de mercado. O segundo era desenvolver teoria. Os
economistas não levariam o campo a sério até que ele tivesse modelos
matemáticos formais que pudessem incorporar as descobertas adicionais da
psicologia. Com novos e talentosos economistas comportamentais
adentrando o campo, e mesmo alguns teóricos1 bem estabelecidos, como
Jean Tirole (ganhador o Prêmio Nobel de 2014), brincando com modelos
comportamentais, houve progresso contínuo nas duas frentes. Mas havia
um terceiro objetivo à espreita em segundo plano: podíamos usar a
economia comportamental para tornar o mundo um lugar melhor? E
podíamos fazer isso sem confirmar a suspeita profundamente arraigada dos
nossos maiores críticos: que éramos socialistas disfarçados, talvez até
comunistas, querendo substituir os mercados pela burocracia? Era a hora
certa de abordar esse assunto.
31

SAVE MORE TOMORROW

Dada a atenção que a comunidade da economia comportamental tinha


dedicado coletivamente aos problemas de autocontrole, um ponto de
partida natural seria encontrar maneiras de ajudar as pessoas a poupar para
a aposentadoria. Desenhar melhores planos de poupança para esse fim é
uma tarefa para a qual a teoria econômica padrão está mal equipada. Antes
de mais nada, ela parte da premissa de que as pessoas estão poupando
exatamente a quantia certa (e, claro, investindo de forma inteligente). Se
elas já estão fazendo perfeitamente uma coisa, como você pode contribuir?
Além disso, mesmo que um economista quisesse ajudar em um projeto
desses, ele só teria uma ferramenta diretiva com que jogar, ou seja, o
retorno financeiro sobre a poupança descontado o imposto. As teorias
padrão de poupança,1 tais como as fornecidas por Milton Friedman ou
Franco Modigliani, fazem implicitamente uma fortíssima predição de que
nenhuma outra variável importa, já que os outros fatores que determinam
a poupança de uma família — tais como idade, renda, expectativa de vida
e assim por diante — não são controlados pelo governo. O governo não
pode mudar a sua idade, mas pode mudar o rendimento da sua poupança
após descontado o imposto — por exemplo, criando planos de
aposentadoria isentos de impostos. Ainda assim, há um problema básico
com o uso dessa ferramenta: a teoria econômica não nos diz até que ponto
os poupadores serão responsivos a tal mudança. Na verdade, não podemos
ter certeza nem de que a criação de uma poupança isenta de impostos irá
aumentar ou diminuir a soma total de dinheiro que as pessoas reservam
para a aposentadoria.
À primeira vista, pareceria que aumentar o rendimento da poupança
criando contas isentas de impostos deveria aumentar o volume de
poupança, já que os rendimentos subiriam. Mas, em reflexão adicional, é
possível notar que taxas de rendimento mais altas significam que é
necessário poupar menos para atingir uma determinada meta de
economia. Alguém que esteja tentando acumular um pecúlio específico
pode alcançar esse objetivo com menos poupança se os rendimentos
subirem.2 Então a teoria econômica oferece apenas uma ferramenta
diretiva, que é alterar a taxa de rendimentos descontados os impostos, mas
não sabemos se é melhor aumentá-la ou diminuí-la para aumentar a
poupança. Isso não ajuda muito. É claro que testes empíricos poderiam
nos dizer que efeito terá a mudança nas taxas de imposto, mas até
recentemente era difícil prover resultados definitivos. Conforme coloca o
economista de Stanford Douglas Bernheim em sua meticulosa resenha da
literatura publicada em 2002: “Como economista, não se pode resenhar a
volumosa literatura de tributação e poupança sem ficar um tanto
humilhado pela enorme dificuldade de aprender qualquer coisa de útil
mesmo acerca das questões empíricas mais básicas.”3
Um dos problemas em determinar o efeito de uma mudança na lei
tributária é que, para se qualificar para impostos baixos, os investidores
precisam satisfazer a outras regras, tais como colocar o dinheiro em uma
conta especial, possivelmente com penalidades para retiradas antes da
aposentadoria. Essa conta especial poderia facilitar a poupança de duas
maneiras. Primeira: a penalidade para retirada atua como incentivo a
deixar o dinheiro investido. Segunda: sacar dinheiro de uma conta mental
designada como “poupança para aposentadoria” é menos tentador do que
uma simples conta-poupança. Na verdade, logo após a introdução de
planos de poupança para aposentadoria isentos de impostos nos Estados
Unidos, houve um acalorado debate na literatura de economia4 sobre se
tais planos estariam aumentando a poupança ou simplesmente passando
dinheiro de contas tributáveis para contas isentas de impostos. Só muito
recentemente ocorreu o que considero um teste definitivo, ao qual
chegaremos mais adiante neste capítulo.
A economia comportamental oferece mais potencial neste e em muitos
outros domínios de políticas públicas porque tudo importa, ou seja, todos
aqueles FSIs. A primeira vez que me aventurei nessas águas foi em 1994,
com um breve artigo intitulado “Psychology and Savings Policies”.5 Nesse
artigo, eu fazia três propostas de políticas que se baseavam em percepções
comportamentais. As duas primeiras eram dirigidas a uma conta individual
de aposentadoria, então um popular veículo de poupança chamado
Individual Retirement Account (IRA). (Elas se tornaram menos
importantes quando os limites de renda para elegibilidade foram
restringidos e os planos de poupança para aposentadoria oferecidos pelas
empresas, tal como os 401(k), tornaram-se mais comuns.) Na época em
que eu escrevia, indivíduos podiam contribuir com até US$2.000,00 por
ano (US$4.000,00 para um casal) para essas contas isentas de impostos.
Como as contribuições eram dedutíveis, um indivíduo com uma taxa de
imposto marginal de 30% que contribuísse com o máximo de US$2.000,00
podia reduzir seu imposto em US$600,00.
Um problema com o modelo IRA é que o contribuinte já precisa ter
feito a contribuição antes de submeter a declaração de imposto de renda.
Esse modelo é problemático porque muitos contribuintes só têm dinheiro
para investir em uma IRA depois de terem submetido a declaração e
acertado as contas com o governo. Os contribuintes americanos têm mais
probabilidade de gastar dinheiro após enviarem a declaração de imposto de
renda, porque 90% deles recebem uma restituição que gira em média em
torno de US$3.000,00 por família, e o dinheiro da restituição leva algum
tempo para chegar.
Então a minha primeira sugestão era permitir aos contribuintes usar sua
restituição do imposto de renda para fazer uma contribuição já
descontando da restituição (referente à renda do ano anterior). Pela minha
proposta, o contribuinte só teria que criar uma conta IRA antes de
preencher o formulário, e então poderia simplesmente solicitar à Receita
para enviar parte da restituição para essa conta, e repetir isso nos anos
seguintes usando a mesma conta.
A segunda proposta foi planejada para reforçar a primeira. Sugeri que o
governo ajustasse a fórmula utilizada para determinar quanto dos salários
dos trabalhadores é retido na fonte pelo Departamento do Tesouro como
antecipação de impostos. Essa fórmula poderia ser ajustada para que os
contribuintes recebessem restituições um pouco maiores no final do ano, a
não ser que reduzissem ativamente os índices de retenção, o que qualquer
um pode fazer. A evidência aponta que, ao receber uma soma inesperada6
— e, aparentemente, é assim que consideram a restituição do imposto,
apesar de ser esperada —, as pessoas tendem a poupar em proporção maior
do que fazem com os ganhos regulares, especialmente quando se trata de
uma quantia considerável. Assim, minha ideia era que, se aumentássemos
o valor da restituição, geraríamos mais poupança, independentemente de
encontrarmos uma forma de facilitar o encaminhamento dessas
restituições para uma poupança IRA. O ideal seria combinar essas duas
propostas.
Eu desconfiava que o aumento das alíquotas de retenção provavelmente
teria outro efeito colateral benéfico: melhor cumprimento das obrigações
fiscais. Minha sensação era de que muitos contribuintes consideravam a
restituição como ganho e a redução no pagamento como perda; e, ao se
defrontar com uma perda, podem ser “criativos” no preenchimento da
declaração. Lembre-se de que as pessoas tendem a buscar o risco no
domínio das perdas quando têm a chance de um break-even. Um estudo
recente de 4.000.000 de restituições de imposto na Suécia confirmou o
meu palpite. Os autores descobriram que os contribuintes aumentavam
significativamente suas deduções reivindicadas como “outras despesas para
recebimento de renda empregatícia” se tivessem imposto a pagar. A
reinvindicação de pequenas quantias nessa categoria estudada pelos
$ $
autores (menos de Kr$20.000,00, cerca de US$2.600,00) é sabidamente
fictícia em sua maioria. Quando os contribuintes são auditados7 (o que é
raro), tais reivindicações são rejeitadas em mais de 90% das vezes.
Minha terceira proposta envolvia uma mudança simples na maneira
como as pessoas aderem a planos de poupança com contribuição definida
oferecidos pelos seus empregadores, tais como os planos 401(k) oferecidos
nos Estados Unidos. Basicamente, indaguei: por que não mudar o padrão?
Conforme as regras habituais, para aderir ao plano, o empregado tem que
preencher um punhado de formulários, escolher uma taxa de poupança e
decidir como investir o dinheiro. Por que não fazer da adesão ao plano a
opção padrão e dizer às pessoas que, se não desmarcarem essa opção,
estarão automaticamente inscritas no plano com uma taxa de poupança
padrão e com algum produto de investimento padrão?
A economia faz uma predição clara sobre essa última proposta: não
surtirá nenhum efeito. A designação de uma opção específica como padrão
é um FSI. Os benefícios de aderir a um plano 401(k) podem resultar em
grandes quantias de dinheiro — dezenas, se não centenas de milhares de
dólares —, especialmente se, como é comum, o empregador entra com
alguma parcela da contribuição. Nenhum Econ deixaria que o pequeno
inconveniente de preencher alguns formulários o impedisse de receber
tanto dinheiro. Seria como comprar um bilhete de loteria premiado e não
se dar ao trabalho de resgatá-lo porque precisaria gastar cinco minutos para
ir até a casa lotérica. Mas para os Humanos, para quem o preenchimento
de formulários pode ser intimidador e a escolha de estratégias de
investimento é uma tarefa assustadora, tornar a adesão ao plano como
opção padrão pode ter um grande efeito.
Mais tarde fiquei sabendo que não fui o primeiro a pensar em modificar
a opção padrão para adesão a planos de aposentadoria. Algumas firmas já
haviam tentado, mais notavelmente o McDonald’s, a gigantesca rede de
fast-food. Mas o nome habitualmente usado para esse plano na época foi
uma escolha infeliz. Na indústria era chamado de “eleição negativa”. É
difícil deixar as pessoas empolgadas com um plano que é chamado de
eleição negativa.
Alguns anos depois de publicar esse artigo, fui solicitado a dar uma
palestra para clientes de planos de aposentadoria no Fidelity, o gigantesco
fundo mútuo americano. O Fidelity, é claro, tinha um interesse pecuniário
nesse tópico. Empresas por todos os Estados Unidos vinham rapidamente
trocando o velho estilo de planos de pensão, no qual o empregador tomava
todas as decisões, pelos novos planos de contribuição definida. Em
resposta, o Fidelity e muitas outras grandes empresas de prestação de
serviços financeiros haviam criado novas linhas de negócios para
administrar os planos para os empregadores, e seus fundos mútuos também
eram oferecidos como veículos potenciais de investimento para o
empregado. Aumentar o saldo das contas seria bom para os empregados e
para o Fidelity.
Se eu conseguisse pensar em algo que pudesse pôr mais dinheiro nas
contas de poupança para aposentadoria, teria na plateia os representantes
de várias centenas de grandes empregadores, e eles poderiam estar
dispostos a tentar. É claro que eu defenderia a alteração da opção padrão
para a adesão automática, mas seria bom também apresentar alguma coisa
nova.
Depois de alguns brainstorms com Shlomo Benartzi, naquela época já
um colaborador regular, a abordagem que adotei foi fazer uma lista das
razões comportamentais mais importantes que levam alguém a deixar de
poupar o suficiente para a aposentadoria, e então desenhar um programa
capaz de superar cada um desses obstáculos. É uma abordagem que agora
uso com frequência quando tento idealizar uma intervenção
comportamental para algum problema. Para a minha lista, identifiquei três
fatores.
O primeiro obstáculo é a inércia. Pesquisas revelam que a maioria das
pessoas que pagam planos de aposentadoria pensam que deveriam estar
poupando mais, e planejam tomar alguma atitude, hum... em breve. Mas
então procrastinam e nunca chegam a alterar suas taxas de poupança. Na
verdade, a maioria dos participantes de planos raramente faz qualquer
mudança nas suas opções de poupança, a menos que mudem de emprego
e sejam confrontados com um novo conjunto de formulários que terão de
preencher. Superar a inércia é o problema que a adesão automática resolve
em um passe de mágica. O mesmo conceito deveria ser incluído em um
plano para aumentar as taxas da poupança. Se pudéssemos, de algum
modo, fazer com que as pessoas que começaram um plano aumentassem
suas taxas de poupança, deixando que isto ocorresse automaticamente, a
inércia poderia funcionar a nosso favor em vez de contra nós.8
O segundo obstáculo é a aversão à perda. Sabemos que as pessoas
detestam perder e, em particular, detestam ver seus contracheques sendo
diminuídos. Com base nas descobertas do nosso estudo sobre o que é justo,
também sabemos que, nesse domínio, a aversão à perda é mensurada em
valores nominais, isto é, sem ser corrigida pela inflação. Então, se
pudéssemos bolar um jeito de os empregados não sentirem cortes nos seus
contracheques, haveria menos resistência a poupar mais.
O terceiro insight comportamental estava relacionado com o
autocontrole. Um achado fundamental da pesquisa sobre esse tópico é que
temos mais autocontrole quando se trata do futuro do que do presente. Até
mesmo as crianças dos experimentos com marshmallow feitos por Mischel
não teriam dificuldade se hoje lhes fosse dada a escolha entre um
marshmallow às 14h de amanhã ou três marshmallows às 14h15 de
amanhã. Todavia, sabemos que, se lhes dermos a mesma escolha amanhã
às 14h, poucos seriam capazes de esperar até as 14h15. Eles têm o viés do
presente.
A proposta que acabei apresentando na conferência do Fidelity recebeu
o nome de “Save More Tomorrow” [Poupe Mais Amanhã]. A ideia era
oferecer às pessoas a opção de decidir agora aumentar suas taxas de
poupança mais tarde, especificamente quando recebessem o próximo
aumento. E, então mantê-los inscritos no programa até que optassem por
sair ou alcançassem algum teto. Vinculando os aumentos nas taxas de
poupança aos aumentos de salário, a aversão à perda seria evitada.
Pedindo-lhes que tomassem uma decisão que seria efetivada em algum
momento no futuro, o viés do presente seria mitigado. E, ao manter o
plano em vigor a menos que a pessoa optasse por sair, a inércia trabalharia
a nosso favor. Tudo que eu sabia sobre economia comportamental sugeria
que tal plano funcionaria. Ingenuamente, eu também estava confiante de
que uma das centenas de empresas na conferência em breve entraria em
contato para experimentar essa grande nova ideia. E estava contente em
entregá-la de bandeja e oferecer consultoria grátis a qualquer um que
estivesse disposto a tentá-la, contanto que deixassem Benartzi e eu
avaliarmos o que aconteceria.
Que ilusão. Nem uma única empresa entrou em contato. E a adesão
automática também não estava se saindo melhor, mesmo com seu nome
aprimorado.
Uma coisa que estava tornando lenta a adoção da adesão automática era
que as companhias não estavam seguras de que era legal. Aqui um
advogado e especialista em pensões, Mark Iwry, interveio para ajudar. Iwry,
na época funcionário do Departamento do Tesouro encarregado da
política nacional de pensões, levou o Departamento do Tesouro e a
Receita a emitirem uma série de regulamentos e pronunciamentos que
definiam, aprovavam e promoviam o uso daquilo a que se referiam como
adesão automática ao 401(k) e outros planos e aposentadoria. Assim, Mark
Iwry realmente pavimentou o caminho para as empresas tentarem essa
nova ideia, não só com um nome melhor, mas também com um carimbo
de aprovação legal. (Ele fez isto de forma bastante independente, embora
mais tarde tivéssemos nos conhecido e trabalhado juntos em outras
iniciativas.)
Contudo, continuava sendo difícil encorajar as empresas a adotar a
ideia sem prova de que ela realmente dava certo. Tal problema foi
resolvido por uma colega de Chicago, Brigitte Madrian, que agora leciona
na Kennedy School of Government, em Harvard. Brigitte entrou um dia
no meu escritório para me mostrar alguns resultados interessantes que
obtivera e que eram tão fortes que ela mal podia acreditar, embora ela
mesma tivesse feito os cálculos. Uma empresa que havia tentado a adesão
automática pediu que Brigitte analisasse os dados. Ela trabalhou com um
funcionário da companhia, Dennis Shea, para ver se a adesão automática
era efetiva. Os resultados foram estarrecedores, pelo menos para Brigitte,
que tinha recebido formação tradicional como economista. Ela sabia que a
opção padrão era um FSI e, portanto, não deveria ter importância. Mas ela
pôde ver que tinha, sim.9
A empresa havia adotado a adesão automática em junho de 1999, cerca
de um ano depois que o conceito recebera a aprovação oficial do governo.
Brigitte comparou o comportamento de empregados recém-elegíveis para o
plano em 1998, o ano anterior à mudança, com o de contratados no ano
após a mudança. Mesmo os empregados mais desinformados acabam
percebendo que aderir a um plano de aposentadoria é uma boa ideia,
especialmente um plano como aquele, com participação do empregador;
então a adesão automática afeta principalmente a rapidez com que as
pessoas aderem. Antes da adesão automática, apenas 49% dos empregados
aderiam ao plano durante o primeiro ano de elegibilidade; depois da
adesão automática, esse número saltou para 86%. Apenas 14% optaram por
sair. É uma mudança de comportamento muito impressionante produzida
por um fator supostamente irrelevante.
Madrian e Shea apropriadamente chamaram o artigo resultante de “O
poder da sugestão”10 e suas análises revelam que o poder de opções padrão
pode ter suas desvantagens. Qualquer companhia que adote a adesão
automática precisa escolher uma taxa de poupança padrão e um portfólio
padrão de investimentos. Sua companhia adotara uma taxa de poupança
de 3% como padrão, e o dinheiro ia para um fundo do mercado, uma
opção de pouco risco, mas também com uma taxa de rendimento muito
baixa, acarretando em lentidão no acúmulo das economias. O governo
influenciou essas duas escolhas. A companhia não tinha escolha acerca da
seleção da corretora padrão porque, na época, existia uma única opção
aprovada para tal uso pelo Departamento de Trabalho dos Estados Unidos.
Desde então, o Departamento de Trabalho aprovou uma série do que
chamou de “alternativas qualificadas de investimento padrão”, e a maioria
dos planos agora escolhe um fundo que combine ações com títulos de
renda fixa, reduzindo gradualmente a porcentagem de ações à medida que
o trabalhador se aproxima da aposentadoria.
A escolha do nível de investimento padrão de 3% também foi
influenciada pelo governo, mas não intencionalmente. Em decisões
oficiais, tais como as iniciadas por Mark Iwry, geralmente há fatos
específicos incluídos, e na decisão oficial de junho de 1998 constavam as
seguintes linhas:11 “Suponha que uma firma inscreva automaticamente os
seus empregados em um plano de aposentadoria a uma taxa de poupança
de 3%...”12 Desde então, a vasta maioria das empresas que adota a adesão
automática inscreve as pessoas inicialmente com essa taxa. Pode chamar de
padrão involuntário.
Ambas as escolhas padrão — a opção de investimento no mercado e a
taxa de poupança de 3% — não tinham a pretensão, por parte dos
empregadores, de ser sugestão nem conselho. Em vez disso, as opções
foram escolhidas para minimizar a chance de a empresa ser processada.
Mas os empregadores pareciam tratar as opções padrão como sugestões. A
maioria acabava poupando 3% e investindo em um fundo do mercado.
Comparando as escolhas feitas por pessoas inscritas antes da adesão
automática com as que vieram depois, Madrian e Shea foram capazes de
mostrar que alguns empregados teriam selecionado uma taxa de poupança
mais alta se o fizessem por conta própria. Em particular, muitos haviam
escolhido até então uma taxa de 6% na poupança — taxa a partir da qual o
empregador parava de igualar as contribuições. Depois que a adesão
automática foi instituída, havia menos pessoas escolhendo 6% e mais
escolhendo 3%. Esse é o inconveniente da adesão automática. E é também
uma boa razão para qualquer empresa que adote a adesão automática
implantar também o plano Save More Tomorrow.
O artigo de Brigitte aumentou a conscientização acerca da efetividade
da adesão automática, mas ainda não havia interessados em adotar o Save
More Tomorrow. Então, sem mais nem menos, recebi uma ligação de
Shlomo Benartzi. Um consultor de serviços financeiros, Brian Tarbox,
tinha ouvido um de nós falando sobre o Save More Tomorrow e havia
implantado o programa. Havíamos conversado com Brian sobre o plano de
implantação, mas já tinham se passado dois anos e eu havia me esquecido
completamente. Brian voltara a entrar em contato com Shlomo e lhe
dissera que agora tinha dados e estava disposto a dividi-los conosco.
Estourem a champanhe! Até que enfim tínhamos um estudo de caso para
analisar.
A firma com que Tarbox trabalhara tinha começado com um problema.
No caso dos planos de aposentadoria, se seus empregados de salário mais
baixo não aderissem ao plano, a empresa poderia ser considerada fora de
conformidade com as regras do Departamento de Trabalho, as quais
limitam a proporção de benefícios que podem ser concedidos aos
empregados de salário mais alto. Quando isso acontece, a quantia máxima
com que qualquer indivíduo pode contribuir é reduzida. O cliente de
Tarbox estava desesperado para persuadir seus empregados de salário mais
baixo a poupar dinheiro, tão desesperado que o haviam contratado para se
reunir com cada empregado para uma sessão individual de planejamento
financeiro. Brian tinha um laptop carregado com um software capaz de
calcular quanto os empregados deveriam poupar, e penso que a
companhia tinha esperança de que ele conseguisse convencê-los. Mas eles
precisavam de mais do que apenas conversa. Precisavam de um plano.
Os empregados daquela firma não estavam poupando muito, e não
haviam acumulado muito como pecúlio de aposentadoria. Quando Brian
rodava seu programa para calcular a proporção ideal de poupança dos
empregados (aquela que um Econ escolheria), o programa
frequentemente sugeria o máximo permitido nessa empresa, 15%. Se Brian
sugerisse a alguém poupando 5% no momento que deveria aumentar para
15%, o empregado daria risada. A maioria estava lutando para conseguir
pagar as contas. Um aumento grande na poupança, acarretando um grande
corte no dinheiro para passar o mês, estava fora de cogitação.
Benartzi e Tarbox elaboraram uma estratégia mais moderada. Em vez
de informar o nível de poupança recomendado pelo programa, a sugestão
de Brian era que os empregados aumentassem sua taxa de poupança em
cinco pontos percentuais. Se não estivessem dispostos a aceitar esse
conselho, era-lhes oferecida uma versão do Save More Tomorrow.
Foi bom para Tarbox (e para os empregados) que tivéssemos lhe dado
esse plano reserva. Quase 3/4 dos funcionários recusaram seu conselho de
aumentar a poupança em cinco pontos percentuais. Para esses poupadores
altamente relutantes, Brian sugeriu que concordassem em aumentar a
proporção de poupança em três pontos percentuais na próxima vez em que
tivessem aumento e continuassem a fazê-lo para cada aumento salarial nos
quatro aumentos anuais seguintes; depois disso, os aumentos proporcionais
cessariam. Para sua surpresa, 78% dos empregados a quem foi oferecido tal
plano o aceitaram. Alguns deles eram pessoas que não estavam
participando do plano na época, mas achavam que seria uma boa
oportunidade de começar — em alguns meses.
Depois de três anos e meio e quatro aumentos de salário anuais, os
empregados participando do Save More Tomorrow já tinham quase
quadruplicado sua taxa de poupança, de magros 3,5% para 13,6%. Nesse
ínterim, aqueles que haviam aceitado o conselho de Brian para aumentar
sua taxa de poupança em 5% viram sua proporção dar um salto no
primeiro ano, mas ficaram encalhados quando a inércia se instalou.
Posteriormente Brian nos contou que percebeu depois que deveria ter
oferecido a todos a opção Save More Tomorrow em primeiro lugar. (Ver
Figura 25).
Munidos desses resultados, tentamos fazer com que outras firmas
testassem a ideia. Shlomo e eu nos oferecemos para ajudar, contanto que
as empresas concordassem em nos fornecer os dados para análise. Isso
gerou mais algumas poucas implementações para estudo. Uma lição
fundamental que aprendemos, que confirmava uma forte suspeita, era que
os índices de participação dependiam grandemente da facilidade com que
os empregados pudessem aprender sobre o programa e se inscrever. O
método de Brian era ideal para isso. Ele mostrava a cada empregado a
terrível situação da sua poupança, oferecia-lhe um plano fácil para mudar,
e então, em um passo crucial, ajudava-o a preencher e devolver os
formulários necessários. Infelizmente, esse tipo de tratamento individual
acaba saindo caro. Algumas empresas tentaram seminários educativos em
grupo, o que pode ser útil, mas a não ser que sejam acompanhados por
uma chance imediata de se inscrever em seguida, sua efetividade é
limitada. E simplesmente disponibilizar a opção em algum lugar difícil de
achar no website do administrador do plano não vai atrair os
procrastinadores preguiçosos (em outras palavras, a maioria de nós), para
quem o programa foi concebido. Uma solução prática para esse problema
é tornar um programa como Save More Tomorrow o padrão (obviamente
com a opção de sair). Com toda certeza, qualquer firma que ainda esteja
usando um padrão inicial de 3% como taxa de poupança deve aos seus
funcionários um caminho para um teto de poupança que lhes ofereça
alguma chance de uma aposentadoria decente. Eu diria que poupar 10%
da renda seria um mínimo para aqueles sem outras fontes de riqueza, e
15% seria ainda melhor.
Tanto a adesão automática quanto o Save More Tomorrow estão
finalmente se difundindo. Muitas empresas adotaram uma versão mais
simples do Save More Tomorrow, chamada reajuste automático, que
desvincula os aumentos da taxa de poupança dos aumentos de salário. Pelo
visto, muitos departamentos de pessoal não são capazes (ou não estão
dispostos) a programar seus sistemas para combinar os dois. (Felizmente,
isto não parece ser uma característica vital do programa.) Segundo um
levantamento conduzido por Aon Hewitt,13 que enfoca os maiores
empregadores, 56% dos empregadores estavam usando a adesão automática
em 2011 e 51% estavam oferecendo reajuste automático ou o Save More
Tomorrow. Esses números elevados de participação são em parte resultado
de uma lei promulgada em 2006 chamada Lei de Proteção à
Aposentadoria, que dava às empresas um pequeno incentivo para adotar
esses formatos.
Em um artigo recente publicado na revista Science,14 Shlomo e eu
estimamos que em 2011 cerca de 4.100.000 pessoas nos Estados Unidos
estavam usando algum tipo de plano de reajuste automático. Como
resultado, em 2013 estavam poupando coletivamente US$7.600.000.000
adicionais por ano. O Reino Unido lançou recentemente um plano
nacional de poupança pessoal15 que utiliza a adesão automática, e até
agora a proporção de empregados que recusa essa opção tem sido de
aproximadamente 12%. Fala-se em adicionar posteriormente o reajuste
automático. Programas similares existem também na Austrália e na Nova
Zelândia.16

––––––––

Uma pergunta frequente que éramos incapazes de responder era se esse


tipo de poupança automática realmente aumentava o patrimônio líquido
de uma família. Alguns argumentavam que talvez, uma vez inscritos, os
participantes reduzissem suas poupanças em outros lugares ou assumissem
mais dívidas. Não existem conjuntos de dados americanos que tenham a
informação adequada sobre patrimônio familiar que permita responder a
essa pergunta. Mas uma equipe de economistas americanos e
dinamarqueses17 chefiada por Raj Chetty de Harvard, uma estrela em
ascensão em economia, usou dados da Dinamarca para fornecer uma
resposta definitiva à pergunta, bem como à pergunta mais genérica
discutida anteriormente, sobre a real efetividade da isenção tributária nos
planos de aposentadoria para aumentar as poupanças. Eles foram capazes
de fazê-lo porque os dinamarqueses mantêm registros meticulosos sobre
patrimônio familiar, bem como de renda.
Há duas principais conclusões do estudo dinamarquês. A primeira é que
o grosso da poupança gerada pelos planos de adesão automática é “novo”.
Quando alguém entra em uma empresa com um plano de aposentadoria
mais generoso e automaticamente começa a poupar mais por esse plano,
não há nem uma redução discernível nas poupanças em outras categorias
nem um aumento de dívidas. Em um mundo de Econs, esse resultado
seria surpreendente porque os Econs tratam o dinheiro como fungível e já
estão poupando exatamente a quantia correta; então, se um empregado é
forçado ou incentivado a poupar mais em um lugar, ele simplesmente
pouparia menos ou pediria mais empréstimos em outro. A segunda
conclusão compara as contribuições relativas de dois fatores que são
combinados nesses planos: suas características automáticas e a economia
obtida pela isenção fiscal. Ao alocar a fonte da nova poupança proveniente
desses programas, os autores atribuem apenas 1% do aumento à isenção
fiscal. Os outros 99% provêm das características automáticas. Eles
concluem: “Em suma, os achados do nosso estudo questionam se os
subsídios de impostos são a política mais efetiva para aumentar poupanças
de aposentadoria. A adesão automática ou políticas padrão que incentivem
os indivíduos a poupar mais têm grandes impactos sobre a poupança
nacional com menor custo fiscal.”

––––––––

Em 2004, vários anos depois que Brian Tarbox realizou aquele primeiro
experimento, Shlomo e eu escrevemos um artigo18 sobre os achados. A
primeira vez que apresentei a pesquisa na Universidade de Chicago foi
numa conferência em homenagem ao orientador da minha tese, Sherwin
Rosen, que morrera prematuramente aos 62 anos pouco tempo antes. O
debatedor do nosso artigo foi Casey Mulligan, um dos vários economistas
hard-core da Escola de Chicago remanescentes no departamento de
economia da universidade.
Os achados do nosso artigo vão contra muito do que Mulligan acredita.
Fomos capazes de levar as pessoas a poupar simplesmente usando
características de planejamento supostamente irrelevantes. Um Econ não
se inscreveria no Save More Tomorrow porque já estaria poupando a
quantia certa. Mesmo que o fizesse, isso não afetaria sua taxa de poupança,
porque faria ajustes em outras partes para voltar a poupar a quantia ideal
que originalmente escolhera. Mulligan admitiu de má vontade que
parecíamos de fato ser capazes de realizar essa magia negra, mas estava
preocupado com a possibilidade de causarmos algum dano. Ele achou que
É
poderíamos estar enganando as pessoas, levando-as a poupar demais. É
claro que eu estava pensando comigo mesmo: se as pessoas são tão espertas,
como adeptos da escolha racional como Mulligan costumam presumir,
não seriam enganadas com tanta facilidade. Porém não disse nada. Em vez
disso, reconheci que era possível induzir as pessoas a poupar mais dinheiro
além da quantia ideal que um Econ escolheria, embora isto parecesse
improvável considerando os baixos índices de poupança individual nos
Estados Unidos. Ainda assim, como precaução, elaboramos uma taxa
máxima de poupança, após a qual cessariam os aumentos automáticos.
Ademais, se uma família errar seu objetivo ideal de poupança, parece
melhor que erre para mais do que poupe de menos. Não estou querendo
ditar como as pessoas devem alocar seu consumo ao longo da vida, e
seguramente há muitos avarentos que viveram vidas condizentemente
miseráveis. Em vez disso, estou preocupado com a dificuldade de prever a
taxa de rendimento nas poupanças e com a facilidade de fazer ajustes mais
tarde na vida. Alguém que completa 60 anos e se vê de posse de uma
poupança generosa tem inúmeras opções, desde uma aposentadoria
precoce até tirar férias luxuosas ou mimar os netos. Mas alguém que
descobre aos 60 que não poupou o suficiente precisa correr para recuperar
o tempo perdido e pode descobrir que a aposentadoria terá que ser adiada
indefinidamente.
Casey Mulligan encerrou a discussão com uma pergunta: “Sim, parece
que vocês conseguem fazer as pessoas pouparem mais. Mas isto não é
‘paternalismo’?”
Na Universidade de Chicago, você pode chamar alguém de marxista,
anarquista, ou até mesmo de torcedor do Green Bay Packers (o arquirrival
do Chicago Bears, o time local da NFL), mas chamar um colega de
paternalista é o insulto mais cruel de todos. Fiquei genuinamente intrigado
com essa acusação. Normalmente pensamos que paternalismo envolve
coerção, como quando as pessoas são obrigadas a contribuir para a
Previdência Social ou proibidas de comprar álcool ou drogas. Mas o Save
More Tomorrow é um programa voluntário. Continuei dizendo que, se
isto é paternalismo, então deve ser uma variedade de paternalismo muito
diferente. Batalhando para encontrar as palavras certas, disse em um
impulso: “Talvez devêssemos chamar de, não sei, paternalismo libertário.”
Fiz uma anotação mental para discutir essa nova expressão com Cass
Sunstein na próxima vez que o visse.
32

INDO A PÚBLICO

Quando vi Cass novamente, contei-lhe a respeito do meu novo termo,


“paternalismo libertário”. Não era uma expressão bonita, mas ele teve de
admitir que era mais construtiva que o seu termo “anti-antipaternalismo”, e
ficou intrigado.
Na época, a noção de paternalismo tinha presença forte na mente dos
economistas comportamentais. Colin Camerer, George Loewenstein e
Matthew Rabin haviam colaborado com Ted O’Donoghue e com o
professor de direito Sam Issacaroff em um artigo com uma ideia similar e
um título igualmente proibitivo: “Paternalismo assimétrico”.1 Eles
definiam seu conceito da seguinte maneira: “Uma regulamentação é
assimetricamente paternalista se cria grandes benefícios para aqueles que
cometem erros, ao mesmo tempo que impõe pouco ou nenhum dano
àqueles que são plenamente racionais.”2 Rabin e O’Donoghue haviam
cunhado anteriormente a expressão “paternalismo cauteloso”, mas então
aumentaram suas ambições para “paternalismo ótimo”.3 Estávamos todos
tentando mergulhar na questão que havia sido o elefante branco na sala
durante décadas: se as pessoas cometem erros sistemáticos, como isto deve
afetar a política governamental, se é que afeta?
Aconteceu de Peter Diamond estar servindo como presidente eleito da
Associação Econômica Americana em 2002, e ficou encarregado de
organizar o encontro anual, a ser realizado em janeiro de 2003. Por ser um
dos primeiros fãs e colaboradores da economia comportamental, Peter
aproveitou a oportunidade para organizar no encontro algumas sessões
sobre tópicos comportamentais e organizou uma sessão sobre paternalismo.
Cass e eu escrevemos um breve artigo4 que introduzia a ideia de
paternalismo libertário. Com as cinco páginas publicadas que podíamos,
Cass mal começou a se aquecer, então ele pegou aquele texto e escreveu
um respeitável artigo acadêmico jurídico, com mais de 40 páginas. Nós o
chamamos “Paternalismo libertário não é um oximoro”.5
Quando imprimi um rascunho da versão do artigo, ele me pareceu
bastante longo. Um dia perguntei a Cass se ele achava que aquilo poderia
dar em um livro. Seria pouco dizer que Cass adorou a ideia. Não há nada
que ele aprecie mais do que escrever um livro.
A premissa do artigo, e mais tarde do livro, é que, no nosso mundo cada
vez mais complicado, não se pode esperar que as pessoas sejam
competentes para tomar decisões sequer próximas do ideal em todos os
âmbitos em que são obrigadas a escolher. Mas todos gostamos de ter o
direito de escolher sozinhos, mesmo que cometamos erros às vezes. Será
que existem formas de facilitar às pessoas a tomar aquilo que consideram
uma boa decisão, tanto a priori quanto a posteriori, sem forçar ninguém a
nada explicitamente? Em outras palavras, o que podemos conseguir nos
limitando a um paternalismo libertário?
Sabíamos que a expressão “paternalismo libertário” provocaria alguns
arrepios. Não é só na Universidade de Chicago que as pessoas não gostam
do termo “paternalismo”; muita gente é contra que o governo — ou
qualquer um, na verdade — lhes diga o que fazer, e é isto que o termo
geralmente significa. A expressão “paternalismo libertário” é, sim,
complicada, e de fato soa como uma contradição. Mas não é; pelo menos
não da maneira como nós a definimos.
Por paternalismo, referimo-nos a ajudar as pessoas a alcançar seus
próprios objetivos. Se alguém perguntar como chegar à estação de metrô
mais próxima e você der orientação precisa, estará agindo como
paternalista no sentido que usamos. E usamos a palavra “libertário” como
adjetivo, uma tentativa de ajuda sem restringir escolhas.6
Embora gostemos do termo “paternalismo libertário” e possamos
defender sua lógica, é seguro dizer que ele nunca funcionou como título
de livro. O problema foi resolvido quando um editor que estava
considerando nossa proposta de livro sugeriu que a palavra nudge parecia
capturar o que estávamos tentando fazer. Esse editor acabou recusando o
livro, mas imediatamente aproveitamos a ideia para o título, um presente
pelo qual somos gratos.
De modo geral, acredito que seria justo dizer que o nível de entusiasmo
pelo nosso livro na comunidade editorial variou entre morno e frio.
Acabamos em uma editora universitária prestigiosa, mas letárgica, cujo
conjunto de aptidões, como descobrimos mais tarde, não incluía o
marketing. Se quiséssemos que o livro atingisse o grande público, teríamos
que apelar para o boca a boca. (Os direitos para edição popular7 foram
posteriormente vendidos para editores comerciais nos Estados Unidos e no
Reino Unido; depois disso o livro finalmente começou a aparecer nas
livrarias.)

––––––––
Nunca foi nossa intenção alegar que o nudging poderia resolver todos os
problemas. Algumas proibições e obrigações são inevitáveis. Nenhuma
sociedade pode existir sem algumas regras e regulamentos. Exigimos que as
crianças frequentem a escola (verdadeiro paternalismo em todo o sentido
do termo) e proibimos uma pessoa de agredir outra. Há regras estipulando
de que lado da rua se deve dirigir. Os países diferem quanto ao lado
designado como correto, mas quando um britânico visita os Estados
Unidos, não tem permissão de guiar do lado esquerdo da rua. Mesmo
ardentes libertários concordam que não se deve ter permissão de atirar no
vizinho só porque não gosta dele. Então, nosso objetivo aqui é limitado.
Queríamos ver até onde se pode levar a política a ajudar o outro sem criar
obrigações.
Nossa premissa era simples. Como as pessoas são Humanos, e não
Econs (termos que cunhamos para o livro Nudge), cometem erros
previsíveis. Se conseguirmos antecipar esses erros, podemos conceber
políticas que reduzam o índice de erro. Por exemplo, o ato de dirigir,
especialmente distâncias longas, pode deixar o motorista com sono,
aumentando o risco de cruzar a faixa central e provocar um acidente. Em
resposta, algumas localidades acrescentaram pequenos obstáculos à faixa
central, fazendo com que o carro sacoleje ao passar sobre eles, acordando o
motorista que está cochilando (e talvez o levando a fazer uma pausa para
tomar um café). Melhores ainda são os obstáculos com olho-de-gato,
facilitando dirigir no escuro.
Os obstáculos na faixa central também ilustram um ponto que os
críticos do nosso livro parecem incapazes de entender: não temos interesse
em dizer às pessoas o que fazer. Queremos ajudá-las a alcançar seus
próprios objetivos. Leitores que conseguem chegar à quinta página de
Nudge descobrem que definimos nosso objetivo como tentar “influenciar
escolhas de um modo que melhore as vidas dos que escolhem, segundo o
julgamento deles mesmos”. O itálico está no original, mas talvez devêssemos
ter usado também negrito e maiúsculas, dado o número de vezes que
fomos acusados de pensar que sabemos o que é melhor para todo mundo.
Sim, é verdade que pensamos que a maioria das pessoas gostaria de ter
uma aposentadoria confortável, mas queremos deixar a escolha para elas.
Queremos apenas reduzir o que as próprias pessoas chamariam de erros.
Reduzir erros também é a origem do exemplo mais famoso de Nudge,
do Aeroporto Internacional de Schiphol, em Amsterdã. Algum gênio teve a
ideia de fazer os homens prestarem mais atenção na pontaria quando usam
os mictórios do aeroporto. A imagem de uma mosca foi desenhada perto
do ralo do urinol. A administração do aeroporto reportou que a instalação
dessas moscas reduziu o “derramamento”, um eufemismo maravilhoso, em
cerca de 80%. Não conheço nenhuma análise empírica cuidadosa da
efetividade dessas moscas, mas elas (e variações do tema) já foram
localizadas em outros aeroportos mundo afora. Um gol de futebol com
uma bola é especialmente popular durante a Copa do Mundo.
Para mim, aquela mosca no urinol se tornou o exemplo perfeito de um
nudge. Um nudge é um pequeno elemento no ambiente que chama a
nossa atenção e influencia o comportamento. Nudges são efetivos para os
Humanos, mas não para os Econs, pois os Econs já estão fazendo a coisa
certa. Nudges são fatores supostamente irrelevantes que influenciam nossas
escolhas de uma maneira que nos deixe em uma posição melhor. A mosca
deixou ainda mais claro para mim que, enquanto Cass e eu éramos
capazes de reconhecer bons nudges quando nos deparávamos com eles,
ainda carecíamos de um princípio para organizar o processo de como
conceber nudges eficazes.
O nosso grande avanço foi achar o princípio organizador que faltava
quando reli o livro clássico de Don Norman, O design do dia a dia.8 O
livro tem uma das melhores capas que já vi. É a imagem de uma chaleira
que tem a alça e o bico do mesmo lado. Pense nisso. Depois de reler o
livro de Norman, percebi que podíamos aplicar muitos de seus princípios
para os problemas que estávamos estudando. Recentemente eu tinha
comprado meu primeiro iPhone, um aparelho tão fácil de usar que não
precisava de manual de instruções. E se pudéssemos planejar políticas que
facilitassem a criação de ambientes de escolha que fossem igualmente
“centrados no usuário”? Em algum ponto adotamos o termo “arquitetura
de escolhas” para descrever o que estávamos tentando fazer. Curiosamente,
só de ter esse termo para organizar o nosso pensamento nos ajudou a criar
uma lista de princípios para uma boa arquitetura de escolhas, com muitas
das ideias emprestadas da literatura de design centrado no ser humano.
Planejar boas políticas públicas tem muito em comum com planejar
qualquer produto de consumo.
Agora que tínhamos o nosso novo conjunto de ferramentas,
precisávamos fazer uma grande escolha sobre quais questões de política
tentaríamos abordar. Alguns tópicos sobre os quais já tínhamos escrito
foram fáceis, mas outros exigiram que mergulhássemos na literatura para
tentar encontrar alguma coisa útil ou interessante. Algumas dessas
investigações levaram a becos sem saída. Rascunhamos um capítulo sobre
o furacão Katrina, mas o cortamos porque encontramos só uma ideia
remotamente interessante, e não era nossa. John Tierney, um colunista do
New York Times, tinha uma sugestão9 de incentivar as pessoas a deixar suas
casas e ir para terrenos mais elevados antes da chegada de uma tempestade.
A ideia de Tierney era oferecer um marcador de tinta permanente àqueles
que optam por ficar e sugerir que o usem para escrever no corpo seu
número de Seguro Social, para ajudar na identificação de vítimas após a
tormenta. Não tínhamos nada nem de perto tão bom quanto isso.
Em outros casos, a pesquisa nos levou a mudar nossos pontos de vista
sobre algum tema. Um bom exemplo disso é a doação de órgãos. Quando
fizemos a nossa lista de tópicos, este foi um dos primeiros porque sabíamos
de um artigo que Eric Johnson escrevera com Daniel Goldstein a respeito
do poderoso efeito de opções padrão nesse domínio.10 A maioria dos países
adota alguma versão da política de opt-in, em que o doador precisa dar
algum passo positivo — tal como preencher um formulário — para ter seu
nome adicionado ao cadastro de doadores. No entanto, alguns países na
Europa, tais como a Espanha, adotaram a estratégia de opt-out, que é
chamada de “consentimento presumido”. Presume-se que você permite ter
seus órgãos transplantados a menos que opte explicitamente pela exclusão,
e ponha seu nome numa lista de “não doadores”.
Os achados do artigo de Johnson e Goldstein mostravam como as
opções padrão podem ser poderosas. Em países onde o padrão é ser doador,
quase ninguém opta pela exclusão; mas em países com política de opt-in,
em geral menos da metade da população opta pela inclusão! Aqui,
pensamos nós, estava uma receita de política simples: troque para
consentimento presumido. Mas aí fomos mais a fundo. Acontece que a
maioria dos países com consentimento presumido não implanta com rigor
a política. Em vez disso, membros de equipes médicas continuam a
perguntar aos familiares se eles têm alguma objeção sobre a doação de
algum órgão do parente falecido. Essa questão muitas vezes chega numa
hora de severa aflição emocional, já que muitos doadores de órgãos
morrem subitamente em consequência de algum acidente. O pior é que os
familiares em países com esse regime podem não ter ideia de quais eram os
desejos do doador, já que a maioria das pessoas simplesmente não faz nada.
O fato de alguém não ter preenchido um formulário de exclusão do
cadastro de doadores não é um indício forte de suas reais crenças.
Chegamos à conclusão de que o consentimento presumido não era, de
fato, a melhor política. Em vez disso, gostamos de uma variante que havia
sido adotada recentemente pelo estado de Illinois e também usada em
outros estados americanos. Quando a pessoa renova sua carteira de
motorista, lhe é indagado se deseja ser doadora de órgãos. O simples fato
de perguntar à pessoa e imediatamente registrar a escolha facilita a
inscrição na lista.11 No Alasca e em Montana,12 essa abordagem conseguiu
índices de doação acima de 80%. Na literatura da doação de órgãos, essa
política foi apelidada de “escolha obrigatória”,13 e adotamos esse termo no
livro.
A terminologia foi infeliz, como descobri mais tarde. Algum tempo
depois de o livro ter sido publicado, escrevi uma coluna sobre doação de
órgãos no New York Times, advogando a política de Illinois, que continuei
chamando de “escolha obrigatória”.14 Algumas semanas depois, alguém do
corpo editorial do USA Today me chamou para conversar sobre a política
porque seu jornal iria endossá-la. Dentro de alguns dias, recebi uma
ligação urgente da redatora editorial. Ela havia ligado para o funcionário
estadual encarregado dessa política, que tem o título de secretário de
estado, e ele negou firmemente que tal política existisse. Fiquei estupefato.
Eu tinha renovado recentemente a minha carteira de motorista e fui
devidamente indagado se queria ser doador de órgãos. (Eu disse sim.) Mais
alguns telefonemas resolveram o mistério. O secretário de estado, Jesse
White, tinha objeções à palavra “obrigatória”. Ele disse que ninguém era
solicitado a fazer nada e, tecnicamente, estava certo. Quando indagado se
quer ser doador, se alguém se recusa a responder ou permanece calado, o
funcionário do Departamento de Veículos Motores simplesmente toma
como não.
Acontece que Jesse White é um político esperto e, como tal, percebeu
que os eleitores não gostam de mandatos.15 Na esteira dessa lição sobre a
importância da nomenclatura, venho chamando a minha política predileta
de “escolha solicitada” [“prompted choice”], um termo ao mesmo tempo
mais acurado e menos carregado politicamente. Quando se lida com
Humanos, as palavras importam.
33

NUDGE NO REINO UNIDO

Em julho de 2008, passei alguns dias em Londres a caminho da Irlanda


para comparecer ao casamento de Cass com Samantha Power. Embora o
livro Nudge já tivesse saído havia alguns meses nos Estados Unidos, apenas
alguns exemplares tinham chegado a Londres. Nunca fui capaz de
determinar o método de envio usado pela editora, mas desconfio muito
que uma frota de grandes veleiros tenha entrado com a maré baixa,
deixando para trás a equipe de remo da universidade.
Uma dessas pessoas de iniciativa que conseguira pegar um exemplar do
livro foi Richard Reeves. Richard é um espécime raro: um intelectual
profissional sem posto permanente como professor ou consultor. Na época,
estava prestes a se tornar diretor de um think tank chamado Demos, e me
convidou para dar uma palestra sobre Nudge.1 Antes de Richard e eu
efetivamente nos encontrarmos, recebi uma ligação dele no meu celular.
Ele queria saber se eu estaria interessado em conhecer algumas das pessoas
que estavam trabalhando na liderança do Partido Conservador, também
conhecidas como tories. A pergunta viera do seu amigo Rohan Silva, que
também tinha lido Nudge e ficara fascinado pelo livro.
Era grande meu ceticismo em relação a possíveis resultados desse
encontro. Não consigo me lembrar de um momento sequer em que eu
tenha sido descrito como conservador. Radical, criador de problemas,
agitador, inconveniente e outros termos inadequados para uma página
impressa foram adjetivos comumente usados, porém nunca conservador.
Ainda assim, fiquei lisonjeado. “Claro”, falei. “Dê o meu número ao
Rohan, adoraria conversar com eles.” Rohan ligou quase imediatamente e
perguntou se eu estaria disposto a ir até lá naquela tarde e conhecer alguns
de seus colegas nas Casas do Parlamento. Meu ceticismo em relação ao
encontro foi agravado pelo fato de eu estar passeando por Londres em um
dia raro de calor e sol, trajando minha indumentária habitual composta de
jeans e camiseta. Naquela época, eu não sabia quase nada sobre política
britânica, e a minha imagem mental de um grupo de membros
conservadores do Parlamento era de homens velhos de terno,
possivelmente perucas brancas e togas. Eu disse a Rohan que achava não
estar vestido de maneira adequada para uma reunião nas Casas do
Parlamento, mas ele disse para eu não me preocupar, era um grupo
informal. E pela sua voz ao telefone, ele parecia ser bastante jovem. Então
eu disse “Claro, por que não?”.
Meus temores de estar malvestido tinham tão pouco fundamento
quanto meus estereótipos sobre as pessoas que estava prestes a conhecer.
Rohan Silva, então com 27 anos e ascendência cingalesa, parecia estar
sempre com uma barba de três dias por fazer. A única vez que me lembro
dele realmente barbeado foi no seu casamento, anos depois. Seu parceiro,
um pouco mais velho no pequeno grupo, Steve Hilton, ainda não tinha
chegado aos 40 e estava vestindo a roupa que mais tarde vim a saber que
era a sua predileta: camiseta e short de basquete do Los Angeles Lakers.
Nós nos reunimos no gabinete de um membro conservador de longa data,
Oliver Letwin, do pequeno grupo de tories do Parlamento que cercava a
equipe de liderança de David Cameron e George Osborne, ambos na casa
dos 40. Não vi ninguém usando peruca, e acho que o ministro Letwin era
o único que estava de terno.
Dei uma breve palestra improvisada, e o grupo parecia pensar que o
partido poderia apoiar a abordagem de políticas públicas que advogamos
em Nudge como parte de uma renovação de imagem que Cameron e
Osborne estavam realizando. Sua meta declarada era tornar o partido mais
progressista e pró-meio ambiente. Depois da reunião, Rohan e eu
continuamos a conversa e fiquei sabendo que ele viajara para Iowa em
2008 para apoiar Obama na campanha das primárias presidenciais do
Partido Democrata. Minha imagem do Partido Conservador estava
mudando rapidamente.
Rohan conseguiu de algum modo comprar dez exemplares de Nudge,
possivelmente monopolizando o mercado do Reino Unido até a chegada
do próximo navio, e os empilhou sobre sua escrivaninha, um nudge para
fazer os passantes darem uma olhada. Um dia David Cameron — o futuro
primeiro-ministro — viu a pilha e perguntou se aquele era o livro sobre o
qual ouvira algumas pessoas comentando. Rohan sugeriu que ele desse
uma olhada. Aparentemente, Cameron gostou do que leu, porque mais
tarde pôs o livro numa lista de livros que recomendava como leitura de
verão para os tories do Parlamento, embora eu desconfie seriamente que
quem escreveu a primeira versão daquela lista tenha sido Rohan. Entre as
muitas funções que Rohan exercia estava a de “leitor designado”.
Minha viagem seguinte a Londres foi na primavera de 2009, quando
participei de alguns eventos de publicidade com nosso novo editor no
Reino Unido para a edição em brochura do livro. Dadas nossas
experiências anteriores, fiquei chocado de ver cartazes nas estações de
metrô perguntando em letras garrafais: “VOCÊ FOI NUDGED HOJE?”
Em um dos eventos me disseram que no jantar eu estaria sentado ao lado
de alguém chamado sir Gus O’Donnell. Novamente demonstrando a
minha ignorância, perguntei quem era ele, e me disseram que era o
Secretário de Gabinete, o mais alto servidor público no Reino Unido. Mais
tarde fiquei sabendo que as pessoas frequentemente se referiam a ele como
GOD, iniciais de seu nome que formam a palavra “deus” em inglês e uma
discreta menção ao seu poder. Era ele, basicamente, quem dirigia o país.
E, o mais impressionante, já era fã da economia comportamental.
Lorde O’Donnell, como é agora chamado, tem um histórico
considerável. Fez seu doutorado em economia em Oxford, lecionou por
algum tempo e, então, foi trabalhar para o governo, onde teve vários
cargos, inclusive — o mais notável — secretário de imprensa do primeiro-
ministro. Nunca conheci um economista que durasse um único dia como
secretário de imprensa de alguém, muito menos de um chefe de Estado.
Após servir em várias outras funções, ele acabou como Secretário de
Gabinete do país. Não há posição equivalente nos Estados Unidos, e devo
dizer que, após a minha experiência de tratar com Gus e seu sucessor
Jeremy Heywood, acredito que faríamos bem em criá-la. Quando as
eleições gerais foram realizadas, em maio de 2010, e nenhum partido
obteve maioria, o governo continuou funcionando como de costume, com
O’Donnell no leme enquanto os políticos tentavam resolver que partidos
formariam um governo de coalisão.
Por fim, os conservadores concordaram em formar uma coalisão com os
democratas liberais, e David Cameron se tornou o próximo primeiro-
ministro com Nick Clegg, líder dos democratas liberais, nomeado vice-
primeiro-ministro. E quem foi que Clegg escolheu como seu principal
assessor de políticas? Richard Reeves. Enquanto isso, Rohan e Steve Hilton
se tornaram assessores sêniores de política para o primeiro-ministro, se é
que a palavra “sênior” possa ser apropriada para alguém que ainda nem
completou 30 anos. Eles tinham grandes planos, e os planos incluíam um
papel para a ciência comportamental, planos em cuja implementação Gus
O’Connell desempenharia importante papel. Em apenas alguns dias de
visita a Londres, parecia que eu tinha esbarrado com pessoas que eram
realmente capazes de levar a sério as ideias defendidas em Nudge e ver se
era possível fazê-las funcionar.

––––––––

Logo depois que David Cameron e Nick Clegg chegaram a um acordo de


coalizão, Rohan entrou em contato. O novo governo tinha sérias intenções
de usar a economia comportamental e, mais genericamente, a ciência
comportamental, para tornar o governo mais eficaz e eficiente. Ele queria
saber se eu estaria disposto a ajudar. “Claro que sim”, eu respondi. Nós
havíamos escrito Nudge com a vaga esperança de que algumas pessoas com
um pouco de influência pudessem ler o livro e tirar algumas ideias de
política úteis. Desde então, Cass fora trabalhar para seu antigo colega e
amigo da escola de direito da Universidade de Chicago que se tornara
presidente dos Estados Unidos, e agora os britânicos também estavam
interessados.
Por algum golpe de sorte, gênio e timing, David Halpern foi escolhido
para dirigir essa operação ainda sem nome. David não só é um cientista
social de primeira categoria que lecionou na Universidade de Cambridge,
mas também serviu como analista-chefe da unidade de estratégia do
primeiro-ministro Tony Blair. Além disso, foi coautor de relatórios
anteriores no Reino Unido sobre possibilidades de emprego das abordagens
comportamentais pelo governo, tendo escrito um enquanto trabalhava para
Blair. Isso significava duas coisas: ele possuía vasto conhecimento e
experiência sobre como o governo funciona e tinha o tipo de credenciais
apartidárias que seriam cruciais para estabelecer a equipe como fonte de
informação imparcial. Halpern também é charmoso e modesto. Se você
não consegue se dar bem com David Halpern, então há algo de errado
com você.
Durante essa visita, a equipe fez uma rápida viagem a Paris, onde um
psicólogo, Olivier Oullier, estava tentando incentivar o governo Sarkozy a
se interessar por ciência comportamental. Na viagem de trem para lá,
Steve Hilton e eu entramos em um acalorado debate sobre qual seria o
nome da nova equipe. Steve queria usar o termo “mudança
comportamental”, que eu achava que tinha conotações horríveis. David
Halpern e eu fazíamos lobby pelo Behavioural Insights Team (BIT), o
nome finalmente escolhido. A discussão consumiu quase toda a viagem a
Paris. Em algum ponto Rohan chamou Steve de lado e lhe disse para
desistir, argumentando, profeticamente, que “não importa o nome que
dermos, todo mundo a chamará de ‘unidade do nudge’.”

––––––––

Na época da minha viagem seguinte a Londres, a equipe inicial estava


estabelecida e foi instalada em dependências temporárias em um canto
obscuro do Arco do Almirantado, localizado a uma pequena caminhada de
Downing Road 10 e do Parlamento. Era inverno, e Londres havia sido
atingida pelo que os locais consideraram uma nevasca massiva. O acúmulo
de neve era de cerca de 3 centímetros. E o interior do gelado prédio cheio
de correntes de ar que serviu como primeira casa da equipe não era muito
mais quente que o exterior.
A missão oficial do Behavioural Insights Team era ampla: conseguir
impacto significativo em pelo menos duas áreas importantes de políticas;
disseminar a compreensão de abordagens comportamentais em todo o
governo; e alcançar um retorno de pelo menos dez vezes o custo da
unidade. A ideia básica era usar os achados da ciência comportamental
para melhorar o funcionamento do governo. Não havia manual para essa
tarefa, então tivemos de descobrir sem demora. Nesta e nas visitas
posteriores, eu ia frequentemente a reuniões com algum alto funcionário
do governo, o ministro de alguma área ou o vice daquele ministro,
acompanhado de David e de algum outro membro da equipe. Geralmente
começávamos essas reuniões perguntando quais problemas a área
enfrentava e então trocávamos ideias sobre o que poderia ser feito para
ajudar. Era vital para o sucesso do projeto que deixássemos os
departamentos escolherem a agenda, e não dissertar sobre as glórias da
ciência comportamental.
A primeira reunião de que participei foi tão boa que eu poderia
facilmente ter ficado com a impressão de que esse negócio de empregar
insights comportamentais para melhorar políticas públicas seria fácil. Nick
Down, da Her Majesty’s Revenue and Customs (HMRC) — a autoridade
britânica responsável pela coleta de impostos —, tinha ouvido falar do BIT
e havia nos procurado. Sua função era coletar o imposto de renda de
pessoas que deviam dinheiro ao governo. Para a maioria dos contribuintes
britânicos, há pouco risco de cair nessa situação. Empregadores retêm o
imposto na fonte por meio de um sistema chamado “pay as you earn”. Para
aqueles que recebem toda a renda por meio de salários e ordenados, não
há necessidade de preencher uma declaração de imposto e nem imposto a
pagar. No entanto, pessoas autônomas ou que têm outras fontes de renda
além do emprego regular precisam preencher uma declaração e podem ser
confrontadas com uma conta de tamanho considerável.
Para os contribuintes que precisam preencher uma declaração, são
exigidos pagamentos em 31 de janeiro e 31 de julho. Se o segundo
pagamento não for recebido no prazo, o contribuinte recebe um lembrete,
seguido de cartas, telefonemas e, por fim, uma ação judicial. Como
acontece com qualquer credor, o HMRC encara o uso de uma agência de
cobrança ou um processo como último recurso, já que é caro e antagoniza
o contribuinte, que é, obviamente, também um eleitor. Se aquele primeiro
aviso pudesse ser escrito mais efetivamente, pouparia ao HMRC um
bocado de dinheiro. Essa era a meta de Nick Down.
Ele já tinha começado bem. Havia lido o trabalho do psicólogo Robert
Cialdini, autor do clássico livro As armas da persuasão.2 Muita gente diz
que Danny Kahneman é o mais importante psicólogo vivo, e eu
dificilmente discordaria, mas penso que seria correto dizer que Cialdini é
o psicólogo vivo mais prático. Além do livro de Cialdini, Nick Down
também recebera alguns conselhos de uma firma de consultoria3 afiliada
com Cialdini para ajudá-lo a pensar sobre como fazer com que as pessoas
não atrasassem o pagamento de impostos.
A equipe de Nick já tinha feito um experimento piloto com uma carta
que usava uma recomendação padrão extraída da grande obra de Cialdini:
se você quer que a pessoa cumpra alguma norma ou regra, uma boa
estratégia é informá-la (se for verdade) de que a maioria das pessoas
cumpre.4 Em Nudge, havíamos relatado uma utilização bem-sucedida
dessa ideia em Minnesota. Nesse estudo, contribuintes com grandes
dívidas receberam uma variedade de cartas em um esforço de fazê-los
pagar, com mensagens variando desde informações sobre como seu
dinheiro seria usado até ameaças de ações judiciais, porém a mensagem
mais efetiva foi simplesmente dizer às pessoas que mais de 90% dos
contribuintes de Minnesota pagavam seus impostos no prazo. Esse último
fato também era verdade na Grã-Bretanha, e o experimento-piloto usava
uma carta com linguagem semelhante. Os resultados pareceram apoiar
nossa ideia, mas o piloto não havia sido feito de maneira rigorosamente
científica; carecia de um grupo de controle e diversas coisas variavam ao
mesmo tempo. Nick estava ansioso para fazer mais, porém não tinha o
treinamento nem o pessoal para conduzir um experimento apropriado, e
não tinha verba para recorrer a consultores externos.
Foi uma sorte termos encontrado Nick Down em um estágio tão
precoce do desenvolvimento da BIT. Ele já tinha comprado a ideia de que
a ciência comportamental poderia ajudá-lo a fazer um trabalho melhor,
estava disposto a conduzir experimentos, e os experimentos eram baratos.
Tudo que tínhamos de fazer era alterar a redação de uma carta que já seria
enviada aos contribuintes de qualquer maneira. Nem sequer tínhamos de
nos preocupar com o custo da postagem. E o melhor de tudo: ajustando a
linguagem das cartas, poderíamos poupar milhões de libras em potencial.
O BIT tinha um prazo definido de dois anos, depois do qual seria avaliado.
O experimento dos impostos tinha potencial para prover um ganho inicial
que calaria os céticos que achavam que aplicar ciência comportamental
em política do governo era uma atividade frívola condenada ao fracasso.
Nossa reunião inicial acabou levando a três rodadas de experimentação
com níveis crescentes de sofisticação. Michael Hallsworth, do BIT, e uma
equipe de acadêmicos conduziram o experimento mais recente.5 A
amostra incluía aproximadamente 120.000 contribuintes que deviam
quantias que variavam de £351,00 a £50.000,00. (Contribuintes que
deviam mais eram tratados de outra forma.) Todo mundo recebeu uma
carta-lembrete explicando como o imposto poderia ser pago, e à parte a
condição de controle, cada carta continha um nudge de uma linha, que
era uma variação da observação feita por Cialdini sobre cumprimento de
regras. Alguns exemplos:

A maioria das pessoas no Reino Unido paga seus impostos em dia.


A maioria das pessoas na sua localidade paga seus impostos em dia.
Você atualmente pertence a uma minoria de pessoas que não pagaram
seus impostos.
Se você está estranhando, a expressão “a maioria” foi usada em lugar da
mais precisa “90% dos contribuintes” porque algumas das cartas foram
personalizadas para localidades específicas, e o BIT foi incapaz de
confirmar se o número 90% era verdade para toda localidade usada. Há
um aspecto geral importante aqui. Nudges éticos devem ser ao mesmo
tempo transparentes e verdadeiros. Esta é uma regra que o BIT tem
seguido escrupulosamente.6
Todas as manipulações ajudavam, mas a mensagem mais efetiva
combinava dois sentimentos: a maioria das pessoas paga e você é um dos
poucos que não pagou. Essa carta elevou em mais de cinco pontos
percentuais o número de contribuintes que pagaram dentro de 23 dias.7
Uma vez que não há nenhum custo extra em acrescentar uma frase às
cartas, esta é uma estratégia altamente efetiva em termos de custo. É difícil
calcular exatamente quando dinheiro foi economizado, já que a maioria
das pessoas acaba pagando seus impostos, mas o experimento acelerou o
influxo de £9.000.000,00 em recebimentos para o governo ao longo dos
primeiros 23 dias. Na verdade, há uma boa chance de que as lições
aprendidas a partir desse experimento economizem dinheiro suficiente
para o governo britânico para pagar todos os custos do BIT por muitos
anos.

––––––––

A reunião com Nick Down foi atípica. Era mais comum que o ministro ou
chefe de alguma agência do governo precisasse ser convencido tanto do
valor da ciência comportamental quanto da necessidade do experimento.
Em muitas das nossas reuniões, eu me via repetindo duas coisas com tanta
frequência que elas acabaram se tornando conhecidas como os mantras da
equipe.
1. Se você quer incentivar alguém a fazer algo, facilite. Essa é uma lição
que aprendi com Danny Kahneman, com base no trabalho de Kurt Lewin,
um proeminente psicólogo da primeira metade do século XX. Lewin
descreveu o primeiro passo para fazer as pessoas mudarem seu
comportamento como “descongelar”. Uma maneira de descongelar as
pessoas8 é remover as barreiras que as impedem de mudar, por mais sutis
que sejam essas barreiras.
2. Não podemos fazer política baseada em evidência sem evidências.
Embora muito da publicidade em torno do BIT tenha salientado
corretamente o uso de insights comportamentais para planejar mudanças
na forma como o governo opera, uma inovação igualmente importante foi
a insistência de que todas as intervenções fossem testadas usando, sempre
que possível, a metodologia de excelência dos testes controlados
randomizados (comumente chamado de RCTs, abreviatura de randomized
control trials) — um método frequentemente usado em pesquisa médica.
Num RCT, as pessoas são escolhidas aleatoriamente para receber
diferentes tratamentos (tais como a redação do texto das cartas no estudo
dos impostos), incluindo um grupo de controle que não recebe tratamento
nenhum (neste caso, a redação original). Embora essa abordagem seja
ideal, nem sempre ela é viável.9 Às vezes pesquisadores precisam fazer
concessões para poderem realizar qualquer tipo de experimento. O
exemplo a seguir ilustra a importância de ambos os mantras, bem como as
dificuldades práticas associadas à realização de experimentos em grandes
organizações, tanto governamentais quanto privadas.
A certa altura, eu estava participando de uma reunião na qual
integrantes do BIT se encontraram com representantes do Departamento
de Energia e Mudança Climática. Foi apropriado que a reunião tenha
ocorrido durante aquela semana, em que todo mundo estava lutando para
se manter aquecido, porque o tópico era como fazer mais gente isolar
termicamente seus sótãos, localmente conhecidos como “lofts”. Em um
mundo de Econs, todos já teriam feito o isolamento; a economia em custos
de energia pode compensar os custos do processo de isolamento em pouco
mais de um ano. Mesmo assim, cerca de um terço dos lares na Grã-
Bretanha não tinham isolamento suficiente nos seus sótãos, e o
departamento lançara uma iniciativa para incentivar os retardatários a
parar de procrastinar. A iniciativa oferecia subsídios tanto a proprietários
quanto a locadores para melhorar o isolamento térmico de suas casas e
instalar outros produtos de economia de energia. Não havia muita gente
dando ouvidos à proposta do departamento. O Behavioural Insights Team
prometeu pensar sobre o que poderia ser feito.
A intervenção proposta abraçou o mantra “facilite”. Quando
proprietários de casas foram entrevistados e indagados por que não haviam
feito o isolamento, muitos responderam que era trabalhoso demais porque
tinham muita coisa atulhada no sótão. O BIT propôs que as firmas privadas
que instalavam o isolamento introduzissem um pacote que incluísse uma
limpeza do sótão. Se o proprietário comprasse esse pacote, dois sujeitos
esvaziariam o sótão e então ajudariam os donos a escolher o que doar ou
jogar fora e o que colocar de volta no sótão. Nesse meio-tempo, outra
equipe se ocuparia instalando o isolamento. Foram oferecidas duas versões
desse negócio: uma por conta do instalador (£190,00) e outra a preço do
varejo (£271,00). Isso além do custo do isolamento, que era de £179,00.
Um experimento foi conduzido para testar essa ideia, e os resultados
sugeriam que ela podia ser vencedora. Digo “poderia” porque os dados são
tão esparsos que é necessário ter cautela. No intuito de economizar
dinheiro, o único meio utilizado para informar o negócio às pessoas foi
enviar folhetos pelo correio a casas em três bairros distintos, mas similares,
escolhidos porque se acreditava que havia casas com probabilidade de
serem elegíveis para o negócio. Todos os proprietários em um mesmo
bairro receberam a mesma carta,10 oferecendo a limpeza com desconto, a
limpeza com preço de varejo ou simplesmente o negócio padrão (esse
último grupo era o grupo de controle). Foram distribuídos cerca de 24.000
folhetos em cada um dos três bairros.
Infelizmente, o achado básico com esse experimento é que muito
pouca gente estava disposta a isolar seu sótão. Quer tenha acontecido por
não abrirem a correspondência, não acharem a proposta atraente ou
preferirem um vento frio descendo do teto, a aceitação foi mínima. No
total, apenas 28 sótãos receberam o isolamento. No entanto, há pelo menos
um forte indício nos dados de que a oferta de limpeza do sótão foi uma boa
ideia. Embora o tamanho das amostras tenha sido aproximadamente igual,
apenas três famílias aceitaram o negócio de isolamento simples, ao passo
que 16 aceitaram com a condição de limpeza barata e nove aceitaram com
a versão de limpeza mais cara. Então quase todo mundo que concordou
em fazer o isolamento de seu sótão o fez quando lhes foi oferecida alguma
ajuda para a limpeza. No entanto, os números são pequenos demais, o que
exigiria replicar o experimento para se ter confiança de que o efeito foi
real. Por enquanto, penso nesse exemplo como algo entre um achado
científico e um episódio interessante.11
Por mais que os membros da equipe tivessem adorado replicar o
experimento, os baixos índices de aceitação desestimularam o
departamento. Então por que incluir esse exemplo entre tantos outros no
portfólio do BIT? Tenho dois motivos. Primeiro: jamais encontrei um
exemplo melhor do princípio de Lewin de remover barreiras. Nesse caso, a
remoção é praticamente literal. Mesmo que essa implementação específica
nunca seja adotada em grande escala, a lembrança desse exemplo pode
inspirar a criação de um nudge poderoso em outra situação.
Segundo: o exemplo ilustra armadilhas potenciais de testes controlados
randomizados em contextos de campo. Experimentos desse tipo são caros,
e muita coisa pode dar errado. Quando um experimento de laboratório dá
errado, o que acontece com muita frequência em laboratórios operados
por Humanos, perde-se uma quantia relativamente pequena de dinheiro
pago aos sujeitos, mas o experimento geralmente pode ser tentado outra
vez. Ademais, experimentadores inteligentes realizam primeiro um piloto
barato para detectar quaisquer problemas na configuração. Tudo isto é
difícil em experimentos de campo em larga escala, e, para piorar, nem
sempre é possível contar com a presença dos experimentadores, in loco, em
todas as etapas. É claro que cientistas habilidosos na realização de RTCs
conseguem reduzir os riscos de erros e falhas, mas tais riscos nunca vão
desaparecer.
Frustrações à parte, precisamos continuar a realizar ensaios e testar
ideias porque não há outra forma de descobrir o que funciona. De fato, o
legado mais importante do Behavioural Insights Team pode ser ajudar a
incentivar os governos a testar ideias antes de implementá-las. Em 2013, o
governo do Reino Unido estabeleceu uma rede chamada What Works
Network para estimular a testagem de formas de melhorar a efetividade do
governo em todos os domínios, desde saúde e crime até educação. Todo
governo, na verdade toda grande organização, deveria ter equipes similares
conduzindo testes de novas ideias. Mas precisamos ser realistas em relação
aos resultados desses testes. Nem toda ideia funciona; qualquer cientista
pode atestar essa realidade.
Também é crucial compreender que muitas melhorias podem parecer
bem mínimas na superfície: uma mudança de 1% ou 2% em algum
resultado. Isso não deve ser motivo para zombaria, ainda mais se a
intervenção é essencialmente sem custo. De fato, há o perigo de cair numa
armadilha similar à falácia da “grande mixaria” demonstrada pelos
competidores do game show. Um aumento de 2% na efetividade de algum
programa pode não parecer grande coisa, mas quando os valores estão na
casa de bilhões de dólares, mudanças de pequena porcentagem vão se
somando. Como comentou famosamente um senador dos Estados Unidos:
“Um bilhão aqui, um bilhão ali, logo, logo você vai estar falando de
dinheiro de verdade.”12
É importante moderar as expectativas em relação à magnitude dos
efeitos que serão obtidos porque o sucesso da inscrição automática e do
Save More Tomorrow pode criar a falsa impressão de que é fácil planejar
pequenas mudanças que tenham grandes impactos. Não é. Essas
intervenções na poupança combinavam três ingredientes importantes que
aumentam enormemente as chances de um programa atingir sua meta
declarada. Primeiro, os criadores do programa têm uma boa razão para
acreditar que uma parcela da população será beneficiada fazendo alguma
modificação no seu comportamento. Nesse caso, com muita gente
poupando pouco ou nada para a aposentadoria, era uma decisão fácil.
Segundo, a população-alvo deve concordar que uma mudança é desejável.
Aqui, levantamentos indicavam que a maioria dos trabalhadores achava
que deviam estar poupando mais. Terceiro: é possível fazer a mudança
com uma ação quase sem custo (ou, no caso da adesão automática,
absolutamente nenhuma ação). Chamo essas políticas de intervenções de
“um só clique”. Com apenas um tique num quadradinho, a pessoa que se
inscreve no Save More Tomorrow verá sua poupança aumentar com o
tempo, sem necessidade de fazer mais nada.
Infelizmente, em muitos problemas, mesmo quando as duas primeiras
condições são satisfeitas, não há uma solução de um só clique. Por
exemplo, seria de se esperar que uma pessoa que está 50 quilos acima do
seu peso recomendado se beneficiaria com a perda de alguns quilos, e a
maioria das pessoas nessa situação concordaria com essa avaliação. Mas,
fora uma cirurgia, não há resposta fácil. Não fui capaz de conceber um
programa que funcione para mim ou qualquer outra pessoa, e sabemos
que a maioria dos programas de dieta fracassam no longo prazo. Não existe
dieta de um só clique. Mesmo assim, embora não possamos resolver todos
os problemas com uma solução de um só clique, seguramente existem
alguns casos em que tais políticas podem ser concebidas, e aqueles
interessados em implementar novas políticas de mudanças
comportamentais seriam sábios em buscar tais ideias. No mundo das
políticas públicas, são as que têm chance de produzir resultados bons e
mais rápidos.
Para dar um exemplo concreto: se a meta é reduzir a taxa de gravidez
adolescente, a estratégia mais efetiva é o uso de contraceptivos reversíveis
de longa ação, tais como um dispositivo intrauterino (DIU). Experimentos
com uma amostra de moças sexualmente ativas constataram um índice de
fracasso de menos de 1%, muito inferior ao de outras formas de
contracepção. Uma vez implantado o dispositivo, nenhuma outra ação se
faz necessária. Aqueles que estão à procura de intervenções
comportamentais que tenham alta probabilidade de funcionar deveriam
buscá-las em outros ambientes, onde uma única ação pode cumprir o
objetivo. E se essa solução ainda não existe, invente uma!
Em alguns casos, intervenções bem-sucedidas são simples lembretes
para as pessoas que, de outra forma, poderiam se esquecer de algo. Muitos
exemplos desse tipo têm sido possibilitados pela tecnologia de envio de
mensagens de texto, o que mostra que os nudges não precisam ser criativos,
elaborados ou ocultos de alguma maneira; lembretes simples e diretos na
forma de texto podem ser extremamente efetivos. Um exemplo vem do
campo da saúde. Em um estudo em Gana, a Innovations for Poverty
Action realizou um teste controlado randomizado avaliando se lembretes
por mensagem de texto para tomar medicação contra malária ajudavam as
pessoas a seguirem adiante com o tratamento médico. Eles não só
descobriram que esses textos eram eficazes, mas também que as mensagens
breves tinham melhores resultados; era o lembrete, e não a informação
adicional, que importava.13
De maneira similar, um estudo no campo da educação ressalta a
eficácia e a escalabilidade de simples lembretes de texto. O estudo mediu a
efetividade do READY4K!,14 um programa que enviava aos pais de alunos
em idade pré-escolar mensagens de texto regulares com dicas para a
criação dos filhos, inclusive maneiras de ajudar as crianças a aprender a ler
e a escrever. O estudo mostrou aumentos significativos no envolvimento
parental em atividades de alfabetização tanto em casa como na escola,
aumentando por sua vez os ganhos em leitura para as crianças.
Tais lembretes simples são um bom exemplo de que nudges podem ser
realmente suaves e transparentes, e ainda assim funcionarem.15
O BIT passou pela sua revisão após dois anos e foi renovado pelo
Cabinet Office em 2012. Como a equipe continuou a crescer
rapidamente, foi necessário achar um novo lar. A estada nos gelados
alojamentos originais foi, felizmente, breve, mas a sede seguinte, em um
espaço emprestado dentro do Departamento do Tesouro, era pequena
demais para as necessidades da crescente equipe. Assim, em 2014, foi
tomada a decisão de privatizar parcialmente o BIT. Ele passou a ser
propriedade, em partes iguais, do Cabinet Office, seus empregados e sua
sócia sem fins lucrativos, a NESTA, responsável por fornecer à equipe seu
local de trabalho. O BIT tinha um contrato de cinco anos com o Cabinet
Office, então podia fazer planos independentes dos resultados das eleições
gerais de maio de 2015. A equipe cresceu para aproximadamente 50
pessoas e agora dá apoio a uma gama de entidades governamentais por
todo o Reino Unido, e também auxilia cada vez mais outros governos,
inclusive um novo e empolgante estudo sobre conformidade fiscal na
Guatemala.

––––––––

Enquanto eu dava meus palpites nos esforços do Behavioural Insights


Team do Reino Unido, Cass estava ocupado em Washington servindo
como administrador do Office of Information and Regulatory Affairs
(OIRA). Formalmente parte do Office of Management and Budget da
Casa Branca, o OIRA foi formado em 1980 com a missão de avaliar o
impacto econômico de novas regulamentações governamentais para
assegurar que elas façam mais bem do que mal. Embora não tivesse cargo
nem verba para realizar testes controlados randomizados, em alguma
medida Cass foi capaz de servir como um BIT de um só homem durante o
primeiro mandato do presidente Obama.
Depois de quatro anos trabalhando para o governo, Cass voltou a
ensinar na escola de direito de Harvard, para onde se mudara pouco antes
de o presidente Obama ser eleito. Mas o programa de nudge nos Estados
Unidos não terminou com a partida de Cass. No começo de 2014, a dra.
Maya Shankar, uma ex-violinista prodígio transformada em neurocientista
cognitiva que abraçou o nudge, criou uma pequena unidade na Casa
Branca. Maya, mais enérgica que o coelho da propaganda de pilhas, tem
uma habilidade de fazer as coisas acontecerem. Em uma participação na
Associação Americana para o Progresso da Ciência, ela serviu como
consultora do escritório de políticas de ciência e tecnologia da Casa
Branca. Nesse papel, se propôs a missão de criar uma versão americana do
BIT. Milagrosamente, conseguiu seu objetivo em menos de um ano e sem
nenhum cargo ou verba do governo.
A equipe, oficialmente chamada Social and Behavioral Sciences Team
(SBST), começou como uma pequena unidade de apenas seis cientistas
comportamentais: Maya, dois bolsistas universitários e mais três pessoas
que tiraram licença de think tanks sem fins lucrativos — o ramo norte-
americano Jameel Poverty Action Lab (J–PAL), especializado em realizar
RCTs; e o ideas42, que tem a economia comportamental como seu
principal ponto forte.
Só no primeiro ano, a SBST embutiu uma dezena de testes controlados
randomizados de inclinação comportamental em programas nacionais,
com objetivos de políticas que abrangiam desde o aumento dos benefícios
de veteranos até a ajuda a pessoas com dificuldade de quitar seus
empréstimos estudantis. E a equipe também está crescendo. O governo
federal recentemente reagiu aos primeiros sucessos da equipe
comprometendo parte do seu orçamento para financiar membros
adicionais. Graças ao apoio do governo e de parceiros externos, a equipe
deverá ter dobrado de tamanho quando este livro for publicado.
Outros países também estão aderindo ao movimento. Um estudo
conduzido pelo Economic and Social Research Council publicado em
2014 reporta que 136 países no mundo incorporaram ciências
comportamentais em algum aspecto de políticas públicas, e 51
“desenvolveram iniciativas de políticas centralmente dirigidas que foram
influenciadas pelas novas ciências comportamentais.”16 Claramente a ideia
está se espalhando.
Vale a pena ressaltar que os autores do relatório escolheram o termo
“ciências comportamentais” para descrever as técnicas sendo usadas. O
trabalho do BIT tem sido frequentemente mal caracterizado como sendo
baseado em economia comportamental quando, na verdade, pelo menos
até agora, houve muito pouca economia envolvida. As ferramentas e os
insights provêm basicamente da psicologia e de outras ciências sociais.
Todo o objetivo de formar uma equipe de análises comportamentais é
utilizar os achados de outras ciências sociais para incrementar o conselho
habitual sendo fornecido pelos economistas. Insistir em chamar qualquer
pesquisa relacionada a políticas públicas de um tipo de economia é um
insulto a essas outras ciências sociais.

––––––––

Sempre que alguém me pede para autografar um exemplar de Nudge,


acrescento a frase: “nudge para o bem”. Nudges são meras ferramentas, e
essas ferramentas existiam antes de Cass e eu lhes darmos um nome. As
pessoas podem ser direcionadas a poupar para a aposentadoria, a fazer mais
exercícios e a pagar seus impostos em dia, mas também podem ser
direcionadas a pegar uma segunda hipoteca da sua casa e gastar o dinheiro
em um surto de compras. Empresas ou governos com más intenções
podem usar esses achados das ciências comportamentais para proveito
próprio, à custa de pessoas nas quais o nudge foi aplicado. Vigaristas não
precisam ler nosso livro para saber como fazer seus negócios. Cientistas
comportamentais têm muita sabedoria a oferecer para transformar este
mundo num lugar melhor. Usemos a sabedoria deles escolhendo
cuidadosamente nudges com base na ciência e sujeitando essas
intervenções a testes rigorosos.
Tenho orgulho de dizer que a minha cidade natal, Chicago, acabou de
lançar sua própria equipe de análises comportamentais com a ajuda do
ideias42. Incentive seu próprio governo a fazer o mesmo. Deixar de fazê-lo
é um comportamento muito desviante.
CONCLUSÃO

O QUE VEM A SEGUIR?

Já se passaram mais de 40 anos desde que comecei a escrever o início da


Lista no quadro-negro do meu escritório. Muita coisa mudou. A economia
comportamental não é mais uma operação secundária, e escrever um
artigo de economia em que as pessoas se comportam como Humanos não
é mais considerado um desvio, pelo menos para a maioria dos economistas
com menos de 50 anos. Depois de uma vida inteira como rebelde da
profissão, estou me adaptando lentamente à ideia de que a economia
comportamental está se tornando popular. O amadurecimento do campo
foi tão avançado que, quando este livro foi publicado nos Estados Unidos
em 2015, eu estava em meio ao meu mandato como presidente da
American Economic Association, e Robert Shiller foi meu sucessor. Os
loucos tomaram conta do hospício!
Mas o processo de desenvolver uma versão enriquecida da economia,
com Humanos na base e na linha de frente, está longe de terminar. Aqui
falarei um pouco sobre o que espero que venha a seguir, com ênfase no
“espero”. Sei que é impossível prever como uma disciplina mudará ao
longo do tempo. A única predição sensata é que os acontecimentos
seguramente nos surpreenderão. Assim, em vez de fazer predições, ofereço
uma breve lista de desejos para o progresso do campo nos próximos anos. A
maioria dos desejos se destina aos produtores de pesquisa econômica —
meus colegas economistas —, mas alguns são voltados para os
consumidores dessa pesquisa, sejam eles administradores, burocratas,
donos de times de futebol ou proprietários de casas.

______

Antes de olhar para a frente e ver o que a economia poderia se tornar,


parece sensato olhar para trás e fazer um balanço. Para grande surpresa de
todos, o maior impacto da abordagem comportamental da economia tem
sido na área de finanças. Ninguém teria previsto isto em 1980. Na verdade,
era algo impensável, porque os economistas sabiam que os mercados
financeiros eram os mais eficientes de todos os mercados, os lugares onde a
arbitragem era mais fácil e, portanto, o domínio onde o comportamento
desviante era menos provável de surgir. Em retrospecto, fica claro que as
finanças comportamentais prosperaram por duas razões. A primeira: há
teorias rigidamente especificadas, tais como a lei do preço único. A
segunda razão é que há um volume fantástico de dados que podem ser
usados para testar essas teorias, inclusive dados diários sobre milhares de
ações que remontam a 1926. Não sei de nenhum outro campo em
economia que nos permitiria uma refutação tão clara da teoria econômica
como a história da Palm e da 3Com.1
É claro que nem todos os economistas financeiros renunciaram à
lealdade à hipótese do mercado eficiente. Mas as abordagens
comportamentais são levadas a sério e, em muitas questões, o debate entre
os campos racional e comportamental está dominando a literatura em
economia financeira há mais de duas décadas.
A chave para manter esse debate bem-fundamentado e (em sua maior
parte) produtivo é o foco em dados. Como Gene Fama frequentemente
diz quando é indagado sobre nossas visões concorrentes: concordamos em
relação aos fatos, só discordamos em relação à interpretação. Os fatos são
que o modelo de precificação de ativos de capital foi claramente rejeitado
como descrição adequada dos movimentos de preços de ações. Beta, o
único fator a que um dia foi creditada importância, não parece explicar
muita coisa. E outros fatores que um dia foram tidos como irrelevantes são
agora considerados de grande importância, embora as razões para isso
permaneçam controversas. O campo parece estar convergindo para aquilo
que eu chamaria de “economia baseada em evidência”.
Seria natural imaginar que outro tipo de economia poderia existir, mas
a maior parte da teoria econômica não deriva da observação empírica. Em
vez disso, é deduzida a partir de axiomas de escolha racional, tenham ou
não esses axiomas qualquer relação com o que observamos na nossa vida
cotidiana. Uma teoria do comportamento dos Econs não pode ter base
empírica, porque Econs não existem.
A combinação de fatos que são difíceis ou impossíveis de confirmar pela
hipótese do mercado eficiente, aliada à voz firme dos economistas
comportamentais dentro do campo, fez das finanças o campo onde as
alegações do gesto da mão invisível receberam o escrutínio mais
construtivo. Em um mundo onde uma parte de uma empresa pode vender
mais que a empresa inteira, fica claro que nenhum gesto, por mais amplo
que seja, é suficiente. Economistas na área de finanças têm sido obrigados
a levar a sério os “limites da arbitragem”, que poderiam ser facilmente
chamados de “limites gestuais da mão”. Agora sabemos mais sobre como e
quando os preços podem divergir do valor intrínseco, e o que impede o
smart money de fazer os preços entrarem de novo na linha. (Em alguns
casos, investidores que aspiram a ser o smart money podem ganhar mais
dinheiro apostando em surfar na bolha e planejando cair fora mais rápido
que os outros, em vez de apostar em um retorno à sanidade.) As finanças
também ilustram como a economia baseada em evidência pode levar ao
desenvolvimento teórico. Como disse Thomas Kuhn, a descoberta começa
com anomalias. A tarefa de elaborar a versão baseada em evidência da
economia financeira está longe de terminada, mas está no caminho certo.
É hora de um progresso semelhante em outros ramos da economia.
Se fosse escolher o ramo da economia que estou mais ansioso para ver
adotar abordagens comportamentais realistas, seria, lamentavelmente, o
campo onde as abordagens comportamentais têm tido menor impacto até
aqui: a macroeconomia. As grandes questões de política monetária e
financeira têm importância vital para o bem-estar de qualquer país, e uma
compreensão de Humanos é essencial para escolher sabiamente essas
políticas. John Maynard Keynes praticou a macro comportamental, mas
essa tradição tem diminuído desde então. Quando George Akerlof e Robert
Shiller — dois distintos acadêmicos que estão mantendo viva a tradição
comportamental keynesiana — tentaram por vários anos organizar um
encontro anual de macroeconomia comportamental no National Bureau
of Economic Research, foi difícil achar bons artigos de macroeconomia
em número suficiente para completar um programa. (Em contraste, o
encontro de finanças comportamentais que Shiller e eu coordenamos,
realizado duas vezes por ano, atrai dezenas de propostas sólidas para cada
encontro, e o processo de escolher apenas seis para incluir no programa é
difícil.) Akerlof e Shiller acabaram abandonando a empreitada.2
Um dos motivos de não vermos um grupo crescente de economistas
comportamentais trabalhando em macroeconomia pode ser porque o
campo careça de dois ingredientes-chave que contribuíram para o sucesso
das finanças comportamentais: as teorias não fazem predições facilmente
verificáveis, e os dados são relativamente escassos. Em conjunto, isto
significa que a “prova irrefutável” da evidência empírica — como a que
existe em finanças — continua a nos escapar.
Talvez mais importante que isso seja a indicação de que os economistas
não conseguem sequer chegar a um acordo sobre o que fazer frente a uma
crise econômica como a que vivenciamos em 2007–08. Os da esquerda
adotam a visão keynesiana de que o governo deveria ter tirado vantagem da
combinação de altas taxas de desemprego e taxas de juros baixas (ou
negativas) para realizar investimentos em infraestrutura. Os da direita
temem que tais investimentos não sejam bem gastos e que o aumento da
dívida nacional gere mais adiante uma crise orçamentária ou inflação.
Esses economistas acreditam que cortes em impostos estimularão o
crescimento, enquanto os keynesianos acreditam que o crescimento será
estimulado por gastos públicos. Ambos os lados se culpam mutuamente
pela lentidão da recuperação: ela se deve a austeridade de mais ou de
menos. Como provavelmente não conseguiremos levar governos a
concordar em deixar as políticas de combate à recessão serem escolhidas
aleatoriamente — para poder realizar ensaios controlados randomizados
—, pode ser que esse debate nunca seja resolvido.3
Todavia, a falta de consenso sobre o que constitui a essência do modelo
macroeconômico “racional” não implica que os princípios da economia
comportamental não possam ser aplicados a grandes questões de políticas
no quadro geral. Perspectivas comportamentais podem adicionar nuances
aos assuntos macroeconômicos mesmo na ausência de uma hipótese nula
clara para refutar ou elaborar. Não deveríamos precisar de provas
irrefutáveis para começar a coletar evidência.
Uma importante política macroeconômica pedindo por análise
comportamental é como moldar um corte de impostos visando estimular a
economia. A análise comportamental ajudaria, independentemente de o
motivo para o corte de impostos ser keynesiano — aumentar a demanda de
bens — ou pelo lado da oferta — visando fazer com que “criadores de
empregos” criem ainda mais empregos. Há detalhes comportamentais
críticos na maneira como o corte de impostos é administrado, detalhes que
seriam considerados FSIs em qualquer contexto racional. Se o pensamento
keynesiano motivar o corte de impostos, então os responsáveis pelas
políticas desejarão que esse corte estimule o máximo possível o
comportamento de gastar. E um detalhe supostamente irrelevante que
esses responsáveis pelas políticas devem considerar é se o corte deve vir em
uma única bolada ou ser distribuído ao longo do ano. Sem modelos de
comportamento do consumidor baseados em evidência, é impossível
responder a essa pergunta. (Quando a meta é estimular gastos, meu
conselho seria distribuir ao longo do ano.4 Boladas têm maior
probabilidade de irem para a poupança ou serem usadas para liquidar
dívidas.)
As mesmas questões se aplicam ao corte de impostos do lado da oferta.
Suponha que estejamos cogitando oferecer uma isenção tributária para
empresas que tragam dinheiro de volta aos Estados Unidos em vez de
mantê-lo escondido em subsidiárias no exterior para evitar tributação. Para
planejar e avaliar essa política, precisamos de um modelo baseado em
evidência que nos diga o que as empresas farão com o dinheiro repatriado.
Será que elas vão investi-lo, distribuí-lo aos acionistas ou acumulá-lo, como
tantas firmas americanas vêm fazendo desde a crise financeira? Isso torna
difícil predizer o que as empresas fariam caso se vissem com uma parcela
maior desse dinheiro em terreno doméstico. Mais genericamente, até que
entendamos melhor como firmas reais se comportam, referindo-nos
àquelas administradas por Humanos, não podemos fazer um bom trabalho
de avaliar o impacto de medidas fundamentais de política pública. Terei
um pouco mais a dizer sobre isso adiante.
Outra questão referente ao panorama geral que pede uma análise
comportamental mais meticulosa é a melhor maneira de encorajar as
pessoas a começar novos negócios (especialmente aqueles que poderiam
ser bem-sucedidos). Economistas de direita tendem a enfatizar a redução
de alíquotas marginais em ganhos de alta renda como a chave para gerar
crescimento. Os de esquerda tendem a insistir em subsídios direcionados
para indústrias que querem estimular (tais como energia limpa) ou
aumento de disponibilidade de empréstimos por parte da Small Business
Administration, uma agência governamental cuja missão é estimular a
criação e o sucesso de novos empreendimentos. E tanto economistas
quanto políticos de todas as espécies tendem a favorecer isenções de muitas
regulamentações governamentais para pequenas empresas, para quem a
conformidade pode ser custosa. Todas essas políticas são dignas de
consideração, mas raramente ouvimos muito de economistas sobre mitigar
o risco do prejuízo aos empreendedores se um novo negócio fracassar, o
que acontece em pelo menos metade das vezes, se não mais.5 Sabemos
que, para os Humanos, as perdas se parecem maiores que os ganhos, então
esta talvez seja uma consideração importante. Aqui está uma sugestão
nessa linha, oferecida durante uma entrevista de televisão improvisada
(então perdoe a gramática):

O que precisamos fazer neste país é construir um colchão mais


macio para o fracasso. Porque [os de direita] dizem que os criadores
de empregos precisam de mais cortes de impostos e de uma
recompensa maior pelo risco que assumem (...) Mas e o risco de
deixar seu emprego para virar empreendedor porque perderia o
plano de saúde? (...) Por que não somos capazes de vender a ideia de
que, para obter sucesso neste país, não é preciso aumentar a
recompensa pelo risco, mas, sim, amortecer os danos do risco?

Essa ideia não veio de um economista, nem mesmo de um economista


comportamental. Veio do comediante Jon Stewart,6 apresentador de The
Daily Show, durante uma entrevista com Austan Goolsbee, meu colega da
Universidade de Chicago que durante algum tempo serviu como chefe do
Council of Economic Advisors do presidente Obama. Economistas não
deveriam precisar que o apresentador de um programa humorístico de
notícias mostrasse que encontrar meios de mitigar os custos pelos fracassos
poderia ser mais efetivo para estimular novos negócios do que cortar a
alíquota de impostos de pessoas que ganham mais de US$250.000,00 por
ano, especialmente quando 97% dos proprietários de pequenos negócios
nos Estados Unidos ganham menos do que isso.

––––––––

A macroeconomia comportamental está no topo da minha lista de desejos,


mas praticamente todos os campos da economia poderiam se beneficiar
dando uma atenção maior ao papel dos Humanos. Junto com finanças, a
economia de desenvolvimento é provavelmente o campo onde
economistas comportamentais estão tendo maior impacto, em parte
porque o campo foi revitalizado por um influxo de economistas que estão
aplicando ideias em países pobres por meio de testes controlados
randomizados.7 Nenhum país africano pobre vai virar a Suíça da noite para
o dia, mas podemos aprender como melhorar as coisas, um experimento
de cada vez.
Precisamos de mais economia baseada em evidência, podendo ser
teórica ou empírica. A teoria da perspectiva é, obviamente, seminal para a
economia comportamental no que se refere à teoria baseada em evidência.
Kahneman e Tversky começaram coletando dados sobre o que as pessoas
fazem (a partir de suas próprias experiências) e então construíram uma
teoria cuja meta era capturar o máximo possível desse comportamento de
forma parcimoniosa. Isto está em contraste com a teoria da utilidade
esperada, que, como uma teoria de escolha normativa, foi derivada de
axiomas racionais. A teoria da perspectiva agora já foi testada e repetida
rigorosamente8 com dados tirados de uma ampla variedade de situações,
desde o comportamento dos competidores em game shows, passando por
golfistas profissionais até investidores no mercado de ações. A próxima
geração de teóricos de economia comportamental, como Nicholas
Barberis, David Laibson e Matthew Rabin (para citar apenas três) também
começa com fatos e depois passa para a teoria.
Para produzir novas teorias, necessitamos de novos fatos, e a boa notícia
é que estou vendo agora muitas formas de coleta de evidência criativas
sendo publicadas nas principais revistas de economia. A crescente
popularidade de testes controlados randomizados, a começar pelo campo
de economia do desenvolvimento, ilustra muito bem essa tendência, e
mostra como a experimentação pode aumentar a caixa de ferramentas dos
economistas, que geralmente dispunham de uma única ferramenta:
incentivos financeiros. Como vimos ao longo deste livro, tratar todo o
dinheiro como sendo a mesma coisa e também como o principal
impulsionador da motivação humana não é uma boa descrição da
realidade.
Um bom exemplo de um domínio onde experimentos de campo
realizados por economistas estão tendo impacto é a educação. Os
economistas não têm uma teoria de como maximizar o que as crianças
aprendem na escola (exceto a teoria obviamente falsa de que todas as
escolas com fins lucrativos já estão usando os melhores métodos). Uma
ideia exageradamente simplista é que podemos melhorar o desempenho de
alunos simplesmente dando incentivos financeiros para pais, professores ou
crianças. Infelizmente, há pouca evidência de que tais incentivos sejam
efetivos, mas as nuances importam. Por exemplo, uma descoberta
intrigante de Roland Fryer9 sugere que recompensar alunos por inputs (tais
como fazer o dever de casa) em vez de outputs (tais como suas notas) é
efetivo. Acho esse resultado intuitivamente atraente porque os alunos com
maior necessidade não sabem como se tornar estudantes melhores. Faz
sentido recompensá-los por fazer coisas que os educadores consideram
eficazes.
Outro resultado interessante provém diretamente da cartilha da
economia comportamental. A equipe de Fryer, John List, Steven Levitt e
Sally Sadoff10 descobriu que instituir um bônus para os professores faz
uma grande diferença. Professores que recebem no começo do ano letivo
um bônus que precisa ser devolvido se eles falharem em alcançar alguma
meta conseguem uma melhora no desempenho de seus alunos
significativamente maior do que professores a quem é oferecido um bônus
de fim de ano dependendo de atingir ou não as mesmas metas.11
Um terceiro resultado positivo ainda mais distante da tradicional caixa
de ferramentas de incentivos financeiros vem de um recente teste
controlado randomizado12 conduzido no Reino Unido, usando um
método — cada vez mais popular e de baixo custo — de mensagens de
texto no celular. Essa intervenção envolvia mandar mensagens para
metade dos pais em alguma escola antes de uma importante prova de
matemática, para que ficassem sabendo que o filho ou filha teria uma
prova em cinco dias, depois em três dias, depois em um dia. Os
pesquisadores chamam essa abordagem de “pré-informe”. A outra metade
dos pais não recebia as mensagens. As mensagens de pré-informe
melhoraram o desempenho dos alunos na prova de matemática pelo
equivalente a um mês de ensino adicional, e os mais beneficiados foram os
alunos no quartil inferior. Essas crianças ganharam o equivalente a dois
meses de ensino, em relação ao grupo de controle. Depois, pais e alunos
disseram que queriam continuar com o programa, mostrando que
apreciaram receber o nudge. Esse programa também desmente a frequente
alegação, não respaldada por evidência, de que os nudges precisam ser
secretos para serem efetivos.
Escolas públicas, como aldeias remotas em países pobres, são ambientes
desafiadores para os experimentadores. Estamos aprendendo lições
importantes sobre como ensinar às nossas crianças e mantê-las motivadas, e
isto deveria incentivar outros fora dos campos da educação e da economia
do desenvolvimento a também tentar a coleta de dados. Experimentos de
campo talvez sejam a ferramenta mais poderosa que temos13 para pôr em
evidência na “economia baseada em evidência”.

––––––––

Minha lista de desejos para não economistas tem jeito parecido.


Considerando que as escolas são uma das mais velhas instituições da
sociedade, é impressionante que não tenhamos descoberto como ensinar
bem às nossas crianças. Precisamos realizar experimentos para descobrir
como melhorar, e só há pouco começamos a fazê-lo. O que isso deveria
nos dizer sobre criações muito mais novas que escolas, tais como as
corporações modernas? Existe alguma razão para acreditarmos saber a
melhor maneira de administrá-las? É hora de todos — de economistas a
burocratas, de professores a líderes corporativos — reconhecerem que
vivem em um mundo de Humanos e adotar a mesma abordagem guiada
por dados para seus empregos e suas vidas que os bons cientistas usam.
Minha participação na criação da economia comportamental me
ensinou algumas lições básicas que, com a devida cautela, podem ser
adotadas em uma gama de circunstâncias. Aqui estão três delas.
Observe. A economia comportamental começou com observações
simples. As pessoas comem castanhas-de-caju demais se a tigela for
mantida sobre a mesa. As pessoas fazem contabilidade mental — não
tratam todo dinheiro da mesma maneira. As pessoas cometem erros —
montes deles. Parafraseando uma citação anterior: “Os Humanos existem.
Olhe em volta.” O primeiro passo para derrubar a sabedoria convencional,
quando a sabedoria convencional está errada, é olhar o mundo ao seu
redor. Veja o mundo como ele é, não como outros gostariam que fosse.
Colete dados. Histórias são poderosas e memoráveis. É por isso que
contei tantas neste livro. Mas um episódio individual só pode servir como
ilustração. Para realmente nos convencer e, mais ainda, convencer os
outros, precisamos mudar a maneira como fazemos as coisas: precisamos
de dados, muitos dados. Como disse uma vez Mark Twain: “Não é o que
você não sabe que mete você em encrenca. É o que você sabe com certeza
e que simplesmente não é verdade.” As pessoas têm excesso de confiança
porque nunca se dão ao trabalho de documentar seu registro passado de
predições erradas e, então, pioram as coisas, tornando-se vítimas do temido
viés da confirmação — só procuram evidência que confirme suas hipóteses
preconcebidas. A única proteção contra o excesso de confiança é coletar
dados sistematicamente, especialmente dados que possam provar que você
está errado. Como minha colega de Chicago, Linda Ginzel, sempre diz
aos seus alunos: “Se você não anota, não existe.”14
Além disso, a maioria das organizações tem uma necessidade urgente de
aprender a aprender, e então se comprometer com essa aprendizagem para
acumular conhecimento ao longo do tempo. No mínimo isto significa
tentar coisas novas e manter registro do que acontece. Melhor ainda seria
realizar experimentos reais. Se ninguém na sua organização sabe como
realizar um experimento apropriado, contratem um cientista
comportamental. Eles são mais baratos do que advogados e consultores.
Fale mais alto. Muitos erros organizacionais poderiam ter sido
facilmente evitados se alguém estivesse disposto a dizer ao chefe que algo
estava dando errado.
Um vívido exemplo vem do mundo de altos valores da aviação
comercial, conforme registrado em crônica por Atul Gawande — um
defensor da redução do erro Humano — em seu livro Checklist: como fazer
as coisas benfeitas.15 Mais de 500 pessoas perderam a vida em uma colisão
na pista em 1977 porque o segundo oficial do voo da KLM foi tímido
demais para questionar a autoridade do comandante, seu “chefe”. Depois
de entender errado as instruções sobre outro avião que ainda estava na
mesma pista, o comandante continuou a acelerar sua aeronave para a
decolagem. O segundo oficial tentou adverti-lo, mas o capitão desprezou
sua advertência, e daí por diante o segundo oficial permaneceu em
silêncio — até que os dois aviões colidiram. Gawande apropriadamente
diagnostica a causa como sendo falha organizacional: “[A empresa aérea]
não estava preparada para esse momento. Não haviam dado os passos para
fazerem de si mesmos uma equipe. Como resultado, o segundo oficial
nunca acreditou ter a permissão, muito menos o dever, de impedir o
comandante e esclarecer a confusão. Em vez disso, o comandante tinha
autorização para acelerar e matar a todos.”
Outro exemplo vem do desastre de alpinismo na escalada do Monte
Everest tão vividamente documentado por Jon Krakauer em seu livro No ar
rarefeito.16 Durante várias semanas se aclimatando e chegando lentamente
ao acampamento base mais alto, Rob Hall e Scott Fisher repetidamente
enfatizaram para seus clientes a importância de dar meia-volta se não
tivessem atingido o pico na hora designada de 13h. Contudo, esses dois
guias experientes perderam a vida depois de violarem sua própria regra.
Tragicamente, nenhum de seus subordinados tentou intervir para lembrar
a esses homens suas próprias regras. Como ambos os exemplos ilustram, às
vezes, mesmo quando você está falando com o chefe, precisa avisá-lo da
ameaça de um desastre iminente.
A criação da economia comportamental incluiu muitas situações em
que foi preciso falar mais alto com sumos sacerdotes da economia acerca
do irrealismo dos modelos hiperracionais. Não posso dizer que recomendo
assumir um caminho tão arriscado como eu fiz. Eu estava em
circunstâncias incomuns. Tive a sorte de encontrar Kahneman e Tversky
exatamente no momento certo. E, como expôs sem rodeios o orientador da
minha tese, minhas perspectivas como economista não eram nada
brilhantes. “Não esperávamos muito dele” diz tudo. Quando seus custos de
oportunidade são baixos, vale a pena correr riscos e falar mais alto,
especialmente se o caminho é tão divertido quanto o que eu percorri.
Mas não podemos esperar que as pessoas assumam riscos, seja falando
mais alto ou de outras maneiras, se serão demitidas ao fazer isso. Bons
líderes devem criar ambientes onde os empregados sintam que decisões
tomadas com base em evidência sempre serão recompensadas, não importa
qual seja o resultado. O ambiente organizacional ideal incentiva todo
mundo a observar, coletar dados e falar mais alto. Os chefes que criam tais
ambientes estão arriscando apenas uma coisa: alguns arranhões no seu ego.
É um preço pequeno a pagar para aumentar o fluxo de novas ideias e
reduzir os riscos de desastres.

––––––––

Embora neste livro eu tenha sido crítico em relação aos economistas em


certas ocasiões, sou totalmente otimista quanto ao futuro da economia. Um
sinal que acho particularmente encorajador é que os economistas que não
se identificam como “comportamentais” escreveram alguns dos melhores
artigos de economia comportamental publicados em anos recentes. Esses
economistas simplesmente fazem um sólido trabalho empírico sem se
abalar com as consequências. Já mencionei dois desses artigos antes no
livro: o de Justine Hastings e Jesse Shapiro sobre a contabilidade mental da
gasolina, e o de Raj Chetty e sua equipe analisando dados dinamarqueses
sobre poupança para aposentadoria. Lembre-se de que a equipe de Chetty
descobriu que o incentivo econômico para poupança via redução de
impostos praticamente não tem efeito nenhum sobre o comportamento.
Em vez disso, 99% do trabalho é feito pela arquitetura de escolha17 dos
planos, tais como a taxa de poupança padrão — em outras palavras, FSIs.
Esse artigo é apenas um de muitos nos quais Chetty e sua equipe de
colaboradores descobriram que percepções comportamentais podem
melhorar a nossa compreensão de políticas públicas.18
Quando todos os economistas tiverem também a mente aberta e
estiverem dispostos a incorporar variáveis importantes no seu trabalho,
mesmo que o modelo racional esteja dizendo que essas variáveis são
supostamente irrelevantes, o campo da economia comportamental
desaparecerá. Toda economia será tão comportamental quanto necessário.
E aqueles que têm se apegado teimosamente a um mundo imaginário que
consiste apenas de Econs agitarão uma bandeira branca, em vez de uma
mão invisível.
NOTAS

EPÍGRAFE
1. Pareto ([1906] 2013), cap. 2, p. 21.

PREFÁCIO
1. Choices, Values, and Frames, Kahneman e Tversky (2000).
2. Enquanto Amos estava vivo, uma piada conhecida entre psicólogos era que ele
possibilitava um teste de QI com um único item: quanto mais rapidamente você
percebesse que ele era mais inteligente que você, maior seria seu QI.
3. Lowenstein (2000).
4. When Genius Failed: Lowenstein (2001).
5. Se você quiser aprender mais sobre o campo da economia comportamental,
acompanhar desenvolvimentos e controvérsias recentes ou fazer um comentário,
confira o blog Misbehaving em misbehavingbook.org. Contribuições e sugestões são
bem-vindas.

CAPÍTULO 1: FATORES SUPOSTAMENTE IRRELEVANTES


1. Um economista que, de fato, nos avisou acerca da alarmante taxa de aumento nos
preços de moradias foi meu colega economista comportamental Robert Shiller.
2. Smith ([1776] 1981, [1759] 1981).
3. Para evidência de agricultores Humanos tomando decisões como essa, ver Duflo,
Kremer e Robinson (2011), e Cole e Fernando (2012). De um lado, agricultores
parecem, sim, responsivos à informação se esta lhes é comunicada, e compreendem
quanto um fertilizante será benéfico às suas terras. De outro, eles também aumentam a
compra e a utilização de fertilizante em resposta a cutucões (nudges) comportamentais
simples que não teriam impacto sobre um Econ.
4. “Ciência sombria” é um termo cunhado por Thomas Carlyle para se referir à
economia. (N. T.)

CAPÍTULO 2: O EFEITO POSSE


1. “The Life You Save May Be Your Own”, Schelling (1968).
2. Experimento típico de Schelling: suponha que houvesse algum procedimento médico
para prover um modesto benefício de saúde, mas que fosse extremamente doloroso. No
entanto, o procedimento seria administrado com uma droga que não impediria a dor,
mas apagaria toda a memória do evento. Você estaria disposto a passar pelo
procedimento?
3. A questão na qual Zeckhauser estava interessado era: como a disposição de Aidan em
pagar depende do número de balas na arma? Se todas as câmaras estão cheias, Aidan
deve pagar tudo que tem (e pode pedir emprestado) para remover até mesmo uma
bala. Mas, e se houver apenas duas balas carregadas? O que ele pagará para remover
um delas? E seria mais, ou menos, do que pagaria para remover a última bala?
4. “The Value of Saving a Life”, Thaler e Rosen (1976).

5 d df l h
5. Tecnicamente, as respostas podem diferir por aquilo que os economistas chamam
efeito de renda ou riqueza. Sua situação é pior na versão A do que na versão B porque,
se não fizer nada, não será exposto à doença na versão B. Mas esse efeito não pode
explicar diferenças da magnitude que observei, e outros levantamentos nos quais eu
disse hipoteticamente às pessoas na versão A que elas receberiam (digamos)
US$50.000,00 não eliminaram a disparidade.
6. Rosett não parecia muito preocupado com esse comportamento. Posteriormente
publiquei um artigo que incluía essa anedota, com Rosett sob a alcunha de Sr. R.
Mandei uma cópia para ele quando o artigo foi publicado e recebi uma curta resposta:
“Ah, a fama!”
7. No Super Bowl XXXV, Alan Krueger (2001) perguntou aos torcedores que compraram
ingressos por US$400,00 ou menos (valor nominal dos ingressos) sobre sua disposição
de comprar e vender no preço de mercado, de aproximadamente US$3.000,00. Uma
esmagadora maioria (86%) estaria disposta a comprar (se não tivesse conseguido o
ingresso), todavia não estaria disposta a vender por esse preço.
8. É claro que alunos da faculdade de teologia podem compensar essa disparidade no
longo, longo prazo.

CAPÍTULO 3: A LISTA
1. Fischhoff (1975).
2. “ Judgement Under Uncertainty: Heuristics and Biases”, Tversky e Kahneman (1974).
3. O Prêmio Nobel de economia não consta entre os originais determinados em
testamento por Alfred Nobel, embora seja concedido junto com eles. Seu nome
completo é Prêmio Sveriges Riksbank de Ciências Econômicas em Memória de Alfred
Nobel, mas aqui o chamarei abreviadamente de Prêmio Nobel. Uma lista de laureados
pode ser encontrada em http://www.nobelprize.org/nobel_prizes/economic-
sciences/laureates/.
4. Na verdade, o simples fato de ter uma arma de fogo em casa aumenta o risco de um
membro do domicílio cometer suicídio.
5. DeSilver (2013), reportando sobre os dados de 2010 dos Centros de Controle e
Prevenção de Doenças.
6. No caso de você estar se perguntando sobre a ordem dos nomes na autoria dos artigos
deles, desde cedo Amos e Danny adotaram a estratégia sutil de alternar o nome que
viria antes como forma de sinalizar que estavam de igual para igual na parceria. Em
economia, a ordem alfabética é a opção-padrão, mas em psicologia a ordem dos nomes
geralmente pretende indicar as contribuições relativas. Sua solução evitava ter de tomar
a decisão, artigo por artigo, sobre quem tinha contribuído mais. Tais avaliações podem
ser estressantes (ver capítulo 28).

CAPÍTULO 4: TEORIA DO VALOR


1. “Prospect Theory”, Kahneman e Tversky (1979). Perguntei a Danny por que haviam
mudado o nome. Sua resposta: “‘Teoria do Valor’ era enganoso, e decidimos ter um
termo completamente sem significado, que viria a se tornar significativo se, por algum
golpe de sorte, a teoria se tornasse importante. ‘Prospectos’ se encaixava bem.”
2. Ver Becker (1962, 1964).
3. Ver Bernoulli ([1738] 1954) para uma tradução inglesa.
4. O paradoxo é o seguinte: suponha que um jogador precise pagar uma determinada
quantia para participar de um jogo. Uma moeda será lançada e, se der coroa, o jogo
acaba. Contudo, o prêmio dobra a cada vez que der cara. Ou seja, se der cara no
primeiro lançamento, o jogador ganha US$2; se na segunda vez que for lançada
também der cara, o jogador ganha US$4, e assim por diante. Seu ganho esperado é ½ x
US$2 + ¼ x $4 + 1/8 x US$8... Tal sequência é infinita, assim o prêmio também cresce
f f f
infinitamente. Então por que as pessoas não pagam uma fortuna para fazer a aposta? A
resposta de Bernoulli foi supor que, com o aumento dos ganhos do jogador, o valor que
ele dá ao futuro ganho diminui, o que gera aversão ao risco. Uma solução mais simples
é observar que existe apenas uma quantidade finita de riqueza no mundo, então você
deveria se preocupar se a outra parte poderá pagar se você ganhar. São necessárias
apenas 40 coroas seguidas para elevar seu dinheiro a mais de 1 trilhão de dólares. Se
você acha que a banca pode quebrar, a aposta não vale mais que US$40.
5. The Theory of Games and Economic Behavior, Von Neumann e Morgenstern (1947).
6. Baumol (1962).
7. Tom Magliozzi faleceu em 2014, mas o programa continua em reprises, com os dois
irmãos ainda caindo na risada.

CAPÍTULO 5: CALIFORNIA DREAMIN’ – O SONHO DA CALIFÓRNIA


1. “Consumer Choice: A Theory of Economists’ Behavior”, Thaler (1980).
2. Resposta: Dirija na mesma velocidade o caminho todo. A chance de levar uma multa é
proporcional ao tempo que você dirige, mantendo todo o resto constante.
3. Existem, é claro, exceções a essa generalização. Nessa era, George Stigler e Tom
Schelling vêm à cabeça como grandes escritores.
4. Kahneman (2011).
5. Johnson (2010).
6. Eu me referia ao trabalho inicial de Smith, citado pelo comitê do Nobel.
Posteriormente ele mergulhou em outras áreas mais radicais, inclusive em uma série
de experimentos nos quais era capaz de produzir confiavelmente uma bolha nos preços
de ativos (Smith, Suchanek e Gerry, 1998).
7. Ver Smith (1976).
8. Os familiarizados com a área acadêmica talvez estejam se perguntando como acabei
em um emprego na escola de administração de empresas de Rochester depois de ser
aluno no departamento de economia. As universidades geralmente não contratam seus
próprios graduados. A resposta é uma longa história, mas a versão curta é que eu
lecionava na escola de administração de empresas enquanto era aluno de pós-
graduação e, quando meu primeiro emprego furou no último minuto, Bill Meckling,
reitor da escola, me ofereceu uma posição de um ano como tapa-buraco, e eu acabei
ficando ali por mais alguns anos.

CAPÍTULO 6: A MANOPLA
1. Ver Mongin (1997) e Frischmann e Hogendorn (2015) para uma crítica a esse debate
sobre análise marginal.
2. Lester (1946).
3. Machlup (1946).
4. Friedman (1953), p. 21.
5. Lichtenstein e Slovic (1973).
6. Eles privilegiaram essa hipótese a despeito de Lichtenstein e Slovic (1973) replicarem
seu experimento com uso de dinheiro real no salão de um cassino em Las Vegas. O
fato de terem desconsiderado essa evidência poderia ser explicado por outra de suas
hipóteses. Eles também cogitaram explicitamente a possibilidade de que os resultados
ruins tivessem sido obtidos simplesmente porque os pesquisadores eram psicólogos,
classe conhecida por enganar os voluntários em experimentos. Desnecessário dizer,
essa hipótese não caiu bem para nenhum psicólogo que tenha dado de cara com o
artigo deles.
7. Grether e Plott (1979).
8. Na verdade, os mercados podem exacerbar perdas de bem-estar social resultantes da
presença de vieses de consumidor. As empresas podem não ter um incentivo para
l d d l l
eliminar o viés dos consumidores uma vez que, em algumas circunstâncias, os lucros
da empresa crescem na razão direta da ingenuidade: taxas de atraso em pagamentos de
cartões de crédito (Heidhues e Kazeegi, 2010); matrículas em academias (DellaVigna e
Malmendier, 2006); taxas disfarçadas em cartuchos de impressoras e quartos de hotel
(Gabaix e Laibson, 2006).
9. Para uma abordagem cuidadosa sobre como pensar no conceito de mão invisível, ver
Ullmann-Margalit (1977).
10. O estudo de como empresas de maximização de lucros interagem com consumidores
Humanos é o tema do empolgante campo da organização industrial comportamental.
Caso deseje um texto-base sobre o assunto, ver Spiegler (2011). Os exemplos discutidos
no Capítulo 13 também são relevantes.
11. Para uma análise meticulosa desses tipos de argumento, ver Russell e Thaler (1985),
Haltiwanger e Waldman (1985) e Akerlof e Yellen (1985).
12. Esquemas fraudulentos de investimento, tipo pirâmides, que prometem lucros
excepcionalmente altos. O nome faz referência ao primeiro idealizador de um
esquema desses, Carlo Pietro Ponzi, na década de 1920 nos Estados Unidos. (N. T.)
13. “An Economic Theory of Self-Control”, Thaler e Shefrin (1981).

SEÇÃO II: CONTABILIDADE MENTAL


1. Meu artigo era Thaler (1980), e eles sugeriram o termo “contabilidade mental” em
Kahneman e Tversky (1984).

CAPÍTULO 7: PECHINCHAS E ENGANAÇÕES


1. Talvez surpreendentemente, o único grupo de pessoas que mais se aproxima de pensar
desta maneira sobre custos de oportunidade sejam os pobres. Em seu recente livro
Scarcity [Escassez], Sendhil Mullainathan e Eldar Shafir (2013) relatam que, nessa
dimensão, os pobres chegam mais perto de se comportar como Econs do que aqueles
que estão melhor de vida, simplesmente porque os custos de oportunidade são
altamente salientes para eles. Se um ganho inesperado de US$100 pudesse pagar a
conta de luz ou água atrasada ou substituir os sapatos das crianças que já estão
pequenos demais, os custos de oportunidade ficam evidentes. No entanto, o incessante
desgaste em relação a custos de oportunidade cobra o seu preço. Ter de se preocupar
constantemente em arranjar o dinheiro para pagar o aluguel dificulta manter tudo em
dia, e pode contribuir para algumas das más decisões tomadas pelos pobres, tais como
tomar empréstimos e atrasar os pagamentos.
2. Mediana é o termo estatístico para “meio”. Se todos os preços forem listados em ordem
de cima para baixo, a resposta mediana é aquela com igual quantidade de respostas
mais altas e mais baixas.
3. Um estudo recente descobriu que, quando os supermercados nos Estados Unidos foram
confrontados com o desafio de um Walmart entrando no seu mercado doméstico,
todos sofreram, mas aqueles que usaram a estratégia de preços promocionais (por
exemplo, ofertas frequentes) experimentaram receitas e viabilidade de longo prazo
significativamente maiores do que a estratégia de preços baixos diários. (Ellickson,
Misra e Nair, 2012).
4. Barbaro (2007).
5. Tuttle (2012).
6. Chernev (2012).
7. Clifford e Rampell (2013).
8. http://savingscatcher.walmart.com.

CAPÍTULO 8: CUSTOS AFUNDADOS


6
1. Staw (1976).
2. O nome do artigo no original em inglês, “Knee-Deep in the Big Muddy”, faz referência
à canção “Waist Deep in the Big Muddy” [“Afundado até a cintura no grande
lamaçal”], e a letra ilustra vividamente o conceito de escalada, com os versos indo da
lama na altura dos joelhos até a cintura e depois o pescoço.
3. DellaVigna e Malmendier (2006).
4. Gourville e Soman (1998).
5. Arkes e Blumer (1985).
6. Desde cedo, Orley foi um grande apoiador meu e dos meus colegas de viagem
malcomportados, inclusive durante seu período como editor da American Economic
Review. Mesmo assim, até hoje ele insiste em chamar o que faço de “wackonomics”,
um termo que ele acha engraçadíssimo. [N. T.: o termo “wacko” se refere a alguém
cujo comportamento é esquisito, diferente da maioria; em casos extremos, alguém
maluco, doido. Uma tradução livre seria, portanto, “economia de doido”]
7. Shafir e Thaler (2006). Ver também Thaler (1999a) para uma discussão do estudo.
8. Há uma interessante observação colateral para este experimento. O sorteio oferecendo
uma garrafa de vinho de US$75 gerou 178 respondentes de um grupo relativamente
abastado de leitores. Isso representava 42 centavos por resposta, e eles tinham de pagar
a própria postagem! Se você quer que pessoas façam alguma coisa, sorteios podem ser
uma motivação muito efetiva.
9. Um belo texto sobre essa frase em Wickman (2013).

CAPÍTULO 9: BALDES E ORÇAMENTOS


1. Heath e Soll (1996).
2. Hastings e Shapiro (2013).
3. Mian e Sufi (2014).

CAPÍTULO 10: NA MESA DE PÔQUER


1. Isso foi antes do começo da tendência das noitadas de pôquer em que o ganhador leva
tudo, inspiradas pela popularidade dessa forma de apostas nos torneios de pôquer.
2. O estudo citado por Kahneman e Tversky (1979) e McGlothin (1956).
3. Em alguns casos também era fácil. Bill Green era um econometrista que participava
regularmente do nosso grupo, e eu notava que, quando tinha uma mão boa, ele
começava a se remexer todo na cadeira. Não havia como deixar de perceber. Num
certo momento ficamos com pena dele e lhe contamos, mas ele não conseguia se
conter quando tinha uma mão realmente boa. Fiquei esperando que ele alguma hora
ganhasse uma bolada com um blefe, mas isso nunca aconteceu.
4. Thaler e Johnson (1990).
5. Isto significa que a predição da teoria da perspectiva de que pessoas buscam riscos no
domínio das perdas pode não se sustentar se a oportunidade de assumir risco não
oferece chance de sair no zero a zero.
6. Chevalier e Ellison (1997).

CAPÍTULO 11: FORÇA DE VONTADE? NÃO É PROBLEMA


1. Smith ([1776] 1981, p. 456): vol. 1, livro 4, cap. 2, par. 9.
2. Ver Ashraf, Camerer e Loewenstein (2005) para uma discussão completa deste ponto.
Minha discussão aqui se baseia fortemente no trabalho deles e também no de George
Loewenstein (1992), que há muito se interessa por este tópico, e não é preguiçoso
demais para ler livros longos.
3. Smith ([1776] 1981, p. 190): parte 4, cap. 2, par. 8; citado em Ashraf, Camerer e
Loewenstein (2005).
4 d l b l d
4. Certa vez dei uma palestra sobre autocontrole para um grupo de economistas na
Universidade Hebraica de Jerusalém. A certa altura usei a palavra “tentação”, e um dos
membros da plateia me pediu para defini-la. Outra pessoa do público se intrometeu
para dizer: “Está na Bíblia.” Mas não estava no dicionário dos economistas.
5. “A mudança, mais uma vez, deve ser menos rápida quanto mais distantes estivermos do
momento, e mais rápida à medida que nos aproximamos dele. Um evento que deve
acontecer daqui a um ano nos afeta mais ou menos tanto num dia quanto em outro;
mas um evento de importância, que deve ocorrer daqui a três dias, provavelmente nos
afetará em cada um dos dias intermediários mais agudamente do que no anterior.”
(Jevons [1871], 1957, cap. 2).
6. Pigou (1920), citado por Loewenstein (1992), que dá um belo apanhado histórico das
ideias sobre preferência de tempo.
7. Fisher (1930, p. 82): par. 9.
8. Ibid. p. 83: par. 9.
9. Para ser preciso, a taxa de desconto exata é de 11,11...%. Se o consumo do ano que vem
é avaliado em 10% menos que o de hoje, então a taxa de desconto geralmente é
definida como o valor x que satisfaz 1/(1 + x) = 0,9, que é 0,11... Ou seja, dizer que o
valor do consumo no próximo ano é 90% de seu valor hoje é equivalente a dizer que o
valor do consumo hoje é 111,11...% do seu valor no próximo ano. Para taxas de
desconto próximas a zero, a diferença entre esses dois números (aqui 10% e 11,11...%)
é pequena.
10. A função hiperbólica generalizada de desconto introduzida por Loewenstein e Prelec
(1992) pegou um tipo de telescópio defeituoso como premissa inicial, a saber, que o
intervalo entre duas datas futuras parece uma fração tão longa quanto um intervalo de
tamanho equivalente começando hoje.
11. Sobre o importante papel de Pareto em divorciar a economia da psicologia, ver Bruni
e Sugden (2007).
12. The General Theory of Employment, Interest and Money: Keynes (1936).
13. Friedman (1957).
14. Friedman (1963) esclarece a análise desse caso.
15. Aqui e no que se segue, também considerarei, em nome da simplicidade, que as taxas
de juros e inflação sejam zero, ou, se preferir, que sejam iguais entre si e todos os
números corrigidos pela inflação.
16. Modigliani e Brumberg (1954).
17. Se considerarmos um problema de longo prazo, tal como poupar para a
aposentadoria, então a história fica mais complicada, e eu iria um pouco mais ao
encontro de Modigliani. Ver a discussão sobre a hipótese do ciclo de vida
comportamental logo abaixo.
18. Barro (1974).
19. Quando Robert Barro e eu estávamos juntos numa conferência, anos atrás, eu disse
que a diferença entre os nossos modelos era que ele pressupunha que os agentes no seu
modelo eram tão espertos quanto ele, e eu acreditava que eram tão bobos quanto eu.
Barro concordou.
20. Ou, como me disse meu colega e bom amigo de Cornell Tom Gilovich: “Nunca
deixo de me assombrar com o número de hipóteses nulas convenientes que a teoria
econômica lhe deu.”
21. Thaler e Shefrin (1988).
22. Choi, Laibson, Madrian e Metrick (2009).

CAPÍTULO 12: A PLANEJADORA E O FAZEDOR


1. Strotz (1955–56).
2. Na verdade, Ulisses não era esperto o suficiente para conceber o plano ele mesmo.
Recebeu alguns bons conselhos de Circe, uma deusa especializada em ervas e drogas.
d
Vai entender.
3. Mischel (1968), p. 146, e Mischel (1969), p. 104. Para uma atualização da pesquisa
longitudinal, ver Mischel et al. (2011) e o recente livro de Mischel (2014) para o
público geral.
4. Ainslie (1975) elaborou uma versão do desconto hiperbólico que serviria mais tarde de
base para a construção de Loewenstein e Prelec (1992).
5. Alguns pesquisadores tentaram uma versão do teste do marshmallow/biscoito recheado
em animais. A maioria parte para a recompensa imediata, mas um papagaio-cinzento
particularmente esperto, chamado Griffen, revelou exibir um autocontrole melhor que
a maioria das crianças em idade pré-escolar (Zielinski, 2014).
6. McIntosh (1969), p. 122.
7. O modelo do sistema dual não é uma criação de Kahneman. Muitos outros psicólogos
haviam escrito sobre tais modelos. Ver, por exemplo, Sloman (1996) e Stanovich e
West (2000).
8. O modelo de sistema dual articulado por Kahneman em Rápido e devagar: duas formas
de pensar não era a maneira como Tversky e ele originalmente pensaram sobre sua
pesquisa. Uma das principais razões de Danny para escrever o livro foi porque
acreditava que, ao recompor seu trabalho original usando a estrutura de um sistema
rápido, automático, e um sistema lento, reflexivo, oferecia uma perspectiva nova e
perspicaz de seus achados anteriores.
9. Thaler e Shefrin (1981).
10. Tom Schelling começou a escrever sobre este tópico pouco depois de mim. Nossos
pontos de vista têm praticamente a mesma essência, mas ele estava menos convencido
que eu de que o conjunto de preferências de longo prazo tem maior probabilidade de
estar “certo”. Ver, por exemplo, Schelling (1984).
11. Jensen e Meckling (1976).
12. Amos sempre se referia ao planejador como mulher. Farei a mesma coisa em
homenagem a ele. E como os homens geralmente são mais semelhantes ao fazedor, o
empregarei no masculino. Podem me chamar de sexista.
13. Para facilitar, ignora-se aqui a possibilidade de que a dieta de uma barra de proteína
por dia deixe os fazedores cada vez mais famintos com o passar do tempo.
14. Tal tecnologia existe. O Kitchen Safe (kitchensafe.com) é um recipiente de plástico
que o usuário pode trancar por qualquer período de tempo. Os fabricantes o
recomendam para qualquer coisa tentadora, desde doces até smartphones e chaves de
carros. Ganhei um de um aluno atencioso. Naturalmente, estava cheio de castanhas-
de-caju. Em um mundo de Econs, não haveria demanda para tal produto.
15. Ver Banich (2009) para uma análise de alguns aspectos relevantes de psicologia e
neurociência.
16. Laibson (1997).
17. O’Donoghue e Rabin (1999).
18. Um influente apanhado geral sobre preferência de tempo é Frederick, Loewenstein e
O’Donoghue (2002).
19. Loewenstein (2005).

CAPÍTULO 13: DESVIOS NO MUNDO REAL


1. Em termos de contabilidade mental, ir a Greek Peak e pagar o preço de varejo de fato
fornecia utilidade de aquisição positiva para a maioria dos clientes, especialmente
moradores locais que podiam viajar apenas 30 minutos de carro, esquiar um dia e estar
em casa para o jantar, sem ter que pagar quartos de hotel. Esse é um luxo acessível a
residentes em Salt Lake City e outros locais próximos a estações de esqui, mas não à
maioria das pessoas. O problema estava na utilidade de transação percebida, já que o
preço não parecia razoável em comparação com estações de esqui maiores e que não
cobravam muito mais.
l
2. Prelec e Loewenstein (1998).
3. É claro que nem todo mundo cai em uma armadilha dessas. Antes de Michael começar
a nos dar bilhetes gratuitos para o teleférico, eu havia comprado um programa de
esquiar pós-escola para a minha filha Maggie, que estava no sexto ano. Uma semana
Maggie anunciou que iria faltar ao esqui para ir a um baile na escola. Na semana
seguinte, também disse que faltaria porque uma amiga ia dar uma festa de aniversário.
“Ei, Maggie”, eu disse, “você tem certeza disso? Nós pagamos um bocado por esse
programa de esqui!” Maggie simplesmente disse: “A-há! Custos afundados!” Só mesmo
a filha de um economista viria com uma resposta dessas.
4. Infelizmente Michael faleceu enquanto este livro estava sendo finalizado. Ambos
gostávamos de comparar nossas memórias distantes desse episódio enquanto eu
escrevia este trecho. Já sinto sua falta.
5. Outro fator conduzindo ao acúmulo de estoque era que o presidente Nixon havia
imposto controles de preço por volta de 1971–72. No ano seguinte, quando as
restrições foram suspensas, fabricantes aumentaram os preços mais do que os
consumidores estavam acostumados, para compensar as restrições passadas. Isto criou
uma utilidade de transação altamente negativa para os consumidores, de modo que um
número menor deles estava disposto a comprar e os estoques se acumularam.
6. Tecnicamente, o primeiro reembolso foi oferecido pela Ford em 1914, mas, uma vez
desaparecido, nunca mais voltou. Ao menos até a campanha “Car Clearance Carnival”
da Chrysler nos anos 1970, que serviu como resposta ao acúmulo de estoques (Jewett,
1996).
7. A GM relutantemente ofereceu empréstimos depois que a Chrysler e a Ford o fizeram.
“Entende-se que a GM vinha resistindo a seguir a Ford e Chrysler por medo de
deflagrar uma ampla batalha industrial de incentivos. No passado, muitos
consumidores que não compravam carros antes que tais programas vigorassem
simplesmente continham suas compras até a próxima rodada de incentivos.” (Nag,
1985).
8. Buss (1986).

CAPÍTULO 14: O QUE PARECE JUSTO?


1. Filósofos de verdade fazem isso agora. Ver Knobe e Nichols (2013), ou, para uma
introdução mais breve, Knobe et al. (2012).
2. Roth (2007).
3. Daly, Hobijn e Lucking (2012); Kaur (2014).
4. Lohrn (1992).
5. Miller (1995).
6. McKay, Deogun e Lublin (1999).
7. Halliday (2012).
8. “Apple acusada de explorar a morte de Whitney Houston depois de o preço dos álbuns
decolar no iTunes”, Daily Mail, 14 fevereiro 2012.
9. Nielsen SoundScan (2012).
10. Brown (2014).
11. Perguntei a um motorista da Uber na Califórnia como ele se sentiria se o preço
dinâmico fosse aplicado caso houvesse algum incêndio florestal em uma cidade e as
pessoas precisassem sair de lá. Ele disse: “Nessa situação, eu gostaria de oferecer
corridas gratuitas!”
12. Um episódio similar ocorreu em Sydney, na Austrália, durante uma crise de reféns no
centro da cidade. Os preços subiram, provavelmente com base em algum algoritmo
que não tinha sintonia fina com circunstâncias especiais. Após críticas on-line, alguns
Humanos na Uber decidiram oferecer corridas gratuitas e reembolsar pessoas que
tinham pagado. (Sullivan, 2014)
13. Kokonas (2014).
4 l d h
14. Notavelmente, uma organização ainda maior — a NFL — reconhece e respeita esse
mesmo conselho. Em uma entrevista com o economista Alan B. Krueger, o vice-
presidente de relações públicas da NFL, Greg Aiello, explicou que sua organização
adota uma “visão estratégica de longo prazo” em relação aos preços dos ingressos, pelo
menos para o Super Bowl. Mesmo que a demanda alta por ingressos para o Super Bowl
justificasse preços significativamente maiores (e lucros no curto prazo: ele calcula que
o aumento no lucro na mesma escala das rendas de publicidade), a organização
mantém intencionalmente esses preços razoáveis para fomentar sua “contínua relação
com fãs e associados comerciais” (Krueger, 2001).

CAPÍTULO 15: JOGOS DE JUSTIÇA


1. Güth, Schmittberger e Schwarze (1982). Escrevi um artigo analisando esse e outros
artigos que estudam os Jogos de Ultimato (Thaler, 1988b).
2. Kahneman, Knetch e Thaler (1986).
3. O povo Machiguenga, na Amazônia peruana, raramente rejeita qualquer oferta de
dinheiro grátis, e as ofertas que fazem tendem a ser baixas (Henrich, 2000). Ver
também Henrich et al. (2002). Para uma abordagem popular, ver Watters (2013).
4. Hoffman, McCabe e Smith (1996).
5. Cameron (1999). Slonim e Roth (1998) encontraram resultados semelhantes na
Eslováquia, embora Andersen et al. (2011) encontrem índices de rejeição mais baixos
com uma arquitetura experimental diferente no nordeste da Índia.
6. Sen (1977), p. 336.
7. “Economist Free Ride: Does Anyone Else?”, Marwell e Ames (1981). Ver também
Frank, Gilovich e Regan (1993), que argumentam que o treinamento em economia
leva os estudantes a se comportar em interesse próprio.
8. Andreoni (1988).
9. Fehr e Gächter (2000, 2002); Fischbacher, Gächter e Fehr (2001); Fehr e Fischbacher
(2003); Kocher et al. (2008).
10. Dawes e Thaler (1988).

CAPÍTULO 16: CANECAS


1. Roth (1987).
2. Knetsch e Sinden (1984).
3. Kahneman, Knetsch e Thaler (1991).
4. Samuelson e Zeckhauser (1988).

CAPÍTULO 17: COMEÇA O DEBATE


1. Os procedimentos da conferência foram publicados, primeiro como uma edição da
Journal of Business (Hogarth e Reder, 1986), e depois como um livro, Rational Choice
(Hogarth e Reder, 1987).
2. Arrow (1986), p. S385.
3. Ele observa que até mesmo essa teoria ainda envolve alguma maximização. Na verdade,
desde então estes economistas desenvolveram teorias “racionais” baseadas no hábito.
Ver Becker e Murphy (1988) e Becker (1992).
4. Arrow (1986), p. S391.
5. Ibid., p. S397. Ver também Simon (1957), caps. 14-15, e Conlisk (1996).
6. “The Conference Handbook”, Stigler (1977), p. 441.
7. Ibid., p. 442.
8. Thaler (1986), p.S283.
9. Modigliani e Miller (1958). Ver também Miller (1988).
10. Shefrin e Statman (1984).
k l 4 f d d f d d d
11. Baker e Wurgler (2004) fornecem evidência de que firmas atendem ao desejo de
investidores por dividendos oferecendo-lhes mais em ocasiões em que o mercado põe
um prêmio em empresas que pagam dividendos.
12. Durante muito tempo fundações e dotações operavam da mesma maneira, que era
não mexer no principal e gastar o “rendimento”, com a tendência de forçá-las a manter
títulos e ações que pagassem grandes dividendos. Gradualmente essa prática foi sendo
reconhecida como tola, e essas organizações adotaram uma regra mais sensata, tal
como gastar determinada porcentagem (digamos 5%) de uma média móvel de três anos
do valor da dotação, permitindo-lhes escolher investimentos com base em seu
potencial de longo prazo, em vez de remunerações em dinheiro. Essa mudança de
política permitiu a dotações investirem em novas classes de ativos, tais como fundos de
capital, que frequentemente não pagam qualquer dividendo por muitos anos.
13. Lintner (1956)
14. Miller (1986), p. S467.
15. Ibid., p. S466.
16. Ibid., p. S467.
17. Shiller (1986), p. S501.

CAPÍTULO 18: ANOMALIAS


1. The Structure of Scientific Revolutions, Kuhn (1962).
2. Um dos prazeres de escrever as colunas sobre anomalias era que os próprios editores
faziam o papel de pareceristas, e todo artigo também passava por uma verdadeira
“edição” para torná-lo inteligível para não especialistas. Tim Taylor, um economista
que escreve muito bem, executou habilmente essa tarefa desde o início e ainda está
envolvido com ela. Na maioria das publicações acadêmicas, os editores se asseguram
de que a economia esteja correta enquanto um revisor fica a cargo da correção
gramatical e do estilo, mas ninguém faz sugestões de como tornar o artigo mais legível.
Desde cedo, Tim conferiu importância ao poder de dar opções. Ele reescrevia cada
artigo, enviava sua nova versão aos autores e lhes dizia que tinham liberdade para
recusar qualquer uma de suas sugestões. Aliás, o Journal of Economic Perspectives on-
line é acessível gratuitamente a qualquer pessoa em www.aeaweb.org/jep, inclusive
edições passadas. É um ótimo lugar para se aprender economia.
3. Thaler (1987a, 1987b).
4. Rozeff e Kinney (1976).
5. Thaler (1992).

CAPÍTULO 19: FORMANDO UMA EQUIPE


1. O catalisador foi indiscutivelmente von Neumann e Morgenstern (1947), cuja primeira
edição foi publicada em 1944.
2. Camerer (2003).
3. Há algumas exceções para essa generalização, tais como a neurociência, na qual
cientistas de muitos campos diferentes têm trabalhado juntos produtivamente; mas
nesse caso eles se unem em torno de ferramentas específicas como escaneamento
cerebral. Não quero dizer que todos os encontros interdisciplinares sejam perda de
tempo. Só estou dizendo que, na minha experiência, eles têm sido decepcionantes.
4. Para ser claro, o campo de julgamento e tomada de decisão cujo pontapé inicial foi
dado por Kahneman e Tversky nos anos 1970 continua a prosperar. Seu encontro
anual, patrocinado pela Society for Judgement and Decision Making (SJDM), atrai
mais de 500 estudiosos cujo trabalho frequentemente se cruza com a economia
comportamental. Há também numerosos estudiosos comportamentais notáveis em
marketing, incluindo meu velho amigo Eric Johnson, vários dos meus ex-alunos e
muitos outros que fazem pesquisa sobre tópicos como contabilidade mental e
l d
autocontrole. Meu ponto é que um encontro típico de economistas comportamentais
não inclui psicólogos, e eu sou um dos poucos economistas que participa regularmente
dos encontros da SJDM.
5. Schachter et al. (1985a, 1985b), Hood et al. (1985).
6. Uma exceção é o livro Escassez [Scarcity, no original], de Sendhil Mullainathan e
Eldar Shafir (2013), uma das raras colaborações entre um economista e um psicólogo.
7. Fehr, Kirchsteiger e Riedl (1993).
8. Akerlof (1982).
9. Rabin (1993).

CAPÍTULO 20: ENQUADRAMENTO ESTREITO NO UPPER EAST SIDE


1. Kahneman e Lovallo (1993).
2. Kahneman (2011), cap. 22.
3. Mullainathan (2013), Baicker, Mullainathan e Schwartzstein (2013).
4. Um experimento recente mostra que intervenções comportamentais podem funcionar
nesse domínio, embora a tecnologia necessária não existisse naquela época. O simples
ato de mandar mensagens de texto aos pacientes para lembrá-los de tomar a medicação
prescrita (neste estudo, para baixar a pressão sanguínea ou níveis de colesterol) reduziu
de 25% para 9% o número de pacientes que esqueciam ou deixavam de tomar seu
remédio (Wald et al, 2014).
5. Mehra e Prescott (1985).
6. Eles puderam fazer isso porque, por razões técnicas, a teoria padrão faz uma predição
acerca da relação entre o equity premium e a taxa de rentabilidade sem risco. Acontece
que no mundo da economia convencional, quando a taxa de juros real (corrigida pela
inflação) sobre ativos livres de riscos é baixa, o equity premium não pode ser muito
grande. E no período de tempo que eles estudaram, a taxa real de rentabilidade sobre
títulos do Tesouro era de menos de 1%.
7. Pode não parecer uma diferença muito grande, mas é enorme. São necessários 70 anos
para um portfólio dobrar de valor se estiver crescendo a 1% ao ano, e 52 anos se estiver
crescendo a 1,35%, mas apenas 10 anos se estiver crescendo a 7%.
8. Rajnish Mehra me contou isso.
9. Mehra (2007).
10. É crucial para o argumento de Samuelson que ele esteja usando a formulação
tradicional de utilidade de riqueza esperada. Um desvio de contabilidade mental tal
como o efeito dinheiro da casa não é permitido nessa configuração porque a riqueza é
fungível.
11. Samuelson (1979), p. 306.
12. “Risk and Uncertainty: A Fallacy of Large Numbers”, Samuelson (1963).
13. Benartzi e Thaler (1995).
14. Barberis, Huang e Santos (2001) formalizam esta intuição num modelo dinâmico.
15. Benartzi e Thaler (1997).
16. Thaler et al. (1997).
17. Shaton (2014).
18. Benartzi e Thaler (1995).
19. É claro que isso não quer dizer que as ações sempre sobem. Vimos recentemente que
ações podem cair 50%. É por isso que considero que faz sentido a política de reduzir a
porcentagem do seu portfólio de ações à medida que você fica mais velho. Os fundos
de prazo fixo usados como estratégias de investimento padrão na maioria dos planos de
aposentadoria agora seguem essa estratégia.
20. A troca de turno das 17h é particularmente enlouquecedora porque ocorre justo
quando muita gente está saindo do trabalho. E como muitas das frotas são localizadas
no Queens, longe do centro de Manhattan, os taxistas muitas vezes começam a voltar
para a garagem às 16h, ligando o luminoso de “fora de serviço”. Um recente estudo
d b l d 6h h
descobriu que isso resulta em 20% a menos de táxis na rua entre 16h e 17h, em
comparação a uma hora antes. Ver Grynbaum (2011) para a história completa.
21. Camerer et al. (1997)
22. Esse resultado tem sido discutido na literatura, com achados contraditórios por Farber
(2005, 2008, 2014) e Andersen et al. (2014), e resultados confirmativos de Fehr e
Goette (2007), Crawford e Meng (2011), Dupas e Robinson (2014) e, com os melhores
dados até agora (sobre os taxistas de Singapura), Agarwal et al. (2014).
23. Lembre-se da discussão que tivemos mais cedo sobre a Uber e a tarifa dinâmica. Se
alguns de seus motoristas se comportassem dessa maneira, isto limitaria a efetividade da
tarifa em aumentar a oferta de motoristas. A pergunta-chave, que é impossível de
responder sem acesso aos dados deles, é se muitos motoristas monitoram a tarifa
dinâmica quando não estão dirigindo e saltam para dentro do carro quando os preços
sobem. Se um número suficiente de motoristas responder dessa maneira, isto anularia
qualquer tendência dos motoristas de largar cedo depois de atingir a meta numa
corrida com aumento de 10%. É claro que a tarifa dinâmica pode ajudar a desviar
carros para lugares onde a demanda é mais alta, pressupondo que a alta dure tempo
suficiente para os carros chegarem lá.

CAPÍTULO 21: O CONCURSO DE BELEZA


1. Jensen (1978), p. 95.
2. Ao ser perguntado do que ele mais se orgulhava, da sua designação para o Hall da Fama
ou seu Prêmio Nobel, Gene disse que era a primeira, ressaltando que tinha menos
laureados.
3. Um dos meus muitos tutores em finanças ao longo dos anos foi Nicholas Barberis, que,
por algum tempo, foi meu colega na Universidade de Chicago e agora leciona em
Yale. Minha análise aqui se baseia na nossa pesquisa de finanças comportamentais
(Barberis e Thaler, 2003).
4. Economistas comportamentais têm conduzido numerosos experimentos nos quais
bolhas são previsivelmente criadas em laboratório (Smith, Suchanek e Williams, 1968;
Camerer, 1989; Barner, Feri e Plott, 2005), mas os economistas financeiros dão pouco
crédito a tais demonstrações, em parte porque não oferecem a oportunidade de
profissionais poderem intervir e corrigir preços errados.
5. Publicado como Jensen (1969).
6. O prêmio de 2013 foi para Gene Fama e Bob Shiller, sobre cujos debates você pode ler
neste capítulo e no Capítulo 17, junto com meu colega economista de Chicago Lars
Hansen, cujos pontos de vista se encontram em algum ponto no amplo espaço
intermediário, ou talvez à margem, de Fama e Shiller.
7. Keynes (1936), cap. 12.
8. Ibid., cap. 12, p. 153.
9. Ibid., p. 154.
10. Seja ou não proibido esse padrão nos preços, um artigo recente encontra respaldo para
a história de Keynes sobre o preço das companhias de gelo. Empresas com negócios
sazonais têm preços mais altos quando seus ganhos estão mais altos. (Chang et al,
2004).
11. Ibid., p. 158.
12. Ibid.
13. Nasar (1998).
14. Camerer (1997).
15. Nagel (1995).
16. Pesquisadores exploraram várias alternativas ao equilíbrio de Nash. Ver, por exemplo,
Geanakoplos, Pearce e Stachetti (1989); McKelvey e Palfrey (1995); Camerer, Ho e
Chong (2004); Eyster e Rabin (2005); Hoffmann et al. (2012); Tirole (2014).

lb d h
17. Este é outro caso em que a teoria econômica normativa — aqui o equilíbrio de Nash
valendo zero — faz um serviço terrível como teoria descritiva, e é igualmente ruim
como fonte de conselho sobre qual número chutar. Existe agora uma literatura
crescente com tentativas de prover melhores modelos descritivos.
18. Outra razão para os concorrentes terem chutado 1 foi que haviam notado um
pequeno lapso de redação nas regras do concurso, que pedia às pessoas para adivinhar
um número entre 0 e 100. Acharam que a “pegadinha” estava na palavra “entre”, ou
seja, que os palpites 0 e 100 estavam excluídos. Isto teve pouca influência nos
resultados, mas aprendi pela experiência e troquei a palavra “entre” para “de”, como fiz
ao apresentar o problema neste livro.
19. Outras nem tão inteligentes assim. Pelo menos três pessoas que chutaram 33 relataram
ter usado a função geradora de números aleatórios do Excel para determinar que, se as
pessoas escolhem ao acaso de 0 a 100, a média será 50! Talvez eu tenha expectativas
muito altas para a sofisticação matemática dos leitores do Financial Times, mas eu
acreditava que eles descobririam que a média de números escolhidos ao acaso de 0 a
100 é 50 sem usar o Excel. Isto confirmava a minha antiga suspeita de que muita gente
usa planilhas como alternativas ao raciocínio.
20. Keynes (1923), cap. 2, p. 80.

CAPÍTULO 22: A REAÇÃO DO MERCADO DE AÇÕES É EXAGERADA?


1. Essa ideia foi formalizada por Milgrom e Stokey (1982).
2. Com base em dados da Bolsa de Valores de Nova York (2014).
3. Na realidade havia uma terceira condição, que estou deixando de fora por
simplicidade, na qual os sujeitos eram informados do decil de pontuação em um teste
de concentração mental. Os resultados dessa condição encontram-se entre as outras
duas.
4. Kahneman e Tversky (1973).
5. Graham e Dodd ([1934] 2008), Graham ([1949] 1973).
6. Graham ([1949] 1973), cap. 7, p. 164.
7. Graham e Dodd ([1934] 2008), p. 270.
8. Basu (1977), p. 680.
9. Banz (1981), p. 17.
10. Dreman (1982).
11. De Bondt e Thaler (1985).

CAPÍTULO 23: A REAÇÃO À SOBRERREAÇÃO


1. Fama (1970).
2. Uma nota sobre confusão de terminologia: neste capítulo e no próximo, quando uso o
termo “precificação inadequada” (mispricing), quero dizer que o preço de uma ação
vai variar previsivelmente em uma direção, para cima ou para baixo, e nessa medida o
investidor poderia hipoteticamente tirar vantagem disso para um “almoço grátis”. Esta
é a primeira ilustração das formas sutis pelas quais os dois componentes da HME estão
entrelaçados. É razoável pensar que ações precificadas “baixo demais” acabarão
eventualmente vencendo o mercado, mas De Bondt e eu não tivemos evidência
conclusiva de que os preços dos Perdedores divergissem do seu valor intrínseco, apenas
que obtinham rendimentos mais altos.
3. Sharpe (1964) e Lintner (1965a, 1965b). Para abordagem mais profunda, ver Cochrane
(2005). A razão para estes métodos não usarem a discrepância de preço como medida
do risco das ações é que, em um portfólio amplo de ações, esses movimentos em média
seriam flutuantes. Em vez disso, a ideia é medir o risco com base em quão sensível o
preço da ação é em relação aos movimentos de mercado (por exemplo, um índice

5 d d h dd d d
como o S&P 500), de modo que se tenha uma medida de quanto mais arriscada (ou
menos arriscada) se torna o seu portfólio devido a essa ação específica.
4. Apenas para evitar confusão, devo mencionar que este “beta” não tem nada a ver com o
beta nos modelos beta-delta de viés do presente no Capítulo 12. Tudo que posso dizer
é que os economistas gostam de letras gregas e beta é uma das primeiras do alfabeto.
5. Banz (1981).
6. “The CAPM Is Wanted, Dead or Alive”, Fama e French (1996).
7. Fama e French (1993).
8. “Contrarian Investment, Extrapolation and Risk”, Lakonishok, Shleifer e Vishny
(1994).
9. Ver palestra do Nobel de Fama, publicado como Fama (2014).
10. Fama e French (2014). Um modelo relacionado é Asness, Frazzini e Pedersen (2014).

CAPÍTULO 24: O PREÇO NÃO ESTÁ CERTO


1. Shiller (1981).
2. Se a fundação algum dia vender as ações, então também incluiríamos o preço que
obterão ao vendê-las, descontado de volta para o presente. Se retiverem as ações tempo
suficiente, isso terá um efeito desprezível sobre a análise.
3. Kleidon (1986).
4. Cutler, Poterba e Summers (1989).
5. “Stock Prices and Social Dynamics”, Shiller (1984).
6. Akerlof e Shiller (2009).
7. Shiller (2000).
8. Para deixar registrado, eu também achava que as ações de tecnologia estavam
supervalorizadas no final dos anos 1990. Em um artigo escrito e publicado em 1999, eu
previ que o que estávamos vivenciando correntemente viria a se tornar conhecido
como a Grande Bolha das Ações da Internet (Thaler, 1999b). Mas, como Shiller, eu
teria escrito a mesma coisa dois anos antes se tivesse me disposto a isso (lembre-se, eu
era e continuo sendo um preguiçoso). Tendo feito uma predição correta acerca do
mercado de ações, estou determinado a não fazer outra.
9. Pode-se encontrar uma lista de todos os programas desses workshops no website de Bob:
http://www.econ.yale.edu/~shiller/behfin/

CAPÍTULO 25: A BATALHA DOS FUNDOS MÚTUOS FECHADOS


1. Citado em Fox (2009), p. 199. A única cópia desse artigo que consegui encontrar é
uma que Fisher Black mandou por fax para Summers com seus comentários escritos à
mão. Perto da frase de abertura sobre “IDIOTAS”, Black escreve: “Eu os chamo de
‘noise traders’. Eles negociam com base em ruído, como se fosse informação.”
2. De Long et al. (1990).
3. Graham ([1949] 1973), p. 242.
4. Para deixar claro, pode ser muito inteligente investir em fundos fechados quando eles
são vendidos com desconto, mas é tolice comprar quando eles são lançados e ainda há
uma comissão a ser cobrada.
5. Lee, Shleifer e Thaler (1991).
6. Thompson (1978).
7. Malkiel (1973).
8. Chen, Kan e Miller (1993).
9. Os cinco artigos são: Lee, Shleifer e Thaler (1991), Chen, Kan e Miller (1993a),
Chopra et al. (1993a), Chen, Kan e Miller (1993b) e Chopra et al. (1993b).

CAPÍTULO 26: MOSCAS-DAS-FRUTAS, ICEBERGS E PREÇOS DE AÇÕES NEGATIVOS


l l
1. Era possível encontrar algumas cotas para empréstimo se você tivesse tempo. Na
verdade, naquela ocasião, houve um aluno de ph.D. em finanças na Universidade de
Chicago que estava determinado a ganhar dinheiro com a 3Com/Palm. Ele abriu
contas em todas as corretoras de descontos e gastou todo seu tempo tentando tomar
emprestadas cotas da Palm para ficar vendido. Sempre que conseguia cotas da Palm, já
ficava vendido e usava o dinheiro para comprar a quantidade de cotas da 3Com
requeridas para proteger (hedgear) sua aposta. Quando o acordo foi finalizado, alguns
meses depois, ele fez um belo lucro e comprou um carro esporte que apelidou de
Palmóvel. A moral da história é que foi possível fazer dezenas de milhares de dólares a
partir dessa anomalia, mas não dezenas de milhões.
2. Uma situação semelhante ocorreu em meados de 2014 quando a participação da Yahoo
na Alibaba foi calculada como sendo mais valiosa do que a Yahoo inteira (Jackson,
2014; Carlson, 2014).
3. Quando descrevi esta anomalia para o CEO de um grande fundo de pensão em algum
momento dos anos 1990, ele disse que eu devia estar enganado, porque seguramente o
dinheiro inteligente simplesmente compraria as ações que estivessem mais baratas. Eu
disse “É mesmo? Acredito que o seu fundo possui milhões de dólares da versão mais
cara” e apostei que eu estava certo, com um belo jantar como prêmio. Sabiamente, ele
não apostou. Seu fundo estava parcialmente indexado no S&P 500, que na época
incluía a versão Dutch que estava sendo vendida com ágio.
4. Loewenstein (2000).
5. Shleifer e Vishny (1997).
6. “Can Market Add and Subtract?”, Lamont e Thaler (2003).
7. Abrindo totalmente o jogo: desde 1998 sou sócio em uma gestora de investimento
chamada Fuller and Thaler Asset Management, que investe em ações dos Estados
Unidos encontrando situações em que os vieses comportamentais dos investidores têm
probabilidade de gerar preços inadequados. O fato de ainda estarmos no negócio
sugere que ou tivemos êxito em usar finanças comportamentais para superar o mercado
ou tivemos muita sorte, ou ambas as coisas.
8. Black (1986), p. 553.
9. Ver Mian e Sufi (2014).

CAPÍTULO 27: INSTRUÇÃO EM DIREITO


1. France agora trocou marketing por fotografia. Na minha opinião altamente
tendenciosa, vale a pena dar uma olhada nas suas imagens. Veja você mesmo em
franceleclerc.com.
2. “A Behavioral Approach to Law and Economics”, Jolls, Sunstein e Thaler (1998).
3. Solow (2009).
4. Mais tarde chamaríamos isto de nudge.
5. Outra condição do teorema de Coase, junto com a ausência de custos de transação, é
que os valores sejam “pequenos” em relação à riqueza das partes em disputa. Vou
ignorar isto para os propósitos dessa discussão.
6. “The Problem of Social Cost”, Coase (1960).
7. Ibid., p. 15.
8. More Guns, Less Crime, Lott (1998).
9. Os últimos achados de John Donoghue, professor de direito de Stanford, e de seus
colegas sugerem que, acima de tudo, a aprovação das chamadas leis de “direito ao
porte” aumenta a taxa de criminalidade (Aneja, Donoghue III e Zhang, 2014).
10. O experimento gera dinheiro porque os alunos haviam fornecido os recursos e muitas
ofertas foram rejeitadas, isto é, nenhum dos dois jogadores ganhou nada. Sempre
inventávamos um jeito de devolver o dinheiro aos alunos, geralmente fazendo o jogo
do concurso de beleza discutido antes e dando as sobras ao vencedor.
11. Farnsworth (1999).
h 4
12. Zamir e Teichman (2014).
13. Korobkin (2011).

CAPÍTULO 28: AS SALAS DE TRABALHO


1. John também era um grande fã de basquete que ganharia regularmente no fantasy
basketball league da NBA. Poucos anos após esse episódio, ele tornou-se empresário de
Yao Ming, a estrela do basquete de 2,30 metros.
2. Cheguei a mostrar para John um rascunho deste capítulo, pedindo-lhe comentários.
Ele não confirmou nem negou os detalhes da minha reconstituição dos
acontecimentos, mas reconheceu que eu tinha descrito corretamente os fatos básicos.
3. Quando pessoas neste capítulo são identificadas pelo primeiro nome apenas, são
personagens reais mas com nomes fictícios.
4. Hsee et al. (2009).

CAPÍTULO 29: FUTEBOL AMERICANO


1. Infelizmente, Gary Becker morreu em 2014 enquanto este livro estava sendo escrito.
Ele foi um dos economistas mais criativos que já conheci. Sinto muito que não esteja
por aqui para me dizer o que pensa do meu livro. Tenho certeza de que eu teria
aprendido algo com seus comentários, mesmo que discordasse. O chavão “ele é um
cavalheiro e um erudito” era uma descrição perfeita de Gary.
2. Stewart (1997).
3. Massey e Thaler (2013).
4. Para uma análise, ver minha coluna “Anomalias” sobre o assunto (Thaler, 1988a).
5. Ross, Greene e House (1977).
6. Camerer e Weber (1999).
7. Essas estatísticas usam a métrica simples de “jogos iniciados” para determinar quem é
melhor. Usamos essa métrica simples porque pode ser medida para jogadores em
qualquer posição. Entretanto, estes resultados e outros que mencionarei são
semelhantes mesmo se usarmos medidas de performance mais refinadas, tais como
jardas conquistadas para um wide receiver ou running back.
8. Um time realmente esperto trocará uma escolha de segunda rodada no ano vigente por
uma escolha de primeira rodada no ano seguinte, e então trocará a escolha de primeira
rodada por múltiplas escolhas de segunda rodada no próximo ano, possivelmente
convertendo uma delas em uma escolha de primeira rodada no ano subsequente, e
assim por diante.
9. Postscript: O Redskins teve um jogo de fim de temporada em 2014 contra o St. Louis
Rams, o time que recebeu todas aquelas posições de escolha que o Washington havia
trocado para adquirir o jogador dos seus sonhos. No começo do jogo, o treinador do
Rams mandou todos os jogadores que havia escolhido com aquelas posições recebidas
para servirem como capitães do time para o cara ou coroa do chute inicial. O Rams
venceu o jogo por 24–0 e RG3 estava sentado no banco devido ao seu jogo ruim.
Vamos ver se o sr. Snyder aprende a ser paciente.
10. Romer (2006).
11. Para exemplo do trabalho de Brian Burke, ver
http://www.advancedfootballanalytics.com/.
12. A recomendação do robô pode ser encontrada em
https://www.nytimes.com/interactive/projects/4thdownbot/index.html/. Para uma
comparação entre o desempenho de treinadores e do 4th Down Bot do NYT, ver Burke
e Quealy (2014).
13. Silver (2012).
14. Nota exclusiva para fãs da NFL: penso que a estimativa de Silver pode ser
conservadora. Ela negligencia o fato de que, se você sabe de antemão que optará pelo
f d d d d d lh d
going for it na quarta descida, isso muda as jogadas que podem ser escolhidas na
terceira descida. Se um time tem uma terceira descida e cinco jardas para completar,
quase sempre tentam um passe, mas se souberem que na quarta precisarão de um
going for it e duas jardas para completar, podem tentar uma corrida com mais
frequência na terceira, o que obviamente também melhora suas chances quando enfim
decidirem passar, já que serão menos previsíveis.
15. Peter e Hull (1969).

CAPÍTULO 30: GAME SHOWS


1. Post et al. (2008). Concordei, mas com algumas advertências. Disse que a colaboração
poderia ser insensata por conta de pelos menos dois aspectos. Primeiro, sou
notoriamente lento (não mencionei a parte da preguiça). Segundo, preocupava-me
com o “efeito Matthew”, um termo cunhado pelo sociólogo Robert K. Merton, que diz
que o crédito excessivo por qualquer ideia será atribuído à pessoa de maior
reconhecimento associada a ela. Stephen Stigler, um estatístico da Universidade de
Chicago, chamou de Lei de Stigler (ironia intencional) sua versão alternativa desse
efeito: “Nenhuma descoberta científica recebe o nome do seu descobridor original.” A
piada, é claro, é que Lei de Stigler era simplesmente um novo enunciado para a
proposição de Merton. Thierry e o grupo decidiram que colaboraríamos, com a
condição de que, se eu considerasse que não estava acrescentando nada, eu me
retiraria.
2. A teoria da perspectiva ganhou de longe.
3. Thaler e Johnson (1990).
4. Baltussen, Van den Assem e Van Dolder (2015).
5. Isso se alinha com achados de que os investidores assumem mais riscos on-line do que
na frente de outros. Barber e Odean (2002) descobriram que investidores negociam
mais e de forma mais especulativa depois da troca de negócios via telefone para
negócios on-line.
6. Rabin (1993); Tesler (1995); Levitt e List (2007).
7. Ver Sally (1995) para um metaestudo de artigos publicados ao longo de 35 anos.
Holfstadter (1983) e Rapoport (1988) são alguns exemplos representativos.
8. Van den Assem, Van Dolder e Thaler (2012).
9. Na literatura da teoria dos jogos este é chamado um Dilema do Prisioneiro “fraco”
(Rapoport, 1998).
10. WNYC (2014).

SEÇÃO VIII: PRESTANDO AJUDA


1. Ver, por exemplo, Ellison e Fudenberg (1993), Ellison (1997), Fudenberg e Levine
(2006), e Bénabou e Tirole (2003).

CAPÍTULO 31: SAVE MORE TOMORROW


1. Friedman (1957); Modigliani e Brumberg (1954).
2. A teoria econômica prediz, sim, que o pecúlio total que as pessoas acumulam cresce se
a poupança for isenta de impostos; ela só não diz se as contribuições da poupança vão
crescer ou diminuir, e, como sociedade, ambos importam. Eis aqui uma analogia:
suponha que você troque o seu carro velho por outro novo que tenha o dobro de
eficiência em termos de combustível. Se você for um Econ, andará mais quilômetros
de carro, já que o custo das viagens de carro diminuiu, mas é improvável que você
compre mais combustível.
3. Bernheim (2002).

4 b 6
4. Poterba, Venti e Wise (1996) argumentavam que IRAs aumentavam, sim, as poupanças.
Mostraram que aqueles que começavam tais planos tinham a tendência de continuar
contribuindo cada ano, e seus saldos cresciam regularmente, sem aparente prejuízo de
outras formas de poupança. Engen, Gale e Scholz (1996) focalizaram uma questão
diferente: se um aumento na contribuição máxima aumentava a poupança.
Concluíram que não. Penso que ambos estavam certos. Os IRAs aumentavam a
poupança, sim, porque induziam algumas pessoas que não estavam fazendo poupança
para a aposentadoria a reservar alguma coisa todo ano. Mas um aumento na
contribuição máxima só afetaria o abastado, que já estava poupando mais que o
máximo, e simplesmente passaria o dinheiro de contas tributáveis para não tributáveis.
Minha leitura do artigo de Chetty et al. (2014) discutida no final do capítulo apoia esta
visão.
5. Thaler (1994).
6. Landsberger (1966); Epley, Mak e Idson (2006); Shapiro e Slemrod (2003).
7. Engstrm, Nordblom, Ohlsson e Persson (2015).
8. Choi et al. (2003); Choi, Laibson e Madrian (2004).
9. Brigitte não se manteve cética por muito tempo. Ela logo se associou a David Laibson e
um grupo rotativo de coautores para replicar e ampliar seus achados originais. Ela e
David são agora proeminentes especialistas no campo de projetos para planos de
poupança para aposentadoria.
10. “The Power of Suggestion”, Madrian e Shea (2001).
11. Iwry e sua equipe se fixaram em 3% simplesmente porque um nível baixo teria menor
probabilidade de gerar oposição e no mínimo estabeleceria o princípio orientador. Já
em 2000, sua equipe tentou recalibrar para um nível mais alto por meio de várias
outras regulamentações, mas a âncora inicial se firmou.
12. Internal Revenue Service (1998).
13. Hess e Xu (2011).
14. Benartzi e Thaler (2013).
15. U. K. Deparment of Work and Pensions (2014).
16. Summers (2013) provê uma descrição breve e amigável dos planos de aposentadoria
australianos. John e Levine (2009) descrevem o modelo neozelandês, entre outros.
17. Chetty et al. (2014).
18. Benartzi e Thaler (2004).

CAPÍTULO 32: INDO A PÚBLICO


1. “Asymmetric Paternalism”, Camerer et al. (2003).
2. Ibid., p. 1.212.
3. O’Donoghue e Rabin (1999, 2003).
4. Thaler e Sunstein (2003).
5. “Libertarian Paternalism Is Not an Oxymoron”, Sunstein e Thaler (2003).
6. Ainda que achássemos o termo perfeitamente lógico, nem todo mundo concordou. Um
professor de direito escreveu um comentário sobre o nosso artigo intitulado
“Libertarian Paternalism Is an Oxymoron” [“Paternalismo libertário é um oximoro”]
(Mitchell, 2005). Eu quis postar uma resposta on-line que não teria texto; consistiria
apenas de um título de três palavras: “No, It’s Not” [“Não, não é”]. Cass me convenceu
de que isto não ajudaria muito.
7. Thaler e Sunstein (2008).
8. The Design of Everyday Things, Norman (1988).
9. Tierney (2005).
10. Johnson e Goldstein (2004).
11. A maioria dos estados combina sensatamente esta política com uma lei de
“consentimento na primeira pessoa”, que estipula que, se o doador morrer, seus desejos

d d d f l l b d f lh
devem ser respeitados, poupando aos familiares qualquer obrigação de fazer escolhas
difíceis em momentos traumáticos.
12. Donate Life America (2014).
13. Foi chamada pela primeira vez “escolha obrigatória” em um relatório sobre doação de
órgãos do Instituto de Medicina (Childress et al., 2006).
14. Thaler (2009).
15. Ele poderia ter compartilhado esse sábio detalhe com o presidente Obama, cuja lei de
saúde pública tem uma característica muito impopular que é chamada de “mandato”.
Como a lei proíbe que companhias de seguros discriminem pessoas com condições
preexistentes, era necessária alguma cláusula para impedir que as pessoas esperassem
até ficar doentes ou ter um acidente para contratar o seguro, e a cobertura obrigatória
foi escolhida como solução para o problema. Mas havia outras maneiras de alcançar o
mesmo objetivo. Por exemplo, eu seria a favor de uma combinação de cadastramento
automático (com opção de exclusão) mais uma cláusula de que qualquer um que opte
por sair do seguro não pode comprar uma apólice por um período de tempo específico,
como três anos, por exemplo.

CAPÍTULO 33: NUDGE NO REINO UNIDO


1. Richard mudou-se para os Estados Unidos e tem hoje um cargo na Brookings
Institution em Washington, D.C.
2. Cialdini (2006).
3. A firma de consultoria de Cialdini chama-se Influence at Work.
4. Pode-se pensar nessa estratégia como um apelo às pessoas que são “cooperadores
condicionais”, como discutido no Capítulo 15.
5. Hallsworth et al. (2014).
6. É claro que existe alguma ambiguidade em relação ao que se entende pela palavra
“transparente”. Se as saladas são dispostas em um local proeminente na lanchonete
(como acontece na Booth School of Business, posso orgulhosamente informar), não
creio que seja necessário afixar uma placa dizendo que o objetivo dessa localização
específica é induzi-lo a escolher saladas em vez de hambúrgueres. O mesmo vale para
a linguagem na carta. Não é necessário destacar a frase-chave e dizer que a inserimos
para aumentar a chance de que você nos mande um cheque o quanto antes. Afinal, é
isto que a carta inteira está tentando conseguir. Então, pela minha definição,
transparência significa que não há nada escondido e que eventualmente os resultados
de todos os estudos acabarão sendo liberados para o público geral. (Este tópico é
explorado extensamente em um recente artigo de Cass Sunstein [2014], intitulado
“The Ethics of Nudging”.)
7. Você poderia perguntar: qual é a mágica dos 23 dias? Acontece que, no sistema
administrativo, se uma conta não é paga até esse prazo, outra carta é enviada, porque os
computadores de HMRC são programados para monitorar o pagamento nessa data.
Realizar experimentos no governo exige uma boa dose de aceitação das limitações do
que já está sendo mensurado.
8. Ver Lewin (1947).
9. Por exemplo, pelo meu conhecimento nunca houve um teste de controle randomizado
do Save More Tomorrow. O motivo é que nunca conseguimos fazer uma empresa
concordar em oferecer o plano a alguns funcionários escolhidos ao acaso e não oferecê-
lo a outros. O mais perto que chegamos foi quando pudemos fazer com que uma
empresa realizasse testes diferentes em duas de suas fábricas, com as outras 26 fábricas
servindo como controle. Esses testes não foram perfeitos, mas ainda assim aprendemos
coisas, por exemplo, sobre o valor de sessões educacionais, mas a interpretação tinha
que ser cuidadosa, já que os próprios funcionários escolheram assistir ou não às sessões
educacionais. Quando se trata de realizar experimentos tanto no governo como na
iniciativa privada, ninguém pode se dar ao luxo de ser purista.
d h l d b l
10. Esse desenho não contempla uma distribuição puramente aleatória porque com
apenas três bairros é razoável admitir a possibilidade de haver diferenças sutis entre eles
que pudessem confundir os resultados.
11. Behavioural Insights Team (2013), p. 3.
12. Para aqueles que ficaram curiosos, foi o senador Evvert Dirksen de Illinois.
13. Raifman et al. (2014).
14. York e Loeb (2014).
15. Lembretes são outro exemplo de como, em muitos casos, os nudges são inerentemente
transparentes. Não há motivo para acrescentar: “Aliás, o propósito desta mensagem de
texto era lembrá-la de tomar sua medicação.” Dããã.
16. Whitehead et al. (2014).

CONCLUSÃO: O QUE VEM A SEGUIR?


1. E também não prejudicava muito o fato de os mercados financeiros oferecerem as
melhores oportunidades de ganhar dinheiro se estiverem com comportamento
desviante. Assim, um bocado de recursos intelectuais foi dirigido para investigar
possíveis estratégias lucrativas de investimentos.
2. Ver Akerlof (2007) para uma perspectiva das questões a serem respondidas.
3. Nós temos nos beneficiado de alguns experimentos “naturais”, tais como a queda do
Muro de Berlim, que nos permitiu comparar economia de mercado versus economia
planejada.
4. Até mesmo o rótulo dado para o corte de impostos pode ser relevante. Epley et al.
(2006) descobriram que as pessoas mostram maior propensão a gastar dinheiro advindo
de um corte de impostos que seja chamado de “bônus” do que de “restituição”.
5. É claro que nem todo mundo deve ser encorajado a se tornar empresário. Muitos
começam com expectativas pouco realistas sobre as chances de sucesso: a vasta maioria
acredita que suas chances de sucesso são muito maiores que a média, e cerca de 1/3
acredita que o sucesso é uma coisa certa. (Cooper, Woo e Dunkelberg, 1988.) Talvez a
Small Business Administration devesse oferecer formação em índices básicos para
donos de negócios principiantes, para ajudar a podar o excesso de confiança.
6. Stewart (2012)
7. Dois livros recentes que descrevem o que aprendemos com muitos desses experimentos
são Banerjee e Duflo (2011) e Karlan e Appel (2011). Mullainathan e Shafir (2013) e
Haushofer e Fehr (2014) argumentam que, por razões comportamentais e psicológicas,
viver na pobreza pode levar a uma tomada de decisão pior, o que dificulta sair da
pobreza. Ver também World Bank (2015).
8. Ver Post et al. (2008) e Van den Assem, Van Dolder e Thaler (2012) sobre game shows,
Pope e Schweitzer (2011) sobre golfe, Barberis e Thaler (2003) e Kliger, Van den
Assem e Zwinkels (2014) para análises de finança comportamental, e Camerer (2000) e
DellaVigna (2009) para levantamentos de aplicações empíricas mais genéricas de
economia comportamental.
9. Fryer (2010).
10. Fryer et al. (2013).
11. Um embargo para esta descoberta é que a devolução do bônus não é popular entre os
professores, razão pela qual quase nunca vemos bônus “negativo” no local de trabalho.
Pegar dinheiro de volta pode ser visto como “injusto”.
12. Kraft e Rogers (2014).
13. Gneezy e List (2013).
14. Ginzel (2014).
15. Gawande (2010), pp. 176-77.
16. Krakauer (1997).
17. Outro exemplo é Alexandre Mas, que (às vezes colaborando com Alan Krueger)
mostrou que, depois de disputas trabalhistas cujo resultado é ruim para os
b lh d ld d d b lh d l 4 b l d
trabalhadores, a qualidade do trabalho declina. Ver Mas (2004) sobre o valor do
equipamento de construção após uma disputa, Mas e Krueger (2004) sobre defeitos em
pneus após uma greve, e Mas (2006) sobre trabalho policial após arbitração. Outro
exemplo de economistas da corrente principal fazendo pesquisa com uma inclinação
de economia comportamental seria Edward Glaeser (2013) sobre especulação
imobiliária.
18. Ver a palestra Ely de Chetty (2015) proferida no encontro da American Economic
Association que organizei em janeiro de 2015. Nesse caso você pode literalmente
assisti-la indo para o site da AEA: https://www.aeaweb.org/webcasts/2015/Ely.php.
BIBLIOGRAFIA

AGARWAL, Sumit; DIAO, Mi; PAN, Jessica; SING, Tien Foo. “Labor Supply Decisions
of Singaporean Cab Drivers”. 2014. Disponível em: http://ssrn.com/abstract=2338476.
AKERLOF, George A. “Labor Contracts as Partial Gift Exchange”. Quarterly Journal of
Economics 97, no 4: 543–69. 1982.
––––––. “The Missing Motivation in Macroeconomics”. American Economic Review 97,
no 1: 3–36. 2007.
––––––; SHILLER, Robert J. O espírito animal: como a psicologia humana impulsiona a
economia e a sua importância para o capitalismo global. Elsevier: Rio de Janeiro, 2009.
––––––; YELLEN, Janet L. “A Near-Rational Model of the Business Cycle, With Wage
and Price Inertia”. Quarterly Journal of Economics 100, suplemento: 823–38. 1985.
ANDERSEN, Steffen; BRANDON, Alec; GNEEZY, Uri; LIST, John A. “Toward an
Understanding of Reference-Dependent Labor Supply: Theory and Evidence from a
Field Experiment”. Artigo de trabalho 20695. National Bureau of Economic Research,
2014.
ANDERSEN, Steffen; ERTAC, Seda; GNEEZY, Uri; HOFFMAN, Moshe; LIST, John
A. “Stakes Matter in Ultimatum Games”. American Economic Review 101, no 7: 3427–
39. 2011.
ANDREONI, James. “Why Free Ride?: Strategies and Learning in Public Goods
Experiments”. Journal of Public Economics 37, no 3: 291–304. 1988.
ARKES, Hal R.; BLUMER, Catherine. “The Psychology of Sunk Cost”. Organizational
Behavior and Human Decision Processes 35, no 1: 124–40. 1985.
ARROW, Kenneth J. “Rationality of Self and Others in an Economic System”. Journal of
Business 59, no 4, parte 2: S385–99. 1986.
ASHRAF, Nava; CAMERER, Colin F.; LOEWENSTEIN, George. “Adam Smith,
Behavioral Economist”. Journal of Economic Perspectives 19, no 3: 131–45. 2005.
ASNESS, Clifford S.; FRAZZINI, Andrea; PEDERSEN, Lasse Heje. “Quality Minus
Junk”. 2014. Disponível em: http://ssrn.com/abstract=2312432.
BAICKER, Katherine; MULLAINATHAN, Sendhil; SCHWARTZSTEIN, Joshua.
“Behavioral Hazard in Health Insurance”. Artigo de trabalho. 2013.
BAKER, Malcolm; WURGLER, Jeffrey. “A Catering Theory of Dividends”. Journal of
Finance 59, no 3: 1125–65. 2004.
BALTUSSEN, Guido; VAN DEN ASSEM, Martijn J.; VAN DOLDER, Dennie. “Risky
Choice in the Limelight”. Review of Economics and Statistics. 2015.
BANERJEE, Abhijit Vinayak; DUFLO, Esther. Poor Economics: A Radical Rethinking of
the Way to Fight Global Poverty. Nova York: PublicAffairs, 2011.
BANICH, Marie T. “Executive Function: The Search for an Integrated Account”.
Current Directions in Psychological Science 18, no 2: 89–94. 2009.
BANZ, Rolf W. “The Relationship between Return and Market Value of Common
Stocks”. Journal of Financial Economics 9, no 1: 3–18. 1981.
h l “ h b k
BARBARO, Michael. “Given Fewer Coupons, Shoppers Snub Macy’s”. New York Times,
29 setembro, 2007. Disponível em:
http://www.nytimes.com/2007/09/29/business/29coupons.html.
BARBER, Brad M.; ODEAN, Terrance. “Online Investors: Do the Slow Die First?”
Review of Financial Studies 15, no 2: 455–88. 2002.
BARBERIS, Nicholas C.; THALER, Richard H. “A Survey of Behavioral Finance”. In
Nicholas Barberis, Richard H. Thaler, George M. Constantinides, M. Harris e Rene
Stulz, eds., Handbook of the Economics of Finance, vol. 1B, 1053–128. Amsterdã:
Elsevier, 2003.
BARBERIS, Nicholas; HUANG, Ming; SANTOS, Tano. “Prospect Theory and Asset
Prices”. Quarterly Journal of Economics 116, no 1: 1–53. 2001.
BARNER, Martin; FERI, Francesco; PLOTT, Charles R. “On the Microstructure of
Price Determination and Information Aggregation with Sequential and Asymmetric
Information Arrival in an Experimental Asset Market”. Annals of Finance 1, no 1: 73–
107. 2005.
BARRO, Robert J. “Are Government Bonds Net Wealth?” Journal of Political Economy
82, no 6: 1095–117. 1974.
BASU, Sanjoy. “Investment Performance of Common Stocks in Relation to Their Price-
Earnings Ratios: A Test of the Efficient Market Hypothesis”. Journal of Finance 32, no
3: 663–82. 1977.
BAUMOL, William J. “On the Theory of Expansion of the Firm”. American Economic
Review 52, no 5: 1078–87. 1962.
BECKER, Gary S. “Investment in Human Capital: A Theoretical Analysis”. Journal of
Political Economy 70, no 5: 9–49. 1962.
––––––. Human Capital: A Theoretical Analysis with Special Reference to Education.
National Bureau for Economic Research e Columbia University Press: Nova York e
Londres, 1964.
––––––. “Habits, Addictions, and Traditions”. Kyklos 45, no 3: 327–45. 1992.
––––––; MURPHY, Kevin M. “A Theory of Rational Addiction”. Journal of Political
Economy 96, no 4: 675–700. 1988.
BEHAVIOURAL INSIGHTS TEAM. “Removing the Hassle Factor Associated with Loft
Insulation: Results of a Behavioural Trial”. UK Department of Energy & Climate
Change, setembro de 2013. Disponível em:
https://www.gov.uk/government/publications/loft-clearance-results-of-a-behavioural-
trial.
BÉNABOU, Roland; TIROLE, Jean. “Intrinsic and Extrinsic Motivation”. Review of
Economic Studies 70, no 3: 489–520. 2003.
BENARTZI, Shlomo; THALER, Richard H. “Myopic Loss Aversion and the Equity
Premium Puzzle”. Quarterly Journal of Economics 110, no 1: 73–92. 1995.
––––––. “Risk Aversion or Myopia? Choices in Repeated Gambles and Retirement
Investments”. Management Science 45, no 3: 364–81. 1999.
––––––. “Behavioral Economics and the Retirement Savings Crisis”. Science 339, no
6124: 1152–3. 2013.
BERNHEIM, B. Douglas. “Taxation and Saving”. In Martin Feldstein e Alan J.
Auerbach, eds., Handbook of Public Economics, vol. 3, 1173–249. Elsevier: Amsterdã,
2002.

l “ f h h f
BERNOULLI, Daniel. (1738). “Exposition of a New Theory on the Measurement of
Risk”. Traduzido do latim para o inglês por Louise Sommer. Econometrica 22, no 1:
23–36. 1954.
BROWN, Gary S. “Letter from State of New York Office of the Attorney General to Josh
Mohrer, General Manager, Uber NYC”. 8 julho de 2014. Disponível em:
http://ag.ny.gov/pdfs/Uber_Letter_Agreement.pdf.
BURKE, Brian; QUEALY, Kevin. “How Coaches and the NYT 4th Down Bot Compare”.
The New York Times, 28 novembro de 2013. Disponível em:
http://www.nytimes.com/newsgraphics/2013/11/28/fourth-downs/post.html.
BUSS, Dale. “Rebate or Loan: Car Buyers Need to Do the Math”. Wall Street Journal, 1o
outubro de 1986.
CAMERER, Colin F. “Bubbles and Fads in Asset Prices”. Journal of Economic Surveys 3,
no 1: 3–41. 1989.
––––––. “Progress in Behavioral Game Theory”. Journal of Economic Perspectives 11, no 4:
167–88. 1997.
––––––. “Prospect Theory in the Wild: Evidence from the Field”. In Daniel Kahneman e
Amos Tversky, eds., Choices, Values, and Frames. Cambridge University Press:
Cambridge, 2000.
––––––. Behavioral Game Theory: Experiments in Strategic Interaction. Princeton
University Press: Princeton, 2003.
––––––; HO, Teck-Hua; CHONG, Juin-Kuan. “A Cognitive Hierarchy Model of Games”.
Quarterly Journal of Economics 119, no 3: 861–98. 2004.
––––––; ISSACHAROFF, Samuel; LOEWENSTEIN, George; O’DONOGHUE, Ted;
RABIN, Matthew. “Regulation for Conservatives: Behavioral Economics and the Case
for ‘Asymmetric Paternalism.’” University of Pennsylvania Law Review 151, no 3: 1211–
54. 2003.
––––––; WEBER, Roberto A. “The Econometrics and Behavioral Economics of
Escalation of Commitment: A Re-examination of Staw and Hoang’s NBA Data”.
Journal of Economic Behavior and Organization 39, no 1: 59–82. 1999.
CAMERON, Lisa Ann. “Raising the Stakes in the Ultimatum Game: Experimental
Evidence from Indonesia”. Economic Inquiry 37, no 1: 47–59. 1999.
CARLSON, Nicolas. “What Happened When Marissa Mayer Tried to Be Steve Jobs”.
The New York Times Magazine, 17 de dezembro de 2014.
CASE, Karl E.; SHILLER, Robert J. “Is There a Bubble in the Housing Market?”.
Brookings Papers on Economic Activity, no 2: 299–362. 2003.
CASE, Karl E.; SHILLER, Robert J.; THOMPSON, Anne. “What Have They been
Thinking? Home Buyer Behavior in Hot and Cold Markets”. Artigo de trabalho 18400.
National Bureau of Economic Research, 2012.
CHANG, Tom Y.; HARTZMARK, Samuel M.; SOLOMON, David H.; SOLTES,
Eugene F. “Being Surprised by the Unsurprising: Earnings Seasonality and Stock
Returns”. Artigo de trabalho. 2014.
CHEN, Nai-Fu; KAN, Raymond; MILLER, Merton H. “Are the Discounts on Closed-
End Funds a Sentiment Index?” Journal of Finance 48, no 2: 795–800. 1993a.
––––––. “Yes, Discounts on Closed-End Funds Are a Sentiment Index: a Rejoinder”.
Journal of Finance 48, no 2: 809–10. 1993b.
CHERNEV, Alexander. “Why Everyday Low Pricing Might Not Fit J.C. Penney”.
Bloomberg Businessweek, 17 maio de 2012. Disponível em:

h b k l 5 h d l h
http://www.businessweek.com/articles/2012-05-17/why-everyday-low-pricing-might-not-
be-right-for-j-dot-c-dot-penney.
CHETTY, Raj. “Behavioral Economics and Public Policy: A Pragmatic Perspective”.
American Economic Review 105, no 5. 2015. Vídeo da palestra disponível em:
https://www.aeaweb.org/webcasts/2015/Ely.php.
––––––; FRIEDMAN, John N.; LETH-PETERSEN, Soren; NIELSEN, Torben Heien;
OLSEN, Tore. “Active vs. Passive Decisions and Crowd-Out in Retirement Savings
Accounts: Evidence from Denmark”. Quarterly Journal of Economics 129, no 3: 1141–
219. 2014.
CHEVALIER, Judith; ELLISON, Glenn. “Risk Taking by Mutual Funds as a Response
to Incentives”. Journal of Political Economy 105, no 6: 1167–200. 1997.
CHILDRESS, James F.; LIVERMAN, Catharyn T.; et al. Organ Donation: Opportunities
for Action. National Academies Press: Washington, DC, 2006.
CHOI, James J.; LAIBSON, David; MADRIAN, Brigitte C. “Plan Design and 401(k)
Savings Outcomes”. National Tax Journal 57, no 2: 275–98. 2004.
––––––; METRICK, Andrew. “Optimal Defaults”. American Economic Review 93, no 2:
180–5. 2003.
––––––. “Reinforcement Learning and Savings Behavior”. Journal of Finance 64, no 6:
2515–34. 2009.
CHOPRA, Navin; LEE, Charles; SHLEIFER, Andrei; THALER, Richard H. “Yes,
Discounts on Closed-End Funds Are a Sentiment Index”. Journal of Finance 48, no 2:
801–8. 1993a.
––––––. “Summing Up”. Journal of Finance 48, no 2: 811–2. 1993b.
CHOUDHRY, Niteesh K.; AVORN, Jerry; GLYNN, Robert J.; ANTMAN, Elliott M.;
SCHNEEWEISS, Sebastian; TOSCANO, Michele; REISMAN, Lonny;
FERNANDES, Joaquim; SPETTELL, Claire; LEE, Joy L.; LEVIN, Raisa;
BRENNAN, Troyen; SHRANK, William H. “Full Coverage for Preventive
Medications after Myocardial Infarction”. New England Journal of Medicine 365, no
22: 2088–97. 2011.
CIALDINI, Robert B. As armas da persuasão. Rio de Janeiro: Sextante, 2012.
CLIFFORD, Stephanie; RAMPELL, Catherine. “Sometimes, We Want Prices to Fool
Us”. New York Times, 13 de abril de 2013. Disponível em:
http://www.nytimes.com/2013/04/14/business/for-penney-a-tough-lesson-in-shopper-
psychology.html
COASE, Ronald H. “The Problem of Social Costs”. Journal of Law and Economics 3: 1–
44. 1960.
COCHRANE, John H. Asset Pricing. Princeton University Press: Princeton, 2005.
COLE, Shawn; FERNANDO, A. Nilesh. “The Value of Advice: Evidence from Mobile
Phone-Based Agricultural Extension”. Artigo de trabalho em finanças 13-047, Harvard
Business School. 2012.
CONLISK, John. “Why Bounded Rationality?” Journal of Economic Literature 34, no 2:
669–700. 1996.
COOPER, Arnold C.; WOO, Carolyn Y.; DUNKELBERG, William C. “Entrepreneurs’
Perceived Chances for Success”. Journal of Business Venturing 3, no 2: 97–108. 1988.
CRAWFORD, Vincent P.; MENG, Juanjuan. “New York City Cab Drivers’ Labor
Supply Revisited: Reference-Dependent Preferences with Rational Expectations
Targets for Hours and Income”. American Economic Review 101, no 5: 1912–32. 2011.
d “ h
CUTLER, David M.; POTERBA, James M.; SUMMERS, Lawrence H. “What Moves
Stock Prices?” Journal of Portfolio Management 15, no 3: 4–12. 1989.
DALY, Mary; HOBIJN, Bart; LUCKING, Brian. “Why Has Wage Growth Stayed
Strong?”. Federal Reserve Board of San Francisco: Economic Letter 10: 1–5. 2012.
DAWES, Robyn M.; THALER, Richard H. “Anomalies: Cooperation”. Journal of
Economic Perspectives 2, no 3: 187–97. 1988.
DE BONDT, Werner F. M.; THALER, Richard H. “Does the Stock Market Overreact?”
Journal of Finance 40, no 3: 793–805. 1985.
DE LONG, J. Bradford; SHLEIFER, Andrei; SUMMERS, Lawrence H.; WALDMANN,
Robert J. “Noise Trader Risk in Financial Markets”. Journal of Political Economy 98, no
4: 703–38. 1990.
DELLAVIGNA, Stefano. “Psychology and Economics: Evidence from the Field”. Journal
of Economic Literature 47, no 2: 315–72. 2009.
––––––; LIST, John A.; MALMENDIER, Ulrike. “Testing for Altruism and Social
Pressure in Charitable Giving”. Quarterly Journal of Economics 127, no 1: 1–56. 2012.
DELLAVIGNA, Stefano; MALMENDIER, Ulrike. “Paying Not to Go to the Gym”.
American Economic Review 96, no 3: 694–719. 2006.
DESILVER, Drew. “Suicides Account for Most Gun Deaths”. Fact Tank, Pew Research
Center, 24 de maio de 2013. Disponível em: http://www.pewresearch.org/fact-
tank/2013/05/24/suicides-account-for-most-gun-deaths/
DONATE LIFE AMERICA. “National Donor Designation Report Card”. 2014.
DONOHUE III, John J.; ANEJA, Abhay; ZHANG, Alexandria. “The Impact of Right to
Carry Laws and the NRC Report: The Latest Lessons for the Empirical Evaluation of
Law and Policy”. Artigo de trabalho 430, Stanford Law and Economics Olin. 2014.
DREMAN, David N. The New Contrarian Investment Strategy. Random House: Nova
York,1982.
DUFLO, Esther; KREMER, Michael; ROBINSON, Jonathan. “Nudging Farmers to Use
Fertilizer: Theory and Experimental Evidence from Kenya”. American Economic
Review 101, no 6: 2350–90. 2011.
DUPAS, Pascaline; ROBINSON, Jonathan. “The Daily Grind: Cash Needs, Labor
Supply and Self-Control”. Artigo de trabalho 511, Stanford Center for International
Development. 2014.
ELLICKSON, Paul B.; MISRA, Sanjog; NAIR, Harikesh S. “Repositioning Dynamics
and Pricing Strategy”. Journal of Marketing Research 49, no 6: 750–72. 2012.
ELLISON, Glenn. “Learning from Personal Experience: One Rational Guy and the
Justification of Myopia”. Games and Economic Behavior 19, no 2: 180–210. 1997.
––––––; FUDENBERG, Drew. “Rules of Thumb for Social Learning”. Journal of
Political Economy 101, no 4: 612–43. 1993.
ENGEN, Eric M.; GALE, William G; SCHOLZ, John Karl. “The Illusory Effects of
Saving Incentives on Saving”. Journal of Economic Perspectives 10, no 4: 113–38. 1996.
ENGSTROM, Per; NORDBLOM, Katarina; OHLSSON, Henry; PERSSON, Annika.
“Tax Compliance and Loss Aversion”. American Economic Journal: Economic Policy.
2015.
EPLEY, Nicholas; MAK, Dennis; IDSON, Lorraine Chen. “Bonus or Rebate?: The
Impact of Income Framing on Spending and Saving”. Journal of Behavioral Decision
Making 19, no 3: 213–27. 2006.
EYSTER, Erik; RABIN, Matthew. “Cursed Equilibrium”. Econometrica 73, no 5: 1623–
72. 2005.
FAMA, Eugene F. “Efficient Capital Markets: A Review of Theory and Empirical Work”.
Journal of Finance 25, no 2: 383–417. 1970.
––––––. “Two Pillars of Asset Pricing”. American Economic Review 104, no 6: 1467–85.
2014.
––––––; FRENCH, Kenneth R. “Common Risk Factors in the Returns on Stocks and
Bonds”. Journal of Financial Economics 33, no 1: 3–56. 1993.
––––––. “The CAPM Is Wanted, Dead or Alive”. Journal of Finance 51, no 5: 1947–58.
1996.
––––––. “A Five-Factor Asset Pricing Model”. Artigo de trabalho, Fama–Miller Center for
Research in Finance. 2014. Disponível em: http://ssrn.com/abstract=2287202.
FARBER, Henry S. “Is Tomorrow Another Day? The Labor Supply of New York City
Cabdrivers”. Journal of Political Economy 113, no 1: 46. 2005.
––––––. “Reference-Dependent Preferences and Labor Supply: The Case of New York
City Taxi Drivers”. American Economic Review 98, no 3: 1069–82. 2008.
––––––. “Why You Can’t Find a Taxi in the Rain and Other Labor Supply Lessons from
Cab Drivers”. Artigo de trabalho 20604. National Bureau of Economic Research: 2014.
FARNSWORTH, Ward. “Do Parties to Nuisance Cases Bargain after Judgment? A
Glimpse Inside the Cathedral”. University of Chicago Law Review 66, no 2: 373–436.
1999.
FEHR, Ernst; FISCHBACHER, Urs. “The Nature of Human Altruism”. Nature 425, no
6960: 785–91. 2003.
FEHR, Ernst; GACHTER, Simon. “Cooperation and Punishment in Public Goods
Experiments”. American Economic Review 66, no 2: 980–94. 2000.
––––––. “Altruistic Punishment in Humans”. Nature 415, no 6868: 137–40. 2002.
FEHR, Ernst; GOETTE, Lorenz. “Do Workers Work More If Wages Are High? Evidence
from a Randomized Field Experiment”. American Economic Review 97, no 1: 298–317.
2007.
FEHR, Ernst; KIRCHSTEIGER, George; RIEDL, Arno. “Does Fairness Prevent Market
Clearing? An Experimental Investigation”. Quarterly Journal of Economics 108, no 2:
437–59. 1993.
FEHR, Ernst; SCHMIDT, Klaus M. “A Theory of Fairness, Competition, and
Cooperation”. Quarterly Journal of Economics 114, no 3: 817–68. 1999.
FISCHBACHER, Urs; GÄCHTER, Simon; FEHR, Ernst. “Are People Conditionally
Cooperative? Evidence from a Public Goods Experiment”. Economics Letters 71, no 3:
397–404. 2001.
FISCHHOFF, Baruch. “Hindsight ≠ Foresight: The Effect of Outcome Knowledge on
Judgment Under Uncertainty”. Journal of Experimental Psychology: Human Perception
and Performance 1, no 3: 288. 1975.
FISHER, Irving. A teoria do juro. Nova Cultural: São Paulo, 1988.
FOX, Justin. O mito dos mercados racionais. Best Business: Rio de Janeiro, 2011.
FRANK, Robert H.; GILOVICH, Thomas; REGAN, Dennis T. “Does Studying
Economics Inhibit Cooperation?” Journal of Economic Perspectives 7, no 2: 159–71.
1993.

h d “
FREDERICK, Shane; LOEWENSTEIN, George; O’DONOGHUE, Ted. “Time
Discounting and Time Preference: A Critical Review”. Journal of Economic Literature
40, no 2: 351–401. 2002.
FRIEDMAN, Milton. “The Methodology of Positive Economics”. In Essays in Positive
Economics (cap. 1), 3–43. University of Chicago Press: Chicago, 1953.
––––––. “The Permanent Income Hypothesis”. In A Theory of the Consumption Function
(cap. 2), 20–37. Princeton University Press: Princeton, 1957.
––––––. “Windfalls, the ‘Horizon,’ and Related Concepts in the Permanent-Income
Hypothesis”. In Measurement in Economics: Studies in Mathematical Economics and
Econometrics in Memory of Yehuda Grunfeld (cap. 1), 3–28. Stanford University Press:
Palo Alto, 1963.
FRISCHMANN, Brett M; HOGENDORN, Christiaan. “Retrospectives: The Marginal
Cost Controversy”. Journal of Economic Perspectives 29, no 1: 193–206. 2015.
FRYER Jr., Roland G. “Financial Incentives and Student Achievement: Evidence from
Randomized Trials”. Artigo de trabalho 15898. National Bureau of Economic
Research, 2010.
––––––; LEVITT, Steven D.; LIST, John; SADOFF, Sally. “Enhancing the Efficacy of
Teacher Incentives through Loss Aversion: A Field Experiment”. Artigo de trabalho
18237. National Bureau of Economic Research, 2012.
FUDENBERG, Drew; LEVINE, David K. “A Dual-Self Model of Impulse Control”.
American Economic Review 96, no 5: 1449–76. 2006.
GABAIX, Xavier; LAIBSON, David. “Shrouded Attributes, Consumer Myopia, and
Information Suppression in Competitive Markets”. Quarterly Journal of Economics
121, no 2: 505–40. 2006.
GAWANDE, Atul. Checklist: Como fazer as coisas benfeitas. Sextante: Rio de Janeiro,
2011.
GEANAKOPLOS, John; PEARCE, David; STACCHETTI, Ennio. “Psychological
Games and Sequential Rationality”. Games and Economic Behavior 1, no 1: 60–79.
1989.
GINZEL, Linda E. “The Green Pen—Linda Ginzel: In the Classroom”. Chicago Booth
Magazine. Inverno, 2015.
GLAESER, Edward L. “A Nation of Gamblers: Real Estate Speculation and American
History”. Artigo de trabalho 18825. National Bureau of Economic Research, 2013.
GNEEZY, Uri; LIST, John A. The Why Axis: Hidden Motives and the Undiscovered
Economics of Everyday Life. Random House: Nova York, 2013.
GOURVILLE, John T.; SOMAN, Dilip. “Payment Depreciation: The Behavioral Effects
of Temporally Separating Payments from Consumption”. Journal of Consumer
Research 25, no 2: 160–74. 1998.
GRAHAM, Benjamin. O investidor inteligente. HarperCollins Brasil: Rio de Janeiro,
2017.
––––––; DODD, David L. Security Analysis. 6a ed. McGraw Hill: Nova York, 2008.
GRETHER, David M.; PLOTT, Charles R. “Economic Theory of Choice and the
Preference Reversal Phenomenon”. American Economic Review 69, no 4: 623–38.
1979.
GRYNBAUM, Michael M. “Where Do All the Cabs Go in the Late Afternoon?” New
York Times, 11 de janeiro de 2011. Disponível em:
http://www.nytimes.com/2011/01/12/nyregion/12taxi.html

Ü lf d “ l
GÜTH, Werner; SCHMITTBERGER, Rolf; SCHWARZE, Bernd. “An Experimental
Analysis of Ultimatum Bargaining”. Journal of Economic Behavior and Organization 3,
no 4: 367–88. 1982.
HALLIDAY, Josh. “Whitney Houston Album Price Hike Sparks Controversy”. Guardian,
13 de fevereiro de 2012. Disponível em:
http://www.theguardian.com/music/2012/feb/13/whitney-houston-album-price.
HALLSWORTH, Michael; LIST, John A.; METCALFE, Robert D.; VLAEV, Ivo. “The
Behavioralist as Tax Collector: Using Natural Field Experiments to Enhance Tax
Compliance”. Artigo de trabalho 20007. National Bureau of Economic Research,
2014.
HALTIWANGER, John; WALDMAN, Michael. “Rational Expectations and the Limits of
Rationality: An Analysis of Heterogeneity”. American Economic Review 75, no 3: 326–
40. 1985.
HASTINGS, Justine S.; SHAPIRO, Jesse M. “Fungibility and Consumer Choice:
Evidence from Commodity Price Shocks”. Quarterly Journal of Economics 128, no 4:
1449–98. 2013.
HAUSHOFER, Johannes; FEHR, Ernst. “On the Psychology of Poverty”. Science 344, no
6186: 862–7. 23 de maio de 2014.
HEATH, Chip; SOLL, Jack B. “Mental Budgeting and Consumer Decisions”. Journal of
Consumer Research 23, no 1: 40–52. 1996.
HEIDHUES, Pau; KSZEGI, Botond. “Exploiting Naïveté about Self-Control in the
Credit Market”. American Economic Review 100, no. 5: 2279–303. 2010.
HENRICH, Joseph. “Does Culture Matter in Economic Behavior? Ultimatum Game
Bargaining among the Machiguenga of the Peruvian Amazon”. American Economic
Review 90, no 4: 973–9. 2000.
––––––; ALBERS, Wulf; BOYD, Robert; GIGERENZER, Gerd; MCCABE, Kevin A.;
OCKENFELS, Axel; YOUNG, H. Peyton. “What Is the Role of Culture in Bounded
Rationality?”. In Gerd Gigerenzer e Reinhard Selten, eds., Bounded Rationality: The
Adaptive Toolbox (cap. 19), 343–59. MIT Press: Cambridge, 2002.
HESS, Pamela; XU, Yan. “2011 Trends & Experience in Defined Contribution Plans”.
Aon Hewitt. 2011.
HOFFMAN, Moshe; SUETENS, Sigrid; NOWAK, Martin A.; GNEEZY, Uri. “An
Experimental Test of Nash Equilibrium versus Evolutionary Stability”. In Proc. Fourth
World Congress of the Game Theory Society. sessão 145, comunicação 1. Istambul,
2012.
HOFSTADTER, Douglas R. “Computer Tournaments of the Prisoners-Dilemma Suggest
How Cooperation Evolves”. Scientific American 248, no 5: 16. 1983.
HOGARTH, Robin M.; REDER, Melvin W. “The Behavioral Foundations of Economic
Theory: Proceedings of a Conference October 13–15, 1985”. Journal of Business 59, no
4, parte 2: S181–505. Outubro de 1986.
––––––. Rational Choice: The Contrast Between Economics and Psychology. University of
Chicago Press: Chicago, 1987.
HOOD, Donald C.; ANDREASSEN, Paul; SCHACHTER, Stanley. “II. Random and
Non-Random Walks on the New York Stock Exchange”. Journal of Economic Behavior
and Organization 6, no 4: 331–8. 1985.
HSEE, Christopher K.; YANG, Yang; GU, Yangjie; CHEN, Jie. “Specification Seeking:
How Product Specifications Influence Consumer Preference”. Journal of Consumer
Research 35, no 6: 952–66. 2009.
“ l l ll
INTERNAL REVENUE SERVICE. “Revenue Ruling 98–30”. Internal Revenue Bulletin
25: 8–9. 22 de junho de 1998. Disponível em: http://www.irs.gov/pub/irs-irbs/irb98-
25.pdf.
JACKSON, Eric. “The Case For Apple, Facebook, Microsoft Or Google Buying Yahoo
Now”. Forbes.com: 21 de julho de 2014. Disponível em:
http://www.forbes.com/sites/ericjackson/2014/07/21/the-case-for-apple-facebook-
microsoft-or-google-buying-yahoo-now.
JENSEN, Michael C. “Risk, The Pricing of Capital Assets, and the Evaluation of
Investment Portfolios”. Journal of Business 42, no 2: 167–247. 1969.
––––––.“Some Anomalous Evidence Regarding Market Efficiency”. Journal of Financial
Economics 6, no 2: 95–101. 1978.
JEVONS, William Stanley. A teoria da economia política. Nova cultural: São Paulo, 1986.
JEWETT, Dale. “1975 Cars Brought Sticker Shock, Then Rebates”. Automotive News. 26
de junho de 1996.
JOHN, David C; LEVINE, Ruth. “National Retirement Savings Systems in Australia,
Chile, New Zealand and the United Kingdom: Lessons for the United States”. The
Retirement Security Project. Brookings Institution: 2009. Disponível em:
http://www.brookings.edu/research/papers/2010/01/07-retirement-savings-john.
JOHNSON, Eric J.; GOLDSTEIN, Daniel G. “Defaults and Donation Decisions”.
Transplantation 78, no 12: 1713–6. 2004.
JOHNSON, Steven. De onde vêm as boas ideias. Zahar: Rio de Janeiro, 2010.
JOLLS, Christine; SUNSTEIN, Cass R.; THALER, Richard. “A Behavioral Approach to
Law and Economics”. Stanford Law Review 50, no 5: 1471–550. 1998.
KAHNEMAN, Daniel. Rápido e devagar: Duas formas de pensar. Objetiva: Rio de
Janeiro, 2012.
––––––; KNETSCH, Jack L.; THALER, Richard H. “Fairness and the Assumptions of
Economics”. Journal of Business 59, no 4, parte 2: S285–300. 1986.
––––––. “Anomalies: The Endowment Effect, Loss Aversion, and Status Quo Bias”.
Journal of Economic Perspectives 5, no 1: 193–206. 1991.
KAHNEMAN, Daniel; LOVALLO, Dan. “Timid Choices and Bold Forecasts: A
Cognitive Perspective on Risk Taking”. Management Science 39, no 1: 17–31. 1993.
KAHNEMAN, Daniel; TVERSKY, Amos. “On The Psychology of Prediction”.
Psychological Review 80, no 4: 237. 1973.
––––––. “Prospect Theory: An Analysis of Decision under Risk”. Econometrica 47, no 2:
263–91. 1979.
––––––. Choices, Values, and Frames. Cambridge University Press: Cambridge, 2000.
KARLAN, Dean; APPEL, Jacob. Mais do que boas intenções: Entenda como a nova
economia está ajudando na erradicação da pobreza mundial. Elsevier: Rio de Janeiro,
2011.
KAUR, Supreet. “Nominal Wage Rigidity In Village Labor Markets”. Artigo de trabalho
20770. National Bureau of Economic Research, 2014.
KEYNES, John Maynard. A Tract on Monetary Reform. Macmillan: Londres, 1923.
––––––. A teoria geral do emprego, do juro e da moeda. Nova Cultural: São Paulo, 1985.
KLEIDON, Allan W. “Anomalies in Financial Economics: Blueprint for Change?”
Journal of Business 59, no 4, parte 2: S469–99. 1986.
KLIGER, Doron; VAN DEN ASSEM, Martijn J.; ZWINKELS, Remco C. J. “Empirical
Behavioral Finance”. Journal of Economic Behavior and Organization 107, parte B:
4 4
421–7. 2014.
KNETSCH, Jack L.; SINDEN, John A. “Willingness to Pay and Compensation
Demanded: Experimental Evidence of an Unexpected Disparity in Measures of
Value”. Quarterly Journal of Economics 99, no 3: 507–21. 1984.
KNOBE, Joshua; BUCKWALTER, Wesley; NICHOLS, Shaun; ROBBINS, Philip;
SARKISSIAN, Hagop; SOMMERS, Tamler. “Experimental Philosophy”. Annual
Review of Psychology 63: 81–99. 2012.
KNOBE, Joshua; NICHOLS, Shaun. Experimental Philosophy. Oxford University Press:
Oxford e Nova York, 2013.
KOCHER, Martin G.; CHERRY, Todd; KROLL, Stephan; NETZER, Robert J.;
SUTTER, Matthias. “Conditional Cooperation on Three Continents”. Economics
Letters 101, no 3: 175–8. 2008.
KOKONAS, Nick. “Tickets for Restaurants”. Blog do restaurante Alinea, 4 de junho de
2014. Disponível em: http://website.alinearestaurant.com/site/2014/06/tickets-for-
restaurants/.
KOROBKIN, Russell. “What Comes after Victory for Behavioral Law and Economics”.
University of Illinois Law Review 2011, no 5: 1653–74. 2011.
KRAFT, Matthew; ROGERS, Todd. “The Underutilized Potential of Teacher-to-Parent
Communication: Evidence from a Field Experiment”. Artigo de trabalho RWP14-049.
Harvard Kennedy School of Government. 2014.
KRAKAUER, Jon. No ar rarefeito. Companhia das Letras: São Paulo, 1997.
KRUEGER, Alan B. “Supply and Demand: An Economist Goes to the Super Bowl”.
Milken Institute Review, Segundo Trimestre de 2001: 22–9.
––––––; MAS, Alexandre. “Strikes, Scabs, and Tread Separations: Labor Strife and the
Production of Defective Bridgestone/Firestone Tires”. Journal of Political Economy
112, no 2: 253–89. 2004.
KUHN, Thomas S. A estrutura das revoluções científicas.: Perspectiva: São Paulo, 2013.
LAIBSON, David. “Golden Eggs and Hyperbolic Discounting”. Quarterly Journal of
Economics 112, no 2: 443–78. 1997.
LAKONISHOK, Josef; SHLEIFER, Andrei; VISHNY, Robert W. “Contrarian
Investment, Extrapolation, and Risk”. Journal of Finance 49, no 5: 1541–78. 1994.
LAMONT, Owen A.; THALER, Richard H. “Can the Market Add and Subtract?
Mispricing in Tech Stock Carve-Outs”. Journal of Political Economy 111, no 2: 227–68.
2003.
LANDSBERGER, Michael. “Windfall Income and Consumption: Comment”. American
Economic Review 56, no 3: 534–40. 1966.
LEE, Charles; SHLEIFER, Andrei; THALER, Richard H. “Investor Sentiment and the
Closed-End Fund Puzzle”. Journal of Finance 46, no 1: 75–109. 1991.
LESTER, Richard A. “Shortcomings of Marginal Analysis for Wage-Employment
Problems”. American Economic Review, 36, no 1: 63–82. 1946.
LEVITT, Steven; LIST, John. “What Do Laboratory Experiments Measuring Social
Preferences Reveal About the Real World?” Journal of Economic Perspectives 21, no 2:
153–74. 2007.
LEWIN, Kurt. “Frontiers in Group Dynamics: II. Channels of Group Life; Social
Planning and Action Research”. Human Relations 1, no 2: 143–53. 1947.
LICHTENSTEIN, Sarah; SLOVIC, Paul. “Response-Induced Reversals of Preference in
Gambling: An Extended Replication in Las Vegas”. Journal of Experimental Psychology
101, no 1: 16. 1973.
LINTNER, John. “Distribution of Incomes of Corporations Among Dividends, Retained
Earnings, and Taxes”. American Economic Review 46, no 2: 97–113. 1956.
––––––. “The Valuation of Risk Assets and the Selection of Risky Investments in Stock
Portfolios and Capital Budgets”. Review of Economics and Statistics 47, no 1: 13–37.
1965a.
––––––. “Security Prices, Risk, and Maximal Gains from Diversification”. Journal of
Finance 20, no 4: 587–615. 1965b.
LIST, John A. “The Market for Charitable Giving”. Journal of Economic Perspectives 25,
no 2: 157–80. 2011.
LOEWENSTEIN, George. “The Fall and Rise of Psychological Explanations in the
Economics of Intertemporal Choice”. In George Loewenstein e Jon Elster, eds.,
Choice Over Time, 3–34. Russell Sage Foundation: Nova York, 1992.
––––––; PRELEC, Drazen. “Anomalies in Intertemporal Choice: Evidence and an
Interpretation”. Quarterly Journal of Economics 107, no 2: 573–597. 1992.
LOHR, Steve. “Lessons From a Hurricane: It Pays Not to Gouge”. New York Times, 22 de
setembro de 1992. Disponível em:
http://www.nytimes.com/1992/09/22/business/lessons-from-a-hurricane-it-pays-not-to-
gouge.html.
LOTT, John R. More Guns, Less Crime: Understanding Crime and Gun Control Laws.
University of Chicago Press: Chicago, 1998.
LOWENSTEIN, Roger. Quando os gênios falham: Ascensão e queda do Long-Term
Capital Management. Gente: São Paulo, 2009.
––––––. “Exuberance Is Rational”. New York Times Magazine, 11 de fevereiro de 2001.
Disponível em: http://partners.nytimes.com/library/magazine/home/20010211mag-
econ.html.
MACHLUP, Fritz. “Marginal Analysis and Empirical Research”. American Economic
Review 36, no 4: 519–54. 1946.
MACINTOSH, Donald. The Foundations of Human Society. University of Chicago Press:
Chicago, 1969.
MADRIAN, Brigitte C.; SHEA, Dennis F. “The Power of Suggestion: Inertia in 401(k)
Participation and Savings Behavior”. Quarterly Journal of Economics 116, no 4: 1149–
87. 2001.
MALKIEL, Burton Gordon. A Random Walk Down Wall Street. Norton: Nova York,
1973.
MARWELL, Gerald; AMES, Ruth E. “Economists Free Ride, Does Anyone Else?
Experiments on the Provision of Public Goods”. Journal of Public Economics 15, no 3:
295–310. 1981.
MAS, Alexandre. “Pay, Reference Points, and Police Performance”. Quarterly Journal of
Economics 121, no 23: 783–821. 2006.
––––––.“Labour Unrest and the Quality of Production: Evidence from the Construction
Equipment Resale Market”. Review of Economic Studies 75, no 1: 229–58. 2008.
MASSEY, Cade; THALER, Richard H. “The Loser’s Curse: Decision Making and
Market Efficiency in the National Football League Draft”. Management Science 59, no
7: 1479–95. 2013.
MCGLOTHLIN, William H. “Stability of Choices among Uncertain Alternatives”.
American Journal of Psychology 69, no 4: 604–15. 1956.
kh l “ l dl f
MCKAY, Betsy; DEOGUN, Nikhil; LUBLIN, Joann. “Clumsy Handling of Many
Problems Cost Ivester Coca-Cola Board’s Favor”. Wall Street Journal, 17 de dezembro
de 1999. Disponível em: http://online.wsj.com/article/SB945394494360188276.html.
MCKELVEY, Richard D.; PALFREY, Thomas R. “Quantal Response Equilibria for
Normal Form Games”. Games and Economic Behavior 10, no 1: 6–38. 1995.
MEHRA, Rajnish. “The Equity Premium Puzzle: A Review”. Foundations and Trends in
Finance 2, no 1: 1–81. 2007.
––––––; PRESCOTT, Edward C. “The Equity Premium: A Puzzle”. Journal of Monetary
Economics 15, no 2: 145–61. 1985.
MIAN, Atif; SUFI, Amir. House of Debt: How They (and You) Caused the Great Recession,
and How We Can Prevent It from Happening Again. University of Chicago Press:
Chicago, 2014.
MILLER, Mark. “First Chicago Loses Touch with Humans”. Chicago Sun–Times, 2 de
maio de 1995, 25. Acessado via ProQuest:
http://search.proquest.com/docview/258111761.
MILLER, Merton H. “Behavioral Rationality in Finance: The Case of Dividends”.
Journal of Business 59, no 4, parte 2: S451–68. 1986.
––––––. “The Modigliani–Miller Propositions after Thirty Years”. Journal of Economic
Perspectives 2, no 4: 99–120. 1988.
MISCHEL, Walter. Personality and Assessment. John Wiley: Hoboken, 1968.
––––––. “Continuity and Change in Personality”. American Psychologist 24, no 11: 1012.
1969.
––––––. O teste do marshmallow. Objetiva: Rio de Janeiro, 2016.
––––––; AYDUK, Ozlem; BERMAN, Marc G.; CASEY, B. J.; GOTLIB, Ian H.;
JONIDES, John; KROSS, Ethan; TESLOVICH, Theresa; WILSON, Nicole L.;
ZAYAS, Vivian; et al. “‘Willpower’ over the Life Span: Decomposing Self-Regulation”.
Social Cognitive and Affective Neuroscience 6, no 2: 252–6. 2010.
MITCHELL, Gregory. “Libertarian Paternalism Is an Oxymoron”. Northwestern
University Law Review 99, no 3: 1245–77. 2005.
MODIGLIANI, Franco; BRUMBERG, Richard. “Utility Analysis and the Consumption
Function: An Interpretation of Cross-Section Data”. In Kenneth K. Kurihara, ed., Post-
Keynesian Economics, 383–436. Rutgers University Press: New Brunswick, 1954.
MODIGLIANI, Franco; MILLER, Merton. “The Cost of Capital, Corporation Finance
and the Theory of Investment”. American Economic Review 48, no 3: 261–97. 1958.
MONGIN, Philippe. “The Marginalist Controversy”. In John Bryan Davis, D. Wade
Hands e Uskali Maki, eds., Handbook of Economic Methodology, 558–62. Edward
Elgar: Londres, 1997.
MULLAINATHAN, Sendhil. “When a Co-Pay Gets in the Way of Health”. New York
Times, 10 de agosto de 2013. Disponível em:
http://www.nytimes.com/2013/08/11/business/when-a-co-pay-gets-in-the-way-of-
health.html.
––––––; SHAFIR, Eldar. Escassez. Best Business: Rio de Janeiro, 2016.
NAG, Amal. “GM Is Offering Low-Cost Loans on Some Cars”. Wall Street Journal, 21 de
março de 1996.
NAGEL, Rosemarie Chariklia. “Unraveling in Guessing Games: An Experimental
Study”. American Economic Review 85, no 5: 1313–26. 1995.
NASAR, Sylvia. Uma mente brilhante. Best Bolso: Rio de Janeiro, 2008.
“ l ll k d d
NEW YORK STOCK EXCHANGE. “NYSE Group Volume in All Stocks Traded”.
NYSE Facts and Figures. 2014. Disponível em:
http://www.nyxdata.com/nysedata/asp/factbook/viewer_edition.asp?
mode=table&key=3133&category=3.
NORMAN, Donald A. O design do dia-a-dia. Rocco: Rio de Janeiro, 2006.
O’DONOGHUE, Ted; RABIN, Matthew. “Procrastination in Preparing for Retirement”.
In Henry Aaron, ed., Behavioral Dimensions of Retirement Economics, 125–56.
Brooking Institution e Russell Sage Foundation: Washington, DC, e Nova York, 1999.
––––––. “Studying Optimal Paternalism, Illustrated by a Model of Sin Taxes”. American
Economic Review 93, no 2: 186–91. 2003.
PARETO, Vilfredo. Manual de economia política. Nova Cultural: São Paulo, 1988.
PETER, Laurence J.; HULL, Raymond. O princípio de Peter. Elsevier: Rio de Janeiro,
2003.
PIGOU, Arthur Cecil. The Economics of Welfare. MacMillan: Londres, 1920.
POPE, Devin G.; SCHWEITZER, Maurice E. “Is Tiger Woods Loss Averse? Persistent
Bias in the Face of Experience, Competition, and High Stakes”. American Economic
Review 101, no 1: 129–57. 2011.
POST, Thierry; VAN DEN ASSEM, Martijn J.; BALTUSSEN, Guido; THALER,
Richard H. “Deal or No Deal? Decision Making under Risk in a Large-Payoff Game
Show”. American Economic Review 98, no 1: 38–71. 2008.
POTERBA, James M.; VENTI, Steven F.; WISE, David A. “How Retirement Saving
Programs Increase Saving”. Journal of Economic Perspectives 10, no 4: 91–112. 1996.
PRELEC, Drazen; LOEWENSTEIN, George. “The Red and the Black: Mental
Accounting of Savings and Debt”. Marketing Science 17, no 1: 4–28. 1998.
RABIN, Matthew. “Incorporating Fairness into Game Theory and Economics”. American
Economic Review 83, no 5: 1281–302. 1993.
RAIFMAN, Julia R. G.; LANTHORN, Heather E.; ROKICKI, Slawa; FINK, Gunther.
“The Impact of Text Message Reminders on Adherence to Antimalarial Treatment in
Northern Ghana: A Randomized Trial”. PLOS ONE 9, no 10: e109032. 2014.
RAPOPORT, Anatol. “Experiments with N-Person Social Traps I: Prisoner’s Dilemma,
Weak Prisoner’s Dilemma, Volunteer’s Dilemma, and Largest Number”. Journal of
Conflict Resolution 32, no 3: 457–72. 1988.
ROMER, David. “Do Firms Maximize? Evidence from Professional Football”. Journal of
Political Economy 114, no 2: 340–65. 2006.
ROSS, Lee; GREENE, David; HOUSE, Pamela. “The ‘False Consensus Effect’: An
Egocentric Bias in Social Perception and Attribution Processes”. Journal of
Experimental Social Psychology 13, no 3: 279–301. 1977.
ROTH, Alvin E. “Repugnance as a Constraint on Markets”. Journal of Economic
Perspectives 21, no. 3: 37–58. 2007.
––––––. Laboratory Experimentation in Economics: Six Points of View. Cambridge
University Press: Cambridge, 1987.
ROZEFF, Michael S.; KINNEY, William. “Capital Market Seasonality: The Case of
Stock Returns”. Journal of Financial Economics 3, no 4: 379–402. 1976.
RUSSELL, Thomas; THALER, Richard H. “The Relevance of Quasi Rationality in
Competitive Markets”. American Economic Review 75, no 5: 1071–82. 1985.
SALLY, David. “Conversation and Cooperation in Social Dilemmas: A Meta-Analysis of
Experiments from 1958 to 1992”. Rationality and Society 7, no 1: 58–92. 1995.
l “ h h f bl d f
SAMUELSON, Paul A. “The Pure Theory of Public Expenditure”. Review of Economics
and Statistics 36, no 4: 387–9. 1954.
––––––. “A Note of Measurement Utility”. Review of Economic Studies 4, no 2: 155-61.
1937.
––––––. “Risk and Uncertainty: A Fallacy of Large Numbers”. Scientia 98, no 612: 108.
1963.
––––––. “Why We Should Not Make Mean Log of Wealth Big Though Years to Act Are
Long”. Journal of Banking and Finance 3, no 4: 305–7. 1979.
SAMUELSON, William; ZECKHAUSER, Richard J. “Status Quo Bias in Decision
Making”. Journal of Risk and Uncertainty 1, no 1: 7–59. 1988.
SCHACHTER, Stanley; GERIN, William; HOOD, Donald C.; ANDERASSEN, Paul.
“I. Was the South Sea Bubble a Random Walk?” Journal of Economic Behavior and
Organization 6, no 4: 323–9. 1985a.
SCHACHTER, Stanley; HOOD, Donald C.; GERIN, William; ANDREASSEN, Paul;
RENNERT, Michael. “III. Some Causes and Consequences of Dependence and
Independence in the Stock Market”. Journal of Economic Behavior and Organization
6, no 4: 339–57. 1985b.
SCHELLING, Thomas C. “The Life You Save May Be Your Own”. In Samuel B. Chase
Jr., ed., Problems in Public Expenditure Analysis, vol. 127, 127–176. Brookings
Institution: Washington, DC, 1968.
––––––. “Self-Command in Practice, in Policy, and in a Theory of Rational Choice”.
American Economic Review: Papers and Proceedings 74, no 2: 1–11. 1984.
SEN, Amartya K. “Rational Fools: A Critique of the Behavioral Foundations of Economic
Theory”. Philosophy and Public Affairs 6, no 4: 317–44. 1977.
SHAFIR, Eldar; THALER, Richard H. “Invest Now, Drink Later, Spend Never: On the
Mental Accounting of Delayed Consumption”. Journal of Economic Psychology 27, no
5: 694–712. 2006.
SHAPIRO, Matthew D.; SLEMROD, Joel. “Did the 2001 Tax Rebate Stimulate
Spending? Evidence from Taxpayer Surveys”. In James Poterba, ed., Tax Policy and the
Economy (cap. 3), vol. 17, 83–109. National Bureau of Economic Research e MIT
Press: Cambridge, 2003
SHARPE, William F. “Capital Asset Prices: A Theory of Market Equilibrium Under
Conditions of Risk”. Journal of Finance 19, no 3: 425–42. 1964.
SHATON, Maya. “The Display of Information and Household Investment Behavior”.
Artigo de trabalho. Booth School of Business: Chicago, 2014.
SHEFRIN, Hersh M.; STATMAN, Meir. “Explaining Investor Preference for Cash
Dividends”. Journal of Financial Economics 13, no 2: 253–82. 1984.
SHEFRIN, Hersh M.; THALER, Richard H. “The Behavioral Life-Cycle Hypothesis”.
Economic Inquiry 26, no 4: 609–43. 1988.
SHILLER, Robert J. “Do Stock Prices Move Too Much to Be Justified by Subsequent
Changes in Dividends?” American Economic Review 71, no 3: 421–36. 1981.
––––––. “Stock Prices and Social Dynamics”. Brookings Papers on Economic Activity 2:
457–510. 1984.
––––––. “Comments on Miller and on Kleidon”. Journal of Business 59, no 4, part 2:
S501–5. 1986.
––––––. Exuberância irracional. Makron Books: São Paulo, 2000.

d b “ h f b l f
SHLEIFER, Andrei; VISHNY, Robert W. “The Limits of Arbitrage”. Journal of Finance
52, no 1: 35–55. 1997.
SILVER, Nate. O sinal e o ruído. Intrínseca: Rio de Janeiro, 2013.
SIMON, Herbert A. Models of Man, Social and Rational: Mathematical Essays on
Rational Human Behavior in a Social Setting. Wiley: Oxford, 1957.
SLOMAN, Steven A. “The Empirical Case for Two Systems of Reasoning”. Psychological
Bulletin 119, no 1: 3. 1996.
SLONIM, Robert L.; ROTH, Alvin E. “Learning in High Stakes Ultimatum Games: An
Experiment in the Slovak Republic”. Econometrica 66, no 3: 569–96. 1998.
SMITH, Adam. Teoria dos sentimentos morais. WMF Martins Fontes: São Paulo, 2015.
––––––. A riqueza das nações. 2 vols. WMF Martins Fontes: São Paulo, 2016.
SMITH, Vernon L. “Experimental Economics: Induced Value Theory”. American
Economic Review 66, no 2: 274–9. 1976.
––––––. SUCHANEK, Gerry L.; WILLIAMS, Arlington W. “Bubbles, Crashes, and
Endogenous Expectations in Experimental Spot Asset Markets”. Econometrica 56, no 5:
1119–51. 1988.
SOLOW, Robert M. “How to Understand the Disaster”. New York Review of Books, 14 de
maio de 2009. Disponível em:
http://www.nybooks.com/articles/archives/2009/may/14/how-to-understand-the-
disaster/.
SPIEGLER, Ran. Bounded Rationality and Industrial Organization. Oxford University
Press: Oxford e Nova York, 2011.
STANOVICH, Keith E.; WEST, Richard F. “Individual Differences in Reasoning:
Implications for the Rationality Debate”. Behavioral and Brain Sciences 23, no 5: 701–
17. 2000.
STAW, Barry M. “Knee-Deep in the Big Muddy: A Study of Escalating Commitment to a
Chosen Course of Action”. Organizational Behavior and Human Performance 16, no 1:
27–44. 1976.
STEWART, Jon. “Interview with Goolsbee, Austan”. Daily Show. Comedy Central: 6 de
setembro de 2012.
STEWART, Sharla A. “Can Behavioral Economics Save Us from Ourselves?” University
of Chicago Magazine 97, no 3. 2005. Disponível em:
http://magazine.uchicago.edu/0502/features/economics.shtml.
STIGLER, George J. “The Conference Handbook”. Journal of Political Economy 85, no
2: 441–3. 1977.
STROTZ, Robert Henry. “Myopia and Inconsistency in Dynamic Utility Maximization”.
Review of Economic Studies 23, no 3: 165–80. 1955–56.
SULLIVAN, Gail. “Uber Backtracks after Jacking Up Prices during Sydney Hostage
Crisis”. Washington Post, 15 de dezembro de 2014. Disponível em:
http://www.washingtonpost.com/news/morning-mix/wp/2014/12/15/uber-backtracks-
after-jacking-up-prices-during-syndey-hostage-crisis.
SUMMERS, Nick. “In Australia, Retirement Saving Done Right”. Bloomberg
BusinessWeek, 30 maio de 2013. Disponível em:
http://www.businessweek.com/articles/2013-05-30/in-australia-retirement-saving-done-
right.
SUNSTEIN, Cass R. “The Ethics of Nudging”. 2014. Disponível em:
http://ssrn.com/abstract=2526341.

h d “ b l
––––––; THALER, Richard H. “Libertarian Paternalism Is Not an Oxymoron”. University
of Chicago Law Review 70, no 4: 1159–202. 2003.
TELSER, L. G. “The Ultimatum Game and the Law of Demand”. Economic Journal
105, no 433: 1519–23. 1995.
THALER, Richard H. “Toward a Positive Theory of Consumer Choice”. Journal of
Economic Behavior and Organization 1, no 1: 39–60. 1980.
––––––.“The Psychology and Economics Conference Handbook: Comments on Simon,
on Einhorn and Hogarth, and on Tversky and Kahneman”. Journal of Business 59, no
4, parte 2: S279–84. 1986.
––––––.“Anomalies: The January Effect”. Journal of Economic Perspectives 1, no 1: 197–
201. 1987a.
––––––. “Anomalies: Seasonal Movements in Security Prices II: Weekend, Holiday, Turn
of the Month, and Intraday Effects”. Journal of Economic Perspectives 1, no 2: 169–77.
1987b.
––––––. “Anomalies: The Winner’s Curse”. Journal of Economic Perspectives 2, no 1: 191–
202. 1988a.
––––––. “Anomalies: The Ultimatum Game”. Journal of Economic Perspectives 2, no 4:
195–206. 1988b.
––––––. The Winner’s Curse: Paradoxes and Anomalies of Economic Life. Free Press: Nova
York, 1992.
––––––. “Psychology and Savings Policies”. American Economic Review 84, no 2: 186–92.
1994.
––––––. “Mental Accounting Matters”. Journal of Behavioral Decision Making 12: 183–
206. 1999a.
––––––. “The End of Behavioral Finance”. Financial Analysts Journal 55, no 6: 12–17.
1999b.
––––––. “Opting in vs. Opting Out”. New York Times, 26 de setembro de 2009. Disponível
em: http://www.nytimes.com/2009/09/27/business/economy/27view.html.
––––––; BENARTZI, Shlomo. “Save More TomorrowTM: Using Behavioral Economics
to Increase Employee Saving”. Journal of Political Economy 112, no S1: S164–87.
2004.
––––––; JOHNSON, Eric J. “Gambling with the House Money and Trying to Break
Even: The Effects of Prior Outcomes on Risky Choice”. Management Science 36, no 6:
643–60. 1990.
––––––; ROSEN, Sherwin. “The Value of Saving a Life: Evidence from the Labor
Market”. In Nestor E. Terleckyj, ed., Household Production and Consumption, 265–
302. National Bureau for Economic Research: Nova York, 1976.
––––––; SHEFRIN, Hersh M. “An Economic Theory of Self-Control”. Journal of Political
Economy 89, no 2: 392–406. 1981.
––––––; SUNSTEIN, Cass R. “Libertarian Paternalism”. American Economic Review:
Papers and Proceedings 93, no 2: 175–9. 2003.
––––––. Nudge: o empurrão para a escolha certa. Elsevier: Rio de Janeiro, 2008.
––––––; TVERSKY, Amos; KAHNEMAN, Daniel; SCHWARTZ, Alan. “The Effect of
Myopia and Loss Aversion on Risk Taking: An Experimental Test”. Quarterly Journal
of Economics 112, no 2: 647–61. 1997.

ll “ l l k k d
––––––; ZIEMBA, William T. “Anomalies: Parimutuel Betting Markets: Racetracks and
Lotteries”. Journal of Economic Perspectives 2, no 2: 161–74. 1988.
THOMPSON, Rex. “The Information Content of Discounts and Premiums on Closed-
End Fund Shares”. Journal of Financial Economics 6, no 2–3: 151–86. 1978.
TIERNEY, John. “Magic Marker Strategy”. New York Times, 6 de setembro de 2005.
Disponível em: http://www.nytimes.com/2005/09/06/opinion/06tierney.html.
TIROLE, Jean. “Cognitive Games and Cognitive Traps”. Artigo de trabalho. Toulouse
School of Economics, 2014.
TUTTLE, Brad. “In Major Shakeup, J.C. Penney Promises No More ‘Fake Prices.’”
Time, 26 de janeiro de 2012. Disponível em: http://business.time.com/2012/01/26/in-
major-shakeup-j-c-penney-promises-no-more-fake-prices/.
TVERSKY, Amos; KAHNEMAN, Daniel. “Judgment under Uncertainty: Heuristics and
Biases”. Science 185, no 4157: 1124–31. 1974.
UK DEPARTMENT FOR WORKS AND PENSIONS. “Automatic Enrolment Opt Out
Rates: Findings from Qualitative Research with Employers Staging in 2014”. Relatório
de Pesquisa Ad Hoc 9, DWP. 2014. Disponível em:
https://www.gov.uk/government/uploads/system/uploads/attachment_data/file/369572/r
esearch-report-9-opt-out.pdf.
ULLMANN-MARGALIT, Edna. “The Invisible Hand and the Cunning of Reason”.
Social Research 64, no 2: 181-98. 1997.
VAN DEN ASSEM, Martijn J.; VAN DOLDER, Dennie; THALER, Richard H. “Split or
Steal? Cooperative Behavior When the Stakes Are Large”. Management Science 58, no
1: 2–20. 2012.
VON NEUMANN, John; MORGENSTERN, Oskar. Theory of Games and Economic
Behavior.: Princeton University Press: Princeton, 1947.
WALD, David S.; BESTWICK, Jonathan P.; RAIMAN, Lewis; BRENDELL, Rebecca;
WALD, Nicholas J. “Randomised Trial of Text Messaging on Adherence to
Cardiovascular Preventive Treatment (INTERACT Trial)”. PLOS ONE 9, no 12:
e114268. 2014.
WASON, Peter C. “Reasoning About a Rule”. Quarterly Journal of Experimental
Psychology 20, no 3: 273–81. 1968.
WATTERS, Ethan. “We Aren’t the World”. Pacific Standard, 5 fevereiro de 2013.
Disponível em: http://www.psmag.com/magazines/magazine-feature-story-
magazines/joe-henrich-weird-ultimatum-game-shaking-up-psychology-economics-
53135/.
WHITEHEAD, Mark; JONES, Rhys; HOWELL, Rachel; LILLEY, Rachel; PYKETT,
Jessica. “Nudging All Over the World: Assessing the Global Impact of the Behavioural
Sciences on Public Policy”. Economic and Social Research Council, setembro de 2014.
Disponível em:
https://changingbehaviours.files.wordpress.com/2014/09/nudgedesignfinal.pdf.
WICKMAN, Forrest. “Who Really Said You Should ‘Kill Your Darlings’?” Slate, 18 de
outubro de 2013. Disponível em:
http://www.slate.com/blogs/browbeat/2013/10/18/_kill_your_darlings_writing_advice_w
hat_writer_really_said_to_murder_your.html.
WNYC. “The Golden Rule”. Radiolab 12, no 6. 25 de fevereiro de 2014. Disponível em:
http://www.radiolab.org/story/golden-rule/.
WORLD BANK. World Development Report 2015: Mind, Society, and Behavior. World
Bank: Washington, DC, 2015.

“ h ff f l
YORK, Benjamin N.; LOEB, Susanna. “One Step at a Time: The Effects of an Early
Literacy Text Messaging Program for Parents of Preschoolers”. Artigo de trabalho
20659. National Bureau of Economic Research, 2014.
ZAMIR, Eyal; TEICHMAN, Doron. The Oxford Handbook of Behavioral Economics and
the Law. Oxford University Press: Oxford e Nova York, 2014.
ZIELINSKI, Sarah. “A Parrot Passes the Marshmallow Test”. Slate, 9 de setembro 2014.
Disponível em:
http://www.slate.com/blogs/wild_things/2014/09/09/marshmallow_test_of_self_control_
an_african_grey_parrot_performs_as_well.html.
LISTA DE FIGURAS

A menos que especificado de outra maneira, todas as imagens foram


criadas por Kevin Quealy.

Fig. 1: O quebra-cabeça dos trilhos da ferrovia


Fig. 2: Utilidade marginal da riqueza
Fig. 3: A função valor
Fig. 4: Saul Steinberg, “Vista do mundo a partir da 9th Avenue”
(New Yorker, 29 de março de 1976). Reproduzido por cortesia da
Saul Steinberg Foundation.
Fig. 5: As escolhas de Wimbledon: Agora ou Mais Tarde
Fig. 6: Felicidade, culpa e barras energéticas
Fig. 7: Um mercado experimental para fichas
Fig. 8: O problema das quatro cartas (fonte: Wason, 1966)
Fig. 9: Taxas de rentabilidade, exibidas de duas maneiras
(fonte: Benartzi e Thaler, 1999)
Fig. 10: Palpites no Jogo do Concurso de Beleza do Financial Times
Fig. 11: Predição de GPAs
Fig. 12: Os mercados de ações são voláteis demais?
Fig. 13: Razões preço/lucro do mercado de ações no longo prazo
(fonte: http://econ.yale.edu/~shiller/)
Fig. 14: Preços de moradias nos Estados Unidos no longo prazo
(fonte:
http://faculty.chicagobooth.edu/john.cochrane/research/papers/disco
unt_rates_jf.pdf)
Fig. 15: Prêmios e descontos em fundos mútuos fechados selecionados
(fonte: Wall Street Journal online, 1º janeiro 2015)
Fig. 16: A aritmética peculiar da Palm e 3Com
Fig. 17: O mercado de canecas e o teorema de Coase
(crédito de fonte da imagem: Alex Berkowitz)
Fig. 18: O valor de mercado das posições de escolha no Draft da NFL
(fonte: Massey e Thaler, 2013)
Fig. 19: O “Chart” usado pelos times da NFL para o valor das posições de
escolha no Draft
Fig. 20: Remuneração de posições de escolha no Draft da NFL
(fonte: Massey e Thaler, 2013)
Fig. 21: “Valor excedente” das posições de escolha no Draft da NFL
(fonte: Massey e Thaler, 2013)
Fig. 22: Superávit comparado ao valor de mercado das posições de escolha
no Draft da NFL (fonte: Massey e Thaler, 2013)
Fig. 23: Prêmios do Deal or No Deal
Fig. 24: Índices de cooperação para os competidores do Golden Balls
(fonte: Van den Assem et. al., 2012)
Fig. 25: Resultados do Save More Tomorrow
(fonte: Thaler e Benartzi, 2004)
AGRADECIMENTOS

Um homem preguiçoso não consegue escrever um livro sem contar com


muita ajuda. Agradeço a John Brockman, que me induziu com jeitinho a
escrever este livro, como só ele sabe. Minhas editoras, W. W. Norton e
Penguin UK, foram pacientes e me deram todo o apoio, mesmo quando
acabei escrevendo um livro que não era aquele que estavam esperando.
Brendan Curry, na Norton, forneceu um nível de apoio editorial que é
cada vez mais raro. Ele leu cada palavra do original pelo menos duas vezes;
a maioria dos autores tem muita sorte se recebem um tratamento como
esse mesmo uma única vez. Alexis Kirschbaum, na Penguin, ajudou me
incentivando a levar o livro nesta direção, e foi fantástico em ver o quadro
geral. Ambos também foram muito divertidos. Allegra Huston deu o pingo
final de polimento com toda a serenidade e aprumo.
Muitos amigos leram as primeiras versões do livro, e, dado seu nível de
talento e a generosidade do tempo que me dedicaram, este deveria ser
realmente um livro muito melhor. Caroline Daniel, do Financial Times,
leu o manuscrito inteiro e fez comentários escritos à mão que eram quase
legíveis. Meu time dos sonhos como escritor, formado por Stephen
Dubner, Malcolm Gladwell e Michael Lewis, também leu e comentou as
várias versões. Michael levou um pedaço do livro em uma viagem para
percorrer uma trilha e me mandou um e-mail de três palavras dizendo
“Não é chato!”. Isso me fez seguir adiante por um tempinho. Todos os três
me deram o tipo de conselho que só verdadeiros mestres da sua arte podem
prover.
Cass Sunstein foi uma fonte constante de incentivo e conselhos sábios,
embora não consiga entender por que não terminei o livro pelo menos três
anos antes. Danny Kahneman ofereceu sua judiciosa sabedoria em cada
estágio, inclusive durante a edição de texto. Não é surpresa nenhuma que
Danny tenha ficado perplexo por eu ter conseguido terminar o livro. Maya
Bar-Hillel, Drew Dickson, Raife Giovinazzo, Dean Karlan, Cade Massey,
Manny Roman, Rohan Silva e Martijn van den Assem leram e fizeram
comentários detalhados sobre uma das versões iniciais que melhoraram
enormemente o livro. E o que posso dizer sobre o espantoso Jesse Shapiro,
que a esta altura já leu e editou cada palavra dos meus dois últimos livros?
Se Jesse algum dia escrever um livro, comprem. Será fantástico. Outros
amigos que ofereceram opiniões sobre várias seções incluem Nick
Barberis, Shlomo Benartzi, Alain Cohn, Owen Lamont, Andrei Shleifer e
Rob Vishny. Como sempre, conversei durante horas com Sendhil
Mullainathan sobre este livro, e ele o tornou mais inteligente, como
sempre faz. Craig Fox, um dos nossos muitos participantes das colônias de
férias, veio com o título no verão passado durante uma conferência. Esta
longa lista não inclui todos os amigos que tiveram de me escutar falando
sobre este projeto durante os últimos anos. Obrigado, pessoal!
Kevin Quealy criou todas as figuras do livro, fazendo-o com criatividade
e paciência. Na minha vida pós-livro, estou esperando ansiosamente para
assistir a alguns jogos de futebol americano com ele e conversar sobre a
estratégia da quarta descida.
A Booth School of Business da Universidade de Chicago forneceu apoio
financeiro para este projeto por meio do Center for Decision Reasearch e
da Initiative on Global Markets. Eles também me pagam para ir trabalhar
em um lugar onde cada dia posso ter esperança de aprender alguma coisa
com alguém mais inteligente que eu. Ah, e também me fornecem uma
ótima sala de trabalho. Se você leu até aqui, merece saber que tive a sorte
de cair na sétima escolha do draft das salas.
Para produzir este livro, três pessoas fizeram trabalho braçal. Dois
graduados nas colônias de férias Russell Sage compilaram e checaram as
referências; Paolina Medina passou parte do seu verão forçando-nos a
começar a tarefa, que então foi assumida por Seth Blumberg, que entrou
num frenesi de trabalho nas etapas finais em que conferiu tudo pelo menos
duas vezes e até me ajudou em algumas somas. Se os fatos do livro estão na
sua maioria certos, é deles o crédito, e aguardem para ler em breve seus
ótimos artigos de economia comportamental. Paolina, Seth e eu, todos nos
reportamos à grande Linnea Meyer Gandhi, que administrou todo o
processo de produção do livro como só uma consultora formada pela
Booth School é capaz. Simplesmente não consigo imaginar como eu teria
um dia acabado isto sem ela. (E ela também não consegue.)
Especialmente nas etapas finais, com uma porção de gente trabalhando
simultaneamente nas várias partes do livro, ela nos manteve
(especialmente a mim) organizados. Espero que Linnea gerencie uma
empresa em breve. Se ela contratar você, esteja preparado para trabalhar
duro. Ninguém jamais a chamaria de preguiçosa.
Por fim, contra todas as chances, France Leclerc continua a me
aguentar quando preferiria estar viajando pelo mundo em busca daquelas
imagens que só ela sabe capturar. E torna o meu mundo mais belo e
interessante.
SOBRE O AUTOR

© France Leclerc

Richard H. Thaler é professor de ciências comportamentais e economia na


Universidade de Chicago. Em 2015, foi presidente da American Economic
Association e, em 2017, recebeu o prêmio Nobel por suas contribuições ao
campo da economia comportamental.
LEIA TAMBÉM

A grande saída
Angus Deaton

O capital no século XXI


Thomas Piketty
Princípios
Ray Dalio

Você também pode gostar