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Método Paulo Freire

FREIRE, Paulo. Educação Como Prática da Liberdade. Rio de Janeiro: Ed.


Paz e Terra, 1967
Capítulo 4 - Educação e Conscientização - pg. 101

Paulo freire em seu livro Educação como prática para a liberdade (1967)
expõe os caminhos metodológicos que acreditava ser a forma mais adequada
ao trabalho com adultos. Ele acreditava na educação como processo libertador
da opressão das camadas dominantes da sociedade e entendia, também, que a
educação “massificava” os homens, com os conteúdos contidos nos livros
advindos de uma cultura que não representava a cultura do homem do campo,
por exemplo.
O método estrutura-se a partir de 3 etapas fundamentais: INVESTIGAÇÃO,
TEMATIZAÇÃO – PROBLEMATIZAÇÃO.

A primeira delas, INVESTIGAÇÃO, educador e educando buscam em seu


universo palavras de suas biografias e que serão os temas centrais. Vamos
voltar ao exemplo da cartilha que trouxe no início desta unidade... A aula da
cartilha estava embasada na sílaba BA e utilizava a frase BARRIGA DO BEBÊ.
As palavras BARRIGA e BEBÊ fazem sentido para quem? Será que fazem parte
do cotidiano de um adulto? No processo de investigação devemos dialogar com
nossos alunos para entendermos suas vidas, no que trabalham o que gostariam
de conhecer, o que conhecem e deste diálogo definir a próxima etapa a
TEMATIZAÇÃO. Nesta etapa “codificam e decodificam esses temas, buscando
o seu significado social, tomando assim consciência do mundo vivido”.(Instituo
Paulo Freire, 2005). Na próxima etapa, a de PROBLEMATIZAÇÃO o educador
e o educando buscam superar uma visão inicial do sentido da palavra buscando
uma visão mais crítica, na perspectiva de mudança de mundo.
Disponível em:
http://www.projetomemoria.art.br/PauloFreire/pensamento/01_pensamento_o%20metodo_paulo_freire.html

As etapas descritas mostram os princípios que regem o método. No livro,


Paulo Freire descreve o processo de alfabetização explicitado em 5 fases:

1ª fase: Levantamento do universo vocabular dos grupos com quem se


trabalhará. Essa fase se constitui num importante momento de pesquisa e
conhecimento do grupo, aproximando educador e educando numa relação
mais informal e, portanto mais carregada de sentimentos e emoções. É
igualmente importante a anotação das palavras da linguagem dos
componentes do grupo, dos seus falares típicos.

2ª fase: Escolha das palavras selecionadas do universo vocabular


pesquisado. Esta escolha deverá ser feita sob os critérios: a) da sua riqueza
fonética; b) das dificuldades fonéticas, numa sequencia gradativa das
menores para as maiores dificuldades; c) do teor pragmático da palavra, ou
seja, na pluralidade de engajamento da palavra numa dada realidade social,
cultural, política etc.

3ª fase: Criação de situações existenciais típicas do grupo com quem se


vai trabalhar. São situações desafiadoras, codificadas e carregadas dos
elementos que serão decodificados pelo grupo com a mediação do educador.
São situações locais que, discutidas, abrem perspectivas para a análise de
problemas locais, regionais e nacionais.

4ª fase: Elaboração de fichas-roteiro que auxiliem os coordenadores de


debate no seu trabalho. São fichas que deverão servir como subsídios, mas
sem uma prescrição rígida a seguir.

5ª fase: Elaboração de fichas para a decomposição das famílias


fonéticas correspondentes aos vocábulos geradores. Esse material poderá
ser confeccionado na forma de slides, stripp-filmes (fotograma) ou cartazes.
Disponível em:
http://www.projetomemoria.art.br/PauloFreire/pensamento/01_pensamento_o%20metodo_paul
o_freire.html. Acessado em: 18/12/2014

O Método pauta-se nas famílias fonéticas, tal qual a cartilha, mas tem uma
diferença essencial: o material não estava pronto, foi construído pelos
educandos juntamente com os educadores, criando-se sentido. As palavras
fazem parte do cotidiano dos educandos, saíram de suas práticas sociais.

A palavra geradora era a condutora dos trabalhos no método Paulo


Freire. A partir dela o trabalho se desenrolava. A palavra surgia das rodas de
diálogo entre educador e educando. É interessante destacar que:

Paulo Freire pensou que um método de educação construído em cima da


ideia de um diálogo entre educador e educando, onde há sempre partes de
cada um no outro, não poderia começar com o educador trazendo pronto, do
seu mundo, do seu saber, o seu método e o material da fala dele. Um dois
pressupostos do método é a ideia de que ninguém educa ninguém e ninguém
se educa sozinho. (BRANDÃO,1986-pg 21)

Vamos acompanhar um exemplo de trabalho com palavras geradoras


retirado do livro de BRANDÃO (1986-pg 53-54) que nos mostra uma ficha de
trabalho.

Palavra geradora: SALÁRIO


Ideias para discussão:

 A valorização do trabalho e a recompensa


 Finalidade do salário: manutenção do trabalho e de sua família.
 O horário do trabalho segundo a lei.
 O salário mínimo e o salário justo.
 Repouso semanal – férias – décimo terceiro mês.
Finalidades da conversa:

 Levar o grupo a discutir sobre a situação do salário dos camponeses.


 Discutir o porquê dessa situação.
 Discutir com o pessoal sobre o valor e a recompensa do trabalho.
 Despertar no grupo o interesse de conhecer as leis do salário.
 Levar o grupo a descobrir o dever que cada um tem de exigir o salário
justo.
Encaminhamento da conversa:
 O que é que vocês estão vendo neste quadro?
 Como é que está a situação do salário dos camponeses? Por que?
 O que é salário?
 Como deve ser o salário? Por que?
 O que é que a gente sabe das leis sobre salário?
 O que podemos fazer pra conseguir um salário justo?

Podemos perceber, claramente, que há muito mais do que o objetivo com a


alfabetização... Esta é a verdadeira educação transformadora da qual Paulo
Freire nos fala! A conscientização através do acesso a educação. Vejam que a
diferença com o trabalho com cartilhas é completamente diferente, concordam?

No Brasil tivemos vários materiais criados para a EJA e um deles, que se


aproximava da proposta de Paulo Freire, era o material elaborado pela Fundação
Educar, criada pelo governo federal para substituir o programa existente na
época, o MOBRAL. A criação deu-se nos anos 80, porém durou apenas uma
década. Nos anos 90 a Fundação foi extinta. O material utilizado tinha o seguinte
formato:

TIJOLO

Imagem elaborada pela autora

Há associação de texto/palavra e imagem e, a partir deste contexto, os


educandos deveriam pensar em outras palavras do mesmo contexto, como:
CIMENTO - PÁ – AREIA – ÁGUA – PAREDE

A regra não era pensar em palavras da mesma família silábica, mas


pensar em palavras do mesmo contexto. Diferente das cartilhas para crianças.

O princípio estabelecido era trabalhar com palavras que viessem do


cotidiano dos alunos, de seus trabalhos e ocupações.

Segundo DURANTE (1998) acreditava-se, por um longo período de


tempo, que a alfabetização dava-se primeiramente pela aquisição das letras,
seus sons, formação de sílabas, as regras ortográficas e de pontuação para que
depois pudessem aprender a escrever. Hoje, entendemos que não é apenas a
aquisição destes conhecimentos que fará do educando um leitor e um escritor
autônomo. A escrita nos serve para a comunicação, principalmente. A autora
aponta:

O uso da linguagem apresenta modalidades que contribuem para seu


aprimoramento. O conhecimento do uso e da função da linguagem tem mais
influência no planejamento do discurso que seu caráter oral ou escrito.
Podemos encontrar no discurso oral maiores semelhanças com a linguagem
escrita que em alguns textos escritos. Há adultos que apresentam um
discurso letrado, sem terem o domínio do sistema notacional. Isso rompe com
a concepção de que o domínio do sistema alfabético é pré-requisito para
aprendizagem da linguagem. Os dois processos podem ocorrer
paralelamente. A escrita alfabética corresponde a um sistema notacional e a
linguagem é um modo que se usa para escrever ou falar.(p.28)

VERBETE

sistema notacional - Diferentes estudiosos da consciência fonológica e defensores do


método fônico no Brasil e no exterior (cf., por exemplo, CAPOVILLA, CAPOVILLA, 2000;
MORAIS, 1996) assumem literalmente que a escrita alfabética seria um “código” e que as
crianças, para dominá-lo, precisariam apenas aprender o “princípio alfabético”, isto é
“compreender que em nossa escrita as letras representam os sons da fala”. Temos defendido
que a escrita alfabética é um sistema notacional e não um código (cf. MORAIS, 2005a) e que o
aparentemente simples domínio do tal “princípio alfabético” pressupõe um complexo trabalho
cognitivo, que implica compreender as propriedades daquele sistema e distingui-las das que
caracterizam outros sistemas simbólicos (como a notação numérica decimal). (Moraes, 2006)

Ainda segundo DURANTE (1998) desenvolver nos alunos adultos a


competência leitora e escritora é colocá-los diante de textos de uso social e fazê-
los compreender estes textos e mais, fazê-los produzir textos desenvolvendo a
competência leitora e escritora.
Paulo freire nos trouxe uma concepção de trabalho com adultos, mas que
na verdade tem grande embasamento teórico em autores importantes. Como cita
LAFFIN (2012):

Assumimos uma concepção de educação de idosos e adultos baseada no


pensamento de Vygotsky, para quem as relações do homem com o
mundo são fundamentalmente mediadas por instrumentos e signos. O
sujeito humano, em suas ações, cria instrumentos e signos para
transformar a natureza e a si mesmo, construindo a cultura.

Segundo estudos de vários autores – tais como Vygotsky (1993), Kohl de


Oliveira (1983), Oliveira (1999) e Luria (1990), entre outros –, adolescentes,
idosos e adultos diferem das crianças no processo de aprender, não
pelo modo como compreendem o objeto de conhecimento, mas pelo
modo como suas mentes trabalham para alcançá-lo. (grifos meus) – (pag
145)

É preciso pensar que estes jovens e adultos já passaram por experiências


em suas vidas, trabalham, tem suas famílias enfim, vivem! Esta é uma questão
que não podemos negligenciar. Ainda citando LAFFIN (2012):

Deve-se buscar o conhecimento que prepare homens e mulheres para o seu


tempo, ampliando a sua capacidade de agir na construção do novo,
compreendendo e criticando o que vem sendo produzido. Os conteúdos do
currículo de um projeto educativo para idosos e adultos deverão trazer
as temáticas sociais para a sala de aula, como conteúdos
sistematizados, capazes de favorecer a visão interdisciplinar que
permita a compreensão da totalidade concreta. Entende-se a necessidade
de valorizar a intencionalidade dos sujeitos na constituição da sua relação
com o saber ao procurarem a escolarização, uma vez que vivem numa
sociedade que valoriza práticas de uso da escrita e do conhecimento
sistematizado. Dessa forma, o sujeito se vê inserido num contexto. (pag 145-
146) – grifos meus

Há uma questão que permeia tudo isso... Os alunos analfabetos tem uma
baixa alto estima. Não é incomum ouvirmos frases, ditas por eles, como estas:

“Cavalo velho não pega trote”

“Papagaio velho não aprende a falar”

“Vivi assim até hoje!”

De certa forma há uma resignação a sua condição de analfabeto, por isso


esta forma de ver a educação e entenderem que não há necessidade de
frequentar a escola. Quando resolvem frequentar deparam-se com todas essas
questões que apontamos nesta unidade.

Disponível em:
http://www.saobernardo.sp.gov.br/comuns/pqt_container_r01.asp?srcpg=noticia_completa&ref=5880&qt1=0. Acessado
em: 18/12/2014

Referências Bibliográficas

DURANTE, M. Alfabetização de adultos: leitura e produção de textos. Porto


Alegre: Artmed, 1998.

FREIRE, P. Educação como prática da liberdade. Rio de Janeiro: Paz e


Terra, 1967

http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/Ensfund/alf_moarisconcpmetodalf.pdf -
Acessado em: 08/12/2014

INSTITUTO PAULO FREIRE. O método Paulo Freire. 2005. Disponível em:


http://www.projetomemoria.art.br/PauloFreire/pensamento/01_pensamento_o%
20metodo_paulo_freire.html. Acessado em: 10/12/2014.
LAFFIN, Maria Hermínia Lage Fernandes. Alfabetização de idosos e adultos
ou leitura e escrita? Rev. Port. de Educação vol.25 no.2. Braga 2012.
versão impressa ISSN 0871-9187. Disponível em:
http://www.scielo.gpeari.mctes.pt/pdf/rpe/v25n2/v25n2a07.pdf. Acessado em
18/12/2014.

MEC. Educação para jovens e adultos: ensino fundamental: proposta


curricular -1º segmento / coordenação e texto final (de) Vera Maria Masagão
Ribeiro; São Paulo: Ação Educativa; Brasília: MEC, 2001.
MEC. RESOLUÇÃO CNE/CEB Nº 1, DE 5 DE JULHO DE 2000. Diretrizes
Curriculares Nacionais para a Educação e Jovens e Adultos. Disponível em:
http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/CEB012000.pdf . Acessado em:
10/12/2014.

MORAIS, Artur Gomes de. Concepções e metodologias de alfabetização:


Por que é preciso ir além da discussão sobre velhos “métodos”? UFPE –
Centro de Educação e CEEL - Centro de Estudos em Educação e Linguagem.
2006. Disponível em:

VENTURA, Jaqueline P. Educação de Jovens e Adultos Trabalhadores no


Brasil: revendo alguns marcos históricos. Disponível em:
http://www.uff.br/ejatrabalhadores/artigo-01.htm. AcesSado em: 10/12/2014.

BRANDÃO, C. R. O que é o método Paulo Freire? 11ª ed. São Paulo: Editora
Brasiliense, 1986.

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