Você está na página 1de 8

UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLÂNDIA

FACULDADE DE EDUCAÇÃO - FACED

CURSO DE JORNALISMO

KAREN KRISTINE FERREIRA MUNIZ - 11611JOR021

Teorias da comunicação revisitadas por Luís Mauro Sá Martino

Resenha apresentada como exigência parcial para


aprovação na disciplina Teorias da Comunicação II do
Curso de Jornalismo da Universidade Federal de
Uberlândia.

UBERLÂNDIA - 2017
TEORIAS DA COMUNICAÇÃO REVISITADAS POR LUÍS MAURO SÁ MARTINO
MARTINO, Luís. Teoria da comunicação: ideias, conceitos e métodos. 5.ed. Petrópolis,
RJ: Vozes, 2014.
A obra Teoria da comunicação: ideias, conceitos e métodos de Luís Mauro Sá
Martino, segundo o autor, foi pensada a partir de outros clássicos de Teoria da Comunicação,
e é introduzida com uma discussão sobre a obra em si. Segundo Martino, o trabalho de
explicar Teorias comunicacionais de uma maneira mais acessível se trata de um processo de
leitura e tradução, no qual simplifica-se o complexo ao aplicá-lo à realidade imediata. A
composição do livro se dá por uma perspectiva dos paradigmas comunicacionais, é
segmentado em seções, capítulos e tópicos e possibilita uma leitura independente dos
capítulos. Martino salienta que a obra busca apresentar, ou melhor, introduzir o leitor as
principais ideias dos autores das teorias, mas não resume de forma alguma a imensidão de
conceitos que cada teoria abriga.

Luís Mauro Sá Martino é formado em Jornalismo pela Cásper Líbero, fez Mestrado e
Doutorado em Ciências Sociais na PUC-SP, e pós-doutorado na School of Political, Social
and International Studies na Universidade de East Anglia (Norwich, UK) em 2008. Para
organizar a obra aqui resenhada, o autor afirma que objetiva construir um cenário do campo
da comunicação que aponta trilhas para outros inícios, não possuindo em nenhum momento a
pretensão de dar conta de todo o campo comunicacional.

Na introdução da obra o autor busca traçar um contorno para o que seria a Teoria da
comunicação, que não apresenta um cânone na discussão como várias outras ciências
apresentam, uma problemática já discutida por Robert Craig (CRAIG 1999, p. 119 apud
SODRÉ, 2012, p. 13) , que afirma que com exceção do interior de pequenos grupos, os
estudiosos apenas se ignoram; informação salientada por Martino com uso de dados que
exprimem um desconsenso nos estudos do campo comunicacional, apenas 23,5% das teorias
apresentadas como comunicacionais são consideradas como tais por todos os autores. Com
tudo isso levado em consideração Martino afirma,

“Teoria da comunicação” é uma área de fronteiras indefinidas, na


intersecção de vários conceitos, métodos e práticas vindos de outras áreas do
conhecimento, da psicanálise aos estudos de política, sem uma maior
articulação entre eles (...) é uma área que constrói seu objeto ressaltando o
aspecto comunicativo de qualquer relação social, uma perspectiva que ocupa
espaço na paisagem acadêmica por identificar a possibilidade de um objeto
único e múltiplo ao mesmo tempo. Qualquer relação social se estrutura
sobre ações recíprocas diversas, e há um componente de comunicação em
todas elas. Destacar esse elemento e submetê-lo a uma análise parece definir
a unidade plural da Teoria da comunicação. (MARTINO, 2014, p. 13-14).
O autor destaca o fato de que o livro traz autores que podem ser questionados quanto
a pertença ao campo comunicacional, mas que a comunicação é um estudo do qual os limites
se estendem a outras áreas e perspectivas, desde que a relação comunicacional seja o objeto
central do estudo. Em sequência, Martino explana sobre o conceito do termo “teoria”, à luz
de Nigel Gilbert autor de Researching for life, ao afirmar que “assim como uma lente, uma
teoria ajuda a ver aspectos da realidade nas entrelinhas do cotidiano (...), é sempre reflexiva:
ela é criada a partir de pesquisas sobre fatos reais e, mais tarde, auxilia na compreensão de
acontecimentos semelhantes” (2014, p. 15-16). O autor refere-se então a Teoria da
comunicação no Brasil, a qual optou por não abordar na obra por ser um tema complexo que
requer uma obra exclusiva dedicada ao assunto.

Assim, como a obra de Martino não assume a responsabilidade de sintetizar todo o


campo comunicacional, a esta resenha não cabe um resumo do livro de Martino, mas uma
introdução a suas discussões e abordagens. Resenhar esta obra não é um desafio tão grande
quanto desenhar o cenário do campo comunicacional, mas requer assim como o livro uma
complexa curadoria ao que deve ser mencionado. Definidas as fronteiras desta resenha
introduzimos ao desenvolvimento da obra.

O livro é segmentado em quatro seções, sendo a primeira intitulada “A produção da


comunicação”, nesta seção são apresentadas ao leitor correntes teóricas e Escolas que
buscaram compreender o processo de produção comunicacional. O primeiro capítulo é
referente a pesquisa norte-americana em comunicação, que foi a pioneira nos estudos de
comunicação de massa (Mass Communication Research) e catalisou a criação de vários
modelos teóricos para compreender as relações entre a comunicação e a sociedade no início
do século XX..

Esta corrente, abriga inúmeros teóricos desde Lippmann com sua análise do discurso
comunicacional na sua obra Public Opinion, as visões funcionalistas de Lasswell, Merton e
Lazarsfeld; além da formulação de modelos teóricos que buscavam dar conta do processo
comunicativo, modelos lineares, circulares e espirais. E conceitos que são muito relevantes na
produção jornalística, como newsmaking, gatekeeping, empresa comunicacional e efeito de
enquadramento. No que tange a abordagem de tais teorias e modelos Martino se atém ao
postulado de introdução, abordagens simples e claras que intencionam apresentar de forma
primária o conteúdo; a ordenação dos tópicos não é deliberada, mas garante uma narrativa
complementar que constrói o entendimento das pesquisas. Diversas figuras são usadas como
recurso para ilustrar modelos e teorias, sistematizando a compreensão.

O segundo capítulo da seção aborda a Escola de Frankfurt, ou casa da teoria crítica.


Seus precursores foram Adorno, Horkheimer, Benjamin e Habermas os quais Martino traça
uma pequena biografia que possibilita uma compreensão macro das críticas realizadas. A esta
escola pertence a crítica da “indústria cultural”, que Martino descreve a problemática erguida:
“a cultura era criada conforme as exigências de um modelo empresarial de produção (...) o
lucro orienta a produção, e o espaço da criação individual é eliminado em virtude da lógica
de produção coletiva” (2014, p. 51-53). O autor recorre a exemplos nacionais como a Folha
de São Paulo, sendo fiel a premissa de aplicação a realidade imediata para simplificação.
Martino expressa, neste contexto, uma preocupação com a vanguarda artística que não
encontrou seu lugar neste circuito de produções, sendo necessárias adaptações para serem
aceitas pelo grande público, que já possui uma exigência moldada. Conceitos como
reprodutibilidade técnica e esfera pública também são de autorias da Escola Alemã a qual
Martino traduz e classifica como crítica, deixando trilhas para aprofundamento durante sua
escrita, quando apresenta o referencial usado pelos principais autores da Escola.

O terceiro capítulo introduz a crítica marxista, o qual traça o caminho que dirigiu o
marxismo a comunicação começando pelo conceito de ideologia; buscando conceder uma
autonomia maior ao leitor na interpretação da corrente, Martino apresenta primeiramente o
pensamento marxista alienado de sua relação com a comunicação e em seguida as
interpretações congruentes ao campo comunicacional. Interpretações que conferem para a
ideologia o subtexto nos produtos de massa, com a utilização de exemplos acessíveis Martino
traduz a realidade destas teoria em desenhos animados como Pato Donald. Para alguns
teóricos, neste sentido a massificação da cultura também acarreta perda de território político e
auxilia na construção do senso comum, que se cria a partir da adoção de ideologias implícitas
nos produtos de massa. Martino apresenta também teóricos que consideravam a resistência do
receptor, como Gramsci, que é apropriado pelo campo da comunicação e que considera a
hegemonia uma negociação de sentidos e não uma imposição, adotando um perfil mais sutil
de influência.

No quarto e último capítulo desta seção o autor traz conceitos como da


intersubjetividade, experiência e comunicação que apesar de não incluir uma discussão das
mídias se faz relevante por identificar a partilha de signos da sociedade e auxilia na
construção social da realidade; que é de extrema importância ao se pensar a comunicação
pela mídia. E apresenta também o teórico Luhmann que coloca em xeque a efetividade do
processo comunicativo devido às variáveis de interpretação.

É possível observar a construção dos capítulos no contexto da seção que adota um


paradigma processual da comunicação, com teorias e modelos que buscam compreender
como funciona e em alguns casos aplicar críticas em sua análise; Martino apresenta de forma
simplificada e apesar de possibilitar uma leitura independente dos capítulos é impossível não
visualizar uma possibilidade de leitura hipertextual, não de forma negativa, mas de forma
complementar.

A segunda seção é intitulada “Do texto ao contexto” e creio que ao se defender de


possíveis acusações de uso de autores de fora da comunicação Martino se referia a alguns
autores desta seção; nela são discutidos estudos filosóficos da linguagem, a genealogia e
fisionomia da mesma, como na triangulação na compreensão de palavras e seus significados.
Mas no curso de sua narrativa os autores são muito bem justificados. Como, no primeiro
capítulo, Jean Piaget que discute a racionalidade humana, que foi tão defendida no
modernismo, presente no processo linguístico. E Chomsky que defende a razão e a linguagem
como sendo uma capacidade indiscriminável ao homem, diferente de outras habilidades, que
precisam serem desenvolvidas; Chomsky aponta como as estruturas sintáticas são inatas mas
estão sujeitas a apropriações do indivíduo, o que chama de “microidioma”, e também realiza
uma crítica da mídia a respeito da “distorção sistemática da informação”. Todos esses temas
são visualizados como relevantes para os estudos comunicacionais.

Nesta seção Martino traça as fronteiras da semiótica e semiologia sendo estas


vinculadas a Escola Francesa e pesquisas norte-americanas, nesta ordem. Na apresentação
destes conceitos Martino recorre a semiótica soviética que o auxilia na exemplificação da
relação da mídia com este sistema de signos. E introduz esse conceito também na noção do
discurso. No terceiro capítulo, Martino introduz o estruturalismo que é uma corrente teórica
que busca compreender como o significado é fixado, afirmando não apontar as fronteiras
entre a semiótica e o mesmo propositalmente. Neste capítulo há a construção de uma
hipertextualidade ao passo que o autor recorre a pesquisa norte-americana e a Escola de
Frankfurt para exemplificar a análise estrutural de Eco, criando uma intertextualidade
aparente dentro do próprio livro, que já era esperada. Relacionando o significado ao exercício
de poder, traz à luz Michael Foucault que apresenta este como uma atividade sutil,
“disfarçada nos meandros dos discursos cotidianos” (2014, p. 147) e podendo ser definido
deliberadamente. Foucault autor do livro vigiar e punir aponta a explicitude das relações de
poder no sistema panóptico que objetiva a vigilância e o controle, contrastando com a
atividade sutil de exercício do poder no estruturalismo.

No quarto capítulo, Martino busca ilustrar como as práticas midiáticas se integram a


outras práticas sociais e as transformam, usando exemplos próximos ao contexto brasileiro
para facilitar a compreensão, introduz gêneros, em geral televisivos, que aparentam realidade.
E traz a discussão das diferentes realidades como a realidade transmitida é diferente daquela
que é apresentada. Neste contexto, Boris Kossoy também apresenta uma concepção, a qual se
refere como 2ª realidade, sendo esta uma representação, um recorte que depende do ponto de
vista, logo a realidade apresentada não é de forma alguma a realidade presenciada.

Trazendo a discussão do real para o campo digital também é possível introduzir a


“cultura da virtualidade real” de Manuel Castells, que discute como a presença tecnológica
criou uma cibercultura que simula uma realidade, já que em conceito o virtual é apresentado
por Mcluhan como potência de ser, mas não é.

A terceira seção intitula-se Estudos de recepção e vale a redundância ao afirmar que


nesta seção Martino apresenta o campo comunicacional com o receptor sob perspectiva,
introduzindo um pensamento que tece a complexidade da recepção, diferente de perspectivas
anteriores, dando grande destaque a consciência individual e a interpretação do receptor.
Adotando essa perspectiva os conceitos e problemáticas erguidas por outras escolas são
relativizadas; dando origem a novas teorias como a Teoria das Mediações, que considera o
contexto de recepção da mensagem e os julgamentos inferidos pelo receptor devido sua
construção pessoal. O que torna a narrativa de Martino de mais fácil compreensão entre
vários fatores, é a possibilidade de notar a progressão das Escolas e correntes teóricas, devido
a contextualização temporal e correlação explícita. Nesta seção são apontados mais uma vez
os estudos norte-americanos, alguns reformulados para compreender a demanda de análise da
recepção. E apresenta-se novamente modelos que tentam compreender o processo, dessa vez
de recepção, e os conhecimentos são embasados principalmente em experimentos sociais.
Modelos como agenda setting e a espiral do silêncio, se encontram dentro da análise sob esse
paradigma.

Na quarta e última seção Martino desenvolve um embate entre autores que defendem
e atacam a modernidade para definir os conceitos da pós-modernidade que possui raízes na
falha dos princípios da modernidade. O autor esquematiza as críticas pós-modernas que
rompem com a modernidade de forma a ser visualizada em um quadro comparativo. Neste
contexto pós-moderno apresentado por Martino surgem estudos de processos
comunicacionais como os Estudos Culturológicos Ingleses que são uma mistura de várias
correntes teóricas como o Estruturalismo Francês, a Semiótica e a pós-modernidade
compreendida por Foucault; em um estudo das culturas populares e de massa sob uma
perspectiva inédita. Martino também aponta outras análises de práticas comunicativas em
ambientes característicos da pós-modernidade, como o ambiente digital.

A obra Teoria da Comunicação: ideias, conceitos e métodos, cumpre exatamente com


a proposta inicial que Martino introduz, desenhar o cenário comunicacional, introduzindo um
panorama das teorias, conceitos, modelos e autores. A narrativa do autor é muitas vezes
quase literária, o que torna a leitura mais leve e facilita a compreensão do conteúdo. É
possível assumir que a própria ordenação da obra cria uma narrativa particular que expressa o
ponto de vista de Martino e não foi decidida ao acaso; também proporciona uma leitura que
ao passo que é independente é complementar. A leitura de um capítulo não exige o outro, mas
há uma perspectiva mais ampla se o leitor seguir a ordem proposta pela obra. Uma introdução
à teoria da comunicação de forma dinâmica e acessível para um público que abrange de
estudantes a pesquisadores.

REFERÊNCIAS

CASTELLS, M. A cultura da virtualidade real: a integração da comunicação eletrônica, o fim


da audiência de massa e o surgimento das redes interativas. In: A sociedade em rede: Era da
informação, v. 1. São Paulo: Paz e Terra, 2012

KOSSOY, B. Realidades e Ficções na Trama Fotográfica. São Paulo, Ateliê Editorial,


1999. p. 60.

MARTINO, Luís. Teoria da comunicação: ideias, conceitos e métodos. 5.ed. Petrópolis,


RJ: Vozes, 2014.
SODRÉ, Muniz. Comunicação: um campo em apuros teóricos. Matrizes. Ano 5 - Nº 2,
jan/jun. 2012, São Paulo, Brasil, p. 11-27

Você também pode gostar