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Profilaxia paraORIGINAL
tromboembolia venosa em uma unidade de tratamento intensivo
Objetivos: Identificar o nível de risco e a prática de profilaxia para TEV em pacientes hospitalizados
em um centro de tratamento intensivo (CTI). Métodos: A amostra foi constituída por pacientes
admitidos no CTI-HCPA entre dezembro de 1997 e fevereiro de 1998. Foram excluídos pacientes em
tratamento com anticoagulantes ou que apresentavam contra-indicações para uso de heparina. Os
critérios utilizados para determinação dos fatores de risco para TEV e sua estratificação em níveis de
risco seguiram parâmetros estabelecidos em consensos internacionais. O estudo não foi de
conhecimento do pessoal médico da unidade. Resultados: Foram analisados 180 pacientes, com
média de idade de 58 anos (± 16,5). Os fatores de risco mais freqüentes foram: idade ≥ 40 anos
(85,0%), grande cirurgia (47,8%), infecção torácica ou abdominal (22,8%). Dois ou mais fatores de
risco simultâneos estiveram presentes em 146 (81%) casos. Na avaliação do risco para TEV, 142 (79%)
foram classificados como risco moderado/alto. Medidas profiláticas foram prescritas para 102
pacientes (57%), sendo a heparina utilizada em 60% dos casos de risco moderado ou alto. Evidenciou-se
uma associação significativa entre o aumento do nível de risco e do número de fatores de risco com
o aumento do uso de profilaxia (p < 0,05). Conclusão: Fatores de risco para TEV foram freqüentes na
amostra estudada. No entanto, 40% dos pacientes com risco moderado/alto não receberam profilaxia
farmacológica para TEV . (J Pneumol 2000;26(1):15-19)
* Trabalho realizado na Faculdade de Medicina da Universidade Fe- 3 . Serviço de Medicina Intensiva – Hospital de Clínicas de Porto Ale-
deral do Rio Grande do Sul, com apoio do CNPq, Fundação de gre.
Amparo à Pesquisa do Estado do Rio Grande do Sul (FAPERGS) e Endereço para correspondência – Paula Mallman da Silva, Rua Walir
Pró-Reitoria de Pesquisa da Universidade Federal do Rio Grande Zottis 193, Jardim Planalto – 91220-500 – Porto Alegre, RS. Tel.:
do Sul (Propesq/UFRGS). (51) 348-2714 – E-mail: paula@voyager.com.br
1 . Serviço de Pneumologia – Hospital de Clínicas de Porto Alegre.
2 . Faculdade de Medicina – Universidade Federal do Rio Grande do Recebido para publicação em 1/6/99. Reapresentado em 2/
Sul. 8/99. Aprovado, após revisão, em 6/10/99.
TABELA 1
QUADRO 1
Freqüência dos fatores de risco para tromboembolia
Estratificação de risco para tromboembolia
venosa em 180 pacientes internados em uma
venosa em pacientes hospitalizados
unidade de tratamento intensivo
Risco baixo
Fator de risco n (%)
• Ausência de fatores de risco para TEV
• Grande cirurgia, sem outros fatores de risco associados
Idade ≥ 40 153 85,0
Risco moderado Grande cirurgia 86 47,8
• Grande cirurgia e idade ≥ 40 anos Infecção 41 22,8
• Grande doença clínica Insuficiência respiratória 33 18,3
• Trauma de quadril ou membros inferiores Infarto do miocárdio 30 16,7
• História prévia de TEV ou trombofilia Obesidade 30 16,7
Imobilidade prolongada 30 16,7
Risco alto Insuficiência cardíaca 26 14,4
• Grande cirurgia ou fratura de quadril ou membros inferiores Sepse 22 12,2
• Grande cirurgia pélvica ou abdominal para câncer Câncer 13 7,2
• História prévia de TEV ou trombofilia em paciente com Acidente vascular cerebral 7 3,9
grande doença clínica, trauma ou cirurgia Outros 12 6,7
• Paralisia de membros inferiores Sem fator de risco 7 3,9
• Amputação de membros inferiores
TABELA 2
Na análise dos resultados, foram determinadas medi- Medidas utilizadas em 180 pacientes internados
em uma unidade de tratamento intensivo para
das descritivas para prevalência de fatores de risco e fre-
prevenção da tromboembolia venosa
qüência de uso de medidas profiláticas para TEV. O teste
do qui-quadrado foi utilizado na avaliação do uso de hepa-
Medida profilática n (%)
rina de acordo com o número de fatores presentes em
cada paciente, sendo utilizado um valor de P < 0,05 como HNF isolada 97 54,0
índice de significância estatística. HNF + deambulação 03 1,7
HNF + fisioterapia 01 0,5
Deambulação precoce 01 0,5
RESULTADOS Sem profilaxia 78 43,3
Durante o período de estudo, 261 pacientes foram ad- Total 180 100,0
mitidos no CTI/HCPA. Foram excluídos 81 pacientes, con- HNF: heparina não-fracionada
siderando-se 45 com contra-indicações para o uso de he-
parina por sangramento ativo (25 casos), acidente vascu-
lar cerebral hemorrágico (11) e discrasia sanguínea (9), e não-fracionada foi prescrita para 100 pacientes (55,6%),
36 apresentando outra doença associada que necessitava deambulação precoce para 4 (2,2%) e fisioterapia para
de anticoagulação, como angina instável (14 casos), trata- apenas 1 (0,6%). Outros métodos de profilaxia para TEV
mento para TVP/TEP (9), prótese cardíaca (9), arritmia (3) não foram prescritos nesta amostra.
e prevenção de AVC recorrente (1). A média de fatores de risco por paciente foi de 2,6 (±
A amostra foi constituída por 180 pacientes, 80 mu- 1,2). Dois ou mais fatores simultâneos estiveram presen-
lheres (44,4%) e 100 homens (55,6%), com idade média tes em 146 casos (81%) e em apenas 7 (4%) nenhum
(± desvio-padrão) de 57,7 (± 16,5) anos, com tempo médio fator de risco foi encontrado. A Tabela 3 mostra a fre-
de internação, na unidade, de cinco dias. qüência de fatores de risco simultâneos por paciente e sua
Na Tabela 1 são apresentados os cenários de risco para relação com a prática de profilaxia para TEV. Houve asso-
TEV mais encontrados entre os pacientes internados no ciação estatisticamente significativa entre o uso de hepa-
CTI/HCPA , sendo os mais destacados idade ≥ 40 anos rina não-fracionada e o aumento do número de fatores de
(85,0%), pós-operatório de grande cirurgia (47,8%), in- risco por paciente, variando de 47% nos casos com me-
fecção torácica ou abdominal (22,8%) e insuficiência res- nos de dois fatores simultâneos para 81% nos casos com
piratória com prótese ventilatória (18,3%). cinco fatores de risco ou mais. Conforme demonstrado
Foram utilizadas medidas profiláticas, físicas ou farma- na Tabela 4, o aumento do nível de risco para TEV tam-
cológicas, isoladas ou em associação para 102 casos bém se associou significativamente com maior freqüência
(56,7%), conforme demonstrado na Tabela 2. A heparina de prescrição de heparina não-fracionada.
J Pneumol 26(1) – jan-fev de 2000 17
Barreto SSM, Silva PM da, Faccin CS, Theil AL, Nunes AH, Pinheiro CTS
TABELA 3
Freqüência do uso de profilaxia de acordo com o
número de fatores de risco para tromboembolia venosa
≤1 34 (18,9) 16 (47,0)
2 55 (30,6) 23 (42,0)
3 45 (25,0) 28 (62,2)
4 30 (16,7) 20 (66,7)
≥5 16 (8,9) 13 (81,3)
Total 180 (100,0) 102 (56,7)
P de tendência < 0,005
TABELA 4
Freqüência de uso de profilaxia medicamentosa para
tromboembolia venosa segundo o nível de risco
Talvez a principal razão para a baixa utilização de me- Alguns fatores de risco, como presença de TEV prévia,
didas preventivas para TEV seja o temor do agravamento história de trombofilia e obesidade, provavelmente tenham
das condições clínicas de pacientes criticamente enfermos, sido subestimados, em razão da metodologia do estudo.
especialmente pela possibilidade de sangramentos. Nessa Entretanto, isso apenas reforça a observação da existên-
amostra, foram excluídos os pacientes de maior risco de cia de elevada prevalência de fatores de risco para TEV em
hemorragia, não se justificando a baixa freqüência de pres- pacientes internados em centros de tratamento intensivo.
crição de heparina não-fracionada em doses preconiza- A ausência de uma rotina hospitalar de profilaxia para
das, ou mesmo de heparinas de baixo peso molecular, TEV pode também ser uma das razões para a menor ex-
liberadas pela Comissão de Medicamentos do hospital para tensão de seu uso. Resultados de estudo recente(23) de-
pacientes de risco. A mortalidade associada ao tratamen- monstraram que, em um hospital universitário em que um
to anticoagulante pleno para TEV aguda em protocolos programa de educação médica em TEV vinha sendo de-
publicados é de 0,1%(21,22). senvolvido por cinco anos, 86% dos pacientes internados
Medidas físicas, como elevação dos membros inferio- na unidade de tratamento intensivo utilizavam algum tipo
res, fisioterapia e meias elásticas de compressão gradua- de profilaxia. Programas de educação médica parecem
da, são amplamente aplicáveis e de baixo custo, melho- ser importantes, na medida em que possibilitam discus-
rando o fluxo sanguíneo venoso femoral e diminuindo a sões e esclarecimentos à população médica sobre aspec-
incidência de TVP, especialmente em idosos. Tais medidas tos relacionados com a profilaxia, diagnóstico e terapêuti-
deveriam ser prescritas para todos os pacientes critica- ca da TEV, tornando a prevenção desta doença mais efeti-
mente enfermos(11). Em cirurgia geral o emprego de meias va e o diagnóstico precoce e, assim, diminuindo sua mor-
elásticas de compressão graduada e de compressão pneu- bimortalidade.
mática intermitente reduziu o risco relativo de TEV em Em resumo, fatores de risco para TEV foram freqüentes
63% e 61%, respectivamente (20). No entanto, apenas 5 em uma amostra de pacientes internados em uma unida-
pacientes (2,8%) da amostra estudadas receberam pres- de de tratamento intensivo de um hospital geral universi-
crição de medidas físicas durante o período de internação tário brasileiro. A prescrição de profilaxia para TVP limi-
no CTI . A prescrição de deambulação precoce, para 4 tou-se a menos de dois terços dos pacientes para os quais
pacientes, relacionou-se a casos de infarto agudo do mio- estaria indicada, restringindo-se basicamente a minidoses
cárdio de boa evolução clínica. de heparina não fracionada.
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