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Antes de mais nada, vamos definir o que entendemos por racismo: uma prática
discriminatória que se pauta na noção de raça, na idéia de que poderíamos agrupar as
pessoas ao redor de atributos fenotípicos (características observáveis a olho nu, tais
como a cor da pele, o tipo de cabelo, a espessura dos lábios, o tamanho da testa, o
formato do nariz etc.) e associar valores éticos e morais a esses atributos. Dessa noção
advém a idéia de que pessoas negras, ou com a pele mais escura, seriam,
naturalmente, mais burras, menos confiáveis, teriam o cabelo mais feio ou ruim etc.
Dito isso, gostaria de destacar que uma das questões mais freqüentes, quando
conversamos com professores sobre o racismo nas escolas, diz respeito à idéia de que
ele refere, somente, a discriminação sofrida por negros/as. Quer me parecer que o
racismo transcende a raça negra: o racismo é produto de uma cultura (no caso, a
cultura brasileira) e está inserido nas práticas presentes na totalidade das instituições –
escola, famílias, religiões etc.
Ora, se a escola está inserida na cultura, nada mais esperável do que ver,
dentro dela, cenas de racismo, cenas nas quais brancos reproduzem os valores que
foram ensinados a ter em relação aos negros e cenas nas quais os negros reproduzem
a submissão ao preconceito e à humilhação de que são vitimas. Pode, então, a escola
fazer de outro modo? Há espaço para romper esse círculo de violência – às vezes física,
às vezes simbólica – e ensinar a todos com respeito? Penso que sim. Desta parte,
gostaria de destacar que:
• não existe Cultura Infantil fora de uma determinada cultura mais ampla, que a
engloba;
Isso não remete a um discurso pela igualdade, mais deixa o aluno discriminado
mais confortado: sim, ele está em sofrimento por ser ridicularizado ou vítima de
preconceito e alguém se importa com esse fato, alguém notou... O professor! Nada de
discursos intermináveis – que só servem para deixar o agressor/racista com mais raiva
do agredido (e, às vezes, até desejando vingar-se). Algumas vezes, aliás, os professores
reforçam as noções racistas com suas explicações contraditórias (ainda que bem
intencionadas). Vejamos algumas cenas:
Considero que estas explicações religiosas, do tipo “para Deus somos todos
iguais”, reforçam a idéia racista: estamos dizendo PARA DEUS – ou seja, para Deus,
somente para Deus. O que podemos é conversar sobre o tema, criando condições
favoráveis para que os alunos externem suas posições, digam o que pensam – sem
medo de represálias, para que possam ter suas idéias confrontadas com outras, bem
diferentes, e possam, a partir desse confronto, verem abaladas suas posições.
Uma das cenas mais comuns nas escolas é a aversão que as crianças têm em
tocar os colegas de pele negra: quanto mais escura a cor da pele, pior. Essa aversão se
expressa de diferentes modos – não dar as mãos nas brincadeiras, não abraçar, não
dançar junto, não compartilhar objetos ou materiais. Está embutida, nesse
comportamento, a noção de que a cor pode ser “passada” para a pessoa: sabendo que
ter a pele escura não é bom, as crianças temem tornarem-se, elas próprias, vítimas da
discriminação que perpetram. Se escurecerem serão isoladas, não serão aceitas, não
terão afago e carinho.
Está presente, aqui, também a idéia de que há uma essência negra (a cor da
pele, o cabelo): a idéia de que negro é quem negro parece (mestiços, pardos, mulatos
etc.), ou seja, quanto mais claros, menos vistos como negros. Há uma essencialização
da cor. Parece assustador, mas os educadores que estão lendo este texto sabem bem o
que estou afirmando, pois já presenciaram estas cenas. Vamos ver alguns relatos, para
percebermos onde e como isso acontece.
Não cabe aqui questionar a importância destes estudos, mas apontar que,
enquanto os “alvos” desta violência foram as crianças negras, não havia tanta
preocupação. Agora que as crianças agredidas são brancas, de classe média,
parecemos ter acordado. É fato inegável que o racismo nas escolas não se limitou ao
discurso: ele se traduziu, muitas vezes, em atos agressivos que colocaram (e ainda
colocam) em risco a integridades dos alunos. Vejamos mais dois relatos:
Caso 1: Seus colegas maltratavam-na diariamente por ela ter a pele negra.
Na aula de matemática a menina foi ao banheiro, quando voltou, um de
seus colegas colocou o pé para que ela caísse. Todos riram com o
desequilíbrio da menina.
Caso A: “R” foi escolhida para fazer o papel da virgem Maria na peça do final
de ano. Aquilo foi a gota d’água: no final da tarde, quando saía da escola ela
foi cercada por 20 colegas que a espancaram. A família, apavorada, preferiu
transferí-la de escola, sem prestar queixa.