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Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo

2018

Em sua teoria sobre o nacionalismo, Benedict Anderson propõe uma associação entre
nacionalismo e sacrifício. Explique esta proposição de Anderson e a discuta à luz das
reflexões sobre biopoder, apresentadas por Michel Foucault, necropolítica e sacrifício
propostas por Achille Mbembe.

RA:020187; Professora: Caroline


Freitas
Intrigado com as novas formas de pensamentos construídas a partir do
Iluminismo e a Revolução, que deixaram de lado as eras dinásticas, para criar a ideia de
nação, com a qual Benedict Anderson, tenta dar explicação em sua obra, “Comunidades
imaginadas”, dizendo que estás começaram a se formar, independente das desigualdades
e explorações que possam haver, com uma “camaradagem horizontal” entre os
indivíduos que vivem em um determinado território, sendo essa e a ideia do exemplo da
linguagem, com a língua escrita em comum, usando como exemplo, a impressão do
primeiro livro, (a Bíblia), e depois com a imprensa de jornais nacionais, que o que
determinavam as notícias que nele estariam era o interesse da população e como seria
lida, dependia da língua que está falasse, tornando principalmente, pelo capitalismo a
língua não mais algo para poucos, como era com o latim, mas como uma mercadoria
para muitos; estes pontos apresentados, são cruciais para entender o conceito de
nacionalismo.

Usando principalmente as construções nacionais das Américas, para sustentar


sua explicação sobre o nascimento das nações como constituições impulsionadas contra
um inimigo em comum, o colonizador, o autor apresenta a nação constituída
principalmente deste fator, que legitima a criação dos Estados nacionais, por terem sido
melhor estabelecidos, advindo principalmente pela criação de um inimigo em comum,
este que impulsou as diferentes guerras de independência.

São estes pontos apresentados sobre o nacionalismo, que fazem com que as
pessoas morram por estas formas imaginadas de agrupamento, por se identificarem com
uma determinada comunidade, tornando de certa forma, a identidade que deveria ser
maleável, até mesmo quando se está falando de identidade nacional, acaba se perdendo
em uma “falsa” impossibilidade de mudança, ou para colocar em termos de Zygmunt
Bauman, “ela se perde em sua liquidez, para se tornar “ilusoriamente” concreta”; seria
uma forma de tentar entender o que o autor tenta explicar em sua obra, com o fato de
pessoas se sacrificarem pelo país em que vivem, o que para ele seria um ato de
superioridade da comunidade em que vive, sobre a sua própria vida.

Está ideia de sacrifício pela nação, se mostra como uma forma, próxima ao
conceito de biopolítica de Michel Foucault, por ser a forma pela qual um determinado
Estado utiliza-se de seu poder, para fazer políticas que controlem a sociedade de forma
a em grande medida usar de seus corpos, praticando o que ele chama de biopoder, que
se baseia na ideia de “fazer viver ou deixar morrer”, desta forma será feita uma
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biopolítica para determinar, por exemplo, em uma guerra, quem irá ao campo de batalha
e quem não o fará; caberá ao governo tal decisão e o cidadão deverá seguir suas
orientações caso seja convocado, seja para estar na defesa ou na linha de frente, não é o
indivíduo que decide. Mas após ser levado a decisão tomada pelo Estado, determinado
indivíduo poderia ter a liberdade de decidir se vai ou não, mas está é impedida pelo
sentimento de pertencimento a comunidade imaginada na qual ele vive, sendo o que o
faz ter a ideia de compromisso com está tendo o que vemos muito nos Estados Unidos,
principalmente, a ideia de que o indivíduo não está indo para a guerra por sua vontade
ou pela vontade do Estado, (que travou a guerra), mas pela nação.

Neste exemplo apresentado sobre o conceito de biopolítica, vale acrescentar a


crítica de Claudio Lomnitz a ideia de comunidades imaginadas, pois Benedict Anderson
apresenta-o relacionando e se baseando principalmente nas criações nacionais da
América hispânica, esta que se ele tivesse conhecido mesmo, apresentando a crítica do
autor, seria uma independência e sobre tudo uma guerra travada pelos “criollos” (filhos
de europeus, que nasceram em terras americanas), envolvendo toda a população da
região, que muitas vezes eram escravos, vindos de outras terras africanas, população
pré-colombiana, que tinha já estabelecida a sua nação, mas teve que se subjugar para
poder fazer parte das novas nações que estavam consolidando suas sucessivas
independências, o que foi o caso dos Incas, que tiveram que se submeter a consolidação
de pelo menos três nações em seu antigo território (Equador, Peru e Bolívia); criando
desta forma uma biopolítica a proveito da pequena elite da época, que queria ser
europeia, mas que por isso, acabou fazendo de seus ideias os mesmo de toda a
população que habitava terras americanas.

Com essa ideia de que o indivíduo se submete a nação para ir à guerra e não por
motivos pessoais ou familiares, mas acabando por ir independente disso, mas por
pessoas que nunca viu e nunca vai acabar vendo na vida, são condições que Achille
Mbembe, define como necropolítica, por “subjugar a vida ao poder da morte”, para
poder acrescentar e aprimorar o conceito de biopoder e biopolítica. Seguimos com o
exemplo do indivíduo que é convocado a guerra, que seria uma forma de política por
meio da violência, tornando o indivíduo como um Ser do Estado e não, com o conceito
de Jean-Paul Sartre, “o Ser-Para-Si”, por isso de certa forma, seria a perda de liberdade
pessoal deste Ser, para estar sujeito a “Ser-Para-Outro”, portanto, este indivíduo que vai
a guerra, não é livre para viver a própria vida, por depender da comunidade, pelas

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relações de harmonia que estabelece em sua nacionalidade, por isso, não é livre para
morrer.

O sacrifício é como se fosse uma “morte anunciada”, que relacionado aos pontos
já apresentados nos parágrafos anteriores possibilita que o ser humano se identifique
como um animal que está à beira da morte, por ter sido, por exemplo, pego por seu
caçador. Assim o sacrifício, se torna a forma de trazer a morte por seu próprio empenho;
nada garante que o indivíduo que vá a guerra, vá morrer, mas também não há a certeza
de que vá voltar, por isso, ele vai com a mente já ferrenha em sua morte certa, mas
dando um sentido a ela, este que para ele lhe dá a intenção de que é necessária a sua
vida não para si, mas o sentimento de que ela é para além disso, para uma grande
comunidade, o que nada mais é do que uma justificativa para a sujeição, para a perda da
liberdade, pois em certa medida, ele sabe, que indo para a linha de frente em um
conflito armado, não tem sentido para si, mas tem para a sua nação.

A necropolítica está em relação ao sacrifício e o nacionalismo, no exemplo da


relação daquele cidadão que foi a guerra e voltou, para com aquele que morreu no
campo de batalha, pois, por mais que este se sinta principalmente agradecido, por ter
voltado a sua família, volta-se a valorização daqueles que não voltaram, como uma
forma de terem dado suas vidas, (morrido), para que este pudesse estar vivo; seria
assim, uma morte pela vida, mas não pela própria, mas pela do outro, como se pelo
convívio em comunidade, a vida que o morto deu a nação, fosse “agradecida” por meio
deste sentimento, que não é o principal do que volta vivo da guerra, mas que é o que o
Estado impõe a sua população no momento em que faz celebrações fúnebres ou até
mesmo inauguração de monumentos aqueles que “morreram pela pátria”.

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Bibliografia

ANDERSON, Benedict R., Comunidades imaginadas: reflexões sobre a origem e a


difusão do nacionalismo, São Paulo: Companhia das letras, 2008.

FOUCAULT, Michel. Aula de 17 de março de 1976. IN: Em defesa da sociedade.


Editora MMF Martins Fontes, São Paulo, 2018.

LOMNITZ, Claudio, Nacionalismo como um sistema prático. A teoria de Benedict


Anderson da perspectiva da América Hispânica. Novos Estudos CEBRAP, 59:37-
61,2001.

MBEMBE, Achille, Necropolítica. Arte e Ensaios.

SARTRE, Jean Paul, O ser e o nada – ensaios de ontologia fenomenológica, — 4ª ed.—


Petrópolis, RJ:  Vozes, 1997.

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