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Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 2008.

075056-3, de Tijucas
Relator: Des. Sérgio Izidoro Heil

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI


MUNICIPAL N. 1.003/93, DE TIJUCAS. NOTIFICAÇÃO DA
CÂMARA MUNICIPAL PARA PRESTAR INFORMAÇÕES
NÃO ATENDIDA. FATO QUE NÃO OBSTA A APRECIAÇÃO
DO MÉRITO DA AÇÃO. NOMEAÇÃO DE CURADOR
ESPECIAL DESNECESSÁRIA. PRELIMINARES. NORMA
IMPUGNADA QUE SE REVESTE DA QUALIDADE DE LEI
EM SENTIDO MATERIAL. POSSIBILIDADE DE
QUESTIONAMENTO PELA VIA DO CONTROLE
ABSTRATO DE CONSTITUCIONALIDADE. NORMA
CONSTITUCIONAL DE REPETIÇÃO OBRIGATÓRIA
UTILIZADA COMO PARÂMETRO DE CONTROLE. FATO
QUE NÃO ALTERA A COMPETÊNCIA PARA
PROCESSAMENTO E JULGAMENTO DA PRESENTE
AÇÃO DIRETA. MÉRITO. INSTITUIÇÃO DE VANTAGEM
PECUNIÁRIA AOS SERVIDORES PÚBLICOS MUNICIPAIS.
CONCESSÃO NÃO FUNDAMENTADA EM CRITÉRIOS QUE
TENHAM ESPECIAL SIGNIFICAÇÃO PARA A
ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. INEXISTÊNCIA DE
RAZOABILIDADE. VANTAGEM VARIÁVEL ENTRE 10% E
100% DOS VENCIMENTOS DO SERVIDOR. AUSÊNCIA DE
DISPOSIÇÃO, PELA LEI, DE GRADAÇÃO LEGAL.
PRINCÍPIO DA LEGALIDADE. IRRELEVÂNCIA, NO PONTO,
DA EXISTÊNCIA DE DECRETO QUE REGULAMENTA A
MATÉRIA. ADOÇÃO POR ESTE, ADEMAIS, DE CRITÉRIOS
DE AVALIAÇÃO SUBJETIVOS E OBSCUROS.
IMPOSSIBILIDADE DE AVERIGUAÇÃO DE EVENTUAL
DESRESPEITO À ISONOMIA DE VENCIMENTOS. TEXTO
LEGAL QUE ESTABELECE, AINDA, PLENA
DISCRICIONARIEDADE DO ALCAIDE PARA RETIRAR
EFICÁCIA DA LEI, DEFERIR OU INDEFERIR A VANTAGEM
E DEFINIR O RESPECTIVO VALOR. VIOLAÇÃO AO
PRINCÍPIO DA LEGALIDADE. UTILIZAÇÃO DA LEI, AINDA,
COMO SUBSTITUTIVO DE REVISÃO DOS VENCIMENTOS
DOS AGENTES PÚBLICOS. POSSIBILIDADE DE
REDUÇÃO DOS GANHOS DOS SERVIDORES. NÃO
ATENDIMENTO AO PRINCÍPIO DA IRREDUTIBILIDADE.
INCONSTITUCIONALIDADE EVIDENCIADA. PEDIDO
INICIAL PROCEDENTE. MODULAÇÃO DOS EFEITOS.
I. Apenas as leis e atos normativos que possuem "um
coeficiente mínimo de abstração ou, pelo menos, de
generalidade" (QO na MC na ADI 1937/PI, rel. Min.
Sepúlveda Pertence, j. 20/06/2007) podem se sujeitar ao
controle concentrado de constitucionalidade. Assim, estando
a lei ora questionada dotada deste coeficiente de abstração,
não há que se falar em inépcia da inicial.
II. Remanesce a competência da Corte Catarinense para
processamento e julgamento de Ação Direta de
Inconstitucionalidade ainda que o preceito da Constituição
Estadual invocado como parâmetro de controle constitua
norma de repetição obrigatória.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Ação Direta de


Inconstitucionalidade n. 2008.075056-3, da comarca de Tijucas (1ª Vara), em que
é reqte o Coordenador Geral do Centro de Apoio Operacional do Controle de
Constitucionalidade Ceccon, e reqdos o Prefeito Municipal de Tijucas e outros:

ACORDAM, em Órgão Especial, por votação unânime, afastar as


preliminares e, no mérito, julgar procedente o pedido inicial, com modulação dos
efeitos. Custas legais.

RELATÓRIO

Trata-se de ação direta de inconstitucionalidade promovida pelo


Procurador-Geral de Justiça, por meio do Coordenador Geral do Centro de Apoio
Operacional do Controle de Constitucionalidade – CECCON, e pelo Promotor de
Justiça da comarca de Tijucas em face da Lei municipal n. 1.003/93, daquele
município.
Alegam os requerentes, em síntese, que o normativo impugnado é
inconstitucional por três razões, in verbis (fl. 04):
a) A lei não expõe critérios objetivos e procedimento formalizado para a
aferição dos aspectos justificantes do benefício, o que possibilita o tratamento
desigual entre servidores e impede o controle judicial dos atos de concessão,
quantificação e revogação do benefício;

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b) A lei estabelece como fundamentos da concessão da "vantagem
pessoal" critérios inerentes à própria função pública, que não denotam qualquer
característica excepcional justificadora de algum benefício complementar ao
vencimento correspondente ao cargo;
c) A lei atribui ao Chefe do Executivo o poder discricionário para a
concessão da vantagem pessoal.
Entendendo violado o artigo 16, caput, da Constituição Estadual
(norma simétrica ao artigo 37, caput, da Constituição Federal), pretendem os
requerentes a concessão de medida cautelar para suspender a eficácia da lei
impugnada – inclusive com a suspensão do pagamento da vantagem instituída
pela referida lei – e, no mérito, a procedência do pedido inicial para declarar a
inconstitucionalidade do artigo 1º da referida lei e das normas que dela
sucederem.
Ao feito foi conferido, por despacho do antigo relator, Des. Hilton
Cunha Júnior, o rito do artigo 12 da Lei Estadual n. 12.069/01 (fl. 28).
Notificado, o alcaide de Tijucas sustentou preliminar de carência de
ação aos argumentos de que a norma impugnada é lei de efeitos concretos, não
sendo passível de impugnação pela via do controle concentrado, e de que o texto
constitucional eventualmente violado foi o da Constituição Federal, pelo que
incabível a ação direta de inconstitucionalidade perante a Corte estadual. No
mérito, sustentou a constitucionalidade da norma, em observância ao princípio da
igualdade, dada a existência de regular processo administrativo para apuração da
competência, assiduidade, eficiência e dedicação ao trabalho, critérios objetivos
estabelecidos na lei para concessão da vantagem. Sustentou não existirem
dificuldades na aferição de tais critérios porque "(...) o município de Tijucas
possui poucos servidores, no qual o Prefeito Municipal conhece pessoalmente
todos eles e interage com os mesmos no dia-a-dia de trabalho, e governa o
município com o auxílio de seus secretários, sendo realizados procedimentos
administrativos para averiguarem os casos concretos de concessão da vantagem
pessoal".
Após afirmar a inexistência de fumus boni iuris e de periculum in

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mora, especialmente em face dos anos decorridos desde a vigência da lei,
pretendeu a denegação da medida liminar pretendida.
Concluiu pleiteando o acolhimento da preliminar apresentada, com a
conseqüente extinção do feito sem julgamento de mérito, e, no mérito, o
julgamento de improcedência do pedido inicial (fls. 33/40).
Citado, o Procurador-Geral do Município defendeu o ato impugnado,
argüindo preliminarmente a carência de ação, nos mesmos moldes em que
suscitada pelo Prefeito. No mérito, reiterou os argumentos expostos nas
informações prestadas pelo alcaide, acrescentando, ainda, que o chefe do
executivo municipal faz uso de seu poder discricionário para conferir a vantagem
aos servidores "mais sacrificados" (fl. 61), em especial por conta da defasagem
de alguns vencimentos, sempre respeitando a necessidade de prévio processo
administrativo para aferição dos critérios legais de concessão da benesse.
Afirmou, ainda, que o benefício é concedido especialmente aos servidores que
percebem "(...) um salário não conivente com a função que desempenha, em
total desarmonia com a realidade, e desde que, avaliado para comprovar que faz
jus, poderá ser contemplado".
Sustentou a inexistência dos pressupostos indispensáveis à
concessão da medida cautelar, nos mesmos moldes do que foi dito pelo Prefeito,
pretendendo a denegação da decisão liminar pretendida.
Concluiu com pedidos de acolhimento da prefacial ou, no mérito, de
improcedência dos pedidos iniciais (fls. 54/66).
A Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra do Procurador
de Justiça Plínio César Moreira e do Promotor de Justiça Mauro Canto da Silva,
opinou pela procedência dos pedidos iniciais (fls. 74/78).
Criado o Órgão Especial desta Corte, vieram redistribuídos os autos
em 05/03/2010.

VOTO

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I. Cabe destacar, inicialmente, que a câmara municipal de Tijucas,
mesmo notificada para apresentar informações, quedou-se inerte, sem sequer
nomear procurador.
Em que pese a lamentável omissão, esta não obsta o conhecimento
do mérito da demanda, porque a manifestação da legislativo municipal não se
reveste da qualidade de defesa do ato impugnado, dever este pertencente ao
procurador do município. Somente a ausência de defesa do ato ensejaria a
necessidade de nomeação de curador especial, o que não é o caso dos autos.
Isto ponderado, passa-se à análise da preliminar de mérito
suscitada nas informações prestadas pelo alcaide e na defesa apresentada pelo
procurador do município.
II. Suscitou-se a carência de ação aos argumentos de que a lei
impugnada é de efeitos concretos, não sendo passível de controle de
constitucionalidade pela via concentrada, e de que o texto constitucional
efetivamente atingido é aquela da Carta da República.
As alegações, contudo, não procedem.
É certo que, como assinalado nas informações e na defesa da lei
impugnada, o controle concentrado encontra limites na abstração do comando da
norma impugnada. Não pode ela se direcionar a uma relação jurídica concreta, a
um caso específico, mas apenas a uma relação jurídica em abstrato, com um
mínimo de densidade normativa.
Nestes termos, assinala Hely Lopes Meirelles:
A jurisprudência do STF tem considerado inadmissível a propositura de
ação direta de inconstitucionalidade contra atos de efeito concreto. Assim, tem-
se afirmado que a ação direta é o meio pelo qual se procede ao controle de
constitucionalidade de normas jurídicas in abstracto, não se prestando ela "ao
controle dos atos administrativos que têm objeto determinado e destinatários
certos, ainda que esses atos sejam editados sob a forma de lei – as leis
meramente formais, porque têm forma de lei, mas seu conteúdo não encerra
normas que disciplinam relações em abstrato" (in: Mandado de Segurança. 28.
ed. São Paulo: Malheiros, 2005. p. 366).
Do STF, os seguintes julgados sobre a matéria enfocada:
Agravo regimental em ação direta de inconstitucionalidade. Item 2 - no que
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se refere a créditos provenientes do Estado do Amazonas - e Anexo II, item 1.1,
do Comunicado CAT 36, da Coordenadoria da Administração Tributária do
Estado de São Paulo. 2. O Comunicado CAT-36/2004, da Coordenadoria de
Administração Tributária do Estado de São Paulo, constitui mero ato
administrativo despido de normatividade, isto é, não é ato normativo autônomo,
geral e abstrato e, portanto, não pode ser submetido à fiscalização abstrata de
sua constitucionalidade, conforme a consolidada jurisprudência desta Corte. 3.
Agravo regimental desprovido (AgR na ADI 3350/SP, rel. Min. Gilmar Mendes, j.
28/08/2008).
Ainda:
Não há, na presente Ação Direta de Inconstitucionalidade, a impugnação
de um ato normativo. Não se pretende a suspensão cautelar nem a declaração
final de inconstitucionalidade de uma norma, e sim de uma destinação de
recursos, prevista em lei formal, mas de natureza e efeitos político-
administrativos concretos, hipótese em que, na conformidade dos precedentes
da Corte, descabe o controle concentrado de constitucionalidade como previsto
no art. 102, I, "a", da Constituição Federal, pois ali se exige que se trate de ato
normativo. Precedentes (QO na ADI 1640, rel. Min. Sydney Sanches, j.
12/02/98) (grifo nosso).
Com igual teor, os seguintes excertos desta Corte:
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - DISPOSITIVOS
INSERIDOS, POR EMENDAS DE INICIATIVA PARLAMENTAR, EM ANEXO
DA LEI DE DIRETRIZES ORÇAMENTÁRIAS DO MUNICÍPIO DE TIMBÓ PARA
O EXERCÍCIO DE 2004 - INVIABILIDADE DO CONTROLE DE
CONSTITUCIONALIDADE CONCENTRADO NA ESPÉCIE, POR SE TRATAR
DE NORMAS DE EFEITOS CONCRETOS E VIGÊNCIA TEMPORÁRIA -
INADEQUAÇÃO DA VIA PROCESSUAL - CARÊNCIA DA DEMANDA -
EXTINÇÃO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO (ADI n. 2003.023006-8, de
Timbó, rel. Des. Gastaldi Buzzi, j. 20/07/2005).
Finalmente:
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - LEI MUNICIPAL N.
2.212/09 DE PRAIA GRANDE ¿ LEI MUNICIPAL QUE AUTORIZA O
PREFEITO A FIRMAR CONVÊNIO COM A APAE MUNICIPAL E CONCEDE-
LHE DOTAÇÃO ORÇAMENTÁRIA - ATO ADMINISTRATIVO DE EFEITO
CONCRETO - AUSÊNCIA DE ABSTRAÇÃO, GENERALIDADE OU
NORMATIVIDADE DO PRECEITO LEGAL - INVIABILIDADE DE
QUESTIONAMENTO DA NORMA PELO PROCEDIMENTO ELEITO -
EXTINÇÃO DO PROCESSO.
- "'Não se conhece de ação direta de inconstitucionalidade contra atos
normativos de efeitos concretos, ainda que estes sejam editados com força
legislativa formal' (ADIN n. 1.716, Min. Maurício Corrêa)." (Ação Direta de
Inconstitucionalidade n. 2002.026780-0, de Joinville, Relator: Des. Mazoni
Ferreira, j. em 04.08.04) (ADI n. 2009.032169-5, de Santa Rosa do Sul, rel. Des.
Sérgio Roberto Baasch Luz, j. 25/08/2009).
Não obstante referido entendimento, é impossível afirmar que a lei

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questionada nos presentes autos seja um ato de efeito concreto. Diversamente, o
texto legal questionado possui "(...) um coeficiente mínimo de abstração ou, pelo
menos, de generalidade" (QO na MC na ADI 1937/PI, rel. Min. Sepúlveda
Pertence, j. 20/06/2007), uma densidade normativa minimamente suficiente para
que seja caracterizado como lei em sentido material, passível de sindicância em
sede de controle concentrado.
Tal constatação não é afastada pelo argumento de que o normativo
regulamenta relações da municipalidade com pequeno grupo de cidadãos – no
caso, os próprios servidores municipais. Ainda que nem todos os cidadãos
submetidos aos ditames daquele ente federado sejam atingidos pelo normativo
questionado, rege este múltiplas relações jurídicas, conferindo direitos mas
condicionando-os a certos requisitos, o que demonstra não ser ele lei apenas em
sentido formal, mas também em sentido material.
Não há como, portanto, acolher a prefacial por este ângulo.
Por outro norte, o fato de os princípios constitucionais estaduais
apontados como parâmetro de controle traduzirem mera reprodução daqueles
contidos na Carta da República não retira a competência desta Corte de Justiça
para apreciação e julgamento da presente Ação Direta. Isto porque que, nestes
casos, realmente se questiona dispositivo pertencente à Carta Estadual, atraindo
a competência deste Tribunal de Justiça (CE, art. 83, XI, "f"), embora restando
autorizado, em tese, recurso extraordinário à Corte Suprema.
Neste sentido, as seguintes decisões do Excelso Pretório:
CONSTITUCIONAL. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE:
TRIBUNAL DE JUSTIÇA. LEI MUNICIPAL FRENTE À CONSTITUIÇÃO
ESTADUAL. NORMAS DE REPRODUÇÃO OBRIGATÓRIA. CABIMENTO DA
AÇÃO DIRETA E DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO: EFEITO SUSPENSIVO.
I. - Cabimento da ação direta de inconstitucionalidade, no Tribunal de
Justiça estadual, que tem por objeto lei municipal frente à Constituição estadual,
reproduzindo esta normas de reprodução obrigatória. Cabimento do recurso
extraordinário.
II. - Precedentes do STF: Rcl 383/SP, Moreira Alves p/ o acórdão, "DJ" de
21.5.93; RE 190.985/SC, Néri da Silveira, Plenário; RREE 182.576/SP e
191.273/SP, Velloso, 2ª T. (AgR na Pet 2788 AgR/RJ, rel. Min. Carlos Velloso, j.

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24/10/2002).
Ainda:
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE DE LEI MUNICIPAL,
PROCESSADA PERANTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA. CONTRARIEDADE A
DISPOSITIVO DA CONSTITUIÇÃO ESTADUAL QUE REPRODUZ NORMA
CONSTITUCIONAL FEDERAL. ALEGADA USURPAÇÃO DE COMPETÊNCIA
DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.
Desde o julgamento da RCL 383, Rel. Min. Moreira Alves, entende o STF
inexistir usurpação de sua competência quando os Tribunais de Justiça
analisam, em controle concentrado, a constitucionalidade de leis municipais
ante normas constitucionais estaduais que reproduzam regras da Carta da
República de observância obrigatória. Reclamação julgada improcedente (Rcl
2076/MG, rel. Min. Ilmar Galvão, j. 03/10/2002).
Em igual sentido, também a jurisprudência desta Corte:
O Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina é órgão com
competência jurisdicional para processar e julgar ações diretas de
inconstitucionalidade contra leis estaduais ou municipais (normas objeto)
contrastando com dispositivos da Constituição Estadual (normas parâmetro),
ainda quando meras reproduções de texto da Constituição Federal (art. 125,
§2o, CF). A esfera estadual representa, na verdade, um microssistema de
controle da constitucionalidade, no centro do qual a competência da Corte local
se subsume à causa petendi referente à alegada violação à Constituição
Estadual. Em havendo remissão incidental a preceitos da Constituição Federal,
tal circunstância acarreta parcialização no âmbito cognitivo da ação direta de
inconstitucionalidade de forma a, não conhecidas as argüições, resguardar a
competência privativa do Supremo Tribunal Federal na análise de virtuais
violações a dispositivos postos na Constituição da República (ADI n.
2005.005756-1, da Capital, rel. Maria do Rocio Luz Santa Ritta, j. 05/10/2007).
Por tais razões, portanto, não há como acolher a prefacial também
por este vértice.
Superadas as questões anteriores ao mérito, passa-se à análise
deste.
III. Para correta compreensão do mérito da presente demanda,
mister se faz a transcrição integral do texto da lei questionada, a qual "autoriza a
concessão de vantagem pessoal e dá outras providências":
Art. 1º - Fica o Chefe do Poder Executivo autorizado a conceder, a
qualquer servidor municipal, vantagem pessoal, cujo valor ficará compreendido
entre 10% (dez por cento) e 100% (cem por cento) do vencimento ou salário,
atendidos os requisitos de competência, assiduidade, eficiência e dedicação ao
trabalho, segundo avaliação do Chefe do Poder Executivo.
Art. 2º - O direito ao recebimento da vantagem pessoal cessa quando o
Chefe do Poder Executivo o determinar.
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Art. 3º - A vantagem pessoal é inacumulável com a função gratificada e
não poderá ser atribuída para ocupante de cargo em comissão.
Art. 4º - Incidirá sobre a vantagem pessoal a contribuição previdenciária e
tributos.
Art. 5º - A vantagem pessoal não será incluída na base de cálculo para
outra vantagem ou beneficio a que faz jus o servidor exceto férias e décimo
terceiro salário ou vencimento.
Art. 6º - A despesas desta Lei correrá por conta das dotações do
orçamento vigente.
Art. 7º - Esta lei entra em vigor na data de sua publicação, revogadas as
disposições em contrário.
Como se vê, o diploma questionado institui a possibilidade de que o
servidor público do município de Tijucas faça jus a uma vantagem pessoal, desde
que "(...) atendidos os requisitos de competência, assiduidade, eficiência e
dedicação ao trabalho". Parte integrante da remuneração do servidor público, em
conjunto com o vencimento, as vantagens pecuniárias devem ser instituídas
tendo por base uma situação específica, que deve se verificar para que o agente
tenha direito à percepção do valor correspondente.
Sobre o tema, assim disserta José dos Santos Carvalho Filho:
Vantagens pecuniárias são as parcelas pecuniárias acrescidas ao
vencimento-base em decorrência de uma situação fática previamente
estabelecida na norma jurídica pertinente. Toda vantagem pecuniária reclama a
consumação de certo fato, que proporciona o direito à sua percepção. Presente
a situação fática prevista na norma, fica assegurado ao servidor o direito
subjetivo a receber o valor correspondente à vantagem. Esses fatos podem ser
das mais diversas ordens: desempenho das funções certo tempo; natureza
especial da função; grau de escolaridade; funções exercidas em gabinetes de
chefia; trabalho em condições anormais de dificuldade, etc. (in: Manual de
Direito Administrativo. 19. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008. p. 650).
Não há, segundo o direito pátrio, qualquer circunscrição dos fatos
que podem servir de base à concessão de vantagem pecuniária que venha a
integrar a remuneração do servidor público. Certo é, porém, que não é um fato
corriqueiro, comum, inerente às próprias incumbências do servidor que pode dar
azo ao pagamento de verba não compreendida no vencimento; diversamente, é
preciso que haja uma significação específica de tal fato para a Administração.
Neste sentido, a crítica de Hely Lopes Meirelles:
Além dessa vantagens, que encontram justificativa em fatos ou situações
de interesse administrativo, por relacionadas direta ou indiretamente com a

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prestação do serviço ou com a situação do servidor, as Administrações têm
concedido vantagens anômalas, que refogem completamente dos princípios
jurídicos e da orientação técnica que devem nortear a retribuição do servidor.
Estas vantagens anômalas não se enquadram quer como adicionais, quer como
gratificações, pois não têm a natureza administrativa de nenhum desses
acréscimos estipendiários, apresentando-se como liberalidades ilegítimas que o
legislador faz à custa do erário, com o só propósito de cortejar o servidor público
(in: Direito Administrativo Brasileiro. 34. ed. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 495).
É este o caso da norma questionada no presente controle
concentrado. Não obstante tenha sido instituída sob o pretexto de conferir aos
servidores o direito à percepção de quantia não contemplada na rubrica do
vencimento, não se extrai do texto da lei a eleição de qualquer situação de
especial interesse da Administração que possa ser adotada como ponto de
partida para concessão da vantagem instituída. "Competência, assiduidade,
eficiência e dedicação" devem ser inerentes a qualquer funcionário público, de
sorte que não há nenhuma especial razão para que se eleja tais critérios como
base para concessão da vantagem.
Neste sentido, colhe-se da jurisprudência do Supremo Tribunal
Federal:
A norma legal, que concede a servidor inativo gratificação de ferias
correspondente a um terco (1/3) do valor da remuneração mensal, ofende o
critério da razoabilidade que atua, enquanto projeção concretizadora da cláusula
do "substantive due process of law", como insuperável limitação ao poder
normativo do Estado. Incide o legislador comum em desvio etico-jurídico,
quando concede a agentes estatais determinada vantagem pecuniária cuja
razão de ser se revela absolutamente destituída de causa (MC em ADI n.
1158/AM, rel. Min. Celso de Mello, j. 19/12/1994) (grifo nosso).
Válido assinalar que a vantagem é concedida indistintamente a
qualquer servidor do município, sendo indiferentes as atribuições do cargo ou o
tempo de carreira, por exemplo. Assim, sequer é possível cogitar de concessão
da vantagem a servidor para o qual uma de tais características detenha
excepcional importância, como já se reconheceu, por exemplo, no caso do
"prêmio de assiduidade" concedido aos professores da rede de ensino estadual
deste Estado:
ADMINISTRATIVO - PROFESSORES DA REDE ENSINO ESTADUAL -
PRÊMIO DE ASSIDUIDADE - INCONSTITUCIONALIDADE AFASTADA

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Não padece de inconstitucionalidade lei que a título de incentivo institui
"premio assiduidade" ao professor que no período do ano letivo tiver
comprovada 100% (cem por cento) de freqüência ao trabalho (Lei n. 1.139/92,
art. 26, § 1°) (AC n. 2001.019128-8, da Capital, rel. Des. Luiz Cézar Medeiros, j.
23/06/2003).
No ponto, portanto, a base legal para deferimento da vantagem
encontra-se destituída de qualquer razoabilidade, ferindo o princípio do devido
processo legal em sua manifestação substantiva, resguardada pela Carta
Catarinense no caput de seu artigo 4º:
Art. 4º O Estado, por suas leis e pelos atos de seus agentes, assegurará,
em seu território e nos limites de sua competência, os direitos e garantias
individuais e coletivos, sociais e políticos previstos na Constituição Federal e
nesta Constituição, ou decorrentes dos princípios e do regime por elas adotados
(...).
Neste norte, inafastável a constatação de que a norma instituidora
da vantagem encontra-se tisnada pela inconstitucionalidade.
Não fosse bastante, há ainda outros argumentos que permitem o
reconhecimento da inconstitucionalidade material dos preceitos em exame.
Da leitura do normativo impugnado, verifica-se ter ele se limitado a
afirmar que o cumprimento dos requisitos dispostos na lei enseja o recebimento
de vantagem no valor "entre 10% (dez por cento) e 100% (cem por cento) do
vencimento ou salário".
Não há na lei, contudo, qualquer parâmetro que indique a forma de
se apurar qual o percentual a que fará jus o servidor. A gradação não é
estabelecida legalmente, como se poderia esperar da norma, em razão da
necessidade de obediência ao princípio da legalidade, exigível por força do artigo
4º da CESC, já alhures transcrito.
Quanto a tal constatação, porém, o Procurador-Geral do Município
disse não haver qualquer inconstitucionalidade, porque a apuração da ocorrência
dos fatos que dão suporte ao deferimento da vantagem é precedida por regular
procedimento administrativo, nos moldes do Decreto n. 023/99, que assim
dispõe:
Art. 3º. A gratificação a ser paga mensalmente, será de no mínimo 10%

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(dez por cento) e de no máximo 100% (cem por cento) do salário do servidor,
conforme quadro anexo.
Art. 4º. A pontuação será atribuída ao servidor, com base na avaliação de
competência e eficiência, bem como assiduidade e dedicação ao trabalho, na
forma do anexo que integra este decreto, observados os seguintes fatores:
I – Avaliação de Competência e Eficiência:
A) eficiência – quantidade e qualidade de trabalho;
B) competência no cumprimento de suas atribuições;
C) disciplina e subordinação;
D) cooperação e solidariedade no ambiente de trabalho;
E) zelo para com o patrimônio público.

II – Avaliação de Assiduidade e Dedicação:


A) iniciativa no cumprimento de suas atribuições;
B) comparecimento no local de trabalho;
C) permanência no local de trabalho;
D) cumprimento do horário de trabalho;
E) dedicação ao trabalho.

§ 1º - Nas avaliações de competência e eficiência e de assiduidade e


dedicação, será atribuída ao servidor, para cada fator considerado, de 01 (um) a
10 (dez) pontos.
§ 2º - A gratificação será concedida em percentual equivalente ao número
total de pontos obtidos pelo servidor na avaliação, ou seja, cada ponto equivale
a 1% (um por cento) de gratificação.
§ 3º - Para ter direito à gratificação, o servidor terá que apresentar
pontuação total de no mínimo 10 (dez) pontos e no máximo 100 (pontos).
Todavia, a falta de individuação dos critérios não pode ser suprida
por meio de qualquer outra espécie normativa que não a lei, entendida em seu
sentido formal. Ao par da Constituição ou da Lei Orgânica, é ela a única espécie
normativa capaz de obrigar a todos os cidadãos e ao próprio Estado, não
bastando para tanto o Decreto mencionado pela Procuradoria-Geral do Município
ao realizar a defesa da norma impugnada. Isto porque, já existindo lei instituidora
da vantagem, não pode a norma infra-legal invadir a competência daqula,
conferindo direitos e atribuindo deveres; diversamente, tem de se limitar à
regulamentação de sua execução.
Destarte, toda a gradação constante do artigo 4º do referido Decreto
não pode ser levada em consideração para se aferir qual o percentual a que os
servidores fazem jus. Esta ausência de regramento abre a possibilidade de se
violar o princípio da igualdade, consagrado no artigo 4º da CESC, o que torna a
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norma inconstitucional.
Ainda que se considerassem válidos os parâmetros estabelecidos
pela norma infra-legal, vê-se que apenas parte dos critérios adotados são
objetivos. Excetuados os itens "b", "c" e "d" do item II do artigo 4º do decreto
regulamentar antes mencionado, que tratam sobre a questão do horário, todas as
demais alíneas encerram bases de apreciação que são puramente subjetivas,
não havendo qualquer modo de demonstrar seu efetivo preenchimento. É
simplesmente impossível sindicá-las, especialmente em face de seu simplista
sistema de controle, demonstrado às fls. 70/71, por meio do qual basta ao chefe
imediato do servidor – responsável por sua avaliação (art. 5º do Decreto
Regulamentar) – atribuir os pontos correspondentes, não se exigindo qualquer
fundamentação para tanto.
É evidente, no ponto, a brecha que se abre para a quebra do
princípio da isonomia de vencimentos, desdobramento do princípio da isonomia
(CESC, artigo 4º, caput), consagrado no inciso XVIII do artigo 27 da Carta
Estadual:
Art. 27 — São direitos dos servidores públicos, além de outros
estabelecidos em lei:
(...)
XVIII - proibição de diferença de vencimento, de exercício de funções e
critérios de admissão, bem como de ingresso e freqüência em cursos de
aperfeiçoamento e programas de treinamento por motivo de sexo, idade, cor ou
estado civil (...) (grifo nosso).
Com efeito, a adoção de critérios meramente subjetivos, sem a
necessidade de que o aferidor fundamente a decisão tomada permite que
funcionários que tenham igual desempenho no exercício de seus cargos
percebam adicionais em montantes diversos, sem que seja possível fazer valer a
igualdade entre eles.
De outro lado, mesmo os critérios pretensamente objetivos, tais
como "quantidade de trabalho", não autorizam o controle de seu aferimento. Isto
porque, ainda que se constituam de dados objetivos, nem a lei impugnada, nem o
decreto que a regulamenta instituíram critérios claros para que se determine a

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relação produtividade/pontuação. Dito de outro modo: ambos os normativos não
disseram qual a produtividade necessária para atingir esta ou aquela pontuação,
o que também afasta a possibilidade de controle sobre tais parâmetros.
Ainda em relação aos critérios ditos objetivos, verifica-se que dentre
eles estão comparecimento e permanência no local de trabalho e cumprimento
do horário de trabalho.
Com a devida vênia, é rematado absurdo que tais critérios sirvam
de medida de aferição do merecimento da vantagem. Ora, ressalvados os poucos
casos em que o servidor exerce suas atribuições externamente, é indispensável
que o mesmo esteja presente durante todo o expediente em seu local de seu
trabalho, cumprindo o horário que lhe for designado. Não adotando tal postura
deve ele, inclusive, ser submetido a processo administrativo para que se lhe
aplique a sanção disciplinar cabível.
Nestes moldes, é de se indagar: se o expediente tiver a duração de
8 (oito) horas diárias, o servidor que comparecer a seu local de trabalho durante
apenas 1 (uma) hora fará jus a 1 (um) ou 2 (dois) pontos em sua avaliação,
tomando o rumo de receber quantia adicional sobre o vencimento? Ou, ao revés,
é exigível que o funcionário trabalhe 16 (dezesseis) horas diárias para fazer jus à
pontuação máxima do quesito, já que o cumprimento da jornada padrão é
considerada como pontuação 0 (zero)? Em verdade, constata-se, fogem à
razoabilidade os critérios adotados.
Não fossem suficientes tais ponderações, há ainda um outro ponto
na lei atacada que permite a conclusão por sua inconstitucionalidade. Trata-se do
fato de que o deferimento e a suspensão da vantagem pecuniária constituem
atos discricionários do alcaide.
Tratando-se de ato discricionário, faz-se indispensável que o agente
público exponha a devida fundamentação de seu ato, para que ele seja passível
de controle, especialmente quanto à eventual ocorrência de desvio de poder.
Esta exigência constitui corolário do princípio da legalidade, contemplado no

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caput do artigo 16 da Constituição Estadual.
Assim é que, nos moldes em que a avaliação é realizada
atualmente, conforme se percebe pelos documentos de fls. 70/71, não há
qualquer atenção ao princípio mencionado. Em ambos os formulários
apresentados, não há qualquer motivação do ato de concessão do benefício,
havendo apenas um campo para apresentação das razões para indeferimento da
vantagem pelo alcaide – note-se, igual espaço não existe para o caso de
deferimento.
Os documentos apresentados permitem concluir pela inexistência
de efetivo e verdadeiro acompanhamento do desempenho do servidor. Não há
sequer uma linha reservada à descrição do comportamento do agente público, de
modo a ser presumível não haver verificação de proceder daquele.
Quanto ao ponto, com a devida vênia, soa esdrúxulo o argumento
utilizado pelo alcaide, no sentido de que o município "(...) possui poucos
servidores, no qual o Prefeito Municipal conhece pessoalmente todos eles e
interage com os mesmos no dia a dia de trabalho (...)", permitindo uma correta
avaliação de seu desempenho. Ora, 275 (duzentos e setenta e cinco) são os
servidores que percebem a vantagem instituída pela lei ora atacada, conforme se
extrai do documento de fls. 21/25, razão pela qual se mostra impossível que o
Chefe do Executivo efetivamente acompanhe de perto o trabalho por eles
desempenhado. Fosse assim, o município não teria governante, mas um fiscal de
concessão da vantagem.
De outro norte, diz o artigo 2º da lei que, por simples ato do alcaide,
fica ele autorizado a fazer cessar o pagamento da vantagem.
A primeira inconstitucionalidade que se vê no artigo é uma inversão
da hierarquia das normas. Ao conferir tal autorização, a lei permite que ato
administrativo – e, portanto, infra-legal – se sobreponha à própria lei instituidora
da vantagem, suspendendo sua eficácia. A suspensão do pagamento, assim,
somente poderia ser realizada por meio de outra lei, que viesse a revogar o texto

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legal questionado nestes autos.
Finalmente, há de se reproduzir, aqui, o que disse o Procurador-
Geral do Município acerca do fim ao qual se destina a vantagem debatida nesta
fiscalização abstrata (fl. 61):
Os exemplos comprovam que o Prefeito Municipal, que diante da
conveniência da medida, bem como, da oportunidade, através do uso do poder
discricionário que lhe é inerente, vem adequando os salários de alguns dos
servidores públicos, consideravelmente afetados pela defasagem dos seus
vencimentos, desde que devidamente avaliados por procedimentos
administrativos próprios conforme DECRETO MUNICIPAL n. 023/99.
Como se vê, o montante pago tem uma única razão de ser:
complementar os vencimentos dos servidores municipais. Isto quer dizer que o
alcaide, ao invés de enviar ao Legislativo municipal projeto de lei que faça a
revisão dos ganhos dos agentes públicos, prefere continuar pagando o montante
relativo à vantagem pecuniária, a qual pode ser aumentada, diminuída ou
cessada conforme bem lhe aprouver, porquanto inserida em seu âmbito de
discricionariedade.
Esta forma encoberta de revisar os vencimentos dos servidores
termina por violar uma das garantias asseguradas aos agentes públicos
catarinenses na Carta Estadual, qual seja, a da irredutibilidade de seus
vencimentos:
Art. 23. A remuneração e o subsídio dos servidores da administração
pública de qualquer dos Poderes, atenderão ao seguinte:
(...)
VIII - o subsídio e os vencimentos dos ocupantes de cargos e empregos
públicos são irredutíveis, ressalvado o disposto nos incisos III e VII, deste artigo,
nos arts. 23-A e 128, inciso II, desta Constituição e no art. 153, inciso III e § 2°,
inciso I, da Constituição Federal (grifo nosso).
Ora, se a eficácia da lei, o deferimento ou indeferimento da
vantagem e o percentual em que ela é atribuída a cada servidor estão no âmbito
de discricionariedade do Chefe do Executivo, pode ele fazer o que bem entender
com a vantagem, atribuindo-a por longa data, como substitutivo da revisão, e,
depois, fazendo-a cessar. Estaria aí violado o princípio da irredutibilidade dos
vencimentos, razão pela qual não se pode conferir semelhante poder ao alcaide.

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Por tais razões, sendo flagrante a inconstitucionalidade da lei, por
diversos ângulos, deve o texto ser extirpado do mundo jurídico.
Não obstante, tendo-se em vista a autorização constante do artigo
17 da Lei estadual n. 12.069/01, não se mostra prudente cassar a norma desde
já. Isto porque, os quase 300 (trezentos) servidores municipais certamente
percebem a vantagem desde há muito, tendo-se em vista que a lei questionada
data de 1993.
Assim sendo, melhor se mostra modular os efeitos da presente
decisão, conferindo prazo de 180 (cento e oitenta) dias para que o município de
Tijucas, querendo, edite nova lei que contemple os servidores com a revisão de
seus vencimentos.
Ante o exposto, vota-se no sentido de julgar procedente o pedido da
presente ação direta para declarar a inconstitucionalidade da Lei n. 1.003/93 do
município de Tijucas, protraindo-se a eficácia da norma em 180 (cento e oitenta)
dias, a contar desta decisão.

DECISÃO

Nos termos do voto do relator, o Órgão Especial, à unanimidade,


julgou procedente o pedido da ação direta para declarar a inconstitucionalidade
da Lei n. 1.003/93 do município de Tijucas, protraindo-se a eficácia da norma em
180 (cento e oitenta) dias, a contar desta decisão.
O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Sr.
Des. Trindade dos Santos, com voto, e dele participaram os Exmos. Srs. Des.
Gaspar Rubik, Pedro Manoel Abreu, Irineu João da Silva, Luiz Cézar Medeiros,
Vanderlei Romer, Eládio Torret Rocha, Nelson Schaefer Martins, José Volpato de
Souza, Sérgio Roberto Baasch Luz, Monteiro Rocha, Fernando Carioni, Salete
Silva Sommariva, Ricardo Fontes, Edson Ubaldo, Jaime Ramos, Newton Janke e
Lédio Rosa de Andrade.
Pela douta Procuradoria-Geral de Justiça emitiu parecer o Exmo. Sr.

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Procurador de Justiça Plínio César Moreira.
Florianópolis, 4 de agosto de 2010

Sérgio Izidoro Heil


relator

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