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CP/ID

G rego do N ovo T estamento


M a r v in R. V incent

Estudo no V ocabulário
G rego do N ovo T estamento

Evangelho de João
Epístolas de João
Apocalipse

Tradução:
Lena Aranha
Α missão primordial e intransferível da CPAD é proclamar, por meio da página impressa, o

Θ Evangelho de nosso Senhor Jesus Cristo no Brasil e no exterior; edificara Igreja de Cristo por
intermédio de literaturas ortodoxas, que auxiliem os obreiros cristãos no desenvolvimento
de suas múltiplas tarefas no Reino de Deus; e educara sociedade e a Igreja através da Escola
vJ tHU Dominical, que evangeliza enquanto ensina. Nosso maior presente é pensar no futuro.

VINCENT - ESTUDO NO VOCABULÁRIO GREGO DO NOVO TESTAMENTO

Traduzido do original Vincent’s JVord Studies in the New Testament.


Edição em língua portuguesa © 2013 por Casa Publicadora das Assembléias de Deus.
Todos os direitos reservados.

Vincent, Marvin Richardson.


Vincent - Estudo no Vocabulário Grego do Novo Testamento. / Marvin Richardson
Vincent. Tradução Lena Aranha. - Rio de Janeiro: CPAD, 2013. v. 2 .
536 p.; 15,5 x 22,7 cm.

Título original; Vincent’s fVord Studies in the New Testament.

Bibliografia: p. 498.

ISBN 978-85-263-1094-0.
1 . Bíblia. Novo Testamento —Estudos. 2 . Bíblia. Novo Testamento - Introduções. I. Título.
CDD 225.6

Presidente da CGADB José W ellington Bezerra da Costa


Presidente Cons. Adm. CPAD José W ellington da Costa Júnior
Diretor Executivo Ronaldo Rodrigues de Souza
Gerência de Publicações Alexandre Coelho
Tradução Lena Aranha
Coordenação editorial Anderson Grangeão da Costa
Revisão Tatiana da Costa
Caroline Tuler
Gerência de Comunicação Rodrigo Sobral Fernandes
Projeto gráfico e editoração Fagner Machado
Capa Wagner de Almeida

Impressão CPAD ( 1. ed., ju l./2 0 l3 ; tiragem: 5.000)

CASA PUBLICADORA DAS ASSEMBLÉIAS DE D EU S


Avenida Brasil, 34.401, Bangu, Rio de Janeiro - Caixa Postal 3 3 1, CEP 21.852-001
SAC (Serviço de Atendimento ao Cliente): 0800-021-7373
P lano da O bra

Volume I Evangelhos Sinópticos


Atos dos Apóstolos
Epístolas de Tiago, Pedro e Judas
Volume II Evangelho de João
Epístolas de João
Apocalipse

Volume III Romanos


Filipenses
1 e 2 Coríntios
Colossenses
Efésios
Filemom
Volume IV 1 e 2 Tessalonicenses
Gálatas
Epístolas Pastorais
Hebreus
S umário

LISTA DE REDUÇÕES.....................................................................................ix
INTRODUÇÃO AOS ESCRITOS DE JOÃO..................................................... 1
O Evangelho....................................................................................................... 4
Relação com os Evangelhos Sinópticos................................................................7
As epístolas..........................................................................................................10
0 Apocalipse........................................................................................................ 13
Estilo e expressão de João...................................................................................15
JOÃO....................................................................................................................19
Comentário...........................................................................................................19
1 JOÃO.............................................................................................................. 251
Comentário........................................................................................................ 251
Nota crítica sobre lJoS. 19-22.......................................................................... 311
2 JOÃO...............................................................................................................323
Comentário........................................................................................................ 323
3 JOÃO...............................................................................................................329
Comentário........................................................................................................ 329
APOCALIPSE.................................................................................................. 335
Comentário........................................................................................................ 335
Lista de palavras e expressões gregas empregadas somente por João...........483
V incent - E studo no Vocabulário G rego NT

REFERÊNCIAS............................................................................................... 493
ÍNDICE TEMÁTICO...................................................................................... 497
ÍNDICE DE PALAVRAS GREGAS............................................................... 509

viii
L ista de Reduções

L ivros da B íblia

Antigo Testamento Is Isaías


Gn Gênesis Jr Jeremias
Êx Êxodo Lm Lamentações
Lv Levítico Ez Ezequiel
Nm Números Dn Daniel
Dt Deuteronômio Os Oseias
Js Josué J1 Joel
Jz Juizes Am Amós
Rt Rute Ob Obadias
lSm 1 Samuel Jn Jonas
2Sm 2 Samuel Mq Miqueias
lRs 1 Reis Na Naum
2Rs 2 Reis Hc Habacuque
lCr 1 Crônicas Sf Sofonias
2Cr 2 Crônicas Ag Ageu
Ed Esdras Zc Zacarias
Ne Neemias Ml Malaquias
Et Ester
Jó Jó Novo Testamento
SI Salmos Mt Mateus
Pv Provérbios Mc Marcos
Ec Eclesiastes Lc Lucas
Ct Cantares Jo João
V incent - E studo no Vocabulário G rego NT

At Atos dos Apóstolos Tt Tito


Rm Romanos Fm Filemom
lCo 1 Coríntios Hb Hebreus
2C0 2 Coríntios Tg Tiago
G1 Gálatas lPe 1 Pedro
Ef Efésios 2Pe 2 Pedro
Fp Filipenses lJo 1 João
Cl Colossenses 2Jo 2 João
lTs 1 Tessalonicenses 3J0 3 João
2Ts 2 Tessalonicenses Jd Judas
lTm 1 Timóteo Ap Apocalipse
2Tm 2 Timóteo

L iteratura A pócrifa

Sb Sabedoria lMc 1 Macabeus


Sr Sirácida, ou Eclesiástico 2Mc 2 Macabeus
Jt Judite Br Baruque
Tb Tobias

T extos e T raduções

a 21 Almeida Século 21 (2010)


acf Almeida Corrigida e Revisada Fiel, SBTB (1994)
AEC Almeida Edição Contemporânea (1990)
ARA Almeida Revista e Atualizada (1993)
ARC Almeida Revista e Corrigida (2009)
ANG LO -SA X Ã Versão Anglo-saxã da Bíblia
BJ Bíblia de Jerusalém (2002)
BP Bíblia do Peregrino (2006)
BV Bíblia Viva (1999)
CNBB Bíblia Sagrada Tradução da CNBB (2001)
COVERDALE Bíblia de Coverdale
CRANM ER Bíblia de Cranmer
ECP Bíblia Sagrada Edição Catequética Popular (2009)
EP Bíblia Sagrada Edição Pastoral (1990)
KJNTA King James Nova Tradução Atualizada (2005)
KJV King James Version, ou Versão Autorizada (1611)
LXX Septuaginta, ou Versão dos Setenta
NCL Nova Chave Linguística do Novo Testamento Grego
x
L ista de R eduções

N T IA Novo Testamento Interlinear Analítico Grego-Português: Texto


Majoritário com Aparato Crítico
N T LH Nova Tradução na Linguagem de Hoje (2008)
NVI Nova Versão Internacional (2001)
RV Revised Version of the New Testament
R V -O T Revised Version of the Old Testament
TB Tradução Brasileira (2010)
T EB Tradução Ecumênica da Bíblia (1994)
TM The Greek New Testament according to the Majority Text (2.a ed.)
TR Texto Recebido, ou Textus Receptus
TYNDALE Versão do Novo Testawmento, de Tyndale
VULGATA Tradução latina do Novo Testamento
W Y C L IF FE Versão do Novo Testamento, de Wycliffe

G erais
cap., caps. capítulo, capítulos op. cit. lat. opus citatum, na obra
cp. compare, confronte citada
ibid. lat. ibidem, na mesma p. página(s)
obra ss. seguintes
id. lat idem, do mesmo autor v., vv. versículo, versículos
i.e. lat. id est, isto é volume(s)

xi
Introdução aos E scritos de João

A vida de João cobre um período de perto do início do século I ao início do


século II. Ele era nativo da Galileia, e, de acordo com a tradição, da cidade de
Betsaida, que ficava na margem ocidental do mar da Galileia, não muito longe
de Cafarnaum e Corazim. Seu pai era Zebedeu; sua mãe, Salomé (Mc 16.1; Mt
20.20), estava entre as mulheres que apoiaram o Senhor com seus recursos
(Lc 8.3) e compareceram à crucificação dele (Mc 15.40). A família não era des­
provida de recursos materiais. Zebedeu era um pescador e tinha empregados
contratados para ajudá-lo com seu trabalho (Mc 1.20). Salomé ministrava para
Jesus, e parece que João tinha sua própria casa (Jo 19.27). Aparentemente, ele
era um dos discípulos de João Batista, e, enquanto estava envolvido na ativida­
de de seu pai, foi encontrado e chamado por Jesus (Mt 4.21; Mc 1.19). Dos dois
discípulos mencionados em 1.35, apenas o nome de um, André, é mencionado
(Jo 1.40); normalmente, supõe-se que o outro seja João, que suprimiu o próprio
nome como faz em outras circunstâncias quando se refere a si mesmo (Jo 14.23;
18.15; 19.26; 20.2,4,8; 21.20)'.
Tão logo João conheceu Jesus, ele tornou-se seu entusiástico discípulo. Sua in­
timidade peculiar com o Senhor é marcada pela expressão “aquele a quem Jesus
amava”, e também pelo fato de que ele foi um dos três escolhidos para estar com
Ele em determinadas crises especiais e graves. Ele foi admitido na câmara mor­
tuária da filha do governador (Mc 5.37) e testemunhou a restauração dela à vida;
estava presente na transfiguração (Lc 9.28), e foi escolhido com Pedro e Tiago pelo

1. A menção de seu próprio nome no livro de Apocalipse, e não no Evangelho, é suficientemente


explicada pelo fato de que o Evangelho é histórico, com intenção de dar proeminência a Cristo e
manter o escritor na sombra. O Apocalipse, por sua vez, é profético, e o nome do autor é exigido
como testemunho das revelações concedidas a ele. Compare com D n 7.15; 8.27.
I ntrodução aos E scritos de J oão

Mestre para fazer companhia a Ele durante sua agonia no Getsêmani (Mc 14.33).
Acompanhou Jesus, depois de sua prisão, ao palácio do sumo sacerdote e assegurou
a entrada de Pedro (Jo 18.15-16). Permaneceu ao lado da cruz com a mãe de Jesus,
que a entregou aos seus cuidados (Jo 19.25-27). Com Pedro, correu ao sepulcro na
manhã da ressurreição, ao ser informado por Maria Madalena, entrou na tumba
vazia, viu e creu (Jo 20.2-8). Depois da ressurreição, aparece envolvido em sua
ocupação anterior, no mar da Galileia. Ele é o primeiro a reconhecer o Senhor
ressurreto de pé na praia (Jo 21.7), e é o objeto da inquirição de Pedro: “Senhor, e
deste que será?”, quando ele o vê seguindo a Jesus (Jo 21.20-21).
Sua atividade apostólica aconteceu nos primeiros trinta anos após a ascensão.
Em Jerusalém, sua posição entre os apóstolos não era excepcionalmente proemi­
nente. Na época da perseguição de Estêvão, ele permaneceu em Jerusalém com os
outros apóstolos (At 8.1), mas quando Paulo, três anos após sua conversão, foi a
Jerusalém (G1 1.18), só encontrou ali Pedro e Tiago, o irmão de Jesus. Contudo,
isso não quer dizer que os outros apóstolos tinham partido definitivamente da
cidade e se estabelecido em outro lugar. Em G1 2.9, Paulo alude a João como es­
tando presente em Jerusalém na época do concilio (At 15). A narrativa de Atos dos
Apóstolos não o menciona em conexão com o concilio, mas Paulo, na epístola aos
Gálatas, refere-se a ele como um dos pilares da igreja, junto com Tiago e Cefas.
A tradição comumente recebida retrata-o encerrando sua carreira apostó­
lica na Ásia e em Éfeso. Uma antiga tradição afirma que ele deixou Jerusalém
doze anos depois da morte de Cristo. Portanto, ele não foi, de forma alguma,
imediatamente para Éfeso. Notícias claras quanto à sua moradia nesse in­
tervalo são totalmente inexistentes. Um fato digno de nota é que a vida de
muitos líderes mundiais inclui períodos que permanecem em branco para a
maioria dos mais cuidadosos biógrafos, e nos quais a curiosidade do mun­
do não consegue nunca adentrar. Assim é o período do retiro de Paulo na
Arábia, do exílio de Dante, e, em alguma extensão, da tentação de Jesus no
deserto. Algumas tradições posteriores afirmam que ele visitou a Pártia, e
Jerônimo, de forma infundada, conjectura que ele tenha pregado na Judeia.
Há alguma plausibilidade na suposição de que ele pode ter ido para Antioquia
na época da primeira viagem missionária de Paulo. É certo que, muito depois,
João foi sucessor de Paulo em Éfeso. Na partida de Paulo para Mileto (At 20),
ou durante a composição da epístola aos Efésios, não há nenhum traço da
presença de João em Éfeso.
A tradição também concorda que João foi banido para a ilha de Patmos pelas
autoridades romanas. Ireneu diz que ele foi banido no reinado de Domiciano;
outra tradição fixa o exílio no reinado de Nero. Diz-se que, desse exílio, foi-lhe
permitido retornar sob o reinado de Nerva (96-98 d.C.). A data de sua morte é
desconhecida. Jerônimo data-a 68 anos após a morte de Cristo.
2
I ntrodução aos E scritos de J oão

A característica predominante da natureza de João é a receptividade contempla­


tiva. Toda palavra do seu Senhor é recebida no fundo do seu coração, logo guar­
dada e ponderada. "Ele não pergunta: Ό que farei?’”, mas: Ό que Ele fará?” Por
isso, fica claro por que ele captou o mais puro e sutil aroma da personalidade de
Jesus. Essa receptividade é acompanhada do poder de compartilhar a mensagem.
‘Todo homem”, diz Ebrard, “pode ver o brilho do pôr do sol sobre os Alpes, mas
nem todos conseguem pintá-lo”. João, como um espelho, não só recebia, mas tam­
bém refletia. Embora os outros evangelistas percebessem esse elemento do ensi­
namento e da obra de Jesus que produzia os resultados exteriores mais imediatos e
impressionantes, como, por exemplo, o Sermão do Monte, João discernia o sentido
e a influência do incidente menos proeminente, como a conversão no poço de Jacó.
Paulo, como João, tem a qualidade da interioridade, mas Paulo raciocina onde João
contempla. João é tenaz e intenso; Paulo é igualmente assim, mas é mais perito que
João. João remói seu pensamento; Paulo golpeia e apara golpes com ele.
Contudo, João não é sentimental. Ele não é o adorável e efeminado jovem da
pintura. Tem fibra moral e mental bastante firme. Recebeu o título “Filho do
trovão” daquele que nunca traduz errado o caráter de alguém. Não-irascível,
como alguns deduziram apressadamente a partir de Lc 9.54, ilustra a peculiari­
dade de muitas naturezas amorosas e contemplativas, que se manifestam em im­
pressionante impetuosidade em ocasiões que apelam para suas percepções mais
radicais da verdade e para seu campo de visão mais abrangente. João era incapaz
de sentir meios-entusiasmos e de suspender a fé. Em tudo que se referia a ele
mesmo, era totus in Hits \Jiomem de uma ideia e de um propósito, totalmente dedicado
à sua missão}. De sua própria maneira, não tem fala menos clara e firme que a
de Paulo. E direto em momentos em que Paulo, às vezes, é irônico. Não é gentil
nem vago em sua linguagem referente aos que negam que Jesus é o Cristo (lJo
2.22), ou acerca da linhagem daquele que pratica o pecado (lJo 3.8) e da qualida­
de moral daquele que odeia seu irmão (lJo 3.15; 4.20). No livro de Apocalipse,
demonstra a solidariedade mais profunda com a indignação divina contra o mal
e contempla com alegria verdadeira sua derrota e punição totais e esmagadoras.
Parece encorajar o progresso do Conquistador montado sobre o cavalo branco.
As discussões entre verdade e falsidade, vida e morte, luz e trevas, amor e ódio
são afirmadas por ele com agudeza inflexível e decisiva, e como finalidades ab­
solutas. A qualidade de pecado é concebida de acordo com a escala de seu amor
adorador por Cristo. Ele lida com isso como perversidade, não como fraqueza,
embora não negligencie a última. Para ele, a vitória do evangelho não é uma
profecia, mas um fato consumado. A fé sujeita o mundo. A conquista de Cristo já
está presente em todo cristão.
Esse caráter não se adaptaria à obra de Paulo, pois não era suficientemente
versátil e multilateral. João não tinha o instinto pioneiro, a atividade enérgica e

3
I ntrodução aos E scritos de J oão

o poder de executar os planos de Paulo. Ele estava preparado para construir a


superestrutura, em vez de estabelecer a fundação dela; para ser o professor, em
vez de um evangelista. Cabia a ele completar o ensinamento dos outros após­
tolos, revelando o mistério teórico da encarnação e o segredo da união interior
do cristão com Cristo; purgar a igreja do erro especulativo e levantar, contra a
caricatura gnóstica, a verdadeira imagem do Filho do Homem.
Os escritos atribuídos a João são o Evangelho, três epístolas e o livro de Apo­
calipse ou Revelação.

O E vangelho

A tradição quase unânime da igreja atribui o quarto Evangelho a João. Ele


é inquestionavelmente obra de um judeu, uma testemunha ocular e discípu­
lo de Jesus. Foi provavelmente escrito perto do fim do século I, e, por isso,
posteriormente aos outros três Evangelhos. De acordo com a evidência mais
antiga, foi composto em Éfeso, a pedido dos amigos mais íntimos de João, os
quais queriam ter o ensino oral dele registrado para o uso permanente da
igreja.
Há três teorias quanto ao motivo de sua composição. De acordo com a pri­
meira, conhecida como teoria “suplementar”, João escreveu o quarto Evangelho
como um complemento aos seus predecessores, a fim de suprir o que faltava na
narrativa sinóptica. Esse Evangelho, na verdade, é complementar de fato, mas
não no motivo. E complementar porque o escritor assume constantemente que
determinados fatos já são conhecidos de seus leitores e acrescenta outros a par­
tir de suas próprias informações especiais. Mas o próprio Evangelho renuncia
expressamente a qualquer intenção de ser completo (21.25), e é uma concepção
original na forma e no conteúdo, tendo um plano seu mesmo distinto e apresen­
tando aspectos novos da pessoa e do ensinamento de nosso Senhor. “É o retrato
de alguém que pinta não porque os outros não captaram o ideal que ele represen­
taria, mas porque seu coração está pleno e ele precisa falar.”
A segunda teoria é de que o Evangelho é “polêmico” ou controverso, destina­
do a opor-se aos erros dos nicolaítas e de Cerinto. Mas o Evangelho é polêmico
só acidentalmente, quando a apresentação da verdade positiva sugere pontos
específicos de erro. O ponto de vista não é controverso. O escritor é movido pela
pressão de seu grande tema de expor o Evangelho em seus aspectos positivos, e
não com especial referência aos erros do seu tempo.
A terceira teoria, conhecida como “irênica” ou conciliatória, sustenta que o
Evangelho pretendia reconciliar percepções religiosas divergentes e trazer à sua
correta relação verdades pervertidas por heresias. O Evangelho é conciliatório
de fato, não a partir de uma intenção definitiva, mas da natureza mesma do ob-
4
I ntrodução aos E scritos de J oão

jeto - o Verbo feito carne, em que todas as controvérsias religiosas são reconci­
liadas. Conforme Westcott:

Da mesma maneira que ele se eleva acima da controvérsia enquanto condena o erro,
preserva as verdades características que a heresia isolou e usou impropriamente. O
quarto Evangelho é a resposta mais completa às múltiplas formas do gnosticismo,
todavia foi o escrito mais usado pelos gnósticos. Ele não contém uma narrativa formal
da instituição dos sacramentos, contudo apresenta de forma mais completa a ideia
deles. Expõe com forte ênfase o fracasso do povo antigo, e mesmo assim aponta com
mais clareza a relevância da dispensação que foi confiada a eles. Traz as muitas opo-
sições —antíteses - da vida e do pensamento e deixa-as à luz do fato supremo que
reconcilia tudo: o Verbo sefez carne, e sentimos, do princípio ao fim, que essa luz brilha
no registro de dor e triunfo, de derrota e esperança.

O propósito é distintamente afirmado no próprio Evangelho. “Estes, porém,


foram escritos para que creiais que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus, e para que,
crendo, tenhais vida em seu nome” (20.31). A última dessas três coisas - vida em
Cristo pela fé - é a chave para as outras duas. Os leitores já são discípulos; e, ao
vindicar as duas proposições de que Jesus é o Cristo e o Filho de Deus, o objetivo
não é levar ao reconhecimento de sua missão divina, mas exibi-las como o fun­
damento de uma comunhão viva dos cristãos com Deus e de uma vida espiritual
mais rica. O caráter do Evangelho é predominantemente histórico. Mesmo as
porções doutrinais têm um fundo histórico e uma incorporação histórica. A dou­
trina, por exemplo, do antagonismo essencial entre luz e trevas é apresentada na
narrativa da atitude hostil dos judeus em relação a Cristo; e a discussão com eles
tem sua raiz e matéria nesse mesmo antagonismo. O material histórico é cuida­
dosamente escolhido com vista à sua influência, sobre a concepção particular da
pessoa e obra de Cristo, anunciada no prólogo. A história é a exposição prática
da doutrina do Logos na pessoa e vida terrena do homem Jesus. Os milagres são
invariavelmente mencionados como sinais, e vistos como expressões e evidências
da personalidade divina do operador deles.
O Evangelho caracteriza-se pelo emprego profuso de simbolismo. Isso con­
corda com sua fibra hebraica, como também, em grande parte, com a natureza de
seu objeto. Pois João não só era judeu familiarizado com a economia e a profecia
simbólicas do Antigo Testamento, mas também Jesus, a figura central do seu
Evangelho, é predominantemente o cumpridor da Lei e dos Profetas. O próprio
ensino de Cristo também era muitíssimo simbólico; e a percepção peculiar, pro­
funda e espiritual de João detecta nos atos comuns de Cristo esse sentido mais
abrangente que pertencia a eles em virtude da posição de Jesus como o represen­
tante da humanidade; e essa união dos mundos natural e espiritual assumida nas
5
I ntroduçAo aos E scritos de J oAo

declarações de nosso Senhor, em que o visível era usado como o tipo do invisível.
Como afirma Lange:

João nos fornece não só um simbolismo da palavra do A ntigo Testamento, das ins­
tituições, histórias e pessoas veterotestamentárias; ele também nos fornece o simbo­
lismo da natureza, da antiguidade, da história e da vida pessoal; daí, o simbolismo
absoluto, ou o sentido ideal de toda existência verdadeira, em esboços relevantes.

A relação do Evangelho com o Antigo Testamento é afirmada. O cerne do sis­


tema do Antigo Testamento é a manifestação da glória de Deus - a Shekinah. João
declara que, em essência, essa glória aparece em Cristo. Ele reconhece a prepara­
ção divina entre as nações para a vinda de Cristo, e a disciplina especial de Israel
com vistas ao advento do Messias. Nos judeus, discerne os sujeitos especiais da
economia messiânica. Natanael, na verdade, é um israelita; o templo é a casa do Pai;
a salvação é dos judeus; as Escrituras judaicas testificam de Cristo; os testemunhos
de Cristo são extraídos de três períodos sucessivos do treinamento do povo - o
patriarcal, o teocrático e o monárquico; a serpente no deserto prefigura o “levanta­
mento” de Cristo, e a Páscoa, seu próprio sacrifício como Cordeiro de Deus.
O quarto Evangelho é o único dos quatro que é desenvolvido de acordo com um
plano sistemático e elaborado com antecedência. Esse plano pode ser genericamen­
te descrito como, seguindo o arranjo geral de Westcott, a exibição do “desenvol­
vimento paralelo de fé e descrença por meio da presença histórica de Cristo”. Por
conseguinte, o Evangelho desdobra-se em duas divisões gerais: o prólogo (1.1-18);
e a narrativa (1.19-21.23). A narrativa consiste de duas partes: a autorrevelação de
Cristo ao mundo (1.19-12.50); a autorrevelação de Cristo aos discípulos (13—21).
No desenvolvimento desse plano, o autor estende-se em três pares de idéias: teste­
munho e verdade; glória e luz; julgamento e vida. Segundo Westcott:

Há várias atestações da missão divina; há a manifestação progressiva da majestade


inerente do Filho; há o efeito contínuo e necessário que essa manifestação produz
sobre aqueles a quem ela se manifesta; e a narrativa pode muito bem ser descrita
como o desenvolvimento simultâneo desses três temas, em que o grande tema de fé e
descrença está dividido.

O plano é prenunciado no prólogo. Aquele que era o Verbo, estava com Deus
desde o princípio, por meio de quem todas as coisas vieram à existência, era vida e
luz - a luz dos homens. Para Ele, o testemunho foi dado por João, que foi enviado
para testificar dele a fim de que todos os homens pudessem crer nele. Mas, embora
Ele tenha se feito carne e habitado entre os homens, embora tenha vindo para sua
própria casa, embora fosse cheio de graça e verdade, o mundo não o conheceu, e
6
I ntrodução aos E scritos de J oão

seu próprio povo recusou-se a recebê-lo. Contudo, houve os que o receberam; e


para esses, Ele deu poder para se tornarem filhos de Deus pela fé em seu nome.
Eles tornaram-se filhos de Deus não em um sentido físico, não pelo sangue, nem
pela vontade do homem, mas de Deus. Eles receberam a plenitude do Senhor.
Por conseguinte, o Evangelho trata da natureza de Cristo e do testemunho
de Cristo dado por João, pelos discípulos e pelos milagres. Ele prossegue para
descrever o conflito entre a Luz eterna e as trevas, incorporadas historicamente
na persistente oposição dos judeus a Jesus. Ele veio a eles, e eles não o receberam.
Então, o outro aspecto é apresentado —a bênção dos que o recebem, a concessão
da filiação e o consequente privilégio de comungar com a natureza divina. Do
13.° até o fim do 17." capítulo, descreve-se a revelação de Cristo de si mesmo a
seus discípulos em ministérios de amor e em discurso privado. As trevas não
dominam a luz. A aparente derrota por meio da morte foi convertida em vitória
pela ressurreição. Essa vitória da luz é desenvolvida do capítulo 18 ao fim do ca­
pítulo 20, na história da traição, da paixão e da ressurreição. O capítulo 21 forma
um epílogo em que a luz divina brilha mais uma vez em milagre, ministério e
conselho, antes da partida final para o Pai.

R elação com os E vangelhos S inópticos

O quarto Evangelho exibe diferenças marcantes em relação aos outros Evan­


gelhos no arranjo cronológico e na seleção do material. Quanto a esse último
item, contém muito do que é peculiar a si mesmo e concorda com os Sinópticos
apenas em algumas seções.
Contudo, o Evangelho, embora independente, não contradiz os Evangelhos
Sinópticos. Todos os quatro Evangelhos baseiam-se conscientemente nos mes­
mos grandes fatos, e o autor do quarto Evangelho reconhece e confirma os três
primeiros. Os incidentes comuns ao quarto Evangelho e a todos os Sinópticos
são o batismo de João, a alimentação das cinco mil pessoas, a entrada triunfal
em Jerusalém, a última ceia e a paixão e ressurreição. João, junto com Mateus e
Marcos, relata o caminhar sobre o mar e a unção em Betânia.
O Evangelho de João também sugere conhecimento de incidentes que ele não
relata. São eles as circunstâncias do batismo de Jesus, a posição e o caráter de Si-
mão Pedro, a moradia inicial de Jesus em Nazaré e a posterior em Cafarnaum, o
número dos discípulos, a data da prisão de João Batista, a ascensão etc. As mesmas
imagens aparecem nas figuras do noivo e da noiva, da colheita, do servo, da vinha.
Os mesmos ditos ocorrem, e coincidências verbais e outras são frequentes2.

2 . Para uma lista dessas coincidências, vide Westcott, Introdução ao Commentary on the Gospel o f
John, em Speaker’s Commentary.

7
I ntrodução aos E scritos de J oão

As coincidências internas são ainda mais espantosas. Por exemplo, o retrato


de Jesus apresentado por João, em muitos aspectos, é único. Ele é mais completo,
mais sutil, e indica uma intimidade mais estreita. João lida com a pessoa de Je­
sus, em pontos em que Mateus e Lucas lidam com sua missão. Em Mateus, Ele
é o cumpridor da lei; em João, prenuncia o plano maior e mais rico do Espírito.
Não obstante, o Cristo de João é a mesma figura que aparece nos Sinópticos. Em
ambos, Ele é o mestre, o manso e humilde, o operador de milagres de poder e
misericórdia. Em ambos, é o de fala clara e simples para aqueles que se tornariam
seus discípulos, o que odeia a hipocrisia, o que lê o coração do homem.
Coincidências similares aparecem no retrato de discípulos proeminentes, no­
tavelmente de Pedro. Embora apareça em algumas cenas não relatadas pelos
escritores dos Sinópticos, o Pedro de seus Evangelhos é facilmente reconhecido
no retrato apresentado por seu companheiro discípulo. Ele é a mesma combina­
ção de coragem impulsiva e covardia; de afeição e brusquidão; tão rapidamente
suscetível ao amor quanto à raiva; tão pronto a entrar no mar ao ver seu Senhor
andando sobre as águas quanto a ferir Malco.
As coincidências internas também são discerníveis na pressuposição de João
dos fatos registrados pelos outros evangelistas, de modo que as coincidências,
às vezes, aparecem no que ele não registra. Sem dar detalhes do nascimento
de Cristo, como Mateus e Lucas, João informa-nos que o Verbo se fez carne. A
infância de Jesus, com sua sujeição à autoridade paterna, aparece na história do
casamento em Caná. Enquanto os Sinópticos estendem-se no evento da encar­
nação, ele estende-se na doutrina. O batismo e a Ceia, dos quais a instituição ele
não relata, são presumidos como familiares na conversa com Nicodemos e no
discurso em Cafarnaum. A ascensão não é descrita, mas é predita nas palavras de
Cristo a Maria. De forma semelhante, a obra de Jesus na Galileia, que João não
narra, é pressuposta nos capítulos 6 e 7. Presume-se que a unção em Betânia é
conhecida, bem como o interrogatório de Jesus diante de Caifás.
Com essas coincidências marcantes aparecem diferenças. Afora a omissão de
Marcos do Evangelho da infância, a narrativa dos Sinópticos divide-se em três
partes: (l) o ministério de João Batista, o batismo e a tentação de Jesus; (2) o
retorno de Jesus à Galileia, seguido de uma série de narrativas conectadas con­
cernentes ao ensino e aos milagres dele nesse distrito e nos circunvizinhos, sem
nenhuma sugestão de que, durante esse tempo, Ele também visitou a Judeia e
Jerusalém; (3) todos os três, por conseguinte, passam imediatamente da última
jornada de Jesus a Jerusalém para a Páscoa, em que Ele foi crucificado. Por isso,
conforme o Deão Alford comenta,

se tivéssemos apenas o relato deles, jamais poderiamos, com alguma certeza, afirmar
que Ele foi a Jerusalém, durante sua vida pública, até chegar o momento de ser entregue.

8
I ntrodução aos E scritos de J oão

É verdade que eles não excluem essa suposição, mas, antes, talvez a sugiram. Contudo,
isso não podería ser deduzido da narrativa deles com alguma precisão histórica.

Voltando-nos, agora, para o Evangelho de João, descobrimos o ministé­


rio de Cristo na Galileia, entre o batismo e a paixão, interrompido pelas
jornadas a Jerusalém. Ele sobe à cidade para a Páscoa, ocasião em que ocor­
re a purificação do templo e a visita a Nicodemos (2.13; 3.1-21). Uma se­
gunda visita acontece em uma festa dos judeus cujo nome não é mencionado
(v. 1), durante a qual Ele cura o homem paralítico, em Betesda, incitando,
com isso, a hostilidade dos judeus, e faz o discurso dos versículos 17-47. Ele
sobe mais uma vez à cidade na Festa dos Tabernáculos (7.10), e, dez meses
depois, na Festa da Dedicação (10.22). Passa um período de intervalo do
outro lado do Jordão (10.40), em Efraim, no deserto da Judeia (l 1.53-54), e
em Betânia (11; 12.1), depois do que faz sua entrada triunfal em Jerusalém
(22.12ss). Assim, de acordo com João, entre a última jornada de Cristo da
Galileia para Jerusalém e sua entrada triunfal na cidade, há um intervalo
de diversos meses, passado, em parte, em Jerusalém e, em parte, nos dis­
tritos vizinhos; enquanto, de acordo com os Sinópticos, parece que Ele foi
da Galileia para Jerusalém, para a última Páscoa, só pouco tempo antes de
ela começar, e que, antes disso, permaneceu todo o tempo na Galileia ou na
vizinhança dela, tendo estabelecido sua moradia lá no início de seu minis­
tério público.
Nos Sinópticos, o cenário da obra de Cristo é quase exclusivamente a Galileia,
enquanto João menciona só cinco eventos ligados ao ministério galileu. O quarto
Evangelho, por sua vez, presume o conhecimento da atividade de Jesus na Gali­
leia e na Pereia (6.1; 7.1; 5.11,52; 10.40).
A diferença entre João e os Sinópticos também aparece na forma da narra­
tiva. Os últimos apresentam o ensino de Jesus tratando principalmente com
os camponeses humildes. Ele é proverbial, popular, abundante em parábolas,
e os discursos são breves. João apresenta Cristo fazendo longos e profun­
dos discursos refletidos. Enquanto João não traz nada correspondente ao
Sermão do Monte e aos grupos de parábolas, os outros evangelistas não fa­
zem qualquer relato equivalente às conversas com Nicodemos, com a mulher
samaritana e com os discípulos antes da Páscoa. Em João, os discursos são
mais comoventes e dialéticos; nos Sinópticos, mais proverbiais, parabólicos
e proféticos. Contudo, o relato de João a respeito do ensino de Jesus não é
desprovido de breves ditos paradoxais, como os que abundam nos Sinópticos
(cp. 2.19; 4.32,34-35; 7.33; 5.17; 6.27,33,62); nem faltam ditos parabólicos,
como o Deus Pastor, a Vinha, a Agua Viva e o Pão do Céu, apesar de nenhuma
parábola ser desenvolvida por João.

9
I ntrodução aos E scritos de J oão

Em outro e mais profundo aspecto, seu Evangelho permanece relacionado aos


outros como complementação. Só ele apreendeu e preservou determinados aspectos
da vida e do ensino do Senhor, como suas declarações quanto à sua relação eterna
com o Pai e sua unidade eterna com Ele (S.ISss; 5.17ss.; 6.33,51; 7.16,28ss.; 8.58, e
outros). Em resumo, é a João que devemos a percepção do aspecto contemplativo
da obra de Cristo; enquanto, no que concerne à relação do cristão com seu Senhor,
o evangelista nos fornece aquelas palavras profundas e reconfortantes que dizem
respeito à união mística e à comunhão de vida entre Ele mesmo e seus discípulos,
nas quais eles entrarão por intermédio do Espírito Santo.
Contudo, essas percepções mais místicas e mais profundas, no geral, não são o
resultado da personalidade característica de João. Elas também foram matizadas
e modeladas pelas condições peculiares da igreja e do pensamento religioso da
sua época. O conflito do cristianismo não era mais com o erro do judaísmo, não
mais entre o evangelho e a lei, entre a circuncisão e a incircuncisão, mas com um
gnosticismo essencialmente pagão que atraía a igreja com a pretensão de uma
profunda percepção do cristianismo e que tentava perverter o evangelho para
seu próprio serviço. Já se comentou que o objetivo do quarto Evangelho não era
distintamente polêmico. João foi impelido a escrever pela pressão sobre sua pró­
pria alma da verdade de “Deus manifestado em carne”, e não pelas agressões da
heresia. Não obstante, as declarações de um certo Cerinto3 acrescentaram aspe­
reza ao retrato do Filho do Homem feito pelo apóstolo. Nenhuma resposta mais
impressionante poderia ser dada a esse ensinamento que a fornecida por João
nas palavras do próprio Senhor concernentes à sua preexistência e divindade
eterna e em seu testemunho de que o Pai criou todas as coisas por meio do Ver­
bo. {Vide 1.3,14,33-34,49; 3.13-14; 5.23,26; 6.51,62; 8.58; 13.23SS.; 17.1-2,16,19;
18.6,11,37.)

As E pístolas

Em geral, reconhece-se que a primeira epístola foi escrita em Éfeso. Na igreja


latina, prevalecia a opinião de que ela foi endereçada primariamente aos partos,
mas a tradição eclesiástica não identifica nenhuma missão de João aos partos,
sendo que se supõe que Tomé levou o evangelho a eles.

3. Este Cerinto ensinava que o mundo não foi feito pelo Deus supremo, mas por outro poder re­
moto que governa o universo. Dizia que Jesus não nasceu da virgem por concepção milagrosa,
mas era o filho de José e Maria por geração natural, embora fosse especialmente provido com
justiça e sabedoria. Dizia também que, depois do batismo de Jesus, o Cristo desceu sobre Ele na
forma de uma pomba, a partir desse poder soberano que está sobre todas as coisas. Então, Ele
anunciou o Pai desconhecido e realizou milagres, mas, perto do fim do seu ministério, o Cristo
partiu de Jesus, e este sofreu e ressuscitou da morte, enquanto o Cristo permaneceu impassível
como um ser espiritual.

10
I ntrodução aos E scritos de J oão

Contudo, o destinatário exato dela é de pouca consequência. “Seu matiz é mo­


ral, não local.” É um retrato único de uma sociedade cristã, a única comunicação
da obra do Espírito entre os homens. Não há traço de perseguição: “O mundo
era perigoso por sua sedução, não por sua hostilidade”; os perigos eram internos,
não externos.
Esses fatos dão caráter à epístola em dois sentidos. Primeiro, a obra
missionária da igreja encontra-se no pano de fundo do pensamento do
apóstolo. O mundo é dominado pela fé conforme representada na igreja,
e o evangelho é proclamado pela própria existência da igreja, e proclama­
do efetivamente à proporção da pureza e fidelidade da igreja. Segundo, a
atenção concentra-se na ideia fundamental da própria mensagem, não na
relação da mensagem com outros sistemas. A grande questão é a pessoa e
a obra do Senhor.
A forma peculiar de erro combatida na epístola é a docética e a ceríntica4. Nes­
se ensinamento, o pecado e a expiação não têm lugar. Cristo veio ao mundo não
para redimi-lo pela remissão do pecado, mas para iluminar alguns intelectos se­
lecionados com filosofia, Jesus não é Deus manifestado em carne; a humanidade
de Jesus não é real, mas um espectro. Contra esses pontos de vista, João afirma
que nenhum espírito que nega que Jesus Cristo veio em carne é de Deus (1Jo
4.2-3); que aquele que nega que Jesus é o Cristo é mentiroso, e que a negação do
Filho envolve a rejeição do Pai (2.22-23); que aquele que nega ser pecador enga­
na a si mesmo e impugna a veracidade de Deus (1.8,10). O Verbo da vida que ele
proclama era a verdadeira manifestação humana de Deus, o Cristo humano que
ele e seus companheiros discípulos viram, e ouviram, e tocaram (1.1-2). Jesus é a
propiciação para o pecado (2.2). O mundo não é conquistado pelo conhecimento,
mas pela fé de que Jesus é o Filho de Deus (5.4-5).
A principal evidência da autoria de João para a epístola é interna, extraí­
da de sua semelhança com o Evangelho em vocabulário, estilo, pensamento
e escopo. Existe a mesma repetição de palavras e frases fundamentais, como
verdade, amor, luz, nascido de Deus, permanência em Deus. Existe a mesma sim­
plicidade de construção; a mesma raridade de partículas; o emprego do conec-
tivo simples (καί, e), em lugar de uma partícula de sequência lógica (3.3,16);
a sucessão de sentenças e orações sem partícula (2.22-24; 4.4-6,7-10,11-13;
2.5-6,9-10); e a execução de sentenças em paralelismo por meio da repetição de
orações (1.6,8,10; 5.18,20). As coincidências verbais abundam. Palavras como
κόσμος (mundo), φως (luz), σκοτία (trevas), φανερόω (manifestar), ζωή αιώνιος
(vida eterna), αληθινός Θεός (o Deus verdadeiro), ò μονογενής υίός (o Filho

4. Os docetistas defendiam que o corpo de nosso Senhor era um espectro imaterial. O nome deles
deriva de δοκέω (dokeõ), parecer.

11
I ntrodução aos E scritos de J oão

unigênito) etc. são comuns a ambos. Coincidências de expressão também são


numerosas. Compare, por exemplo:

1 J oão E vangelho
1.2-3 3.11
1.4 16.24
2.11 12.35
2.14 5.38
2.17 8.35
3.5 8.46
3.8 8.44
3.13 15.18
3.14 5.24
3.16 10.15
4.6 8.47
5.4 16.23

A epístola pressupõe o Evangelho. As diferenças são do mesmo tipo das que


aparecem naturalmente entre um historiador e um professor interpretando a
história. Pode-se perceber isso por uma comparação do prólogo do Evangelho
com a epístola. O prólogo e a epístola permanecem na mesma relação com os
discursos, conforme aparece a partir de uma comparação dos pensamentos sobre
vida, luz e verdade, no prólogo, com passagens nos discursos. Assim, compare,
sobre vida, Evangelho 5.26; 11.25; 14.6; prólogo 1.4; epístola 1.1; 5.20. Sobre luz,
Evangelho 8.12; 12.46; prólogo 1.4,7,9; epístola 1.6-7; 2.8. Sobre verdade, Evan­
gelho 8.32; 14.6; prólogo 1.9,14,17; epístola 1.6,8,10; 2.4,8,21,27; 3.19; 4.1,6; 5.20.
O tema do Evangelho é: Jesus é o Cristo em processo de manifestar sua glória.
Na epístola, presume-se a manifestação da glória como o fundamento da exor­
tação aos cristãos para que a manifestem em sua vida. A doutrina da propicia-
ção, exposta a Nicodemos, é aplicada em lJo 3.1. A promessa do Paracleto, no
Evangelho, é indicada como cumprida na epístola (2.20). A epístola lida com
os frutos daquele amor que é ordenado no Evangelho. (Cp. Evangelho 13.34;
15.12 com epístola 3.11; 4.7,11; 3.14; 4.12,20-21.) No Evangelho, a glória di­
vina é proeminente; na epístola, a humanidade de Cristo o é. A doutrina da
propiciação e da purificação é tratada de forma mais completa na epístola (2.2;
3.16; 4.10; 1.7,9).
O caráter epistolar não aparece na forma. Ela não tem endereçamento ou
subscrição, e não apresenta nenhum traço direto de seu autor ou de seu des­
tinatário. Mas é movida por sentimento pessoal (1.4; 2.12), pela experiên­
cia pessoal (l.l), e pela avaliação das circunstâncias das pessoas referidas
(2.12,22,27; 3.2,13; 4.1,4; 5.18).
12
I ntrodução aos E scritos de J oão

A segunda e terceira epístolas não contêm indicação direta da época ou do


lugar em que foram escritas. Provavelmente, foram compostas em Éfeso. Fica
aparente que as duas são obras do mesmo autor por causa da concordância de
estilo e espírito. Em relação à primeira epístola, a semelhança de linguagem e
pensamento entre a segunda e a primeira é mais estreita que entre a primeira
e a terceira.

O A pocalipse

Esse documento deu origem a volumosas controvérsias quanto a seu autor,


sua origem, seu propósito e sua interpretação. Sustenta-se que é uma falsificação,
usando o nome de João; composta por outro autor sob o nome do apóstolo, não a
fim de enganar, mas de registrar uma revelação oral de João; ou que foi obra de
outro João. Alguns que negam que João escreveu o Evangelho atribuem o Apo­
calipse a ele, e a autenticidade do último é defendida por alguns proeminentes
críticos racionalistas.
O apóstolo João foi banido para a ilha de Patmos, provavelmente pelo impe­
rador Domiciano, em 95 ou 96 d.C.; e o livro, composto durante seu exílio ou, o
que é mais provável, depois de seu retorno a Éfeso, contém a revelação concedida
a ele em uma série de visões. O livro é endereçado diretamente às sete igrejas da
Ásia proconsular, sendo o número sete representativo, e não incluindo todas as
igrejas da Ásia. O propósito do livro era encorajar a igreja durante aquele perí­
odo de provação, predito por Jesus mesmo, entre o encerramento da revelação
direta e a segunda vinda do Senhor. Esse encorajamento centra-se no retorno de
Jesus para dar vida eterna ao seu povo e para esmagar seus inimigos. Quando re­
lacionado com o progresso da doutrina no texto do Novo Testamento, ele repre­
senta a consumação final da igreja redimida, a Jerusalém celestial, prenunciada
na elevação e crescimento da igreja apostólica.
O estilo é figurativo e simbólico. Lida com princípios, não com eventos espe­
cíficos. A negligência dessa característica e a tentativa correspondente de ligar
os símbolos e profecias com incidentes ou personagens históricos específicos
devem-se a maior extravagância de interpretação. Não se pode extrair nenhum
argumento satisfatório de seu conteúdo contra sua autenticidade quando relacio­
nado com os outros escritos de João. Ele proclama as mesmas verdades eternas
afirmadas e vindicadas no Evangelho e nas epístolas —a soberania de Deus, o
conflito de pecado e justiça, o triunfo temporário do mal, e a vitória final e decisi­
va da santidade. Com nos outros escritos, Cristo é a figura central, o conquista­
dor do pecado e da morte, a alegria coroada do redimido, e o objeto da adoração
dele. O livro enfatiza o ódio divino contra o pecado e a certeza do julgamento
divino do ímpio e da futura bem-aventurança dos que creem em Jesus. A prin-
13
I ntrodução aos E scritos de J oão

cipal ideia do Evangelho e do livro de Apocalipse é a mesma - a de um conflito


decisivo entre as forças do bem e do mal.
O simbolismo do Apocalipse é judaico, e não grego ou romano. O livro está
impregnado com o estilo e a imagem do Antigo Testamento, e é modelado pelos
livros históricos e proféticos dele. Como diz o Professor Milligan:

O livro está absolutamente impregnado das memórias, dos incidentes, dos pensamen­
tos e da linguagem do passado da igreja. Em tal extensão, é esse o caso de que se
pode duvidar se contém uma única figura não extraída do Antigo Testamento, ou
uma única sentença completa que não tenha sido, mais ou menos, construída a partir
de materiais extraídos da mesma fonte. £...] É um perfeito mosaico de passagens do
A ntigo Testamento, em um momento, citadas verbalmente, em outro, mencionadas
por meio de alusão distinta; agora, tomadas de uma cena da história judaica, e agora
novamente, de duas ou três juntas.

Assim, a heresia dos nicolaítas é a heresia de Balaão (2.14); a maldade na


igreja de Tiatira é personificada por Jezabel (2.20); o capitão angélico na guerra
contra os dragões é o Miguel do livro de Daniel (12.7); Jerusalém, monte Sião,
Babilônia, o Eufrates, Sodoma e Egito são símbolos da santa bem-aventurança
dos santos, dos transgressores contra Deus e do julgamento do ímpio (21.2; 14.1;
16.19; 9.14; 6.8). A batalha de Armagedom leva-nos de volta à grande morte na
planície de Megido (Jz 5.19; SI 83.9; 2Rs 23.29). As promessas às igrejas são fei­
tas sob as figuras da árvore da vida, do maná escondido, da pedra branca, da vara
de ferro, da coluna do templo de Deus (2.7,17,27-28; 3.5,12,20). O céu é descrito
sob a imagem do tabernáculo no deserto (11.1,19; 6.9; 8.3; 4.6). As pragas do
capítulo 8 são as pragas do Egito; a travessia do mar Vermelho e a destruição de
Corá estão misturadas na representação da libertação do povo de Deus (12.15-
16). Dos profetas, Ageu contribui com o terremoto do capítulo 6, e Joel, com a
mudança do sol em negrume de pano de saco e da lua em sangue; Isaías contribui
com as estrelas caindo, com a figueira derrubando seu fruto temporão, e com a
retirada do céu como um pergaminho; Ezequiel contribui com o escorpião do
capítulo 9, a descrição da nova Jerusalém do capítulo 21, o livro do capítulo 5, e
o pequeno livro do capítulo 10; Zacarias contribui com a abertura dos selos do
capítulo 6 e as oliveiras do capítulo 11. A visão do Redentor glorificado (1.12-20)
é combinada a partir de Êxodo, Zacarias, Daniel, Ezequiel, Isaías e Salmos.
Junto com essas coincidências, há determinados contrastes, notavelmente em
relação à doutrina da vinda de Cristo, a qual, no Evangelho e nas epístolas, está
no pano de fundo, embora seja o tema principal de Apocalipse. O Apocalipse tra­
ta o julgamento iminente como algo exterior, o Evangelho, como espiritual. O
Apocalipse descreve o triunfo do cristianismo sob a imagem do judaísmo, sendo
14
I ntroduçAo aos E scritos de J oão

a consumação uma Jerusalém ideal e uma adoração ideal; enquanto no Evange­


lho o judaísmo aparece em oposição a Cristo, “permanecendo de fora, isolado e
petrificado, e não tomado com Ele, despertado e glorificado”.
Os símbolos do livro são extraídos de objetos familiares ao escritor - os gafa­
nhotos, as águias, a mó, a oliveira, a palmeira e a vinha.
A principal objeção proposta contra a autoria comum ao Evangelho e ao Apo­
calipse é a diferença de linguagem e estilo. Essa diferença deve ser admitida
francamente. Como afirma o Dr. Davidson:

A linguagem afasta-se materialmente do grego usual do Novo Testamento, apresen­


tando anomalias, incorreções, construções peculiares e disposição estranha de pala­
vras que não têm paralelo. [[...3 A linguagem é tão completamente hebraica, que ne­
gligencia as regras usuais do grego.

Muitos críticos eminentes consideram essas diferenças irreconciliáveis com a


pressuposição da autoria comum.
Por sua vez, pode-se argumentar que essas diferenças são em grande escala
intencionais; que o autor deixa o uso comum sob as exigências peculiares de seu
assunto, originadas das condições sob as quais ele escreve, e que seu intento é
conformar-se ao estilo de discurso do Antigo Testamento; e mais, que sua fami­
liaridade com o uso correto é mostrado por outras passagens do mesmo livro.
Além disso, o livro de Apocalipse contém muitas das palavras que são peculiares
ao Evangelho e às epístolas, como testemunho, tabemáculo, guardar, vencer, nomear,
tanto quanto a expressão de caráter, verdade (αληθινός), no sentido de real; e as
figuras de fome, sede, maná, água viva, pastor e ovelhas. Na verdade, responde-se
que, nas passagens em que as mesmas palavras ocorrem, elas são usadas com
um sentido diferente, mas muitas dessas alegadas diferenças desaparecem sob
exame mais atento. O caráter hebraico só é superficialmente distinto do caráter
do Evangelho, que é hebraico no espírito, embora o grego seja muito mais puro,
e “a ausência de solecismo surja da fuga de expressões idiomáticas”5.

E s t il o e E xpr essã o d e J oão

O estilo de João no Evangelho e nas epístolas é marcado pela simplicidade e


facilidade. Ele é claro, sem elegância, e a expressão é comparativamente pura no
que concerne às palavras e à gramática, mas animada por um talento hebraico.

5. Está, obviamente, fora do escopo deste livro discutir de forma crítica essa e outras questões joa-
ninas. Tal tarefa tem de pressupor a familiaridade do leitor com o grego. A discussão referente
às diferenças de linguagem pode ser encontrada na excelente obra do Professor Milligan, The
Revelation of St. John, Apêndice II.

15
I ntrodução aos E scritos de J oão

Godet descreve o estilo como caracterizado por “uma simplicidade infantil e pro­
fundidade transparente, uma santa melancolia, e uma vivacidade não menos que
santa; acima de tudo, a suavidade de um amor puro e gentil”.
O vocabulário é escasso. As mesmas expressões ocorrem continuamente. Por
isso, encontramos 23 ocorrências de φώς (luz); 42 de δόξα, δοξάζεσθαι (glória,
ser glorificado); 52 de ζωή, ζην (vida, viver); 47 de μαρτυρεΐν, μαρτυρία (teste­
munhar, testemunho); 55 de γινώσκειν (saber, conhecer); 78 de κόσμος (mundo);
98 de πίστευε lv (crer, acreditar); 23 de εργον (trabalho); 25 de όνομα (nome) e
άληθεία (verdade), cada; e 17 de σημεΐον (sinal).
Todavia, a escassez do vocabulário é compensada por sua riqueza. As pou­
cas palavras constantemente recorrentes são símbolos de idéias fundamentais e
eternas. Conforme Godet:

Elas não são puramente noções abstratas, mas poderosas realidades espirituais que
podem ser estudadas sob múltiplos aspectos. Se o autor tem apenas poucos termos
em seu vocabulário, esses termos podem ser comparados a peças de ouro com que
grandes senhores fazem pagamentos.

Uma uniformidade semelhante fica aparente nas construções. Em geral, elas


são simples, claras e diretas. As sentenças são curtas e coordenadas, seguindo
uma à outra por um tipo de paralelismo, como na poesia hebraica. Assim, em
lugares onde outros escritores usariam partículas de conexão lógica, ele usa o
simples conectivo καί (e). Por exemplo, em 1.10, João quer dizer que, embora
Jesus estivesse no mundo, ainda assim o mundo não o conheceu; mas ele afirma
o fato em duas proposições distintas e independentes: “estava no mundo £../] e
o mundo não o conheceu”. Como em 8.20. Jesus falava no lugar do tesouro, en­
sinava no templo, e embora Ele aparecesse e ensinasse publicamente, ninguém
pôs as mãos nele. João escreve: “Essas palavras disse Jesus no lugar do tesouro,
ensinando no templo, e ninguém o prendeu”. Ele usa e no lugar em que se pode
esperar o antitético mas (1.5; 3.11; 15.24). Há também uma ausência frequente
de partículas de ligação. Por exemplo, não há nenhuma nos primeiros dezesse­
te versículos do capítulo 15. Apesar da riqueza das partículas gregas, João usa
apenas cinco. Ele faz uso abundante de contrastes ou paralelismos antitéticos
sem usar conexões de ligação. Daí, “a lei foi dada por Moisés; a graça e a verda­
de vieram por Jesus Cristo” ( 1.17); “Deus nunca foi visto por alguém. O Filho
unigênito, que está no seio do Pai, este o fez conhecer” (1.18). Compare com
8.23; 15.5 etc. Essa coordenação simples de orações é auxiliada pela repetição
de uma palavra ou frase marcadas, de modo que a conexão entre as duas decla­
rações seja estabelecida, e a ideia, conduzida em uma nova direção (cp. 10.11;
15.13SS.; 15.1,5; 17.14SS.; 6 .3 9 -4 0 ,4 4 ).

16
I ntrodução aos E scritos de J oão

A narrativa é direta. Até mesmo as palavras de outros são dadas diretamente,


e não de forma oblíqua. Em vez de dizer: “Este é o testemunho de João, quando
os judeus mandaram que lhe perguntassem quem ele era, e ele confessou que
não era o Cristo”, João diz: “E este é o testemunho de João, quando os judeus
mandaram £...J que lhe perguntassem: Quem és tu? E confessou £../]: Eu não
sou o Cristo” (1.19, grifo nosso). Compare com 7.40ss.; 2.3ss.; 4.24ss.; 5.10ss.;
6.14; 8.22; 10.3ss. Na estrutura da narrativa, não são trabalhados detalhes ilus­
trativos, mas estes são inseridos como parênteses ou declarações distintas (cp.
6.10; 4.6; 10.22; 13.30; 18.40). O estilo de João é circunstancial. Uma ação que
os outros escritores declaram como complexa é analisada por ele, e seus com­
ponentes são declarados separadamente. Assim, em vez da expressão idiomá­
tica grega usual: “Jesus respondendo disse”, João escreve: “Jesus respondeu e
disse”, tornando, assim, ambos os fatores do ato igualmente proeminentes (cp.
12.44; 7.28; 1.15,25). Essa peculiaridade é ainda mais ilustrada pela combina­
ção das expressões positiva e negativa da mesma verdade (cp. 1.3,20; 2.24; 3.16;
5.5; 18.20; lJo 1.6; 2.4,27). Contudo, a separação é apenas superficial. A ligação
interna é mantida próxima na mente do escritor, e é impressa no leitor pela
constante repetição que, em uma percepção apressada, parece monótona, mas
que serve para representar o pensamento central em suas muitas facetas e para
pô-lo em sua relação dominante com pensamentos subordinados. Seu uso fre­
quente da partícula ούν (portanto) dirige a atenção para a sequência de eventos
ou idéias (2.22; 3.25,29; 4.1,6,46; 6.5; 7.25; 8.12,21,31,38; 5.7; 7.1,3,9,17,21).
A expressão afim de que (iva), marcando um objeto ou propósito, ocorre com
frequência e exibe a característica da mente de João de considerar as coisas em
suas relações moral e providencial. Assim, em 4.34: “A minha comida é afim de
que faça a vontade daquele que me enviou”, a ênfase não cai sobre o processo,
mas sobre o fim. Compare com 5.36; 6.29; 8.56; 12.23; 13.34; 17.3.
O sujeito, ou a palavra relevante de uma sentença, é frequentemente repeti­
do, sobretudo em diálogos (característicos do Evangelho de João), em que, pela
repetição constante dos nomes das partes, eles são mantidos claros na mente do
leitor (cp. 2.18; 4.7SS.; 8.48ss.; 10.23ss.; também 1.1,7,10; 4,22; 5.31; 6.27; 11.33).
O pronome demonstrativo é habitualmente introduzido para evocar o sujei­
to, quando uma oração fica entre o sujeito e o verbo (cp. 15.5; 7.18; 10.1; 12.48;
14.21,26; 15.26). O pronome pessoal é empregado com frequência, sobretudo na
primeira pessoa. Segundo Westcott: “A esse respeito, boa parte do ensinamento
dos discursos do Senhor depende do cuidadoso reconhecimento da referência
enfática à sua personalidade indivisa” (cp. 8.14,16; 5.31).
As citações, em geral, são da lxx , e nunca diretamente do hebraico.

17
João

P rólogo

-18. Apresento a organização do Prólogo de acordo com Godet:

O prólogo resum e-se a três pensam entos, que também determinam o plano dele:
O Logos: o Logos renegado; o L ogos reconhecido e recuperado. E sses três as­
pectos fundam entais harm onizam com os três principais aspectos da história
conform e relatada nesse Evangelho: a revelação do Logos; a descrença do povo
judeu; a fé dos discípulos. O versículo 5 forma uma transição entre a primeira
parte (vv. 1-5) e a segunda (vv. 6- 1 1), da m esm a maneira que os versículos 12 e
13 ligam a segunda parte à terceira (vv, 12-18), a qual, por sua vez, tem ligação
próxim a com a primeira parte. A relação dessa última parte com a primeira,
indicada pela sim ilaridade de pensam ento e exp ressão que pode ser observada
entre os versículos 18 e 1 , pode ser expressa desta maneira: a pessoa que os
apóstolos observam , que foi proclamada por João Batista, e em quem a igreja
cria (vv. 12-18), não é ninguém além daquele cuja existência e suprema grandio­
sidade foram indicadas pelo títu lo L ogos. Logo, a igreja possui em seu Redentor
o Criador de todas as coisas, a Luz essencial, o Príncipe da vida, o próprio Deus.
A ligação original entre o homem e D eus, que o pecado arruinou (v. 5), e que
a descrença rompeu com pletam ente (v. 1 1 ), é perfeitam ente restaurada para o
cristão; e, por m eio da fé, a lei do paraíso (v. 4) torn a-se mais uma vez a lei da
história humana (vv. 16-18). A ssim , o prólogo forma um todo com pacto e orgâ­
nico, do qual o pensam ento germ inal é este: por m eio da encarnação, os cristãos
são restaurados àquela com unhão com o Verbo e àquela relação viva com Deus,
da qual o homem foi privado pelo pecado.
J oão —P rólogo

P rimeira divisão do prólogo : o V erbo (1-5)

1. No princípio, era (ev αρχή ήν). É uma evidente alusão à primeira palavra de
Gênesis. Mas João eleva a frase de sua referência a um ponto no tempo, o início
da criação, para o tempo da absoluta preexistência, anterior a qualquer criação,
que só é mencionada no versículo 3. Esse princípio não teve princípio (cp. v. 3;
17.5; lJo 1.1; Ef 1.4; Pv 8.23; SI 90.2). Contudo, esse engrandecimento da con­
cepção não aparece tanto em άρχή, princípio, que apenas deixa espaço para isso,
como no uso de ήν, era, denotando existência absoluta (cp. eípí, eu sou, Jo 8.58),
em vez de eyeveio, veio a ser, ou começou a ser, usado nos versículos 3 e 14, acerca
do vir a ser da criação e do Verbo tornando-se carne. Observe também o con­
traste entre kv αρχή, no princípio, e a expressão απ’ αρχής, desde o princípio, que
é comum nos escritos de João (8.44; lJo 2.7,24; 3.8) e que não deixa espaço para
a ideia de preexistência eterna. Segundo Milligan e Moulton:

Em Gn 1.1, a história sagrada parte do princípio e segue em direção descendente,


mantendo-nos, assim, no curso do tempo. Aqui, ele começa do mesmo ponto, mas
segue em direção ascendente, levando-nos, assim, à eternidade do tempo precedente.

Vide nota sobre Cl 1.15. Essa noção de “princípio” é engrandecida ainda mais
pela declaração subsequente da relação do Verbo com o Deus eterno. Ο αρχή
deve referir-se à criação - o princípio primordial das coisas; mas se, nesse princí­
pio, o Verbo já era, então Ele pertencia à ordem da eternidade. Conforme Lange:

Todavia, o Verbo não só existia no princípio, mas também era o princípio eficiente, o
início do princípio. Ο άρχή (princípio), em si mesmo e em sua operação das trevas e dos
caos, estava, em sua ideia e em seu princípio, encerrado em uma única palavra lumino­
sa, que era o Logos. E quando é dito que o Verbo estava em seu princípio, sua existên­
cia eterna já é expressa e sua posição eterna na divindade já é indicada por meio disso.

E Godet:

Há, como o refrão de um hino, oito ocorrências na narrativa da criação (em Gênesis)
das palavras: E disse Deus. João reúne todos esses ditos de D eus em um único dito, vivo
e favorecido com atividade e inteligência, do qual emanam todas as ordens divinas: ele
encontra o Verbofalando como a base de todas as palavras faladas.

A palavra (6 λόγος): Logos. Essa expressão é a nota-chave e o tema de todo o Evan­


gelho. Λόγος é da raiz λεγ, que aparece em λέγω, cujo sentido primitivo é estender, depois,
escolher, reunir,juntar, por conseguinte, reunir ou juntar palavras, e, assim,falar. Por isso,
20
J oão - P rólogo

λόγος, acima de tudo, é uma coletânea, ou coleção, das coisas que estão na mente e das
palavras por meio de que são expressas. Assim, a palavra representa aforma exterior
por meio de que o pensamento interior é expresso, e opensamento interior propriamente
dito, o oratio e ratio latinos; compare com o termo italiano ragionare, “pensar” e “falar”.
Enquanto significando a forma exterior, a palavra nunca é usada no sentido me­
ramente gramatical, como apenas o nome de uma coisa ou ato (έπος, όνομα, ρήμα),
mas representa uma palavra como a coisa a que se refere, a parte material, não aformal·,
a palavra como incorporando a concepção ou ideia. Vide, por exemplo, Mt 22.46;
lCo 14.9,19. Por conseguinte, a palavra representa um dito, de Deus ou do homem
(Mt 19.2 1-22; Mc 5.35-36); um decreto, umpreceito (Rm 9.28; Mc 7.13). A l x x chama
os Dez Mandamentos de oi δέκα λόγοι., “as dez palavras’ (Ex 34.28), daí o conhe­
cido termo decálogo. O termo é usado ainda para discurso, o ato de falar (At 14.12), a
habilidade e prática no falar (Ef 6.19), ou a fala contínua (Lc 4.32,36). Também para
doutrina (At 18.15; 2Tm 4.15), sobretudo a doutrina da salvação por intermédio de
Cristo (Mt 13.20-23; Fp 1.14); para narrativa, tanto a relação como a coisa relacio­
nada (At 1.1; Jo 21.23; Mc 1.45); para assunto sob discussão, um negócio, um caso da
lei (At 15.6; 19.38).
Com o significado de pensamento interior, ela denota a faculdade de pensar e
discernir (Hb 4.12); observação ou consideração (At 20.24); avaliação, prestação de
contas (At 20.29).
João a usa em um sentido peculiar, aqui e no versículo 14; e, com esse sentido,
só nessas duas passagens. A abordagem mais próxima a essa está em Ap 19.13,
em que o conquistador é chamado a Palavra de Deus; e é lembrada nas expressões
Palavra da vida e a vida fo i manifestada (lJo 1.1-2). Compare com Hb 4.12. Era
um termo teológico familiar e corrente quando João escreveu, e, por essa razão,
ele o usa sem dar explicações.

USO DO TERMO NO ANTIGO TESTAMENTO

Aqui, a palavra aponta diretamente para Gn l, em que o ato da criação é efe­


tivado por meio da fala de Deus (cp. SI 33.6). A ideia de Deus, que está em sua
própria natureza oculta, revelando-se na criação, é a raiz do Logos-ideia, em
contraposição a todas as concepções materialistas ou panteístas da criação. No
Antigo Testamento, essa ideia desenvolve-se em três linhas.
(1) A Palavra, como incorporando a vontade divina, épersonificada na poesia hebraica.
Por conseguinte, os atributos divinos são predicados dela como a revelação contínua
de Deus na lei e na profecia (SI 33.4; Is 40.8; SI 119.105). A Palavra é um meio de cura
em SI 107.20; uma mensageira em SI 147.15; o agente do decreto divino em Is 55.11.
(2) A sabedoria personificada (Jó 2.12ss.; Pv 8; 9). Aqui também é a ideia da
revelação do que está escondido. Pois a sabedoria está vedada ao homem: “O
21
JoÂo - P rólogo
homem não lhe conhece o valor; não se acha na terra dos viventes. O abismo
diz: não está em mim; e o mar diz: ela não está comigo. Não se dará por ela
ouro fino, nem se pesará prata em câmbio dela. £...J Porque está encoberta
aos olhos de todo vivente e oculta às aves do céu” (Jó 28.13-15,21). Até mes­
mo a morte, que desvela tantos segredos e o mundo inferior, conhece-a ape­
nas como um rumor (v. 22). Somente Deus conhece seu caminho e seu lugar
(v. 23). Ele fez o mundo, fez os ventos e as águas, fez um decreto para a chuva
e um caminho para a luz do trovão (vv. 25-26). Ele, que possuía sabedoria no
começo do seu caminho, antes de suas obras da antiguidade, antes da terra
com seus abismos e riachos e montanhas, com quem estava a sabedoria como
aquela criada com Ele (Pv 8.26-31), declarou-a: “Então, a viu e a manifestou;
estabeleceu-a e também a esquadrinhou” (Jó 28.27), e incorporou-a em sua
obra criativa. Assim, essa personificação baseia-se no pensamento de que a
sabedoria não está trancada em repouso em Deus, mas é ativa e se manifesta
no mundo. “No cume das alturas, junto ao caminho, nas encruzilhadas das
veredas, ela se coloca. Da banda das portas da cidade, à entrada da cidade e à
entrada das portas está clamando” (Pv 8.2-3). Ela constrói um palácio, prepa­
ra um banquete e faz um convite geral para o simples e para todo aquele que
quer entender (Pv 9.1-6). É vista como a que guia à salvação, compreendendo
todas as revelações de Deus, e como um atributo que abrange e combina to­
dos os outros atributos dele.
(3) O Anjo de Jeová. O mensageiro de Deus que serve como seu agente no mun­
do do sentido, e que é, às vezes, distinguido de Jeová e, outras vezes, idêntico a
Ele (Gn 16.7-13; 32.24-28; Os 12.4-5; Êx 23.20-21; Ml 3.1).

USO APÓCRIFO

Nos escritos apócrifos, esse elemento mediador é apreendido de forma


mais distintiva, mas com uma tendência ao panteísmo. Em Sabedoria de Sa­
lomão (pelo menos, 100 a.C.), em que a sabedoria parece ser vista como outro
nome para toda a natureza divina, embora em nenhuma passagem ligada
ao Messias, ela é descrita como um ser de luz procedente essencialmente
de Deus; uma verdadeira imagem de Deus, coocupante do trono divino; um
princípio verdadeiro e independente, revelando Deus no mundo e fazendo
mediação entre o mundo e Ele, depois de tê-lo criado como seu órgão - em
associação com um espírito chamado povoyeveç, unigênito (7.22). “Ela é um ef-
lúvio do poder de Deus, irradiação pura da glória do Todo-poderoso; eis por
que mancha nenhuma se insinua nela. Ela é um reflexo da luz eterna, espelho
sem mancha da atividade de Deus e imagem da sua bondade” (7.25-26, t e b ;
cp. cap. 7 inteiro). Mais uma vez:
22
J oão - P rólogo

Ela se estende com força de uma extremidade do mundo à outra e com bondade go­
verna o universo. Eu a amei e a procurei desde minha juventude, busquei desposá-la,
apaixonei-me por sua beleza. Sua glória eclipsa a nobreza, pois partilha a vida de
Deus, e o soberano do universo a amou. Iniciada na própria ciência de Deus, é ela
quem decide suas obras. [../] Graças a ela, obterei a imortalidade, e deixarei aos pós-
teros uma lembrança eterna (8. 1- 4,13, teb).

No capítulo 16.12, é dito: "Tua palavra, ó Senhor, que a todos cura” ( t e b ; cp.
SI 107.20); e no capítulo 18.15-16: “A tua Palavra onipotente, deixando os céus
e o trono real, irrompeu como o guerreiro impiedoso no meio da terra maldita,
empunhando, como espada afiada, teu decreto irrevogável. Levantando-se, ela
encheu tudo de morte; ela chegava ao céu, enquanto caminhava sobre a terra”
( t e b ) . Vide também Sr 1; 24; e Br 3; 4.1-4.

USO JUDAICO POSTERIOR

Depois do cativeiro babilônico, os doutores judeus combinaram em uma só


perspectiva as teofanias, revelações proféticas e manifestações em geral de Jeová,
e uniu-as em um único conceito, a de um agente permanente de Jeová no mundo
sensível, que eles designaram pelo nome de Memra {palavra, λόγος) de Jeová. Os
judeus eruditos introduziram a ideia nos targums, ou paráfrases aramaicas do
Antigo Testamento, que eram lidos publicamente nas sinagogas, substituindo a
expressão a palavra de Jeová por aquele nome, cada vez que Deus se manifestava.
Assim, em Gn 39.21, eles parafrasearam: “A Memra estava com José na prisão”.
Em SI 110, Jeová dirige o primeiro versículo à Memra. A Memra é o anjo que des­
truiu os primogênitos do Egito, e foi a Memra que guiou os israelitas na coluna
de nuvem.

USO NA FILOSOFIA JUDAICO-ALEXANDRINA

Desde a época de Ptolomeu I (323-285 a.C.), havia muitos judeus no Egito.


Fílon (50 d.C.) estimava-os em um milhão em sua época. Alexandria era o quartel-
general deles. Eles tinham sua própria assembléia legislativa e magistrados, e
possuíam os mesmos privilégios que os gregos. A Septuaginta ( l x x ) , tradução
das Escrituras hebraicas para o grego (280-150 a.C.), foi o início de um
movimento literário entre eles, a tônica do que foi a reconciliação da cultura
ocidental com o judaísmo, o estabelecimento de uma ligação entre a fé do Antigo
Testamento e a filosofia grega. Por isso, eles interpretavam os fatos da história
sagrada alegoricamente, e os transformavam em símbolos de determinados
princípios especulativos, alegando que os filósofos gregos tinham emprestado
23
JoAo - P rólogo
sua sabedoria de Moisés. Aristóbulo (cerca de 150 a.C.) afirmou a existência de
uma tradução da lei anterior e muito mais antiga, dedicada a Ptolomeu VI; uma
exposição alegórica do Pentateuco, em que ele tentava mostrar que as doutrinas
do peripatético ou da escola aristotélica eram derivadas do Antigo Testamento.
A maioria das escolas da filosofia grega estava representada entre os judeus
alexandrinos, mas a favorita era a platônica. O esforço pela reconciliação
culminou com Fílon, contemporâneo de Cristo. Fílon tinha conhecimento
íntimo da filosofia platônica e tornou-a o caráter fundamental das suas próprias
doutrinas, embora se beneficiando, da mesma forma, de idéias pertencentes às
escolas peripatética e estoica. Incapaz de discernir a diferença nos pontos de
vista a partir de que essas doutrinas rigorosamente distintas procediam, ele
misturou não só doutrinas discordantes das escolas gregas, mas também as do
Oriente, concernentes à sabedoria dos gregos como tendo origem na legislação
e nos escritos de Moisés. Juntou todos os elementos do Oriente e do Ocidente
que podiam ajudar a modelar sua concepção de um vice-gerente de Deus, “um
mediador entre o eterno e o efêmero. Seu Logos reflete luz de incontáveis facetas”.
De acordo com Fílon, Deus é o ser absoluto. Ele chama Deus de “aquele que
é”; “o Único e o Tudo”. Só Deus existe por si mesmo, sem multiplicidade e sem
mistura. Nenhum nome pode ser apropriadamente atribuído a Ele: Ele simples­
mente é. Por isso, em sua natureza, Ele é incognoscível.
Fora de Deus, existe matéria eterna, sem forma e vazia, e essencialmente ma­
ligna; mas o Ser perfeito não poderia entrar em contato direto com o disparatado
e corruptível, de forma que o mundo não poderia ser criado por sua interferência
direta. Por isso, a doutrina de um princípio mediador entre Deus e a matéria - a
Razão divina, o Logos, em quem estão incluídas todas as idéias das coisas finitas,
e quem criou o mundo sensível fazendo com que essas idéias penetrassem na
matéria.
O Deus absoluto está cercado por seus poderes (δυνάμβ,ς) como um rei por
seus servos. Esses poderes, na linguagem platônica, são idéias, na judaica, anjos,
mas, em essência, todos são um, e a unidade deles - como existem em Deus,
como emanam dele, como são disseminados no mundo - é expressa pelo Logos.
Por isso, o Logos aparece sob dois aspectos: (l) como a razão imanente de Deus,
contendo em si mesmo o mundo ideal, que, embora não tenha existência exte­
rior, é igual à razão imanente no homem. Esta é intitulada Λόγος enÔLafieiroç, ou
seja, o Logos concebido e residente na mente. Esse era o aspecto enfatizado pelos
alexandrinos, e que tendia ao reconhecimento de uma dupla personalidade na
essência divina. (2) Como a palavra verdadeira, procedente de Deus e manifes­
tada no mundo. Esta, quando emitida por Deus na criação do mundo é ο Λόγος
προφορικός, ou seja, o Logos proferido, assim como no homem a palavra falada é
a manifestação do pensamento. Esse aspecto prevalecia na Palestina, onde a Pa-
24
JoÂo - P rólogo
lavra aparece como o anjo do Pentateuco, como o meio da comunicação exterior
de Deus com os homens, e tende em direção ao reconhecimento de uma pessoa
divina subordinada a Deus. Sob o primeiro aspecto, o Logos é realmente um com
o ser oculto de Deus; o segundo compreende todas as obras e revelações de Deus
no mundo; proveem dele mesmo as idéias e energias por meio de que o mundo
foi estruturado e é sustentado; e, enchendo todas as coisas com luz e vida divinas,
governa-as em sabedoria, amor e justiça. E o princípio da criação, não iniciado,
como Deus, nem feito, como o mundo; mas o primogênito do Pai eterno (sendo o
mundo o filho mais novo); a imagem de Deus; o mediador entre Deus e o mundo;
o mais alto anjo; o segundo Deus.
Assim, a concepção de Fílon acerca do Logos é: a soma total e o livre exercício
das energias divinas; de modo que Deus, à medida que Ele se revela, é chamado
Logos; enquanto o Logos, à medida que revela Deus, é chamado Deus.
A doutrina e os termos de João são coloridos por essas influências preceden­
tes. Durante sua residência em Efeso, ele deve ter se familiarizado com as formas
e os termos da teologia alexandrina. Não é improvável que tenha usado o termo
Logos com a intenção de facilitar a passagem das teorias correntes em sua época
para o puro evangelho que proclamava. Conforme Godet:

Para aqueles helenistas e judeus helenistas, de um lado, que estavam filosofando em


vão sobre as relações do finito e do infinito; para aqueles investigadores da letra das
Escrituras, de outro lado, que especulavam sobre as revelações teocráticas, João disse,
ao dar o nom e L ogos a Jesus: “O M ediador desconhecido en tre D eus e o mundo, a
quem vocês aspiram conhecer, vim os, ouvim os e tocamos. Suas especulações filosófi­
cas e suas sutilezas nunca os elevarão até Ele. Creiam, com o nós, em Jesus e terão nele
esse Revelador divino que ocupa seus pensam entos”.

Todavia, a doutrina de João não é a de Fílon, e não depende dela. As diferen­


ças entre as duas são pronunciadas. Embora ambos usem o termo Logos, eles o
fazem com sentidos totalmente distintos. Em João, quer dizer palavra, como nas
Escrituras em geral; em Fílon, razão, e de forma tão distintiva, que, quando ele
quer lhe dar o sentido de palavra, acrescenta a ela, a título de explicação, o termo
ρήμα, palavra.
A natureza do ser descrito por Logos é concebida em cada um deles por um
espírito totalmente distinto. O Logos de João é uma pessoa, com a consciência da
distinção pessoal; o de Fílon é impessoal. Sua noção é indeterminada e flutuante,
modelada pela influência que aconteça de estar operando na época. Sob a influ­
ência de documentos judaicos, ele qualifica o Logos como um “arcanjo”; sob a de
Platão, como “a Ideia das Idéias”; sob a dos estoicos, como “a razão impessoal”. É
duvidoso que Fílon já tenha pretendido representar o Logos formalmente como

26
J oão - P rólogo

pessoa. Todos os títulos que ele lhe deu podem ser explicados pela suposição de
que se referia ao mundo ideal sobre o qual o mundo real é modelado.
Além disso, em Fílon, a função do Logos está confinada à criação e preservação
do universo. Ele não se identifica ou se conecta com o Messias. Sua doutrina era,
em grande grau, um substituto filosófico para as esperanças messiânicas. Ele pode
ter concebido a Palavra como agindo por intermédio do Messias, mas não como
um com Ele. O Logos é um princípio universal. Em João, o Messias é o Logos mes­
mo, unindo-se à humanidade e vestindo-se com um corpo a fim de salvar o mundo.
As duas noções diferem quanto à origem. O Deus impessoal de Fílon não pode
passar de criação finita sem contaminação de sua essência divina. Por isso, um
agente inferior deve ser mediador. O Deus de João, por sua vez, é pessoal e tem
personalidade amorosa. Ele é Pai ( 1. 18); sua essência é amor (3. 16; lJo 4.8, 16).
Ele está em relação direta com o mundo que deseja salvar, e o Logos é Ele mes­
mo manifestado na carne. De acordo com Fílon, o Logos não é coexistente com o
Deus eterno. A matéria eterna está antes dele no tempo. Segundo João, o Logos
está essencialmente com o Pai desde toda a eternidade (1.2), e é Ele quem cria
todas as coisas, incluindo a matéria ( 1.3).
Fílon não capta a força moral da religião hebraica conforme expressa em sua
ênfase sobre a santidade de Jeová, e, por isso, não percebe a necessidade de um
mestre e Salvador divino. Ele se esquece da vasta diferença entre Deus e o mundo,
e declara que, se o universo acabasse, Deus morreria de solidão e inatividade.

O SENTIDO DE LOGOS EM JOÃO

Da mesma maneira que Logos tem o duplo sentido de pensamento e fala, tam­
bém Cristo é relacionado a Deus como a palavra à ideia, não sendo a palavra um
mero nome para a ideia, mas a própria ideia expressa. O pensamento é a palavra
interior (o Dr. Schaff compara com a expressão hebraica “falo em meu coração”,
com sentido de “penso”).
O Logos de João é o Deus verdadeiro e pessoal (1.1), a Palavra, que estava
originalmente com Deus antes da criação, e era Deus, um em essência e natureza,
contudo pessoalmente distinto ( 1. 1, 18); o revelador e intérprete do ser oculto de
Deus; o reflexo e a imagem visível de Deus, e o órgão de todas as suas manifesta­
ções ao mundo. Compare com Hb 1.3 . Ele fez todas as coisas, procedendo pesso­
almente de Deus para a execução do ato da criação ( 1.3 ), e tornou-se homem na
pessoa de Jesus Cristo, realizando a redenção do mundo. Compare com Fp 2.6.
Sobre João, Ford cita William Austin:

O nome Palavra é dado de forma mais excelente a nosso Salvador, pois expressa sua na­
tureza em um, mais que em quaisquer outros. Por isso, João, quando nomeia a pessoa na

26
J oão - P rólogo

Trindade (1Jo 5.7), escolhe, antes, chamá-lo P a la v ra que F ilho, pois o termo p a la v r a é mais
comunicável que filh o. F ilh o refere-se só ao P a i que o gerou; mas p a la v r a pode referir-se
àquele que a concebe, àquele que a pronuncia; ao que é fa la d o p o r m eio dela; à voz, de que ela
se reveste; e aos efeitos que ela desperta naquele que a ouve. Assim, Cristo, por ser Ele a
P a la vra , não só se refere a seu Pai que o gerou, e de quem Ele vem, mas também a todas
as criaturas que foram feitas por Ele; à carne com que Ele se revestiu; e à doutrina que
Ele trouxe e ensinou, e que ainda vive nos corações de todos os que a ouviram de forma
obediente. Ele é que é essa P alavra; e qualquer outro, profeta ou pregador, é somente um a
voz (Lc 3.4). P a la v ra é um a concepção in terior d a mente, e v o z é apenas u m sin a l de intenção.
João era só um sinal, uma vo z, não digno de desatar as correias das sandálias dessa Palavra.
Cristo é a concepção in terior “no seio de seu Pai”, e Ele é propriamente a P alavra. Não obs­
tante, a Palavra é a intenção proferida, como também concebida no interior; pois Cristo,
no ventre da virgem, ou na manjedoura, ou no altar da cruz, não era menos a Palavra do
que Ele era no princípio, “no seio de seu Pai”. Pois, da mesma maneira que a intenção não
deixa a mente quando a palavra é proferida, também Cristo, procedendo do Pai por gera­
ção eterna, e depois aqui por nascimento e encarnação, ainda permanece nele e com Ele
em essência; como a intenção, concebida e nascida na mente, ainda permanece com ela e
nela, embora a palavra seja pronunciada. Por isso, Ele é corretamente chamado a P alavra,
por sua vinda do Pai e, ainda assim, sua permanência nele'.

E o Verbo. A repetição do grande sujeito, com ênfase solene.

Estava com Deus (ήν προς τον 0eòv). Na anglo- saxâ, no meio de Deus. Na
wycliffe , em Deus. Com (πρός) não transmite o sentido pleno, mas não há ne­
nhuma palavra em português que o faça melhor. A preposição πρός, que, com o
caso acusativo, denota movimento rumo a, ou direção, é também frequentemente
usada no texto do Novo Testamento com o sentido de com; e não apenas de estar
perto ou ao lado, mas como uma união e comunhão vivas, sugerindo a noção ativa
de relação. Assim: "Não estão aqui conosco suas irmãs?” (πρός ημάς), ou seja, em
relações sociais conosco (Mc 6.3; Mt 1S.56). “Até quando estarei convosco?” (πρός
ύμάς, Mc 9.19). “Todos os dias me assentava junto de vós’ (Mt 26.55). "Para habi­
tar com o Senhof (πρός τον Κύριον, 2Co 5.8). “Fique convosco e passe também o
inverno” (lCo 16.6). “A vida eterna, que estava com o Pai’ (πρός τον πατέρα, lJo
1.2). Dessa forma, a declaração de João é de que o Verbo divino não só habitava
com o Pai por toda a eternidade, mas também estava em relação de comunhão
ativa e viva com Ele.

1. Austin, M e d ita tio n f o r C hristm as D ay. Sobre João nomear a pessoa na Trindade (lJo 5.7), ele
naturalmente não previa a crítica que eliminaria essa passagem do texto. E, ao discutir sobre
“voz”, Austin usou o termo latino vox, e é óbvio que ele tinha em mente o sentido secundário de
p a la v r a ou dito.

27
J oão - P rólogo

E o Verbo era Deus (καί Θεός ήν ό λόγος). Na ordem grega, e Deus era o Ver­
bo, a qual é seguida pela anglo- saxã, wycliffe e tyndale. Contudo, Θεός, Deus,
é o predicado, não o sujeito, da proposição. O sujeito deve ser o Verbo, pois João
não está tentando mostrar quem é Deus, mas quem é o Verbo. Observe que Θεός
está sem artigo, que não podería ser omitido se ele pretendesse designar o Verbo
como Deus; porque, nesse caso, Θεός seria ambíguo, talvez um Deus. Além disso,
se ele dissesse: Deus era o Verbo, estaria contradizendo sua declaração anterior
pela qual distinguira (de forma hipostática)2. Deus do Verbo, e λόγος (Logos)
significaria, ademais, só um atributo de Deus. Na proposição, o predicado está
localizado enfaticamente antes do sujeito, por causa do progresso do pensamen­
to, sendo essa a terceira e mais elevada declaração referente ao Verbo - o clímax
das duas proposições precedentes. A palavra Deus, usada de modo atributivo,
mantém a distinção pessoal entre Deus e o Verbo, mas une a essência e a natu­
reza para seguir a distinção da pessoa, e atribui ao Verbo todos os atributos da
essência divina. Segundo Meyer: “Há algo majestoso na forma como a descrição
do Verbo, nas três breves porém extraordinárias proposições do versículo 1, é
desvelada com crescente abundância”.

2. Ele (ουτος). Literalmente, este-, o primeiro mencionado, o Verbo.

Estava no princípio com Deus. No versículo 1, os elementos dessa decla­


ração foram apresentados separadamente: o Verbo, o ser eterno do Verbo, e sua
comunhão ativa com Deus. Aqui eles estão combinados, e com nova força. Esse
mesmo Verbo não só era coeterno com Deus em relação ao ser (ήν, era), mas
também estava eternamente em comunhão ativa com Ele {no princípio com Deus;
προς tòv Θεόν). Conforme Moulton, “não simplesmente o Verbo com Deus, mas
Deus com Deus”. Observe que aqui Θεόν tem o artigo, como na segunda propo­
sição, em que se fala de Deus de forma absoluta. Na terceira proposição, o Verbo
era Deus, o artigo foi omitido porque Θεός descrevia a natureza do Verbo e não
identificava sua pessoa. Aqui, como na segunda proposição, o Verbo é posto em
relação pessoal com Deus.
Esse versículo forma o ponto de transição da discussão do ser pessoal do Verbo
para sua manifestação na criação. Se era esse mesmo Verbo, e não outro, o qual era
Ele mesmo Deus, e o qual, por toda a eternidade, estava em comunhão ativa com
Deus, então, se segue naturalmente que a declaração diz que todas as coisas foram
criadas por meio dele, ligando assim a natureza essencial do Verbo à sua manifesta-

2. A palavra hípóstase equivale a substância. Na linguagem teológica, o termo é usado no sentido de


pessoa como distinta de essência.
Por isso, a expressão d e fo rm a hipostática significa pessoalmente, no
sentido teológico, que reconhece as três pessoas da Divindade como uma essência.

28
J oão - P rólogo

ção na criação. Como a ideia do Verbo envolve conhecimento e vontade, sabedoria


e força, a função criativa é apropriadamente dele. Por isso, sua relação íntima para
criar coisas, sobretudo o homem, prepara o caminho para sua encarnação e obra
redentora. A conexão entre criação e redenção é mais próxima do que comumente
é apreendido. Ela é sugerida nas palavras de Isaías (46.4): "Eu o fiz, e eu vos leva­
rei”. Em certo sentido, a redenção brota da criação. Porque Deus criou o homem à
sua própria imagem, Ele o restauraria a essa imagem. Porque Deus fez o homem,
ele o ama, educa-o, carrega-o e continua com ele na corrida no sentido de sua in­
finita paciência, é sobrecarregado com sua perversidade e cegueira, e expressa e
executa tudo isso na encarnação e obra redentora de Jesus Cristo. Deus está sob a
tensão do instinto paterno (falando em termos humanos) para redimir o homem.

3. Todas as coisas (πάντα). Observadas severamente. A referência é ao detalhe


infinito da criação, antes que à criação como um todo, a qual é expressa por τα
πάντα, todas as (Cl 1.16). Por isso, João evita a palavra κόσμος, o mundo, a qual
denota o mundo como um grande sistema. Por conseguinte, Bengel, citado por
Meyer, está enganado ao referir-se ao κόσμω (o mundo) do versículo 10 como um
paralelo.

Foram feitas (έγένετο). Literalmente, vieram a í í t o u tornaram-se; expressando


a passagem da inexistência para o ser, e o desvelamento de uma ordem divina.
Compare com os versículos 14 e 17. Três palavras são usadas no texto do Novo
Testamento para expressar o ato da criação: κτίζειν, criar (Ap 4.11; 10.6; Cl
1.16); mi&v, fazer (Ap 14.7; Mc 10.6), ambas as quais se referem ao Criador;
e γίγνεσθαι, tomar-se, que se refere ao que é criado. Em Mc 10.6, ocorrem as
duas palavras: "Desde o princípio da criação (κτίσεως), Deus os fe z (έποίησεν)”.
Também em Ef 2.10: “Somos feitura (ποίημα) sua, criados (κτι,σθέντες) em Cristo
Jesus”. Aqui a distinção é entre o ser absoluto expresso por fjv (vide nota sobre v.
1) e o vir a ser da criação (εγένετο). O mesmo contraste ocorre nos versículos 6 e
9: “Houve (εγενετο) um homem enviado de Deus”; “estava (ήν) a luz verdadeira”.
Sobre lJo 2.17, Westcott escreve:

A principal concepção de criação presente nos escritos de São João é expressa pela
primeira menção que ele faz dela: Todas as coisas vieram a ser por meio da Palavra. Essa
declaração deixa de lado as noções de matéria eterna e de mal inerente à matéria. Hou­
ve ocasião quando o mundo não existia (Jo 17.5,24); e, por implicação, todas as coisas
quando feitas eram boas. A agência da Palavra, que “era Deus”, mais uma vez exclui
a ideia de um Criador essencialmente inferior a Deus, e a noção de um monoteísmo
abstrato em que não há relação viva entre a criatura e o Criador; pois, como todas as
coisas vieram à existência “por meio” da Palavra, assim elas são sustentadas “nela”

29
J oão - P rólogo

(Jo 1.3; cp. Cl 1.16ss.; Hb 1.3). E ainda mais, o uso do termo èyéveto, v eio a ser, como
distinto de έκxía§r\, f o r a m cria d a s, sugere o pensamento de que a criação deve ser vista
(de acordo com nossa apreensão) como uma manifestação de uma lei divina de amor.
Dessa forma, a criação ( to d a s a s coisas v ie ra m a ser p o r m eio dele) corresponde à encarna­
ção (a Palavra se f e z carne). Todo o desvelamento e veladura do ser finito até o último
resultado encontra-se no cumprimento de sua vontade, que é amor.

Por ele (δι’ αύτοϋ). Literalmente, por meio dele. A preposição διά, em geral, é usa­
da para denotar a obra de Deus por intermédio de alguma agência secundária, como
διά του προφήτου, por meio doprofeta (Mt 1.22; vide nota sobre essa referência)3. É a
preposição pela qual usualmente se expressa a relação de Cristo com a criação (cp.
lCo 8.6; Cl 1.16; Hb 1.2), embora, de vez em quando, ela seja usada em relação ao
Pai (Hb 2.10; Rm 11.36; e G1 1.1, onde é usada em relação a ambos). Por isso, como
comenta Godet, “ela não rebaixa a Palavra à categoria de um mero instrumento”,
mas apenas indica uma relação diferente com a criação por parte do Pai e do Filho.

Sem (χωρίς). Literalmente, à parte de. Compare com 15.5.

Nada do que foi feito se fez (έγέι^το ούδ€ eu, ό γέγονεν). Muitas autoridades
colocam o período depois de eu, e juntam ò γέγοι/ev com o que se segue, traduzin­
do por “sem Ele coisa alguma foi feita. Aquilo que foi feito era vida nele”*.

Feito (eyevero). Como antes, veio a ser.

Nada (ούδ€ eu). Literalmente, nem mesmo uma coisa. Compare com πάντα (todas
as coisas), no início desse versículo.

Que foi feito (ò yéyovev). Na t b , mais corretamente, que tem sidofeito, observan­
do a força do tempo perfeito como distinta do aoristo (eyeueTo). O último tempo
aponta para a obra da criação considerada como um ato definitivo ou uma série de
atos no início do tempo. O tempo perfeito indica a continuidade das coisas criadas;
de forma que a ideia completa é: que tem sidofeito e existe. A combinação de uma
oração positiva com uma negativa (cp. v. 20) é característica do estilo de João, como
também do de Tiago. Vide nota sobre “sem faltar em coisa alguma”, Tg 1.4.

3. Assim na rv, mas não consistentemente em toda ela. Vide meu artigo sobre o Novo Testamento
Revisado, in: Presbyterian Review, out 1881.
4. Essa leitura é defendida muito energicamente pelo Cônego Westcott, e é adotada no texto de
Westcott e Hort, e sustentada por Milligan e Moulton. Ela é rejeitada por Tischendorf e pelos
revisores; também por Alford, De Wette, Meyer e Godet. Considerações gramaticais parecem
colocar-se contra ela (v id e Alford, sobre a passagem), mas a defesa de Westcott é mais enge­
nhosa e plausível.
30
JoAo - P rólogo

4. Nele, estava a vida (ev αύτώ ζωή ήν). Ele era a fonte da vida - física, moral
e eterna seu princípio e fonte. O Novo Testamento emprega duas palavras
para vida·, βίος e ζωή. A primeira distinção é que ζωή significa existência em con­
traposição à morte, e βίος, o período, meios, ou modo de existência. Assim, βίος
é originalmente a palavra mais elevada, sendo usada para o homem, enquanto
ζωή é usada para os animais (ζώα). Por isso, referimo-nos à discussão da vida e
dos hábitos dos animais como zoologia; e aos relatos da vida dos homens como
foografia. Os animais têm o princípio vital em comum com os homens, mas os
homens levam a vida controlada pelo intelecto e pela vontade, e direcionada para
fins morais e intelectuais. No texto do Novo Testamento, βίος significa sustento,
ou seja, meios de subsistência (Mc 12.44; Lc 8.43), ou curso de vida, a vida vista
como um plano (Lc 8.14; lTm 2.2; 2Tm 2.4). Ζωή ocorre no sentido mais inferior
da vida, considerada, principal ou totalmente, como existência (1 Pe 3.10; At 8.33;
17.25; Hb 7.3). Parece haver relevância no uso da palavra em Lc 16.25: “Recebes­
te os teus bens em tua vida (èu rrj ζωή σου)”, com a sugestão de que a vida do ho­
mem rico tinha sido pouco melhor do que a mera existência, e não a vida em todo
seu verdadeiro sentido. Todavia, do começo ao fim do Novo Testamento, ζωή é
uma palavra mais nobre e parece ter trocado de lugar com βίος. Ela expressa o
conjunto de bênçãos mortais e eternas (Mt 25.46; Lc 18.30; Jo 11.25; At 2.28;
Rm 5.17; 6.4), e não só referentes ao homem, mas também a Deus e a Cristo.
Assim aqui. Compare com 5.26; 14.6; lJo 1.2. Essa mudança deve-se à revelação
evangélica da conexão essencial de pecado com morte, e, por conseguinte, de
vida com santidade. Conforme Trench: “Qualquer coisa verdadeiramente viva só
está assim porque o pecado nunca encontrou lugar nela, ou, tendo encontrado
lugar por um tempo, desde de então foi dominado e expulso”.
Ζωή é uma palavra favorita de João. Vide 11.25; 14.6; 8.12; lJo 1.2; 5.20;
Jo 6.35,48; 6.63; Ap 21.6; 22.1,17; 7.17; Jo 4.14; Ap 2.7; 22.2,14,19; Jo 12.50 ;17.3;
20.31; 5.26; 6.53-54; 5.40; 3.15-16,36; 10.10; 5.24; 12.25; 6.27; 4.36; lJo 5.12,16;
Jo 6.51.

Era a luz dos homens (ήν το φως τώυ άνθρώπων). Passando do pensamento
de criação em geral para o da criação da humanidade, que, na gama inteira das
coisas criadas, tem capacidade especial para receber o divino. A luz —o modo
peculiar da operação do divino sobre os homens, em conformidade com a natu­
reza racional e moral deles, que sozinha estava preparada para receber a luz da
verdade divina. Não se diz que o Verbo era luz, mas que a vida era a luz. O Verbo
torna-se luz por meio do ambiente de vida, de vida espiritual, da mesma maneira
que a visão é uma função da vida física. Compare com 14.6, em que Cristo torna-
-se a vida por ser a verdade; e com Mt 5.8, em que o coração puro é o meio pelo
qual Deus é contemplado. Em qualquer modo de manifestação, o Verbo está no
31
J oão - P rólogo

mundo, Ele é a luz do mundo; em suas obras, no alvorecer da criação, nas condi­
ções alegres do Éden; nos patriarcas, na Lei e nos Profetas, em sua encarnação,
e na subsequente história da igreja. Compare com 9.5. Dos homens, como uma
classe, e não de indivíduos somente.

S egunda divisão do prólogo: o V erbo rejeitado (5-11)

Contra o ser eterno, luz e vida do Verbo divino, emerge um princípio contrá­
rio no mundo - trevas. Tendo sido apresentados o propósito e a obra de Deus na
criação, agora somos confrontados com a atitude do homem em relação a essas
coisas.

5. Resplandece (φαίνει). Observe o tempo presente, indicando não só o ponto


presente do tempo, mas também que a luz tem resplandecido continuamente e
sem interrupção desde o princípio até agora, e ainda está resplandecendo. Por
isso, φαίνει, resplandece, denota a propriedade peculiar da luz sob todas as cir­
cunstâncias, e não φωτίζει, alumiar ou iluminar, como no versículo 9. O brilho
nem sempre ilumina. Compare com lJo 2.8.

Nas trevas (kv tf| σκοτία). Σκοτία, trevas, é uma palavra peculiar ao grego
posterior, e é usada no texto do Novo Testamento quase exclusivamente por
João. Há uma ocorrência dela em Mt 10.27, e outra em Lc 12.3. A palavra mais
comum no texto neotestamentário é σκότος, oriunda da mesma raiz, que aparece
em σκιά, sombra, e σκηνή, tenda. Outra palavra para trevas, ζόφος, ocorre apenas
em Pedro e Judas (2Pe 2.4,17; Jd 6,13). Vide nota sobre 2Pe 2.4. As duas palavras
estão combinadas na expressão escuridão das trevas (2Pe 2.17; Jd 13). No grego
clássico, σκότος, como distinto de ζόφος, é o termo mais forte, denotando a condi­
ção de trevas em contraposição à luz na natureza. Daí de morte, da condição antes
de nascer, de noite. Ζόφος, principalmente um termo poético, quer dizer sombrio,
obscuridade, nebulosidade. Aqui, usa-se a palavra mais forte. As trevas do pecado
são profimdas. A condição moral que se opõe à luz divina é totalmente escura. A
luz mesma que está nela são trevas. Sua condição é a oposta àquele estado feliz
de humanidade indicado no versículo 4, quando a vida era a luz dos homens; é
uma condição em que a humanidade tornou-se presa da falsidade, tolice e pecado.
Compare com lJo 1.9-11; Rm 1.21-22.

Compreenderam (κατέλαβεv). Na r v , consta apreenderam; na w y c l i f f e , não a


tomaram. Vide nota sobre Mc 9.18; At 4.13. Compreenderam, no sentido da a r c , en­
tenderam, é inadmissível. Esse sentido exigiría a voz média do verbo (cp. At 4.13;
10.34; 25.25). A r v , apreenderam, ou seja, apanharam ou capturaram, transmite a
32
J oão - P rólogo

ideia correta, que aparece em 12.35: “Para que as trevas vos não apanherri’, isto
é, aposse-se de e capture. A palavra é usada no sentido de apossar-se depara tornar
sua posse-, consequentemente, tomar posse de. Usada para referir-se à obtenção
do prêmio nos jogos (lCo 9.24); ao alcance da justiça (Rm 9.30); a um demônio
tomando posse de um homem (Mc 9.18); ao Dia do Senhor surpreendendo alguém
como um ladrão (lTs 5.4). Essa ideia, aplicada às trevas, inclui a noção de eclip­
sar ou subjugar. Por isso, alguns traduzem por prevalecer (Westcott, Moulton). O
pensamento de João é de que, na luta entre a luz e as trevas, a luz sai vitoriosa. As
trevas não se apropriam da luz e a eclipsam. Segundo Westcott: “A frase toda, na
verdade, é um paradoxo impressionante. A luz não bane as trevas; as trevas não
dominam a luz. Luz e trevas coexistem lado a lado no mundo”.

6. Houve um homem (έγένετο άνθρωπος). Melhor, como na r v , “veio um


homem”, com έγένετο denotando a manifestação histórica, o surgimento de
João Batista na economia da revelação da luz. Compare com 3.1, havia £...)]
um homem (ήν άνθρωπος), em que se declara o mero fato de que havia um
homem como Nicodemos. Vide observações sobre ήν, versículo 1. A distinção
também é sugerida entre o ser eterno (ήν) do Verbo e a vinda à existência de
seu mensageiro.

Enviado (απεσταλμένος). Vide nota sobre Mt 10.2,16; Mc 4.29; Lc 4.18. O ver­


bo carrega o sentido de enviar um mensageiro com uma comissão especial. Por
isso, ele é usado para a missão do Filho de Deus e de seus apóstolos; a palavra
apóstolo deriva diretamente desse verbo. Assim, distingue-se de πέμπω, enviar,
que denota apenas a relação do remetente com o enviado. Vide nota sobre 20.21 e
lJo 3.5. A declaração não é meramente equivalente afo i enviado. O verbo finito e
o particípio devem ser considerados separadamente, como afirmando dois fatos
distintos: o aparecimento e a missão de João Batista. Veio um homem, e esse homem
foi enviado da parte de Deus.

De Deus (παρά Θεοϋ). A preposição significa do lado de. Ela investe o mensa­
geiro de mais dignidade e relevância do que se o escritor tivesse dito: “enviado por
Deus”. A preposição é usada para o Espírito Santo, enviado da parte do Pai (15.26).

Cujo nome era João (όνομα αύτφ Ίωάνης). Literalmente, o nome para ele João.
Essa é a primeira menção a João Batista; a última ocorre em At 19.3. Acerca do
nome, vide nota sobre Mt 3.1; Lc 3.2. João nunca fala do Batista como João, o
Batista, como os outros evangelistas, mas simplesmente como João. Isso é per-
feitamente natural na suposição de que João mesmo é o autor do Evangelho, e é
o outro João da narrativa.
33
J oão - P rólogo

7. Este (οΰτος). Compare com o versículo 2, e com o pronome εκείνος, ele, no


versículo 8.

Para testem unho (εις μαρτυρίαν). Mais corretamente do que na k j v ,


como uma testemunha, para o que se empregaria μάρτυρα, como em At 1. 8 .
O sentido é para trazer testemunho ou testemunhar. Acerca da palavra, vide
At 1.22; lPe 5.1. Essa é uma das palavras típicas de João, com quase cinquen­
ta ocorrências em suas várias formas nesse Evangelho, e trinta ou quarenta
ocorrências nas epístolas e no Apocalipse. O desenvolvimento enfático da
ideia de testemunho é peculiar a esse Evangelho. Como afirma Westcott:
“Ele evidentemente pertence a uma época quando os homens começaram a
raciocinar sobre a fé e a analisar os fundamentos sobre os quais ela repou­
sava”. Ele desenvolve a ideia sob as seguintes formas: o testemunho do Pai
(5.31,34,37); o testemunho de Cristo mesmo (8.14; 18.37); o testemunho de
obras (5.17,36; 10.25; 14.11; 15.24); o testemunho da Escritura (5.39,40,46;
1.46); o testemunho do precursor (1.7; 5.33,35); o testemunho dos discípulos
(15.27; 19.35; 21.24; lJo 1.2; 4.14); o testemunho do Espírito (15.26; 16.13-
14; lJo 5.6). Observe, aqui, a ênfase ligada à ideia pela dupla forma em que é
colocada: primeiro, genérica, para testemunho, e, então, pela apresentação do
sujeito do testemunho.

Todos. João Batista assume o trabalho dos profetas quanto à preparação deles
para a extensão universal do chamado divino (Is 69.6). Sua mensagem era para
os homens, sem relação com qualquer nação, seita, descendência ou outras con­
siderações.

Por ele. João Batista.

8. Ele (εκείνος). Enfático: “Não era ele a luz”. Compare com 2.21: “Ele (εκείνος)
falava”, destacando a diferença entre a concepção de Jesus sobre destruir e re­
construir o templo e a de seus ouvintes.

A luz (το φως). O u s o e n fá tic o d o p r o n o m e n a tr a d u ç ã o d a k jv , “essa l u z ” , é

d e s n e c e s s á rio .

Veio. Na k j v , fo i enviado. Nenhuma das duas leituras consta no texto


original. Literalmente: “Ele não era a luz, mas a fim de que (ΐνα) ele pu­
desse dar testemunho”. Como em 9.3: “Nem ele pecou, nem seus pais; mas
(ele nasceu cego) para que se manifestem nele as obras” etc. Compare com
15.25. Na t e b , “devia dar testemunho”
34
J oão —P rólogo

9. Ali e s ta v a a lu z v e rd a d e ira etc. Essa passagem é interpretada de diferentes


formas. Alguns juntam vindo (ερχόμενον) com homem (άνθρωπον), e traduzem:
todo homem que vem, como na arc. Outros juntam vindo com luz, e traduzem,
como na rv : a luz verdadeira - vindo ao mundo. A última é a tradução preferível, e
é justificada pelo uso frequente que João faz da expressão vem ao mundo, com re­
ferência a nosso Senhor. Vide3.19; 6.14; 9.39; 11.27; 12.46; 16.28; 18.37. Em 3.19
e 12.46, ela é usada como aqui, em conexão com luz. Observe especialmente a úl­
tima ocorrência, quando Jesus diz: “Eu sou a luz que vim ao mundo”. Estava (ήν)
deve ser tomado independentemente, ali estava, e não unido em uma concepção
simples com vindo (ερχόμενον), como se tivesse o sentido de estava vindo. A luz
era, existia, quando João Batista apareceu como testemunha. Até o momento do
seu aparecimento, ela estava o tempo todo vindo: seu ser permanente associado
à vinda lenta e progressiva, uma revelação “muitas vezes e de muitas maneiras”
(Hb 1.1). Conforme Westcott: “Desde o começo, Ele estava em seu caminho para
o mundo, avançando em direção à encarnação por meio de revelações preparató­
rias”. Por isso, traduza, como na rv : “Ali estava a verdadeira luz, exatamente a luz
que ilumina todo homem, vindo ao mundo”.

Verdadeira (αληθινόν). Como na w ycliffe (cp. Credo Niceno: “Verdadeiro


Deus de verdadeiro Deus”). Esse epíteto só é aplicado à luz aqui e em lJo 2.8,
e está praticamente restrito aos escritos de João. Uma palavra diferente,
αληθής, também traduzida por verdade, ocorre em 3.33; 5.31; 8.13 e em outras
passagens. A diferença é que αληθής quer dizer verdadeiro, em contraposição
a falso·, enquanto άληθινός significa o que é real, perfeito e substancial, em
contraposição ao que é fantasioso, impreciso, falsificado, ou apenas simbólico.
Assim, Deus é αληθής (Jo 3.33) no fato de que Ele não pode mentir. Ele é
άληθινός (lT s 1.9), distinto dos ídolos. Em Hb 8.2, o tabernáculo celestial é
chamado αληθινή, distinto do tabernáculo mosaico, que era uma representação
da realidade celestial (Hb 9.24). Por conseguinte, a expressão luz verdadeira
denota a realização da ideia divina original da Luz - a Luz arquetípica, con­
trastada com todas as manifestações imperfeitas: “A Luz que cumpriu todas
as promessas por meio das luzes preparatórias, parciais, até mesmo fictícias,
que já existiram no mundo antes.”

Nossos pequenos sistemas têmseus dias;


Eles têmseu diaecessamde ser;
Eles são apenas débeis luzes de ti,
E tu, 6Senhor, és mais queeles5.

5. Tennyson, In Memoriam.

35
J oão —P rólogo

Luz (φωτίζει). Vide nota sobre resplandecer, versículo 5, e compare com


Lc 11.35-36.

Todo homem (-πάντα άνθρωπον). Não coletivamente, como no versículo 7, mas


individual e pessoalmente.

Ao mundo (τον κόσμον). Como no versículo 3, a criação é designada em seus


vários detalhes pela palavra πάντα, todas as coisas, também aqui ela é vista em sua
totalidade como um todo ordenado. Vide nota sobre At 17.24; Tg 3.6.
O Novo Testamento usa quatro palavras para mundo: (l) γή, terra, solo, terri­
tório, a Terra como distinta de céus. O sentido é puramente físico. (2) οικουμένη,
que é um particípio, com o sentido de habitado, com γή, terra, subentendida, e
quer dizer a terra como a moradia dos homens·, o mundo inteiro habitado. Vide
nota sobre Mt 24.14; Lc 2.1. Essa palavra também é usada em um sentido
físico, embora uma vez em referência ao “mundo futuro” (Hb 2.5). (3) αιών, es­
sencialmente tempo, como a condição sob a qual todas as coisas criadas existem
e a medida da existência delas: um período de existência-, um tempo de vida-, uma
geração-, por conseguinte, um longo espaço de tempo; uma era, idade, época, perío­
do de uma dispensação. Sobre esse sentido primário, físico, ergue-se um sentido
secundário, a saber, tudo o que existe no mundo sob as condições de tempo. A partir
disso, desenvolve-se novamente um sentido mais distintivamente ético, o curso
e a corrente dos assuntos deste mundo (cp. expressão os tempos), e esse curso como
corrompido pelo pecado; daí o mundo mal. Assim em G1 1.4; 2Co 4.4. (4) κόσμος,
que segue uma linha de desenvolvimento semelhante, do sentido físico para o
ético, querendo dizer: (a) Ornamento, arranjo, ordem (lPe 3.3). (b) A soma total
do universo material considerado como um sistema (Mt 13.35; Jo 17.5; At 17.24; Fp
2.15). Compare com Platão:

A quele que é incapaz de ter com unhão tam bém é incapaz de ter amizade. E, Cáli-
cles, o s filósofos nos dizem que com unhão e amizade e m étodo e tem perança e justiça
m antêm unidos céu e terra e deuses e hom ens, e, por isso, este universo é chamado
Cosmos, ou ordem, não desordem ou mistura6.

(c) Esse universo como moradia do homem (Jo 16.21; lJo 3.17). (d) A soma total da
humanidade existente no mundo-, a raça humana (Jo 1.29; 4.42). (e) No sentido ético,
a soma total da vida humana existente no mundo ordenado, considerada à parte de,
alienada de, e hostil a, Deus, e das coisas terrenas que desviam de Deus (Jo 7.7; 15.18;
17.9,14; lCo 1.20-21; 2Co 7.10; Tg 4.4).

6. Platão, Górgias, 508.

36
J oão - P rólogo

Essa palavra é característica de João, e preeminentemente nesse último sentido


ético, em que raramente é usada pelos autores dos Sinópticos; enquanto João, em
nenhuma outra passagem, usa αιών em referência à ordem moral. Nesse último
sentido, a palavra é totalmente estranha à literatura pagã, uma vez que o mundo
pagão não tinha percepção da oposição existente entre Deus e o homem pecador,
entre a ordem divina e a desordem moral introduzida e mantida pelo pecado.

10. Estava no mundo. Não só no seu advento, mas antes de sua encarnação, e
não menos que depois dela. Vide nota sobre os versículos 4 e 5.

Foi feito (eyéveto). Veio a ser. Vide nota sobre o versículo 3.

Por ele. Ou por meio dele (διά). Vide nota sobre o versículo 3.

Conheceu (εγνω). Reconheceu. Embora Ele estivesse no mundo e fosse seu


Criador, todavia, o mundo não o reconheceu. Essa é a relação de idéias nessas
três orações, mas João expressa essa relação segundo o modo hebraico, simples­
mente pondo-as lado a lado e ligando-as por meio do και, e. Essa construção é
característica de João. Compare com 8.20, passagem em que o ponto é que embora
Jesus ensinasse em público, onde Ele poderia facilmente ser capturado, ainda
assim nenhum homem tentou pegá-lo. Isso é expresso por duas orações paralelas
com o copulativo simples. “Essas palavras disse Jesus £..(] e ninguém o prendeu”.

Ele (αυτόν). O ele (αυτού) precedente é ambíguo em si mesmo quanto ao gêne­


ro. No que diz respeito a sua forma, ele deve ser neutro, caso em que ele poderia
se referir à luz, "o Verbo visto como um princípio resplandecente”, com ele, no
versículo 5. Mas αυτόν é masculino, ele, para que, agora, o Verbo apareça como
pessoa. Isso determina o gênero do αύτου precedente.
A respeito da natureza iluminada e não iluminada, compare com a alegoria de
Platão em a República, no início do livro 7, na qual ele retrata os homens confina­
dos desde a infância em uma caverna subterrânea, acorrentados de modo que só
possam ver o que está diante deles, e sem a ajuda de luz, exceto a do fogo atrás
deles. Eles confundem sombras com substância e ecos com vozes. Quando eles
são libertados e estimulados a olhar a luz, do fogo ou do sol, seus olhos desacos­
tumados com a claridade doem, e eles imaginam que as sombras que viam antes
eram mais verdadeiras do que como os objetos reais se mostram agora. Por fim,
eles conseguirão ver o sol e o reconhecerão como o doador das estações e anos
e o guardião de tudo que está no mundo visível. “Quando os olhos da alma se
voltam, toda a alma deve se voltar do mundo do vir a ser, e dos mais brilhantes e
melhores do ser, ou, em outras palavras, do bom”.

37
J oão —P rólogo

Observe também a apropriabilidade dos dois verbos juntos com o pronome


neutro e o masculino. No versículo 5, com o pronome a, o Verbo, como princí­
pio de luz, κατέλαβαν, compreenderam. Aqui, com ele, o Verbo, como pessoa, εγνω,
reconheceu.

11. Veio (ήλθει/). Agora, a narrativa passa da ação geral para a especial, a ação
do Verbo como a Luz. O Verbo veio, no tempo aoristo, denota um ato absoluto
—a encarnação. No versículo 10, o Verbo é descrito como estando invisível no
mundo. Agora, Ele aparece.

Para o que era seu (εις τα ίδια). Literalmente, suaspróprias coisas; vide nota sobre
At 1.7. A a r a segue a a r c . A n t l h traduz: veiopara o seuprópriopaís, e a w y c l i f f e : veio
para suas próprias coisas, e compare com 16.32; 19.27; At 21.6. A referência é à terra
de Israel, reconhecida como a de Deus em um sentido peculiar. Vide Jr 2.7; Os 9.3;
Zc 2.12; Dt 7.6. O versículo 11 não é uma repetição do versículo 10. Há um progres­
so na narrativa. Ele estava no mundo em geral, a seguir, Ele veio para sua própria casa.

Seu (ol ίδιοι). O gênero masculino, como o precedente, é neutro. Que repre­
senta seu próprio país ou posses, seu próprio povo. Na r v , Eles que eram seu.

Receberam (τταρελαβοι>). No texto do Novo Testamento, é mais comum tomar


um junto com o outro. Vide nota sobre Mt 4.5; 17.1; At 16.33. Mas também de
aceitação ou reconhecimento de alguém ser o que professa ser e de receber algo
transmitido, como lCo 11.23; G1 1.12 etc. Westcott acha que esse último sentido
está implícito aqui; Cristo oferecido pelos mestres de Israel por intermédio de
João. Alford adota o primeiro sentido, “expressando a suposição pessoal da pró­
pria pessoa como amigo ou companhia”. De Wette interpreta: receber dentro de
casa. Godet força o ponto ao explicar como: acolher bem. A interpretação de De
Wette parece harmonizar melhor com sua própria casa. Aqui, compare mais uma
vez a bela escolha de verbos: apreenderam (κατελαβεν) a Luz como um princípio e
receberam (παρέλαβον) a Luz como uma pessoa e o Mestre da casa.

T erceira divisão do prólogo : o V erbo recebido (12-18).

12. A todos (όσοι). Denotando indivíduos, como ’ίδιοι (v. 11) representa a nação
como um todo.

Receberam (ελαβον). O verbo simples do composto παρέλαβον no versícu­


lo 11.0 sentido dos dois verbos é basicamente o mesmo (como Alford, De Wet­
te e, aparentemente, Meyer), embora alguns reconheçam uma diferença, como
38
J oão - P rólogo

Milligan e Moulton, que traduzem παρέλαβον por aceitaram e έλαβον por rece­
beram e dizem que “o primeiro enfatiza a vontade consentida (ou recusada) de
receber enquanto o último traz diante de nós aposse conquistada·, de forma que o
sentido pleno é este, Tantos quantos o aceitaram, o receberam”. Para o uso do
verbo simples, vide versículo 43; 13.20; 19.6.

Poder (εξουσίαν). Na n v i , o direito. O Novo Testamento usa seis palavras


para poder: βία,fo rç a , com frequência, opressiva, exibindo-se na violência (At
5.26; 27.41; cp. verbo correlato, βιάζεται, M t 11.12: “Se faz violência ao Reino
dos céus, e p ela fo rç a se apoderam dele”); δύναμις, h abilidade n atu ral ( vid e nota
sobre 2Pe 2.11); ενέργεια, energia, poder em operação; só o poder sobre-humano,
bom ou mal. Usado só por Paulo e principalmente nas epístolas escritas na
prisão (Ef 1.19; 3.7; Cl 2.12; cp. verbo correlato, ενεργέω, ex ib ir poder, e vide
nota sobre Mc 6.14; T g 5.16); ισχύς, fo rç a (v id e nota sobre 2Pe 2.11; cp. verbo
correlato, ισχύω, ser fo r te , e vid e nota sobre Lc 14.30; 16.3); κράτος, p o d er só
de Deus, poder rela tivo e manifestado, dom ínio (Ef 1.19; 6.10; lTm 6.16; lPe
4.11; cp. verbo correlato, κρατέω, ter poder, ser p e rito em, e vide nota sobre Mc
7.3; At 3.11); εξουσία, liberdade de ação (έξεστι, ê legal, perm itido), autoridade
delegada ou arbitrária (Jo 5.27; 10.18; 17.2; 19.10-11; vide nota sobre Mc
2.10; Lc 20.20). Portanto, aqui, εξουσία não tem apenas o sentido de p o ssi­
bilid a d e ou habilidade, mas de d ireito legítimo de uma fonte competente —o
Verbo.

D e serem (γενέσθαι). Como os que nascem (v. 13; cp. 3.3 e Mt 5.45).

Filhos (τέκνα). Na rv, mais corretamente, crianças. Filho é υιός. Τέκνον, crian­
ça (τίκτω, nascer) denota uma relação baseada na comunhão de natureza, enquan­
to υιός, filho, só pode indicar adoção e herança. Vide G1 4.7. A não ser em Ap 11.7,
que é uma citação, João nunca usa υ'ιός para descrever a relação dos cristãos com
Deus, uma vez que ele não considera a posição destes resultados da adoção, mas
da nova vida. Paulo, por sua vez, observa a relação do ponto de vista legal, como
adoção, transmitindo nova dignidade e relação (Rm 8.15; G1 4.5-6). Vide também
Tg 1.18; 1Pe 1.3,23, passagens que adotam o ponto de vista de João, em vez do de
Paulo. Τέκνον, indicando a relação do homem com Deus, ocorre em 1.12; 11.52;
lJo 3.1,2,10; 5.2 e sempre no plural.

Creem (πιστευούσιν εις). O particípio presente, creem, indica o presente e


a atividade contínua da fé. João usa a palavra, às vezes simplesmente com o
caso dativo, com o sentido de crer em uma pessoa ou coisa; ou seja, crer que
eles são verdadeiros ou falam a verdade. Assim, creram na Escritura (2.22);
39
J oão - P rólogo

crê-me (4.21); crésseis em Moisés, seus escritos, minhas palavras (5.46-47). Em


outras ocasiões com a preposição elç, no, que é traduzida por crer em ou crer
no. Como aqui, 6.29; 8.30; lJo 5.10. Vide os dois contrapostos em 6.29-30;
8.30-31; lJo 5.10. Crer em ou no é mais que a aceitação de uma declaração.
É aceitar uma declaração ou pessoa de tal modo a descansar nelas e acre­
ditar nelas praticamente; apoiar-se e beneficiar-se de tudo que é oferecido
nelas. Assim, crer no Senhor Jesus Cristo não é apenas crer nos fatos da vida
histórica dele ou crer em sua força salvadora como um fato, mas aceitá-lo
como Salvador, Mestre, Pessoa Solidária e Juiz; repousar a alma nele para a
salvação presente e futura e aceitar e adotar seus preceitos e exemplo como
vinculados à vida.

Nome (όνομα). Vide nota sobre Mt 28.19. Expressando a soma das qualidades
que marcam a natureza, ou caráter, de uma pessoa. Crer no nome de Jesus Cris­
to, o Filho de Deus, é aceitar como verdadeira a revelação contida nesse título.
Compare com 20.31.

13. Quais (o'í). Referindo-se aos filhos de Deus.

Nasceram (έγεννήθησαν). Literalmente,foram gerados. A expressão γ^ννηθήναΐ


έκ του Θεοΰ, ser nascido ou gerado de Deus, no Evangelho, ocorre somente aqui, e
diversas vezes na primeira epístola. Ela é peculiar a João.
Há um desenvolvimento de pensamento nas três orações seguintes, descre­
vendo a própria origem da nova vida do cristão. Os filhos de Deus não são ge­
rados do sangue, da vontade da carne nem da vontade do homem. Westcott diz: “O
novo nascimento não é realizado pela descendência, pelo desejo nem pelo poder
humano”.

Do sangue (έξ αΙμάτων). Literalmente, dos sangues. O plural é explicado de


várias maneiras: por alguns, como indicação da dualidade dos sexos; por ou­
tros, como multiplicidade de ancestrais. A melhor explicação parece ser a for­
necida por meio do uso similar do plural em Platão, ’étl èv γάλαξι τρεφόμίνοι,
“enquanto ainda nutrido pelos leites’n. Os fluídos, sangue ou leite, são repre­
sentados como a soma total de todas as partes deles. Compare com τα υδατα,
as águas.

14. E o Verbo (καί). Como antes, a conjunção simples, não sim, nem a saber nem
por isso, mas passando a uma nova declaração concernente ao Verbo.

7. Platão, L ets, 887.

40
J oão —P rólogo

Se fez carne (σαρξ cyeveuo). Na nvi , “tomou-se carne”. O mesmo verbo que en­
contramos no versículo 3. Todas as coisas tornaram-se por intermédio dele; Ele,
por sua vez, tornou-se carne. “Ele tornou-se aquilo que primeiro se tornou por
intermédio dele.” Ao se fazer carne, Ele não deixou de ser o Verbo eterno. Sua
natureza divina não foi deixada de lado. Ao se fazer carne, Ele não se separa da
alma racional do homem. Ele, retendo todas as propriedades essenciais do Verbo,
entrou em novo modo de ser, não em um novo ser.
A palavra σάρξ, carne, descreve esse novo modo de ser. Ela representa natureza
humana em manifestação corpórea e de acordo com esta. Aqui, como contraposto de pu­
ramente divino e da natureza puramente imaterial do Verbo. Ao se fazer carne, Ele
não se tornou primeiro uma personalidade. Todo o prólogo concebe-o como uma
personalidade desde o início —desde eras eternas. A expressão sefe z carne quer
dizer mais do que Ele ter assumido a forma do corpo humano. Ele assumiu a toda a
natureza humana, identificando-se com a raça do homem, possuindo um corpo hu­
mano, uma alma humana e um espírito humano. Vide 12.27; 11.33; 13.21; 19.30. Ele
não assume apenas por um tempo a humanidade como algo estranho a Ele mesmo.
A encarnação não foi um mero acidente de seu ser substancial. “Ele se fez carne, e
não se revestiu na carne.” Compare com toda a passagem com 1Jo 4.2; 2Jo 7.

Habitou (έσκήνωσ€ν). Literalmente, “tabemaculou, habitou, fixou sua tenda ou


seu tabernáculo; de σκηνή, tenda ou tabemáculo. Só João usa esse verbo; no Evan­
gelho, ele o usa apenas aqui; e em Ap 7.15; 12.12; 13.6; 21.3. O verbo ocorre em
escritos clássicos, como em Xenofonte, kv τω ireôíq» έσκήνου, ele montou sua tenda
na planícii. Também Platão, ao argumentar contra a proposição de que o injus­
to morre por meio do poder destrutivo inerente ao mal, diz que “a injustiça que
mata os outros mantém o assassino vivo - sim, e vigilante também; ουτω πόρρω
που ώς eoiKev εσκήνωται. τού θανάσιμος eivai, ou seja, literalmente, até onde tem
sido sua tenda ampliada para ser uma casa da morte”9. A imagem aqui é do Antigo
Testamento (Lv 27.11; 2Sm 7.6; SI 128.67ss.; Ez 37.27). O tabernáculo era o lugar
de moradia de Jeová; o lugar de encontro de Deus com Israel. Assim, o Verbo veio
aos homens na pessoa de Jesus. Da mesma maneira que Jeová adotou para sua
habitação uma moradia como a das pessoas no deserto, também o Verbo assumiu
a comunhão da natureza com a humanidade, a incorporação da humanidade em
geral e se fez carne. “O que era desde o princípio, o que vimos com os nossos olhos,
o que temos contemplado, e as nossas mãos tocaram da Palavra da vida. £...]] A
nossa comunhão é com o Pai e com seu Filho Jesus Cristo” (lJol.l-S; cp. Fp 2.7-8).
Alguns veem na palavra tabernáculo uma estrutura temporária (vide con­
traste entre σκήνος, tabernáculo, e οικοδομή, habitação, cp. n v i , morada ter-

8. Xenofonte, Anabasis, vii, 4, 11.


9. Platão, República, 610.

41
JoAo - P rólogo
restre, cp. t eb , em 2C0 5.1), uma sugestão da transitoriedade da estadia de
nosso Senhor na terra; o que pode bem ser verdade, embora a palavra não
sugira necessariamente isso; pois Ap 21.3 diz a respeito da Jerusalém celes­
tial·. “Eis aqui o tabernáculo de Deus com os homens, pois com eles habitará
(σκηνώσίΐ)”.
Dante alude à encarnação no sétimo canto do "Paraíso”:

- Aceitar não querendo, obediente,


Saudável freio, o hom em , sem mãe nado,
Perdeu-se a si, perdeu a humana gente.
M uitos séculos enferm a do pecado,
Jazeu ela não erro engrandecido
Té que o Verbo de D eu s fosse encarnado.
Por ato só do E terno Amor, unido
A natureza se há, que ao mal se dera,
D epois de esquiva ao Criador ter sid o 10.

Entre nós (êv ήμΐν). No meio de nós. Compare com Gn 24.3, l x x : “D os cana-
neus, no meio dos quais eu habito (μ€θ’ ών έγώ οίκώ eu αύτοίς)”. A referência é à
testemunha ocular da vida de nosso Senhor. Godet afirma: “Conforme a mani­
festação apresenta-se na mente do evangelista e, nas palavras entre nós, assume o
caráter da lembrança mais pessoal, torna-se nele o objeto de deleitável contem­
plação”
As palavras seguintes, até Pai e incluindo esta, são parentéticas. A sentença
contínua é: "E o Verbo se fez carne e habitou entre nós, £...j cheio de graça e de
verdade”.

Vimos (Ιθ€ασάμ€θα). Compare com Lc 9.32; 2Pe 2.16; lJo 1.1; 4.14. Vide nota
sobre Mt 11.7; 23.5. A palavra denota contemplação calma e contínua de um
objeto que permanece diante do espectador.

Glória (δόξαν). Não a glória absoluta do Verbo eterno, que só podia pertencer
ao estado preexistente dele e à condição subsequente de sua exaltação; mas sua
glória revelada, sob as limitações humanas, nele mesmo e nos que o observavam.
A referência, mais uma vez, é às manifestações da glória divina no Antigo Testa­
mento, no deserto (Ex 16.10; 24.16 etc.); no templo (lRs 8.11); para os profetas
(Is 6.3; Ez 1.28). A glória divina revelada de tempos em tempos em Cristo, em
sua transfiguração (Lc 9.31; cp. 2Pe 1.16-17) e seus milagres (Jo 2.11; 11.4,40),

10. Dante, A Divina Comédia, Paraíso, tradução José Pedro Xavier Pinheiro, São Paulo, Tietê,
1954, vii, p. 41.

42
J oão —P rólogo

mas aparecem também em sua vida e caráter perfeitos em seu cumprimento da


ideia absoluta de humanidade.

Glória. Sem o artigo. Essa repetição da palavra é explanatória. A natureza da


glória é definida pelo que se segue.

Como (ώς). Uma partícula de comparação. Compare com Ap 5.6: “Um Cordei­
ro, como havendo sido morto”; e também com Ap 13.3.

Do U nigênito do Pai (μονογενούς παρά πατρός). Na n v i , “vindo do Pai”. A


glória era igual, correspondia em natureza com glória do Unigênito enviado
do Pai. Era a glória daquele que tinha participação na essência divina do Pai;
sobre quem o amor do Pai foi visivelmente derramado em abundância e que
representava o Pai como seu embaixador. A palavra μονογενής, unigênito (De
Wette e Westcott, “único nascido"), é usada no texto do Novo Testamento
para o relacionamento humano (Lc 7.12; 8.42; 9.38). Na lxx , ela corresponde
a querido, hebraico, único, em SI 21 (kjv , 22.20); e a desolado, só, em SI 24 (kjv ,
25.16). Com exceção das passagens citadas acima e de Hb 11.17, a palavra, no
texto do Novo Testamento, ocorre somente nos escritos de João e só é usada
para Cristo. Pode-se comparar essa palavra com ο πρωτότοκος, primogênito,
de Paulo (Rm 8.29; Cl 1.15,18), que também ocorre uma vez em João (Ap
1.5) e em Hb 1.6; 11.28; 12.23. A palavra de João marca a relação do Pai
como única, afirmando o fato em si mesmo. A palavra de Paulo põe o Filho
eterno em relação com o universo. A palavra de Paulo enfatiza a existência
do Senhor diante das coisas criadas; a de João enfatiza sua distinção das
coisas criadas. Μονογενής distingue entre Cristo, como o Filho único, e os
muitos filhos (τέκνα) de Deus; além disso, no fato de que o Filho único não
se tornou (γενεσθαι) esse filho ao receber poder por meio de adoção ou da
geração moral, mas estava (ήν) assim desde o princípio com Deus. O fato
apresentado não pertence à esfera da encarnação dele, mas de seu ser eterno.
A declaração é antropomórfica", e, por isso, não pode expressar totalmente
a relação metafísica.
Do Pai é uma tradução apropriada da arc, “do Pai”, dando, assim, a força de
παρά (vide nota sobre de Deus, v. 6). A preposição não expressa a ideia de geração,
que seria transmitida por έκ ou pelo genitivo simples, mas de missão —vindo do
Pai, como João veio de Deus (vide6A6; 7.29; 16.27; 17.8). O versículo correlativo
desse é o 18: “Que está no seio (είς τον κόλπον) do Pai”, literalmente, “no íntimo”,

11. Ou seja, atribuindo forma humana e modos de atividade humanas a Deus, como quando falamos
da mão, daface e dos olhos de Deus, ou, como aqui, de Deus gerando.

43
J oão - P rólogo

com a preposição εις significando que entrou e está lá-, vendo, assim, o Filho como
tendo retornado ao Pai (mas vide nota sobre v. 18).

Cheio de graça e de verdade (πλήρης χάριτος καί αλήθειας). A expressão


está ligada ao principal sujeito da sentença: “O Verbo - cheio de graça e de ver­
dade”. Uma combinação comum no Antigo Testamento (cp. Gn 24.27,49; 32.10;
Ex 34.6; SI 40.10-11; 61.7). Essas duas palavras resumem o caráter da revela­
ção divina. Segundo Westcott: “Graça corresponde à ideia da revelação de Deus
como amor (lJo 4.8,16) por meio dele que é vida; e verdade corresponde à reve­
lação de Deus como Luz (lJo 1.5) por meio dele que é Ele mesmo Luz”. Compare
com o versículo 17. Acerca de graça, vide nota sobre Lc 1.30.

15. Da mesma maneira como o versículo 14 faz paralelo com os versículos 1-5,
também esse versículo faz paralelo com os versículos 6-8, mas com um avanço do
pensamento. Os versículos 6-8 apresentam o testemunho de João Batista para o
Verbo como a luz, em geral, dos homens. Esse versículo apresenta o testemunho
de João Batista do Verbo pessoal se fazer carne.

Testificou (μαρτυρεί). Porém, trata-se do tempo presente. A t e b traduz cor­


retamente por dá testemunho. O tempo presente descreve o testemunho de João
Batista como permanente. O fato de o Verbo se fazer carne é estabelecido perma­
nentemente pelo testemunho dele.

Clamou (κεκραγεν). Vide nota sobre Mc 5.5; 9.24; Lc 18.39.0 verbo denota uma
declaração inarticulada como distinta das palavras. Quando usado em ligação com
a fala articulada, ele é unido com λεγειν ou είπεΐν, dizer, como em 7.28, clamar,fa ­
lar. Compare com 7.38; 12.44.0 clamor corresponde à descrição de si mesmo, feita
por João Batista, como uma voz (φωνή, som ou tom), Mc 1.3; Lc 3.4; Jo 1.23.0 verbo
está no tempo perfeito, mas com o sentido clássico usual de presente.

Este era (ήν). O tempo imperfeito aponta para o testemunho historicamente


passado.

Depois de mim (όπίσω μου). Literalmente, após eu: em sua manifestação humana.

É antes de mim (έμπροσθεν μου γέγονεν). Literalmente, “se torna , como na


r v , ou “está aqui (cp. 6.25) antes de mim”. Antes é usado para tempo, não para

dignidade nem para classificação. A expressão tem uma forma enigmática: “meu
sucessor é meu predecessor”. A ideia da dignidade superior de Cristo não é uma
inferência necessária de sua vinda depois de João como, nessa interpretação, as
44
J oão - P rólogo

palavras poderíam sugerir. Ao contrário, o arauto que precede é inferior em dig­


nidade ao príncipe que ele anuncia.

Porque (ότι.). Ou por. O motivo para a declaração precedente: a chave do enigma.

Foi primeiro do que eu (πρώτος μου ήν). Literalmente, primeiro em relação


a mim (como na rv, margem). A referência à dignidade exigiría o uso de έατίν,
é (vide Mt 3.1 1 , “mais poderoso”). Uma expressão similar ocorre em 15.18: “O
mundo £...],primeiro do que a m? (πρώτον υμών), me aborreceu (odiou) a mim”. A
referência é à preexistência de Cristo. João Batista, quando fala da manifestação
histórica de Cristo -foiprimeiro do que eu—, usa γέγονεν. guando fala do ser eterno
de Cristo - é antes de mim -, usa ήν. Assim, o sentido é que Cristo, em sua ma­
nifestação humana, apareceu depois de João Batista, mas, como o Verbo eterno,
precede a este, porque Ele existia antes dele. Compare com 8.5812.

16. E (και). Mas a leitura correta é ότι, porque, ligando, assim, a sentença seguin­
te ao “cheio de graça e de verdade” do versículo 14. Conhecemos a Jesus como
cheio de graça e de verdade porque recebemos da sua plenitude.

Da sua plenitude (έκ του πληρώματος αύτοϋ). Essas e as palavras seguin­


tes são do evangelista, não de João Batista. A palavra plenitude (πλήρωμα) só
é encontrada aqui em João, mas ocorre frequentemente nos escritos de Paulo,
cujo uso do termo na epístola para os Efésios e para os Colossenses ilustra
o sentido em João; sendo essas igrejas asiáticas que, mais tarde, caíram na
esfera de influência de João. A palavra é semelhante a πλήρης, cheio (v. 14), e
πληρούν, encher ou completar, e quer dizer aquele que está completo em si mesmo,
plenitude, número ou quantidade completa. Assim a tripulação do navio é chama­
da de πλήρωμα, completa. Aristófanes disse que "τούτων πλήρωμα, a soma total
desses é quase dois mil talentos”13. Heródoto diz que o termo completo da vida
do homem entre os persas é de oitenta anos14; e Aristóteles refere-se a Sócrates
como dizendo que as oito classes representando atividades distintas no Estado
constituem &plenitude ào Estado15. Em Ef 1.23, Paulo diz que a igreja é &pleni­
tude de Cristo; ou seja, a plenitude das graças divinas em Cristo é transmitida
à igreja como corpo dele, e todo o corpo “provido e organizado pelas juntas e

12. Segui Meyer e Godet. D e Wette, Alford, Milligan e M oulton adotam a outra interpretação,
referindo-se a «μπροσθίν para classificação ou dignidade. Como também W estcott, embora ele
não afirme a questão entre as duas explicações com sua contundência usual.
IS. Aristófanes, As Vespas, 66O.
14. Heródoto, iii, 22.
15. Aristóteles, Política, iv, 4. Vide Platão, República, 371.

45
J oão - P rólogo

ligaduras, vai crescendo em aumento de Deus” (Cl 2.19; cp. E f 4.16). De for­
ma semelhante, ele ora (Ef 3.19) para que os irmãos possam ser enchidos de
toda a plenitude de Deus; isto é, que eles possam ser enchidos com a plenitude
que Deus transmite. Relacionado de forma mais próxima com o uso do termo
por João aqui está Cl 1.19: “Porque foi do agrado do Pai que toda a plenitu­
de (τό πλήρωμα, observe o artigo) nele (Cristo) habitasse”; e 2.9-10: “Porque
nele habita corporalmente (ou seja, tornando-se encarnado) toda a plenitude da
divindade. E estais perfeitos (πεπληρωμένοι) nele”. Essa passagem declara que
o todo agregado dos poderes e graças divinos aparecem no Verbo encarnado e
corresponde à declaração de João de que “o Verbo se fez carne e habitou entre
nós, £...] cheio de graça e de verdade”; enquanto “estais perfeitos” corresponde
à declaração de João de que “todos nós recebemos também da sua plenitude”.
Assim, o sentido de João aqui é que os cristãos recebem da plenitude divina
tudo que é necessário para a perfeição de seu caráter e para a realização de seu
trabalho (cp. Jo 15.15; 17.22)16.

Recebemos (Ιλάβομ^ν). A tradução por recebemos traduz o tempo aoristo de


forma mais literal.

Graça sobre graça (χάριν άντί χάριτος). A preposição άντί, originalmen­


te, tem o sentido de contra, oposto, àfrente de (em sentido local). Essa troca é de­
senvolvida pela ideia de contrapor uma coisa à outra. Por isso, Heródoto diz:
“Eles compraram a ilha, άντί χρημάτων, por dinheiro”17. Também M t 5.38:
“Olho por (άντί) olho” etc. Essa ideia está na raiz do sentido peculiar em que a
preposição é usada aqui. Não recebemos a graça do Novo Testamento em vez
da graça do Antigo Testamento; nem, tampouco, graça sobre graça, mas nova
graça transmitida como se a medida anterior de graça tivesse sido recebida
e melhorada. “Perceber e usar uma medida de graça era ganhar uma medida
maior (supostamente) em troca por ela.” Por conseguinte, graça contínua, inin­
terrupta. A ideia do desenvolvimento de uma graça por outra é elaborada por
Pedro (2Pe 1.5), a respeito do que vide notas. W iner cita um paralelo mais
interessante de Fílon:

Assim, tendo provido e dispensado as primeiras graças (χάριτας), antes que seus desti­
natários se tornem desumanos por meio da saciedade, subsequentemente, ele concede
diferentes graças em troca por (άντί) aquelas, e uma terceira supre para a segunda, e
sempre as novas em troca pela mais antiga.

16. Dificilmente é necessário referir-se ao estudante crítico para a admirável observação do Bispo
Lightfoot em seu comentário sobre Colossenses, p. S2Sss.
17. H e ró d o to , iii, 59.

46
J oão - P rólogo

17. Porque (ότι). Fornece o fundamento da afirmação de que os cristãos rece­


bem dons de graça novos e mais ricos; o fundamento é que a lei de Moisés era um
decreto limitado e estreito, enquanto Jesus Cristo transmite a plenitude da graça
que há nele (v. 14). Compare com Rm 4.15; 10.4; G1 3.10.

Foi dada (εδόθη). Um dom especial, servindo a um propósito especial e prepa­


ratório em relação ao evangelho, sendo a palavra apropriada para “uma institui­
ção externa e positiva”.

Por Moisés (διά). Literalmente, por intermédio de. Vide nota sobre por ele, ver­
sículo 3.
A graça e a verdade vieram (εγει/ετο). Vieram a ser como o desenvolvimento
do plano divino inaugurado na lei e revelando a relevância do dom da lei. Elas
não vieram a ser de forma absoluta, mas em relação à humanidade. Compare com
1Co l .30, passagem que diz que Cristofo i feito (propriamente, tornou-se, έγενηθη)
para nós sabedoria e justiça etc.; que no sentido pleno é graça e verdade. A pala­
vra graça não ocorre em mais nenhuma passagem de João, a não ser nas sauda­
ções (2Jo 3; Ap 1.4; 22.21).

Jesus Cristo. O ser presente na mente do evangelista desde o início do


Evangelho agora é mencionado pelo nome pela primeira vez. As duas orações,
“a lei foi dada” e “a graça e a verdade vieram”, sem a conjunção ou a partícula
qualificadora, ilustram o paralelismo característico do estilo de João (vide nota
sobre v. 10).

18. D eus nunca foi visto p o r alguém (θεόν ούδείς έώρακεν πώιτοτε). Na
ordem grega, Deus vem em primeiro lugar, isto para enfatizar “Deus foi
nenhum homem visto”. Quanto ao conteúdo da declaração, compare com
3.11; Êx 33.20; lJo 4.12. As manifestações de Deus para os santos do An­
tigo Testamento eram apenas parciais e aproximadas (Êx 33.23). Aqui, o
visto é a visão da essência divina, em vez da pessoa divina, que também está
indicada pela ausência do artigo de Θεόν, Deus. Nesse sentido, nem mesmo
Cristo era visto como Deus. O verbo όράω, ver, denota um ato físico, mas
enfatiza o discernimento mental que o acompanha e aponta para a resulta­
do, não para o ato de ver. Em lJo 1.1; 4.12,14, θεάομαι é usado, denotando
contemplação calma e deliberada (vide nota sobre v. 14). Em 12.45, temos
θεωρεω, ver (vide nota sobre Mc 5.15; Lc 10.18). Tanto θεάομαι quanto
θεωρεω sugerem contemplação deliberada, mas o primeiro é ver para satis­
fazer o olho, enquanto o último é ver de forma mais crítica com interesse
espiritual ou mental interiores na coisa vista e com vistas a conhecê-la.
47
J oão - P rólogo

Segundo Thayer: “Θεωρεΐν seria usado para um general passando vistas em


um exército, ou inspecionando-o, oficialmente; θεάσθαι seria usado para um
espectador leigo que assiste ao desfile”

O Filho unigênito (ò μονογενής υΙός). Diversos dos principais manuscritos


e uma grande quantidade de evidências antigas sustentam a leitura μονογενής
Θεός, “Deus unigênito”18.
Outra diferença, e menor, na leitura relaciona-se com o artigo, que é omitido
em μονογενής pela maioria das autoridades, as quais favorecem Θεός. A leitura
como Filho unigênito ou Deus unigênito não afeta o sentido da passagem. A última
leitura apenas combina em uma única frase os dois atributos já indicados da pa­
lavra - Deus (v. l), unigênito (v. 14); o sentido é aquele que é Deus e unigênito.

Que está no seio (ò ών εις τον κόλπον). A expressão ó ών, que está ou aquele estando
é explicada de duas maneiras: (l) como um presente eterno que expressa a relação
eterna de Filho e Pai. (2) Conforme interpretado pela preposição εις, em, literalmente,
no, e expressando o fato do retorno de Cristo para o Pai depois de sua encarnação: “O
Filho que entrou no seio do Pai e está lá”. No primeiro caso, é uma descrição absoluta da
natureza do Filho; no segundo caso, a ênfase está no fato histórico da ascensão, embora
com referência à sua moradia eterna com o Pai daquele tempo em diante.
Embora o fato de o retorno de Cristo para a glória do Pai possa estar presente
na mente do escritor e possa ter ajudado a determinar a forma da declaração,
enfatizar esse fato nessa conexão pode parecer menos consistente com o curso
do pensamento no prólogo que a outra interpretação, uma vez que, nessa sen­
tença, João declara a competência do Filho encarnado para manifestar Deus para
a humanidade. A ascensão de Cristo, na verdade, está associada a essa verdade;
todavia, à luz do curso de pensamento anterior, não é seu fator original. Antes, é
a eterna unidade do Verbo com Deus que, embora passando pela fase de encarnação,
permanece ininterrupta (3.13). Assim, Godet declara de forma competente: “A
qualidade atribuída a Jesus de ser o revelador perfeito do ser divino está funda­
mentada em sua relação íntima e perfeita com Deus mesmo”.
A expressão no seio do Pai descreve essa relação eterna com uma relação es­
sencialmente de amor, usando a imagem da relação de marido e esposa (Dt 13.6),

18. O Dr. Scrivener, em Introduction to the C riticism o f the N e w Testam ent, declara: “Os que utilizam
evidência antiga exclusivamente para a revisão do texto podem bem ficar perplexos ao lidar
com essa passagem. Os mais antigos manuscritos, versões e escritores estão irremediavelmen­
te divididos”. Contudo, ele decide sempre pela leitura υιός. Como o texto de Tischendorf e
dos comentaristas, Meyer, D e Wette, Alford, Godet, Schaff (em L a n g e ’s Com m entary). O texto
de W estcott e Hort apresenta Θεός, com ό μονογενής υιός em nota de margem. Assim Wes-
tcott ( Com m entary ), Milligan e Moulton, e Tregelles. Vide nota de Schaff sobre a passagem
em L a n g e ’s Com m entary, Scrivener, p. 525; e F. J. A. Hort, T w o D issertations, Cambridge, 1877.

48
J oão — P rólogo

de pai e filho (Nm 11.12) e da proteção amorosa e do descanso proporcionado


a Lázaro no paraíso (Lc 16.23). A força da contração εις, no, de acordo com a
primeira interpretação de que está, é semelhante à de “com Deus” (vide nota sobre
v. 1); denota uma relação sempre ativa, um eterno sair e retornar do Filho, em
sua obra eterna de amor, ao seio do Pai. Ele sempre sai desse elemento de graça
e amor e retorna a ele. Esse elemento é sua vida. Ele está lá, conforme Godet:
“porque é arrastado a ele por sua ação incessante”.

Este (εκειίΌς). Muitíssimo enfático e aponta para o Filho eterno. Esse prono­
me é usado por João com mais frequência que por qualquer outro escritor. Há
72 ocorrências dele, e não só para denotar um objeto mais distante, mas também
para denotar e dar ênfase especial à pessoa ou coisa imediatamente à mão ou a
qual tem, de forma predominante, a qualidade que está imediatamente em ques­
tão. Por isso, Jesus aplica-o a si mesmo como a pessoa sobre quem o homem cego
de nascença, já curado, indaga: “É aquele (εκείνος) que fala contigo” (Jo 9.37).
Também aqui: “o Filho unigênito, que está no seio do Pai, este o fez conhecer”.

Fez conhecer (έξηγήσατο). Traduzindo estritamente o aoristo, ele o fe z


conhecido, revelou. De εκ, adiante, e ήγέομαι, liderar o caminho. Orig., liderar ou
governar. Daí, como no latim, praeire verbis, vir adiante com palavras, prescrever
ou determinar a forma das palavras. Extrair na narrativa, recontar ou exercitar
(vide A t 15.14, e nota sobre Lc 24.35). Relacionar em plenitude, interpretar ou
traduzir. Portanto, εξήγησις, exegese, é interpretação ou explicação. A palavra
εξηγητής era usada pelos gregos para explicar os oráculos, sonhos, presságios
ou rituais sagrados. Por isso, Creso, ao encontrar os arrabaldes de Sardes
cheio de serpentes, chamou os profetas (εξηγητάς) de Telmessos19. Assim, a
palavra veio a ter o sentido de guia espiritual. Platão chama Apoio de guia
tutelar (πατρώος εξηγητής) da religião20, e diz: “Que os sacerdotes sejam intér­
pretes da vida”21. Na l x x , a palavra é usada em referência aos adivinhadores da
corte do faraó (Gn 41.8,24), e o verbo relacionado, ao ensino ou interpretação
concernente à lepra (Lv 14.57). O sentido de João é que o Verbo revelou ou
manifestou e interpretou o Pai para os homens. A palavra ocorre somente aqui
nos escritos de João. A n t l h traduz: fo i quem nos mostrou. Essas palavras con­
cluem o prólogo.

A N a r r a t iv a H is t ó r ic a , começa agora, e cai em duas divisões genéricas, que


tomei de Westcott.

19. H e ró d o to , i, 78.
20. Platão, República, 427.
21. Id., Leis, 759.
49
J oão - C ap. 1

I. A A utorrevelação de C risto para o M undo (1.19-12.50)

II. A A utorrevelação de C risto para os D iscípulos (13.1-21.23)

19. Este (αυτή). O seguinte. Esse uso do pronome chamando a atenção do leitor
para o que se segue e preparando-o para isso é frequente em João. Às vezes, o
pronome carrega o sentido de qualidade, desse tipo, desse caráter. Vide 3.19; 15.12;
lJo 5.4,9,11,14.

Testem unho (μαρτυρία). Declaração. Vide nota sobre o versículo 7 e


lPe 5.1.

João. Vide nota sobre o versículo 6. Observe o artigo: o João, mencionado


anteriormente.

Os judeus (oi Ιουδαίοι). Essa é uma palavra característica de João. Há mais de


cinquenta ocorrências dela em seu Evangelho como sua expressão pessoal, embora
haja seis ocorrências da fórmula Rei dosjudeus usada pelos gentios. Nos Evange­
lhos Sinópticos, por sua vez, há doze ocorrências de Rei dosjudeus, mas só quatro
passagens em que ocorre a palavra judeus. Nos escritos de Paulo, ela é comparati­
vamente rara, em sua maioria em contraste com grego, e ambas em contraste com
cristianismo. No livro de Apocalipse, há duas ocorrências dela (2.9; 3.9), daqueles
que dizem ser judeus e não o são, mas são “a sinagoga de Satanás” e “mentem”.
No Evangelho, João distingue entre a multidão (ό δχλος) e osjudeus (Ιουδαίοι).
Com o primeiro termo, ele refere-se ao conjunto dos habitantes judeus da Palesti­
na, a massa de pessoas, principalmente, os galileus; com o segundo termo, refere-se
mais particularmente aos habitantes da Judeia, os líderes do judaísmo em oposição
a Jesus. A multidão é inconstante na convicção, inquisitiva, desprezada pelos
fariseus, inclinada a ouvir Jesus e crer; é movida pelo impulso de torná-lo
rei, escoltando-o triunfalmente em Jerusalém e não aparecendo na narrativa
do julgamento e da crucificação. Os judeus são obstinados na expectativa
de um Messias nacional. Eles representam o aspecto estreito e sectário do
judaísmo, eles são os instigadores da oposição a Jesus e os líderes desses
opositores, e a crucificação de Jesus é atribuída a eles. João usa a palavra nos
pontos em que os outros evangelistas se referem aos opositores de Cristo
como fariseus, saduceus, presbíteros, chefes dos sacerdotes, mestres da lei
ou escribas. Ele reconhece a distinção entre fariseus e saduceus e, embora
não mencione os últimos pelo nome, caracteriza-os por sua posição. Jesus é
a chave para o sentido no qual João emprega o termo judeus. Ele consider a-
-os em sua relação com Ele. A ideia subjacente à palavra, usualmente, é a de
50
J oão - C ap. 1

separação do caráter e dos privilégios do verdadeiro israelita por meio de sua


rejeição de Jesus82.

Mandaram (άπέστειλαν), Como uma comitiva. Vide nota sobre o versículo 6.

Sacerdotes e levitas. Representando o elemento eclesiástico da nação, as


duas classes empregadas no serviço do templo. Vide is 3.3; 2Cr 30.27; Ez 44.15.
A combinação não ocorre em mais nenhuma passagem do Novo Testamento. E
provável que esses representantes tenham vindo do Sinédrio.

Para que £../] perguntassem (iva έρωτήσωσιν). Literalmente, afim de que eles
perguntassem. Vide nota sobre Mt 15.23.

Quem és tu (σύ τίς et)? Literalmente, tu, quem és tu?

20. Confessou e não negou. A combinação característica de João de uma ora­


ção positiva e uma negativa. Vide nota sobre o versículo 3. Os dois verbos são
usados absolutamente.

Eu não sou o Cristo. De acordo com a leitura apropriada, έγώ, eu, permanece
na frente na declaração de João Batista, com δτι tendo apenas a força das mar­
cas da citação. A frase é enfática: “Eu não sou o Cristo, embora o Cristo esteja
aqui”. Alguns questionavam se João era o Cristo (Lc 3.15; At 13.25). Observe a
ocorrência frequente do enfático eu·, versículos 23,26-27,30-31,33-34. Acerca de
o Cristo, vide nota sobre Mt 1. l .

21. Então, quem és, pois? És tu Elias? Algumas autoridades leem: Então, quem
és tu? Elias? Elias, predito em Ml 4.5, como o precursor do dia do Senhor.

És tu o profeta? De acordo com a ordem grega seria: o profeta és tu. Vide


Dt 18.15, compare com At 3.22; 7.37; Jo 1.46; 6.14.

Não. Observe como as sucessivas negativas ficam mais breves.

23. A voz (φωνή). Ou uma voz. Não há artigo. Vide nota sobre M t 3.5.

Que clama no deserto. Alguns juntam no deserto com endireitai, como no


hebraico. A citação é de Is 40.3. Nos outros três Evangelhos, a citação aplica-se

22. Oestudiosodeveriarealmenteleroadmirável resumodesseassuntofeitopeloCônegoWestcott,


naIntroduçãodeseuCom m entary on the G ospel o f John.
51
J oAo - C ap. 1

a João Batista (Mt 3.8; Me 1.3; Lc 3.4). Aqui, ele usa a citação para se referir a si
mesmo. Acerca de deserto, vide nota sobre Mt 3.1.

Endireitai o caminho (εύθύνατε την οδόν). Em lugar de οδόν, caminho, todos


os Sinópticos usam τρίβους, caminhas trilhados, sendas-, e para o verbo εύθύνατε,
endireitar, usam o verbo e adjetivo ευθείας ποιείτε. Acerca da imagem de prepa­
rar o caminho, vide nota sobre Lc 3.5.

24. Os que tinham sido enviados eram (οί απεσταλμένοι ήσαν).


Literalmente: aqueles tendo sido enviados eram. Porém, os melhores textos
omitem o artigo, de modo que as palavras restantes formem o passivo mais-
que-perfeito: “eles tinham sido enviados da parte dos fariseus”. Esse acréscimo
de uma circunstância explicativa é típico de João. Compare com 1.41,45; 9.14;
11.5,18; 13.23.

26. Eu batizo com água, mas, [...)] está um. Os melhores textos omitem mas-,
para que as duas orações ilustrem o paralelismo característico de João e revele o
contraste contundente entre João Batista e seu sucessor.

Meio de vós (μέσος υμών). No grego, é: no meio em relação a vocês. Έγώ, eu,
e μέσος, no meio, permanecem, respectivamente, na início das orações paralelas
enfatizando, assim, os dois grupos contrapostos.

Está (εστηκεν). Os melhores textos trazem στήκει, verbo similar de εστηκεν,


mas acrescido do sentido de permanecer firme, persistente. Daí estaifirmes (lCo
16.13; G1 5.1; Fp 1.27). O verbo enfatiza a firme e digna atitude de Cristo.

Vós não conheceis (υμείς). Enfático.

27. Este é aquele que vem após mim (αυτός εστιν ό όπίσω μου ερχόμενος). Os
melhores textos omitem as duas primeiras palavras. Westcott e Hort também
omitem ó; assim, a tradução é: não conheceis aquele que vem após mim.

Foi preferido antes de mim. Os melhores textos omitem.

D esatar (ϊνα λύσω). Literalmente, que eu podia desatar. Marcos (1.7) e Lucas
(3.16) trazem desatar. Mateus (3.11) traz levar. Vide nota sobre Mt 3.11.

28. Betabara (Βηθαβαρά). A leitura correta é Βηθανία, Betânia. Não a cidade de


Betânia de 11.18, mas uma vila desconhecida. Não era incomum dois lugares
52
J oão —C ap. 1

terem o mesmo nome, como as duas Betsaidas, uma na margem leste do lago de
Genesaré (Mc 6.32,45) e a outra na margem oeste (Jo 1.44); as duas Cesareias,
uma no Mediterrâneo (At 8.40) e outra em Gaulanites, aos pés do Líbano, a Ce-
sareia de Filipe (Mt 16.13).

Estava batizando (ήν βαπτίζων). O particípio com o verbo substantivo indica


ação contínua; estava ocupado em batizar.

29. João. Os melhores textos omitem.

Viu (βλέπει). Ambos όράω e βλέπω denotam o ato físico de ver, o primeiro
ver em geral, o segundo o simples olhar. A percepção indicada por βλέπω é mais
externa-, a percepção do sentido como distinta do discernimento mental, que é
proeminente em όράω. Um olhar diz a João Batista que o mais poderoso chegou.
Vide nota sobre o versículo 18 e Mt 7.3.

Para (προς). Estritamente em direção a.

Eis (ΐδε). O imperativo no singular, embora se dirija ao grupo de seus seguido­


res. Contudo, essa construção não é incomum. Vide Mt 26.65; At 13.46.

O Cordeiro (ò αμνός). A palavra ocorre somente em João, aqui e no versí­


culo 36. Ocorre também em At 8.32 e lPe 1.19. O diminutivo άρνίον, cordei-
rinho, é encontrado uma vez no Evangelho (21.15), com frequência em Apo­
calipse, mas apenas em relação ao Redentor glorificado, e em nenhuma outra
passagem do Novo Testamento. Em algumas circunstâncias, a palavra pode
enfatizar o caráter gentil e inocente de Jesus sofrendo para expiar os pecados
dos homens (Ap 5.6,12; 13.8), mas também é empregada para descrevê-lo
como indignado (Ap 6.16); vitorioso (Ap 17.4); objeto de adoração (Ap 5.8) e
entronado (Ap 5.13; 7.17).
A expressão o Cordeiro de Deus (observe o artigo), evidentemente, é usada aqui
por João Batista e, em algum sentido, é entendida por seus ouvintes e aponta
para Is 3 (v. 7); compare com At 8.32. É provável que a referência seja ao Cordei­
ro da Páscoa, embora os comentaristas divirjam.

De Deus. Fornecido por Deus para sacrifício.

Que tira (ό α’ίρων). Ou afasta ou tira de si mesmo a fim de suportar; ou remo­


ção ou expiação do pecado. Todavia, uma ideia está incluída na outra. O tirar do
pecado acontece por meio de Ele suportá-lo. Em Is 53 ( l x x ), φέρω, carregar,
53
João- C ap. 1
suportar, e seu composto αναφέρω (vide nota sobre lPe 2.5) são usados, e αίρω,
pegar e levar embora, ocorre somente na frase sua vida ê tirada da terra,fo i cortado
da terra dos viventes, de acordo com o uso universal da l x x , que nunca emprega
a’ipeiv para expressar o ato de carregar, suportar o pecado. Se João Batista tinha
em mente carregar, suportar, ele, provavelmente, teria usado φέρω. Compare
com lJo 3.5: “Ele se manifestou para tirar (iva. ctpr|) os nossos pecados”; e com
lJo 1.7: “nos purifica de todo pecado”. No uso do tempo presente, tira, João Ba­
tista vê a futura consumação da obra expiatória de Cristo como potencialmente
presente.

O pecado (την αμαρτίαν). Visto coletivamente.

Mundo. Vide nota sobre o versículo 9.

30. Do qual (trepl οΰ). Ou seja, “a respeito tfcquem”; mas a leitura mais apropria­
da é υπέρ οδ, “em nome de quem”, em vindicação de.

Um homem (άνήρ). O Novo Testamento usa três palavras para homem, άρρην ou
άρσην, άνήρ e άνθρωπος. ’Άρσην denota apenas a distinção sexual, varão (Rm 1.27; Ap
12.5,13). Άνήρ denota o homem como distinto da mulher, como varão ou marido (At
8.12; Mt 1.16), ou como distinto do menino (Mt 14.21). O homem também é favorecido
com coragem, inteligência, força e outros atributos nobres (lCo 13.11; Ef 4.13; Tg 3.2).
O termo άνθρωπος é genérico, não faz distinção de sexo, um ser humano (Jo
16.21), embora, com frequência, seja usado em conexões que indicam ou envolvem
sexo, como Mt 19.10; 10.35. Usado para humanidade (Mt 4.4) ou para pessoas (Mt
5.13,16; 6.5,18; Jo 6.10). Usado para homem como distinto de animais ou plantas
(Mt 4.19; 2Pe 2.16) e também distinto de Deus, Cristo, como divinos, e dos anjos
(Mt 10.32; Jo 10.33; Lc 2.15). Usado com a noção de fraqueza que leva ao pecado
e com sentido de insolência (lCo 2.5; lPe 4.2; Jo 5.12; Rm 9.20). Assim, o sentido
mais nobre e honrável está ligado a άνήρ, e não a άνθρωπος. Por isso, Heródoto
diz que quando os medos atacaram os gregos, eles caíram em grandes números
para que ficasse claro para Xerxes que ele tinha muitos combatentes (άνθρωποι),
mas poucos guerreiros (άνδρeç)23. Daí Homero dizer: “Sede homens (àvépeç), amigos,
ânimo forte, mutuamente ciosos da honra no duro embate”24. Por isso, João Batista
usa aqui άνήρ para Jesus com sentido de dignidade. Compare com άνθρωπος, no
versículo 6, no qual a palavra não indica desprezo, mas é simplesmente indefinida.
Em João, άνήρ tem principalmente o sentido de marido (4.16-18). Vide 6.10.

23. Heródoto, vii, 210.


24. Homero, Ilía d a , tradução HaroldodeCampos, São Paulo, ARX, 2008, 5. reimpressão, v, 529.

54
J oão - Cap. 1

31. E eu (κάγώ). Enfático. “E eu, [embora^ disse^sse]: após mim vem um homem
(v. 30), não o conhecia”.

Não o conhecia. Oficialmente, como o Messias. Não há referência a conheci­


mento pessoal. É inconcebível que, em vista da relação íntima das duas famílias,
João Batista não conhecesse Jesus pessoalmente.

Israel. Sempre com a ideia do privilégio especial da raça.

32. Testificou (εμαρτύρησεν). Na n v i , deu testemhunho. Vide nota sobre o versículo 7.

Eu vi (τεθεαμαι). A rv apresenta com mais correção a força do tempo perfeito: eu


tenho visto. Calma e refletidamente; vide nota sobre o versículo 14.0 tempo perfeito
indica o efeito duradouro da visão. Compare com έώρακα, eu tenho visto (v. 34, t b ).

Como uma pomba (ώσε'ι περιστεράν). Na forma de uma pomba. Vide nota
sobre Mt 3.16.

33. Esse (εκείνος). Na n v i , aquele. Vide nota sobre o versículo 18. Enfatiza a co­
municação pessoal de Cristo com João Batista.

Com o Espírito Santo (èv Πνεύματι 'Αγίω). A preposição εν, em, com fre­
quência, tem a força instrumental de com. Contudo, aqui, ela parece significar o
elemento da nova vida, como εν υδατι, com água, representa o elemento do batismo
simbólico e seria mais bem traduzido por em. A ausência do artigo com Espírito
Santo concorda com isso, como indicando a influência espiritual do agente divino,
em vez de sua personalidade.

34. Eu vi (εώρακα). Na t b , mais estritamente de acordo com o tempo perfeito, eu


tenho visto. Vide nota sobre o versículo 32, e observe o verbo diferente para ver,
acerca do qual vide nota sobre o versículo 18.

Tenho testificado (μεμαρτύρηκα). Também no tempo perfeito.

O Filho de D eus. Essa é a leitura apropriada, mas um manuscrito muito


importante traz ò εκλεκτός, o escolhido. Com essa expressão, João Batista
quer dizer o Messias. Ela tem o mesmo sentido nos Evangelhos Sinópticos.
Compare com M t 11.27; 28.19. Para o sentido em que era entendida pelos
judeus da época de Cristo, vide versículos 18-19; 10.29,30-36. No Antigo
Testamento, a expressão ocorre apenas em Dn 3.25. Compare com SI 2.12.
55
J oão - C ap. 1

Acerca de υΙός, filho, como distinto de τέκνον, criança, descendentes, vide nota
sobre o versículo 12.

35. Estava (ε'ιστήκει). Na k jv , postou-se. Na r v , mais apropriadamente, estava se


postando-, na t e b , se achava. O tempo imperfeito denota algo em progresso. Por isso,
aqui, com a ideia de espera^ achava-se em expectativa. Compare com 8.37; 18.5-6,18.

Dois dos seus discípulos. Um era André (v. 41), e o outro, o próprio evangelis­
ta, que cuidadosamente evita mencionar seu próprio nome em toda a narrativa.
O nome de Tiago, o mais velho, também não aparece nem o de Salomé, a mãe do
evangelista, mencionada pelo nome no Evangelho de Marcos (15.40,16.1). A omis­
são de seu próprio nome é mais relevante a partir do fato de que ele, habitualmente,
é preciso em definir os nomes em sua narrativa. Compare a simples designação de
Simão (l .42) com as ocorrências subsequentes de seu nome depois do seu chamado,
como 1.42; 13.6; 21.15 etc. Também Tomé (11.16; 20.24; 21.2); Judas Iscariotes
(6.71; 12.4; 13.2,26) e o outro Judas (14.22). Observe também que ele nunca se
refere a João Batista como João, o Batista, como os outros três evangelistas, mas
sempre como João.

36. Vendo (έμβλέψας). A n v i dá a força do aoristo, quando viu. Vide nota sobre o
versículo 29. O verbo só é usado por João aqui e no versículo 42.

Passar a Jesus (πφίπατοϋντι). O sentido literal do verbo é andar por ali (πφί).
Aqui é possível que o sentido seja caminhando ao longo. Westcott, “partir”. Vide
nota sobre lPe 5.8; Lc 11.44.

37. Dizer (λαλοΰντος). Literalmente, dizendo.

Seguiram. Bengel diz: “A origem da igreja cristã”.

38. Vendo (θεασάμενος). O sentido melhor seria observando·, olhá-los firmemente


como se os estudasse.

Que buscais? João registra as primeiras palavras de Cristo. Compare com


Mt 3.15; Mc 1.15; Lc 2.49.

Rabi. Meu poderoso, meu honrável senhor. Explicado por Jesus mesmo com
διδάσκαλος, mestre (Mt 23.8, passagem em que a leitura apropriada é διδάσκαλος,
em vez de καθηγητής, guia, chefe, encontrada em Mt 23.10, n v i ). Termo usado
pelos judeus para se dirigirem a seus professores e formado a partir de uma raiz
56
JoÂo —C ap . l
hebraica com o sentido de grande, notável O termo ocorre comumente em João
e é encontrado em Mateus e Marcos, mas não em Lucas, pois ele usa επιστάτης.
Vide nota sobre Lc 5.5.

Traduzido. João, com frequência, acrescenta comentários explicativos. Vide


versículos 42-43; 9.7.

Moras (μένεις). Na a r a , assistes. Jesus perguntara: “Que buscais?”, não quem.


Eles respondem: “Onde [tu] moras?”

39. Vede (ιδετε). Mas a leitura correta é οψεσθε, vereis.

Foram. Os melhores textos acrescentam o\5v,pois. Como a t e b . Essa partícula


de ligação é encontrada no Evangelho de João com tanta frequência quanto nos
três Sinópticos juntos e mais comumente na narrativa, marcando a transição de
uma coisa para outra e servindo para ligar as diversas partes da narrativa. Vide
versículo 22; 2.18. 3.25; 4.28,30 etc. Assim, com muito mais frequência que nos
discursos em que seria usada para marcar uma sequência de pensamento. Essas
instâncias ainda ocorrem como nos versículos 21,25; 3.29; 8.5; 4.11.

Morava (μένει). O tempo presente. Literalmente, eles viram onde ele morava.
Para uma construção semelhante, vide 2.9; 4.1; At 10.18 etc.

Hora décima. A questão é se essa hora deve ser considerada de acordo com
o método judaico ou romano de cálculo. O método judaico, empregado pelos
outros evangelistas, começa o dia ao nascer do sol, assim, de acordo com ele, a
décima hora seria 16 horas. O método romano, como o nosso, conta a partir da
meia-noite, de acordo com o que a décima hora seria 10 horas. O peso do argu­
mento, no todo, parece estar a favor do método judaico, o qual, indubitavelmente,
é assumido por João em 11.9. Os gregos da Ásia Menor, para quem João escrevia,
usavam o método judaico, recebido dos babilônios. Godet cita um incidente dos
“Discursos sagrados”, de Aélio Aristides, sofista grego do século II e contem­
porâneo de Policarpo. Deus ordenou-lhe que tomasse um banho, ele escolheu a
sexta hora como a mais benéfica para a saúde. Sendo inverno, e o banho era frio, a
hora era meio-dia·, pois ele disse ao amigo, que o esperava: “Veja, a sombra já está
virando?” Até mesmo o Cônego Westcott, que advoga o método romano, admite
que “romanos e gregos, não menos que os judeus, contam as horas a partir do
nascer do sol”, embora os romanos calculem seus dias civis a partir da meia-noite,
e a décima hora seja chamada de última hora, quando os soldados pegavam sua
refeição ou tinham permissão para descansar. Por isso, em seu relato do ataque
57
J oão - C a p . 1

romano a Sutri, Lívio registra: “Por volta da décima hora, o cônsul ordenou uma
refeição para seus homens e instruiu-os para que estivessem em armas a qual­
quer hora do dia ou da noite em que ele desse o sinal. £...] Depois de se refresca­
rem, eles descansaram”25.
Aristófanes diz: “Quando a sombra no relógio de sol está com três metros de
comprimento, então vão jantar”26; e Horácio: “Você jantará comigo hoje. Venha
depois da nona hora”27. Objeta-se que o horário que se estende das 16 horas até o
fim do dia não seria descrita como aquele dia-, todavia, além de marcar a hora espe­
cífica em que acompanharam Jesus como a primeira hora de sua vida cristã, seria
improvável que João usasse uma forma de falar mais popular e mais imprecisa para
indicar a extensão da estadia com Jesus, querendo dizer apenas que eles permane­
ceram com Jesus durante o resto do dia e, sem dúvida, prolongaram sua conversa
até a noite28.

40. Um dos dois. Sendo o outro João.

André. Vide nota sobre Mc 3.18. Compare com Mc 13.3; Jo 6.8; 12.22.

Irmão de Simão Pedro. A menção a Simão Pedro antes de ele aparecer na


narrativa indica a importância que o evangelista liga a ele. A menção parece as­
sumir o conhecimento da narrativa evangélica por parte dos leitores. Vide uma
circunstância similar de antecipar o que é explicado subsequentemente na men­
ção a Maria, 11.2.

41. Este achou primeiro (eúpíoKei οΰτος πρώτος). Na n v i , o primeiro que ele
encontrou. Este é o pronome demonstrativo, esse aqui, que, junto com primeiro, pa­
rece apontar para o encontro posterior de seu irmão pelo outro discípulo, ou seja,
de Tiago por João. Bengel diz: “Ao festival de novidade daqueles dias correspon­
de belamente a palavra achou, que com frequência é usada aqui”.

Seu (τον ’ίδιον). Vide nota sobre M t 22.5; 25.15; At 1.7; lPe 1.3.

Achamos (eupijKapev). Esse foi chamado o capítulo das descobertas.

25. Não é fácil ajustar todas as referências à hora do dia no Evangelho de João a um dos dois mé­
todos. Assim, 19.14 localiza a crucificação na sexta hora ou ao m eio-dia, contando pelo método
judaico, enquanto Marcos (15.25) diz terceira hora ou entre 8 e 9 horas. As duas passagens do
capítulo 4.6,52 são de pouca ajuda, sobretudo a última. Talvez, afinal, a passagem quase mais de­
cisiva seja 11.9. Há autoridades de peso dos dois lados. Para o método romano, Tholuck, Ebrard,
Ewald, Westcott; para o método judaico, Lücke, D e Wette, Meyer, Alford, Lange, Godet.
26. Lívio, ix, 37.
27. Aristófanes, Ecclesiazusae, 648.
28. Horácio, E pístolas, livro 1, vii, 69.

58
J oão - C ap . 1

O Messias. Título peculiar a esse Evangelho; aparece somente aqui e em 4.25.

Cristo. Vide nota sobre Mt l.l.

42. Olhando. O mesmo termo usado no versículo 36, em que é ver. Na n v i,


olhou para.

Tu serás. Alguns leem como pergunta: serás tu.

Jonas (’Ιωνά). A leitura correta é Ίωάνου, de João.

Pedro (Πέτρος). Vide nota sobre Mt 16.18. Uma massa de rocha separada. NaKJv,
umapedra. Cefaséo nome aramaico, que ocorre em lCo 1.12; 3.22; 9.5; 15.5; G1 2.9.

43. Jesus. Os melhores textos omitem.

Quis ir (ήθέλησεν έξίλθεΧν). A nvi tem uma tradução melhor, decidiupartir. Acer­
ca da construção, vide nota sobre Mt 20.14; acerca do verbo quis ir, vide nota sobre
Mt 1.19.

E achou. Observe o vivido intercâmbio de tempos: quis ir, achou. A coorde­


nação das duas orações, que os outros escritores poriam em dependência lógica,
é característica de João. Mesmo nos pontos em que há verdadeira dependência
interna, ele usa só as partículas conectivas simples. Compare com 2.l3ss.

Filipe. Vide nota sobre Mt 3.18. Para indícios de seu caráter, vide 6.5,7;
12.21SS.; 14.8-9.

Disse. Os melhores textos acrescentam Jesus: “Jesus lhe disse” (bj).

Segue (άκολούθβ.). Com frequência, usado no texto do Novo Testamento com o


sentido especial de seguir como discípulo ou partidário. VideMt 4.20,22; 9.9; Mc 1.18;
Jo 8.12. Também com o sentido de aderir firmemente a alguém e conformar-se ao
exemplo desse alguém. Vide Mt 10.38; 16.24; Jo 12.26. O verbo ocorre apenas uma
vez fora dos escritos dos evangelistas, em lCo 10.4. Ele aparece no substantivo acó­
lito, ou acolitado, ou acolitato, posição de servo da igreja logo abaixo do subdiácono
cuja obrigação era preparar as lâmpadas, iluminar a igreja, preparar os elementos
sacramentais etc. Sob os imperadores bizantinos, o capitão da guarda pessoal do
imperador era chamado acólito ou o seguidof9.

29. Vide Scott, Count R o b ert o f P aris.

59
JoÂo - Cap. 1

44. De Betsaida. Na rv, mais literalmente, oriundo de (άπό). Betsaida da Galileia.


Vide 12.21 e nota sobre o versículo 28. Filipe, sendo da mesma cidade de André e
Pedro, foi o mais pronto em receber a Cristo por causa do testemunho e exemplo
de seus companheiros concidadãos. Observe a mudança de preposição: oriundo
de Betsaida (άπό) e de dentro da (έκ) cidade. Vide nota sobre dos mortos, Lc 16.31.

45. Natanael. Provavelmente o mesmo que Bartolomeu. Vide nota sobre Barto­
lomeu, Mc 3.18.

Moisés escreveu na lei etc. Observe o detalhe circunstancial dessa confissão


quando comparada com a de André (v. 42).

46. Pode vir [../] de Nazaré (’εκ Ναζαρέτ είναι). Literalmente, “<?de dentro de”;
expressão característica de João. Vide 3.31; 4.22; 7.17,22; 8.23; 15.19; 18.36,38
etc. Quer dizer mais do que “vir de”, mais propriamente, “vir de” com o sentido
de que é de-, ser identificado com algo de modo a aparecer com a impressão, a mo­
ral ou outra coisa desse local. Vide especialmente 3.31: “Aquele que vem da terra
é da terra”; ou seja, compartilha de sua qualidade. Compare com as palavras de
Cristo para Nicodemos (3.6) e com lCo 15.47.
Na ordem grega, de Nazaré vem primeiro na sentença expressando o proemi­
nente pensamento que Natanael tinha em mente, surpreso por Jesus vir de Na­
zaré, uma vila pobre cujo nome nem mesmo aparece no Antigo Testamento. Ao
contrário da explicação popular, não há evidência de que Nazaré fosse pior que
outros lugares, além do fato da violência de seu povo com Jesus (Lc 4.28-29) e de
sua descrença obstinada nele (Mt 13.58; Mc 6.6). Contudo, existia o provérbio de
que nenhum profeta veio da Galileia (Jo 7.52).

47. Um verdadeiro israelita (αληθώς Ισραηλίτης). Literalmente, verdadeira­


mente um israelita. Um israelita não apenas na descendência, mas no caráter de
acordo com o ideal estabelecido pela lei de Deus. A própria palavra israelita era
uma designação honrável. Vide nota sobre varões israelitas, At 3.12, e compare
com declarações sobre judeus, versículo 19.

Dolo (δόλος). Propriamente, isca para peixe e relacionada na raiz a δελεάζω,


pegar com isca ou enganar. Vide nota sobre engodando, 2Pe 2.14. O verdadeiro isra­
elita seria o verdadeiro filho de Israel depois que ele deixasse de ser o substituto.
E interessante o fato de Jacó, em Gn 25.27, ser chamado de varão simples, ou seja,
como alguns explicam o hebraico, um homem perfeito ou correto; e outros, um ho­
mem de hábitos serenos e simples e de que a lxx traduza esse adjetivo por άπλαστος,
não dissimulado, semfingimento, simples, sincero. Aqui, o grego aqui deve ser lido
literalmente: em quem não há dolo.
60
João - Cap. l
48. Conheces (γινώσκεις). Vide nota sobre At 19.15.

Debaixo da figueira (ύττό την συκήν). A construção com eíôov oe, te vi eu;
ou seja, te vi debaixo dafigueira. A preposição com o caso acusativo - o que su­
gere movimento em direção a um ponto - indica a retirada dele para a sombra
da árvore a fim de meditar ou orar. Vide nota sobre o versículo 50. Os escritos
judaicos falam de rabis célebres que tinham o costume de se levantar cedo para
dar continuidade a seus estudos sob a sombra de uma figueira. Compare com
Mq 4.4; Zc 3 .1 0 . Agostinho, em suas Confissões, relata a respeito de si mesmo:
“Deixei-me, não sei como, cair debaixo de uma figueira e dei livre curso às lá­
grimas, que jorravam de meus olhos aos borbotões, como sacrifício agradável
a ti”30. Natanael pergunta: "De onde me conheces tu?”. Jesus responde: “Q..J] te
vi eu (eíôov)”.

49. Rabi. Aqui, Natanael usa o título que evitara em sua primeira fala.

50. Debaixo da figueira (úuò τής συκής). Compare com o versículo 48. Aqui é
usada a mesma preposição com o caso genitivo, indicando descanso, sem a suges­
tão de retirada ou afastamento para.

Crês? Assim está correto, embora alguns traduzam como afirmação, crês.

51. Na verdade, na verdade (αμήν, αμήν). As palavras são transcritas no nosso


amém.. João, ao contrário dos outros evangelistas, nunca usa um único na verdade,
e a expressão, conforme é empregada individualmente nos Sinópticos, é usada só
por Cristo.

Daqui em diante (άττ’ άρτι). Os melhores textos omitem. O sentido literal da


expressão é: de agora em diante, por isso, conforme comenta habilmente o Cônego
Westcott, “se for genuína, descrevería a comunhão entre terra e céu como esta­
belecida a partir do momento em que o Senhor iniciou seu ministério público”.

Céu (tòv ουρανόν). A a r c fornece o artigo, o céu.

Aberto (άνεωγότα). Particípio perfeito. Ele significa permanecendo aberto, e é


usado na história do martírio de Estêvão, At 7.56. Compare com Is 64.1. A ima­
gem apresentada do verdadeiro israelita é extraída da história de seu ancestral
Jacó (Gn 28.12).

30. Agostinho, Confissões, traduçãoMaria Luiza Jardim Amarante, 10 . ed., SãoPaulo, Paulus, 1984,
viii, 28, p. 213-214.

61
J oão - C ap . 1

Anjos. Com exceção de 12.29 e 20.12, João não usa a palavra “anjo” em outras
passagens do Evangelho nem das epístolas e não se refere ao ser nem ao ministé­
rio deles. Trench cita uma bela passagem de Platão como sugestiva das palavras
do nosso Senhor31. Platão fala de amor.

Ele éumgrande espírito, ecomo todos os espíritos eleé intermediárioentre o divino


e o mortal. Ele é o intérprete entre deuses e os homens, transmitindo para os deu­
ses as orações e sacrifícios dos homens e para os homens as ordens e respostas dos
deuses; ele éo mediador que transpõe o abismo que os separa, e nele tudo é unido, e
por intermédio dele os atos do profetae do sacerdote, os sacrifícios, os mistérios eos
encantamentos deles e toda profecia eencanto encontra seu caminho. Pois Deus não
semisturacomohomem, mas, por intermédiodoamor, todorelacionamentoe comu­
nicação deDeus como homem, quer despertoquer adormecido, éexercido38.

Filho do Homem. Vide nota sobre Lc 6.22. Nesse capítulo, observe os títulos
aplicados sucessivamente para nosso Senhor: o grande sucessor de João Batista,
o Cordeiro de Deus, o Filho de Deus, o Messias, o Rei de Israel. Esses títulos
todos foram dados por outras pessoas. O título de Filho do Homem, Ele aplica
a si mesmo.
No Evangelho de João, como nos Sinópticos, essa expressão é usada só por
Cristo ao falar de si mesmo e, em outras passagens, apenas em At 7.56, passagem
em que o título é aplicado a Ele por Estêvão. A expressão ocorre com menos fre­
quência em João que nos Sinópticos, tendo trinta ocorrências em Mateus, treze
em Marcos e doze em João.
O uso do título por Jesus aqui é explicado de duas maneiras.
I. Que Ele empresta o título do Antigo Testamento para designar a si mesmo
ou (a) como um profeta, como em Ez 2.13; 3.1 etc.; ou (b) como o Messias, con­
forme prognosticado em Dn 7.13. Essa profecia de Daniel tinha alcançado uma
circulação tão ampla que o Messias era chamado Anani ou o homem, das nuvens.
(a) Essa explicação é indefensável porque, em Ezequiel e em outras passagens
do Antigo Testamento, a expressão filho do homem é usada para descrever o ho­
mem sob suas limitações humanas, como fraco, falível e incompetente por ele
mesmo para ser um agente divino.
(b) A alusão à profecia de Daniel é admissível, mas Jesus não pretende dizer:
“Sou o Messias prognosticado por Daniel”. O conceito popular do termo Messias
tem um sentido político ligado a ele; e é perceptível em todo o Evangelho de João
em que Jesus tem o cuidado de evitar usar esse termo diante das pessoas, mas ex-

31. Trench, Studies in the Gospels.


32. Platão, Sym posium , 203.
62
JoAo - Cap. 1
pressa o mesmo sentido por meio de circunlocução, a fim de evitar a complicação
que o entendimento popular representaria para sua obra. Vide 8.24-25; 10.24-25.
Além disso, a expressão Filho do Homem, via de regra, não era aplicada ao
Messias. Ao contrário, o versículo 27 e o 12.34 mostram que essa expressão
estava em contraposição com aquele termo. Compare com Mt 16.13,15. Filho de
Deus é o título messiânico que, com uma única exceção, aparece nas confissões
(1.34,49; 11.27; 20.31)33.
No livro de Daniel, a referência é exclusivamente ao estágio final dos assuntos
humanos. O ponto é o estabelecimento final do reino divino. Além disso, Daniel
não diz “o Filho do Homem”, mas “um como o filho do homem”. Compare com
Ap 1.13; 14.14, em que o artigo também é omitido.
II. A segunda explicação, e a correta, é que o título Filho do Homem é a expressão
da autoconsciência de Cristo da forma como se relaciona com a humanidade como
um todo, denotando sua verdadeira participação na natureza humana e designando
a si mesmo como o representante do homem. Assim, ela corresponde à passagem de
Daniel, na qual os reinos terrenos são representados por bestas, mas o reino divino é
representado pelo Filho do Homem. Por isso, também, a palavra άνθρωπος também é
usada intencionalmente (vide nota sobre um homem, v. 30; cp. Jo 8.40).
Embora o elemento humano seja, assim, enfatizado na expressão, a consciência
de Jesus, conforme expressa dessa maneira, não exclui sua natureza e afirmações
divinas, mas, antes, vê-as por meio de sua humanidade. Ele mostrou-se divino
em sendo, dessa forma, profundamente humano. Por esse motivo, dois aspec­
tos da expressão aparecem em João e também nos Sinópticos. Por um lado, Ele
contempla sua vida e obra terrenas que inclui ser desprezado; sua adaptação às
condições da vida humana; o velamento parcial de sua natureza divina; o caráter
amoroso de sua missão; sua sujeição à interpretação errônea; e sua perspectiva
da consumação da agonia. Ele, por sua vez, possui autoridade suprema; ocupa-se
do trabalho de seu Pai; revela vislumbres de sua natureza divina por intermédio
de sua humanidade; sua presença e missão conferem séria responsabilidade so­
bre aqueles a quem Ele apela e prevê a consumação da glória não menos que a
da agonia. Vide Mt 8.20; 11.19; 12.8,32; 13.37; 16.13; 20.18; 26.64; Mc 8.31,38;
14.21; Lc 9.26,58; 12.8. 17.22; 19.10; 22.69.
O outro aspecto está relacionado com o futuro. Ele tem visões de outra vida
de glória e domínio; embora Ele esteja presente na carne, sua vinda ainda é
futura e será seguida de julgamento, o qual foi entregue a Ele, e da glória final
de seu redimido em seu reino celestial. Vide Mt 10.23; 13.40ss.; 16.27ss.; 19.28;
24.27,37,44; 25.31SS; Mc 13.26; Lc 6.22; 17.24,30; 18.8; 21.27.

S3. Em Jo 9.35, passagem em que Jesus mesmo formula uma confissão, a leitura é debatida; três dos
principais manuscritos trazem Filho do Homem. Vide nota sobre essa passagem.

63
João - C ap. 2

C apítulo 2

1. Ao terceiro dia. Calculado a partir do último dia mencionado (1.43).

Umas bodas (γάμος). Ou festa de casamento, incluindo uma série de entreteni­


mentos, daí, com frequência, ser encontrado no plural. Vide nota sobre Mt 22.2.

Caná da Galileia. Para distingui-la de Caná, na Coele-Síria.

Mãe de Jesus. João nunca menciona o nome de sua mãe.

Estava ali. Quando Jesus chegou. Provavelmente, sua mãe estava ali como
amiga íntima da família ajudando nas arrumações.

2. E foram também convidados. Depois de seu retorno do encontro com o Batista.

Seus discípulos. Em honra a Jesus.

3. Faltando o vinho (ύστίρήσαντος οίνου). Literalmente, quando o vinho aca­


bou; como na ntlh . Na n v i , tendo acabo o vinho. Algumas autoridades primitivas
liam: “Eles não tinham vinho, pois o vinho do casamento foi consumido”. Às
vezes, as festas de casamento duravam uma semana inteira (Gn 29.27; Jz 14.15;
Tb 9.12; 10. l).

Não têm vinho. Sugere um pedido de ajuda, não necessariamente a expecta­


tiva de um milagre.

4. Mulher. Não indicando severidade nem desrespeito. Compare com 20.13,15.


Essa era uma forma de tratamento altamente respeitável e carinhosa.

Que tenho eu contigo (τί έμοί και ool). Literalmente, o que há para mim
e ti. Vide nota sobre Mc 5.7, e compare com Mt 8.29; 27.19; Mc 1.24; Lc 8.28.
A frase ocorre muitas vezes no Antigo Testamento, 2Sm 16.10; lRs 17.18 etc.
Jesus, embora de modo gentil e afetuoso, rejeita a interferência dela, pretendendo
prover a demanda de sua própria maneira. Compare com 6.6. Na n v i , que temos
nós em comum, mulher?

Ainda não é chegada a minha hora. Compare com 8.20; 12.23; 13.1. Em todo
caso, a chegada da hora indica alguma crise na vida pessoal do Senhor, mais comu-
mente sua paixão. Aqui, trata-se da hora de sua manifestação messiânica (v. 11).
64
J oão - Cap. 2
5. Aos empregados (διακόνοις). Vide nota sobre Mt 20.26; Mc 9.35.

6. Talhas (ύδρίαι). Usada apenas por João e só no Evangelho, versículo 7; 4.28.


Talhas de água está correto já que a palavra deriva de ΰδωρ, água.

De pedra. Porque é menos suscetível à impureza e, por isso, é prescrita pelas


autoridades judaicas para o lavar-se antes e depois das refeições.

Para as purificações etc. Ou seja, para os costumes de purificação existentes


entre os judeus.

Cabiam (χωροϋσαι). Derivado de χώρος, lugar ou espaço. Por conseguinte, fa ­


zer espaço ou caber, assim, ter espaço para conter alguma coisa.

Metretas (μετρητάς). Somente aqui no texto do Novo Testamento. Derivada


de μετρέω, medir, daí, apropriadamente, é um medidor. Medida de líquido conten­
do cerca de quarenta litros.

7. Enchei (γεμίσατε). Compare com Mc 4.37, e vide nota. sobre Lc 14.23.

8. Tirai (αντλήσατε). Derivado de άντλος, o local de um navio onde a água de sentina


se acumula, por conseguinte, o próprio acumulo de água. Por essa razão, o verbo
originalmente tinha o sentido de esvaziar a água acumulada; daí, em geral, tirar
a água como se fosse de um poço (4.15). O Cônego Westcott acha que a água
que foi transformada em vinho não era a das talhas da purificação, mas a que
era pedida aos servos, depois de eles terem enchido as talhas com água, para que
continuassem tirando água do poço ou da fonte.

Mestre-sala (άρχιτρικλίνω). Derivado de άρχω, ser chefe, e de τρίκλινον,


latim, triclinium, salão de banquete com três sofás (vide nota sobre Mc 6.39). Al­
guns explicam a palavra com o sentido de supervisor do comitê de banquete, um
empregado cuja tarefa era arrumar os utensílios da mesa, decidir sobre os pra­
tos do cardápio e testar o alimento de antemão. Outros explicam que o sentido
se refere a dos convidados ser selecionado para presidir o banquete como era
o costume grego e romano. Essa última percepção parece ser sustentada por
uma passagem do Sirácida (32.1-2, teb ): “Se te escolheram para presidir, não
tomes ares emproados: comporta-te com os outros como um deles. Ocupa-te
com eles, e somente depois vai também sentar-te. Tendo cumprido todos os
teus deveres, toma o teu lugar para poderes gozar de sua satisfação e ver-te co­
roado por teu perfeito desempenho”. De acordo com o costume grego e roma­
no, o mestre da festa era escolhido por sorteio. Por isso, Horácio, em sua ode ao
65
João - Cap. 2
amigo Séstio, diz, refletindo, com base em princípios morais, sobre a brevidade
da vida: “Logo a casa de Plutão será tua e não lançarás a sorte com dados pela
presidência do vinho”. Ele prescrevia a proporção de água e vinho e também
podia impor multas para quem não adivinhasse charadas etc. Como o sucesso
da festa dependia em grande parte dele, a escolha da pessoa para a função era
delicada. Platão diz: “Não devemos indicar um homem sóbrio e sábio para ser
nosso mestre da alegria? Pois se o chefe dos bebedores for ele mesmo jovem e
beberrão, e não excessivamente inteligente, então só por meio de alguma sorte
especial ele será salvo de cometer um grande mal”34,. A palavra ocorre apenas
aqui e no versículo 9. A wycliffe simplesmente transcreve: architriclinus (en­
carregado da festa; mestre de cerimônias).

10. Têm bebido bem (μεθυσθώσι). Na yvi,já beberam bastante. A ara traduz já be-
beramfartamente. As traduções da kjv e tyndale são melhores que a da rv : quando
os homens beberam livremente. O mestre-sala quer dizer que quando o paladar dos
convidados fica menos sensível graças à indulgência é oferecido um vinho de
qualidade inferior. Em todas as instâncias do uso da palavra no texto do Novo
Testamento, seu sentido é intoxicação. Dificilmente requer comentário a tenta­
tiva de defender a teoria do vinho não fermentado a fim de negar ou enfraquecer
esse sentido da palavra citando “wmjardim regado” (Is 58.11; Jr 31.12). Pode-se
responder a isso citando Platão, que usa βατιτίζίσθαι, ser batizado, para estar bê­
bado35. Na lxx , o verbo ocorre muitas vezes para regar (SI 65.9,10), mas sempre
com o sentido de molhar ou enxaguar, de estar embriagado ou saciado de água. Em
Jr 48.26 (lxx , 31), a palavra é encontrada no sentido literal, estar embriagado. O
uso metafórico da palavra foi transmitido para a gíria comum, como quando se
diz que um homem embriagado está encharcado ou molhado (como Platão, acima).
O uso figurativo da palavra na lxx tem um paralelo no uso de ποτίζω, dar para
beber, para expressar regar o chão. Como Gn 2.6, um vapor regou a face da terra
ou deu-lhe de beber. Compare com Gn 13.10; Dt 1 l . i o . Um uso curioso da pala­
vra ocorre em Homero, na passagem em que ele descreve o estiramento da pele
de um boi a qual, a fim de ficar mais elástica, é imersa (μςθύουσαν) com gordura36.

Inferior (Ιλάσσω). Literalmente, fraco. Indicando tanto pior quanto mais fra­
co. Fraco aparece no mesmo sentido de ordinário.

Guardaste (τ^τήρηκας). Vide nota sobre lPe 1.4.

34. Platão, L ets , 640.


35. Id., Symposium, 176.
36. Homero, Ilia d a , xvii, 390.

66
J oão - Cap. 2
11. Principiou assim. Ou, no sentido mais estrito, isso como um início.

Seus sinais (σημείων). Sinais é a forma mais correta de traduzir, preferível ao


termo milagre; como na ntlh e tb . Vide nota sobre Mt 11.20; 14.24. Esse ato não
foi apenas um prodígio (τέρας), nem uma maravilha (θαυμάσιοι/), tampouco, um poder
(δύναμις), mas distintivamente um sinal, uma marca do poder, graça e caráter divino
do agente. Por isso, ele cai perfeitamente com as palavras manifestou a sua glória.

Creram nele (επίστευσαν εις αυτόν). Vide nota sobre 1.12. Literalmente, cre­
ram em. O Cônego Westcott, mais habilmente, diz que essas palavras transmi­
tem a ideia de “absoluta transferência de confiança de uma pessoa para outra”.

12. Desceu (κατέβη). Cafarnaum fica na margem do lago e Nazaré e Caná no


terreno mais elevado.

13. Páscoa dos judeus. Acerca do uso de João do termo judeus, vide nota sobre
1.19. Assim, aqui o termo é usado como uma sub-referência à religião nacional
como se consistisse apenas de meras cerimônias. A mesma sugestão está sub­
jacente nas palavras do versículo 6: “Para as purificações dos judeus”. Só João
menciona essa primeira Páscoa do ministério de Jesus. Os Sinópticos não relatam
nenhum incidente de seu ministério na Judeia, e, exceto pela narrativa de João,
não se pode afirmar positivamente que Jesus subiu a Jerusalém durante sua vida
pública antes de sua prisão e crucificação.

14. No templo (ίερω). No recinto do templo, não no santuário (ναός). Vide nota
sobre Mt 9.5; Mc 11.16.

Os que vendiam (τους πωλοΰντας). O artigo define-os como uma categoria


bem conhecida.

Cambiadores (κερματιστάς). Somente aqui no texto do Novo Testamento.


O substantivo relacionado κέρμα, dinheiro, que ocorre somente no versícu­
lo 15, é proveniente de κείρω, cortar em pedaços, e, por isso, tem o sentido
de moeda pequena-, “troco miúdo” de que os cambiadores precisariam ter um
grande suprimento. Assim, o sentido estrito de cambiadores é fornecedor de
troco miúdo. Mateus e Marcos usam κολλυβιστής (vide v. 15), cujo sentido
é substancialmente o mesmo, uma vez que considera o fazer negócio com
moeda pequena, mas com a diferença de que κόλλυβος, o substantivo de que
o termo é derivado, e com o sentido de uma moeda pequena, também é usado
para denotar a categoria do troco. Assim, essa última palavra fornece um
67
J oão - C a p . 2

indício do preço elevado nessa troca, e que a palavra usada por João aqui não
transmite. Os cambiadores abriam suas barracas nas cidades do interior um
mês antes da festa. Na época da chegada da primeira leva de peregrinos para
a Páscoa em Jerusalém, as barracas no interior eram fechadas, e os cambia­
dores assentavam-se no templo (vide nota sobre M t 17.24; 21.12; Mc 11.15).
O retrato desse incidente fornecido por João é mais vivido e detalhado que
os dos Sinópticos, que apenas declaram sumariamente a expulsão dos comer­
ciantes e a derrubada das mesas. Compare com M t 21.12-13; Mc 11.15-17;
Lc 19.45-4637.

15. Um azorrague (φραγέλλιον). Somente aqui no texto do Novo Testamento.


Só João registra esse detalhe.

De cordéis (εκ σ χ ο ιν ιώ ν ). A palavra é diminutivo de σ χοΐνο ς, junco, e daí


uma corda dejuncos trançados. Portanto, a a r c é estritamente literal: cordéis (cor­
das finas e flexíveis). Na kjv, pequenas cordas. Heródoto diz que quando Creso
cercou Éfeso, os efésios ofereceram sua cidade a Diana, esticando uma corda
fina (σ χο ινίο ν) do muro da cidade até o templo da deusa, uma distância de 708
metros88. A schoenus era uma medida de distância egípcia marcada por uma
corda de junco. Vide Heródoto, ii.6. Alguns acham que essa é a etimologia de
meada.

Lançou [...^ fora (έξέβαλβν). Literalmente, com na nvi, expulsou. Vide nota
sobre M t 10.34; 12.35; Mc 1.12; T g 2.25.

Todos. Refere-se aos animais. A ntlh faz referência a toda aquela gente, a nvi
traduz corretamente: “Expulsou todos do templo, bem como as ovelhas e os
bois”.
Dinheiro. Vide nota sobre o versículo 14.

Mesas. Na arc, derribou as mesas-, na teb , derrubou suas mesas. Vide nota sobre
Lc 19.23.

16. Casa de meu Pai. Vide nota sobre negócio de meu Pai, Lc 2.49, e compare com
Mt 23.38, passagem em que Jesus fala do templo como sua casa. O povo transfor­
mara a casa de Deus na casa deles.

37. Não levanto a questão sobre se a narrativa de João e a dos Sinópticos se referem ao mesmo
evento.
38. Heródoto, i, 26.

68
J oão - C ap . 2

Casa de vendas (εμπορίου). Somente aqui no texto do Novo Testamento. Os


Sinópticos dizem covil de ladrões (Mt e Mc), covil de salteadores (Lc).

17. Está escrito (γεγραμμένον έστίν). Literalmente, permanece escrito. Essa for­
ma da frase, o particípio com o verbo substantivo, é peculiar de João no lugar da
mais comum γεγραπχαι. Para uma construção similar, vide 3.21.

O zelo da tua casa. Zelo para a honra da casa de Deus. Zelo, ζήλος, de ζέω,
entrar em ebulição. Vide nota sobre T g 3.14.

Me devorará (καχεφαγε με). Como na lxx , SI 68 ( kjv, 69.9). Mas os melhores


textos trazem καχαφάγεχαι, consumir. Como na ara e n v i : “o zelo pela tua casa
me consumirá”.

18. Responderam. Com frequência, usado para réplica de uma objeção ou crí­
tica, ou para algo presente na mente do outro, como em 19.7 ou 3.3, onde Jesus
responde com referência ao erro que Nicodemos tem em sua mente, em vez de
com réplica direta ao seu discurso.

19. Derribai este templo (λύσαχε xòv ναόν χοΰχον). Destruir, literalmente, li­
vrar, na wycliffe , desfazer. Vide nota sobre Mc 13.2; Lc 9.12; At 5.38. Observe
que a palavra para templo é ναόν, santuário (vide nota sobre v. 14). Esse templo
aponta o templo real, que é verdadeiramente um templo só como o é a moradia
de Deus, daí santuário, mas com uma referência típica à própria pessoa de Jesus
como o lugar santo de habitação de Deus, que “estava em Cristo”. Compare com
lCo 3.16-17. Por essa razão, a morte de Cristo foi a derrubada do templo; e sua
ressurreição, a reconstrução dele. O imperativo emfazeres é da natureza de desa­
fio. Compare com "enchei vós”, Mt 23.32.

20. Em quarenta e seis anos, foi edificado este templo (χεσσαράκονχα καί έξ
έχεσιν ώκοδομήθη ò ναός ούτος). Literalmente, em quarenta e seis anos este templo
fo i construído. Falavam do templo como se estivesse concluído, embora ele só
tenha sido concluído 36 anos depois.

Tu. A posição do pronome grego torna-o enfático.

21. Ele (εκείνος). Vide nota sobre 1.18. O pronome é enfático e marca o contraste
entre o sentido mais profundo de Jesus e o literalismo dos judeus e de seus discípu­
los {vide o versículo seguinte). Para outras ilustrações de João apontando o sentido
das palavras de Jesus que não foram entendidas de início, vide 7.39; 12.33; 21.19.
69
João - Cap. 2
22. Ressuscitou (ήγερθη). Na ntlh , mais corretamente, fo i ressuscitado. O mesmo
verbo dos versículos 19 e 20.

Dissera (ελεγεν). Na rv, mais corretamente, ele disse. Os melhores textos omi­
tem lhes.

Creram na Escritura (έπίστευσαν ττ| γραφή). Observe que έπίστευσαν, creram,


é usado aqui com o dativo simples, e não com a preposição είς, em (vide nota sobre
1.12). Assim, o sentido é: eles creram que a Escritura era verdadeira. Acerca de
γραφή, passagem ou seção da Escritura, vide nota sobre Mc 12.10.
Em João, como em outras passagens, a palavra quase sempre se refere a uma
passagem em particular citada no contexto. As únicas duas exceções são 17.12
e 20.9. Para se referir ao Antigo Testamento como um todo, João sempre usa o
plural αί γραφαί. Provavelmente, a passagem mencionada aqui é SI 16.10. Com­
pare com At 2.27,31; 13.35.

Na palavra. O dito que acaba de ser pronunciado concernente à destruição


do templo.

23. Pela Páscoa. Note a omissão de dosjudeus (v. 13).

Durante a festa (εν τη εορτή). Na n v i , nafesta. A Festa dos Pães Asmos, du­
rante os sete dias seguintes ao da verdadeira Páscoa (vide nota sobre Mc 14. l).

Creram no (έπίστευσαν εις). A expressão mais forte de fé (1.12).

Seu nome. Vide nota sobre 1.12. Compare a expressão creram no seu nome
com creram nele (8.30), que é a expressão mais forte indicando o ato de lançar-se
a si mesmo sobre ele; enquanto crer no nome é mais apropriadamente crer nele
como aquele que afirma ser, nesse caso, o Messias. Isso é crer em reconhecimen­
to, em vez de em apropriação. Segundo Meyer: “A fé deles em seu nome (como o
de Messias) ainda não equivale a alguma decisão de sua vida interior por Jesus,
era apenas uma opinião, produzida pela visão de seus milagres, de que Ele era
o Messias”.

Vendo (θεωροϋντες). Na rv, literal e corretamente, contemplando, na teb , à vista


dos (vide nota sobre 1.14,29).

Fazia (έιτοίει). Melhor, estavafazendo-, o imperfeito denota as obras maravilho­


sas como em progresso.
70
João - Cap. 2
24. Mas £...]] Jesus (αυτός δε ò Ίησοΰς). Ο αύτος, que não aparece na tradução,
tem a força da expressão de sua parte, marcando o contraste com aqueles recém-
mencionados.

Não confiava (ούκ επίστευεν). Na ara , não se confiava-, na teb , não sefiava. Há
um tipo de jogo de palavras com entre esse termo e επίστευσαν, creram, no versí­
culo precedente. A ara reproduz isso: “O próprio Jesus não se confiava a eles”. Ele
não confiava sua pessoa a eles. Na tyndale , não se punha nas mãos deles. Conforme
Godet: “Ele não tinha fé na fé deles”.

Porque £../] conhecia (διά το αυτόν γινώσκειν). Literalmente, p o r conta


João descreve o conhecimento do Senhor com duas
do fa to de seu conhecimento.
palavras, que é importante distinguir. Γινώσκειν, como aqui, sugere adqui­
r ir conhecimento; conhecimento esse que é resultado de discernimento e que
pode ser aumentado. Esse conhecimento pode ser extraído de fatos externos
(5.6; 6.15) ou de empatia espiritual (10.14,27; 17.25). Ειδεναι (1.26) sugere co­
nhecimento absoluto-, o conhecimento da intuição e da convicção satisfeita. Por
isso, o termo é usado para o conhecimento de Cristo das coisas divinas (3.11;
5.32; 7.29), dos fatos de seu próprio ser (6.6; 8.14; 13.1) e de fatos externos
(6.61,64; 13.11). Em 21.17, as duas palavras aparecem juntas. Pedro diz a Jesus,
apelando para seu conhecimento absoluto·. “Sim, Senhor; tu sabes (ou percebes,
γινώσκεις) que te amo”.

25. Não necessitava (ού χρείαν είχεν). Literalmente, ele não tinha necessidade.

Testificasse (μαρτυρήση). Na n v i , melhor, desse testemunho. A mesma palavra


está em 1.7-8,15,32 (vid e nota sobre 1.7).

Do homem (περί του ανθρώπου). Melhor, como na n v i , a respeito do homem.

Ele [[...] sabia (αυτός έγινωσκεν). O pronome é expresso e visa à ênfase, como
na arc: “Ele mesmo sabia”. O imperfeito expressa continuação: Ele estava ciente
o tempo todo conforme os casos sucessivos se apresentavam; ligando-se, assim,
com as palavras seguintes: “O que havia no homem”, ou seja, em cada homem em
particular com quem Ele estava relacionado. Nenhuma característica desse tipo
era atribuída aos deuses do paganismo. Gladstone afirma:

Assim, emborao domdealgo como apresciência geral pareça sermantidapara todas


as deidades da invenção, o dom‘de alguémcapaz de discernir os pensamentos e in-
tentos do coração’ não éencontrado emnenhumlugar; nemse acreditava que algum
71
JoAo - Cap. 3

membrodacomunidadedoOlimpotivesseessedom, comoeraditodealguémqueera
maior que eles, ‘Ele conhecia todos os homensenãoprecisavaqueninguémtestificas­
sedo homem, pois sabiao que estava no homem39.

C apítulo 3

1. Um homem. Com referência à última palavra do capítulo precedente. A en­


trevista com Nicodemos, à parte da importante verdade que ela incorpora, é uma
ilustração do conhecimento de Cristo do que estava no homem. Godet, de forma
correta, observa que João, por meio da palavra άνθρωπος (homem), lembra-nos
que Nicodemos era um espécime da raça que Jesus conhecia tão bem.

Chamado Nicodemos. Literalmente, Nicodemos, este era o nome dele. O nome


quer dizer conquistador do povo (νίκη, vitória, e δήμος, povo), embora alguns lhe
deem uma derivação hebraica com o sentido de sangue inocente.

Príncipe. Membro do Sinédrio.

2. Com Jesus. Os melhores textos substituem por προς αύτόν, para ele.

De noite. Embora de forma tímida, temendo comprometer sua dignidade e,


possivelmente, sua segurança. O fato é observado mais uma vez, em 19.39 (vide
nota sobre 7.50). De noite, “quando a superstição judaica manteria os homens em
casa”. Ele conseguiu chegar à moradia de Jesus sem ser observado pelos outros
habitantes da casa, pois uma escada externa levava ao andar de cima.

Rabi. O mestre de Israel (v. 10) dirige-se a Jesus pelo título usado por seus
próprios discípulos a ele mesmo —meu mestre (vide nota sobre 1.38). Milligan e
Moulton dizem “Temos certeza de que um membro da seita que examinou cui­
dadosamente as credenciais de João Batista (1.19-24) não se dirigiría claramente
a Jesus por meio desse título de honra nem o reconhecería como mestre”.

Sabemos (οΐδαμεν). Convicção garantida baseada nos milagres feitos por Je­
sus (vide nota sobre 2.24).

És mestre. De acordo com a ordem grega, que tu vens de Deus como mestre.

De Deus. Essas palavras aparecem em primeiro lugar na sentença, e isso para


enfatizar. É de Deus que você veio.

39. Gladstone, Homer and the Homeric Age, ii, 366.

72
João —Cap. 3
3. Respondeu e disse. Vide nota sobre 2.18.

Na verdade, na verdade. Vide nota sobre 1.51.

Nascer de novo (yevvr|Gf| ãvcoGev). Vide nota sobre Lc 1.3. Literalmente, de alto
(Mt 27.51). Os expositores dividem-se quanto à tradução de άνωθ€ν, alguns tradu­
zem por do alto, e outros, por outra vez ou de novo. A palavra é usada nos seguintes
sentidos no texto do Novo Testamento, em que há treze ocorrências dela:
1. Do alto: Mt 27.51; Mc 15.38; Jo 19.23; Tg 1.17; 3.15,17.
2. De cima: Jo 3.31; 19.11.
3. Desde o princípio: Lc 1.3; At 26.5.
4. De novo: G1 4.9; mas acompanhada de πάλιν, de novo, novamente.
Em favor da tradução do alto, argumenta-se que ela corresponde ao método
habitual de João descrever a obra de regeneração espiritual como um nascimento
de Deus{\.\3-, lJo 3.9; 4.7; 5.1,4,8); e mais, que é Paulo, e não João, quem descreve
isso como um novo nascimento.
Em favor da outra tradução, outra vez, pode-se dizer: (1) que do alto não des­
creve o fato, mas a natureza do novo nascimento, o que na ordem lógica seria
afirmado depois do fato, mas que é anunciado antes se traduzirmos por do alto. Se
traduzirmos por outra vez ou de novo, a ordem lógica é preservada, a natureza do
nascimento é descrita no versículo 5; (2) que Nicodemos entendeu claramente a
palavra com o sentido de outra vez, uma vez que, no versículo 4, ele traduziu-a
por tornar, (3) que parece estranho que Nicodemos tenha se surpreendido com a
ideia de um nascimento do céu.
O Cônego Westcott chama a atenção para a forma tradicional do dito na qual
a palavra άναγ^ννάσθαι, que só pode ter o sentido de renascer, é usada como sua
equivalente. Contudo, outra vez não transmite a exata força da palavra, que é
mais propriamente como na arc, de novo ou outra vez. Assim, a tradução deve ser
como a da arc : aquele que não nascer de novo. A frase ocorre somente no Evange­
lho de João.

Ver (Lôelv). As coisas do reino de Deus não estão aparentes para a visão nor­
mal. É necessário um novo poder de visão, o qual está ligado apenas ao novo
homem. Compare com lCo 2.14.

Reino de Deus. Vide nota sobre Lc 6.20.

4. Sendo velho (γέρων ών). Literalmente, sendo um homem velho.

Pode (μή δύναται). A partícula interrogativa antecipa a resposta negativa.


Com certeza, ele não pode.
73
JoAo - Cap. 3
Tomar a entrar. Nicodemos olha o assunto apenas do aspecto físico. Sua ex­
pressão tornar a entrar não é a mesma coisa que o de novo de Jesus. Conforme
Godet comenta: “Ele não entende a diferença entre um segundo começo e um
começo diferente .

5. Nascer da água e do Espírito. A exposição dessa passagem muito contro­


vertida não cabe no escopo desta obra. Podemos observar alguns aspectos. (1)
Que, aqui, Jesus estabelece as condições preliminares para a entrada em seu rei­
no, expandindo e explicando sua declaração do versículo 3. (2) Que, aqui, essa
condição é afirmada como complexa, incluindo dois fatores distintos, água e o
Espírito. (3) Que o primeiro desses dois fatores não deve ser unido ao segundo;
que o elemento espiritual não é para ser excluído nem obliterado pelo elemento
externo e ritual-, e que não devemos entender como Calvino, o Espírito Santo
como a água purificadora no sentido espiritual: “água que é o Espírito”. (4) Que
a água, definitivamente, aponta para o ritual do batismo e faz isso com dupla
referência - ao passado e ao futuro. Naturalmente, a água sugeriu a Nicodemos
o batismo de João, que, na época, estava despertando profundo e generalizado
interesse; e, com isso, a purificação simbólica dos judeus e o uso do Antigo Tes­
tamento de lavar como a imagem de purificação do pecado (SI 51.2,7; Ez 36.25;
Zc 13.1). As palavras de Jesus abriram, para Nicodemos, uma relevância nova
e mais espiritual nas purificações cerimoniais e no batismo de João Batista, o
qual fora rejeitado pelos fariseus (Lc 7.30). O ritual de João Batista tinha uma
nova e legítima relação com o reino de Deus que Nicodemos deve aceitar. (5)
Que, embora Jesus tenha declarado a obrigação do ritual exterior, Ele também
declarou, como complemento necessário deste, a presença e a energia criadora
e informadora do Espírito com o qual, conforme João prometera, aquele que
viría batizaria seu povo. Que como o batismo de João Batista era para arrepen­
dimento, para a remissão do pecado, também a nova vida deve incluir a purificação
verdadeira não menos que a simbólica da vida antiga e pecaminosa, e a infusão,
por meio do Espírito, de um novo e divino princípio de vida. Assim, as palavras
de Jesus incluíam uma referência profética ao ideal completo do batismo cris­
tão - “pela lavagem da regeneração e da renovação do Espírito Santo” (Tt 3.5;
Ef 5.26); de acordo com a qual os dois fatores estão inseparavelmente fundidos
(um não é engolido pelo outro), e a nova vida é inaugurada tanto de forma
simbólica no batismo com água quanto de verdade na renovação por meio do
Espírito Santo, ainda que o ritual, por meio de sua associação com a energia do
Espírito, não passa de mero símbolo: é um verdadeiro veículo de graça para o
destinatário e tem uma parte substancial na inauguração da nova vida. O batis­
mo considerado apenas como um ritual e à parte da operação do Espírito não
pode conceder, e não concede, nova vida. Sem o Espírito, ele é uma mentira. Ele
74
João - Cap. 3
é um sinal verdadeiro apenas como o sinal de uma graça interior e espiritual.
(6) Que o ideal da nova vida apresentada nas palavras de nosso Senhor inclui a
relação do homem regenerado com uma organização. E declarado que o objeto
do novo nascimento é que o homem possa ver e entrar no reino de Deus. Mas o
reino de Deus é uma economia. Ele inclui e implica a comunidade cristã orga­
nizada. Esse é um dos fatos que, com sua obrigação associada, é revelado na
nova visão do novo homem. Ele não vê apenas a Deus, mas também o reino de
Deus; Deus como Rei de uma cidadania organizada; Deus como Pai da família
da humanidade; a obrigação com Deus implica a obrigação com o próximo; a
obrigação com Cristo implica a obrigação com a igreja, da qual Ele é o cabeça,
“que é o seu corpo, a plenitude daquele que cumpre tudo em todos” (Ef 1.23).
Só por meio da água, do mero ritual exterior do batismo, o homem entra em
comunhão exterior com a igreja visível sem ver nem entrar no reino de Deus.
Por meio da água e do Espírito, ele entra, de fato, na comunhão exterior, mas,
por meio dela, entra na visão e na comunhão do reino de Deus.

Entrar. Isso é mais que ver (v. 3). É tornar-se participante, entrar e tomar
posse, como os israelitas fizeram em Canaã.

6. O que é nascido (τό γ^γειη'ημέτ'Οΐ'). O sentido estrito é o qual nasceu e, por


conseguinte, agora, está diante de nós como nascido. O tempo aoristo (w. 3-5,7)
marca o fato do nascimento; o tempo perfeito (como aqui), a condição do que é
nascido (vide nota sobre 1Jo 5.18, em que ocorre os dois tempos); o neutro, o que,
afirma o princípio na abstração. Compare com o versículo 8, em que a declaração
é pessoal: todo aquele que é nascido. Compare com lJo 5.4 e 5.1,18.

Da carne (4κ τής σαρκός). Vide nota sobre o versículo 14. João usa a palavra
σάρξ, em geral, para expressar a humanidade sob a condição desta vida (1.14; 1Jo
4.2-3,7; 2Jo 7), às vezes, com um indício mais definido da natureza pecaminosa
e falível da humanidade (lJo 2.16; Jo 8.15). Usa duas vezes em contraposição a
πνεύμα, Espírito (3.6; 6.63).

Do Espírito (έκ του πνεύματος). O Espírito Santo de Deus ou oprincípio de vida


que Ele concede. A diferença é sutil, pois as duas idéias deixam implicíto uma à ou­
tra; mas talvez a última seja melhor aqui porque é um pouco mais abstrata e, por
isso, contrasta com a carne. Espírito e carne são princípios distintos, o primeiro
é do céu, e o outro é da economia terrena.

7. T e —necessário vos. Observe a mudança do pronome singular para o plural.


O Senhor, em seu tratamento para Nicodemos (te), falava também para aqueles
75
JoÂo - Cap. 3
que Nicodemos representava e que este incluiu quando disse: “Sabemos” (v. 2).
Seu engano era o engano da sua classe.

8. O vento (τό πνεύμα). Alguns defendem a tradução por espírito, como a t e b ,


o espírito sopra onde quer. No hebraico, as palavras espírito e vento são idênti­
cas. Πνεύμα deriva de πνέω, soprar ou assoprar, o verbo usado nesse versículo
(assoprar) e em todas as outras passagens do Novo Testamento que fazem
referência ao assoprar o vento (Mt 7.25,27; Lc 12.55; Jo 6.18). Com frequên­
cia, ele ocorre nos clássicos no sentido de vento. Por isso, Aristófanes disse τό
πνεΰμ’ ελαττον γίγνεται, ο vento está morrendo“ , também no texto do Novo
Testamento, Hb 1.7, passagem para a qual a tradução apropriada é: “Aquele
que faz de seus anjos ventos”, citação de SI 103.4 ( l x x ). Na l x x , lReis 18.45;
19.11; 2Reis 3.17; Jó 1.19. No texto do Novo Testamento, no sentido de so­
pro, 2Ts 2.8; Ap 11.11. A tradução usual, vento, é confirmada aqui pelo uso
do verbo relacionado πνεΐ, sopra, e de φωνήν, voz, som. Tholuck acha que a
imagem pode ter sido sugerida a Jesus pelo som do vento noturno varrendo
as ruas estreitas.

Onde quer (οπού θελει). Acerca do verbo θέλω, querer ou determinar, vide nota
sobre Mt 1.19. Na k j v , equivale a listeth, antiga palavra inglesa para agradar ou
desejar, derivada da anglo-saxônica lust, com o sentido de prazer. Chaucer usa as
formas arcaicas leste, lust e list para as idéias de prazer ou desejo:

Forte estavaovinho ebomparabebermosprazerosos*'.


Ame se desejas**.

Ela andavapara cima epara baixo como o serviçal cobiça ( sem pre qu e lh e agrada)**.

Um miserável acometidopelo medo, nãopela força, comoAníbal,


Repelenossas tropas econquista comoela deseja44.

Por isso, o apático (inglês listless) é destituído de desejo. A declaração de Jesus


não pretende ser cientificamente precisa, mas, antes, está na categoria poética,
parente da conhecida expressão “livre como o vento”. Compare com lCo 12.11; e
para a descrição mais prosaica sobre o curso do vento, vide Ec 1.6.

40. Aristófanes, O s Cavaleiros, 4 4 1 .


41. Chaucer, C anterbury Tales , p. 752.
42. Ibid., p. 1185.
43. Ibid., p. 1054.
4 4 . Shakespeare, H en ry VI, parte I, i, v, 22.

76
João - Cap. 3
Voz (φωνήν). Na n t l h , barulho. Usa a proclamação articulada e a não articulada,
como nas palavras vindas do céu no batismo de Jesus e na transfiguração (Mt 3.17;
2Pe 1.17-18); de trombeta (Mt 24.31; lCo 14.8) e coisas inanimadas em geral (lCo
14.17). João Batista chama a si mesmo de φωνή, a voz, e a palavra é usada para ven­
to, como aqui, em At 2.6. De trovão, com frequência, em Apocalipse (6.1; 14.2 etc.).

Não sabes donde vem (ούκ ονδας). Essa é a melhor tradução, e a nvi esco­
lheu uma tradução não tão precisa, mas [você] não pode dizer. Em Memorabilia,
Sócrates diz:

Os instrumentos das deidades você também achará imperceptíveis, pois o raio, por
exemplo, emborasejaevidentequeéenviadodo altoequeseguesuavontadeemtudo
comque entra emcontato, ainda assimnunca é visto nemse aproximando, atacando
ourecuando; os ventos tambémsãoeles mesmos invisíveis, emboraoefeito deles seja
evidentepara nós epercebamos o curso deles45.

Compare com Ec 11.5.

Assim. Assim o sujeito da influência invisível do Espírito dá evidência visível


de seu poder.

9. Isso. Como o novo nascimento.

Ser (ycvéoQai). Literalmente, venha a acontecer.

10. Respondeu e disse. Vide nota sobre 2.18.

T u és mestre de Israel (συ ei ò διδάσκαλος του ’Ισραήλ). Ο σύ, tu, é enfático.


Um mestre é mais corretamente traduzido pela rv, o professor. Na cnbb, o mestre.
O artigo não é irônico, apenas marca a relação oficial de Nicodemos com o povo
e acrescenta força ao contraste nas palavras seguintes. De forma similar, Platão
disse: “Tu (σύ, enfático), ó mestre da verdadeira virtude, pretendes fingir que és
justificado nisso?”46. Acerca de “Israel”, vide nota sobre 1.47. Há quatro ocorrên­
cias da palavra no Evangelho de João; aqui, 1.31,47,49.

Não sabes (ού γινώσκπς). Vide nota sobre 2.24. Nicodemos não é reprovado
por carecer de conhecimento prévio, mas por carecer de percepção ou de entendi-

45. Xenofonte, Memorabilia, iv, 3, 14.


46. Platão, Críton, 51.

77
J oão - C ap. 3

mento quando essas verdades são expostas para ele. A tradução da n v i é melhor,
não entende.

11. Nós dizemos—sabemos—vimos. Após o uso do singular nos versículos 3,5,7,12,


o plural aqui é digno de nota. Ele não é apenas retórico - “um plural de majestade”
- mas é explicado pelo versículo 8: ‘Todo aquele que é nascido do Espírito”. O novo
nascimento transmite uma nova percepção. O homem que nasce do Espírito tem
vida eterna (v. 36); e a vida eterna é conhecer a Deus e a Jesus Cristo a quem Ele en­
viou (17.3). Έ vós tendes a unção do Santo e sabeis (οιδατβ) tudo”47(lJo 2.20). Aquele
que é nascido da água e do Espírito vê o reino de Deus. Por conseguinte, esse nós
inclui, com Jesus, todos que são verdadeiramente nascidos de novo no Espírito. Jesus
satisfaz o sabemosde Nicodemos (v. 2), referindo-se à classe à qual ele pertencia, e com
outro sabemos, referindo-se a outra classe, da qual Ele era o cabeça e representante.
Sabemos (oiôapev) absolutamente. Vide nota sobre 2.24.

Testificamos (μαρτυρούμε). Na rv, melhor, prestamos testemunho de·, na t eb ,


testemunhamos. Vide nota sobre 1.7.

12. Falei (eluov). Traduzindo o aoristo de forma mais estrita, falei.

Coisas terrestres (τα 4ττίγεα). Composto de 4irí, sobre, e γή, terra. Em Cl 3.2,
o adjetivo aparece em sua forma analisada, τα 4πί τής γης, coisas da terra. E nesse
sentido literal que deve ser entendido aqui; e não coisas de natureza terrena, mas
coisas cujo lugar apropriado é na terra. Não assuntos mundanos, nem coisas pecamino­
sas, mas, ao contrário, Westcott diz que:

os fatos e fenômenos da vida mais elevada como uma classe de coisas que tem seu
assento e manifestação na terra; que pertence emsua realização a nossa existência
atual; que sãovistas emsuas consequências, como as questões donascimento; que são
sensíveis emseus efeitos, como aação do vento; que são umprincípio e umaprofecia,
não umcumprimento.

Assim as coisas terrestres incluem o fenômeno do novo nascimento.

[Coisas^] celestiais (τα 4πουράνια). Composto de4ní, sobre ou no, e ουρανός, céu.
Não coisas santas quando comparadas com as pecaminosas, nem coisas espirituais
quando comparadas com as temporais; mas coisas que estão no céu, os mistérios da
redenção, tendo seu assento na vontade divina, as que foram realizadas no mundo

47. Ou, deacordocomalgumas altas autoridades: "Vocês todos sabem”.


78
J oão - Cap. 3

por intermédio da obra e morte de Jesus Cristo e da fé da humanidade (5.14-16).


Por isso, o versículo 13 diz que o Filho do Homem que está no céu desceu de lá e,
nos versículos 31-32, que Ele que saiu do céu para testemunhar (na terra) do que
viu e ouviu; e que Ele, sendo enviado de Deus, fala as palavras de Deus (v. 34).
Argumenta-se contra a autenticidade do quarto Evangelho, pois a linguagem
elevada e mística que, nele, é atribuída a Jesus é inconsistente com os relatos
sinópticos das palavras proferidas por Ele. Argumenta-se que se o Evangelho de
João representa fielmente o estilo de fala de Jesus, os outros devem deturpá-lo.
As palavras de Godet sobre esse ponto são dignas de citação:

Seria verdadeiramente curioso se o primeiro a apontar esse contraste fosse o pró­


prio evangelista cuja narrativa foi apresentada como fundamento da objeção. O au­
tor do quarto Evangelho põe essas palavras (3.12) na boca de Jesus. Ele declara lá
que Ele desceu do céu para trazer essa mensagem divina para o mundo. Por conse­
guinte, o autor do quarto Evangelho estava claramente consciente das duas formas
de ensinamento adotadas por Jesus; a primeira, a usual, em que Ele explicava as
coisas terrenas, evidentemente, sempre na relação delas com Deus e seu reino; a
outra —que contrastava de muitas formas com a primeira, e a qual Jesus empre­
gava só excepcionalmente —em que Ele falava diretamente, e como testemunha,
de Deus e das coisas de Deus, naturalmente, sempre em conexão com o destino da
humanidade. As instruções do primeiro tipo têm um caráter mais simples, mais prá­
tico e mais variado. Elas referem-se às diferentes situações da vida; era a exposição
das verdadeiras relações morais dos homens uns com os outros e dos homens com
Deus. £...] Mas, dessa forma, Jesus não podia alcançar o objetivo final que buscava,
a plena revelação do mistério divino, do plano de salvação. Jesus, desde seu batismo,
tinha o céu constantemente aberto diante dele; o decreto da salvação fora desvelado
para Ele; Jesus, em particular, tinha ouvido estas palavras: ‘Este é o meu Filho ama­
do’; Ele repousava no peito do Pai e podia descer e descer de novo sem cessar nas
profundezas do amor insondável do Pai, amor esse do qual Ele sentia o poder vivi-
ficador; e quando, em determinados momentos excepcionais, Ele veio a falar desse
relacionamento divino e dar expansão à plenitude de vida com que essa relação o
supria, sua linguagem assumia um tom peculiar, solene, místico e, poder-se-ia dizer,
até mesmo celestial; porque, nessas ocasiões, Ele revelava coisas celestiais. Bem, esse
é exatamente o caráter de sua linguagem no quarto Evangelho.

Compare com Lc 10.18ss., passagem em que as palavras de Jesus assumem um


caráter semelhante aos de seus pronunciamentos no Evangelho de João.

13. Ora (καί). Observe a partícula conectiva sim ples, com nada que indique a
sequência lógica do pensamento.
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JoAo - C ap. 3
Desceu. Equivale a tem estado no. Jesus diz que ninguém esteve no céu a não
ser o Filho do Homem que desceu do céu, porque nenhum homem podería ir ao
céu sem ter ascendido a ele.

Que está no céu. Muitas autoridades omitem.

14. Importa (ôeX). Importa representa a eterna necessidade dos conselhos divi­
nos. Compare com Lc 24.26,46; Mt 26.54; Mc 8.31; Jo 12.34.

Levantado (υψωθηναι). A seguir, estão os usos da palavra no texto do Novo Testa­


mento: a exaltação do orgulhoso (Mt 11.23; Lc 10.15; 14.11). A elevação dos humildes (Lc
1.52; Tg 4.10; lPe 5.6). A exaltação de Cristo em glória (At 2.33; 5.31). O levantamento na
cruz (Jo 3.14; 8.28; 12.32,34). A referência aqui é à crucificação, mas além dela, à glori-
ficação de Cristo. E característico de João misturar as duas idéias da paixão e da glória
de Cristo (8.28; 12.32). Assim, quando Judas saiu para trair Jesus, este disse: ‘Agora, é
glorificado o Filho do Homem” (13.31). Por essa razão, o cristão subjuga o mundo pela
fé naquele que veio não só pela água, mas pela água e pelo sangue ( lJo 5.4-6).

15. Nele crê (πισκυων elç αυτόν). Os melhores textos trazem a expressão èv αύτω,
construída com vida eterna e traduzida por tenha nele a vida eterna. Como a t e b .

Não pereça, mas. Os melhores textos omitem.

Tenha a vida eterna. Frase característica de João para viver para sempre. Vide
versículos 16,36; 5.24; 6.40,47,54; lJo 3.15; 5.12.
A entrevista com Nicodemos acaba no versículo 15, e as palavras seguintes são
de João. Isso fica evidente a partir dos seguintes fatos: (l) no versículo 16, o tempo
passado de amou e deu ajusta-se melhor do ponto de vista posterior a partir do qual
João escreve, depois da morte vicária de Cristo como um fato histórico realizado,
em vez de a partir da tendência do presente discurso de Jesus antes da plena re­
velação dessa obra. (2) Na maneira de João acrescentar comentários explanatórios
seus mesmos (1.16-18; 12.37-41) e de fazer isso de forma abrupta. Vide 1.15-16,
e a respeito do e, 1.16. (3) O versículo 19 segue a mesma linha de pensamento de
1.9-11, no prólogo; e o tom daquele versículo é histórico, carregando o sentido de
rejeição passada, como: amaram as trevas; eram más. (4) A expressão nele o r não é
usada em outras passagens por nosso Senhor, mas por João (1.12; 2.23; lJo 5.13).
(5) A expressão Filho unigênito não é usada em outras passagens por Jesus mesmo,
mas, em todos as ocorrências, pelo próprio evangelista (1.14,18; lJo 4.9). (6) A ex­
pressão pratica a verdade (v. 21) ocorre de novo somente em lJo 1.648.

48. Todavia, essapercepçãoé objetadapor Meyer, Lange, De Wette, AlfordeGodet.


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J oão —Cap. 3

16. O mundo (κόσμον). Vide n o ta sobre 1.9.

Deu. Em vez de enviou, enfatizando a ideia de sacrifício.

Filho unigênito. Vide nota sobre 1.14.

Tenha. Vide nota sobre o versículo 15.


Essa atitude de Deus em relação ao mundo está em sugestivo contraste com a
atitude em que os deuses do paganismo são representados.
Por isso, Hera (Juno) diz a Hefesto (Vulcano):

Hefesto ilustre, bastai Não parece


cabível maltratar de tal modo umdos deuses
imortais, por amor de ummerohomemmortal*9.

E Apoio, a Posêidon (Netuno):

Não dirás, Posêidon,


queeu, doente da cabeça, brigaria contigo
por vis mortais, que feito folhas viçampor
umtempo, florescendo, nutridos defrutos,
mas, vida breve, logo perecem, exânimes.
Portanto, abstenhamo-nos decombater,
o mais rapidamente. Que sozinhos lutem!50

O homem não tem garantia de perdão nem mesmo quando ele oferece sacri­
fícios com os quais os deuses se deleitam de forma especial. “Por conseguinte, o
pecado do homem e a punição divina são certezas; o perdão é incerto e depende
do capricho arbitrário dos deuses. A vida humana é uma vida sem a certeza da
graça”51. O Sr. Gladstone observa: “Jamais se descobrirá que alguma deidade
homérica fez sacrifício pessoal em favor de um cliente humano”52.

17. Enviou (άπέστειλεν). Vide n o ta sobre 1.6. Enviar, em vez de dar{v. 16), p o r­
que aqui a ideia de sacrifício funde-se nesse com issionam ento autoritativo.

Seu Filho. Os melhores textos trazem τον, o, para αύτοϋ, seu.

49. Homero, Ilíada, xxi, 379-380.


50. Ibid., xxi, 461, 467.
51. Nágelsbach, Homerische Theologie.
52. Gladstone, Homer and the Homeric Age, ii, 372.

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J oão - C a p . 3

Condenasse (κρίνη). A tradução da a r a é melhor,julgasse. Condenaré κατακρίνω,


termo não usado por João (Mt 20.18; Mc 10.33 etc.). O sentido original do verbo
κρίνω, é separar. Como Homero, sobre Deméter (Ceres) apartar “o grão da palha”53.
D aí distinguir, escolher, ser de opinião, julgar. Vide nota sobre hipócritas, Mt 23.13.

Mundo. A repetição tripla da palavra transmite certa solenidade. Compare


com 1.10; 15.19.

18. Já e s t á condenado (ήδη κέκριται). Na ara , mais corretamente, já estájul­


gado. A descrença, ao separar de Cristo, sugere julgamento. Ele foi julgado em
virtude de sua descrença.

19. Esta. Ou seja, nisto consiste o julgamento. É característico de João prefaciar


uma declaração com é esta e, depois, definir a declaração por δ τ ι o u 'iv a , que. Vide
1 5 .1 2 ; 17.3; lJo 1.5; 5 .1 1 ,1 4 ; 3 j o 6.

Luz (το φως). A arc usa co rretam en te a luz. Vide 1.4,9.

Homens (οί άνθρωποι). Literalmente, os homens. Visto como uma categoria.

Trevas (το σκότος). Vide nota sobre 1.5. A arc traz corretamente as trevas.
João emprega essa palavra somente aqui e em lJo 1.6. Seu termo usual é σκοτία
(1 .5 ; 8 .1 2 ; lJo 1.5 etc.), mais comumente descrevendo uma condição de trevas, que
trevas em contraposição com luz.

Eram (ήν). Habitualmente. O tempo imperfeito marca continuação.

Más (πονηρά). Ativamente más. Vide nota sobre Mc 7.22; Lc 3.19.

20. Faz (πράσσων). O particípio presente, indicando hábito e tendência geral.

Mal (φαύλα). Na rv, maldade. O versículo anterior trazia uma palavra distinta
dessa. Originalmente, leve, irrisório, trivial e, por conseguinte, sem valor. Portan­
to, o mal considerado sob o aspecto de inutilidade. Vide nota sobre T g 3.16.

Para que as suas obras não sejam reprovadas (ίνα μη έλεγχθη τα epya
αυτού). Mais provavelmente, afim de que suas obras não sejam reprovadas. O termo
έλέγχω, traduzido por reprovadas, tem várias fases de sentido. No grego clássico

S3. Homero, Ilia d a , v, 501.


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João - C a p . 3

primitivo, a palavra tinha o sentido de desgraça ou envergonhar. Por isso, Ulisses,


obtendo sucesso no teste do arco, diz a Telêmaco: “Telêmaco, não te envergo­
nha o estrangeiro sentado em teu solar”54. Depois, o sentido de investigação, ou
questionamento, com o propósito de convencer, condenar ou refutar, de censurar, acusar.
Conforme Heródoto: “Em sua réplica, Alexandre ficou confuso e divergiu da
verdade, depois do que os escravos vetaram, refutaram suas declarações (ήλεγχον,
questionaram e o pegaram em falsidade) e contaram toda a história do crime”55.
O mensageiro, em Antigone, de Sófocles, ao descrever a consternação do vigia ao
encontrar o corpo sepultado de Polinice, diz: “Palavras más espalharam-se entre
eles, guarda acusando (ελέγχων) guarda”56. Sentido de argumento, provar, trazer à
prova-, provar por meio de raciocínio encadeado. E a palavra ocorre em Píndaro com
o sentido genérico de conquistar ou sobrepujar. “Entrando na corrida nua, eles
sobrepujaram (ήλεγξαν) o grupo grego em velocidade”57.
No texto do Novo Testamento, a palavra é encontrada com o sentido de re­
provar (Lc 3.19; lTm 5.20 etc.). De convencer de crime ou falta (lCo 14.24; Tg
2.9). De trazer à luz ou expor por meio de condenação ou convicção (Ef 5.11,13;
Jo 8.46; vide nota sobre essa passagem). Bem como para expor os falsos mestres
e refutá-los (Tt 1.9,13; 2.15). De testar e expor com vistas a corrigir e, por isso,
quase equivalente a repreender (Hb 12.5). Os diferentes sentidos unem-se na pa­
lavra condenar. O teste expõe e demonstra o erro, refuta-o, assim, convence, condena
e repreende o objeto dele. Essa condenação resulta em repreensão, por meio de que
0 erro é corrigido; e o sujeito errado, purificado. Se a condenação for rejeitada,
ela carrega consigo condenação e punição. Assim, o homem é convencido do
pecado, da justiça e do juízo (Jo 16.8). Nessa passagem, o perpetrador do mal é
representado evitando a luz que testa, essa luz que é fruto do amor (Ap 3.19), e
a consequente exposição de seu erro. Compare com Ef 5.13; Jo 1.9-11. Essa ideia
de amar as trevas, em vez da luz, é tratada vividamente em Jó 24 e aparece ao
longo dos versículos 13-17.

21. Pratica a verdade (ποιων την αλήθειαν). A frase ocorre apenas aqui e em
1Jo 1.6. Observe a frase contraposta, fa z o mal (v. 20). Lá o plural é usado: fa z o
mal, mal é representado pelo número de obras ruins. Aqui o singular, a verdade
ou verdade, verdade é considerada única e “inclui em uma unidade suprema todas
as obras boas e corretas”. Também se deve observar nesses dois versículos as pa­
lavras distintas usadas para fazer, fa z o mal (πράσσων); pratica a verdade (ποιων).

54. Homero, Odisséia, traduçãoDonaldoShüler, Porto Alegre, L&PM Pocket, 2007, xxi, 424.
55. Heródoto, i, 115.
56. Sófocles, A ntigone, 260.
57. Píndaro, P ítica s, xi, 75.

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J oão - Cap. 3
O último verbo contempla o objeto e ofim da ação; o primeiro, o meio, com a ideia
de continuidade e repetição. Πράσσων é a prática, enquanto ποιων pode ser ofa ­
zer de uma vez por todas. Assim, ποιεϊν ειρήνην é firmar paz-, πράσσειν ειρήνην é
negociar paz. Como Demóstenes diz: “Ele fará (πράξει) essas coisas e as concluirá
(ποιήσει)”. No texto do Novo Testamento, a tendência observável é o uso de
ποιεΐν no bom sentido e de πράσσειν no mal sentido. Compare com a palavra
semelhante, πράξις, ação ou trabalho, da qual há seis ocorrências, e quatro dessas
seis ocorrências referem-se às obras más (Mt 16.27; Lc 23.51; At 19.18; Rm
8.13; 12.14; Cl 3.9). Compare essa passagem especialmente com o versículo 29,
no qual, como aqui, os dois verbos são usados com os dois substantivos. Tam­
bém Rm 7.15,19. Bengel diz: “O mal não tem descanso; ele é mais ocupado que a
verdade”. Os textos de Rm 1.32 e 2.3 usam os dois verbos para fazer o mal, mas
ainda com uma distinção em que πράσσω é o termo mais abrangente, designando
a busca do mal como o objetivo da atividade.

Vem para. Em contraste com aborrece (v. 20). Seu amor pela luz é demonstrado
por sua busca por ela.

Em Deus. O elemento de ação santa. Observe o tempo perfeito, têm sidofeitas


(como na tb ) e permanecem.

22. A terra da Judeia (την Ίουδαίαν γην). Literalmente, a terra judeia. A frase
ocorre somente aqui no texto do Novo Testamento.

Estava (διέτριβεν). O sentido original do verbo é prosseguir com dificuldade,


daí desgastar-se, consumir-se; e assim usado em referência ao gasto ou passagem
de tempo.

Batizava (εβάπτιζεν). O tempo imperfeito concorda com a ideia de tardar. Ele


continuou batizando durante sua estadia.

23. Batizava (ήν βαπτίζων). O verbo substantivado com o particípio também


indicando ato contínuo ou habitual: estava ocupado em batizar.

Em Enom, junto a Salim. A situação é matéria de conjectura. Provavelmen­


te, a palavra Enom é parecida com a hebraica ‘ayin um olho, uma nascente. Vide
nota sobre Tg 3.11.

M uitas águas (υδατα πολλά). Literalmente. Provavelmente, referindo-se à


quantidade de tanques ou nascentes.
84
J oão - Cap. 3
Ali - eram batizados. Imperfeitos. Eles continuavam a vir.

24. Prisão (την φυλακήν). Vide nota sobre At 5.18,21.

25. Então (ούν). Não uma partícula de tempo, mas de consequência; por isso,
porque Jesus e João batizavam.

Questão (ζήτησις). Na nvi, mais corretamente, discussão. Questão seria ζήτημα


sempre no sentido de debate. A palavra aqui representa o processo de inquirir.

Entre (έκ). Na c n b b , corretamente, da parte dos. Literalmente, procedente de. A


tradução da k j v não mostra com que grupo a discussão teve origem. O grego
mostra distintamente que a discussão foi levantada pelos discípulos do Batista.

Um judeu. Os melhores textos trazem ’Ιουδαίου, com um judeu. Possivelmen­


te, um que afirmou que, agora, o batismo de João podia ser dispensado.

Purificação. Provavelmente, não a respeito da cerimônia de purificação


conhecida, mas como se o batismo de Jesus ou de João tivesse maior poder
purificador.

26. Ei-lo (ϊδε). Usado por Mateus e Marcos, não por Lucas, mas com muita fre­
quência por João.

Batizando - vão ter. O presente seria mais bem traduzido por está batizando,
estão vindo.

27. Receber. Condizendo com dada.

For dada (ή δεδομενον). Na r v , mais corretamente, tem sido dado.

Do céu. Literalmente, a partir do céu (εκ).

29. A esposa. Figura de linguagem comum nas profecias do Antigo Testamen­


to concernente à relação entre Jeová e seu povo (Ez 16; Os 2.19; Ml 2.11). Vide
também nota sobre Mt 1.21, concernente a Oseias.

Amigo do esposo. Ou padrinho do noivo. O termo é apropriado para a


Judeia; o padrinho não era uma figura costumeira na Galileia. Vide Mt 9.15,
passagem que usa a expressão filhos das bodas. (Vide nota sobre Mc 2.19.) Na
85
João —Cap. 3
Judeia, havia dois padrinhos, um para o noivo e outro para a noiva. Antes do
casamento, eles atuavam como intermediários entre o casal; no casamento,
eles ofereciam presentes, serviam a noiva e o noivo e os escoltavam até o
quarto nupcial. Era obrigação do amigo do noivo apresentá-lo a sua noiva,
depois do casamento, de manter os termos apropriados entre as partes e, so­
bretudo, de defender a boa reputação da noiva. Os escritos rabínicos falam de
Moisés como o amigo do noivo que leva a noiva para se encontrar com Jeová
no Sinai (Êx 19.17); e descreve Miguel e Gabriel agindo como os amigos do
noivo para nossos primeiros pais, quando o Altíssimo mesmo pegou o cálice
de bênçãos e disse as bênçãos. João Batista apresenta-se como estando na
mesma relação para Jesus.

Alegra-se muito (χαρά χαίρει). Literalmente, regozija-se com alegria. Uma


expressão hebraica. Vide nota sobre Lc 22.15, e compare com At 23.14; Tg 5.17.
Somente aqui nos escritos de João.

Essa minha alegria (αϋτη ή χαρά ή έμή). Uma expressão muito enfática: essa,
a alegria que é minha. A mudança de estilo nos versículos seguintes parece indicar
que as palavras do Batista cessaram nesse ponto e são retomadas e comentadas
pelo evangelista.

31. Aquele que vem (ό Ερχόμενος). O particípio presente. A vinda vista ainda em
processo de manifestação. Compare com 6.33.

De cima (άνωθεν). Videnota sobre 3.2.

Sobre (επάνω). Supremo.

Da terra (εκ τής γης). Literalmente, a partir da terra; de origem terrena.

É da terra. A mesma expressão da terra é repetida com o sentido de natureza


terrena. Acerca da expressão característica είναι εκ, ser de, vide nota sobre 1.46.

Fala da terra. A partir da terra. Suas palavras têm origem terrena. Acerca de
λαλζϊ,/αΐα, vide nota sobre Mt 28.18.

32. Aceita (λαμβάνει). João usa apenas uma vez δέχομαι para aceitar, a respeito
dos galileus aceitarem a Cristo (4.45). A distinção entre os dois não é preservada
de forma contundente, mas δέχομαι, em geral, acrescenta a ideia de pegar, de
saudar. Por isso, Demóstenes diz que os anciãos de Tebas não receberam as boas-
86
J oão - Cap. 3
vindas (Ιδεζαντο), ou seja, não receberam com prazer o dinheiro que lhes foi
oferecido nem o pegaram (ελαβον). Λαμβάνει também inclui a retenção do que é
pego. Daí receber a Cristo (1.12; 5.43; 13.20). A expressão aceita o seu testemunho
é peculiar a João (v. 11; 5.34; lJo 5.9).

33. Confirmou (εσφράγισεν). Na k j v , colocou seu selo. Colocar tem o sentido de


afixar. Assim, colocar um selo significa atestar um documento. A expressão foi
mantida a partir da versão de c o v e r d a l e (1535). Daí: “Eles devem colocar suas
mãos, e colocarão suas mãos”. Compare também com a antiga fórmula legal:
“Para testemunho do que coloquei minha alma”. Na r v , melhor, colocou sobre
isto seu selo. O sentido aqui é: atestou solenemente e confirmou a declaração de que
"Deus é verdadeiro”. Somente aqui a palavra é usada com esse sentido. Em
outras passagens, com o sentido de cerrar fileiras por segurança; esconder;
marcar uma pessoa ou coisa. Vide nota sobre Ap 22.10. O tempo aoristo aqui
denota um ato realizado.

34. As palavras (τα ρήματα). Não palavras nem palavras individuais, mas as pala­
vras - a mensagem completa de Deus. Vide nota sobre Lc 1.37.

Dá Deus. Os melhores textos omitem Deus. Na n v i , ele dá. A n v i também,


corretamente, omite lhe. O objeto pessoal do verbo dark indefinido. Traduza: ele
não dá o Espírito por medida (cp. t b ).
A fim de transmitir toda a força dos termos dar e por medida é necessário
tentar uma explicação do escopo e do sentido gerais dessa dificílima e muito
discutida passagem. O ponto de partida da exposição deve ser o versículo 30, a
nobre sujeição do Batista a sua posição e declaração para Jesus: É necessário que
ele cresça e que eu diminua. Nesse ponto, o evangelista, conforme observamos,
assume o discurso. A declaração do Batista de que é necessário que Jesus cresça
- de que Ele é mensageiro de um caráter mais elevado do ponto de vista trans­
cendental e com uma mensagem muito maior que a dele mesmo —fornece um
texto ao evangelista. Ele mostrará por que Jesus deve crescer. Ele deve crescer
porque vem de cima e,por isso, é supremo sobre todos (v. 31). Ele repete essa de­
claração, definindo de cima (άνωθεν) por do céu (εκ τοΰ ούρανοϋ) e enfatizando
isso contrapondo com o mero testemunho terreno (ò έκ τής γης) cujas palavras
carregam a marca de sua origem terrena (εκ τής γής λαλεΐ). Sendo do céu, Ele
testifica das coisas celestiais como testemunha ocular e auricular. “Aquilo que
ele viu e ouviu, isso testifica.” E verdade, de fato, que os homens rejeitam esse
testemunho. “Ninguém aceita o seu testemunho” (v. 32). Não obstante Ele é
digno de crédito implícito como testemunho de Deus mesmo. Ele que recebeu
esse testemunho o atestou solenemente como testemunho de Deus mesmo;
87
João - Cap. 3
“esse confirmou que Deus é verdadeiro”. Declarar que o testemunho de Jesus
é uma inverdade é o mesmo que declarar que Deus é uma inverdade (v. 33).
Pois Ele que foi enviado por Deus anuncia toda a mensagem divina (as palavras
de Deus, v. 34).
Até aqui, o raciocínio é dirigido para a conclusão de que Jesus deve crescer e
que sua mensagem deve ser recebida. Ele é o mensageiro do céu de Deus mesmo
e fala as próprias palavras de Deus.
A explicação comum da oração subsequente é que Deus confere o Espírito
sobre Jesus em sua plenitude, e não “por medida”.
Mas isso é repetir o que já está mais que implícito. Parece supérfluo dizer que
Deus concede o Espírito sem medida sobre aquele que veio do céu, que é supre­
mo sobre todas as coisas, que testemunha das coisas celestiais que viu e ouviu e
que revela toda a mensagem de Deus para os homens.
Assim, pegue a cadeia de pensamento desde a primeira oração do versí­
culo 34 e siga-a até a outra linha. O mensageiro de Deus fala as palavras de
Deus e, por isso, mostra-se digno de confiança e demonstra isso ainda mais
ao conceder o dom do Espírito sem medida para seus discípulos. “Não lhe dá Deus
o Espírito por medida.” Essa interpretação acrescenta um novo elo à cadeia
de pensamento, um novo motivo de por que Jesus deve crescer e seu testemu­
nho ser recebido; a saber, o motivo de que não só Ele mesmo foi divinamente
dotado com o Espírito, mas que Ele prova isso ao conceder o Espírito sem
medida.
Assim, o versículo 35 segue a sequência natural. Esse poder dispensador
que atesta suas afirmações é dele por meio do dom do amor divino do Pai. “O
Pai ama o Filho e todas as coisas entregou nas suas mãos.” Essa última frase, nas
suas mãos, não quer dizer só posse, mas também o poder de dispor. Vide Mc 9.31;
14.41; Lc 23.46; Hb 10.31. Deus entregou ao Filho todas as coisas para Ele ad­
ministrar de acordo com sua vontade e governo. Essas duas idéias da recepção
de Cristo e da concessão dos dons divinos são combinados em Mt 11.27: “Todas
as coisas me foram entregues por meu Pai-, e ninguém conhece o Filho, senão o
Pai; e ninguém conhece o Pai, senão o Filho e aquele a quem o Filho o quiser
(βούληται) revelar”.
Por isso, João Batista deve diminuir, e Jesus deve crescer. A medida do
Espírito foi concedida a João Batista em dose suficiente para sua obra prepa­
ratória, mas o próprio João Batista viu o Espírito descer em forma corpórea
sobre o Filho de Deus e ouviu a voz vinda do céu dizendo: “Este é o meu
Filho amado, em quem me comprazo”. Assim, o Espírito é de Cristo mesmo.
Ele concede-o, confia-o (δίδωσιν), em sua plenitude. Por isso, mais adiante,
Jesus diz o seguinte a respeito do Espírito da verdade: “Ele me glorificará,
porque há de receber do que ê meu e vo-lo há de anunciar. Tudo quanto o Pai
88
J oão —Cap. 4
tem é meu; por isso, vos disse que há de receber do que é meu e vo-lo há de
anunciar” (Jo 16.14-15).

86. Aquele que não crê (ό άπβ-θών). Na t e b , se recusa a crer. A forma mais
correta é a da ntlh , desobedece. A descrença é vista em sua manifestação ativa,
a desobediência. O verbo πείθω quer dizer persuadir, provocar crença, induzir a
fazer algo para persuadir, e, assim, atinge o sentido de obedecer, apropriadamente
como resultado de persuasão. Vide nota sobre At 5.29. Compare com lPe 4.17;
Rm 2.8; 11.30-31. Contudo, obediência inclui fé. Compare com Rm 1.5, obedi­
ência da fé.

Não verá (ούκ δψετοα). Compare o tempo futuro com o presente “tem a vida
eterna”, e o termo simples, vida, com o pleno desenvolvimento da ideia de vida
eterna. Aquele que crê está no círculo da vida de Deus, eterna em essência. Sua
vida “está escondida com Cristo em Deus”. A vida eterna é conhecer o único e
verdadeiro Deus e Jesus Cristo, que Ele enviou. Por isso, essa vida eterna não é
apenas futura, é uma posse atual. Ele a tem. O descrente e desobediente, em vez de
ter vida eterna, não tem vida, nem mesmo a vê(cp. vero Reino de Deus, 3.3). Ele
não tem percepção da vida considerada e muito menos da vida eterna, o desenvol­
vimento pleno e complexo da vida.

A ira de Deus (όργή του Θεού). Tanto οργή quanto θυμός são usados no
texto do Novo Testamento para ira ou raiva e sem nenhuma distinção comu-
mente observada. O termo όργή denota um sentimento mais profundo e mais
permanente, um hábito de mente estabelecido; enquanto θυμός é uma agitação
mais turbulenta, mas temporária. As duas palavras são usadas na expressão ira
de Deus, o que, em geral, denota uma manifestação distinta do julgamento de
Deus (Rm 1.18. 3.5; 9.22; 12.19). Όργή (não θυμός) também aparece na expres­
são a irafutura e suas variantes (Mt 3.7; Lc 3.7; lTs 2.16 etc.). Compare com
ira do Cordeiro (Ap 6.16).

Permanece (μενει). O tempo presente. Enquanto o crente tem vida, a ira perma­
nece sobre o descrente. Ele vive continuamente em uma economia alienada de Deus
e que, em si mesma, é habitualmente objeto do desprazer e indignação de Deus.

C apítulo 4

1. E. Volta à passagem 3.22 e à controvérsia que surge a respeito dos dois batismos.

O Senhor. Vide nota sobre Mt 21.3


89
J oão - C ap. 4

Saber (€γνω) ou perceber. Vide nota sobre 2.24.

Fariseus. João nunca se refere aos saduceus pelo nome. Os fariseus represen­
tavam a oposição a Jesus, a mais poderosa e perigosa das seitas judaicas.

Fazia e batizava. Aqui, os dois verbos estão no presente. O narrador põe-se


na cena da história: estáfazendo e batizando.

2. Ainda que (καίτοιγί). Literalmente, e contudo. O relato do batismo de Jesus


levado ao Batista pelos seus discípulos está correto.

Batizava. O tempo imperfeito: não era seu costume batizar.

3. Deixou (άφήκ€). O sentido literal do verbo é remover, dispensar. Ele é usado


para perdoar as dívidas (Mt 6.12; Tg 5.15); entregar (Mt 27.50); deixar em paz
(Mt 19.14); permitir ou consentir (Lc 6.12). Vide nota sobre essas passagens.
O emprego dele aqui é peculiar. Compare com 16.28, a saída de Cristo do
mundo.

Outra vez. Vide 1.44.

4. Era £...]] necessário. Por esse ser o caminho natural de Jerusalém para a Ga-
lileia. Possivelmente, com a sugestão da necessidade de proceder da vontade do
Pai. João não apresenta isso como uma missão empreendida pelos samaritanos.
Jesus observava a lei que impunha a seus discípulos (Mt 10.5).

5. Pois (οΰν). Não uma partícula de tempo, mas a ligação lógica. Por essa razão,
indo por esse caminho, Ele deve precisar etc.

Cidade. Não sugerindo um lugar de grande tamanho ou importância. Com­


pare com 11.54; Mt 2.23.

Sicar. Comumente identificada com Siquém, a moderna Nablus, vista


como uma corruptela de Sequém. Todavia, algumas autoridades modernas
argumentam que um lugar tão famoso como Siquém não devia ser men­
cionado sob outro nome e identificam o lugar com Askar, cerca de três
quilômetros a leste de Nablus. O nome Sicar quer dizer cidade de bêbados ou
cidade dormitório.

Herdade (χωρίου). Diminutivo de χώρα, uma região.


90
J oão - Cap. 4
6. Fonte (πηγή). Sentido estrito da palavra; a n v i traz poço. A palavra para
cisterna ou poço é φρέαρ, usada por João nos versículos 11 e 12. Em outras pas­
sagens do Novo Testamento, sempre é usada para poço. Vide Lc 14.5; At 9.1-2.
Não há menção ao poço de Jacó no Antigo Testamento. O poço tradicional
ainda sobrevive.

Na entrada do vale de Siquémsão visíveis duas pequenas clareiras no meio de uma


vasta planície de plantação de milho - uma capela mulçumana pintada de branco; a
outra, alguns fragmentos de pedra. A primeira, segundo se alega, cobre o suposto
túmulo deJosé, £...] e, asegunda, marca olugar inconteste do poço, agora, largado e
atravancadocomas ruínas quecaíramdentrodele; mas aindacomtodas as especifica­
ções parareivindicar o título depoço original58.

O Dr. Thomson diz:

Nãovi nadaparecidocompoço- nadaalémdeummuromodernobaixomuitoquebra­


do e, aparentemente, nunca commais de três metros de altura. A área demarcada por
eletem42,6passos deleste aoestee 49,5 passos de norte asul. A superfícieé coberta
por umamassaconfusadeentulho, semformae comexcesso de matoe urtiga. £...] O
poço fica próximo da extremidade sudeste da área e, para alcançar sua boca, a pessoa
temdeseabaixar, comalgumrisco, cercadetrêsmetrosemumaabóbodamuitobaixa59.

O Dr. Thomson também comenta sobre a grande discrepância nas medidas do


poço tiradas por diferentes turistas por causa do acúmulo de pedras e escombros
das ruínas do prédios que antes o cobriam. “Tudo confirma a fala da mulher sa-
maritana de que ‘o poço é fundo’.” Em 1697, Maundrell marcou a profundidade
de 32 metros, com 4,5 metros de água. Em 1838, o Sr. Calhoun constatou quase
a mesma profundidade de água. Em 1841, o Dr. Wilson mediu a profundidade
do poço, apenas 22,8 metros, medida confirmada pela mensuração posterior do
capitão Anderson, em 1866, e do tenente Conder, em 1875.

Cansado (κ6Κοπιακώς). Vide nota sobre Lc 5.5.

Pois. Exatamente como Ele estava ou, como alguns explicam, estando, pois,
cansado do caminho.

Assentou-se. O tempo imperfeito: estava sentado, quando a mulher veio.

58. Stanley, S in a i a n d Palestine.


5 9 . Thomson, T he L a n d a n d the Book.

91
J oão - C ap. 4

Hora sexta. De acordo com a contagem judaica, meio-dia. De acordo com o


método romano, entre 15 e 16 horas. Vide nota sobre 1.39. A hora comum para
tirar água era à tarde.

7. Uma mulher. Considerada como alguém que não merecia muito estima pelos
mestres populares; uma samaritana, por conseguinte, desprezada pelos judeus;
pobre, pois, nos tempos mais antigos, tirar água do poço não era algo realizado
pelas mulheres de posição social (Gn 24.15; 29.9).

De Samaria. Literalmente, de dentro de Samaria (έκ). Não da cidade de Sama­


ria, que ficava a cerca de 9,6 quilômetros de distância, mas do país. Samaritana
por raça e religião.

Tirar. Vide nota sobre 2.8.

9. A mulher samaritana (ή γυνή ή Σαμαρεΐτις). Uma maneira diferente de


expressar a mesma ideia da expressão do versículo precedente. Literalmente, a
mulher a samaritana. Aqui é enfatizado o caráter distintivo da mulher, conforme
indicado pela raça.

Disse (αιτείς). Vide nota sobre M t 15.23.

Não se comunicam (ού συγχρώνται). Não tem relação familiar nem de ami­
zade. Que eles tinham algum tipo de comunicação é demonstrado pelo fato de os
discípulos irem à cidade para comprar provisão. Algumas autoridades omitem
porque osjudeus não se comunicam com os samaritanos. Os judeus tratavam os sama-
ritanos com todo tipo de desdém e os acusavam de falsidade, tolice e descrença.
Os samaritanos tinham vendido os judeus como escravos quando os tiveram em
seu poder e acendido sinais espúrios para que os fachos de fogo brilhassem e
servissem para anunciar o início dos meses, além de eles assaltarem e matarem
os peregrinos na estrada para Jerusalém.

10. Se tu conheceras etc. Respondendo, antes, a algo latente na pergunta do que


a própria pergunta, como na primeira resposta de Jesus a Nicodemos.

O dom (δωρεάν). A palavra só aparece aqui nos Evangelhos, embora Lucas


a use quatro vezes em Atos dos Apóstolos e haja uma ocorrência de um ad­
vérbio parecido, δωρεάν, livremente, em Mateus. A palavra carrega o sentido de
dom abundante, gratuito, honrável. Compare com δώρημα, dom, e vide nota sobre
Tg 1.17.
92
J oão - Cap. 4
Pedirías (ήτησας). Jesus usa a mesma palavra para pedir que a mulher usara
para se referir ao fato de ele lhe pedir água, a palavra expressa o pedido de um
inferior para um superior. Aqui, ela é a palavra apropriada.

Água viva (ϋδωρ ζών). Fresca, perene. Imagem familiar para os judeus. Vide
Jr 2.13; 17.13; Zc 14.8. Não é necessariamente a mesma coisa que água da vida
(ύδωρ ζωής; Ap 21.6; 22.1,17).

11. Com que a tirar (αντλημα). Esse substantivo grego quer dizer o que ê tirado,
o ato de tirar e a coisa com que se tira. Aqui, o balde —de pele e com três varetas
cruzadas na boca para mantê-lo aberto - é baixado por meio de uma corda feita
de pêlo de cabra. Não deve ser confundido com o cântaro (υδρία) do versículo 28.
A palavra é encontrada somente aqui no texto do Novo Testamento.

Poço (φρέαρ). Vide nota sobre o versículo 6. Talvez o poço fosse alimentado
por nascente (πήγα!) viva.

A água viva (το ϋδωρ τό ζώΐ'). Literalmente, a água a viva.

12. És tu maior (μή συ μείζωυ). A partícula de interrogação indica que é espe­


rada uma resposta negativa: com certeza, tu não és. Ο συ, tu, no início da sentença
é enfático e, possivelmente, com uma leve nuança de desprezo.

Jacó, o nosso pai. Os samaritanos reivindicavam descendência de José, como


representante das tribos de Efraim e Manassés.

Filhos (υίο'ι). Tradução correta; contra a kjv, crianças.

Gado (θρέμματα). Somente aqui no texto do Novo Testamento. De (τρέφω)


nutrir. O termo geral para tudo que é alimentado ou nutrido. Quando usada para
animais - em sua maioria mansos - gado, ovelha etc. A palavra é aplicada para fi­
lhos, aves, insetos e peixes, como também para escravos domésticos que, de acor­
do com alguns, é o sentido aqui; mas, como Meyer declara legitimamente: “Não
havia necessidade especial de mencionar os servos; a menção ao gado completa o
retrato do progenitor nômade desse povo”.

13. Qualquer que beber (πας ò πίυων). Literalmente, todo o que bebe. Como na tb .

14. Aquele que beber (δς δ ’ αυ πίτ)). A nvi trad u z as duas e x p r e ssõ e s da
m esm a m an eira, m as há um a d iferen ça n o s p ro n o m es indicada, em bora m u ito

93
JoAo - Cap. 4
vagamente, pelo qualquer que e aquele que, além de uma diferença mais evi­
dente no verbo beber. No primeiro caso, o artigo com o particípio indica algo
habitual·, todos que bebem continuamente, como os homens, em geral, fazem
de acordo com sua sede. No versículo 14, o tempo aoristo definitivo expres­
sa um ato único —algo feito uma vez por todas. Literalmente, ele que pode ter
bebido.

Nunca terá sede (ού μή διψήσει c-ίς τον αιώνα). A dupla negação, ού μή,
é uma declaração muito forte equivalente a de maneira alguma ou de modo ne­
nhum. Contudo, não deve ser entendido que a recepção da vida divina pelo
cristão acabe com todo desejo futuro. Ao contrário, ela gera novos desejos. O
ato de beber da água viva é apresentado como um ato único a fim de indicar o
princípio divino de vida como contendo só em si mesmo a satisfação de todo san­
to desejo conforme eles surgem sucessivamente; em contraposição às fontes
humanas, que logo se exaurem e levam o indivíduo a procurar outras fontes. O
desejo santo, independentemente de quão grande ou variado ele seja, sempre
busca e encontra sua satisfação em Cristo, e só em Cristo. A sede deve ser en­
tendida no mesmo sentido nas duas frases, referindo-se ao desejo natural que
o mundo não pode satisfazer e que, por isso, está sempre vivo. Drusius, crítico
flamengo citado por Trench, diz: “Quem bebe a água da sabedoria tem desejo,
e não tem sede. Ele tem desejo, ou seja, ele deseja cada vez mais o que bebe. Ele
não tem sede porque está tão repleto que não deseja outra bebida”60. O forte
contraste dessa declaração de nosso Senhor com o sentimento pagão é ilustra­
do pela seguinte passagem de Platão:

Sócrates·. Deixe-me pedir-lhe para considerar até que ponto você aceitaria isso como
uma explicação das duas vidas, a moderada e a imoderada: existem dois homens, am­
bos tinham uma quantidade de barris; um dos homens tem seus barris seguros e
cheios, um cheio de vinho, outro de mel, um terceiro de leite, além de outros cheios
com outros líquidos, e as fontes que os enchem são poucas e reduzidas, e o homem só
as consegue com uma boa dose de labuta e dificuldade; mas quando seus barris são
enchidos uma vez, ele não precisa enchê-los mais e não tem mais problema com eles
nem tem de se preocupar mais com eles. O outro homem também consegue fontes,
embora não sem dificuldade, mas seus barris estão furados e não são seguros, e ele é
obrigado a enchê-los dia e noite sem parar, e ele, se parar um pouco, agoniza de dor.
Essa é a respectiva vida deles; e, agora, você diria que a vida do imoderado é mais feliz
que a do moderado? Não o convencí de que o contrário é verdade?
Cálicles. Você não me convenceu, Sócrates, pois o primeiro homem que se completou
não tem mais nenhum prazer; e essa vida, como acabo de dizer, é a de uma pedra; ele

60. Trench, S tu d ies in the Gospels.


94
J oão —C ap. 4

não tem alegria nem tristeza depois de estar repleto de uma vez por todas; mas a vida
de prazer está no derramamento da fonte.
Sócrates·. E se a fonte estiver sempre jorrando não deve haver um riacho sempre cor­
rendo e buracos grandes o bastante para acolher a descarga?
Cálicles. Com certeza que sim.
Sócrates. Então, a vida de que você fala agora não é a de um homem morto nem de uma
pedra, mas de um glutão; você quer dizer que ele tem de estar com fome e comendo?
Cálicles Sim, é isso mesmo que quero dizer.
Sócrates E ele tem de estar com sede e bebendo?
Cálicles Sim, é isso que quero dizer, ele tem de ter todos seus desejos em relação a si
mesmo e poder viver alegremente na gratificação deles01.

Compare com Ap 7.16-17.

Fará (γερήσεται). Na n v i , melhor, tornará, expressando o rico desenvolvimen­


to contínuo e energia renovada do princípio divino de vida.

Nele. Suprimento que tem sua principal fonte no próprio ser do homem, e não
em algo exterior a ele.

Uma fonte (πηγή). A rv mantém poço, onde fonte é mais correto.

A jo rrar (άλλομένου). Saltando·, concordando, assim, com tornará.

O filósofo imperial de Roma proferiu uma grande verdade, mas imperfeita; viu muito, mas
não viu tudo; não viu que essa fonte de água deve ser alimentada, e alimentada ainda mais
pelas ‘fontes superiores’ se for para realmente não falhar no presente, ao escrever: O lhe no
interior; no interior está a fonte do bem e sempre pode jorrar se sempre estiver cavando’62.

Para a vida eterna. Cristo no cristão é vida. Essa vida sempre tende em dire­
ção a sua fonte divina e jorra na vida eterna.

15. Venha aqui (φχωμοα ένθάδί). Os melhores textos trazem a leitura διέρχωμαι,
com a preposição δ tá tendo a força de por meio da intervenção direta.

16. M arido (ctvôpcc). Vide n o ta sobre 1.30.

17. Bem (καλώς). Apropriadamente, corretamente. Compare com 8.48; Mt 15.7; Lc 20.39.

61. Platão, Górgias, 494.


62. Plutarco, Sobre Virtude e Vício.

95
JoAo - Cap. 4

19. Vejo (θεωρώ). Vide nota sobre 1.18. Não a percepção imediata, mas, antes,
percebo ao observá-lo mais longamente e com mais atenção.

20. Nossos pais. Provavelmente, referindo-se aos ancestrais dos samaritanos tão
antigos quanto a construção do templo no monte Gerizim na época de Neemias.
Esse templo foi destruído por João Hircano, em 129 a.C., mas o lugar permaneceu
santo e, até hoje, todos os anos, os samaritanos celebram lá sua festa de Páscoa. Ob­
serve a vivida descrição do Deão Stanley, que esteve presente nessa celebração63.

Neste monte. Gerizim, aos pés do qual está o poço. Aqui, de acordo com a tradi­
ção samaritana, Abraão sacrificou Isaque e encontrou-se com Melquisedeque. Por
alguma convulsão da natureza, a principal cadeia de montanhas correndo de norte
a sul tem uma fissura aberta em toda sua extensão, em sua base em ângulos exatos,
e uma profunda fissura que forma o vale de Nablus, quando ele aparece subindo a
planície de El Mukuwhna de Jerusalém. O vale fica, no mínimo, a 548 metros acima
do nível do mar, e as montanhas em cada lado do vale elevam-se até cerca de mais
305 metros de altura. O monte Ebal fica no norte; o Gerizim, no sul; e a cidade,
entre os dois. Perto da ponta oriental, o vale não tem mais que 301 metros de lar­
gura; e, suponho, que as tribos se reuniam lá para ouvir as “bênçãos e maldições”
lidas pelos levitas (Dt 27-28). O panorama visto do topo do Gerizim talvez seja o
mais extenso e impressionante de toda a Palestina. O pico é um pequeno platô. No
meio da extremidade sul fica uma rocha inclinada, que os samaritanos dizem ser
o lugar do altar do templo deles, e eles tiram os sapatos ao se aproximar dela. No
limite leste do platô, uma pequena cavidade na rocha é mostrada como o lugar em
que Abraão ofereceu Isaque. O monte Ebal fica a 938 metros acima do nível do mar
e é mais de setenta metros mais alto que o Gerizim64·.

Deve adorar (õeX). A samaritana apresenta a adoração como uma obrigação


divina. Esse é o único verdadeiro lugar santo. Compare com o versículo 24.

21. A hora vem (ερχεται ώρα). Mais propriamente, uma hora. Não tem artigo.
Está chegando, está até agora a caminho.

Adoreis (προσκυνήσετε). Vide nota sobre At 10.25. A palavra foi usada de for­
ma indefinida no versículo 20. Aqui é usada com o Pai, definindo, assim, a ver­
dadeira adoração.

6S. Stanley, T he J ew ish Church, v. 1, Apêndice III.


64. Nota condensada a partir de T h e L a n d a n d the Book·. Central Palestine and Phoenicia, do Dr.
Thomson. Encontramos, no mesmo volume, uma descrição interessante da escavação feita no
pico do monte Gerizim pelo Tenente Anderson, p. 126-128.

96
J oão —C ap. 4

O Pai. Esse uso absoluto do título o Pai é característico de João. Ele fala de
Deus como o Pai e meu Pai, a primeira forma é a mais comum. A respeito da dis­
tinção entre os dois, o Cônego Westcott observa: “Geralmente, pode-se dizer que
o primeiro título expressa a relação original de Deus com o ser e, sobretudo, com
a humanidade, em virtude da criação do homem à imagem divina; e o último tí­
tulo fala mais particularmente da relação do Pai com o Filho encarnado e, assim,
indiretamente com o homem em virtude da encarnação. O primeiro sugere os
pensamentos que nascem da avaliação da absoluta ligação moral do homem com
Deus; a última dos pensamentos que nascem do que nos é revelado por meio da
revelação, da ligação do Filho encarnado com Deus e com o homem”. Vide 6.45;
10.30; 20.21; 8.18-19; 14.6-10; 15.8. João nunca usa nosso Pai, usa só uma vez seu
Pai (20.17) e nunca Pai sem o artigo, exceto quando se dirige a Ele.

2 2 . O q u e não s a b e i s ( ò ούκ o t ô a x e ) . Literalmente, o que não conhecem. A a r a

traduz corretamente o que não conheceis. Compare com At 17.23, em que a leitura
correta é 8, que, em vez de ou, quem: “Esse, pois, que vós honrais não o conhecen­
do”. Essa adoração do desconhecido é comum à ignorância comum e à cultura
filosófica; para a mulher samaritana e para os filósofos atenienses. Compare com
7.28; 8.19,27. O neutro expressa o caráter irreal e impessoal da adoração sama­
ritana. Como os samaritanos só receberam o Pentateuco, eles ignoravam a reve­
lação posterior e mais abrangente de Deus, conforme contida especialmente nos
escritos dos profetas, e da esperança messiânica, conforme desenvolvida entre os
judeus. Eles só preservaram a noção abstrata de Deus.

Nós. Aqui, Jesus identifica-se com o povo judeu. A essência da verdadeira


adoração judaica é representada por Ele.

Adoramos o que sabemos (ιτροσκυνούμεν δ οΐδαμεν). Literalmente, e como


na nv i , nós adoramos o que conhecemos. Acerca desabemos, vide nota sobre 2.24. O
neutro o que é usado para o verdadeiro objeto de adoração como para o irreal ob­
jeto de adoração, talvez por causa da correspondência com a oração precedente
ou porque o objeto de adoração é concebido de forma abstrata, e não pessoal.
Compare com 14.9.

Salvação (ή σωτηρία). A palavra tem o artigo: a salvação prometida e a ser


revelada em Cristo.

Vem dos judeus. A a r c traduz corretamente: vem dos judeus (έκ). Por isso,
não pertence a, mas procede de. Vide Gn 12; Is 2.3; Mq 4.2. Até mesmo a idéia de
salvação do Antigo Testamento está presa a Cristo. Vide Rm 9.4-5. A salvação é
97
JoÂo —Cap. 4
dosjudeus até mesmo daqueles que a rejeitaram. Vide nota sobre 1.19. Acerca do
característico vem de, vide nota sobre 1.46. A passagem ilustra o hábito de João de
confirmar a autoridade divina da revelação do Antigo Testamento e de mostrar
seu cumprimento em Cristo.

23. E agora é. Isso não podería ser acrescentado no versículo 21, porque a ado­
ração local não fora ainda abolida, mas era verdade em relação à verdadeira ado­
ração do Pai por seus verdadeiros adoradores, pois Jesus já estava rodeado por
um pequeno bando deles, e logo seriam acrescentados mais ao grupo (vv. 39-42).
Bengel diz que as palavras e agora ê foram adicionadas para que a mulher não
pensasse que devia procurar moradia na Judeia.

Verdadeiros (αληθινοί). Real, genuíno. Vide nota sobre 1.9.

Adoradores (προσκυνηταί). Somente aqui no texto do Novo Testamento.

Em espírito e em verdade (èv πνευματι καί άληθ^ία). Espírito (nveOpa)


é a mais elevada, mais profunda, mais nobre parte da nossa humanidade, o
ponto de contato entre Deus e o homem (Rm 1.9); enquanto a alma (ψυχή) é
o princípio da individualidade, o assento das impressões pessoais, tendo um
lado em contato com o elemento material da humanidade e também com o
elemento espiritual e, assim, é um elemento mediador entre o espírito e o
corpo. A expressão em espírito e em verdade descreve as duas características
essenciais da verdadeira adoração·, em espírito como distinto de lugar, forma,
ou outras limitações sensuais (v. 21); em verdade como distinto de concepções
falsas resultantes do conhecimento imperfeito (v. 22). A verdadeira adoração
inclui um senso espiritual do objeto adorado e uma comunhão espiritual com
ele; a manifestação da consciência moral nos sentimentos, nos movimentos
da vontade, “disposições de elevação, exaltação” etc. Ela também inclui uma
concepção confiável do objeto. Em Jesus, o Pai é visto (14.9) e conhecido (Lc
10.22). Assim, adquire-se a verdadeira concepção. Ele é a verdade (14.6). Da
mesma forma, por intermédio dele, vamos ao Pai e comungamos espiritual­
mente com Ele. Nenhum homem vai ao Pai de outro jeito (14.6). Adorar em
verdade não é apenas adorar com sinceridade, mas com a adoração correspon­
dente à natureza do objeto de adoração.

Porque o Pai (καί γάρ ò πατήρ). A k j v falha ao traduzir καί, também, e a r v


põe o termo em nota de margem. Ele enfatiza o caráter conclusivo do motivo
designado: “porque o Pai também, de sua parte, procura” etc. Para um uso similar
de καί, vide nota sobre M t 8.9; também M t 26.73; At 19.40.
98
JoÂo - Cap. 4

Procura a tais que assim o adorem (τοιούτους (ητεΐ τούς προσκυνοϋντας


αύτόν). Construção um tanto peculiar. Literalmente, busca tal como aqueles que
o adoram, como seus adoradores. Tais, ou seja, os que adoram em espírito e em
verdade e, por isso, são verdadeiros (αληθινοί) adoradores do verdadeiro Deus
(άληθινόν 0 6 Ò V ; 17.3).

24. Deus é Espírito (πνεύμα ò Θεός). Na k j v , Deus é um Espírito. Espírito é a pala­


vra enfática: Espírito é Deus. A expressão descreve a natureza, não ά personalidade
de Deus. Compare com as expressões: Deus é luz-, Deus é amor (l So 1.5; 4.8).

25. Messias £...)] vem. A mulher usa o nome judaico, bem conhecido em Sama­
ria. Os samaritanos também esperavam o Messias, baseando sua esperança em
textos das Escrituras como Gn 3.15; 49.10; Nm 24.17; Dt 18.15. Eles procura-
vam-no para restaurar o reino de Israel e restabelecer a adoração no Gerizim,
onde eles supunham que o tabernáculo estava escondido. Eles chamavam-no de
hushab ou hathab, cujo sentido é o conversor ou, de acordo com alguns, o que retor­
nará. A noção samaritana do Messias era menos mundial e política que a judaica.

Que se chama o Cristo. Frase acrescentada pelo evangelista. Compare com 1.41.

Ele vier (εκείνος). Enfático, aponta para o Messias em contraposição com to­
dos os outros mestres.

Anunciará (άναγγελεί). Literalmente, proclamar ou anunciar. A preposição


misturada άνά, cujo sentido do radical é para cima, quer dizer do começo aofim, dos
pês à cabeça. O verbo é usado em 16.13, as revelações do Consolador.

26. Eu o sou (είμι). Literalmente, eu sou. A concepção samaritana menos


política do Messias possibilitou que Jesus se anunciasse para a mulher sa­
maritana sem temer ser mal interpretado como o era pelos judeus. Compare
com Mt 8.4; 16.20.
Esse incidente fornece uma notável ilustração do amor do nosso Senhor pela
alma humana e da sua habilidade, tato e firmeza ao lidar com degradação mo­
ral e intolerância ignorante. Ele tranquiliza a mulher ao lhe pedir um favor. A
hesitação dela nasce menos do preconceito de raça que da surpresa de um judeu
lhe pedir algo para beber (cp. história de Zaqueu). Jesus lança mão de um objeto
próximo e conhecido como a tônica de sua grande lição. Ele não a inunda com
novo conhecimento, mas estimula o questionamento e o pensamento. Ele trata o
pecado dela de forma franca, mas não dura. Ele se satisfaz em deixá-la saber que
Ele tem consciência desse pecado, sabendo que ela, por intermédio dele, como o
99
J oão - C ap. 4

Discernidor, aos poucos, o alcançaria como o Perdoador. Apesar da ignorância e


banal superstição dessa mulher, Ele não retém a mais sublime verdade. Ele co­
nhece o entendimento imperfeito dela, mas toma por certo o poder germinativo
da própria verdade. Ele não é dissuadido do esforço para plantar sua verdade e
salvar uma alma, quer por seu próprio cansaço quer pelo sentimento conven­
cional de desaprovação por conversar com uma mulher em um lugar público.
Godet contrasta o método de Jesus nesse caso com o empregado na entrevista
com Nicodemos.

Com Nicodemos, Ele começou a partir da ideia que ocupava todo coração fariseu em
relação ao reino de Deus e, a partir dessas, deduzia as consequências práticas mais
rigorosas. Ele sabia o que tinha de fazer com um homem acostumado à disciplina da
lei. A seguir, Ele revelou a Nicodemos as verdades mais elevadas do reino do céu,
ligando-as ao tipo impressionante do Antigo Testamento e contrastando-as com as
características correspondentes do programa farisaico. Aqui, ao contrário, com a mu­
lher destituída de todo treinamento escriturai, Ele pega seu ponto de partida da coisa
mais comum imaginável: a água do poço. D e repente, ele, por meio de uma antítese ar­
rojada, exalta a água à ideia dessa vida eterna que mata para sempre a sede do coração
humano. Assim, a aspiração espiritual despertada nela torna-se a profecia interior à
qual Ele liga suas novas revelações e, por isso, alcança o ensinamento sobre a verda­
deira adoração que corresponde tanto diretamente à predisposição peculiar da mulher
quanto à revelação das coisas celestiais correspondiam aos pensamentos mais íntimos
de Nicodemos. Diante do último, Ele revela-se como o Filho unigênito, mas faz isso
enquanto evita o título de “Cristo". Com a mulher, Ele usa claramente esse termo, mas
não sonha em iniciar, nos mistérios da encarnação e da redenção, uma alma que ainda
está nos primórdios da vida e do conhecimento religiosos65.

27. Vieram - maravilharam-se (ήλθαν - έθαύμαζον). O tempo de cada verbo é


diferente: o aoristo, vieram, marca, como um único ponto no tempo, a chegada
dos discípulos, e o tempo imperfeito, estavam maravilhando-se, marca algo con­
tinuado: eles permaneceram e observaram-no conversando com a mulher, e o
tempo todo estavam maravilhando-se com isso.

Estivesse falando (έλάλει). O tempo imperfeito: estavafalando. Como na r v .

Uma mulher. Tradução correta; contra a k j v , a mulher. Eles não se surpre­


enderam por Ele estar conversando com aquela mulher, mas com o fato de seu
mestre conversar com alguma mulher em público. Os escritos rabínicos ensina-

65. Godet, Commentary on the Gospel of John.


100
J oão - C ap. 4

vam que estava abaixo da dignidade do homem conversar com mulheres. Essa
era uma das seis coisas que um rabi não devia fazer. “Que ninguém”, está escrito,
“converse com uma mulher na rua, nem mesmo com a própria esposa.” Esses
escritos também sustentavam que a mulher era incapaz de instrução religiosa
profunda. “Antes queimar os ditos da lei que os ensinar às mulheres.”

28. Cântaro. Vide n o ta sobre 2.6.

29. Tudo. A percepção de Jesus naquele caso convenceu-a de que Ele sabia tudo
e, para a consciência despertada dela, parecia que Ele contara tudo.

Não é este o Cristo (μήτι àm v)? Mais propriamente, como na rv, pode este
ser. Na t b , Será este, porventura-, na b j e t e b , Não seria ele. A partícula sugere uma
resposta negativa. Com certeza, esse não pode ser, contudo há nessa expressão al­
guma esperança.

30. Pois. Omita.

Saíram - foram te r com ele (έξήλθον - ηρχοντο προς αυτόν). Saíram é o tem­
po aoristo, denotando sair da cidade como um ato único em um ponto do tempo.
Foram, quer dizer iam, é o tempo imperfeito, denotando ação em progresso. A
observância da distinção torna a narrativa mais vivida. Eles estavam vindo. Para
poderia ser na direção de (προς). O tempo imperfeito também é exigido pelas se­
guintes palavras: “No meio tempo” (enquanto a mulher ainda estava ausente e
os samaritanos estavam indo em direção a Ele), “os discípulos estavam rogando’ que
Ele comesse. Esse último tempo imperfeito é negligenciado pela r v .

32. Comida (βρώσιν). Originalmente, o ato de comer (Cl 2.16), mas, com frequência,
em relação ao que é comido. Encontra-se um paralelo na frase comum: uma coisa é
boa ou ruim para comer. Paulo sempre usa a palavra em seu sentido original.

Não conheceis (ούκ οΐδατε). Ou seja, vocês não conhecem sua virtude. Na k jv ,
inadequadamente, de que não sabeis.

33. Diziam (έλεγον). Tempo imperfeito: começaram a dizer, ou estavam dizendo. A


questão foi discutida entre eles.

Uns aos outros. Temendo perguntar a Jesus.

34. Comida (βρώμα). Palavra diferente da usada no versículo 32 e cujo sentido


é: o que é comido.
101
JoAo - Cap. 4

Fazer (ινα ποιώ). Literalmente, afim de que eufaça. Enfatizando ofim, e não o
processo. Com frequência, é usada com esse sentido em João. Vide nota sobre 3.19.

Realizar (τελειώσω). Melhor, como na tb, completar, na nvi, concluir. Não meramen­
te levar a um fim, mas aperfeiçoar. De τέλειοζ,perfeito. O verbo é característico de João
e da epístola aos Hebreus. Vide versículo 36; 17.4; 19.28; lJo 2.5; 4.12; Hb 2.10; 5.9 etc.

35. Não dizeis vós. No que é apresentado a seguir, Jesus contrasta o tempo natu­
ral da colheita com a colheita espiritual, a qual devia acontecer imediatamente na
reunião dos samaritanos. O vós é enfático, marcando o que os discípulos esperam
de acordo com a ordem da natureza. Enquanto olham para esses campos verdes
entre o Ebal e Gerizim, vós dizeis, ainda faltam quatro meses para a colheita.

Há quatro meses (τετράμηνοι έστιν). Apropriadamente, é um espaço de quatro


meses. Somente aqui no texto do Novo Testamento.

Ceifa (θερισμός). Vide nota sobre Lc 10.2.

Brancas (λευκά í). Vide nota sobre Lc 9.29.

Já [λ..]] para a ceifa. Colheita espiritual. Para Jesus, a multidão de samaritanos


que, agora, dirige-se para o poço era como um campo com a colheita madura,
prefigurando a colheita mais abrangente da humanidade que seria feita por seus
discípulos. Nos melhores textos, o termo^á junta-se ao versículo seguinte, e ο και,
e, no início do versículo seguinte, é omitido: o ceifeiro recebe desdejá etc. (cp. a r a ).

Galardão (μισθόν). Vide nota sobre 2Pe 2.13.

Para a vida eterna. Isso é explicado como aquele que nãoperece, masperseverapara
a vida eterna ou na vida eterna, como em um celeiro. Compare com o versículo 14.

Ambos (όμοΟ). A construção é peculiar: que ambos, o que semeia possa se regozijar
junto com o que colhe. Ambos não quer dizer em comum, mas simultaneamente. A co­
lheita segue tão rapidamente a disseminação do evangelho entre os samaritanos,
a ponto de o que semeia e o que colhe se regozijarem juntos.

37. Nisso (εν τούτω). Literalmente. Nessa relação entre o que semeia e o que colhe.

É verdadeiro o ditado (ó λόγος έστ'ιν ò άληθινός). Na a r c , apropriadamente,


o ditado, o provérbio comum. Verdadeiro: não só diz a verdade, mas também o dita-
102
J oão - Cap. 4
do é completamente cumprido de acordo com o ideal no plantio e na colheita do
que Jesus diz. A tradução literal do grego, conforme fornecida acima, é: “o ditado
é o verdadeiro (ditado)”. Porém, diversas altas autoridades omitem o artigo antes
de verdadeiro.

38. Eu £...J enviei (έγώ άπέστ^ιλα). Esse eu é enfático. O tempo aoristo aponta a
missão dos discípulos como envolvida no chamado original deles.

Outros. Jesus mesmo e todos os que tinham preparado o caminho para Ele,
como João Batista.

Trabalharam (κίκοπιάκασι). O tempo perfeito. Na rv, corretamente, têm tra­


balhador, seu trabalho mostra seus efeitos nesse caso. Acerca da palavra trabalho,
vide nota sobre Lc 5.5. Compare com Js 24.13.

39. Pela palavra (tòv λόγον). Melhor tradução que a da kjv, dito. Na n v i , teste­
munho. Não se refere apenas à declaração da mulher: Disse-me etc., mas também
a todo o testemunho (μαρτυρούσης) dela concernente a Cristo.

40. Ficasse (μεΐναι.). A ara apresenta uma tradução melhor permanecesse.

41. Muitos mais (πολλώ πλείους). Literalmente, mais por meio de muitos, ou seja,
muitos mais, com referência ao simples πολλοί, muitos, do versículo 39.

42. Diziam (’έλεγον). O tempo imperfeito: diziam para a mulher à medida que
sucessivamente a encontravam.

Pelo que disseste (λαλιάν). Outra palavra é substituída propositalmente


por λόγον, palavra (vv. 39,41). No versículo 39, λόγος, palavra, é usada para
a mulher, a partir da perspectiva do evangelista, como um testemunho para
Cristo. Aqui, os samaritanos distinguem entre a palavra mais autoritativa e
exaltada de Jesus e afala da mulher. Na rv , discurso-, na bj e teb , dizeres. Com­
pare com o verbo correlato, λαλόω, nos versículos 26-27; também em 8.43;
M t 26.73.

O Cristo. Os melhores textos omitem.

O Salvador (ό σωτήρ). João só usa a palavra aqui e em lJo 4.14. Vide nota so­
bre Jesus, Mt 1.21. É relevante que essa concepção de Cristo tenha sido expressa
pela primeira vez por um samaritano.
103
J oão - C ap. 4

44. Porque - na sua própria pátria (γάρ - ev τή ίδια πατρίδι.). Porque desig­
na o motivo por que Jesus foi à Galileia. Parece que com a expressão sua pró­
pria pátria pretende-se dizer a Judeia, embora quase a mesma frase, seu p a íf6,
seja usada pelos três Sinópticos para referir-se à Nazaré, na Galileia. Contudo,
o Evangelho de João lida com o ministério de Jesus na Judeia, em vez de na
Galileia, e a expressão na sua própria pátria é apropriada para a Judeia, como
“o verdadeiro lar e terra natal dos profetas, a terra em que ficava a cidade de
nascimento do Messias, a cidade associada com ele tanto na antiga profecia
como na expectativa popular”. Por essa razão, em Jerusalém, o povo disse: “Não
diz a Escritura que o Cristo vem da descendência de Davi e de Belém, da aldeia
de onde era Davi” (7.42)? Os versículos 1-3 afirmam que Jesus deixou a Judeia
por causa de uma controvérsia incitada pelos fariseus, os quais João sempre
aponta como os líderes da oposição a Jesus. Além disso, somos informados de
que em Jerusalém, embora muitos cressem no nome dele, Jesus, ainda assim,
não confiava neles (2.23-24). De acordo com essa explicação, o termo γάρ, por­
que, é usado em seu sentido natural e mais óbvio, determinando o motivo da
partida de Jesus para a Galileia. Naturalmente, o provérbio é sugerido pela
referência à Galileia, onde Jesus usou-o em Nazaré (vide M t 13.57). O termo
o t e οΰν, quando, pois (cp. n t i a ; pois indicando sequência lógica, e não tempo),
do versículo 45, segue naturalmente a citação do provérbio, representando a
correspondência entre o caráter da recepção dele na Galileia e o motivo de sua
ida para lá. Por fim, se entendermos por sua própria pátria, Nazaré, somos com­
pelidos a explicar ο γάρ, porque, a partir do versículo 46; Jesus foi para Caná (a
norte de Nazaré) sem atravessar sua terra natal, pelo motivo mencionado. Isso
parece forçado e arbitrário67.

45. Receberam (Ιδέξαντο). Vide nota sobre 3.32.

46. Jesus. Os melhores textos omitem.

Caná (την Κανά). Observe o artigo a Caná, e vide nota sobre 2.1. O artigo
define a Caná previamente mencionada.

66. Em M t 13.57, Tischendorf lê como aqui, kv τη ιδία πατρίδι, em seu pró p rio país. W estcott e
Hort, 4v τη πατρίδι αύτοΰ.
67. Fornecí o que parece ser, no todo, a explicação mais simples e natural, embora contrarie uma
multidão de altas autoridades. As várias interpretações formam um emaranhamento descon­
certante. Todas elas estão abertas à objeção. Uma das discussões mais claras e simples da
passagem é encontrada em Schaff, P o pu lar C om m entary on the G ospel o f John, editada pelos Pro­
fessores Milligan e Moulton, em que essa explicação é adotada, embora o Professor Schaff (em
L a n g e ’s Com m entary ) a chame de “absurda”. Essa também é a percepção do Cônego Westcott.
Outras explicações são: Galileia em geral; Nazaré; Baixa Galileia, em que Nazaré estava situa­
da, como distinta da Alta Galileia, em que ficava Cafarnaum.

104
J oão - C ap. 4

Oficial do rei (βασιλικός). Apropriadamente, um adjetivo com o sentido de


real, de βασιλεύς, rei. Ele ocorre somente em João, aqui e no versículo 49; em to­
das as outras passagens é usado como adjetivo (At 12.20-21; Tg 2.8). O sentido
literal aqui é oficial do rei. Na w y c l i f f e , pequeno rei.

Estava enfermo (ήσθευει). Vide notas sobre enfermidades, Lc 5.15.

47. Foi ter (άπήλθεν). Literalmente, afastou-se (άπό). Deixou o filho sozinho por
um tempo.

Curasse (ίάσηται). Vide nota sobre Mt 8.7 e Lc 6.19.

Estava à morte (ήμελλεν άποθνήσκειυ). Literalmente, estava para morrer.


Compare com a expressão deselegante de Marcos, εσχάτως εχει, está moribunda,
5.23, sobre o que vide nota. Compare também com 12.33.

48. Lhe disse: Se não virdes. Dirigindo-se ao oficial do rei (lhe), mas tendo em
mente a população da Galileia, a qual ele representa (vós).

Sinais e milagres (σημεία καί τέρατα). Vide nota sobre Mt 24.24. Σημεία,
sinais, e έργα, obras, são palavras características de João para milagres. Vide ver­
sículo 20; 7.21; 14.10; 2.23; 6.2 etc.

£Vós(] não (ού μη). A dupla negativa é corretamente apresentada pela ara,

“não [...] de modo nenhurd’.

49. Filho (παιδίορ). Diminutivo. Literalmente, meu pequeno-, um toque de


ternura.

50. Foi-se (επορεύετο). Porém, assim perde-se a força do tempo imperfeito, que
se harmoniza com a sentença seguinte: ele estava prosseguindo em seu caminho, e
conforme agora estava descendo etc.

51. Servos (δούλοι). É apropriado o uso de serviçal ou servos. Vide nota sobre
Mt 20.26; Mc 9.35, respectivamente.

Teu filho vive (ò υ'ιός σοΰ ζη). Os melhores textos, no entanto, trazem αυτού,
seu. Como na n t l h , seufilho está vivo. Cristo usa υιός, filho, em vez de ιταιδίον,
menino ( n v i ), expressando o valor da criança como representante da família. Vide
nota sobre 1.12.
105
JoAo - Cap. 5
52. Pois (οΰν). Não uma partícula de tempo, mas de sequência. Na n v i, quando
perguntou.

A que hora se achara m elhor (κομψότεροι» έσχεν). Frase peculiar que ocor­
re somente aqui no texto do Novo Testamento. Literalmente, tinha melhorado.
Κομψότεροι» deriva de κομψός, bem vestido, bem cuidado, elegante-, e essa palavra
deriva de κομεω, cuidar de. A ideia da frase é transmitida na expressão familiar:
ele está indo bem, ou lindamente, ou ainda bravamente. Os comentaristas citam um
paralelo a partir de Arriano: “Quando o médico entra, você não deve ter medo
do que ele dirá; nem se ele disser: ‘Está se comportando bravamente’ (κόμψως
εχεις), você deve dar vazão a muito alegria”.

Às sete horas (ώραν έβδόμηι»). O caso acusativo não denota um ponto no tem­
po, mas a duração: durante a sétima hora.

Febre (πυρετός). Derivado de πυρ, fogo. Como a palavra latina febris, que está
para ferbris, de ferveo, arder ou brilhar por causa do calor.

Deixou (άφήκεν). Literalmente, deixou-o. Vide nota sobre o versículo 3.

54. Este segundo milagre etc. Literalmente, Jesusfe z isso de novo como um se­
gundo sinal. O pleonasmo em “de novo £../] segundo’ é apenas aparente. Outros
milagres, na verdade, foram realizados entre esses dois; mas João enfatiza esses
dois como marcando a vinda de Jesus da Judeia para a Galileia. A cura do filho do
oficial do rei foi o segundo milagre, apenas no que diz respeito a acontecer quando
Jesus se retirou da Judeia para a Galileia. Daí o segundo, de novo. Ele realizou mais
um milagre quando foi de novo para a Galileia, e esse milagre foi o segundo, como
marcando a segunda vinda dele.

C apítulo 5

1. Uma festa (εορτή). Ou festival Qual festival, é incerto. E identificado com a


Páscoa, Pentecostes e a Festa dos Tabernáculos; também com o Dia da Expiação,
a Festa da Dedicação e a Festa de Purim.

2. Das Ovelhas (τη προβατικη). A palavra é um adjetivo: pertencente à ovelha, o


que exige que seja complementada com outra palavra, não com άγορά, mercado,
mas com πύλη, porta. Essa porta ficava próxima do templo, do lado leste da cidade.
Vide Ne 3.1,32; 12.39. Alguns editores juntam o adjetivo com a palavra seguinte,
κολυμβήθρα, tanque, fazendo com que a última palavra passe a ser κολυμβήθρα (caso
dativo) e lendo-a como o tanque das ovelhas. Na wycliffe, águaparada para animais.
106
J oão - C ap. 5

Tanque (κολυμβήθρα). No texto do Novo Testamento, só aparece nesse ca­


pítulo e em 9.7,11. Apropriadamente, um tanque para nadar, de κολυμβάω, mer­
gulhar. Em Ec 2 . 6 ( l x x ), a palavra é usada para um reservatório de água de um
jardim. A palavra hebraica origina-se do verbo ajoelhar-se e, por isso, refere-se a
um lugar em que um rebanho ou homem tem de ajoelhar-se para beber. Na lin­
guagem eclesiástica, afonte batismal e o próprio batistério.

Chamado (επιλεγόμενη). Estritamente, apelidada, talvez o nome tenha su­


plantado algum nome anterior.

Betesda (Βηθεσδά). Termo comumente interpretado como Casa de Misericór­


d ia outros interpretam como Casa do Pórtico. As leituras também variam. Tis-
chendorf, Westcott e Hort trazem Βηθζαθά, Bèthzatha, Casa da Oliveira. O local
não pode ser identificado com alguma certeza. O Dr. Robinson acha que talvez
seja a fonte da virgem, a fonte superior de Siloé68.

Alpendres (στοάς). Claustros, pórticos cobertos.

S. Grande multidão. Os melhores textos omitem grande.

Enfermos (άσθενούντων). Na n v i , inválidos. Contudo, a k j v fornece o sentido


literal, pessoas semforça. Na wycliffe , debilitados.

Paralíticos (ξηρών). Literalmente, secos. Como na w y c l i f f e .


As palavras seguintes até o fim do versículo 4 são omitidas nos melhores
textos.

5. E estava ali um homem que, havia trinta e oito anos, se achava enfermo.
Literalmente, tendo uma enfermidade de trinta e oito anos.

6. Havia muito tempo (πολύν ήδη χρόνον έχει). Literalmente, elejá estava havia
muito tempo.

Queres (θέλεις). Não apenas você quer, mas você está determinado? Vide nota sobre
Mt 1.19. Jesus recorre à energia de sua vontade. Não é improvável que ele tivesse
caído em apatia por causa de sua longa enfermidade. Compare com At 3.4; Jo 7.17.

São (υγιής). Sadio.

68. Vide Thomson, The h a n d and the Book: Southern Palestine and Jerusalem, p. 458-461.

107
J oão —Cap. 5

7. Coloque (βάλτι). Literalmente, lançar, indicando movimento rápido exigido


para levá-lo para a água antes que o movimento dela acabe. Vide nota sobre
Mc 7.30; Lc 16.20.

8. Cama (κράββατον). Usado por Marcos e Lucas. Vide nota sobre Mc 2.4, e com­
pare com At 5.15; 9.33.

10. Curado (τ€θεραττ€υμένω). Vide nota sobre Mt 8.7; Lc 5.15; At 17.25.

Levar (αροα). A t e b traduz com mais correção por carregar. E a própria pala­
vra de Jesus do versículo 8.

11. Aquele que me curou - ele próprio (ò ποιήσας - έκτΐηος). O pronome


demonstrativo aponta com ênfase para o sujeito da oração precedente. Uso ca­
racterístico de João. Vide 1.18,33; 9.37; 10.1; 12.48 etc.

12. Pois. Omita.

Quem é o homem etc. “Observe a astúcia maliciosa. Eles não dizem: ‘Quem é
aquele que o curou?’, mas: ‘Quem disse para pegar tua cama?’”69

13. E o que fora curado (LaOelç). Compare com o versículo 10, e observe a pa­
lavra diferente para cura. Vide referências ali.

Quem era (τις έστιη). O tempo presente, quem é.

Se havia retirado (éÇéveuaev). O sentido literal do verbo é virar a cabeça para


o lado a fim de evitar algo. Daí, geralmente, traduzido por retirar ou desaparecer.
Somente aqui no texto do Novo Testamento.

14. Encontrou - disse. Observe a dinâmica troca dos tempos, como no versículo 13.

Não peques mais (μηκέτι άμάρταν^). Não continue a pecar. Vide nota sobre
Mt 1.21. Assim, Jesus mostra seu conhecimento de que a doença é resultado do
pecado.

Alguma coisa pior. Pior até mesmo que trinta e oito anos de sofrimento.

Te £...]] suceda (σοί γένητοα). Literalmente, te aconteça. Como na teb.

6.9. Grotius apud Trench, Notes on the Miracles o f our Lord.


108
J oão - C ap. 5

15. Anunciou (άνήγγειλεν). Vide nota sobre 4.25. Contudo, os m elhores textos
trazem εΐπεν, disse.

16. Os judeus perseguiram. O tem po im perfeito (έδίωκον) pode ser traduzido


p o r começaram a perseguir, já que isso é o início das hostilidades c o n tra Jesus, ou,
m ais provavelm ente, corresponde ao m esm o tem po de kmíei, fazia, ou m elhor,
costumava fazer. Διώκω, perseguiram, o rig in alm en te é correr atrás, perseguir com
propósito hostil, daí atormentar.

Procuravam matá-lo. Os melhores textos omitem.

Fazia. Vide acima. Godet observa: “O tempo imperfeito expressa, de forma


maligna, a ideia de que, com Ele, a violação do sábado tornara-se uma regra”.

17. Trabalha. A discussão voltou-se para o trabalho no sábado. O trabalho do


Pai de manter e redimir o mundo continua desde a criação até o momento pre­
sente (έως άρτι): até agora, não é interrompido pelo sábado.

E eu trabalho (κάγώ εργάζομαι). Ou, também trabalho. As duas orações são


coordenadas. A relação, como observa Meyer, não é de imitação nem de exemplo,
mas de igualdade de vontade e procedimento. Jesus não viola o ideal divino do sába­
do com sua atividade santa nesse dia. Segundo Westcott:

O verdadeiro descanso do hom em não é o descanso do trabalho humano e terreno,


mas o descanso para o trabalho divino e celestial. A ssim , a tradicional observância do
sábado m eram ente negativa é posta em contundente contraste com o cum prim ento
final e positivo do serviço espiritual, para o qual o sábado era uma preparação.

18. Quebrantava (’έλυε). Literalmente, estava violando, tempo imperfeito. Vide


nota sobrefazia, versículo 16. Não quer dizer estava violando o sábado em algum
caso em particular, mas anulando a lei e a obrigação da observância do sábado.

Seu próprio Pai (πατέρα ίδιον). Tradução apropriada; contra a b p e e c p , seupai.

19. Na verdade, na verdade. Vide nota sobre 1.51.

Se o não vir. Referindo-se a não podefazer coisa alguma, não por si mesmo. Jesus,
sendo um com Deus, não pode fazer à parte dele.

Fazer ao Pai (τον πατέρα ποιοϋντα). Na r v , corretamente, fazendo. O particí-


pio destaca, de forma mais contundente, a coincidência de ação entre Pai e Filho.
109
J oão —C ap. 5

Conforme Meyer: “a intuição interior e imediata que o Filho tem perpetuamente


do trabalho do Pai”

Igualmente (όμοίως). A tradução melhor, como na rv, é: da mesma maneira.


Igualmente é popularmente entendido como equivalente a também; mas a palavra
indica identidade de ação baseada na identidade de natureza.

20. Ama (φιλ6ΐ). No texto do Novo Testamento, duas palavras expressam


amar, φι,λέω e αγαπάω. ’Αγαπάω indica uma ligação racional e judiciosa fun­
damentada na convicção de que seu objeto é digno de estima ou merecedor
dessa estima por conta de benefícios concedidos. Φιλέω representa um senti­
mento mais caloroso, mais instintivo, mais intimamente ligado ao sentimen­
to e envolvendo mais paixão. Por isso, άγαπάω é representado pelo termo
latino diligo, a ideia fundamental desse termo é seleção, a escolha deliberada,
com fundamentos suficientes, de um entre muitos como o objeto de esti­
ma. Assim, φιλέω enfatiza o elemento afetivo do amor, e άγαπάω, o elemento
racional, inteligente. Em Memorabilia, de Xenofonte, Sócrates aconselha seu
amigo Aristarco a aliviar as necessidades de seus dependentes fornecendo-
-lhes meios para estabelecê-los no trabalho. Aristarco seguiu seu conselho, e
Xenofonte diz que as mulheres empregadas por ele o amavam (έφίλουν) como
seu protetor, ao passo que ele, por sua vez, amava-as (ήγάττα) porque eram
úteis para ele70. O sentimento de Jesus por M arta e Maria é descrito com o
termo ήγάπα, 11.5. Os homens são ordenados a amar (άγαπάν) a Deus (Mt
22.37; lCo 8.3); nunca o termo φιλεΐν, uma vez que amar a Deus envolve
discernimento racional e inteligente de seus atributos, e não apenas senti­
mento afetivo. Os dois elementos combinados no amor do Pai pelo Filho (Mt
3.17; Jo 3.35; v. 20). O termo άγάπη é usado em todo panegírico do amor de
lCo 13, e o exame desse capítulo mostra a grande participação do elemento
discriminativo na concepção de amor do apóstolo. O substantivo άγάπη não
aparece em nenhum escrito clássico. Como Trench comenta, “é uma palavra
nascida no âmago da religião revelada”. Έράω, em que predomina a ideia de
paixão sensual, não é usado em lugar algum do Novo Testamento. Trench
tem algumas declarações interessantes sobre sua tendência em relação a um
maior conjunto de associações nos escritos platônicos71.

Ele lhe mostrará maiores obras. Quando Jesus faz o que vê o Pai fazer (v.
o mostrar obras maiores é o sinal para Jesus fazê-las. Acerca de obras, como
19),
palavra característica de João, vide nota sobre 4.47.

70. Xenofonte, Memorabilia, ii, 7, §12.


71. Trench, Synonyms o f the New Testament, p. 42.

110
J oão - Cap. 5

Para que vos maravilheis. O vos é enfático (òpelç), e é dirigido àqueles que
questionavam sua autoridade, cujo espanto, por essa razão, seria de perplexida­
de, mais do que de fé admirada, mas que pode levar à fé. Platão diz: “Espanto é
o sentimento do filósofo, e filosofia começa com espanto”72; e Clemente da Ale­
xandria, citado por Westcott: “Aquele que se maravilha devia reinar, e aquele que
reina devia descansar”. Compare com At 4.13.

21. Ressuscita - vivifica. Física e espiritualmente.

O Filho vivifica. Não ressuscita e vivifica. Contudo, o vivificar (ζωοποιεί, tornar


vivo) inclui o ressuscitar, para que as duas orações tenham a mesma extensão. Na
concepção popular, o ressuscitar precede o vivificar; mas, na verdade, o tornar
vivo é o fato controlador do ressuscitar. ’Eyeípei, ressuscitar, quer dizer principal­
mente despertar.

2 2 . Também o Pai (oòôè γάρ ò πατήρ). A a r c e a k j v (que traz: pois o Pai) não
captam o ponto alto em oüôè: nem mesmo o Pai, que seria esperado que fosse o juiz.

Deu (δέδωκ€ν). Na n v i e t e b , confiou. A palavra habitual usada para a


concessão de privilégio e funções do Filho. Vide versículo 36; 3.35; 6.37,39;
10.29 etc.

Todo o juízo (την κρίσι,ν πάσαν). Literalmente, todo ojulgamento.

23. Que o enviou. A expressão é peculiar de João e usada só pelo Senhor, em


relação ao Pai. Vide 4.34; 6.38-39; 7.16,28,33 etc.

24. Ouve. Intimamente ligado com crê.

Tem a vida eterna. Vide nota sobre 3.36.

Não entrará em condenação (elç κρίσιν ούκ ερχεται). O tempo presente,


não entra,como a a r a . Não condenação, mas ju íz o , como a a r a . Vide nota sobre
3.17. Na TB não entra em ju íz o . O presente, entra, afirma o princípio geral ou or­
dem geral.

Da m orte (έκ θανάτου). A rv traduz corretam ente: de dentro da m orte, indi­


cando a condição anterior em que ele se encontrava.

72. Platão, Teeteto, 155.

111
J oão —C ap. 5

Vida (την' ζωήν). A vida; o ideal de vida perfeita.

25. Os mortos. Espiritualmente.

26. Como - assim (ώσπερ - ούτως). A correspondência é de fato, não de grau.

Deu (εδωκεν). Esse é o sentido mais estrito, o tempo aoristo aponta para o
passado eterno.

27. Poder. Vide nota sobre 1.12.

O Filho do Homem. A melhor forma é: um Filho do Homem. Não tem ar­


tigo. A autoridade é imputada a ele como perfeito homem. João usa o artigo em
todas as passagens com essa frase, exceto aqui e em Ap 1.13; 14.13. Vide nota
sobre Lc 6.22.

28. Nos sepulcros (τοΐς μνημείοlç). A tradução da n v i é melhor, túmulos. Duas


palavras são usadas no texto do Novo Testamento para o lugar de sepultamento,
τάφος e μνημεΐον ou μνήμα. A primeira enfatiza a ideia de sepultamento (θάπτω,
sepultar)·, a última, de preservar a memória do morto, de μιμνήσκω, lembrar.

29. Fizeram o bem - fizeram o mal. Observe mais uma vez o uso de verbos
diferentes para fazer com beme mal. Vide nota sobre 3.21. Acerca da palavra para
mal (φαύλα), vide nota sobre 3.20.

Ressurreição da vida (άνάστασι,ν ζωής). A expressão ocorre somente aqui no


texto do Novo Testamento; como ressurreição dojulgamento (άνάστασιν κρίσεως).

30. Do Pai. Omita. Na nvi , àquele que me enviou.

31. Se eu (εάν εγώ). O eu é expresso para dar ênfase: só eu.

Verdadeiro (αληθής). Como distinto defalso. Vide nota sobre 1.9.

33. Vós mandastes. Na tb , corretamente, tendes mandado. O tempo perfeito com


alusão a algo permanente em seu resultado. De forma similar, deu testemunho
deveria ser tem dado testemunho, como na tb . Observe o vós (ύμεις) expresso, mar­
cando de forma enfática o contraste entre o testemunho do homem exigido pelos
judeus e o testemunho divino no qual Jesus confia (v. 34).

34. Eu, porém (εγώ δε). O eu é enfático em contraste com o vós (v. 33).
112
J oão - C ap . 5

Recebo (λαμβάνω). Vide nota sobre 3.32.

Testemunho (την μαρτυρίαν). A teb apresenta apropriadamente o testemu­


nho. A restauração do artigo é importante. Ele tem a força de meu, indicando o
testemunho como algo característico da obra de Cristo. O único testemunho que
aceito como prova.

De homem. Ou de um homem, com uma referência original a João Batista. A


arc traduz, não recebo testemunho de homem.

Isso. Com referência ao Batista.

Vos salveis. O vos (ύμεις) marca-os como aqueles que podem ser influenciados
pelo testemunho humano e inferior, embora não tenham apreendido o testemu­
nho divino.

35. A candeia que ardia e alumiava (ò λύχνος ò καιόμενος και φαίνων). Na


teb ,a lâmpada que se acende e brilha. Λύχνος, candeia, em contraposição a luz (φώς).
Vide 1.5,7-9; e compare com 8.12; 9.5; 12.46. Na ara , lâmpada. João Batista, ao
contrário de Jesus, não brilha com luz própria. O artigo definido acompanhado
de candeia aponta para esse termo como um objeto de casa familiar. Ardia alude
ao fato de que a candeia fornece luz, porém, luz transitória. Ao arder, o óleo é
queimado.

Vós quisestes. Mais uma vez, o enfático υμείς, vós.

Alegrar (άγαλλιασθήναι). A palavra quer dizer alegria exultante, viva. Vide


Mt 5.12; Lc 1.47; 10.21; lPe 1.6. O interesse em João Batista foi um entusiasmo
frívolo, superficial e passageiro. Bengel diz: “Eles foram atraídos por seu brilho,
não por seu calor”.

36. Maior testemunho (την μαρτυρίαν μείζω). O artigo, omitido na arc, tem a
força de meu, como no versículo 34. Na tb, o testemunho que eu tenho, é maior.

Deu. Vide nota sobre o versículo 22.

Para realizar (iva τελειώσω). Literalmente, afim de que completasse. Na nvi ,


concluir, na bj, consumar. Vide nota sobre 4.34.

As mesmas obras (αύτά τα έργα). Na rv, mais corretamente, as próprias obras;


na nvi, apropria obra.
113
J oão — C a p . 5

37. Ele mesmo (αύτός). Os melhores textos substituem por 4κά.νος, ele, tradu­
zindo: “O Pai que me enviou, ele prestou testemunho”. Como na rv. Na teb , O
Pai, que me enviou, deu elepróprio testemunho.

Voz —parecer. Não se refere à descida da pomba e à voz vinda do céu no


batismo de Jesus, mas, em geral e de forma figurativa, ao testemunho de Deus
no Antigo Testamento. Isto está em harmonia com a referência subsequente
à palavra.

38. Sua palavra. Enfático, começando a sentença. Compare com 17.6ss.;lJo 1.10;
2.14.

39. Examinais (èpeuuâtc). A arc traz corretamente \^vó.<Q estudam. Jesus recor­
re a uma prática familiar na qual porque vós cuidais ter nelas é explicativo. Vide
lPe 1.11; Rm 8.27; lCo 2.10; Ap 2.23.

As Escrituras (τάς γραφάς). Literalmente, os escritos, possivelmente com uma


sugestão de contraste com a palavra (v. 38).

Elas (exeivai). Essas mesmas Escrituras.

40. E. Mais que uma simples partícula de ligação. Antes, e ainda. Vide nota sobre
Lc 18.7.

Não quereis (ού GéÃexe). Indicando determinação obstinada. Vide nota sobre
Mt 1.19.

41. Eu não recebo glória dos homens. A ordem grega é: glória dos homens
eu não recebo. Compare com o versículo 34. Sua glória consiste em sua comu­
nhão amorosa com Deus. Os homens que não amam a Deus não têm simpatia
por ele.

42. Conheço (εγνωκα). Vide nota sobre 2.24.

O amor de Deus. Amor por Deus. Esse era o resumo da própria lei deles. A
única outra passagem do Evangelho em que a expressão ocorre é Lc 11.42.

Em vós (kv έαυτοις). A rv traz, corretamente, em vocês mesmos. Compare com


6.53; lJo 5.10; Mc 4.17.
114
J oão - C a p . 5

44. Vós crer. Mais uma vez, o vós é enfático, a oração seguinte fornece o motivo
para a ênfase.

Recebendo (λαμβάνοντες). Literalmente, recebendo (como vós fazeis); vendo


que vós recebeis.

Não buscando a honra que vem só de Deus (και την δόξαν την παρά του
μόνου Θεού ού ζητείτε). A rv apresenta a frase de forma excelente, seguindo a
ordem grega: e a glória que vem do Deus único vós não buscais. Não só de Deus, o
que omite totalmente a força do artigo definido, mas do Deus único. Compare com
lTm 6 .1 5 -1 6 ; Jo 17.3; Rm 1 6 .2 7 .

45. Hei de acusar (κατηγορήσω). De κατά, contra, e αγορεύω, falar na assembléia


(αγορά). Daí ser apropriado, trazer uma acusação à corte. João não usa outro verbo
para acusar, e este somente aqui, em 8.6 e Ap 12.10. Uma vez que διαβάλλω ocor­
re no texto do Novo Testamento (Lc 16.1; sobre o que vide nota), tendo o sentido
de acusação maliciosa e secreta, em contraposição a acusação (κατηγορία) pública.
Αίτιάομαι ocorre uma vez na palavra composta προητιασάμεθα, nós previamente
apresentamos acusação (Rm 3.9). Isto se refere especialmente ao fundamento da
acusação (αίτια). O termo έγκαλεω ocorre somente em Atos dos Apóstolos, com
exceção de Rm 8.33. Quer dizer acusar publicamente, mas não necessariamente
diante de um tribunal. Vide At 2 3 .2 8 -2 9 ; 26.2,7.

Em quem vós esperais (είς ôv ύμεις ήλπίκατε). Uma expressão forte. Lite­
ralmente, em que vós tendes esperado. A nvi traduz admiravelmente por em quem
estão as suas esperanças.

47. Escritos (γράμμασιν). É importante entender o sentido preciso dessa pala­


vra porque ela determinará se Jesus pretendia uma antítese entre os escritos de
Moisés e suas próprias palavras ou simplesmente entre Moisés (εκείνου) e ele
mesmo (έμοις).
O principal sentido de γράμμα é o que está escrito. Por isso, o termo pode descrever
uma única letra ou um documento. A partir dessa noção genérica, desenvolveram-se
diversas formas no texto do Novo Testamento. A palavra ocorre em seu sentido
mais restrito de letras ou caracteres em Lc 23.38; 2Co 3.7; G1 6.11. Em At 28.21,
o termo quer dizer comunicação oficial. Paulo, com uma única exceção (2Co 3.7),
usa-o para letra da Escritura em contraposição com seu espírito (Rm 2.27,29; 7.6;
2Co 3.6). Em Lc 16.6-7, o termo denota uma conta de devedor (teb , recibo). Em 7.15
e At 26.24, a palavra é usada no plural como um termo genérico para aprendizado
escriturai e rabínico. Compare com Is 2 9 .1 1-12, lxx , em que um homem que sabe ler
115
João - C ap. 6

é descrito como έπιστάμενος γράμματα, familiarizado com as letras. Uma vez que
o termo é usado coletivamente para as sagradas letras - as Escrituras (2Tm 3.15),
como também para a própria Escritura. Entre os gregos alexandrinos, o termo
não está confinado à instrução elementar, mas inclui exposição, baseada, todavia, em
estudo crítico do texto. A tendência dessa exegese, com frequência, era em direção
à interpretação mística e alegórica, degenerando em uma ingenuidade trivial de
fixar sentidos novos e secretos em formas antigas e familiares. Isso foi ilustrado
pelas exposições neoplatônicas de Homero e pela exegese rabínica. Homens não
familiarizados com esses estudos, sobretudo se eles apareciam como professores
públicos, seriam considerados ignorantes pelos judeus da época de Cristo e dos
apóstolos. Daí a pergunta a respeito de nosso Senhor mesmo: “Como sabe este
letras” (γράμματα, Jo 7.15)? Também o comentário sobre Pedro e João (At 4.13)
de que eram indoutos (αγράμματοι). Como também aqueles que descobriam nas
Escrituras do Antigo Testamento referências a Cristo seriam estigmatizados pelos
pagãos como seguidores do método engenhoso e fantasioso dos intérpretes judeus,
que eles desprezavam. Talvez alguns desses sentimentos tenham provocado as
palavras de Festo para Paulo: As muitas letras (πολλά γράμματα) tefazem delirar (At
26.24). E conhecido o cuidado minucioso com que a transcrição literal dos escritos
sagrados foi guardada. Os escribas (γραμματείς) eram responsáveis pela produção
de cópias de acordo com a letra (κατά το γράμμα).
Uma única passagem de 2 Timóteo não pode ser determinante em favor do
uso geral do termo para as Escrituras, sobretudo uma vez que os melhores textos
rejeitam o artigo antes de ιερά γράμματα, de forma que o sentido, aparentemen­
te, é mais genérico: “Sabes as sagradas letras”. A fórmula familiar para as Escri­
turas era ai γραφαι άγίαι. Um único livro da coleção de escritos era conhecido
como βιβλίον (Lc 4.17) ou βίβλος (Lc 20.42); nunca como γραφή, que era o termo
para uma passagem em particular. Vide nota sobre Mc 12.107S.
Assim, parece-me que a antítese entre os escritos de Moisés, supersticiosamente,
reverenciados na letra e, minuciosa e criticamente, examinados e expostos pelos ju­
deus, e as palavras vivas (ρήμασιν, vide nota sobre Lc 1.37) tem de ser reconhecida.
Contudo, isso não precisa excluir a outra antítese entre Moisés e Jesus pessoalmente.

C apítulo 6

1-14. Compare com Mt 14.13-21; Mc 6.30-44; Lc 9.10-17.

73. 0 BispoLightfoot ( C om m entary on G alatian s, iii.22) incitacommuitafirmezaqueesseéinvaria­


velmente seusentido. As passagens citadas emcontraposiçãoaessapercepçãopelo Professor
Thayer (L exicon o f the N e w Testam ent), Jo 7.38; 10.S5; Rm4.3; G1 3.22; 4.30; Tg 2.8; IPe 2.6;
2Pe 1.20, nãomeparecemserconclusivas; aocontrário, diversas delas parecem, mais propria­
mente, promover apercepçãodeLightfoot.
116
J oão - C a p . 6

1. Do mar. Vide nota sobre Mt 4. 18.

2. Multidão (δχλος). Vide n o ta sobre 1.19.

Seguia (ήκολούθει). Tempo imperfeito, denotando não apenas o ato de seguir


nessa ocasião, mas em geral.

Via (έώρων). A rv tra z observava. Vide nota sobre 1.18.

Os sinais. Na kjv, seus milagres. Omita seus, como na arc.

3. Ao monte (το όρος). O sentido estrito é o monte. O escritor fala como alguém
familiarizado com a região.

Assentou-se (έκάθητο). Tempo imperfeito: estava assentando-se quando viu a


multidão se aproximando (v. 5).

4. A festa (ή εορτή). Com o artigo definido, a festa; apontando para algo bem
conhecido.

5. Vinha (ερχεται). A tradução está vindo é melhor. Ter com ele (πρός) é mais pro­
priamente em direção a.

Pão (άρτους). Apropriadamente, pães. Vide nota sobre Mt 4.1.

6. Experimentar (πειράζων). Literalmente, experimentando ou provando. Vide


nota sobre Mt 6 . 13. Na n v i , pô-lo àprova.

7. Dinheiros (δηναρίων). Vide nota sobre M t 20.2. Duzentos dinheiros represen­


tavam algo entre trinta e trinta e cinco dólares.

Para que cada um deles tome um pouco. Frase peculiar a João.

9. Um rapaz (παιδάριον). Diminutivo. Somente aqui no texto do Novo Testa­


mento74. Só João menciona o rapaz.

Cevada (κρίθινους). Detalhe peculiar a João. No texto do Novo Testamento,


a palavra ocorre somente aqui e no versículo 13. O termo indica um tipo de pão

74. A leitura correta em Mt 11.16 é παιδίοις.

117
João - C ap . 6

inferior. Plínio e alguns escritores judeus descrevem a cevada como alimento


adequado para animais. Suetônio refere-se a um retórico bombástico como orador
de cevada, inflado como a cevada na umidade; e Lívio relata como ordenava-se
às coortes que perderam seus padrões que recebecessem cevada como alimento.

Peixinhos (όψάρια). A palavra ocorre somente aqui e em 21.9. Os Sinópticos


usam ίχθυές. A arc , peixinhos, pretende traduzir o diminutivo75. A palavra tem o
sentido de qualquer coisa que é comida com pão e pode se aplicar a refeição em
geral ou ao que é comido com pão, como iguaria. Homero fala de cebolas como o
“estimulante (όψον) do bom beber”76. O termo era aplicado ao peixe p a r excellence.
Entre os gregos, o peixe tornou-se a principal iguaria para os glutões, por isso
Demóstenes descreve um glutão e perdulário como alguém que é extravagante
com peixe.

Mas que é isso para tantos? Frase peculiar a João, embora a ideia esteja
implícita em Lc 9.13.

10. Assentar (àvaueoelv). Literalmente, reclinar.

Relva (χόρτος). Originalmente, uma área delimitada. Por isso, Homero fala de Pe-
leu oferecer sacrifício, αυλής kv χόρτω, no paço11. Daí um lugar de alimentação e, assim,
relva, feno. O sentido é meramente de nossa pastagem abstrata. Mateus e Marcos
mencionam a erva, Marcos com a qualificação verde. A nvi menciona grama.

11. Dado graças. Todos os Sinópticos relatam seu ato de levantar os olhos ao céu
e abençoar. Talvez ele tenha usado a fórmula familiar: “Abençoado sejas, Jeová,
nosso Deus, Rei do mundo, que produz o pão da terra”.

Pelos discípulos, e os discípulos. Os melhores textos omitem. Traduza,


como a n v i : os repartiu entre os que estavam assentados.

Igualmente também os peixes. Como também Marcos.

Quanto eles queriam. Frase peculiar a João.

75. Edersheim (Life o f Jesus) diz que o Talmude fornece o nome de determinados tipos de peixes,
especialmente designados como peixinhos, que podem ser comidos sem cozinhar, e esses peixi­
nhos eram recomendados para a saúde, e o mar da Galileia era particularmente rico nesse tipo
de peixe, a salga e a conserva dele era uma indústria especial entre os pescadores.
76. Homero, Ilíada, xi, 6SS.
77. Ibid., xi, 774·.

118
J oão - C a p . 6

12. Pedaços (κλάσματα). De κλάω, quebrar.

Que sobejaram (περισσεύσαντα). A nvi traduz: que sobraram. Literalmente, ex­


cederam o suprimento necessário. Só João registra a ordem de Jesus para recolher
os pedaços e o motivo para isso, para que nada seperca.

13. Cestos (κοφίνους). Vide nota sobre Mt 14.20. Na w y c liffe , caixões.

D e pedaços etc. João fornece mais detalhes que os Sinópticos. Marcos só


menciona a coleta dos restos dos peixes (cp. n t i a ). João também usa εγέμισαν,
encheram, em lugar de levantaram, conforme encontramos nos Sinópticos.

Cinco pães de cevada. Detalhe peculiar a João, enfatizando a identidade do


fragmento com os pães originais.

Aos que haviam comido (βεβρωκόσιν). Somente aqui no texto do Novo


Testamento.

14. Que devia vir ( ò ερχόμενος). Literalmente, aquele vindo. Na t e b , que deve vir.

1 5 -2 1 . Compare com Mt 14.22-36; Mc 6.45-52.

15. Haviam de vir (μέλλουσιν ερχεσθαι). Literalmente, estão para vir.

Arrebatá-lo (άρπαζε iv). Vide nota sobre Mt 11.12.

Rei. Melhor tradução que a da kjv , um rei. Sobre eles mesmos.

Ele só (αυτός μόνος). Mateus usa κατ’ ιδίαν, à parte, e tanto Mateus quanto
Marcos acrescentam para orar.

16. A tarde (όψία). Adjetivo. ’Όψιος, tarde, com ώρα, hora, subentendido.

17. Barco (πλοΐον). Na tb, barca. Vide nota sobre Lc 5.2. Os melhores textos
omitem o artigo.

Passaram (ήρχοντο). Tempo imperfeito: estavam indo. Como na rv.

Cafamaum. Marcos traz Betsaida.

Era já escuro (σκοτία ήδη έγεγόνει.). Literalmente, a escuridãojá tinha baixado.


Acerca de escuro, vide nota sobre 1.5.
119
J oão — C a p . 6

18. Levantou (διηγάρρυο). É lamentável como a k j v perde a força vivida desses im­
perfeitos. Na r v , corretamente, estava levantando-se, na n t l h , começou a soprar. Literal­
mente, estava sendo despertado. Os imperfeitos transmitem o sentido de perigo sendo
reunido, e realçam com mais força o fato do aparecimento de Jesus. Eles estavam indo,
a escuridão já tinha caído, o mar estava levantando-se, e Jesus ainda não tinha vindo.

Assoprava (ττνέοντος). Literalmente, soprando. A tradução por que estava so­


seria melhor. Nesse ponto, a narrativa de João é mais detalhada e vivida
p ra n d o
que a dos outros.

19. Tendo navegado (έληλακότες). Literalmente, tendo g u ia d o ou propulsionado


(o barco).

Vinte e cinco etc. O lago tinha cerca de qu aren ta estádios, 9,6 quilômetros,
em sua parte mais larga, eles tinham navegado pouco mais que a metade do
caminho.

Viram (θεωροΰσι). Na rv , observaram , olhar com intenção. Vide nota sobre


1.18. Lucas e João usam frequentemente essa palavra.

Aproximando-se. Literalmente, vin do a estar próxim o. Na w y c l i f f e , a serfeito


p róxim o. Marcos acrescenta: queria p a ssa r adian te deles-, e Lucas, que eles pensa­
ram que fosse um fantasma.

21. Eles, de boa mente, o receberam (ήθελον Ãaftelv). Tradução inadequada. A


r v traz c o r r e ta m e n te : eles queriam recebê-lo-, depois de serem tranquilizados pela

voz dele. O imperfeito denota u m sentimento contínuo, não um desejo impulsivo


e temporário.

Logo (ευθέως). Quer Jesus tenha, de fato, entrado no barco quer não, João não
nos diz. A inferência mais natural é que ele entrou. Mateus e Marcos dizem isso.
A imediata e milagrosa chegada deles à praia foi simultânea ao fato de o deseja­
rem receber ou sua verdadeira subida a bordo. Só João menciona esse incidente.
Mateus e Marcos dizem que o vento cessou.

Iam (υπήγον). O imperfeito, estavam indo. Literalmente, estavam indo embora.


O verbo tem o sentido de se retirar de algo. Compare com o versículo 67; 7.33,
sobre o qual v id e nota; 12.11; 18.8.

22. Que estava (ò έστηκώς). Permaneceu durante a noite perto do lugar do mi­
lagre e ainda estava lá.
120
J oão - Cap. 6
Barquinho (πλοιάριον). Diminutivo, como na arc.

(“Barco - aquele em que seus discípulos entraram.]] Conforme a kjv. Omita,


como na arc. Na rv, “não havia nenhum outro barco ali, exceto um.

23. Contudo, outros barquinhos tinham chegado (άλλα ôè ήλθ^ρ πλοιάρια).


Alguns editores omitem ôè, contudo, mudam άλλα, outros, para άλλα, mas, e a lei­
tura fica assim: mas lá chegaram barcos.

26. Pelos sinais (σημίΐα). A inserção do artigo definitivo e a tradução por


milagres, na ntlh , tende a obscurecer o verdadeiro sentido da passagem. Jesus
diz: Vocês não me procuram porque viram sinais. O que vocês viram em minhas
obras foram apenas maravilhas. Vocês não viram nelas indícios de meu poder e
missão divinos.

Saciastes (έχορτάσθητ*). Vide nota sobre Mt 5.6; Lc 15.16.

27. Comida (βρώσίρ). Vide nota sobre 4.32. Em Mt 6.19-20 e só lá é usado no sen­
tido deferrugem, que come ou corrói. De forma semelhante, corroer é de girar, roer.

Este o Pai, Deus, o selou. A arc faz, corretamente, o ponto culminante da


sentença cair em Deus: “Porque a este o Pai, Deus, o selou”. De acordo com a
ordem grega estrita, a frase fica assim: porque ele o Pai selou, Deus. Acerca de selou
(έσφράγισβρ), vide nota sobre 3.33. Na teb , marcou com seu selo.

28. Que faremos? (tí uoioOpev). Literalmente, o quefazemos? Os melhores tex­


tos trazem ποιώμέν, o que temos defazer?

Obras. A pergunta é do ponto de vista legal, as obras sendo consideradas


como a condição para obter o pão da vida.

29. Creiais. A fé é apresentada como um ato moral ou obra moral. Tem-se que
acreditar na obra de Deus. A fé inclui todas as obras que Deus exige. A pergunta
dos judeus contempla inúmeras obras. A resposta de Jesus os conduz para uma
obra. O Cônego Westcott observa, com acerto, que “essa fórmula simples con­
tém a solução completa para a relação de fé e obras”.

30. Pois. Uma vez que ele afirma ser o enviado de Deus.

31. Maná. Apropriadamente, o maná, referência a um fato histórico conhecido.


Uma passagem é citada de um comentário hebraico sobre o livro de Eclesiastes,
121
João —Cap. 6
como se segue: “Da mesma maneira que o primeiro Redentor fez o maná des­
cer, como está escrito: ‘Eis que vos farei chover pão dos céus’; também o último
Redentor deve fazer o maná descer como está escrito: ‘Haverá um punhado de
trigo na terra”’.

32. Moisés não vos deu (ού Μωσής ÔéÔcoicev ύμιν). A antítese é entre Moisés
e meu Pai. Por isso, a nvi está correta ao traduzir por “não foi Moisés quem lhes
deu” etc., - “mas é meu Pai quem lhes dá” etc. Alguns editores mudam o tempo
perfeito, ôéôtOKCV, tem dado, para o aoristo, ’éôooicev, deu.

O verdadeiro pão do céu (τον άρτον έκ τού ουρανού τον αληθινόν). A


tradução ganharia se seguisse a ordem grega: “o pão do céu, o verdadeiro pão".

33. Aquele que desce (ò καταβαίνων). Pode ser traduzido assim, em aquele que
refere-se a άρτος, pão-, por isso, a tradução da a r c é a melhor, uma vez que Jesus
só se identifica com o pão no versículo 35.

35. Eu sou o pão da vida. Forma de expressão peculiar a João. Vide versícu­
los 41,48,51; 8.12; 10.7,9,11,14; 11.25; 14.6; 15.1,5.

Vem —crê. A fé em seu aspecto ativo e em seu aspecto de repouso.

Não (ού μή). Mais propriamente, de modo algum ou dejeito nenhum. Na tb , de


modo algum; na ara , jamais.

36. Mas. Embora você tenha visto quando pediu, repito o que lhe disse - que
você viu e não creu.

37. Tudo o que (παν δ). O singular neutro do adjetivo e do pronome. Todos os
cristãos são considerados com um todo completo. Compare com 17.24, de acordo
com a leitura correta: “Aqueles que me deste”.

Virá (ηξει). Enfatiza a ideia de alcançar ou chegar.

Vem (έρχόμενον). Verbo diferente que enfatiza o processo de vir.

38. Do céu (ck τού ούρανοΰ). Porém, os melhores textos trazem άπό, a partir de,
em vez de è«, de dentro de, sendo a ideia, antes, de ponto de partida (eu descí) do que
de origem. Descí deveria ser traduzido como na r v (sou ou tenho descido). O tempo
é o perfeito.
122
J oão - Cap. 6
39. A vontade do Pai. Omita do Pai, e traduza: a vontade dele etc.

De todos aqueles que me deu (ίοα παν δ δέδωκέ μοι). A construção é pecu­
liar e interrompida. Todos aqueles que me deu destaca-se sozinho como nominativo
absoluto; um modo muito enfático e impressionante de anunciar. Literalmente,
é: não devo perder nenhum de todos aqueles que ele me deu.

No último Dia (kv τη έσχατη ημέρα). A frase ocorre somente em João.

40. Porquanto (δέ). A arc traduz a leitura dos melhores textos, que trazem
γάρ, pois, em lugar de δέ, mantido pela kjv. Há uma ligação lógica entre a última
sentença e a seguinte. A vontade do Pai de preservar e alçar aqueles que deu ao
Filho, incluindo em seu cumprimento a contemplação de fé no Filho e sua missão
na vida eterna.

Daquele que me enviou. Os melhores textos substituem πατρός μου, de meu Pai

Vê (Oecopcôu). A palavra é usada de forma deliberada. A visão salvadora de


Cristo não é um mero ato de ver, mas de contemplação atenta. Na n v i , olhar para.
Vide nota sobre 1.18. Compare com vós me vistes e, contudo, não credes (v. 36).

41. Pois (οΰν). Melhor tradução que a da teb, a partir de então. Na rv, portanto-, na
com isso: por causa de suas palavras.
n v i,

Murmuravam (έγγόγυ(ον). Tide nota sobre Jd 16, e compare com lCo 10.10;
Fp 2.14. A palavra é usada constantemente na lxx em relação à murmuração
de Israel no deserto. Na teb, murmurar a seu respeito-, na n v i , criticar Jesus. Como
Chaucer: “Judas criticou ativamente Madalena, quando ela ungiu o nosso Se­
nhor”78; e Shakespeare: “Lembra-te que te prestei serviços importantes nunca
menti, não descuidei de nada nem me mostrei queixoso ou rabugento”79.

Dele (π€ρ'ι αύτοΰ). Indicando que eles dirigiram suas objeções a Ele. Toda­
via, Trept quer dizer a respeito de ou concernente a. Daí a tradução correta da teb,
a seu respeito.

42. Conhecemos. Não indicando necessariamente que José ainda estava vivo,
mas apenas o fato de que José era reconhecido como pai de Jesus.

78. Chaucer, P a rson ’s Tale.


79. Shakespeare, A tempestade, ato l, cena 2. Disponível em: < http://www.ebooksbrasil.org/eLi-
bris/tem pestade.html>. Acesso em: 28 jun. 2018.

123
JoÂo - Cap. 6

44. Trouxer (ελκύση). Encontramos duas palavras para trazer no texto do Novo
Testamento, σύρω e ελκύω. A distinção entre elas não é comumente observada; e
o sentido, com frequência, é sobreposto. Σύρω, originalmente, significa puxar ou
arrastar como uma roupa ou chinelos rasgados. As duas palavras são usadas para
empurrar ou arrastar para o tribunal. (Vide At 8.3; 17.6; 16.19.) Em At 14.19,
σύρω, o arrastar do corpo inconsciente de Paulo para fora da cidade de Listra.
Em 21.6,8,11, as duas palavras são usadas para puxar a rede. Em 18.10, ελκύω, o
ato de Pedro de puxar a espada. Contudo, uma distinção é observada: a palavra
σύρω nunca é usada para se referir ao fato de Cristo atrair os homens. Vide 6.44;
12.32. Só há uma ocorrência de ελκύω fora dos escritos de João (At 16.19). Lutero
disse a respeito dessa passagem: “O puxar não é como o do carrasco, que puxa o
ladrão de cima da escada para a forca; mas é a atração graciosa como a do homem
que todos amam e a quem todos vão de boa vontade”.

45. Ensinados por Deus (διδακτοί τού Θεοϋ). A ideia é lançada em um adjetivo
composto, θεοδίδακτοι., em lTs 4.9.

46. Visse. Em contraposição a ouvir e aprender (v. 45). O Pai não é visto imediata­
mente, mas por intermédio do Filho. Compare com 1.18; 14.9; lJo 3.2; Mt 11.27.

De Deus (παρά τού Θεού). Essa é a forma mais correta, de, com a ideia de
associação com ele: de com Deus. Παρά é usado para cortejo de um objeto pessoal,
em geral, indicando o ponto de partida.

49. Morreram (άπεθανοη). O aoristo não aponta a condição atual deles, mas o
fato histórico; eles morreram. Como na arc.

51. Pão vivo (ò άρτος ò ζώη). Literalmente, o pão o vivo {pão). Na wycliffe , pão
fermentado.

Eu der. Ο εγώ, eu, é enfático em contraposição com Moisés (v. 32).

Carne. Vide nota sobre 1.14.

Que eu darei. Os melhores textos omitem. Leia, como na bj: minha carne para
a vida do mundo. Na tb , e opão que eu darei pela vida do mundo ê a minha carne.

52. Disputavam (εμάχοντο). A murmuração (v. 41), agora, transforma-se em dis­


cussão aberta entre os próprios judeus.

53. Comerdes a carne. Apropriar-se da vida. Compare com G1 2.20; Ef 3.17.


124
J oão - Cap. 6
Beberdes o seu sangue. Apropriar-se do mérito salvador de sua morte. A
Páscoa aproximava-se e a referência bem pode ser à carne e ao sangue do cor­
deiro pascal.

Não tereis vida em vós mesmos (ούκ έχετε ζωήν εν έαυτοϊς). Essa tradução
está correta e harmoniza com o texto grego. A kjv só traz: em vós·, a ntlh sequer
traz esse acréscimo. Toda verdadeira vida está em Cristo. Compare com Cl 3.3.

54. Come (τρώγων). É usado outro verbo para comer. Com exceção de Mt 24.38,
ele só é encontrado em João e sempre em conexão com Cristo. Nenhuma relevân­
cia especial pode ser justamente ligada ao seu uso aqui. Parece ser tomado como
uma palavra corrente e εφαγον é retomado no versículo 58.

55. Verdadeiramente (αληθώς). Literalmente. Os melhores textos trazem


αληθής, verdadeiro·, verdadeira comida, verdadeira bebida.

56. Permanece (μένει). A ntlh traduz: vive. A palavra está entre as favoritas de
João, ocorrendo mais frequentemente no Evangelho dele que em todo o resto do
Novo Testamento.

57. O Pai, que vive (ò ζών πατήρ). A frase é encontrada somente aqui no texto
do Novo Testamento. Acerca de que vive e vida, vide nota sobre 1.4.

Pelo Pai (διά τον πατέρα). Inadequado. Traduza: por causa do, como na nvi.
Porque o Pai é quem está vivo. Daí por causa de mim, em vez de por mim.

59. Na sinagoga (εν συναγωγή). Porém, falta o artigo definido; por isso, deve­
mos entender em uma sinagoga ou em uma assembléia. Vide nota sobre Tg 2.2.
Entre as ruínas de Tell Hum, provável local de Cafarnaum, foi encontrado entre
os restos de uma sinagoga um bloco de pedra, talvez o lintel, no qual havia um
pote de maná esculpido e um padrão de folhas de vinha e cachos de uva80.

60. Duro (σκληρός). Vide nota sobre Mt 25.24; Jd 14. De acordo com a ordem
grega, duro é este discurso.

O [../] ouvir (αυτού ακούε ιν). O termo αυτού pode ser traduzido por ele, mas
não é provável aqui. Ouvir representa um ouvir dócil com vistas a receber o que
éouvido. Compare com 10.3,16,27; 12.47; 18.37.

80. Vide o relato completo dessas ruínas em Thomson, The Land and the Book·. Central Palestina
and Phoenicia, p. 417-419.

125
J oão - Cap. 6
61. Escandaliza (σκανδαλίζει). Na rv, causa de tropeço. V ide nota sobre Mt 5.29.
Na w y c l i f f e , vos injuria.

62. Que seria, pois, se visseis (εάν ούν θεωρήτε). A pergunta é marcada por
uma aposiopese, ou seja, interromper a sentença e deixar o ouvinte completá-la
por si mesmo. Literalmente, se, então, observásseis etc. - o complemento poderia
ser: isso não mais osfaria tropeçar?

Subir (άναβαίνοντα). A rv, apropriadamente, traduz o particípio: subindo.

63. Disse (λαλώ). A k j v seg u e a leitu ra en tre parêntesis, digo. A arc se g u e a


leitura correta, λελάληκα, o tem po perfeito, m as não com unica toda a sua força:
tenho dito, ou tenho d ito agora mesmo, em referência ao discurso precedente.

64. Havia de entregar (παραδώσων). Vide nota sobre Mt 4.12; Mc 4.29. O Novo
Testamento designa Judas uma vez pelo substantivo προδότης, traidor, Lc 6.16.

66. Desde então (εκ τούτου). A nvi traduz: daquela hora em diante. Como resul­
tado do então (εκ), procedendo deste. Compare com 19.12.

Tomaram para trás (άπήλθον εις τα όπίσω). Ο grego expressa mais que o
português. Eles afastaram-se (άπό) de Cristo; literalmente, para as coisas anteriores,
para o que eles tinham deixado a fim de seguir o Senhor.

Andavam (περιεπάτουν). Literalmente, perambular, com Jesus em sua peram-


bulação para aqui e ali.

67. Aos doze. João presume que o número seja conhecido. Ele é sugerido nos
doze cestos de restos. Como também em muitas outras circunstâncias desse
Evangelho, fatos da narrativa dos Sinópticos são tomados com a certeza de que
são familiares.

Quereis vós também retirar-vos? (μή και υμείς θελετε ύπάγειν). A partícula
interrogativa μή mostra que é esperada uma resposta negativa. Seguramente não
quereis. Na rv, retirar-vos-íeis; na ntlh , Será que vocês também querem ir embora.
Acerca do verbo retirar, vide nota sobre iam (v. 21).

68. Simão Pedro. Críticos da autenticidade do Evangelho de João alegam que


isso revela um esforço por parte do autor para reivindicar para o discípulo que
Jesus amava a preeminência sobre Pedro. A asserção, de vez em quando, é con-
126
J oão - Cap. 7
tradita pela própria narrativa. Vide 1.42; 6.68; 13.6; 18.10,16; 20.2,7; 21.3,7,11 e
notas sobre outras passagens. Nessa passagem, a resposta de Pedro pelos doze é
um desses casos.

As palavras da vida eterna (ρήματα ζωής αιωνίου). Não tem artigo. Tu tens
palavras. Palavras da vida são palavras que carregam vida nelas. Compare com a
expressão pão da vida, luz da vida, água da vida, árvore da vida.

69. Temos crido (έγνώκαμεν). Literalmente, temos vindo a conhecer. A ordem das
palavras crer e conhecer é inversa em 17.8; lJo 4.16. No caso dos primeiros discí­
pulos, f i produzida pela impressão predominante de que as obras e a pessoa de
Jesus precediam a convicção intelectual.

Que tu és o Cristo, o Filho de Deus. Os melhores textos substituem essa


expressão por ό άγιος του 0eoü, o Santo de Deus. A outra leitura resulta da ten­
tativa de fazer a confissão de Pedro aqui harmonizar com a confissão registrada
em Mt 16.16. Segundo Westcott, as duas confissões diferem no fato de que “aqui
a confissão aponta para o caráter interior em que os apóstolos encontraram a
garantia de vida; lá a confissão era do cargo público e da pessoa teocrática do
Senhor”.

70. Um diabo (διάβολος). Vide nota sobre Mt 4.1. A palavra é um adjetivo com
o sentido de calunioso, mas é quase invariavelmente usada no texto do Novo
Testamento como substantivo e com o artigo. O artigo está faltando apenas em
lPe 5.8; At 13.10; Ap 12.9 e talvez Ap 20.2. A essência mesma da natureza dia­
bólica é opor-se a Cristo. Compare com M t 16.23.

71. Judas Iscariotes, filho de Simão (’Ιούδαν Σίμωνος Ίσκαριώτην). A leitura


correta é Ίσκαριώτου, Iscariotes, com o caso genitivo concordando com Σίμωνος,
de Sim ão. Traduza, como a r v : Judas, ofilh o de S im ã o Iscariotes. Iscariotes designa
o nome da cidade de Simão: um homem de Queriote. Compare com Mt 10.5.

C apítulo 7

2. A festa dos judeus chamada de Festa dos Tabemáculos. A t b salienta a


força determinante dos dois artigos: a festa dos judeus, a dos tabernáculos. Essa
festa ocorria no começo do outono (setembro ou início de outubro) e durava
sete dias. Sua observância é ordenada em Ex 23.16; 34.22; Lv 23.39,42-43; Dt
16.13. Ela tinha dupla relevância. Era a festa da colheita e, por isso, chamava-se
a Festa da colheita e comemorava a habitação de Israel no deserto em tendas, ou

127
J oão —Cap. 7
tabernáculos. Daí o nome Festa dos Tabernáculos ou das Cabanas. A associação do
evento posterior com a colheita era destinada a lembrar o povo, em sua pros­
peridade, dos seus dias de errância em que não tinham casa, de fato de que seu
coração não deve ser elevado e se esquecer de Deus, que os libertou da escravidão
(Dt 8.12-17). Portanto, eles receberam a ordem de deixar sua casa permanente
e morar em barracas na época da colheita. A festa também era conhecida como
a Festa de Jeová ou, simplesmente, como a Festa (Lv 23.39; lRs 8.2) por causa de
sua importância e de ser a mais alegre de todas as festas. Na celebração da festa
em Jerusalém, eram montadas barracas nas ruas, praças e telhados das casas81.
A palavra grega para essa festa, σκηνοπηγία, construção de tabernáculos, ocorre
somente aqui no texto do Novo Testamento.

3. Teus discípulos. Aqueles que foram ganhos pelos primeiros ensinamentos na


Judeia e em Jerusalém e também os outros de outros lugares.

4. Procure ser conhecido (èv παρρησία). Literalmente, com coragem. O raciocí­


nio é o seguinte: nenhum homem pode afirmar Aposição afirmada por Cristo e, ao
mesmo tempo, manter em segredo as obras que a vindicarão.

5. Nem (oòôè). Melhor como apresentada na a r c , nem mesmo.

Criam (Ιπίστβιον). O imperfeito, estavam crendo, referindo-se não a um único


ato de fé, mas à fé como habitual e dominante.

6. Tempo (καιρός). Vide nota sobre Mt 12.1; Lc 1.20; At 12.1. A estação, ou jun­
ção, apropriada.

Sempre [[...^ pronto. Os discípulos podem se associar a qualquer momento


com o mundo, com o qual eles ainda tinham afinidade. Não como Jesus, o qual
estava em antagonismo essencial com o mundo.

7. Não £...3 pode. Frequente em João e expressa uma impossibilidade inerente.


Vide 3.3,5; 5.19; 6.44; 7.34,36; 8.21,43; 12.39; 14.17 etc.

Más (πονηρά). Vide nota sobre Lc 3.19; 7.21.

8. Esta festa. Por esta, leia a, a primeira vez, mas não a segunda.

81. Para umadescriçãocompleta, v id e o artigo“FestadosTabernáculos”, in: McClintockeCroks,


Cyclopaedia, v. 10; eEdersheim, T he Temple, cap. xiv.

128
João - Cap. 7
Está cumprido (πεπλήρωται). Literalmente, tem estado cumprido. Por isso, a
arctraduz ainda o meu tempo não está cumprido.

11. Ora (ούν). Seria melhor, por isso; porque Ele não apareceu com os galileus.

Procuravam (ε(ήτουν). O imperfeito: continuavam a procurar, procuravam-no


persistentemente.

No Qele]] (εκείνος). Enfático: aquele de que ouvimos e a quem vimos antes.

12. Murmuração. Vide nota sobre 6.41.

A multidão (τοΐς δχλοις). Vide nota sobre 1.19.

Diziam (ελεγον). O imperfeito: estavam dizendo.

Engana (πλανά). Na tb, melhor, desencaminha. Vide nota sobre Mc 12.24;


Jd 13.

13. Abertamente (παρρησία). A palavra pode ter o sentido de sem reserva (10.24;
11.14) ou semtemor( 11.54).

14. No meio da festa (τής εορτής μεσούσης). Forma de expressão peculiar en­
contrada somente aqui. O meio é expresso por um particípio do verbo μεσόω, estar
no meio. Literalmente, afesta estando na metade.

Ensinava (έδίδασκεν). Ou começou a ensinar. Tempo imperfeito.

15. Letras (γράμματα). Vide nota sobre 5.47.

16. Doutrina (διδαχή). Melhor, como na n v i , ensino. O termo doutrina adquiriu


um sentido convencional que pode ser enganoso.

17. Quiser fazer a vontade dele (θελη το θέλημα αύτοΰ ποιειν). A k jv traduz
equivocadamente o verbo θέλω, querer ou determinar, como um mero auxiliar. Ao
negligenciar o sentido distinto do verbo querer e reduzir quererfazer em fará,
sacrifica a verdadeira força da passagem. Jesus diz: Se alguém quiserfazer, se seu
propósito moral está em concordância com a vontade divina.

Conhecerá. A harmonia com a vontade de Deus é a condição para entendê-la.


129
João —Cap. 7
De Deus (έκ του Θεού). Melhor, da parte de, procedente de dentro de.

De mim mesmo (απ’ εμαυτοΰ). De mim mesmo é equivocado, comumente en­


tendido com o sentido de concernente a mim mesmo. Na rv, corretamente, da parte
de mim mesmo; na n v i , porvmm mesmo; sem união com o Pai. Compare com 5.30.

18. Sua própria glória (την δόξαν την ίδιαν). Literalmente, a glória que é dele
mesmo-, o segundo artigo lança dele mesmo em contundente contraste com da­
quele que o enviou. Acerca de dele mesmo, vide nota sobre At 1.7; Mt 22.5; 25.15.

Daquele (ουτος). Observe o uso característico da contração do pronome para


salientar e enfatizar o sujeito principal da sentença.

Injustiça (άδικία). Vide nota sobre 2Pe 2.13.

19. Deu (δεδωκεν). Alguns textos apresentam o tempo aoristo εδωκεν, caso em
que essa tradução é correta. Se, como outros, lemos o tempo perfeito, deveriamos
traduzir: não lhes tem dado Moisés a lei, que vocês ainda professam observar.

Observa (ποιεί). Na tb , corretamente, cumpre. Compare com fazer, no versí­


culo 17.

Procurais (ζητείτε). Tradução apropriada; contra a kjv, pretendeis.

20. Demônio (δαιμόνιον). Ou mais corretamente um demônio. Vide nota sobre


Mc 1.34. O nome foi aplicado a Jesus pela multidão (όχλος), não por aqueles a
quem Ele se dirige no versículo 19, por causa da obscura suspeita de que eles
achavam que Ele nutria, demonstrando a total ignorância do desígnio dos judeus
no qual Jesus penetrara. O mesmo termo foi usado para João Batista, o ascético,
como alguém que se afastou do convívio social (Mt 11.18).

21. Uma obra (εν εργον). A cura no sábado (vv. 1-8).

23. Indignai-vos (χολάτε). Somente aqui no texto do Novo Testamento. De


χολή, rancor. Estritamente, o verbo tem o sentido de cheio de hile, daí ser melan­
colia louca.

De todo (δλον υγιή). O sentido estrito é tornei um homem todo são, em con­
trapartida ao ritual da circuncisão, que afeta um único membro, mas que, não
obstante, eles praticavam no sábado.
130
João - Cap. 7
24. Aparência (δψιν). Originalmente, vendo ou vista. Em 11.44; Ap 1.16, rosto,
daí aparência externa. A palavra ocorre somente nas três passagens mencionadas.

Reta justiça (την δικαίαν KpíoLv). Apropriadamente, a reta justiça; que é


apropriada para o caso em questão.

25. Dos de Jerusalém (Ίεροσολυμιτών). Literalmente, dos hierosolomitas, que


conheciam melhor que a multidão os desígnios do sacerdócio. A palavra ocorre
aqui e em Mc 1.5.

26. Sabem, verdadeiramente, os príncipes? A partícula interrogativa μήιτοτε


pode ser traduzida pela expressão familiar eles não sabem, sabem? A nvi traduz:
será que as autoridades etc. Defato (αληθώς); de forma literal, verdadeiramente.

[Ό verdadeiro 3 Cristo (αληθώς). Conforme a kjv. No ntia (cp. tm ), realmente.


Omita, como na arc.

27. Todavia (άλλα). Mas, não pode ser que os príncipes tenham feito essa desco­
berta, pois sabemos de onde esse homem é.

Sabemos (οΐδαμεν). O conhecimento dos príncipes é expresso por εγνωσαν;


eles averiguaram por meio da pesquisa e da observação. O conhecimento do povo,
οΐδαμεν, é essa convicção estabelecida.

De onde (ττόθεν). Referindo-se a seu parentesco e família.

Ninguém saberá de onde ele é. As opiniões divergem quanto à referência


precisa dessas palavras. Alguns as explicam por meio de uma ideia popular de
que o Messias só seria conhecido quando fosse ungido por Elias, que apareceria
de repente. Outros se referem a Is 53.8 ou a Dn 7.13. Meyer diz que apesar de
a crença popular de que a descendência imediata do Messias seria desconhecida
quando Ele viesse não poder mais ser provada historicamente, ela é crível, em
parte a partir da crença em sua origem divina e, em parte, a partir da obscuridade
em que a família davídica tinha sucumbido.

28. Pois (οΰν). A TB usa corretamente então, dando o motivo para as palavras
subsequentes na emoção despertada em Jesus pela concepção errônea do povo.

Clamava (εκραξεν). Vide nota sobre Mc 5.5; 9.24.

Ensinando (διδάσκων). Essa é a melhor tradução. A expressão clamava en­


sinando sugere falar de maneira particularmente solene e com elevação da voz.
131
J oão - Cap. 7
Me —de onde sou. Reconhecendo a verdade da declaração do povo do versícu­
lo 27, sabemos de onde este é no diz respeito a sua pessoa exterior e sua origem ter­
rena. Ele prossegue para mostrar que eles ignoravam seu relacionamento divino.

Verdadeiro (αληθινός). Verdadeiro ao ideal de quem envia: um remetente ge­


nuíno no mais alto sentido do termo. Vide nota sobre 1.9.

29. Dele (παρ’ αύτοΰ). Vide nota sobre 6.46.

30. Pois. Outra das frequentes circunstâncias em que a versão da k j v desse


Evangelho traduz a partícula lógica como partícula de tempo. Deve-se traduzir
como a a r c , pois, por causa de sua afirmação de ser enviado de Deus.

Prendê-lo (πιάσαι). Vide nota sobre At 3.7.

31. Fará (μήτι ποίησα). Literalmente, certamente ele nãofará de maneira alguma.

32. Servidores (ύπηρετας). Vide nota sobre Mt 5.25; Lc 1.2.

33. Disse-lhes. Omita, como na bj, teb, bp.

Vou (υπάγω). Partirei. Vide nota sobre 6.21.

34. Vós me buscareis. Não como agora, para debates ou violência, mas para ajuda.

Aonde eu estou. No ser absoluto e eterno e em comunhão com o Pai. Eu sou


(εγώ ε’ιμί) é a fórmula da existência divina (8.58). A frase carrega um indício da
natureza essencial de Jesus e, assim, prepara o caminho para o vós não podeis vir
{vide nota sobre v. 7). A diferença de caráter torna isso essencialmente impossível.

35. Irá este (ούτος μέλλει πορεύεσθαι). Literalmente, aonde este homem pretende
ir, ou aonde ele está pensando em ir? Como na kjv, a bj {irá ele) perde a insinuação
desdenhosa de este homem (n v i ; ara , teb , entre outras, este).

[N ós] o não acharemos (ημείς). Conforme a k j v ; omitido na a r c . O pronome


é enfático: nós, os líderes religiosos, os sábios, que examinam as declarações de
todos os mestres professos e mantêm um olhar vigilante em todos os impostores.

Dispersos entre os gregos (την διασποράν των Ελλήνων). Literalmente,


a dispersão dos gregos. Os judeus que ficaram em terras estrangeiras depois do
retorno do cativeiro eram chamados por dois nomes: 1. O Cativeiro, expresso
132
J oão - Cap. 7
era grego por três palavras, a saber, αποικία, assentado m u ito d ista n te d e casa , que
não ocorre no texto do Novo Testamento; μετοικεσία, m udança de dom icílio , en­
contrada em Mt 1.11,12,17 e sempre com o sentido de ser deportado para a
Babilônia; αιχμαλωσία, p e g a r na p o n ta d a lança, Ef 4.8 (“levou cativo o cativeiro”);
Ap 13.10. 2. A D ispersão (διασπορά). Vide nota sobre lPe 1.1; Tg 1.1. O primeiro
nome marca a relação deles com sua própria terra; a segunda , com as terras
estrangeiras.

Os gregos ("Ελληνας). Literalmente. Vide nota sobre At 6.1.

36. Que palavra é esta (τις εστιν ουτος ό λόγος)? Essa é a tradução mais sim­
ples e literal. Como a k j v , Q ue tip o d e declaração é esta, outras versões fogem a esse
critério ( a r a , b j , t e b , b p ).

37. No último dia. O oitavo dia, o encerramento de toda a festa, e observado


como sábado (Lv 23.36). Era chamado o d ia do g ra n d e lo u vo r porque era feito um
circuito de sete voltas em torno do altar com “Hosanas”; também era o d ia de
ramos e o d ia de bater os ram os porque todas as folhas eram arrancadas dos galhos
e os ramos de palma e r a m f e ito s e m pedaços ao bater do lado do altar. Toda ma­
nhã, depois do sacrifício, o povo, conduzido pelo sacerdote, retornava à fonte de
Siloé, onde o sacerdote enchia um jarro de ouro e levava para o templo em meio
à música e aos gritos de alegria. Avançando para o altar de oferta queimada, ao
clamor do povo: “Levanta a tua mão!”, ele esvaziava o jarro em direção ao oeste
e um cálice de vinho em direção ao leste, enquanto o povo entoava: “E vós, com
alegria, tirareis águas das fontes da salvação”. Não é certeza se essa libação era
feita no oitavo dia, mas não pode haver dúvida de que as palavras seguintes do
Senhor se referiam a essa cerimônia.

Pôs-se em pé (ε'ιστήκει). O imperfeito, estava postando-se, assistindo a ceri­


mônia. A a r c {pôs-se e m p e ) e a r a (levantou-se) perdem esse toque vivido; assim
também a b j , t e b , b p . Compare com o n t i a .

38. Diz a Escritura. Não há uma passagem exatamente correspondente, mas a


citação harmoniza com o teor geral de diversas passagens, como Is 55.1; 53.11;
Zc 13.1; 14.8; Ez 47.1; J1 3.18.

Ventre (κοιλίας). A palavra, com frequência, é usada no Antigo Testamento


para o âm ago do homem, a alm a ou coração. V ideJó 15.35; 32.19; Pv 18.8; 20.27,30.
O ritual de retirar e derramar a água remonta ao ferir a rocha no deserto. Em
Êx 17.6, “Dela sairão águas” literalmente é “sairão águas d e dentro d e l a . Aqui,
133
João - C ap. 7

a palavra ventre tem o sentido do recôndito do coração do crente, que derrama


refrigério espiritual. Compare com lCo 10.4; Jo 4.14.

Correrão (ρεύσουσιν). A palavra ocorre somente aqui no texto do Novo Tes­


tamento.

Rios. Um tipo de abundância. Compare com Nm 20.11.

Água viva. Compare com 4.10.

39. Do Espírito. O Espírito Santo pessoalmente.

O Espírito Santo (nveOpa άγιον). Os melhores textos omitem άγιον, santo,


e o artigo definido não está no texto, de m odo que a tradução estrita é apenas
espírito. Literalmente, espírito ainda não estava. Dado, na arc e n v i , é acrescentado
para proteger contra uma possível compreensão errônea, em que, como Alford
observa, “nenhum leitor inteligente poderia cair”. A palavra espírito, permane­
cendo, assim, sozinha, marca não o Espírito pessoal, mas sua operação, dom ou
manifestação. O Cônego Westcott diz corretamente: “É impossível não contrastar
o caráter misterioso dessa declaração com o claro ensinamento do próprio João
sobre a ‘unção’ de crentes (lJo 2.20ss.), o qual compõe um comentário, adquirido
por experiência posterior, sobre as palavras do Senhor”.

Sido gloriíicado (έδοξάσθη). Temos aqui um dos termos característicos de


João, mesmo porque a ideia é essencial para seu Evangelho - anuncia Jesus como
a glória de Deus manifestada (1.14). O início dos milagres de nosso Senhor foi
uma manifestação de sua glória (2.11). Sua glória era a expressão da vontade
do Pai (8.54). Por meio de sua obra, ele glorificou o Pai na terra (12.28; 17.4) e,
nisso, ele mesmo era glorificado (17.10). A doença e a ressurreição de Lázaro
aconteceram para a glória de Deus (l 1.4). A consumação de sua obra foi marca­
da pelas palavras: “Agora, é glorificado o Filho do Homem, e Deus é glorificado
nele” (13.31). Ele tinha sua glória com o Pai antes do mundo ser (17.5). Ela é
consumada com sua ascensão (7.39; 12.16). A paixão é o caminho para a glória
(12.23-24; 13.31). A fecundidade de pessoas que creem nele é para a glória de
Deus (15.8), e o oficio do Espírito é glorificar a Cristo (16.14).

40. Muitos. Os melhores textos omitem. Leia, como na n v i : alguns.

Essa palavra (τον λόγον). Os melhores textos substituem por τών λόγων
τούτων, essas palavras. Como na ara , estas palavras.
134
João - Cap. 7
O Profeta. Vide nota sobre 1.21.

41. Vem, pois, o Cristo etc. (μή γάρ ò Χριστός). A a r c apresenta melhor a força
da partícula interrogativa com γάρ, pois. Na r v , Pois que, o Cristo vem etc. A ideia
completa é: “Você não pode (μή) dizer aquilo, pois (γάρ), o Cristo etc.”.

Vem (έρχεται). O tempo presente, corretamente apresentado pela a r c .

48. Havia dissensão (σχίσμα έγένετο). A b j traduz mais corretamente: “Produ­


ziu-se uma cisão”; na rv, “levantou-se uma divisão”. Vide nota sobre 1.3.

44. Queriam prendê-lo (ήθελον πιάσαι). Vide nota sobre 7.17. Estavam dispos­
tos ou queriam levá-lo. A arc traduz m ais apropriadam ente que a k j v , que traz:
teriam levado.

46. Como este homem. Alguns dos melhores textos omitem.

47. Enganados (πεπλάνησθε). Na rv, desviados. Vide nota sobre o versículo 12.

48. Dos principais ou dos fariseus. A ordem grega, seguida pela a r c , é mais
sugestiva: Creu nele, porventura, algum dos principais ou dosfariseus (a fim de recor­
rer a um círculo mais abrangente)?

49. Esta multidão (ò όχλος ουτος). E ssa é a m elhor tradução, multidão, quando
Vide n ota sobre 1.19.
contrastada com o s ju d eu s ortod oxos.

Maldita. Como exemplos de declarações rabínicas concernentes a essa categoria


podem ser citadas as expressões vil, pessoa da terra, e o dito: “O ignorante é ímpio;
apenas o instruído terá participação na ressurreição”. Ainda mais abusivo e abominá­
vel é este: “Ele não deve tomar uma filha do povo da terra porque elas são abomina-
ção, e suas esposas são abominação, e isso é dito em relação a suas filhas, Dt 27.21”!

50. O que de noite fora ter com Jesus (ò έλθών νυκτος προς αύτόν). Os tex­
tos variam, quer substituindo πρότερον, antes, primeiro, por νυκτος, de noite, quer
omitindo a oração toda e apresentando: Nicodemos, que era um deles, disse-lhes.

51. Um homem (τον άνθρωπον). Literalmente, o homem, independentemente de


quem ele seja, que vem diante deles.

Sem primeiro o ouvir (εάν μή άκούση παρ’ αύτοϋ). A nvi traduz mais correta­
mente: semprimeiro ouvi-lo. Ouvi-lo é uma tradução inadequada para παρ’ αύτοδ,
135
João - Cap. 7

a palavra ventre tem o sentido do recôndito do coração do crente, que derrama


refrigério espiritual. Compare com lCo 10.4; Jo 4.14.

Correrão (peóoowiv). A palavra ocorre somente aqui no texto do Novo Tes­


tamento.

Rios. Um tipo de abundância. Compare com Nm 20.11.

Água viva. Compare com 4.10.

89. Do Espírito. O Espírito Santo pessoalmente.

O Espírito Santo (ττνεΰμα άγιον). Os melhores textos omitem άγιον, santo,


e o artigo definido não está no texto, de modo que a tradução estrita é apenas
espírito. Literalmente, espírito a in d a não estava. D ado, na a r c e n v i , é acrescentado
para proteger contra uma possível compreensão errônea, em que, como Alford
observa, “nenhum leitor inteligente poderia cair”. A palavra espírito, permane­
cendo, assim, sozinha, marca não o E sp írito pessoal, mas sua operação, dom ou
manifestação. O Cônego Westcott diz corretamente: “É impossível não contrastar
o caráter misterioso dessa declaração com o claro ensinamento do próprio João
sobre a ‘unção’ de crentes (1Jo 2.20ss.), o qual compõe um comentário, adquirido
por experiência posterior, sobre as palavras do Senhor”.

Sido glorificado (έδοξάσθη). Temos aqui um dos termos característicos de


João, mesmo porque a ideia é essencial para seu Evangelho - anuncia Jesus como
a glória de Deus manifestada (1.14). O início dos milagres de nosso Senhor foi
uma manifestação de sua glória (2.11). Sua glória era a expressão da vontade
do Pai (8.54). Por meio de sua obra, ele glorificou o Pai na terra (12.28; 17.4) e,
nisso, ele mesmo era glorificado (17.10). A doença e a ressurreição de Lázaro
aconteceram para a glória de Deus (11.4). A consumação de sua obra foi marca­
da pelas palavras: “Agora, é glorificado o Filho do Homem, e Deus é glorificado
nele” (13.31). Ele tinha sua glória com o Pai antes do mundo ser (17.5). Ela é
consumada com sua ascensão (7.39; 12.16). A paixão é o caminho para a glória
(12.23-24; 13.31). A fecundidade de pessoas que creem nele é para a glória de
Deus (15.8), e o ofício do Espírito é glorificar a Cristo (16.14).

40. Muitos. Os melhores textos omitem. Leia, como na n v i : alguns.

Essa palavra (tòv λόγον). Os melhores textos substituem por των λόγων
τούτων, essas palavras. Como na ara , estas palavras.
134
João - C ap. 7

O Profeta. Vide nota sobre 1.21.

41. Vem, pois, o Cristo etc. (μη γάρ ò Χριστός). A a r c apresenta melhor a força
da partícula interrogativa com γάρ, pois. Na r v , Pois que, o Cristo vem etc. A ideia
completa é: “Você não pode (μή) dizer aquilo, pois (γάρ), o Cristo etc.”.

Vem (φ χ ιτ α ι). O tempo presente, corretamente apresentado pela arc.

43. Havia dissensão (σχίσμα έ γ έΐΐτ ο ). A b j traduz m ais corretam ente: “Produ­
ziu-se uma cisão”; na rv, “levantou-se uma divisão”. Vide nota sobre 1.3.

44. Queriam prendê-lo (ήθελον πιάσαι). Vide nota sobre 7.17. Estavam dispos­
tos ou queriam levá-lo. A a r c traduz m ais apropriadam ente que a k j v , que traz:
teriam levado.

46. Como este homem. Alguns dos melhores textos omitem.

47. Enganados (ττεπλάνησθε). N a rv, desviados. Vide nota sobre o versículo 12.

48. Dos principais ou dos fariseus. A ordem g rega, seguida pela a r c , é m ais
sugestiva: Creu nele, porventura, algum dosprincipais ou dosfariseus (a fim de recor­
rer a um círculo m ais abrangente) ?

49. Esta multidão (ò όχλος ουτος). E ssa é a m elhor tradução, multidão, quando
Vide n o ta sob re 1.19.
contrastada com o s ju d eu s o rtod oxos.

Maldita. Como exemplos de declarações rabínicas concernentes a essa categoria


podem ser citadas as expressões vil, pessoa da terra, e o dito: “O ignorante é ímpio;
apenas o instruído terá participação na ressurreição”. Ainda mais abusivo e abominá­
vel é este: “Ele não deve tomar uma filha do povo da terra porque elas são abomina-
ção, e suas esposas são abominação, e isso é dito em relação a suas filhas, Dt 27.21”!

50. O que de noite fora ter com Jesus (ò έλθών νυκτός προς αυτόν). O s te x ­
tos variam , quer su b stitu in d o π ρ ό τ φ ο ν , antes, primeiro, por νυκτός, de noite, quer
om itindo a oração toda e apresentando: Nicodemos, que era um deles, disse-lhes.

51. Um homem (τον άνθρωπον). Literalmente, o homem, independentemente de


quem ele seja, que vem diante deles.

Sem primeiro o ouvir (èàv μή άκούση παρ’ αύτοϋ). A n v i t r a d u z m a i s c o r r e t a ­


m e n t e : sem primeiro ouvi-lo. Ouvi-lo é u m a t r a d u ç ã o i n a d e q u a d a p a r a παρ’ αύτοϋ,

135
J oão - Cap. 7
a palavra ventre tem o sentido do recôndito do coração do crente, que derrama
refrigério espiritual. Compare com lCo 10.4; Jo 4.14.

Correrão (peúoouoiv). A palavra ocorre somente aqui no texto do Novo Tes­


tamento.

Rios. Um tipo de abundância. Compare com Nm 20.11.

Água viva. Compare com 4.10.

89. D o Espírito. O Espírito Santo pessoalmente.

O Espírito Santo (πνεύμα άγιον). Os melhores textos omitem άγιον, santo,


e o artigo definido não está no texto, de modo que a tradução estrita é apenas
espírito. Literalmente, espírito ainda não estava. Dado, na a r c e n v i , é acrescentado
para proteger contra uma possível compreensão errônea, em que, como Alford
observa, “nenhum leitor inteligente podería cair”. A palavra espírito, permane­
cendo, assim, sozinha, marca não o Espírito pessoal, mas sua operação, dom ou
manifestação. O Cônego Westcott diz corretamente: “É impossível não contrastar
o caráter misterioso dessa declaração com o claro ensinamento do próprio João
sobre a unção’ de crentes (1Jo 2.20ss.), o qual compõe um comentário, adquirido
por experiência posterior, sobre as palavras do Senhor”.

Sido glorificado (έδοξάσθη). Temos aqui um dos termos característicos de


João, mesmo porque a ideia é essencial para seu Evangelho —anuncia Jesus como
a glória de Deus manifestada (114). O início dos milagres de nosso Senhor foi
uma manifestação de sua glória (2.11). Sua glória era a expressão da vontade
do Pai (8.54). Por meio de sua obra, ele glorificou o Pai na terra (12.28; 17.4) e,
nisso, ele mesmo era glorificado (17.10). A doença e a ressurreição de Lázaro
aconteceram para a glória de Deus ( 11.4). A consumação de sua obra foi marca­
da pelas palavras: “Agora, é glorificado o Filho do Homem, e Deus é glorificado
nele” (13.31). Ele tinha sua glória com o Pai antes do mundo ser (17.5). Ela é
consumada com sua ascensão (7.39; 12.16). A paixão é o caminho para a glória
(12.23-24; 13.31). A fecundidade de pessoas que creem nele é para a glória de
Deus (15.8), e o ofício do Espírito é glorificar a Cristo (16.14).

40. Muitos. Os melhores textos omitem. Leia, como na n v i : alguns.

Essa palavra (tòv λόγον). Os melhores textos substituem por των λόγων
τούτων, essas palavras. Como na a r a , estas palavras.
134
João - Cap. 7
O Profeta. Vide nota sobre 1.21.

41. Vem, pois, o Cristo etc. (μή γάρ ò Χριστός). A arc apresenta melhor a força
da partícula interrogativa com γάρ ,pois. Na rv, Pois que, o Cristo vem etc. A ideia
completa é: "Você não pode (μή) dizer aquilo, pois (γάρ), o Cristo etc.”.

Vem (epxeiai). O tem p o p resente, co rretam en te apresentado pela arc .

43. Havia dissensão (σχίσμα ύγένβτο). A b j traduz mais corretamente: “Produ­


ziu-se uma cisão”; na r v , “levantou-se uma divisão”. Vide nota sobre 1.3.

44. Queriam prendê-lo (ήθ€λον ττιάσαι). Vide nota sobre 7.17. Estavam dispos­
tos ou queriam levá-lo. A arc traduz m ais apropriadam ente que a kjv, que traz:
teriam levado.

46. Como este homem. Alguns dos melhores textos omitem.

47. Enganados (ne· πλάνησθ€). Na r v , desviados. Vide nota sobre o versículo 12.

48. Dos principais ou dos fariseus. A ordem grega, seguida pela arc, é mais
sugestiva: Creu nele, porventura, algum dos principais ou dosfariseus (a fim de recor­
rer a um círculo mais abrangente) ?

49. Esta multidão (ô όχλος ούτος). Essa é a melhor tradução, multidão, quando
contrastada com os judeus ortodoxos. Vide nota sobre 1.19.

Maldita. Como exemplos de declarações rabínicas concernentes a essa categoria


podem ser citadas as expressões vil, pessoa da terra, e o dito: “O ignorante é ímpio;
apenas o instruído terá participação na ressurreição”. Ainda mais abusivo e abominá­
vel é este: “Ele não deve tomar uma filha do povo da terra porque elas são abomina-
ção, e suas esposas são abominação, e isso é dito em relação a suas filhas, Dt 27.21”!

50. O que de noite fora te r com Jesus (ò έλθών νυκτος προς αυτόν). Os tex­
tos variam, quer substituindo πρότφον, antes, primeiro, por νυκτος, de noite, quer
omitindo a oração toda e apresentando: Nicodemos, que era um deles, disse-lhes.

51. Um homem (τον άνθρωπον). Literalmente, o homem, independentemente de


quem ele seja, que vem diante deles.

Sem primeiro o ouvir (èàv μή άκοΰστ) παρ’ αύτοΰ). A n v i traduz mais correta­
mente: sem primeiro ouvi-lo. Ouvi-lo é uma tradução inadequada para παρ’ αύτοΰ,
135
JoÂo - Cap. 8

que significa, como apresenta a r v , de s i mesmo-, παρά, sugerindo além de, ou seja,
seu lado do caso.

52. Examina. Compare com 5.39.

Verás (ΐδε). Essa tradução requer que a palavra seguinte, ou, seja traduzida
por que, em vez de porque. Como na rv ; na kjv, observa. A diferença não é impor­
tante.

53. Esse versículo e a porção do capítulo 8, até o versículo 12, são, em geral, jul­
gados pelas melhores autoridades críticas como não pertencentes ao Evangelho
de João.

C apítulo 8

12. A luz do mundo (tò φως του κόσμου). Não λύχνος, um a candeia, como João
Batista (5.35). L u z é outro dos termos e idéias característicos de João que de­
sempenha um importantíssimo papel em seus escritos enquanto relacionados
com a manifestação de Jesus e sua obra para os homens. Ele vem de Deus, que é
a Luz (1Jo 1.5). “Nele, estava a vida e a vida era a lu z dos homens” (1.4). Antes da
encarnação, o Verbo estava entre os homens como luz (1.9; 9.5), e a luz veio com
a encarnação (3.19-21; 8.12; 12.46). Cristo é luz através da energia iluminadora
do Espírito (14.21,26; 16.13; lJo 2.20,27), recebida por meio do amor (14.22-23).
O objeto da obra de Cristo é transformar os homens em filhos da luz (12.36,46)
e dotá-los com a luz da vida (8.12).
No versículo 20, somos informados que Jesus disse essas palavras no lu g a r do
tesouro. Este ficava no pátio das mulheres, o lugar mais público do templo. Quatro
candelabros de ouro permaneciam lá, cada um com quatro tigelas de ouro, e cada
uma destas era enchida por um jovem descendente sacerdotal que retirava o óleo
de um jarro. Acendiam-nas na primeira noite da Festa dos Tabernáculos. Não é
improvável que eles sugerissem a figura do nosso Senhor, mas a própria figura
era conhecida da profecia e da tradição. De acordo com a tradição, Luz era um
dos nomes do Messias. Vide Is 9.1; 42.6; 49.6; 40.1-3; Mq 4.2; Lc 2.32.

Andará em trevas (περιπατήσει kv τή σκοτία). Essa frase é peculiar ao Evan­


gelho e à primeira epístola de João.

Terá (εξει). Não só a verá, mas também a possuirá. Daí os discípulos de Cris­
to serem a lu z d o m u n do (Mt 5.14). Compare com lu zes, ou propriamente
a stro s (φωστήρες), um nome aplicado aos crentes em Fp 2.15.

136
J oão - Cap. 8
13. Tu testificas de ti mesmo. Uma objeção técnica, evitando o verdadeiro
propósito da declaração de Jesus. Os escritos rabínicos declaravam que nenhum
homem podia testemunhar por si mesmo.

14. Ainda que (καν). Literalmente, mesmo se.

Sei (οίδα). Com clara consciência interior. Vide nota sobre 2.24.

De onde vim e para onde vou. Dois fatos essenciais do testemunho, a saber,
origem e destino. Conforme Lange: “A questão era sobre sua própria consciência
pessoal, da qual só ele mesmo podia testemunhar”. “Se o sol, ou o dia, pudesse
falar e dissesse: ‘Sou o sol!’; e recebesse a réplica: ‘Não, sua majestade é a noite,
pois você testemunha de si mesmo!’, como isso soaria? Argumente contra isto,
se puder82.

Nem para onde vou. Conforme os melhores textos, que trazem ή, ou, em lugar
de καί (“e para onde vou”).

16. Verdadeiro (άληθής). Porém, os melhores textos trazem αληθινή, verdade


para o ideal perfeito de julgamento.

17. Na vossa lei (ev tq> νόμω τω ύμετερορ). Literalmente, na lei, aquela que é vossa.
Vossa tem força enfática: da qual vocês alegam monopólio. Vide 7.49.

E stá [(...3 escrito (γεγραπται,). O tempo perfeito: tem sido escrito, e per­
manece escrito. A forma comum de citações em outras passagens, mas usada
por João em relação às Escrituras do Antigo Testamento somente aqui. Sua
forma usual é γεγραμμένον έστίν, o particípio com o verbo no infinito, lite­
ralmente, está sendo escrito.

O testem unho de dois homens. Vide D t 19.15.

18. De mim testifica - o Pai. Assim, há dois testemunhos, e a carta da lei é


cumprida.

19. Onde. O testemunho de uma testemunha não vista e não ouvida não os satisfaria.

20. O tesouro (γαζοφυλακ ίφ). De γάζα, tesouro, palavra persa de que há ape­
nas uma ocorrência no texto do Novo Testamento (At 8.27), e φυλακή, guar-

82. R erlen burg B ible apud Stier, W ords o f the L o r d Jesus.

137
J oão - Cap. 8
da. João só a usa aqui. O tesouro ficava no pátio das mulheres que não era
chamado assim por ser apropriado exclusivamente para a adoração das mu­
lheres, mas porque elas não tinham permissão para passar dali, exceto por
propósitos sacrificais. O pátio cobria um espaço superior de 18,58 metros
quadrados e havia treze baús em formato de trombeta contra as paredes,
rodeados por uma colunata, chamados de “trombetas” por causa do formato,
e os quais serviam para pôr contribuições de caridade. Esse pátio era a parte
mais pública do templo.

E ninguém o prendeu (καί oüòelç k v ia c e v αυτόν). Observe a ligação com a


sentença anterior pelo simples e, em que outro escritor diria “e contudo”·, sendo
o sentido de que, embora Jesus estivesse ensinando onde seria facilmente preso,
contudo, ninguém tentou prendê-lo. Vide nota sobre 1.10. P rendeu é uma tradu­
ção melhor, como em outras passagens, do que p ô s as m ãos nele (cp. k j v ; 7.30).
A inconsistência da k j v em traduções da mesma palavra, do que essa é apenas
uma das muitas ocorrências, merece observação aqui, a partir do fato de que nas
duas únicas passagens em que João usa a expressão lançou m ão dele (7.30; 7.44),
ele emprega a fórmula comum έπιβάλλ6ΐν τας χόίρας ou την χόίρα, e nessas duas
passagens a palavra πιάσαι é traduzida por pren der (cp. t e b ). O uso dessa última
palavra está restrito quase exclusivamente a João, enquanto há apenas três ocor­
rências em outras passagens (At 3.7; 12.4; 2Co 11.32).

21. Pois (οΰν). É uma tradução apropriada, ligando o fato de Jesus continuar a
falar em liberdade, sem ser preso.

Retiro-me (ύπάγω). R e tiro -m e da sua presença; esse sentido é enfatizado


pelas palavras seguintes: buscar-m e-eis. Ao expressar o afastamento de alguém
dos homens ou dos objetos à volta, podemos enfatizar apenas of a t o de rem over,
caso em que απέρχομαι, p a r tir , seria apropriado; ou podemos enfatizar o afas­
tamento como influenciando alguma relação da pessoa com aquela da qual ele
se afasta, como em 6.67, passagem em que Jesus diz aos discípulos: “Q uereis
vós tam bém re tira r-v o s” ou afa sta r-se de mim, caso em que υπάγω é a palavra
apropriada83.

No vosso pecado (èv xf| αμαρτία υμών). Vide nota sobre Mt 1.21. Observe
o singular, pecado, não pecados. Ele é usado coletivamente para expressar toda a
condição de alienação de Deus.

83. Contudo, e sto u inclinadoaa ch a r queadistinçãoe n tr e essasduase x p ressõ es e tam b ém d e sta s e


πορεύομαι, queoCônego Westcott alega serobservadoporJoão, nãoaguentamtantapressão.
Vide ocomentáriodelesobreJo 7.33.

138
João - Cap. 8
22. Matar-se a si mesmo (μήτι άποκτενει εαυτόν»)? A zombaria dessas palavras
é igualmente sutil e mordaz. A partícula interrogativa, μήτι, quer dizer com cer­
teza ele, de maneira alguma, matará a si mesma, e o sentido da oração toda é: ele,
com certeza, não irá onde nós não o possamos alcançar, a menos que, por acaso,
ele mate a si mesmo; e como isso garantiría sua ida para o Geena, claro que nós
não poderiamos segui-lo até lá. A declaração demonstra escárnio e farisaísmo
dos falantes.

23. Vós sois de baixo (εκ των κάτω έστε). Expressão peculiar a João e seu Evan­
gelho. Jesus afirma o antagonismo radical entre seus oponentes e Ele mesmo
como baseado em diferença de origem e natureza. Eles vêm da economia baixa,
sensual e terrena, e Ele, da celestial. Compare com Tg 3.15ss.

De cima (εκ των άνω). Também peculiar ao Evangelho de João. Compare com
Cl 3.1. Acerca da expressão ser de (είναι έκ), vide nota sobre 1.46.

Vós sois deste mundo (εκ του κόσμου τούτου εστε). Peculiar a João e ocorre
na primeira epístola dele. Acerca de κόσμος, mundo, vide nota sobre 1.9. Vocês são
desta ordem, ou economia, terrena.

24. Eu sou (εγώ είμι). Algumas versões incluem ele, mas não consta do texto.
Ao reter isso, temos, sou o Messias. Mas as palavras, no entanto, são a expressão
de seu ser divino absoluto, como no versículo 58: “Se não crerdes que eu sou.
Vide Dt 32.39; Is 43.10; e compare com os versículos 28 e 58 deste capítulo e
com 13.19.

25. Isso mesmo que já desde o princípio vos disse (την αρχήν ó τι καί λαλώ
ύμιν). Passagem muito difícil em relação à qual os comentaristas são quase ir­
remediavelmente divididos. Há duas categorias principais de interpretação. De
acordo com uma delas, deve-se entender como uma interrogação-, segundo a ou­
tra, como uma afirmação. Os dois representantes principais da primeira categoria
são Meyer, que traduz: “Vocês perguntam o que estou dizendo a vocês o tempo
todo (την αρχήν)?”; e Westcott: “Como é que tenho dito a vocês o tempo todo (τήν
άρχήν)”? Também Milligan e Moulton. A tradução desse último exige a mudan­
ça de ó τι, o relativo, o que, para a conjunção ότι, que.
A segunda categoria de intérpretes, que constrói a passagem de forma afir­
mativa, varia em sua explicação de τήν άρχήν, traduzindo essa expressão di­
versamente: tudo, em essência, acima de tudo, no início. Há uma terceira categoria
que considera τήν άρχήν como substantivo e explica segundo Ap 21.6: “Eu sou
o Princípio, o que estou dizendo a vocês”. Esse ponto de vista é representado prin-
139
JoAo - Cap. 8
cipalmente pelos comentaristas mais antigos, Agostinho, Bede, Lampe e, depois,
Wordsworth.
Adoto o ponto de vista de Alford, que traduz por essencialmente, explicando
como em g e ra l ou traçado a té seu p rin cíp io (άρχή). Matizadas a partir dessa estão
Godet, absolutamente, Winer, do começo ao fim , Thayer, totalm ente ou precisam ente.
Traduzo: S ou essencialmente aquele que a in d a f a l a a vocês. Se aceitarmos a explica­
ção de sou, no versículo 24, como uma declaração do ser divino absoluto de Jesus,
essa ideia prepara o caminho para esta interpretação da resposta do Senhor para
a pergunta: Q uem és tu? Suas palavras são a revelação dele mesmo. Segundo Go­
det: “Ele recorre ao seu próprio testemunho como a expressão adequada de sua
natureza. Eles têm apenas de entender a fundo as séries de afirmações que ele
faz a respeito de si mesmo e, dessa maneira, descobrirão uma análise completa
de sua missão e essência"8'1'.

26. Muito tenho etc. A ligação do pensamento parece ser como segue:

Sou tal como minhas palavras mostramquesou, devodeclarar toda amensagemdele


emvirtude da minha união essencial comaquele comquemfalo. Muitas coisas tenho
adeclarar ejulgar, e vocês voltamouvidos surdos para elas; não obstante, devo falar
toda averdade, as coisas que ouvi deleque me enviou eéverdadeiro.

Falo ao mundo (λέγω εις τον κοσμόν). Os melhores textos trazem λαλώ, que
não enfatiza o que Cristo diz (o que seria λέγω), mas o f a to d e Ele falar. Vide nota
sobre Mt 28.18. O uso da preposição elç, aqui, é peculiar. Literalmente, “Falo
dentro do mundo”; portanto, minhas palavras podem alcançar o mundo e se es­
palhar por ele. Para uma construção semelhante, vid e lTs 2.9; 4.8; Hb 2.3. Como
Sófocles, quando Electra diz: κήρυσσέ μ’ elç απαντας, anuncie-m e a todos, para que
meu relato possa alcançar todos os ouvidos85.

27. Entenderam (’έγνωσαν). Perceberam, como na t b .

84. Estou consciente da objeção dessa tradução baseada no cânon de que την αρχήν temesse
sentido apenas emsentenças negativas, objeçãoessaque, semdúvida, nãoéevitada pelaten­
tativa deGodet de explicar essapassagemcomo essencialm ente negativa. Mas essa regra não
éabsolutamente universal ( v id e Thayer, Lexicon, άρχή, 1, b.), e essaexplicaçãoparece-me, no
todo, concordarmelhorquequalqueroutracomosentidogeral dapassagemcomoaentendo.
SemprerelutoemdiferirdoCônegoWestcott, massemchegarapontodedizer, comoAlford,
que sua interpretaçãoé não gram atical; devoconfessar que ela me pareceartificial e forçada,
comotambématraduçãodeMeyer, queestáabertaasériascríticasemrelaçãoaofundamento
nagramática. O estudanteencontraráasdiferentesinterpretaçõesbemresumidaseclassifica­
das emSchaflf, Lange’s Commentary, eaindamais resumidana“Nota Adicional” deWestcott
sobreocapítulo 8. Vide tambémMeyer.
85. Sófocles, Electro, 606.

140
J oão - Cap. 8
Ele [...] falava. O imperfeito. Estavafalando seria muito melhor.

28. Levantardes. Vide nota sobre 3.14.

Conhecereis (yiOÓoeoGe). Traduza aqui, como também no versículo 27, por


perceber (cp. b v ).

Eu sou. Como no versículo 24, sobre o que vide nota.

Por mim mesmo (άττ’ έμαυχοΰ). Na t b , de mim mesmo. Propriamente, da parte


de mim mesmo, como na r v , em 7.17, mas não aqui. Vide nota sobre 7.17.

Ensinou (έδίδαξεν). Essa é a tradução mais correta. O tempo aoristo, concer­


nente ao ensino como um único ato. Compare com ηκουσα, ouvi, 3.32.

Falo (ταϋτα λαλώ). Não equivale a. portanto falo (ou seja, como o Pai me ensi­
nou), mas a uma declaração absoluta em relação a essas revelações que apresenta
aqui.

29. O Pai. Os melhores textos omitem.

Só. Vide versículo 16.

O que lhe agrada (xà àpeoxà αύχώ). Literalmente, como na t b , as coisas que
são do seu agrado. Sempre (uávxoxe) encerrando as sentenças, é enfático. A santa
atividade de Jesus é habitual e contínua. Vide 4.34.

30. Creram (emoxeuoau elç). Vide nota sobre 1.12, e compare com criam nele,
versículo 31.

31. Criam nele (iteinoxeuKÓxaç αύχφ). Observe a frase diferente, distinguindo os


judeus da companhia mista, do versículo 30 (creram acerca dele).

Se vós permanecerdes (kàv òpelç peívqxe). A ênfase está no vós, dirigido


àqueles cuja fé era rudimentar, que acreditavam nele, mas ainda não criam a res­
peito dele.

Na minha palavra (év xqj λόγω χφ 4μώ). Literalmente, na palavra que é minha·,
peculiarmente minha, característica de mim. A expressão, de forma intencional, é
mais forte que minha palavra. Compare com meu amor (15.9).
141
J oão - C ap . 8

Verdadeiramente (αληθώς). Literalmente. Como aqueles que creem em mim,


não como aqueles que são movidos pelo entusiasmo temporário a admitir minhas
afirmações.

33. Nunca servimos a ninguém (δεδουλεύκαμεν πώποτε). A r v traduz melhor: em


tempo algum temos estado em escravidão, fornecendo, assim, a força do tempo perfei­
to, nunca até agora, e de πω, ainda. A luz das promessas feitas a Abraão, Gn 17.16;
22. 17-18, os judeus reivindicam não só liberdade, mas também domínio sobre as
nações. Em sua réplica a Jesus, eles também ignoram a escravidão egípcia, babi­
lônia e síria, por meio das quais a nação passou sucessivamente, como também
sua sujeição atual a Roma, tratando-as como meras servidões que, embora fossem
reais, não era servidão por direito nem servidão à qual tenham se submetido de boa
vontade e, por isso, não seria servidão em algum sentido verdadeiro. Além do fato
de que suas palavras foram o pronunciamento de forte paixão, deve-se lembrar que
os romanos, por motivos políticos, tinham lhes concedido a aparência de indepen­
dência política. Como em tantos outros casos, eles ignoraram a relevância mais
alta das palavras de Jesus e fundamentaram sua réplica na tecnicidade. Esses são
os mesmos judeus que criam nele (v. 31). Stier comenta: “Esses crentes fracos logo
desistiram de sua fé”. Assim, a sugestão da possível inconstância de sua fé, trans­
mitida nas palavras do Senhor: Se vós permanecerdes na minha palavra, é justificada.

34. Todo aquele que comete (πας ό ποιων). Tradução mais correta; contra a
kjv , qualquer que comete.

Pecado (την αμαρτίαν). O artigo definido, o pecado, mostra que Jesus não se
refere apenas a um único ato, mas a uma vida de pecado. Compare com lJo 3.4-8,
e pratica a verdade (Jo 3.21); pratica ajustiça (1 Jo 2.29).

Servo (δούλος). Ou um servo. Escravo é apropriado. Vide nota sobre Mt 20.26.

Do pecado. Algumas poucas autoridades omitem e leem: todo aquele que comete
pecado é um escravo. Compare com Rm 6.17,20.

35. Não fica para sempre em casa. O escravo não tem lugar permanente na casa.
Ele pode ser vendido, trocado ou expulso. Compare com Gn 2 1.10; G1 4.30. Casa.
VideYib 3.6; Jo 14.2. O filho mais velho da parábola do filho pródigo (Lc 15.29)
nega sua filiação com as palavras: “Eis que te sirvo (δουλεύω) há tantos anos”.

36. Verdadeiramente (όντως). Usado somente aqui por João. Quer dizer essen­
cialmente.
142
J oão - C ap . 8

37. Não entra (ού χωρει). Na rv, não tem livre acesso, ou não abre caminho. Esta tradu­
ção está em harmonia com os versículos 3 0 e 3 1 , concernentes àqueles que creram,
mas não criam nele, e que, por meio de sua resposta indiganada, no versículo 3 3 ,
demonstraram que a palavra de Jesus não fizera progresso neles. A tradução da kjv,
não tem lugar, não é sustentada pelo uso, embora Field (Otium Norvicense) cite um
exemplo incontestável desse sentido nas epístolas de Alcifron, escritor pós-cristão,
que relata a história de um parasita que retorna depois de se fartar em um banquete
e solicita que um médico administre um emético. O parasita, descrevendo o efeito
do remédio, diz que o médico se perguntava onde tal bagunça tivera lugar (εχώρησε).
Para a tradução da rv, compare com Aristófanes: πώς ούν ού χωρει τούργον; “Como
é isso de o trabalho nãofazer progresso?’*5. Plutarco, εχώρει διά τής πόλεως ό λόγος,
“apalavra (ou relato) anunciada (ou passada adiante) através da cidade”87.

38. Vistes. Os melhores textos apresentam ήκούσατε, ouvistes, como na teb.

39. Filhos (τέκνα). Vide nota sobre 1.12.

40. Homem (άνθρωπον). Usado somente aqui pelo Senhor a respeito de si


mesmo. A isso corresponde o fato de o Senhor chamar o diabo de homicida,
no versículo 44. Talvez também, conforme observa Westcott, possa sugerir
a ideia da solidariedade humana que ele, como homem, tem o direito de de­
clarar sobre eles.

Abraão não fez isso. Nas tradições orientais Abraão é mencionado como
“cheio de bondade amorosa”.

41. Vós fazeis. Ou estãofazendo.

Prostituição (πορνείας). De περνημι, vender.

42. Saí - de Deus (εκ του Θεού εξήλθον). Como na t e b . A expressão ocorre
somente aqui e em 16.28. Έξελθεΐν άπό é encontrado em 13.3; 16.30, e enfatiza
a ideia de separação; um vindo do Deus a quem Ele tem de retornar (e que ia para
Deus). Έξελθεΐν παρά (16.27; 17.8), está vindo dejunto de, sugerindo relação pes­
soal com Deus. Έξελθεΐν εκ, aqui, enfatiza a ideia de comunidade essencial de ser.
“Saí de dentro de”.

E vim (ήκω). E o mesmo que dizer: e aqui estou.

86. Aristófanes, A Paz, 472.


87. Plutarco, César, 712.
143
João - Cap. 8
De mim mesmo (άπ’ έμαυτοϋ). De minha própria autodeterminação indepen­
dente, mas meu ser é de origem divina. Vide nota sobre 2.17.

43. Linguagem - palavra (λαλιάν - λόγον). A primeira palavra refere-se àforma-,


e a última, ao conteúdo do discurso. Como Mt 26.73, passagem em que se diz o
seguinte a respeito de Pedro: “A tua fala (λαλιά) te denuncia”; o modo de falar. Se
eles tivessem entendido o conteúdo, teriam entendido a forma.

Não poderdes. Vide nota sobre 7.7.

44. Vós (ΰμεις). Enfático, em contraste com ημείς, nós, do versículo 41.

De vosso pai (εκ). Muito sugestivo, indicando comunhão de natureza, como no


versículo 42. Compare com lJo 3.8,10.

Ao diabo. Vide nota sobre Mt 4.1. João usa Satanás apenas uma vez no Evan­
gelho (13.27), com frequência em Apocalipse e nenhuma vez nas epístolas. Al­
guns críticos adotam a mesma tradução singular que, em grego, carrega o senti­
do: tendes por pai ao diabo, ou o vosso pai é o diabo ( t e b ). Isso é explicado acusando
João de gnosticismo e o fazendo se referir ao Demiurgo, ser misterioso e inferior
descendente de Deus e —de acordo com os gnósticos, por intermédio de quem
Deus criou o universo - que se rebelou contra o Senhor e era pai de Satanás. Só
é necessário declarar com Meyer que essa percepção é não bíblica e não joanina.

Desejos (επιθυμίας). Vide nota sobre Mc 4.19.

Quereis satisfazer (θέλετε ποιεΐν). Apropriadamente, vós quereisfazer. Vide


nota sobre 7.17.

Homicida (άνθρωποκτόνος). Literalmente. Somente aqui e em lJo 3.15. De


άνθρωπος, homem, e κτείνω, matar. O epíteto é aplicado a Satanás não com refe­
rência ao assassinato de Abel, mas ao fato de ele ser o autor da morte para a raça
humana. Compare com Rm 7.8,11; Hb 2.14.

Desde o princípio. Da raça humana.

Não se firmou (ούκ εστηκεν). Pode-se explicar isso de duas maneiras. O verbo
pode ser tomado como tempo perfeito deioxrpi, a forma para o tempo presente
no português, firmo-me. Nesse caso, descrevería a permanência atual de Satanás
no elemento de falsidade: ~_elej não sefirmou na verdade. Ou pode ser tomado como
144
J oão - Cap. 8
o tempo imperfeito de στήκω, mantenho minhafirmeza, ou simplesmente firmo-me,
caso em que a forma seria εστηκεν e teria o sentido de que, mesmo antes de sua
queda, ele não era verdadeiro, ou não permaneceu verdadeiro para com Deus, mas
caiu. Meyer, que entende no primeiro sentido, observa: “Verdade é o domínio em
que ele não pisa, pois, para ele, essa é uma esfera estranha e heterogênea da vida.
C-d A mentira é a esfera em que ele mantém seu lugar”. Como Mefistófeles:

Sou oespírito
que estorva sempre. E comrazão, pois tudo
quanto nasceu mereceaniquilado;
portanto eramelhor não ter nascido.
Meu elemento éo quechamais vós outros
Destruição, Pecado, oMal, emsuma88.

Quando ele profere mentira (όταν λαλη το ψεύδος). Mais estritamente, sempre que
—a mentira, em contraposição à verdade, considerada como um todo. São fornecidas
duas interpretações. De acordo com uma, o diabo é o sujeito dafala; segundo a outra, o
sujeito é indefinido; “quando alguém profere”, afirmando uma proposição geral.

Lhe é próprio (εκ των ιδίων). Literalmente, das coisas que lhe são próprias.
Segundo Meyer: “Essa é mais peculiarmente sua natureza ética”.

Porque é mentiroso e pai da mentira (ότι ψεύστης έστί καί ò πατήρ αύτοΰ).
São fornecidas três interpretações. 1. A da arc e tb : “ê mentiroso e [(o]] pai da
mentira . 2. “Ele é mentiroso e o pai do mentiroso (uma vez que da mentira tam­
bém pode ser traduzido por dele)”. 3. Tornando ò πατήρ αύτοΰ, seu pai, o sujeito
da sentença, e remetendo do que a alguém, o sujeito indefinido do verbo proferir
(“quando alguém profere mentira”). Assim, a tradução deve ser: porque seu pai é
um mentiroso. Quanto ao curso do pensamento de Jesus - se aceitarmos alguma
das duas primeiras traduções -, ele volta-se para o caráter de Satanás. Depois de
afirmar que os judeus são filhos do Diabo, Jesus prossegue e descreve o demônio
como homicida e mentiroso e prolonga-se na última característica dizendo que
a falsidade é seu elemento natural e peculiar. Sempre que mente, ele fala de sua
própria natureza falsa, pois é um mentiroso e pai da mentira e do mentiroso. Se
aceitarmos a terceira tradução, o pensamento, antes, gira em torno do caráter dos
judeus como filhos de Satanás. Ele, primeiro, profere a acusação geral, vós tendes
por pai ao diabo e, como tal, farão as obras dele. Por isso, vocês são homicidas e
mentirosos. Ele é homicida, e vocês tentam me matar. Ele não permanece na ver­
se. Goethe, Fausto, tradução AntônioFelicianodeCastilho. Disponível em: <http://www.ebooks-
brasil.org/eLibris/faustogoethe.html>. Acesso em: 28 jun. 2018.

145
J oão - C ap. 8

dade nem a pratica; pois, quando fala uma mentira, ele fala de sua própria natu­
reza falsa, por meio de falsidade de direito de nascimento, pois seu pai também
é um mentiroso89.

45. Mas porque [eu] digo (εγώ δε ou). Opte pela tradução mas, em vez de e.
Você acreditaria em fa ls id a d e se eu falasse assim, mas, porque falo a verdade, você
não acredita. O eu é enfático (cp. tb ). E u, porque eu lh e digo etc.

46. Convence (ελέγχει,). V ide nota sobre 3.20. Na nvi, acusar.

Pecado (αμαρτίας). Não éf a l t a nem erro, mas pecado em geral, como em todas
as outras passagens do Novo Testamento.

A verdade (άλήθει,αρ). Sem o artigo, e, por essa razão, não toda a verdade, mas
aquilo que é verdade como qualquer parte da revelação divina.

47. Quem é de (ό ών έκ). A construção familiar. Vide nota sobre 1.46.

48. Não dizemos nós bem. Indicando uma abordagem atual. B em (καλώς), no
sentido literal, quer dizer fin am en te, belamente. Às vezes, com sentido irônico,
como em Mc 7.6.

És samaritano (Σαμαρείτης εΐ σύ). Literalmente, um sa m a rita n o és tu; com


ο σύ, tu, terminando a sentença com uma ênfase mordaz: tu, que professas essa
reverência por Deus e sua lei, és somente um samaritano, hostil à verdadeira lei
e ao reino de Deus.

49. Eu não tenho demônio. Ele ignora a acusação de ser samaritano, recusan­
do-se a reconhecer a distinção nacional. Por dem ônio, leia diabo.

50. Há quem a busque. Que busca minha honra e julga entre mim e meus
oponentes.
89. Adoto essa tradução, embora comalguma hesitação, como aque melhor representa o que me
parece ser alinha depensamento de toda a passageme aque evita amaioriadas dificuldades
gramaticais. 1.Emboragramaticalmentedefensável, necessitadatraduçãoumtantodesajeitada
deαυτούcomoneutro, por inferênciaouderivaçãodomasculinoψεύστης. E muitomais natural
tomá-lacomomasculino. As traduções 1e2exigemqueò πατήρsejaentendidocomoo predicado,
considerandoque, tendooartigo, serianaturalmentedeseesperarquefosseosujeito. Aprincipal
objeçãoàtradução3éaomissãodosujeitocomλαλη, oqueédifícil. OProfessorKendrick(edição
estado-unidensedeMeyer) citaφησί comoparaleloem2Co 10.10e, commuitajustiça, comenta
que, “seforpossívelfazeralgumaobjeçãocontraessaconstrução, elanãoseaproximaemdificul­
dadedaqueéfeitacontraό πατήραυτούcomopredicadonosentidocomumentedesignadopara
essaexpressão. ElaéadotadaporWestcott, MilliganeMoulton.
146
JoAo - Cap. 8

51. Guardar (τηρήση), Vide nota sobre lPe 1.4.

Palavra (λόγον). Essa tradução é melhor, e não ensinamentos como na ntlh.

Vide nota sobre o versículo 43.

Nunca verá a morte (θάνατον ού μή θεώρηση). A expressão θεωρείο θάνατον,


ver a morte, ocorre somente aqui no texto do Novo Testamento. A dupla negativa
quer dizer de modo algum, de jeito nenhum. Θεώρηση, verá, denotando visão ime­
diata, prolongada, é usado propositalmente porque a promessa contempla todo o
curso da vida do cristão em Cristo. Não é não morrer para sempre, mas viver para
sempre. O cristão entra nessa vida que, em essência, é a negação e a contradição
da morte, a partir do momento de sua união com Cristo e se move ao longo de todo
o curso, em tempo não menor que a eternidade, vendo apenas vida, e com as costas
voltadas para a morte. O reverso dessa verdade, em conexão com o mesmo ver­
bo, é dolorosamente sugestivo. A questão é pertinente porque os revisores man­
tiveram verá e não a substituíram por veja, como fizeram em muitas instâncias.

52. Agora. Olhar em retrospectiva para o versículo 48. Se fomos muito preci­
pitados na ocasião dizendo que você tem um demônio, agora, suas palavras nos
justificam plenamente. Eles entenderam que Jesus falava da morte natural.

Morreu (άπεθανε). Essa é a melhor tradução, referindo-se ao fato histórico.

Provará a morte. Eles mudam a forma da declaração de Jesus. O Senhor mesmo


provou a morte. Vide Hb 2.9. A expressão provará a morte não ocorre no Antigo Tes­
tamento, mas é comum nos escritos rabínicos. “O anjo da morte”, dizem os rabis, “ à
cabeceira da cama, segura a espada na mão, tendo na ponta gotas de fel. O homem
doente, espia esse anjo mortífero, abre a boca de medo; e, a seguir, aquelas gotas caem
nela, das quais uma o mata, a segunda deixa-o pálido e a terceira, o apodrece”.

53. És tu (μή σύ). Tu, enfático; e a partícula interrogativa negativa pressupõe


uma resposta negativa, tu, com certeza, não és maior.

Que morreu (όστις). O pronome composto όστις, que, usado de forma expli­
cativa, conforme o uso familiar do Novo Testamento, em vez de pronome rela­
tivo simples. O sentido é vendo que ele está morto. O relativo composto indica
apropriadamente a classe ou tipo a que um objeto pertence. Você é maior que
Abraão, que está ele um dos que estão mortos? Como Cl 3.5. “Mortificai, pois,
[j..] a vil concupiscência e a avareza, que é (ήτις εστίο) idolatria.” Vide nota sobre
Mt 13.52; 21.41; Mc 12.18; Lc 12.1; At 7.53; 10.41; lPe 2.11.
147
JoAo —Cap. 9

55. Palavra (λόγον). Essa é a tradução mais apropriada, como no versículo 51.
Como na ara .

56. Exultou (ήγαλλιάσατο). Com alegria exultante. Vide nota sobre lPe 1.6.

Viste (ίνα ϊδη). A construção grega é peculiar. Literalmente, que ele deve ver,
ou seja, no conhecimento, ou antecipação, de que ele deve ver.

Meu dia. O sentido exato da expressão é incerto.

57. Ainda não tens cinquenta anos (πεντήκοντα ετη ουπω ’έχεις). Literalmente.
A idade da maturidade completa.

Viste. Mais uma vez, as palavras do Senhor citadas erroneamente.

58. Existisse eu sou (γενέσθαι, εγώ είμι). É importante observar a distinção


entre os dois verbos. A vida de Abraão estava sob as condições do tempo, e,
por essa razão, teve um princípio temporal. Por isso, Abraão veio a e x is tir ou
nasceu (γενεσθαι). A vida de Jesus era desde a eternidade e até ela. Assim, a
fórmula para a existência absolu ta e etern a, eu sou (εγώ είμι). V ide nota sobre
1.3; 7.34.

59. Passando pelo meio deles, e assim se retirou. Os melhores textos omitem.

C apítulo 9

1. De nascença (εκ γενετής). A palavra ocorre somente aqui no texto do Novo


Testamento.

2. Nem ele [../], nem seus pais. Era uma percepção judaica comum achar que
os méritos, ou deméritos, dos pais apareceríam nos filhos e que os pensamen­
tos da mãe podiam afetar a condição moral de sua descendência por nascer. Na
crença popular, a apostasia de um dos maiores rabis fora causada pelo deleite
pecaminoso de sua mãe em atravessar um bosque de um ídolo.

3. Mas £...^ para que (άλλ’ ΐνα). Há uma elipse: m as [_ele nasceu cegò~\ p a ra que.

4. Convém que eu faça (εμέ δει έργάζεσθαι). Os melhores textos trazem ημάς, nós,
em lugar de εμέ, eu. Literalmente, ê necessário a nós trabalhar, na t e b , é m ister traba­
lharmos. Assim, Jesus associa os discípulos com Ele mesmo. Compare com 3.11.

148
J oão —Cap. 9
Me enviou, e não nos enviou. O Filho envia os discípulos, como o Pai envia o
Filho.

5. Enquanto (όταν). A melhor tradução seria quando quer que. Na r v , quando. Seja
em minha encarnação, ou antes de minha encarnação, ou depois dela. Compare
com 1.4,10.

A luz. Vide nota sobre 8.12. O artigo está faltando. Westcott diz: “Cristo é ‘a
luz do mundo’, bem como ‘a única Luz do mundo’. O caráter é imutável, mas a
demonstração do caráter varia conforme a ocasião”.

6. Na terra (χαμαί). Somente aqui e em 18.6.

Untou (επέχρισε). Somente aqui e no versículo 11. Considerava-se que a saliva ti­
nha virtudes peculiares não só como remédio para doenças dos olhos, mas, em geral,
como encantamento, por isso, era empregada em encantamentos. Pérsio, ao descre­
ver uma mulher idosa lidando com uma criança, escreve: “Ele tira o bebê do berço
e, com o dedo médio, umedece a testa e os lábios dele com saliva para afastar mau
olhado”90. Tácito relata como uma das pessoas comuns da Alexandria importunava
Vespasiano para conseguir remédio para sua cegueira e orava para que ele borrifasse
suas faces e seus globos oculares com a secreção de sua boca91. Plínio disse: “Temos
de acreditar q u e a unção constante a cada manhã com a saliva de jejum (ou seja, pro­
duzida antes de c o m e r ) previne a inflamação dos olhos”92. Alguns editores leem aqui
4πέθηκ€ν, aplicar em ( c o m o n a t e b ), em lugar de έιτέχρισεν, untar.

Do cego. Omita, e leia como na r v : seus olhos.

7. Lava (νίψαι). Lava os olhos. Vide nota sobre At 16.33.

Siloé. Segundo os escritores rabínicos, Shiloack, na l x x , Σιλωάμ; na v u l g a t a


e pais latinos, Siloe. Em Josefo, em geral, Siloa. Nos escritos é sempre chamado
de tanque ou piscina ( b j ), construído, não natural. O lugar é claramente identificado
em um recesso na extremidade sudeste de Sião, perto da junção do vale de Ti-
ropeon com o de Cedrom. De acordo com o Dr. Thomson, é um paralelogramo
de cerca de 16,15 metros de extensão por 5,4 metros de largura e que, em sua
condição perfeita, deve ter tido quase 6 metros de profundidade. Sendo, desse

90. Pérsio, Sátiras, ii, 32-33.


91. Tácito, História, iv, 81.
92. Plínio, História Natural, xxviii, 7.

149
J oão —Cap. 9
modo, o menor de todos os tanques de Jerusalém. A água flui no tanque através
de um canal subterrâneo da fonte da Virgem, e as águas são marcadas por fluxo
e refluxo. O Dr. Robinson testemunhou um aumento e queda na água de 30,48
centímetros em dez minutos. O canal foi cruzado por dois exploradores, Dr.
Robinson e o capitão Warren. Vide o relato da exploração de Warren em Thom­
son93. Acerca da palavra tanque, vide nota sobre 5.2.

Enviado. A palavra hebraica quer dizer derramamento (de águas); envio, provavel­
mente com referência ao fato de que o monte do templo lança suas águas das nascen­
tes. Muitos expositores encontram uma relevância característica no fato de a obra de
Cristo ser realizada por meio do tanque que leva esse nome. Dessa forma, Milligan e
Moulton, depois de observarem o fato de que a água era extraída desse tanque para
ser derramada sobre o altar durante a Festa dos Tabernáculos, que esse tanque era
associado com as “fontes da salvação” (Is 12.3), e que, na época do Messias, o derra­
mamento da água simbolizava a efusão de bênção espiritual, prosseguem para dizer:

Portanto, como maior interessenatural, o evangelista observa que essenomemesmo


corresponde aoMessias; e, aoapontar essefato, indica-nos qual eraoobjetivodeJesus
emenviar o homempara essas águas. Nisso, ainda de forma mais distintiva que em
outros particulares que observamos, Jesus, enviando o homempara longe dele, está
semantendo diante deleligado emtudo comsua cura. Assim, aolongo detoda anar­
rativa toda atenção está concentrada emJesus mesmo, aLuz do mundo, ‘enviado por
Deus’ para abrir olhos cegos.

Vide também Westcott e Godet.

8. Cego. Os melhores textos substituem por προσαίτης, mendigo.

Que estava assentado e mendigava (ò καθήμενος και τφοσαιτών). Literal­


mente, alguém que se assentava e mendigava-, denotando algo costumeiro.

9. Ele dizia (εκείνος). O forte demonstrativo lança o homem em forte realce


como o personagem central.

11. Ao tanque de Siloé. Os melhores textos dizem apenas: fosse a Siloé. Na n v i ,


quefosse lavar-me em Siloé.

Vi (άνεβλεψα). Originalmente, erguer os olhos, como em Mt 14.19; Mc 16.4, e


assim alguns o traduzem aqui. Porém, é melhor: recuperei a vista (cp. t e b ).

9S. Thomson, T he L a n d a n d the Book·. Southern PalestineandJerusalem, p. 460.


150
J oão - Cap. 9
14. E era sábado quando (fjv Ôe σάββατον oxe). Os melhores textos apresentam,
em vez de oxe, quando, èv ή ημέρα, o dia em que. Literalmente, era um sábado o dia
em que.

16. Não guarda o sábado. Um preceito rabínico declara: “É proibido até mesmo
aplicar saliva de jejum aos olhos no sábado”. As palavras do versículo 14,fe z o
lodo, também marcam um ponto específico de ofensa.

18. Os judeus. Observe a mudança de osfariseus. Os fariseus já estavam dividi­


dos quanto a esse milagre (v. 16). Os judeus representam a parte hostil a Jesus.

Do que agora via (αυτού του άναβλέψαντος). Apropriadamente: “daquele mes­


mo que recebera sua visão”.

22. Tinham resolvido - que (ouveteGeuno - ίνα). O sentido é: tinhamformado


um acordo afim de realizar essefim , a saber, que o confessor de Cristo devia ser
excomungado.

Confessasse (όμολογήση). Vide nota sobre Mt 7.23; 10.32.

Fosse expulso da sinagoga (άποσυνάγωγος γέυηται). A tradução literal não


pode ser fornecida de modo esmerado, pois não temos um adjetivo correspon­
dente a άποσυνάγωγος, que quer dizer excluído da sinagoga-, tão próximo quanto —
que elefosse banido da sinagoga. O adjetivo ocorre somente no Evangelho de João,
aqui e em 12.42; 16.2. Três tipos de excomunhões eram reconhecidos, dos quais
só o terceiro era a verdadeira expulsão, sendo os outros dois tipos disciplinares.
O primeiro e mais leve era chamado de repreensão e durava de sete a trinta dias.
O segundo era chamado pôr para fora e durava, pelo menos, trinta dias seguido
de uma “segunda admoestação” que durava mais trinta dias. Este só podia ser
pronunciado em uma assembléia de dez. Ele era acompanhado de maldições e, às
vezes, era proclamado com o toque da trombeta de chifre. A pessoa excomunga­
da não seria admitida em nenhuma assembléia de dez homens nem para a oração
pública. As pessoas mantinham uma distância de 1,80 metro dele, como se ele
fosse leproso. Quando morresse, deviam-se jogar pedras no seu caixão e era proi­
bido pranteá-lo. Se tudo o mais falhasse, o terceiro tipo era pronunciado, ou seja,
a verdadeira excomunhão, cuja duração era indefinida. Era como se o homem
estivesse morto. Não se podia manter comunicação com ele, ninguém devia lhe
dar indicação de caminho e, embora ele pudesse comprar as coisas necessárias
para a vida, era proibido comer e beber com ele. Essas formas mais severas pa­
recem ter sido introduzidas depois, assim, a penalidade a que os pais do homem
151
João — C ap . 9

cego temiam, provavelmente, era a separação de toda comunhão religiosa e da


comunicação comum da vida por talvez trinta dias.

24. Dá glória a Deus (δός δόξαν τω Θεώ). Compare com Js 7.19; 1Sm 6.5. Essa frase
dirigida a um ofensor sugere que ele, por meio de algum ato ou palavra anterior,
desonrou a Deus e é interpelado para que repare a desonra ao falar a verdade. Nesse
caso, também é um apelo ao homem restaurado para atribuir sua cura diretamente a
Deus, e não a Jesus. Palgrave, diz que a frase árabe, em geral, dirigida a alguém que
disse algo extremamente fora de lugar é istaghfir Allah, peça perdão a DeusH.

Nós sabemos. O nós é enfático. Nós, os homens sábios e guardiões da religião.

28. Injuriaram (èλοιδόρησαν). O verbo quer dizer repreender ou censurar em


voz alta e de maneira abusiva. Calvino, sobre 1Co 4.12, “somos injuriados e ben­
dizemos”, comenta: “Λοιδορία é uma repreensão mais severa que não só repre­
ende o homem, mas também o ataca de forma contundente e o marca com injúria
pública. Por isso, λοιδορβΐν é ferir um homem como com o espinho da maldição”.

Discípulo dele (μαθητής έκείνου). Literalmente, discípulo desse homem. O pro­


nome tem força desdenhosa que não é transmitida por dele.

29. Falou (λ6λάληκ€ν). Tempo perfeito, tem falado, e, assim, a autoridade das
palavras de Moisés continua até o presente. Assim na rv. Λαλέω significa falar,
familiarmente. Vide Êx 33.11.

De onde é. Compare com 7.27; 8.14.

30. A maravilha (θαυμαστόν). A leitura correta acrescenta o artigo, a maravilha.


Como a arc.

Vós não saibais. Vós é enfático; vós que se pode esperar que saibam sobre um
homem que operou tal milagre.

E (καί). Vide nota sobre 8.20; 1.10.

31. Nós sabemos. Aqui o pronome não é expresso e o nós não é enfático, como
o pronome nos versículos 24 e 29, mas expressa a informação comum a todos
ligados ao fato familiar.

94. Palgrave, C en tral a n d E a stern A rabia.

152
João - Cap. 9
Temente a Deus (θεοσεβής). Somente aqui no texto do Novo Testamento. A
palavra relacionada, θεοσφεια, servir a Deus, ocorre somente em lTm 2.10. Com­
binado com Θεός, Deus, e σέβομαι, adorar, o mesmo verbo que aparece em ευσεβής,
piedoso (At 10.2,7; 22.12), e ευσέβεια, santidade (At 3.12; lTm 2.2 etc.). Vide nota
sobre 2Pe 1.3. Essas duas últimas palavras, embora possam querer dizer reverên­
cia em relação a Deus, também podem indicar o cumprimento devido das relações
humanas; enquanto θεοσεβής, temente a Deus, limita-se à piedade em relação a Deus.

32. Desde o princípio do mundo (εκ του αίώνος). A frase exata ocorre somente
aqui no texto do Novo Testamento. A expressão άπ’ αίώνος é encontrada em
At 3.21; 15.18; από των αιώνων em Cl 1.26.

34. Todo (όλος). Literalmente, todos vocês.

Em pecados. Permanecendo primeiro na ordem grega e enfática, como tam­


bém é oi), tu, em ambas as instâncias. “Tu és nascido todo em pecados e nos en­
sinas a nós?”

Ensinas. Enfático. Tu, dessa forma, nasceste em pecados, assume o cargo de mestre?

Expulsaram-no. Do lugar em que estavam conversando. Não excomungaram,


o que esse ajuntamento de pessoas variadas não podia fazer.

35. Disse-lhe. Omita lhe.

Crês tu (σύ πιστεύεις)? A forma da pergunta indica a expectativa confiante


de uma resposta afirmativa. É quase uma afirmação, você certamente acreditas-, você
(σύ, enfático) que levantou um testemunho tão corajoso de mim que eles o expul­
saram. Observe a expressão πιστεύεις είς, crês, e vide nota sobre 1.12.

Filho de Deus. Tischendorf, Westcott e Hort apresentam Filho do homem.

36. Quem é ele? Os melhores textos inserem καί, e quem é ele? O que transmite
um ar de ansiedade à pergunta.

38. Adorou (προσεκύνησεν). Vide nota sobre At 10.25.

39. Juízo (κρίμα). Não o ato do julgamento, mas seu resultado. Sua presença mes­
ma no mundo constitui uma separação, a ideia primitiva de julgamento entre os
que creem nele e os que o rejeitam. Vide nota sobre 3.17.
153
João - C ap. 10

40. Também nós somos cegos (μή καί ήμ€ΐς τυφλοί eopev)? Ο também pertence
a nós. A partícula interrogativa tem a força de certamente nós não somos, e o nós é
enfático. Também nós somos cegos? Como na arc .

41. Não teríeis pecado (ούκ αν β’ίχβτε αμαρτίαν). Ou: não deverieis ter. A expres­
são αμαρτίαν έχα,ν, ter pecado, ocorre somente em João, aqui no Evangelho e na
primeira epístola.

C apítulo i o

1. Na verdade, na verdade (αμήν αμήν). A fórmula nunca começa com nada


muito novo, mas liga o que vem a seguir ao que precede. Esse discurso surge
da pressuposição de que os fariseus são os únicos guias autorizados das pessoas
(9.24,29). Eles já foram descritos como cegos e pecadores.

Curral das ovelhas (αύλήν τών προβάτων). Literalmente. Nessa tradução, as


duas idéias, a do rebanho e a do aprisco, são tratadas de forma distinta. Compare
com o versículo 16.

Por outra parte (άλλαχόθεν). Literalmente, de algum outro canto. O ladrão não
vem, como o pastor, de algum lugar conhecido, como da sua casa ou do pasto,
mas de um canto desconhecido e por um caminho dele mesmo. Esse por é rele­
vante porque Jesus, nos discursos anteriores, enfatizou muito a fonte da qual Ele
procedia e faz a diferença, em caráter, entre Ele mesmo e seus opositores, por se
tratar de diferença de origem. Vide 8.23,42,44. Na última parte desse capítulo, Ele
expõe o mesmo pensamento (w. 30,32-33,36).

Ladrão - salteador (κλέπτης - ληστής). Para a distinção, vide nota sobre


Mc 11.17. Há um ponto culminante na ordem das palavras; aquele que consegue
seu objetivo por meio de estratagema e, se isso não for suficiente, da violência.

2. O pastor (ποιμήν). Um pastor é melhor. É o caráter que é contemplado, em


vez da pessoa.

3. Porteiro (θυρωρός). De θύρα, porta, e ώρα, cuidar. Um subpastor ao qual as


ovelhas são confiadas depois de presas para passar a noite e que abrem a porta
do aprisco à chegada do pastor de manhã.

Chama (καλβΐ). Porém, os melhores textos trazem φωνΠ, expressando trata­


mento pessoal.

154
J oão - C ap . 10

4. Tira para fora (έκβάλη). Na r v , mais estritamente, tirou parafora; na b p , retirou.


Em lugar da expressão "traz para fora”, do versículo 3. Isso sugere coação, como se
algumas ovelhas não quisessem deixar o aprisco. Meyer diz que a expressão tirapara
fora retrata a maneira de guiar para fora. Ele segura as ovelhas e as traz para fora.

As suas ovelhas (τά ίδια πρόβατα). Os melhores textos trazem πάντα, todas,
para πρόβατα, ovelhas·, todas as suas. Como na b p .

Vai adiante. Como o pastor oriental sempre o faz. Depois de tirá-las para
fora, agora, ele as guia.

Seguem. Thomson relata:

E necessário que elas sejamensinadas aseguir eanão sedesviar paraos campos sem
cerca detrigo querepousamtãotentadores dooutro lado. O pastor chama-as detem­
pos emtempos paralembrá-las de sua presença. Elas conhecemsuavoz eseguemem
frente; mas se umestranho as chamar, elas param, levantamacabeçaemalarme, e se
o chamado for repetido, elas viram-se efogemdele, pois elas não conhecema voz de
estranhos. Este não éumcostume fantasioso de uma parábola, é umsimples fato. Fiz
o experimento diversas vezes.

6. Parábola (παροιμίαν). Só há uma ocorrência da palavra fora dos escritos de


João (2Pe 2.22). A palavra usual para parábola é παραβολή, que uma vez foi tradu­
zida por provérbio na t e b (Lc 4.23; a r v usa parábola; a b p , refrão), e que não ocorre
nenhuma vez em João. Para a distinção, vide nota sobre Mt 13.3.

7. A porta das ovelhas. Com o sentido de a porta para as ovelhas; não a porta do
aprisco. “O pensamento está ligado à vida, e não simplesmente à organização.”

10. O ladrão (ò κλέπτης). Jesus põe Ele mesmo em contraste com o miserável
criminoso.

Eu v im (ήλθον). Tradução mais correta. Eu estou vindo (k j v ) representaria o


tempo presente.

Com abundância (πφίσσόν). Literalmente, possam ter abundância. Em con­


trapartida, a n v i traz: plenamente.

11. O bom Pastor (ò ποιμήν ò καλός). Literalmente, o pastor o bom (pastor).


O termo καλός, embora não ocorra com frequência em João, é mais comum que

155
J oão - Cap. 10
αγαθός, bom, do qual há apenas quatro ocorrências, e três das quatro ocorrências
no gênero neutro, uma coisa boa ou aquilo que é bom. Καλός, em João, aplica-se a
vinho (2.10); nesse capítulo, três vezes a pastor e duas vezes a obras (10.32-33).
No uso clássico, foi usado originalmente como descritivo úaforma exterior, beleza;
da utilidade como um refúgio justo, um vento justo. Auspicioso como sacrifício. Mo­
ralmente bonito, nobre, por isso, a virtude é chamada de το καλόν. O uso do Novo
Testamento é similar. Extemamentejusto como as pedras do templo (Lc 21.5); bem
adaptado ao seupropósito como o sal (Mc 9.50); competentepara o cargo como diáconos
(lTm 4.6); como despenseiro (lPe 4.10); soldado (2Tm 2.3); expediente, benéfico (Mc
9.43,45,47); moralmente bom, nobre como obras (Mt 5.16); consciência (Hb 13.18). A
expressão ébom, ou seja, uma coisa boa ou apropriada (Rm 14.21). Na l x x , καλός
é a palavra mais usual para bom como oposto a mau (Gn 2.17; 24.50; Is 5.20). Em
Lc 8.15, encontramos καλός e αγαθός juntos como epítetos de coração; honesto (ou
virtuoso, nobre) e bom. O epíteto καλός, aplicado aqui para o pastor, aponta para a
bondade essencial como realização nobre e que impõe a admiração que traz respei­
to e afeto. Como o Cônego Westcott observa: “O bom Pastor, no cumprimento de
seu trabalho, declara a admiração de tudo que é generoso no homem”.

Dá a sua vida (την ψυχήν αυτού τίθησιν). A frase é peculiar a João, ocorrendo
no Evangelho e na primeira epístola. Ela é explicada de duas maneiras: ou (1) de
acordo com o uso clássico da palavra τίθημι, com o sentido de formular como um
rogo, pagar como um preço. Como Demóstenes, pagar lucro ou a taxa estrangeira.
Ou (2) de acordo com 13.4, tirar sua vida como uma veste. A última opção parece
preferível. Τίθημι, no sentido de pagar um preço, não ocorre no texto do Novo
Testamento, a não ser que a frase entregou sua vida seja explicada dessa forma9ií.
Em 13.4, tirou as vestes (τίθησι τα íμάτια) é seguido, no versículo 12, de tomou as
suas vestes (ίλαβί τα 'ιμάτια). Assim, nesse capítulo, dá (τίθησιν) a sua vida (v. 11)
e dou (τίθημι) a minha vida (vv. 17-18) são seguidos de λαβίΐν, “tornar a tomá-la”.
As expressões την ψυχήν 6θηκ6, ele deu a sua vida, e τάς ψυχάς Oeivai, nós devemos
dar a vida, ocorrem em 1Jo 3.16.0 verbo é usado no sentido de deixar de lado nos
clássicos, como deixar de lado a guerra, os escudos etc. Compare com Mt 20.28,
δούναι τήν ψυχήν, dar a sua vida.

Pelas ovelhas (ínrèp). Em favor delas.

12. M ercenário (μισθωτός). De μισθός, contratar. Vide nota sobre 2Pe 2.13. Na
assalariado.
n v i,

95. Huther, sobre lJo 3.16, declara que esse sentido só seria admissível no evento de a frase ser
usada invariavelmente com ímép τίνος, emfa v o r de alguém.

156
Jo ã o - C ap . 10

Ve (θεωρεί). Muito vivido. Seu olhar está fixo pelo fascínio do terror do lobo
que se aproxima. Compare com Dante:

D e um leão de repente surge o aspecto,


Que ao meu peito o pavor de novo lança.
C -]
Eis surge Loba, que de magra espanta;
D e ambições todas parecia cheia;
Foi causa a muitos de miséria tanta!
Com tanta intensa torvação emenleia
Pelo terror, que o cenho seu movia,
Que a mente à altura não subir receia9fi.

Sobre essa palavra, Westcott menciona Agostinho: fuga animi Timor est, a luta
da mente é covardia; com a qual, mais uma vez, compara com Dante:

O meu ânimo assim, que treme ansioso,


Volveu-se 7..j‘17,

Deixa (άφίησι). Vide nota sobre 4.3.

Arrebata (αρπάζει). A tradução d a n v i , ataca, é melhor, embora arrebata, sem


dúvida, seja usado pela a r c e a c f com seu sentido primeiro e mais forte do la­
tim vulgar caciare, caçar alterado de capturar, agarrar ou possuir. Compare com o
italiano cacciare, caçar. A mesma palavra é usada no versículo 28, arrebatará das
mãos de Cristo. Vide nota sobre Mt 11.12.

As arrebata e dispersa. Representa a leitura dos melhores textos, que omitem


ovelhas (cp. e c p ).

13. O m e rc e n á rio fo g e . Os melhores textos omitem. Leia, como na n v i : elefoge.

Não tem cuidado (ού μέλει αότω). Literalmente, as ovelhas não são uma preo­
cupação para ele. Vide nota sobre lPe 5.7. O contraste é sugestivo.

14. Das minhas sou conhecido (γινώσκομαι ύπό τύ ν έμών). Os melhores tex­
tos trazem γιηώσκουσί με τά έμά, as minhas me conhecem. Assim na r v . Na n v i e
b p , elas me conhecem, na b j e t e b , as minhas ovelhas me conhecem.

96. Dante, A Divina Comédia, Inferno, i, 44-54, p. 5-6.


97. Ibid., Inferno, i, 25, p. 5.

157
JoAo - C ap . 10

15. Assim como o Pai me conhece a mim. Ligue essas palavras com a sentença
anterior: das minhas sou conhecido, assim como o Pai me conhece a mim etc.

16. Aprisco (αυλής). De αω, ventar, daí o sentido estrito ser um lugar ao ar livre;
um espaço não coberto cercado por muros. Como Homero, na caverna de Ciclope:

Quando, a pouca distância atingimos o lugar,


Notamos uma caverna num dos extremos, bem perto
do mar. Era alta e cercada de loureiros. Gado miúdo,
ovelhas e cabras. Cochilavam. Um muro elevado
de rochas fincadas no solo protegia o cercado (αύλή)98.

O Dr. Thomson diz:

O prédio baixo na encosta do monte comarcos na frente e sua área cercada protegi­
da por um muro de cascalho e rodeada de plantas espinhosas pelo qual acabamos de
passar é umaprisco ou marâh [(...3· Os marâhs, em geral, são construídos em um vale
ou do lado ensolaradode uma colina, em que ficam abrigados dos ventos do inverno.
No clima usual, as ovelhas e os bodes são reunidos à noite em um pátio cercado; mas
quando as noites são frias e tempestuosas, os rebanhos são fechados no marâh. Os
arbustos de espinhos afiados sobre o topo do muro que rodeia o pátio são uma defesa
que o lobo que está à espreita raramente tenta escalar. Contudo, o leopardo e a pantera
desse país, quando pressionados pela fome, às vezes, saltam por cima dessa cerca de
espinho e, em um salto, estão entre o assustado rebanho".

Compare com Homero:

À guisa de leão, a quem o pastor fere,


do rebanho lanudo cioso, quando a fera
escalava o redil, e não a mata, mas
antes lhe excita a força; e o pastor foge, inerme,
e as ovelhas se ajuntam pávidas no
até que o predador, violento salte fora100;

Agregar (àyayclv). A tradução da bj, conduzir, é melhor; na bp, guiar. Compare


com o versículo 3, as conduz para fora (cp. bj). A ideia não é de reuni-las (como
συναγάγη, 11.52), nem de conduzi-las para o lugar, mas assumir a direção.

98. Homero, Odisséia, ix, 181-185.


99. Thomson, The Land and the Book Central Palestine and Phoenicia, p. 591.
100. Homero, op. cit., v, 136-142.
158
JoÂo - Cap. 10

Haverá (γενήθ6ται). Mais corretamente, virão a ser. Alguns editores apresen­


tam γενήσονται, elas se tornarão.

Um rebanho (μία ποίμνη). A k j v traz aprisco, ignorando inteiramente a distinção


entre αυλή, aprisco, e ποίμνη, rebanho. Encontramos a segunda palavra em Mt 26.31;
Lc 2.8; lCo 9.7, e sempre com o sentido distinto de um rebanho, como também o di-
minutivo ποίμνιοv,pequeno rebanho (Lc 12.32; lPe 5.2 etc.). Traduza, como na r v : um
rebanho, umpastor. Assim também na t y n d a l e ; na b j , um só rebanho, um sópastor. Com­
pare com Ez 34.23. Contudo, não temos que dizer, com Trench101, que os judeus e
gentios são os dois rebanhos que Cristo unirá em um único rebanho. Os pagãos não são
concebidos como um rebanho, mas como uma dispersão. Vide 7.5; 11.52; e, conforme
Meyer observa, “o pensamento de uma liderança divina do pagão não corresponde de
forma alguma ao que se imagina de um rebanho, do qual o conceito de comunhão teo-
crática se constitui uma característica essencial”. Como Bengel. “Ele diz, outro pastor,
não outro rebanho, pois elas estão espalhadas pelo mundo.” guando Jesus fala das ou­
tras ovelhas que não são deste aprisco, a ênfase está no aprisco, não em deste. Compare
com Rm 11.17ss. Além disso, Jesus não quer dizer que os gentios têm de ser incorpo­
rados no rebanho judeu, mas que a união dos dois consiste em sua relação em comum
com Ele mesmo. Segundo Westcott: “A unidade da igreja não emerge da extensão
do reino antigo, mas é o antítipo dessa figura terrena. Nada é dito de um rebanho sob
a nova dispensação”. Logo, percebe-se que a tradução incorreta foi devido à falta de
cuidado ou erros de alguns pais ocidentais e à Vulgata, que traduz ambas as palavras
por redil, aprisco, o que está de acordo com o interesse das afirmações dos romanistas.

18. T ira (a’ipei). Essa é a forma apresentada por alguns textos. De acordo com
essa leitura, a palavra apontaria de volta para a obra de Jesus conforme concebi­
da e realizada no conselho eterno de Deus, em que o sacrifício de si mesmo não
foiforçado, mas foi sua oferta espontânea em concordância com a vontade do Pai.

Eu de mim mesmo a dou. Na w y c l i f f e , E u aproponho da parte de mim mesmo-,


na t e b , por mim mesmo eu dela me despojo.

Poder (έξουσίαν). Na r v , em nota de margem, direito. Vide nota sobre 1.12.

Mandamento (έντολήν). Videnota sobre Tg 2.8.

19. Haver divisão (σχίσμα eyéveto). Na r v , mais corretamente, levantou-se. A


palavra σχίσμα, divisão, de σχίζω, partir, descreve um fato recorrente na nar-

101. Trench, O n th e A u th o rize d Version o f the N e w T estam ent.

159
J oão - C ap . 10

rativa de João. Vide 6.52,60,66; 7.12,25ss.; 8.22; 9.16-17; 10.19,24,41; 11.37ss.;


12.19,29,42; 16.18-19.

Palavras (λόγους). Ou discursos.

21. Endemoninhado (δαιμονι(ομένου). Literalmente. A rv traz: alguém possuído


por um demônio.

Pode [7.7] um demônio (μή δύναται). Seguramente um demônio não pode.

22. Festa da Dedicação (έγκαίνια). Somente aqui no texto do Novo Testamen­


to. A palavra quer dizer renovação, derivada de καινός, novo,fresco. Josefo chama-a
de φώτα, luzes. A festa foi instituída por Judas Macabeus (164 a.C.) em memória
da purificação do templo das poluições de Antióquio Epifanes. Os judeus vitorio­
sos, diz o Deão Stanley,

entraram e encontraram a cena de caos que a ocupação síria deixara. O s corredores das
câmaras dos sacerdotes, que rodeavam o templo, foram derrubados; as portas viraram
cinzas, o altar foi desfigurado e toda a plataforma estava coberta com o se fosse uma
floresta ou uma clareira. Era um espetáculo de partir o coração. O primeiro im pulso
deles foi se jogar imediatamente no chão e soprar alto as trombetas de chifres que acom­
panhavam todas as ocasiões de luto e também as de alegria - todos os sinos e também
os carrilhões da nação. A seguir, enquanto as guarnições estrangeiras eram mantidas
na baía, os guerreiros começaram a elaborar o processo de purificação do lugar poluído.
£...] N o interior do templo, tudo teve de ser reabastecido - vasos, candelabros e altar de
incenso, além das mesas e cortinas. Finalm ente, tudo foi completado, e, no 25.° dia de
kislev (meio de dezembro), o m esm o dia em que, três anos antes, a profanação ocorrera,
o tem plo foi consagrado de novo. [7.7] O que ficou mais vivo na recordação da época foi
que a luz perpétua voltou a brilhar de novo. O castiçal de ouro não estava mais lá. Seu
lugar foi tomado por um candelabro de ferro, emoldurado por madeira102.

De acordo com a tradição, descobriu-se que o óleo fora profanado e só uma


jarra de óleo puro, selado com o sinete do sumo sacerdote foi considerado sufi­
ciente para alimentar o candelabro por um único dia. Mas por meio de um mila­
gre, a jarra foi enchida de novo durante oito dias, até que um suprimento novo
pudesse ser encontrado. O festival durava oito dias. As luzes ficavam acesas não
só no templo, mas também em todas as casas. Os proprietários de casa, quando
piedosos, acendiam uma lâmpada para cada habitante da casa e, todas as noites,

102. Stanley, The Jewish Church, parte iii, 345-346.

160
JoAo - Cap. 10
os mais zelosos acrescentavam uma lâmpada para cada indivíduo, assim, se uma
casa tivesse dez habitantes, ela terminaria com oitenta. Os judeus reuniam-se no
templo ou nas sinagogas dos lugares em que residiam, carregando ramos de pal­
ma e entoando salmos de louvor. Não era permitido que se começasse nenhum
jejum nem pesar pelo relato de alguma calamidade ou luto durante o festival.

23. Alpendre de Salomão. Colunata coberta do lado leste do pátio externo do


templo. De acordo com Josefo, era uma relíquia nos tempos de Salomão que per­
maneceu intacta na destruição do templo por Nabucodonosor.

24. A nossa alma suspensa (την ψυχήν ημών αίρεις). Literalmente, suspendes
nossa alma. Entusiasma-nos e acendes nossa esperança. Na n v i , nos deixará em
suspense.

Abertamente (παρρησία). Vide nota sobre 7.13.

26. Como já vo-lo tenho dito. Os melhores textos omitem.

27. Minhas ovelhas (τα πρόβατα τα εμά). Literalmente, as ovelhas, aquelas que são mi­
nhas. Forma de expressão característica de João. Compare com 3.29; 5.30; 14.15 etc.

28. Dou (δίδωμι). Não darei. A dádiva é presente e contínuo. Compare com 3.36.

Arrebatará (άρπάσει). Vide nota sobre o versículo 12. Compare com pode arre­
batá-las, do versículo 29. Aqui, Jesus fala dofata, lá, da possibilidade, n v i , arrancar.

29. Meu Pai, que mas deu, é maior do que todos (ò πατήρ μου ός δεδωκε μοι,
μειζων πάντων εστιν). Há considerável confusão aqui em relação à leitura. Wes-
tcott, Hort e Tischendorf leem ò πατήρ μου (Tischendorf rejeita μου) ó δεδωκεν
μοι πάντων μεΐζόν εστιν. Ο que ο Pai (ou meu Pat) me tem dado é maior do que tudo.
A r v traz essa leitura em nota de margem. Na tradução, troque deu por tem dado.

30. Um (εν). O gênero neutro, não o masculino είς, uma pessoa. Sugere unidade de
essência, não apenas de vontade ou poder.

31. Pegaram - outra vez (έβάστασαν πάλιν). Outra vez refere-se a 8.59. Parece
como se um verbo diferente tivesse sido escolhido de propósito aqui (cp. ήραν,
pegaram, de 8.59), uma vez que a conversa aconteceu no alpendre de Salomão, no
qual as pedras não estariam à mão. O verbo aqui pode ter o sentido de levantar.
Como Ajax diz:
161
JoÂo —C ap . 10
Envie alguém como mensageiro para transmitir
A notícia maligna a Teucros, de que ele primeiro
Pode levantar (βαστάση) meu corpo transpassado por essa aliada espada103.

Contudo, o sentido mais usual do verbo no texto do Novo Testamento é aguen­


tar ou carregar. Como para a cruz (Jo 19.17; Lc 14.27). Aqui ele pode ser muito
apropriadamente traduzido por pegaram, talvez das obras que estavam sendo
feitas no templo na época. Vide mais em 12.6.

82. Obras boas (καλά). Obras belas, nobres, apropriadas para causar admiração e
respeito. Compare com Mc 14.6, e vide nota sobre o versículo 11.

Por qual dessas obras (διά ποΙον αυτών ’έργον). Literalmente, por qual tipo dessas
obras. Não se deve perder de vista essa força qualitativa de ποιον, embora seja impos­
sível traduzi-lo com exatidão sem parafrasear. Jesus não quer dizer, como a a r c e a
n v i sugerem, “por qual dessas obras”, mas “qual ê o caráter dessa obra em particular

entre todas por quais me apedrejam?” O me, encerrando a sentença, é enfático.

83. Dizendo. Omita.

34. Não está escrito (ούκ έστιν γ^γραμμένον). Mais estritamente, não permanece
escrito.

Lei (νόμω). Às vezes, a palavra é usada no texto do Novo Testamento em ou­


tras passagens. Vide 12.34; 15.25; Rm 3.19; lCo 14.21.

Disse etc. A referência é a SI 82.6.

85. A Escritura (ή γραφή). A passagem da Escritura. Vide nota sobre 2.22; 5.47.

Anulada (λυθήναι). Literalmente, desprendida. Na t e b , abolir. A palavra é ca­


racterística de João. Ele usa-a para a destruição do templo (2.19); a quebra do
sábado (5.18); a violação da lei (7.23); a destruição das obras de Satanás (lJo 3.8),
além de, no sentido físico, em outras passagens.

36. Santificou (ήγίασεν). A t e b apresenta uma tradução melhor consagrou. A


ideia fundamental da palavra é separação e consagração ao serviço da divindade.
Vide nota sobre At 26.10, acerca do adjetivo relacionado άγιος, santo ou consa­
grado.

103. Sófocles, Ajax, 827.

162
João - C ap. 11

Filho de Deus. Não há artigo. A ausência do artigo direciona-nos ao cará­


ter de Jesus, em vez de à pessoa dele. Os juizes, aos quais a citação do versícu­
lo 35 se refere, eram chamados deuses, porque eram representantes de Deus. Vide
A

Ex 21.6; 22.8, passagens em que a palavra traduzida por juizes é elohim, deuses.
Em Ex 22.28, aparece deuses na t eb , em nota de rodapé104. A linha de raciocínio
de Jesus é que se esses juizes podem ser chamados deuses, como eu blasfemo ao
me chamar Filho de Deus uma vez que o Pai me consagrou e me enviou ao mun­
do em uma missão especial?

37. Me acrediteis (πιστεύετέ μοι). Observe acrediteis com o dativo simples; me


acrediteis, e não em mim. É uma questão de fé em seu testemunho, não na sua pes­
soa. Vide nota sobre 1.12.

38. Nele. Os melhores textos trazem έν τώ πατρί, no Pai.

39. O utra vez. Aponta de volta a 7.30,32,44, em que encontramos a palavra


ττιάσαι, prender.

Escapou (εξήλθεν έκ). A rv apresenta tradução literal: saiu de. A expressão


ocorre somente aqui.

40. Além do Jordão (πέραν του Ίορδάνου). Na região chamada Pereia, de πέραν,
além. Era do lado leste do rio e era a antiga posse de Gade e Rúben. Corresponde,
em um sentido mais amplo, à região em torno do Jordão (Mt 3.5; Lc 3.3). Compare
com Mt 19.1; Mc 10.1.

C apítulo 11

1. Então (δέ). Marcando a interrupção no retiro de Jesus (10.40).

Lázaro. Vide nota sobre Lc 16.20.

2. Ungido (άλείψασα). Encontramos três palavras para o ato de unção no


texto do Novo Testamento: αλείφω, χρίω e seus compostos, e μυρίζω. A úl­
tima é usada só uma vez em Mc 14.8 para a unção do corpo do Senhor no se-
pultamento. Entre as duas outras a distinção é estritamente mantida. Χρίω,
cinco ocorrências, é usada em todos os casos da unção do Filho pelo Pai com
o Espírito Santo, menos em um deles (Lc 4.18; At 4.27; 10.37; Hb 1.9). Nas

104. V ide também a nvi, D eus, com ju iz e s e m nota de rodapé.

163
J oão - Cap. 11
outras instâncias (2Co 1.21) de dotar os cristãos com dons do Espírito Santo.
Assim, a palavra está limitada a unção sagradalü5. A palavra αλείφω é usada
para todas as verdadeiras unções. Vide M t 6.17; Mc 6.13; Lc 7.38; T g 5.14.
Em geral, a l x x mantém a mesma distinção, embora com algumas exceções,
como Nm 3.3.

3. Tu amas (φιλεις). Vide nota sobre 5.20. Segundo Bengel: “Elas não dizem,
vem. Ele que ama só precisa saber”.

4. Para morte. Não para a morte como uma questão final.

Para glória (ύπερ). Aqui, com em outras passagens de João, emfavor de. O Cô­
nego Westcott comenta: ‘Ά doença é vista em uma relação tripla; para em relação
com o resultado real; emfavor de quanto ao sofrimento suportado; afim de que em
relação ao propósito divino”.

5. Amava (ήγάπα). Observe o verbo aqui: não é φιλεις, como no versículo 3. Vide
nota sobre 5.20. Lázaro não é mencionado em Lc 10.38ss.

8. Agora (νΰν έζήτουν). Essa forma da a r c é muito melhor que as outras,


pois dá a verdadeira força de v w , agora, e do imperfeito: ainda agora £...]]
procuravam .

Tom as (υπάγεις). Deixas esse retiro seguro? Vide nota sobre 6.21; 8.21.

9. Andar (περιπατή). Andar, em torno, à procura de seu negócio comum. Na b j,

caminhar.

11. Dorme (κεκοίμηται). Mais corretamente, como na rv, tem adormecido. Vide
nota sobre At 7.60; 2Pe 3.4.

Despertá-lo (έξυπνίσω αυτόν). Somente aqui no texto do Novo Testamento.

12. Estará salvo (σωθήσεται). Literalmente. Na n v i , va i melhorar, ntlh , vai fic a r


bom·, w y c l i f f e , estará seguro; τ υ χ ό ale ,fa r á bem o bastante.

13. Repouso (Κοιμήσεως). Relacionado com o verbo do versículo 11. Na ntlh ,

sono natural; na t e b , o adormecimento do sono.

105. Trench (Synonyms) parece negligenciar a exceção de 2Co, embora cite a passagem. Ele diz que
χρίεiv está absolutamente restrito à unção do Filho pelo Pai, p. 131.

164
João - C ap. 1 1

15. Por amor de vós - para que acrediteis. Essas duas orações, que estão se­
paradas na a r c e na nvi, na ordem grega, estão juntas: por amor de vós para que
acrediteis·, sendo a última parte a explicação da primeira.

De que eu não lá estivesse. O comentário de Bengel é lindo e característico.

Isto concorda maravilhosamente com a propriedade divina que lemos de ninguém ter
morrido enquanto o Príncipe da vida estava presente. Se você supõe que, na presença de
Jesus, a morte não podia atacar Lázaro, a linguagem das duas irmãs, versículos 21 e 32,
tem um sentido mais sublime; e explica-se a alegria do Senhor por sua própria ausência.

Com ele (προς αύτόν). Mais tocante. Com ele, como se ele ainda estivesse vivo.
A morte não quebrou o relacionamento pessoal do Senhor com seu amigo.

16. Dídimo (Δίδυμος). Não é o sobrenome de Tomé, mas o equivalente grego


do nome aramaico, gêmeo. Vide nota sobre Mc 3.18. A palavra ocorre somente no
Evangelho de João.

Condiscípulos (συμμαθηταις). Somente aqui no texto do Novo Testamento.

Morrermos. Westcott comenta: “Ele morrerá pelo amor que tem, mas não
afetará a fé que não tem”.

17. Já havia quatro dias que estava na sepultura (τέσσαρας ημέρας ήδη ’έχοντα
έν τω μνημίίω). Literalmente, verificou que ele já estava no sepulcro havia quatro dias.

18. Quinze estádios. Um pouco mais que três quilômetros.

19. M uitos dos judeus tinham ido. Sentido correto, tinham ido. O tempo é o
mais-que-perfeito. A amizade de Lázaro com Jesus não o fez ser considerado um
apóstata, em cujo funeral toda indignidade teria sido mostrada; caso em que, até
mesmo, as pessoas se vestiriam de branco, roupa festiva de demonstração de ale­
gria. Aqui, ao contrário, parece que foi demonstrado todo sinal de solidariedade
e de respeito.

A M arta e a M aria (προς τάς irtpi Μάρθαν και Μαρίαν). Literalmente, por
aqueles ao redor de Marta e Maria; uma expressão idiomática grega para Marta e
Maria e seus companheiros, ou presentes. Compare com oí περ'ι τον Παύλον, Paulo
e os que estavam com ele (At 13.13). Nossa expressão familiar quando falamos em
visitar uma família é um tanto análoga: Vou aos Ramos ou Silvas, por meio da qual
165
J o â o - C ap. 11

incluímos o chefe da família com os membros dela. Contudo, Westcott, Hort


e Tregelles, como também o texto dos revisores, seguem a leitura: προς την
Μάρθαν κ. M., a Marta e Maria.

20. Que Jesus vinha (ou 6 ’Ιησούς 6ρχ€ται). Literalmente, está vindo. As pala­
vras exatas da mensagem foram: Jesus está vindo.

Saiu-lhe ao encontro (ύπήντησεν). O verbo quer dizer ir encontrar.

22. Pedires a Deus (αίτηση τον 0eóv). O verbo αίτέω é usado para o pedido de
um inferior a um superior. O verbo έρωτάω significa pedir em termo de igualdade
e, por isso, é sempre usado por Cristo em relação ao seu próprio pedido para o
Pai, no conhecimento de sua igual dignidade. Por isso, Marta, conforme Trench
observa, “revela claramente sua concepção errônea e inadequada da pessoa dele,
no fato de que ela não reconhece nele nada além de um profeta, quando ela atri­
bui o que pediu (αίτεΐσθαι) a Ele, o que Ele nunca atribui a si mesmo”106. Bengel
diz: “Marta não fala em grego, contudo João expressa o comentário inexato dela,
o qual o Senhor gentilmente tolera”. Vide nota sobre Mt 15.23.

24. Na ressurreição. Na a ra , ressurgir.

25. Eu sou a ressurreição e a vida. As palavras eu sou são muito relevantes.


Marta, antes, declarou a ressurreição como uma doutrina, um dogma atual; Jesus
afirma que é como umfato identificado com sua própria pessoa. Ele não diz: Eu
levantei da morte, Eu realizei a ressurreição, mas: Eu sou a ressurreição. Em sua
própria pessoa, representando a humanidade, Ele exibe o homem como imortal,
mas imortal apenas por meio da união com Ele.

A vida. A vida é a ideia mais abrangente e inclusiva. Ressurreição está envol­


vida na vida como um incidente desenvolvido pelo triunfo temporário e aparente
da morte. Toda vida verdadeira está em sua origem, sua manutenção e em sua
consumação, e tudo isso é transmitido ao cristão em sua união com Ele. Essa vida
não é afetada pela morte. Segundo Godet:

Todo crente, na realidade e para sempre, está protegido da morte. Morrer com luz total,
na clara certeza da vida que está em Jesus, morrer só fiara continuar a viver para Ele não é
mais aquele fato que na linguagem do homem é designado pelo nome de morte. É como se
Jesus tivesse dito: ‘Em mim a morte é certeza de viver, e o viver é certeza de nunca morrer”

106. Trench, Synonyms of the New Testament

166
J oão —C ap. 11

Acerca de ζωή, vida, vide nota sobre 1.4.

Esteja morto (άποθάνη). O aoristo denota um evento, não uma condição. Por
isso, a tradução da a r a , ainda que morra, é muito melhor.

27. Creio (πεπίστευκα). Literalmente, tenho crido. O tempo perfeito. Como na


n v i . Marta volta a sua crença anterior, que consiste no reconhecimento de Cris­
to como seu Senhor. Qualquer fé que ela tenha nessa nova revelação de Cristo
repousa na verdade de que Ele é o Ungido, o Filho de Deus, até mesmo Ele que
vem ao mundo.

28. O Mestre (ò διδάσκαλος). Literalmente, o professor. Westcott comenta que


esse título permite um vislumbre da ligação do Senhor com os discípulos: então,
eles falavam dele.

Está aqui (πάρεστιν). Literalmente, está presente. Na t e b , está aí. Na bj, está aqui.

29. Levantou-se £...] e foi (ήγέρθη και ήρχετο). O aoristo, levantou-se, assinala
um ato único e instantâneo de levantar-se. O imperfeito, estava indo, assinala o
progresso em direção a Jesus.

31. Dizendo (λεγοντες). Os melhores textos trazem δόξαντες, supondo. Como na n v i .

Saíra (υπάγει). Afastara-se da nossa companhia. Vide nota sobre 6.21; 7.21.

Para chorar ("ίνα κλαύστ)). Na t e b , lamentar. A palavra quer dizer chorar alto.
VideMt 2.18; Mc 5.38; e nota sobre Lc 6.21; 7.32.

33. Moveu-se muito em espírito (ενεβριμήσατο τφ πνεύματι). Vide nota sobre


Mc 1.43; há três ocorrências da palavra para mover em outras passagens: M t 9.30;
Mc 1.43; 14.5. Em cada caso, ela expressa uma acusação ou censura acompanhada
do sentimento de desprazer. Essa passagem tem duas linhas de interpretação,
ambas assumindo que o sentido recém-declarado: (l) Τφ πνεύματι, o espírito, é
considerado como o objeto da acusação ou censura interior de Jesus. Isto é expli­
cado de maneira variada: como se Jesus repreendesse de forma contundente o re-
traimento natural de seu espírito humano e o convocasse para o conflito decisivo
com a morte; ou que Ele examinou seu impulso para tornar manifesta sua ener­
gia divina de uma vez por todas. (2) Considerar no espírito como representando a
esfera do sentimento, como 13.21; Mc 8.12; Lc 10.21. Alguns explicam o sentimen­
to como indignação diante do pranto hipócrita dos judeus ou da descrença deles
167
J oão — C ap . 1 1

ou da interpretação errônea da irmã; outros explicam como indignação diante do


triunfo temporário de Satanás, que tinha poder de morte.
A interpretação que explica τω πνεύματι como a esfera do sentimento deve ser
a preferida. Compare com o versículo 38, em si mesmo. A natureza da emoção de
Jesus, em particular, permanece em grande escala uma questão de conjectura. A
n v i traduz: agitou-se no espírito-, a t e b : teve um frêm ito interior.

Perturbou-se (έτάραξεν έαυτόν). Literalmente. Provavelmente, refere-se à de­


monstração externa do forte sentimento que ele sentiu.

35. Chorou (èôÓKpuoev). Um verbo diferente daquele do versículo 31. De δάκρυ, lágri­
ma, com o sentido de derramar lágrimas, chorar silenciosamente. Ocorre somente aqui no
texto do Novo Testamento. Κλαίω, chorar defir m a audível, é usado uma vez para nosso
Senhor em Lc 19.41. Segundo Godet: “O próprio Evangelho em que a divindade de
Jesus é afirmada com mais clareza também é aquele que nos deixa mais familiarizados
com o lado profundamente humano de sua vida”. Pode-se perceber, até mesmo pelo es­
tudo superficial dos clássicos, até que ponto essa concepção de divindade está desligada
no ideal pagão. Os deuses e deusas de Homero choram e urram quando são feridos,
mas não se comovem com o sentimento de insegurança do homem107[vide nota sobre
3.16). Gladstone afirma: “Os deuses, embora distribuam aflições sobre a terra, as quais
não são suavizadas por amor nem suscitadas por um propósito disciplinador distinto,
cuidam de manter-se além de todo toque de pesar ou cuidado”.

Assim os deuses urdem o fadário


D os infaustos mortais: um viver agoniado,
Sendo os numes incólumes108.

Também Diana, ao apelar ao coitado Hipólito por solidariedade, replica:

Vejo, e chorar não devo uma só lágrima109.

O satírico romano, sem perceber, testemunha da profunda fidelidade e beleza


dessa imagem do Salvador chorando com estas palavras: “A natureza confessa
que deu o coração mais terno para a raça humana ao lhes dar as lágrimas: essa é
a melhor parte das nossas sensações”110.

107. Talvez a abordagem mais próxima desse sentimento em Homero seja o caso de Tétis, choran­
do por seu filho Aquiles e também com ele (Homero, Ilíada, i, 360; xviii, 51, 66).
108. Homero, Ilíada, xxiv, 525.
109. Eurípedes, Hipólito, tradução J. B. de Mello e Souza. Disponível em: < http:// www.ebooksbra-
sil.org/eLibris/hipolito.html>. Acesso em: 28 jun. 2013.
110 . Juvenal, Sátiras, xv, 131-133.

168
João - C ap. 11

36. Amava (εφίλει). Não a palavra do versículo 5. Vide nota sobre 5.20, e com­
pare com 20.2.

37. Ao cego (του τυφλοϋ). Referindo-se à restauração do homem cego registrada


no capítulo 9. A ntlh é muito indefinida. A arc apresenta corretamente: abriu os
olhos ao cego.

Fazer também etc. Esse dito dos judeus deve ter sido proferido com ironia, caso
em que lança luz no sentido de moveu-se muito em espírito (v. 33) e de mover-se em si
mesmo no versículo seguinte. Mas as palavras podem ter sido ditas com sinceridade.

38. Posta (επέκει,το). Esse seria o sentido se o sepulcro fosse um buraco vertical;
mas se ele fora escavado horizontalmente na rocha, talvez tivesse o sentido de
posta contra. A tumba tradicional de Lázaro é do primeiro tipo, e descia-se nela
por uma escada.

39. Tirai. A pedra fora colocada sobre a entrada principal para guardar a tumba
contra animais selvagens e podia ser removida com facilidade.

Irmã do defunto. Um detalhe aparentemente supérfluo, mas acrescentado a


fim de apresentar o ponto da objeção dela quanto à remoção da pedra ao enfatizar
a relutância natural de uma irmã em ver o corpo corrompido do irmão exposto.

Cheira mal (όζει). Somente aqui no texto do Novo Testamento. A declaração


não indica uma experiência do sentido dela, o que é sustentado por alguns exposi­
tores e, às vezes, expresso no tratamento pictórico do assunto111, mas apenas sua
inferência a partir do fato de que ele morrera havia quatro dias.

É já de quatro dias (τεταρταίος εστιν). Expressão idiomática grega peculiar.


Ele ê um homem do quarto dia. Por isso, At 28.13 traz: um dia depois-, literalmente,
sendo homens do segundo dia. A ideia judaica comum era que a alma pairava acima
do corpo até o terceiro dia, quando começava a deterioração, e, nesse momento,
a alma fazia seu voo.

41. [T)o lugar onde o m orto estava deitado.]] Conforme a k j v . N o n t i a (cp.


t m ), de onde o morto fora posto. Omita, como na a r c .

1 1 1 . Como obras por Fra Angélico (Florença), Bonifazio (Louvre) e a soberba pintura de Sebastian
del Piombo, na Galeria Nacional, Londres.

169
J oão — C a p . 11

(τον δχλον). Em vista da distinção que João habitualmente faz


4 2 . D a m u ltid ã o
entre osjudeus e a multidão, o uso do último termo aqui é notável, uma vez que
judeus ocorre nos versículos 1 9 ,3 1 ,3 6 . Parece indicar que uma multidão confusa
está reunida. Na t e b , desta multidão. Vide nota sobre 1 .1 9 .

4 3 . V em p a ra fo ra (õeúpo €ξω). Literalmente, para este lado.

Literalmente. Somente aqui no texto do Novo Testamen­


4 4 . F a i x a s (K eip ío a ç).
to. Nas passagens de 1 9 .4 0 ; 2 0 .5 ,7 , usa-se όθόνια, lençóis.

L e n ç o (σ ο υ δ α ρ ίω ). Vide n o ta sob re Lc 1 9 .2 0 .

É interessante comparar a imagem do afeto fraterno sob a sombra da morte,


nesse Evangelho, com o mesmo sentimento conforme exibido na tragédia grega,
sobretudo em Sófocles, que o desenvolveu com maravilhoso poder em Antigone
e Electra.
Na primeira, Antigone, a figura feminina consumada da tragédia grega, cai
vítima de seu amor por seu irmão morto. Nessas duas obras, Antigone e Electra,
o amor fraterno é complicado por outro sentimento mais inflexível: em Antigone,
com o desafio indignado do decreto que se recusa a enterrar seu irmão; em Elec­
tra, com o anseio de vingança a muito acalentado. Electra anseia por seu irmão
Orestes como o ministro da retribuição, em vez de como o consolo para a solidão
e a dor. Por isso, para ela, a suposta morte dele é principalmente a derrota do
propósito apaixonado e mortal de toda sua vida. Antigone vive para seus pa­
rentes e é sustentada em seu triste destino pela esperança de se juntar a eles no
próximo mundo. Ela acredita na permanência da existência pessoal.

Lá, ao menos, tenho esperança de que minha chegada agradará a meu pai, a minha
mãe, e também a ti, meu irmão querido!112

E novamente:

Querida, como sempre fui, por ele, com ele repousarei no túmulo... com alguém
a quem amava; e meu crime será louvado, pois o tempo que terei para agradar
aos mortos, é bem mais longo do que o consagrado aos vivos... Hei-de jazer sob a
terra eternamente!...113

112 . Sófocles, Antigone, tradução J. B. de Mello e Souza. Disponível em: < http://www.ebooksbra-
sil.org/eLibris/antigone.html>. Acesso em: 28 jun. 2013.
1 13. Ibid.

170
J oão - C a p . 11

Nenhuma esperança desse tipo ilumina o pesar de Electra.

O restes m uito amado! M atas-m e morrendo!


Levastes, quando fostes, as minhas esperanças
—que viverías para retornar um dia
meu vingador e de m eu pai Q ./]114.

E novamente:

Fala nos deuses, sugerindo-me esperanças


Pelos que já pertencem ao reino das sombras115.

Quando lhe perguntam:

Será possível dar aos mortos nova vida ? " 6

Ela replica:

Não quero dizer isso. Julgas-me demente ? 117

Na família de Betânia, o pesar das duas irmãs, ao contrário do pesar das don­
zelas gregas, não está misturado com nenhum outro sentimento, salvo talvez o
matiz de um sentimento beirando a reprovação de que Jesus não estava lá para
impedir que a calamidade se abatesse sobre elas. Elas não expressam conforto
pela esperança de se reunir ao morto, e a doutrina de uma futura ressurreição,
dificilmente, está sugerida na declaração delas, doutrina essa que, para elas, é
um assunto genérico, tendo pouco ou nada que ver com pesar pessoal. Nesse
particular, até o ponto em que a expressão indica, a vantagem está do lado da
donzela tibetana. Embora sua esperança seja resultado de seu afeto, em vez de
seu treinamento religioso —um pensamento considerado o filho de um desejo —
ela nunca perde seu entendimento da expectativa de alegria de se juntar ao seu
ente querido morto.
Mas a história do Evangelho contrasta de forma mais forte com a literatura
clássica pela verdade da ressurreição que, na pessoa e energia do Senhor da vida,

114. Sófocles, Electra. Disponível em: <http://pensamentosnomadas.files.wordpress.com/2012/03/


electra.pdf>. Acesso em: 28 jun. 2013.
115. Ibid.
116. Ibid.
117. Ibid.

171
João — C ap. 11

domina a narrativa. Jesus entra de uma vez por todas como o consolo do amor
enlutado e a solução eterna do problema de vida e morte. A ideia que Electra
despreza como insana é, aqui, um fato realizado. Por mais bonita, maravilhosa que
seja a ação que o drama desenvolve do conflito do amor fraternal com a morte, a
cortina cai sobre a morte como a vitoriosa. Na história do Evangelho, Jesus traz
uma boa ação, uma lição e um triunfo. Sua calorosa solidariedade, suas palavras
reconfortantes, suas lágrimas no túmulo do amigo estão em relevante contraste
com a atitude política, tímida e, às vezes, injuriosa do coro de velhos tebanos em
relação a Antigone. A consumação das duas tragédias é o horror absoluto e não
aplacado. O suicídio resolve o problema para Antigone, e Electra recebe seu irmão
de volta, como se tivesse voltado do mundo dos mortos, uma vez que foi dado como
morto, só para incitá-lo a matar e a exultar com ele sobre as vítimas. É uma bela
característica da narrativa do Evangelho o fato de que ela parece, por assim dizer,
retirar-se com uma delicadeza instintiva da alegria dessa família reunida de novo.
Ela para abruptamente com as palavras: “Desatai-o e deixai-o ir”. Só a imaginação
segue as irmãs com o irmão, possivelmente com Cristo, atrás da porta fechada e
ouve a conversa sagrada dessa maravilhosa comunhão. Tennyson, com uma per­
cepção verdadeira e profundamente cristã, descobriu sua tônica.

Seus olhos são moradia de oração silenciosa,


Nenhum outro pensamento sua mente admite
Mas, ele foi morto e está assentado lá!
E aquele que o trouxe de volta está lá.
Então, um amor profundo superou
Todos os outros, quando seu olhar ardente
Passou pelo rosto vivo do irmão
E repousou na própria Vida118.

45. O que Jesus fizera. Os melhores textos omitem Jesus. Alguns registram ó,
aquilo que Ele fez; outros, a, as coisas que.

46. Alguns deles. Não dos judeus que foram até Maria, mas alguns dos judeus,
talvez alguns dos que reuniram a multidão por curiosidade.

47. Os principais dos sacerdotes. Do grupo dos saduceus. Deve-se manter


isso constantemente em mente ao ler a narrativa de João e a dos Sinópticos. Os
saduceus, representados pelos principais dos sacerdotes, são os líderes em escala
mais decisiva contra Cristo. Ao longo desse Evangelho, a forma de expressão é

118. Tennyson, In Memoriam.

172
J oão - C a p . 11

apenas os principais dos sacerdotes ou os principais dos sacerdotes e os fariseus. A


única menção aos fariseus na história da Paixão está em Mt 27.62, passagem em
que a expressão também é ospríncipes dos sacerdotes e osfariseus. Os principais dos
sacerdotes são inimigos mortais de Cristo (Mt 26.3,14). De forma similar, em
Atos dos Apóstolos, a oposição aos cristãos é encabeçada pelos sacerdotes e pelos
saduceus, que representam o mesmo grupo. Nas duas circunstâncias em que os
fariseus aparecem, eles inclinam-se a favor dos cristãos (5.34; 23.6).

Conselho (συνεδριον). Correto, e não o conselho que exigiría um artigo. O


sentido é que eles convocaram uma sessão do Sinédrio; provavelmente distinta de
uma reunião formal do corpo de membros.

Que faremos? O tempo presente indicando uma emergência. Esse homem


está em ação ensinando e realizando milagres, e o que nós estamos fazendo a
respeito disso?

48. O nosso lugar e a nação (τον τόπον καί το έθνος). Lugar, ο templo e a cidade
(At 6.13; 21.28; Mt 24.15). Nação, a organização civil. Vide nota sobre lPe 2.9;
Lc 2.32. No Sinédrio estavam muitos aliados devotados de Roma, e o resto estava
bem consciente da debilidade do poder nacional.

49. Caifás. Saduceu que deteve seu cargo por dezoito anos.

Naquele ano. Isso é mencionado para mostrar que João cometeu um erro histó­
rico, uma vez que, de acordo com a lei mosaica, o sumo sacerdócio era mantido pela
vida toda. O fato de haver três ocorrências da expressão (w. 49,51) é relevante e,
longe de indicar um erro, liga o cargo de Caifás com sua participação na execução
da morte de Cristo. O cargo delegava ao sumo sacerdote oferecer todo ano o grande
sacrifício de expiação pelo pecado; e naquele ano, aquele ano memorável, caiu a Caifás
ser o instrumento do sacrifício daquele que afastou o pecado do mundo. Dante põe
Caifás e seu sogro, Anás, bem no fundo do inferno, no fosso dos hipócritas:

Atalhai-me jazendo um condenado


Com puas três em cruz via estendido.
Em vendo-me estorceu-se angustiado,
Altos suspiros arrancou do peito.
Catalano acercou-se apressurado.
“Este” —disse —“que geme em duro leito,
Que a um homem dessem morte aconselhara
Aos Fariseus, do povo por proveito.

173
J oão - C ap. 12

“Através do caminho é nu, repara:


D e quem passa, desta arte, ele conhece
O peso, quando for calcá-lo para.
Igual martírio o sogro seu padece,
Assim como cada um desse concilio"9.

O Deão Plumptre sugere que a punição descrita pelo poeta parece reproduzir
o pensamento de Is 51.23.

50. Povo - nação (του λαοϋ - τό έθνος). O primeiro é a nação teocrática, o povo
de Deus; a segunda é o corpo político. Vide nota sobre lPe 2.9.

52. Nação (έθνους). João não usa a palavra λαός, povo, que Caifás acabou de empregar.
Os judeus não eram mais um povo, mas apenas uma das nações do mundo. Ele quer
estabelecer os gentios em contraposição com os judeus, e essa distinção era nacional.
Além disso, João aponta pelo uso dessa palavra o fato de que a obra de Cristo não foi
para ser de algum povo especialmente escolhido por Deus, mas para todas as nações.

54. Deserto. A região montanhosa deserta a nordeste de Jerusalém.

Eíraim. O local é incerto. Comumente tido como Ofra (lSm 13.17) ou Efraim
(2Cr 13.19) e identificado com et-Taiyibeh, a 25,7 quilômetros de Jerusalém e
situada em uma colina que domina o vale do Jordão.

55-57. 12.1-11. Compare com Mt 26.6-13; Mc 14.3-9.

C apítulo 12

1. O que falecera. Omita.

A quem ressuscitara. Leia, acrescentando Jesus·, “a quem Jesus ressuscitara”.

3. Uma libra (λίτραν). Somente aqui e em 19.39. Mateus e Marcos usam


άλάβαστρον, vaso.

D e nardo (νάρδου πιστικής). Como Marcos. Vide nota sobre Mc 14.3.

De muito preço (πολυτίμου). Literalmente, de muita valia. Mateus traz


βαρυτίμου, de grande valor.

119. Dante, A Divina Comédia, Inferno, xxiii, 110 - 122 , p. 145.

174
João —C ap. 12

Ungiu. Vide nota sobre 11 . 2 .

Pés. Os Sinópticos só mencionam o derramamento na cabeça.

4. Filho de Simão. Omita.

5. Trezentos dinheiros (τριακοσίων δηναρίων). Ou trezentos denários. Acerca


de denário, vide nota sobre Mt 20.2. Marcos diz mais que trezentos dinheiros.
Trezentos denários equivalería a cerca de cem reais ou duas vezes essa quantia
se calcularmos de acordo com o poder de compra.

Os pobres (πτωχοίς). Vide nota sobre Mt 5.3. Sem artigo: para pobres.

6. E tinha a bolsa, e tirava o que ali se lançava (και το γλωσσόκομον eíxe, κα'ι
τα βαλλόμενα έβάσταζεν). Os melhores textos trazem ’έχων, tendo, e omitem o
segundo και, e. Assim, a tradução deveria ser: e tendo a boba etc.

A bolsa (γλωσσόκομον). Somente aqui e em 13.29. Originalmente, uma caixa


para guardar o bocal de instrumento de sopro. Proveniente de γλώσσα, língua, e
κομέω, tende. A palavra também era usada para caixão fúnebre. Josefo usa-a para
cofre no qual os ratos de ouro e esmeralda eram preservados (lSm 6 . 11). Na l x x ,
da arca que Joás forneceu para receber contribuições para os reparos na casa do
Senhor (2Cr 24.8). A rv traz caixa, em nota de margem.

Tirava (Ιβάσταζεν). Levava ou roubava (t e b ). Esse sentido é, mais propria­


mente, transmitido pelo contexto do que residente no próprio verbo, ou seja, de
acordo com o uso do Novo Testamento (vide nota sobre 10.21). Inquestionavel­
mente, o verbo tem esse sentido no grego posterior, com frequência em Josefo120.
Portanto, traduza como a a r c . Na t b , subtraía. A tradução da t e b é tautológica.

120 . Alguns sustentam o significado de tirar ou carregar para Mt 8.17 e Jo 20.15 (como Thayer,
Lexicon). Penso que o primeiro é mais que duvidoso. Meyer declara que isso é “contrário ao
sentido”. De Wette e Lange traduzem por carregava. O Cônego Cook diz: “As palavras esco­
lhidas por Mateus eliminam a suposição de que ele aplica as palavras do profeta, ao contrário
do sentido do original, à mera remoção de doenças ao curá-las”. As palavras em Mateus são
uma citação de Is 53 .4, que Cheyne (Prophecies of Isaiah) traduz: “com certeza, ele levou nossas
doenças, e nossas dores ele as carregou”. A lxx : “Este homem carrega pecados e é afligido por
nós”, símaco : “Sem dúvida, ele carregou nossos pecados e aguentou nossos labores”. Eder-
sheim comenta que “as palavras, conforme apresentadas por Mateus, são mais verdadeiramen­
te um targum neotestamentário do original”. Delitzsch, que acha que o significado de tirar está
incluído no sentido da palavra hebraica nãsã’(ityj), admite que seu significado principal é: ele
recolheu, removeu. O significado em Jo 20.25 pode ser explicado como em Jo 12 .6, determinado
pelo contexto, embora possa ser traduzido por: se o tivesses tomado. Field (Otium Norvicense) cita
uma passagem de Diógenes Laércio (iv, 59) em que é dito que Lacides, sempre que tirava algu­
ma coisa de sua despensa, costumava, depois de lacrar, jogar o selo, ou anel, no poço, para que
nunca pudesse ser tirado de seu dedo e nenhuma das despensas fossem roubadas (βασταχθ^ίη).

175
J oão —Cap. 12

7. Deixai-a; para o dia da minha sepultura guardou isto (αφες αυτήν εις την
ημέραν του ενταφιασμού μου τετήρηκεν αυτό). Essa passagem apresenta grande
dificuldade. De acordo com essa leitura, o sentido é que Maria guardara o unguento,
talvez do estoque providenciado para o enterro de Lázaro, em contraste com o dia
da preparação de Cristo para a tumba. A palavra ενταφιασμού é traduzida incorre­
tamente por sepultamento. Ela tem o sentido de preparação para sepultamento, a ar­
rumação do corpo ou embalsamento. A passagem de 19.40 explica-a como a amarração
em panos de linho com especiarias: “como os judeus costumam fazer para preparar
para o sepultamento (ένταφιάζειν)”, não para sepultar (cp. kjv ). É a expressão em latim,
pollingere, lavar e preparar o corpo para apirafiinebre. Por isso, o nome do servo a quem
essa tarefa era atribuída era polinctor. Ele era um escravo de libitinarius, ou coveiro.
Assim, Maria guardou o unguento a fim de embalsamar Jesus com ele nesse dia,
como se Eleja estivesse morto. Esse é o sentido nos Sinópticos. Mateus (26.12) diz:
fi- lo preparando-me para o meu sepultamento. Marcos: antecipou-se a ungir.
Contudo, a leitura do t r é debatida. Os melhores críticos textuais concordam que
o perfeito, τετήρηκεν, tem guardado, foi substituído pela leitura original τηρήση, o ao-
risto, pode guardar, ou pode ter guardado, por alguns que tentavam harmonizar o texto
com Mc 14.8; sem entender como ela poderia guardar para o enterro dele aquilo
que derramava agora. Contudo, alguns argumentam exatamente o oposto, a saber,
que o perfeito é a leitura original e que o aoristo é a correção feita pelos críticos que
estavam ocupados com a noção de que nenhum homem é embalsamado antes de sua
morte, ou que não entendiam como o unguento já podia ser guardado, como se fosse
possível supor naturalmente que acabara de ser comprado (como Godet e Field).
De acordo com a leitura correta, iva, para, é inserido depois de αφες αύτήν,
deixem -na em p a z , ou permitam-na·, τετήρηκεν, guardou, é mudado para τηρήση,
pode guardar, e o todo é traduzido: perm itam -na g u ardar isto para o dia de meu
sepultamento. Como na rv.
Mas é difícil perceber por que Cristo desejaria que fosse guardado para seu
sepultamento o que já fora derramado sobre Ele. Alguns, como Meyer, assumem
que só uma parte do unguento foi derramada e αύτό, isto, se refere à parte res­
tante. “Deixem-na em paz, ela não pode dar para o pobre esse unguento de que já
usou uma porção para ungir meus pés, mas deve guardá-lo para o dia do meu em­
balsamento.” O Cônego Westcott inclina-se para essa percepção do uso de só uma
parte. Mas a inferência das narrativas dos Sinópticos pode ser que só o conteúdo
todo do frasco foi usado, e a menção, de João, à libra e à acusação de desperdício
tem o mesmo efeito. Não há nada que justifique uma suposição contrária.
Outros explicam: deixem -na p o r ter guardado isto, ou deixem -na para que possa
guardar isto. Como Westcott, que diz: “A expressão idiomática por meio da qual
o falante se lança no passado e observa o que é feito como ainda um propósito é
comum a todas as línguas”.
176
João - C ap . 12

Outros ainda, mais uma vez, retêm o sentido: deixem-na em paz, e traduzem
ΐνα, para, com uma elipse, deste modo: “Deixem-na em paz; (ela não vendeu seu
tesouro) para que possa guardar isto” etc.
A tradução antiga, como na k j v e a r c , é a mais simples e fornece um sentido
perfeitamente inteligível e consistente. Contudo, se essa tradução deve ser re­
jeitada, parece melhor, no todo, adotar a leitura paralela da r v , com 'iva elíptica:
deixem-na empaz; istofoi para que ela pudesse guardá-lo. Assim, preserva-se a força
proibitória de αφες αύτήν, implícita em Mt 26.10 e inquestionável em Mc 14.6.
Compare com Mt 15.14; 19.14; 27.49121.
Observe que a promessa da futura reputação desse ato (Mt 26.13; Mc 14.9)
é omitida pelo único evangelista que registra o nome de Maria em conexão
com ele.

9. Muita gente (όχλος πολύς). Os melhores textos inserem o artigo, o que trans­
forma a expressão em uma frase usual, as pessoas comuns. Como na r v .

Soube (εγνω). A n v i apresenta mais corretamente descobrir. Eles, ao descobrir.

10. Os principais dos sacerdotes. Vide nota sobre o versículo 47.

11. Iam (ΰπήγον). Afastavam-se da companhia deles.

12-19. Compare com M t21.1-ll;M c ll.l- ll;L c 19.29-44.

12. Uma grande multidão (δχλος πολύς). Alguns editores acrescentam o artigo
e traduzem: as pessoas comuns.

13. Ramos de palmeira (τά βαΐα των φοινίκων). A a r c omite os dois artigos:
os ramos das palmeiras. O termo βαΐα ocorre somente aqui no texto do Novo
Testamento e quer dizer ramos de palmeira ou, estritamente, topo da palmeira,
onde o fruto é produzido. De palmeiras pode ter sido acrescentado por João para
leitores não familiarizados com o termo técnico, mas a expressão ramos das
palmeiras é semelhante a chefe da casa (οικοδεσπότης τής οικίας, Lc 22.11). Em
geral, os artigos são explicados como designando as árvores que ficavam nas
laterais da rota da procissão. Alguns acham que eles apontam para os conheci-

121 . Field (Otium Norvicensé), que defende τετήρηκεν, observa que “a conjectura de que o unguento
possa ter sido reservado daquele usado no enterro de Lázaro não é fantasiosa, mas um ex­
celente exemplo de coincidência não programada, uma vez que nunca perceberiamos a pro­
priedade da expressão podia vender-se, dos dois primeiros Evangelhos, se João não nos tivesse
ajudado com seu τετήρηκευ, guarded’.

177
João - C ap. 12

dos ramos de palmeira que tem conexão com a Festa dos Tabernáculos. Acerca
dos diferentes termos empregados pelos evangelistas para “ramos”, vide nota
sobre Mc 11.8.

Ao encontro (ε’ις ύπάντησιν). Sentido muito literal, ir a um encontro.

Clamavam (εκραζον). O imperfeito, continuavam a clamar, como ele adiantara.

Hosana. Com o sentido de: Salvà

Bendito (ευλογημένος). Palavra diferente de bem-aventurados, de Mt 5.3


(μακάριος). Este é o particípio perfeito do verbo εύλοykiú, falar bem de, exaltar, daí
a palavra inglesa eulogy, elogio. A palavra de Mateus aplica-se a caráter, e esta a
reputação. A atribuição de louvor aqui é de SI 118.25-26. Esse salmo, de acordo
com Perowne, foi originalmente composto para a primeira celebração da Festa dos
Tabernáculos depois da conclusão da consagração do templo sagrado. As palavras
do versículo 25 eram entoadas durante aquela festa, quando o altar de ofertas
queimadas foi solenemente circundado; ou seja, uma vez em cada seis dias da festa,
e sete vezes no sétimo dia. Esse sétimo dia era chamado “o grande Hosana” e não
só as orações para a festa, mas também os ramos das árvores, incluindo as murtas
amarradas nas palmeiras, eram todos chamados de “Hosanas”.

O Rei de Israel. Os melhores textos acrescentam κα'ι, até o Rei etc.

14. Jumentinho (όνάριον). Somente aqui no texto do Novo Testamento. Mateus


menciona um jumento e um filhote; Marcos e Lucas só mencionam um filhote.

18. Saiu ao encontro (ύπήντησεν). O verbo tem o sentido de ir ao encontro. Na


r v , saiu e encontrou.

19. Vão após ele (όπίσω αύτοΰ άπήλθεν). A expressão ocorre somente aqui.
Literalmente, vão embora.

20. Gregos ("Ελληνες). Gentios, não helênicos. Vide nota sobre At 6.1. Jesus
entrou em contato com o mundo gentio em seu nascimento (os magos) e no fim
de seu ministério.

22. Filipe - André. Eles aparecem juntos em 1.45; 6.7-8. Compare com Mc 3.18.

23. Respondeu (άπεκρίνατο). Os melhores textos trazem αποκρίνεται, responde.


178
J oão — C a p . 12

É chegada a hora em que (έλήλυθ^ρ ή ώρα ϊνα). Não equivale a “é chegada


a hora em que”. A expressão a hora é usada de forma absoluta; é chegada a hora
crítica afim de que o Filho etc.

24. Na verdade, na verdade. Vide nota sobre 1.51; 10. l.

O grão de trigo (ò κόκκος). Esta é a forma apropriada, o grão ou trigo. O


artigo deve ser inserido na tradução, porque Jesus está citando o grão de trigo
como um tipo familiar daquilo que contém em si mesmo o germe da vida. Por
isso, trigo tem o artigo; o grão do trigo. A escolha da expressão grão de trigo
como ilustração adquire um interesse particular a partir do fato de ser dirigida
aos gregos, familiarizados com os mistérios eleusinos celebrados em seu pró­
prio país. Esses mistérios baseavam-se na lenda de Dionísio (Baco). De acordo
com a lenda, seu nome original era Zagreu. Ele era filho de Zeus (Júpiter) com
sua própria filha Perséfones (Proserpina) e estava destinado a ter sucesso no
domínio supremo e ao exercício do raio. O ciúme de Hera (Juno), esposa de
Zeus (Júpiter), incitou os titãs contra ele, que o mataram enquanto ele con­
templava seu rosto em um espelho, picaram seu corpo e o cozinharam em um
caldeirão, preservando só o coração. Zeus, em sua ira, arremessou os titãs para
o Tártaro, e Apoio recolheu os restos de Zagreu e os enterrou. O coração foi
dado a Sêmele, e Zagreu nasceu de novo dela sob a forma de Dionísio (Baco).
Os mistérios representavam o nascimento original da serpente, o assassinato
e o desmembramento da criança, e a vingança infligida a Zeus (Júpiter); e os
símbolos exibidos - o dado, a bola, o pião, o espelho e a maçã - representavam
os brinquedos com os quais os titãs atraíram a criança para seu poder. Depois,
seguiu-se a restauração da vida; Dêmetra (Ceres), deusa da agricultura, mãe do
alimento, juntando os membros e dando seu seio maternal para a criança. Tudo
isso era uma preparação para a grande eleusínia, na qual o ressurreto Dionísio
no vigor da sua segunda vida era conduzido por Atenas para Elêusis em alegre
procissão. Uma espiga de milho, arrancada em silêncio solene, era exibida para
os iniciados como o objeto de contemplação mística, como o símbolo do deus,
morto prematuramente, mas que, como a espiga guardando a semente do mi­
lho, carrega nele mesmo o germe de uma segunda vida.
Essa lenda foi combinada com a lenda de Perséfones, filha de Dêmetra,
levada por Plutão para o mundo infernal. A mãe vagueou por toda a terra à
procura da filha e ao encontrá-la apelou a Zeus, por meio de cuja intervenção
Perséfones, embora condenada a passar parte do ano no Hades, teve permis­
são para passar outra parte do ano na terra. Assim, a história transforma-se
no símbolo da vegetação que germina na primavera e cujo poder retira da
terra nas outras estações do ano. Essas características dos mistérios apresen-
179
J oão - C ap . 1 2

tam, com o mesmo símbolo empregado por Cristo aqui, o cru conceito pagão
de vida surgindo da morte.

Só (αυτός μόνος). Literalmente, ele mesmo só. Na rv , por si só, na n t l h , apenas um grão.

25. Vida (ψυχήν). Vide nota sobre Mc 12.30; Lc 1.46.

Perdê-la-á (άπολόσβ.). Os melhores textos trazem ànoÃÀúeL, perde. Vide nota


sobre Lc 9.25.

Neste mundo. Essa economia terrena vista como estranha e hostil por Deus.
As palavras são acrescentadas a fim de explicar a forte expressão aborrece a sua
vida ou alma.

Guardá-la-á (φυλάξει). Vide nota sobre lPe 1.4.

26. Serve (διακονή). Vide nota sobre Mt 20.26; Mc 9.35; lPe 1.12.

Me (έμοί). Observe a recorrência enfática do pronome nesse versículo.

Meu Pai. A t e b apresenta corretamente o Pai. Westcott relata:

Muita da exata força do registro de são João das palavras do Senhor parece depender
de concepções distintas das duas formas sob as quais a paternidade de Deus é descrita.
Diz-se que Deus é como "o Pai” e como “meu Pai”. Em geral, pode-se dizer que o pri­
meiro título expressa o relacionamento original de Deus com o ser e, sobretudo, com a
humanidade em virtude da criação do homem à imagem divina; e o segundo expressa
mais particularmente a relação do Pai com o Filho encarnado e, por isso, de forma
indireta com o homem em virtude da encarnação. O primeiro título sugere aqueles
pensamentos que brotam da avaliação da absoluta ligação moral do homem com Deus;
o último, aqueles que surgem do que é se faz conhecido para nós por meio da revelação
da ligação do Filho encarnado com Deus e com o homem. “O Pai”, sob esse aspecto,
corresponde ao grupo de idéias reunidas nos títulos do Senhor, “o Filho”, “o Filho do
homem”; e “meu Pai”, àquelas reunidas nos títulos “o Filho de Deus”, “o Cristo”.

27. Minha alma. Vide referências na nota sobre o versículo 25. A alma, ψυχή,
é a moradia das afeições humanas, o espírito (πνεύμα) é a moradia das afeições
religiosas.

Está perturbada (τετάρακται). O tempo perfeito: tem estado perturbada, e


permanece perturbada. O mesmo verbo de 11.33. Observe que lá é dito que Ele
180
J oão —C ap . 12

moveu-se em espírito (τώ πνεύματι). Sua agitação interior não surgiu de sofrimento
pessoal nem de empatia, mas do mesmo choque para seu senso moral e espiritual.

Que direi eu? Expressão natural das profundezas da humanidade de nosso Se­
nhor: como devo expressar minhas emoções? Alguns comentaristas ligam isso com
a oração seguinte.· devo dizer Pai, salva-me desta hora etc. Mas isso não concorda com
o contexto e representa uma hesitação na mente de Jesus que não tem lugar ali122.

Salva-me. O encolhimento de sofrimentos pertence à personalidade humana


de nosso Senhor (cp. Mt 26.39); mas a oração, salva-me desta hora não é para liber­
tação do sofrimento, mas por vitória na aproximação da provação. Vide Hb 5.7. A
expressão é muito vivida. “Salva-me desta hora”.

Para isso. Explicado pelo glorifica o teu nome. Para isso, a saber, que o nome do
Pai possa ser glorificado.

28. Glorifica (δόξασον). Na w y c l i f f e , esclarece, como na v u l g a t a , clarifica.

Nome. Vide nota sobre Mt 28.19.

30. Por amor de mim. Enfático na ordem grega. Essa voz não veio por amor de mim.

3 1 .0 príncipe deste mundo (ò αρχών» του κόσμου τούτου). A expressão ocorre


somente no Evangelho, aqui e em 14.30; i 6.ll.

Será expulso (έκβληθήσεται 6ξω). Em todos os casos, exceto um em que a


palavra έκβάλλω ocorre em João, ela é usada para expulsão de um lugar ou comu­
nidade santos. Vide 2.15; 9.34-35; 3Jo 10; Ap 12.2. Compare com Jo 10.4.

32. For levantado (ύψωθώ). Vide nota sobre 3.14. A referência original é à cruz,
mas foi incluída uma referência à ressurreição e à ascensão. Bengel diz: “Na cruz
mesmo já havia algo tendendo à direção da glória”. Na t e b , elevado.

Da terra (έκ τής γης). Literalmente, fora da terra.

Atrairei (έλκύσω). Vide nota sobre 6.44.

122. Meyer comenta com agudeza que essa tradução “traz o resultado de uma verdadeira oração
entremeada em monólogos reflexivos e, por isso, é menos adequada a uma estrutura de mente
tão profundamente comovida”.
181
João- C ap. 12
Todos (πάντας). Algumas altas autoridades leem πάι/τα, todas as coisas.

A mim (προς έμαυτόν). Essa forma está correta, a mim, em contraste com o
príncipe deste mundo.

34. Da lei. Vide nota sobre 10.34.

35. Convosco (μ€0’ υμών). Os melhores textos trazem èv ύμιν, entre vós. Como
na teb.

Enquanto tendes (écoç).Os melhores textos trazem ώς, conforme: caminhem em


conformidade com ofato de que têm a Luz entre vocês.

Para que as trevas vos não apanhem (ίνα μή σκοτία ύμάς καταλάβω). Ο texto
da NVi é melhor: para que as trevas não os surpreendam. Acerca de surpreendam, vide
nota sobre apanha, Mc 9.18; e informados, At 4.13.

40. Cegou-lhes os olhos etc. Essas palavras de Isaías são repetidas cinco vezes
no texto do Novo Testamento como a descrição do povo judeu em seu último
estágio de decadência. Mt 13.13; Mc 4.12; Lc 8.10; Jo 12.40; At 28.26.

Endureceu (π^πώρωκεν). Vide nota sobre o pronome relacionado, πώρωσις,


dureza, Mc 3.5.

Compreendam (νοήσωσιν). A rv apresenta uma tradução melhor, percebam,


na n v i , entendam. Marcos traz συνιώσιν, percebam. Vide nota sobre inteligência,
Lc 2.47.

Se convertam (έπιστραφώσιν). Vide nota sobre Mt 13.15; Lc 22.32. Na ntlh ,


mais acuradamente, se voltem, com a ideia de voltar-se para ou em direção a algo
(έπί).

41. Quando (oxe). Os melhores textos trazem oxv, porque. Como na t e b .

Sua glória. Na visão no templo, Is 6.1,3,5.

Dele. Cristo.

42. Até muitos dos principais (κα'ι ék των αρχόντων). Na rv, de forma mais
hábil e acurada, até dos líderes.
182
J oão — C a p . 12

Creram nele (επίστευσαν εις αυτόν). Vide nota sobre 1.12. Deve-se observar
que, aqui, João usa essa fé imperfeita que se recusa a se completar na confissão,
a fórmula para a fé perfeita. Compare com creram no seu nome (2.23), e vide nota
sobre essa passagem.

O confessavam (ώμολόγουν). O o, ou, como na r v , isso, não está no texto.


O verbo é usado de forma absoluta. Eles não fizeram confissão. Vide nota sobre
Mt 7.23; 10.32; 14.7.

Para não serem expulsos da sinagoga (ίνα μή αποσυνάγωγοι γένωνται).


Essa é a melhor forma, para não serem etc. Compare com a r v , versículo 35. Acer­
ca d a frase: serem expulsos da sinagoga, vide nota sobre 9.22.

43. Glória (δόξαν). É uma forma muito melhor porque sugere contraste com a
visão da glória divina mencionada no versículo 41. Compare com o versículo 44.

Do que (ηπερ). A palavra não pode ser traduzida por uma palavra correspon­
dente em nossa língua. A força é: “mais do que a glória de Deus, embora Ele seja
muito mais glorioso”. Não encontramos a palavra em nenhuma outra passagem do
Novo Testamento. Algumas autoridades leem υπέρ, acima, do alto.

44. Clamou (εκραξεν). Não se pretende que isso se relacione com um reapareci­
mento de Jesus em público. O encerramento de seu ministério público é mencio­
nado no versículo 36. Esse clamor dá continuidade aos próprios comentários do
evangelista e introduz um resumo do ensinamento passado de Jesus para os judeus.

Crê - naquele que me enviou (πιστεύει -ε ις τον πέμψαντά με). Esta é a primei­
ra e quase a única passagem desse Evangelho em que as palavras crer em são usadas
com referência ao Pai. A tradução no versículo 24 é um erro. Vide 14.1. A frase é
constantemente associada com nosso Senhor. Ao mesmo tempo, é preciso observar
que ela contempla o Pai como a fonte da revelação especial de Cristo e, por isso,
não é absolutamente uma exceção ao uso habitual. O mesmo é verdade para 14.1.

45. Vê (θεωρεί). Na r v , apropriadamente, contempla. Compare com 14.9. A pala­


vra foi escolhida de propósito para assinalar uma intensa, contínua contemplação
de Cristo, resultando em um conhecimento ainda mais amplo do Pai.

46. Vim (ελήλυθα). No n t i a , lenho vindo (campo interlinear). O tempo perfeito


aponta para o resultado permanente de sua manifestação. Compare com 5.43;
7.28; 8.42; 16.28; 18.37.
183
JoÂo - C a p . 13

Permaneça nas trevas. A expressão ocorre somente aqui. Compare com


lJo 2.9,11, e também com 8.12; 12.35.

47. Não crer (μή πιστεύστ)). Os melhores textos trazem φυλάξτ), (as) guardar.
Como na t e b .

Vim (ήλθον). O tempo aoristo aponta para o propósito da vinda, como o vim
(v. 46) aponta para o resultado. Compare com 8.14; 9.39; 10.10; 12.27,47; 15.22.
Encontramos os dois tempos em 8.42; 16.28.

48. Rejeitar (άθετών). Vide nota sobre Lc 7.30.

As [...] palavras (ò λόγος). Compreendendo todos os ditos (ρήματα).

Essa (εκείνος). Pronome de referência remota. Westcott comenta, de ma­


neira primorosa: “O pronome de retomada e de isolamento põe ênfase proemi­
nente no ensinamento mencionado como passado e separado daqueles a quem
era dirigido. Supostamente, ele permanece, à distância, como testemunha e
acusador”.

No último Dia. Peculiar a João. Vide 6.39.

49. De mim mesmo (4ξ 4μαυτοϋ). De dentro de mim mesmo. Essa fórmula ocorre
somente aqui. A expressão usual é άπ’ 4μαυτοΰ. A preposição άπό, da parte de,
como distinta de 4k, de dentro de, marca, antes, o ponto de partida como a fonte
viva e convincente daquilo que é apresentado a seguir. Em 7.17 lemos: “Se ela é
de dentro de Deus (4κ του Θεού) ou se eu falo da parte de mim mesmo (απ’ εμαυτοϋ)”.

Deu (εδωκεν). Os melhores textos trazem δεδωκεν, o tempo perfeito, tem dado-,
o resultado do dom continua até agora. Como na r v .

Dizer —falar (εΐπω —λαλήσω). O primeiro relacionando-se com a substância, e


o último, com a forma do pronunciamento de Jesus.

C a pítu lo 13

1 . Antes da festa da Páscoa. Essa oração é para ser interpretada com ήγάπησεν,
amou, no fim desse versículo. Observe que João, ao mencionar a Páscoa aqui,
abandona a frase explicativa dos judeus (11.55). Não é a Páscoa dos judeus que
Jesus está para celebrar, a qual degenerou em uma forma vazia, mas a ordem na-

184
J oão - C ap . 13

cional, em concordância com seu verdadeiro espírito, e com um desenvolvimento


de seu sentido mais elevado.

Sabendo (είδώς). Ou, uma vez que ele sabia.

Sua hora. Vide nota sobre 12.23, e compare com 2.4.

Que (ΐνα). A fim de que-, marcando a partida como um decreto divino.

Passar (μεταβη). A preposição composta μετά quer dizer passar de uma esfera
para outra.

Os seus (τούς ίδιους). Vide nota sobre At 1.7. Compare com 17.6ss.; At 4.23;
24.23; lTm 5.8; Jo 1.1 1 .

Amou-os (ήγάπησεν). Observe que João usa a palavra indicando o afeto discri­
minatório: o amor de escolha e de seleção. Vide nota sobre o versículo 20.

A té ao fim (εις τέλος). As interpretações diferem. A tradução da k j v e


rv é de autoridade duvidosa. As passagens mencionadas em apoio a essa,
M t 10.22; 24.13; Mc 13.13, podem todas ser traduzidas por até o extremo,
como na t e b . Além disso, outras fórmulas são usadas em que o sentido de até
o fim é inquestionável. Em Ap 2.26, a única outra instância dos escritos de
João em que τέλος é usado em uma frase adverbial, a expressão é άχρι τέλους,
até ofim. De forma similar, Hb 6.1 1 . Em Hb 3.6,14, μέχρι τέλους, até ofim.
A expressão pode ter o sentido de finalmente, e, por isso, muitos a traduzem
assim aqui, como Meyer, Lange e Thayer [Lexicon). “Finalmente, Ele amou-
-os”; ou seja, mostrou-lhes a última prova de seu amor. Essa é a tradução mais
provável em Lc 18.5, a respeito da qual vide nota. Esse também é o sentido
de até o extremo, ao máximo. Como Westcott e Godet. Mas estou inclinado a,
com Meyer, recuar diante da “gradação inapropriada” que, assim, está suge­
rida como se o amor de Jesus, agora, alcançasse um grau mais elevado que
antes (άγαπήσας). Por isso, prefiro a tradução até ao fim ou finalmente Ele os
amou, tomando ήγάπησεν, amou, no sentido da manifestação de seu amor. Esse
sentido, com frequência, está ligado ao verbo. Vide, por exemplo, lJo 4.10
(conforme Westcott, “o amor visto em sua manifestação histórica”); e compa­
re com Jo 3.16; Ef 2.4; 5.2,25; 2Ts 2.16; Ap 3.9.

2. Acabada a ceia (δείπνου γενομένου). A leitura mais aprovada é γινομένου, par-


ticípio presente, denotando enquanto a ceia acontecia. Por isso, a r v apresenta cor­
retamente: durante a ceia. Na n v i , estava sendo servida a ceia. A a r c está inadequada,

185
João - C ap. 13

mesmo se a leitura do t r for mantida, pois no versículo 12 Jesus reclina-se de novo, e


no versículo 26 a ceia ainda está acontecendo. A tradução deveria ser: tendo começado
a ceia ou tendo sido servida}™. É importante observar a ausência do artigo definido:
uma ceia, distinta de a festa, e esta também é designada por uma palavra distinta.

Tendo já £../] posto (ήδη βτβληκότος). Esse já é melhor. P osto literalmente


quer dizer lançado ou jogado.

No coração de Judas. Meyer, estranhamente, faz referência ao coração do


próprio diabo, e não ao de Judas, traduzindo por: tendo o diabo j á fo rm a d o o d e­
sígnio de que J u das deveria o entregar. Godet não é muito incisivo quando diz que
“esse sentido é insustentável”124.

3. Tinha depositado (δέδωκβι). Os melhores textos trazem ’έδωκχρ, depositou, com


o aoristo marcando o comissionamento de Jesus como dado de uma vez por todas.

Havia saído (έξήλθε). Essa tradução exigiria o tempo mais-que-perfeito. O


aoristo aponta para sua vinda como fato histórico, não como relacionado ao seu
resultado. Vide nota sobre 12.47. Na rv, corretamente, saiu.

Ia (ύπάγβ,). Tempo presente: vai; voltando das cenas da terra. Observe a ordem
original: quefoi de Deus que Ele saiu, epara Deus Ele está indo.

4. Da ceia (4κ τοϋ δείποου). Do grupo reunido à mesa.

Tirou (τίθησι). Tempo presente: tira. Na t e b , depõe.

As vestes (ίμάτια). Vide nota sobre M t 5.40. Vestes de cima.

Toalha [Xkvziov). Uma palavra latina, linteum. Um pano de linho. Ocorre so­
m e n t e aqui e no versículo 5. Na t e b , pano.

Cingiu (διέζωσεν). Ocorre somente nesse capítulo e em 21.7. O verbo com­


posto tem o sentido de prender ou cingir ao redor.

123. Godet, com sua conhecida aversão por afastamentos do t r , sustenta a leitura yevopévou, e
explica γινομένου por quando o repasto começou como repasto, acrescentando que a correção foi
feita a fim de localizar a lavagem de pés no início da refeição, o momento costumeiro para
fazer isso. Porém, a realização do ato durante o curso da refeição é indicado pelas palavras do
versículo 4: Levantou-se da (έκ) ceia.
124. Estou surpreso de descobrir que foi adotado por Milligan e Moulton.

186
Jo â o - C ap. 13

5. Numa bacia (νιπτήρα). Somente aqui no texto do Novo Testamento. De


νίπτω, lavar.

6. Tu lavas (σύ μου νίπτεις)? Os dois pronomes, tu, mim, permanecem juntos no
início da sentença em contraste enfático. Tu a mim lavas os pés?

7. Sabes - saberás (οίδας - γνώση). A a r c ignora a distinção entre as duas pa­


lavras. “Não o sabes tu” (ούκ οίδας) de absoluto e completo conhecimento. Você deve
aprender ou perceber (γνώση), a partir do conhecimento adquirido pela experiência.
Na n v i , compreende e entenderá. Na t e b , saber e compreenderás. Vide nota sobre 2.24.

Depois (μετά ταυτα). Literalmente, depois dessas coisas.

8. Nunca (ού μή - εις τον αιώνα). Expressão muito contundente. Literalmente,


você não deve de maneira alguma lavar meus pés enquanto houver mundo.

10. Aquele que está lavado - lavar [(...3 os pés (ό λελουμένος - νίψασθαι). A a r c
elimina a distinção entre λούω, banhar, aplicar água no corpo todo, e νίπτω, lavar
uma parte do corpo. Assim, quando Dorcas morreu (At 9.37), elas banharam seu
corpo (λούσαντες). O provérbio em 2Pe 2.22 é sobre a porca que foi toda banhada
(λουσαμένη). Por outro lado, aquele que jejua deve lavar o rosto (Mt 6.17).
No texto do Novo Testamento, os dois verbos são sempre usados para seres vivos.
A palavra para lavar coisas, como redes, vestes etc., é πλύνω. Vide Lc 3.2. Todos
os três verbos ocorrem em Lv 15.11 (lxx ).

1 1 . Quem [[...3 havia de trair (τον παραδιδόντα). Literalmente, aquele que está train­
do. Como em Mt 26.2, o tempo presente é usado, está sendo traído (παραδίδοται). Vide
nota sobre Mt 4.12, e compare com προδότης, traidor, Lc 6.16; At 7.32; 2Tm 3.4.

12. Assentou (άναπεσών). Literalmente, reclinou-se. Os convidados reclinavam-


se sobre divãs, recostando-se sobre o lado esquerdo do corpo e inclinando sobre
a mão esquerda. A mesa ficava um espaço quadrado ou oblongo formada nos três
lados pelos divãs, o quarto lado ficava aberto e a mesa estendia-se para além do
fim dos colchões.

Entendeis (γινώσκετε). Entendeis ou percebes?

13. M estre (ό διδάσκαλος). Literalmente, o professor. Mestre e Senhor, de acordo


com os títulos judaicos Rabbi e Mar, dependendo se os seguidores eram discípulos
ou servos.
187
JoAo- C ap. 13
14. £Vosso] Senhor e Mestre. Pronome inserido na kjv; omitido na arc. Melhor
como na ara: o Senhor e o Mestre. Os dois têm artigo.

Deveis (ο φ είλε). O verbo quer dizer ter obrigação. Há várias ocorrências


dele nas epístolas de Joâo (lJo 2.6; 3.16; 4.11; 3Jo 8). No Evangelho, ocor­
re somente aqui e em 19.7. Compare com Lc 17.10. Na versão de Mateus da
oração do Senhor, ocorrem as duas palavras relacionadas: όφείλημα, dívida, e
όφειλετης, devedor. Aqui Jesus apresenta a obrigação de ministrar como uma
dívida sob a qual seus discípulos estão obrigados por meio do ministério dele
para eles. A palavra deve é o tempo passado de dever. Δει, dever ou ser obrigado
[vide 3.7,14,30 etc.), expressa uma obrigação na natureza das coisas-, όφείλειν,
uma obrigação especial, pessoal.

13. Exemplo (υπόδειγμα). Acerca das três palavras usadas no texto do Novo
Testamento para exemplo, υπόδειγμα, τύπος e δείγμα, vide nota sobre 2Pe 2.6;
lPe 5.3; Jd 7.

16. Na verdade, na verdade. Vide nota sobre 1.51; 10.1.

O servo. Sem artigo. Melhor um servo; como na n v i , nenhum escravo.

O enviado (απόστολος). Literalmente, um apóstolo. Vide nota sobre M t 10.2.

17. Bem-aventurados (μακάριοι). Melhor como na nvi, felizes. Vide nota sobre
Mt 5.3.

18. Tenho escolhido (εξελεξάμηη). Tempo aoristo, eu escolhí. Não eleito para a
salvação, mas escolhido como apóstolo.

Que se cumpra a Escritura etc. (ΐνα). Elíptico. Devemos suplentar que essa
escolhafo i feita para que etc.

Come (τρώγωυ). Com exceção de Mt 24.38, a palavra ocorre somente em João.


Vide nota sobre 6.54. Originalmente, ela queria dizer roer ou mastigar, mastigar
vegetais efrutas crus, e, por isso, com frequência, era usada para a alimentação de
animais, como Homero125, em referência à alimentação de mulas. Evidentemente
ela perdeu seu sentido original no texto do Novo Testamento, como também o
perdeu em certa extensão no grego clássico, embora, quando aplicada aos ho-

125. Homero, O disséia, vi, 90.


188
João —Cap. 13
mens, se refira mais comumente ao ato de comer vegetais e frutas, como em
Aristófanes126, σΟκα τρώγει v, comerfigos. O total divórcio de seu sentido original
no Novo Testamento é demonstrado em sua aplicação à carne de Cristo (6.54).
Ela só é usada por João em conexão com Cristo.

Pão comigo (μετ’ ψού τον optou). Alguns editores leem μοί) τον άρτον, meupão.

Calcanhar (πτέρναν). Somente aqui no texto do Novo Testamento. A metáfora é


de dar um chute. Daí Plutarco, ao descrever o ladrão Sciron, que estava acostumado,
“por causa de sua insolência e atrevimento, a esticar seus pés para estranhos,
ordenando-lhes que os lavassem, e depois, após terminarem essa tarefa, a mandá-
los, com um chute, rocha abaixo para o mar”127. Alguns explicam a metáfora pela
rasteira no pé em algum tipo de luta; mas, como Meyer, com acerto, diz: “Jesus não
foi ludibriado’. A citação é do hebraico, não da lxx, de SI 41.9 (lxx, 40). A lxx traz:
“Pois o homem de minha paz em quem esperava, que come meu pão, aumentou sua
perspicácia (πτερνισμόν, lit., passou rasteira) contra mim”.

19. Agora (άπ’ άρτι). A arc traz corretamente desde agora. Compare com 1.52;
14.7; Mt 23.39.

Eu sou (4γώ είμι). Na ntlh, E u so u quem sou. Vide nota sobre 8.24.

21-35. Compare com M t 26.21-25; Mc 14.18-21; Lc 22.21-23.

21. Turbou-se em espírito. Vide nota sobre 11.33; 12.27. A agitação era na re­
gião mais elevada da vida espiritual (πνεύμα).

Um de vós me há de trair. Como Mateus e Marcos, com o acréscimo de que


comigo come. Lucas, a mão do que me trai está comigo à mesa.

22. Olhavam (έβλεπον). O tempo imperfeito, continuavam olhando conforme du­


vidavam.

Sem saberem (άπορούμενοι). Vide nota sobre Mc 6.20.

Ele falava (λέγει). O tempo presente, fala, foi introduzido para criar o efeito
de vivacidade.

126. Aristófanes, A p a z , 1325.


127. Plutarco, Teseu.
189
João - Cap. 13
23. Estava reclinado no seio de Jesus (ήν άνακείμίνος kv τώ κόλπφ του
Ίησοϋ). A rv traduz: “estava reclinado à mesa etc. A mesa foi acrescentado porque
o verbo é o termo genérico equivalente a sentado à mesa. “No seio de Jesus”
define a posição de João em relação aos outros convidados. Como os convidados
reclinavam sobre o braço esquerdo, os pés estirados para trás, a cabeça de cada
um deles estaria próxima do peito de seu companheiro da esquerda. Supondo
que Jesus, Pedro e João estavam juntos, Jesus ocuparia o lugar central, o lugar
de honra, e João, estando de frente para Ele, podia prontamente reclinar-se para
trás e falar com Ele. Pedro estaria atrás dele.

Peito. Vide nota sobre Lc 6.38. Os Sinópticos não relatam esse incidente.

24. Fez sinal (veúei). Literalmente, acenou com a cabeça.

Para que perguntasse quem era (πυθέσθαι τίς αν £Ϊη). Os melhores textos
trazem καί Ãéyei αύτφ ei/trè τίς έστιν, e disse a ele: Diga-nos quem é.

25. Inclinando-se (έπιπεσών). Esta palavra literalmente quer dizer cair so­
bre, e é traduzida dessa maneira em quase todas as ocorrências no texto do
Novo Testamento. Em Mc 3.10, ela aplica-se às multidões, que se arrojavam
sobre Cristo. Contudo, ela não ocorre em nenhuma outra passagem em João,
e, por isso, algumas das melhores autoridades leem αναπνοών, inclinando-se,
verbo que João usa diversas vezes no Evangelho, como no versículo 12128.
Como na r v . Qualquer uma das duas leituras aponta a distinção, perdida
pela kjv ao traduzir deitado, entre ήν άνακ€ΐμενος (v. 23), que descreve a
posição reclinada de João ao longo da refeição, e a repentina mudança de
posição retratada por άναπεσών, inclinando-se. A distinção é reforçada pela
preposição distinta em cada caso: reclinado no (ev) seio de Jesus e inclinan­
do-se para trás (άνά). Mais uma vez, as palavras seio e peito representam
palavras distintas no grego: κόλπος representa mais geralmente a curva
formada pela parte dianteira da pessoa reclinada, o regaço, colo, e στήθος, o
peito propriamente dito. No texto do Novo Testamento, o verbo άναπίπτω,
inclinar-se, sempre descreve uma mudança de posição. É usado para a incli­
nação para trás do remador para dar uma nova remada. Platão, na conheci­
da passagem de Fedro, na qual a alma é descrita sob a figura de dois cavalos
e um charreteiro, diz que o charreteiro tem medo quando contempla a visão
do amor e cai para trás (άν^πβσ^ν), de maneira que faz com que os cavalos
fiquem sobre suas ancas.

128. O afeto de Godet pela “leitura recebida” leva-o umtanto alémdos limites quando diz que
άναπ€σών"pareceabsurdo”.
190
J oão - Cap. 13
[[Como ele estava]] (ούτως). Inserido pelos melhores textos e não encontrado
na arc. Reclinado como ele estava, inclinou-se. Na tb, “aquele discípulo, assim re­
clinada, encostou-se”. A atitude geral de reclinação foi mantida. Compare com 4.6:
“Assentou-se assim (ούτως) junto da fonte”. De acordo com a instituição original,
a Páscoa era para ser comida de pé (Ex 12.11). Depois do cativeiro, o costume
mudou, e os convidados passaram a reclinar-se. Os rabinos insistiam que, pelo
menos, parte da ceia de Páscoa devia ser feita naquela posição, porque eram os
escravos que comiam assim de pé, e a posição reclinada mostrava que haviam
sido libertos da escravidão.

Peito (στήθος). De 'ίατνμι,fazer levantar. Daí aquele que se sobressai. Em escritos pos­
teriores, João ficou conhecido como ό ςπιστήθιος, aquele sobre o seio ou o amigo dopeito.

26. A quem eu der o bocado molhado (φ έγώ βάψας τό ψωμίον έπιδώσω). Os


melhores textos apresentam ω έγώ βάψω τό ψωμίον και δώσω αύτώ, para quem
eu mergulharei o bocado e o darei.

Bocado (ψωμίον). Só nesse capítulo. Diminutivo de ψωμός, um bocado, que, por


sua vez, é proveniente de ψάω, esfregar ou esfarelar. Homero diz, acerca do ciclope:

Da garganta vinham nacos (ψωμοί) de carne nadando


em golfadas tintas arrotos do borracho129.

E Xenofonte: “E em determinada ocasião tendo visto um de seus compa­


nheiros à mesa provando muitos pratos com um bocado (ψωμφ) de pão”130.
O verbo relacionado ψωμίζω, traduzido por alimentar, ocorre em Rm 12.20;
lCo 16.3. Vide também na lxx: SI 79.5; 80.16. De acordo com sua etimologia,
o verbo quer dizer alimentar com bocados; e os gregos o usavam para se referir
ao fato de ama-seca mastigar o alimento e, depois, o dar para o nenê. Por isso,
Aristófanes disse: Έ uma colocava a criança para descansar, outra banhava-a, e
outra ainda alimentava-a (έψώμισεν)”131. Esse sentido, possivelmente, pode dar
um novo colorido à palavra conforme usada em Rm 12.20: “Se o teu inimigo
tiver fome, dá-lhe de comer (ψώμιζα)”; com terno cuidado. Em lCo 13.3, o sentido
original parece ser enfatizado: Έ ainda que distribuísse toda a minha fortuna
para sustento dos pobres (ψωμίσω)”. Essa ideia é a de fazer caridade aos bocados.
O Deão Stanley diz:

129. Homero, Odisséia, ix, 374, p. 135.


ISO. Xenofonte, M em orabilia, iii, 14-15.
131. Aristófanes, L isístra ta , 19-20.

191
JoAo —Cap. 13
Quemjá testemunhou adoação emummonastériocatólico ou no pátio dopalácio de
umbispoou arcebispo da Espanha ou Sicilia, onde imensas receitas são injetadas em
quantias insignificantes para rebanhos de mendigos, será que sente aforça do uso de
ψωμίσωumtanto irônico do apóstolo?

Molhando o bocado. Compare com Mt 26.23; Mc 14.20. O molho comum


da ceia de Páscoa consistia dos seguintes itens arrumados juntos: carne do cor­
deiro pascal, um pedaço de pão sem fermento e ervas amargas. O molho em que
essas coisas eram mergulhadas não pertencia à instituição original, mas foram
introduzidas antes da época de Cristo. De acordo com uma autoridade, ele con­
sistia apenas de vinagre e água (cp. Rt 2.14); outros descrevem o molho como
uma mistura de vinagre, figos, tâmaras, amêndoas e tempero. A farinha usada
para engrossar o molho em ocasiões comuns era proibida na Páscoa pelos rabi­
nos, para que não provocasse uma leve fermentação. De acordo com alguns, o
molho era batido até adquirir a consistência de argamassa a fim de comemorar
o trabalho dos israelitas no Egito onde produziam e assentavam os tijolos.

A Judas Iscariotes, filho de Simão (Ιούδα Σίμωνος Ίσκαριώτη). Os me­


lhores textos apresentam Ίσκαριώτου, “Judas, o filho de Simão Iscariotes’. Como
6.71. O ato foi um sinal de clemência e de boa vontade em relação ao traidor e um
tácito apelo à consciência deste contra a traição contemplada.

27. Após o bocado (tóte). Com ênfase peculiar marcando o ponto decisivo no
qual Judas, finalmente, cometeu sua mais tenebrosa obra. Se o sinal de boa vonta­
de que Jesus ofereceu não abrandasse o coração dele, então o endurecería; e Judas
parece tê-lo interpretado como uma confirmação de seu propósito.

Satanás. A única ocorrência dessa palavra nesse Evangelho.

Entrou nele (elç έκεΐνον). O pronome de referência remota separa Judas da


companhia dos discípulos.

Depressa (τάχιον). Literalmente, mais depressa. O comparativo sugere uma


ordem para apressar seu trabalho, que já começara.

29. A bolsa. Vide nota sobre 12.6.

Compra (άγόρασον). Argumento incidental em favor dessa reunião dos discí­


pulos ter acontecido na noite da festa da Páscoa. Se tivesse sido na noite anterior,
ninguém teria pensado que Judas sairia à noite para comprar provisão para a
festa, quando havia todo o dia seguinte para isso, nem pensariam que sua saída
192
João - Cap. 13
fosse para procurar os pobres àquela hora. O 15.° dia de nisã, época da celebração
da Páscoa, na verdade, estava investido da santidade do sábado; mas provisão e a
preparação do alimento necessário eram expressamente permitidas naquele dia.
As regras rabínicas proviam até mesmo para a procura do cordeiro pascal na
véspera da Páscoa quando acontecia de cair no sábado.

Para a festa (elç τήρ έορτήρ). Essa é a melhor tradução. A festa da Páscoa.
A refeição que estiveram compartilhando era a refeição preliminar, no encerra­
mento da qual a Páscoa era celebrada; da mesma maneira como, subsequente­
mente, a eucaristia era celebrada no encerramento do ágape, ou festa do amor.
Observe a palavra diferente, èopτ\\, festa, em vez de ôclitvop, ceia, e o artigo
usado com festa.

Aos pobres. Talvez para ajudá-los a procurar seu cordeiro pascal.

30. Judas (€Κ6Ϊνος). Na kjv , ele. Vide nota sobre o versículo 27.

31. Agora. Marcando uma crise na qual Jesus é liberado da presença do traidor
e aceita as consequências de sua traição.

É - glorificado (έδοξάσθη). Literalmente, foi glorificado. O aoristo aponta


para a saída de Judas. Jesus foi glorificado por meio da morte, e seu destino foi
selado (falando do ponto de vista humano) pela saída de Judas. Ele fala da morte
e consequente glorificação como já realizada.

32. Se Deus é glorificado nele. As autoridades mais antigas omitem.

Em si mesmo (kv έαυτω). Sua glória estará contida na glória divina e será
identificada com ela. Compare com “aquela glória que tinha contigo”, παρά σοί
(17.5). Έν, em, indica unidade de ser, παρά, com, unidade deposição.

33. Filhinhos (raoáa). Diminutivo, ocorrendo somente aqui no Evangelho, mas


repetidas vezes na primeira epístola. Não ocorre em nenhum outro trecho do
Novo Testamento.

Agora (άρτι.). No versículo 31, agora corresponde a νΰν, o que marca de forma
absoluta um ponto no tempo. Já o termo άρτι marca o ponto no tempo enquanto
relacionado com o passado ou com o futuro. Por isso, “desde os dias de João Ba­
tista até agora” (άρτι; Mt 11.12). “Ou pensas tu que eu não podería, agora (άρτι),
orar a meu Pai?”, embora a ajuda tenha sido adiada até agora (Mt 26.53). Aqui a
193
Jo ã o - C ap . 13

palavra sugere que o pesaroso anúncio da despedida de Jesus de seus discípulos


foi retida até o presente. Agora chegou a hora.

34. Novo (καινήν). Vide nota sobre M t 26.29.

M andam ento (έντολήν). A palavra para um único mandamento ou injun-


ção, mas usada também para o corpo inteiro de preceitos morais do cristia­
nismo. Vide lTm 6.14; 2Pe 2.21; 3.2. Vide também nota sobre T g 2.8. Esse
novo mandamento incorpora o princípio essencial de toda a lei. Compare
também com 1Jo 3.23. Alguns intérpretes, em vez de entender que vos ameis
uns aos outros etc., como a definição do mandamento, explicam o manda­
mento como se referindo à ordem da santa comunhão e o traduzem por “um
novo mandamento (observar essa ordenança) vos dou a fim de que ameis uns
aos outros”. Contudo, essa interpretação é mais que improvável e contrá­
ria ao uso de que se deveria fazer referência à santa ceia como Ιντολή, um
mandamento.

Que (iva). Com sua usual força télica132; indicando o escopo, e não apenas a for­
ma ou natureza do mandamento.

Como (καθώς). Essa é a melhor tradução. Não é uma simples compara­


ção (ώσιτερ), mas uma conformidade-, o amor tem de ser da mesma natureza.
Contudo, há duas formas de traduzir a passagem. 1. “Dou-lhes um novo
mandamento de que amem uns aos outros com a mesma devoção com que
eu os amei.” 2. “Dou-lhes um novo mandamento, que amem uns aos outros
como os amei até o momento a fim de que imitem meu amor uns em rela­
ção aos outros.” A primeira tradução descreve o caráter do amor mútuo dos
cristãos; a segunda, seu fundamento. A r v traz a segunda tradução em nota
de margem.

35. Conhecerão (γνώσονχαι). Perceberão ou virão a conhecer.

Meus discípulos (έμοί μαθηταί). Vide nota sobre M t 12.49. Literalmente, dis­
cípulos para mim. Compare com 15.8.

36-38. Compare com M t 26.31-35; Mc 14.27-31; Lc 22.31-38.

37. Agora (άρτι). Sem esperar por um tempo futuro. Vide nota sobre o versícu­
lo 33, e compare com νϋν, agora, no versículo 36.

132. Dirigida a um fim (τίλος) e, por isso, marcando um propósito.


194
João - Cap. 14
Darei a minha vida. Vide nota sobre 10.11.

38. Tu darás a tua vida? Para uma repetição similar das próprias palavras de
Pedro, vide nota sobre 21.17.

Capítulo 14

1. Coração (καρδία). Nunca usado no texto do Novo Testamento para o mero


órgão fisico, como acontece na lxx , embora, às vezes, seja usado em relação ao
vigor e senso de vidafisica (At 14.17; T g 5.5; Lc 21.34). Em geral, o cerne de nosso
complexo ter - físico, moral, espiritual e intelectual. Vide nota sobre Mc 12.30. O
órgão imediato por meio do qual o homem vive sua vida pessoal e no qual toda a
vida da pessoa se concentra. Por isso, às vezes, é usado como paralelo de ψυχή, a
vida individual, e de πνεύμα, o princípio da vida, que se manifesta na ψυχή. Estri­
tamente, καρδία é o órgão imediato de ψυχή, ocupando uma posição mediadora
entre ela e πνεύμα. No coração (καρδία), o espírito (πνεύμα), que é o princípio dis­
tintivo da vida ou alma (ψυχή), tem o alicerce de sua atividade.
As emoções de alegria ou pesar, assim, são ambas atribuídas ao coração e à alma.
Compare com 14.27: “Não se turbe o vosso coração (καρδία)”; e com 12.27: “Ago­
ra, a minha alma (ψυχή) está perturbada”. O coração é o foco da vida religiosa
(Mt 22.37; Lc 6.45; 2Tm 2.22). É a esfera de operação da graça (Mt 13.19; Lc
8.15; 24.32; At 2.37; Rm 10.9-10). Também do princípio oposto (Jo 13.2; At 5.3).
Usado também como o alicerce do entendimento-, afaculdade da inteligência quando
aplicada às coisas divinas (Mt 133.15; Rm 1.21; Mc 8.17).

Credes - crede também (πιστεύετε κα'ι πιστεύετε). Os verbos podem ser en­
tendidos como indicativos ou imperativos. Assim, podemos traduzir: vós credes em
Deus, vós credes também em mim, ou: crede em Deus e credes em mim-, ou: crede em Deus
e crede em mim-, ou, uma vez mais, como na arc. A terceira tradução corresponde
à melhor, com o caráter animador do discurso.

2. Casa (οικία). O lugar de moradia. Usado principalmente para o prédio (Mt 7.24; 8.14;
9.10; At 4.34). Dafamília ou todas aspessoasque habitam na casa (Mt 12.25; Jo 4.53; lCo
14.15; Mt 10.13). De propriedade (Mt 23.14; Mc 12.40). O sentido aqui é céu133.

1SS. A explicaçãodadopor Milligan eMoulton équeacasa doPai inclui terraetambémcéu; em


suma, queéouniverso sobreoqual o Pai governa, tendo muitos apartamentos, alguns deste
lado, outros alémdo túmulo. Portanto, quandoJesus vai embora, Ele vai apenas paraoutro
cômododaúnicacasa do Pai. O principal pensamentoéqueemqualquerlugarnoqual Jesus
esteja, todosnósestamosnacasadoPaie, porisso, nãopodehaververdadeiraseparaçãoentre
Jesus e seusdiscípulos. Isso é muitobonitoeé, emsi mesmo, verdade, mascomoexplicação
dessapassagemnãoestágarantidapornadanela, mas, antes, élidanela.
195
J oão - Cap. 14
Moradas (μονά!). Ocorre somente aqui e no versículo 23. De μένω, permanecer
ou habitar. Originalmente, uma permanência, ou estadia, ou adiamento. Daí Tucí-
dedes, de Pausânias: “Ele assentou em Colonas, em Tróade, e, conforme relatado
para os éforos, para estar negociando com os bárbaros e para permanecer lá (την
μονήν ποιούμενος, literalmente, fazer uma parada) para não bons propósitos”134.
Por isso, um lugar de permanência ou de moradia. A palavra morada tem etimolo­
gia semelhante e segue o mesmo curso de desenvolvimento, sendo derivada de
manere, permanecer. Assim, mansio é, primeiro, uma estadia e, depois, um lugar de
moradia. Um sentido posterior de morada e de μονή é lugar de moradia ou parada
em uma jornada. Alguns expositores, como Trench e Westcott, explicam a pala­
vra aqui conforme esse último sentido como indicando a combinação das noções
contrastadas de progresso e resposta na percepção do futuro135. Isso é bastante
indefensável. Aqui, a palavra tem o sentido de moradias. Compare com a descri­
ção do palácio de Príamo feita por Homero:

Entrando no solar belíssimode Príamo,


passandopelos pórticos deliso mármore,
deparacomcinquenta aposentos contíguos,
revestidos depedrapolida, onde os filhos
dorei, junto às esposas dormiam; do outro lado
dopátio, outros doze aposentos, fronteiros,
para as filhas de Príamo, empedrapolida,
os tetos comterraços, contíguos. Os genros
de Príamo ali dormiam, junto comas esposas136.

Godet comenta: “A imagem deriva daqueles grandes palácios orientais em


que há não só moradia para o soberano e o herdeiro do trono, mas também para
todos os filhos do rei, por mais numerosos que possam ser”.

Se não fosse assim, eu vo-lo teria dito (ei δε μή εΐπον αν ύμΐν). Na w y c l i f f e ,


Se qualquer coisa menos, eu teria dito a vocês. Na t e b , Senão, ter-vos-ia eu porventura
dito

Vou preparar etc. Muitos intérpretes anteriores atribuem teria lhes dito a es­
sas palavras e traduzem por teria lhes dito que vou preparar um lugar para vocês.

IS4. Tucídedes, i, 131.


135. W Aldis Wright (Bible Word-Book) está equivocado em chamar isso de “o sentido primário” da
palavra. Não é mencionada nenhuma autorização para usar a palavra morada nesse sentido antes
de Pausânias (180 d.C.). A interpretação do Cônego Westcott é demolida com eficácia (em geral,
uma coisa nada fácil de fazer) por J. Sterling Berry, em The Expositor, 2.“ série, v. 3, p. 397.
136. Homero, Ilíada, vi, 243-251, p. 247.

196
João- C ap. 14
Mas isso é inadmissível porque Jesus diz (v. 3) que Ele, na verdade, preparará
um lugar. A melhor tradução, se nãofosse assim, eu vo-lo teria dito, é considerada
parentética e conecta a sentença seguinte com há muitas moradas por meio de ότι,
pois ou porque, inserido pelos melhores textos. “Na casa de meu Pai há muitas
moradas (se não fosse assim, eu vo-lo teria dito), pois vou preparar-vos lugar”.

Vou preparar. Compare com Nm 10.33. Também com Hb 6.20: “Onde Jesus,
nosso precursor, entrou por nós”.

Lugar (τόποι/). Vide nota sobre 11.48. Assim, a moradia celestial é descrita por
meio de três palavras: casa, moradia, lugar.

3. Se eu for (èàv πορευθώ). Πορεύομαι, ir, da ida com um objetivo definido. Vide
nota sobre 8.21.

Virei outra vez (πάλιν έρχομαι). O tempo presente: venho, como na rv. Não
está limitado à segunda e gloriosa vinda do Senhor nos últimos dias nem a ne­
nhuma vinda especial, como Pentecostes, embora estes estejam todos incluídos na
expressão; é para ser mais propriamente entendido como sua vinda e presença
contínuas por meio do Espírito Santo. Conforme Westcott: “Cristo, na verdade,
está desde o momento de sua ressurreição sempre vindo ao mundo, e à igreja, e
aos homens como o Senhor ressurreto”.

E vos levarei (παραλήψομαι). A kjv traduz: acolho. Aqui se trata do tempo


futuro, pelo que a tradução da rv, venho outra vez e vos acolherei, é muito me­
lhor. A mudança de tempo verbal é intencional, com o futuro apontando para
a futura recepção pessoal do crente por meio da morte. Cristo está sempre
com o discípulo, “vindo” continuamente a ele, até o fim do mundo. Então, Ele
o receberá nessa comunhão imediata, em que ele “o verá como Ele é”. O verbo
παραλαμβάνω é usado no texto do Novo Testamento como levando junto com
(Mt 4.5; 17.1; At 16.33, sobre todos os quais vide notas); receber a, levarei para
(Mt 1.20; Jo 14.3; respectivamente); receber de, receber por transmissão, como
principalmente em Paulo (G1 1.12; Cl 2.6; 4.17; lTs 2.13 etc. Vide também Mt
24.40-41). Nessa passagem, dificilmente é fantasioso entender os dois primei­
ros sentidos misturados no uso do verbo. Jesus, por meio do Espírito, recebe os
seus mesmos consigo por meio da vida e, depois, recebe-os ao seu lado na morte.
Ele mesmo os conduz a si mesmo.

Eu estiver. Vide nota sobre 7.34.

4. Vou (υπάγω). Afastar-me de vocês. Vide nota sobre 8.21.


197
J oão- C ap. 14
Vós sabeis £...] e conheceis o caminho (oiôate, καί την οδόν ο’ίδατε). Os
melhores textos omitem o que corresponde a e conheceis, lendo: para onde vou
conheceis o caminho. Na nvi: Vocês conhecem o caminho para onde vou.

5. E como podemos saber o caminho (καί πώς δυνάμίθα την οδόν elôévoa). Os
melhores textos usam οΐδαμεν, conhecemos, em lugar de δυνάμ^θα, podemos saber,
lendo: como conhecemos o caminho. Como na r v . Alguns também omitem e antes
de como.

6. Eu sou o caminho. Os discípulos estão absorvidos com o pensamento sobre a


separação de Jesus. Para Tomé, a ignorância depara onde Jesus está indo envolve o
desconhecimento do caminho. Milligan e Moulton afirmam: “Portanto, com amo­
rosa condescendência a figura de linguagem é retomada, e eles são assegurados
de que Ele é, em si mesmo, por assim dizer, essa distância a ser atravessada”. Ao
longo do caminho para a casa do Pai, eles ainda estão com Ele.

A verdade. Como a perfeita revelação de Deus Pai, combinando em si mes­


mo e manifestando toda a realidade divina, quer no ser, quer na lei, quer no
caráter de Deus. Ele incorpora o que os homens devem saber a respeito de Deus
e em que crer sobre Ele; o que eles devem fazer como filhos de Deus e o que
devem ser.

A vida. Não só a vida no mundo futuro. Segundo Meyer: Ele é “o princípio e a


fonte da vida em seu desenvolvimento temporal e consumação futura, de modo
que qualquer um que não o tenha recebido nele mesmo pela fé se torna presa da
morte espiritual e eterna”. “Aquele que crê no Filho tem vida eterna.” Compare
com Cl 3.4; Jo 6.50-51; 11.25-26.
Thomas à Kempis:

Segue-me, eusou o caminho, a verdade eavida (Jo 14.6). Semcaminho não se anda,
semverdadenãoseconhece, semvida nãosevive. Eu souocaminhoquedeves seguir,
averdadequedeves crer, avidaquedeves esperar. Eu souocaminho seguro, averda­
deinfalível, avida interminável”131.

Acerca de ζωή, vida, vide nota sobre 1.4.

Ao Pai. O fim do caminho.

137. Thomasà Kempis, Im ita tio n o f Christ, iii, 56. Disponível em: < h ttp ://im ita ca o d ec risto .S O w e b s.
com/III_DA_CONSOLAO_INTERIOR.html>. Acessoem: 28 jun. 2013.
198
João - Cap. 14
7. Conhecésseis (έγνώκειτε). Preferivelmente, tivessem aprendido a conhecer, por
meio de minhas sucessivas revelações de mim mesmo.

Conhecerieis (έγνώκειτε αν). O mesmo verbo usado antes neste versículo.


Contudo, alguns editores leem ήδειτε, o verbo com o sentido de conhecimento
absoluto, o conhecimento intuitivo e de convicção satisfeita. Se essa interpretação
for adotada, ela marca um contraste com o conhecimento progressivo indicado
por έγνώκειτε. Vide nota sobre 2.24.

M eu Pai. Não o Pai como no versículo 6. Esse é o conhecimento do Pai


em sua relação com o Filho. Por intermédio desse conhecimento, alcança-
se o conhecimento de Deus como o Pai, “na mais profunda verdade de seu
ser”. Esse último conhecimento é mais bem expresso por οιδα. Vide nota
sobre 4.21.

Tendes visto. Vide nota sobre 1.18.

9. Estou (είμι). Literalmente. Ao passo que a kjv traz: Tenho eu estado.

Conhecido (έγνωκάς). Vir a conhecer.

Dizes tu (σύ). Enfático. Tu que disseste: “Havemos achado aquele de quem


Moisés escreveu na Lei e de quem escreveram os Profetas” (1.45). Omita e antes de
como dizes tu.

10. De mim mesmo (άιτ’ εμαυτού). Na rv, melhor, da parte de mim mesmo. Vide
nota sobre 7.17.

O Pai, que está em mim, é quem faz as obras (ò δε πατήρ ò èv έμοί μενών,
αυτός ποιεί τα έργα). Os melhores textos trazem ό δε πατήρ εν εμο'ι μενών ποιεί
τα έργα αΰτου, ο Pai permanecente em mimfa z suas obras. Filipe duvida se Cristo
está no Pai, e se o Pai está nele. A resposta é dupla, correspondendo às duas par­
tes da dúvida. Suas palavras são do Pai, e não faladas dele mesmo, pelo que Ele
as profere a partir do interior do Pai e está Ele mesmo no Pai. Suas obras são as
obras do Pai que vive nele; logo, o Pai está nele.

11. Crede-me (πιστεύετε μοι). O plural do imperativo: “Crede-me vós”. Compare


com crês tu, do versículo 10. Essas palavras são dirigidas aos discípulos como um
todo, a cujo pensamento Filipe dera voz.
199
J oão - C ap . 14

Ao menos (ei ôè μή). Literalmente, mas se não. Se vocês não acreditam na


autoridade da minha afirmação pessoal.

Por causa das mesmas obras (διά τα έργα αύτα). Literal mente, por conta das
próprias obras, sem considerar meu testemunho oral.

12. Obras £...] maiores. Não milagres mais notáveis, mas referindo-se à
obra mais abrangente do ministério apostólico sob a dispensação do Espírito.
Essa obra era de uma natureza mais elevada que as meras curas do corpo.
Godet diz com verdade: “Aquilo que foi feito por são Pedro no Pentecostes,
por são Paulo em todo o mundo, aquilo que foi feito por um pregador comum,
um único crente, ao trazer o Espírito para o coração, não pôde ser feito por
Jesus durante sua jornada neste mundo”. O ministério pessoal de Jesus na
carne deve ser um ministério local. Apenas sob a dispensação do Espírito ele
pôde ser universal.

13. Em meu nome. Primeira ocorrência da expressão. Vide nota sobre Mt 28.19.
Segundo Meyer, a oração é feita em nome de Jesus,

se esse nome, Jesus Cristo, como a total substância da fé salvadora e da confissão


daquele que ora, é, em sua consciência, o elemento em que a atividade piedosa se
movimenta; para que, assim, essenome, abraçando toda arevelação da redenção, seja
aquele que mede e define especificamente a disposição, o sentimento, o objeto e o
conteúdo da oração. O uso expresso do nome de Jesus nesse sentido não é umsinal
específico; aquestão édo e sp írito eda m en te daqueleque ora”.

Westcott cita Agostinho para o efeito de que a oração em nome de Cristo deve
ser consistente com o caráter de Cristo, e de que Ele a cumpre como Salvador e,
por isso, apenas quando ela conduz à salvação.

14. Se perdirdes alguma coisa. Algumas autoridades inserem me. Como na teb.
Isso sugere oração a Cristo.

15. Guardareis (τηρήσετε). Essa é a leitura dos melhores textos. A kjv segue a
leitura τηρήσατε, guardais. Armazene em seu coração e preserve com cuidadosa
vigilância. Videnota sobre guardada, lPe 1.4.

Meus mandamentos (τάς έντολάς τάς εμάς). Literalmente, os mandamentos


que são meus. Vide nota sobre 10.27.

16. Rogarei (έρωτήσω). Vide nota sobre 11.22.


200
João - Cap. 14
Consolador (παράκλητου). Ocorre somente no Evangelho de João e na pri­
meira epístola (14.16,26; 15.26; 16.7; lJo 2.1). De παρά, p a ra o lado de, e καλέω,
convocar. Daí o sentido original ser: aquele que é cham ado p a ra o lado d e outro a f im
de o ajudar, como advogado em um tribunal de justiça. O último, uso helenista de
παρακαλείν e παράκλησις, para denotar o ato de consolar e consolação, deu surgi­
mento à tradução por Consolador, que aparece em toda instância do Evangelho,
mas é mudada para A d v o g a d o em lJo 2.1, em conformidade com seu sentido
uniforme no g r e g o clássico. O argumento em favor dessa tradução é totalm ente
conclusivo. Insiste-se que a tradução por C onsolador é justificada pelo fato de
que a palavra, em seu sentido original, quer dizer mais que um mero consolador,
sendo derivada do latim confortare, fortalecer, e de que, por isso, o Consolador é
aquele que fortalece a causa e a coragem de seu cliente no tribunal; mas, como
o Bispo Lightfoot observa, a história dessa interpretação mostra que esta não
é alcançada por esse processo, mas surgiu de um erro gramatical e que, por
esse motivo, esse relato só pode ser aceito como uma apologia pós-fato, e não
como uma explicação do fato. Portanto, o Espírito Santo, por meio da palavra
παράκλητος, e da qual o termo P arãclito (teb) é uma transcrição, representado
como nosso A d v o g a d o ou Conselheiro, “que sugere o verdadeiro raciocínio para
nossa mente e os verdadeiros cursos de ação para nossa vida, aquele que condena
nosso adversário, o mundo, pelo erro e advoga nossa causa diante de Deus, nosso
Pai”. Deve-se notar que Jesus e também o E sp írito S a n to são representados como
Paráclito. O Espírito Santo tem de ser outro Paráclito, e isso cai na declaração da
primeira epístola: “Temos um A d vo g a d o para com o Pai, Jesus C risto ’. Compare
com Rm 8.26. Vide nota sobre Lc 6.24. Observe também que a palavra outro cor­
responde a άλλον, e não a erepov, que quer dizer diferente. O advogado que está
para ser enviado não é diferente de Cristo, mas outro semelhante a Ele mesmo.
Vide nota sobre Mt 6.24138.

Convosco (μεθ’ υμών). Observe as três preposições usadas nesse versículo


para descrever a relação do Espírito com o cristão. Com vocês (μετά), em comu­
nhão; p o r vocês (παρά), em sua presença pessoal; em vocês (ev), como uma energia
pessoal permanente, na fonte da vida.

17. O Espírito da verdade. “O título mais extraordinário”, diz Bengel. “O Espí­


rito, que tem a verdade, revela-se, por meio do conhecimento, no entendimento;
confere-o por meio da prova e experiência práticas na vontade; testifica dele para

138. O estudante encontrará a questão inteira discutida pelo Bispo Lightfoot (O n a Fresh R evision
o f the N e w Testament, p. 348); Julius Charles Hare (M issio n o f the Com forter, p. 348); e Cônego
Westcott (Introdução ao C om m entary on the G ospel o f John, Speaker’s Commentary, p. 211).
Vide também sua nota sobre lJo 2.1, em seu C om m entary on the E pistles o f John.

201
J oão - Cap. 14
os outros, também por intermédio daqueles a quem Ele o revela; e defende essa
verdade do que a passagem 1.17 chama de a graça e a verdade. £...] A verdade faz
com que todas nossas virtudes sejam verdade. Do contrário, há um tipo de falso
conhecimento, falsa fé, falsa esperança, falso amor; mas não existe nada como
falsa verdade.”

O mundo. Vide nota sobre 1.9.

Estará em vós. É assim que alguns editores leem.

18. Deixarei (άφήσω). Vide nota sobre 4.3.

Órfãos (ορφανούς). Literalmente. Ocorre somente aqui e em Tg 1.27, onde


é traduzida por órfãos. Compare com filhinhos (13.33). “Ele não nos deixou sem
uma regra (13.34), sem um exemplo (13.15), sem um motivo (14.15), sem umaforça
( l5.5), sem uma advertência (15.2,6), sem um Consolador (14.18), nem sem uma
recompensa (14.2)1S9.

Voltarei (έρχομαι). Tempo presente, volto. Vide nota sobre o versículo 3.

19. Vós vivereis (καί ύμεΐς ζήσεσθε). Pode também ser traduzido: e vós vivereis,
explicando a primeira declaração, vós me vereis. Como na t e b , em nota (Vós me ve­
reis; porque eu vivo, vós vivereis também). Esta é melhor. João não está argumentan­
do pela dependência da vida deles na de Cristo, mas pela comunhão com Cristo
como o fundamento para a visão espiritual.

21. Tem. Conforme Agostinho: “Que tem na memória e guarda na vida”.

Manifestarei (εμφανίσω). Adequadamente, manifestação à visão, como


distinto de δηλόω, deixar evidente para a mente (lCo 3.13; Cl 1.8 etc.). Uma
manifestação clara e evidente é indicada aqui. Compare com vós me vereis (v.
19). Westcott observa: “Transmite mais que o desvelamento de uma presença
não descoberta (άττοκαλύπτω), ou a manifestação de uma presença escondida
(φανερόω)”.

22. Judas. Vide nota sobre Tadeu, Mc 3.18.

(Não o Iscariotes). A arc melhora a tradução ao pôr essas palavras imediata­


mente após Judas. Segundo Bengel:

139. James Ford, The Gospel of St. John Illustrated.


202
J oão —C ap . 14
Ele distingue o Judas piedoso não por seu próprio sobrenome, mas pela negação do
nome do outro; salientando, ao mesmo tempo, o traidor como alguém tão presente
mais uma vez após sua negociação com os adversários, mas também como o homem
que não tem afinidade com essa questão.

D e onde vem (τί yéyovev). Literalmente, o que tem de acontecer. Sugerindo que
Judas achava que houvera alguma mudança nos planos de Jesus. Ele presumiu
que Jesus, como o Messias, revelar-se-ia publicamente.

23. Minha palavra (λόγον μου). Toda a mensagem do evangelho como distinta
de suas partes separadas ou mandamentos.

[)Nós[] viremos. Compare com 10.30; Ap 3.20.

Morada (μονήν). Vide n o ta sobre o versículo 2. Compare com lJo 2.24; 5.15.

24. Minhas palavras (λόγους). Compare com p a la v ra , versículo 23. As partes


constituintes de uma palavra.

25. Estando convosco (μένων). A rv apresenta, de uma forma mais forte e mais
literal, enquanto a in d a perm anecendo.

26. Em meu nome. V ide nota sobre o versículo 13.

[(Ele)] (έκεινος). Conforme a kjv . Na t b e ara , e ste/ esse, omitido na arc . Pon­
do o Advogado distinta e contundentemente diante dos ouvintes. O pronome é
usado na primeira epístola de João, caracteristicamente de nosso Senhor. Vide
lJo2.6; 3.3,5,7,16; 4.17.

Tenho dito (etnov). O tempo aoristo, disse.

27. Paz. Lutero comenta: “Essas são as últimas palavras, como as de alguém que
está para se retirar e diz ‘boa noite’ ou dá sua bênção”. P a z era uma saudação
oriental habitual ao partir. Compare com 20.21.

Minha paz vos dou. Compare com 1Jo 3.1. Godet diz: “É dele mesmo que alguém da .

Nem se atemorize (δειλιάτω). Somente aqui no texto do Novo Testamento. O


termo, propriamente, tem o sentido de temor acovardado. Na n v i , medo. O adjetivo re­
lacionado δβ,λός, medo, é usado por Mateus em relação aos discípulos na tempestade
(8.26) e em Apocalipse para aqueles que negam a fé por medo de perseguição (21.8).
203
João- C ap. 15
O substantivo relacionado, δειλία, ocorre somente em 2Tm 1.7: “Deus não nos deu o
espírito de te m o r, contrastado com o espírito de fortaleza, de amor e de moderação.

28. Ter dito. Omita, e leia: fic a r ia m contentes porqu e vou p a ra o P a i (cp. nvi).

30. Já não falarei (ούκ eu λαλήσω). A r v apresenta, de forma mais correta: não
f a la r e i mais.

O príncipe deste mundo. Os melhores textos apresentam “do mundo” ( a r a ).

Nada tem em mim. Nenhum direito nem poder sobre Cristo que o pecado
pudesse exercer nele. A ordem grega é: em m im ele não tem nada.

31. Mas é para que o mundo saiba etc. Nesse versículo, a conexão é muito debati­
da. Alguns explicam: Levantem-se, vam o-nos daqui p a ra que o mundo saiba que eu amo o
P a i e que como o P a i me ordem , assim, eufaço. Outros explicam assim: A ssim eu faço, p a ra
que o mundo saiba - e como o P a i me mandou etc. Outros ainda, mais uma vez, tomam
a frase inicial como elíptica, fornecendo ou ele vem, ou seja, Satanás, a fim de que o
mundo saiba - e que como o Pai etc.; ou entrego-me ao sofrimento e à morte p a ra que o
mundo saiba etc. Nesse caso, levantem-se etc., forma, como na k j v e rv , uma sentença
independente. Inclino-me a adotar essa interpretação. A expressão άλλ’ ινα, para que,
com uma elipse, é comum em João. Vide 1.8,31; 9.3; 13.18; 15.25; lJo2.19.

C apítulo 15

Não se sabe onde os seguintes discursos foram pronunciados. Alguns supõem


que depois das palavras: L eva n ta i-vo s, vam o-n os daqui, os discípulos ainda fica­
ram inclinados à mesa. Outros acham que os discursos foram feitos no caminho
para o monte das Oliveiras; e ainda outros acham, mais uma vez, que foram feitos
no pátio do templo. Assumindo que a imagem da videira foi sugerida por meio
de alguns objetos externos, esse objeto é explicado de acordo com as diferentes
percepções da cena dos discursos. Os que acham, como Meyer, que o cenário era
o cômodo que o grupo ainda não deixara sugerem que o termo se refira ao copo de
vinho que eles tinham acabado de partilhar; ou, como Tholuck, uma videira cujos
brotos tinham entrado na sala; ou, como Storr, a visão de uma videira externa
vista na luz da lua. Os que designam que os discursos foram feitos no caminho
para o monte das Oliveiras, descendo o vale do Cedrom através das videiras,
como Lange e Godet, referem-se à imagem da videira e das fogueiras acesas ao
longo dos lados do vale do Cedrom para queimar os galhos podados das videi­
ras. Os que localizam os discursos no pátio do templo, como Westcott e Lampe,
204
JoAo-C ap. 15
encontram a sugestão na grande videira dourada sobre a porta do templo. Ou­
tros, como Lücke, Alford, Milligan, Moulton e Trench, que ainda mais uma vez
acham que a similitude não é extraída de algum objeto externo, mas foi sugerida
pelo simbolismo familiar da videira e do vinho no Antigo Testamento, como em
SI 80.8-19; Is 5-lss.; Jr 2.21; Ez 19.10ss.

1. A videira verdadeira (ή άμπελος ή αληθινή). Literalmente, a videira, a ver­


dadeira (videira). Verdadeira, genuína, correspondendo ao ideal perfeito. Vide nota
sobre 1.9. A videira era o símbolo da Igreja antiga. Vide a passagem citada acima,
e também Os 10.1; Mt 21.33; Lc 13.6.

Lavrador (γεωργός). De γή, a terra, e εργω, trabalho. O vinhateiro é αμπελουργός,


ocorrendo apenas em Lc 13.7; mas a ocupação do vinhateiro é subordinada, en­
quanto γεωργός pode indicar o proprietário. Vide 2Cr 26 .1 0 ( lxx ) em q u e a palavra
é aplicada ao rei Uzias. Como a respeito de Noé, em Gn 9.20. Em Mt 21.33-41,
ο γεωργοί representa os judeus proeminentes e os líderes dos judeus. Na n v i ,
agricultor.

2. Vara (κλήμα). Ocorre somente nesse capítulo. Essa palavra e κλάδος, rarrw (vide
nota sobre Mt 24.32; Mc 11.8), são derivadas de κλάω, quebrar. A palavra enfatiza
as idéias de delicadeza eflexibilidade.

Limpa (καθαίρει). Ao passo que na k jv , purga. Na n v i, poda.

3. Limpos (καθαροί). Do ponto de vista etimológico, está relacionado a καθαίρει.


A a r c indica isso por meio da tradução de καθαίρει, limpa, 15.2.

4. De si mesma (άφ’ εαυτού). De forma apropriada, a partir de si mesma. Vide


nota sobre 7.17.

Assim também vós (ούτως ούδε υμείς). Literalmente, assim tampouco vós.

5. Sem mim (χωρ'ις έμοΰ). Adequadamente, à parte de mim. Como na rv. Com­
pare com 1.3; Ef 2.12.

6. Será lançado fora (έβλήθη εξω). O tempo aoristo. Literalmente,yòz lança­


do fora. O aoristo denota um ato momentâneo, indica que foi lançado fora no
momento em que deixou de permanecer na videira. Fora quer dizer da videira-,
’í£,u>,fora.

Como a vara (ώς το κλήμα). Estritamente, o ramo; o ramo infrutífero.


205
J oâo- C ap. 15
Secará (έξηράΐ'θη). O aoristo, como em foi lançadofora. Na nvi e na teb, seca.

Colhem. Indefinido. Na ntlh, sãojuntados. Compare com Is 27.11; Ez 15.5.

7. Pedireis (αΐτήσεσθε). Os melhores textos trazem a forma imperativa,


αίτήσασθε, pedi'w.

Vos será feito (γενήσεται, ύμΐν). Literalmente, virá a acontecerpara você.

8. Nisto (èu τούτω). Relacionado comumente ao que se segue. Meu Pai é


glorificado nisto, a saber, que dês muito fruto. É melhor referir isso de volta ao
versículo 7. Na união perfeita de vontade entre Filho e discípulos, que, por parte
do discípulo, resulta na obtenção de que em tudo que pedir, o Pai é glorificado. A
passagem 14.13 exemplifica essa ideia: Έ tudo quanto pedirdes em meu nome,
eu o farei, para que o Pai seja glorificado no Filho”. O desígnio dessa glorificação
é que (iva) você possa produzir muito fruto. Essa referência retrospectiva de eu
τούτψ, nisto, ocorre em 4.37; 16.30; lJo 4.17.

É glorificado (έδοξάσθη). O tempo aoristo -.foi glorificado. Como no versículo 6,


marca o ponto em que a glória do Pai foi realizada na união perfeita da vontade
do cristão com a de Cristo.

Assim sereis (καί γενήσεσθε). Literalmente, e vos tornareis. Contudo, alguns


editores leem γενησθε, conectando, na mesma construção, com a oração prece­
dente e traduzindo assim: “Nisto é (foi) glorificado meu Pai, que possais produzir
muito fruto e tornar-vos meus discípulos”. Observe que a palavra é tornar-se, não
ser. O discipulado cristão envolve progresso e crescimento.

9. No meu amor (kv rf| άγάπη τή èprj). Literalmente, no amor, aquele que é meu.
Não só o amor do discípulo por Cristo, nem o amor de Cristo pelo discípulo,
mas o Cristo-princípio de amor que inclui ambos os amores. Vide a mesma forma
de expressão em a minha alegria, versículo 11; 3.29; 17.13;juízo (5.30; 8.16); os
mandamentos (14.15); paz (14.27).

11. Minha alegria. A alegria que é minha; característica de mim. Vide nota sobre
o versículo 9.

Permaneça (μείν'η). Os melhores textos trazem rj, possa estar.

140. Como diz Godet, isso nâo transforma a promessa em “preceito moral”. É um encorajamento
incitativo. Mas a leitura ocorre no Códice a !

206
João - C ap . 15

Seja com pleta (ιτληρωθή). A rv apresenta, de forma mais correta, possa ser
cumprida. A kjv perde a distinção entre a alegria completa, a de Cristo, e a alegria
progressiva, mas finalmente consumada, a do discípulo.

12. Meu mandamento (ή Εντολή ή Εμή). O mandamento que é meu.

Que vos ameis (iva). Indicando não só a natureza do mandamento, mas tam­
bém seu propósito.

13. Ninguém tem maior amor do que este, de (iva). Algumas das fases mais
sutis do pensamento de João não podem ser apreendidas sem um cuidadoso
estudo dessa conjunção muito recorrente. Alguns gramáticos ainda sustentam
que ela é usada para marcar não só desígnio efim, mas também resultado'*'. Mas
pode-se justamente afirmar que seu sentido predominante é intento, propósito,
objetivo ou objeto. Daí de, representando ϊνα, é para ser entendido no sentido
de para o fim ou intento que-, a fim de que. Aqui o uso da palavra é muito sutil
e sugestivo, bem como bonito. Nenhum homem tem amor maior do que este
(amor), que, em sua concepção original, foi destinado e designado para alcançar
até o ato de sacrificar a vida por um amigo. Portanto, Cristo aqui nos fornece
mais que uma mera comparação abstrata e mais que uma mera avaliação hu­
mana de amor. Ele mede o amor de acordo com seu intento divino, original e
de longo alcance.

Dar alguém a sua vida. Vide nota sobre 10.11.

14. Mando (Εντέλλομαι). De várias palavras utilizadas para mando no texto do


Novo Testamento, essa é sempre usada para dar uma injunção, ou preceito, especí­
fico. O substantivo relacionado, Εντολή, quer dizer uma ordem, uma obrigação, um
preceito, e, por isso, é usado para um preceito separado da lei como distinto da lei
como um todo (νόμος). Vide Mt 22.36,38. Contudo, às vezes, é usado para o todo
o corpo de preceitos morais do cristianismo. Vide nota sobre 13.34. O sentido das
ordens específicas aqui coincide com a leitura do tr, όσα, tudo o que, literalmente,
tantas coisas quanto.

15. Já - não (ούκέτι). Melhor na ntlh, não mais. Não mais servos como vocês
eram sob a dispensação da lei. Compare com G1 4.7.

Servo (δούλους). Estritamente, escravo.

141. Os termos técnicos são τίλι,κώς (telikõs), do desígnio efim, e έκβατικώς ( ekbatikõs), do resultado.

207
João - C ap . 15

Não sabe (ούκ olôé). Não tem percepção instintiva. Vide nota sobre 2.24.

Vos. No grego, a posição do pronome é enfática: “Tenho-zw chamado


amigos”.

16. Escolhestes - vós. O pronome é enfático: “Não fostes vós que me escolhestes”.

Nomeei (’έθηκα). Melhor tradução que ordenar (k jv ), porque despe a palavra


de seu sentido convencional. Ordenar é proveniente do latim ordinare e quer di­
zer pôr por ordem. Por isso, Robert de Gloucester: “Ele começou a ordenar seu
povo”142, ou seja, pôr seu povo em ordem. Hakluyt: “Ele ordenou um barco feito
de uma árvore”143. O verbo grego quer dizer estabelecer, pôr ou colocar. Daí a no­
meação de alguém para o serviço. Vide lTm 1.12. Na w y c l iffe , M t 24.47: “Sobre
todos os seus bens ele o ordenara-, na bj e teb , constituirá.

Vades (ΰττάγητε). Sair de sua sociedade pessoal e ir para o mundo.

A fim de que tudo etc. (iva). Coordenado com o precedente 'iva, para que, para
marcar outro resultado da escolha e designação deles por Cristo. Ele designou-os
para que produzissem fruto, e para que obtivessem tais respostas para sua oração
conforme se tornassem frutíferos.

17. Que (iva). Todos os meus ensinamentos são para ofim de que vocês amem
uns aos outros.

18. Se o mundo vos aborrece (el μισό.). Literalmente, odeia. O modo indicativo
com a partícula condicional assume o fato como existente: se o mundo vos abor­
rece, como ofaz.

Sabei (γινώσκετε). O tempo presente também pode ser traduzido como impe­
rativo, como na arc . Na kjv , sabeis.

Primeiro do que a vós (πρώτον υμών). Literalmente, primeiro em relação a vós.


Vide nota sobre 1.15.

19. Do mundo (έκ του κόσμου). Levantados de dentro do mundo. Vide nota sobre
da terra, 3 .3 1.

142. Robert de Gloucester, Chronicle.


143. Hakluyt, Voyages.

208
J oão- C ap. 15
Amaria (αν εφιλει). Ο verbo para afeto n a tu ra l Vide nota sobre 5.20.

20. Perseguiram (έδιωξαν). O sentido original do verbo é p ô r p a ra lutar, por isso,


correr rapidam ente a f i m de alcançar ou re a liza r como o objetivo ou o competidor na
corrida. Daí Sófòcles: “Vinha por último teu filho, / refreando seus rápidos corcéis,
poupando-os para o fim; / mas ao ver que de tantos apenas restava / um dos com­
petidores, incitou aos gritos, / na ânsia da vitória, os animais indóceis (διώκει)"1**.
Compare com alcançar (διώκω, Fp 3.12). Por isso, perseguir com intento hostil e, em
geral, p a ra molestar, perturbar, perseguir. P erseguir é proveniente do equivalente la­
tino persequor, seguir de p erto e foi usado antes com o sentido de seguir, enquanto
seguir, por sua vez, foi usado no sentido de perseguir. Daí a n v i , Mt 5.44: aqueles
que os perseguem (ou seja, seguem ). Sir Thomas More diz: “Enquanto seus inimigos
regozijavam-se com a vitória que os havia perseguido (isto é, seguido)”'*1.

21. Por causa do meu nome (διά το όνομά μου). Literalmente, p o r conta do meu
nome. O nome de Cristo representava a fé, a atitude, as afirmações e o objetivo
dos discípulos. Seu nome era confissão deles. Lutero diz: “O nome de Cristo em
sua boca não será nada para eles além de veneno e morte”.

22. Teriam pecado (αμαρτίαν εΐχον). V ide n ota sobre 9.41; lJo 1.8.

Desculpa (πρόφασιν). De πρό, antes, em fre n te de, e φημι, d iz e r o u afirm ar. Assim,
algo que foi posto em fre n te d a verdadeira causa de uma coisa, um pretexto. Compare
com lTs 2.5; At 27.30. P retexto carrega a mesma ideia do latim, proetextum , algo
tram ado em frente, com vistas a encobrimento ou engano. Na t e b , defesa. A k j v segue
a t y n d a l e : n ada com que encobrir seu pecado. Latimer declara: “Com essa desculpa
caridosa, quando você ofende diante de Cristo apenas uma vez, nisso, acaba por
ofender duas vezes”14®. A palavra aparece no baixo latim, cloca, sino (cp. francês
cloche, e o inglês clock), e esse nome foi dado ao manto do cavaleiro por causa de
sua semelhança com um sino. A palavra a liv ia r deriva do latim, pallium , mascarar.

25. Sem causa (δωρεάν). G ratuitam ente. Relacionado a δίδωμι, dar. O ódio deles
era um dom voluntário.

27. Testificareis (μαρτυρείτε). Tempo presente, testificais. Como na rv. O u pode


ser entendido como imperativo: testificai.

144. Sófòcles, Electra. Disponível em: < http://pensamentosnomadas.files.wordpress.com/2 0 1 2 /0 3 /


electra.pdf>. Acesso em: 28 jun. 2013.
145. Thomas More, Utopia.
146. Latimer, Sermons.
209
João - C ap . 16

C apítulo 16

1.Escandalizeis (σκανδαλισθήτε). Na n v i , tropeçar. Nesse Evangelho, ocorre so­


mente aqui e em 6.61. Vide nota sobre 5.29. Na t e b , não sucumbais à provação.

2. Expulsar-vos-ão das sinagogas. Vide nota sobre 9.22.

Mesmo (άλλ’). Literalmente, mas. Eles o excomungarão, m as , pior do que isso,


vem a hora etc.

Vem mesmo a hora em que (iva). Literalmente, “vem uma hora a f i m d e que”.
A hora é ordenada com a seguinte finalidade em vista: ela vem repleta de cum­
primento de um propósito divino.

Qualquer que (πας ò). Literalmente, cada um que.

Fazer um serviço (λατρείαν προσφέρειν). Literalmente, tra z e r ou oferecer s e r ­


O sentido estrito de λατρεία é serviço por contrato, mas é usado para qual­
viço .
quer serviço e, com frequência, para o serviço de Deus.

3. Vos. Omita.

4. Mas (άλλα). Marca uma interrupção na enumeração de detalhes temíveis; m as


(para não dizer nada mais dessas coisas) tenho-vos dito isso etc.

Desde o princípio ( έ ξ αρχής). Essa é a maneira mais adequada. Como na a r c


e a r a . A frase ocorre somente aqui e em 6.64.

7. Convém (συμφέρει). De a w , ju n to , e φέρω, carregar ou trazer. A ideia subjacen­


te da palavra é concom itância de circunstâncias.

Vá (άπέλθω). A s diferentes palavras para i r devem ser observadas nes­


se versículo e no versículo 10. Aqui, expressando apenas partida de um
ponto.

For (πορευθώ). Como na r v . Na t e b , p a rtir. Com a noção de ir com um propó­


sito, expresso em en viar-vo-lo-ei.

8. Convencerá (ελέγξει). Vide nota sobre 3.20. Na t e b , confundirá. Na B j , estabele­


cerá a culpabilidade.

210
JoAo - C ap . 16

D o pecado - justiça - juízo ( π ε ρ ί ) . Literalmente, concernente a, quanto a. Na b j ,


a respeito de. D o transmite uma impressão errada, a saber, que Ele condenará o
mundo de ser pecador, injusto e estar exposto ao julgamento. Isso é verdade, mas
a preposição sugere mais. Ele condenará o mundo a respeito desses três aspectos;
ou seja, o condenará pela ignorância de sua verdadeira natureza.

Justiça (δικαιοσύνης). Somente aqui e no versículo 10, no Evangelho. Ocorre


na primeira epístola e em Apocalipse.

10. Vou (ύπάγω). R etirar-se da visão deles e da irmandade terrena. V ide nota so­
bre 8.21 e nota de rodapé.

Vereis (θεωρείτε). Na n v i , verão. Vide nota sobre 1.18.

11. Está julgado (κεκριται). Tempo perfeito. Na r v , portanto, corretamente, tem


sido ju lg a d o .

12. Suportar (βαστάζειv ). V ide nota sobre 10.31; 12.6.

Agora (άρτι). Vide nota sobre 13.33. Com referência ao tempo futuro, quando
eles conseguirão os suportar.

IS. Espírito da verdade. Literalmente, da verdade. V ide nota sobre 14.7.

Guiará (οδηγήσει). De οδός, caminho, e ήγεομαι, g u ia r. O substantivo relacio­


nado, οδηγός, g u ia , líder, ocorre em Mt 15.14; At 1.16 etc.

Em toda a verdade (είς πάσαν την αλήθειαν). Na κν, mais corretamente, a toda
a verdade. A a r c segue a leitura de alguns editores: εν τή άληθεάχ πόση. Outros edi­
tores leem είς τήν αλήθειαν πάσαν, juntando πάσαν em um sentido adverbial com
vos guiará-, ou seja, guiará vocês completamente à verdade. O Espírito não revela toda
a verdade aos homens, mas Ele os guia para a verdade conforme ela está em Cristo.

De si mesmo. Na r v , corretamente, d a p a r te de si mesmo. Na teb , p o r s i mesmo.


Videnota sobre 7.17.

Tiver ouvido (fiv άκούση). Alguns leem άκούει, ouvir, com a omissão de dv, a
partícula condicional. A leitura do t r , όσα α ν άκούση, é, estritamente: quaisquer
coisas que ele tenha ouvido.

211
J oão - Cap. 16

Anunciará (άναγγελεΐ). Essa é a melhor forma. Compare com Mc 5.14,19;


At 20.27; 2Co 7.7. Também relatar, At 14.27. Usado para a proclamação formal
da religião cristã (At 20.20; lPe 1.12; lJo 1.5). Vide nota sobre At 19.18.

O que há de vir (τα ερχόμενα). O artigo, omitido pela a r c , é importante. O


sentido não é : Ele lhe mostrará algumas coisas que hão de vir, mas as coisas, como
n a b j , que hão de vir ou as coisas que estão vindo. Essas coisas são tudo o que Ele

tiver ouvido. A frase ocorre somente aqui no texto do Novo Testamento.

14. Há de receber (λήψεται). Na r v , tomará. Vide nota sobre 3.32.

15. Tudo quanto (πάντα δσα). Literalmente, todas as coisas tantas quantas sejam.
Na r v , todas as coisas quaisquer que sejam.

Há de receber (λήψεται). Os melhores textos trazem λαμβάνει., toma. Jesus


apresenta a relação entre o Filho e o Espírito como um relacionamento presente
e constante.

16. Não me vereis (οΰ θεωρείτε). O tempo presente: “não me vês mais”. Como na rv .

Ver-me-eis (όψεσθε). Aqui é usado um verbo diferente para ver, como na t e b ,


não me tereis diante dos olhos - vereis. Para a distinção, vide nota sobre 1.18. Θεωρεω
enfatiza o ato da visão; όράω, o resultado. Θεωρεω denota contemplação deliberada
associada a interesse mental ou espiritual. Westcott comenta:

A visão de contemplação fascinada, em que eles observavam pouco a pouco a manifes­


tação exterior do Senhor, foi mudada e transfigurada em visão, à qual se agarraram
intuitivamente, de uma vez por todas, a tudo que Cristo era. Enquanto a presença ter­
rena dele foi o objeto no qual seus olhos estavam fixos, sua visão era necessariamente
imperfeita. Sua presença glorificada mostrou-o em sua verdadeira natureza.

Porquanto vou para o Pai. Os melhores textos omitem.

17. Então (ow). Na r v , corretamente, portanto. É uma partícula de conexão lógica,


não de tempo.

18. Quer dizer (λέγει). Enfatizando o propósito do dito.

Um pouco (το μικρόν). Nos versículos 16 e 17, sem o artigo. Aqui o artigo um
ou esse pouco, como na t e b , esse um, enquanto define o ponto especial da dificul­
dade deles; esse “um pouco” do que Ele fala.
212
João - Cap. 16
Não sabemos (ούκ ο ΐδ α μ ε ν ) . Tradução mais simples e literal. Na teb, não
compreendemos. Ao passo que a k j v traz·, não podem os distinguir.

Diz (λαλεΐ). Enfatizando a. fo r m a como foi dito.

19. Conheceu (εγνω). A forma da nvi é melhor: percebeu. V ide nota sobre 2.24.

20. Chorastes - lamentareis - estareis tristes (κλαύσετε - θρηνήσετε - λυπηθήσεσθε).


Dessas três palavras, a última é a de sentido mais genérico, expressando toda espécie
de dor, do corpo ou da alma, e não necessariamente a manifestação exterior de
sofrimento. As outras duas palavras denotam a expressão audível de pesar. Θρηνεω
marca a expressão mais formal. Tem o sentido de proferir lamento sobre o morto.
Daí Homero dizer a respeito do lamento sobre Heitor, em Troia:

O morto é transladado aoplecaro solar


eposto sobre o leito encordoado. A seu lado,
cantores entoamtrenós, emtomlastimoso,
e, flébil, o responso das mulheres segue-os147.

O verbo ocorre em Mt 11.17; Lc 7.32; 23.27. Κλαίω quer dizer choro audível,
o choro de crianças, como distinto de δακρύω, derram ar lágrim as, chorar silenciosa­
mente, o qual ocorre apenas uma vez no texto do Novo Testamento, no choro de
Jesus (Jo 11.35). V ide nota sobre Lc 7.32.

21. A mulher (ή γυνή). Literalmente. O artigo genérico marca a mulher como


representante de seu sexo: mulher como tal.

Está para dar à luz. Imagem comum no Antigo Testamento do sofrimento


resultando em alegria. Vide Is 21.3; 26.27; 66.7; Os 13.13; Mq 4.9-10.

A aflição (τής θλίψεως). Palavra comumente traduzida por aflição ou trib u la -


ção na k jv . Vide nota sobre M t 13.21.

Prazer (την χαράν). Propriamente, a alegria que se contrapõe à aflição.

Um homem (άνθρωπος). Vide nota sobre 1.30.

22. Tendes tristeza (λύπην έχετε). Essa forma de expressão ocorre com
frequência no texto do Novo Testamento para denotar a posse de virtudes,

147. Homero, Ilíada, xxiv, 719-722, p. 481.


213
João —C ap. 16

sensações, desejos, emoções; faculdades, falhas ou defeitos intelectuais ou


espirituais ou a experiência com eles. Essa forma é mais forte que o verbo que
expressa qualquer um desses sentimentos. Por exemplo, ter f i é mais forte que
acreditar, ter v id a é mais forte que o ato de viver. Ela expressa uma percepção d istin ta
e pessoal da virtude, da falta ou do sentimento em questão. Por isso, ter triste za é
mais que estar pesaroso. Em Mt 17.20, Cristo não diz se credes, mas se tiverdes fi;
se você, mesmo em um grau muito pequeno, tem fé como um princípio e motivo
consciente e vivo. Compare com ter am or (13.35; lJo 4.16); ter p a z (16.33); ter
confiança (2Co 3.4); ter ousadia (Hb 10.19; lJo 2.28).

23. Perguntareis (έρωτήσετ^). Ou, como em nota de margem da r v , perguntareis


- questionareis. Questionar é o principal sentido do verbo, a partir do qual ele passa
para o sentido mais genérico de requerer, p e d ir , rogar. Como Mc 7.26; Lc 4.38;
Jo 17.15 etc. Aqui, o sentido é não deveis me perguntar nada (cp. v. 19, em que o
mesmo verbo é usado). Compare com Mt 16.13; 21.24; Jo 1.19. Perguntar, de for­
ma absoluta, Lc 22.68. Além disso, observe a escolha da palavra aqui para marcar
a pergunta sobre term os fa m ilia res. Vide nota sobre 11.22. Outro verbo para pedir
ou p e rg u n ta r ocorre na frase seguinte: “Tudo quanto pedirdes (αίτήστητέ)” etc.
Aqui o sentido é: se vocêsfiz e r e m qualquer pedido. Compare com Mt 5.42; 7.7,9-10
etc. Observe também que essa palavra para pedir ao Pai marca o pedido de um
inferior a um superior e é a palavra que Cristo nunca usa para seus p ró p rio s pedi­
dos ao Pai. Compare com lJo 3.22.

Na verdade, na verdade. Vide nota sobre 1.51; 10.1.

Tudo quanto pedirdes - em meu nome - dar. Os melhores textos mudam


boa av, tudo, para av u , se (pedirdes) algum a coisa; e põem em meu nome depois de
lhe será dado. Como na rv. Se vocês pedirem qualquer coisa ao Pai, Ele a dará a vocês
em meu nome. Na n v i , meu Pai lhes dará tudo o que pedirem em meu nome. Não só a
oração é oferecida, mas a resposta é dada em nome de Cristo.

24. Pedistes (alteiTe). O presente do imperativo sugerindo pedido contínuo.


Está pedindo. Compare com Mc 6.22, αΐτησον, o imperativo aoristo, marcando
uma única e clara petição.

Se cumpra (ή π€πληρωμένη). Muito literalmente, possa ser cumprida. A rv

apresenta, mais corretamente, seja cumprida. Compare com 15.11.

25. Parábolas (παροιμίαις). Vide nota sobre parábolas, Mt 13.3. Ele falava usando
imagens, como a videira e a mulher em trabalho de parto.
214
J oão - C a p . 16

Falarei (άναγγελώ). No n t i a , anunciarei (campo interlinear). V ide nota sobre ο


versículo 13. Os melhores textos trazem άιταγγ€λώ; a força original dessa palavra
significa trazer notícias d a p a r te de (άιτό) alguma coisa ou alguém.

Abertamente (παρρησία). Vide nota sobre 7.13.

26. Pedireis —rogarei. Observe mais uma vez o uso dos dois verbos para
pedireis (αίτήσεσθε); eu rogarei (ερωτήσω). V id e n o t a sobre o ver­
p e d ir . Vós
sículo 23.

27. Ama (φιλεΐ). Como filhos, com o amor de afeição natural. V ide nota sobre
5.20. O mesmo verbo na oração seguinte sobre o amor dos discípulos por
Cristo.

D e Deus. Alguns editores leem do P ai. Παρά, do lado de.

28. Do Pai (παρά). Os melhores textos trazem εκ, de den tro de.

Vou (πορεύομαι). V ide nota sobre o versículo 7.

29. Falas - dizes (λαλεΐς —λέγεις). O primeiro refere-se à fo rm a ; o segundo, ao


nota sobre o versículo 18.
propósito. Vide

30. Conhecemos (ο’ίδαμεν). Melhor tradução, como na t e b e n t l h . Ao passo que


a k j v traz: estam os seguros.

Por isso (4v τούτω). Literalmente, nisso. Compare com lJo 2.3,5; 3.16,19,24;
4.9-10,13,17; 5.2.

31. Agora (άρτι). Vide nota sobre 13.33. Com referência à vinda do tempo de
grande provação.

32. Que (iv a ). Vide nota sobre o versículo 2 e 15.12. No conselho divino é chega­
da a hora em que podeis ser dispersos e deixados etc.

Para sua (εις τα ΐδι,α). Para sua própria casa. Vide nota sobre 1.11.

33. Tereis (εξετε). Os melhores textos trazem εχετε, tendes.

Tende bom ânimo (θαρσειτε). Ocorre somente aqui em João.


215
J oâo - C ap. 17

Venci (νενίκηκα). Só há três ocorrências do verbo fora dos escritos de João.


Ocorre somente aqui no Evangelho, e é frequente na primeira epístola e em Apo­
calipse. Forma uniforme para a vitória espiritual.

C a p ít u l o 1 7

A ORAÇÃO SUMO SACERDOTAL

Segundo Lange:

Emerge, como de um oceano, da vida de oração divinamente rica de Cristo as pérolas das
orações simples feitas por Ele e que foram preservadas para nós: a oração feita no Sermão
do Monte para o uso de seu povo —Pai nossa, o relato do louvor a Deus na partida da Gali-
leia (Mt 11.25); as orações no túmulo de Lázaro e no recinto do templo; nossa oração sumo
sacerdotal; a súplica no Getsêmani e as palavras-oração do Crucificado - Pai, perdoa-lhes, EU,
EU, e a oração final: Pai nas tuas mãos etc., à qual se liga o exultante clamor: Está consumado,
porquanto, de um ponto de vista, pode ser considerado uma palavra de oração. Acrescente-
-se a essas as menções de orações, de ação de graças, os suspiros de Cristo dirigidos ao céu,
bem como suas convocações e encorajamentos para orar, e Ele aparece como o Príncipe da
humanidade até mesmo no reino da oração; da mesma forma, na maneira como Ele escondia
sua vida de oração, exibindo-a apenas quando havia necessidade disso. Se considerarmos sua
obra como uma árvore que sobe para o céu e eclipsa o mundo, sua vida de oração é a raiz des­
sa árvore; sua oonquista do mundo repousa na profundeza infinita da sua apresentação de si
mesmo diante de Deus, de sua devoção de si mesmo a Deus, de sua imersão de si mesmo em
Deus, de sua certeza de si mesmo e poder de Deus. Em sua vida de oração a verdade perfeita
de sua natureza humana também se aprovou. Aquele mesmo que, como Filho de Deus, é
revelação completa, como Filho do homem, é religião completa.

No “Pai Nosso” (Mt 6), Cristo expõe o que seus discípulos devem desejar para
si mesmos. Nessa oração, Ele indica o que deseja para eles. E interessante estu­
dar as formas em que as idéias do Pai Nosso são reproduzidas e desenvolvidas na
oração sumo sacerdotal.

1. Essas coisas (ταϋτα). Literalmente. Ao passo que a k j v traz: estas palavras.

Falou. Em nenhuma passagem João diz que Jesus orou, como fazem os outros
evangelistas.

Teu Filho - teu Filho (σοϋ τον ulòv - ό υ'ιός). Mais propriamente, teu
Filho - o Filho. Como na a r a e a 2 1. A segunda frase marca a mudança do

216
J oão - C ap. 17

pensamento do relacionamento pessoal para a relação em que Jesus manifesta


a glória do Pai.

2. Poder (εξουσίαν). A nvi apresenta, com acerto, autoridade. Vide nota sobre 1.12.

Toda carne. Expressão hebraica, denotando toda a humanidade em sua im­


perfeição. Vide Gn 6.12; SI 65.2; Is 40.5 etc.

Para que dê a vida eterna a todos quantos lhe deste (ίνα παν δ δέδωκας
αύτω δώση αύτοΐς ζωήν αιώνιον). Literalmente, que a todos que deste a Ele, a eles
Ele dê vida eterna. Todos (παν), número singular, considera o corpo de discípulos
cristãos coletivamente·, a eles, individualmente.

3. A vida eterna. Com o artigo: a vida eterna. Explicando as palavras do versí­


culo anterior. A vida eterna (da qual falo) é esta.

Que (iva). Expressando o objetivo.

Conheçam (γινώσκωσι). Possam reconhecer ou perceber. É impressionante que a vida


eterna consista de conhecimento ou, antes, da busca de conhecimento, uma vez que o
tempo presente marca uma percepção contínua, progressiva de Deus em Cristo. Que eles
possam aprender a conhecer. Compare com o versículo 23; 10.38; 1Jo 5.20; 4.7-8.

Digo, o conhecimento de Deus em Cristo


Aceito pela razão, resolve para você
Todas as questões da terra e fora dela.
E, até agora, o leva célere à sabedoria.
Você melhoraria isso para provar de novo o provado?
A vida, um mero minuto, com poder para usar essa prova.
Deixa o conhecimento e volta à forma como ele brota?
Você o tem, use-o, imediatamente, ou morra.
Pois digo que isto é morte, e apenas a morte,
Quando a perda do homem vem a ele de seu ganho
Trevas da luz, da ignorância do conhecim ento
E da falta de amor do amor m anifestado148.

A relação da percepção de Deus ao caráter é afirmada em lJo 3.2, a respeito


do qual vide nota.

148. Robert Browning, A Death in the Desert.

217
João- C ap. 17
Verdadeiro (άληθινόν). Vide nota sobre 1.9. Compare com lCo8.4; lTm6.15.

Jesus Cristo, a quem enviaste. A bj apresenta melhor a ênfase da ordem


grega: e aquele que enviaste, Jesus Cristo. Enviaste (άπέστείλας). O tempo aoristo
enfatiza o fato histórico da missão de Cristo.

4. Glorifiquei-te - tendo consumado (έδόξασα - έτελείωσα). Os melhores tex­


tos trazem τελειώσας, tendo consumado, como na arc; o particípio define a manei­
ra como Ele glorificou o Pai na terra.

A fazer (iva ποιήσω). Literalmente, afim de que eufizesse (isso).

5. De ti mesmo (παρά σεαυτφ). Em comunhão contigo mesmo. Assim, contigo


(παρά σοί).

Tinha. Na verdade, possuía.

8. As palavras (τα ρήματα). Compare com tua palavra (λόγον), no versículo 6.


Esta palavra representava a mensagem do evangelho em sua totalidade-, aquelas, a
mensagem considerada em suas partes constituintes. Vide nota sobre Lc 1.37. Com­
pare com 56.38,47; 6.60,63,68; 8.43,47,51; 12.47-48; 15.3,7.

9. Eu rogo (ερωτώ). Mais estritamente, faço pedido. Vide nota sobre 16.23. Esse
eu é enfático, como ao longo da oração.

10. Todas as minhas (τα εμά πάντα). Todas as coisas que são minhas. Como na rv.
Na a2 1, todas as coisas que me pertencem.

11. Eu vou («Ερχομαι.). Estou indo. Fala a respeito de sua partida para o Pai.

Santo (άγιε). Vide nota sobre santos, At 26.10; também sobre lPe 1.15. Com­
pare com lJo 2.20, e com Pai justo (δίκαιε), versículo 25. Esse epíteto aplicado
agora, pela primeira vez, ao Pai, contempla Deus, o santo, como o agente do que
Cristo deseja para seus discípulos —santidade de coração e vida; ser guardado do
mal do mundo.

Aqueles que (οΰς). A leitura correta é ώ, referindo-se ao nome. Teu nome, que
tu me deste (cp. teb ). Como no versículo 12. Compare com Fp 2.9-10; Ap 2.17;
19.12; 22.4.

12. No mundo. Omita.


218
J oão - C ap. 17

Eli C„0 guardava («τηρούν). Tempo imperfeito. E u continuei a g u a rd a r. O eu é


enfático: E u guardei-os, agora tu os guardas.

Tenho guardado («φύλαξα). A b j apresenta, com acerto, guardei A a r c e b j deixam


passar a distinção entre as duas palavras para a guarda. A primeira palavra tem o senti­
do: E u os preservei a última: E u os gu ardei como um meio de os preservar. A a r a e t e b
traduzem respectivamente por guardar e proteger. Vide nota sobre g u ardada,em lPe 1.4.

Se perdeu - perdição (άπώλ«το - απώλειας). Um jogo de palavras. Conforme


Westcott: ‘‘Nenhum deles pereceu, exceto ofilh o do perecim ento”.

A Escritura (ή γραφή). Vide nota final sobre 5.47 e Mc 12.10.

15. Do mal (τού πονηρού). Ou do m aligno. Essa tradução está de acordo com o
uso de João. Vide lJo 2.13-14; 3.12; 5.18-19; e compare com 12.31; 14.30; 16.11.
D e («k), literalmente, fo r a de, quer dizer f o r a das m ãos do.

17. Santifica (άγίασον). Usado constantemente na l x x para expressar toda a


dedicação e consagração a Deus de pessoas e coisas. Vide Ex 29.1,36; 40.134; Lv
22.2-3. A t e b apresenta consagra. V ide nota sobre 10.36.

Na verdade (èv τή άληθεία). Os melhores textos omitem σου, mantido na k j v :


“por meio da tua verdade”. N a (èv) deve ser traduzido literalmente assim, mar­
cando a esfera ou elemento da consagração. S an tifica -o s na verdade.

Tua palavra (ò λόγος ò σός). Apropriadamente, a p a la v ra que é tua. V ide nota


sobre 15.9.

18. Enviei (άπέστειλας - άπέστειλα). Em missão. Vide nota sobre Mt 10.16.

19. Santifico. V ide nota sobre o versículo 17.

20. Hão de crer (πιστ«υσόντων). Os melhores textos trazem πιστ«υόντων, o par-


ticípio presente, que creem. Como na t e b . O futuro corpo de crentes é concebido
como já existindo.

Pela sua palavra, hão de crer em mim. A ordem grega é: creem p e la sua p a ­
A expressão “creem pela sua palavra” forma uma ideia composta.
lavra em m im .

21. Um. Omita.


219
J oão - Cap. 18
24. Aqueles que (οϋς). Os melhores textos trazem ò, aquele que . A construção no
grego é similar à do versículo 2: “todo aquele que tens dado a ele” etc (cp. n t i a ,
campo interlinear). Como com ττάν, todo , naquela passagem, aqui a expressão
aquele que refere-se ao corpo de cristãos considerados coletivamente.

Quero (θέλω). Vide nota sobre Mt 1.19149.

Minha glória. A glória que é minha.

C apítulo 18

1. Compare com Mt 26.30,36-46; Mc 14.26,32-42; Lc 22.39-46.

1. Ribeiro (χειμάρρου). De χεΐμα, inverno , e ρ έω , f lu ir . De forma adequada, uma


torrente de inverno . Ocorre somente aqui no texto do Novo Testamento. Na t e b
e na b j , torrente do Cedron. Na r v , à margem, ravina . No grego clássico, o termo
ocorre em Demóstenes no sentido de escoadouro ou canal . Pode ser entendido
como equivalente à palavra árabe uádi , que quer dizer um rio e seu leito ou, de
forma mais adequada, o vale de um rio até mesmo quando o rio está seco.

Cedrom (Κέδρων). Que também pode ser traduzido por dos cedros , forma pre­
ferida por alguns editores. Há alguma incerteza quanto ao exato sentido da pa­
lavra cedro , que ocorre com bastante frequência, e alguns supõem que é o nome
genérico da família das pináceas. Uma árvore de folhagem escura é mencionada
no Talmude pelo nome de cedrus . A torrente do Cedrom separava o monte das
Oliveiras do monte do templo. Westcott cita, de Derenbourg, uma passagem do
Talmude para o fato de que havia dois cedros no monte das Oliveiras, e sob um
deles ficavam quatro lojas para a venda de objetos puros do ponto de vista da
lei; e de que em uma delas eram vendidos pombos suficientes para os sacrifícios
de toda a Israel. Ele acrescenta: “Até mesmo a menção do Cedrom por meio do
nome popular e secundário ‘a ravina dos cedros’ pode conter uma alusão ao es­
cândalo sentido como um pesado fardo na época em que os sacerdotes ficaram
ricos com a venda de vítimas pelos dots cedros ”150. O Cedrom é o ribeiro no qual
Davi passou, descalço e chorando, quando fugiu de Absalão (2Sm 15.23-30). Lá,
o rei Asa queimou o ídolo obsceno que pertencia a sua mãe (lRs 15.13). Era o
receptáculo das impurezas e abominações da adoração de ídolo quando foi re-

149. Godet diz que essa expressão "não é encontrada emnenhuma outra passagemna boca de
Jesus”. Porém, vid e Mt 8.S; Mc 14.36; Jo 21.22.
150. Derenbourg apudWestcott, On the H isto ry a n d G eography o f Palestine.

220
J oão — C ap . 18

movido do templo pelos seguidores de Jeová (2Cr 19.16); e, na época de Josias,


era o cemitério comum da cidade (2Rs 23.6). Na visão de Ezequiel (47.5-7), ele
vai para a porta oriental do templo, ressaltando o desfiladeiro do Cedrom e vê
as águas correndo para o vale até o ribeiro se transformar em um rio poderoso.

Um horto. Nem João nem Lucas fornecem o nome Getsêmani.

2-12. Compare com Mt 26.47-56; Mc 16.43-52; Lc 22.47-53.

2. Que o traía (ò παραδι,δούς). O particípio presente, marcando a traição como


em progresso. Literalmente, que está traindo.

Ajuntava (συνήχθη). Literalmente. Ao passo que na k jv , d irig ia -se. Os itens


desse versículo são peculiares a João.

3. Uma coorte (την σπείραν). Mais propriamente, a coorte. Vide nota sobre
Mc 15.16; também sobre centurião, Lc 7.2; e At 21.31. A coorte, ou gru po, era da
guarnição romana na torre de Antônia.

Oficiais (ύπηρετας). Vide nota sobre Mt 5.25. Enviados do Sinédrio. A polícia


do templo. Os escritores dos Evangelhos Sinópticos falam da formação militar
que prendeu Jesus como δχλος, um a m u ltidão ou turba, mas Mateus e Marcos
mencionam coorte (σπείρα) mais adiante na narrativa (Mt 27.27; Mc 15.16).

Lanternas (φανών). Somente aqui no texto do Novo Testamento. Um detalhe


peculiar a João. Embora fosse noite de lua cheia, temia-se que Jesus pudesse se
esconder e escapar.

4. Que £..(] haviam de vir (τα ερχόμενα). Literalmente, que estão vindo. Os deta­
lhes nos versículos 4-9 são peculiares a João.

5. O Nazareno (τον Ναζωραίον). Literalmente. Ao passo que a k j v e n v i trazem:


de Nazaré.

Estava (είστήκεί). Tempo imperfeito. Na r v , corretamente, continuava a estar.

8. Estes. Os discípulos.

Ir (ύπαγε iv). Sair, retirar-se.


221
J oão - C ap. 18

10. Simão Pedro. Só João menciona os nomes de Simão Pedro e de Malco em


conexão com esse incidente. O incidente mesmo é relatado por todos os evan­
gelistas.

Espada. Atitude contrária à regra que proibia carregar armas em dia de festa.

O servo do sumo sacerdote. Vide nota sobre Mt 26.51.

Orelha direita. Lucas e João. Os outros não especificam que orelha foi cor­
tada. Para orelha, João e Marcos usam ώτάριον, um diminutivo; Lucas usa
ούς; e Mateus, ώτίον, diminutivo na forma, mas não na força. Vide nota sobre
Mt 26.51.

11. Tua espada. Omita tua, e l e i a : a e s p a d a , como n a ara .

Bainha (θήκην). Somente aqui no texto do Novo Testamento. De τίθημι, pôr.


O objeto dentro de que a espada é posta.

O cálice. Compare com Mt 26.39; Mc 14.36; Lc 22.42. Peculiar a João.

12. O tribuno (χιλίαρχος). V ide n o ta sobre Mc 6.21, e sobre centurião, Ix 7.2.

Prenderam (συνίλαβον). Esta é a melhor forma de traduzir. É a palavra téc­


nica para prender. Literalmente, levou com eles, à qual percebemos uma alusão no
jargão policial moderno: Venha com igo. Compare com Lc 22.54.

13-18. Compare com Mt 26.57-58,69-75; Mc 14.53-54,66-72; Lc 22.54-62.

13. Primeiramente a Anás. Isso supre os detalhes do questionamento prelimi­


nar diante do sumo sacerdote, que os escritores dos Sinópticos omitem.

Sogro (TT6V0€pòç). Somente aqui no texto do Novo Testamento.

Daquele ano. Vide nota sobre 11.49.

15. Seguiam (ήκολούθει). O imperfeito, 3.a p. singular, estava seguindo, em refe­


rência a Simão Pedro.

O utro discípulo. Conforme a leitura correta, que omite o artigo. O utro, pro­
vavelmente o próprio João.
222
João — C ap. 18

Sala (αυλήν). Não palácio (t e b ), mas pátio, como na n v i. Vide nota sobre
Mt 26.3; Lc 11.21.

16. Estava. Mais propriamente, o sentido é: situou-se e permaneceu situado.

Porta. A porta se abria da rua para o pátio.

Porteira (τή θυρωρω). Vide nota sobre 10.3.

17. A porteira (ή παιδίσκη). Vide nota sobre At 12.13.

És tu (μή σύ). A pergunta é posta na forma negativa, como se fosse esperada


uma resposta negativa: tu não és, és?

Também. Mostrando que ela reconheceu João como discípulo.

18. Estavam. E desanimador ver como comumente se ignora e mal traduz o tem­
po imperfeito, prejudicando, com isso, a vivacidade da narrativa. Compare com a
kjv , arc , entre outras. Traduza, como na rv : estavam postando-se, no n tia , estavam
postados (campo interlinear).

Brasas (άνθρακιάν). Somente aqui e em 21.9. Mateus não menciona a fogueira.


Marcos registra το φως, estritamente, α luz do fogo. Lucas diz que eles tinham
acendido umafogueira (πυρ).

Se a q u e n ta v a m . Na rv, mais propriamente, estavam se aquentando. Assim, no


versículo 25, o sentido é: continuava a estar e estava se aquentando, em lugar de
estava e aquentava-se.

19-24. Compare com Mt 26.59-68; Mc 14.55-65; Lc 22.63-71.

19. Interrogou (ήρώτησ€ν). Ou questionou. Na n t l h , ^ z algumas perguntas.

D outrina (διδαχής). Na r v , melhor, ensino-, na n v i , ensinamentos.

20. Na sinagoga (έν τή συναγωγή). Os melhores textos omitem o artigo. Tra­


duza: em sinagoga, ou seja, quando as pessoas estavam reunidas. Como a nossa
expressão “em assembléia”.

Todos [../] se a ju n ta m (πάντες συνέρχονται). Adote a leitura πάντως; a k j v segue


a leitura πάντοτε, sempre. Συνέρχονται significa, preferivelmente, se ajuntam, se reúnem.
228
Jo ã o - C ap. 18

22. Deu uma bofetada (eôcoxe ράπισμα). Literalmente, deu um golpe. Os intér­
pretes diferem quanto ao fato de se o golpe foi com uma vara ou com a mão. O
verbo relacionado ραπίζω, de ραπίς, uma vara, está etimologicamente relaciona­
do com ραβδίζω, de ράβδος, uma vara, e ocorre em Mt 5.39, na expressão bater na
face, e em Mt 26.67, onde se estabelece uma distinção de κολαφίζω, golpear com
a mãofechada. Contudo, essa última passagem deixa a questão em aberto, uma
vez que, se o sentido de golpear com uma vara pode ser defendido, não há nada
que impeça que ele seja entendido ali nesse sentido. O sentido anterior da pala­
vra, sem dúvida, de acordo com sua etimologia, era golpear com uma vara. Como
Heródoto, a respeito de Xerxes. “É certo que ele ordenou que aqueles que bate­
ram (ραπίζοντας) as águas (do Helesponto) para proferir, enquanto as chicotea­
vam, essas palavras bárbaras e perversas.”151 E mais uma vez: “O capitão coríntio
Adeimantus observou: ‘Temístocles, nos jogos em que aqueles que começaram
cedo demais foram espancados (ραπίζονται)’”152. No grego clássico, passa desse
sentido para o de uma leve bofetada. O gramático Frínico (180 d.C.) condena o uso
da palavra com o sentido de bater com a mão ou esbofetear por considerar que não
está de acordo com o bom uso ático e diz que a expressão adequada para bofeta­
da é έπί κόρρης πατάξαι. Isso demonstra que a expressão não ática já estava em
uso. Na lxx , a palavra é claramente usada com o sentido de bofetada. Vide Is 50.6:
“Ofereço minhas faces aos golpes (elç ραπίσματα)”. Os 11.4: "Como um homem
que golpeia (ραπίζων) suas faces” (na arc , tiram ojugo de sobre as suas queixadas-,
na a r a , alivia ojugo etc.). Em lRs 22.24 temos: “Zedequias £...] feriu a Micaías
no queixo (έπάταξε 4π'ι την σιαγόνα)”. Por essa razão é que a palavra em 18.23,
ôépeiç, literalmente, esfolar, traduzida por ferir ou bater (cp. Lc 12.47), parece se
adequar melhor ao sentido de bater com uma vara; contudo, em 2Co 11.20, esse
verbo é usado para bater naface (elç πρόσωπον ôépei), e em lCo 9.26, passagem
em que Paulo usa a imagem de um boxeador, ele diz: “assim luto (πυκτίύω, de
boxear ou lutar com as mãosfechadas), não como desferindo golpes (ôepoov) no ar”.
Esses exemplos praticamente destroem a força do argumento a partir de ôépeiç.
É impossível estabelecer o ponto de forma conclusiva, mas, em geral, parece bem
manter a tradução da a r c 153.

24. Anás mandou-o (άπέστειλ^ν ό "Αννας). Os melhores textos acrescentam ούν,


então. Aqui, a tradução do aoristo pelo mais-que-perfeito na kjv , tinha mandado,
é inadmissível, e é um artificio para harmonizar essa inquirição de Jesus com a

151. H e ró d o to , vii, 35.


152. Id., viii, 59.
153. A observação do Sr. Field (OtiumNorvicense), de que é improvável que a palavra pudesse conti­
nuar a ser usada no sentido mais antigo (vara) depois de ter adquirido o último sentido (mão),
dificilmente pode ser considerada conclusiva.

224
Jo ã o - C ap . 18

descrita em Mt 26.56-68, como também para escapar da aparente inconsistência


entre a menção ao sumo sacerdote (Caifás), como conduzindo essa inquirição, e
a declaração do versículo 13, que sugere que esse foi apenas um interrogatório
preliminar diante de Anás. Traduza: Anás, então, mandou-o.

Manietado. Provavelmente, Ele foi solto durante o interrogatório.

37. O galo cantou. O grego não tem o artigo definido. Vide nota sobre Mt 26.34.
O uso do artigo parece marcar a hora, a hora do canto do galo, em vez de o in­
cidente.

38-38. Compare com Mt 27.1-2,11-14; Mc 15.1-5; Lc 23.1-5.

28. Levaram (αγουσιν). Tempo presente, levam.

Audiência (ττραιτώριον). Na ara , pretório. Transcrição de uma palavra latina,


praetorium. Originalmente, a tenda do general. Nas províncias romanas, como aqui,
era o nome da residência oficial do governador romano. Compare com At 23.35. Ela
veio a ser aplicada para toda vila ou palácio espaçoso. Daí Juvenal dizer: “Para
seus crimes, eles estão em dívida por seus jardins, palácios (praetoria) etc.”154. Em
Roma, o termo era aplicado à guarda pretoriana ou guarda-costas imperiais. Vide
nota sobre Fp 1.13. Na n tlh , palácio.

Manhã (πρωί). Termo usado tecnicamente para a quarta vigília, das 3 horas às
6. Vide Mc 13.35. O Sinédrio não podia presidir uma reunião legal, sobretudo em
casos de pena capital, antes do nascer do sol; e, nesses casos, os procedimentos
judiciais tinham de ser conduzidos e encerrados durante o dia. A condenação
à morte dada à noite era tecnicamente ilegal. Em casos capitais, a sentença de
condenação não podia ser legalmente pronunciada no dia do julgamento. Se os
procedimentos noturnos foram apenas preliminares para o julgamento formal,
eles não teriam validade; se fossem formais, eles eram, ipsofacto, ilegais. Em um
ou em outro caso, a lei foi observada em relação ao segundo conselho. De acordo
com a contagem hebraica do tempo, a reunião aconteceu no mesmo dia.

Se contaminarem (μιανθώσιν). Originalmente, manchar, como com cor. Por


isso, Homero disse: “Como serva caria ou meônia (que o freio das maxilas dos gi­
gantes adorna) tinge (μιήνη) de cor púrpura”155. Por isso, não é necessariamente

154. Juvenal, Sátiras, i, 75.


155. Homero, Ilíada, iv, 141-143, p. 155.

225
J oão - C ap . 18

um sentido ruim, como μολύνω, contaminar ou manchar cora sujeira (lCo 8.7; Ap
3.4). No grego clássico, μιαίνω, o verbo usado aqui, é o termo usual para profanar
ou desconsagrar. Por isso, Sófocles diz:

Nem mesmo temendo essa contaminação (μίασμα) terrível,


Consentirei no sepultamento. Bem sei
Aquele homem é incapaz de contaminar (μιαίνειν) os deuses156.

E Platão: “E se um homicida [(...3 sem purificação polui a ágora, ou os jogos,


ou os templos”157 etc. Vide nota sobre lPe 1.4. A contaminação, nesse caso, era
entendida como a da casa inteira na qual não fora removido todo fermento.

Comer a Páscoa. O propósito desse trabalho impede-nos de examinar a ques­


tão muito debatida da aparente inconsistência entre João e os escritores dos Si-
nópticos quanto à hora da celebração da Páscoa.

29. Pilatos. Observe a brusquidão com que ele é introduzido como alguém bem
conhecido. São dadas duas derivações do nome. Pilatus, alguém armado com o
pilo ou lança, como Torquato, alguém adornado com um colar {torques). Ou uma
contração de Pileatus, usando o píleo ou barrete, o sinal dos escravos libertados.
Tácito refere-se a ele como ligado à morte de Cristo. “O autor desse nome (cris­
tão), ou seita, foi Cristo, punido com pena capital no reinado de Tibério por Pôn-
cio Pilatos”158. Ele foi o sexto procurador romano na Judeia.

Que acusação. Não indica desconhecimento da acusação por parte de Pilatos,


mas sua exigência da acusação formal.

30. Malfeitor (κακοποιός). Na rv, literalmente, fazedor de mal. De κακόν, mal, e


ποιkta, fazer. Lucas usa uma palavra distinta, κακούργος, de κακόν, mal, e εργω,
trabalhar. Vide nota sobre lPe2.12.

31 . Levai-o vós (λάβετε αύτόν ύμεις). A kjv obscurece a força enfática de υμείς,
vós. As palavras de Pilatos demonstram grande sagacidade prática em forçar os
judeus a se comprometerem em admitir que desejavam a morte de Cristo. “Levai-
-o vós mesmos (como na rv ), e julgai-o de acordo com a vossa lei.” “Segundo a
nossa lei”, replicam os judeus, “ele deve morrer’. Mas eles não podiam infligir
essa penalidade. “Isto não é lícito” etc.

156. Sófocles, Antigone, 1042-1044·.


157. Platão, Leis, 868.
158. Tácito, Anais, xv, 44.

226
J oão - C ap. 18

32. De que morte (ιτοίφ θανάτψ). Mais corretamente, por qual tipo de morte.
Como na rv ; na n v i , a espécie de morte. Compare com 12.32; Mt 20.19. A crucifi­
cação não era uma punição judaica.

S3. Tu és (oi) et). Tu é enfático. Tu, o malfeitor desprezado.

Rei dos judeus. O título civil. O título teocrático, rei de Israel (1.40; 12.13), é
dirigido a Jesus na cruz (Mt 27.42; Mc 15.32) em zombaria.

35. Sou eu judeu? Como se a pergunta de Jesus indicasse que Pilatos se acon­
selhara com os judeus.

36. Servos (ύπηρέται). Somente nessa passagem nos Evangelhos, em referência


aos cristãos. Compare com At 13.5; 1Co 4.1. Corresponde a Cristo como rei.

Lutariam (ήγωνίζοι/το). O tempo imperfeito denota ação em progresso: esta­


riam combatendo agora.

37. Logo tu és (ούκοΰν et σύ). A partícula interrogativa ούκοΰν, portanto não,


ocorre somente aqui no texto do Novo Testamento. É irônica. No versículo 33,
a ênfase está em tu-, aqui está em rei. Togo, afinal, tu és um rei.

Nasci - vim (γ^γέρι/ημαι - έλήλυθα). Ambos perfeitos. Eu tenho nascido -


eu tenho vindo. Como na rv . A ordem grega é: Eu para isso tenho nascido etc.,
lançando &ênfase na pessoa e no destino de Cristo. O perfeito descreve seu
nascimento e vinda não só como fatos históricos, mas como permanentes em
seus resultados. Compare essa confissão diante de Pilatos (lT m 6.13) com
a confissão correspondente diante do sumo sacerdote (Mt 26.64). Westcott
relata:

Aquele, para se dirigir aos judeus, está enquadrado na linguagem de profecia; o outro,
para se dirigir a um romano, apela para o testemunho universal da consciência. Um
fala de uma futura manifestação de glória, o outro fala de manifestação atual de verda­
de. Um olha à frente para o retorno, outro rememora a encarnação.

Da verdade (έκ τής άληθείας). Literalmente, fora da: brotado da, cuja vida e
palavras provêm da verdade. Vide nota sobre 14.6, e compare com 8.47.

38. A verdade. Em grego, sem o artigo, de forma distinta do versículo anterior,


da verdade. Jesus pretende a verdade absoluta-, Pilatos, a verdade em algum caso
227
Jo â o - C ap . 18

particular. Godet comenta: “A exclamação de Pilatos não é a expressão de sede


ardente pela verdade nem do desespero de uma alma que há muito a busca em
vão; é a profissão de ceticismo frívolo como é tão frequente encontrar no homem
do mundo e, sobretudo, no estadista”.

Crime (αιτίαν). Propriamente, motivo de acusação. Vide nota sobre Mt 27.37, e


compare com Mt 19.10.

39-40. Compare com Mt 27.15-26; Mc 6.15.

39. Vós tendes por costume. O sentido original da palavra συνήθεια, costume,
é intimidade, ligação habitual, e daí passa naturalmente para o sentido de hábito
ou costume. Só João põe a declaração desse costume na boca de Pilatos. Mateus e
Marcos relatam o costume como um fato.

Da Páscoa (έν τω πάσχα). Mais específico que Mateus e Marcos, nos quais a
expressão é genérica, κατά εορτήν, em época defesta.

40. G ritar (έκραύγασαν). Clamor peculiarmente alto, incômodo, um grito. Platão


usa o termo para o uivo de um cão: “A cadela uivadora que ladra (κραυγά(ουσα)
aos seus donos”159. Outros usam para o clamor dos espectadores no teatro e para
o grasnar do corvo. Vide nota sobre Mt 15.22.

Voltaram. Presumindo a lembrança de João de um “grito” anterior que ele


não registrou.

Salteador (ληστής). Vide nota sobre Mt 26.55; Mc 11.17; Lc 10.30. Mateus


chama-o de “preso bem conhecido” (27.16). Marcos afirma que ele tinha feito
uma insurreição e cometido assassinato (15.7), falando da insurreição como
um evento bem conhecido. Lucas diz: “por causa de uma sedição (στάσιν τινά)
feita na cidade e de um homicídio” (23.19). Lucas, escrevendo para os gentios,
não se referiría ao evento como algo familiar. Os bandidos desse tipo eram
numerosos na vizinhança de Jerusalém durante o domínio romano. Seus lí­
deres eram bem conhecidos. Josefo descreve-os com a mesma palavra usada
por Mateus, επίσημοι, notável. Seus saques, com frequência, eram cometidos
sob pretextos patrióticos, por isso, Barrabás talvez tivesse amigos influentes
entre o povo.

159. Platão, Diálogos III: República, tradução Leonel Vallandro, Rio de Janeiro, Editora Globo,
1964, p. 303.
228
João — C ap. 19

C apítulo 19

1-3. Compare com Mt 27.26-30; Mc 15.15-19.

1. Açoitou (έμαστίγωσεν). Mateus e Marcos usam a forma grega da palavra


latina flagellare, φραγελλόω, que ocorre somente nessas duas circunstâncias no
texto do Novo Testamento. João usa a palavra grega mais comum, embora ele
apresente φραγ^λλίον {flagellum), açoitar, em 2.15. Contudo, Mateus e Marcos
usam μαστι,γόω em outras passagens (Mt 10.17; 20.29; Mc 10.34). O substantivo
relacionado, μάστι,ξ, ocorre diversas vezes no sentido metafórico de praga. Fide
nota sobre Mc 3.10, e compare com Mc 5.29,34; Lc 7.21. O verbo é usado de
forma metafórica apenas uma vez, Hb 12.6. O açoitamento era a preliminar legal
para a crucificação, mas, nesse caso, foi infligido ilegalmente antes da sentença
de crucificação ser pronunciada, com o intuito de evitar a punição extrema e de
satisfazer os judeus (Lc 23.22). A punição era terrível, a vítima era amarrada em
um pilar, ou estaca, baixa e açoitada com vara ou, no caso de escravos e provin­
cianos, com açoites chamados escorpiões, tiras de couro com bolas de chumbo ou
pregos afiados nas pontas. A severidade da punição no caso de Jesus fica evidente
em sua impossibilidade para carregar a cruz.

2. Coroa (στέφανον). Como Mateus e Marcos. Lucas não menciona a coroa de


espinhos. Vide nota sobre lPe 5.4.

De espinhos (Ιξ άκανθων). Como Mateus. Marcos apresenta άκάνθινον, o


a d j e t i v o , de espinhos, que João também usa em 19.5. Todas as tentativas de
definir o caráter botânico dos espinhos usados na coroa de Cristo são palpites.
A palavra usada aqui para espinhos é a única que ocorre no texto do Novo Testa­
mento; ο σκόλοψ (espinho na carne) de 2Co 12.7 é mais propriamente uma estaca
que trespassa o corpo.
A coroação com espinhos e o açoitamento são os assuntos prediletos da arte
cristã. Algumas das primeiras representações do açoitamento retratam a figura
do Senhor completamente vestido e de pé encostado na coluna sem estar amar­
rado, ilustrando, assim, a voluntariedade do seu sacrifício. Em um manuscrito do
século X iy no Museu Britânico, Ele está de pé totalmente vestido, segurando
um livro em uma mão e abençoando com a outra. O sentimento mais devoto que
predominava nessa representação foi gradualmente superado pelo sentido do
sofrimento físico. As primeiras pinturas representavam as costas voltadas em di­
reção ao espectador, e o rosto, voltado em uma atitude forçada, exibido de perfil.
Mais tarde, a face e a figura foram viradas totalmente de frente, e as chicotadas
caíam no peito. Por isso, Jerônimo, em seu comentário sobre Mateus, diz que o

229
JoÂo - Cap . 19

am plo p eito de D e u s(f) foi rasgado com chicotadas. A posição de pé é a aceita, mas
ocorrem instâncias em que o Salvador está no chão amarrado à coluna por uma
das mãos. Esse é o comovente e, ao mesmo tempo, revoltante quadro de L. Ca-
racci na galeria de Bolonha, no qual o soldado agarra Jesus pelo cabelo enquanto
chicoteia o corpo com um maço de galhos. Em um saltério do século Χλζ o Salva­
dor está de pé, em frente à coluna, cobrindo o rosto com as mãos.
De acordo com a representação posterior, o momento escolhido é quando a
execução da sentença está apenas começando. Um homem está amarrando as
mãos no pilar, outro está amarrando um maço de gravetos soltos. As repre­
sentações alemãs são mais grosseiras que as italianas, mas com mais inciden­
tes. Falta-lhes o sentimento espiritual que aparece nos melhores exemplos
italianos.
Um campo para sentimentos mais elevados e tratamento mais sutil é aberto
nos momentos subsequentes ao açoitamento. Um dos exemplos mais excelentes
é o quadro de Velásquez, “Cristo na coluna”, exposto na Galeria Nacional de
Londres. A verdadeira grandeza e p á th o s da concepção expressam-se acima de
determinados detalhes prosaicos e realistas. O Salvador está sentado no chão, os
braços estendidos e inclinado para trás na extensão toda da corda que amarra
suas mãos cruzadas. O rosto está voltado sobre o ombro esquerdo, totalmente
voltado para o espectador. Varas, cordas e galhos quebrados estão sobre o chão,
e finos fios de sangue aparecem sob o corpo. Um anjo guardião atrás da figura
do Senhor inclina-se levemente sobre uma criança ajoelhada com as mãos entre­
laçadas apontando para o sofredor de cuja cabeça sai um raio de luz que chega
até o coração da criança. O anjo é uma ama-seca espanhola com asas, e o rosto da
criança é do tipo espanhol mais do sul e contrasta de forma contundente com o
delicado semblante de Cristo, semelhante ao de uma criança, conforme retratado
por Murillo, que está pendurado ao lado desse quadro, um dos mais doces tipos
de beleza andaluza. O rosto do Salvador, na verdade, é totalmente másculo, do
tipo robusto, expressando intenso sofrimento, mas sem contorção da fisionomia.
Os grandes olhos escuros estão indescritivelmente tristonhos. A forte luz sobre
o braço direito funde-se na profunda sombra das mãos amarradas, e a mesma
sombra cai com efeito impressionante através da luz direta sobre o braço esquer­
do, marcada no pulso por uma leve linha de sangue.
No retrato da coroação com espinhos, em alguns exemplos, o momento esco­
lhido é após a coroação acontecer, e a ação retrata a adoração para zombaria; mas
a concepção predominante é a do ato da coroação, que consiste em pressionar a
coroa sobre a fronte por meio de duas longas varas finas. Um exemplar magnífi­
co é o afresco de Luini, exposto na Biblioteca Ambrosiana de Milão. Cristo está
assentado sobre uma tribuna, coberto com um manto vermelho, o semblante com
uma expressão de infinita doçura e dignidade, enquanto um soldado, rodeado
230
João - C ap. 19

pela multidão em ambos os lados enfia a coroa e entrega um cajado. Os artistas


italianos representam a coroa consistindo de galhos flexíveis com pequenos es­
pinhos; mas os artistas do norte “concebem”, para citar a Sra. Jameson, “uma feia
estrutura dos galhos mais firmes e nodosos com espinhos enormes com quinze
centímetros de comprimento, aos quais nenhuma mão humana teria conseguido
dar forma”. Em alguns poucos exemplos posteriores, as varas são omitidas, e a
coroa é colocada sobre a cabeça pela mão com armadura de um soldado.

Puseram sobre (περιέβαλον). Literalmente, atirara m sobre, Na rv, vestiram.

Púrpura (πορφυροϋν). Adjetivo. Encontrado somente aqui, no versículo 5 e em


Ap 18.16. Marcos usa o substantivo, πορφύρα, pú rpura, que também ocorre em
Ap 17.4; 18.12. Vide nota sobre Ix 16.19. Mateus apresenta κοκκίνην, escarlate.

Veste (Ιμάτιον). Na k j v , manto. Melhor, como na n v i , capa, uma vez que m an ­


to dá a impressão de um pano que se arrasta no chão. V ide nota sobre Mt 5.40.
Mateus traz χλαμύδα, capa m ilita r curta (27.28). Lucas descreve o traje como
λαμπράν, suntuoso, luminoso ou brilhante (23.11).

3. E diziam. Acrescente και ηρχοντο προς αυτόν, e continuaram vin do p a r a Ele,


antes de e d iz ia m ou continuaram d izen d o . O imperfeito denota os atos sucessivos
de deferência dos soldados conforme surgiam um após o outro.

Davam-lhe bofetadas (έδίδουυ αύτώ ραπίσματα). Literalmente, continuavam


nota sobre 18.22.
a d a r-lh e bofetadas. Vide

5. Saiu [[...^ Jesus. Do Pretório.

Levando (φορών). Não φέρων, carregando, mas a forma frequentativa desse


verbo, denotando um carregar h abitu al ou contínuo; daí levando, como se fosse sua
roupa natural.

6. Gritaram. Vide nota sobre 18.40.

Crucifica-o. Os melhores textos omitem 0.

Tomai-o (λάβετε αύτον ύμεΐς). De acordo com a ordem grega: “tomai-o vós”.
Na r v , to m a i-o vós mesmos; na n v i , levem -no vocês. Vide n o ta sobre 18.31.

7. Nós temos uma lei. N ó s é enfático. Independentemente de qual seja sua deci­
são, nós temos uma lei etc.
231
J oão- C ap. 19
Segundo a nossa lei. Os melhores textos omitem nossa. Leia: d e acordo com
na nvi.
essa lei, como

8. Mais atemorizado. Segundo Godet:

Essas palavras dos judeus produziram um efeito em Pilatos para o qual eles não es­
tavam preparados. A fala deu força para um terrível pressentimento que se formava
gradualmente em sua mente. Tudo que ele ouvira relacionado aos milagres de Jesus,
ao misterioso caráter de sua pessoa, de suas palavras e de sua conduta, à estranha
mensagem que acabara de receber de sua esposa - de repente, tudo isso é explicado
pelo termo ‘Filho de D eus’. Esse homem extraordinário seria mesmo um ser divino
que tinha aparecido na terra? Naturalmente, a verdade apresenta-se a sua mente na
forma de superstições pagãs e lendas mitológicas.

11. Aquele que me entregou. Caifás.

12. Desde então (έκ τούτου). Inadequado. A rv apresenta, de forma correta, p o r


causa disto.

Procurava (έζήτει). Tempo imperfeito. Fez repetidas tentativas.

Amigo do César. Título conferido desde a época de Augusto aos governa­


dores provinciais. Contudo, não é provável que fosse usado pelos judeus nesse
sentido técnico, mas apenas como um modo de dizer: "Você não é, de fato, o
imperador”.

César (τω Καίσαρι). Literalmente, o César. O termo que, de início, era um


nome próprio, o sobrenome de Júlio César, adotado por Augusto e seus suces­
sores, tornou-se um designativo para todos os imperadores e passou a ser um
título. Assim, o imperador dessa época era T ib ério César. Todavia, foi introduzi­
da uma distinção entre esse título e o de Augusto, dado pela primeira vez para
Otaviano, o primeiro imperador. O título “Augusto” era sempre reservado para
o monarca, enquanto “César” era mais livremente usado para suas relações; e a
partir do reinado de Adriano (117-138 d.C.), pelo menos, passou a ser apropriado
para a segunda pessoa no Estado, considerada como o presumível herdeiro do
império.

13. Esse dito (τούτον τον λόγον). Os melhores textos trazem των λόγων τούτων,
essas palavras. Como na teb. Ele temia uma acusação em Roma diante de Tibério,
a qual podería ser justificada por seu desgoverno.
232
JoAo-C ap. 19
Tribunal (βήματος). Vide nota sobre At 7.5. Os melhores textos omitem o ar­
tigo, o que pode indicar que o tribunal era improvisado.

Litóstrotos (Λιθόστρωτοι). De λίθος, pedra, e στρωτός, distribuído ou espalhado.

Gabatá. Do hebraico gab (aa), “atrás”, e daí o sentido de lugar elevado. Assim,
o termo aramaico não é uma tradução do termo grego, o que indica que o lugar,
independentemente de onde fosse, era distinguido por um pavimento em mosai­
co ou xadrez. Suetônio relata que Júlio César, em suas expedições, costumava
carregar com ele um pavimento em mosaico portátil como seu tribunal. Contu­
do, não é provável que, aqui, haja alguma alusão a essa prática. Westcott explica
Gabatá como o topo da casa.

14. Hora sexta. Vide nota sobre 1.39.

15. Eles (oi). Os melhores textos trazem ckcI voi, aqueles (aquelas pesssoas). O
pronome de referência remota isola e faz uma distinção contundente entre eles e
Jesus. Vide nota sobre 13.27.

Tira (άρον). Literalmente. Ao passo que a kjv tm-.fora com ele.

Não temos rei, senão o César. Essas palavras, pronunciadas pelos princi­
pais dos sacerdotes, eram muito relevantes. Esses principais representantes do
governo teocrático de Israel renunciaram, assim, formal e expressamente a essa
função e declararam sua submissão a um poder temporal e pagão. Esse pronun­
ciamento é “a abdicação formal da esperança messiânica”.

16-17. Compare com Mt 27.31-34; Mc 15.20-23; Lc 23.26-33.

16. Entregou. Lucas diz entregou Jesus à vontade deles (23.25). Pilatos não pro­
nunciou a sentença, mas negou toda responsabilidade pelo ato e entregou Cristo
para eles (αύτοΐς), tendo eles invocado a responsabilidade para eles mesmos. Vide
Mt 27.24-25.

E o levaram. Os melhores textos omitem.

17. Levando (βαστάζων). Vide nota sobre 12.6; 10.31.

Sua cruz (τον σταυρόν αΰτοΰ). Os melhores textos trazem αύτώ ou ίαυτω,
“carregando a cruz por si mesmo". João não menciona o recrutamento forçado de
Simão Cireneu para esse serviço. Compare com Mt 27.32; Mc 15.21; Lc 23.26.
233
João - Cap. 19

Calvário. Vide nota sobre Mt 27.33.

1 8 -2 4 . Compare com Mt 27.35-38; Mc 15.24-28; Lc 23.33-34,38.

18. No meio. Todos os escritores dos Sinópticos descrevem o caráter dos dois
que foram crucificados com Jesus. Mateus e Marcos dizem que eram salteado­
res·, Lucas, m alfeitores (κακούργους). Os três Sinópticos (Mt 27.38; Lc 23.33; Mc
15.27) usam a expressão um, à direita, e outro, à esquerda; e, por isso, João apresen­
ta essencialmente um de cada lado. João não diz nada sobre o caráter desses dois,
apenas descreve-os como outros dois.

19. Título (τίτλον). Somente aqui e no versículo 20, no texto do Novo


Testamento. João usa o termo técnico romano titulus, um a p la c a ou aviso. Usado
para anúncio ou aviso de venda afixado em uma casa. Por isso, Ovídio disse de
uma credora sem coração: “Ela despachou nossos bens de família sob uma placa
(.sub-titulum )”1R0; ou seja, pôs a casa e a mobília à venda. Também com o sentido
de o títu lo de um livro , um epitáfio. Mateus apresenta αιτίαν, acusação; Marcos,
επιγραφή τής αιτίας, inscrição da acusação; Lucas, επιγραφή, inscrição. Só João
menciona o fato de que Pilatos escreveu a anotação.

Jesus Nazareno, Rei dos Judeus. Cada evangelista apresenta um fraseado


no título.

Mateus: Este é Jesus, o Rei dos Judeus.


Marcos: O Rei dos Judeus.
Lucas: Este é o Rei dos Judeus.
João: Jesus Nazareno, Rei dos Judeus.

O elemento essencial do enunciado, R e i dos Judeus, é comum a todos. Expres­


sava, de forma clara e direta, a principal intenção de Pilatos, lançar desdém sobre
os judeus. Lange comenta:

Na percepção do homem Pilatos, o dito quer dizer: Jesus, o Rei dos judeus fanáti­
cos, crucificado no m eio de judeus, que deviam todos ser executados dessa forma.
Na percepção dos judeus: Jesus, o incitador, o Rei dos rebeldes. Na percepção do
juiz político: Jesus, por cuja acusação os judeus, com sua acusação ambígua, podem
vir a responder. Na percepção da ironia divina que governava a expressão: Jesus,
o M essias, pela crucificação transformou-se verdadeiramente no Rei do povo de
Deus.

160. Ovídio, Remedia Amoris, 302.

234
J oão - C ap. 19

20. Hebraico, grego e latim. Alguns editores variam a ordem. Na nvi, aram aico,
la tim e grego; na t e b , hebraico, la tim eg reg o . Essas inscrições em diferentes línguas
não eram incomuns. Júlio Capitolino, biógrafo (320 d.C.), em sua obra sobre a
vida do terceiro górdio diz que os soldados erigiram sua tumba na fronteira per­
sa e puseram um epitáfio (titu lu m ) em latim, persa, hebraico e egípcio, a fim de
que pudesse ser lido por todos. O hebraico era o dialeto nacional; o latim, o oficial;
e o grego, o comum. Como o hebraico era a língua nacional, Rei dos judeus foi
traduzido para o latim e o grego, assim, a inscrição era profética de que Cristo
devia ingressar na administração civil e na fala comum; que o Messias hebraico
devia se tornar igualmente o libertador de gregos e romanos; que, por Cristo ser
o verdadeiro centro da civilização religiosa do judaísmo, Ele também devia ser o
verdadeiro cerne do movimento intelectual do mundo representado pela Grécia
e de sua civilização legal e m a teria l representadas por Roma. As três civilizações
que tinham preparado o caminho para Cristo estavam, desse modo, reunidas na
cruz. A cruz é o verdadeiro cerne da história do mundo.

21. Os principais sacerdotes dos judeus. Expressão única, possivelmente uma


forma de contrastar com R e i dos ju deu s.

23. Quatro partes. Todos os Sinópticos relatam a partilha das vestes. As quatro
partes a serem divididas seriam a cobertura para a cabeça, as sandálias, o cinto e
o ta lit ou a roupa externa com franjas, em forma de quadrado. Delitzsch descreve
assim a roupa do Senhor:

Sobre a cabeça, Ele usava um sudário branco, preso sob o queijo, e descendo por trás
dos ombros. Sobre a túnica que cobria o corpo, até os pés e as mãos, usava um talit
azul com franja azul e branca nas quatro pontas, assim, com esse manto jogado so­
bre a roupa de baixo, cinza com listras vermelhas, por uma parte estar bem junto da
outra, a roupa de baixo mal era perceptível, a não ser quando os pés com sandálias
apareciam161.

Túnica (χιτώνα). Ou capa. Vide nota sobre M t 5.40.

Não tinha costura (άρραφος ou άραφος). Somente aqui no texto do Novo Tes­
tamento. De ά, não, e ράπτω, costurar ju n to . Como a túnica do sumo sacerdote. Só
João registra esse detalhe.

Tecida (υφαντός). Somente aqui no texto do Novo Testamento.

161. Delitzsch, A Day in Capernaum.

235
Jo ã o - C ap . 19

24. Vestes (Ιματισμόν). Na k j v , vestuário-, roupa, coletivamente. Vestes ( a r c ; o u rou­


pas, n v i ) , para o termo ιμάτια, é melhor do que vestuário (ou traje), que é um termo
coletivo, enquanto a palavra é usada para se referir a peças distin tas de roupa.

25. Estava. Tempo imperfeito, estavam postando-se. No n t ia , tin h am se p o sta d o


(campo interlinear).

Maria Madalena. Estritamente, a (ή) Madalena. Ela é introduzida de forma


abrupta na narrativa, como pessoa bem conhecida.

26. Mulher. Vide nota sobre 2.4.

Eis. O Cônego Westcott comenta a respeito das quatro exclamações desse ca­
pítulo - E is aqu i o homem ! E is aqui o vosso rei. E is a í o teufilhol E is a í tua mãe\ - como
uma imagem notável do que Cristo é e do que Ele revela sobre que são os homens.

27. Em sua casa (τα ’ίδια). Vide nota sobre 1.11.

28-30. Compare com M t 27.45-50; Mc 15.33-37; Lc 23.44-46.

28. Estavam terminadas (τετελεσται). Na r v , com tradução mais estrita do tem­


po perfeito, estão concluídas. Concluídas corresponde melhor ao consum ado do ver­
sículo 30. Essa sentença pode ser tomada com a precedente ou com a seguinte.

29. Vinagre. V ide nota sobre Mt 27.48.

Hissopo. Mateus e Marcos apresentam καλάμε, um a cana. Lucas diz ape­


nas que eles lhe ofereceram vinagre. O vin h o m istu ra d o com f e l (Mt 27.34)
ou vin h o com m irra (Mc 15.23) foi oferecido a Jesus a n tes de sua crucificação,
como uma bebida entorpecedora. O hissopo dá uma ideia da altura da cruz,
pois as canas de hissopo mais compridas não tinham mais de 1,20 metro. O
vinagre, nesse caso, foi oferecido a fim de reavivar Cristo. João não menciona
a bebida entorpecedora.

30. Entregou o espírito (παρεδωκε τό πνεύμα). Na r v , seu espírito. Em Mateus,


άφήκεν, despediu. Em Marcos, εξεπνευσεν, expirou (sua vida). Como Lucas, que
acrescenta: “Pai, em tuas mãos confio (παρατίθεμαι; vid e nota sobre Lc 9.16) meu
espírito”.

31-42. Compare com Mt 27.57-61; Mc 15.42-47; Lc 23.50-60.


236
JoÃo - Cap . 19

31. Os judeus - sábado. Os judeus, que, assim, tinham recentemente afirmado


sua obediência a César, agora, têm escrúpulos em relação a observar a letra da lei.

32. Quebraram as pernas. Detalhe registrado apenas em João. Esse cru rifra-
giu m , quebrar as pernas, consistia em bater nas pernas com um martelo de ma­
deira pesado a fim de apressar a morte. As vezes, essa prática era infligida como
punição em escravos. Suetônio fornece algumas ilustrações horríveis em suas
obras sobre a vida de Augusto e Tibério.

34. Com uma lança (λόγχη). Somente aqui no texto do Novo Testamento. Pro­
priamente, a p o n ta de uma lança. Daí Heródoto dizer dos árabes: “Eles também
tinham lanças (αίχμάς) com chifre afiado de antílope na ponta como uma p o n ta de
lança (λόγχης)”1® 2. Usada também, como aqui, para lança mesmo.

Furou (β'υξβ'). Somente aqui no texto do Novo Testamento. Foi levantada a questão
sobre se o evangelista quer descrever um corteprojundo ou uma picada. Outro verbo, no
versículo 37, é traduzido por tmspassar, citação de Zc 12.10, έξβκέντησαν, que também
ocorre em Ap 1.7, com referência à crucificação de Cristo, e é usado no grego clássico
para arrancar os olhos ou punhalada e, na l x x , para o pedido de Saul para seu escudeiro:
‘Arranca a tua espada e atravessa-me com ela” (1Cr 10.4). Contudo, o verbo usado aqui,
νύσσω, também é usado para descrever as feridas sérias e mortais, como em Homero:

Idomeu, lanceiroilustre, o atravessa (νύξ)


comdardo longo, pelaespádua destra, quando
subia aocarro. Tomba eo tolda a treva odiosa163.

Sugere-se que o corpo foi apenas espetado com a lança para verificar se ainda
estava vivo. Em geral, parece não haver motivo para abandonar o entendimento
comum da narrativa de que o soldado infligiu um golpe profu n do no lado de Jesus
(cp. 20.25,27); não fica bem aparente, como sustenta o Sr. Field, por que se deve
manter uma distinção entre os dois verbos, o do versículo 34 e o do 37164·.

162. Heródoto, vii, 96.


163. Homero, Ilíada, v, 45-47.
164. O Sr. Field (Otium Norvicense) sustenta que νύοοω é a palavra branda e menciona uma curiosa
ilustração de Plutarco (Life o f Cleomenes). Cleômenes e seu grupo escaparam da prisão e se
empenharam para levantar a cidade e conseguir a posse da fortaleza. Eles, ao falharem nesse in­
tento, resolveram se suicidar. Combinam que um deles não se mataria até que tivesse certeza de
que todos os outros estivessem mortos. Quando todos estão esticados no chão, o sobrevivente
anda ao redor deles e acerta cada um com seu punhal (τώ ξιφιδίψ παραπτόμενος). Quando chega
em Cleômenes, ele furaro (νύξας) no tornozelo (trapà τό σφυράν) e o vê contrair o rosto.

237
J oão - Cap. 19
Sangue e água. Argumenta-se de maneira muito plausível que esse foi um
fenômeno natural, o resultado de uma ruptura do coração que, conforme se pre­
sume, foi a causa imediata da morte, seguida de uma efusão de sangue no pe-
ricárdio. Esse sangue, separado em suas partes, a mais densa e a mais líquida,
fluiu quando o pericárdio foi furado pela lança165. Contudo, penso, como Meyer,
que está evidente que João pretende descrever o incidente como algo totalmente
inesperado e maravilhoso, e essa é a explicação que melhor se ajusta à solene
afirmação do versículo 35. Que o fato tinha um sentido simbólico para o evange­
lista fica claro a partir de lJo 5.6.

35. E aquele que o viu testificou (ό έωρακώς μεμαρτύρηκβ'). Na r v , observando


na tradução o tempo perfeito dos dois verbos, aquele que tem visto tem testificado.
Essa passagem só pode se referir ao autor desse Evangelho. Compare com lJo 1.1.

Verdadeiro (αληθινή). G enuíno , de acordo com o verdadeiro ideal do que deve


ser o testemunho. Vide nota sobre 1.9.

E aquele (κακάνος). Alguns argumentam que esse pronome é o motivo para


entender que esse testemunho é de outra pessoa que não João, porque é um pro­
nome de referência remota. Mas a passagem de 9.37 mostra claramente que um
falante pode usar esse pronome para si mesmo. E o pronome, além disso, é em­
pregado nesse Evangelho para indicar uma pessoa, de acordo com Godet, “como
aquele que tem a qualidade, em um grau destacado ou até mesmo exclusivo, que
é o ponto em questão”. Vide 1.18; 5.39.

Verdade (άληθή). Literalmente, coisas verdadeiras. Como distinto de falso. As­


sim, pelo uso das duas palavras para verdade, salientam-se, como diz Westcott,
“as duas condições em que o testemunho deve satisfazer; a primeira de que a
pessoa que o deu seja competente para falar com autoridade; e a segunda de que
o relato de sua experiência seja exato”.

38. Discípulo de Jesus. Mateus chama-o de hom em rico-, Marcos, senador honra­
do, ou seja, membro do Sinédrio; e Lucas, senador, homem de hem e ju sto.

Rogou (ήρώτησε). Melhor, como na n v i , pediu. Vide nota sobre 1 1 . 2 2 ; 16.23.


Marcos acrescenta que ele ousadamentefoi, o que é sugestivo em vista da de­
claração de João de seu discipulado secreto, fato ignorado pelos autores dos
Sinópticos.

165. Vide William Stroud, Physical Theory o f the Death o f Christ

238
J oão - C ap. 19

Lhe permitisse. De acordo com a lei romana. Ulpiano, jurista romano do


século III, diz:

O corpo daqueles que recebempunição capital não pode ser negado a seus parentes.
Contudo, nessedia, ocorpodos quesãoexecutados sãosepultados sóemcasosemque
foi pedidapermissão; eesta, concedida; e, às vezes, nãoédadapermissão, especialmen­
tenos casos daqueles quesãopunidos por alta traição. O corpo do executado deve ser
dado para sepultamento para qualquer umque opedir.

De vez em quando, governadores cobiçosos vendiam esse privilégio. Cícero,


em um de seus discursos contra Verres, apresenta uma passagem extremamente
vivida, descrevendo essas extorsões. Depois de se estender na tortura infligida
ao condenado, ele diz:

Contudo, amorte é o fim. Não deverá ser assim. A crueldade pode ir adiante? Uma
forma deve ser encontrada. Pois os corpos dos decapitados deverão ser jogados
aos animais. Se isso é doloroso para os pais, eles podemcomprar a liberdade para
sepultar1”6.

Compare com Mt 14.12; At 8.2.

39. Foi £../] Nicodemos - se dirigira de noite. É marcado o contraste entre


sua primeira visita e a segunda.

Composto (μίγμα). Somente aqui no texto do Novo Testamento. Algumas


autoridades entendem ελιγμα, um rolo.

Libras. Libras romanas, quase 340 gramas. A grande quantidade pode ser
explicada pela intenção de cobrir todo o corpo com o preparado e pelo fato de
que uma porção estava destina para a cama do corpo no sepulcro. Compare com
o relato do enterro de Asa, 2Cr 16.14. Conforme Meyer: “Reverência extraordi­
nária em seu doloroso enlevo não se satisfaz facilmente”.

40. Lençóis (όθονίοις). Usado só por João, se Lc 24.12 for rejeitado, como o é
por alguns editores. Todos os escritores dos Sinópticos trazem σινδών, lençol
fino. Vide nota sobre Mc 14.51. Mateus e Lucas trazem έντύλιξΐν, envolveu ou
enrolou ( n t l h ), e Marcos, hví ίληθ6θ, envolveu ou enrolou ( n t l h ), em vez do εδησαο,
envolveram ou enrolaram ( n t l h ), de João.

166. Cícero, v, 45.

239
J oão - C ap. 2 0

Com as especiarias. Espalhadas sobre o lençol, ou bandagens, em que o cor­


po foi envolvido.

Como os judeus costumam fazer. Em contrapartida ao costume dos egíp­


cios, por exemplo, descrito desta forma por Heródoto:

Eles primeiropegamumapeçacurva deferroe, comela, extraemos miolos pelas nari­


nas conseguindo, assim, livrar-se de uma parte enquanto o resto do crânio é limpo do
quesobroucomalavagemcomdrogas; aseguir, elesfaziamumcorteaolongodoflanco
comuma pedra etíope afiada e tiravamtodo o conteúdo do abdômen, o qual, a seguir,
limpavam, lavando-o todo comvinho de seiva de folha de palmeira e, comfrequência,
lavavammais uma vez comuma infusão de folhas aromáticas trituradas. Depois disso,
eles enchiamacavidade comamais pura mirra esmagada comcássia oucanela e todo
outro tipo de especiarias, menos olíbano, e costuravama abertura. A seguir, o corpo é
colocado emnatrão (carbonatode sódio) durante setedias, ficando totalmente coberto.
Passadoesseperíododetempo, oqual nãodeve serexcedido, ocorpoélavadoeenrola­
dodacabeçaaospés combandagens defino linho, untadas comgoma167.

Ou, possivelmente, pode-se sugerir um contraste com o costume romano de


queimar o corpo dos mortos. Tácito diz dos judeus: “Eles preferem, antes, enter­
rar o corpo dos mortos que os incinerar, seguindo nisso o costume egípcio; com
os quais eles também concordam em sua atenção ao morto”168.

Na preparação para o sepulcro (έηταφηχζειν). Propriamente, preparar pa ra o se­


pulcro-, ao passo que a kjv traz: para sepultar. Vide nota sobre 12.7. Compare com a
l x x , Gn 50.2, onde a mesma palavra é usada para o embalsamamento do corpo de José.

41. Um horto. Só mencionado por João.

Novo (καιηόη). Vide n o ta sobre Mt 26.29. João omite o detalhe de a tumba ser
talhada na pedra, ao qual se referem todos os escritores dos Sinópticos.

C apítulo 2 0

1-2. Compare com Mt 28.1; Mc 16.2-4; Lc 24.1-3.

1. No primeiro dia da semana (τη μια των σαββάτων). Expressão idiomática


hebraica, d ia um da semana. Vide nota sobre Lc 4.31; At 20.7.

167. Heródoto, ii, 86.


168. Tácito, H istó ria , v, 5.

240
João - C ap. 2 0

Escuro. Mateus diz: quando j á despontava; Marcos: d e m anhã cedo, ao nascer do


sol; Lucas: m u ito de m adrugada; v id e nota sobre Lc 24.1.

Tirada (ήρμει/ον etc). L e v a n ta d a de d en tro de. Todos os escritores dos Si-


nópticos apresentam ro la d a . Na a r c : Mateus, rem ovendo; Marcos, re vo lvid a ; e
Lucas, rem o vid a .

2. Amava (έφίλει). Palavra para afeto pessoal. Em 13.23; 21.7,20, usa-se ήγάπα.
V ide nota sobre 5.20.

Não sabemos. O plural indica que Maria não estava sozinha, embora
só ela seja mencionada como vindo do sepulcro. Ela pode ter precedido as
outras.

S. Foram ao (ηρχοντο εις). Inadequado. O tempo é o imperfeito: eles estavam indo.


Na r v , eles ia m em direção ao.

4. Os dois corriam (ετρεχον). Ainda o tempo imperfeito, eles estavam correndo.


Quanto a k j v perde com sua insistência em ignorar a força desse tempo verbal.
Na n t l h , saíram correndo.

Correu mais apressadamente (προέδραμε τάχιον). Literalmente, correu na


fre n te , m ais rapidam ente. Dante, dirigindo-se ao espírito de João no paraíso, diz-,

Ó Santo Padre, ó Spírito, quevendo


Stás quanto creste, tanto quechegaste
Ao sepulcro, omais moço antecedendo169.

5. Abaixando-se (παρακύψας). V ide nota sobre T g 1.25, e compare com lPe 1.12.
Vide também Ct 2.9 ( l x x ): “Ele olha (παρακύπτων) pelas janelas”.

Viu (βλέπει). Simples visão. Compare com o olh a r atento de Pedro (θεωρεί),
versículo 6, que descobriu o lenço não visto por João.

7. Lenço (σουδάριον). V ide nota sobre Lc 19.20.

Enrolado (έντετυλιγμένον). Tradução melhor do que em brulhado. Na t b , d o ­


brado.A ordem com que tudo está arranjado no sepulcro mostra ausência de
pressa e precipitação no desertar e levantar da morte.

169. Dante, A Divina Comédia, Paraíso, xxiv, 124-126, p. 154.

241
João - Cap. 2 0

8. Creu. Essa palavra é explicada pelo que se segue. Ele creu (finalmente) que Je­
sus ressuscitara; pois até esse momento (ούδεπω, v. 9) ele e seu discípulo-compa-
nheiro (plural, ήδεισαν) não sabiam etc. O singular, creu, conforme Meyer observa
com profundidade, "só satisfaz a experiência^moa/inesquecível desse momento,
embora não exclua também a fé contemporânea de Pedro”. Acerca de sabiam
(ήδεισαν), vid e nota sobre 2.24.

9. A Escritura (την γραφήν). A passa g em da Escritura. Vide nota sobre 5.47. A


referência pode ser a SI 16.10.

Necessário. Acerca dessa necessidade, ligando o conselho divino aos sofrimen­


tos, morte e ressurreição de Jesus, v id e M t 26.54; Mc 8.31; Lc 9.22; 17.25; 22.37;
24.7,26,44; Jo 3.14; 12.34; At 1.16.

11-18. Compare com Mc 16.12-13; Lc 24.13-35.

11. Estava. Tempo imperfeito: continuava a e sta r chorando, depois de os dois


apóstolos terem ido embora.

12. Viu (θεωρεί). Na rv, contemplou. Vide nota sobre o versículo 5.

Anjos. Os anjos são raramente mencionados na narrativa de João. Vide 1.51;


12.29; 20.12.

13. Ela [../] disse. Ela está tão absorta em sua dor e amor que não fica ate­
morizada com a manifestação sobrenatural que, em circunstâncias normais,
poderiam a ter aterrorizado; ao contrário, conversa com eles como se fossem
seres humanos.

14. Voltou-se para trás. O Cônego Westcott, com aquela bela e sutil percepção
que o caracteriza tanto, comenta:

Também conseguimos imaginar que ela toma consciência da outra presença, como,
muitas vezes, sentimos a aproximação de um visitante sem o ver nem o ouvir dis­
tintamente. Também pode ser que os anjos, olhando em direção ao Senhor, tenham
mostrado algum sinal da vinda dele.

Viu (θεωρεί). Tempo presente. Na rv, contemplou. Ela olha com firmeza e intri­
gada para ele como olharia para um estranho. Guardar essas distinções entre os
verbos para ver é muito importante para a percepção das nuanças mais delicadas
da narrativa.
242
João — C ap . 2 0

Não sabia (fjôei). Indicando um conhecimento baseado na comunhão e afini­


dade espirituais, uma convicção interior, consciente e firme da identidade dele.

16. Disse-lhe: Raboni. Insira, como na ara, em hebraico, depois de disse-lhe.

17. Não me detenhas (μή μου απτού). O sentido original do verbo é segurar-se em.
Assim, aqui não está sugerido um mero toque momentâneo, mas um agarrar-se a.
Maria pensou que a antiga relação entre ela e seu Senhor seria renovada; a antiga
relação com vista, som e toque continuaria como antes. Cristo diz: O tempo para esse
tipo de relacionamento acabou. Daqui em diante, sua comunhão comigo será pela fé
por meio do Espírito. Essa comunhão será possível pela minha ascensão para o Pai.

Meu Pai. Os melhores textos omitem o pronome e apresentam o Pai. Na bj, ao


sobre 12.26. Essa expressão, enfatizando a relação de Deus com a
P a i. Vide n o ta
humanidade, em vez de com Cristo mesmo, é explicada pelo que vem um pouco
adiante no versículo - “meu Pai e vosso Pai”.

Meus irmãos. A palavra irm ão aplicada aos discípulos já ocorreu antes


(7.3,5,10), mas não a expressão meus irm ãos acompanhada de meu P a i e vosso P ai.
Compare com Mt 28.10.

Eu subo (άναβαίνω). O tempo presente não é usado no sentido de futuro próximo,


mas indicando que Ele já entrou naquele novo estágio de ser inaugurado formalmen­
te pela ascensão de fato. A ressurreição, na verdade, representa o início da ascensão.

18. Foi e anunciou (’έρχεται άγγέλλουσα). Literalmente, f o i anunciando.

19-23. Compare com Mc 16.14-18; Lc 24.36-49.

19. Ajuntado. Omita.

21. Enviou (άπέσταλκΐν). Observe a distinção entre esse verbo e aquele usado
para o envio dos discípulos (πέμπω). V ide nota sobre 1.6.

22. Assoprou sobre eles (έν€φύσησ€ν). Somente aqui no texto do Novo Testa­
mento. O ato foi simbólico, segundo a maneira dos profetas hebreus. Compare
com Ez 37.5.

O Espírito Santo. Sem o artigo. O dom concedido não era do Espírito Santo
pessoal, mas, antes, um sin a l desse dom, uma efusão do Espírito.

243
João - Cap. 21

23. Perdoardes (άφήτε). Somente aqui nesse Evangelho em conexão com peca­
dos. Aparece com frequência nos Sinópticos (Mt 6.12; 9.5; Mc 2.5; Lc 5.23 etc.).

25. Sinal (τύπον). Vide nota sobre lPe 5.3.

Puser - puser (βάλω). O mesmo verbo nos dois casos. Por isso, é melhor a
apresentação da arc. Na ntlh , tocar-puser.

De maneira nenhuma (ού μή). Negativa dupla: não crerei de maneira nenhuma.

26. Chegou Jesus. Não há partícula de conexão, então, e o verbo está no tempo
presente. A teb descreve de forma mais vivida a entrada abrupta de Jesus: Jesus veio.

27. Não sejas (μή γίνου). Literalmente, não se torne. Tomé estava no caminho
claro para se tornar descrente, por meio de sua dúvida quanto à ressurreição.

Incrédulo —crente (άπιστος - πιστός). Há uma correspondência de palavras


aqui, à qual, talvez, a abordagem mais próxima seja descrente, crente.

29. Tomé. Omita.

31. Foram escritos (γέγραπται). Têm sido, ou permanecem, escritos. O tempo per­
feito. A intenção de João era escrever um evangelho, não uma biografia.

C apítulo 2 1

1. M anifestou-se (εφανέρωσεν). E fácil essa tradução transmitir apenas o sen­


tido de aparecer, mas seu sentido é muito mais profundo. O verbo ocorre com
frequência no texto do Novo Testamento e é muito mais usado para Deus e
Cristo ou para os homens em sua relação com Eles. Portanto, para Cristo em
pessoa enquanto esteve na terra (Mc 16.12,14; Jo 1.31; 2.11; lPe 1.20; lJo 1.2).
Para as obras de Cristo (Jo 2.11; 9.3; lJo 3.5). Para Cristo na redenção (lJo 3.5).
Para Cristo em sua segunda vinda (lJo 2.28). Para Cristo em glória (lJo 3.2; Cl
3.4). É usado para Deus. Para sua revelação de si mesmo aos homens para que
eles o conhecessem (Rm 1.19). Para sua manifestação em Cristo (lT m 3.16).
Para sua justiça (Rm 3.2l). Para seu amor (lJo 4.9). É usado para os homens.
Como epístolas manifestando o caráter e o espírito de Cristo (2Co 3.3; 5.11).
No julgamento (2Co 5.10). Em todos os casos em que o aparecimento não é
apenas um apelo ao sentido, mas é dirigido à percepção espiritual e contempla
um efeito moral e espiritual. E a exposição da lei, da vontade ou do caráter de
244
J oão - C ap. 21

Deus; da pessoa ou obra de Cristo; do caráter ou das obras dos homens, com
vistas à revelação da qualidade deles e de produzir uma impressão moral. Na
n v i , apareceu.

Mar. Vide nota sobre Mt 4.18.

De Tiberíades. Em nenhuma outra passagem dos Evangelhos. Os Sinópticos


dizem: mar da Galileia ou lago de Genesaré.

3. O barco (το πλοΐον). Esta é a tradução da a r c que restaura o artigo, o que


indica um implemento familiar. Vide nota sobre Lc 5.2.

Logo. Omita.

Naquela noite. O pronome enfático aquela (εκείνη) pode indicar que o insu­
cesso deles era incomum.

Apanharam (επίασαν). Como no versículo 10.0 verbo tem o sentido de apode-


rar-se de e em nenhuma passagem do Novo Testamento ele é usado para apanhar
peixe. Em outras passagens desse Evangelho, sempre nos ataques a Cristo feitos
pelas autoridades (7.30,32,44; 8.20; 10.39; 11.57). Para a detenção de Pedro e
Paulo (At 12.4; 2Co 11.32). Para o prender da besta (Ap 19.20). Para o tomar
pela mão (At 3.7).

4. Sendo (γινόμενης). Ou está vindo, particípio presente; conforme a leitura dos


melhores textos. A k j v segue a leitura γενομενης, era chegada. Na r v , quando o dia
já estava rompendo-, na n v i , ao amanhecer. A k j v não concorda muito bem com o
fato de que Jesus não foi reconhecido imediatamente pelos discípulos devido, em
parte, talvez, à luz incompleta.

Na praia (εί,ς τον αίγιαλόν). Vide nota sobre Mt 13.2. A preposição εις, para,
torna a frase equivalente a: “Jesus foi para a praia e permaneceu lá”.

5. Filhos (ποαδια). Ou jühinhos. Também usada duas vezes por João na saudação
da primeira epístola (2.13,18), onde, contudo, a palavra mais comum é τεκνία,
filhinhos.

Tendes alguma coisa de comer (μή τι προσφάγιον ’έχετε)? Ο interrogativo


μή τι indica que é esperada uma resposta negativa: vocês não têm, suponho, nada. O
termo προσφάγιον equivale a όψάριον, o que é acrescentado ao pão em uma refeição,
245
JoAo - C ap. 21

sobretudo peixe. Vide nota sobre 6.9. Ocorre somente aqui no texto do Novo
Testamento. Na t e b , um pouco de peixe'10.

6. A rede (δίκτυον). Vide nota sobre M t 4.18; 13.47.

Não Q...]] podiam (ουκ ΐσχυσαν). Vide nota sobre Lc 14.30; 16.3; Tg 5.16.

Tirar (ελκΰσαι). Puxar para o barco. Compare com σύροντες, versículo 8, ar­
rastando a rede atrás do barco.

7. Túnica (επενδυτήν). Uma veste, ou blusa, para a parte superior. Somente aqui
no texto do Novo Testamento. Na l x x , em lSm 18.4, a capa que Jônatas deu a
Davi. Em 2Sm 13.18, a roupa real de virgem de Tamar. Há duas ocorrências do
verbo relacionado, επενδύομαι (2Co 5.2,4), com o sentido de “ser revestidos” com
nossa habitação, que é do céu, ou seja, ser vestidos com traje para a parte supe­
rior. Vide nota sobre essa passagem.

Nu. Não completamente, mas vestido apenas com a roupa de baixo ou calção.

8 . O barco (τφ πλοιαρίφ). O substantivo é diminutivo. Na a r a , o barquinho. E

improvável que isso se refira a um barco menor acompanhando o barco. Compare


com a alternação de πλοΐον e πλοιάριον, em 6.17,19,21-22,24.

Duzentos côvados. Pouco mais de 91 metros.

Cheia d e p eix es (των ιχθύων). Ou, como na wycuffe , a rede dos peixes. Ao
contrário, a b j traz: a rede com ospeixes.

9. Saltaram em terra (άπεβησαν εις την γην). Refere-se não à chegada do barco,
mas à ida dos barqueiros para a praia. Por isso, a rv, corretamente, traduz: eles
saíram para a praia.

Brasas. Carvão. Vide 18.18.

Peixe (όψάριον). Vide nota sobre 6.9.

Pão (άρτον). Ou filão de pão. Vide nota sobre Mt 4.1; 7.9.

170. A pergunta usual que um observador faz a alguém ocupado em pescar ou catar ave é: εχεις τι,
tens algum a coisa. Equivale a: você se d ivertiu ? Vide Aristófanes, A s N u vens, 731.

246
J oão - C ap. 21

10. Dos peixes (των όψαρίων). Como no versículo 9. Enfatiza o peixe como
alimento.

Apanhastes (εττιάσατε). Vide nota sobre o versículo 3. Bengel diz: “Por meio
do dom de Cristo, eles os tinham pegado, contudo Ele diz cordialmente que eles
os tinham pegado”.

11. Subiu. No barco.

Para terra (επί τής γης). Em sentido estrito, sobre a terra.

Grandes peixes. Todas as autoridades concordam quanto à abundância de


peixe existente no mar da Galileia. M. Lortet, citado pelo Dr. Thomson, diz que
duas jogadas de rede, em geral, enchiam seu barco. Betsaida (havia dois lugares
com esse nome nas margens daquele mar) quer dizer casa das pescarias. A fama do
mar nesse particular estende-se a tempos muito remotos; de modo que, de acordo
com a lenda rabínica, uma das dez leis fundamentais estabelecidas por Josué na
divisão do país foi que ninguém podia pescar com anzol no mar da Galileia para
que não interferissem com a livre passagem de barcos. O Talmude menciona
determinados tipos de peixe que podem ser comidos sem cozinhar e os designa
como peixinhos. Conforme όψάρια é traduzido em 6.9. É possível que a expressão
grandes peixes indique um contraste com os peixinhos que pululavam no mar, e
cuja salga e conservação era uma indústria especial entre esses pescadores.

12. Jantai (άριστήσατε). Antes, cafi da manhã. No grego ático, αριστόν refere-se
à refeição do meio-dia; a refeição da noite é conhecida como δείπνον. A hora normal
para a αρ ιστόν não pode ser fixada com precisão. A tendência de peso entre os
escritores gregos parece ser em favor do meio-dia. Contudo, a refeição descrita
aqui evidentemente aconteceu em uma hora bem mais matutina e podería pare­
cer corresponder mais de perto ao άκρατίσμα, ou café da manhã dos gregos, o qual
era tomado logo após se levantar. Todavia, Plutarco afirma expressamente que
ambos os nomes eram aplicados para a refeição matinal e diz de Alexandre: “Ele
estava acostumado a tomar o cafi da manhã (ήρίστα) logo ao alvorecer, sentado,
e a jantar (εδείπνει) tarde da noite”. Em Mt 22.4, os convidados do rei para o
casamento são convidados para um αρ ιστόν.

Perguntar (έξετάσαι). Na rv, inquirir. Sugerindo inquirição cuidadosa e preci­


sa. Há apenas três ocorrências no texto do Novo Testamento: a ordem de Hero-
des para que perguntassem diligentemente pelo menino Cristo (Mt 2.8), e a ordem
que os discípulos receberam para procurar os membros dignos da comunidade
(Mt 10.11).
247
J oão —C ap. 2 1

IS. Pão —peixe. Os dois têm artigo - o pão, o peixe —aparentemente, apontando
para a provisão que Jesus mesmo fizera.

Deu-lho. Nada é dito de sua partilha de si mesmo. Compare com Lc 24.42-43.

14. A terceira vez. As duas primeiras ocasiões foram registradas em 20.19,26. A


aparição para Maria Madalena não é contada, porque o evangelista diz expres­
samente aos seus discípulos.

15. Simão, filho de Jonas. Compare com a primeira fala de Cristo a Pedro, 1.43.
Ele nunca o tratou pelo nome de Pedro, embora esse nome seja usado normal­
mente, sozinho ou com Simão, nas narrativas dos Evangelhos e na forma grega
Pedro, e não na aramaica Cefas, que, por sua vez, é sempre empregada por Paulo.
Quanto ao termo Jonas, leia, como na nvi, João.

Amas (αγαπάς). Jesus usa a palavra mais dignificante, realmente a mais nobre,
mas ela parece a Pedro, no ardor de seu afeto, a mais fria palavra para amor. Vide
nota sobre 5.20.

Mais do que estes. Mais que esses discípulos me amam. Compare com 13.37;
Mt 26.33. A pergunta transmite uma repreensão gentil por suas extravagantes
confissões anteriores.

Amo (φιλώ). Pedro substitui a palavra mais calorosa, mais afetiva, e omite
toda comparação com seus irmãos discípulos.

Apascenta (βόσκε). Vide nota sobre lPe 5.2.

Cordeiros (άριήα). Diminutivo, cordeirinhos. Godet comenta:

Há uma notável semelhança entre a situação atual e a das duas cenas anteriores na
vida de Pedro com as quais a situação atual se relaciona. Ele foi chamado por Jesus
para o ministério depois de uma pesca milagrosa de peixes; é depois de uma pesca
semelhante que o ministério é restaurado a ele. Ele perdera seu cargo por meio da
negação ao lado das brasas; é ao lado de brasas que ele a recupera.

16. Amas (αγαπάς). Novamente a palavra mais fria, mas a expressão mais do que
estes é omitida.

Amo (φιλώ). Pedro reitera sua palavra anterior para expressar seu afeto
pessoal.
248
JoAo - C ap. 21
Apascenta (ποιμαίνω). Uma palavra diferente: cuide, como na rv. Na n v i , pas­
toreie. Vide nota sobre lPe5.2.

Ovelhas (πρόβατα). Alguns dos melhores textos trazem προβάτια, diminutivo,


ovelhinhas.

17. Amas (φιλεΐς). Aqui Jesus adota a palavra de Pedro. Contudo, o Cônego
Westcott atribui o uso de φιλέω por Pedro a sua humildade e sua hesitação em
afirmar esse amor mais elevado que está implícito em άγαπφς. Essa me parece ser
a interpretação menos natural, por procurar refinar demais a situação.

18. Moço (νεώτερος). Literalmente, maisjovem. Aparentemente, Pedro estava na


meia-idade. Vide Mt 8.14.

Te cingias a ti mesmo (έζώννυες σεαυτόν). A palavra pode ter sido sugerida


por Pedro cingir sua túnica de pescador ao redor do corpo. O tempo imperfeito
representa algo habitual. Costumava vestir-se e ir e vir para onde queria.

Andavas (περιεπάτεις). Literalmente, andavas em volta de. Peculiarmente apro­


priado para descrever a livre atividade de vigorosa virilidade.

Estenderás as mãos. A alusão às mãos estendidas na cruz, a qual alguns


intérpretes encontram aqui, é fantasiosa. E apenas uma expressão para o desam­
paro da idade.

Para onde tu não queiras. De acordo com a tradição, Pedro sofreu martírio
em Roma e foi crucificado com a cabeça virada para baixo.

19. Com que morte (ποίω). Propriamente, por qual tipo de morte. Como na r v .

20. Recostara (άηέπεσει>). Na r v , se inclinara para trás. Vide nota sobre 13.25. A
referência é ao ato especial de João de se reclinar para sussurrar para Jesus, e não
a sua posição na mesa.

21. E deste que será (ουτος δε τί;)? Literalmente, e o que deste?

22. Até que eu venha (εως έρχομαι) Preferivelmente, enquanto eu estou vindo.
Compare com 9.4; 12.35-36; lTm 4.13.

Que te importa a ti (τί πρός σε;)? Literalmente, o que te diz respeito?


249
J oão —C ap. 21

23. Não havia de m orrer (ούκ αποθνήσκει). Literalmente, não morre.

24-25. Muitos intérpretes acham que esses dois versículos foram escritos por
alguma outra mão que não a de João. Alguns atribuem os versículos 24 e 25 a
dois escritores distintos. E provável que todo o capítulo, embora carregando
marcas inconfundíveis da autoria de João em seu estilo e linguagem, tenha sido
composto subsequentemente à conclusão do Evangelho.

250
1 João

Capítulo l

O termo καθολική, católico ou geral, aplicado às epístolas de Tiago, Pedro, João


e Judas, foi usado do século II em diante no sentido de algo que se dirigia ao
fiel em geral, como distinto de cristãos de países ou cidades específicas, como os
gálatas ou efésios. Dessa maneira, Clemente de Alexandria fala da epístola de
Atos 15 como “a epístola católica de todos os apóstolos dada para o fiel”. O vo­
cábulo também foi usado para epístolas especialmente dirigidas, mas com uma
aplicação geral, que não reivindicavam autoridade canônica.
Na igreja ocidental posterior, o grupo de epístolas conhecido como católico foi
chamado de canônico por um erro de interpretação das palavras de Junilius1, que
se referia às epístolas de Tiago, 2 Pedro, Judas, 2 e 3 João como acrescentadas
por muitos à coleção de livros canônicos. Entendeu-se que isso queria dizer que o
termo canônico se aplicava a esses livros de forma peculiar.

1. Compare com Jo 1.1,9,14. A construção dos três primeiros versículos é um


tanto intrincada. Ela é simplificada ao dividi-la em três partes, representadas
respectivamente pelos versículos 1, 2 e 3. A primeira parte, o que era desde oprin­
cípio - Palavra da vida, forma uma oração suspensa, sendo o verbo omitido por
um tempo, e o curso da sentença, interrompido pelo versículo 2, que forma um
parêntesis: e a vida - manifestada para nós. O versículo 3, a fim de retomar a sen­
tença interrompida do versículo 1, repete de forma condensada duas das orações
daquele versículo, o que vimos e ouvimos, e fornece o verbo que a rege, anunciamos.

1. Cerca de 5 5 0 d.C., em geral, acredita-se que foi um bispo. O autor de uma obra intitulada De
Partibus Divinae Legis, um tipo de introdução aos escritos sagrados.
1 João — C ap . l

Assim, a sentença simples, despojada do parêntesis e com os termos recuperados,


seria: Declaramos a vós que o que era desde o princípio, o que temos visto com os nossos
olhos, o que contemplamos, e as nossas mãos tocaram com respeito à Palavra da vida.

O que (o). Debate-se se João usa isso em um sentido pessoal como equivalente
a Aquele que, ou em seu significado estritamente neutro, como querendo dizer algo
relativo à pessoa e revelação de Cristo. Em geral, o termo TtepC, com respeito a (na
a r c , da; na t e b , em nota, a respeito de), parece ir contra o sentido pessoal. As su­

cessivas orações, o que era desde oprincípio etc., não expressam o Verbo Eterno em si
mesmo, mas algo relacionado com Ele ou um predicado que diz respeito a (írepí) Ele. O
indefinido o que, aparentemente, é definido por essas orações, o que apela à vista,
ao ouvido, ao toque2. No sentido estrito, é verdade, o vocábulo nepí é apropriado
só com ouvimos, mas é usado com outras orações em um sentido amplo e flexível
(cp. Jo 16.8). Westcott afirma: “O assunto não é apenas uma mensagem, mas tudo
que se tornou claro por meio da múltipla experiência que diz respeito a ela”.

Era (ήν). Não έγένετο, veio a ser. Vide nota sobre Jo 1.3; 7.34; 8.58. Era já exis­
tente quando a sucessão da vida começou.

Desde o princípio (απ’ άρχής). Há duas ocorrências da expressão no Evange­


lho (8.44; 15.27); nove na primeira epístola; e duas na segunda epístola. É usada
de forma absoluta (3.8; 2.13-14) e relativa (Jo 15.27; 1Jo 2.24). Aqui, é contrastado
com "no princípio” (Jo l.l). A diferença é que pelas palavras “no princípio”, o
escritor coloca-se no ponto inicial da criação e, olhando em retrospectiva para a
eternidade, descreve o que já existia quando a criação começou. “No princípio, era
o Verbo”. Nas palavras “desde o princípio”, o escritor olha para o ponto inicial do
tempo e descreve o que tem existido desse ponto em diante. Assim, “no princípio”
caracteriza a Palavra divina absoluta, quando Ele era antes da fundação do mun­
do e na fundação do mundo. “Desde o princípio” caracteriza seu desenvolvimento
no tempo. Observe a ausência do artigo aqui e em Jo 1.1. Não o princípio com um
fato definido e concreto, mas como apreendido pelo homem; aquilo para o que
olhamos como “princípio”.

[(Temos ouvido)] - vimos (άκηκόαμ€ν - Ιωράκαμβ'). A a r c não traz o primei­


ro verbo. Os dois estão no tempo perfeito —temos ouvido; temos visto —, denotando
os efeitos ainda permanentes do ato de ouvir e ver. Como na a r a .

Com os nossos olhos. Enfatiza a experiência direta e pessoal de maneira


maravilhosa.

2. Essa 4a percepção de Alford e Westcott. Ebrard e Huther sustentam o sentido pessoal.

252
1 João - C ap . 1

Temos contemplado (έθεασάμ6θα). Na n v i , corretamente, contemplamos. O


tempo é o aoristo; marcando não o efeito permanente da visão sobre o obser­
vador, mas a manifestação histórica para testemunhas especiais. Acerca da di­
ferença entre esse verbo e έωράκαμεν, temos visto ( a r c , vimos), vide nota sobre
Jo 1.14,18.

Tocaram (έψηλάφησαν). O tempo aoristo. Na n v i , apalparam. Para a força pe­


culiar do verbo, vide nota sobre Lc 24.39. Provavelmente, a referência é a tocai-me
(Lc 24.39) e a Jo 20.27. Isso é mais perceptível a partir do fato de que João não
menciona o acontecimento da ressurreição nas epístolas e não usa o vocábulo em
sua própria narrativa da ressurreição. A frase, portanto, ajusta-se às numerosas
instâncias em que João presume o conhecimento de determinados fatos históri­
cos por parte de seus leitores.

Da Palavra (περί τού λσγού). Melhor, como apresenta a n v i , a respeito da Palavra.

Da vida (τής ζωής). Literalmente, a vida. Vide nota sobre Jo 1.4. A expressão
ό λόγος τής ζωής, a Palavra da vida, não ocorre em nenhuma outra passagem do
Novo Testamento. O mais próximo dela ocorre em Fp 2.16; mas nessa perícope
nenhuma das palavras tem o artigo. Na expressão palavras da vida eterna (Jo 6.68)
e em At 5.20, todas as palavras desta vida, usa-se o termo ρήματα. A questão é se
λόγος é usado aqui para a Palavra pessoal, como em Jo 1.1, ou para a mensagem
ou revelação divina. Nas quatro passagens do Evangelho onde λόγος é usado no
sentido pessoal (Jo 1.1,14), o vocábulo é usado de forma absoluta, o Verbo (cp. Ap
19.13). Por sua vez, ele é usado muitas vezes de forma relativa no texto do Novo
Testamento, como: palavra do Reino (Mt 13.19); palavra desta salvação (At 13.26);
palavra da sua graça (At 20.32); palavra da verdade (Tg 1.18). João usa ζωής, da
vida, com frequência, para caracterizar a palavra que acompanha esse termo.
Assim, coroa da vida (Ap 2.10); água da vida (Ap 21.6); livro da vida (Ap 3.5); pão
da vida (Jo 6.35); ou seja, a água que é viva e transmite vida; o livro que contém
a revelação da vida; o pão que transmite vida. No mesmo significado, Jo 6.68;
At 5.20. Compare com T t 1.2-3.
Embora a expressão a Palavra da vida não ocorra em outras passagens com
um sentido pessoal, inclino-me a considerar sua referência primária como pes­
soal, como o fazem Alford, Huther e Ebrard, a partir da conexão óbvia do pen­
samento com Jo 1.1,4. “No princípio, era o Verbo - nele, estava a vida”. Ebrard
afirma:

Como João não se propõe a dizer que anuncia Cristo como uma simples idéia,abstrata,
mas que declara suas próprias experiências históricas concretas a respeito de Cristo

253
1 J oão - C a p . 1

—também, agora, ele continua, não o Logos (Palavra), mas a respeito da Palavra, anun­
ciamos para vocês.

Ao mesmo tempo, concordo com o Cônego Westcott que é mais provável que
as duas interpretações não estejam separadas de forma contundente. “A revela­
ção proclama o que ela inclui; ela dá, anuncia a vida. Em Cristo, a vida como o
sujeito, e vida como o caráter da revelação, estão absolutamente unidas.”

2. Esse versículo é parentético. Para interpretações similares da construção,


compare com o versículo 3; Jo 1.14; 3.16,31; 19.35.

E (καί). Vide nota sobre Jo 1.10; 8.20.

A vida (ή ζωή). O Verbo mesmo que é a Vida3. Compare com Jo 14.6; 5.26;
iJo 5.11-12. V ida expressa a natureza do Verbo (Jo 1.4). A expressão a vid a , além
de equivaler à expressão a P alavra, também indica, como a verdade e a lu z, um
aspecto do ser do Senhor.

Foi manifestada (έφανερώθη). V ide nota sobre Jo 21.1. Em correspondência


com o Verbo s e f e z carne (Jo 1.14). Todavia, as duas expressões apresentam aspec­
tos distintos da mesma verdade. O verbo se f e z carne contempla simplesmente o
fato histórico da encarnação. A v id a f o i m anifestada expõe o desvelar desse fato
em várias operações da vida. A primeira denota o processo objetivo da encar­
nação como tal, a outra denota o resultado desse processo como relacionado à
capacidade humana de receber e entender isso. Westcott registra:

A realidade da encarnação não seria declarada se fosse dito: “A Palavra foi manifes­
tada”; a diversidade das operações da vida ficaria circunscrita se fosse dito: “A vida se
tornou carne”. A manifestação da vida foi uma consequência da encarnação da Pala­
vra, mas não é coextensivo com ela.

Vimos - testificamos - anunciamos. Três idéias na mensagem apostólica:


experiência, testemunho, anúncio.

Testificamos. Vide nota sobre Jo 1.7.

Anunciamos (απαγγέλλομεv). Melhor como apresentado na n v i , proclam am os.


Videnota sobre Jo 16.25. Como aqui. A mensagem vem de (άπό) Deus.

3. Quanto ao uso do termo vida por João, o estudante deveria consultar a “Nota Adicional” do
Cônego Westcott sobre lJo 5.20 (Commentary on the E p istles o f John, p. 204).

254
1 J oão — C ap . 1

A vida etem a (την» ζωήν την αιώνιον). Tradução particularmente inadequa­


da, uma vez que ela não expressa de forma alguma o desenvolvim ento da ideia da
vida, que é claramente contemplado pelo original. Traduza, como na r v : a vid a , a
vid a eterna-, ou: a vida, mesmo a vida etem a. Para uma repetição similar do artigo,
compare com 1Jo 2.8; 4.9; 2Jo 11. Essa expressão em particular ocorre aqui e em
2.25. João usa ζωή αιώνιος, v id a eterna, e ή αΙώνιος ζωή, a v id a eterna; a primeira
para expressar a concepção genérica de vida eterna, e a segunda para se referir
à vida eterna como o dom especial de Cristo. Αιώνιος, etem a , descreve a vida em
sua qualidade de não ser m edida pelo tempo, uma ideia mais abrangente que a mera
duração.

Que (ήτις). Não o relativo simples ή, que, mas definindo a q u alidade da vida e
tendo, ao mesmo tempo, um tipo de força confirmatória e explicativa da palavra
eterna: considerando que era uma vida divina em sua natureza —“com o Pai” —e,
dessa maneira, independente das condições temporais.

Com o Pai (προς τον πατέρα). Vide nota sobre com D eus, Jo 1.1. Na vida, a
ativa relação e comunhão com o Pai. Coleridge afirma: “A preposição de moção
com o verbo de repouso envolve a eternidade do relacionamento com atividade e
vida”. A vida eternamente cuidada para o Pai, apesar de ela emanar dele. Ela saiu
dele e foi manifestada para os homens, mas com a finalidade de que possa levar
os homens para si e os unir ao Pai. A manifestação da vida para os homens foi
uma revelação de vida, como, primeiro e acima de tudo, centrada em Deus. Por
esta razão, embora a vida abstratamente retorne para Deus, da mesma maneira
que procede dele, ela retorna trazendo o mundo redimido em seu âmago. O ideal
completo de vida divina inclui transmissão, mas com vistas ao desenvolvimento
prático de tudo que a recebe com referência a Deus como seu cerne vivificador,
propulsor, regulador e inspirador.

O Pai. V ide nota sobre Jo 12.26. O título “o Pai” ocorre raramente nos Sinóp-
ticos e sempre com referência ao Filho. Em Paulo, só há três ocorrências (Rm
6.4; lCo 8.6; Ef 2.18). Em nenhuma passagem de Pedro, Tiago, Judas nem de
Apocalipse. É frequente no Evangelho e nas epístolas de João, e nesses últimos
textos uniformemente4.

3 .0 curso regular da sentença, interrompida pelo versículo 2, agora, é retomado


pela repetição de o que vim os e ouvim os (v. 1), e os dois elementos de experiência,

4. Que, de qualquer modo, o estudante consulte a “Nota Adicional” do Cônego Westcott, de seu
Commentary on the Epistles o f John, p. 27.

255
1 J oão - C a p . 1

ver e ouvir, são lançados juntos sem o relativo repetido o que. No versículo 1, o
ponto alto promovido a partir da evidência menor de ouvir para a de ver. Aqui,
na recapitulação, o processo é revertido e a classe mais alta de evidência é posta
em primeiro lugar.

Para que também tenhais (και ύμίν). O tam bém é explicado de diversas ma­
neiras. De acordo com alguns, refere-se a um círculo especial de leitores cristãos
além daqueles a quem a conclusão do Evangelho se dirige. Outros, mais uma
vez, acham que se refere aos que não tinham visto e ouvido em contraposição às
testemunhas oculares. Daí Agostinho dizer, de Jo 20.26ss.:

Ele (Tomé) tocou o homem e confessou o Deus. E o Senhor, consolando-nos do fato


de que, agora, que está assentado no céu não pode ser tocado com as mãos, mas tocado
pela fé, diz: “Porque me viste £—3 creste; bem-aventurados os que não viram e cre­
ram”. Somos nós que somos descritos; é para nós que a passagem aponta. Portanto, que
venha acontecer em nós que a bem-aventurança que o Senhor predisse que acontece­
ria: a vida mesma foi manifestada na carne para que a coisa que pode ser vista só com
o coração possa também ser vista com os olhos, que isso possa curar nosso coração.

Comunhão (κοινωνίαν). Esse vocábulo introduz-nos a um dos principais pen­


samentos da epístola. A verdadeira vida no homem, que vem por meio da acei­
tação de Jesus como o Filho de Deus, consiste em comunhão com Deus e com o
homem. Acerca do termo, vide nota sobre At 2.42; Lc 5.10. O verbo κοινωνέω,
entrar em comunhão, ser fe ito parceiro, ser parceiro de, ocorre em lPe 4.13; 2Jo 11;
Hb 2.14 etc. A expressão aqui, εχειν κοινωνίαν, é mais forte, uma vez que ela
expressa a alegria ou realização da comunhão como comparada com o mero f a to
da comunhão. Vide nota sobre Jo 16.22.

Nossa comunhão (ή κοινωνία ή ήμετέρα). Ο significado mais estrito é a co­


munhão que é nossa, de acordo com a prática característica de João de definir e
enfatizar um substantivo por meio de um artigo e um pronome possessivo. Vide
nota sobre Jo 10.27. N ossa (pronome possessivo, em vez de pronome pessoal)
indicando comunhão como uma m arca d istin tiv a dos cristãos, em vez de como
apenas algo desfrutado por eles.

Com o Pai e com seu Filho (μετά του πατρος καί μετά του υιού αυτού). Obser­
ve a preposição repetida μετά, com, distingue as duas pessoas e coordena a comu­
nhão com o Pai e o Filho indicando, assim, uniformidade de essência. A comunhão
com os dois contempla a união da divindade. Platão diz de alguém que vive em
desejo e roubo desenfreados: “Esse não é amigo de Deus nem do homem, pois ele é
256
1 J oão - C a p . l

incapaz de com ungar (κοινωνΛν αδύνατος), e aquele que é incapaz de ter comunhão
(κοινωνία) também é incapaz de ter amizade”5. Ele define a divinação ou adivinha­
ção como “a arte da comunhão (κοινωνία) entre deuses e homens”6.

4. Estas coisas. A epístola toda.

Vos escrevemos (γράφομ^ν ύμΐν). Os melhores textos trazem ήμβΐς, nós, em


lugar de ύμΐν, p a ra vós. Verbo e pronome são enfáticos. O escritor fala com auto­
ridade consciente, e sua mensagem é para ser não só anunciada (άπαγγύλλομ^ν,
v. 3), mas também escrita. N ó s escrevemos é enfatizado pela ausência do objeto
pessoal, p a r a vós.

Vosso gozo (ή χαρά ύμών). Os melhores textos trazem ημών, nosso, embora
ambas as leituras proporcionem um bom sentido.

Cumpra (ιτοπληρωμένη). Essa é a forma mais adequada. Frequente em João.


Vide i o 8.29; 1.8; 12.38. 15.11; 2J0 12; Ap 6.11. Düsterdieck, citado por Alford:

A paz da reconciliação, a abençoada consciência da filiação, o alegre crescimento em


santidade, a brilhante perspectiva da integridade e glória futuras - todas essas coisas
são apenas simples detalhes do que, em toda sua extensão e largura, é abraçado por
uma única expressão·, v id a etern a, a verdadeira posse do que é a imediata fonte da nossa
alegria. Temos alegria, alegria de Cristo, porque somos abençoados, porque temos a
vida mesmo em Cristo.

E Agostinho: “Há uma alegria que não é concedida aos ímpios, mas àqueles
que te servem por puro amor: essa alegria és tu mesmo. E esta é a felicidade:
alegrar-nos em ti, de ti e por ti. É esta a felicidade, e não outra”7. Alford está cer­
to ao comentar que esse versículo fornece um caráter epistolar ao que se segue,
mas, dificilmente, pode-se dizer como ele o fez que isto “ocupa o lugar de χαίρειν,
bendizer, literalmente regozijar, tão comum nas aberturas das epístolas”8.

5. E esta é (κα'ι αϋτη έστ'ιν). Tradução correta e literal. De acordo com a leitura
apropriada, o verbo aparece primeiro na ordem (έστ'ιν αύτη), com ênfase, não só
como um verbo de ligação, mas também no sentido: “existe isso como a mensa­
gem”. Para um uso correlato do verbo substantivado, vid e 5 . 16-17; 2.15; Jo 8.50.

5. Platão, G órgias, 507.


6. Id., Symposium, 188.
7. Agostinho, Confissões, x, 22, p. 273-274.
8. Todavia, não nas epístolas do Novo Testamento. Xaípeiv, bendizer, não ocorre em nenhum ende-
reçamento de epístola apostólica, exceto na de Tiago. Vide nota sobre T g 1.1.

257
1 João - C ap. 1

Mensagem (έπαγγελία). Contudo, esse termo é invariavelmente usado no


texto do Novo Testamento na acepção de prom essa. Os melhores textos trazem
αγγελία, mensagem, que ocorre somente em 3.11; e o verbo correlato, αγγέλλω,
só em Jo 20.18.

Dele ouvimos (άκηκόαμεν άπ’ αυτού). Forma de expressão não encontrada


em outras passagens de João, que normalmente usa παρ’ αύτοϋ. Vide nota sobre
Jo 6.46. A frase aqui aponta para a derradeira, e não necessariamente a im ediata,
fonte da mensagem. Não só João, mas também outros em tempos anteriores ou­
viram essa mensagem. Compare com lPe 1.10-11. Άπό aponta para a fo n te,n a . pá,
para o doador. Daí Jo 5.41 declarar: “Eu não recebo glória dos (παρά) homens”.
Não há concessores de honra sobre mim. O versículo 44 afirma: “Como podeis
vós crer, recebendo honra uns dos (παρά) outros”, a honra que os homens têm
para dar, “e não buscando a honra que vem só de (παρά) Deus”, a honra que só
Deus concede. Por sua vez, lJo 3.22 declara: “E qualquer coisa que lhe pedirmos,
dele (άπό) a receberemos”, a fonte suprema de nossos dons. Também Mt 17.25:
“De quem cobram os reis da terra os tributos ou os impostos? D o s (άπό) seus
filhos ou dos (άπό) alheios?” Qual é a legítima e derradeira fonte de receita nos
estados?

Anunciamos (άναγγέλλομΕν). Compare com o verbo simples άγγέλλβ,ν


(αγγέλλω), tra z e r notícia, em Jo 20.18 e somente nesta referência. O verbo
άυαγγέλλειν (αναγγέλλω) significa trazer a notícia até (άνά) ou de v o lta àquele
que as recebe. Άπαγγέλλειν (άπαγγέλλω) significa anunciar notícias como vindas
de (άπό) alguém; vid e Mt 2.8; Jo 4.51. Καταγγέλλβ,ν (καταγγέλλω) é proclamar
com autoridade, bem como propagar a notícia entre (κατά) os que ouvem. Vide
At 17.23. Encontrado só em Atos e em Paulo.

Deus é luz (0eòç φως έστίν). Declaração da natureza absoluta de Deus.


Não um a luz nem a luz, com referência a seres criados, como a lu z dos homens,
a lu z do m undo, mas simples e absolutamente D eu s é lu z, em sua própria na­
tureza. Compare com D eus é espírito, e v id e nota sobre Jo 4.24; D eus é am or,
em lJo 4.8,16. A expressão não é uma metáfora. Ebrard afirma: “Tudo que
estamos acostumados a chamar lu z no domínio da criatura, quer com sentido
físico quer com metafísico, é só um eflúvio dessa uma e única L u z primitiva que
aparece na natureza de Deus”. Luz é imaterial, difusa, pura e gloriosa. Ela é a
condição da vida. Do ponto de vista físico, ela representa g ló ria ; da perspectiva
intelectual, verdade, do ponto de vista moral, san tid a d e. A luz, como imaterial,
corresponde a Deus como E sp írito ; como difusa, corresponde a Deus como
am or, como a condição de vida, a Deus como vida; como pura e iluminada, a

258
1 J oão - C ap. 1

Deus como sa n tid a d e e verdade. No Antigo Testamento, a luz, com frequência,


é o meio da revelação visível de Deus para os homens. Foi a primeira manifes­
tação de Deus na criação. A tocha ardente passou entre os pedaços das vítimas
partidas na aliança de Deus com Abraão. Deus foi à frente de Israel em uma
coluna de fogo, desceu em fogo no Sinai e apareceu na nuvem luminosa que re­
pousou sobre o propiciatório no lugar mais santo. No grego clássico, φως, luz,
é usado metaforicamente para deleite, libertação, vitó ria , e é aplicado a pessoas
como um termo de sentimento de admiração, da mesma forma como dizemos
que alguém é a lu z d a nossa v id a ou o deleite dos nossos olhos. Também Ulisses,
ao ver seu filho Telêmaco, diz: “Vieste, Telêmaco, doce brilho (γλυκ^ρόρ φάος)”9.
E Electra, saudando o retorno de seu irmão Orestes: “B e n d ito d ia (φίλτατον
φως)/”10. De vez em quando, é usada, como o faz Eurípedes, para a lu z d a ver­
d a d e" . Nenhum escritor moderno desenvolveu a ideia de Deus como luz com
tanto poder e beleza como Dante. Seu “Paraíso” pode verdadeiramente ser
chamado de estudo da luz. A luz é a única expressão visível de Deus. A luz,
irradiando dele, é difundida através do universo como o princípio da vida. Essa
tônica é apresentada na abertura do “Paraíso”.

A Glória de quem tudo, aos seus acenos,


Move, o mundo penetra e resplandece,
Em umas partes mais em outras menos.
No céu onde sua luz mais aparece,
Portentos vi que referir, tornando,
Não sabe ou pode quem à terra desce12.

No final, a visão beatífica, Deus mesmo é imaginado como um ponto luminoso


que derrama seus raios através de todas as esferas, acima das quais os espíritos
observavam e nas quais eles liam o passado, o presente e o futuro.

Tu ó Graça abundante, me animando,


Olhos fitar ousei na luz eterna,
A visão almejada consumando.
E lá na profundeza vi que se interna
Unido pelo amor num só volume
O que pelo universo se esquaderna:

9. Homero, O d issé ia , xvi, 23.


10. Sófocles, E le c tra , tradução Mário da Gama Cury, São Paulo, Civilização Brasileira, 1965, vs.
1999, p. 53.
11. Eurípedes, Ifig ê n ia em T á u ris, 1046.
12. Dante, A D i v i n a C o m éd ia , Paraíso, i, 1-6, p. 7.

259
1 J oão - C ap . 1

Acidente, substância e o seu costume,


Conjuntos entre si por tal maneira,
Que da verdade exprimo um frouxo lume'3.

E essa Luz tal efeito produzia,


Que em deixá-la pro ver dif ’rente aspeto £sic.]]
Consentir impossível me seria
Que o bem da sua aspiração objeto,
Todo está nela; é tudo lá perfeito,
Como fora de lá tudo é defecto fsic.]

Lume eterno, que a sede em ti só tendo,


Só te entendes, de ti sendo entendido!
E te amas e sorris só te entendendo!13

A luz inflama o amor.

Se no fogo do amor te resplandeço


Em modo, que o terreno amor precede;
Se aos olhos a força desfaleço;
Não te espantes: efeito é que procede
Desse perfeito ver, que o bem compreende,
E, o compreendendo, em se apurar progrede.
Já patente me está quando resplende
Na inteligência tua a Luz eterna,
Que, apenas vista, sempre amor acende16.

E não há nele treva nenhuma (καί σ κοτία ούκ ’é ouv k v αύτω ούδεμία). É
característico de João expressar a mesma ideia de forma positiva e negativa. Vide
Jo 1.7-8,20; S. 13,17,20; 4.42; 5.24; 8.35; 10.28; lJo 1.6,8; 2.4.27; 5.12. De acordo
com a ordem grega, a tradução é; “E treva não há nele, não, não de maneira al­
guma”. Para um acréscimo similar de oòôeíç, nenhuma, a uma sentença completa,
vide Jo 6.63; 12.19; 19.11. Acerca de σκοτία, trevas, vide nota sobre Jo 1.5.

6. Se dissermos (kàv ε’ίπωμ^ν). O modo subjuntivo põe o caso como suposto, não
como assumido.

13. Dante, A D iv in a Com édia, Paraíso, xxxiii, 82-90, p. 196.


14. Ibid., Paraíso, xxxiii, 100-105, p. 202-203.
15. Ibid., Paraíso, xxxiii, 124-126, p. 203.
16. Ibid., Paraíso, v, 1-9, p. 29. Vide também Paraíso, xxx, xxxi.

260
1J oão - Cap. l
Andarmos em trevas. A expressão ocorre somente no Evangelho e na pri­
meira epístola de João. Trevas, aqui, é σκότος, em vez de σκοτία (v. 5). Vide nota
sobre Jo 1.5. Andarmos (π€ριπατώμεν) é, literalmente, andarem volta de, indicando
o curso habitual da vida, interno e externo. O verbo, com esse significado moral,
é comum em João e Paulo; e, em outras perícopes, só é encontrado em Mc 7.5 e
At 21.21.

Mentimos e não praticamos a verdade. Mais uma vez a combinação de


declarações positiva e negativa. Vide nota sobre o versículo 5. A expressão pra­
ticar a verdade ocorre somente no Evangelho e na primeira epístola de João. Vide
nota sobre Jo 3.21. Todo caminhar nas trevas não é prática da verdade. Westcott
afirma: “A ação correta é o pensamento verdadeiro realizado. Todo fragmento de
prática correta é muita verdade tornada visível”.

7. Andarmos na luz (Iv τω φωτι π€ριπατώμ6ν). A expressão ocorre somente


na primeira epístola. Andarmos, como acima. Na luz, tendo nossa vida em Deus,
que é luz.

Ele na luz está. Deus está para sempre e imutavelmente na luz perfeita. Com­
pare com SI 104.2; lTm 6.16. Andarmos avançando na luz e, através da luz, para
mais luz. “Mas a vereda dos justos ê como a luz da aurora, que vai brilhando mais
e mais até ser dia perfeito” (Pv 4.18).

Uns com os outros (per’ άλλήλων). Não, nós com Deus e Deus conosco, mas com
nossos irmãos. A comunhão com Deus revela-se e prova-se pela comunhão com os
cristãos. Vide 4.7,12; 3.11,23.

De Jesus Cristo, seu Filho. Omita Cristo. O nome humano, Jesus, mostra que
seu sangue está disponível para o homem. O nome divino, seu Filho, mostra que
ele é eficaz. Estarei prestando um serviço aos estudantes das epístolas de João
dando, de forma condensada, a observação do Cônego Westcott, classificando os
diversos nomes do Senhor e seus usos nas epístolas.
O nome em João como em outras perícopes da Bíblia tem dois sentidos distin­
tos, mas intimamente ligados.
1. A revelação do ser divino por meio de um título especial.
2. A soma total das várias revelações reunidas como para formar uma revela­
ção suprema.
O último significado é ilustrado em 3Jo 7, em que “o nome” inclui absoluta­
mente os elementos essenciais do credo cristão, a completa revelação da obra de
Cristo em relação a Deus e ao homem. Compare com Jo 20.31; At 5.41.
261
1 J oão - C ap. 1

Em 2.12, o termo é mais limitado, referindo-se a Cristo como ele viveu na


terra e se entregou pelos “irmãos”. Em 3.23 e 5.13, o significado exato é definido
pelo que se segue.

n o m e s e fe tiv a m e n te u sa d o s

I. Seu Filho Jesus Cristo. Em 1.3; 3.23; 5.20. O antecedente divino é descrito
distintamente em cada caso, e essa diferença colore a frase. Em 1.23, o Pai (com­
pare com Jo 3). Em 3.23, Deus. Em 5.20, é o verdadeiro Deus. Assim, a filiação de
Cristo é vista em relação a Deus como Pai, como Deus e como satisfazendo o
ideal divino que o homem é capaz de formar. A expressão toda, Seu Filho Jesus
Cristo, inclui os dois elementos das confissões que João destaca.
1. Jesus é o Filho de Deus (4.15; 5.5).
2. Jesus é o Cristo (2.22; 5.1).
Os elementos constituintes da expressão resumida são todos usados separa­
damente por João.
(1) Jesus·. 2.22; 5.1; 4.3 (em que a leitura correta omite Cristo). O pensamento é
do Senhor em sua humanidade histórica.
(2) Cristo·. 2Jo 9. Aponta para a preparação feita sob a antiga aliança.
(3) Jesus Cristo·. 2.1; 5.6; 2Jo 7. Combina as idéias de verdadeira humanidade e
posição messiânica.
Em 4.15, a leitura é duvidosa: Jesus ou Jesus Cristo.
Sobre 4.2, vide nota.
(4) O Filho·. 2.22-24; 4.14; 5.12. A relação absoluta de filiação e paternidade.
(5) 0 Filho de Deus: 3.8; 5.10,12-13,20. Compare com seu Filho (4.10;
5.9), em que o antecedente imediato é 0eóç, Deus-, e com 5.18: aquele que é
nascido de Deus. Combinação das idéias da divina dignidade e divina filiação
de Cristo.
(6) Jesus seu Filho (de Deus): 1.7. Duas verdades. O sangue de Cristo está dis­
ponível e é eficaz.
(7) Seu Filho (de Deus), seu Filho unigênito·. 4.9. A singularidade do dom é a
manifestação de amor.
O Filho, em várias formas, é eminentemente característico da primeira e da segun­
da epístola, nas quais o nome ocorre mais vezes que em todas as epístolas de Paulo.
Κύριος, Senhor, não é encontrado nas epístolas (omita em 2Jo 3), mas ocorre
no Evangelho e, com frequência, no Apocalipse.
A expressão o sangue de Jesus seu Filho foi escolhida graças a uma percepção
profunda. Embora Inácio use a expressão sangue de Deus, o vocábulo sangue ê ina-
propriado para o Filho concebido em sua natureza divina. O termo Jesus salienta
sua natureza humana, na qual Ele assumiu um corpo real de carne e sangue, cujo
sangue foi derramado por nós.
262
1 João - Cap. 1

Purifica (καθαρίζει). Vide nota sobre Mc 7.19. Não só perdoa, mas remove.
Compare com T t 2.14; Hb 9.ISss.; 22ss.; Ef 5.26ss.; Mt 5.8; lJo 3.3. Compare
também com o versículo 9, em que ocorre perdoar (άφη) e purificar (καθαρίση)
com uma óbvia diferença de sentido. Observe o tempo presente purifica. A pu­
rificação é atual e contínua. Alexander (Bispo de Derry) menciona uma passa­
gem impressionante de Victor Hugo17. O usurpador Canute, que participou da
morte de seu pai, expirando depois de um reinado virtuoso e glorioso, caminha
em direção à luz do céu. Todavia, primeiro, ele corta com sua espada uma co­
bertura de neve do topo do monte Savo. Conforme ele avança em direção ao
céu, forma-se uma nuvem pesada, e, gota a gota, sua mortalha fica ensopada
por uma chuva de sangue.

Todo pecado (ττάσης αμαρτίας). O princípio do pecado em todas suas formas e


manifestações; não as manifestações separadas. Compare com grande gozo (Tg 1.2);
toda a paciência (2C0 12.12); toda a sabedoria (Ef 1.8); toda a diligência (2Pe 1.5).

8. Que não temos pecado. A conjunção ότι, que, pode ser tomada apenas como
um marca de citação: “Se dissermos, não temospecado’. Acerca da expressão temos
pecado, vide nota sobre Jo 16.22, e compare com tenhais comunhão, versículo 3.
Pecado (αμαρτίαν) não deve ser entendido como pecado original nem como pecado
antes da conversão, mas no sentido genérico. Ebrard registra: “É óbvio que esse
exeiv αμαρτίαν {terpecado) está infinitamente diversificado de acordo com a me­
dida sucessiva de purificação e desenvolvimento do novo homem. Nem mesmo o
apóstolo João não se exclui do universal se dissermos’.
Autores pagãos falam muito pouco sobre pecado, e o paganismo clássico tem
pouco, ou nenhum, conceito de pecado no sentido do Evangelho. A abordagem
mais próxima disso foi de Platão, de cujas obras foi possível reunir uma declara­
ção completa, razoavelmente doutrinai, sobre a origem, a natureza e os efeitos do
pecado. A ideia fundamental de αμαρτία {pecado) entre os gregos é fisica; a perda
de uma marca {videnota sobre Mt 1.21; 6.14); a partir do que se desenvolve em um
significado metafísico, vaguear no entendimento. Este assume o conhecimento como a
base da bondade e, assim, o pecado é principalmente ignorância. No conceito pla­
tônico de pecado, o erro intelectual é o elemento proeminente. Daí: “Então, o que
eu disse é o resultado de tudo isso? Esse não é o resultado - aquelas outras coisas
são indiferentes, e essa sabedoria é o único bem; e a ignorância, o único mal?18”
“Portanto - continuei - compete a nós, como fundadores obrigar as melhores
naturezas a que alcancem esse conhecimento que dissemos se o mais elevado

17. Vitor Hugo, Le Parricide.


18. Platão, Eutidemo, p. 281.

263
1 João - Cap. 1

de todos; não devem renunciar à ascensão enquanto não houverem chegado até
o bem”19. Platão representa o pecado como a predominância dos impulsos mais
baixos da alma, em contraposição à natureza e a Deus20. Ou, mais uma vez, como
uma vontade interior de harmonia.

Que possamos considerar todo ser vivo como umbonecodos deuses, quer apenas seu
brinquedo quer criado com umpropósito - qual dos dois, não podemos saber, com
certeza? Mas isso sabemos que esses afetos emnós são como cordas ebarbantes que
nos puxamparacaminhos distintos eopostos e para ações opostas; e nisto repousa a
diferença entre virtude evício*1.

Ele rastreia a maioria dos pecados como influência do corpo sobre a alma.

Além disso, por todo o tempo que durar nossa vida, estaremos mais próximos
do saber, parece-me, quando nos afastarmos o mais possível da sociedade e união
com o corpo, salvo em situações de necessidade premente, quando, sobretudo, não
estivermos mais contaminados por sua natureza, mas, pelo contrário, nos achar­
mos puros de seu contato, e assim até o dia em que o Deus houver desfeito esses
laços. E quando dessa maneira atingirmos a pureza, pois que então teremos sido
separados da demência do corpo, deveremos mui verossimilmente ficar unidos a
seres parecidos conosco; e por nós mesmos, unicamente por nós mesmos, conhe­
ceremos sem mistura alguma tudo o que é. E nisso, provavelmente, é que há de
consistir a verdade22.

Encontramos, todavia, nos escritores clássicos o significado ocasional da culpa


universal da humanidade, embora até mesmo Platão forneça alguns traços escas­
sos de que aceita a doutrina da depravação inata. Daí Teógnis dizer: Ό sol não
contempla nenhum homem totalmente bom e virtuoso entre aqueles que vivem
agora”23. “Mas tornar-se bom, a fim de permanecer em boa condição e ser bom, não
é possível nem concedido ao homem. Deus só tem essa bênção, mas o homem só
pode evitar ser mau quando a força das circunstâncias o dominam”24. “Como, então,
é possível ser sem pecado? E impossível; mas isto é possível: lutar para não pecar”25.

19. Platão, Diálogos III: República, vii, 519, p. 208.


20. Vide Platão, heis, ix, 863; República, i, 351.
21 . Platão, Leis, i, 644.
22. Id., Diálogos II: Fédon, tradução Jorge Paleikat e Cruz Costa, Rio de Janeiro, Editora Globo,
1961, 67, p. 89-90. O estudante pode consultar proveitosamente o ponto de vista de Platão
sobre o pecado em Ackermann, The C hristian E lem en t in P la to, p. 57ss.
23. Teógnis, 615.
24. Platão, P rotagoras, 344.
25. Id., E p ite to , iv, 12, 19.

264
1João - Cap. 1
Enganamo-nos (εαυτούς πλανώμεν). Literalmente, levamo-nos a nos desviar.
Vide nota sobre Mc 12.24; M t 27.63-64; Jd 13. Não só nos enganamos, mas tam­
bém somos responsáveis por isso. A expressão ocorre somente aqui no texto do
Novo Testamento. Para o verbo, conforme aplicado para enganadores de vários
tipos, vide Mt 24.4; Ap 2.20; 13.14; 19.20; 12.9; 10.3. Compare com πλάνοι, enga­
nadores (2J0 7); πλάνη, engano (Jd l; 1Jo 4.6).

Verdade. O evangelho todo. Toda realidade está em Deus. Ele é o único Deus
verdadeiro (άληθινός, Jo 17.3; vide nota sobre Jo 1.9). Essa realidade está encar­
nada em Cristo, a Palavra de Deus, “a exata imagem de sua substância” e em sua
mensagem para os homens. Essa mensagem é a verdade, título não encontrado
nos Sinópticos, Atos nem Apocalipse, mas nas epístolas (Tg 5.19; lPe 1.22; 2Pe
2.2) e em Paulo (2C0 13.8; Ef 1.13 etc.). E, em especial, é característico do Evan­
gelho e das epístolas de João.
A verdade é representada por João de forma objetiva e subjetiva.
1. Objetivamente. Na pessoa de Cristo. Ele é a Verdade, a revelação perfeita de
Deus (Jo 1.18; 14.6). Sua humanidade é verdade para a lei absoluta de direito, que
é a lei de amor, e é, por essa razão, nosso padrão perfeito de humanidade.
A verdade, existindo em Deus e identificada com Ele de forma absoluta, tam­
bém foi, em alguma medida, difundida no mundo. A Palavra estava no mundo,
antes como depois da encarnação (Jo 1.10). Vide nota sobre Jo 1.4-5. Cristo, com
frequência, trata a verdade como algo a que Ele veio testemunhar, e sua missão
era desenvolvê-la para que fosse reconhecida e expressada de forma mais clara
(Jo 18.37). Ele fez isso ao incorporar a verdade em sua própria pessoa (Jo 1.14,17;
14.6) e por meio de seu ensinamento (Jo 8.40; 17.17); e sua obra é realizada pelo
Espírito da verdade (Jo 16.13), enviado por Deus e por Cristo (Jo 14.26; 16.7).
Assim, o Espírito, mesmo como Cristo, é a Verdade (lJo 5.6). A soma toda do co­
nhecimento de Cristo e do Espírito é a Verdade (lJo 2.21; 2J0 l).
Essa verdade pode ser reconhecida, apreendida e apropriada pelo homem e
também pode ser rejeitada por ele (Jo 8.32; lJo 2.21; Jo 8.44).
2. Subjetivamente. A verdade é alojada no homem pelo Espírito e transmitida
ao seu espírito (Jo 14.17; 15.26; 16.13). Ela habita no homem (lJo 1.8; 2.4; 2J0 2)
como revelação, conforto, orientação esclarecimento, convicção, impulso, inspi­
ração e conhecimento. É 0 espírito da verdade em contraposição ao espírito de erro
(Do 4.6). Ela traduz-se em ato. Os verdadeiros filhos de Deus praticam a verdade
(Jo 3.21; lJo 1.6). Ela traz santificação e liberdade (Jo 8.32; 17.17). Vide nota
sobre Jo 14.6,17.

9. Confessarmos (όμολογώμεν). D eόμος, ume o mesmo, e λέγω, dizer. Por esta ra­
zão, originalmente, dizer a mesma coisa sobre outro e, portanto, admitir a verdade de
265
1João - C ap. l

uma acusação. Compare com SI 51.4. A expressão exata, όμολογεΐν τάς αμαρτίας,
confessar ospecados, não ocorre em outra passagem do Novo Testamento. Compa­
re com έξομολογίΐσθα l αμαρτίας (παραπτώματα) em Mt 3.6; Mc 1.5;Tg5.l6. Vide
nota sobre Mt 3.6; 11.25; Lc 22.6; At 91.18; Tg 5.16.

Pecados. Observe o plural quando comparado com o singular, pecado, no ver­


sículo precedente. Vide nota. O plural indica que a confissão tem de ser específica
e também genérica. As palavras de Agostinho vão exatamente ao ponto, mas seu
jogo de palavras com perdão e confissão não pode ser reproduzido em português.
Vis ut ille ignoscat? Tu agnosce—Você quer que Ele perdoe? Confesse.

Fiel (πιστός). Verdadeiro a sua própria natureza e promessas, mantendo a fé


com Ele mesmo e com o homem. O termo é aplicado a Deus cumprindo suas
próprias promessas (Hb 10.23; 11.11); cumprindo o propósito para o qual Ele
chamou os homens (lTs 5.24; lCo 1.9); respondendo com proteção à confiança
posta nele pelos homens (lCo 10.13; lPe 4.19). “Ele permanece fiel; não pode
negar-se a si mesmo” (2Tm 2.13). O mesmo vocábulo é aplicado para Cristo (2Ts
3.3; Hb 3.2; 2.17). Aqui, fala-se da fidelidade de Deus não só como essencial ao
seu próprio ser, mas também como fidelidade conosco. Ebrard afirma: “fidelidade
a essa natureza de verdade e luz, relacionadas com sua própria essência, que nos
governa contanto que confessemos nossos pecados”. A essência da mensagem
da vida é comunhão com Deus e com os filhos dele (v. 3). Deus é luz (v. 5). Ao
caminhar na luz temos comunhão, e o sangue de Cristo é constantemente aplicado
para nos purificar do pecado, que, por ser trevas, interrompe a comunhão. Se ca­
minharmos nas trevas, não praticamos a verdade. Se negarmos nossos pecados,
a verdade não está em nós. Se confessarmos nossos pecados, “fiel ê Deus, pelo
qual fostes chamados para a comunhão de seu Filho Jesus Cristo, nosso Senhor”
(1Co 1.9), em perdoar nossos pecados, em nos purificar de toda injustiça e, assim,
restaurar e manter a comunhão ininterrupta.

Justo (δίκαιος). De δίκη, justiça. O termo é aplicado para Deus e para Cristo.
Vide Ap 16.5; Jo 17.25; lJo 2.1; 3.7; lPe 3.18. Estes dois vocábulos,^/e justo, um
implica o outro. Eles unem-se em uma verdadeira concepção do caráter de Deus.
O Senhor, que é o justo absoluto, tem de ser fiel a sua própria natureza e a sua
justiça quando trata com os homens, que participam dessa natureza e caminham
em comunhão com Ele, sendo simplesmente fiel a Ele mesmo. Westcott observa:
“Justiça é a verdade em ação”.

Perdoar (ίνα αφή). Vide Jo 20.23; lJo 2.12. O significado principal do termo é
remover, descartar, por conseguinte, cancelar os pecados como se perdoa uma dí-
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1João - Cap. 1
vida. Purificar (v. 7) contempla o caráter pessoal do pecador; remissão contempla os
atos dele. Vide nota sobre Mt 6.12; Tg 5.15. O sentido literal de perdoar é que ele
seja perdoado. Acerca do uso de 'iva, afim de que, por João, vide nota sobre Jo 15.13;
14.31. O perdão condiz com o propósito essencial de seu ser justo e fiel.

Nossos pecados (τάς αμαρτίας). João define pecado como ανομία, iniquidade.
Compare com Rm 6.19. Segundo a ara, transgressão da lei (lJo 3.4). Pode ser consi­
derado como condição ou como ata, ambos com referência ao ideal de humanidade
normal e divino ou a uma lei externa imposta ao homem por Deus. Qualquer afas­
tamento do ideal normal de homem como criado à imagem de Deus põe o homem
fora de uma relação e harmonia verdadeiras com seu verdadeiro “eu" e, dessa for­
ma, com seus irmãos e com Deus. Assim, ele entra em uma relação falsa e anormal
com o certo, o amor, a verdade e a luz. Ele caminha nas trevas e perde a comunhão
com Deus. A iniquidade é trevas, falta de amor e egoísmo. Esse falso princípio toma
forma no ato. Ele pratica (ποιεί) ou comete pecado. Ele pratica iniquidade (την ανομίαν
ποιεί; lJo 3.4,8 [ποιων την αμαρτίαν]). Ele transgride as palavras(ρέματα, Jo 17.8)
de Deus e seus mandamentos (έντολαί, lJo 2.3) conforme incluídos e expressos em
sua palavra ou mensagem (λόγος, 1Jo 2.7,14). De forma similar, o verbo άμαρτάνειν
(αμαρτάνω), pecar, pode ter o sentido de ser pecaminoso (lJo 3.6) ou de cometer pe­
cado (Do 1.10). O pecado, considerado como princípio e ato, é designado por João
pelo termo αμαρτία. O princípio expresso nos atos específicos é ή αμαρτία (Jo
1.29), que ocorre nesse sentido em Paulo, mas não nos Sinópticos nem em Atos.
Muitos dos termos usados para pecado por outros escritores do Novo Testamento
não estão presentes em João, como: ασέβεια, impiedade, (vide nota sobre Jd 14);
άσεβεΐν (άσεβέω), viver impiamente (2Pe 2.6); παραβαίνειν (παραβαίνω), transgredir,
παράβασις, transgressãa, παραβάτης, transgressor {vide nota sobre Mt 6.14; Tg 2.11);
παρανομεΐν (παρανομέω), agir contra a lei, παρανομία, quebra da lei {vide nota sobre
At 23.3; 2Pe 2.16); παράπτωμα, ofensa {vide nota sobre Mt 6.14).

Purificar. Video,ota sobre o versículo 7.

Injustiça (αδικίας). Com referência a δίκαιος,justo. O Justo que nos chama a comun­
gar com Ele elimina a injustiça, que é contrária a sua natureza e que torna a comunhão
impossível. O termo ocorre nos escritos de João apenas em Jo 7.18; lJo 5.17.

10. Não pecamos (ούχ ήμαρτήκαμεν). Cometemos pecados. O pecado visto como
um ato. A condição é expressa por αμαρτίαν ούκ έχομεν, não temos pecado (v. 8).

Fazemo-lo (ποιοΰμεν αυτόν). O termo é característico de João. Vide Jo 5.18;


8.53; 10.33; 19.7,12.
267
1 J oão —C ap . 2

Sua palavra (ò λόγος αύτοΰ). Não a Palavra pessoal, como em Jo 1.1, mas a
mensagem divina do evangelho. Vide Lc 5.1; 8.11; At 4.31; 6.2,7 etc. Compare
com “não há verdade em nós” (v. 8). A verdade é a substância da palavra. O vocá­
bulo carrega a verdade. O termo move o homem (Jo 8.31-32) e permanece nele (Jo
5.38; 8.37). O homem também permanece na palavra (Jo 8.31).

Capítulo 2

1. Meus filhinhos (xecvía μου). T ckvÍ ov, filhinhos, diminutivo de τέκνοv, filho,
ocorre em Jo 13.33; iJo 2.12,28; 3.7,18; 4.4; 5.21. Essa expressão, em particular,
só é encontrada aqui (os melhores textos omitem meus, em lJo 3.18, como na
ara e te b ). É usado como termo afetivo ou, possivelmente, com referência à ida­
de avançada do escritor. Compare com a palavra usada por Cristo, παιδία, filhos
(Jo 21.5), a qual João também usa (lJo 2.13,18). Na conhecida história de João e
do jovem convertido que se tornou um ladrão, relata-se que o apóstolo, já idoso,
dirigiu-se ao lugar frequentado pelo ladrão, e que o jovem homem, ao vê-lo, fu­
giu. João, esquecido de sua idade, correu atrás dele gritando:

O meu filho, porque você foge de mim, seu pai? Você, umhomemarmado - eu, um
velho indefeso! Tenha pena de mim! Meu filho, não tema! Ainda há esperançade vida
para você. Gostaria de eu mesmo levar o fardo de todos diante de Cristo. Se for ne­
cessário, morro por você, como Cristo morreu por nós. Pare! Foi Cristo quem me
enviou*6.

Escrevo. Mais pessoal que escrevemos (1.4) e, por isso, ajusta-se melhor à forma
de tratamento, meusfilhinhos.

Se alguém pecar, temos. A mudança da terceira pessoa indefinida, alguém,


para a primeira pessoa do plural, temos, é relevante. Com o temos, João assume a
possibilidade de atos pecaminosos por parte de cristãos e dele mesmo, algo em
comum com eles, e sua necessidade comum da intervenção do Advogado divino.
Daí Agostinho dizer:

Ele nãodisse: “v o s tendes”, nem“vos m e tendes”, tampouco“v ó s tendes Cristo mesmo”,


mas ele inclui C risto , não ele m esm o, e diz: “nós temos”, e não “v ó s tendes”. Ele preferiu
pôr-seentreospecadores paraquepudesseterCristopor seuadvogadoapôr-secomo
o advogado, emvez de a Cristo, e ser encontrado entre os orgulhosos destinados à
condenação.

26. A históriapodeser encontradaemdetalhesemGodet, C om m entary on John, v. 1, p. 58.


268
1 J oão - C ap. 2

Um Advogado (παράκλητον). Vide nota sobre Jo 14.16.

Com o Pai (προς τον πατέρα). Vide nota acerca da expressão com Deus, em
Jo 1.1. E indicada uma relação ativa. Acerca dos termos o Pai e meu Pai, vid e nota
sobre Jo 4.21.

O Justo. Compare com ju sto , 1.9. Não há artigo no grego: Jesus C risto ju sto . Na
teb,Jesus Cristo, que é ju sto. Vide nota sobre 1.9.

2. E ele (καί αύτός). O ele é enfático: aquele mesmo Jesus; E le mesmo.

A propiciação (ίλασμός). Somente aqui e em 4.10. De ίλάσκομαι, a pazigu ar,


conciliar consigo mesmo, que ocorre em Lc 18.13; Hb 2.17. O significado original
do substantivo era um m itig a d o r ou propiciador e passa, por intermédio do uso ale­
xandrino, a ter o sentido de o meio de propiciar, como aqui. A construção tem de
ser particularmente observada: por, quanto ao assunto de (περί) nossos pecados; o caso
genitivo daquele pelo qual se faz propiciação. Em Hb 2.17, o caso acusativo, também
dos pecados a serem propiciados. No uso clássico, por sua vez, a construção habitual
é o acusativo (caso objetivo direto), da pessoa propiciada. Conforme Homero, acerca
dos deuses. Θεόν ίλασκεσθαι é to rn a r um deus propício a a lg u é n f1. De homens a quem
alguém deseja conciliar por meio de honras divinas após a morte. Daí Heródoto
dizer, de Felipe de Crotona: “Sua beleza garantiu-lhe honras nas mãos da popula­
ção de Egesta, o que eles nunca concederam a ninguém mais, pois eles levantaram
um templo de heróvsobre seu túmulo e ainda o propiciaram (αυτόν ίλάσκονται) com
sacrifícios”28. Mais uma vez: O s habitantes de Páros, tendo propiriado Temístocles
(Θεμιστοκλεα Ιλασάμενοι) com presentes, escaparam as visitas do exército”29. A
mudança dessa construção mostra, para citar o Cônego Westcott:

Que a concepção escriturai do verbo não é de apaziguar alguémque está comraiva,


com umsentimento pessoal, do ofensor; mas de alterar o caráter do que, semisso,
ocasiona a necessária alienação e interpõe umobstáculo inevitável à comunhão. Ex­
pressões como “propiciando aDeus” eDeus “serreconciliado” sãoestranhas àlingua­
gemdo Novo Testamento. O h om em éreconciliado (2Co 5.l8ss.; Rm 5 . 10ss.). Há uma
propiciação d o p e c a d o ou do p ecador.

Pelos de todo o mundo (περί όλου του κόσμου). A n v i acrescenta pecados (pelos
pecados de); mas deve ser omitido, como na a r c . Compare com lJo 4.14; Jo 4.42;

27. Vide Homero, Ilía d a , i, 386, 472.


28. Heródoto, v, 47.
29. Id., viii, 112.

269
1 João - C ap. 2

12.32. Bengel observa: “A propiciação é tão ampla quanto o pecado”. Se os ho­


mens não experimentam seu benefício, a falha não está na eficiência. Düsterdieck
(citado por Huther) diz: “A propiciação tem sua verdadeira eficácia para todo o
mundo; para os crentes, ela traz vida, para os não crentes, morte”. Lutero: “É fato
patente que você também faz parte do mundo todo; então, seu coração não pode
se enganar e achar que o Senhor morreu por Pedro e Paulo, mas não por mim”.
Acerca de κόσμος, mundo, vid e nota sobre Jo 1.9.

3. Nisto (εν τούτφ). Literalmente. Na a r a , ora. Característico de João. Vide


Jo 13.35; 15.8; 16.30; lJo 2.5; 3.24; 4.13; 5.2; 3.16; 3.19; 4.2. A expressão aponta
para o que se segue: “se guardarmos os seus mandamentos”, contudo, com uma
referência velada a essa ideia como, em geral, implícita nas palavras anteriores
concernentes à comunhão com Deus e ao andar na luz.

Sabemos (γι,νώσκομεν). Ou percebemos. Por experiência do dia a dia; distinto


de οΐδαμεν, sabemos, expressando conhecimento absoluto e imediato de um fato
de uma vez por todas. Compare com lJo 3.2.

Que £../] conhecemos (ou εγνώκαμεν). Ou, mais literalmente, tem os v in ­


do a conhecer. João não usa as formas compostas έπιγινώσκειν (έπιγινώσκω) e
έιτίγνωσι,ς (tóknota sobre Mt 7.16; vid e Lc 1.4; At 4.13; Rm 1.28; Ef 1.17 etc.),
nem o vocábulo relacionado γνώσις, conhecimento (Lc 1.77; Rm 2.20 etc.).

Guardarmos os seus mandamentos (τάς έντολάς αύτοΰ τηρώμεν). Frase pe­


culiar a João e que, em outras perícopes, ocorre somente em M t 19.17; 1Tm 6.14.
Em lCo 7.19, encontramos τήρησις εντολών, a observância dos m andam entos.
Acerca de τηρεω, g u ard ar, vid e nota sobre lPe 1.5.

4. Mentiroso. Compare com m entim os, em l .6.

Nele (eu τούτφ). Enfático. Literalmente, nesse a verdade não está. Vide nota
sobre 1.8.

5. Guarda a sua palavra (τηρή αύτοΰ τον λόγον). Observe a mudança: p a la v ra s


por m andam entos. A p a la v ra é a revelação vista como um todo, o que inclui todos
os m andam entos ou injunções isolados. Vide o uso de λόγος, p a la vra , e εντολή, p re ­
ceito, em Jo 14.21-24.

O amor de Deus está £...] aperfeiçoado (ή αγάπη τοΰ Θεού τετελείωται).


A a r a traduz melhor o tempo perfeito: tem sido aperfeiçoado o a m o r de D eus. A
270
1 J oão - C ap. 2

mudança na forma dessa sentença antitética é impressionante. Ele que afirma


conhecer a Deus, e ainda vive na desobediência é mentiroso. Devíamos esperar
uma compensação para isso: ele que guarda seus mandamentos é d a verdade ou a
verdade está nele. Em vez disso, temos: “O amor de Deus está nele verdadeiramen­
te aperfeiçoado”. Em outras palavras, o filho de Deus obediente é caracterizado
não por algum traço, ou qualidade, representativo de sua própria personalidade,
mas apenas como o sujeito da obra do amor divino; como a esfera em que esse
amor realiza sua obra perfeita.
A expressão ή αγάπη του OeoO, o am or de D eus, pode ter o sentido de o am or
que D eus demonstra, ou o am or do qu al D eus é objeto, ou o a m o r que ê característico de
Deus, quer manifestado por Ele mesmo, quer por seu Filho obediente por meio de
seu Espírito. O uso de João não é decisivo como o de Paulo, de acordo com o qual
o a m o r d e Deus, em geral, representa o amor que procede de Deus e é manifestado
por Ele. A expressão exata o a m o r de D eu s ou o am or do P a i encontra-se em 4.9
(3.16,o am or) no sentido indubitável de o am or de D eu s p elos homens. O mesmo sig­
nificado é pretendido em 3.1,9,16, embora expresso de forma distinta. A acepção
é duvidosa em 2.5; 3.17; 4.12. A m o r dos homens p o r D eu s é claramente o sentido
em 2.15; 5.3. Só há duas ocorrências da expressão nos Evangelhos (Lc 11.42; Jo
5.42), e, nos dois casos, o conceito é duvidoso. Alguns, como Ebrard, combinam os
dois e explicam o a m o r de D eu s como a m útua relação de a m o r entre D eus e os homens.
Não é possível estabelecer o ponto de forma decisiva, mas inclino-me a entender
que a ideia fundamental do amor de Deus, conforme exposto por João, é o a m o r que
D eus tornou conhecido e que corresponde a sua natureza. Está de acordo com essa inter­
pretação o uso geral de αγάπη, amor, no texto do Novo Testamento, com o genitivo
nominativo30. O objeto é mais comumente expresso por clç, em direção a ou para.
Vide lTs 3.12; Cl 1.4; lPe 4.8. Mais vigoroso ainda é o tratamento de João para
o sujeito no capítulo 4. Naquele capítulo, temos, no versículo 9, a manifestação do
amor de Deus em nós (kv ήμίν). Por meio da nossa vida em Cristo e de nosso amor
por Deus, somos uma manifestação do amor divino. A seguir está uma definição
da natureza essencial do amor. “N isto está o amor, isto é, nisto consiste o amor: não em
que nós tenhamos am ado a Deus, mas em que ele nos amou (v. 10). Nosso amor mútuo
é uma prova de que Deus habita em nós. Quando Deus habita em nós, seu amor
é aperfeiçoado em nós (v. 12). Podería parecer que a última deve ser explicada de
acordo com o versículo 10. Assim: Έ nós conhecemos e cremos no amor que Deus
nos tem” (v. 16; vide nota sobre a expressão tem amor, em Jo 16.22). “Deus é amor”,
essa é sua natureza, e Ele concede que essa natureza seja a esfera na qual seus filhos
habitam. “Quem está em amor está em Deus”. Por fim, nosso amor é produzido por
seu amor por nós. “Nós o amamos porque ele nos amou primeiro” (v. 19).

30. Isto é, o caso genitivo, de Deus, do Pai, representa Deus com o sujeito da emoção.

271
1 J oão - C ap. 2

Em harmonia com isso está Jo 15.9: “Como o Pai me amou, também eu vos
amei a vós; permanecei no meu a m o r . M eu am or deve ser explicado pelo eu vos
amei. Essa é a mesma ideia de amor divino na esfera de ser renovado ou com esse
elemento da renovação; e essa ideia é posta, como na perícope que estamos exa­
minando, em conexão direta com a observância dos mandamentos divinos. “Se
guardardes os meus mandamentos, permanecereis no meu amor”.
Essa interpretação não exclui o amor do homem por Deus. Ao contrário,
ela o inclui. O amor que Deus tem é revelado como o a m o r d e D eu s no amor de
seus filhos em relação a Ele, não menos que em suas manifestações de amor
por eles. Assim, a ideia do amor divino é complexa. O amor, em sua essência,
é recíproco. Seu ideal perfeito requer duas partes. Não é suficiente nos dizer,
como uma verdade vazia e abstrata, que Deus é amor. A verdade deve estar
completa e plena para nós pela aplicação notável e perceptível do amor divino
sobre um objeto e pela resposta desse objeto. O amor de Deus é aperfeiçoado,
ou com pletado, pelo perfeito estabelecimento da relação de amor entre Deus e o
homem. Quando o homem ama perfeitamente, seu amor é o amor de Deus der­
ramado em abundância em seu coração. Seu amor deve sua natureza e origem
ao amor de Deus.
O termo verd a d eira m en te (αληθώς) nunca é usado por João como uma mera
fórmula de afirmação, mas tem o conceito de advérbio qualitativo, expres­
sando não apenas a ex istên cia a tu a l de uma coisa, mas sua existência corres­
pondente de maneira absoluta à άλήθ€ΐα, verdade. Compare com Jo 1.48; 8.31.
E s tá aperfeiçoado. João está apresentando o id e a l de vida em Deus. “Este é o
amor de Deus que guardemos os seus mandamentos”. Por isso, quem guarda
a p a la v r a de Deus, sua mensagem em sua totalidade, realiza a perfeita relação
de amor.

Estamos nele. Compare com At 17.28. Vide n o ta sobre 2.15.

6. Aquele que diz que está nele (kv αύτω péueiv). E s ta r ou perm anecer em
D eus é uma expressão mais comum em João que h a b ita r em D eus e marca um
avanço de pensamento. A expressão é uma das favoritas de João. Vide Jo 15.4ss.;
6.56; lJo 2.24,27-28; 3.6,24; 4.12s.,15s. Bengel observa a gradação nas três ex­
pressões: conhecer a E le, e sta r nele, perm anecer ou h ab ita r nele —conhecimento, co­
munhão, constância.

Deve (όφείλ6ΐ). Uma obrigação, posto como uma d ívid a . V id e h c 17.10 e sobre
d ívid a s, Mt 6.12. O vocábulo expressa uma obrigação pessoal e especial, e não
como óel, deve, uma obrigação na natureza das coisas. V ide Jo 20.9 e compare com
Do 3.16; 4.11; 3jo 8.
272
1J oão - Cap. 2
Ele (ètceivoç). Sempre para Cristo nas epístolas de João. Vide έκείνης, referin­
do-se a αμαρτία, pecado, em 1Jo 5.16.

7. Irmãos (αδελφοί). A leitura correta é αγαπητοί, am ados. Como na n v i . Esta é


a primeira ocorrência desse título, sugerido pelos vocábulos anteriores concer­
nentes à relação de amor.

Não £...] novo mandamento (ούκ εντολήν καινήν). A r v , de forma apro­


priada, põe esses termos no início da sentença para dar ênfase; o argumento do
versículo repousa na antítese entre o novo e o antigo. Acerca de novo, v id e nota
sobre Mt 26.29.

Antigo (παλαιάν). No texto do Novo Testamento são usados quatro vocábu­


los para a n tig o ou velho. Desses, γέρων e πρεσβύτερος referem-se apenas à idade
do homem ou, a última, ao cargo oficial baseado principalmente na idade. Daí
o termo oficial ancião ou presbítero. Entre os dois outros, αρχαίος e παλαιός, a
distinção não é tão marcante. O termo αρχαίος enfatiza o novo alcance de um
começo (αρχή). Por esta razão, Satanás é “a a n tig a (αρχαίος) serpente”, cuja obra
maligna é contemporânea do início do tempo (Ap 12.9; 20.2). O mundo antes
do dilúvio é o “mundo a n tig o (αρχαίος)” (2Pe 2.5). Mnasom era “um discípulo
a n tig o (αρχαίος)”, não idoso, pois era discípulo desde o começo (At 21.16). Só-
focles apresenta os dois termos: “Tinha um presente velho (παλαιόν)”; ou seja,
recebido há muito tempo, “do a n tig o (αρχαίου) centauro”31. O centauro é con­
cebido como uma criatura do mundo antigo pertencente a um estado de coisas
que tinham passado. Assim, carrega a ideia de an tiq u a d o , peculiar a um estado
de coisas obsoleto.
O termo παλαιός traz o significado de g a sto pelo tempo, por causa de danos,
sofrimento ou outras causas. Assim, a veste velha (Mt 9.16) é παλαιόν. Como os
odres velhos (Mt 9.17). O homem idoso de uma geração ainda viva comparado
com o jovem da mesma geração é παλαιοί. Em παλαιός, a simples concepção de
tem po domina. Em αρχαίος, com frequência, há uma sugestão de um caráter cor­
respondendo à idade remota.
Aqui, o mandamento é chamado de an tigo porque pertence ao primeiro estágio
da igreja cristã. Os cristãos o tinham desde o início de sua fé cristã.

Mandamento. O mandamento do amor. Compare com Jo 13.34. Esse man­


damento é cumprido ao se caminhar como Cristo caminhou. Compare com
Ef 5.1-2.

31. Sófocles, As Traquínias, 555.

273
1 João - C ap. 2

8. Mandamento novo. O mandamento do amor é an tig o e novo. A n tig o porque os


leitores de João o têm desde o início de sua experiência cristã. N o v o porque ele,
no desenvolvimento da experiência cristã, desenvolveu um novo poder, sentido,
obrigação e correspondência mais próxima “com os fatos da vida de Cristo, com
o supremo mistério de sua paixão e com os fatos da vida cristã”.

Que é verdadeiro (ó k a x iv αληθές). A expressão que, ou o qual, refere-se ao


m andam ento do am or ou ao fato afirmado, a saber, que o m andam ento a n tigo é novo.
O fato de o mandamento antigo ser novo é verdade nele e em nós. Em geral,
prefiro essa interpretação.

Nele e em vós. Por vós, leia nós. O fato de o mandamento antigo ser novo é
verdade nele (Cristo), uma vez que Ele o deu como um mandamento novo e é ilus­
trado pela palavra e o exemplo dele. Ele é verdade em vós, desde que vocês só o
receberam quando Cristo o deu a vocês e uma vez que a pessoa e a vida de Cristo
os atraem a novas luzes, e com poder renovado, à medida que sua vida cristã se
desenvolve. N ele aponta de volta a quando E le cam inhava.

Porque. Explica o aparente paradoxo.

Vão passando (παράγ€τοα). Ao passo que a k j v traz: são passadas. E s s a p a ssa ­


representada como rea liza d a , mas em progresso. A a r c traduz correta­
g em n ã o é
mente o tempo presente.

As trevas (ή σκοτία). Vide nota sobre Jo 1.5. Deus é lu z e, por esta razão, qualquer
um que não está em comunhão com Ele é trevas. Em todos os casos em que o termo
não é usado para treva física, ele tem o significado de insensibilidade moral para a
luz divina; cegueira ou estupidez moral. Compare com Jo 8.12; 12.35,46; lJo 2.9,11.

A verdadeira luz (το φως το αληθινόν). Literalmente, a lu z, a verdadeira (luz).


Vide nota sobre a expressão a vid a eterna, 1.2. Verdadeira não como distinta de
falsa, mas como resposta para o verdadeiro ideal. Vide nota sobre Jo 1.9. A verd a ­
deira lu z é a revelação de Deus em Cristo. Vide nota sobre lJo 1.5.

Alumia (φαίν€ΐ). Vide nota sobre Jo 1.5. Compare com Ap 1.16; 8.12; 21.23;
2Pe 1.19. Vide nota sobre Rm 3.11 ss.; T t 2.11; 3.4.

9. Aborrece (μισών). A questão crucial é mantida aqui como nas palavras de


Cristo: “Quem não é comigo é contra mim” (Lc 11.23). Os homens caem em duas
categorias, os que têm comunhão com Deus e, portanto, caminham em luz e
274
1 JoÂo - C ap . 2

amor e os que não têm comunhão com Deus e, assim, caminham em trevas e ódio.
“Uma oposição direta”, diz Bengel, onde o amor não está, há ódio. “O coração
não está vazio.” V ide Jo 3.20; 7.7; 15.18ss.; 17.14. O vocábulo ódio é o oposto de
amor de afeto n atu ral (φιλειν [φιλέω]) e do sentimento mais diferenciador —am or
fu n d a m en ta d o na ju s ta estim a (αγαπάν [αγαπάω]). Para o primeiro, vid e também
Jo 12.25; 15.18-19; compare com Lc 14.26. Para o último, vid e também lJo 3.14-
15; 4.20; Mt 5.43; 6.24; Ef 5.28-29. Westcott afirma: “No primeiro caso, ódio,
que pode se tornar uma obrigação moral envolve a sujeição de um instinto. No
segundo caso, expressa uma determinação geral de caráter”.

Seu irmão (τον αδελφόν). Seu companheiro cristão. O singular, irm ão, é ca­
racterístico dessa epístola. Vide versículos 10-11; 3.10,15,17; 4.20-21; 5.16. No
texto do Novo Testamento, os cristãos são chamados de cristãos (At 11.26; 26.28;
lPe 4.16), principalmente pelos de fora do círculo cristão. D iscípu lo aplica-se a
todos os seguidores de Cristo (Jo 2.11; 6.61) e estritamente aos Doze (Jo 13.5ss.).
Em At 19.1, discípulo é usado só para aqueles que receberam o batismo de João
Batista. Não é encontrado nas epístolas de João nem no Apocalipse. Irm ão. O pri­
meiro título dado ao corpo de crentes depois da ascensão (At 1.15, onde a leitura
correta é αδελφών, irm ão, em lugar de μαθητών, discípulos ). Vide At 9.30; 10.23;
11.29; lTs 4.10; 5.26; lJo 3.14; 3Jo 5,10; Jo 21.23. Pedro apresenta ή αδελφότης,
a fra te rn id a d e (lPe 2.17; 5.9). O s crentes. Sob três formas: os crentes (oi πιστοί; At
10.45; lTm 4.12); aqueles que creem (οι πιστεύοντες; lPe 2.7; lTs 1.7; Ef 1.19);
aqueles que criam (ol πιστεύσαντες; At 2.44; 4.32; Hb 4.3). O s santos (οί άγιοι), ex­
pressão característica de Paulo e do Apocalipse. Há quatro ocorrências de santos
em Atos (9.13,32,41; 26.10) e uma em Judas (v. 3). Também em Hb 6.10; 13.24.
Em Paulo, 1C06.I; 14.33; Ef 1.1,15 etc. Em Ap 5.8; 8.3-4; 11.18 etc.

Até agora (εως άρτι). Embora a luz estivesse aumentando e embora ele pu­
desse declarar que esteve na luz desde o início. A expressão ocorre em Jo 2.10;
5.17; 16.24; e é usada por Paulo em lCo 4.13; 8.7; 15.6.

10. Está (μένει). Vide nota sobre o versículo 6. Compare com o versículo 9, está em.

Escândalo (σκάνδαλον). Acerca de escan dalizar, v id e nota sobre M t 5.29. Para


essa imagem em João, v id e Jo 6.61; 11.9; 16.1; Ap 2.14. O significado não é de
que ele não dá chance de fazer os outros tropeçarem, mas de que não há nenhum
tropeço em seu caminho. Vide So 11.9-10.

11. Está - anda —para onde. A condição daquele que odeia é vista como rela­
cionada com ser, ação e tendência.
275
1 João - Cap. 2

Ir (υπάγει). Ou, está indo. Vide nota sobre Jo 6.21; 8.21.

Cegaram (έτύφλωσεν). Para essa imagem, vid e Is 6.10. Vide n o ta sobre fechou,
Mt 13.15. Compare com Jo 1.5, e vid e nota sobre καταλάβη, surpreendam , em
Jo 12.35; também sobre Jo 12.40. O tempo aoristo, cegaram, indica um ato passa­
do, definido e decisivo. Quando as trevas alcançaram, elas cegaram. A cegueira
não é uma condição nova em que ele entrou.

12. Filhinhos. Vide nota sobre o versículo 1 e Jo 1.12. Não crianças em idade,
mas o tratamento para os leitores em geral.

Nome. Vide nota sobre Jo 1.12; 2.23.

13. Pais. Indicando idade e autoridade.

Conhecestes (έγνώκατε). Na n v i , corretamente, vocês conhecem. O conheci­


mento é o característico de p a is, como fruto da experiência. Vocês perceberam, por­
tanto, vocês conhecem.

Vencestes (νενικήκατε). Compare com Jo 16.33. A imagem é característica


do Apocalipse e da primeira epístola. V ide Ap 2.7,11,17,26; 12.11; 21.7; lJo 2.14;
4.4; 5.4-5.

O maligno (τον πονηρόν). V ide nota sobre m ald a d es, Mc 7.22; Lc 3.19; espí­
rito s maus, Lc 7 .2 1 . O príncipe das trevas é intitulado por João de ό διάβολος,
o f a ls o a cu sa d o r ( ίο 8.44; 13.2; lJo 3 .8 ,1 0 ; v id e nota sobre M t 4.1); ό Σατανάς,
S a ta n á s, o a d v e rsá rio (Jo 13.27; compare com ό κατήγωρ, o acu sador, propria­
mente, na corte, Ap 12.10); ό πονηρός, o m a lig n o (Jo 17.15; lJo 2 .1 3 -1 4 ; 3.12;
5 .1 8 -1 9 ); ò αρχών του κόσμου τούτου, ο p r ín c ip e deste m u n do ( ί ο 12.31; 14.30;
16.11). Observe a introdução abrupta do termo aqui, como indicando algo
familiar.

Filhos (παιδία). Compare com τεκνία, filh in h os (v. l), que enfatiza a ideia de
parentesco,embora esse termo enfatize a noção de subordinação e consequente d is­
ciplina. Daí ele ser o vocábulo mais apropriado quando se fala do ponto de vista
da autoridade, em vez da afeição.

Conhecestes (έγνώκατε). Na n v i , corretamente, vocês conhecem.

O Pai. Em sua justa autoridade como a de um Pai sobre os filhos.

276
1 JoAo —C ap . 2

14. Eu £...]] escrevi έγραψα). Ou, estritamente, tenho escrito. Compare com es­
crevo (vv. 12-13) e observe a mudança de tempo. O tempo passado, escrevi, não se
refere a alguma escrita anterior, como o Evangelho, mas à escrita atual para essa
epístola. O tempo presente, escrevo, refere-se ao ato imediato de escrever: o aoris-
to é o ep istolar por meio do qual o escritor se põe no lugar do leitor, observando
a escrita como um ato passado. Vide nota sobre lPe 5.12. Assim, escrevo refere-se
ao ato imediato do apóstolo de escrever; escrevi ou tenho escrito, o ato do leitor de
ler a escrita concluída.

Aquele que é desde o princípio. O Cristo eterno e preexistente que é desde o


princípio (Jo 1.1). O Filho eterno por intermédio do qual os homens foram trazidos
ao relacionamento de filhos de Deus e aprenderam a conhecer o Pai. O conheci­
mento de Deus envolve, da parte dos p a is e dos filhos, o conhecimento de Cristo.

Fortes (ισχυροί). Vide nota sobre não pôde, Lc 14.30; não posso, Lc 16.3.

15. O mundo (τον κόσμον). Vide n ota sobre Jo 1.9.

O amor do Pai (ή αγάπη του πατρός). A frase ocorre somente aqui no texto
do Novo Testamento. Ela quer dizer amor em direção ao Pai, porém, como gerado
pelo amor do Pai pelo homem. Compare com lJo 3.1. Vide nota sobre a m o r de
Deus, versículo 5.

Não está nele. Isso significa mais que ele não amar a Deus; antes, representa
que o amor de Deus não permanece nele como o princípio governante de sua
vida. Westcott cita um paralelo de Filo: “É impossível o amor pelo mundo co­
existir com o amor por Deus da mesma maneira como é impossível a luz e as
trevas coexistirem”. Compare com Platão:

É certo, Teodoro. Porém não é possível eliminar os males - forçoso é haver sempre
o que se oponha ao bem —nem mudarem-se eles para o meio dos deuses. É inevitável
circularem nesta região, pelo meio da natureza perecível. Daqui nasce para nós o
dever de procurar fugir quanto antes daqui para o alto. Ora, fugir dessa maneira é
tornar-se o mais possível semelhante a Deus; e tal semelhança consiste em ficar al­
guém justo e santo com sabedoria32.

16. Tudo (παν). Não todas as coisas separadamente, mas tudo que está no m undo
visto como uma unidade.
coletivam ente,

32. Platão, Diálogos: Teeteto e C rátilo, tradução Carlos Alberto Nunes, Belém, UFPA Gráfica e
Editora Universitária, 1988, 176, p. 4·9.

277
1 JoÂo - Cap. 2

A concupiscência (ή επιθυμία). Vide nota sobre Mc 4.19.

Da carne. Apetite sensual. O desejo que reside na carne, não o desejo p a ra a car­
ne. Para esse uso subjetivo do genitivo com concupiscência, v id e Jo 8.44; Rm 1.24;
Ap 18.14. Compare com lPe 2.11; T t 2.12. A concupiscência da carne envolve a
apropriação do objeto desejado. Acerca de a carne, vid e nota sobre Jo 1.14.

A concupiscência dos olhos. Isso está incluído na concupiscência da carne


como uma manifestação específica dela. Todo desejo meramente sensual perten­
ce à economia que “não é do Pai”. O desejo dos olhos não envolve apropriação. Ele
é satisfeito com a contemplação. Esse representa um tipo mais elevado de desejo
que o desejo da carne, no fato de que ele busca prazer m en tal onde o outro busca
gratificação físic a . Assim, há um relevante indício nessa perícope de que até mes­
mo a elevada gratificação artística pode não ter relação com Deus.

A soberba da vida (ή αλαζονεία του βίου). Na τβ, vaidade. Ο termo ocorre so­
mente aqui e em Tg 4.16, a respeito do qual v id e nota. O significado original dele
é co n versafrívola, v a zia , arrogante-, ou dem onstração d e friv o lid a d e , arrogância e fa lta
de inteligência ou sabedoria; daí o sentido de segurança insolente e vã nos próprios
recursos ou na estabilidade das coisas terrenas, que resulta na desobediência das
leis divinas. A vaidade da vid a é a que pertence à vida atual. Acerca de βίος, vida,
como distinto de ζωή, vida, vide nota sobre Jo 1.4.

Do Pai (εκ του πατρός). Não origina do Pai. Acerca da expressão είναι έκ, ser
nota sobre Jo 1.46.
de, vid e

Ora, quando um homem se abandona à concupiscência e aos maus procederes, quando


praticou longamente estes dois vícios, todos os seus pensamentos se tornam neces­
sariamente mortais. Logo, torna-se mortal inteiramente, tanto quanto o possa ser, e
nada mais resta nele senão o que é mortal, tanto esta parte se desenvolveu. Contraria­
mente, quando um homem cultivou em si mesmo o amor da ciência e dos pensamentos
verazes, quando, de todas as suas faculdades, exerceu principalmente a capacidade de
pensar nas coisas imortais e divinas, um tal homem, se vier a tocar a verdade, é sem
dúvida absolutamente necessário que, na medida em que a natureza humana pode
participar da imortalidade, possa dela fruir inteiramente. Pois, sem cessar, rende culto
à divindade, entretendo sempre em bom estado o Deus que nele habita: é então fatal
que seja singularmente feliz33.

33. Platão, Timeu e Crítias ou a Atlântida, tradução Norberto de Paula Lima, Curitiba, Hemus, 2 0 0 2 ,
90, p. 181-182.

278
1 J oão - Cap. 2

17. Para sempre (εις τον αιώνα). A única forma em que αιών, era, vida, ocorre no
Evangelho e nas epístolas de João, exceto έκ του αΐώνος, desde oprincípio do mundo (Jo
9.32). Algumas versões antigas acrescentam: “como Deus, permanece para sempre”.

18. Filhinhos (παιδία). Vide nota sobre o versículo 13.

A última hora (έσχατη ώρα). A frase ocorre somente aqui no texto do Novo
Testamento. Acerca do uso de ώρα, hora, por João, como marcando um período
crítico, vide Jo 2.4; 4.21,23; 5.25,28; 7.30; 8.20; 12.23,27; 16.2,4;25,32. No texto do
Novo Testamento, o significado predominante da expressão é últimos dias, de um
período de sofrimento e luta precedendo a vitória divina. Vide At 2.17; Tg 5.3;
lPe 1.20. Por esta razão, a frase aqui não se refere ao fim do mundo, mas ao pe­
ríodo predecessor de uma crise no avanço do reino de Cristo, um período incerto
e turbulento marcado pelo aparecimento de “muitos anticristos”.

Vem (έρχεται). O presente profético equivale a estápara vir. O mesmo termo é


usado para Cristo (Jo 14.3; 21.22; Ap 22.20).

Anticristo. Peculiar a João no texto do Novo Testamento. A ausência do


artigo mostra seu uso como nome próprio. Ele pode se referir a alguém que
se levanta contra Cristo ou que se levanta no lugar de Cristo; da mesma forma
como αντιστράτηγος pode representar alguém que se levanta no lugar de um
στρατηγός, pretor, um propretor (vide Introdução a Lucas, vol. i, e nota sobre At
16.20), ou uma oposição geral. João nunca usa o termo ψευδόχριστός, falso Cristo
(Mt 24.24; Mc 13.22). Embora ofalso Cristo seja apenas um pretendente ao cargo
messiânico, o anticristo “ataca a Cristo ao propor-se a fazer ou proteger o que Ele
fez, embora negue a Cristo”. Assim, o anticristo é aquele que se opõe a Cristo disfar­
çado de Cristo. É muito importante o comentário de Westcott de que o significado
de anticristo de João é determinado pela plena concepção cristã de Cristo, e não pela
concepçãojudaica do Salvador prometido.

Se têm feito (γεγόνασιν). Na n v i, mais corretamente, têm surgido. Na teb ,


estão aí; na kjv, existem.

Por onde (όθεν). Literalmente, por que motivo. Somente aqui em João. O termo
é encontrado em Mateus e Lucas e, com frequência, em Hebreus, e não em outras
perícopes.

19. Saíram de nós (Ιξ ημών έξήλθαν). A expressão, sair de, pode ter o significa­
do de remoção (Ap 18.4; Jo 8.59) ou origem (Ap 9.3; 14.13,15,17; 19.5,21). Aqui
279
l J oão - C ap . 2

é o segundo sentido, conforme fica claro a partir da oração seguinte. Compare


com At 20.30.

Não eram de. Vide nota sobre Jo l .46.

Conosco (μεθ’ ήμών). ’Eu ήμΐν, entre nós, estaria mais de acordo com o uso
habitual de João, mas aqui seu pensamento repousa, antes, na comunhão que na
união dos cristãos como um corpo.

Para que se manifestasse (φανίρωθώσιν). Vide nota sobre Jo 21.1.

Não são todos (ούκ eioiv πάι/τες). Tradução mais acertada34. Ao passo que
na bj: nem todos eram, a bp diminui a força da negação pela exclusão de todos·, que
não eram dos nossos.

20. A unção (χρίσμα). O termo tem o significado daquilo com que a unção
é realizada - o unguento ou pomada. No texto do Novo Testamento, ocorre
somente aqui e no versículo 27. A t eb , uma unção. A raiz é a mesma para esse
termo e Χριστός, Cristo. Vide nota sobre Mt l . 1. A unção é da parte do Ungido.

Do Santo. Cristo. Vide Jo 6.69; At 3.14; 4.27,30; Ap 3.7.

Sabeis tudo (οΐδατε πάντα). Os melhores textos trazem πάντες, vós todos co­
nheceis-, caso em que a conexão é com a oração seguinte: “Não escrevi a vocês
porque não conhecem a verdade, mas porque a conhecem’.

21. Não [...]] escrevi (ούκ έγραψα). Vide nota sobre o versículo 13.

22. O mentiroso (ό ψ^ύστης). Essa é a tradução correta: “o mentiroso”; con­


tra a kjv, que traz: um mentiroso. Para uma frase interrogativa similar, vide
5.5. A expressão marca o sentimento vivido com que o apóstolo escreve. Com
o artigo definido, o mentiroso, a mentira é exposta em sua personalidade
concreta: aquele que personifica tudo que é falso, como o anticristo repre­
senta toda forma de hostilidade e oposição a Cristo. A negação de que Jesus
é o Cristo é representativo da falsidade. Ele que o nega é representativo do
mentiroso.

84. Porque reproduz a separação que ocorre no original entre nãoe todos pelo verbo. N esses casos,
de acordo com o uso no texto do Novo Testamento, a negação é universal. A tradução da kjv e
bj, nem todos, torna-a parcial. Observe, por exemplo, lJo 3.15; M t 24.22.

280
1 J oão - C ap . 2

Aquele que nega (ò άρνούμενος). O artigo com o particípio denota a negação


habitual. Literalmente, aquele negando, aquele que habitualmente apresenta essa
atitude em relação a Cristo. Os termos miram a heresia de Cerinto, homem de
descendência judaica e educado na Alexandria. Ele negava a concepção milagro­
sa de Jesus e ensinava que, depois de seu batismo, o Cristo desceu sobre Jesus na
forma de uma pomba e que, depois, Ele anunciou o Pai desconhecido e realizou
milagres; mas que, perto do fim de seu ministério, o Cristo partiu mais uma vez
de Jesus, e este sofreu e levantou da morte, enquanto o Cristo permaneceu im­
passível (incapaz de sofrer) como um ser espiritual.

O Pai. O título o Pai ocorre sempre em sua forma simples nas epístolas. Nun­
ca seu ou nosso Pai, nem o Pai no céu.

23. Não tem o Pai (ούδε τον πατέρα έχει). Apropriadamente: “não tem nem o
Pai”, embora ele professe a reverência pelo Pai enquanto rejeita o Filho. Compa­
re com Jo 8.42.

24. [^Quanto a vocês] (υμείς). Tradução da r v e n v i . O n t ia traz: vós (campo in­


terlinear). A força do enfático vocês, no início da sentença, é totalmente perdido na
a r c , que toma o pronome simplesmente como nominativo para vós ouvistes. Vocês é

enfático pelo contraste com os falsos mestres (v. 22).

Desde o princípio. Vide nota sobre 1.1. Observe a mudança na ordem da


sentença repetida, o que vós ouvistes desde oprincípio: 8 ηχούσατε άπ’ αρχής, aquilo
que vós ouvistes, com a ênfase na recepção da mensagem; δ άπ’ αρχής ήκούσατε,
aquilo que vós ouvistes desde o princípio, enfatizando o tempo da recepção como
coincidente com a origem da fé deles.

No Filho e no Pai. Compare com a ordem reversa do versículo 22. Westcott


afirma: “Aqui o pensamento é de subir através da confissão do Filho para o co­
nhecimento do Pai; lá, o pensamento refere-se ao problema de negar culminando
na negação do Pai”.

25. A promessa (ή επαγγελία). Vide nota sobre At 1.4.

Vida eterna (την ζωήν την αίώνιον). Literalmente, a vida, a eterna (vida).

26. Enganam (πλανώντων). Vide n o t a s o b r e 1 .8 . Na t b , desencaminham.

27. Vós (υμείς). Enfático, como no versículo 24.


281
1 JoAo - C ap . 2

Dele (άπ’ αύτου). Vide nota sobre 1.5.

A sua unção (το αύτοΰ χρίσμα). Essa é a leitura dos melhores textos. A kjv

segue a leitura αύτό: “a mesma unção”.

É verdadeira, e não é mentira. A combinação característica de declaração


positiva e negativa. Vide nota sobre 1.5.

Nele. Cristo.

Permanecereis (μενείτε). Tradução inadequada. Os melhores textos trazem


μένετε, que pode ser tomado como imperativo, permanece, ou como indicativo, per­
maneceis. O indicativo é preferível, como correspondente a μένει,permanece.

28. Quando ele se manifestar (όταν φανερωθη). Os melhores textos trazem 4àv, se,
em lugar de quando. Como na rv, que também transmite a força passiva apropriada
de φανερωθη, se elefor manifestado. Não expressa dúvida em relação aofato, mas in­
certeza quanto às circunstâncias. Acerca de<t>avepÓG), tomar manifesto, vide nota sobre
Jo 21.1. João nunca usa αποκαλύπτω, revelar, para se referir à revelação de Cristo. Na
verdade, nem o verbo nem o substantivo relacionado, άποκάλυψις, ocorrem em seus
escritos, exceto em Jo 12.38, que é uma citação de Isaías, e em Ap 1.1.

Tenhamos. Assim, identifica-o com seus filhos na fé. O professor e também


os alunos permanecem nele.

Tenhamos confiança (σχώμεν παρρησίαν). Na n tlh , coragem. Acerca da ex­


pressão ter coragem, vide 3.21; 4.17; 5.14; Hb 3.6; 10.19; Fm 8. Acerca do termo
παρρησία, coragem, vide nota sobre Jo 7.13; At 2.29. Ele opõe-se, como aqui, a
α ίσ χύ νο μ α ι, ser envergonhado, em Pv 13.5, onde a lxx apresenta: “um homem
perverso é envergonhado (αίσχύνεται) e não terá coragem (παρρησίαν)”. Também
em Fp 1.20. Compare com 2Co 3.12. A ideia de fala livre e aberta está no fundo
do vocábulo: ir diante do tribunal de Deus sem nada a esconder. O pensamen­
to é incorporado na confissão geral do Livro comum de oração: “Não devemos
dissimulá-los nem escondê-los diante da face do Deus todo-poderoso, nosso Pai
celestial, mas confessá-los”. Como no hino de John Wesley:

Jesus, teu sangue e justiça,


Minha beleza é, minha gloriosa vestimenta;
Em meio a mundos incendiados nesta ordem
Com alegria levanto a cabeça.

282
1 J oão —C ap. 2

Destem ido possa eu permanecer em teu grande dia,


Para que nada se me possa acusar.
Totalmente absolvido através destes estou
D o pecado e medo, da culpa e vergonha.

Não sejamos confundidos por ele (αίσχυνθώμεν απ’ αύτοΰ). A expressão


é peculiar. Literalmente, “não sejamos envergonhados distantes dele”. Na t e b :
cobertos de vergonha, longe dele. O pensamento fundamental é de separação e afas­
tamento de Deus por causa da vergonha da consciência de culpa. Encontramos a
mesma construção na l x x . I s 1.29: “Porque vos envergonhareis pelos carvalhos”.
Jr 2.36: “Também do Egito serás envergonhada, como foste envergonhada da
Assíria”. Jr 12.13.

Vinda (παρουσία). Literalmente, presença. Conforme em 2Co 10.10. Daí a presen­


ça de alguém vindo, e, assim, sobretudo no texto do Novo Testamento, vinda futura
e visível de nosso Senhor para ressuscitar os mortos, julgar o mundo e, finalmente,
estabelecer o reino de Deus. O vocábulo não ocorre em outras perícopes de João, e
ele tampouco usa επιφάνεια, o termo usado por Paulo para o mesmo evento.

29. Se sabeis - sabeis (εάν είδήτε - γινώσκετε). Se você sabe absolutamente que
Ele é justo, você percebe que todo aquele etc. Vide nota sobre Jo 2.24·. Vocêpercebe
pode ser tomado como imperativo: perceba ou saiba.

Justo (δίκαιος). Usado por João para Deus e para Cristo. Para Deus, lJo 1.9;
Jo 17.25; Ap 16.5; para Cristo, lJo 2.1; 3.7; Compare com At 3.14; 7.52; 22.14.

É nascido dele (4ξ αύτοΰ γεγεννηται). Na r v , gerado. Primeira ocorrência da


expressão na epístola. Os intérpretes diferem quanto à referência a ele, alguns o
relacionam com Deus, e outros, com Cristo. Contra a última interpretação está o
fato de que não é dito que os homens nascem de Cristo, mas de Deus-, e o fato de nas­
cido de Deus ser uma expressão característica de João, enquanto nascido de Cristo é
uma expressão que não ocorre em nenhuma passagem. Por sua vez, a indubitável
referência a Cristo no versículo 28 podería parecer exigir uma referência seme­
lhante aqui. Diz-se que os homens permanecem em Cristo e também em Deus e
são nascidos do Espírito. O comentário de Westcott é pertinente.

Quando João pensa em Deus em relação aos homens, ele nunca pensa nele à parte de
Cristo {vide lJo 5.20) e, mais uma vez, ele nunca pensa em Cristo em sua natureza
humana sem acrescentar o pensamento de sua natureza divina. Assim, é possível uma
rápida transição de um aspecto da pessoa humana-divina do Senhor para outro.

283
1 João - Cap. 3

Capítulo 3

1. Vede (ΐδετε). Literalmente, vede vós. O plural é peculiar. A forma usual é o


singular ’ίδε ou ιδού. Vide Jo 1.29; 4.35; 11.3; 19.26-27. Em outras passagens, o
plural é usado para alguma coisa realmente visível (G1 6.11).

Quão grande (ποταττην). O vocábulo é de rara ocorrência no texto do Novo Tes­


tamento, mas é encontrado em todos os Sinópticos e em 2Pe S.ll. Somente aqui
nos escritos de João. O significado original é de quepaís ou raça, depois, de que tipo ou
qualidade. É usado para qualidade de pessoas e coisas. Compare com bj, queprova de.

Tem concedido (δύδωκεη). Enfatiza a doação do receptor. Compare com


χαρίζομαι, de χάρις, graça, favor, que enfatiza a boa-vontade do doador. Vide
G1 3.18; Fp 2.9; 1.29.

Que (iva). Vide notei sobre Jo 15.13.

Fôssemos chamados (κληθώμεν). Ou, nomeados. Como Mt 2.23; 21.13;


Lc 1.13,31 etc. O verbo nunca é usado por João para o chamado divino. Em
Jo 10.3, em lugar de καλά., chama, leia φωηεΐ.

Filhos (τέκνα). Vide nota sobre Jo 1.12.

[Έ tal nós somos]] (και έσμεν). Tradução da r v , acrescentada de acordo com


os melhores textos. Literalmente, e nós somos. Na t b , b j , t e b , e nós o somos. Um
comentário parentético e refletivo característico de João. Vide nota sobre 1.2.

2. Amados. Vide 2.7.

Agora somos £...]] e etc. Os dois pensamentos da condição presente e futura dos
filhos de Deus são postos lado a lado com a simples conexão e como partes de um único
pensamento. A condição cristã, agora e eternamente, centra-se no fato de serem filhos
de Deus. Nesse fato repousa o germe de todas as possibilidades de vida eterna.

Ainda não é manifesto (οΰπω εφανερώθη). Na n v i , mais corretamente, ainda


não se manifestou. Vide nota sobre Jo 21.1. A força do tempo aoristo é: nuncafo i
manifestado em qualquer ocasião.

O que havemos de ser (τί εσόμεθα). Segundo Bengel: “Esse o que sugere algo
indizível contido na semelhança com Deus”.
284
1 J oão - C ap. 3

Mas sabemos. Omita mas.

Quando ele se manifestar (kàv φανερωθη). Na rv, corretamente, se ele (ou


isso)fo r manifestado. Na tb , se ele se manifestar. Podemos traduzir: “se isso for mani­
festado”, ou seja, o que havemos de ser, ou: “se ele’ etc. O termo έφανερώθη que pre­
cede, (ainda não) é manfesto, deve, penso, fazer-nos decidir em favor da tradução
isso. Agora, somos filhos de Deus. Não foi revelado o que havemos de ser e, por
esta razão, não o sabemos. Na ausência dessa revelação, sabemos (por intermédio
de nossa consciência de filiação, de sua promessa de que contemplaríamos a sua
glória) que, o que devemos ser foi manifesto, o fato essencial da condição de glori-
ficado, assim, revelada será a semelhança ao Senhor. Este fato conhecemos agora
como promessa, isto é, a verdade geral de nossa futura condição. A condição
de percepção do fato é a manifestação desse estado glorificado, a revelação do τί
εσόμεθα, o que havemos de ser, pois essa manifestação trará consigo a visão clara do
Senhor. Quando o que havemos de ser for manifestado, isso nos levará a ficar face a
face com Ele, e seremos como Ele porque o veremos como Ele é.

Semelhantes a ele (καθώς εστιν). Estritamente, exatamente como. Na rv,


assim como.

Quanto no Paraísoeterna afesta


Há de ser, tanto o nosso amorvestido
Será deluz emtorno manifesta.
O brilho deudo ardor háprocedido
E o ardor davisão queé tão gozosa,
Quanto aGraça o valor faz mais subido35.

3. E qualquer que [(...3 tem (πας ό εχων). Forma característica de expressão de


João, contendo “uma referência a algum que tinha questionado a aplicação de um
princípio geral em casos particulares”. Aqui, para algumas pessoas que negaram
a obrigação prática da pureza moral envolvida em sua esperança. Vide versícu­
los 4,6,9-10,15,23,29; 4.7; 5.1,4,18; 2Jo 9.

Nele (επ’ αύτώ). Ambíguo. Melhor, como n a rv, posta sobre ele.

Esperança. A única referência de João à esperança cristã. A frase usada aqui,


ter a esperança sobre si, é única no texto do Novo Testamento. Compare com επ’
αύτώ έθνη ελπιοΰσι.ν, "sobre ele os gentios colocarão a sua esperança” (Rm 15.12);

85. Dante, A Divina Comédia, Paraíso, xiv, S7-42, p. 81.

285
1 J oão - C ap. 3

ήλπίκαμεν 4π'ι Θεώ ζώντι, “esperamos sobre ο Deus vivo” (iTm 4.10). Acerca da
força de εχων, vide nota sobre Jo 16.22.

Purifica-se a si mesmo (αγιάζει, εαυτόν). Acerca do verbo, vide nota sobre


lPe 1.22; Tg 4.8. Na lx x , é usado só para purificação cerimonial, bem como em
quatro das sete circunstâncias em que ele ocorre no texto do Novo Testamento
(Jo 11.55; At 21.24,26; 24.18). Nos casos restantes, sobre purificar o coração e
a alma (Tg 4.8; lPe 1.22). O adjetivo relacionado αγνός, puro, tem um sentido
moral em todas as ocorrências, como também tem o substantivo άγνότης, pureza
(somente em 2Co 6.6). O termo άγνισμός, purificação (somente em At 21.26),
cerimonial.

Ele (εκείνος). Cristo, como sempre na epístola.

Puro (αγνός). Vide nota acima. Embora marcando pureza moral e espiritual, e
de grande valor, uma vez que, aqui, o vocábulo é aplicado a Cristo, admite, toda­
via, o pensamento de possível tentação ou contaminação diferindo, desse modo,
de άγιος, que quer dizer absolutamente santo. Por esse motivo, αγνός não pode ser
adequadamente aplicado a Deus, que é άγιος; mas ambos podem ser usados para
Cristo, Ele em virtude de sua perfeição humana.

4. Qualquer que pratica o pecado (πας ό ποιων την αμαρτίαν). Na n v i , de forma


melhor, todo aquele quepratica opecado. Vide nota sobre o versículo 3, e qualquer que
tem, e observe a repetição frequente dessa forma de expressão no presente capítulo.
Compare com πας ò άμαρτάνων, qualquer que vive pecando (v. 6). A expressão prati­
car opecado vê o pecado como algo realizado em sua plenitude. Aquele que pratica o
pecado realiza o pecado em ações (observe o artigo την), o que inclui e representa o
ideal completo de pecado. Compare com pratica ajustiça, em 2.29.

Também pratica iniquidade (και την ανομίαν ποιεί). Tradução mais acura­
da; contra a kjv , também transgride a lei. Compare com M t 13.41, e com a expres­
são οί εργαζόμενοι την ανομίαν, vós que praticais a iniquidade (Mt 7.23).

Porque (κα'ι). Na tb , corretamente, e. Essa oração e a precedente são coorde­


nadas segundo a maneira de João.

É iniquidade (εστίν ή ανομία). Tradução correta; contra a kjv, é a transgres­


são da lei. O pecado é a violação da lei de nosso ser, a lei que inclui nossa relação
tripla com Deus, com os homens e fatos a nossa volta e a nós mesmos. Compare
com T g 1.14; 4.17.

286
1 J oão —Cap. 3

5. Sabeis. Apelo característico de João ao conhecimento cristão. Compare com


2.20-21; 4.2,14,16; 5.15,18; 3Jo 12.

Ele (εκείνος). Cristo, como sempre nessa epístola. Vide nota sobre Jo 1.18.

Se manifestou. Vide nota sobre Jo 21. l . Incluindo toda a vida de Cristo na terra
e suas consequências. Aqui, a ideia de manifestação assume o fato de uma existência
anterior. João usa vários termos para descrever a encarnação. Ele concebe-a com
referência ao P a i, como um envio, uma missão. Daí ό πέμψας pe, aquele que me enviou
(Jo 4.34; 6.38; 9.4; 12.44 etc.); ό πέμψας με πατήρ, o P a i que me enviou (Jo 5.37; 8.18;
12.49 etc.); com o verbo αποστέλλω, en viar como enviado, com uma comissão; Deus
enviou (άπέστειλεο) seu Filho (Jo 3.17; 10.36; lJo 4.10; compare com Jo 6.57; 7.29;
17.18). Com referência ao Filho, como um vindo, considerado como um fato histórico
e permanente. Como evento histórico, E le veio (ήλθεν, Jo 1.11); este é aquele que veio (ò
ελθών, lJo 5.6). Vim (έξήλθον, Jo 8.42; 16.27-28; 17.8). Como algo perm anente em seus
efeitos, vim , veio, é vindo, marcado pelo tempo perfeito: a lu z é vinda (έλήλυθεν, Jo
3.19). Jesus Cristo ê vindo (εληλυθότα, 1Jo 4.2). Compare com Jo 5.43; 12.46; 18.37.
Em duas ocorrências com ήκω, vim, Jo 8.42; lJo 5.20. Ou com o tempo presente,
como descrevendo a vinda realizada naquele momento, daí vim (έρχομαι, Jo 8.14);
compare com Jo 14.3,18,28; também Jesus C risto veio (ερχόμενον, 2Jo 7). Com refe­
rência àform a: na carne (σάρξ). Vide Jo 1.14; lJo 4.2; 2Jo 7. Com referência a homens,
Cristo f o i m an if*estado (lJo 1.2; 3.5,8; Jo 1.31; 21.1,14)*®.

Para tirar (ίνα αρη). Vide nota sobre Jo 1.29.

Nossos pecados (τάς αμαρτίας ημών). Omita ημών, nossos. Compare com
Jo 1.29, την αμαρτίαν, o pecado. Aqui, o plural considera tudo que está contido
no termo inclusivo o pecado, todas as manifestações ou realizações de pecado.

Nele não há pecado (αμαρτία έν αύτφ ούκ εστιν). Literalmente. Ele é essen­
e p a ra sempre sem pecado. Compare com Jo 7.18.
cialm ente

6. Permanece. Compare com Jo 15.4-10. P e rm a n e c e re m Cristo é mais do que


estar nele, uma vez que representa uma condição mantida pela comunhão com
Deus e pela prática habitual de sua vontade. Vide nota sobre 2.6.

Não vive pecando. João não ensina que os cristãos não pecam, mas se refere
a um caráter, um hábito. D o começo ao fim da epístola, o apóstolo lida com a rea­

se. Estou em dívida com o Cônego Westcott quanto ao conteúdo dessa nota.

287
1JoAo - Cap. 3
lidade ideal da vida em Deus, em que o amor de Deus e o pecado excluem um ao
outro como a luz e as trevas se excluem mutuamente.

Viu - conheceu. A visão de Cristo e a apropriação do que é visto. A tradução


por conheceu está adequada.

7. Filhinhos. Vide nota sobre 2.1.

Engane (πλανάτω). Na tb, melhor, desencaminhe. Vide nota sobre 1.8.

Pratica justiça. Vide nota sobre o versículo 4, e compare com 2.29. Observe o
artigo την, a justiça, em sua completude e unidade. Não apenas praticando atos
justos. Platão afirma: “Em sua relação com os outros homens, ele pratica o que é
justo; e em sua relação com os deuses, ele pratica o que é santo; e ele que pratica
a justiça e a santidade não pode ser nada além de justo e santo”.

8. Do diabo. Vide nota sobre 2.13. Compare com Jo 8.44. Agostinho registra:
“O Diabo não fez ninguém, não gerou ninguém, não criou ninguém; mas todo
aquele que imitar o Diabo, supostamente, é filho do Diabo, por meio da imitação,
não por ser nascido dele”.

Pecando. O tempo presente indica continuidade. Ele pecou no princípio e


nunca parou de pecar desde o início e ainda peca.

O Filho de Deus. Pela primeira vez na epístola. Até aqui o título foi o F ilh o
ou seu F ilho. Vide nota sobre 1.7.

Desfazer (λύση). Literalmente, dissolver, desprender. Compare com At 27.41;


13.43. Westcott afirma:

As obras do demônio são representadas como contendo determinada consistência e


coerência. Elas mostram um tipo de fronte firme. Mas Cristo, com sua vinda, revelou-
-as em sua completa insubstancialidade. Ele "desfaz” os laços aparentes por meio dos
quais elas são mantidas juntas.

9. Qualquer que é nascido (ιτάς ò γεγ^ννημένος). Acerca da forma de expressão,


vid e nota sobre o versículo 4. Na rv, gerado. O particípio perfeito indica uma con­
dição permanente desde o início: aquele que nasceu e permanece filho de Deus.

Sua semente. O princípio divino de vida.


288
1J oão - Cap. 3
Não pode. Vide nota sobre o versículo 6. A vida em Deus, concebida como um
ideal perfeito, exclui a possibilidade do pecado. Compare com Rm 6, o capítulo
todo.

10. Nisto (ev τούτω). V ide nota sobre 2.3.

Filhos do diabo (τέκνα τοΰ διαβόλου). A única ocorrência da expressão. Com­


pare com At 13.10, e vid e Jo 8.44.

A justiça. Na kjv, falta aqui o artigo; compare com o versículo 7. Justiça não
é considerada em sua completude, mas como carregando um caráter particular.
Seria interessante seguir a mesma distinção entre as seguintes palavras com e
sem o artigo: αμαρτία, pecado-, αγάπη, am or, ζωή, vida·, άλήθίΐα, verdade.

11. Desde o princípio. Fide nota sobre l.i.

Que (ίνα). O p r o p ó s ito s objetivo da mensagem. Fide nota sobre Jo 15.13.

12. Caim que era (Κάϊν ήν). Que não aparece no grego. A construção é irregu­
lar. Literalmente, como na rv , não como C aim era do m aligno.

Matou (έσφαξαν). O verbo ocorre somente em João, e só aqui, fora do Apo­


calipse. Originalmente, matar cortando a garganta; por isso, em Homero, para
rebanho:

Eles insistem em consumir-lhe. (σφάζουσι) ovelhas gordas e reses


que arrastam cascos luzentes37.

O abate das vítimas para sacrifício:

Então depois de orar, e de espalhar farinha,


Destroncam e degolam (έσφαξαν) bois, esfolam touros38.

Assim, em geral, assassinar ou m atar.

Por que causa (χάριν τίνος). Literalmente, p o r conta d e que. Χάριν, p o r causa
de, p o r conta de, em outras passagens, está posto depois do genitivo. Vide Ef 3.1,14;
lTm 5.14; G1 3.19. Na m n , p o r que.

37. Homero, Odisséia, i, 92-93, p. 17.


38. Id., Ilíada, i, 459, p. 57.

289
1João —Cap. 3
13. Irmãos (άδελφοί). A única ocorrência desse modo de tratamento na epístola.

Aborrece (μισεί). Modo indicativo, apontando para o fato como existente: se


o mundo o aborrece, como d e f a to of a z .

14. Nós sabemos. Enfático; nós como distintos do mundo.

Passamos (μεταβεβήκαμεν). Literalmente, temos p a ssa d o sobre.

Da morte (εκ του θανάτου). Literalmente. O artigo marca-a como um das


duas esferas em que os homens devem estar: m orte ou vida. A m orte e a v id a re­
presentam uma dessas contraposições contundentes e características da epístola,
como: amor, ódio-, trevas, luz; verdade, m entira. Ό θάνατος, a m orte, ocorre nas
epístolas de João somente aqui e na oração seguinte. No Evangelho, só em 5.24.
Personificada em Ap 1.18; 6.8; 9.6; 20.13.

Para a vida (εις την ζωήν). Na r v , mais literalmente, p a ra dentro da. Compare
com entrar na vida, em Mt 18.8; 19.17.

Porque. O sin al de ter passado pela vida; não o fu n dam en to.

Amamos os irmãos (άγαπώμεν τούς αδελφούς). A única ocorrência da ex­


pressão. Em outras passagens, a m a m uns aos outros ou am e seu irm ão. V ide nota
sobre 2.9.

Seu irmão. Omita.

15. Homicida (άνθρωποκτόνος). Homicida involuntário. Somente aqui e em


Jo 8.44, em referência ao diabo.

Vida eterna etc. É sugestivo o contraste entre o sentimento incorporado nes­


sa declaração e o do paganismo da Antiguidade a respeito do assassinato, por
exemplo, na era homérica.

Com relação à prática do homicídio, a moralidade grega comum era extremamente


liberal. [...] Entre os gregos, matar um homem era avaliado à luz da má sorte ou, no
máximo, como um erro discreto, quando o perpetrador do ato chegava entre estran­
geiros como fugitivo em busca de proteção e hospitalidade. Portanto, de imediato,
quando o crime ocorria em uma situação difícil, ele permanecería apenas como um
ato de natureza de erro particular ou civil e era considerado uma multa pagável, con-

290
1 J oão - C ap . 3

tudo, não (como podería ser) como um modo falho de atribuir alguma culpa ao réu,
mas como, em geral, uma satisfação justa para os sentimentos feridos dos parentes e
amigos ou como uma compensação real pelos serviços perdidos do homem morto. A
religião da era não toma conhecimento do ato, qualquer que seja ele39.

16. Conhecemos (εγνωκαμεν). Tradução co rreta; c o n tra a kjv, compreendemos.

O amor. A nvi acrescenta: Jesus Cristo-, a t b e ara, Cristo-, a teb e ecp, Jesus.
Omita, como na arc .

Nisto (ev τούτφ). Vide nota sobre 2.3.

Deu a sua vida (την ψυχήν αύτοΰ εθηκεν). Vide nota sobre Jo 10.11.

Nós devemos (όφείλομεν). Vide nota sobre 2.6.

17. Bens do mundo (τον βίον του κόσμου). Na a r a , recursos deste mundo-, na n v i ,
recursos materiais. Βίος q u e r d iz e r aquilo por meio de que a vida é sustentada, recursos,
riqueza.

Vendo (θεωρή). Contempla deliberadamente. Vide nota sobre Jo 1.18. Na rv,

contempla. A única ocorrência do verbo nas epístolas de João.

Necessitado (χρείαν εχοντα). Literalmente, tendo necessidade. Na n v i , em necessidade.

Coração (τα σ π λ ά γ χ ν α ). Vide nota sobre compassivo, lPe 3 .8 . Na rv, muito


melhor, sua compaixão. Na n v i , não se compadecer dele. O vocábulo ocorre somente
aqui em João.

19. D iante dele (έμπροσθεν αύτοΰ). Enfático, com a seguinte ordem: diante dele
asseguraremos nosso coração. Deve-se ter em mente essas palavras como a nota-
chave do que se segue.

Asseguraremos (πείσομεν). Duas traduções são possíveis: o sentido primário


de persuadir (At 1 9 .2 6 ; 1 7 .4 ; 2Co 5 . 1 1); ou o sentido secundário e consequente de
assegurar, tranquilizar, conciliar (Mt 2 8 .1 4 ). Traduza como a arc , asseguraremos.
Na nvi e teb , tranquilizaremos. Vide nota crítica no final do comentário sobre essa
epístola.

39. Gladstone, H o m er a n d the H om eric A ge, ii, 4·36.

291
1 J oão — C ap . 3

20. Sabendo que, se o nosso coração nos condena, maior é Deus etc. Passagem
muito difícil. Vide a nota crítica, como acima. Traduza, como a rv: asseguraremos
nosso coração dian te dele onde quer que nosso coração nos condene, porqu e D eu s é m a io r
do que nosso coração.

Sabendo que (ότι). Não deve ser traduzido como conjunção {pois Γκ,ιν, bjj ,
ou como na arc, mas como relativo, p o r m ais que,
porqu e Γτεβ ] ) , seja em que fo r,
ou onde quer que.

C ondena (καταγι,νώσκί]). Só há três ocorrências do term o no texto do


Novo Testamento: aqui, no versículo 21 e em G1 2.11. Ela significa: (l)
O b s e r v a r d e f o r m a a c u ra d a , em geral, no mal sentido. Daí e x a m in a (Pv
28.11); compare com Aristófanes: “Tendo o b se r v a d o (καταγνούς) os pon­
tos fracos do homem idoso”*0. F o r m a r um p re c o n c e ito d e s fa v o r á v e l co n tra .
Como Heródoto. Dátis diz aos delíacos: “Por que vocês fugiram, ó santos
homens, tendo j u l g a d o - m e ( κ α τ α ,γ ν ό ν τ ε ς κατ’ èpeO) de forma tão pouco
amistosa?”*'. (2) N o t i f i c a r ju d ic ia lm e n te ·, acu sar; a c u sa r-se . Como Tucídi-
des: “Ninguém, quando se aventura em um empreendimento perigoso,
já d ecreto u u m a sen ten ça d e f r a c a s s o p a r a s i m esm o” (καταγνούς 4αυτού μή
irepteoeoGat)42. S e n te n c ia r ou c o n d e n a r. C o n d e n a r à m o rte . “Os que fugi­
ram eles condenaram à m orte” (θάνατον καταγνόντες)*3. D e c id ir um p r o ­
cesso c o n tra a lg u é m . Como Aristófanes: “Vocês, juizes, não têm susten­
to se não d e c id ir e m c o n tra (καταγνώθ€σθ€) este processo”*4. Em G1 2.11,
afirma-se que Pedro, por causa de suas concessões aos rituais judaicos,
κατεγνωσμενος ήν, era c o n d e n á v e l ou a u to c o n d e n á v e l ( t b , co n d en a d o ; a r c ,
re p re e n sív e l; não como na k j v , d e v ia s e r c u lp a d o ). Sua conduta foi sua pró­
pria condenação. Esse é o significado nessa perícope, o ju lg a m e n to in te r io r
d a co n sciên cia.

[Torque]] (ότι). Esse segundo ότι não aparece na arc. É uma conjunção.

M aior (μζίζων). Essa grandeza superior deve ser observada como re­
lacionada ao ju lg a m e n to de Deus ou a sua c o m p a ix ã o ? Se for ao ju lg a m e n to
dele, o sentido é: Deus que é maior que nosso coração e sabe todas as
coisas não só deve e n d o ssa r, mas enfatizar nossa autoacusação. Se nosso

40. Aristófanes, O s C a v a le iro s, 46.


41. Heródoto, vi, 97.
42. Tucídides, iii, 45.
43. Id., vi, 60.
44. Aristófanes, op. cit., 1360.
292
1 J oão - C ap . 3

coração condena-nos, quanto mais Deus que é maior que nosso coração.
Se for a c o m p a ix ã o dele, o significado é: quando nosso coração nos con­
dena devemos o tranquilizar com a certeza de que estamos nas mãos de
um Deus que é maior que nosso coração - que excede o homem em amor
e compaixão e também em conhecimento. Esse último sentido se ajusta
melhor a toda a tendência da discussão. V ide nota crítica. Há um jogo de
vocábulos com γινώσκει, conhecer, e καταγινώσκη, co n d en a r, que não é pos­
sível traduzir.

21. Amados. O tratamento afetuoso é sugerido pelo pensamento precedente da


atormentadora autoacusação.

Confiança (παρρησίαν). Na n t l h , coragem. Vide nota sobre 2.28.

22. Pedirmos (αίτώμεν). Vide nota sobre Lc 11.9.

Dele [...)] receberemos (λαμβάνομεν άπ’ αύτοΰ). Acerca da forma de expres­


são, vid e nota sobre 1.5. Acerca do pensamento, compare com Jo 15.7.

Guardamos (τηραΰμεν). Vide sobre lPe 1.5. Observe a combinação de guardar


e fazer. O discernimento vigilante e a prática habitual. Compare com SI 123.2. A
mesma combinação ocorre em 5.2-3, onde, em lugar do primeiro τηρώμεν, g u a r­
dar, leia ποιώμεν, obedecer.

Agradável (αρεστά). V ide Jo 8.29.

À sua vista (ενώπιον αύτοΰ). Compare com έμπροσθεν αύτοΰ, d ia n te dele, ou na


presença dele (v. 19). A expressão à sua vista, segundo Westcott, “destaca o pensa­
mento da visão divina. Compare com Jo 12.37; e 20.30”.

23. Creiamos no nome (πιστεύσωμεν τφ όνόματι). V ide nota sobre Jo 1.12;


lJo 1.7.

24. Nele está, e ele nele. Bede afirma: “Portanto, deixe Deus ser sua mora­
dia e seja a moradia de Deus, permaneça em Deus e deixe que ele permaneça
em você”.

Espírito. A primeira menção ao Espírito na epístola. Nunca encontrado


acompanhado de S an to nas epístolas nem em Apocalipse.

293
1 J oão - C a p . 4

Capítulo 4

1. Amados. Mais uma vez o reconhecimento do perigo dos falsos espíritos pro­
voca esse tratamento afetuoso. Compare com 3.21.

Provai (δοκιμάζετε). Melhor tradução. Na n v i , examinem. Vide nota sobre


lPe 1.7; Lc 1 2 .5 5 . Compare com a expressão discernir os espíritos, lCo 1 2 .1 0 .

De Deus (εκ). De dentro de·, procedente de.

Falsos profetas (ψευδοπροφήται). No texto do Novo Testamento, o termo é


aplicado aos rivais dos verdadeiros profetas, sob a antiga dispensação (Lc 6 .2 6 ;
2Pe 2 .1 ), e aos rivais dos apóstolos, sob a economia do evangelho (Mt 7 .1 5 ;
2 4 . 1 1;24; Mc 1 3 .2 2 ). Em Apocalipse, “a incorporação do poder da falsidade espi­
ritual” (1 6 .1 3 ; 1 9 .2 0 ; 2 0 .1 0 ). O falso profeta sustenta suas declarações com sinais
e prodígios (Mt 2 4 .2 4 ; At 1 3 .6 ; Ap 1 9 .2 0 ) e, assim, é distinto dos falsos doutores.
VideZPe 2.1, onde os dois termos ocorrem juntos.

Têm levantado (εξεληλύθασιν). O tempo perfeito indica que a influência de


suas falsas missões ainda está em operação hoje.

2. Nisto (ε ν το ύ τ ω ). Vide n o t a s o b r e 2 .3 .

Conhecereis (γ ιν ώ σ κ ε τ ε ). Perceber. Vide nota sobre Jo 2 .2 4 .

Confessa ( ο μ ο λ ο γ ε ί). Vide nota sobre Mt 7 .2 3 ; 1 0 .3 2 .

Que Jesus Cristo veio em carne (Ίησοϋν Χριστόν εν σαρκί έληλυθότα). Li­
teralmente, “Jesus Cristo tendo vindo” etc. Na teb , Jesus Cristo vindo. A frase toda
forma o objeto direto do verbo confessar.

De Deus. Compare com lCo 1 2 .3 .

3.Veio em carne. Omita. Traduza: não confessa Jesus. Como na n v i . Uma leitura
antiga é: λύει τον Ίησούν, “anula” ou “destrói Jesus”. Compare com a n tlh , quem
nega isso a respeito de Jesus. O simples Jesus enfatiza a humanidade do nosso Se­
nhor considerada em si mesma. Vide Rm 3 .2 6 ; 10 .9 ; 2Co 11.4; Ef 4 .2 1 ; Hb 2 .9 .

Este (τούτο). Não esse espírito, mas essa não confissão, resumida em toda sua
manifestação.

294
1 João - Cap. 4

Vir. Vide nota sobre 2.18.

4. Tendes vencido. Vide n o ta sobre 2.13.

Maior. Compare com 3.20.

Em vós. A sociedade cristã. Compare com Jo 6.56; 14.20; 15.4-10; 17.23,26;


G1 2.20 (do indivíduo).

O que está no mundo. Em 5.19, é dito que o mundo está no m aligno. Compare
com Ef 2.2.

5. Do mundo (έκ τού κόσμου). P rocedente do, como sua origem (έκ). Diferente de
έκ τής γης, da terra (Jo 3.31), como marcando toda economia mundana conside­
rada moralmente.

Falam do mundo (έκ τοϋ κόσμου λαλοϋσιν). Tradução ambígua que pode fa­
cilmente ser interpretada como: “Eles falam concernente ao mundo”. Literalmen­
te, é: “Eles falam de dentro do mundo”; ou seja, o caráter de seu pronunciamento
corresponde à origem deles. Na r v , “eles falam como do mundo”. Ao passo que a
n v i traz: o q u e fa la m procede do mundo. A posição de do m undo na sentença é enfá­

tica: “é de dentro do m undo que eles falam”.

6. Aquele que conhece (ò γινώσκων). Literalmente, aquele conhecendo; aquele


que está, habitualmente e cada vez com mais clareza, percebendo e reconhecen­
do Deus conforme sua vida cristã se desenvolve. O conhecimento é visto como
progressivo, e não como completo. Compare com Fp 3.12, e com aquele que está
cham ando (ό καλών, lTs 5.24), e também com ò αγαπών, aquele que am a (v. 7).

N isto (έκ τούτου). Não é igual ao comum èv τούτψ (v. 2). Ele ocorre somente
aqui na epístola. A expressão έν τούτψ significa em isto ou nisto, έκ τούτου, de
isto ou disto. O primeiro assinala a perm an ên cia ou consistência da essência ou a
verdade de uma coisa em algo que a apreensão dela nos transmite a natureza
essencial da própria coisa. A segunda marca a inferência ou dedução da verdade
de algo em contrapartida com sua percepção imediata daquele algo. Na r v , p o r
m eio disto.

O espírito do erro (τό πνεύμα τής πλάνης). A expressão não ocorre em ne­
nhuma outra perícope do Novo Testamento. Compare com πνεύμασ ι πλάνοις,
espíritos enganadores, em lTm 4.1.

295
1 João - Cap. 4

7. De Deus (εκ του Θεοΰ). Flui de Deus.

8. Não conhece (ούκ έγνω). O tempo aoristo: não conheceu, desde o princípio. Ele
nunca conheceu.

E amor (αγάπη έστίν) V ide nota sobre as expressões D eus é lu z (1.5) e a verdade
(1.6); também sobre D eus é espírito (Jo 4.24). E sp írito e lu z são expressões da na­
tu reza essencial de Deus. A m o r é a expressão de sua perso n a lid a d e correspondente
a sua natureza. Vide nota sobre am or de D eus (2.5). Verdade e amor permanecem
relacionados um com o outro. O amor é a condição do conhecimento.

9. Se manifestou. Vide nota sobre Jo 21.1; lJo 3.5.

Para conosco (εν ήμΐν). Tradução inadequada. Não “entre nós”, como em
Jo 1.14, nem “em nós”, mas, como na margem da rv, em nosso caso*6.

Enviou (άπέσταλκεν). João descreve a encarnação mais frequentemente como


um envio que de outra maneira. ’Αποστέλλω é en via r sob comissão, como u m enviado.
O tempo perfeito, tem enviado, aponta para os resultados permanentes do envio.
V ide nota sobre 3.5.

Seu Filho unigênito (τον υιόν αύτοϋ τον μονογενή). Literalmente, seu F ilho, ο
unigênito (Filho). Modo de expressar comum em João, ampliando o significado de
um substantivo pela adição de um adjetivo ou particípio com artigo. Vide 1.2; 2.7-
8,25; 5.4; Jo 6.41,44,50-51; 15.1 etc. Acerca de unigênito, v id e nota sobre Jo 1.14.

10. Propiciação. V ide nota sobre 2.2.

11. Assim (ούτως). Enfático.

Nós devemos. Vide nota sobre 2.6.

12. Deus. Começando a sentença de forma enfática e sem o artigo: Deus como
Deus. “D eus que nenhum homem já viu”. Compare com Jo 1.18.

45. Como Alford e Huther, contra Westcott. Westcott observa, com acerto, que a preposição cv, em,
é usada constantemente no contexto para expressar a presença de Deus no corpo do cristão;
mas é mais comumente usada ali com ykvex, perm anece, versículos 12-1S, 15-16, e a declaração
objetiva: D eus enviou etc., definindo a manifestação do amor de Deus, não se ajusta de forma
natural ao sentido subjetivo sugerido por em nós.

296
1 JoAo —Cap. 4

Dia do Juízo (τή ήμερα τής κρίσεως). Literalmente. A expressão exata ocorre
somente aqui. A expressão ήμερα κρίσεως, d ia de ju íz o , sem os artigos, é encon­
trada em Mt 10.15; 11.22,24; 12.36; 2Pe 2.9; 3.7. O dia é chamado o g ra n d e D ia
da sua ira (Ap 6.17); d ia d a ira e da m anifestação do j u í z o de D eus (Rm 2.5); D ia da
visitação (lPe 2.12); ú ltim o D ia (Jo 6.39-40,44,54); naquele D ia (Mt 7.22; Lc 6.23;
10.12). A expressão o J u ízo é encontrada em Mt 12.41-42; Lc 10.14; 11.31-32.

Porque. A semelhança com Cristo é o fundamento da confiança.

Qual (καθώς). Não no sentido absoluto, mas de acordo com a nossa medida,
como homens neste mundo.

Ele é. O tempo presente é muito relevante. Compare com 3.7: "É justo, assim
como ele é justo”. A essência do nosso ser sendo como Ele é repousa no amor
aperfeiçoado; e Cristo é eternam ente amor. “Quem está em amor está em Deus, e
Deus, nele”. Compare com 3.2.

Neste mundo. Essa economia atual, física e moral. A expressão limita a con­
cepção de semelhança.

18. No amor, não há temor (φόβος ούκ εστιν kv τή αγάπη). Literalmente, tem or
não é. Ele não tem existência. O tem or é aquele falado em lPe 1.17; Hb 12.28;
temor santo; respeito filia l, não temor escravizante, como em Rm 8.15. N o am or,
literalmente, o am or, aquele amor aperfeiçoado do qual João tem falado.

Perfeito (τελεία). Não aperfeiçoado, como no versículo 17 (texto grego),


mas p e rfe ito como resultado de ter sido aperfeiçoado. Compare com Hb 5.14;
T g 1.4; 3.2.

Lança fora (εξω βάλλει). Expressão forte: despeja. O temor é lançado fora da
esfera da comunhão de amor. Vide a expressão em Jo 6.37; 9.34-35; 12.31; 15.6.

Tem £...]] a pena (κόλασιν εχει). A tradução da a r a , tormento, é imperfeita.


O vocábulo tem o sentido de punição, pen alidade. No texto do Novo Testamento,
ele ocorre somente aqui e em Mt 25.46. O verbo relacionado κολάζομαι, p u n ir,
é encontrado em At 4.21; 2Pe 2.9. Observe o tempo presente, tem. A punição
é presente. O temor pela antecipação da punição está presente mesmo agora. A

expressão tem a pen a ( vid e nota sobre Jo 16.22) indica que a punição é inerente
ao temor. O temor carrega sua própria punição. Agostinho, comentando sobre a
expulsão do temor pelo amor, diz:

299
1 J oão - C a p . 5

Vemos, como na costura, o fio passar através da agulha. A agulha é primeiro enfiada
no tecido, mas o fio só pode ser introduzido quando a agulha é tirada. Também o medo
primeiro ocupa a mente, mas não permanece indefinidamente nela porque entrou para
o propósito de introduzir o amor.

As palavras: porqu e o tem or tem consigo a pen a, são parentéticas.

E o que teme. A n v i (aquele que tem medo) omite e (5è), que é importante na
conexão íntima dessa oração com: no amor, não há tem or etc. Aquela é uma decla­
ração abstrata, esta é pessoal; dois modos de afirmar a mesma verdade.

Não é perfeito. Bengel afirma: “A condição dos homens varia, sem temor e
sem amor; com temor sem amor; com temor e com amor; sem temor com amor”.

19. Nós o amamos (ημάς άγαπώμεν αυτόν). Os melhores textos omitem o.


Alguns traduzem por: que nos amemos, ou am em o-nos, como no versículo 7. A
declaração é genérica, relacionando toda a operação do princípio do amor. Todo
amor humano é precedido do amor de Deus e gerado por ele.

20. Quem não ama seu irmão etc. Observe a inversão evidente das orações:
aquele que não am a seu irm ão, a quem tem visto, a D eus, a quem não tem visto, não p o d e
am ar.

Como. Os melhores textos omitem, e apresentam a declaração direta: não p o d e


Como na n v i .
am ar.

21. Que (ϊνα). Não definindo o conteúdo do mandamento, mas expressando sua
intenção. Compare com Jo 13.34, e vid e nota sobre Jo 15.13.

Seu irmão. Agostinho registra:

Para o perseguidor Saulo, Cristo disse: ‘‘Saulo, Saulo, por que me persegues? Ascendí
ao céu, mas ainda repouso sobre a terra. Aqui, sento-me à direita do Pai; lá ainda sinto
fome, sede e sou um estrangeiro”

Capítulo 5

1. Todo aquele que crê (πας ò πι,στ^ύων). Literalmente. Para a forma caracte­
rística da expressão; vid e nota sobre 3.3.
300
1 João - C ap. 5

O Cristo. V ide nota sobre Mt 1.1; lJo 1.7.

2. Nisto ( è v τούτω). Contra a k j v , p o r isto. Não p o r isto, nem a p a r tir de isto, como
uma inferência ( vide nota sobre 4.6), mas no preciso exercício do sentimento em
direção a Deus, nós conhecemos.

Quando (όταν). Sentido mais estrito, sempre que. Nossa percepção da existên­
cia do amor por nosso irmão é desenvolvida em toda ocasião quando exercitamos
amor e obediência em relação a Deus.

Guardamos (τηρώμεν). Leia ποί-ώμ^ν, praticam os. Como na a r a . Vide nota so­
bre Jo 3.21; Do 3.4. A expressão exata uOLeív τάς έντολάς, p ra tic a r os manda­
mentos, ocorre somente aqui. V ide nota sobre Ap 22.14.

3. Pesados (βαρεΐαι). Literalmente. Há seis ocorrências do vocábulo no texto do


Novo Testamento. Nas epístolas de Paulo: At 20.29, ‘lobos cruéis’, fero zes, vora­
zes, 2Co 1 0 . 1 0 , graves, duras (cp. n v i ); M t 23.23; At 25.7, im portante, grave-, o mais
im portan te da lei; g ra ves acusações contra Paulo.

4. Vence (νικά). Vide nota sobre 2.13.

A vitória (ή νίκη). Somente aqui no texto do Novo Testamento.

Que vence (ή νικήσασα). O tempo aoristo, venceu. Acerca da forma cumulativa


da expressão, a vitó ria , que vence, vid e nota sobre 4.9. Aqui, o aoristo tem que ser
mantido em seu significado estrito. A vitória sobre o mundo era, potencialmente,
vencida quando acreditávamos em Jesus como o Cristo, o Filho de Deus. Vence­
mos o mundo ao sermos levados à união com Cristo. Tornando-nos como Ele é
(3.17), tornamo-nos participantes de sua vitória (Jo 16.33). “Maior é o que está
em vós do que o que está no mundo” (4.4).

Nossa fé (πίστι,ς ημών). Πίστις,^?, somente aqui nas epístolas de João e não
no Evangelho. N o s s a fe é abraçada na confissão de que Jesus é o Cristo, o Filho
de Deus. Acerca da questão do uso subjetivo e objetivo de a fé , vide nota sobre
At 6.7.

5. Que vence (ò νικών). O artigo com o particípio denotando o que é habitual,


aquele que leva uma vida de vitória sobre o mundo.

6. Este. Jesus.
301
1J oão - Cap. 5
Aquele que veio (ò έλθών). Refere-se ao fato histórico. Vide Mt 11.3; Lc 7.19;
Jo 1.15,27. Compare, para a forma de expressão, com Jo 1.33; 3.13.

Por água e sangue (δι’ ϋδατος καί αίματος). Διά, por, deve ser tomado com ò
έλθών, aquele que veio. Não tem só o sentido de acompanhamento, mas também de
instrumentalidade, ou seja, por meio do qual. Assim, água e sangue são o meio por
intermédio dos quais Jesus, o Mediador, operou e que, sobretudo, caracterizou a
vinda. Vide, em especial, Hb 9.12: “Vindo Cristo nem por sangue (δι’ αίματος)
de bodes e bezerros, mas por seu próprio sangue (διά δί τοΰ Ιδιου α'ίματος)”. Com­
pare com: “andamos porf i e não por vista’ (διά πιοτί ως ού διά ίϊδους, 2Co 5.7);
esperamos com (literalmente, por meio de) paciência (δι’ ύπομονής, Rm 8.25).
Água refere-se ao batismo de Cristo no início de sua obra messiânica, por meio
do qual Ele declarou seu propósito para cumprir toda justiça (Mt 3.15). Sangue
refere-se a sua morte sangrenta na cruz pelos pecados do mundo.
Outras explicações são substituídas por essa ou combinadas com ela. Alguns
se referem às palavras água e sangue para o incidente de Jo 19.34. Para esse fim,
é justamente objetado que está evidente que esses termos foram escolhidos para
descrever algo característico do cargo messiânico de Cristo, o que não pode ser
dito a respeito do incidente em questão. Todavia, como Alford observa com acer­
to: “negar toda essa alusão parece ir contra a probabilidade. Dificilmente, aqui e
naquela perícope, o apóstolo teria posto essa ênfase evidente na água e no sangue
juntos sem ter em mente algum elo ligando esse lugar e aquele”. Os leitores da
epístola deviam estar familiarizados com o incidente por meio do ensinamento
escrito e oral.
Outros se referem às palavras aos sacramentos cristãos. Contudo, estes, como
Huther observa, são apenas os meios para a apropriação da expiação de Cristo, ao
passo que o assunto aqui é a consumação da própria expiação. Αίμα, sangue, des­
tacando-se por si mesmo, nunca representa a Ceia do Senhor no texto do Novo
Testamento.
O verdadeiro princípio de interpretação parece ter sido estabelecido nos dois
cânones de Düsterdieck. (1) Água e sangue devem apontar para alguns fatos pu­
ramente históricos da vida de nosso Senhor na terra e para alguns testemunhos
ainda presentes de Cristo. (2) Eles não devem ser interpretados simbolicamente,
mas entendidos como algo tão real e poderoso, como aqueles por meio dos quais
o testemunho de Deus é dado para os cristãos, e a vida eterna é assegurada a
eles. Assim, a referência sacramental, embora secundária, não pode ser excluída.
O Cônego Westcott encontra “uma extensão do sentido” de água e sangue nas
seguintes palavras: “Não só na água, mas na água e no sangue”, seguidas da re­
ferência ao testemunho presente do Espírito. Ele argumenta que a mudança das
preposições (ev, em, em lugar de διά, por), o uso do artigo (τφ) e a ênfase sobre a
302
1João - Cap. 5
experiência real (o Espírito ê o que testifica), estes, junto com o fato de que aquilo
que foi falado em sua unidade {por água e sangue) agora é mencionado em suas
partes separadas {na água e no sangue)·.

Tudo mostra que João fala de uma continuação da primeira vinda sob alguma for­
ma nova, mas análoga. A primeira prova do messiado de Jesus repousa em seu
completo cumprimento histórico da obra do Messias de uma vez por todas ao
trazer purificação e salvação; essa prova continua na experiência da igreja em
suas duas partes separadas.

Assim, somos levados às idéias subjacentes aos dois sacramentos.


O assunto iniciado pelo vocábulo sangue é amplo demais para uma discussão
no escopo deste livro. O estudante é dirigido às obras: Dr. Patrick Fairbairn,
Typology o f Scripture·, Andrew Jukes, The Law o f the Offerings·, Professor Wil­
liam Milligan, The Resurreiction o f our Lord (observe p. 274ss.); Cônego Westcott,
“Nota Adicional” sobre lJo 1.7, em seu Commentary on John’s Epistles·, e Henry
Clay Trumbull, The Blood Covenant.

Não só por água (ούκ kv τώ ίίδατι μόνον). Literalmente, não só na água.


Na ntlh , com. A preposição kv, em, marca a esfera ou elemento em que veio; διά,
por, o meio pelo qual. Para a alternância de kv e διά, vide 2Co 6.7. Os vocábu­
los são provavelmente dirigidos contra o ensinamento de Cerinto. Vide nota
sobre 2.22. João afirma que Jesus é o Cristo e que veio pelo sangue e também
pela água.

E o Espírito é o que testifica (καί το πνίΰμά èotiv το μαρτυρούν). Literal­


mente, e o Espírito é aquele que está testificando. Observe o tempo presente, testifica,
e compare com o versículo 9, tem testificado (cp. texto grego). O testemunho é
atual e contínuo na igreja, nos sacramentos, por exemplo, em água e em sangue.
O testemunho é um ofício peculiar do Espírito. Vide Jo 14.26; 15.26; 16.8ss. Vide
nota sobre Jo 1.7.

Porque (ότι). Alguns traduzem por que, como apresentando o conteúdo do tes­
temunho, o que é absurdo: o Espírito testifica que o Espírito é a verdade. O Espírito
é o Espírito Santo, não a vida espiritual no homem.

A verdade (ή άλήθ€ΐα) Da mesma maneira como Cristo é a verdade (Jo 14.6).

7. Três são os que testificam (τράς eloiv οί μαρτυροϋντ^ς). Literalmente, três


são as testemunhas.
303
1J oão - Cap. 5
O Pai, a Palavra e o Espírito Santo; e estes três são um. Esses vocábu­
los são rejeitados pelo veredicto geral das autoridades críticas. Para os detalhes
das memoráveis controvérsias sobre a perícope, o estudante pode consultar as
obras: Frederick Henry Scrivener, Introduction to the Criticism o f the New Testa­
ment, Samuel P. Tregelles, An Account o f the Printed Text o f the Greek New Tes­
tament; John Selby Watson, The Life o f Richard Porson, M. A.; Professor Ezra
Abbot, Orme’s Memoir o f the Controversy on l John v.7; Charles Foster, A New Plea
for the Authenticity of the Text o f the Three Heavenly Witnesses, ou Porson s Letters to
Travis Eclectically Examined, Cambridge, 1867. Sobre a ultima obra mencionada,
Scrivener comenta: “De bom grado a chamaria de sucesso se pudesse fazê-lo com
verdade. Refutar boa parte da argúcia insolente de Porson é fácil, sustentar a
autenticidade dessa passagem é impossível”. Tregelles fornece uma lista de mais
de cinquenta volumes, panfletos ou notícias críticas sobre essa questão. Porson,
na conclusão de suas cartas para Travis, diz:

Em suma, se esse versículo for realmente genuíno, não obstante sua ausência de to­
dos os manuscritos gregos conhecidos, exceto de dois (aquele de Dublin e o forjado,
encontrado em Berlim), um dos quais estranhamente traduz o versículo do latim, e o
outro o transcreve de um livro impresso; apesar de sua ausência de todas as versões,
exceto da vulgata, mesmo de muitos dos melhores e mais antigos manuscritos da
vulgata ; porém, o profundo e mortal silêncio de todos os escritores gregos até o sé­
culo XIII e da maioria dos latinos até o meio do século VIII; se, apesar de todas essas
objeções, ele ainda for genuíno, não se pode provar que nenhuma parte das Escrituras,
seja qual for ela, é espúria ou genuína; e permitiu-se que, por muitos séculos, Satanás
banisse a “magnífica passagem do Novo Testamento”, como a chamava Martinho, dos
olhos e da lembrança de quase todos os autores, tradutores e copistas cristãos.

8. Concordam num (εί,ς το εν εισιν). Literalmente, são para o um. Eles conver­
gem para a única verdade, Jesus Cristo, o Filho de Deus, vindo na carne.

9. Se recebemos (et λαμβώνομεν). O modo indicativo, assumindo essa recepção


como um fato. Se recebemos, como ofizemos. Acerca do verbo receber, vide nota
sobre Jo 3.32.

O testemunho de Deus é maior. Complete mentalmente: e, portanto, devíamos


recebê-lo.

Porque (ott). Explicando, não porque ele é maior, mas porque o princípio da gran­
deza superior do testemunho divino deveria ser aplicado e a ele se deveria apelar
neste caso. Complete mentalmente: e isso se aplica ao caso diante de nós, porque etc.

304
1João - Cap. 5
O testemunho de Deus é este, que (rjv). Os melhores textos trazem ότι, que o u
porque.Traduza: que. E ste é o testemunho de D eus, mesmo of a to de que etc.

10. No Filho de Deus. Fé na pessoa de Cristo, não apenas no f a to d e que Jesus é


o Filho de Deus.

Deus. Também pessoal. Crer em Deus é crer na mensagem que vem dele. Vide
nota sobre Jo 1.12.

Fez —creu (πεττοίηκεν —ττεπίστευκεν). Na k j v , tem feito-, tem crido. O tempo


perfeito marca os dois resultados expressos pelos verbos como ligados a um ato
passado. O ato perpetua-se na condição atual do descrente.

Creu no testemunho (πεπίστευκεν εις την μαρτυρίαν). A expressão ocorre


somente aqui. Vide nota sobre Jo 1.12. Em outro caso, crer em é usado com um
objeto não diretamente pessoal, πιστεύατε είς το φως, mas a referência é clara­
mente ao Cristo pessoal como a lu z do m undo (Jo 12.36).

11. Deu (εδωκεν). A a r c observa o tempo aoristo; contra a k j v , tem dado. A


referência é ao fato histórico da dádiva. Como lJo 3.23: “amar-nos uns aos
outros conforme o mandamento que ele nos deu (εδωκεν)” (cp. b j ). O versí­
culo 24: “nisto conhecemos que ele permanece em nós, pelo Espírito que nos
deu (εδωκεν)” (cp. a r a ). Por sua vez, lJo 3.1: “Vede quão grande amor nos tem
concedido (δεδωκεν) o Pai”. A dádiva de amor reside no fato de que agora somos
filhos de Deus (v. 2).

Vida eterna (ζωήν αί,ώνιον). Compare com as expressões την ζωήν τήν
αιώνιον, a vida, a v id a eterna e ή αιώνιος ζωή, a v id a eterna (Jo 17.3). Para a
distinção entre as expressões, v id e n ota sobre 1.2. A expressão aqui, sem nenhum
dos artigos, define apenas o caráter da vida.

12. Tem a vida (εχει τήν ζωήν). Esse é o sentido mais estrito, a vida, ou seja, a
vida que Deus concedeu (v. 11). Vide nota sobre Jo 16.22. Compare com Cristo,
que é a nossa v id a (Cl 3.4).

O Filho de Deus. Tem o F ilh o, não tem o F ilh o de D eus, aponta de volta para
Deus como o doador de vida em seu Filho. Bengel observa: “O versículo tem
duas orações: na primeira, não se acrescenta de Deus, porque os cristãos conhe­
cem o F ilh o ; na outra, acrescenta-se que os descrentes talvez saibam muito bem
como é sério não o ter”.

305
1JoÂo —Cap. 5
Não tem a vida. Observe a inversão: “Quem tem o Filho tem a vida; quem não
tem o Filho de Deus não tem a vid a ”.

IS. Escrevi (έγραψα). Literalmente. João fala como se rememorasse sua


epístola e relembrasse o objetivo com que a escreveu. V id e nota sobre
2.13.

Saibais (είδήτε). Não perceber (γινώσκειν), mas saber com conhecimento esta­
belecido e absoluto. Vide nota sobre Jo 2.24·.

[(A vocês q u e creem.] Conforme a n v i , na sequência de: escrevi-lhes estas coi­


sas. Na T b , a vós que credes; na a r a , a vós outros que credes. A t b e a r a seguem a
ordem grega (cp. t r ). Os termos, como eterna, acima, são acrescentados como um
pensamento posterior, definindo o caráter das pessoas a quem se dirigem.

Tendes a vida eterna (ζωήν εχετε αιώνιον). A ordem grega é peculiar:


“para que saibais que v id a v ó s ten d es etern a ”. O adjetivo e te rn a é acrescen­
tado como uma ideia posterior. Daí Westcott: “que tendes vida —sim, vida
eterna”.

No nome (εις το δνομα). Vide nota sobre Jo 2.23; 1.12.

14·. Confiança (παρρησία). Na n t l h , coragem. V ide nota sobre 2.28; Jo 7.13. Acer­
ca de ter confiança, v id e nota sobre Jo 16.22.

Pedirmos (αίτώμεθα). Com uma possível referência, na voz média, a pedir p o r


nós mesmos.

Segundo a sua vontade (κατά το θέλημα αύτοΰ). Para a expressão compare


com lPe 4.19; G1 1.4; Ef 1.5,11.

Ele nos ouve (άκούει ημών). Compare com Jo 9.31; 11.41-42. Só João usa ouve
nesse sentido.

15. Tudo o que pedimos. A frase toda é regida pelo verbo ouvir. Se sabemos que
Ele ouviu todas nossas petições.

16. Se alguém vir (εάν τις ϊδη). Um caso suposto.

Seu irmão. Irmão cristão.


306
1J oão - Cap. 5
Cometer pecado (άμαρτάνοντα αμαρτίαν). Literalmente, pecando um pecado.
Não há paralelo exato a essa frase no texto do Novo Testamento. Compare com:
a promessa que ele m s prometeu (cp. r v ), em 2.25.

Não é para morte (μή προς θάνατον). Descreve a natureza do pecado. A pre­
posição para tem o sentido de tendência em direção a, não necessariamente envol­
vendo morte. Vide nota sobre o versículo 17.

Orará (αιτήσει). O tempo futuro não expressa apenas permissão (será permi­
tido que ele peça), mas a certeza de que, como um irmão cristão, ele pedirá.
Sugere-se uma injunção para esse efeito.

Deus dará. Na k jv , ele dará, segundo o texto grego. Pode referir-se a Deus
ou ao pedinte, como o meio de conceder vida por intermédio de sua intercessão,
como em T g 5.20. A primeira explicação é a mais natural. Como na a r c , a r a , bj ,
t e b , entre outras.

[Para ele^) (αύτω). A a r c não traz. Refere-se ao irmão por quem é feita a inter­
cessão. Na TB e t e b , “lhe dará a vida”; na bj , “dará a vida a este irmão”.

Àqueles que [...]] pecarem (τοίς άμαρτάνουσιν). Em aposição com αύτω, para ele.
Deus dará vida para ele (o irmão que errou), mesmopara aqueles quepecaram. O plural
generaliza o caso particular descrito por άμαρτάνοντα αμαρτίαν, pecando um pecado.

Há pecado (έστιν αμαρτία). Tradução melhor; contra a k jv , há umpecado. Um


pecado expressaria um ato específico como tal, como na t e b . Pecado descreve o
caráter de uma classe de ato.

Para morte. A dificuldade da perícope repousa na explicação desses vocábulos.


É impossível determinar seu significado exato. Algumas das muitas explicações
são como se segue: esse pecado que Deus pune com doença mortal ou morte súbi­
ta. Todos esses pecados são punidos com excomunhão (como os antigos teólogos
católicos). Pecado impenitente. Inveja. Condição ou estado pecaminoso. O pecado
por meio do qual o cristão retrocede da vida cristã para a morte. A negação anti-
cristã de que Jesus é o Cristo.
A frase λαβάν αμαρτίαν θανητοφόρον, incorrer em pecado mortal ( a r c , levem
sobre si opecado e morram), ocorre em Nm 18.22, l x x , e a distinção entre pecados
para morte e pecados não para morte é comum nos escritos rabínicos. Contudo,
a expressão de João pode ter sido sugerida por esses escritos, mas não se pode
assumir que eles determinam o sentido em que ele usa a expressão.
307
1 João - C ap . 5

Na passagem, vida e morte devem corresponder. Morte fisica e vida espiritual


não é o que o texto quer dizer aqui. A perícope deve ser interpretada à luz dos
pronunciamentos de João em outras passagens concernentes à vida e à morte.
No versículo 12, ele diz: “Quem tem o Filho tem a vida; quem não tem o Filho de Deus
não tem a vida. Em 3.14-15, ele afirma que passamos da morte para a vida, porque
amamos os irmãos-, que qualquer que aborrece a seu irmão é homicida e que nenhum
homicida tem permanente nele a vida eterna. Esses cânones de interpretação apon­
tam para a explicação, em que algumas das melhores autoridades concordam,
que o pecado para morte não se refere a um ato específico, mas a uma categoria, ou
espécie, de pecados, e a tendência da qual é cortar o elo de comunhão com Cristo.
Por isso, a passagem é a nota-chave de comunhão que impregna a epístola. Qual­
quer interrupção na comunhão entre a alma e Cristo e, por conseguinte, entre o
indivíduo e o corpo de crentes, é para morte, pois não há vida à parte de Cristo.
É, de fato, verdade que essa tendência é inerente a todo pecado. O pecado é es­
sencialmente morte. Mas uma distinção deve ser feita, como observa o Cônego
Westcott, entre os pecados que fluem da imperfeição e fraqueza do ser humano
e os pecados que são manifestações patentes de um caráter afastado de Deus.
“Toda iniquidade é pecado, e há pecado que não é para morte”. No estudo desta
perícope, deve-se plantar cuidadosamente na mente que João está falando de atos
pecaminosos como revelações do caráter, e não apenas de pecados em si mesmos.
Também Huther: “Esse pecado como é caracterizado não pelo objeto ao qual está
ligado, mas pela disposição a partir da qual ele procede”48.

Por esse não digo que ore (ού περί εκείνης λέγω 'ίνα ερώτηση). Literalmen­
te, não concernente a isto digo que ele devafazer pedido. Como na r v . Não é proibido
orar nem mesmo para esse pecado para morte, mas João diz que não ordena isso.
Observe a contundente distinção com que esse pecado terrível é lançado fora pelo
uso do pronome de referência remota e sua posição enfática na sentença. Observe
também as palavras fazer pedido (ερώτηση), e compare com αιτήσει, orará. Acerca
da distinção, vide nota sobre Lc 11.9. Αίτέω, orar, é usado para a petição de um
inferior, e nunca é usado em referência aos próprios pedidos de Cristo para Deus.
Por isso, o uso aqui é apropriado para a humilde e afetuosa petição de um cristão
para Deus em favor de um irmão pecador. Έρωτάω é usado para o pedido de um
igual ou de alguém que pede em termos iguais. Assim, ele pode assinalar um pe­
dido baseado na comunhão com Deus por intermédio de Cristo ou pode indicar
para um elemento de presunção na oração por um pecado para morte. Westcott
cita uma inscrição muito antiga das catacumbas romanas como uma ilustração

48. Um interessante ensaio sobre “O Pecado para Morte”, do Rev. Samuel Cox, D. D., pode ser
encontrado em The Expositor, 2.“ série, v. 1 , p. 416. Ele sustenta o ponto de vista de Bengel de
um estado, ou condição, pecaminoso.

308
1 JoAo - Cap. 5

do uso de έρωτφν no sentido de cristãos orarem por cristãos: έρωτα υπέρ ημών»,
orem p o r nós.

17. Iniquidade (αδικία). Esse é o caráter de toda ofensa contra o que é certo.
Toda quebra de obrigação é uma manifestação de pecado. Compare com 3.4,
onde pecado é definido como ανομία, in iqu idade, e iniquidade, como pecado.
V ide Rm 6.13.

18. Sabemos (ο’ίδαμεν). João usa esse apelo ao conhecimento de duas formas:
sabemos(3.2,14; 5.18-20); sabeis (2.20; 3.5,15).

Aquele que é nascido de Deus (ò γεννηθείς εκ του Θεού). Literalmente, f o i


gerado. Essa frase exata não ocorre em outra perícope. Alguns a relacionam com
o homem que é nascido de Deus, tornando-a um paralelo com ò γεγεννημένος εκ
τού Θεοϋ, ο que é nascido de Deus (lJo 3.9). Outros, a Cristo, o unigênito de Deus.
A última interpretação é preferível.

O maligno (ό πονηρός). Vide nota sobre 2.13.

Toca (άπτεται). Vide nota sobre Jo 20.17, a única outra perícope dos escritos
de João em que ocorre o verbo. Esse verbo e θιγγάνω (Cl 2.21; Hb 11.28; 12.20)
expressam um toque que exerce uma influência modificadora sobre o objeto to­
cado, embora θιγγάνω indique, antes, um toque superficial. Acerca de ψηλαφάω
(At 17.27; Hb 12.18; lJo l.l), vide nota sobre Lc 24.39. Compare com Cl 2.21. A
ideia aqui é: não o agarra.

19. Somos de Deus (εκ του Θεού έσμέν). Para a expressão είναι έκ, ser de, vid e
nota sobre Jo 1.46. Para εσμεν, somos, v id e nota sobre 3.1. João expressa a relação
do cristão com Deus por meio das seguintes palavras: ser nascido ou gerado de
D eus, γεννηθήναι εκ του Θεοΰ (5.1; 2.29; 4.7); denotando a comunicação inicial
da nova vida. S e r de D eus, είναι έκ του Θεοϋ (Jo 8.47; lJo 3.10; 4.6), denota a li­
gação essencial em virtude da nova vida. F ilh o de D eus, τέκνον Θεοϋ (Jo 1.12; lJo
3.1,10), denota a relação estabelecida por meio da nova vida.

Mundo (κόσμος). V ide nota sobre Jo 1.9.

Está (κεΐται). O termo é mais forte que έστί, está, indicando a condição passiva
e não progressiva na esfera de influência de Satanás. Alford registra: “Embora
sejamos de Deus, sugerindo nascimento e procedência e uma mudança de condição,
ο κόσμος, o mundo, todo o resto da humanidade, permanece nas mãos do maligno”.

309
1 JoÂo —C a p . 5

No maligno (εν τφ πονηρώ). Tradução melhor; contra a k jv , m aldade. A ex­


pressão estar no tem paralelo em Sófocles:

εν ύμίν γάρ ώς Θεω


κείμεθα τλάμονες.

Miseráveis nós repousamos em você como em um deus49.

20. Entendimento (διάνοιαν). Somente aqui nos escritos de João. A faculdade


de entender. V ide nota sobre Lc 1.51. Westcott comenta que substantivos que
expressam poder intelectual são raros nos escritos de João.

Para conhecermos (γινώσκομεν). Apreender progressivamente. Compare


com Jo 17.3.

O que é verdadeiro (τον αληθινόν). Compare com Ap 3.7,14; 6.10. Acerca de


verdadeiro, vide nota sobre Jo 1.9.

Deus muito estranha m ente, na verdade, condescende em deixar as coisas claras para
mim, assumindo, de fato, por um tempo, a forma de um homem, para que eu, em minha
modesta esfera, possa vê-lo melhor. Essa é minha oportunidade de conhecê-lo. Essa
encarnação é Deus se fazendo acessível ao pensamento humano —D eus abrindo para
o homem a possibilidade de correspondência por intermédio de Jesus Cristo. E essa
correspondência e esse ambiente são aqueles que busco. Ele mesmo assegura-me: “E
a vida eterna é esta: que conheçam a ti só por único Deus verdadeiro e a Jesus Cristo,
a quem enviaste”. Não discirno agora o sentido mais profundo em Jesus Cristo a quem
enviaste? Não entendo melhor com a visão e arrebatamento mais profundo com que os
discípulos exclamam: “O Filho de Deus veio e nos deu entendimento, para que conhe­
çamos aquele que é o Verdadeiro” Qnvi ] ? 50

Este. Deus Pai. Contudo, muitos ligam ao Filho.

Vida eterna. Vide nota sobre 1.251.

21. Guardai-vos (φυλάξατε εαυτά). A frase exata não se encontra em outras pas­
sagens do Novo Testamento. Vide 2Pe 3.17. V id e n ota sobre lPe 1.4.

49. Sófocles, Antigone, 247.


50. Drummond, Natural Law in the Spiritual World.
51. O estudante fará bem em estudar a “Nota Adicional” do Cônego Westcott sobre essa frase
(Commentary on the Epistles of John, p. 204ss.).

310
Nota C rítica sobre lJo 3.19-22
ídolos (ε’ιδώλων). Estritamente, imagens. Contudo, a ordem tem, aparente­
mente, o significado paulino mais amplo: guardar-se contra tudo que ocupa o
lugar devido a Deus.

Nota Crítica sobre lJo 8.19-22

A segunda grande divisão da primeira epístola de João trata do conflito entre


a verdade e a falsidade. Essa seção estende-se de 2.18 a 4.6 e está subdividida sob
os seguintes tópicos:
1. A revelação dafalsidade e da verdade (2.18-29).
2. Osfilhos de Deus e osfilhos do demônio (3.1-12).
3. Irmandade em Cristo e o ódio do mundo (3.13-24).
4. Os espíritos rivais da verdade e do erro (4.1-6).
Essa perícope repousa na terceira dessas subdivisões, mas a linha do pensa­
mento apresenta-se na segunda subdivisão, que começa com o seguinte capítulo
- osfilhos de Deus e osfilhos do Diabo.
Primeiro, façamos uma breve revisão do conteúdo desse capítulo até o ponto
do nosso texto.
Deus demonstra seu maravilhoso amor ao nos chamar filhos de Deus (τέκνα),
como expressando comunhão de natureza, em vez de uloí {filhos), que expressa a
posição de privilégio.
Assim, o mundo não nos conhece da mesma maneira que não o conhece.
Somos filhos de Deus; e nesse fato repousa encoberto o nosso futuro, a essência
do que será a semelhança com Deus, vindo por intermédio da visão desvelada e
transfigurada.
O resultado dessa relação e esperança é o eforço persistente segundo a pureza
moral. “E qualquer que nele tem esta esperança purifica-se a si mesmo, como
também ele é puro.”
Essa tentativa de purificar corresponde ao cumprimento do nosso verdadeiro
destino, o qual Cristo tornou possível. O pecado é irreconciliável com a correta
relação com Deus, pois o cristianismo enfatiza a lei de Deus e “pecado é iniquida­
de”. O objeto da manifestação de Cristo foi para “tirar os nossos pecados”; por­
tanto, “qualquer que permanece nele não vive pecando”. “Quem pratica justiça é
justo, assim como ele é justo.” “Quem pratica o pecado é do diabo”; mas o Filho
de Deus se manifestou a fim de destruir as obras do Diabo. A semente divina - o
princípio divino de crescimento - a origem da nova vida está no verdadeiro cris­
tão; e a ideia de filiação divina e pecado são mutuamente excludentes.
O ser um filho de Deus manifesta-se não só no praticar a justiça, mas também
no amor —o amor por Deus, tomando forma em amor e ministério para o irmão.
Essa é a mais alta expressão de justiça. Todo o objetivo do evangelho é a criação
311
N ota C rítica sobre lJo 3.19-22
e o fortalecimento do amor; e o tipo de vida em Deus por intermédio de Cristo;
por conseguinte, é o oposto direto de Caim, que sendo do maligno matou seu
irmão.
Contra esse amor está o ódio do mundo. Isto está ligado - como o amor tam­
bém o está —com a questão da origem. Os filhos de Deus compartilham a nature­
za de Deus, a qual é amor. Os filhos do mundo são os filhos do maligno, cuja na­
tureza é a iniquidade e o ódio. O amor é o fruto da vida; o ódio, da morte. Aquele
que não ama permanece na morte. Por nós mesmos, filhos de Deus, sabemos que
passamos da morte para a vida porque amamos o irmão.
Cristo é o tipo perfeito e a revelação do amor, uma vez que Ele deu sua vida
por nós. Nós, do mesmo modo, devemos dar nossa vida pelo irmão. O teste prá­
tico de nosso amor fraternal é o ministério. O amor de Deus não permanece em
nós se nos recusarmos a mitigar a necessidade de nosso irmão.
O fruto do amor é a confiança. “Nisto” - a consciência do amor ativo e sincero
pelo irmão repousa no amor de Cristo e é modelado por ele - nisto, sabemos que
somos da verdade; e, ao saber isso, asseguramos nosso coração na presença de
Deus, em que vivemos, movemos e temos nosso ser. É a exata essência da vida
cristã que é vivida e testada diante de Deus. Nenhuma segurança nem confiança
são possíveis, exceto quando estamos no relacionamento certo com Deus.
Assim, por meio da consciência do amor, que é de Deus e que marca os filhos
de Deus, sabemos que somos filhos de Deus —da verdade; e nesse conhecimen­
to encontramos segurança e confiança diante do tribunal mais elevado mesmo.
“Diante dele asseguraremos nosso coração.”
Isso nos traz para o cerne da nossa perícope. Qual é o caráter específico e a
direção da nossa segurança? Do que estamos confiantes? Aqui, descobrimos as
diferenças na exposição da passagem. As questões separam-se em três:
1. Qual é o sentido de πείσομεν (asseguraremos ou persuadiremos)?
2. Como explicar os dois usos de δτι (que ou porque)?
3. Qual é o sentido de μείζων (maior)?
Essas perguntas estão interligadas de forma que nem sempre é possível sepa­
rar de modo rígido a discussão sobre elas.
Πείσομεν pode ser tomado, ou de acordo com seu significado primitivo, persu­
adir, induzir, prevalecer (At 19.26; 18.4; 2C0 5.11), ou em seu sentido secundário
e subsequente, assegurar, tranquilizar, apaziguar (Mt 28.14).
1. Se traduzirmos por persuadir, dois cursos são possíveis.
(a) Ou o usamos de modo absoluto e suprimos mentalmente alguma coisa
como o conteúdo da persuasão. “E nisto conhecemos que somos da verdade e
diante dele £...]] persuadimos nosso coração.” A mente pode, então, completar:
Persuadimos nosso coração afiicar confiante para perguntar qualquer coisa a Deus.
Objeção. Isso anteciparia o versículo 2 1. “Se o nosso coração nos não condena,

312
N ota C rítica sobre lJo 3.19-22

temos confiança para com Deus; e qualquer coisa que lhe pedirmos, dele a rece­
beremos” etc.; ou:
Persuadimos nosso coração a mostrar amor por meio de nossa vida e ações. Objeção.
Isso não se ajusta à conexão, pois se reconhecemos a nós mesmos por meio do
nosso amor como filhos da fé, então não precisamos mover nosso coração para
amar o que já está lá; ou:
Persuadimos nosso coração que somos da verdade. Objeção. Isso é tautológico. Sa­
bemos, ou percebemos, que somos da verdade por meio do fato do nosso amor.
Por isso, rejeitamos o uso absoluto de TOÍoopev.
(b) Ainda traduzindo por persuadir podemos tentar encontrar a substância
da persuasão nas seguintes orações. Aqui entramos na segunda das nossas três
questões, o duplo ότι, pois δτι torna-se o sinal de definição de toίσομαΛ As dife­
rentes combinações e traduções propostas centram em duas traduções possíveis
para δτι: porque ou que.
Se traduzirmos por porque, isso deixa-nos com o TOÍoopeu absoluto, que já re­
jeitamos. Assim, temos de traduzir: “E nisto conhecemos que somos da verdade e
diante dele asseguraremos nosso coração; porque, se o nosso coração nos condena,
porque (segundo δτι) maior é Deus do que o nosso coração” etc.
Todas as outras traduções, como essa, envolvem o que é chamado de uso de
δτι em epanalepse; o segundo levantando e transportando o sentido do primeiro.
Isso é muito questionável aqui, porque:
1. Não há motivo para isso. O uso de δτι ou de vocábulos correlates só é
apropriado em passagens em que o curso do pensamento é interrompido por
uma sentença —ou parênteses - longa e inserida e na qual a conjunção retoma a
linha do discurso. É totalmente fora de lugar aqui depois da interjeição de apenas
poucas palavras.
2. Não há paralelo para isso nos escritos de João nem em outras perícopes do
Novo Testamento, que eu saiba (mas vide lJo 5.9).
O caso não fica melhor se traduzirmos δτι por que. Aqui, na verdade, livramo-
-nos do TOÍoopev absoluto, mas somos compelidos a concordar com a retomada
de δτι. Por exemplo:
“Devemos nos persuadir de que, se o nosso coração nos condena, que, digo,
Deus é maior do que o nosso coração.”
Além disso, algumas dessas explicações fazem, no mínimo, com que o apóstolo
apresente uma declaração inexata. Suponha, por exemplo, que temos: “Assegurare­
mos nosso coração que Deus é maior que nosso coração”; fazemos o apóstolo dizer
que a consciência do amor fraternal e do nosso consequente ser “da verdade” é a base
da nossa convicção da soberana grandiosidade de Deus. Assim: Έ nisto (em nosso
amor fraternal) conhecemos que somos da verdade e Q..J] nisto asseguraremos nosso
coração que maior é Deus do que o nosso coração, e conhece todas as coisas”.

313
N ota C rítica sobre lJo 3.19-22

O caso não é melhorado se traduzirmos o primeiro ότι por pronominal e ti­


vermos o seguinte texto: “Asseguraremo-nos no quefor que nosso coração nos
condene, que Deus é maior que nosso coração”. Assim, o objeto da persuasão é a
grandiosidade de Deus. O significado da condenação é a ocasião para persuadir­
mos a nós mesmos; a fundação da nossa persuasão da grandiosidade de Deus é
nossa consciência de ser da verdade.
Portanto, concluímos:
1. Que temos que rejeitar toda tradução fundamentada no uso absoluto de
ireíoop eu .
(a) Porque ele deixa a mente concluir algo que o texto nos leva a esperar que
ele complete.
(b) Porque o conceito de persuasão, ou garantia, toma seu caráter da ideia de
condenar ou acusar (καταγινώσκτ)), e se torna vago se o separamos disso.
2. Devemos rejeitar explicações fundamentadas no uso de ότι em epanalepse
pelas razões já apresentadas.
Voltamo-nos, agora, para a tradução adotada pelos revisores do Novo Testa­
mento.
Essa tradução toma o primeiro ότι com kkv como relativo pronominal e o se­
gundo como causai; e fica como se segue:
“Nisto sabemos (ou, mais adequadamente,percebemos) que somos da verdade, e
asseguraremos (ou tranquilizaremos) nosso coração diante dele em qualquer coisa
que nosso coração nos condene (ou acuse) porque Deus é maior que nosso coração
e conhece todas as coisas.”
A única objeção gramatical a essa tradução, à qual é conferida algum peso, é que
a exata frase pronominal ότι èccv não ocorre em outra perícope do Novo Testamen­
to; mas isso é um pouco melhor que nada, uma vez que temos realmente a mesma
combinação sob outra forma, a saber, G1 5.10, όστις kkv (como Lach., West. e H.,
Tisch., Lightfoot), e possivelmente em At S.23, onde Tishc lê ητις kkv. E m Cl 3.17,
Westcott e H., Lightfoot e Ellicott leem ότι èàu (“qualquer coisa que fizerdes por
palavras ou por obras”). Além disso, é confirmado pelo uso frequente de kkv em
lugar deãv depois dos relativos (Mt 5.19; 8.19; 10.42; 11.27; Jo 15.7)52.
Essa tradução introduz a terceira questão: Qual é o sentido ώ pe íζωι> ? Devemos
tomá-lo como indicando julgamento ou compaixão da parte de Deus? Ou seja:
1,°) Devemos amainar a acusação do nosso coração dizendo: “Deus é maior que
nosso coração, portanto, seu julgamento é mais rígido que o nosso e, por isso, à
parte da comunhão com Ele, não temos esperança”; ou, como Meyer coloca:
“Só no amor fraternal consciente tranquilizaremos nosso coração, pois se não
amarmos, nosso coração nos condena, e Deus é maior que nosso coração, e a

52. Vide Moulton, Winer, 2. ed., p. S90.

314
N ota C rítica sobre lJo 8.19-22
consciência acusadora não encontra paz”; ou, mais uma vez, ela é popularmente
interpretada:
“Se nosso coração nos condena, então Deus, que é maior que nosso coração
e conhece todas as coisas, não deve só endossar, mas enfatizar nossa autoacusa-
ção.” Se nosso coração condena, quanto mais Deus condena?
Ou: 2.°) Devemos tomar μείζων como a expressão do amor compassivo de Deus
e dizer: “Quando nosso coração nos condena, o tranquilizamos com a segurança
de que somos os filhos provados de Deus e, por isso, estamos em comunhão com
um Deus que é maior que nosso coração, maior em amor e em compaixão não
menos que em conhecimento”?
A escolha entre esses dois deve ser em grande parte determinada pela tendên­
cia de toda a discussão e, portanto, aqui deixamos o lado textual e gramatical da
questão e prosseguimos para o aspecto homilético da perícope.
Em geral, observamos que toda a tendência do capítulo é consolar e asse­
gurar. O capítulo é introduzido de um entusiasmo repleto de amor. “Vede quão
grande amor nos tem concedido o Pai: que fôssemos chamados filhos de Deus.”
As sombras mais escuras - a origem e a natureza do pecado; a verdade de que
os pecadores são do maligno, o ódio do mundo brotando dessa oposição radical
entre a origem e o motivo dos filhos de Deus e dos filhos do maligno - são acres­
centados para aumentar e enfatizar a posição e o privilégio dos filhos de Deus.
Eles não devem ter dúvidas quanto a sua relação com Deus. Eles são postos para
dar testemunho do supremo amor. Se Deus Pai é amor, e eles são seus filhos, eles
devem compartilhar sua natureza e provar que compartilham ao amar a Ele e
a seus filhos. Por isso, João, em outra passagem, diz: “Amados, amemo-nos uns
aos outros, porque o amor é de Deus; e qualquer que ama é nascido de Deus e
conhece a Deus. Aquele que não ama não conhece a Deus, porque Deus é amor.
£...] Se nós amamos uns aos outros, Deus está em nós, e em nós é perfeito o seu
amor. Nisto conhecemos que estamos nele, e ele em nós, pois que nos deu do seu
Espírito. £../] E nós conhecemos e cremos no amor que Deus nos tem. Deus é
amor e quem está em amor está em Deus, e Deus, nele” (4.7ss.).
E mais uma vez nesse capítulo: “Nós sabemos que passamos da morte para a
vida, porque amamos os irmãos”.
Todo esse testemunho de amor tende a assegurar o coração. Tudo vem à tona
e alcança seu ápice no versículo 19: “Nisto” —no fato do amor e na consciência
dele - “nisto conhecemos que somos da verdade e diante dele asseguraremos
nosso coração; sabendo que, se o nosso coração nos condena”. Em impressio­
nante paralelismo com isso está o capítulo recém-mencionado dessa epístola, o
capítulo quatro, sobretudo a forma em que, como nesse capítulo, a evidência do
amor contribui para assegurar. Vide os versículos de 7 a 16 - a dificuldade dos
quais, conforme observamos, é que o amor é a evidência de nossa permanência
315
N ota C rítica so bre lJo 3.19-22
em Deus; e, depois, observe como isso se depara com a segurança nos versículos
17 e 18. “Nisto é perfeito o amor para conosco, para que no Dia do Juízo (com­
pare com ‘diante dele’) tenhamos confiança (compare com ‘asseguraremos nosso
coração’); porque, qual ele é, somos nós também neste mundo (como Cristo). No
amor, não há temor; antes, o perfeito amor lança fora o temor; porque o temor
tem consigo a pena.”
Agora, havia um motivo muito bom e óbvio para enfatizar esse pensamento
de confiança. João conhecia o temor do coração cristão e, além disso, sabia como
eles ficariam conscientes do alto padrão do caráter cristão, estabelecido nesse
capítulo. Observe estas afirmações: “E qualquer que nele tem esta esperança
purifica-se a si mesmo, como também ele é puro”. “Qualquer que permanece
nele não vive pecando; qualquer que vive pecando não o viu nem o conheceu.”
“Quem pratica o pecado é do diabo.” “Qualquer que é nascido de Deus não vive
na prática do pecado.” Não é difícil conceber o efeito dessas declarações sobre
uma consciência sensível. Testemo-nos. Não precisamos assegurar nosso cora­
ção? Na consciência da insegurança, com a lembrança do erro, sob a pressão e o
impulso da tentação diária, é estranho o coração nos acusar? É estranho levantar
a questão: sou, de fato, filho de Deus? Esses erros e lapsos não me provam que
sou filho do Diabo?
Agora, penso que, em vista desse fato, todos nós devemos ser levados a anteci­
par - como a sequência natural da primeira parte do capítulo - um pensamento,
não de crítica e julgamento severos, baseado no conhecimento infinito de Deus,
mas de compaixão e segurança fraternais com nossas autoacusações e tranquili­
zar nossos medos.
A consciência cristã exerce um cargo judicial em nós, acusando ou aprovan­
do. Nosso coração julga. Mas o que precisamos lembrar especialmente e o que,
parece-me, é exatamente o cerne do ensinamento dessa passagem é que os decretos
do coração não são decisivos, mas devem ser transportados a um tribunal mais alto para
ratificação. Mesmo nosso coração renovado é ignorante e cego. Deus é maior que
nosso coração e conhece todas as coisas. Qualquer poder de discernimento que a
consciência tenha, ela o recebe de Deus. Por isso, na interpretação da passagem,
deve-se dar mais ênfase que comumente às palavras “diante dele”. “Se recebemos
o testemunho dos homens, o testemunho de Deus é maior” (lJo 5.9; vide lJo
5.14, e compare com Hb 4.16). Conforme já indicado, é essencial à ideia da vida
cristã vivida na visão de Deus. O verdadeiro filho de Deus tem sempre o Senhor
diante de sua face. O principal regulador de sua vida é o senso da presença de
Deus. A manifestação de Deus na perfeita obediência de Cristo é seu padrão; a
lei de Deus transmite para sua consciência seu tom de repreensão ou de elogio.
Esse é o resultado natural e necessário da relação assumida na passagem —filhos
de Deus. Como filhos de Deus, na casa de nosso Pai, a vida é regulada pela cons-

316
N ota C rítica sobre lJo 3.19-22
ciência perpétua da presença e do exame de nosso Pai. Nenhuma segurança nem
confiança é possível, se não crescer do correto relacionamento com Ele.
Assim, João, não quer dizer que um filho de Deus não tem pecado em virtude
de sua relação como filho e que sua autoacusação é tranquilizada ao ser pronun­
ciada sem fundamento.
Ele não quer dizer que o coração não o pode acusar justamente. O julgamento
de Deus pode confirmar o julgamento do coração.
Ele quer dizer que o coração não é o árbitro supremo e derradeiro.
A interpretação comum apresenta um defeito radical nisso —ela assume a
infalibilidade do coração e introduz Deus para confirmar e enfatizar a decisão
do coração. Se seu coração o condena, então, Deus, que é maior que seu coração,
condena-o mais severamente porque Ele vê seu pecado sob a luz de sua onisci-
ência. Além disso, isso faz nossa confiança em relação a Deus depender princi­
palmente do testemunho do nosso coração. Se nosso coração não nos condena,
então podemos ir diante de Deus com confiança e pedir o que quisermos, porque
Deus, sendo maior que nosso coração, confirma o testemunho deste. Em suma,
nessa construção, a voz do coração é a voz de Deus. Conforme interpreto isso,
o ensino de João é o inverso disso. Só Deus conhece todas as coisas. Nenhuma
confiança, nenhuma acusação é para ser recebida como final até ser passada dian­
te do Senhor. Devemos procurar fora de nós mesmos os testes mais elevados
do “eu”. Não é diante de nós mesmos que asseguramos ou condenamos a nós
mesmos. A autocondenação não será tranquilizada pela autocomunicação. Não
precisamos estar seguros de nós mesmos, mas ser assegurados por Ele.
E quase desnecessário dizer, mas deve-se ter em mente que esses termos são
dirigidos a cristãos, e isso levanta outra questão interessante - do pecado nos
cristãos. Às vezes, o coração condena de forma injusta e desnecessária. A cons­
ciência, às vezes, está doente e é morbidamente exigente, e o coração fica angus­
tiado com acusações que são tão fantasiosas quanto dolorosas. Mas a condenação
do coração, conforme já foi comentado, com frequência, é justa. Contudo, isso,
e também outros casos, é coberto pelas palavras do apóstolo: “Diante dele asse­
guraremos nosso coração; sabendo que, se o nosso coração nos condena”. Então
seria uma boa pergunta, como, quando Deus endossa a condenação do coração,
asseguramos nosso coração diante dele? E quando o apóstolo mesmo acaba de
nos dizer que “qualquer que é nascido de Deus não vive na prática do pecado”?
- que não pode pecar porque é nascido de Deus? - que aquele que vive pecando
não viu nem conheceu a Deus? Essas declarações, por si mesmas, são terríveis.
Elas destroem toda esperança de segurança. Elas transformam o não ter pecado
no teste de estar em Cristo. Como asseguraremos nosso coração?
Aqui, devemos ser específicos e observar que João - em todo esse capítulo e,
pode-se dizer, em toda a epístola - lida com algo mais abrangente que erros ou

317
N ota C rítica sobre lJo 3.19-22
boas obras específicas. Ele lida com a questão da relação do cristão com Deus.
Observe as classificações contundentes e amplas desse capítulo para esse efeito,
indicando a ordem, ou economia, à qual o homem pertence, em vez de seus atos
específicos.
Quem praticajustiça.
Quem pratica o pecado, em que pecado é uma resposta completa para a justiça
como um todo.
É justo, assim como ele [Deusj éjusto-, é do diabo: em que, em cada caso, é mostra­
do que o caráter do homem é um reflexo de seu mestre espiritual.
Assim também as expressões: “filhos de Deus”; “da verdade”; “da morte para
a vida”. E no capítulo 1: “nas trevas”; “na luz”. Mais uma vez no capítulo 4: “está
em Deus”; “do mundo”; “de Deus”. E mais uma vez, o fato de toda a epístola
girar em torno da questão da relação entre o homem e Deus. Sua nota-chave é
comunhão —“o que vimos e ouvimos, isso vos anunciamos, para que também te­
nhais comunhão conosco; e a nossa comunhão é com o Pai e com seu Filho Jesus
Cristo”.
Isso sendo verdade, os testes aplicados são dirigidos a essa comunhão. “E nis­
to conhecemos que somos da verdade”; que é nossa esfera, nossa origem, nossa
economia. E de acordo com atos específicos são tratados à luz dessa comunhão
geral. Nenhum homem vai sem pecado diante de Deus. Isso é tratado no pri­
meiro capítulo com referência a determinadas desilusões atuais nessa matéria.
Aqueles que mantêm que o pecado é um acidente, e não um princípio, um fenô­
meno transitório que não leva a questões permanentes, são confrontados com:
“Se dissermos que não temos pecado (αμαρτίαν ούκ εχομεν), enganamo-nos a nós
mesmos, e não há verdade em nós”. Aqueles que negam que pecaram pessoal­
mente são confrontados com: “Se dissermos que não pecamos (ούχ ήμαρτήκαμεν),
fazemo-lo mentiroso, e a sua palavra não está em nós”. De forma que, repito, o
exame contemplado aqui é um teste de relação, e não de ato específico. Como
Westcott observa, com verdade: “Enquanto a comunhão com Deus é real” (se um
homem é verdadeiramente nascido de Deus), “os atos pecaminosos são apenas
acidentes. Eles não tocam a essência do ser do homem”. (Compare também com
Westcott, sobre lJo 5.16.) Por conseguinte, quando nosso coração nos condena
do pecado, e aparecemos diante de Deus, nosso asseguramento, ou tranquilidade,
de coração vem por intermédio de Deus nos trazer de volta a essa comunhão
com Ele e, da prova que a acompanha, o amor pelo nosso irmão. Deus ensina o
coração a satisfazer sua autoacusação com o fato e a evidência da filiação. Nisto
asseguramos nosso coração diante dele.
É notável a forma como João exalta e enfatiza a suficiência e determinação
desse teste. “Quem está em amor está em Deus, e Deus, nele.” “Nós sabemos que
passamos da morte para a vida, porque amamos os irmãos.” E no capítulo 4, ele

318
N ota C rítica sobre lJo 3.19-22
é ainda mais enfático, afirmando (v. 12) que o amor pelo irmão é a única prova
possível de amor por Deus, pois “ninguém jamais viu a Deus, se nós amamos uns
aos outros, Deus está em nós, e em nós é perfeito o seu amor”.
Então, o homem considera que seu coração o acusa justamente diante de Deus,
e Ele diz: “É verdade, você pecou. Mas você é meu filho, que provou o ser pelo
seu amor. Eu, seu Pai, não o vou perdoar? Você temeu trazer isso para mim? ‘Se
alguém pecar, temos um Advogado para com o Pai, Jesus Cristo, o Justo, e ele é
a propiciação pelos fseusj pecados’. Se você confessar os seus pecados, sou fiel e
justo para lhe perdoar os pecados e o purificar de toda injustiça”.
Se o homem caminha sob a acusação de amor imperfeito, ele recebe a garantia
de que sua comunhão com Deus não é determinada nem perpetuada pela escas­
sa medida do mais puro amor humano. “Nisto está o amor: não no fato de que
nós tenhamos amado (ήγοπτηκαμεν) a Deus, mas no fato de que Ele nos amou
(ήγάπησβ/, associando seu amor a um ato definido) e enviou seu Filho para pro­
piciação pelos nossos pecados.”
Se a autoacusação é mórbida e infundada, uma singularidade de uma doen­
ça religiosa fantasiosa, em vez de um veredicto verdadeiro de uma consciência
saudável, o testemunho complexo e confuso de nosso coração ignorante é deter­
minado pelo simples testemunho de amor. Sou filho de Deus. Nas mãos de meu
Pai não encontro nenhum encorajamento para continuar em pecado, mas, sim,
o perdão para o meu pecado, com tônicos para minha condição mórbida, com
auxílio para minhas fraquezas. Só por meio dessa sabedoria perfeita, o erro será
convenientemente pesado; só por meio desse amor perfeito, o erro será perdoado;
só por meio dessa força perfeita, a alma será fortalecida para recomeçar sua luta
de uma vida inteira contra o pecado. Se trememos com receio de que as coisas das
quais nosso coração nos acusa sejam a justificativa para sermos deserdados da
nossa posição e privilégio, somos apontados para além de nossos lapsos e erros
passados para o grande e dominante sentimento de nossa comunhão com Deus.
Nós o amamos, amamos nosso irmão, portanto, somos seus filhos; sem dúvida,
filhos falhos, mas ainda seus. Ele deserdará seu filho?
Observe mais uma vez como João encontra conforto no fato da onisciência
do Senhor. Asseguramos nosso coração porque Deus conhece todas as coisas. O
instinto natural de imperfeição é fugir do contato e do exame da perfeição. Mas
esse instinto é falso e equivocado. O evangelho cria um instinto contrário ao
criar uma consciência filial. Se a santidade de Deus envergonha nossa pecami-
nosidade e a sabedoria perfeita de Deus tolhe nossa insensatez, a perfeição, não
obstante, é o único refúgio seguro para o imperfeito. Nenhum homem quer ser
julgado diante de um juiz ignorante ou corrupto. Se esse conhecimento onis­
ciente vê mais fundo em nosso pecado que nós mesmos somos capazes de ver,
ele também vê mais fundo em nossa fraqueza. Se ele pesa o ato em uma balança

319
N ota C rítica sobre lJo 3.19-22
escrupulosamente equilibrada, ele pesa as circunstâncias na mesma balança. Se
esse conhecimento infinito conhece nossas faltas secretas, também, da mesma
maneira, conhece nossa estrutura e nossa fragilidade. Se ele discerne agrava­
mentos, também distingue paliativos. Se a sabedoria infinita circunda o pecado,
também o amor infinito o faz. Ali, misericórdia e verdade encontram-se, e justiça
e paz tocam-se.
Assim, asseguramos nosso coração diante dele por mais que nosso coração
nos condene. Não com segurança soberba de superioridade moral, não com
percepção intoxicada e embotada pela abjeção do pecado, não com um elixir
que relaxa nossa fibra espiritual e modera nosso entusiasmo pela vitória es­
piritual, porém com o pensamento de que somos filhos de Deus, amorosos,
embora falhos, nas mãos do nosso Pai; com nosso irmão mais velho, Cristo,
intercedendo por nós; com o conhecimento de que o elemento judicial em
nossa experiência cristã é transferido do nosso coração para Deus; com o
conhecimento de que, sendo dele: “nem a morte, nem a vida, nem os anjos,
nem os principados, nem as potestades, nem o presente, nem o porvir, nem a
altura, nem a profundidade, nem alguma outra criatura nos poderá separar
do amor de Deus, que está em Cristo Jesus, nosso Senhor”. Quando li essa
passagem me perguntei se João, enquanto a escrevia, não tinha em mente
aquela conversa de Cristo e Pedro, na praia, após a ressurreição. Lá estava
Pedro com o coração atormentado por causa da autoacusação, como bem
devia está, Pedro que negara a seu Senhor e o abandonara; e, todavia, Cristo
encontra toda essa autoacusação com as palavras: “Amas-me?” E a resposta
de Pedro segue exatamente a veia de nossa passagem: “Senhor, tu sabes tudo;
tu sabes que eu te amo”.
Fundamentada nessa interpretação, o restante da perícope segue simples e
naturalmente. Uma vez assegurados de que somos filhos de Deus, temos con­
fiança em relação a Deus. Essa segurança carrega com ela a segurança de perdão
e empatia, é o único meio por intermédio do qual a condenação do coração é
legitimamente apaziguada. Se, sob essa segurança, nosso coração deixar de nos
condenar, então, “temos confiança para com Deus”. E digno de nota como a li­
nha de pensamento coincide com a da última parte de Hb 4. Lá também vemos
a onisciência divina enfatizada - o discernimento da palavra viva, “viva, e eficaz,
e mais penetrante do que qualquer espada de dois gumes, e penetra até à divisão
da alma, e do espírito, e das juntas e medulas, e é apta para discernir os pensa­
mentos e intenções do coração. E não há criatura alguma encoberta diante dele;
antes, todas as coisas estão nuas e patentes aos olhos daquele com quem temos de
tratar” (vv.12-13). Então, vem o sacerdócio e a empatia de Jesus, o grande sumo
sacerdote, que se “compadece £...] das nossas fraquezas”; e, depois, a mesma con­
clusão: “Cheguemos, pois, com confiança ao trono da graça”.
320
N ota C rítica sobre lJo 3.19-22
Portanto, essa última parte da passagem deve ser interpretada pela anterior.
Aquela de que se o coração não sente nenhum sentimento de condenação não é,
em si mesmo, um fundamento legítimo nem seguro para sentir confiança para
com Deus. Há uma confiança que nasce da presunção, da obtusidade espiritual,
da ignorância do caráter e das declarações de Deus, dos conceitos falsos e super­
ficiais de pecado. Uma ausência de condenação válida deve ter um fato definido e
válido, uma evidência substancial por trás dela; e que, de acordo com a interpre­
tação que demos, ela tem: “Asseguramos nosso coração diante dele em qualquer
coisa que nosso coração nos condene, por intermédio disso, a saber, que o Deus
onisciente é nosso Pai perdoador, que Cristo é nosso Propiciador e Salvador, e
que o Espírito de amor em nossos corações, com o ministério amoroso de nossas
vidas, testificam que somos filhos de Deus”. Observe, nesse ponto, como João
corresponde a Paulo. Olhe primeiro o capítulo 4 dessa epístola: “Se nós amamos
uns aos outros, Deus está em nós, e em nós é perfeito o seu amor. Nisto conhe­
cemos que estamos nele, e ele em nós, pois que nos deu do seu Espírito”. Agora,
volte-se para o capítulo 8 de Romanos: “Portanto, agora, nenhuma condenação
há para os que estão em Cristo Jesus, que não andam segundo a carne, mas se­
gundo o espírito. Porque a lei do Espírito de vida, em Cristo Jesus, me livrou
da lei do pecado e da morte. Porquanto, o que era impossível à lei, visto como
estava enferma pela carne, Deus, enviando o seu Filho em semelhança da carne
do pecado, pelo pecado condenou o pecado na carne, para que a justiça da lei se
cumprisse em nós, que não andamos segundo a carne, mas segundo o Espírito.
Porque os que são segundo a carne inclinam-se para as coisas da carne; mas os
que são segundo o Espírito, para as coisas do Espírito. Porque a inclinação da car­
ne é morte; mas a inclinação do Espírito é vida e paz. Porquanto a inclinação da
carne é inimizade contra Deus, pois não é sujeita à lei de Deus, nem, em verdade,
o pode ser. Portanto, os que estão na carne não podem agradar a Deus. Vós, po­
rém, não estais na carne, mas no Espírito, se é que o Espírito de Deus habita em
vós. Mas, se alguém não tem o Espírito de Cristo, esse tal não é dele. E, se Cristo
está em vós, o corpo, na verdade, está morto por causa do pecado, mas o espírito
vive por causa da justiça. E, se o Espírito daquele que dos mortos ressuscitou a
Jesus habita em vós, aquele que dos mortos ressuscitou a Cristo também vivifi-
cará o vosso corpo mortal, pelo seu Espírito que em vós habita. De maneira que,
irmãos, somos devedores, não à carne para viver segundo a carne, porque, se
viverdes segundo a carne, morrereis; mas, se pelo espírito mortificardes as obras
do corpo, vivereis. Porque todos os que são guiados pelo Espírito de Deus, esses
são filhos de Deus. Porque não recebestes o espírito de escravidão, para, outra
vez, estardes em temor, mas recebestes o espírito de adoção de filhos, pelo qual
clamamos: Aba, Pai. O mesmo Espírito testifica com o nosso espírito que somos
filhos de Deus. E, se nós somos filhos, somos, logo, herdeiros também, herdei-

321
N ota C rítica sobre lJo 3.19-22
ros de Deus e coerdeiros de Cristo”. E, da mesma maneira: “O Espírito ajuda as
nossas fraquezas; porque não sabemos o que havemos de pedir como convém,
mas o mesmo Espírito intercede por nós com gemidos inexprimíveis. E aquele
que examina os corações (sendo maior que o nosso coração e conhecendo todas
as coisas) sabe qual é a intenção do Espírito; e é ele que segundo Deus intercede
pelos santos”. A saber, pelos santos que amam a Deus, predestinados, chamados,
justificados, glorificados. “Que diremos, pois, a estas coisas? Se Deus é por nós,
quem será contra nós? Aquele que nem mesmo a seu próprio Filho poupou, antes,
o entregou por todos nós, como nos não dará também com ele todas as coisas?
Quem intentará acusação contra os escolhidos de Deus? É Deus quem os justifi­
ca. Quem os condenará? Pois é Cristo quem morreu ou, antes, quem ressuscitou
dentre os mortos, o qual está à direita de Deus, e também intercede por nós.
Quem nos separará do amor de Cristo? A tribulação, ou a angústia, ou a perse­
guição, ou a fome, ou a nudez, ou o perigo, ou a espada? Como está escrito: Por
amor de ti somos entregues à morte todo o dia: fomos reputados como ovelhas
para o matadouro. Mas em todas estas coisas somos mais do que vencedores, por
aquele que nos amou. Porque estou certo de que nem a morte, nem a vida, nem os
anjos, nem os principados, nem as potestades, nem o presente, nem o porvir, nem
a altura, nem a profundidade, nem alguma outra criatura nos poderá separar do
amor de Deus, que está em Cristo Jesus, nosso Senhor!”
Finalmente, a perícope inteira carrega um protesto e um antídoto contra um
tipo de piedade introvertida, morbidamente subjetiva, e que examina a si mesma,
que, em geral, estuda o “eu” para a evidência da comunhão e da condição espiri­
tuais corretas; que testa crescimento em graça pela tensão de sentimento e avalia
a latitude e longitude espirituais pela disposição e pelo ânimo espiritual. Senti­
mento e sensibilidade religiosa têm seu lugar, e é elevado e sagrado, mas seu
lugar não é o trono de julgamento; e o sentimento correto na experiência cristã
fundamenta-se sempre na correta relação com os fatos do plano de redenção. A
consciência cristã não dá testemunho válido, salvo quando ele reflete as grandes
verdades objetivas da fé cristã. Se nosso espírito testemunha com. o Espírito, o
Espírito deve, primeiro, testemunhar para o nosso espírito de que somos filhos
de Deus.

322
2 João

1. O ancião (ό πρεσβύτερος). Ο vocábulo é usado originalmente para superiori­


dade em idade. Como Lc 15.25. Mais tarde, passou a ser usado como um termo
de posição ou cargo. Aplicado aos membros do Sinédrio (Mt 16.21; At 6.12).
Aqueles que presidiam as assembléias ou igrejas cristãs (At 11.30; lTm 5.17,19).
Os vinte e quatro membros da corte celestial na visão de João (Ap 4.4,10; 5.5-
6,8,11,14). Aqui, com referência à posição oficial combinada, presumivelmente,
com a idade.

À senhora eleita (εκλεκτή κυρία). Expressão que desconcerta todos os


comentaristas. Alguns supõem que o título descreve uma pessoa, outros, uma
sociedade. As percepções da primeira classe que classifica a expressão como a
pessoa designada são as seguintes: (l) Que a carta foi endereçada a uma certa
babilônia chamada Electa. (2) A uma pessoa chamada Kyria. (3) À Electa Kyria,
nome próprio composto. Os que consideram que a expressão descreve uma
sociedade se dividem em relação à questão: trata-se de uma sociedade cristã
em particular ou toda a igreja. É impossível determinar a questão de forma
satisfatória.

Filhos (τέκνοις). Pode ser tomado literalmente ou espiritualmente. Para o úl­


timo, vide lTm 1-2; G1 4.25; 3Jo 4. Compare também com os versículos 4,13. A
explicação depende do sentido de εκλεκτή κυρία. Caso se dirija à igreja,filhos tem
o significado espiritual. Caso se dirija a um nome próprio tem o sentido literal.

Quais (οΰς). Abrangente, abraçando a mãe e os filhos de ambos os sexos.

Amo (αγαπώ). Vide nota sobre Jo 5.20.


2 João
Na verdade (εν άληθεία). Omita o artigo contraído em na. A expressão em
verdade marca a atmosfera, ou elemento, de verdade em que algo é dito, sentido
ou feito. Vide3o 17.17. Em verdade equivale a verdadeiramente, realmente. Compare
com Cl 1.6; Jo 17.19.

Que t ê m conhecido (ol έγνωκότες). Ou têm vindo a conhecer, ou, como na n v i ,


conhecem. O tempo perfeito de γινώσκω, aprender a conhecer, é traduzido como
presente: tenho aprendido a conhecer, portanto conheço. Vide nota sobre 1Jo 2.3.

2.Que está (την μένουσαν). Na n v i , permanece. Amplia a ideia da verdade·, aquela


que permanece. Vide nota sobre 1Jo 2.6.

Estará conosco (μεθ’ ημών έσται). Conosco tem a posição enfática na senten­
ça: e conosco ela estará. Observe a mudança de está para estará e vide nota sobre
Jo 14.16-17.

3. A graça, a misericórdia, a paz sejam convosco (εσται μεθ’ ημών χάρις


ελεος εΙρήνη). Ο verbo está no tempo futuro: estarão ( t e b ). Nas epístolas paulinas,
as saudações não têm verbo. Em 1 e 2Pe e Judas, usa-se a expressão πληθυνθείη,
sejam multiplicadas. É rara a ocorrência do vocábulo graça (χάρις) nos escritos de
João (Jo 1.14,16-17; Ap 1.4; 22.21); e dos termos relacionados com ele, χαρίζομαι,
ser concedido, perdoar, agraciamento, e χάρισμα, dom, não são encontrados de ma­
neira alguma. Vide nota sobre Lc 1.30. Misericórdia (έλεος) ocorre somente aqui
em João. Vide nota sobre Lc 1.50. As definições pré-cristãs do vocábulo incluem o
elemento de pesar experimentado por causa do sofrimento injustificado de outro.
Como Aristóteles. O termo latino misericórdia (miser, “desgraçado, miserável”;
cor, “o coração”) carrega a mesma ideia. Como Cícero define-a: a tristeza ou pesar
que surge de infelicidade ou tristeza por causa do sofrimento injusto de outra pessoa.
Falando estritamente, o vocábulo quando aplicado a Deus não pode incluir esses
elementos, uma vez q u e d a r não pode ser atribuído a Ele e que o sofrimento é o
legítimo resultado do pecado. O sentimento em Deus assume o caráter de amor
compassivo. Misericórdia é bondade e boa-vontade em relação ao miserável e ao
aflito junto com o desejo de aliviar essa dor. Trench observa:

Na mente divinaena ordemdanossa salvaçãocomo concebida nela, a m isericórdia pre­


cede a graça. Deus amou tanto o mundo comumamor compassivo (no qual estava a
m isericórdia) que Ele deu seuFilho unigênito (nesteag ra ça )paraqueo mundo possaser
salvopor intermédio dele. Mas na ordemda manifestação dopropósito de salvação de
Deus, agraça deve vir antes da misericórdia eabrir caminho para esta. E verdade que
as mesmas pessoas são os sujeitos de ambas, sendo, ao mesmo tempo, as culpadas e as
324
2 J oão

miseráveis; contudo, ajustiça de Deus, tàonecessáriadeser mantidaquanto seuamor,


exige que aculpa seja abolidaantes que amiséria seja aliviada; sóo perdoado podeser
abençoado. Ele temde perdoar antes de poder curar... A partir disso, deduz-se queem
cada uma das saudações apostólicas emque essas palavras ocorrem, a graça precede a
misericórdia1.

Convosco. Os melhores textos trazem conosco. Como na t e b .

Da parte de Deus - da do Senhor Jesus Cristo (παρά Θεοΰ - παρά Ίησοΰ


Χρίστου). Observe a repetição da preposição, salientando a dupla relação com
o Pai e o Filho. Nas saudações paulinas, a preposição άπό, de, é invariavelmente
usada com Deus e nunca repetida com Jesus Cristo. Acerca do uso de παρά, de, vide
nota sobre Jo 6.46; lJo 1.5.

Deus Pai. A expressão mais comum é “Deus, nosso Pai”.

Na verdade e amor. Não encontramos essa combinação em outras passagens.


Os vocábulos indicam o conteúdo de toda a epístola.

4. Muito me alegro. Expressões de alegria agradecida são comuns nas sauda­


ções paulinas. Vide Rm, lCo; Ef; Fp; Cl; lTs; 2Ts; Fm.

Muito (λίαν). Nos escritos de João, o termo só é encontrado aqui e em SJo 3.

Achar (εύρηκα). D e n o ta sobre Jo 1.41. Na ara , ter encontrado.

De teus filhos (εκ των τέκνων). A tradução é obscura. A arc, corretamente,


acrescenta alguns. Compare com Jo 16.17.

Na verdade (εν αλήθεια). Na kjv, seguindo o original: em verdade. Compare


com SJo 3. Vide nota sobre lJol.8.

5. Novo (καινήν). Vide nota sobre Mt 26.29.

Tivemos (ε’ίχαμεν). O apóstolo identifica-se com seus leitores.

6. Amor (ή αγάπη). O amor que acabou de ser mencionado no verbo amemos.

Que (iva). Vide nota sobre Jo 15.13.

1. Trench, Synonyms o f the New Testament.

3 25
2 João
Segundo os seus mandamentos (κατά τάς εντολάς αύτοΰ). Para andar, com
κατά, segundo, de acordo com, vide Mc 7.5; Rm 8.4; 14.15; lCo 3.3; 2Co 10.2. Com
muita frequência com kv, em. Vide Jo 8.12; 11.9-10; 2Co 4.2; lJo 1.7,11. As duas
construções são encontradas em 2Co 10.2-3.

Desde o princípio (άπ’ αρχής). Vide nota sobre Jo 1.1.

Nele (èv αυτή). Em amor, não o mandamento.

7. Enganadores (πλάνοι). Vide nota sobre enganamo-nos a nós mesmos, lJo 1.8.

Entraram no (είσήλθον εις). A rv segue a leitura έξήλθαν, saíram para. O


tempo é o aoristo, traduzido estritamente: saíram. Pode indicar uma crise em
particular, pela qual eles saíram da sociedade cristã.

Os quais não confessam (οί μή όμολογούντες). O artigo com o particípio


descreve o caráter dessa categoria de enganadores e não declara apenas um fato
definido concernente a eles. Compare com Mc 15.41: “muitas outras que tinham
subido comele” (αί συναναβάσαι). Confessam. Vide nota sobre Mt 7.23; 10.32.

Veio (ερχόμενον). Tradução inadequada. O verbo está no particípio presente,


vindo, o que descreve a humanidade de Cristo como ainda sendo manifestada. Vide
nota sobre lJo 3.5. Em lJo 4.2, a manifestação é tratada como um fato passado
pelo tempo perfeito, έληλυθότα, tem vindo. Na rv, que Jesus Cristo vem. Como em
lTs 1.10, τής όργής τής ερχόμενης é a ira que está vindo-, que já começou seu mo­
vimento e está avançando; não apenas, como na ara, a ira vindoura, o que a torna
um evento totalmente futuro. Vide nota sobre tardia, 2Pe 2.3.

O anticristo (ο αντίχριστος). A tradução da arc observa o artigo definido. Ao


passo que na kjv, um anticristo. Vide nota sobre lJo 2.18.

8. Olhai por vós mesmos (βλεπετε εαυτούς ΐνα). A conjunção ΐνα, afim de que,
indica a intenção do aviso. Vide nota sobre Jo 15.13.

Percamos (άπολέσωμεν). Os melhores textos trazem άπολεσητε, vós percais. A


nvi traz: vocês não destruam, a teb, ao contrário: para não perder. Para os significa­
dos do verbo, vide nota sobre Lc 9.25.

Recebamos (άπολάβωμεν). Os melhores textos trazem άπολάβητε, vós recebais.


A preposição composta άπό tem a força de de volta·, recebais de volta de Deus.
326
2 J oão
Galardão (μισθόν). Vide nota sobre 2Pe 2.13, e compare com Mt 5.12; Jo 4.36;
lCo 3.8; Ap 11.18; 22.12.

9. Todo aquele que prevarica (πας ò παραβαίηων). Os melhores textos


trazem προάγων, vai além. Como na t b . Na r v , em nota de margem, toma a
dianteira. O sentido é: todo aquele que avança além dos limites da doutrina cristã.
Outros explicam como aqueles que se instituem como professor ou assumem
a liderança. Esse falso progresso é contrastado com persevera no ensino. Acer­
ca da construção, πας, cada um, com o artigo e o particípio, vide nota sobre
lJo 3.3.

Persevera —na (μενών εν). Vide nota sobre 1Jo 2.6.

Doutrina (διδαχή). Melhor, como na nvi, ensino.

De Cristo. Não o ensino concernente a Cristo, mas o ensino de Cristo mesmo


e de seus apóstolos. Vide Hb 2.3. Também de acordo com o uso do Novo Testa­
mento. VideSo 18.19; At 2.42; Ap 2.14-15.

Na doutrina de Cristo. Omita de Cristo. Assim, διδαχή, doutrina, é usado ab­


solutamente, Rm 16.17; T t 1.9.

10. Se alguém vem (εϊ τις ’έρχεται). O indicativo assume o fato: se alguém vem,
como existem os que vêm. Vem é usado em um sentido oficial, como em referência
a um mestre. Vide nota sobre lJo 3.5.

Traz (φερει). Para o uso do verbo, vide Jo 18.29; At 25.18; 2Pe 2.11; 1.17-18;
lPe 1.13.

Tampouco o saudeis (κα'ι χαίρειν αύτω μή λέγετε). Literalmente: e não digais


a ele “saudações!". Χαίρειν, regozijar-se, saudar, era a forma costumeira de sau­
dação. Também era usada nas despedidas, mas, no texto do Novo Testamento,
sempre é usada para saudação (At 15.23; 23.26; Tg l.l)*. “Agora aquele que vem
e te ensina todas essas coisas, antes ditas, recebe-o; mas, se o próprio professor
se desvia e ensina outro ensinamento, como se para aboli-las, não o ouve.”3 Vide
nota sobre Mt 10.10.

2. Lightfoot traduz χαίρετε por despedida, emFp S.i, edescreve otermo comouma bênção de des­
pedida em4.4; mas, nos dois casos, dizqueotermoinclui umaexortaçãoaoregozijo. A despedida
édesnecessárianos dois casos.
3. Ensinamento dos Doze Apóstolos, cap. xi.

327
2 JoAo

11. Tem parte (κοινωνεΐ). O verbo não ocorre em nenhuma outra perícope dos
escritos de João. O substantivo relacionado κοινωνία, sociedade, comunhão, é pe­
culiar à primeira epístola. Vide nota sobre lJo 1.3; também sobre companheiros
(Lc 5.10); comunhão (At 2.42); participante (1 Pe 5.1).

12. Não quis (οόκ έβουλήθην). Vide nota sobre Mt 1.19.

Papel (χάρτου). Somente aqui no texto do Novo Testamento. O papiro egípcio


ou byblos, Cyperus papyrus, muito comum antigamente, mas não encontrado den­
tro dos limites do país. É uma espadana, ou junco, comprido e liso com um caule
triangular largo, contendo a seiva que fornecia o papel. O papel era fabricado
cortando a seiva em tiras, arranjando-as horizontalmente e, depois, pondo sobre
elas outra camada de tiras na posição vertical, unindo as duas camadas com uma
pasta e pondo todas as duas camadas sob pesada pressão. A porção superior e a
mediana do junco eram usadas para esse propósito. O fato de a planta não ser
mais encontrada é relevante em conexão com a profecia de Isaías de que “as canas
e os juncos (heb. süph fpo J , papiro) se murcharão” (Is 19.6). A planta crescia na
água rasa ou no pântano e está adequadamente representada nos monumentos,
ao lado de um rio ou em terras irrigadas4. Os judeus escreviam sobre vários
materiais, como folhas de oliveira ou de palma, na casca da romã e em peles de
animais. As tábuas (πινακίδιον, Lc 1.63) eram de uso muito comum. Elas con­
sistiam de pequenos pedaços de madeira, unidos e aplainados, ou cobertos com
papiro ou cera.

T inta (μελανός). Literalmente, aquilo que épreto. Só há uma ocorrência da pa­


lavra fora das epístolas de João (2Co 3.3) e há apenas três ocorrências ao todo
(2Jo 12; 3Jo 13). A tinta era preparada com ferrugem ou substância vegetal ou
mineral. Goma e ácido sulfúrico também eram usados. Empregavam-se também
tintas coloridas, vermelha e dourada5.

Ir te r convosco (γενέσθαι προς ύμάς). Ou estar convosco. Para a expressão, vide


lCo 2.3; 16.10.

Boca a boca (στόμα προς στόμα). Literalmente. Compare com πρόσωπον προς
πρόσωπον,/αοε aface, lCo 13.12.

Cumprido (πεπληρωμένη). Tradução correta; contra a t b , ara, entre outras,


completo(a). Na bj, perfeita (a le g ria ).

4. Paramais detalhes, v id e o artigo “Papiro”, in: E nciclopédia B ritân ica, 9. ed., v. 18.
5. Vide Edersheim, L ife a n d T im es o f Jesus the M essiah, ii, 270.
328
3 João

1. O presbítero. Vide nota sobre 2Jo 1.

Ao amado Gaio. A arc apresenta assim. Na ordem grega, o nome vem pri­
meiro. Gaio, o amado.

Gaio. Há diversas ocorrências do nome no texto do Novo Testamento, como


At 19.29; 20.4; Rm 16.23; lCo 1.14. Não se consegue identificar a pessoa men­
cionada aqui.

Na verdade (év άληθεία). A tb, apropriadamente, omite o artigo: em verdade.


Vide nota sobre 2Jo 4.

2. Amado. Compare com o plural, lJo 3.2,21; 4.1,7,11.

Desejo [...J em todas as coisas (περ'ι πάντων εύχομαι). A arc observa ο


sentido de περί, concernente a. A teb traz: sob todos os aspectos. Na tradução da ara,
acima de tudo, o sentido da preposição é contrário ao uso do Novo Testamento.
Εύχομαι, oro ou desejo, ocorre somente aqui nos escritos de João, e não ocorre,
com frequência, em outras passagens. Vide At 26.29; Rm 9.3; Tg 5.16.

Vá bem (εύοδοΰσθαι). Literalmente, tenha uma jornada próspera. De εύ, bem,


e οδός, um caminho. Nesse sentido original, Rm 1.10. Só há três ocorrências do
vocábulo no texto do Novo Testamento. Vide 1Co 16.2.

Tenhas saúde (ύγιαίνειν). Usado no texto do Novo Testamento com o sen­


tido físico e moral. O primeiro sentido só é encontrado aqui e no Evangelho de
3 João
Lucas. Vide Lc 5.31; 7.10; 15.27. Paulo usa a expressão para sanidade na f i ou na
doutrina. Vide lTm 1.10; 6.3; 2Tm 1.13; T t 2.2. Aqui para a saúde física de Gaio,
conforme alma na sentença seguinte demonstra.

Alma (ψυχή). Vide nota sobre Mc 12.30; Lc 1.46. A alma (ψυχή) é o princí­
pio da individualidade; o alicerce das impressões pessoais. Ela tem um lado em
contato com o elemento material e com o espiritual da humanidade e, por esta
razão, é o órgão mediador entre corpo e espírito. Assim, seu significado levanta-
-se constantemente acima da vida ou da vida individual e assume nuanças de sua
relação com o lado emocional ou com o lado espiritual da vida a partir do fato de
ser o alicerce dos sentimentos, desejos, afeições, aversões e a sustentadora e ma-
nifestadora do princípio divino de vida (πνεύμα). Por conseguinte, o termo ψυχή,
com frequência, é usado em nosso sentido de coração (Lc 1.46; 2.35; Jo 10.24; At
14.2); e os sentidos de ψυχή, alma, e πνεύμα, espírito, ocasionalmente aproximam
muito um do outro. Compare com Jo 12.27 e 11.33; Mt 11.29 e lCo 16.18. Tam­
bém com ambas as palavras em Lc 1.47. Nessa perícope, ψυχή, alma, expressa
a alma vista como ser moral designado para a vida eterna .Vide Hb 6.19; 10.39;
13.17; lPe 2.11; 4.19. João, em geral, usa o termo para denotar o princípio da
vida natural. Vide Jo 10.11,15; 13.37; 15.13; lJo 3.16; Ap 8.9; 12.11; 16.3.

3. Muito £...] alegrei. Vide nota sobre 2Jo 4.

Irmãos vieram (ερχόμενων αδελφών). Literalmente, vindo. O particípio pre­


sente denota vir de tempos em tempos, e não vir em uma única ocasião, o que exigi­
ría o aoristo. Acerca de irmãos, vide nota sobre 1Jo 2.9.

Tu andas na verdade. Vide nota sobre lJo 1.8. Para a expressão andas na, vide
nota sobre 2Jo 6. Tu é enfático, sugerindo um contraste com pessoas menos fiéis,
como Diótrefes, versículo 9.

4. Gozo (χαράν). Os textos variam; alguns trazem χάριν, graça oufavor de Deus,
acerca do que vide 2Jo 3. Observe a ordem grega: maior gozo do que este tenho não.

Meus filhos (τα εμά τέκνα). Literalmente, meus própriosfilhos.

Andam (περιπατοΰντα). A nvi, corretamente, andando. O particípio expressa


algo habitual.

5. Procedes fielmente (πιστόν ποιείς). Na rv, fa z e s um trabalhofiel. Uma terceira


interpretação é: deste um penhor ou garantia, e uma quarta, semelhante a essa:
330
3 J oão
garantes. A tradução da rv é a melhor. Não há paralelo para justificar a terceira e
a quarta interpretação1.

Fazes (εργάση). Ou, literalmente, de acordo com a etimologia, trabalhas (εργον,


trabalho). Vide nota sobre Tg 2.9. A distinção entre esse verbo e os outros com o
significado de fazer, como ποιεΐν, πράσσειν, δράν, dos quais o último não ocorre
no texto do Novo Testamento, não é mantida de forma contundente no grego
ático. Em determinadas ligações, a diferença entre eles é grande, em outras, di­
ficilmente é perceptível. Acerca de ποιεΐν e πράσσειν, vide nota sobre Jo 3.21.
Εργάζομαι, como πράσσεiv, contempla o processo, e não o objetivo do ato, carre­
gando a ideia de continuidade e repetição. Ele quer dizer trabalhar, ser ativo, desem­
penhar, com a ideia de empenho contínuo e, por esta razão, é usado para servos
ou para aqueles que têm um determinado negócio ou ofício. Vide Mt 21.28; 25.26;
Lc 13.14; Jo 5.17; 6.27; 9.4; lTs 2.9. Para a expressão έργάση εις, fazes com res­
peito a (rv), vide Mt 26.10.

E para com os estranhos (και εις τούς ξένους). Os melhores textos trazem,
em lugar de ε ις τούς, para os (estranhos), τούτο, que-, de modo que o sentido literal
da sentença é: “para aqueles que são irmãos, e que estranhos”. Para a expressão e
que, compare com lCo 6.6; Fp 1.28; Ef 2.8.

6. Igreja (εκκλησίας). Vide nota sobre Mt 16.18.

Se conduzires (προπέμψας). Literalmente, tendo enviado adiante. O tempo ao-


risto representa o ato como realizado. Compare com At 15.3; T t 3.13. Na tb, se
ajudares; na bj e teb, provendo-os do necessário.

Como é digno para com Deus (άξίως τού Θεού). Literalmente, de um modo
digno de Deus. Como na tb. Compare com lTs 2.12; Cl 1.10.

Bem farás (καλώς ποιήσεις). Para a expressão, vide At 10.33; Fp 4.14;


Tg 2.8 ,19; 2Pe 1.19. A tb traduz o todo assim: aos quaisfarás bem se ajudares na
sua viagem de um modo digno de Deus.

7. Porque pelo seu Nome (ύπερ τού όνόματος). O seu é fornecido pela arc; não
está no texto. Na nvi, corretamente, por causa do Nome. 0 Nome (Jesus Cristo) é
usado assim de forma absoluta em At 5.41; compare com Tg 2.7. Para um uso
absoluto similar de o caminho, vide nota sobre At 9.2. Vide nota sobre lJo 1.7.

1. O Cônego Westcott diz: “nenhumparalelo é mencionadopara" atradução da rv, mas Ap 21.5


dificilmentepode serconsideradoumparaleloparaatradução dele. “garantes”.
331
3 João

Nada tomando dos (μήδεια λαμβάνοντες οπτό). Para a expressão tomando dos,
ou da parte dos, vide nota sobre lJo 1.5.

Gentios (εθνικών). Esse termo ocorre somente em outros trechos do Evange­


lho de Mateus. O vocábulo mais comum έέθνη, que é a leitura do t r aqui: εθνών.
Vide nota sobre Lc 2.32.

8. Devemos (όφείλομεν). Videnota sobre lJo 2.6.

Receber (άπολαμβάνειν). Os melhores textos trazem ύπολαμβάνειν, apoiar,


acudir-, ou seja, dar boas-vindas com o fornecimento de hospitalidade. Na rv, dar
boas-vindas. Na nvi, receber com hospitalidade-, na teb, acudir. O significado original
do verbo é ter sob afim de criar. Daí apoiar, sustentar. O sentido figurativo é: ter na
mente, supor, como Lc 7.43; At 2.15; recolher ou seguir nafala; daí responder, como
em Lc 10.30.

Cooperadores da verdade (σύνεργο! ττ| άληθεία). A expressão é explicada de


duas formas: cooperadores dos professores (το ιούτους, tal como) em apoio da verda­
de; ou cooperadores da verdade. Adote o último, como na arc2.

9. Tenho escrito à igreja. Os melhores textos acrescentam τι, alguma coisa,


o que indica que o apóstolo não considerava a comunicação especialmente
importante.

Diótrefes (Διοτρεφής). O nome deriva de Δίος, de Zeus (Júpiter), e τρέφω, nu­


trir, e quer dizer cuidado por Júpiter.

Que procura te r £...] o primado (ò φιλοπρωτεύων). Deriva do adjetivo


φιλόπρωτος, aprecia ser oprimeiro. O vocábulo ocorre somente aqui.

10. Proferindo (φλυαρών). De φλύω, borbulhar ou transbordar. Assim, fala-se da


conversa que efluente e vazia. Compare com o adjetivo relacionado φλύαροι, f a ­
rofeiras, em lTm 5.13.

2. O usocomumdeouufργόςcomo genitivodapessoacomquesecoopera(Rm16.2 1; lCo 3.9) pa­


rececontra a segundaexplicação. Porém, contra aprimeiraestá ofatodequeacoisapor que ou
em favor de que alguémécooperador tambémé usadanogenitivo(2 C0 1.24) oucomε’ις, para (Cl
4 . 11; 2Co 8.23). Não há exemplo dodativus commodi (comoAlford, Huther), dativo de referência.
Por suavez, o verborelacionadoσυνεργεωocorrecomodativodacoisacomquesecoopera, em
Tg 2.22: ή πίστις συνήργει τοΐς εργοι,ς, α β cooperou com as suas obras (vide anota de Huther).
Concordocomo Cônego Westcott queessaconstruçãoé suficienteparasustentaratraduçãoda
arc . Huther, Alforf e Ebrard, todos eles adotamaoutra explicação.

332
3 João
Os que querem. Os que estão dispostos a receber os estranhos.

Os lança fora. Pela excomunhão, o que, por meio de sua influência, ele tinha
poder para realizar.

11. Sigas (μίμου). Mais corretamente, como na nvi, imite. Em outras passagens,
só em 2Ts 3.7,9; Hb 13.7. O termo relacionado μιμητής, imitador, traduzido uni­
formemente por imitador na arc, ocorre em lCo 4.16; 11.1; Ef 5.1. Daí nosso
termo mímica, e também pantomima. Μίμος quer dizer ator e um tipo de prosa
dramática, com o significado de uma representação familiar da vida e do perso­
nagem e sem nenhum enredo distinto.

Quem faz mal - quem faz bem (το κακόν - το άγαθόν). Compare com τα
αγαθά, bem, e τα φαΰλα, mal, Jo 5.29.

12. Dão testemunho de Demétrio (Δημητρίιρ μεμαρτύρηται). Literalmente, de


Demétrio testemunho tem sido dado. Vide Jo 3.26.

13. Tinha (ίΐχον). O tempo imperfeito: estava tendo, ou tinha continuadamente,


quando comecei a escrever.

Pena (καλάμου). Literalmente,j««co, cana. Vide Mt 11.7. O cajado ou cetro posto


na mão de Jesus sob escárnio, Mt 27.29. Uma cana, Ap 11.1.

14. Boca a boca. Vide nota sobre 2Jol2.

333
A pocalipse

C apítulo l

1. Revelação (άποκάλυψις). A palavra grega é traduzida por apocalipse. Só há


uma ocorrência nos Evangelhos, Lc 2.32; neste caso, o verbo alumiar devia ser
traduzido por para revelação. O termo é utilizado na passagem de Lucas para se
referir a nosso Senhor como uma luz destinada a dispersar as trevas sob as quais
os pagãos estão cobertos. Há treze ocorrências desta palavra nos escritos de
Paulo e três na primeira epístola de Pedro.
Ela é usada nos seguintes sentidos:
(1) O desvelamento de algo escondido que traz luz e conhecimento para os que o
observam. Vide Lc 2.32. O próprio cristianismo é a revelação de um mistério (Rm
14.25). A participação dos gentios nos privilégios da nova aliança tornou-se co­
nhecida pela revelação (Ef 3.3). Paulo recebeu o evangelho que pregou pela revela­
ção (G1 1.12) e subiu para Jerusalém por uma revelação (G1 2.2).
(2) Percepção cristã da verdade espiritual. Paulo pede espírito £...] de revelação
para os cristãos (Ef 1.17). Manifestações peculiares do dom geral da revelação
são dadas nas assembléias cristãs (lCo 14.6,26). Revelações especiais são garanti­
das por Paulo (2C0 12.1,7).
(3) A segunda vinda do Senhor (1 Pe 1.7,13; 2Ts 1.7; lCo 1.7) em que sua glória
será revelada (lPe 4.13), seu justo julgamento será conhecido (Rm 2.5) e seus
filhos serão revelados em plena majestade (Rm 8.19).
O verbo relacionado άττοκαλύιττω é usado em conexões semelhantes. Seguindo
as categorias dadas acima:
(1) G1 1.16; 3.23; Ef 3.5; lPe 1.12.
(2) M t 11.25,27; 16.17; Lc 10.21-22; lCo 2.10; 14.30; Fp 3.15.
A p o c a l ip s e - C a p. 1

(3) Mt 10.26; Lc 2.35; 12.2; 17.30; Rm 1.17-18; 8.18; lCo 3.13; 2Ts 2.3,6,8;
lPe 1.5; 5.1.
A palavra é composta de άπό, de, e καλύπτω, cobrir. Por isso, remover a co­
bertura de alguma coisa; desvelar. Como para Balaão: “O Senhor abriu (ou desve­
lou-, άπεκάλυψεν τούς οφθαλμούς [Nm 22.31, lxx )]) o s olhos a Balaão”. Como
Boaz para o parente de Noemi: “Resolvi, pois, informar-te”-, na r v : “revelá-lo a ti”
(άποκαλύψω το οΰς σου; Rt 4.4, lxx ). Literalmente, eu descobrirei tua orelha. Como
a nota da t e b .
O substantivo άποκάλυψις, revelação, ocorre somente uma vez na l x x (lSm
20.30), no sentido físico de tirar a cobertura, desvelar, descobrir. O verbo é encon­
trado na l x x em Dn 2.19,22,28.
No grego clássico, ele é usado por Heródoto1 para descobrir a cabeça; e por
Platão: assim, “revela-me (άποκαλύψας) o poder da retórica”2; “Descobre seu peito
e costas”3. O verbo e o substantivo ocorrem em Plutarco; o último para despir o
corpo, das águas e de um erro. Contudo, o sentido religioso é desconhecido para
o paganismo.
As seguintes palavras devem ser comparadas com isso: οπτασία, visão (Lc 1.22;
At 26.19; 2Co 12.1); όραμα, visão (Mt 17.9; At 9.10; 16.9); também όρασις, visão
(At 2.17; Ap 9.17; de forma visível, Ap 4.3). Essas três palavras não podem ser
distinguidas de forma acurada. Todas elas denotam a coisa vista ou mostrada, sem
nada para demonstrar se é entendida ou não.
Como distinto desses outros termos, άποκάλυψις inclui, junto com a coisa
mostrada ou vista, sua interpretação ou desvelamento.
Επιφάνια, aparecimento (daí nossa palavra epifaniá), é usada no grego profa­
no para o aparecimento de um poder mais alto a fim de auxiliar o homem. No
texto do Novo Testamento, só é usada por Paulo e sempre para a segunda vinda
de Cristo, em glória, exceto em 2Tm 1.10, em que ela se refere ao seu primeiro
aparecimento, em carne. Vide 2Ts 2.8; lTs 6.14; T t 2.13. Diferente desse termo,
άποκάλυψις é mais abrangente. Um apocalipse pode incluir diversos έπιφάνειαι,
aparecimentos. Os aparecimentos são o meio das revelações.
Φανέρωσις, manifestação, ocorre somente duas vezes dentro do Novo Testa­
mento, lCo 12.7; 2C0 4.2. O verbo relacionado φανερόω, tornar manifesto, manifes­
tar, ocorre com frequência. Vide nota sobre Jo 21.1. Não é fácil, caso seja possível,
mostrar que essa palavra tem um sentido menos dignificante que άποκάλυψις. O
verbo φανερόω é usado para a primeira e a segunda aparição de nosso Senhor
(lTm 3.16; lJo 1.2; lPe 1.20; Cl 3.4; lPe 5.4). Vide também Jo 2.11; 21.1.

1. Heródoto, i, 119.
2. Platão, G órgias, 460.
3. Id., P rotágoras, 352.
336
A p o c a l i p s e - C ap . 1

Alguns distinguem entre φανέρωσις como uma manifestação externa, para os


sentidos, mas simples e isolada, e άποκάλυψις como uma manifestação interna e
permanente. De acordo com esses, o apocalipse ou desvelamento precede e produz a
φανΊρωσις ou manifestação. O apocalipse contempla a coisa revelada; a manifesta­
ção, as pessoas para quem é revelado.
A revelação aqui é o desvelamento dos mistérios divinos.

D e Jesus Cristo. Não a manifestação ou revelação de Jesus Cristo, mas a reve­


lação dada por Ele.

Para mostrar (δβιξοα). Frequente em Apocalipse (4.1; 17.1; 21.9; 22.1). A


construção é feita com c ô g j k c v , deu·, lhe deu para mostrar. Compare com “lhe
concederei que se assente” (3.21); “fora dado o poder de danificar” (7.2); “lhe
foi permitido que fizesse” (na t b , “lhe foi dado fazer”; na k j v , “tem poder para
fazer”, 13.14).

Servos (δούλοις). Propriamente, escravos. Vide nota sobre M t 20.26; Mc 9.35.

Brevemente devem acontecer (yeueoGai kv τάχβι). Para o termo kv τάχβ.,


brevemente, vide Lc 18.8, passagem em que, todavia, está sugerida longa demora.
Expressões como essa devem ser entendidas não de acordo com a medição de
tempo humana, mas, antes, como em 2Pe 3.8. A ideia é: dentro em pouco, con­
forme o tempo é computado por Deus. O aoristo do infinitivo γενέσθαι não quer
dizer começar a acontecer, mas denota um cumprimento completo: deve brevemente
acontecer em sua totalidade.

Devem (ôel). Como o decreto do Deus absoluto e infalível.

Anjo (αγγέλου). Estritamente, um mensageiro. Vide Mt 11.10; Lc 7.24; 9.52.


Compare com o anjo mediador das visões de Daniel e de Zacarias (Dn 8.15-16;
9.21; 10.10; Zc 1.19). Vide nota sobre Jo 1.51.

Enviou (άποστείλας). Vide nota sobre Mt 10.2,16.

Notificou (έσήμανεν). De σήμα, um sinal. Daí, literalmente, ser dar um sinal


ou toque. O verbo, fora dos escritos de João, ocorre somente em At 11.28; 25.27.
Vide Jo 12.33; 18.32; 21.19. Essa é a única ocorrência em Apocalipse. A palavra é
apropriada para o caráter simbólico da revelação assim como em Jo 12.33, passa­
gem na qual Cristo prediz o modo de sua morte em uma imagem. Compare com
sinal, Ap 12.1.
337
A p o c a l ip s e - C ap. I

João. João não fornece seu nome no Evangelho nem nas epístolas. Milligan
declara que aqui, ‘lidamos com profecia, e a profecia exige a garantia do indiví­
duo que é inspirado para proclamar”. Compare com Dn 8.1; 9.2.

Servo. Designando o ofício profético. Vide Is 4*9.5; Am 3.7; compare com


Ap 19.10; 22.9.

2. Testificou (έμαρτύρησεν). Vide nota sobre Jo 1.7. A nvi traduz: dá testemunho.


A referência é ao presente livro, e não ao Evangelho. O tempo aoristo é o aoristo
epistolar. Vide nota sobre lJo 2.13, e compare com a introdução de Tucídides4. “Tu-
cídides, um ateniense, escreveu (ξυνέγραψ6) a história da guerra” etc.; pondo-se no
ponto de vista do leitor, que considerará o escrito como fato ocorrido no passado.

Palavra de Deus. Não a Palavra pessoal, mas o conteúdo profético desse livro.
Vide 22.6.

Testemunho (μαρτυρίαν). Para a expressão testificar uma testemunha, vide


Jo 5.32. Para a ênfase peculiar na ideia de testemunho em João, vide 3o 1.7. As pa­
lavras e a ideia são características de Apocalipse, como também do Evangelho e
das epístolas.

E (xe). Omita. A oração de tudo o que tem visto está em aposição com da palavra
de Deus, e do testemunho de Jesus Cristo, essas indicando como vistas por ele. A t b
acrescenta sim.

Tudo o que tem visto (boa elôev). Literalmente, tantas muitas coisas quanto
viu. No Evangelho, João usa a palavra cíóev, viu, só uma vez em referência a seu
próprio testemunho ocular (20.8). Em Apocalipse, ela é usada constantemente
para o ver de visões. Compare com 1.19. Para o verbo denotando a intuição ime­
diata do vidente, vide nota sobre Jo 2.24.

3. Bem-aventurado (μακάριος). Vide nota sobre Mt 5.3.

Aquele que lê (ó άναγινώσκων). Vide nota sobre Lc 4.16. O leitor na igreja.


Vide 2Co 3.14. Os que ouvem, a congregação. As palavras sugerem uma leitura pú­
blica, oficial m assembléia religiosa para a adoração. A passagem tem algum peso
na determinação da data desse livro. A declarada leitura dos escritos apostólicos
não existia como uma forma recebida antes da destruição de Jerusalém, 70 d.C.

4. Tucídides, H istória.
338
A pocalipse —Cap. 1

Profecia. Vide nota sobre profeta, Lc 7.26.

E guardam (καί τηροΰντ€ς). A ausência do artigo de τηροϋντ^ς, guardando (cp.


ol ακούοντας, os que ouvem), mostra que os ouvintes e os guardadores formam
uma categoria. Tqpelv», guardar, é uma palavra particularmente joanina e é carac­
terística do Apocalipse, assim como dos outros escritos, em seu próprio sentido
peculiar de “guarda” no exercício do cuidado ativo e zeloso, em vez de proteger
para preservar. Vide nota sobre guardada, lPe 1.4.

Que nela estão escritas (τα γ^γραμμένα). Particípio perfeito, têm sido escritas,
e, logo, permanecem escritas.

O tempo (ό καιρός). Vide nota sobre M t 12.1.

Próximo (εγγύς). Literalmente. Vide nota sobre brevemente, versículo 1.

4. João. Observe a ausência de todos os títulos oficiais, como são encontrados


em Paulo; mostrando que João escreve como alguém cuja posição é reconhecida.

Sete. Entre todos os povos antigos, sobretudo do Oriente, a relevância reli­


giosa está ligada a números. Isso surgiu da avaliação instintiva de que o número
e a proporção são atributos necessários do universo criado. Esse sentimento, no
Antigo Testamento, rejeita o paganismo. O número sete era considerado pelos
hebreus como um número sagrado, e, do começo ao fim da Escritura, é o número
da aliança, o sinal da relação entre Deus e a humanidade e, sobretudo, entre Deus
e a igreja. As evidências disso são encontradas na santificação do sétimo dia; na
realização da circuncisão depois de sete dias, a qual é o sinal de uma aliança; pelo
papel desempenhado pelo número nas alianças de casamento e nos tratados de
paz. É o número da purificação e da consagração (Lv 4.6,17; 8.11,33; Nm 19.12).
Segundo Trench:

Sete éonúmerodetoda graça ebenefícioconcedido aIsrael; que, por isso, éassinala­


docomofluindodaaliançaecomo umaconsequênciadela. Os sacerdotes circundaram
Jericó durante sete dias e, no sétimo dia, circundaramsete vezes, paraque toda Israel
soubesse que acidade foi entregue emsuas mãos por Deus, eque sua conquista é um
resultadodiretoeimediatodeseurelacionamentodealiançacomEle. Naamãtemque
imergir sete vezes noJordão paraque reconhecesseoDeus deIsrael como o autor de
sua cura. É o número da recompensa daqueles que são fiéis à aliança (Dt 28.7; lSm
2.5); depuniçãoparaaqueles que serebelamcontraaliança(Lv 26.21,24,28; Dt 28.25)
ouparaaqueles quemaltratamaspessoas queestãoemaliançacomDeus (Gn 4.15,24;
339
A p o c a l ip s e - C ap. 1

Êx 7.25; SI 79 .1 2 ). Todas asfestas sãocomandadas pelo númeroseteoupor sete mul­


tiplicado por sete e, assim, tudo fica ainda mais intenso. É assimcomo sábado, coma
Páscoa, coma Festa das Semanas, coma Festa dos Tabernáculos, como ano sabático
ecomojubileu5.

Trench também diz que, de forma semelhante, o número aparece na conduta


de Deus com as nações de fora da aliança, demonstrando que Ele opera por causa
de Israel e com respeito a sua aliança. É o número dos anos da plenitude e da
fome, em sinal de que esses existiram por causa de Israel, em vez de por causa do
Egito. Sete vezes ignoraram Nabucodonosor para que ele aprendesse que o Deus
de seus cativos judeus reina sobre toda a terra6.
O número sete também ocorre como número sagrado no texto do Novo Testa­
mento. Há sete beatitudes; sete petições no Pai Nosso; sete parábolas em Mt 13;
sete pães; sete palavras ditas na cruz; sete diáconos; sete graças (Rm 12.6-8); sete
características de sabedoria (Tg 3.17). Em Apocalipse, a proeminência do núme­
ro é marcante. Em uma extensão notável, a estrutura desse livro é moldada pelo
uso de números, sobretudo dos números sete, quatro e três. Há sete espíritos
diante do trono; sete igrejas; sete castiçais de ouro; sete estrelas à direita daquele
que é semelhante a um filho de homem; sete lâmpadas de fogo queimando diante
do trono; sete chifres e sete olhos do Cordeiro; sete selos do livro; e os trovões,
as cabeças do grande dragão e do monstro do mar, os anjos com trombetas, as
pragas e as montanhas que são o assento da mística Babilônia —são todos em
número de sete.
Como também há quatro criaturas vivas em volta do trono; quatro anjos nos
quatro cantos da terra, retendo os quatro ventos; a nova Jerusalém é quadrada.
É concedida autoridade à morte para matar nos quatro cantos da terra, e ela
emprega quatro agentes para isso.
Mais uma vez, o uso do número três, conforme comenta o Professor Milligan,
é “tão notável e contínuo que seria necessária uma análise do livro todo para sua
perfeita ilustração”. Há três ais; três espíritos impuros como sapos; três divisões
da Babilônia; e três portas de cada lado da cidade celestial. O T risagion , ou três
vezes santo, é entoado para Deus, o todo-poderoso, a quem são conferidos três
atributos de glória.

Sete igrejas. Nem todas as igrejas da Ásia são pretendidas, uma vez que a
lista das igrejas tratadas em Apocalipse não inclui Colossos, Mileto, Hierápolis e
Magnésia. As sete igrejas mencionadas foram escolhidas para simbolizar a igreja

5. T re n c h , C om m entary on the E pistles to the Seven Churches in Asia.


6. Ibid.

340
A p o c a l ip s e - C ap. 1

toda. Compare com 2.7. Sendo sete o número da aliança, temos nessas sete uma
representação da igreja universal.

Na Ásia. Vide nota sobre At 2.9.

Graça —paz. Para graça (χάρις), vide nota sobre Lc 1.30. As duas palavras são
usadas por Paulo na saudação de todas as suas epístolas, exceto nas três epístolas
pastorais.

Da parte daquele que é, e que era, e que há de vir (άπό του ò ών καί ό
ήρ καί ό ερχόμενος). A saudação toda é dada no nome da santa Trindade: o Pai
(aquele que é, e que era, e que há de vir), o Espírito (os sete espíritos) e o Filho
(Jesus Cristo). Vide mais abaixo. Essa porção da saudação não tem paralelo em
Paulo e é distintivamente característica do autor de Apocalipse. É um dos sole-
cismos na construção gramatical que distingue esse livro dos outros escritos de
João. O estudante de grego observará que o pronome que (ó) não faz a construção
com a preposição d a p a r te de (átró), o que exigiría o caso genitivo, mas permanece
no caso nominativo.
Cada um desses três apelos é tratado como um nome próprio. O Pai é
aquele que ê, e que era, e que há de vir. Essa é uma paráfrase de um nome im-
pronunciável de Deus (Ex 3.14), o absoluto e imutável. Ό ών, aquele que é, é
a tradução da l x x de Ex 3.14: “Eu sou ο ό ών (E u sou)”; “ò ών (E u sou ) me
enviou a vós”. A q u ele que era (ò ήν). A língua grega não tem particípio imper­
feito, pelo que se usa o verbo finito. Q ue ê e que era formam uma oração para
contrabalançar que há de v ir. Compare com 11.17; 16.5; e “e sta v a (ήν) no prin­
cípio com Deus” (Jo 1.2). Q ue h á d e v i r ( ò ερχόμενος). Literalmente, aquele que
está v in d o . Isso não equivale a que será; ou seja, o autor não pretende descrever
a existência abstrata de Deus como cobrindo o futuro não menos que o pas­
sado e o presente. Se seu sentido fosse esse, ele teria escrito ό έσόμενος, que
será. A expressão que há d e v i r não expressa a futura eternidade do ser divino.
A concepção predominante no título, antes, é a de im u ta b ilid a d e . Além disso,
o nome não enfatiza tanto a existência abstrata de Deus quanto sua relação
permanente da aliança com seu povo. Por isso, a expressão que há d e v i r tem
de ser explicada de acordo com a nota-chave do livro - a segunda vinda do
Filho (1.7; 22.20).
A expressão que há de vir, com frequência, é aplicada ao Filho (v id e nota sobre
lJo 3.5) e também ao longo desse livro. Aqui ela é predicado do Pai, à parte de
quem o Filho não faz nada. De acordo com Milligan, “o filho nunca está sozinho,
nem mesmo como Redentor”. Compare com “[TNaf) viremos para ele”, Jo 14.23.
Orígenes cita nossa passagem com estas palavras: “Mas você deve perceber que
341
A p o c a l ip s e - C ap. 1

a onipotência do Pai e do Filho é uma e a mesma, ouça João falando segundo essa
maneira em Apocalipse: ‘que ê ”. O Deão Plumptre compara com a inscrição no
templo de ísis, em Saís, Egito: “Sou tudo o que vem a ser, e que é, e que será, e
nenhum homem levanta meu véu”.
0 Espírito é designado pela expressão os sete Espíritos.

Dos sete Espíritos (των €πτά Πνίυμάτων). Paulo, em nenhuma passagem,


junta o Espírito com o Pai e o Filho em suas saudações iniciais. A abordagem
mais próxima disso é a de 2C0 13.13. A referência não é aos sete principais anjos
(8.2). Não se pode falar apropriadamente deles como a fonte da graça e da paz,
nem podem ser associados com o Pai e o Filho, tampouco ter precedência ao Fi­
lho, como é o caso aqui. Além disso, anjos nunca são chamados de espíritos neste
livro. Compare com essa expressão a referência de 4.5, as sete lâmpadas de fogo,
“as quais são os sete Espíritos de Deus”; e de 3.1, onde se diz que Jesus tem “os
sete Espíritos de Deus”. Assim, os sete Espíritos pertencem ao Filho e também
ao Pai (vide Jo 15.26). O arquétipo da expressão de João é encontrado na visão de
Zacarias, em que o Messias é prefigurado como uma pedra com sete olhos, “os
sete olhos do Senhor, que discorrem por toda a terra” (Zc 3.9; 4.10). Compare
também com a visão do mesmo profeta do castiçal com sete braços (4.2).
Por essa razão, o Espírito Santo é chamado de os sete Espíritos. O perfeito e
místico número sete indica unidade através da diversidade (lCo 12.4). Não se
pretende os sétuplos dons do Espírito, mas a personalidade divina que os trans­
mite; aquele Espírito sob as diversas manifestações. Ricardo de São Victor, ci­
tado por Trench, diz: “E dos sete Espíritos, ou seja, do Espírito sétuplo, que, na
verdade, é simples em natureza, sétuplo em graça”7.

5. Jesus Cristo. O Filho. Posto depois do Espírito porque o sucede nos versí­
culos 5 a 8 e se relaciona com Ele. Isso está de acordo com a maneira de João
ordenar seu pensamento para que uma nova sentença surja a partir do fim da
sentença precedente. Compare com o prólogo do Evangelho e com os versícu­
los 1 e 2 desse capítulo.

A fiel testem unha (ò μάρτυς ό πιστός). Para a fraseologia, v id e nota sobre


Uo 4.9. Para testemunha, vid e nota sobre Jo 1.7; lPe 5.1. Conforme aplicado ao
Messias, v id e SI 89.37; Is 55.4. A construção, mais uma vez, desvia-se da regra
gramatical. As palavras testemunha, unigênito, p rín cip e estão no caso nominativo,
em vez de estar no genitivo, em contraposição com Jesus C risto. Essa construção,
embora irregular, confere, não obstante, dignidade e ênfase a esses títulos do

7. Ricardo de São Victor apud Trench, Seven Churches.

342
A pocalipse - Cap. 1

Senhor. V ide nota sobre o versículo 4. A palavra πι αχός, fo i, é usada: (1) Em refe­
rência àquele que se m ostra f i e l no desempenho de um a obrigação ou na adm inistração
d e um a verdade (Mt 24.45; Lc 12.42). Por Isso, f i e l { i C o 7.25; 2Tm 2.2). Para coisas
em que se pode confiar (lTm 3.1; 2Tm 2.11). (2) Confiança, certeza-, um crente (G1
3.9; At 16.1; 2Co 6.15; lTm5.16). Vide nota sobre lJo 1.9. A palavra é combinada
com αληθινός, verdade, genuíno, em 3.14; 19.11; 21.5; 22.6. Ricardo de São Victor,
citado por Trench, declara:

Testemunhafiel porquedeu testemunho fiel emrelaçãoatodas as coisas que tinham


de ser testificadas por Ele no mundo. Testemunha fiel porque revelou fielmente a
seus discípulos tudo que Ele ouvia do Pai. Testemunha fiel porque Ele ensinou o
caminho de Deus emverdade e não se importou com ninguém nemconsiderou a
pessoa dos homens, ouseja, não seimportou como queos outros pudessemdizer ou
pensar arespeito desse ensinamento verdadeiro. Testemunha fiel porque anunciou
acondenaçãoparaoréprobo easalvação para oeleito. Testemunha fiel porque con­
firmou por meio de milagres a verdade que Ele ensinou empalavras. Testemunha
fiel porque não negou, nemmesmo na morte, o testemunho por Ele mesmo do Pai.
Testemunha fiel porque testemunhou do dia dojulgamento concernente às obras
do bomedo mau.

O primogênito dos mortos (ò πρωτότοκος εκ των νεκρών). Na ntlh , o prim eiro


Filho. O s melhores textos omitem εκ, de. Compare com Cl 1.18.0 Cristo ressurre-
to visto em sua relação com os mortos em Cristo. Ele não foi o primeiro a levantar
da morte, mas foi o primeiro que ressuscitou, e a morte, daí em diante, é impossível
para Ele (Rm 6.9). Ressuscitou, e finalmente trará os que dormem nele (lTs 4.14).
Alguns intérpretes, ao traduzir prim eiro Filho, encontram na frase uma metáfora
da morte como o ventre que o encerrava (vide nota sobre At 2.24). Outros, apoia­
dos pela tradução prim ogênito, ligam a passagem a SI 2.7, que, por sua vez, é ligada
por Paulo à ressurreição de Cristo (At 13.32-33). Paulo também diz que Jesus foi
“declarado Filho de Deus em poder £...] pela ressurreição dos mortos” (Rm 1.4).
O verbo τίκτω, um dos componentes de -πρωτότοκος, p rim ogên ito ou prim eiro Filho,
é usado em todas as ocorrências dentro do Novo Testamento com o sentido de
d a r à lu z ou nascer, e em nenhuma passagem tem o sentido de gerar, a menos que
Tg 1.15 seja uma exceção, sobre a qual vide nota. No grego clássico, o sentido de
g era r é comum.

O príncipe dos reis da terra (ο αρχών των βασιλέων τής γης). Por meio da
ressurreição, Ele passa para a glória e o domínio (Fp 2.9). A comparação com os
reis da terra é sugerida por SI 2.2. Compare com SI 89.27; Is 52.15; lTm 6.15 e
videAjp 6.15; 17.4; 19.16.
343
A pocalipse —Cap. 1

Àquele que nos ama (τω άγαπώντι). Essa é a leitura corrtea. A kjv segue a
leitura τω άγαπήσαντι, “que nos a m o u . O amor de Cristo está sempre presente.
V id e io 13.1.

Lavou (λούσαντι). Leia λύσαντι, libertou. Como na ara . Trench comenta sobre
a variação de leitura como tendo surgido de um jogo com as palavras λουτρόν, um
banho, e λύτρον, um resgate, e esses dois termos expressam os principais benefícios
que resultaram para nós do sacrifício e morte de Cristo. Ele refere-se a esse jogo de
palavras como algo que aconteceu na etimologia do nome Apoio, conforme dado por
Platão; a saber, o lavador (ò άπολούων) e o absolvedor (ò άπολύων) de todas as impu­
rezas. Qualquer dessas leituras se ajusta a um belo círculo de imagens. Para lavado,
compare com SI 11.2; Is 1.16,18; Ez 36.25; At 22.16; Ef 5.26; T t 3.5. Para libertou,
compare com Mt 20.28; lTm 2.6; iPe 1.18; Hb 9.12; G1 3.13; 4.5; Ap 5.9; 14.3-4.

6. Reis (βασιλείς). A leitura correta é βασιλείαν, um reino. O termo rei nunca é


aplicado no texto do Novo Testamento aos cristãos individuais. O reinado dos
santos é enfatizado nesse livro. V ide 20.4,6; 22.5. Compare com Dn 7.18,22.
5 A O ;

Vide a teb , um reino.

Sacerdotes (ιερείς). O termo reino descreve o corpo de redimidos coletivamente.


Sacerdotes indica a posição in dividu al deles. Pedro observa a mesma distinção (lPe
2.5) nas expressões pedras vivas (individuais) e casa espiritual (o corpo coletivamente)
e combina reis e sacerdotes em outro termo coletivo, sacerdócio real (v. 9). O sacer­
dócio de crentes nasce do sacerdócio de Cristo (SI 110.4; Zc 6.13; Hb 7 -10). Essa
dignidade foi prometida a Israel sob a condição de haver obediência e fidelidade a
Deus. “Sereis reino sacerdotal e povo santo” (Ex 19.6). No reino de Cristo, cada in­
divíduo é um sacerdote. O trabalho do sacerdote não está limitado a alguma ordem
do ministério. Todos podem oferecer o sacrifício de louvor e de ação de graças; todos
têm acesso direto ao lugar mais santo por intermédio do sangue de Jesus; todos os
cristãos, como sacerdotes, têm de ministrar uns para os outros e rogar uns pelos ou­
tros. A consumação desse ideal aparece em Ap 21.22, passagem na qual a Jerusalém
celestial é representada como não tendo templo. Ela toda é templo. Trench registra:

E a abolição da distinção entre santo e profano (Zc 14.20-21) - do mais próxim o e do


mais rem oto de D eus - por meio de todos, desde então, são santos, todos são trazidos
para o mais próxim o possível, para Ele.

Para Deus e seu Pai (τω Θεω καί πατρί αυτού). Literalmente, p a ra ο D eus e
A n v i apresenta corretamente: seu D eu s e P ai. Para a expressão, compare
P a i dele.
com Rm 15.6; 2Co 1.3; Ef 1.3.

344
A pocalipse — C a p . 1

Glória e poder (ή δόξα καί το κράτος). A ntlh traduz com acerto os dois
artigos, “a glória e o poder”. Os artigos expressam universalidade, toda glória;
aquilo que em todo lugar e sob toda forma representa glória e poder. O verbo
ser (a glória) não está no texto. Podemos traduzir como uma atribuição, ser, ou
como uma confissão, é. A glória édele. O sentido original de δόξα, gló ria , é opinião
ou ju lgam en to. A palavra não é usada na Escritura nesse sentido. Nos escritores
sagrados, sempre para uma opinião boa ou fa v o rá v e l, daí louvor, honra, g ló ria (Lc
14.10; Hb 3.3; lPe 5.4). Aplicada a objetos físicos, como luz, os corpos celestiais (At
22.11; lCo 15.40). A lum inosidade v isív e l em manifestações de Deus (Lc 2.9; At
7.55; Lc 9.32; 2Co 3.7). M agnificência, d ig n id a d e (Mt 4.8; Lc 4.6). D iv in a m ajestade
ou excelência perfeita, sobretudo em doxologias, quer de Deus quer de Cristo (lPe
4.11; Jd 25; Ap 4.9,11; Mt 16.27; Mc 10.37; 8.38; Lc 9.26; 2Co 3.18; 4.4). A g ló ria
ou m ajestade da graça d iv in a (Ef 1.6,12,14,18; lTm 1.11). A m ajestade dos anjos (Lc
9.26; Jd 8; 2Pe 2.10). A gloriosa condição de C risto depois d e re a liza r sua obra terrena
e do redim ido que com partilha sua g ló ria eterna (Lc 24.26; Jo 17.5; Fp 3.21; lTm
3.16; Rm 8.18,21; 9.23; 2Co 4.17; Cl 1.27).
Trench comenta sobre a proeminência do elemento doxológico na mais alta
adoração da igreja como em contrapartida com o lugar muito subordinado que,
com frequência, ocupa na nossa adoração:

T alvez possam os levar n ossos pedidos ao conhecim ento de Deus, e isso está bem, pois
é oração; mas dar glória a D eus, à parte de qualquer coisa conseguida diretam ente
para nós m esm os em retorno, é melhor, pois é adoração.

O Dr. John Brown, em suas memórias de seu pai, um dos mais excelentes re­
latos biográficos da literatura inglesa, registra uma fórmula usada por ele para
encerrar suas orações em ocasiões especialmente solenes:

E, agora, tu, ó Pai, F ilho e E spírito Santo, o único Jeová e n osso D eus, poderiam os —
com o na maioria das reuniões - com a igreja na terra e a igreja n o céu atribuir toda
honra e glória, poder e majestade, com o era no princípio, é agora e sem pre será, m un­
do sem fim, A m ém 8.

Compare com as doxologias em lPe 4.11; G1 1.5; Ap 4.9,11; 5.13; 7.12; Jd 25;
lCr 24.11.

Para todo o sempre (elç τους αιώνας των αΙώνων). Literalmente, p elo s sé­
culos dos séculos. Como a teb . Para a expressão, compare com G1 1.5; Hb 13.21;

8. John Brown, Horae Subsecivae.

345
A pocalipse - Cap. 1

lPe 4.11. Há doze ocorrências dela em Apocalipse, mas não no Evangelho de


João nem nas epístolas. É a fórmula de eternidade.

Amém (άμήν). A palavra na nossa língua é uma transcrição da grega e da he­


braica. Um adjetivo verbal com o sentido de fir m e ,fie l. Daí ò άμήν, o amém,, apli­
cado a Cristo (Ap 3.14). Esse termo passa a ter um sentido adverbial por meio do
qual alguma coisa é afirmada ou confirmada. Por isso, é usado, com frequência,
por Cristo, em verdade. Só João usa a dupla afirmação, em verdade, em verdade. Vide
nota sobre Jo 1.51; 10.1.

7. Eis que vem com as nuvens (ep/etca μετά των νεφβλών). As nuvens são
usadas com frequência nas descrições da segunda vinda do Senhor. Vide Dn 7.13;
Mt 24.30; 26.64; Mc 14.62. Compare com a manifestação de Deus nas nuvens
no Sinai, na coluna de nuvem, a shekiná e na transfiguração e vid e SI 97.2; 18.11;
Na 1.3; Is 19.1.11

Verá (όψεται). O verbo denota o ato físico, mas enfatiza o discernimento men­
tal que acompanha o ato físico e aponta para o resultado, não para o ato da visão.
Vide nota sobre Jo 1.18. Apropriado aqui como indicando a rapidez do discerni­
mento espiritual, produzido pela aparição do Senhor, naqueles que o rejeitaram
e, agora, lamentam por sua insensatez e pecado.

Os mesmos que (οΐτιν€ς). O relativo composto descreve uma categoria. Vide


nota sobre Mt 13.52; 21.41; Mc 12.18.

Traspassaram (έξεκέντησαν). Vide nota sobre Jo 19.34, e compare com


Zc 12.10; Jo 19.36. Aqui, a expressão não se refere só aos judeus, mas a todos
que rejeitaram o Filho do homem; os que, segundo Milligan, “em qualquer era
se identificaram com o espírito dos assassinos do Salvador”. A passagem é justa­
mente citada como uma forte evidência de que o autor do Evangelho é também
o autor de Apocalipse.

Tribos (φυλά!). Tradução mais correta; contra a k w ,fa m ília s. A palavra usada
para a verdadeira Israel em 5.5; 7.4-8; 21.12. Como as tribos de Israel são a ima­
gem por meio da qual o povo de Deus, judeu ou gentio, é representado, então, os
descrentes estão representados aqui como tribos, “a contraparte desdenhosa da
verdadeira Israel de Deus”. Compare com Mt 24.30-31.

Se lamentarão sobre ele (κόψονται έπ’ αυτόν). Na teb , melhor, estarão de luto.
Literalmente, baterão em seu peito. Vide nota sobre Mt 11.17.
346
A pocalipse —Cap. 1

8. O Alfa e o Ômega (το A καί το Ω). A arc traduz corretamente com o artigo.
As palavras são explicadas pela observação, apropriadamente omitida do texto:
o Princípio e o Fim. Os escritores rabínicos usam a expressão de Ãleph (x) a Tãw
(n) para representar completamente, do princípio aofim. Assim, diz-se: “Adão trans­
grediu a lei de ’Ãleph a Tãw’’. Compare com Is 41.4; 43.10; 44.6.

O Senhor (ò Κύριος). Vide nota sobre Mt 21.3. Os melhores textos trazem


Κύριος ò Θεός, o Senhor, o Deus. Na n v i , o Senhor Deus.

Que é. Vide nota sobre o versículo 4. “Deus, conforme declara uma antiga
tradição, sustenta em sua mão direita o princípio, o meio e o fim de tudo que é.”9

O Todo-poderoso (ò παντοκράτωρ). Só há uma ocorrência fora de Apocalipse


em 2Co 6.18, passagem em que é uma citação. Usada constantemente na lxx .

9. Eu, João. Compare com Dn 7.28; 9.2; 10.2.

Que também sou vosso irmão (ò και αδελφός υμών). Omita και, também, e
co m o na a r a : João, irmão vosso.
tra d u z a

Companheiro (συγκοινωνός). Na r v , m elh o r, participante convosco. Na n v i ,


companheiro de vocês. Vide Fp 1.7 e observe s o b re participantes, Lc 5.10. Κοινωνός
é um companheiro, associado. Σύν reforça o te rm o : companheiro junto com. Com­
pare com a palavra favorita de João na primeira epístola, κοινωνία, comunhão,
lJo 1.3.

Na aflição. Denotando a esfera, ou elemento, em que a parceria subsistia.

Aflição (θλίψει). Vide nota sobre Mt 13.21. Perseguição por causa de Cristo e
ilustrada por João por seu próprio banimento.

Reino (βασιλεία). O reino atual. Trench está equivocado ao dizer que, “em­
bora a tribulação seja presente, o Reino é apenas esperança”. Ao contrário, é a
certeza de estar agora no reino de Cristo —sob a soberania de Cristo lutando o
bom combate sob sua liderança - que dá esperança, e coragem, e paciência. O
reino de Deus é uma força presente, e é uma peculiaridade de João tratar a vida
eterna como já presente. Vide Jo 3.36; 5.24; 6.47,54; lJo 5.11. “Em todas estas
coisas somos mais do que vencedores” (Rm 8.37ss.). Isso pode explicar a ordem

9. Platão, Górgias, 715.

347
A pocalipse —C ap. 1

peculiar das três palavras: aflição e reino , duas idéias aparentemente antitéticas,
sendo unidas com a verdadeira percepção em sua relação, e paciência, acrescida
como o elemento por meio do qual a aflição é traduzida em soberania. A referên­
cia à fu tu ra consumação gloriosa do reino não precisa ser rejeitada. Está, antes,
envolvida no reino atual. Paciência, que liga a vida de aflição com a soberania de
Cristo aqui na terra, também a liga com a consumação do reino de Cristo no céu.
Pela fé e paciência, os súditos desse reino herdam as promessas. Ricardo de São
Victor, citado por Trench: “Corretamente, ele diz ‘na aflição’ e acrescenta ‘no
Reino’ porque, se sofrermos juntos, também reinaremos juntos”. Compare com
At 14.22.

Paciência. Vide nota sobre 2Pe 1.6; Tg 5.7.

De Jesus Cristo (Ιησού Χριστού). Os melhores textos omitem C risto, e inse­


rem kv, em, traduzindo, como a rv : “reino e paciência q u e estão em Jesus”.

Estava (èyeuópqv). Literalmente, vim a passar, ou seja, encontrava-m e. O tempo


passado parece indicar que João não estava mais em Patmos quando escreveu.

Patmos. Hoje chamada de P a tm o ou P alm osa. No mar Egeu, uma ilha do ar­
quipélago de Espórades cerca de 45 quilômetros a sul-sudeste da ilha de Samos.
A ilha tem aproximadamente dezesseis quilômetros de comprimento por nove
de largura. É uma ilha vulcânica e rochosa e sem vegetação; as montanhas, com
altura de quase trezentos metros, dominam uma vista magnífica do mar e ilhas
vizinhos. A baía de La Scala, entrando na terra a leste, divide a ilha em duas par­
tes quase iguais, a norte e a sul. A cidade antiga, ruínas da qual ainda podem ser
vistas, ocupava o istmo que separa La Scala da baía de Merika, na costa oeste. A
cidade moderna fica sobre a montanha na metade sul da ilha, agrupada aos pés
do monastério de São João. Há uma gruta chamada “a gruta do Apocalipse” na
qual dizem que o apóstolo recebeu a visão. Stanley registra:

A austera e dura aridez de seus prom ontórios, recortando a costa, se encaixa bem ao
fato histórico do abandono do cristão condenado em suas praias, com o o do condenado
em sua prisão. A vista do pico mais alto ou, na verdade, de toda elevação alta da ilha,
descortina uma amplidão incom um, com o também se tornou a visão de Apocalipse,
o desvelam ento do futuro para os olh os do solitário profeta. Acima, havia sem pre o
amplo céu da Grécia; às vezes, brilhante com sua “nuvem branca” (Ap 14.14), outras
vezes, rasgado por “relâm pagos [...]] e trovões” (Ap 4.5) e escurecido pela “grande
saraiva” (Ap 11.19) ou alegrado com um “arco celeste [...(] sem elhante à esm eralda”
(Ap 4.3). Acima dos altos topos de Icaria, Samos, e N axos, levantam -se as montanhas

348
A pocalipse - C ap. 1

da Ásia Menor; entre as quais repousava, a norte, o círculo das sete igrejas às quais
seus discursos deviam ser enviados. À volta dele, erguiam-se as montanhas e ilhas
do arquipélago (Ap 6 .1 4 ; 2 1 .2 0 ). Quando ele olha emvolta, para cima ou para baixo,
“o mar" sempre ocupava oprimeiro lugar £...]] as vozes do céu eramcomo o somdas
ondas batendo na praia, como a“voz demuitas águas” (Ap 1 4 .2; 19 .6); a“pedra como
uma grande mó” foi lançada no mar (Ap 18.21); o mar “deu [...J os mortos que nele
havia” (Ap 2 0 .1 3 ) 10.

Por causa da palavra de Deus (διά toy λόγον του 0eoô). P o r causa: é em razão
de, como consequência de. A expressão é comumente explicada com referência ao
banimento de João como mártir pela verdade cristã. Contudo, alguns, sobretudo
aqueles que desejam derrubar que a autoria do livro seja de João, explicam que
ele estava em Patmos p a ra p re g a r a p a la v ra lá ou a fim de receber uma comuni­
cação da palavra de Deus. Todavia, à parte do tom geral do discurso de João,
que sugere um período de perseguição, a expressão p o r causa d a p a la v ra de D eus
ocorre em duas passagens em que não se pode duvidar do sentido; 6.9 e 20.4.
Assim também na ara .

Testem unho (μαρτυρίαν). V ide nota sobre Jo 1.7.

De Jesus Cristo. Omita Cristo.

10. Fui arrebatado (έγενόμην). Vide nota sobre o versículo 9.

Em espírito (4v πν^ύματι). A frase: f u i arrebatado em espírito ocorre somente


aqui e em 4.2; em espírito, em 17.3; 21.10. A frase denota um estado de transe ou
êxtase espiritual. Compare com At 10.10; 2Co 12.2,4. Ebrad afirma: “A conexão
com os objetos circundantes por intermédio dos sentidos é suspendida, e a co­
nexão com o mundo invisível acontece”. Segundo Platão: “Um estado divino que
nos leva além das regras habituais”11. E Plotino:

Vocêpergunta: “Comopodemosconheceroinfinito?” Respondo, nãopelarazão. Ooficio


da razão é distinguir edefinir. Portanto, oinfinito não pode ser classificado entre seus
objetos. Só se pode apreender o infinito por intermédio de uma faculdade superior à
razão; pelaentradaemumestadoemquevocênãoestámais emseu“eu” finito, noqual
aessência divinaétransmitida avocê. Issoéêxtase. Issoéalibertação damentedesua

10. Stanley, Serm ons in the East.


11. Platão, Diálogos: M enon, Banquete, Fedro, tradução Jorge Paleikat, 5. ed., Rio de Janeiro, Edito­
ra Globo, 1962, 265, p. 243.

349
A p o c a l ip s e - C ap. l

consciênciafinita. Q.f] Mas essacondiçãosublimenãoédeduraçãopermanente. Sóaqui


e então que podemos desfrutar essa elevação (misericordiosamente tornada possível
paranós) acimados limites docorpoedomundo. £...] Tudo quetendeaelevareapuri­
ficar amenteoajudamnessaobtençãoefacilitamo acessoearecorrência desses felizes
intervalos. Assim, hádiferentes caminhospelos quais sepodechegar aessefim. O amor
pelabelezaque exalta opoeta; adevoçãoaoÚnico; aelevação daciênciaque setorna a
ambiçãodofilósofo; oamor eas orações pelos quais algumas almas devotas eardorosas
tendememsuapurezamoral emdireçãoàperfeição. Essas sãoas grandes estradas que
levamàs alturas acima do real e do particular, onde ficamos na presença imediata do
infinitoquebrilhacomo sedasprofundezas da alma12.

Ricardo de São Victor (morto e m 1173) estabelece seis estágios de contempla­


ção: dois na província da imaginação, dois na província da razão e dois na provín­
cia da inteligência. O terceiro céu está aberto apenas para o olho da inteligência
- aquele olho cuja visão é clarificada pela graça divina e pela vida santa. No mais
alto grau da contemplação, a penitência beneficia mais que a ciência; os suspiros
conseguem o que é impossível para a razão. Alguns homens bons não conseguem
nem mesmo alcançar o estágio mais alto; poucos são totalmente transportados
com todas as seis asas da contemplação. No êxtase descrito por ele, parece haver
uma divisão em partes, a da alma e a do espírito, como se dividido pela espada do
Espírito de Deus. O corpo adormece, e a alma e todo o mundo visível ficam como
se confinados. O espírito une-se ao Senhor e, um com Ele, transcende a si mesmo
e a todas as limitações do pensamento humano.
O sufismo é o asceticismo místico do islamismo. O êxtase de um santo sufi é
descrito da seguinte maneira por Vaughan:

Minha língua, quente e seca, dança, meusangue corre como fogo,


Minhas noites eraminsones comamorconsumidor,
Até que noiteediapassamcéleres —comoflechas
Arranhando aorla da armadura; uma centena defés
Pareciamuma; umacentenade milhares deanos
Nada mais que ummomento. Naquela hora
Toda eternidade passadaepor vir
Reunidas emumestupendo a g o ra -
Que o entendimentose maravilhe comopode.
Onde homens veemnuvens, contemplo o nono céu,
E vejo o tronodeDeus. Todo céueinferno
São desnudos paramim, eo destino detodos os homens,

12. CartadePlotino, c. 260d.C.


350
A pocalipse - Cap. 1

Os céus eaterra, tudo desvanece ao meu olhar;


O morto levanta-se ao meu olhar. Rasgo o véu
De todo o mundo, eno corredor docéu
Sentei-me no centro, radiante como o sol13.

Beatriz diz para Dante:

Ao céu que é pura luz —disse —ao presente


Alçamo-nos da esfera mais vultuosa,
Luz intelectual, de amor ardente,
Amor do sumo bem, que enche aalegria,
Alegria emdulçores transcendes14.

Dante diz·.

Bemnão tinha estas vozes escutado,


Eis senti quevirtude milagrosa
A força minha havia sublimado;
Senti vista mais que antes poderosa
E tal, que aluz mais penetrante epura
Afrontar podería valorosa15.

E mais uma vez, logo antes da consumação da visão beatífica, Dante diz:

E dos desejos eu, que àmor altura


Suba, o ardor cessar, como devia,
Senti, me apropinquando daventura.
Bernardo, me acenando, se sorria,
gue paracima olhasse; mas euestava
Já por mimmesmo tal qual mequeria.
A vista, que empureza sublimava,
Do alto, que épor si toda aVerdade,
Mais emais pelos raios penetrava.
E o que euvi, desde então, na imensidade
Transcendeu quanto overbo humano intente:
Cede amemória atanta majestade16.

13. Vaughan, H o u rs w ith the M ystics, ii, 19.


14. Dante, A D iv in a Com édia, Paraíso, xxx, 38-42, p. 184.
15. Ibid., Paraíso, xxx, 55-60, p.185.
16. Ibid., Paraíso, xxxiii, 46-57, p. 201-202.

351
A p o c a l ip s e - C ap. l

No dia do Senhor (έν κυριακη ημέρα). A frase ocorre somente aqui no texto
do Novo Testamento. O primeiro dia da semana, a festa da ressurreição do Se­
nhor. Não, como dizem alguns, o dia do julgamento, uma vez que este, dentro
do Novo Testamento, é expresso por ή ημέρα του Κυρίου, ο D ia do Senhor (2Ts
2.2, ara ); ou ημέρα Κυρίου, o D ia do Senhor, sem artigo no grego (2Pe 3.10); ou
ημέρα Χρίστου, o D ia de C risto (Fp 2.16). A expressão usual no texto do Novo
Testamento para o primeiro dia da semana é ή μία των σαββάτων (Lc 24.1; vid e
nota sobre At 20.7).

Detrás de mim. A inesperada e dominadora entrada da voz divina. Compare


com Ez 3.12.

Como de trombeta (σάλπιγγος). Apropriadamente, uma trombeta de guerra.

11. [[Eu sou o Alfa e o Ômega, o Princípio e o Fim.]] Conforme a kjv (cp. tr ).
Omita, como na arc.

Vês (βλέπεις). Vide nota sobre Jo 1.29.

Escreve-o (γράψον). O aoristo imperativo, denotando ação instantânea. Escre­


va im ediatam ente, prontam ente.

Num livro (εις βιβλίον). Literalmente, p a ra dentro de. Comprometa-se em es­


crever p a ra um livro. Para livro, vid e nota sobre Mt 19.7; Mc 10.4; Lc 4.17. A
ordem para escrever é dada doze vezes em Apocalipse.

Sete igrejas. Vide nota sobre o versículo 4.

Que estão na Ásia. Omita.

Efeso. Cinco das sete cidades mencionadas aqui aparecem em uma passagem
de Tácito17, onde é descrita uma disputa entre onze cidades da Ásia proconsular
pelo privilégio de erigir uma estátua e um templo a Tibério. Laodiceia é igno­
rada por ser desigual em riqueza e dignidade para a tarefa. Filadélfia e Tiatira
não são mencionadas. Pérgamo é rejeitada por já ter um templo para Augusto.
Éfeso (com Mileto) já tem atividade suficiente para sua região com as cerimônias
feitas a Diana. Assim, a disputa ficou limita a Sardes e Esmirna; e Esmirna foi a
escolhida com base no fato de que suas autoridades eram amigáveis aos romanos.

17. T ácito , A nais, iv, 55.

352
A pocalipse - Cap. 1
12. Para ver £a v o z ] . Conforme a kjv; a arc não traz a voz. Na teb , para olhar a
voz que mefalava. A voz toma o lugar do orador.

LQue] falava (ήτις). Conforme a kjv ; a arc traz quem. O relativo composto
tem força qualitativa: de que tipo.

Comigo (pet’ époD). A preposição indica conversa, e não apenas discurso.

Castiçais (λυχνίας). Vide nota sobre Mt 5.15. Lembramos imediatamente do


castiçal com sete braços do tabernáculo (Ex 25.31; Hb 9.2; cp. Zc 4.2). Aqui não
há um castiçal com sete braços, mas sete castiçais, representando a Igreja cristã.
A igreja judaica era uma, como a igreja de um único povo. A Igreja cristã, embo­
ra em essência seja uma, é uma igreja composta de muitos povos. Externamente,
ela não é mais uma nem está em um lugar só. De acordo com o sentido literal
da palavra, castiçal, os diversos castiçais são os carregadores da luz (Mt 5.14,16),
"retendo a palavra da vida” (Fp 2.15-16).
O epíteto ouro, tão comum em Apocalipse, indica a preciosidade de tudo que
pertence à igreja de Deus. Trench observa que em todo o Oriente antigo havia
um senso de santidade ligado a esse metal, que, em grande extensão, ainda so­
brevive. Assim, ouro, nos escritos canônicos do zoroastrismo, é sempre sinônimo
de celestial ou divino. Mesmo já na época de Davi, o ouro não era usado como
padrão de valor, mas apenas como um artigo comercial muito precioso e era pe­
sado. Nas Escrituras, ele é símbolo de grande valor, duração, incorruptibilidade e
força (Is 13.12; Lm 4.2; 2Tm 2.20; Jó 36.19). Ele é usado metaforicamente para o
caráter cristão (Ap 3.18). No paraíso terreno, Dante descreve árvores como ouro.

De ver, umtanto além, eutive acrença


Árvores sete deouro: era aparência,
Empresta adistância parecença18.

13. Sete. Omita.

Ao Filho do Homem. O artigo está ausente no grego. A n v i lê : “semelhante


a um filho de homem”. Mas a referência, no entanto, é ao Senhor e não equivale
a um homem. Compare com Jo 5.27; Ap 14.14.

Vestido até aos pés (ποδήρη). Compare com Dn 10.5. De πούς, o pé, e αρω,
atar, daí o que liga cabeça e pé. O termo é propriamente um adjetivo, alcançando

18. Dante, A D iv in a Com édia, Purgatório, xxix, 43-45, p. 175.


353
A p o c a l ip s e - C a p. I

o pé, com χίτων, veste, implícito. Xenofonte fala dos soldados persas fortemente
armados, como carregando escudos de madeira que chegavam aos pés (ποδήρεσι
ξυλίνοας άσπίσιν)19. A palavra ocorre somente aqui no texto do Novo Testamen­
to, mas há diversas ocorrências na l x x , como em Ez 9.2-3,11, passagem em que a
n v i traz apenas linho-, Ex 28.4, na n v i , m anto da veste do sumo sacerdote; Lv 16.4,

túnica sagrada de linho de Arão.


O manto longo é a veste de dignidade e honra. Pode ser real ou sacerdotal, ou
ainda ambos. Compare com Is 6.1.

Cingido pelo peito (περι^ζωσμένον» προς τοΐς μαστοΐς). Na r v , mais correta­


mente, “cingido no (προς) peito”. Compare com 15.6. O lugar comum de amarrar
era no quadril. De acordo com Josefo, os sacerdotes levíticos eram cingidos na
altura do peito.

Um cinto de ouro. O cinto é um símbolo de poder, justiça e verdade do


Antigo Testamento (Is 22.21; Jó 12.18; Is 11.5). Compare com Ef 6.14, pas­
sagem em que o cinturão da couraça cristã é a v e rd a d e , que mantém juntas
toda ordem de graças da mesma maneira que o cinturão mantém junto as
partes superior e inferior da armadura. O cinturão ajusta-se igualmente à
posição real e sacerdotal de Cristo. O cinturão do sumo sacerdote não era
de ouro, era só revestido de ouro. V id e Ex 28.8: “cinto de obra esmerada”;
na t e b : “a faixa [[...]] sobre o efod será trabalhada do mesmo jeito: ouro,
púrpura roxa, púrpura vermelha, carmesim brilhante e linho retorcido”.
Também Êx 29.5.

14. Brancos (λ^υκαι). Vide nota sobre Lc 9.29. Compare com Dn 7.9.

Lã branca - neve. Essa combinação para representar testemunho ocorre em


Dn 7.9 e Is 1.18. N eve, em SI 51.7.

Chama de fogo. Compare com Dn 10.6. Fogo, na Escritura, é a expressão da


ira divina. A imagem pode incluir o pensamento claro e penetrante do Filho do
Homem; mas também expressa sua indignação com o pecado que sua percepção
divina detesta. Compare com 19.11-12. Também Homero, de Agamenon em um
acesso de raiva: “Os olhos chispam como fogo”20; também de Atenas, quando ela
aparece para Áquiles: “Olhos terríveis brilham!”21.

19. Xenofonte, Anabasis, i, 8-9.


20. H o m ero , llía d a , i, 104, p.
S7.
21. Ibid., i, 200, p.
43.

354
A p o c a l ip s e - C ap. 1

15. Latão reluzente (χαλκολιβάνφ). Na a r a , bronze polido. Somente aqui e em


2.18. Compare com Dn 10.6; Ez 1.7. O sentido da palavra é incerto. Alguns
explicam como electro, uma liga metálica de ouro e prata; outros, como latão do
Líbano (Λίβανος); ainda outros, como latão da cor de olíbano (λίβανος); e outros
mais, como uma composição híbrida do termo grego χαλκός, latão, e do hebraico
lãbhan (p*p), tornar branco. O Deão Plumptre observa:

E bastante provável que essas palavras técnicas fossemcorrentes emuma população


como ade Éfeso, consistindo emgrande parte de trabalhadores de metal, alguns dos
quais, semdúvida, eramjudeus22.

Muitas águas. Compare com Ez 1.24; 43.2; Is 17.12. Vide também Ap 14.2; 19.6.

16. Uma aguda espada de dois fios (ρομφαία δίστομος όξέΐα). A ordem grega é:
uma espada de dois fios aguda. Para a palavra peculiar para espada, vide nota sobre
Lc 2.35. O sentido literal de doisfios é de duas bocas. Vide nota sobre fio, Lc 21.24.
Homero fala de traves para luta no mar, "cobertas na. ponta (στόμα, boca) com latão”.

Rosto (όψις). Usado só por João e só três vezes: aqui, em Jo 7.24; 11.44. Não
se refere à aparência geral.

Na sua força. Com todo o poder do sol do Oriente ao meio-dia.


Essa imagem do Filho do Homem suscita alguns comentários sobre o caráter
geral desses símbolos em Apocalipse. Pode-se dizer de imediato que eles não têm
um caráter que tolera as definições mais contundentes da arte pictórica. Devem
ser mantidos na mente não como símbolos claros e evidentes que se traduzem
em apelos aos olhos e que têm sua exata correspondência nos fatos visíveis, mas,
antes, em sua totalidade e com um sentido dominante de suas correspondên­
cias interiores com noções morais e espirituais. Traduzi-los em pinturas é ine­
vitavelmente incorrer, em alguns pontos, em coisas grotescas que prejudicam e
degradam a solenidade deles. Isso é demonstrado nas dezesseis ilustrações do
Apocalipse de Albrecht Dürer feitas em madeira cortada23. 0 Professor Milligan
chega ao ponto de dizer que estes são só grotescos. Deve-se sempre ficar impres­
sionado com a forte individualidade de Dürer, “espreitando”, conforme comenta
o Lorde Lindsay, no subconsciente, “como um lago, movimentado por cada sopro
de vento que desce sobre ele através dos vales circunvizinhos”; com a fertilidade
de sua criatividade, a plenitude de seu pensamento, sua simplicidade e destemor.

22. Plumptre, T he E p istles to the Seven Churches o f Asia.


23. D ü re r, D ie H eim lich O ffenbarung Johanis, p ublicadas em 1498.

355
A pocalipse - Cap. 1

Mas essa mesma fidelidade que apresenta em relação à natureza é sua inimiga
no trato com temas como as visões apocalípticas, investindo-as, como faz, com
um realismo estranho ao espírito e intenção delas. Tome, por exemplo, os quatro
cavaleiros (Ap 6). O poder é sentido de imediato no movimento externo dos três
cavaleiros com arco, espada e balança. O intenso e inexorável propósito com que
eles passam sobre as formas prostradas aos seus pés. Mas o quarto cavaleiro,
a Morte, sobre o cavalo amarelo, seguida pelo Inferno, retratado com as man-
díbulas bem abertas de um monstro em que uma cabeça coroada é depositada,
degenera-se em uma caricatura horripilante do tipo germânico mais ofensivo
- um arlequim ultrapassando muitíssimo em hediondez, o tradicional esqueleto
com foice e ampulheta.
De maneira similar, o anjo com seus pés como colunas de fogo, um sobre o
mar e o outro sobre a terra. Se ficamos solenemente impressionados pelo terrível
rosto do anjo que era como o sol, a solenidade degenera-se em algo parecido com
diversão à visão dos pés como sólidas colunas terminando em chamas na altura
dos joelhos, e do evangelista “que se ajoelha em um promontório com o canto
do grande livro apresentado pelo anjo em sua boca, aparentemente, correndo o
risco de engasgar”.
Em suma, esses símbolos, como o Cordeiro com sete pontas e sete olhos; os
quatro animais, cada um com seis asas e cheios de olhos na parte anterior e na
posterior; a besta que subiu do mar, com dez chifres e sete cabeças e, nos chifres,
dez diademas - não se prestam ao lápis. Uma ilustração de infeliz efeito grotesco
de uma tentativa assim pode ser vista em “Horas apocalíticas”, do Sr. Elliot, em
que é retratado o gafanhoto do capítulo 9 com uma coroa de ouro na cabeça, ca­
belos como de mulher, peitoril de ferro e cauda como a de escorpião.
O Arcebispo Trench, com muito talento, delineia a comparação entre os mo­
delos que a mente grega e hebraica, respectivamente, lidam com o simbolismo.
Na grega, o elemento estético é predominante tanto que a primeira necessidade
do símbolo é satisfazer o senso de beleza, forma e proporção. Na hebraica, a pri­
meira necessidade é

queosímbolo deveexpor, verdadeiraeplenamente, aideia religiosa do qual pretende


ser o veículo. Como o símbolo parecería quando se reveste de uma forma e molde
externos, se encontraria favor e auxílio no tribunal do gosto ou não, era uma con­
sideração bemsecundária; pode-se afirmar comconfiança que não recebia nenhuma
consideração.

A imagem do Apocalipse é hebraica, não grega. É duvidoso que haja algum


símbolo tirado do paganismo. Assim, os símbolos do Apocalipse devem ser lidos
do ponto de vista judaico, e não do pagão.

356
A pocalipse —Cap. 1

Mas dizer que esses símbolos chocam o senso estético não é detratar seu valor
como símbolo nem os detrair como violações da conveniência das coisas. Pode-
-se perguntar com justiça se, com toda essa aparente incongruência e até mesmo
monstruosidade, eles, afinal, podem não ser verdade para o cânone mais alto da
congruência. E certo que a grande economia divina visível, da natureza e do
homem, inclui distintamente o grotesco, o monstruoso, o ridículo (ou como os
qualificarmos). Reconhecemos o fato na expressão “caprichos da natureza”. Mas
eles são “caprichos”? Eles são incongruentes? Até termos apreendido na mente
todo o cosmos, não é seguro para nós responder a essa pergunta de forma muito
positiva. A aparente incongruência vista de um plano mais alto, pode fundir-se
em bela congruência. Testada por um sentido mais sutil, admitida em relação
e ligação com toda região do fenômeno mental e espiritual, vista como um fato
desse reino mais amplo que abraça idéias e verdades espirituais junto com o fenô­
meno externo; o externamente grotesco pode decompor-se no espiritualmente
belo; a incongruência superficial em harmonia essencial e profunda.
Essa possibilidade emerge, na verdade, em determinados pronunciamentos de
nosso Senhor, notavelmente em suas parábolas. Há muito tempo reconhece-se o
absurdo de tentar fazer uma parábola “descrever alguma proposição justa e bem
fundamentada e forçá-la a se sustentar por si só”; em outras palavras, insistir em
uma correspondência rígida e literal entre os mínimos detalhes do símbolo e da
coisa simbolizada. A exposição sólida avança para um tratamento mais abran­
gente e livre, porém mais profundo e mais espiritual, desses pronunciamentos,
compreendendo as meras e subjacentes correspondências de detalhes com a mais
profunda e, segundo Milligan,

fundamental harmoniaeparalelismoentreasduas grandes esferas do ser cósmico—a


daNatureza e ado Espírito; entre os três reinos, da Natureza, da História eda Reve­
lação. Portanto, aseleção desímbolos eparábolas daEscritura nãoéarbitrária, mas é
fundamentada na percepçãoda essência das coisas.

Assim, nessa imagem do Filho do Homem, a tentativa de retratar visu­


almente, para os olhos, a figura cingida com cabelos brancos como a neve,
olhos como chamas de fogo e espada saindo da boca —com pés semelhantes
a latão reluzente e segurando sete estrelas na mão, resultaria tão satisfatória
quanto a tentativa de pintar a misteriosa combinação de olhos, e rodas, e asas
da visão de Ezequiel. Se, por sua vez, admitirmos francamente a impossibi­
lidade disso e relegarmos esse simbolismo a uma região mais elevada, como
um delineamento (imperfeito por causa da imperfeição da fala humana e do
inevitável poder dos sentidos) de fatos espirituais muito profundos, de digni­
dade e pureza sacerdotais e reais; de pureza; de percepção divina; de indigna-

357
A pocalipse - Cap. 1

ção divina com o pecado; se, assim, trouxermos as sugestões mais profundas
da humanidade e da natureza exteriores na relação com sua verdadeira cor­
respondência no reino espiritual - conseguiremos algo mais profundo que
o apelo pictórico para a imaginação. Apreendemos o que não conseguimos
formular; não obstante, o apreendemos. Deixando de lado a correspondência
exterior, ficamos mais livres para penetrar nas profundezas do simbolismo
e alcançar uma correspondência interior não menos real e não menos com­
preensível.

Resplandece (φαίνει). Vide nota sobre Jo 1.5.

17. Caí. Compare com Êx 23.20; Ez 1.28; Dn 8.17ss.; 10.7SS.; Lc 5.8; Ap 19.10.
A condição do profeta, em espírito, não suplanta a existência no corpo. Compare
com At 9.3-5.

O Primeiro e o Último. Esse epíteto é atribuído três vezes a Jeová por Isaias
(41.4; 44.6; 48.12); três vezes nesse livro (aqui, 2.8; 12.13). Ricardo de São Victor
citado por Trench comenta:

Sou o primeiro e o último. Primeiro, por intermédio da criação, último por inter­
médio da retribuição. Primeiro, porque antes de mim um deus não foi formado;
último, porque depois de mim não deve haver outro. Primeiro, porque todas as
coisas são de mim; último, porque todas as coisas são para mim; de mimo princí­
pio, para mimo fim. Primeiro, porque sou a causa da origem; último, porque sou
ojuiz e o fim.

18. E o que vive (καί ό ζών). Não é uma sentença nova ligada às palavras se­
guintes, como na n t l h , mas conectada com o P rim e iro e o Ú ltim o por καί, e. A a r a
traz: e aquele que vive; e a t e b : o Q ue Vive. Compare com Jo 1.4; 14.6; 5.26.

Fui morto (καί έγενόμην νεκρός). Estritamente, v im a estar. Como na nota da


r v . Compare com Fp 2 .8 ; “obediente até à morte”.

Para todo o sempre. V ide nota sobre o versículo 6.

Amém. Omita.

As chaves da morte e do inferno. A n v i , com acerto, traz: as chaves d a m orte


Concebido como uma prisão ou uma cidade murada. Vide nota sobre
e do H ades.
Mt 16.18. As chaves são o símbolo de autoridade. Vide Mt 16.19; Ap 3.7; 9.1;
3 58
A pocalipse - C ap. 1

20.1. O provérbio rabínico diz: “Há quatro chaves alojadas na mão de Deus que
Ele não confia nem ao anjo nem ao serafim; a chave da chuva, a chave do alimen­
to, a chave das tumbas e a chave da mulher estéril”.

19. Escreve. Vide nota sobre o versículo 11. Acrescente portan to.

As que são (ã είσιν). Alguns traduzem por o que elas são, ou seja, o que elas
significam. Porém, a referência de μετά ταΰτα, depois destas, d a q u i p o r diante, a a
ú o i v , a s que são, parece ser decisiva em favor da primeira tradução, que, além de
tudo, é a mais natural.

Hão de acontecer (μέλλει γίνεσθαι). Não o futuro do verbo ser, mas estão
p a r a (μέλλει) acontecer (γίρεσθαι). Compare com o versículo 1 , “devem aconte­
cer”. Aqui o pensamento não se refere à necessidade profética, mas à sequência
de eventos.

20. M istério (μυστήριοι/). Vide nota sobre Mt 13.11. Dependendo da construção


do verbo escrever e em aposição com as coisas que tens visto.

Estrelas. Símbolos de superioridade e autoridade. Vide Nm 24.17; Dn 12.3.


Falsos mestres são estrelas errantes (Jd 13). Compare com Is 14.12.

Anjos (άγγελοι). O sentido exato do termo aqui é incerto. O que apresento a


seguir são as principais interpretações:
1. A s au toridades conhecidas como anjos ou m ensageiros da sinagoga transferidos
p a ra a igreja cristã. Estes eram meros clérigos ou leitores; assim sua posição não
corresponde àquela dos anjos presidindo as igrejas. Ademais, não há indício da
transferência desse cargo para a igreja cristã.
2. A njos, p ro p ria m en te dito. Guardiões celestiais das igrejas. Isso é argumenta­
do com o fundamento de que a palavra é usada constantemente em Apocalipse
para seres celestiais; como referência para os anjos dos pequeninos (Mt 13.10) e
para o anjo de Pedro (At 12.15). Argumenta-se que, se um indivíduo pode ter um
anjo da guarda, uma igreja também o pode ter. A referência também é feita aos
anjos nacionais tutelares de Dn 10.21; 12.1.
Mas por que o profeta seria instruído a escrever para mensageiros celestiais
com exortações ao arrependimento e à fidelidade e os descrevendo como “rico”,
“pobre”, “morno”? (2.9; 3.16,17).
3. O s anjos são um a personificação d as p ró p ria s igrejas. A igreja mencionada como
se estivesse concentrada em seu anjo ou mensageiro. Mas no versículo 20, eles
são explicitamente distinguidos dos castiçais de ouro, as igrejas.
359
A pocalipse - Cap. 2

4. Os dirigentes ou mestres da congregação. Esses são comparados por Daniel


(12.3) com as estrelas. Vide Ml 2.7, em que o sacerdote é chamado de anjo (men­
sageiro) do Senhor; e 3.1, em que a mesma palavra é usada para o profeta. Vide
também Ag 1.13. Sob essa interpretação são possíveis duas percepções, (a) Os
anjos são bispos·, a palavra άγγελος, às vezes, ocorre nesse sentido (como em Jero­
nimo e Sócrates). Isso levanta a questão da existência de episcopado perto do fi­
nal do século I24. (b) A palavra é usada para 0 ministério coletivamente, todo o qua­
dro de funcionários, incluindo os presbíteros e os diáconos, que representavam e
eram responsáveis pela condição moral das igrejas. Vide At 10.17,28; lPe 5.1-5.
O Dr. Schaff diz:

Essa linguagemdo Apocalipsejá olha emdireção à id e ia d e ep isco p a d o emsua forma


primitiva, ou seja, uma concentração monárquica de forma governamental emuma
pessoa, carregando uma relação patriarcal comacongregação, e responsável emum
sentido eminente pela condição espiritual do todo. £..(] Mas mesmo nesse caso, de­
vemos insistir na importante distinção entre os “anjos” do livro de Apocalipse e os
posteriores bispos diocesanos. Pois afora a extensão muito limitada de suas funções,
quandocomparadas como grande território da maioria dos bispos gregos, romanos,
católicos e anglicanos, esses anjos permaneciama b a ix o dos apóstolos e seus emissá­
rios, e nãoforamainda investidos de grandepoder (emespecial odireito paraconfir­
mar e ordenar) o que, depois da morte dos apóstolos, passou a ser responsabilidade
dos bispos. £,.7|, Por conseguinte, se forparaos entendermos como simples indivídu­
os, os anjos devemserconsideradoscomoformandoatransiçãodospresbíteros daera
apostólicapara os bispos do século II25.

C apítulo 2

Segundo Alford, cada carta para as sete igrejas contém: (l) uma ordem para es­
crever ao anjo da igreja específica; (2) um título sublime de nosso Senhor, na maior
parte, da imagem da visão precedente; (3) uma fala para o anjo da igreja, sempre
começando com eu sei, introduzindo uma declaração de suas circunstâncias atuais e
continuando com uma exortação ao arrependimento ou à constância e terminando
com um anúncio profético, principalmente, a respeito de como será 0 retorno do
Senhor; (4) uma promessa para aquele que se submete, geralmente acompanhada
de um chamado solene à atenção cuidadosa: “Quem tem ouvidos ouça” etc.
Em duas igrejas, Esmirna e Filadélfia, o Senhor encontra assunto só para
louvor. Em duas, Sardes e Laodiceia, com uma leve exceção na primeira, só para

24. Vide o EnsaiosobreoMinistro Cristão, doBispoLightfoot, emseu Com m entary on Philippians.


25. Schaff, H isto ry o f the A postolic Church.

360
A pocalipse - Cap. 2

repreensão. Em Éfeso, Pérgamo e Tiatira a condição é misturada, tanto de lou­


vor quanto de repreensão.

1. Éfeso. Éfeso foi construída perto do mar, no vale do rio Caiste, sob as sombras
dos montes Coressus e Prion. No tempo de Paulo, a cidade era a metrópole da
província da Ásia. Ela foi intitulada por Plínio de a lu z da A sia. Seu porto, em­
bora parcialmente ocupado, vivia cheio de navios e ficava na junção de estradas,
e assim, acabava por ter acesso para todo o interior do continente. Seu mercado
era a “Feira da Vaidade” da Ásia. Heródoto diz:

Osjônios da Ásia construíramsuas cidades emuma região emque o ar e oclima são


os mais bonitos de todoo mundo, pois nenhumaoutra regiãoéigualmente abençoada
comoaJônia. Emoutros países, oclimaésuper frioe úmido, ouo calor easecurasão
dolorosamente opressivos*6.

Na época de Paulo, Éfeso era a residência do procônsul romano, e os habitantes


degenerados desciam a toda espécie de bajulação para manter o favor de Roma.
A civilização da cidade era uma mistura da cultura grega e da oriental. Ela era o
quartel-general da arte da magia, e várias superstições eram representadas pelos
diferentes corpos sacerdotais. O grande templo de Diana, o Oriental, não a divin­
dade grega, foi classificado entre as sete maravilhas do mundo, e Éfeso chamava a
si mesma de seu sacristão ( vide nota sobre At 19.27). O direito de asilo estava ligado
ao templo. A lenda relata que quando o templo foi terminado, Mitrídates ficou de
pé sobre sua cúpula e declarou que o direito de asilo devia se estender a um círculo
em torno do templo, até a distância que pudesse alcançar com uma flecha, e a flecha
milagrosamente voou duzentos metros. Esse fato encorajou o contágio moral. Por
isso, o templo é descrito pelo Cônego Farrar desta maneira:

Ele foi construído comgenerosa magnificênciadecontribuições fornecidas por toda


a Ásia - as mulheres contribuírampara ele com suas joias, como as mulheres ju­
dias tinhamfeito havia muito tempo para o Tabernáculo no deserto. Para evitar o
perigo dos terremotos, suas fundações foramconstruídas, a alto custo, sobre bases
artificiais decamadas decouro ecarvão sobre opântano. Ele brilhava delonge com
esplendor como o de uma estrela. Seu átrio consistia de cento e vinte pilares da
ordemiônica, esculpidos emmármore pariano. Suas portas entalhadas emmadeira
de cipreste eram superadas pelas traves tão grandes e sólidas que se invocava a
ajuda de ummilagre para levantá-las. Diz-se que aescadaria que levava ao teto foi
cortada de uma única videira do Chipre. Alguns dos pilares foramesculpidos com
desenhos de extravagante beleza. No interior do templo, estavamas obras-primas
26. Heródoto, i, 14·2.

361
A pocalipse - C ap . 2

de Praxiteles, Fídias, Scopas e Policleto. Pinturas dos maiores artistas gregos, das
quais uma - a semelhança de Alexandre, o Grande, de Apeles —foi comprada por
uma elevada soma, em termos de dinheiro moderno, adornavam as paredes internas.
O telhado do templo era de madeira de cedro, sustentado por colunas de jaspe com
base de mármore pariano. Do topo dessas colunas pendiam presentes de valor ines­
timável, as ofertas votivas ou comemorativas da gratidão imersa em superstição.
Na parte posterior, destacava-se o grande altar adornado com os baixos-relevos de
Praxiteles, por trás do qual caía a cortina púrpura com vastas dobras. Por trás des­
sa cortina, ficava o escuro e terrível santuário no qual permanecia o mais sagrado
ídolo do paganismo clássico, e, mais uma vez, por trás do relicário, ficava a sala que,
inviolável sob a proteção divina, era vista como o banco mais rico e mais seguro do
mundo antigo21.

Éfeso, próxima de Roma, era a principal base do trabalho de Paulo. Ele devo­
tou três anos a essa cidade. A tradição comumente recebida apresenta João en­
cerrando sua carreira apostólica ali. Nada na história da igreja primitiva é mais
bem atestado que sua estadia e trabalho em Éfeso, o centro do círculo de igrejas
estabelecidas por Paulo na Jônia e Frigia.

Que anda (ò περίπατων). Mais do que meramente situar-se. A palavra expres­


sa a atividade de Cristo em favor de sua igreja.

2. Tuas obras (τα έργα σου). Vide nota sobre Jo 4.47.

Trabalho (κόπον). Originalmente, sofrim ento, cansaço-, daí trabalho exaustivo.


O verbo relacionado κοπιάω é, com frequência, usado para trabalho apostólico e
ministerial (Rm 16.12; lCo 15.10; G1 4.11).

Paciência (υπομονήν). Vide nota sobre 2Pe 1.6; Tg 5.7. Compare com a exor­
tação de Paulo para Timóteo em Eféso, 2Tm 2.25-26.

Sofrer (βαστάσαι). Vide nota sobre Jo 10.31; 12.6. Compare com G16.2, em que
a palavra é usada para os cristãos levarem as cargas uns dos outros.

Os maus (κακούς). Trench observa que:

não é pouco notável o fato de a graça ou virtude aqui atribuída ao anjo da igreja de
Éfeso (cp. v. 6) tivesse um nome no grego clássico: μισοπονηρία, ódio do mau; e a

27. Farrar, Life and IVork of St. Paul, ii, 12.

362
A pocalipse - Cap . 2

pessoa com quem a graça está relacionada, μ ισ ο π ό ν η ρ ο ς, odiador do mau-, embora ne­
nhuma dessas palavras, nem nenhuma equivalente a elas ocorra nas páginas do Novo
Testamento. É o mais estranho, por esse ódio do mau, puramente como mal em si, por
mais que hoje pouco se pense sobre ele ou se admire essa atitude, é eminentemente
uma graça cristã.

Puseste à prova (επειράσω). Na bv, tem exam in ado cuidadosam ente. Vide nota
sobre pro vado, lPe 1.7, e compare com lJo4.l; lCo 12.10.

3. Os melhores textos omitem ού κέκμηκας, não tens se cansado, e trazem κα'ι ού


κεκοπίακες, não tens se cansado. Os copistas supuseram que o verbo κοιτιάω so­
mente quer dizer trabalhar, ao passo que ele inclui o sentido de cansaço por causa
do trabalho.

4. Porém. Não está no texto e é desnecessário. A oração seguinte é o objeto de


tenho. “Tenho contra ti que deixaste.” Segundo Trench: “É, de fato, um porém
o que o Senhor tem contra a igreja de Efeso; e esse porém ameaça crescer e se
transformar em tudo, pois veja o versículo seguinte”. Para a expressão tenho con­
tra, v id e Mt 5.23; Mc 11.25; Cl 3.13.

Deixaste (άφήκας). Tradução mais correta do aoristo; contra a kjv , tens d eix a ­
do. O sentido original do verbo é a fa sta r ou repudiar. V ide nota sobre Jo 4.3.

Primeiro amor. Compare com Jr 2.2. A primeira devoção entusiástica da igre­


ja por seu Senhor, sob a imagem de amor conjugal.

5. Caíste (έκπέπτωκας). Literalmente, tens caído.

Arrepende-te (μετανόησον). Vide nota sobre Mt 3.2; 21.29.

Brevemente. Omita.

Virei (έρχομαι). Na a r a , corretamente, venho.

Tirarei do seu lugar o teu castiçal. Farrar declara:

Seu castiçal, há séculos, foi tirado de seu lugar, a esquálida vila islâmica que fica mais
próxima não tem nenhum cristão em sua insignificante população; seu templo é uma
massa de ruínas disformes; seu porto é um tanque coberto de vegetação; o alcaravão
estrondeia em meio a seus pântanos pestilentos e estagnados; e a malária e o esqueci-

363
A pocalipse —C ap. 2

mento reinam supremos sobre o lugar em que a rica civilização da Antiguidade reunia
as cenas de suas mais ignorantes superstições e seus pecados mais degradantes48.

João emprega o verbo κιν4ω, tirar (ara , mover), só no Apocalipse e, além dessa,
em 6.14, passagem em que, como aqui, ele tem o sentido de mover emjulgamento.

6. Dos nicolaítas. De νικάω, conquistar, e λαός, povo. Há duas explicações princi­


pais para o termo. A primeira, e a melhor, é histórica. Uma seita surgida de Nicolas,
um prosélito de Antioquia e um dos sete diáconos de Jerusalém (At 6.5), que apos-
tatou da verdade e se tornou o fundador de uma seita gnóstica antinomiana. Pa­
rece que eles se caracterizavam pela sensualidade, seduzindo cristãos a participar
de festas idólatras e pagães e a ignorar a castidade. Por isso, eles foram marcados
pelos nomes de Balaão e de Jezabel, dois importantes agentes de contaminação
moral sob a dispensação do Antigo Testamento. Balaão atraiu os israelitas, por
intermédio das filhas de Moabe e Midiã, para a idolatria e a prevaricação (Nm 25;
31.16). Jezabel assassinou os profetas do Senhor e promoveu a idolatria em Israel.
Os nicolaítas ensinavam que, a fim de adquirir habilidade na sensualidade, a pessoa
tinha que conhecer toda a sua gama por experiência; e que, por conseguinte, ela de­
veria abandonar-se sem reservas à luxúria do corpo, uma vez que esta só envolvia
o corpo e não tocava o espírito. Esses heréticos eram odiados e foram expulsos da
igreja de Efeso (Ap 2.6), mas eram tolerados pela igreja de Pérgamo (Ap 2.15). A
outra percepção vê o nome como simbólico para destruidor ou corruptor de pessoas.
Essa percepção é adotada por Trench, que afirma:

Os nicolaítas são os balaamitas. Nenhuma seita carrega um nome ou o outro; mas


aqueles que, na nova dispensação, repetiram o pecado de Balaão na antiga dispensação
e tentaram conquistar ou destruir o povo de Deus por meio das mesmas tentações
pelas quais Balaão tinha tentado os conquistar antes29.

Contudo, os nomes não são de maneira alguma paralelos: conquistador de pes­


soas não é a mesma coisa que corruptor de pessoas. Além disso, no versículo 14, os
balaamitas são evidentemente distinguidos dos nicolaítas.
Alford comenta:

Não há nenhum tipo de motivo para interpretar o nome de outra maneira que não
historicamente. Ele ocorre em uma passagem, indicando simples assunto de fato his­
tórico, da mesma maneira que o nome de Antipas o faz no versículo 13.

28. Farrar, Life and Work of St. Paul, ii, 43-44.


29. Trench, Seven Churches.

364
A pocalipse —C ap. 2

7. Quem tem ouvidos. Compare com Mt 11.15; Mc 4.9. A expressão não é


encontrada no Evangelho de João. Ela sempre é usada para verdades radicais,
grandes princípios e promessas.

Ao que vencer (τω νικώντι). Fórmula comum a todas as cartas. O verbo é


usado de forma absoluta sem nenhum objeto expresso. É característico de João,
havendo uma ocorrência no Evangelho, seis na primeira epístola, dezesseis em
Apocalipse e em outras passagens só em Lc 11.22; Rm 3.4; 12.21.

Dar-lhe-ei. Esse termo tem lugar em cada uma das cartas. O verbo é uma
palavra habitual de João para os privilégios e funções do Filho, quer como con-
cecido a Ele pelo Pai, quer dispensado por Ele a seus seguidores. V ide Jo 3.35;
5.22,27,36; 6.65; 13.3; 17.6. Compare com Ap 2.23; 3.8; 4.4; 11.3.

D a árvore (έκ ξύλου). Há 127 ocorrências da preposição έκ, de, de dentro de,
em Apocalipse, e seu sentido próprio é quase universalmente de dentro de. Porém,
essa tradução, em muitas passagens, ficaria tão estranha e idiomática ao ponto de
os revisores do Novo Testamento se sentirem autorizados a adotá-la apenas 41
vezes desse total e empregar de, do, pelo, com, sobre, em, p o r causa de, p o r m o tivo de,
dentre. Vide, por exemplo, 2.7,21-22; 4.4,10; 8.11; 9.18; 14.13; 15.2; 16.21.Compa-
recornJo 3.31; 4.13; 6.13,39,51; 8.23,44; 9.6; 11.1; 12.3,27,32; 17.15.
A rvo re, literalmente, m adeira. V ide nota sobre Lc 13.31; iPe 3.24. O Deão
Plumptre observa o fato de que, proeminente como esse símbolo é na história
primordial, permaneceu despercebido no ensinamento no qual mais deveriamos
ter procurado sua presença - no do salmista e dos profetas do Antigo Testamen­
to. Só em Provérbios de Salomão ele foi usado, em um sentido meio alegórico e
meio místico (Pv 3.18; 23.12; 11.30; 15.4). O reavivamento do símbolo em Apo­
calipse está de acordo com o tema da restituição de todas as coisas. ‘Ά árvore que
desapareceu com o desaparecimento do paraíso terreno reaparece com o reapa­
recimento do paraíso celestial”. C om er da árvore da vida expressa participação
na vida eterna. A imagem da árvore da vida aparece em todas as mitologias, da
índia à Escandinávia. Os rabinos e os mulçumanos chamam a videira de a á rvo re
d a provação. O zoroastrismo tem sua árvore da vida e a chama de a destru idora da
morte. Ela cresce ao lado da água da vida e beber sua seiva confere imortalidade.
A árvore da vida hindu é retratada crescendo de uma grande semente no meio de
uma extensão de água. Ela tem três ramos, cada um coroado com um sol, deno­
tando os poderes da criação, preservação e renovação após a destruição. Em ou­
tra representação, Buda senta-se para meditar debaixo da árvore com três ramos,
cada ramo com três hastes. Um dos cilindros babilônios descobertos por Layard
representa três sacerdotisas catando o fruto do que parece ser uma palmeira

365
A pocalipse - C ap . 2

com três ramos de cada lado. Hathor, a Vênus dos egípcios, aparece meio oculta
nos ramos do pessegueiro sagrado dando o fruto para as almas que partem e a
bebida do céu de um frasco do qual a nascente da vida desce sobre o espírito; e
há uma imagem aos pés da árvore, como um falcão, com cabeça humana e com
mãos estendidas.
Na mitologia escandinava, uma imagem proeminente é a de Yggdrasil, ofreixo
da existência, suas raízes no reino de Hela, ou Morte, seu tronco alcança o céu e
seus galhos se espalham por todo o universo. Aos seus pés, no reino da Morte,
sentam-se três Nornas, ou destinos, o passado, o presente e o futuro, irrigan­
do suas raízes com a água do poço sagrado. Compare com 22. 2,14,19. Virgílio,
dirigindo-se a Dante na conclusão da subida ao Monte do Purgatório, diz:

O pomo, que é tão doce, quanto esquivo,


Que a ambição dos mortais procura ansiosa,
Hoje à fome há de dar-te o lenitivo30.

Paraíso. Vide nota sobre Lc 23.48. Omita no meio do. Παράδεισος, paraíso, se­
gundo Trench,

passa por uma série de sentidos, cada um mais alto que o anterior. De algum jardim de
deleite, que é seu primeiro sentido, passa a ser predominantemente aplicado ao jardim
do Éden, depois, ao lugar de descanso das almas separadas em alegria e felicidade e,
por fim, ao próprio céu; e,de forma notável, percebemos nele o que vemos, de fato,
em tantas palavras, como a religião revelada as assume em seu culto e as transforma
em veículos de verdades muito mais elevadas que qualquer que tenham conhecido de
início, transformando-as e transfigurando-as, como nesse caso, de glória em glória.

8. Esmima. Localizada um pouco a norte de Éfeso, no golfo de mesmo nome.


A cidade original foi destruída por volta de 627 a.C. e ficou deserta e em ruínas
durante quatrocentos anos. Alexandre, o Grande, estudou sua restauração e seu
projeto foi executado depois de sua morte. A nova cidade foi construída a curta
distância a sul da antiga e se tornou a mais admirável da Ásia Menor, sendo co­
nhecida como a glória da Asia. É uma das cidades que reivindicou a honra de ser
a cidade de nascimento de Homero. Um templo esplêndido foi levantado pelos
esmirneus em memória dele e uma caverna da vizinhança da cidade era mos­
trada como o lugar onde ele teria composto seus poemas. O excelente porto de
Esmirna transformou-a em um centro comercial, mas ela também se destacava
por suas escolas de retórica e filosofia. Policarpo foi o primeiro bispo de sua igre-

50. Dante, A Divina Comédia, Paraíso, xxvii, 115-117, p. 167.

366
A pocalipse - C ap. 2

ja, que sofreu muita perseguição, e diz-se que ele foi martirizado no estádio da
cidade em 166 d.C. Argumenta-se, com alguma plausibilidade, que Policarpo foi
bispo de Esmirna na época da composição do Apocalipse e era a pessoa a quem
se dirige aqui. Contudo, essa questão está associada com a data de composição
(■vide Trench31). A cidade era a sede da adoração de Cybele, a mãe dos deuses, e
de Dionísio ou Baco.

Foi morto (èyévero ueicpòç). Literalmente, veio a estar morto.

Reviveu (eCqoeu). Literalmente, viveu. Na rv, apropriadamente, viveu novamen­


te·, a palavra é usada para se referir à restauração da vida. Na n v i , tornou a viver.
Vide, para um uso similar, Mt 9.18; Jo 5.25.

9. Tuas obras, e. Omita.

Tribulação (θλνψιν). Vide nota sobre Mt 13.21. Referindo-se à perseguição de


opressores judeus e pagãos. Vide nota sobre Esmirna, versículo 8.

Pobreza (irtaixeíav). Porque, como todas as outras igrejas cristãs primitivas,


a maioria de seus membros era das classes mais pobres e, talvez, também se
refira ao fato de serem roubados por seus perseguidores. Vide nota sobre pobre,
Mt 5.3.

Rico. Em fé e graça. Compare com Tg 2.5,7; lTm 6.17-18; Lc 12.21;


Mt 19.21.

Blasfêmia (βλασφημίαν1). Vide nota sobre Mc 7.22. Não principalmente blasfê­


mia direta contra Deus, mas insultando os crentes.

Judeus. Literalmente. Não cristãos como em Fp 3.3; Rm 2.28-29. Na verdade,


judeus por nascimento, mas não espiritualmente. O título não lhes é dado pelo
Espírito, nem pelo profeta, mas por eles mesmos; e ninguém usaria esse título
a não ser os que eram judeus por nascimento ou por religião. A inimizade dos
judeus contra os cristãos é um fato conhecido de todos os leitores do livro de
Atos; e é um fato histórico que sua malignidade era especialmente demonstrada
em direção à igreja de Esmirna. Na carta circular enviada pela igreja de Esmir­
na para as igrejas do mundo cristão, relata-se que judeus se juntaram com os
pagãos no clamor para que Policarpo fosse jogado aos leões ou queimado vivo, e

31. T rench, Commentary on the Epistles to the Seven Churches in Asia.


367
A pocalipse - C ap . 2

eles foram os primeiros a, ώς έθος αύτοΐς (como era seu hábito), trazer toros para
a pilha e a esforçar-se para impedir que os restos do mártir fossem entregues a
seus companheiros cristãos para sepultamento.

Sinagoga de Satanás. Para sinagoga, vide nota sobre ajuntam ento, Tg 2.2, a
única passagem em que a palavra é usada para a assembléia cristã. Esse fato apoia
a explicação literal do termo ju deu s. Para Satanás, vid e nota sobre Lc 10.18. Para
o uso de João da expressão os ju deu s, vid e nota sobre Jo 1.19. O uso da palavra
aqui é, em um sentido honrável, muito diferente do costume de João, fato esse
usado para argumentar contra a autoria dele de Apocalipse. Mas João aqui só
cita a palavra e, além disso, emprega-a sem o artigo.

10. Nada temas (μηδέν φοβοΰ). Literalmente. Para o verbo, vid e nota sobre
Lc 1.50.

Eis (Ιδού δή). A partícula δή, p o r certo, que não é traduzida, dá qualidade de
certeza à predição. No n t ia , Certo é que; na n v i , S a ib a que.

O diabo (διάβολος). Vide nota sobre Mt 4.1. Assim, a perseguição dos cristãos
é rastreada até o agente direto de Satanás, e não às paixões ofendidas nem aos
preconceitos dos homens. Trench observa·.

Não há nada mais notável nos registros que nos tenha chegado das perseguições nos
primórdios da Igreja que o senso de que confessores e mártires e também aqueles que,
depois, narraram os sofrimentos e os triunfos deles considerem e profiram que essas
grandes lutas de aflição pela qual eles foram chamados a passar, eram obras diretas
do diabo.

Lançará (μέλλει βαλειν). Na r v , corretamente, está prestes a lançar, c p . ara, está


p a ra lançar.

Prisão (φυλακήν). Vide nota sobre At 5.21.

Sejais tentados (πειρασθήτε). Vide nota sobre lPe 1.7.

Tribulação de dez dias (θλΐψιν ημερών δέκα). Literalmente.

Sê (γίνου). Não se pode dar a exata força da palavra por meio de um vocábulo
correspondente em nossa língua. Literalmente, “torne-se t u . Está para acontecer
uma sucessão de provações exigindo um aumento no poder e uma variedade
368
A pocalipse - C ap . 2

na direção da fé. Com referência a essas provações, a fidelidade não é somente


existente, mas apropriada, desenvolvendo com nova força e em novas aplicações.

Até à m orte (αχρι θανάτου). Não fiel até a hora da morte, mas fiel a ponto de
sofrer a morte por causa de Cristo. “É uma expressão intensiva, não extensiva."

A coroa (τον στέφανον). Tradução correta, “a coroa”; contra a k jv , “uma co­


roa”. V ide nota sobre lPe 5.4; Tg 1.12. Coroa é usado com uma variedade de
palavras: coroa à e ju stiç a (2Tm 4.8); de g ló ria (lTs 2.19; lPe 5.4); defo rm o su ra (Is
62.3, lxx ; na arc , glória)·, de soberba (Is 28.1).

Da vida (τής ζωής). A expressão completa é a coroa d a vida-, ou seja, a coroa


que consiste na vida eterna. A imagem não é tirada dos jogos gregos, embora
Esmirna tivesse o templo Olimpo de Júpiter, e os jogos Olímpicos fossem cele­
brados lá. A coroa é o d iadem a de realeza, em vez da g u irla n d a da vitória, embora
mais comumente seja usada no último sentido. Não é provável que João usasse
uma imagem dos jogos, uma vez que os judeus cristãos tinham um violento pre­
conceito contra eles; preconceito esse que, em ocasiões de celebração, provocava
especial ferocidade dos pagãos contra o que eles consideravam como o caráter
não patriótico e antissocial dos discípulos de Cristo. Foi uma exigência do povo,
reunido no estádio, que Policarpo fosse morto. Além disso, é duvidoso que algum
símbolo de Apocalipse fosse pego do paganismo. A imagem é judaica.

11. Receberá o dano (άδικηθή). Estritamente, sofrerá dano, p re ju ízo (cp. ara , n v i ,
teb); contra a tb, n ada sofrerá d a segunda m orte, e b j , será lesado.

Segunda morte. Expressão peculiar de Apocalipse. Vide 20.6,14; 21.8. Nessas


duas passagens, é definida como lago de fo g o . A morte que aguarda o ímpio após
o julgamento.

12. Pérgamo. A forma apropriada do nome é Pergamum. A cidade ficava situada em


Teuthrania, Mísia, em um distrito irrigado por três rios, um dos quais se comunica
com o mar. A cidade original foi construída em uma elevada colina, que, depois, tornou-
se uma cidadela conforme as casas surgiam em sua base. As lendas locais ligavam um
caráter sagrado ao lugar, o que, junto com sua força natural, transformou-o em um
depósito do tesouro real. A cidade, por seu embelezamento e extensão, tinha uma
dívida principalmente com Eumenes II (197-159 a.C.). Além dos passeios e prédios
públicos, ele fundou uma biblioteca que continha 200 mil livros e só perdia para a de
Alexandria. O reino de Pérgamo tornou-se uma província romana em 130 a.C. Mas a
cidade continuou a florescer, tanto que Plínio a intitulou de longe a m ais ilustre da Ásia.
Todas as principais estradas da Ásia Ocidental convergiam para lá. Pérgamo era
369
A pocalipse —C ap . 2

celebrada pela produção de unguentos, cerâmica, tapeçarias e pergaminho, e o seu


nome (chartapergamena), na realidade, deriva de pergaminho. Ela continha um templo
celebrado e muito frequentado de Eusculápio, adorado na forma de uma serpente
viva alimentada no templo. Por isso, Eusculápio era chamado de o deus de Pérgamo
e, nas moedas cunhadas na cidade, ele aparece, com frequência, com uma vara na qual
a serpente estava enrolada. A grande glória da cidade era o Nicetório, uma gruta de
grande beleza contendo uma reunião de templos. A cidade era descrita como aquela
que reúne uma cidade-catedral pagã, uma cidade universitária e uma residência real
embelezada ao longo dos anos pelos reis, todos os quais tinham paixão por gastar e
amplos meios de gratificá-la. Os rios que circundavam a cidade irrigavam as grutas
de Nicetório e de Eusculápio, na qual floresciam os devassos ritos da Antiguidade
pagã. O caráter sagrado da cidade aparece em moedas e inscrições que descreviam o
pergamenos pelo título reivindicado pelos adoradores de Diana, em Éfeso, νβωκόροι,
limpadores do templo ou sacristãos.

A espada aguda de dois fios. Vide nota sobre l . 16.

IS. Habitas (κατοικείς). Vide nota sobre Lc 11.26; At 2.5.

Trono (θρόνος). Esta é a tradução correta, trono, uma transcrição da palavra


grega. Melhor que assento, porque a intenção é representar Satanás exercendo do­
mínio ali. A palavra é usada dentro do Novo Testamento para trono real (o trono de
D a v i Lc 1.52, vide também Lc 1.52; At 2.30); do trib u n a lju d ic ia l ou corte de ju stiç a
(tam bém vos assentareis sobre doze tronos, p a ra ju lg a r as d o ze tribos de Israel, Mt 19.28;
vide também Lc 22.30); trono dos anciãos (assentados sobre os tronos vin te e quatro an­
ciãos, Ap 4.4; vide também Ap 11.16). Também, por meio de metonímia, aquele que
exerce autoridade, logo, no plural, de anjos (Cl 1.16), tronos pertencentes ao mais
alto grau dos seres angélicos cujo lugar é na presença imediata de Deus.

Reténs (κρατβΐς). Vide nota. sobre Mt 7.3; At 3.11.

Meu nome. Vide nota sobre lJo 1.7.

Minha fé. Vide nota sobre At 6.7.

Antipas. Não há outro registro desse mártir.

14. Doutrina (διδαχήν). Na n v i , melhor, ensinos.

Balaão. Vide Nm 25.1-9; 31.15-16. Compare com 2Pe 2.15; Jd 11.


370
A pocalipse - C ap . 2

Tropeços (σκάι^δαλον). Vide nota sobre escandalizar, Mt 5.29; e escândalo, Mt 16.23.

D iante (êvaíiuou). Literalmente, à vista de. Vide nota sobre Lc 24.11.

Sacrifícios da idolatria (τΐδωλόθυτα). Na a 2 1 , a palavra é traduzida de quatro


maneiras distintas: carne de animais sacrificados aos ídolos (At 15.29); o que é sacrifi­
cado aos ídolos (At 21.25); carne sacrificada aos ídolos ( lCo 8.4); e coisas sacrificadas
a ídolos (Ap 2.14). A bj traduz uniformemente: carnes imoladas (ou sacrificadas) aos
ídolos; também a a e c : coisas sacrificadas (ou o que ê sacrificado) aos ídolos.
O ato de comer comida sacrificada aos ídolos, o que não era uma tentação para os
judeus cristãos, era bem diferente para os gentios. O ato de sacrifício, entre todas as
nações antigas, era tanto um ato social quanto religioso. Comumente, só uma parte
da vítima era consumida como oferta e o resto tornava-se a porção dos sacerdotes,
dada aos pobres ou vendida de novo no mercado. Assim, sacrifício e festa eram iden­
tificados. A palavra originalmente usada para matar em sacrifício (9úetv) adquiriu o
sentido geral de matar (At 10.13). Entre os gregos essa identificação era levada ao
ápice. Tucídides enumera os sacrifícios entre os entretenimentos populares. “Não
esquecemos”, diz ele, “de prover para nosso espírito cansado muitos relaxamentos da
labuta. Temos jogos e sacrifícios regulares durante o ano todo”32. Também Aristó­
teles: Έ algumas sociedades parecem existir por causa do prazer, a dos seguidores
do amor e aqueles clubes de jantar; pois estes existem por causa do sacrifício e da
relação social”33. Suetônio relata que, em uma ocasião, Cláudio, imperador romano,
enquanto estava no fórum de Augusto, sentiu o aroma do banquete que estava sendo
preparado para os sacerdotes na vizinhança do templo de Marte, saiu do tribunal e
sentou-se à mesa com eles3*. Relata também como Vitélio tirou do altar de fogo as
entranhas das vítimas e o milho e os comeu35. Assim, para os gentios, “recusar-se a
compartilhar da comida sacrificada aos ídolos envolvia ausência da festividade públi­
ca e particular, uma renúncia a grande parte da vida social de sua época”. O assunto
é discutido por Paulo em Rm 14.2-21 e em lCo 8.1-11.1.0 conselho de Jerusalém
(At 15) proibia comer a carne oferecida a ídolos, não em consideração a essa proi­
bição feita pela lei mosaica, mas por se tornar uma possível ocasião de pecado para
os cristãos fracos. Em sua epístola aos Coríntios, entre os quais os judeus e o grupo
mais escrupuloso eram os mais fracos, Paulo, ao argumentar com o grupo mais forte
e mais independente, nunca alude ao decreto do conselho de Jerusalém, mas discute
o assunto do ponto de vista dos direitos da consciência. Embora ele admita a possi­
bilidade de participação sem culpa em um banquete, mesmo no templo do ídolo, ele

32. Tucídides, ii, 38.


S3. Aristóteles, Ética, viii, 9, 5.
34. Suetônio, Cláudio, 33.
35. Id., Vitélio, 13.

371
A pocalipse - C ap. 2

desaconselha isso com base nas perigosas consequências para a consciência fraca e
também por envolver um reconhecimento formal da falsa adoração, à qual eles re­
nunciaram no batismo. Stanley relata:

Na epístola aos Romanos, encontramos o excesso do que o escrúpulo do irmão mais


fraco estava carregado, até mesmo o tomde abstenção total de alimentos de origem
animal; como nos nicolaítas das igrejas apocalípticas, percebemos oexcesso dogrupo
indiferentista, que mergulhou semrestrições emtodas as poluições, moral e também
cerimonial, que acompanhavamos ritos pagãos™.

Plumptre diz:

Pode-se observar que- comoexplicaçãoparaalinguagemmaisforteemais veemente


de Apocalipse, considerado até mesmo como apenas umlivro humano—as condições
do caso tinhammudado. Cristãos e pagãos não moravammaisjuntos, como emCo-
rinto, comcomparativamente pouca interrupção emsua relação social, mas estavam
divididos pela clara linha da demarcação. O comer coisas sacrificadas para ídolos era
umtestecada vez mais crucial, envolvendo recuar covardemente daconfissãopública
da fé cristã. Os discípulos que se sentavamàmesa na refeição no templo do ídolo se
divertiamcomaqueles cujas mãos estavamtingidas do sangue de seus irmãos adora­
dores ecujos lábios tinhampronunciado zombarias blasfemas contra o santo nome.

Em tempos de perseguição, experimentar o vinho das libações ou comer carne


oferecida a ídolos era entendido como renúncia ao cristianismo.

15. Assim. Da mesma maneira como Balaque tem Balaão por falso mestre, assim
você tem nicolaítas por mestres.

Nicolaítas. Vide nota sobre o versículo 6.

O que eu aborreço. Omita.

16. Batalharei (πολεμήσω). As palavras guerra efazer ocorrem com mais frequência
em Apocalipse que em qualquer outro livro do Novo Testamento. Segundo Renan:
“Um eterno rufar de trovão do trono”.

17. Comer. Omita.

Do maná escondido (του μάννα του κεκρυμμενου). A alusão pode ser parcial­
mente ao pote de maná que ficava guardado na arca no santuário. VideÊx 16.32-

36. Stanley, T he E pistles o f S t. P a u l to the Corinthians.


372
A pocalipse - Cap. 2

34; compare com Hb 9.4. O fato de que a imagem da arca era familiar a João fica
patente em 11.19. Contudo, essa alusão é indireta, pois o maná guardado na arca
não era para alimento, mas um memorial do alimento, um dia, desfrutado. Duas
idéias parecem estar combinadas na imagem:
1. Cristo como o pão do céu, a nutrição da vida dos crentes, o verdadeiro maná,
do qual aqueles que comem não morrem nunca (Jo 6.31-33,48-51); escondido, no
fato de que Ele está fora da vista, e a vida do cristão está escondida com Ele em
Deus (Cl 3.3).
2. A satisfação do desejo do cristão quando Cristo for revelado. O maná
escondido não deve permanecer escondido para sempre. Devemos ver Cris­
to como Ele é e ser como Ele (lJo 3.2). Cristo dá o maná ao entregar-se.
Trench diz:

O ver a Cristo como Ele é e, por meio dessa visão beatífica, ser mais igual a Ele, é
idêntico acomer o maná escondido, o qual deve, por assimdizer, ser, então, tirado do
santuário, o Santo dos Santos da presença imediata deDeus, onde ficou escondido da
vistapor tantotempo, paraque todos possamparticipar dele; aglória deCristo, agora
escondida evelada, sendo, então, reveladapara seupovo.

Essa é uma das inúmeras ilustrações da dependência do Apocalipse da história


e da profecia do Antigo Testamento. Milligan relata:

Em tal extensão é o caso que é duvidoso se ele contémuma única imagemque não
tenha sido extraída do Antigo Testamento ou uma única sentença completa que não
tenha sido mais oumenos construída de material tirado damesma fonte.

Vide, por exemplo, Balaão (2.14); Jezabel (2.20); Miguel (12.7; cp. Dn 10.13;
12.1); Abadom (Apoliom) (9.11); Jerusalém, monte Sião, Babilônia, o Eufrates,
Sodoma, Egito (21.2; 14.1; 16.19; 9.14; 11.8); Gogue e Magogue (20.8; cp. Ez 38;
39). De maneira semelhante, a árvore da vida, a vara de ferro, os vasos de oleiro,
a estrela da manhã (2.7,17,27-28). O céu é descrito sob a imagem do tabernáculo
no deserto (11.1,19; 6.9; 8.3; 11.19; 4.6). O cântico dos redimidos é o cântico de
Moisés ( 15.3). As pragas do Egito aparecem no sangue, no fogo, no trovão, nas
trevas e nos gafanhotos (cap. 8).

0 grande terremotodocapítulo 6étiradodeAgeu; osol ficandonegro como saco de


cilício ealua ficandocomo sangue (cap. 6) deJoel; as estrelas docéucaindo, afigueira
dando seu figo verde, os céus retirando-se como umlivro que se enrola (cap. 6) de
1saias; os escorpiões docapítulo9deEzequiel; avindima das vinhas da terra (cap. 14)
deJoel; e apisadura dolagar dovinho do mesmo capítulo de Isaías.
373
A pocalipse - Cap. 2

Bem como os detalhes de uma única visão são reunidos de diferentes profe­
tas ou de diferentes partes do mesmo profeta. Por exemplo, a visão do Reden­
tor glorificado (1.12-20). Os castiçais de ouro são de Êxodo e de Zacarias; a
veste até os pés de Êxodo e de Daniel; o cinto de ouro e cabelo como lã branca
de Isaías e de Daniel; os pés como latão reluzente e a voz que soa como muitas
águas de Ezequiel; a espada de dois fios de Isaías e Salmos; o rosto como o sol
de Êxodo; o cair como morto do profeta de Exodo, Isaías, Ezequiel e Daniel;
a mão direita de Jesus sobre o profeta de Daniel. O Professor Milligan afirma:

Na verdade, não queo escritor tenha seprendido aoAntigo Testamento comespírito


de escravo. Ele, antes, usa oAntigo Testamento comgrande liberdade e independên­
cia, estendendo, intensificando ou transfigurando suas descrições aseugosto. Contu­
do, não podemos nos equivocar quanto àprincipal fonte de seus emblemas. Os livros
sagrados de seu povo erammais que familiares para ele. Eles tinhampenetrado em
todo seuser. Tinhamvivido comelecomo umasementegerminando, capaz decrescer
não só nas antigas formas, mas tambémemnovas formas de vida e beleza. Em toda
aextensão da literatura sagrada e religiosa, não seencontra emnenhumoutro lugar
umafusãoperfeita darevelaçãodada aIsrael comamente de alguémqueexpressaria
as idéias de Israel ou daria voz, por meio de símbolos fornecidos na história de Israel,
aos presentes e mais elevados pensamentos dafécristã37.

Uma pedra branca (ψήφον λαϊκήν). Vide nota sobre f a z e r as contas, Lc 14.28;
e brancas, Lc 9.29. A fundação da figura não é para ser procurada nos costumes
gentios, mas nos judaicos. Trench diz: “Branco, em todos os lugares, é a cor e
a vestimenta do céu”. Vide 1.4; 3.5; 7.9; 14.14; 19.8,11,14; 20.11. É o brilhante e
luminoso branco. Compare com Mt 28.3; Lc 24.4; Jo 20.12; Ap 20.11; Dn 7.9.
É impossível determinar o sentido do símbolo com toda certeza. As seguintes
são as principais percepções: o Urim e Tumim escondidos no peitoril de julga­
mento do sumo sacerdote. Isso é defendido por Trench, que supõe que o Urim
era uma pedra peculiarmente rara, e é bem provável que fosse o diamante, e
gravada com o inefável nome de Deus. O novo nome que ele considera como o
novo nome de Deus ou de Cristo (3.12); alguma revelação da glória de Deus que
só pode ser transmitida ao seu povo apenas no mais alto estado de ser e que só
aqueles que realmente receberam conseguem entender.
Milligan supõe que é uma alusão ao prato de ouro que o sumo sacerdote usava
na testa e tinha inscrito as palavras: “Santidade do Senhor”; mas, de forma um tan­
to estranha, passa para a imagem da pedra, ou seixo, usado para votar e considera
que a pedra branca carrega a ideia da absolvição do crente nas mãos de Deus.

S7. Nota condensadaapartir deMilligan, T he R evelation o f S t. John.


3 74
A pocalipse - Cap. 2

O Deão Plumptre vê na pedra o selo por meio do qual, em virtude de seu


formato ou dos caracteres inscritos nele, aquele que o possuía podia, a qualquer
tempo, reivindicar as boas-vindas francas e sinceras do amigo que lhe dera a
pedra; e acrescenta a isso uma alusão ao costume de presentear com essas lem­
branças simbólicas, com o nome do convidado inscrito nelas, uma permissão
de admissão para a festa dada para os que eram convidados a compartilhar no
recinto do templo - uma festa que consistia totalmente, ou em parte, de comida
de sacrifício.
Outros se referem, em relação à ligação da pedra com o maná, ao uso entre
os sacerdotes de jogar a sorte a fim de determinar quem oferecería o sacrifício.
Outros ainda consideram que era usada uma pedra, ou fava, como cédula para
escrever o nome de um candidato em uma eleição.
Em suma, os comentaristas estão totalmente divididos em relação à questão, e
a verdadeira interpretação permanece assunto de conjectura.

Um novo nome. Alguns explicam como o novo nome de Deus ou de Cristo


(cp. 3.12); outros consideram que é o próprio nome do receptor. Alford diz:

Contudo, um n o vo nome, uma revelação de seu título eterno como umfilho deDeus
para aglória emCristo, mas consistindo daquelas marcas e sinais pessoais da adoção
peculiar de Deus de s i m esm o e reveladas nelas comque ele e ninguémmais está fa­
miliarizado.

Bengel diz: “Você sabe que tipo de novo nome obterá? Sujeite-se. Antes disso,
você pedirá em vão e, depois disso, logo o lerá inscrito na pedra branca”.

18. Tiatira. Situada nos confins de Mísia e Jônia. De acordo com Plínio, ela era
conhecida nos tempos antigos como Pelópia e Euhippia. Sua prosperidade rece­
beu novo impulso sob o imperador romano Vespasiano. A cidade continha vários
sindicatos corporativos, como os de oleiros, curtidores, tecelões, produtores de
manto e tintureiros. Foi de Tiatira, que Lídia a vendedora de púrpura de Filipo
veio, a primeira convertida europeia de Paulo. Os numerosos rios do país vizinho
eram cheios de parasitas. A principal deidade da cidade era Apoio, adorado como
o deus sol sob o sobrenome de Tirimaeus. Um santuário fora dos muros da ci­
dade era dedicado a Sambate, uma sibila. O lugar nunca teve muita importância
política.

Filho de Deus. Compare com F ilh o do H om em , 1.13; SI 2.7; 19.13.

Que tem os olhos. Vide nota sobre 1.14-15.


375
A pocalipse - Cap. 2

19. E que as tuas últimas obras etc. Em contrapartida, na ara , e as tuas últimas
obras, mais numerosas etc. (cp. bj); na ecp, e as tuas últimas obras, que excedem etc.
Leia como na arc.

20. Tenho Qpoucas coisas]. Conforme a kjv (cp. tr). Omita, como na arc.

Tolerares (έάς). Usado de forma absoluta.

Jezabel. Usado simbolicamente, mas com referência à notória Jezabel his­


tórica. Ela era filha de Etbaal, rei de Sidom (lRs 16.31), antes um sacerdote de
Astarte e que fez seu caminho para o trono matando seu predecessor Phele. O
casamento de Acabe com ela foi a primeira ocorrência de um casamento de um
rei do Reino do Norte, de Israel, com uma princesa pagã. Essa aliança foi o ponto
de virada na história moral do reino. Desde os tempos de Davi e Salomão, muitos
tratados foram concluídos entre a Fenícia e Israel; no entanto, ao mesmo tempo,
dizia que a função especial do reino das dez tribos era restaurar o antigo rigor
da nacionalidade de Israel. Jezabel encarava com orgulho perverso um povo cuja
religião ela não entendia nem respeitava. Embora as dez tribos tivessem se en­
tregado à idolatria, adorando bezerros, o Deus verdadeiro ainda era adorado,
e a lei de Moisés era reconhecida. A partir da época do casamento de Acabe, a
apostasia de Israel tornou-se mais decidida e mortal. Ela era, segundo Stanley,

uma mulher em quem se mesclaram os hábitos temerários e licenciosos de uma rainha


oriental com as qualidades mais ferozes e inflexíveis herdadas na antiga raça semítica.
Seu marido, que não era desprovido de sentimentos generosos e gentis, tinha, todavia,
caráter fraco e submisso o que logo o transformou em um instrumento nas mãos dela.
£...] A selvagem licenciosidade de sua vida e o mágico fascínio de suas artes ou de seu
caráter se tornaram proverbiais na nação. Ao redor dela e a partir dela, em diferentes
graus de proximidade, desenvolve-se a terrível trama da mais movimentada crise des­
sa porção da história israelita38.

Ela tentou exterminar os profetas de Jeová (lRs 18.13) e inaugurou a adora­


ção de Baal, o deus sol, em impressionante escala. Dois santuários foram estabe­
lecidos, um para cada uma das grandes deidades fenícias, em cada uma das duas
novas capitais do reino, Samaria e Jezreel. O santuário de Astarte ou Astarote (a
Vênus fenícia), em Jezreel, estava sob a sanção especial de Jezabel, e há motivo
para supor que ela ministrava como sacerdotisa nessa adoração licenciosa. Qua­
trocentos sacerdotes, ou profetas, eram ligados a esse santuário e foram susten-

38. Stanley, The Jew ish Church.

376
A pocalipse - Cap. 2

tados na mesa dela. O santuário para Baal, em Samaria, era grande o bastante
para comportar todos os adoradores do Reino do Norte. A equipe desse santu­
ário consistia de 450 sacerdotes, e o interior dele continha representações do
rei sol sobre pequenos pilares, enquanto uma grande estátua da mesma deidade
erguia-se na frente. Nesses santuários, Acabe, em pessoa, oferecia sacrifícios.
Os expositores dividem-se quanto ao uso simbólico do nome nessa passagem,
alguns relacionam o nome a uma única pessoa - “alguma mulher solteira perver­
sa da igreja de Tiatira que herdou esse nome infame na igreja de Deus”, apresen­
tando-se como profetisa e seduzindo os servos de Cristo a cometer fornicação e
a comer coisas oferecidas a ídolos. Outros interpretam o nome como designando
um grupo herético influente da igreja; mas, como Alford comenta, “a verdadeira
solução deve ficar escondida até que o escondido seja conhecido”. Fica claro, de
todo modo, que Tiatira, como a igreja dos tempos antigos, tinha pecado por sua
aliança com uma fé e prática corruptas.

Mulher. Na tb, a mulher. Alguns traduzem: tua esposa.

Ensine e engane (διδάσκειν καί ττλανάσθαι). Os melhores textos trazem καί


διδάσκει καί ττλανά, e ela ensina, e seduz. Como na ara. Para seduzir, vide nota
sobre errais, Mc 12.24, e enganador e erro, Mt 27.63-64. O verbo ττλανάω, seduzir,
é encontrado com mais frequência em Apocalipse que em outras passagens do
Novo Testamento. Ele nunca tem o sentido de mero erro como tal, mas de desvio
fundamental da verdade.

Para que se prostituam e comam dos sacrifícios da idolatria. Esses dois


pecados foram cometidos pela Jezabel histórica. Vide 2Rs 9.22,30; Jr 4.30; Na 3.4.

21. Tempo (χρόνον). Literalmente. Na bj e teb , prazo.

Arrependesse (μετανοήστ)). Vide nota sobre Mt 3.2; 21.29.

Da sua prostituição (έκ). Literalmente, de dentro de, ou seja, como para sair e
escapar de seu pecado. Vide nota sobre o versículo 7.

22. Numa cama. De angústia. O cenário do pecado também é o cenário da


punição.

Adulteram (μοιχεύοντας). Um termo mais abrangente que πορνεΰσαι, cometer


fornicação. Compare com o sentido metafórico expressando a rebeldia e a idola­
tria de Israel (Jr 3.8; 5.7; Ez 16.32).
377
A pocalipse —C ap. 2

Com ela (μετ’ αυτής). Não com ela como o conjux adulterii, mas quem compar­
tilha com ela em seus adultérios.

Das suas obras (εκ των έργων αυτών). Leia αυτής, dela (obras). Arrependa-se
de dentro de (εκ), como no versículo 21.

23. De m orte (έν θανάτω). Na kjv , matarei com morte. Essa é uma expressão
muito forte. Compare com Lv 20.10, lxx, θανάτω θανατούσθωσαν, serão postos
para a morte (kjv e rv ). Literalmente, que eles sejam postos para morrer com morte.
Dificilmente a referência é aos setenta filhos de Acabe que foram degolados (2Rs
10.6-7), pois não eram filhos de Jezabel.

Filhos (τέκνα). Enfático. Distinto dos participantes do versículo 22, como seus
próprios seguidores, “que são nascidos dela e a constituem”. Contudo, alguns
negam qualquer distinção (como Milligan), e outros (como Trench) o explicam
como membros menos evidentes e proeminentes da ímpia companhia, enganados
onde os outros eram os enganadores.

Todas as igrejas. Não apenas as sete igrejas, mas as igrejas do mundo inteiro.

Saberão (γνώσονται). Vide nota sobre Jo 2.24.

Sonda (ερευνών). Vide Jo 5.39; 7.52; Rm 8.27. Compare com Jr 11.20; 17.10;
20.12; lPe 1.11. Denotando uma pesquisa cuidadosa, uma perseguição ou rastro.
Vide Gn 31.35; lRs 20.6; Pv 20.27; lCo 2.10.

Mentes (νεφρους). Somente aqui no texto do Novo Testamento. Estritamente,


rins, como na teb e bj. Usado para pensamentos, sentimentos e propósitos da alma.
Um uso similar de órgão físico para órgão espiritual é σπλάγχνα, entranhas, para
designar coração. Vide nota sobre compassivos, lPe 3.8.

24. E aos restantes. Omita e, e traduza, como na rv : digo a vós, aos restantes. Na
ara , digo r...J a vós outros, os demais.

E não conheceram (και οϊτινες). Omita και, e, e acrescente οΐτινες, que. O re­
lativo composto, que, classifica: que são daqueles que não conheceram etc.

Como dizem. A nvi traduz; como eles dizem. As questões são: 1. A que a ex­
pressão alude? É a fórmula familiar desses heréticos, “as profundezas” ou “as
profundezas de Deus”, as profundezas de Satanás sendo acrescido pelo Senhor
378
A pocalipse - C ap. 2

mesmo em contraste irônico com as profundezas do conhecimento divino - ou


seria as profundezas de Satanás? 2. Como dizem refere-se aos cristãos descreven­
do as profundezas dos gnósticos como profundezas de Satanás, ou refere-se aos
próprios heréticos, chamando seus próprios mistérios de profundezas de Satanás?
A maioria dos comentaristas considera a expressão como dizem como referên­
cia aos heréticos e aplicada apenas à palavra profundezas, sendo de Satanás um
acréscimo feito pelo Senhor em indignação. Alford diz que nenhuma fórmula
como profundezas de Satanás, ou alguma coisa semelhante, é encontrada habitu­
almente pelos antigos heréticos gnósticos.

As profundezas de Satanás (τα βάθη του Σατανά). Ο mais provável é que a


referência seja à seita gnóstica dos ofitas (οφις, serpente), ou, em hebraico, naase-
nos (nãhãs Qtfn£|> serpente), adoradores da serpente, seita de origem desconhecida,
mas que existiu no século VI; uma vez que, em 530, Justiniano passou leis contra
ela. Mansel diz:

A veneração da serpente foi apenas o desenvolvimento lógico de uma teoria, o ger­


me do que é comum a muitas seitas gnósticas. Partindo da pressuposição de que o
criador do mundo deve ser visto como um poder maligno, uma coisa em hostilidade
contra o Deus supremo, segue-se, como consequência natural, que a queda do ho­
mem pela desobediência à ordem de seu criador deve ser considerada não com o uma
transgressão contra a vontade do Deus supremo, mas como uma emancipação da
autoridade de um ser maligno. Assim, a serpente que tentou a humanidade a pecar
não é mais sua destruidora, mas sua benfeitora. Ela é o símbolo do intelecto, por
meio do qual o primeiro casal humano foi instruído no conhecimento da existência
de seres mais elevados que seu Criador. E sse conceito, consistentem ente realizado,
teria resultado em uma inversão direta de todo ensinamento da Escritura, ao cha­
mar o mal de bem, e o bem de mal; ao converter Satanás em Deus, e D eus em Sata­
nás. Não obstante, a maioria das seitas ofitas parece ter recuado dessa portentosa
blasfêmia. Embora reconhecendo a queda do homem como, de alguma maneira, uma
libertação do mal e uma exaltação da natureza humana, eles hesitavam em levar a
cabo seu princípio investindo o espírito m aligno com os atributos de deidade. Um
tipo de concessão foi feita entre a Escritura e a filosofia. Não obstante, a serpente,
em seu serviço para a humanidade, foi representada como um ser de natureza ma­
ligna e inimigo do homem, embora sua obra tenha revertido o bem do homem e ela
mesma tenha sido, além de sua intenção, o instrumento de uma sabedoria mais alta.
M as em, pelo menos, uma seita dos ofitas, as consequências mais lógicas e total­
m ente blasfemas dos primeiros princípios foram exibidas publicamente e de modo
desavergonhado39.

39. Mansel, Gnostic Heresies.


379
A pocalipse - C ap. 2

A jactância característica dos gnósticos era seu conhecimento das profundezas


das coisas divinas. Nisso, provavelmente, eles estavam pervertendo e caricatu­
rando as palavras de Paulo (Rm 11.33; lCo 2.10).

O utra carga (άλλο βάρος). As palavras para carga no texto do Novo Tes­
tamento são: όγκος (só em Hb 12.1), βάρος (Mt 20.12; G1 6.2) βφορτίον (Mt
11.30; 23.4; G1 6.5). O termo όγκος refere-se a volume-, βάρος, a peso-, φορτίον,
a uma carga conforme é carregada (φέρω). Assim, em Hb 12.1: “Deixemos
todo embaraço (όγκος)”, a imagem é de corredores no curso de uma corrida,
e a palavra apropriada denota os pesados mantos e acessórios da vestimenta
comum que impedia a liberdade dos membros. Em Mt 20.12: “Suportamos
o peso (βάρος) do trabalho e o calor do dia” (cp. n v i ), a ideia é que o trabalho
pesado pressiona como um peso. Como G1 6.2: “Levai as cargas uns dos ou­
tros”. Mas em G1 6.5 a ênfase está no ato de levar, por isso, φορτίον é usado:
“Cada qual levará a sua própria carga”·, ou seja, cada homem carregará o que
é designado que ele carregue. É provável que a referência na passagem seja
à proibição ordenada pelo conselho apostólico de Jerusalém , concernente
às mesmas coisas que são repreendidas aqui —fornicação e abstinência de
comidas sacrificadas aos ídolos. Na narrativa do conselho a frase é: “Não vos
impor mais encargo algum” (At 15.28). Por conseguinte, o sentido é: Não
impor a vocês mais encargo algum além da abstinência dessas abominações e
do protesto contra elas.

25. Retende-o (κρατήσατε). Vide nota sobre Mc 7.3; At 3.11.

Até que eu venha (άχρ ις ου αν ήξω). A partícula condicional άν indica que o


tempo de sua vinda é incerto.

26. Guardar £...] as minhas obras (τηρών τά έργα μου). A frase ocorre somente
aqui no texto do Novo Testamento. As obras são as ordenadas por Cristo, as quais
Ele fa z e são osfrutos de seu Espírito. Vide nota sobre Jo 4.47.

Poder (εξουσίαν). Vide nota sobre Jo 1.12. Na nvi , melhor, autoridade.

Nações (εθνών). Vide nota sobre Mt 25.32, e sobre nações, Lc 2.32. Aqui, seria
mais apropriado gentios, como na nvi, em contraposição ao verdadeiro Deus de
Israel.

27. Vara (ράβδω). Essa é a maneira como o termo é comumente traduzido; uma
vez por cetro, Hb 1.8. Esse é o sentido aqui.
380
A pocalipse —C ap. 3

Regerá (ποιμανεί). Literalmente, pastoreará. Uma comparação com 7.17 sa­


lienta a terrível ironia nessa palavra. Compare com SI 2.9, lxx, em que a mesma
palavra é usada. A tb traduz: quebrando-as. Vide nota sobre apascentar, Mt 2.6;
apascentardes, At 20.28; iPe 5.2; Jd 12.

Serão quebradas. A arc segue a leitura de συντριβήσεται, o tempo futuro


do verbo. A leitura correta é συντρίβεται, o tempo presente. Portanto, traduza,
como na rv: “como os vasos do oleiro são quebrados. Na teb , como se quebram os
vasos do oleiro. Vide nota sobre Mc 5.4, e sobre quebrantado, Lc 9.39. O σύν,junto,
transmite a imagem dos fragmentos caindo em uma pilha.

Vasos (σκεύη). Vide nota sobre bens, Mt 12.29; vaso, lPe 3.7.

De oleiro (κεραμικά). De κέραμος, argila de oleiro.

28. A estrela da manhã (τον άστέρα τον πρωινόν). A estrela, aquela da manhã.
Uma das construções características de João. Vide nota sobre lJo 4.9. É mais
provável que a referência seja a Cristo mesmo. Vide 22.16. Ele dará a si mesmo.
Essa interpretação harmoniza com a promessa de poder sobre as nações do ver­
sículo 26. A estrela era o antigo emblema de soberania. Vide Nm 24.17; Mt 2.2.
Plumptre diz:

Era o símbolo de soberania em seu lado mais brilhante e benigno e, por isso, era o
complemento adequado e necessário dos temidos atributos que já existiam antes. O rei
não veio só para julgar e punir, mas também para iluminar e encorajar.

Compre com 2Pe 1.19.

C apítulo 3

1. Sardes. Capital do antigo reino de Lídia. Situada em uma planície ir­


rigada pelo rio Pactolus. A cidade era de origem muito antiga. Heródoto
fornece um relato do cerco e captura da cidade por Ciro e de sua antiga
fortificação pelo antigo rei Meles40. Ela foi regida por uma série de gover­
nantes competentes, o último dos quais foi Creso, celebrado por sua riqueza
e seus infortúnios. Na parte inicial de seu reinado, ele estendeu seu domínio
sobre toda a Ásia Menor, com exceção de Lídia e Cilicia. O governo lidiano
teve fim com a conquista de Ciro. Dos persas, ela passou para as mãos de
Alexandre, o Grande, depois do que, pelos trezentos anos seguintes, seu
40. H e ró d o to , i, 84.
381
A pocalipse - C ap. 3

destino é obscuro. Em 214 a.C., ela foi tomada e saqueada por Antióquio,
o Grande, depois de um cerco de dois anos. A seguir, os reis de Pérgamo
sucederam no domínio, e, das mãos deles, ela passou para as mãos dos ro­
manos.
No tempo de Tibério, ela foi arrasada por um terremoto junto com outras
onze ou doze cidades importantes da Ásia, e a calamidade foi ainda maior por
causa de uma peste.
Sardes, em tempos bastante remotos, foi uma importante cidade comercial.
Plínio diz que a arte de tingir lã foi inventada lá e que ela era o entreposto das
indústrias de tecido de lã, carpetes, tingidos, cuja matéria-prima era abastecida
pelos rebanhos da Frigia. Era também o lugar em que o metal eletro era procu­
rado. Foi encontrado ouro no leito do Pactolus. Dizia-se que as moedas de ouro
e prata foram cunhadas pela primeira vez lá, e, em determinada época, a cidade
passou a ser conhecida como mercado de escravos. A adoração impura da deusa
Cibele era celebrada na cidade e ainda se podem ver as ruínas maciças de seu
templo. A cidade, agora, é um monte de ruínas. Em 1850, nenhum ser humano
habitava o local.

Os sete Espíritos de Deus. Vide nota sobre 1.4.

2. Sê vigilante (γίνου γρηγορών). Literalmente, torne-se atento e vigilante. Vide


nota sobre Mc 13.35; lPe 5.8. Tornar-se o que você não é.

Confirma (στήριξον). Vide nota sobre lPe 5.10, e compare com Lc 22.32;
Rm 1.11; 2Ts 3.3.

Que estava para m orrer (α εμελλον άποθανειν). Conforme a leitura dos me­
lhores textos; a kjv segue a leitura μέλλει, está para·, “coisas restantes que estão
prontas para morrer”.

Não achei as tuas obras (ού ευρηκά σου τα έργα). Alguns textos omitem ο
artigo antes de obras, caso em que devemos traduzir por: não achei nenhumas obras
tuas. Como na r v .

Perfeitas (πεπληρωμένα). Literalmente, cumpridas. Como na r v .

Deus. Os melhores textos inserem μου, “meu Deus”. Como na t e b .

3. Tens recebido e ouvido (εΐληφας καί ήκουσας). O primeiro desses verbos está
no tempo perfeito: tens recebido a verdade como um depósito permanente. Ela
382
A pocalipse - Cap. 3

permanece com você, quer a observe quer não. O último verbo está no tempo ao-
risto, ouvido (como na r v ), denotando apenas o ato de ouvir quando ele acontece.

Vigiares. Vide nota sobre o versículo 2.

Sobre ti. Omita.

Como um ladrão (ώς κλέπτης). Ladrão, como distinto de ληστής, saltea­


dor, um saqueador em larga escala que segura sua presa não com discrição,
mas com violência. Assim, a palavra é apropriada aqui para indicar o ines­
perado e furtivo dia da vinda do Senhor. Compare com lTs 5.2,4; 2Pe 3.10.

Não saberás a que hora sobre ti virei. O provérbio grego diz que os pés das
deidades vingativas são calçados com lã. O sentimento é expresso em dos dois
fragmentos seguintes de Esquilo:

Quer alguém durma, quer caminhe, quer sente-se à vontade,


Invisível e calada a justiça espreita seus passos,
Abalroa de lado a lado seu caminho, da direita ou esquerda;
Nem o que é feito vilmente a noite esconderá;
O que quer que faça, algum deus o observa.

E esperas sempre superar a sabedoria divina?


Que a vingança repousa em algum lugar longe dos mortais?
Está à mão, invisível, ela vê e sabe muito bem
Quem convém ferir. Mas tu não sabes
A hora quando, rápida e inesperada, ela virá
E varrerá o perverso da terra.

4. M as tam bém tens [\.·3 algum as pessoas. Conforme os melhores tex­


tos, que inserem άλλα, mas, entre essas palavras e o versículo precedente.
Mas, não obstante, a apatia geral da igreja, tens algumas. Compare com o
versículo 1 , tens nome, e vide nota sobre 11.13. Nome equivale a pessoas, al­
gumas que podem ser corretamente nomeadas como exceções à concepção
geral.

[jMesmo]] em Sardes. Conforme a k j v (cp. t r ) . Omita κα'ι, mesmo, como na a r c .

Contaminaram (έμόλυναν). Vide nota sobre lPe 1.4.


383
A pocalipse —C ap. 3

Vestes. Vide a mesma imagem em Jd 23. O sentido é não sujar a pureza de sua
vida cristã.

De branco (êv λακοΐς). Com Ιματίοις, vestes, implícito. Vide nota sobre 2.17,
e compare com Zc 3.3,5. Platão diz: “A cor branca é adequada para os deuses”41.
Como Virgílio sobre os inquilinos de Elísio:

Os sacerdotes castos, os poetas


Que o puro estro febeu não profanaram,
Os inventores das polidas artes,
Os que renome obrando mereceram,
A todos nívea banda as frontes orna12.

5. [Ό mesmo] será vestido (οΰτος π φ ί β α λ ^ ΐ τ ο α ) . Conforme a k j v ; a a r c não


traz o mesmo. Em lugar de ουτος, este, ou o mesmo, leia ούτως, assim: “assim será
adornado” (cp. r v ). Na t e b , “assim, o vencedor se trajará”. O verbo denota uma
investidura solene, e literalmente significa lançar ou pôr em torno.

Livro da vida. Literalmente; contra a k jv , livro de vida. Para a imagem, vide


Êx 22.32; SI 49.28; Dn 12.1; Fp 4.3. Compare com Lc 10.20; Hb 12.23.

Confessarei (Ιξομολογήσομοα). Confessar abertamente (ζξ). Vide nota sobre


Mt 11.25; At 19.18; Tg 5.16.

7. Filadélfia. Cento e vinte quilômetros a sudeste de Sardes. A segunda cida­


de em Lídia. A região adjacente era celebrada como um distrito viticultor, e
suas moedas traziam a cabeça de Baco e a figura de uma bacante. A população
incluía judeus, judeus cristãos e convertidos do paganismo. A cidade sofria
terremotos frequentes. De todas as sete igrejas, Filadélfia foi a que desfrutou
por mais tempo de prosperidade como cidade cristã. Ela ainda existe como
cidade turca sob o nome de Allah Shehr, Cidade de Deus. A localização é pito­
resca, a cidade foi construída sobre quatro ou cinco colinas e é bem suprida
de árvores, com clima saudável. Os cristãos nativos acreditam que uma das
mesquitas foi o lugar de reunião da igreja mencionada em Apocalipse. “Uma
coluna solitária muito antiga, com frequência, observada como lembrete dos
observadores das palavras de 3.12: A quem vencer, eu o farei coluna no tem­
plo do meu Deus’”.

41. Platão, Leis, xii, 956.


42. Virgílio, Eneida, tradução Manuel Odorico Mendes, vi, 682-686. Disponível em: < http:// www.
unicamp.br/iel/projetos/OdoricoMendes/>. Acesso em: 28 jun. 2013.

384
A pocalipse - C ap. 3

O que é santo (ò άγιος). Vide nota sobre At 26.10. Cristo é chamado santo,
At 2.27; 13.35; Hb 7.26. Todavia, em todas essas passagens, a palavra é δσιος,
que tem o sentido de santo pela santificação, aplicada àquele que observa diligen­
temente todas as santidades da religião. Portanto, é apropriada para Cristo como
aquele em quem essas santidades eternas são fundamentadas e residem. O termo
usado aqui, άγιος, refere-se, antes, a separação do mal.

O que é verdadeiro (ό αληθινός). Vide nota sobre Jo 1.9. O vocábulo αληθινός


não é apenas genuíno em contraposição ao absolutamente falso, mas contrastado
com aquele que é verdadeiro só de forma subordinada, ou típica. Expressa a per­
feita realização de uma ideia em contraposição com sua realização parcial. Assim,
Moisés deu pão, mas o Pai dá o pão verdadeiro (τον άρτον τον αληθινόν). Israel
era a vinha plantada por Deus (SI 80.8), Cristo é a verdadeira (ή αληθινή) vinha
(Jo 15.1). A palavra é tão característica de João, que, enquanto só há uma ocor­
rência dela nos Evangelhos Sinópticos, uma em uma epístola paulina e quatro na
epístola aos Hebreus, há nove ocorrências dela no quarto Evangelho, quatro na
primeira epístola de João e dez em Apocalipse, e em todas as instâncias nesses
três últimos livros com seu sentido distintivo.

A chave de Davi. Vide nota sobre l . 18, e compare com Is 22.22. Davi é o tipo
de Cristo, o governante supremo do reino do céu. Vide Jr 30.9; Ez 34.23; 37.24. A
casa de Davi é a designação típica do reinado de Jesus Cristo (SI 122.5). Assim, a
propriedade da chave, o símbolo do poder, pertence a Cristo como Senhor do reino
e da igreja de Deus. Vide nota sobre Mt 16.19. Ele admite e exclui ao seu gosto.

Ninguém fecha (ούδε'ις κλείει). Leia κλείσεi, fechará. Como na ara.

8. Pus (δεδωκα). Literalmente, eu tenho dado. Para uma expressão semelhante,


vide Lc 12.51.

Uma porta aberta (θύραν άνεφγμενην). Esse é o sentido mais literal. A ex­
pressão é explicada de várias maneiras. Alguns se referem a ela como entrada
para a alegria do Senhor; outros, como iniciação no significado da Escritura;
outros ainda, como a oportunidade para o trabalho missionário da igreja. Nesse
último sentido, a expressão, com frequência, é usada por Paulo. Vide lCo 16.9;
2Co 2.12; Cl 4.3. Compare com At 14.2743. Dei é apropriado, uma vez que todas
as oportunidades de serviço são dádivas de Deus. Videnota sobre 2.7.

43. Essa é a explanação de Trench, Plumptre, Düsterdieck e Alford e parece, em geral, ser a prefe­
rível. O Professor Milligan argumenta extensamente pela segunda explicação, a de Bengel.

385
A pocalipse - Cap. 3

[[Porque] tendo (ou €χεις). A a r c não traduz oti; no n t i a , porque (campo


interlinear). Alguns textos tornam parentético o trecho “eis [[...] fechar”, e tra­
duzem o u como que, definindo tuas obras. Como na t b .

Pouca força (μι,κράν δύναμιν). Isso poderia ter o sentido de: tens algum poder,
embora pequeno. Contudo, muitos omitem o artigo indefinido na tradução e ver­
tem: tendo poucaforça; ou seja, você é pobre em números e recursos mundanos. Assim
traduzem Alford, Trench e Düsterdieck.

CE] (καί). Conforme a k j v (cp. n t i a , campo interlinear); a a r c não o traz. A li­


gação simples de João, em vez de uma partícula de conexão lógica. Vide nota sobre
Jo 1.10; 6.46; lJo 1.5; Jo 8.20.

Guardaste a minha palavra (έτήρησάς μου τον λόγοι/). Tradução estrita do ao-
risto; contra a kjv, tens guardado. Para a frase, videio 17.6,8.

9. Eu farei (δίδωμι). Na r v , corretamente, Eu dou; na t e b , te entrego. Vide nota


sobre o versículo 8. O sentido é interrompido lá e retomado aqui.

Da sinagoga (èc τής συναγωγής). Determinados indivíduos da sinagoga. A maioria


dos intérpretes acha que se refere aos judeus. Outros explicam de forma mais gené­
rica, como a rendição dos inimigos da igreja aos pés dela. Trench refere-se a uma
passagem da epístola de Inácio para essa igreja da Filadélfia, sugerindo, no meio dela,
a presença real de convertidos do judaísmo que pregavam a fé que antes abraçavam.

De Satanás. Vide nota sobre 2.9.

Eu farei que venham (ποιήσω αυτούς ΐνα ήξωσιν). Literalmente, Eu lhesfarei


que eles venham.

Adorem prostrados a teus pés. Compare com Is 60.14; 49.23.

10. A palavra da minha paciência (τον λόγον τής ύπομονής μου). Não as pa­
lavras que Cristo falou a respeito da paciência, mas a palavra de Cristo que exi­
ge paciência para ser observada; o evangelho, que ensina a necessidade de uma
espera paciente por Cristo. Acerca de paciência, vide nota sobre 2Pe 1.6; T g 5.7.

Da hora (4k). A preposição sugere não uma preservação da tentação, mas uma
preservação na tentação, com o resultado de que eles serão libertados de dentro
de seu poder. Compare com Jo 17.15.
386
A pocalipse - C ap. 3

Da tentação (τού πειρασμού). Literalmente, “da provação”. Vide nota sobre


Mt 6.13; lPe 1.7. Na nvi, provação.

Mundo (οικουμένης). Vide nota sobre Lc 2.1.

11. Eis. Omita.

Para que ninguém tome a tua coroa (ίνα μηδείς λάβη τον στέφανον σου).
Leve-a. A ideia não é a do crente entrar no palácio que foi designado para outro,
mas de um inimigo levar de outro a recompensa que ele mesmo perdeu. A ex­
pressão é explicada por Cl 2.18. Ela é mencionada por Maomé que, depois de ter
tentado em vão converter um Abdalla para a fé e ter ouvido deste que deveria ir
cuidar dos seus negócios e pregar só para aqueles que viessem a ele, foi, abatido,
para a casa de um amigo. Seu amigo percebendo que estava triste, perguntou-lhe
o motivo e, ao ser informado do insulto de Abdalla, disse: “Trate-o gentilmente,
pois juro que quando Deus enviou você para nós, já tínhamos amarrado pérolas
para coroar a Abdalla, e ele acha que você arrancou o reino de sua mão”. Para
coroa, vide nota sobre 2.10. Tua coroa não é a coroa que tens, mas a coroa que terás
se provar ser fiel.

12. Coluna (στύλον). A palavra ocorre em G1 2.9; lTm 3.15; Ap 10.1. A referên­
cia aqui não é a alguma proeminência na igreja terrena, como em G1 2.9, mas à
bem-aventurança no estado futuro. O sentido exato é duvidoso. Alguns explicam
como ele tem um lugar determinado e importante na igreja glorificada. Compare com
Mt 19.28. Outros enfatizam a ideia de estabilidade e encontram um possível local
de referência aos frequentes terremotos que abalavam Filadélfia e que sacudiram
seus templos. Strabo diz:

E Filadélfia não ficou nem mesmo com seus muros intatos, eles, de alguma maneira,
eram sacudidos diariamente e apareciam brechas neles. Mas os habitantes continuam
a ocupar a terra, não obstante, suas dificuldades para construir novas casas.

Outros ainda enfatizam a ideia de beleza. Compare com lPe 2.5, passagem na
qual os santos são descritos como pedras vivas.

Templo (ναω). Vide nota sobre Mt 4.5.

Sobre ele. O conquistador, não a coluna. Compare com 7.3; 9.4; 14.1; 22.4. Pro­
vavelmente em relação à lâmina de ouro inscrita com o nome de Jeová e usada
pelo sumo sacerdote na testa (Ex 28.36,38). Vide nota sobre 2.17.
387
A pocalipse - C ap. 3

Nova Jerusalém. Vide Ez 48.35. O cristão cuja fronte está adornada com esse
nome tem a liberdade da cidade celestial. Mesmo na terra, sua nação é no céu
(Fp 3.20). Trench afirma: “Contudo, sua cidadania estava latente; ele era um dos
escondidos de Deus, mas, agora, ele é sancionado abertamente e tem o direito
de entrar nela pelas portas da cidade”. A cidade é chamada por João de a grande
cidade, a santa Jerusalém, (21.10); por Mateus, de Cidade Santa (4.5); por Paulo,
de Jerusalém que é de cima (4.26); pelo escritor de Hebreus, de a cidade do Deus
vivo, à Jerusalém celestial (12.22). Platão chama sua cidade Calípolis, cidade bela
e ideal44, e o nome Ouranopolis, cidade celestial, já foi aplicado a Roma e Bizâncio.
Para nova (καινής), vide nota sobre Mt 26.29. A nova Jerusalém não é uma cidade
construída recentemente (νέα), mas é nova (καινή) em contraposição à cidade anti­
ga, gasta e pecaminosa. No Evangelho, João costuma usar a forma grega e civil
do nome, 'Ιεροσόλυμα; em Apocalipse, a denominação hebraica e mais sagrada,
Ιερουσαλήμ45.

14. Em Laodiceia (4v Λαοδικεία). Siga essa leitura; contra Λαοδικέων, dos laodi-
censes ( k j v , cp. t r ). Laodiceia quer dizerjustiça dopovo. Como Laódice era um nome
comum entre as senhoras da casa real dos selêucidas, o nome foi dado a diversas
cidades da Síria e da Ásia Menor. A tratada aqui ficava nos confins da Frigia e
Lídia, cerca de 64 quilômetros a leste de Éfeso, e era conhecida como Laodiceia de
Lico. Ela teve sucessivamente os nomes de Dióspolis e Rhoas e recebeu o nome de
Laodiceia quando foi fundada de novo por Antióquio Theos, 261-246 a.C. Ficava
situada em um grupo de colinas entre dois afluentes do rio Lico —o Asôpos e o
Caprus. Em direção ao fim da república romana e sob os primeiros imperadores,
a cidade tornou-se uma das mais importantes e prósperas da Ásia Menor. Um de
seus cidadãos, Hiero, legou toda sua enorme propriedade para o povo e adornou
a cidade com caros presentes. Ela era a sede de transações de grandes somas de
dinheiro e de extenso comércio de madeira. Os cidadãos desenvolveram o gosto
pela arte grega e se destacavam na ciência e na literatura. Laodiceia era a sede de
uma grande escola de medicina. Durante o período romano, ela era a cidade-chefe

44. Platão, Diálogos 111: República, vii, 527, p. 217.


45. A literatura de hinología é muito rica em hinos que descrevem a glória da cidade celestial. Em
latim, há Jerusalem luminosa, que reaparece em Jerusalém, minhafeliz moradia e O querida Mãe
Jerusalém·. Urbs beata Jerusalem, que reaparece em Abençoada cidade, Salem celestial Urbs Sion
Aurea, em Jerusalém, a dourada e Jerusalém, a glória. Desse, O bona patria, traduzido por Para
ti, ó querido, querido País, é uma porção. Também Me receptet Sion illa, de Bernardo. Em inglês,
pode ser mencionadas, além das traduções citadas logo acima: Doce lugar, único doce lugar, Ouve
o que Deus, o Senhor, temfalado; Jerusalém, minhafeliz moradia, quando irei para ti? Em alemão:
Jerusalem du hochgebaute Stadt, de Meyfart, e O Jerusalem du Schone, de Hiller. Há duas tradu­
ções para o inglês do hino de Meyfart: uma pela Srta. W inkworth, Jerusalem, thou cityfa ir and
high (Jerusalém, tua cidade formosa e elevada), e outra pelo Bispo W hittíngham, de Maryland,
Jerusalem, high tower thy glorious walls (Jerusalém, cidadela elevada, teus muros gloriosos).

388
A pocalipse - C ap. 3

de um conventus, ou distrito político, romano em que as sessões eram dirigidas


pelo proconsul da província e onde eram coletadas as taxas das cidades subordi­
nadas. Cícero manteve sua corte lá, e muitas de suas cartas foram escritas de ali.
O conventus representado pela Laodiceia compreendia não menos que 25 cidades, e
as inscrições referem-se à cidade como “a metrópole”. A palavra grega δίοίκησις,
correspondente à latina conventus, foi subsequentemente aplicada a um distrito
eclesiástico e aparece em diocese. A deidade tutelar da cidade era Zeus (Júpiter).
Daí seu primeiro nome, Dióspolis ou Cidade de Zeus. Muitos de seus habitantes
eram judeus. A cidade era objeto de frequentes terremotos, o que, no fim, resultou
em seu abandono. Agora, ela é um lugar deserto, mas suas ruínas, por sua magni­
tude, indicam sua importância anterior. Entre estas estão a pista de corrida e três
teatros, um dos quais tinha 137 metros de diâmetro. Um importante concilio da
igreja foi feito lá no século IV

O Amém. Usado somente aqui como nome próprio. Vide Is 65.16, em que a
tradução correta é o Deus do Amém., e não apenas o Amém. O termo aplicado ao
Senhor quer dizer que Ele mesmo é o cumprimento de tudo que Deus fala para
as igrejas.

Fiel (ιηστός). A palavra ocorre no texto do Novo Testamento em dois senti­


dos: confiável, fiel (Mt 24.45; 25.21,23; Lc 12.42) e crente, que confia (Jo 20.27; G1
3.9; At 16.1). De Deus, necessariamente, só no primeiro sentido.

Verdadeira (αληθινός). Vide nota sobre o versículo 7. A veracidade de Cristo,


assim, é afirmada na palavra fiel, verdadeira não como verdadeiro distinto defalso,
mas verdadeira para a ideia normal de uma testemunha.

O princípio (ή άρχή). O iniciador ou autor, não como em Cl 1.15, o qual é ima­


gem do Deus invisível, o primogênito de toda a criação. Segundo Plumptre:

A ênfase colocada na epístola aos Colossenses sobre a inferioridade daqueles a quem


era dado o mesmo nome de άρχαι, principados [...] para aquele que é o verdadeiro
princípio, ou, se podemos nos aventurar em um uso não familiar de uma palavra co­
nhecida, o verdadeiro Principado da criação de Deus, pode explicar a proeminência
que o nome adquiriu, e, assim, seu uso aqui em uma mensagem dirigida a uma igreja
exposta, como a de Colossos, aos riscos de angelolatria, da substituição dos principa­
dos mais inferiores e de mediadores criados por aquele que era a Cabeça sobre todas
as coisas para sua igreja.

Compare com Hb 12.2, αρχηγόν, autor.


389
A pocalipse - Cap. 3

15. Frio (ψυχρός). Ligado ao mundo e ativamente contrário à igreja. Alford


observa:

E sse estado, tanto quanto o estado oposto de fervor espiritual, seria uma condição
inteligível e claramente marcada; em todos os eventos livre do perigo de misturar
motivo e desconsiderar princípio que pertence à condição de morno; à medida que
um homem ardoroso, quer esteja certo quer esteja errado, é sempre melhor que um
homem que confessa o que não sente.

Q uente (ζεστός). De ζέω, ferver ou borbulhar. Vide nota sobre fervoroso,


A t 18.25.

16. Momo (χλιαρός). Somente aqui no texto do Novo Testamento.


Primeiro e mais numeroso entre os perdidos, Dante identifica aqueles que se
satisfazem em permanecer neutros no grande contexto entre bem e mal.

Ó Mestre, que ouço agora?


Quem são esses, que a dor está prostrando?
D este mísero modo - tornou - chora
Quem viveu sem jamais ter merecido
Nem louvor, nem censura infamadora.
D e anjos mesquinhos coro é-lhes unido,
Que rebeldes a Deus não se mostraram,
Nem fiéis, por si sós havendo sido.
Desdouro aos céus, os céus desterraram;
Nem o profundo inferno os recebera,
D e os ter consigo os maus se gloriaram4®.

Vomitar-te-ei (μέλλω). Estou para ou tenho em mente. Não é uma declaração de


maldição imediata e inexorável, mas sugere uma possibilidade da determinação
ser mudada.

Vomitar-te-ei (έμέσαι). Somente aqui no texto do Novo Testamento. Compa­


re com Lv 18.28; 20.22.

17. Como d izes. Ligado, como na e nvi, com o que vem a seguir, não com
arc
o que precede. Alguns interpretam como: vomitar-te-ei da minha boca porque
dizes.

46. Dante, A D iv in a Com édia , Inferno, iii, 33-42, p. 19.

390
A pocalipse —C ap. 3

Estou enriquecido (πεπλούτηκα). Na n v i , adquiri riquezas. A referência é a


riquezas espirituais imaginadas, não a posses mundanas.

CTuO Conforme o texto grego; a arc não o tra z . O pronome é enfático.

Um desgraçado (ό ταλαίπωρος). Na r v , melhor, comunicando a força d o arti­


go, o desgraçado. De τλάω, aguentar, e παρά, uma provação.

Miserável (έλεαυός). Somente a q u i e em lCo 15.19. Um objeto de misericórdia


(ελεος).

Pobre (πτωχός). Vide nota sobre Mt 5.3.

18. Aconselho-te (συμβουλεύω). Com certa ironia. Embora possa ordenar, Ele,
todavia, aconselha aqueles que, na avaliação deles mesmos, são supridos com
tudo.

Compres. Compare com Is 55.1; Mt 13.44,46. Aqueles que se acham ricos e,


contudo, acabam de ser chamados de miseráveis pelo Senhor, são aconselhados
por Ele a comprar. Porém, a ironia acoberta um convite sincero e gracioso. Os
bens de Cristo são dados gratuitamente, porém, eles têm seu preço - renúncia
ao “eu” e ao mundo.

Ouro (χρυσίου). Com frequência, usada para ouro, dinheiro ou ornamento.


Como lPe 1.18; At 3.6; lPe 3.3. Também é usada para ouro nativo e ouro que
foi derretido e trabalhado (Hb 9.4). É muito provável que seja uma referência às
extensas transações de dinheiro feitas em Laodiceia.

Provado no fogo (πεπυρωμένου έκ πυρός). Ο verbo tem ο sentido de queimar,


estar nofogo; no perfeito passivo, como aqui, tem o sentido de queimado, feito in­
candescente; daí derretidopelofogo, e então refinado. Na r v , refinadoporfogo-, na n v i ,
refinado no fogo. “Por fogo” significa, literalmente, “de dentro do fogo” (έκ; vide
nota sobre 2.7).

Vestes brancas. Na nvi, roupas brancas. Vide nota sobre o versículo 4.

Te vistas (περιβόλη). Esse é o sentido mais literal. Vide nota sobre o versículo 5.

Não apareça (μή φαυερωθη). Na a r a , mais literalmente, não seja manifesta.


Vide nota sobre Jo 21.1. Despir-se e se expor é um método frequente de tor-
391
A pocalipse —C ap. 3

nar pública a vergonha. Vide 2Sm 10.4; Is 20.4; 47.23; Ez 16.37. Compare com
Mt 22.11-13; Cl 3.10-14.

Unjas os olhos com colírio (κολλούριου εγχρισου τους οφθαλμούς σου). A


leitura correta é Ιγχρισοα, o infinitivo, ungir, em lugar do imperativo. Como a
n v i : colírio para ungir os seus olhos. Κολλούριου, de que a palavra latina collyrium é

uma transcrição, é diminutivo de κ ο λ λ ύ ρ α , um rolo depâo grosseiro. Vide lRs 14.3,


l x x ; na k j v , biscoito duro. Aqui aplicado a cilindro ou vareta de unção para os

olhos. Horácio, ao descrever sua jornada brundisina, relata como, a determinada


altura, ele foi incomodado pelos olhos inflamados e os ungiu com colírio negro
( nigra collyria)*1. Juvenal, ao descrever uma mulher supersticiosa, diz: “Se o canto
de seu olho coça quando esfregado, ela consulta seu horóscopo antes de pedir
socorro (collyria)”48. A imagem expõe a unção espiritual por meio da qual a visão
espiritual é purgada. Compare com Agostinho:

Minha presunção separava-me de ti. Meu rosto, de tão inchado, me fechava os olhos.
£../] Tu te compadeceste da terra e do pó, e quiseste reformar minhas deformidades.
Com um aguilhão secreto provocavas em mim a inquietude, para que eu me manti­
vesse insatisfeito, até que te tornasses uma certeza ao meu olhar interior. Meu tumor
diminuía ao contato misterioso de tua mão benfazeja. A vista perturbada e obscure-
cida de minha inteligência melhorava dia a dia, graças ao colírio de dores curativas49.

Compare com lJo 2.20,27.

19. Repreendo (έλέγχω). Vide nota sobre Jo 3.20. Na rv, censuro-, a ntlh traz:
corrijo.

Castigo (παιδέύω). Vide nota sobre Lc 23.16.

Eu £../] todos quantos amo. Conforme a ordem grega, o eu vem primeiro


como pronome enfático. Em contrapartida, na t b , a quantos eu amo, repreendo etc;
e n v i , aqueles que eu amo.

Sê £...)] zeloso (ζήλευε). O verbo é relacionado com ζεοτός, quente, no versícu­


lo 16, a respeito do qual vide a nota.

Arrepende-te. Vide nota sobre Mt 3.2; 2 1.29.

47. Horácio, S átiras, i, v, 30.


48. Juvenal, Sátiras, vi, 577.
49. Agostinho, Confissões, vii, 7-8, p. 171.

392
A pocalipse - Cap. 4

20. Eis que estou à p o rta e bato. Compare com Ct 5.2. Κρούω, bato, era
considerada uma palavra menos clássica que κόπτω. Κρούω significa bater
com α articulação dos dedos, dar pancadinhas; κόπτω, bater com golpe pesado;
ψοφεΐν refere-se à batida de alguém na porta, avisando a pessoa que está
fora para recuar quando a porta for aberta. Compare com T g 5.9. Segundo
Thench:

Ele, à cuja porta devemos permanecer (pois Ele é a Porta que, como tal, convida-mw a
bater), está contente que toda a relação entre Ele e nós possa ser revertida e, em vez
de permanecermos a sua porta, condescende a Ele mesmo estar à nossa porta.

O grego tem uma palavra para um amante à espera na porta de sua amada.
Trench cita uma passagem de Nicolau Cabasilas, teólogo grego do século 14:

O amor pelos homens “aniquilou” a Deus (Fp 2.7). Pois Ele não permanece em seu
lugar e convoca a Ele mesmo o servo a quem amava; mas vai Ele mesmo e busca-o;
e Ele que é rico vem à moradia do pobre, e revela seu amor, e busca igual retorno;
tampouco, Ele se afasta de quem o repele, nem fica desgostoso com sua insolência;
mas, buscando-o, permanece assentado à sua porta, e para que Ele possa mostrar a ele
quem realmente o ama, Ele faz todas as coisas e sofre, suporta e morre.

Minha voz. Cristo não só bate, mas também fala. Trench afirma: A voz, com
muita frequência, interpreta e torna inteligível o propósito da batida.

Ouvir - abrir a porta. Contesta a graça irresistível.

Cearei (δειπνήσω). Vide nota sobre Lc 14.12. Para a imagem, compare com
Ct 5.2-6; 4.16; 2.3. Cristo é o Pão da vida e convida para a grande festa. Vide
Mt 8.11; 25-lss. A consumação será no banquete de casamento do Cordeiro (Mc
14.25; Ap 19.7-9).

Ele, comigo. É característico de João mencionar os ditos de Cristo que ex­


pressam as relações recíprocas dele mesmo e de seus seguidores. Vide Jo 6.56;
10.38; 14.20; 15.4,5; 17.21,26. Compare com Jo 14.23.

21. Ao que vencer. Vide nota sobre 2.7.

C a pítulo 4

O Apocalipse mesmo começa agora.


393
A pocalipse - Cap. 4

1. Depois destas coisas (μετά ταϋτα). Literalmente. Não uma indicação de inter­
rupção no estado extático do profeta, mas só uma sucessão de visões separadas.

Olhei (εΐδον). Na n t l h , melhor, vi. Não de direcionamento de atenção, mas da


simples recepção da visão.

Estava uma porta aberta (θύρα άνεφγμενη). A tb, corretamente, omite esta­
va: uma porta aberta no céu. Um porta colocada aberta. A a r c sugere que o profeta
testemunhou a abertura da porta.

No céu. Compare com Ez 1.1; Mt 3.16; At 7.56; 10.11. Em todas essas passa­
gens o próprio céu é aberto.

De trom beta (σάλπιγγος). Videnota sobre Mt 24.31. Propriamente uma trom-


beta de guerra, embora a palavra também fosse usada para trombeta sagrada, com
o epíteto ιερά, sagrada.

Falar - disse (λαλούσης - λέγουσα). Vide nota sobre Mt 28.18. O primeiro


verbo indica a quebra do silêncio, o segundo o assunto da fala.

Depois destas (μετά ταΰτα). Alguns editores ligam essas palavras com o ver­
sículo seguinte, substituindo-as por και, e, no início desse versículo, e traduzin­
do: “Mostrar-te-ei as coisas que devem acontecer. Depois dessas coisas, imediata­
mente fui”.

2. Fui arrebatado em espírito (εγενόμην εν πνεύματι). Sentido estrito, vim


a ser, me vi em. Apropriado para o transporte súbito e inconsciente do profeta
em estado extático. Por isso, Dante descreve seu arrebatamento inconsciente ao
paraíso:

Eis cuidei ver um dia, ao mesmo passo,


Luzir com outro, qual se Deus fizera
D o céu um sol segundo no regaço50.

Beatriz, notando sua surpresa, diz:

O teu espírito anda errado


Com falso imaginar: 'starias vendo

50. Dante, A D iv in a Com édia, Paraíso, i, 61-63, p. 8.


394
A pocalipse - Cap. 4

O que nâovês, se houveras seafastado.


Te enganas, sobrea terra achar-te crendo:
O raio tão veloz do céu nãodesce,
Como tuquepraocéu vais ascendendo51.

Um trono. Vide Ez 1.26-28.

Estava posto (exerço). Denotando apenas posição, não que o profeta viu a co­
locação do trono. Compare com Jo 2.6.

Um assentado. Ele é chamado daqui em diante no livro todo de ao que estava


assentado sobre o trono e é distinguido do Filho em 6.16; 7.10, e do Espírito Santo
no versículo 5. Normalmente, entende-se que ele é Deus Pai; mas alguns enten­
dem que é o Deus trino52.

3. Pedra de jaspe. A última das doze pedras no peitoril do sumo sacerdote


(Ex 28.20; 39.13) e a primeira das doze enumeradas na fundação da nova
Jerusalém (Ap 21.19). Também é a pedra empregada na superestrutura do
muro da cidade celestial (21.18). A própria pedra era de diferentes cores, a
melhor sendo a púrpura. De acordo com 2 l.l 1, ela parece um cristal resplan­
decente.

Sardônica. Na nvi, sardônio. A sexta pedra da fundação da Jerusalém celestial


em 21.20. Uma pedra vermelha que, supostamente, corresponde à nossa corna-
lina. Plínio atribui a origem de seu nome a Sardes, onde a pedra foi descober­
ta. Outros, ao persa sered, vermelho amarelado. O sentido exato do simbolismo
permanece incerto, devido à nossa ignorância do significado preciso de “jaspe”,
nome que parecer ter coberto uma variedade de pedras, hoje, conhecidas sob ou­
tras classificações. Alguns intérpretes assumem que o jaspe é branco e brilhante,
encontrando nele uma representação da santidade de Deus e na ígnea sardônica
uma representação de sua ira.

Arco celeste (ίρις). Somente aqui e em 10.1. A palavra é idêntica e parece ter
a mesma ligação original com íris, a deidade conhecida como a deusa mensageira
do Olimpo. Em Homero, a palavra é usada em dois sentidos.

51. Dante, A Divina Comédia, Paraíso, i, 88-93, p. 8.


52. Assim pensa o Professor Milligan. Ele acredita que a cena toda se fundamenta em Isaías 6, pas­
sagem que, segundo ele, é sempre considerada como uma das maiores descrições da Trindade
contida no Antigo Testamento.

395
A pocalipse - C ap. 4

E se agora queres perguntar de mim,


N ão sou um sonho, mas am orosa e divina
D eixe isso ser um sinal para ti,
Que quando observas o arco-íris
Que o sol m atutino lança através do mundo.
M as teus olhos não me observam de fato.
Então, ele, despertando na manhã fria,
Sente a garoa fina na face
E levanta-se depressa, naquele lugar selvagem ,
Olhou em torno e viu a luz do sol da manhã lançando
Através do mundo o arco-íris;
E trêm ulo soube que os altos deuses de fato
Enviaram a m ensageira para sua necessidade53.

No grego clássico, a palavra é usada para qualquer auréola brilhante circun­


dando outro corpo; para o círculo em torno dos olhos na cauda do pavão e para
a íris dos olhos.

Esses clarões eu vi passar avante;


Trás si no ar matiz vário espalhavam,
A pendões desfraldados similhante.
Sete listras bem claras desenhavam,
As cores que contêm de Délia o cinto
Ou então do sol no arco, figuravam54.

Na substância profunda e clara eu via


Da excelsa Luz três circ’los discernidos
Por cores, três, de igual periferia,
íris de íris, um de outro refletidos
Estavam, flama o Tércio parecia
Spirando, por igual, de um, de outro unidos55.

Sobre essa passagem que pertence à descrição da visão de Dante da Trindade


eterna, o Deão Plumptre comenta:

Observa-se, não sem satisfação, que Dante evita o antropomorfismo da arte bizan­
tina e ocidental primitiva em que o ancião de dias era representado na forma de um

53. William Morris, Jason, xi, 190-200.


54. Dante, A Divina Comédia, Purgatório, xxix, 73-78, p. 176. “Cinto de Délia”, ou seja, o halo que
circunda a lua. Délia ou Diana.
55. Ibid., Paraíso, xxxiii, 115-120, p. 203.

396
A pocalipse - Cap. 4

venerável idoso. Para ele, como para os artistas mais primitivos, o arco-íris refletindo
arco-íris é o único símbolo adequado do “Deus de Deus, Luz da Luz” do Credo Niceno,
enquanto o amor ardente que sopra dos dois é o do Espírito Santo, procedendo do Pai
e do Filho.

Ao redor do trono. Compare com Ez 1.26,28.

Esmeralda (σμοφαγδίνω). A pedra é mencionada pela primeira vez por Heródo-


to, que descreve um templo de Hércules que ele visitou em Tiro. Ele diz: “Achei-o
ricamente adornado com uma quantidade de ofertas, entre as quais estavam duas
colunas, uma de puro ouro, e a outra de esmeraldas (σμαράγδου λίθου), brilhando
com esplendor à noite”56. Também menciona a pedra em sua história de Polícrates
de Samos, o anel com sinete que Polícrates jogou no mar era uma esmeralda fixada
em ouro57. Contudo, reivindica-se que a verdadeira esmeralda era conhecida dos
antigos. Rawlinson acha que a coluna no templo de Tiro era de vidro. O arco não
era desprovido de outras cores, mas a cor esmeralda predominava.

4. Trono (θρόνου). Um assento ou cadeira. Em Homero, uma cadeira de braços


com encosto alto e escabelo. Almofadas eram postas sobre o assento e tapetes
distribuídos sobre assento e encosto. Um trono real. Usado para o assento oracular
dos sacerdotes de Apoio. Apoio, em Eumenides, de Esquilo, diz: “Nunca, quando
sentar-me no assento do vaticinador (μαντικοΐσιν èv θρόνοις) não falara nada
além do que Zeus, o pai do Olimpo, declarou-me”58. Platão usa para um assen­
to de professor. "Vi Hípias, de Elis, sentando no pórtico oposto em uma cadeira
(4ν θρόνω). Outros estavam sentados em torno dele sobre bancos (èui βάθρων)”,
questionando-o, “e ele ex cathedrâ (έν θρόνω καθήμ€νος, literalmente, sentado na
cadeira) determinava suas muitas questões para eles e discursava para eles”59.
Também usado para banco deju iz e assento de bispo.

Tronos (θρόνοι). Tradução mais correta; contra a k j v , assentos. A palavra é a


mesma que a última.

Vi. Omita.

Anciãos (πρ^σβυτέρους). Vide nota sobre At 14.23. Os 24 anciãos, em geral,


são entendidos como representando a única Igreja de Cristo, ao mesmo tempo

56. Heródoto, ii, 44.


57. Id., iii, 41.
58. Apoio, Eumênides, 616-618.
59. Platão, Protágoras, 315.

397
A pocalipse —Cap. 4

a igreja da antiga e a da nova aliança, simbolizada pelos doze patriarcas e pelos


doze apóstolos respectivamente.

Trajadas de alva cor a ver começo


Pessoas, que os luzeiros têm por guia:
Candor igual na terra não conheço.

[■ ··]
Por baixo de tão belo céu seguiam
Vinte e quatro anciões emparelhados:
Brancos lírios as frontes lhes cingiam60.

Vestidos (περ ι βεβλημένους). Na r v , adornados. Melhor, indicando uma vesti­


menta mais solene. Vide nota sobre 3.5.

Tinham. Omita.

Coroas (στεφάνους). Vide nota sobre lPe 5.4; T g 1.12. Στέφανος com o epíteto
de ouro só é encontrado em Apocalipse. Compare com 9.7; 14.14. A conclusão
natural desse epíteto e do fato de que o simbolismo de Apocalipse é hebraico,
além de que os judeus detestavam muito os jogos gregos, seria que στέφανος é
usado aqui para a coroa real, em especial, uma vez que, neste texto, a igreja é
representada como triunfante —reis e sacerdotes. Por sua vez, nas três passagens
de Apocalipse em que João se refere, evidentemente, à cora real, ele usa διάδημα
(12.3; 13.1; cp. 17.9-10; 19.12). Trench afirma que, nessa passagem, a coroa não
é de realeza, mas de glória e imortalidade. A coroa de ouro (στέφανος) do Filho
do Homem (14.14) é a coroa do conquistador61.
Deve-se admitir francamente, entretanto, que o sentido aqui é um tanto duvi­
doso e que tais passagens da l x x , como 2Sm 12.30; lCr 20.2; SI 20.3; Ez 21.26;
Zc 6.11,14, fornecem uma certa justificativa para o comentário do Professor
Thayer de que é duvidoso se, de fato, a distinção entre στέφανος e διάδημα (a coroa
deflores do vencedor e a coroa real) era estritamente observada no grego helênico.
A coroa de espinhos (στέφανος) posta na cabeça de nosso Senhor, na verdade, foi
tecida, mas era a caricatura de uma coroa real62.

5. Saíam (εκπορεύονται). Na ara , saem. O tempo é mudado vividamente para o


presente.

60 . Dante, A Divina Comédia, Purgatório, xxix, 64- 84 .


61. Trench, Synonyms of the New Testament.
62 . Thayer, Lexicon of the New Testament

398
A pocalipse - C ap. 4

Relâmpagos, e trovões, e vozes. Compare com Êx 19.16. A interpretação


varia de poder de Deus, seu julgamento, seu poder sobre a natureza e sua indignação
contra o ímpio.

Lâmpadas (λαμπά&ς). A origem de nossa palavra lâmpada, mas, mais propria­


mente, uma tocha-, o termo para lâmpada, sendo λύχνος uma lâmpada de mão abas­
tecida com óleo (Mt 5.15; Lc 8.16; Jo 5.35). Vide nota sobre Mt 25.1. Trench diz:
“A forma como de fato os indianos iluminam é com tochas seguradas por homens
que alimentam as chamas com óleo pego de um tipo de garrafa construídas para
esse propósito”.

Sete Espíritos de Deus. Vide n o ta sob re 1.4.

6. De vidro (ύαλίνη). Na b j , vítreo, termo que descreve a aparência, não o material.


O adjetivo e o substantivo relacionado ύαλος, vidro, ocorrem só em Apocalipse.
A etimologia é incerta; alguns sustentam uma origem egípcia, e outros a relacio­
nam ao grego υω, chover, com o sentido original de gota de chuva. Originalmente,
algum tipo de pedra clara e transparente. Heródoto diz que os etíopes colocavam
seus corpos mortos

em uma coluna de cristal que era escavada para os receber, e descobriu-se cristal em
grande abundância em seu país e de um tipo muito fácil de trabalhar. Você pode ver o
corpo através da coluna no interior da qual ele repousa; e ela não deixa sair nenhum
odor desagradável nem, sob nenhum aspecto, é inadequada; contudo, não há nenhuma
parte que não seja plenamente visível como se o corpo estivesse desnudo63.

Sabe-se que o vidro foi feito no Egito, pelo menos, 3.800 anos atrás. Os mo­
numentos mostram que as mesmas garrafas de vidro eram usadas naquela época
como também em tempos posteriores; e o assopramento de vidro está repre­
sentado nas pinturas dos túmulos. Os egípcios possuíam a arte de colori-lo e de
introduzir ouro entre duas camadas de vidro. As ruínas de fornos de vidro ainda
são vistas nos lagos de Natron. O vidro do Egito era muitíssimo famoso. Ele foi
usado em larga escala em Roma com propósitos ornamentais, e a janela de vidro
foi descoberta em Pompeia. Plínio fala do vidro como objeto maleável.

Cristal. Compare com Ez 1.22; Jó 37.18; Êx 24.10. A palavra é usada no grego


clássico para gelo. Tucídides, ao descrever a tentativa dos habitantes de Platéias
de fugir de sua cidade quando foi cercada pelos peloponenses e pelos beócios, re-

63. Heródoto, iii, 24.

399
A pocalipse - C ap. 4

lata a escalada do muro e a travessia do canal, mas só depois de muita luta, “pois
o gelo (κρύσταλλος) neles não estava bastante congelado para aguentar”64. Ori­
ginalmente, sustentava-se que o cristal, considerado mineral, era apenas água
congelada por um longo período de tempo, sendo transformada em gelo mais
resistente que o comum. Por isso, acreditava-se que ele só podia ser produzido
em regiões de gelo perpétuo.

No meio do - ao redor do. Comumente explicado como um no meio de cada


um dos quatro lados do trono. Milligan diz: “Nas extremidades de dois diâme­
tros, atravessando o centro do trono redondo”.

Animais (ζώα). Na n v i , seres viventes. Alford comenta com sagacidade que ani­
mais é a palavra mais infeliz que podia ser imaginada. Animal é θηρίον. Ζώον
enfatiza o elemento vital, θηρίον, o bestial.

Cheios de olhos por diante e por detrás. Os quatro seres viventes são prin­
cipalmente parecidos com os querubins de Ez 1.5-10; 10.5-20; Is 6.2,3; embo­
ra com algumas diferenças de detalhes. Por exemplo, os querubins de Ezequiel
têm quatro asas, enquanto as seis descritas aqui pertencem ao serafim de Isaías.
Como também o Trisagion (três vezes santo, triságio) é de Isaías. Na visão de Eze­
quiel, cada ser vivente tem quatro rostos, ao passo que aqui, cada um dos quatro
tem um rosto.

Quatro animais após se apresentavam,


Coroados de fronde entretecida:
A cada qual seis asas adornavam,
Cobertas de olhos tantos, quantos Argo
Tinha, quando seus, vida gozavam.
D e descrevê-los não me faço cargo,
Leitor; a tanto ora me falta ensejo:
Nem posso neste ponto ser mais largo.
Contenta Ezequiel o teu desejo:
Ele os viu, que, do norte se arrojando,
Vinham com vento, nuve’, ígneo lampejo.
Como os pintou, estava os contemplando:
D ifrença quanto às asas há somente;
João eu sigo, Ezequiel deixando65.

64. Tucídides, iii, 2 3 .


65. Dante, A D iv in a Comédia, Purgatório, xxix, 92-105, p.176, 179.

400
A pocalipse —Cap. 4

7. Leão - bezerro - homem —águia. Dessa passagem origina-se o simbolismo


familiar dos quatro evangelistas: Marcos sentado sobre um leão; Lucas, sobre
um touro jovem; Mateus, sobre um homem; e João, sobre uma águia. Contudo,
há variações. Irineu atribui o leão a João, e a águia a Marcos. Agostinho atribui o
leão a Mateus, e o homem a Marcos.

Leão. Vide nota sobre lPe 5.8.

Bezerro (μόσχω). Compare com Lc 15.23. Na l x x , é traduzido por um touro ou


tourojovem. Êx 22.1; Ez 1.10.

Águia (άετω). Vide nota sobre Mt 24.28.

8. Tinham (είχορ). Os melhores textos trazem εχωρ, tendo, o particípio no sin­


gular concordando com cada um.

Cada um, respectivamente (èv καθ’ ερ). Ou um a um. Conforme a leitura dos
melhores textos; contra a leitura εν καθ’ «αυτό, literalmente, um por si mesmo.
Compare com Mc 14.19.

Seis asas. Compare com Is 6.2. Dante retrata seu Lúcifer, a encarnação de
animalismo demoníaco, com três cabeças e seis asas.

Via asas duas sob cada frente,


Tão vastas, quanto em ave tal convinham:
Velas iguais não abre nau potente.
Plumas, como em morcego, elas não tinham;
D e contínuo agitadas produziam
Os três gélidos ventos, que mantinham
Os frios, que o Cocito enrijeciam66.

O Deão Plumptre comenta que as seis asas parecem as únicos sobreviventes


da condição angélica mais alta da qual Lúcifer caiu.

Ao redor (κυκλόθεν). Os melhores textos põem a vírgula depois de εξ, seis, em


vez de depois de κυκλόθερ, ao redor, e conectam κυκλόθεν com a oração seguinte,
traduzindo: são cheios de olhos ao redor epor dentro. Como na r v ; na a r c , ao redor e
por dentro, estavam cheios de olhos.

66. Dante, A D iv in a Com édia, Inferno, xxxiv, 4 6 -5 2 , p. 2 0 9 -2 1 0 .


401
A pocalipse - Cap. 4

Ao redor e por dentro. Ao redor e dentro de cada asa e na parte do corpo


abaixo da asa.

Estavam cheios (γέμοντα). Leia γέμουσιν, são cheios. Como na bj.

Não descansam (ανάπαυα ιν ούκ ’έχουσιν). Literalmente, não têm descanso.


Como na a r a . Vide nota sobre aliviarei, M t 11.28; e repousa, lPe 4.14.

Santo. Compare com Is 6.3, passagem que é o original da fórmula conhecida


como Trisagion (três vezes santo, triságio), usada nas liturgias antigas. Nas Consti­
tuições Apostólicas, ela fica: “Santo, santo, santo, Senhor Deus dos Exércitos! Céu
e terra estão cheios de tua glória, que és abençoado para sempre. Amém”. Depois
passou a ser entoado sob esta forma: “Santo Deus, santo Todo-poderoso, santo
Imortal, tem misericórdia de nós”. Como na liturgia alexandrina ou liturgia de
São Marcos. “Sacerdote. A ti damos glória e ação de graças, e o hino do Trisagion,
Pai, Filho e Espírito Santo, agora e para sempre e por todas as eras. Povo. Amém!
Deus santo, Todo-poderoso santo, Santo e Imortal, tem misericórdia de nós.” Na
liturgia de Crisóstomo, o coro entoa o Trisagion cinco vezes, e, no meio tempo, o
sacerdote diz secretamente a oração do Trisagion.

Deus Santo, que habitas entre os santos,


Tu que és exaltado pelos Serafins
num hino três vezes santo,
que és glorificado pelos Querubins
e adorado por todos os Poderes celestes;
Tu, que tudo fizeste passar do nada à existência,
criando o ser humano à tua imagem e semelhança,
adornando-o com todos os teus dons;
Tu, que dás sabedoria e inteligência a quem pede
e não desprezas o pecador,
mas estabeleceste a penitência como via de salvação;
Tu, que nos concedeste,
a nós teus humildes e indignos servos,
a graça de estarmos nesta hora
diante do teu glorioso e santo altar
e prestarmos a honra e a adoração que te são devidas:
Recebe, Soberano, de nossos lábios,
de nós que somos pecadores, o hino três vezes santo
e visita-nos com a tua bondade;
perdoa-nos nossas faltas, voluntárias e involuntárias;

402
A pocalipse - Cap. 4

santifica nossas almas e nossos corpos


e concede-nos a graça de servir-te santamente
todos os dias de nossas vidas.
(Em voz alta) Pois Tu és Santo, ó Deus, e nós te glorificamos,67

De acordo com uma tradição não confiável, essa fórmula foi recebida durante
um terremoto em Constantinopla, no reinado de Teodósio II, por intermédio de
um menino que foi levantado ao céu e ouviu-a dos anjos. Os primeiros testemu­
nhos da existência do Trisagion (três vezes santo, triságio) datam do século V ou
da última parte do século IV Depois, as palavras “Que foi crucificado por nós”
foram acrescentadas a fim de se opor à heresia teopasquita (Θεός, Deus; πάσχω,
sofrer), que sustentava que Deus tinha sofrido e sido crucificado. A essas se acres­
centaram, depois, as palavras “Cristo, nosso rei”. A fórmula completa ficou as­
sim: “Deus santo, santo Todo-poderoso, santo Imortal, Cristo nosso Rei que foi
crucificado por nós, tende misericórdia por nós”. Por isso, a fórmula entrou na
controvérsia com os monofisitas, que declaravam que Cristo tinha apenas uma
natureza composta. Dante introduz isso em seu “Paraíso”.

Quem sempre reina, é uno, é duplo, é trino,


E em três, em dois, em um sempre perdura,
Não abrangido - e tudo abrange - em hino
D e tão suave e cônsona doçura
D os coros foi três vezes aclamado,
Que um prêmio fora da virtude pura68.

Calei-me e ressoou melífluo canto


Pelo céu, que Beatriz acompanhava,
Dizendo todos: —Santo! Santo! Santo!69

As interpretações dos símbolos dos quatros seres viventes, claro, são inúme­
ras e variadas. Algumas delas são: os quatro evangelistas ou Evangelhos; os
quatro elementos; as quatro virtudes cardeais; as quatro faculdades ou poderes
da alma humana; o Senhor nos quatro grandes eventos da redenção; as quatro
igrejas patriarcais; os quatro grandes apóstolos; os doutores da igreja; os quatro
anjos principais etc. Os melhores intérpretes modernos explicam as quatro for­
mas como representantes da natureza animada. Milligan afirma:

67. João Crisóstomo. A Divina Liturgia de São João Crisóstomo. Disponível em: < http://www.ec-
clesia.com.br/biblioteca/liturgia/a_divina_liturgia_de_sao_joao_crisostomo_segunda_parte.
html#I>. Acesso em: 28 jun. 2013.
68. Dante, A Divina Comédia, Paraíso, xiv, 28-33, p. 81.
69. Ibid., Paraíso, xxvi, 67-69, p. 156.

403
A pocalipse - Cap. 4

o homem com seu trem cheio de seres dependentes aproximou-se de Deus e se tornou
participante da redenção, cumprindo, assim, a linguagem de Paulo de que “a mesma
criatura será libertada da servidão da corrupção, para a liberdade da glória dos filhos
de Deus” (Rm 8.2 1 ).

Düsterdieck diz: “A ideia essencial, simbolizada na imagem dos quatro seres


viventes, pode ser expressa em palavras como as de SI 103.22”. Cheios de olhos,
eles estão sempre alertas para perceber a manifestação da glória divina. Com
rosto e pés cobertos pelas asas (Is 6.2), eles manifestam sua reverência e hu­
mildade. Voando, eles estão preparados para ministrar. Alford registra: “Assim,
temos o trono de Deus rodeado por sua igreja e seu mundo animado; a primeira
representada pelos 24 anciãos; e o segundo, pelos quatro seres viventes”.

Que há de vir (ò ερχόμενος). Literalmente, que vem ou está vindo.

9. Quando (όταν). Em qualquer tempo, sempre que, indicando, com o tempo futuro,
a eterna repetição do ato de louvar.

Davam (δώσουσιν). Literalmente, como na r v , darão ( c p . tr ). Na t b e a r a , derem,

10. Prostravam-se (βάλλουσιν). Leia βα,λοΰαιν, prostrar-se-ão. A forma como deve


ser lida é, prostrar-se-ão, como a a r a . O lançar das coroas é um ato de submissão e
de homenagem. Cícero relata que quando Tigranes, rei dos armênios, foi levado
ao campo de Pompeu como cativo e se prostrou abjetamente, Pompeu “levantou-o
e repôs o diadema, que ele lançara no chão, sobre sua cabeça”70. Tácito relata a
homenagem pública feita pelo pártico Tiridates para a estátua de Nero.

Uma tribuna posta no centro sustentava uma cadeira de autoridade sobre a qual Nero
repousava. Tiridates aproximou-se e, tendo imolado as vítimas da forma apropriada,
levantou a diadema de sua cabeça e colocou-a aos pés da estátua, enquanto todo cora­
ção batia com intensa emoção71.

11. Senhor (κύριε). Leia ò κύριος καί ò Θεός ήμών, nosso Senhor e nosso Deus.
Como na n v i . Vide nota sobre Mt 21.3.

De receber (λαβείν). Ou talvez seja melhor pegar, uma vez que a glória, a
honra e o poder são de posse absoluta do Todo-poderoso. Vide nota sobre Jo 3.32.

70. Cícero, Pro Sestio (discurso), xxvii.


71. Tácito, Anais, xv, 29.

404
A pocalipse - Cap. 4

Poder. Em vez de ação de graças na atribuição dos seres viventes. No excesso


de gratidão, o “eu” é esquecido. A ação de graças deles é um tributo ao poder
criativo que os chamou à existência. Observe os artigos, “a glória” (como na n v i ),
expressando a incondicionalidade e a universalidade desses atributos. Vide nota
sobre 1.6.

Todas as coisas (τά πάντα). Com o artigo representando o universo.

Por tua vontade (διά τό θέλημα σου). Literal mente, por causa da tua vontade.
Como na a r a . Alford comenta com acerto:

A expressão por tua vontade da kjv introduz um elemento inteiramente estranho ao


contexto e, embora verdade de fato, um tanto inapropriado aqui, em que o o u , por,
traduz um motivo para o fato de ser digno de tomar honra, e glória, e poder.

São (elo lv ). Leia ήσαν, eram, existiram. Um dos grandes manuscritos, b, traz
ούκ ήσαν, não eram-, ou seja, elas foram criadas do nada. Eram não significa vie­
ram a ser, mas simplesmente existiram. Vide nota sobre Jo 1.3; 7.34; 8.58. Alguns
explicam que elas existem em contraposição com sua não existência anterior;
caso em que poderia parecer que a ordem das duas orações devia ser invertida;
além do que não é hábito de João aplicar esse verbo para objetos temporários e
passageiros. O Professor Milligan acha que esse termo faz referência ao tipo de
existência eterna na mente divina antes de alguma coisa ser criada e em confor­
midade com o que foi feito quando chegou o momento da criação. Compare com
Hb 8.5. Platão registra:

Seja então todo o Céu ou o Mundo, ou se esse ser pode receber algum outro nome
apropriado, demos-lhe esse nome. Estabelecemos desde já, no que lhe diz respeito,
a questão que dizíamos, deve-se estabelecer ao início de qualquer cousa. Existiu
sempre, não teve começo, ou então nasceu, começou a partir de um certo termo
inicial? Nasceu, porque é visível e tangível e tem um corpo. D e fato, tudo que assim
é, é sensível, e tudo o que é sensível e apreendido pela opinião e a sensação, é eviden­
temente submetido ao devir e ao nascimento. M as tudo o que nasceu, é necessário,
como dissemos, que tenha nascido pela ação de uma causa determinada. Todavia,
descobrir o autor e o pai deste universo é um grande feito, e quando se o descobriu,
é impossível divulgá-lo a todos. Mas ainda devemos interrogar-nos, a respeito do
Mundo, segundo como aquele que o conforma o realizou. Ora, se o Cosmos é belo
e se o demiurgo é bom, é claro que ele mira o modelo eterno. N o caso contrário, o
que nem é mesmo permitido supor, teria considerado o modelo que nasceu. Ora, é
absolutamente evidente para todos que o demiurgo contemplou o modelo eterno.

405
A pocalipse - Cap. 5

Pois este Cosmos é o mais belo do que já nasceu, e o demiurgo, a mais perfeita das
causas72.

C apítulo 5

1. Na (èní). Literalmente, sobre. O livro, ou rolo, repousa sobre a mão aberta.

Um livro (βιβλίον). Vide nota sobre Mt 19.7; Mc 10.4; Lc 4.17. Compare com
Ez 2.9; Jr 36.2; Zc 5.1-2.

Por dentro e por fora (εσωθ€Ρ καί οπισθίν). Compare com Ez 2.10. Indi­
cando a completude dos conselhos divinos contidos no livro. Os rolos escritos
dos dois lados eram chamados de opistográficos. Plínio, o jovem, diz que seu tio,
Plínio, o velho, deixou-lhe 160 comentários, a maioria escrito detalhadamente,
e também no verso, pelo qual o número de comentários deve ser multiplicado.
Juvenal, protestando contra os poetastros que recitavam seu lixo dos dois lados
do rolo, disse:

Então, aquele recitou para mim suas comédias e esse, suas elegias impunemente?
Imenso “Télefo” consumirá impunemente todo um dia; ou —com a margem do fim do
livro já cheia - “Orestes” escreveu atrás mesmo e ainda não concluiu?73

Selado (κατ^σφραγισμένον). Somente aqui no texto do Novo Testamento.


A preposição κατά denota selado e fechado. Como na t b , fechado e selado. O
rolo é enrolado em torno de um bastão e preso a ele com sete selos. O desen­
rolar do pergaminho não é indicado em nenhuma passagem da visão. Os co­
mentaristas quebraram a cabeça para explicar o arranjo dos selos de forma a
admitir o desenrolar de uma porção com a abertura de cada selo. Düsterdieck
comenta que, com incomparavelmente mais beleza e poder de representação,
o conteúdo do rolo foi sucessivamente simbolizado pela visão que se segue à
abertura de cada selo. “O conteúdo do livro se apresenta em belos símbolos do
selo aberto”. Milligan explica os sete selos como um selo, comparando as sete
igrejas e os sete espíritos com o sentido de uma igreja e um espírito, e duvida
se o número sete aqui tem algum sentido místico. Outros, como Alford, argu­
mentam que a completude dos propósitos divinos está indicada pelo número
perfeito sete.

2. Forte. Ou como de categoria mais alta ou com referência à grande voz.

72. Platão, T im eu e C rítia s ou a A tlâ n tid a , 28-29, p. 78-79.


73. Juvenal, Sátiras, i, 3-6.

406
A pocalipse - Cap. 5

Digno (άξιος) Como em Jo 1.27. Moralmente designado.

S. Debaixo da terra. No Hades.

Olhar (βλέπ€ΐιι). Vide nota sobre Jo 1.29. Dar uma simples olhada no conteúdo.

4. Chorava (εκλαιον). Choro audível. Vide nota sobre Lc 6.21.

5. Dos anciãos (ck των πρ€σβυτέρων). Estritamente, dentre os anciãos.

O Leão. Vide Gn 49.9.

A Raiz de Davi. V ide nota sobre nazareno, Mt 2.23.

Venceu (ένάκησερ). Ou prevaleceu.

Desatar. Omita.

6. E olhei. Omita.

Estava (έστηκός). Na tb , com mais acerto, d e pé. Embora m orto, o Cordeiro está
de pé. Cristo, embora morto, é ressuscitado e vive.

No meio do. Não sobre o trono, mas talvez no espaço no centro de que fica o
trono, e que está rodeado por 24 anciãos.

Um Cordeiro (άρνίον). O diminutivo, muito frequente no Apocalipse e uma


vez no Evangelho de João (21.15). Em mais nenhuma passagem do Novo Testa­
mento. Compare com Is 52.7; Jo 1.29,36. Cristo acaba de ser mencionado como
Leão. Agora, Ele aparece como um Cordeiro. Alguns intérpretes enfatizam a ideia
de g e n tile za , outros, a de sacrifício.

M orto (εσφαγμένορ). O verbo indica violência, carnificina. Vide nota sobre


lJo 3.12. Também é a palavra sacrifical. Êx 12.6.

Sete pontas e sete olhos. V id e comentários sobre as imagens de Ap,


1.16. A ponta é o emblema de poder. V id e nota sobre lSm 2.10; lRs 22.11;
SI 112.9; Dn 7.7,20ss.; Lc 1.69. Compare com M t 28.18. Os olhos represen­
tam o discernimento do Espírito de Deus em operação sobre todas as coisas
criadas.
407
Apocalipse - C ap. 5

Enviados (απεσταλμένα). Vide nota sobre Mc 3.14.

7. Tomou (ειληφεν). Literalmente, tem tomado. O tempo perfeito, alternando


com o aoristo, apresenta uma imagem vivida.

8. Havendo tomado (ελαβεν). Literalmente, tomou. O aoristo está resumido.

Todos eles harpas (έκαστος κιθάρας). A nvi traz, de forma menos desajeitada:
cada um deles tinha uma harpa. Cada um, isto é, dos anciãos. Κιθάρα, harpa, signi­
fica um instrumento distinto da nossa harpa como é comumente construída. E,
antes, um alaúde ou violão, com o qual, mais tarde, a palavra citara se relaciona
etimologicamente. Na Antiguidade, o instrumento tinha uma forma triangular
e sete cordas; depois, as cordas foram aumentadas para onze. Josefo diz que ele
tinha dez cordas e era tocada com um plectro ou uma pequena peça de marfim.

Salvas (φιάλας). Só em Apocalipse. A palavra salva transmite a imagem corre­


ta aqui. Ο φιάλη era um vaso largo e chato usado para líquidos efervescentes, às
vezes, como urna incineradora, para bebidas ou derramar libações. Também para
taça rasa, em geral, sem pé, na qual as libações eram tiradas do misturador. Heró-
doto diz que, em Platéias, Pausânias propôs aos escravos espartanos que juntas­
sem o espólio do campo persa, e que eles encontraram “muitos misturadores de
ouro e tigelas (φιάλας) e outros έκπώματα [recipientespara beber)”1*. A partir de sua
forma larga e chata, ’Άρεος φιάλη, tigela de Marte, era uma metáfora cômica para
escudo. Também era usada para trabalho em baixo relevo no teto. Na lxx, a pa­
lavra é frequentemente usada para taças ou bacias. Vide Nm 7.13,19,25,31,37,43;
lRs 7.50; Zc 9.15. Aqui, incensório, embora diversas palavras distintas da lxx e
do Novo Testamento sejam traduzidas por incensório, como θυΐσκη, lRs 7.50;
θυμιατήριον, 2Cr 26.19; Ez 8.11; Hb 9.4; λιβανωτόν, Ap 8.3. Contudo, θυΐσκη é o
cálice, ou colher, de incenso de ouro para receber o olíbano que era aceso com carvão
do altar de bronze e oferecido no altar de ouro diante do véu. A imagem é do
tabernáculo e do culto do templo.

Incenso (θυμιαμάτων). As orientações para a composição do incenso para a


adoração no tabernáculo são fornecidas em Ex 30.37,38.

Orações. Para incenso como símbolo de oração, vide Lv 16.12-13;


SI 141.2. Vide nota sobre Lc 1.9. Edersheim, ao descrever a oferta de incen­
so no templo, diz:

74. Heródoto, ix, 30.

408
A p o c a l ip s e - C ap . 5

Quando o presidente dava a palavra de comando que marcava que “chegara o mo­
mento do incenso”, toda a multidão, sem sair da corte interior, prostrava-se diante do
Senhor, espalmando a mão em oração silenciosa. Esse é o período mais solene, quando,
em todo o vasto prédio do templo, o silêncio profundo cai sobre a multidão que está
adorando, enquanto, no próprio santuário, o sacerdote estende o incenso sobre o altar
de ouro, e a nuvem de odores sobe diante do Senhor, o que serve como a imagem das
coisas celestiais no Apocalipse (8.1,3-4). As orações oferecidas pelos sacerdotes e pelo
povo nessa parte do culto estão registradas pela tradição como segue: “É verdade que
és Jeová, nosso Deus, e o Deus de nossos pais; nosso Rei e o Rei de nossos pais; nosso
Salvador e a Rocha da nossa salvação; nossa Ajuda e nosso Libertador. Teu nome é
para sempre e não há outro Deus além de Ti. Eles fizeram um novo cântico que foi
entoado por teu nome na praia. Todos juntos louvam a ti e te reconhecem como Rei e
dizem: Jeová que salvou Israel reinará”.

Compare com o “cântico de Moisés”, 15.3, e com “um novo cântico”, versículo 9.

9. Cantavam. O correto é o verbo no presente, denotando a adoração contínua


e incessante do céu ou, possivelmente, descrevendo seu, segundo Alford, “ofício
geral, em vez de um mero caso particular de seu exercício”.

Com o teu sangue (4v τω αϊματί σου). Literalmente, “em teu sangue”. A
preposição em é usada de forma hebraica para o preço; o valor da coisa comprada
contida no preço.

Compraste (ή γ ό ρ α σ α ς). Literalmente. Vide Jo 4 .8 . 6 .5 .

Homens. Em substituição a nos, conforme a k j v e n t i a (cp. t r e t m ).

Tribo (φυλής). Com frequência, usada no texto do Novo Testamento para as


doze tribos de Israel.

Povo - nação (λαού - Εθνους). Vide nota sobre lPe 2.9.

10. Os (αυτούς). Conforme a melhor leitura; contra a leitura ημάς, nos (cp.
kjv).

Reis (βασιλείς). Leia βασιλείαν, um reino. Como na t e b . Vide nota sobre 1.6.

Eles remarão (βασιλΕυσομΕν). Leia βασιλβϋουσιν, eles reinam. O reinado deles


não é futuro, mas atual.
409
A p o c a l ip s e - C a p . 5

11. Milhões de milhões (μυριάδες μυριάδων»). Literalmente dez mil de dez mil.
Compare com SI 68.17; Dn 8.10. Μυριάς, daí o nosso termo miríade, que quer
dizer o número dez mil. Portanto, At 19.19, άργυρίου μυριάδας πέντε, cinquenta
mil peças de prata, literalmente cinco dez mil. No plural, usado para se referir a um
número ilimitado. Vide Lc 12.1; At 21.20; Hb 22.22; Jd 14.

Milhares (χιλιάδες). Χιλιάς, termo coletivo como μυριάς, cujo significado é o


número mil, é quase invariavelmente usado com homens em Apocalipse. Vide 7.4;
11.13. Só uma vez com um objeto material (21.16). Com objetos inferiores, usa-se
χίλιοι, mil. Vide 11.3; 12.6. Essas palavras são o tema do nobre hino de Alford:

Milhões de milhões
Em roupas resplandecentes,
Os exércitos dos santos resgatados
Multidões banhadas de luz;
Está acabado, tudo está acabado,
Sua luta com a morte e o pecado;
Escancarem as portas de ouro
E deixem os vitoriosos entrar.

12. O poder. Compare com a atribuição em 4.11, a respeito do qual vide a nota,
e observe que lá, na n v i , cada aspecto citado tem o artigo, ao passo que aqui ele
aparece apenas no primeiro, o poder, um artigo que abrange todos os particu­
lares, como se eles formassem apenas uma palavra. Acerca das doxologias, vide
nota sobre 1.6.

Riquezas (πλούτον). Não limitado às riquezas espirituais, mas denotando a ple­


nitude de todo dom de Deus. Tg 1.17; At 17.25. Somente aqui em uma doxologia.

Ações de graça (ευλογίαν). Vide nota sobre a palavra relacionada ευλογητός,


bendito, lPe 1.3.

13. Criatura (κτίσμα). Vide lTm 4.4; Tg 1.18. De κτίζω, fundar. Uma coisa fu n ­
dada ou criada. Na r v , coisa criada. Vide nota sobre Jo 1.3.

No mar (έπ'ι τής θαλάσσης). A tradução mais acurada é “sobre o mar”, como a a r a .
Não barcos, mas criaturas do mar que subiram das profundezas para a superfície.

Ações de graças (ή ευλογία). Na r v , mais corretamente, “as ações de graças”.


Na n v i , todos os particulares das atribuições seguintes têm o artigo.
410
A pocalipse - C ap. 6

Honra (τιμή). Originalmente, wafer pelo qual o preço é fixado, daí opreço mes­
mo, a coisa valorizada, e assim, em geral, honra. Vide nota sobre At 28.10.

Poder (το κράτος). Na a ra , o d o m ín io . Para as diferentes palavras para. p o d e r ,


v id e nota sobre 2Pe 2.11.

14. Vinte e quatro. Omita.

Adoraram. Em adoração silenciosa.

Ao que vive para todo o sempre. Omita.

C a pítu lo 6

1. Dos selos. Acrescente sete.

Olhei. Omita.

2. Cavalo branco. Para branco, vide nota sobre Lc 9.29. Cavalo, vide Zc 1.7-11;
6.1-8. Todas as imagens desse versículo são de vitória. No Antigo Testamento,
o cavalo é emblema de guerra. Vide Jó 39.25; SI 76.6; Pv 21.31; Ez 26.10. Como
em Virgílio:

Primeiro agouro, aqui ginetes quatro,


Alvos de neve, o prado à larga tosam.
E meu pai: “Guerra inculcas; para a guerra
Se armam, solo hospedeiro, esses cavalos;
Guerra o armento ameaça75.

E também para Turno, indo para a batalha:

Disse, e parte; os frisões demanda, e os mira


Dos relinchos alegre: de Orítia
Prenda honrosa a Pilumno, sobrepujam
No curso os ventos, no candor a neve76.

75. Virgílio, Eneida, iii, 557-561. Disponível em: < http://ww w.unicam p.br/iel/projetos/O dorico-
M en d es/>. Acesso em: 28 jun. 2018.
76. Ibid., xii, 78-81.

411
A pocalipse - C ap . 6

Homero retrata os cavalos de Reso Eiônides como mais alvos que a neve e
rápidos como o vento77; e Heródoto, ao descrever a batalha de Platéias, diz: “A
luta ia mais contra os gregos, onde Mardónio, montado em um cavalo branco e
cercado por todos os mais bravos persas, os mil homens selecionados, lutou em
pessoa"78. Os cavalos dos generais romanos em seus triunfos eram brancos.

Arco (τόξον). Vide SI 45.4-5; Hc 3.8-9; Is 41.2; Zc 9.13-14, em que na última


passagem a imagem é de um grande arco que só é puxado com a aplicação de
muita força e colocando os pés sobre ele. Compare com a imagem de Homero ao
descrever a tentativa de Telêmaco de puxar o arco de Ulisses:

Postado na soleiraprovou oarco. Três vezes


oarco resistiu vibrante aoesforço de retesá-lo79.

Os pleiteantes propõem ungir o arco com gordura, a fim de suavizá-lo.

Busca lá dentro uma grande rodela de


sebo. M ãos jovens, as nossas, experim entarão o
arco ensebado. O fim deste jo g o está p erto80.

Uma coroa (στέφανος). Vide nota sobre 4.4.

3. E vê. Omita.

Havendo aberto (ήνοιξίν). A tradução mais literal do aoristo é abriu, como


na teb .

4. Vermelho (πυρρός). De πυρ,fogo. Cor de chama. Compare com 2Rs 3.22; Zc 1.8.
Somente aqui e em 12.3.

Que tirasse a paz da terra. Compare com Mt 10.34; 24.7.

Matassem (σφάξωσιν). Vide nota sobre 5.6.

Espada (μάχαιρα). Compare com Mt 10.34. Em Homero, uma grande faca ou


punhal, ao lado da bainha da espada, usado para degolar animais para sacrifício.

77. Homero, ilíada, x, 436-437.


78. Heródoto, ix, 63.
79. Homero, Odisséia, xxi, 124-125, p. 249.
80. Ibid., xxi, 178-180, p. 251.
412
A pocalipse - C ap. 6

Assim: “O Atreide, retirando o cutelo (μάχαιραν) suspenso à bainha de sua lon­


ga espada, tosa o pêlo à cabeça das vítimas. £...3 Agamêmmon, dito isso, com o
bronze cruel degolou os cordeiros”81. É usada pelo cirurgião Macáone para cor­
tar uma flecha82. Heródoto, Aristófanes e Euripides usam a palavra no sentido de
faca para cortar carne. Platão com o sentido defaça para podar árvores. Como arma,
aparece pela primeira em Heródoto: “Aqui eles (os gregos) defenderam-se até 0
último, os quais ainda tinham espadas, usando-as”83. Depois, como sabre ou espada
curva, em contraposição a ξίφος, ou espada reta. Aristófanes usa-a com o adjetivo
μια, simples, para uma lâmina, em contraposição a μάχαιρα διπλή, afaca dupla ou
tesoura. Essa e ρομφαία {vide nota sobre Lc 2.35) são as únicas palavras usadas no
texto do Novo Testamento para espada. Ξίφος ( vide acima) não ocorre. Na lxx,
μάχαιρα, o cutelo de sacrifício, usada por Abraão (Gn 22.6,10).

5. Vem e vê. Omita e vê.

Preto. A cor do luto e da fome. Vide ir 4.28; 8.21; Ml 3.14, passagem em que
pesaroso é, ao pé da letra, de luto.

Uma balança (ζυγόν). Em contrapartida, na k j v , par de balanças. Propria­


mente, qualquer coisa que junte dois corpos; daí jugo (Mt 11.29; At 15.10). A
trave mestra do tear à qual a trama era fixada; as transversais que juntam os
lados opostos de um barco; o travessão da balança e, por isso, a balança mesma.
O julgamento desse selo é a escassez, do que a balança é um símbolo, repre­
sentando os tempos em que o alimento é dado por peso. Vide Levítivo 26.26;
Ez 4.16.

6. Medida (χοινιξ). Choinix, queniz. Somente aqui no texto do Novo Testamen­


to. De acordo com alguns, medida para sólidos, um quarto de litro-, para outros,
uma polegada cúbica e meia. Heródoto, ao falar das provisões para o exército de
Xerxes, determina um cótilo de milho para o suprimento diário de um homem,
evidentemente, com o sentido de ração mínima84·; e Tucídides, ao falar dos ter­
mos da trégua entre os lacedemônios e os atenienses, menciona o seguinte como
uma das condições: “Os atenienses permitirão que os lacedemônios do continen­
te enviem para os da ilha uma quantidade fixa de mistura de farinha, a saber, dois
quartos de litro atenienses (χοίνικας) de farinha de cevada por homem”85. Jowett

81. Homero, Ilíada, iii, 271-292, p. 135.


82. Ibid., xi, 844.
83. Heródoto, vii, 225.
84. Id., vii, 187.
85. Tucídides, iv, 16.

413
A pocalipse - C ap . 6

diz que o cótilo era cerca de duas polegadas cúbicas de medida de sólidos86.
Também Arnold, que acrescenta que a ração diária de dois cótilos de farinha de
cevada por homem era a ração comum de um espartano na mesa pública87. Vide
Heródoto88.

Por um dinheiro (δηναρίου). V ide nota sobre Mt 20.2.

8. Amarelo (χλωρός). Só em Apocalipse, com exceção de Mc 6.39. Apropriada­


mente, am arelo esverdeado, como a grama nova ou o grão não maduro. Homero
aplica a cor para mel·, e Sófocles, para a areia. Em geral, p á lid o , descorado. Usado
para névoa, água do mar, de complexão descorada ou biliosa. Tucídides usa-a
para a aparência de pessoas atacadas pela praga89. Em Homero, a cor é usada
para palidez de medo e, por isso, como diretamente descritiva de medo90. Para a
cor da madeira de oliveira91 da qual a casca é cinza. Gladstone diz que a cor, em
Homero, indica, antes, a ausência de cor definida, e não a presença de uma cor es­
pecífica. Nas páginas do Novo Testamento sempre é traduzida por verde, exceto
aqui. Vide Mc 6.39; Ap 8.7; 9.14.

Inferno. Propriamente, hades. O reino da morte personificada. Vide nota sobre


Mt 16.18.

Poder (έξουσία). Vide nota sobre Mc 2.10; 2Pe 2.11. Na a b a , melhor, autoridade.

Com espada (èv ρομφαία). Outra palavra para espada. Compare com versícu­
lo 4, e v id e nota sobre Lc 2.35.

Com peste (èv θανάτψ). Ou morte. Na t eb , p e la morte. A palavra hebraica debher


(■ ni), peste, é traduzida, na l x x , pela palavra grega para morte. Vide i r 14.12; 21.7.
Compare com o termo P este N e g ra aplicada a uma praga oriental que devastou no
século XIV

Com as feras (ύπό των θηρίων). Na t e b , pelas-, na n v i e a r a , p o r meio. A


preposição ύπό, pelo, p o r m eio, é usada aqui, em vez de èv, em ou com, indicando
de forma mais definitiva o verd a d eiro agen te de destruição; enquanto èv denota

86. Jowett, Thucydides.


87. Arnold, Thucydides.
88. Heródoto, vi, 57.
89. Tucídides, ii, 49.
90. Homero, Iliada, x, 376; xv, 4.
91. Id., Odisséia, ix, 320, 379.

414
A pocalipse - C ap . 6

o elem ento por meio do qual a destruição acontece e dá uma indicação geral
da maneira em que ela era escrita. Compare esses quatro julgamentos com
Ez 14.21.

9. Altar (θυσιαστηρίου). Vide nota sobre At 17.23. O a lta r de sacrifício confor­


me indicado pelos mortos; não o a lta r de incenso. A imagem é do tabernáculo.
Êx 39.39; 40.29.

Almas (ψυχάς). Ou vidas. Vide nota sobre 3Jo 2. Ele só viu sangue, mas sangue
e vida eram termos equivalentes para o hebraico.

Mortos (έσφαγμενων). Vide nota sobre 5.6. A lei ordenava que o sangue dos
animais sacrificados fosse derramado na base do altar de oferta queimada (Lv 4.7).

Deram (είχον). Não g u ardar, mas dar testemunho do que aconteceu com eles.

10. Clamavam (εκραζον). Vide nota sobre Mc 5.5.

Até quando (έως πότε). Literalmente. Compare com Zc 1.12.

Verdadeiro (αληθινός) Vide nota sobre Jo 1.9; Ap 3.7.

Ó - Dominador (ò δεσπότης). Vide nota sobre 2Pe 2.1. Somente aqui em Apo­
calipse. Dirigido a Deus, e não a Cristo, e soprando, como comenta o Professor
Milligan, “o sentimento do Antigo Testamento, mais do que a relação com o
Novo Testamento”. Compare com At 4.24; Jd 4.

Julgas (κρίνεις). Originalmente, o verbo tem o sentido de separar, daí a ideia


de seleção, escolher e, assim, d iscrim in a r ou ju lg a r.

Vingas (εκδικεΐς). Compare com Lc 18.3; Rm 12.19.

Sobre a terra (έπ'ι τής γης). Terra, em Apocalipse, em geral, é entendida como
a terra ím pia.

11. A cada um foi dada uma comprida veste branca (έδόθη αύτοις έκάστφ
στολή λευκή). Conforme a leitura dos melhores textos; contra a leitura εδόθησαν
έκαστο ις στολαι λευκαι, m an tos brancosfo r a m dados a cada um deles (cp. kjv ). Στολή
significa propriamente um m anto longo, esvoaçante; uma veste fe stiv a . Compare
com Mc 16.5; Lc 15.22; 20.46.
415
A pocalipse - C ap . 6

Repousassem (άνοπταύσωνται). Vide nota sobre Mt 11.28; lPe 5.14; compare


com 14.13; Dn 12.13. Não apenas descansar de seu clamor por vingança, mas
repousar em paz.

Se completasse (πληρώσονται.). Completado em número. V ide Cl 2.10. Alguns


textos trazem πληρώσωσιν, tivessem com pletado seu curso.

Conservos. V ide D o m in a d o r no versículo 10.

12. O sexto selo. Milligan registra:

O Apocalipse é moldado pelo grande discurso de nosso Senhor sobre “as últimas coisas”
que foram preservadas para nós nos três primeiros Evangelhos (Mt 24.4--25; Mc 13.5-37;
Lc 21.8-36; cp. 17.20-37). O paralelismo entre os dois, em determinada extensão, é reco­
nhecido pelos inquiridores e, na verdade, em muitos aspectos, é tão óbvio que dificilmente
pode deixar de ser notado até mesmo pelo leitor comum. Se alguém comparar, por exem­
plo, o relato da abertura do sexto selo com a descrição do fim (Mt 24.29-30), perceberá que
um é quase uma transcrição do outro. É notável que não encontremos nenhum relato des­
se discurso no Evangelho de João; nem parece explicação suficiente para a omissão dizer
que esse evangelista estava satisfeito com os registros já apresentados por predecessores.

Tremor de terra (σεισμός). Literalmente. Termo usado também para tempes­


tade. Vide nota sobre M t 8.24, e compare com Mt 24.7. A palavra aqui não está
necessariamente confinada a tremor de terra. Em M t 24.29, ela prediz que as
potências dos céus serão abaladas (σαλευθήσονται, v id e nota sobre Lc 21.26). Aqui
também o céu é retiVjad(V\ (v. 14). Compare com Hb 12.26, onde se usa o verbo
σείω, sacu dir (relacionado com σεισμός).

Negro como saco de cilício (μελας ώς σάκκος τρίχινος). Compare com


Mt 24.29; Is 1.3; 13.10; Jr 4.23; Ez 32.7,8; J1 2.31; 3.15; Am 8.9-10; Miqueias 3.6.
Para saco, vid e nota sobre Lc 10.13.

A lua (ή σελήνη). Acrescente δλη, inteira. Na n v i , to d a a lua.

13. Figos verdes (όλύνθους). Tradução melhor que a da k j v , extemporâneos. Na


b j , somente^gos. Compare com Mt 24.32; Is 34.4. Ocorre somente aqui no texto

do Novo Testamento.

14. Retirou-se (άπεχωρίσθη). O verbo tem o sentido de separar, p a r tir . Na rv ,f o i


rem ovido.

416
A pocalipse - C ap . 7

Livro (βιβλίον). Vide nota sobre Lc 4.17. Compare com Is 34.4.

M ontes e ilhas. Compare com Mt 24.35; Na 1.5.

15. Da terra. V ide n o ta sobre o versículo 10.

Grandes (μεγιστάνες). Na nvi, príncipes. V ide n o ta sobre tribunos, Mc 6.21.

Tribunos (χιλίαρχοι). Vide nota sobre Mc 6.21, e sobre centurião, Lc 7.2.

Os poderosos (oi. δυνατοί). Os melhores textos trazem ol ίσχυρο'ι. Na rv,


05fo rtes. Para a diferença de sentido, vid e nota sobre as palavras relacionadas
δύναμις e Ιαχής, fo rç a o poder, 2Pe 2.11.

Todo livre. Omita todo, e leia, como na r v : todo servo e hom em livre. No n t ia ,
todos eles, escravos e livres.

Nas cavernas (εις τα σπήλαια). A preposição εις, p a ra dentro, sugere corrida


para abrigar-se.

Rochas (πέτρας). Vide nota sobre Mt 16.18.

16. Diziam (λεγουσιν). Literalmente, d izem . Como na rv.

Caí sobre nós. Compare com Os 10.8; Lc 23.30.

Ira (οργής). Denotando a ira de ra ízes profundas. V ide nota sobre Jo 3.36.

17. É vindo (ήλθεν). Literalmente, veio.

O grande Dia (ή ήμερα ή μεγάλη). Literalmente, ο dia, ο g ra n d e {dia). Para


essa construção, vid e nota sobre lJo 4.9.

Poderá subsistir (δύναται σταθήναι). Na rv , corretamente, é capaz. Compare


com Na 1.6; Ml 3.2.

C apítulo 7

l. D estas coisas (ταΰτα). Leia τούτο, disto.

417
A pocalipse - C ap. 7

Retendo (κρατούντας). Retendo fix a m e n te ou firm em en te. Vide nota sobre


Mc 7.3; At 3.11.

2. Banda do sol nascente (ανατολής ήλιου). Sentido mais literal. Vide nota sobre
Mt 2.2; Lc 1.7. Compare com Ez 43.2.

Aos quatro anjos. Compare com Mt 24.31.

3. Na testa. Compare com Êx 28.36-38; Ez 9.4.

4. Cento e quarenta e quatro nail. Não literalmente, mas o número simbólico


de estabilidade e plena completude (12 x 12). As interpretações, como sempre,
variam muito, dividindo-se geralmente em duas grandes categorias: uma susten­
ta que o objetivo é somente os judeus, a outra inclui o número total dos eleitos,
judeus e gentios. Da primeira categoria, alguns consideram os selados como os
cristãos judeus representando os escolhidos da Israel literal. Outros acrescen­
tam a isso a ideia desses como formando o núcleo da humanidade glorificada a
quem se juntam os gentios. Outros ainda os consideram como judeus reservados
por Deus até a vinda do anticristo a fim de manter no seio de sua nação a verda­
deira crença em Jeová e sua lei, como os 7.000 dos dias de Elias.
A interpretação da última categoria parece designada a ter maior peso. De
acordo com o uso apocalíptico, termos judaicos são “cristianizados e engran­
decidos em seu sentido, e a palavra ‘Israel’ tem de ser entendida por todos os
cristãos, a companhia abençoada de todo povo fiel, a verdadeira Israel de Deus”.
V ide Rm 2. 28-29; 9.6,7; G1 6.16; Fp 3.3. A cidade de Deus que inclui todos os
cristãos é designada pelo nome judaico, nova Jerusalém. No versículo 3, o assi­
nalado, em geral, é designado como os servos d o nosso Deus. No capítulo 14, os
cento e quarenta e quatro mil assinalados são mencionados depois da descrição
dos inimigos de Cristo, os que têm referência com toda a igreja de Cristo; e a
menção aos assinalados é seguida da colheita mundial e da vindima da terra. Os
cento e quarenta e quatro mil do capítulo 14 têm o nome do Pai escrito na testa e,
em 22.4, todos os habitantes da nova Jerusalém são assinalados assim. Em 21.12,
as doze tribos incluem todos os cristãos. A marca de Satanás que está na testa
é posta sobre todos seus servos sem distinção de raça. V ide 13.16,17; 14.9; 16.2;
19.20; 20.4. As pragas ameaçam tanto judeus quanto gentios, enquanto o sinal
protege a todos eles.

9. Olhei. Essa visão pertence ao céu, enquanto o selo acontece na terra.

Trajando (ικριβ^βλημένοι). V ide nota sobre 3.5.

418
A pocalipse —C ap. 7

Vestes. V ide nota sobre 6.11.

Foi declarado na Escritura


O sinal (sua forma está sabida)
D e almas, que, amigas, o Senhor apura.
D isse Isaías: cada qual cingida
Em sua pátria será de dupla veste,
E a pátria sua é nesta doce vida.
Por que mais a verdade se manifeste,
Das cândidas estolas discorrendo
Mais claro teu irmão falou do que este92.

Palmas (φοίνικας). Tradução apropriada, mas a palavra é usada aqui em refe­


rência a ram os de palma. Imagem não pagã, mas judaica extraída provavelmente
da Festa dos Tabernáculos.

10. Clamavam. A leitura correta κράζουσιν, eles clam am . Como na rv.

Salvação. O louvor de salvação, atribuindo a salvação a Deus.

11. Estavam (έστήκΈσαν). Na rv, mais corretamente, continuavam estando. O tem­


po é o mais-que-perfeito, usado nesse verbo como um imperfeito.

12. Louvor. Acerca das doxologias, v id e nota sobre 1.6.

13. Falou. No sentido de começar a falar em conexão com alguma determinada


ocasião, como Mt 11.25. V ide nota sobre Jo 2.18.

Estes que estão. A arc, apropriadamente, segue a ordem grega que põe pri­
meiro: “Estes que estão de vestes brancas quem são?”, enfático e indica a ordem
natural do pensamento como se apresenta para o inquiridor. Pará o que, traduzir
por quem, como na nvi.

14. Eu disse-lhe (βΐρηκα). Literalmente, tenho dito. A rv traduz pelo presente: eu


digo. Vide nota sobre clamou, Jo 1.15.

Senhor (κύρΐ€). Acrescente μου, meu, e traduza, como a ara: meu Senhor. Tra­
tamento de respeito para um ser celestial. V ide nota sobre Mt 21.3.

92. Dante, A Divina Comédia, Paraíso, xxv, 88-96, p. ISO. A referência de Dante é a Is 61.7, onde,
contudo, não existe menção a veste, mas unicamente a uma dupla retribuição. O termo “irmão”
refere-se a João.

419
A pocalipse —C ap. 7

Os que vieram (οί ερχόμενοι). O particípio presente. Daí essa tradução da


ARC.

De grande tribulação (έκ τής θλίψεως τής μεγάλης). Literalmente, de dentro


(tribulação). A t e b , apropriadamente, comunica a força do
da tribulação, a g ra n d e
artigo: “da grande”. Vide nota sobre Mt 13.21.

Lavaram (έπλυναν). O tempo aoristo. Esta é a tradução correta. Somente aqui


e em Lc 5.2, sobre a qual vide nota. Para os termos do Novo Testamento para
lavar, vid e nota sobre At 16.33.

As branquearam. Compare com Is 1.18; SI 51.7; Mc 9.3. Milligan comenta


que o termo vestes é a expressão de caráter e compara com a palavra hábito, usada
para traje.

15. Por isso. Por causa dessa lavagem.

Diante do trono. Compare com Ef 5.27.

Servem (λατρεύουσιν). Vide nota sobre Lc 1.74. Na Escritura, o verbo nunca


expressa nenhum outro serviço além daquele para o verdadeiro Deus ou para os
deuses do paganismo.

Templo (ναω). Ou santuário. V ide nota sobre M t 4.5.

Cobrirá (σκηνώσει). De σκηνή, tenda ou tabernáculo. Daí a tradução da n v i ser


melhor, estenderá sobre eles o seu tabernáculo. Vide nota sobre Jo 1.14, e compare
com Lv 26.11; Is 4.5-6; Ez 37.27.

16. Nunca mais terão fome. Compare com Is 49.10.

Calma (καύμα). Em Is 49.10, usa-se a palavra καύσων, o vento quente ou siroco.


Vide nota sobre M t20.12;Tg 1.11.

17. No meio (άνά μέσον). Vide nota sobre 5.6.

Apascentará (ποιμανει). Vide nota sobre há de apascentar, Mt 2.6; At 20.28;


lPe 5.2. Compare com SI 23.1.

Servirá de guia (οδηγήσει). Vide nota sobre Lc 6.39.

420
A pocalipse - C ap . 8

Fontes das águas da vida (ζωής πηγάς ύδάτων). Conforme a leitura dos me­
lhores textos, que substituem o particípio ζώσας, vivas, por ζωής, d a vida. Com­
pare com SI 23.2. Na ordem grega, d a v id a vem em primeiro lugar como enfático.

Toda lágrima (παν δάκρυον). Tradução correta; contra a kjv , to d a s as lá g ri­


mas. Compare com Is 25.8.

C apítulo 8

1. [Quando] (δτε). Conforme a kjv; a tradução da arc elimina a partícula: ha­


vendo aberto. A tb, bj e teb a trazem. Leia δταν, partícula indefinida com o modo
indicativo. Para uma construção similar, v id e Idle 11.19 (leitura correta). Alford
observa que isso ocorre só na abertura desse selo, dando-lhe uma falta de defini­
ção que não pertence a nada do resto.

Fez-se (έγένετο). Mais literalmente, aconteceu. Na rv, seguiu-se.

Quase (ώς). Forma usual de expressão de João. Vide Jo 1.39; 6.19; 11.18.

2. Estavam (εστήκασιν). Na nvi, corretamente, se acham em pé.

Trombetas (σάλπιγγάς). V ide nota sobre 1.10.

3. Junto ao altar (επί το θυσιαστήριον). Os melhores textos trazem θυσιαστηρίου,


o que justifica a tradução da rv: “sobre o altar”. Para alta r, vid e nota sobre 6.9.
Os intérpretes diferem quanto a se o altar se refere ao altar de bronze, como em
6.9, ou ao altar de incenso, como em 9.13. Parece não haver motivo para mudar
a referência do altar de bronze [v id e nota sobre 6.9), sobretudo uma vez que os
dois altares são mencionados nesse versículo. O sacerdote que oficiava no taber-
náculo, ou templo, pegava o fogo para seu incenso do altar de bronze e, depois,
oferecia o incenso sobre o altar de ouro.

Incensário. Vide nota sobre 5.8.

Incenso. Vide nota sobre 5.8.

Pôr com as orações (δώση ταΐς προσευχαΐς). Literalmente, desse às orações.


Na rv, acrescentasse às orações; na tb, a ju n ta r às orações. Para que as orações e o
incenso ascendessem juntos. Προσευχή é sempre usado em referência à oração
a Deus.

421
A pocalipse - C ap . 8

Altar de ouro. O altar de incenso. Êx 30.1-6; 39.38.

4. Subiu com as orações. Às vezes traduzido de forma um tanto inepta, q u e v e io


c o m a s o ra ç õ e s, seguida pela rv , embora com a omissão de q u e v e io em itálico. A

construção se faz com άνέβη, s u b iu , e o caso dativo, à s o ra ç õ e s. Winer afirma: “A


subida da fumaça tinha relação com as orações, estava designada a acompanhá-
-las e a torná-las mais aceitáveis”.

Dos santos (των άγιων). V id e nota sobre At 26.10.

5. Tomou (ε’ίληφ^ν). Literalmente, te m to m a d o . Como na rv, em nota de margem.

Do fogo (έκ του πυρός). Literalmente, “d o ou d e d e n tr o d o fogo", ou seja, dos


carvões ou cinzas quentes. Para 6K, d e d e n tr o d e , v id e nota sobre 2.7.

O lançou sobre a terra. V id e Ez 10.2; Lc 12.49.

6. Tocá-las (ίνα σαλπισωσιν). Literalmente, q u e e le s s o p r a r ã o a s tr o m b e ta s . Levan­


tar suas trombetas até a boca no ato para tocar.

7. O primeiro anjo. Omita a n jo .

Saraiva e fogo misturado com sangue (χάλαζα καί πυρ μεμιγμένα α'ίματι).
Insira έν, e m , antes de α'ίματι, s a n g u e . Em vez de “c o m sangue”, como na arc, nvi,
bj , entre outras, deveriamos traduzir: “e m sangue”. As pedras de saraiva e as bo­
las de fogo caíram em uma chuva de sangue. Compare com o relato da praga de
fogo e saraiva no Egito (Êx 9.24), ao qual essa passagem se refere, e que a l x x
traduz como: e h a v ia s a r a iv a e f o g o m is tu r a d o e n tr e a s a r a iv a . Compare com J12.30.

Terra, que foi queimada na sua terça parte. Isso é acrescentado pelos me­
lhores textos.

Verde (χλωρός). V id e nota sobre a m a r e lo , capítulo 6.8.

8. E foi (ώς). Não um monte, mas uma massa de fogo tão grande que parecia um
monte.

Sangue. Lembrete da primeira praga do Egito (Êx 7.20-21).

9. Vida (ψυχάς). V id e nota sobre SJo 2.

422
A pocalipse - Cap. 9

Naus (πλοίων). Vide nota sobre Lc 5.2.

10. Tocha (λαμπάς). Na t b , facho. Vide nota sobre 4.5.

11. Absinto (αψινθος). Usado metaforicamente no Antigo Testamento para


a id o la tria de Israel (Dt 29.18); para calam idade e sofrim ento (Jr 9.15; 23.15; Lm
3.15,19); para fa ls o j u í z o (Am 5.7).

13. Um anjo (4νός αγγέλου). Em lugar de anjo, leia aetoC, águia. Literalmente,
um a águia. A águia é um símbolo de vingança em Dt 28.49; Os 8.1; Hc 1.8.

Meio do céu (μεσουρανήμαη). Só em Apocalipse, aqui e em 14.6 e 19.17. O


sentido é propriamente o m eridiano, o ponto mais alto no céu que o sol ocu p a ao
meio-dia; não o espaço entre céu e terra. A ara lê: o u vi um a águia.

C apítulo 9

1. Caiu (π^πτωκότα). Literalmente, caída. A estrela caiu antes e é vista quando


caída.Compare com Is 14.12; Lc 10.18.

Do poço do abismo (του φρέατος τής αβύσσου). Essa é a maneira como a a r c


apresenta. Vide nota sobre Jo 4.6, e compare com Lc 14.5. Todavia, não é um poço
trancado, mas a longa fo s s a que leva ao abismo, como um poço que, no Oriente, é
mais comumente coberto e trancado.

2. Fumaça de uma grande fornalha. Compare com Gn 19.28; Êx 19.18;


Mt 13.42,50.

3. Gafanhotos (άκρί&ς). A ideia dessa praga é a da oitava do Egito (Êx 10.14,15).


Compare com a descrição de uma invasão de gafanhotos em J12. Há três palavras
hebraicas no Antigo Testamento que parecem ter o sentido de gafanhoto, prova­
velmente, representando diferentes espécies. No texto do Novo Testamento, só
essa palavra é empregada. Compare com Mt 3.4; Mc 1.6.

Escorpiões. Vide Ez 2.6; Lc 10.19; 11.12. Com formato semelhante ao da la­


gosta, vive em lugares úmidos, sob pedras, em fendas de paredes e porões. O
ferrão fica na ponta da cauda. A ferroada do escorpião sírio não é fatal, embora
seja muito dolorosa. O mesmo é verdade para o escorpião da índia Ocidental.
Thomson comenta que se d i z que os escorpiões do norte da África são maiores e
que, com frequência, seu veneno mata. Alude-se ao fato de o deserto do Sinai ser
423
A pocalipse —Cap. 9

especialmente habitado por escorpiões na época do êxodo (Dt 8.15), e até hoje eles
são comuns no mesmo distrito. Uma parte das montanhas limitando a Palestina
ao sul recebeu, por causa deles, o nome Akrabbim , sendo ‘aqrãbh (nnj?») a palavra
hebraica para escorpião.

4. Verdura. Vide nota sobre 6.8.

Homens que(ανθρώπους oiuveç). O duplo relativo denota a classe. Na tb ,

àqueles homens que não têm etc.

5. Os atormentassem (βασανισθώσιν). Na k j v , eles fo sse m atorm entados. Vide nota


sobre tormentos, Mt 4.24.

Fere (παίση). Dr. Thomson diz que o escorpião não pode ferir usando as late­
rais. Todos os relatos concordam quanto à terrível dor da ferroada.

6. Os homens. Esta é melhor a leitura, os homens; aqueles atormentados.

Desejarão (έπιθυμήσουσιν). Έπί tem a força de veementemente, ardentemente.

Fugirá (φεύξίται). Leia φεύγει, fo g e . Esquilo diz: “Os mortais não odeiam com
justiça a morte, uma vez que ela é a maior libertação de suas muitas desgraças”93.
Heródoto relata o tratamento de Xerxes por Artabano, quando aquele chorou ao
ver seu vasto armamento.

Não há nenhumhomem, quer esteja aqui entre essamultidão quer esteja emoutro
lugar, quer esteja tão feliz a ponto de não ter desejado —não direi uma vez, mas
muitas vezes - estar morto, emvez de vivo. As calamidades caem sobre nós, as
doenças nos atormentamemolestam, efazemavida, curta como é, parecer longa.
Assim, a morte, através da desventura de nossa vida, é o refúgio mais doce de
nossa raça94.

7. Aspecto (ομοιώματα). Literalmente, semelhança.

Cavalos. Compare com J1 2.4. A semelhança de um gafanhoto com um cavalo,


sobretudo com um cavalo aparelhado com armadura, é tão impressionante, que,
em alemão, o inseto é chamado heupferd, cavalo defen o , e em italiano, de cavaletta,
cavalinho.

93. Ésquilo, Fragmento.


94. Heródoto, vii, 46.

424
A pocalipse - Cap. 9

Coroas. Não coroas de verdade, mas como coroas. Milligan comenta que ne­
nhum brilho amarelo perto da cabeça do inseto é fundamento suficiente para essa
imagem.

Como rosto de homem. O r o s to d o g a fa n h o to te m u m a sem e lh a n ç a d is ta n te


co m o se m b la n te h u m a n o . H om ens (ανθρώ πω ν; cp. t b ) n ã o é p a ra s e r to m a d o
co m o d istin ç ã o d e sexo, m as co m o s e n tid o g en érica ro s to humano.

8. Cabelos de mulher. A antena do gafanhoto. Diz-se que é um provérbio árabe


em que a antena do gafanhoto é comparada com cabelos de moças.

Dentes - de leão. Compare com J1 1.6.

9. Couraças. O peito do gafanhoto lembra as placas da armadura do cavalo.

Ruído das suas asas. Olivier, escritor francês, diz:

E difícil expressar oefeitoproduzidoemnós pelavisãodetoda aatmosferatomadade


todos os lados e emgrande altura por uma quantidade infindável desses insetos, cujo
voo eralento e uniforme ecujo barulho lembrava o dechuva.

Para uma descrição vivida da quantidade deles e da destruição causada por


eles, vide Thomson95.

Carros, quando muitos cavalos. Ou seja, de m uitos carros de cavalos. A arc ,


ao inserir uma vírgula, aparentemente, toma as duas orações como paralelas: o
ru ído de carros, (o som de) m uitos cavalos.

10. Cauda semelhante à dos escorpiões. A comparação com o inseto como ele
existe na natureza falha aqui, embora o B ible D iction a ry, de Smith, forneça a ima­
gem de uma espécie de gafanhoto, o A c rid iu m L in eo la , uma espécie comumente
vendida para alimentação nos mercados de Bagdá, e essa espécie tem um ferrão
na cauda.

Aguilhão (κέντρα). Originalmente, qualquer p o n ta afiada. D m ferrã o . Vide nota


sobre aguilhões, A t 26.14. Platão usa a palavra para referir-se à p u a de um piãcr16.
Heródoto, para um instrum ento de tortura. Demócedes, o médico de Crotona, ten­
do negado seu conhecimento de medicina a Dario, este ordenou a seus criados:

95. Thomson, T h e h a n d a n d the Book. Central PalestineandPhoenicia, p. 295-302.


96. Platão, Diálogos III: República, iv, 436, p. 120.
425
A pocalipse - Cap. 9

“Tragam o açoite e os aguilhões de f e r r o (κέντρα)”97. Sófocles, para os colchetes de


p o n ta recurva com que Édipo arrancou seus olhos.

Ai, ai, e ai novamente!


Como me atravessa apulsação queestes g a n ch os (κέντρων) têmcausado!98

Também para referir-se ao esporão do galo, espinho do ouriço e fe r r ã o d e insetos.


Em lugar da tradução da arc, aguilhão na cauda, leia, como na rv : e aguilhão; e
em suas caudas está seu p o d e r p a ra f e r ir . Na ara , e fe rrã o ; na cauda tin h am p o d e r p a ra
causar dano.

11 . Tinham s o b re s i re i (έχουσιν 4φ’ αυτών βασιλέα). Traduza, como na tb : eles têm


sobre si como rei. Compare com Pv 30.27. Por isso, distintos dos gafanhotos naturais.

Em hebreu (Έβραϊστί). Usado só por João. Compare com Jo 5.2; 19.13,17,20;


A p 16.16.

Abadom. Quer dizer destruição. Compare com Jó 26.6; 28.22; Pv 15.11. Aqui o
como fica evidente a partir do equivalente grego Άπολλύων, A poliom ,
D estru id o r,
D estru idor. A perdição é personificada. Está de acordo com o estilo de João de
apresentar a palavra hebraica com a grega equivalente. Compare com Jo 1.38,42;
4.25; 9.7; 11.16 etc.

12. Um ai (ή ούα'ι ή μία). Literalmente, ο a i um.

13. Uma voz (φωνήν μίαν). Literalmente, um a (numeral).

Altar. Vide nota sobre 8.3.

14. Junto ao grande rio (étrt). Tradução mais correta que a da kjv, no. Na bj e
na ecp, à beira do.
teb , sobre-,

Eufrates. O Eufrates era conhecido como o g ra n d e rio, o rio, a inundação. Ele


nasce nas montanhas da Armênia, atravessa os montes Tauro e corre para sul e
sudeste até se juntar ao Tigre na baixa Babilônia. Sua extensão total é de 2 .6 0 0
a 2 .9 0 0 quilômetros e é navegável para pequenas embarcações por 1.900 quilô­
metros de sua foz. Era a fronteira de Israel a nordeste (Gn 15.18; D t 1.7; Js 1.4;

97. Demócedes, iii, 30.


98. Sófocles, É d ip o R ei, 1318.

426
A pocalipse - Cap. 9
compare com 2Sm 8.3-8; lRs 4.21). Assim, formava a defesa natural do povo es­
colhido contra os exércitos assírios. O derretimento da neve da montanha provo­
cava uma inundação anual, começando em março e aumentando até maio. Essas
inundações tornaram-se um emblema do julgamento infligido por Deus a Israel
por meio da Babilônia e da Assíria. O ribeiro de Siloé, que cortava Sião e Moriá,
era um tipo do templo e de seu poderoso e gracioso Senhor; e a recusa de obe­
diência a Deus pelo povo escolhido é representada como sua rejeição das águas
do Siloé, que flui suavemente, e daí sua punição por meio da vinda das águas do
poderoso e grande rio (Is 8.5-8; cp. Jr 17.13). Para os profetas, o Eufrates era
símbolo de tudo que era desastroso nos julgamentos divinos.

15. Para a hora, e dia, e mês, e ano. Essa tradução está incorreta, uma vez que
ela transmite a ideia de que os quatro períodos mencionados têm de ser com­
binados como representando a extensão da preparação ou da continuidade da
praga. Mas deve-se observar que nem o artigo nem a preposição são repetidos
antes de d ia e mês e ano. O sentido é de que os anjos estão preparados para a hora
determinada por Deus, e que essa hora cairá em seu apontado dia, e mês, e ano.

16. Dos cavaleiros (του ιππικού). Quanto ao número, no singular, como em


português o cavalo ou a cavalaria.

Duzentos milhões (δύο μυριάδας μυριάδων). Literalmente, d o is d e z m il d e d e z


mil. V ide nota sobre 5.11. Na rv, du as vezes d e z m il vezes d e z m il, na ara: vin te m il
vezes d e z milhares. Compare com SI 68.17; Dn 7.10; Hb 12.22; Jd 14.

17. Assim (ούτως). Segundo essa maneira.

Nesta visão (èv τή òpáoei). Ou “em m inha visão”. Vide nota sobre At 2.17. A
referência à visão pode ser inserida por causa do o u v i do versículo 16.

De fogo (πύρινους). Na n v i , “como o fogo”. Fogo vermelho.

D e jacinto (ύακινθίνους). O termo υάκινθος, ja c in to , é o nome de uma flor e


também de uma pedra preciosa. O substantivo ocorre somente em Ap 21.20, e
o adjetivo, só aqui. De acordo com a mitologia clássica, a flor do jacinto brota
do sangue de Jacinto, um belo jovem espartano, morto acidentalmente durante
um jogo de malhas. Alguns achavam que as letras A I, A I, a exclamação de “ai”,
podiam ser traçadas nas pétalas do jacinto, enquanto outros descobriram a
letra Y, a letra inicial de Υάκινθος. A história da morte de Jacinto é contada
por Ovídio.
427
A pocalipse - C ap. 9

[...]] Olhe, osangue


Que, sobreochãoderramado, manchouogramado,
Não é mais sangue. Mais brilhante que atintura tíria,
Semelhante àformadelírio umaflor aparece,
Púrpura emcor como aqueleébrancoprateado.
Nemainda tal memorial satisfaz
Febo Apoio, por cuja palavra ela se ergue.
Sobre suafolhagemeleescreve seus próprios lamentos,
E sobre aflor parasemprepermanece gravado
a i, a i" .

Quanto à pedra, ela é identifica por alguns com a safira. Quanto à cor, o jacinto
dos gregos parece compreender a íris, o gladíolo e a espora. Daí os diferentes
relatos de sua cor nos escritos clássicos, variando do vermelho ao negro. Aqui
parece tratar-se de um sombrio azul escuro.

De enxofre (θειώδεις). Talvez lu z am arela, como a cor que podería ser produ­
zida pela fumaça do enxofre.

Dos cavalos. Na Bíblia, o cavalo é sempre referido em conexão com a guer­


ra, exceto em Is 28.28, onde é mencionado quando usado na moagem do trigo,
sendo os cavalos soltos sobre os grãos como na trig lia italiana. A descrição mag­
nífica em Jó 39.19-25 aplica-se ao cavalo de guerra. Ele é distinguido não tanto
por sua velocidade e utilidade como por sua força ( vid e SI 33.17; 147.10), e a
palavra a b b ir,fo rte, é usada como equivalente para um cavalo (Jr 8.16; 47.3). Os
hebreus, como raça pastoral, não precisavam de cavalo. E durante muito tempo
após seu estabelecimento em Canaã, eles prescindiram do cavalo, em parte, por
causa da natureza montanhosa do país, o que permitia o uso de carros só em
determinados lugares (Jd 1.19) e, em parte, por causa a proibição de Dt 17.16.
Em conformidade com essa proibição, eles cortaram os tendões dos cavalos dos
cananeus (Js 11.6,9). O grande suprimento de cavalos foi efetuado por Salomão
por intermédio de sua ligação com o Egito. Vide lRs 4.26.

Saía fogo, e fumaça. Compare com Virgílio.

Então, seosomdearmas ouvir ao longe


Não podepermanecer quieto, mas aguilhoa seus ouvidos
Treme emtodos os membros, ebufando rola
O fogo reunido debaixo de suas narinas abertas100.

99. Ovídio, M etam orfoses, x, I75ss.


100. Virgílio, Geórgicas, iii, 83-85.
428
A pocalipse - Cap. 9
Também com Jó 39.20: “Terrível éo fogoso respirar das suas ventas”.

18. Pragas (πληγών). Vide nota sobre Mc 3.10; Lc 10.30.

19. O poder dos cavalos (εξουσία των ίππων). Conforme melhores textos; con­
tra a leitura έξουσίαι αυτών, o poder deles.

Semelhante a serpentes. Segundo Milligan: “Longo, liso, sutil, prendendo


sua vítima em um abraço de que ela não pode escapar”. Como um das inumerá­
veis fantasias da exposição apocalíptica, pode-se citar a de Elliott, Horae Apo-
calypticae, que encontra uma referência para a cauda dos cavalos nos símbolos de
autoridade dos paxás turcos.

20. Não se arrependeram das obras (ούτε μετενόησαν εκ τών έργων). Lite­
ralmente, "de dentro das obras”. A preposição έκ, de dentro de, com arrepender-se
denota mudança moral envolvendo abandono de obras malignas. Vide nota sobre
Mt 3.2; 21.29.

Obras de suas mãos. Não o curso de vida deles, mas os ídolos que suas mãos
fizeram. Compare com Dt 4.28; SI 134.15; At 7.4.

Demônios (δαιμόνια). Vide nota sobre Mc 1.34. Compare com lCo 10.2;
lTm4.1.

Ver - ouvir - andar. Compare com Dn 5.23.

21. Feitiçarias (φαρμακειών). Somente aqui, 18.23 e G1 5.20, onde φαρμακεία,


feitiçarias ( k jv , bruxaria-, t e b , magia), se enumera entre as “obras da carne”. Usa­
da na l x x para os magos egípcios (Ex 7.22); para as feitiçarias babilônicas (Is
47.9,12). De φάρμακον, droga, daí veneno, encantamento. Platão diz:

Há dois tipos de venenos usados entre os homens que não podem ser claramente
distinguidos. Há umtipo de veneno que machuca o corpo pelo uso deoutros corpos
de acordo comalei natural [../] mas há outro tipo que machucapor meio de feitiça­
rias e encantamentos e laços mágicos, como eles são chamados, e induz uma classe
de homens a machucar outra o mais que puderem, e persuade outros para que eles,
acima de todas as pessoas, sejampropensos aser machucados pelos poderes dos má­
gicos. Bem, não é fácil conhecer a natureza de todas essas coisas; tampouco, se um
homemque conhece pode rapidamente persuadir outros de sua crença. E quando os
homens se perturbamquando veemimagens feitas de cera fixadas emportas ou em

4 29
A pocalipse - C ap . 10

uma encruzilhada de três caminhos, ou no sepulcro dos pais, não adianta tentar os
persuadir adesprezar todas essas coisas, porque não têmdeterminado conhecimen­
to delas. Mas devemos ter uma lei emduas partes concernente ao envenenamento
para quaisquer dos dois modos que sefaça atentativa. Devemos tambémimplorar, e
exortar, e aconselhar os homens anão recorrer aessas práticas, por meio das quais
eles amedrontam as multidões tirando-lhes a sanidade, como se fossem crianças,
forçando o legislador eojuiz acurar seus medos despertados pelos feiticeiros elhes
dizer, primeiro, que quemtenta envenenar ou enfeitiçar outros não sabe o que está
fazendo, quer emrelação ao corpo (a menos que tenha conhecimento de medicina)
quer emrelação a seus encantamentos, amenos que aconteça de ser umprofeta ou
vaticinador101.

C apítulo 10

1. Uma nuvem. Há sete ocorrências da expressão em Apocalipse, e, em todas


elas, em conexão com o Filho do Homem.

Arco celeste. Vide nota sobre 4.3.

Colunas de fogo. Compare com 1.15.

2. Na mão (èv). O liv ro do capítulo 5 estava sobre a destra (èní, vid e 5.l), sendo
também grande demais para caber dentro dela. O livro estava sobre a destra, o
livrinho está na esquerda. V ide nota sobre o versículo 5.

3. Clamou (Ικραξβζ). Vide nota sobre Mc 5.5.

Como quando. O quando da arc é desnecessário.

Brama (μυκάται). Somente aqui no texto do Novo Testamento. Pedro usa


ωρύομαι para a voz do leão. V ide nota sobre 1Pe 5.8. O verbo aqui, originalmen­
te, é aplicado ao mugido de gado, expressando o som m u u -ka-om ai. Aristófanes
e Teócrito usam-na para o rugido do leão, e o primeiro também para trovão.
Homero usa para o toque do escudo e o silvo da carne no espeto.

Sete trovões. Os judeus tinham o costume de falar de trovão como “as


sete vozes”. Compare com as sete ocorrências de “a voz do S enhor ” em SI 29.
Como é usual, a interpretação fica à solta quanto aos sete trovões. Apenas para
exemplenficar, algumas ilustrações podem ser citadas: Vitringa, as sete cruza-

101. Platão, L eis, xi, 933.

430
A pocalipse - C ap. 11

das; Daubuz, os sete reinos que receberam a Reforma; Elliott, o boi fulminado
contra Lutero da cidade das sete colinas.

4. Escrevê-las. De acordo com a injunção em 1.11.

5. A mão. Acrescente την δεξιάν, a direita, e vide nota sobre o versículo 2. Na


teb , a mão direita. Acerca de levantar a mão em juramento, vide Gn 14.22; Êx 6.8;
Dt 32.40.

6. Jurou por (ώμοσερ év). Literalmente, “jurou em", uma expressão idiomática
hebraica. Na n tlh ,fez umjuramento em nome de Deus.

Não havería mais demora (χρόνος ούκ εσται eu). Na n v i , corretamente,


haverá etc. O sentido não é, como popularmente se entende, que o tempo deve
cessar de existir, mas que não haverá mais demora (como na n v i ) antes do cum­
primento do propósito divino referente à igreja na terra. Possivelmente, com
alusão ao clamor até quando (6.10).

7. Quando tocar (μέλλη σαλπίζειν). Tradução inadequada. No n t ia , correta­


mente: estiver a ponto de tocar, na n v i , estiver para tocar.

O segrego (tò μυστήριον). Vide nota sobre Mt 13.11.

Anunciou (εύηγγελισεν). A palavra usada para anunciar as boas-novas da sal­


vação. Aqui para anunciar o segredo do reino.

8. Tomou a falar comigo. Traduzir, como a tb , “tornei a ouvi-la falando”.

9. Fui (άπήλθον). A preposição άττό tem a força de parafora, longe. Fui para longe
do lugar onde estava. Na te b , adiantei-me.

Come-o. Compare com Ez 3.1-3; Jr 15.16.

C apítulo 11

1. Uma vara. Vide nota sobre 2.27.

E chegou o anjo e disse. Omita. A inserção dessas palavras fornece um su­


jeito para a concordância do particípio λέγων, que fica irregular na construção.
Literalmente, a leitura do texto correto: “foi-me dada uma cana, dizendo’. Con-
431
A pocalipse —C ap. 11

sequentemente, Wordsworth refere-se à fala à cana como um meio de fala inspi­


rado. Na rv, melhor, e alguém disse.

O templo (τον ναόν). Vide nota sobre Mt 4.5.

O altar. De incenso, porque só este ficava no lugar sagrado.

Os que nele adoram. Observe a expressão peculiar, medir os adoradores com


uma cana.

2. O átrio que está fora do templo. Não só o pátio exterior, ou corte dos gen­
tios, mas incluindo tudo que não está no interior do ναός, o Lugar Santo e Santo
dos Santos.

Não o meças (’έκβαλε ’έξω). Literalmente, lancefora, ou seja, da medição.

Às nações (τοΐς ’έθνεσιν). Vide nota sobre Lc 2.32. Na nvi, gentios.

Quarenta e dois meses. Período de tempo que aparece de três formas em Apo­
calipse: quarenta e dois meses { 13.5); mil duzentos e sessenta dias (v. 3; 12.6); um tempo, e
tempos, e metade de um tempo ou três anos e meio (12.14; cp. Dn 7.25; 12.7).

3. Poder. Omita.

Duas testemunhas. O leitor lucrará, se, a respeito desse ponto, consultar as


preleções do Professor Milligan sobre o Apocalipse de João. Ele sustenta que a
concepção do Apocalipse é poderosamente moldada pelas recordações de João a
respeito da vida de Jesus; que há um paralelismo próximo entre o Apocalipse e
a delineação da vida de Cristo contida no quarto Evangelho; e que o Apocalip­
se, quanto às concepções mais profundas que o permeiam, é uma repetição do
Evangelho102.

Profetizarão (προφητεύσουσιν). Vide nota sobre profeta, Lc 7.26. Comumente


explicada por pregação de arrependimento, embora alguns a entendam no senti­
do posterior, ou seja, de prognosticar eventos futuros.

Vestidas de pano de saco. A vestimenta dos sacerdotes para arrependimen­


to. Compare com Is 22.12; Jr 4.8; Jn 3.5; Mt 3.4. Para saco depano, vide nota sobre
Lc 10.13.

102. Vide Milligan, The R evelation o f St. John, p. 59-69.


432
A pocalipse - C ap. 11

4. Duas oliveiras. Vide Zc 4.

Castiçais. Vide Zc 4, e nota sobre M t 5.15.

Do Deus. Leia κυρίου, do Senhor. Como na ara. Compare com Zc 4.14.

5. Fogo sairá. Compare com 2Rs l.lO; Jr 5.14.

6. Fechar o céu. Como Elias em lRs 17. l; Lc 4.25; Tg 5.17.

Que não chova (ΐνα μή βρέχη ύετός). Literalmente, p a ra que a chuva não possa
molhar.

Para convertê-las em sangue. Compare com Ex 7.19.

Para ferir (πατάξαι). Usado por João só em Apocalipse, aqui e em 19.15. Com­
pare com Mt 26.31; Mc 14.27; Lc 22.49-50; At 12.7,23.

Com toda sorte de pragas (πάση πληγή). Número singular. Na rv, correta­
mente, com toda pra g a . Vide nota sobre Mt 3.10. Não apenas com as pragas que
Moisés feriu o Egito.

7. A besta (θηρίον). Besta selvagem. Vide nota sobre 4.6. Uma palavra diferente
daquela incorretamente traduzida por anim al, 4.6,7; 5.6 etc. Compare com 13.1;
17.8 e vid e Dn 7.

Abismo (άβύσσου). Vide nota sobre 9.1.

8. Corpo m orto (πτώμα). Carcaça, cadáver, contra a leitura πτώματα, cadáveres


(cp. nvi, bj, ecp; teb, corpos). Vide nota sobre Mt 24.28; Mc 15.45.

Na praça (επ'ι τής πλατείας). Literalmente, “sobre a rua”. V ide nota sobre
Lc 14.21.

D a grande cidade. Jerusalém nunca é chamada por esse nome. Diferentes


expositores acham que a expressão se refere a Roma ou Babilônia. Milligan, a
Jerusalém.

Espiritualm ente (πρευματικώς). Típica ou alegoricamente. Compare com


lCo 10.3-4.
433
A pocalipse - Cap. 11
Seu Senhor. Conforme a leitura αύτών; contra a leitura ημών, nosso ( k j v , cp. t r ).

9. Verão (βλέψουσνν). Leia βλεπουσιν, contem plam (cp. a ra ), e v id e nota sobre


Jo 1.29.

Não permitirão (ούκ άφήσουσιν). Leiaάφvoι)σvv, não perm item . Como n a a ra .

Seja posto em sepulcros (τεθηναν ενς μνήματα). Leia μνήμα, sepultura , como
na TB. Compare com Gn 23.4; Is 14.19-20.

10. Se regozijarão (χαροΰσνν). Leia χανρουσνν, tempo presente, se regozijam . Na


ara, se alegram .

Se alegrarão (εύφρανθήσονταν). Leia ευφραίνονταν, tempo presente, se ale­


e para a palavra, vide nota sobre v iv ia regalada e esplendidam ente, Lc 16.19.
gram ;

Mandarão presentes. Como em um dia de festa. V ide Ne 8.10,12.

Atormentado (βασάνισαν). Vide nota sobre afligia, 2Pe 2.8, e sobre Mt 4.23-24.

11. Espírito de vida (πνεύμα ζώης). Na n v i , sopro. V ide nota sobre Jo 3.8.

Entrou neles. Compare com Ez 37.1-10.

Viram (θεωρουντας). Vide nota sobre Jo 1.18.

13. Terremoto. Vide nota sobre 6.12.

Homens (ονόματα ανθρώπων). Literalmente, nomes de homens. Vide nota sobre 3.4.

Deram glória ao Deus do céu. A frase não representa conversão, arrepen­


dimento ou ação de graças, mas reconhecimento, seu sentido usual na Escritura.
Compare com Js 7.19 ( l x x ). Jo 9.24; At 12.23; Rm 4.20.

15. Os reinos - vieram a ser (εγένοντο ai βασιλείαν). Leia εγένετο ή βασνλενα,


o reino —veio a ser. Na t e b , o reino é agora.

De nosso Senhor. Compare com SI 2.2-9.

17. Senhor, Deus. Vide nota sobre 4.8.


434
A pocalipse - C ap. 11

E que hás de vir. Omita.

1 8 . Iraram -se (όργίσθησαν). V ide nota sobre ira , Jo 3.36. Compare com
SI 2.1.

O tempo (ο καιρός). Vide nota sobre Mt 12.1.

Galardão (μισθόν). Vide nota sobre 2Pe 2.13.

D estruíres (διαφθ€ΐραι). Também corromper.

Os que destroem (τους διαφ&ίροντας). Ou, os destruidores.

19. No céu. Junte co m tem plo de D eus, c o m o na n v i : f o i aberto o san tu ário d e D eus
lugar de co m abriu-se, co m o na arc.
nos céus-, e m

O templo (ó ναός). O Santuário. Compare com o versículo 1, e vid e nota sobre


M t 4.5.

A arca do seu concerto (ή κιβωτός τής διαθήκης αυτού). Κιβωτός, arca, em


geral, tem o sentido de qu alqu er ca ix a de m adeira ou cofre. O termo só é usado
para a arca no tabernáculo aqui e em Hb 9.4. Em outras passagens, para a arca
de Noé. V ide Mt 24.38; Lc 17.27; Hb 11.7; lPe 3.20. Para concerto, v id e a nota
sobre Testam ento, M t 26.28. Essa é a última menção na Bíblia à arca da aliança.
A arca foi perdida quando o templo foi destruído pelos caldeus (2Rs 25.10) e,
no segundo templo, não estava mais lá. Tácito diz que Pompeu “pelo direito de
conquista entrou no templo. Daquele tempo em diante, tornou-se de conheci­
mento geral que o prédio ficou vazio, e o santuário, desocupado, não sendo en­
contrado em seu interior nenhuma representação de divindade”103. De acordo
com a tradição judaica, Jeremias pegou a arca e tudo que o Lugar Santíssimo
continha e escondeu todos os objetos sagrados, antes da destruição do templo,
em uma caverna no monte Sinai, de onde serão restaurados ao templo nos dias
do Messias.

Relâmpagos, e vozes. “As solenes salvas, por assim dizer, da artilharia do céu
com que cada série de visões é concluída”.

103. Tácito, H istó ria , v, 9.


435
A pocalipse - Cap. 12

C a pítu lo 12

1. Sinal (σημίΐον). Tradução melhor que a da kjv , m aravilha. V ide nota sobre
Mt 24.24.

Vestida (περίβφλημένη). Na rv, adornada. V ide nota sobre 3.5.

A lua debaixo dos pés. Vide Cânticos 6.10. O símbolo, em geral, é entendido
como representando a Igreja.

2. Com dores de parto (ώδίνουσα). Vide nota sobre dores, Mc 13.8, e ânsias, At 2.24.

Com ânsias (βασανιζόμενη). Literalmente, sendo atorm entada. Vide nota sobre
11.10 e referências. Para a imagem, compare com Is 6 6 . 7 , 8 ; Jo 16.21.

3. Dragão (δράκων). Satanás. Vide o versículo 9. A palavra só é encontrada em


Apocalipse. Na l x x , para a serpente na qual a vara de Moisés foi transformada.
Em Is 27.1; Ez 29.3; para o crocodilo ou leviatã de Jó 41.1. Em Jr 51.34, para um
dragão.

Vermelho (πυρρός). Vide nota sobre 6.4.

Diademas (διαδήματα). A coroa real, não a guirlanda (στέφανος). Vide nota so­
bre 2.10.

4. Das estrelas do céu. Alguns expositores encontram aqui uma alusão aos
anjos caídos (Jd 6).

Lançou-as sobre a terra. Compare com Dn 8.10.

Para que, dando ela à luz, lhe tragasse o filho (ίνα όταν τέκη τό τέκνον
αυτής καταφάγη). Na rv, mais literalmente, para que, quando ela desse à luz, ele
pudesse devorar seufilho. O Professor Milligan comenta:

Temos, nessas palavras, o dragão fazendo o que o faraó fez a Israel (Ex 1 .1 5 -2 2 ) e, vez
ap ó s vez, nos salmos e nos profetas, o faraó é mencionado como dra g ã o (SI 7 4 .1 3 , n v i ;
Is 27.1; 51.9; Ez 29.3). Também é interessante lembrar que a coroa do faraó era deco­
rada com umdragão (a víbora ou serpente do Egito) e que, da mesma maneira como a
águia era o emblema de Roma, também o dragão era o do Egito. Por isso, a relevância
da vara de Moisés ter se transformado em serpente.
436
A pocalipse - Cap. 12

5. Um filho, um varão (ulòv ãppeva). Literalmente. A leitura correta é ápoev,


o neutro, não concordando com o indivíduo do sexo masculino (fiiòv, filho), mas
com o neutro do gênero. O objetivo não é enfatizar o sexo, mas as qualidades pecu­
liares de masculinidade - poder e vigor. Compare com Jo-16.21; Jr 20.15.

Há de reger (ττοιμαίνειν). Literalmente, pastorear ou apascentar. Vide nota so­


bre Mt 2.6.

Vara de ferro. Compare com SI 2.9, e videnota sobre 2.27.

Foi arrebatado (ήρπάσθη). Vide nota sobre Mt 12.12. Compare com


At 23.10; Jd 23.

6. Por Deus (άττδ του Θεοΰ). Literalmente, de Deus, com a preposição marcando
afionte de que veio a preparação. Para um uso similar, vide Tg 1.13: “De Deus sou
tentado”.

7. Houve (eyévexo). Literalmente, levantou-se.

Batalha no céu. Compare com lRs 22; Jó 1; 2; Zc 3; Lc 10.18.

Miguel. Vide Dn 10.13,21; 12.1; e nota sobre Jd 9.

Batalhavam (επολέμησαν). A leitura correta é του πολέμησα l, batalhar. Como


na rv: “saindo para guerrear contra o dragão” (κατά του δράκοντος). A leitura cor­
reta é μετά, com.

8. Prevaleceram (ΐσχυσαν). Vide nota sobre Lc 14.30; 16.3; Tg 5.16.

9. O grande dragão (6 δράκων ò μέγας). Literalmente, o dragão, o grande (dragão).

A antiga serpente (ò δφις ò άρχαΐος). Literalmente, a serpente, a antiga


(serpente). Para essa construção habitual de João, vide nota sobre lJo 4.9. Para
αρχαίος, antigo, vide nota sobre lJo 2.7, e compare com: “ele foi homicida άπ’
αρχής, desde o princípio , Jo 8.44; sendo άρχή, princípio, etimologicamente rela­
cionado com αρχαίος, antigo.

O diabo. Vide nota sobre Mt 4.1.

Satanás. Vide nota sobre Lc 10.18.


437
A pocalipse - C ap . 12

Que engana (ò πλανών). Literalmente, aquele que engana. V ide nota sobre
lJo 1.8.

Mundo (οικουμένην). Vide nota sobre Lc 2.1. O mundo com todos seus habitantes.

Precipitado na (elç). Literalmente, p a ra dentro.

10. No céu, que dizia (év τφ οΰρανφ λέγουσαν). Conforme a leitura correta, que
junta no céu com gran de voz·, contra a leitura λέγουσαν έν τφ ούρανφ, d ize n d o no
céu (cp. k jv ).

Agora (άρτι). Vide nota sobre Jo 13.33.

Chegada está (έγένετο). Literalmente, aconteceu. Alford declara: “É impossí­


vel, em nossa língua, juntar a uma partícula de tempo presente, como άρτι, agora,
um verbo no tempo aoristo. Nesses casos, somos guiados para o tempo perfeito”.

A salvação, e a força, e o reino. Leitura correta, todos com o artigo. A frase:


agora chegada está a salvação etc., quer dizer que esses itens estão realizados e
estabelecidos. Alguns, de forma menos correta, traduzem: “agora a salvação, [[...]]
vieram a ser de nosso D eus”. Compare com Lc 3.6.

Poder (έξουσία). Vide nota sobre Mc 2.10. Na n v i , autoridade.

O acusador de nossos irmãos (ò κατήγορος των ά&λφών ημών). A forma


correta do grego para acusador é uma transcrição do hebraico rabínico, κατήγωρ.
Os rabinos tinham um termo correspondente, συνήγωρ, para Miguel, como o a d ­
vogado do povo de Deus. A expressão não é aplicada a Satanás em mais nenhuma
passagem do Novo Testamento.

É derribado (κατίβλήθη). O tempo aoristo. De uma vez por todas. Compare


com Jo 12.31; 16.8,11.

O qual [...] acusava (ό κατηγορών). Literalmente, aqtiele acusando. O artigo


com o particípio presente expressa o que é habitual.

11. Venceram (ένίκησαν). V ide nota sobre lJo 2.13.

Pelo sangue do Cordeiro (διά το αιμα του άρνίου). A preposição διά com ο
acusativo indicator causa de. Daí a ara traz, corretamente, p o r causa de. em virtude

438
A pocalipse —Cap. 13

do derramamento desse sangue. De forma semelhante na oração seguinte: “p o r


causa d a palavra do testemunho” (cp. ara ). Para cordeiro, vide nota sobre 5.6.

Testemunho (μαρτυρίας). V ide nota sobre Jo 1.7.

Não amaram a sua vida até à morte. Alford, corretamente, comenta que
“eles carregaram seu não a m o r p e lâ sua própria vida até à morte”.

12. Habitais (σκηνοΰντες). V ide nota sobre Jo 1.14. Compare com 7.15; 13.6; 21.3.

Dos que habitam (τοΐς κατοικοϋσιν). Omita. Leia, como na n v i: a i d a terra e


d o mar.

Ira (θυμόν). V ide nota sobre Jo 3.36.

Tempo (καιρόν). Vide nota sobre Mt 12.1; Mc 1.15; At 1.7.

14. Duas asas. O artigo definido a s devia ser acrescentado: “as duas asas”, como
na nvi e teb . Compare com Êx 19.4; D t 3 2 .1 1; SI 36.7.

[Da^ grande águia [(του à e io ü του μεγάλουj . A arc não traz o artigo. Ele não
aponta para a águia de 8.13, mas é genérico.

Um tempo, e tempos, e metade de um tempo. Três anos e meio. Vide nota


sobre 11.2.

15. Pela corrente a fizesse arrebatar (ταυτην ποταμοφόρητον τιοιήση). Lite­


ralmente, pudesse f a z ê - l a carregada p e la correnteza: um a nascente. A palavra ocorre
somente aqui no texto do Novo Testamento.

17. Jesus Cristo. Omita Cristo.

Os melhores textos acrescentam a esse capítulo as palavras iniciais do capítulo 13


(cp. arc ): “E eu pus-me sobre a areia do mar”. No entanto, alguns mudam έστάθην,
p u s-m e (de pé), para έστάθη, se p ô s (de pé), em referência ao dragão. A bj segue a pri­
meira forma: Coloquei-me depois, a teb , a segunda: Depois, postou-se {12.18).

C apítulo 13

1. Subir (άναβαΐνον). Na n v i , melhor, saía, dando, assim, a força do particípio.

439
A pocalipse - C ap . 13

Besta (θηρίον). Tradução apropriada. V ide comentários sobre ζώα, seres v iv e n -


tes, em 4.6.

Dez chifres. Compare com Dn 7.7.

Diademas (διαδήματα). Compare com 12.3. Vide nota sobre 2.10.

Um nome (όνομα). Leia ονόματα, nomes. Em cada cabeça um nome.

2. Leopardo (παρδαλά). Parece que os antigos não faziam distinção entre o leo­
pardo, a pantera e a onça. A palavra é usada para todos esses animais. L eo p a rd o é
leo-pardo, o leão-pardo, supostamente um cruzamento entre pantera e leoa. Com­
pare com Dn 7.6.

Urso. Compare com Dn 7.5.

Leão. Compare com Dn 7.4.

3. Vi (clôov). Omitido nos melhores textos.

Ferida (έσφαγμένην). Literalmente, m orta. V ide nota sobre 5.6. O termo g o lp e­


ada da ara parece questionável. Há oito ocorrências da palavra em Apocalipse, e,
sete destas deve ser traduzida por m orto ou abatido. O Professor Milligan obser­
va corretamente que a declaração é a contraparte daquela de 5.6, em que há um
Cordeiro, como havendo sido m orto. Em ambos os casos houve morte de fato e, nos
dois, ressurreição. Um é a contraparte zombeteira do outro.

Chaga mortal (πληγή τοΰ θανάτου). Literalmente, f e r id a de morte.

Após a besta (όπίσω τοΰ θηρίου). Uma construção criativa para: m aravilh ou -
se na e seguiu após a (besta).

4. Que deu (ός ’έ δωκεν). A le itu r a correta é óu, “porqu e deu”. Como n a tb.

Quem é semelhante à besta? Uma paródia sobre uma atribuição similar


dada a Deus. Vide nota sobre Is 40.18,25; 46.5; SI 113.5; Mq 7.18; Jr 49.19. Com­
pare com 18.18.

5. Para continuar por quarenta e dois meses (ποίησαι μήνας τεσσφάκοντα


δύο). Literalmente, p a ra f a z e r quarenta e dois meses. Similarmente, At 15.33,
440
A pocalipse —C ap. 13

ποιήσαντες χρόνον, detendo-se a li algu m temper, literalmente, f a z e n d o um tempo.


Vide nota sobre lá passarem os um ano, T g 4.13. Contudo, os melhores expositores
traduzem ποιήσαι de forma absoluta: trabalhar, e o acusativo que se segue como
o acusativo de duração: “durante quarenta e dois meses”. Na r v , em nota de mar­
gem, p a ra f a z e r suas obras durante etc. V ide Dn 11.28.

6. Em blasfêmias (eΙς βλασφημίας). Contra a leitura βλασφημίαν, blasfim ia (cp.


Na r v , comunicando a força de eíç, mais corretamente, “p a ra £ou com vistas
k j v ).

cT\ blasfêm ias’.

E dos que habitam no céu (καί τούς èv τώ ούρανω σκηνοΰντας). Os melhores


textos omitem καί, e, colocando as palavras seguintes em aposição com όνομα e
σκηνήν, nome e tabernáculo. Literalmente, blasfem ar o nome e o tabernáculo que ha­
bita m no céu. Segundo Alford: “O sentido é aumentar a enormidade da blasfêmia
ao salientar a natureza sublime do santo nome de Deus e de seu palácio de mo­
radia”. O sentido literal da palavra habitam é tabernáculo. Vide nota sobre 12.12.

7. Aos santos (των αγίων). Vide nota sobre At 26.10.

Toda tribo (πάσαν φυλήν). Tradução mais literal e correta; ao passo que a k j v
traz: todas as fa m ília s. Vide nota sobre 1.7; 5.9. Depois de tribo, insira καί λαόν, e
povo. Como na teb e n v i . Vide nota sobre lPe 2.9.

Nação (’έθνος). Vide nota sobre lPe 2.9.

8. Desde a fundação do mundo. Na construção, essas palavras podem ser re­


lacionadas com m orto ou com escrito. Em favor da última forma, temos 18.8; e,
da primeira, lPe 1.19-20. Alford, de forma pertinente, argumenta a posição das
palavras em favor da conexão com m orto e diz que se não fosse pela aparente
dificuldade desse sentido assim transmitido, ninguém pensaria em voltar tanto
a ponto de pôr f o i escrito como conexão. Traduza, como a a r c : do Cordeiro que f o i
m orto desde a fu n d a ç ã o do mundo. O sentido literal de καταβολή, fu n dação, é lançar
ou estabelecer, de καταβάλλω, derrubar, daí o estabelecimento d e um a fu n dação.

IO. Se alguém leva em cativeiro, em cativeiro irá (eí τις αιχμαλωσίαν συνάγα,
εις αιχμαλωσίαν ύπάγέΐ). Literalmente, se alguém recolhe em cativeiro (ou seja, reúne
cativos), em cativeiro irá. Os melhores textos inserem elç, para dentro, antes da primeira
ocorrência de cativeiro, e omitem recolhe, ficando assim: se algum homem êpara o cativei­
ro, para dentro do cativeiro ele vai. Como na tb . Vide nota sobre dispersos, Jo 7.35 . Compa­
re com Jr 15.2; 4 3 .1 . Os perseguidores da igreja sofrerão o que infligirem aos santos.
1

441
A pocalipse - C ap . 13

Espada (μαχαίρη). V ide nota sobre 6.4.

Aqui. No pensamento de que Deus julga na terra.

14. Uma imagem à besta (εικόνα τφ θηριω). Είκών significa um a im agem ou se­
melhança. Assim, Mt 22.20, a respeito da semelhança de César na moeda. Rm 1.23,
uma im agem de homem corruptível, e de aves, e de quadrúpedes. Cl 3.10, “a im a ­
g e m daquele que o criou”; ou seja, a semelhança moral de homens renovados com
Deus. Cristo é chamado de a im agem de D eus (Cl 1.15; 2Co 4.4). Além da ideia de
semelhança, a palavra envolve a ideia de representação, embora não de represen­
tação perfeita. Assim, é dito que o homem é a im agem de Deus (lCo 11.7). Nisso,
lembra χαρακτήρ, im agem , em Hb 1.3. A imagem de César na moeda, o reflexo do
sol na água104, e a estátua ou imagem da besta nessa passagem são είκών.
A palavra também envolve a ideia de m anifestação. Assim, Cl 1.15, em que, na
im agem , há um contraste sugerido com o Deus invisível. Por isso, Filo aplicou o
termo para o Logos. Vide nota sobre Jo 1.1.
A palavra desempenha um papel importante na controvérsia ariana na qual se en­
fatizou de forma contundente a distinção entre είκών, imagem, como assumindo um
protótipo, e, por conseguinte, como representando de forma apropriada a relação do
Filho com o Pai, e ομοίωμα, semelhança, sugerindo mera parecença, e não incorporando
a veracidade essencial do protótipo. A imagem envolve a semelhança, mas a semelhança
não envolve a imagem. A última pode indicar só uma parecença acidental, enquanto a
primeira é uma representação verdadeira. Por conseguinte, Cristo é ο είκών de Deus.
Há dez ocorrências de im agem da besta no Apocalipse, quatro delas nesse capí­
tulo e em 14.9,1; 15.2; 16.2; 19.20; 20.4.

15. Falasse. Alguns supõem que isso se refere aos truques dos sacerdotes pagãos
em fazer retratos e estátuas que parecem falar.

16. Um sinal (χάραγμα). A palavra ocorre frequentemente em Apocalipse e ape­


nas uma vez em outra passagem (At 17.29), sobre a qual vid e nota. Os comen­
taristas encontram ilustrações na marca feita em escravos por seus donos ou
em soldados por seus monarcas, e nos escravos ligados a determinados tem­
plos. Heródoto descreve um tempo de Hércules, na desembocadura do Nilo de
Canopo, e comenta: “Se um escravo fugisse de seu dono e se refugiasse nesse
santuário, entregava-se ao deus e recebia determinadas marcas sagradas em sua
pessoa, e, independentemente de quem fosse seu dono, não podia mais pôr as
mãos nele”105. No tratado “concernente à deusa síria”, falsamente atribuído a Lu-

104. Platão, Fédon, 99.


105. Heródoto, ii, 113.

442
A pocalipse - C ap. 13

ciano, afirma-se o seguinte sobre os escravos do templo: “todos eram marcados,


alguns no pulso e alguns no pescoço”. Em G1 6.17, Paulo aplica a palavra para
esses sinais, στίγματα, às marcas do serviço de Cristo que ele carrega em seu
corpo. Em sMc 2.29, lemos que Ptolemeu Filopator exigiu que todos os judeus
da Alexandria fossem registrados entre o povo comum; e que os que eram assim
registrados tinham de ser m arcados (χαράσσεσθαι) em seu corpo com a folha de
hera, símbolo de Dionísio (Baco). Em Lv 19.28, os israelitas são proibidos de
cortar sua carne pelos mortos e de fazer m arcas (γράμματα στικτά) neles mesmos.

17. O número. O método de numeração mística foi obtido também entre os


gregos pagãos, os gnósticos, os pais cristãos e os judeus cabalistas. Júpiter era in­
vocado sob o número 717 contido nas letras Ή ’ΑΡΧΗ, o p rin cíp io . Os gnósticos
adicionaram a suas gemas e amuletos a palavra mística άβρασαξ ou άβραξας, sob a
ideia de alguma virtude ligada a seu número, 365, como a dos dias do ciclo solar.
Barnabé e Clemente de Alexandria falam da virtude do número 318, como de
IHT, a abreviação comum para Jesus crucificado. Nos versículos pseudossibili-
nos, escritos por cristãos, provavelmente perto do fim do século II, encontramos
enigmas em rima dando o número e exigindo o nome. A tradução de um deles
sobre a palavra Jesus é como segue:

Ele viráàterravestidodecarnecomoos homens mortais. Seunomecontémtrêscon­


soantes e duas vogais; duas das primeiras são proferidasjuntas. E declaro o número
completo. Pois o nome revelará a homens incrédulos oito unidades, oito dezenas e
oito centenas.

18. Aqui há sabedoria. Dirigindo a atenção para o desafio que se segue.

Calcule (ψηφισάτω). V ide nota sobre Lc 14.28.

Número de homem. Ele é contado como os homens, em geral, contam. Com­


pare com 2 1 . 1 7 , e um estilete comum, Is 8 .1 ( b j ). Alguns explicam como um núme­
ro simbólico para denotar uma pessoa.

Seiscentos e sessenta e seis (χ ξ ς'). Cada letra representa um componen­


te do número completo: χ = 600; ξ = 60; ς ' = 6. Nos manuscritos mais anti­
gos, a escrita aparece por extenso: εξακόσιοι εξήκοντα εξ. O método de leitura
geralmente adotado é o conhecido como g em a tria , dos rabinos, ou, em grego,
ίσοψηφία, igu aldade numérica, que designa a cada letra de um nome seu valor nu­
mérico usual e dá a soma desses números como o equivalente do nome. Assim, na
Epístola de Barnabé, somos informados de que o nome Ίησοΰς, Jesus, é expresso
443
A pocalipse - C ap . 14

pelo número 888:1 = 10; η = 8; σ = 200; ο = 70; υ = 400; ο = 200. A maioria dos
comentaristas usa o alfabeto grego no cálculo. Contudo, outros empregam o he­
braico. Ao passo que uma terceira categoria usa os algarismos romanos.
As interpretações dessa forma numérica formam uma selva de que é aparente­
mente impossível escapar. Reuss comenta:

Já setentou sujeitar essenúmerofamoso aquase todosos nomes históricos dos dezoito


séculos passados: Tito, Vespasiano e Simão Gioras; Juliano, o apóstata, e Genserico;
MaoméeMartinhoLutero; Benedito IX eLuis XV; NapoleãoI eoduquedeReichstadt;
enãoseria difícil, combase nos mesmos princípios, lê-lo emoutros nomes.

Alguns dos nomes favoritos são: ΛατΛνος, L atin o s, que descreve o caráter
comum dos governantes do antigo Império Romano pagão; Nero César; Diocle-
ciano; χς', o nome de Cristo abreviado, e ξ, o emblema da serpente, de modo que
o sentido modificado seja o m essias de Satanás.

Capítulo 14

1. Estava (έστηκός). O p a rtic íp io , estando, co m o n a rv .

O Cordeiro. Leitura correta, “o Cordeiro”; contra a kjv, “um cordeiro”. Vide 5.6.

O nome dele e o de seu Pai. Acrescente αυτού καί το δνομα, seu e o nome, e
traduza como a t e b : o nome dele e o nome de seu P ai.
A adoração do Cordeiro é o assunto da peça do grande altar na Igreja de São
Bavo, em Ghent, feita por John e Hubert Van Eyck. A cena passa-se em uma
paisagem. O plano de fundo é formado por uma cidade flamenga, provavelmente
com a intenção de representar Jerusalém, e por igrejas e monastérios no estilo
holandês antigo. O plano do meio, é ocupado por árvores, campinas e encostas
verdejantes. Exatamente no centro da pintura, há um altar quadrado forrado com
tecido adamascado vermelho e coberto com um pano branco. Ali está um cordei­
ro, de cujo peito brota um rio de sangue em uma taça de cristal. Anjos ajoelham-
-se em torno do altar com asas parcialmente coloridas e vestes variadas, muitos
deles oram de mãos postas, outros levantam o emblema da paixão, dois, na frente,
balançam incensórios. À direita, atrás do altar, surge um grupo numeroso de
santas, todas em trajes ricos e variados, belos cabelos esvoaçando por cima de
seus ombros e com palmas nas mãos. No primeiro plano, pode-se observar santa
Bárbara e santa Agnes. Da esquerda, avançam papas, cardeais, bispos, monges e
clérigos menores com bastões episcopais, cruzes e palmas. No centro, perto da
base, uma pequena fonte octogonal de pedra projeta uma nascente em um límpi-
444
A pocalipse - C ap. 14

do riacho. Dois grupos estão adorando, um de cada lado da fonte - à direita, os


doze apóstolos ajoelhados descalços e uma formação de papas, cardeais e bispos,
com uma multidão misturada de pessoas da igreja e do povo; à esquerda, reis e
príncipes em trajes variados. Eles estão rodeados por uma profusão de arbustos
floridos, lírios e outras plantas. Nas pinturas laterais inúmeros adoradores mo­
vem-se em direção ao lugar de adoração - cruzados, cavaleiros, reis e príncipes,
incluindo as figuras dos dois artistas montados a cavalo. A Sra. Jameson diz:

Aqui, aproximando de todos os lados, vê-se aquela grande multidão de “toda nação, e
tribo, elíngua, epovo’’ - os santos guerreiros e os santos peregrinos vindo delonge
emprocissão solene- comoutras multidões quejá chegaramaoplano celestial vesti­
das commantos brancos esegurandofolhas depalmanas mãos. A forma deles écomo
anossa; apaisagememvolta deles éumameratranscrição dadoceface denossa natu­
reza externa; agraciosafonte emferro trabalhadonomeiopareceque aindaenvia seu
fluxo para a antiga cidade flamenga; contudo, sentimos que essas criaturas são seres
de cujos olhos Deusjá enxugou todas as lágrimas - que não mais sentirão fome nem
sede; nossa imaginação cobre esses campos floridos de paz e brilho dos recintos ce­
lestiais, enquanto as correntes das fontes são transformadas emáguas vivas, às quais
o Cordeiro mesmo guiará seus redimidos. Aqui, emsuma, emque tudo é humano e
natural na forma, as profundezas espirituais de nossa natureza são tocadas10".

2. E ouvi uma voz de harpistas (καί φωνήν ήκουσα κιθαρωδών). A leitura


correta é: καί ή φωνή ήν ήκουσα ώς κιθαρωδών, e a voz que ouvi (era) como (o
som) de harpistas. Como na t e b . Κιθαρωδός origina-se de κιθάρα, harpa (vide nota
sobre 5.8), e (οδός, cantor. Propriamente, um indivíduo que canta, acompanhando
a si mesmo com a harpa.

3. Animais (ζώων). Na n v i , seres viventes. Vide nota sobre 4.6.

Comprados (ήγαρασμένοι). Tradução correta; contra a teb, redimidos, e b j,

resgatados.

4. Não estão contaminados (οΰκ Ιμολύνθησαν). O sentido do verbo é propria­


mente sujar, manchar, e ele nunca é usado no bom sentido, como piaíveiv (Jo 18.28;
Jd 8), que, no grego clássico, às vezes, é aplicado a colorir. Vide nota sobre lPe 1.4.

Virgens (παρθένοι). O celibato ou a vida em castidade, seja no casamento, seja


na vida de solteiro. Vide lCo 7.1-7,29; 2Co 11.2.

106. Jameson, History o f Our Lord, ii, 339.

445
A pocalipse - C ap. 14

Primícias (απαρχή). V ide n o ta sobre T g 1.18.

5. Engano (δόλος). Leia ψευδός, m entira. Como na nvi e teb .

Irrepreensíveis (αμωμοι). Na n v i , im aculados. Vide nota sobre lPe 1.19.

D iante do trono de Deus. Omita.

6. Pelo meio do céu (èv μεσουρανήματι). Na bj, no meio do céu. Vide nota sobre 8.13.

O evangelho eterno (εύαγγελιον αιώνιον). Sem artigo. Daí a tradução da a r a :


um evangelho eterno. Milligan acha que isso deve ser entendido no mesmo sentido
de pro fetizan do (10.11). O termo αιώνιον inclui mais que mera duração de tempo.
Aplica-se àquilo que não tem o tempo como unidade de medida. Quando aplicado
ao evangelho, ele indica sua semelhança a Ele, cujo ser não é preso pelo tempo.

Para o proclamar aos (εύαγγελίσαι επί). Melhor tradução que p re g a r (cp.


porque tem sentido mais geral e amplo. A preposição επί, omitida no t r ,
k j v ),

significa sobre, em toda a extensão de. Compare com M t 24.14.

Que habitam (κατοικοΰντας). Leia καθημενους, que se assentam . Como na ara.


Compare com Mt 4.16; Lc 1.79.

8. Outro. Acrescente δεύτερος, um segundo.

Caiu (επεσεν). Literalmente. O aoristo profético, expressando a certeza da


queda. Compare com Is 21.9; Jr 51.7-8.

9. O terceiro anjo (τρίτος άγγελος). Acrescente άλλος, outro. Na rv , outro anjo,


um tericeiro·, na a r a , outro anjo, o terceiro.

10. D eitou, não misturado (κεκερασμενου ακράτου). Literalmente, que está m is­
turado sem m istura. Do costume universal de misturar vinho com água para beber,
o termo m isturado passou a ser usado no sentido geral de p rep a ro p e la colocação no
cálice. Daí deitar, ou derram ar, como na t e b .

Cálice da sua ira. Compare com SI 75.8.

Enxofre (θείω). Comumente tomado como o neutro de θειος, divino-, ou seja,


incenso divino, uma vez que se considerava que a queima de enxofre tinha poder

446
A pocalipse - Cap. 14

para purificar, evitando, desse modo, o contágio. Para outros, refere-se a θύω,
queimar, e daí sacrificar.

11. Tormento (βασανισμοΰ). Vide nota sobre M t 4.23-24; e sobre afligia,


2Pe 2.8.

Sobe. Vide Is 34.9-10; Gn 19.28.

Repouso (άνάπαυσιν). Vide nota sobre aliviarei, M t 11.28, e repousa,


lPe 4.14.

12. Aqui estão os. Omita aqui estão, e leia, como na rv: a paciência dos santos,
aqueles que guardam.

A fé em Jesus. Que tem Jesus por seu objeto.

13. Bem-aventurados (μακάριοι). Vide nota sobre M t 5.3.

Desde agora (απ’ άρτι). Vide nota sobre Jo 23.33. A ser juntado, como na
arc ,TB e ara , com morrem, e não com bem-aventurados, nem com a oração se­
guinte. Não, desde agora diz o Espírito. O sentido é explicado de várias ma­
neiras. Alguns entendem como desde o início da era cristã e até o fim dela;
outros consideram que é desde o momento da morte, ligando desde agora com
bem-aventurados, outros ainda, a partir do tempo em que a colheita da terra
está para ser feita. Sófocles diz: “Demonstrem toda reverência religiosa pelos
deuses, pois todas as outras coisas o pai Zeus considera secundárias; pois a
recompensa da piedade acompanha os homens na morte. Quer eles vivam quer
morram, ela não morre”107.

Para que descansem (ίνα άναπαύσωνται). Vide nota sobre M t 11.28. A con­
junção ΐνα, que, fornece o fundamento para o bem-aventurado.

Trabalhos (κόπων). De κόπτω, bater. Daí bater no peito em sinal de pesar. Por­
tanto, κόπος é principalmente um golpe como um sinal de pesar e, depois, o pesar
mesmo. Quanto a trabalho, é o trabalho que envolve cansaço e dor.

Os sig a m (ακολουθεί μετ’ αυτών). Antes, acompanhem. Na rv, seguem com eles.
Compare com Mt 4.25; Mc 3.7 etc. Vide nota sobre Jo 1.43.

107. Sófocles, F ilo c te ste , 1441-1444.

447
A p o c a l ip s e - C ap. 14

15. Lança (πεμψον). Literalmente, envia. Na t b , mete a tuafoice.

Sega (θερισμός). Vide nota sobre Lc 10.2.

Está madura (εξηράνθη). Literalmente, estava seca. Compare com Mc 11.20;


Jo 15.6. Na r v , está madura demais.

16. Meteu (εβαλεν). Literalmente, lançou.

17. Templo (ναού). Propriamente, santuário. Vide nota sobre Mt 4.5.

18. Altar (θυσιαστηρίου). Vide nota sobre At 17.23.

Que tinha poder (εχων εξουσίαν). Literalmente, tendo poder. Alguns textos
acrescentam o artigo ò. Como na r v : “o que tem poder”.

O fogo. Essa é a forma correta, pois no grego está com o artigo.

Clamou (κραυγή). Vide nota sobre Lc 1.42.

Tua foice aguda. Literalmente, tuafoice, a aguda.

Vindima (τρυγησον). De τρύγη, secura, incluída na noção de maturidade, daí


a vindima, colheita. Portanto, o verbo tem o sentido de colher ofruto maduro. Ele
ocorre somente nesse capítulo e em Lc 6.44.

Uvas (σταφυλαι). O substantivo no singular também tem o sentido de um cacho


de uvas.

Estão maduras (ήκμασαν). Somente aqui no texto do Novo Testamento. De


άκμή, transcrito em ápice, o ponto mais alto. Daí o verbo ter o sentido de alcançar
o ápice do crescimento, estar maduro.

19. Grande lagar (την ληνόν τον μέγαν). Ο estudante grego notará o adjetivo
masculino com o substantivo feminino, possivelmente porque o gênero do subs­
tantivo é duvidoso. A rv, por traduzir de forma mais literal, é mais forçada: o
lagar, o grande lagar. Vide nota sobre Mt 21.33.

20. Estádios (σταδίων). O estádio equivalia a aproximadamente 185 metros.

448
A pocalipse - Cap. 15

C apítulo 15

1. As sete últimas pragas (πληγάς 4πτά τάς έσχάτας). Literalmente, sete pragas,
Como na t e b . Na r v , “que são as últimas”. Vide nota sobre Mc 3.10;
as últim as.
Lc 10.30.

É consumada (έτελέσθη). Mais corretamente, tr a z id a a u m fim (τέλος). Na n v i ,


se completa. Literalmente,/òz com pletada, o aoristo profético, que fala de uma coisa
prevista e decidida como se já tivesse sido feita.

2.M ar de vidro (θάλασσαν ύαλίνην). Na rv, melhor, um m a r vítreo. Vide nota


sobre 4.6.

Saíram vitoriosos da besta (νικώντας Ικ του θηρίου). A expressão é


peculiar. Literalmente, co n q u ista ra m de d e n tro de. A construção é única no
texto do Novo Testamento. A frase tem o sentido, não como na b j e b p :
“venceram a”, mas de: sa in d o triu n fa n te s d a (έκ). Na rv , que v ie ra m v ito rio so s
d a p a r te d a besta.

Do seu sinal. Omita.

Estavam junto ao (èirí). Essa é a melhor forma, ju n to ao; na p ra ia do, como


fizeram os israelitas quando entoaram o cântico aludido no versículo 3.

As harpas de Deus. Omita as. Instrumentos totalmente devotados ao louvor


dele. Compare com 5.8; 14.2.

3. O cântico de Moisés. Vide Êx 15. Compare com Deteuronômio 32. Alguns


atribuem tal alusão a essa passagem.

Servo de Deus. V ide Êx 14.31; Nm 12.7; SI 105.26; Hb 3.5.

O cântico do Cordeiro. Não há dois cânticos distintos. O cântico de Moi­


sés é o cântico do Cordeiro. As igrejas do Antigo e Novo Testamentos são
uma.

Grandes e maravilhosas são as tuas obras. SI 111.2; 139.14; lCr 16.9.

Justos e verdadeiros são os teus caminhos. A rv, com ênfase so b re a r e ti­


dão, usa retos em lu g a r de ju stos. Vide D t 32.4,

449
A pocalipse - Cap. 15

Rei dos santos (βασιλεύς των άγιων). As leituras diferem. Alguns lêem, em
lugar de santos, εθνών, das nações (cp. a r a ); outros, αιώνων, dos séculos (cp. aec ).
Compare com Jr 10.7.

4. Quem te não temerá? Vide ir 10.7. Omita te.

Santo (όσιος). Vide nota sobre Lc 1.75. O termo é aplicado a Cristo em


At 2.27,35; Hb 7.26. Só é usado para Deus aqui e em 16.5, onde a leitura correta
é ò όσιος, o santo, em lugar de ό έσόμενος, que será.

Todas as nações virão. Compare com SI 86.9; Is 2.2-4; 66.23; Miqueias 4.2.

Juízos (δικαιώματα). Não apenas decisões divinas, mas atos dejustiça em geral.
Como na n v i . O sentido primário da palavra é o que foi considerado certo para ter
força de lei. Daí um preceito (Lc 1.6; Hb 9.1; Rm 1.32). Uma decisãojudicial a favor
ou contra (Rm 5.16). Atos dejustiça, como na a r a .

5. Eis. Omita.

O templo do tabem áculo (ò ναός τής σκηνής). O santuário do tabernáculo.


Vide nota sobre M t 4.5.

Do testemunho. Vide At 7.44. O tabernáculo era chamado “tabernáculo do


Testemunho” porque continha a arca com a lei de Deus que testifica contra o
pecado. Vide Êx 25.16,21; 30.36; 34.29; 38.21. Compare com 11.19.

6. Linho (λίνο ν). A rv segue a leitura λ ίθ ο ν , pedra, segundo a analogia de


Ez 28.13: “Toda pedra preciosa era a tua cobertura”. A ideia é de veste salpicada
de pedras preciosas. Vide nota sobre 2.17.

Resplandescente (λαμπρόν). Nas páginas do Novo Testamento, principal­


mente aplicado a roupa, como em Lc 2 3 .1 1; At 10.30; Tg 2.2. Também à água da
vida (22. l) e à Estrela da manhã (22.16). Na ntlh , brilhante.

Cingidos - pelo peito. Como o Senhor na visão de 1.13; onde, entretanto, se


usa μαστοΐς, peitos, tórax, em lugar de στήθη, peitos.

7. Salvas (φιάλας). Na n v i , taças. Vide nota sobre 5.8.

8. Fumaça. Compare com Ez 40.34; lRs 8.10; SI 18.8; Is 6.4; Ez 10.2-4.


450
A pocalipse - C ap. ιβ

Ninguém podia entrar. Milligan afirma: “Não se pode se aproximar de Deus


no momento em que Ele está se revelando em todo o terror de sua indignação”.
VideÊx 19.21.

C apítulo 16

1.As sete taças. Traduza com o acréscimo de sete. Na k jv , somente: dosfrascos


da ira.

2. E foi o primeiro. Cada anjo, quando chega sua vez, retira-se (ύπάγ€Τ€, vide
nota sobre Jo 6.21; 8.21) do cenário celestial.

Fez-se (έγένετο). Literalmente, aconteceu. Na r v , veio a ser, na n v j , abriram-se


(feridas malignas). Elliott traduz com muita habilidade: irrompeu.

Chaga (έλκος). Vide nota sobre Lc 16.20. Compare com a sexta praga egípcia
(Êx 9.8-12), onde a l x x usa a palavra 'έλκος, furúnculo. Também em referência à
úlcera ou casca deferida da lepra, Lv 13.18; à chaga do rei Ezequias, 2Rs 20.7; às
úlceras do Egito, D t 28.27,35. Em Jó 2.7 ( l x x ) , a ferida é descrita, como aqui, por
chaga (maligna, πονηρός).

Má e maligna (κακόν καί πονηρόν). De forma similar, os dois substanti­


vos cognatos κακία e πονηριά, maldade e malícia, ocorrem juntos em lCo 5.8.
Πονηρός enfatiza a atividade do mal. Vide nota sobre Lc 3.19.

S. Se tom ou (έγέν^το). Ou mudou-se (cp. teb ).

Sangue. Compare com Êx 7.19.

Como de um morto. Espesso, apodrecido e fétido.

Alma vivente (ψυχή (ώσα). Os melhores textos trazem ψυχή ζωής, alma de
vida. Na teb , sopro de vida.

4. O terceiro anjo. Omita anjo.

Se tom aram (έγένίτο). Não há necessidade de traduzir o verbo singular no


plural. Podemos dizer: veio a ser ou tornou-se.
«

5. O anjo das águas. Nomeado comandante das águas como outros anjos foram
sobre os ventos (7.l) e sobre o fogo (14.18).
451
A pocalipse - C ap . 16

Ó Senhor. Omita.

Santo és. Segundo leitura ò οσιος, traduza: o Santo (cp. tb, a r a , teb, entre
outras); na bj, ó Santo. A k j v segue a leitura ò έσομ^νος, (que) serás.

Julgaste estas coisas (ταΰτα ίκρινας). Literalmente.

6. Porque disto são merecedores. Omita porque.

7. Outro do altar. Omita o u tro do, e leia, como a n v i : ouvi o altar. O altar perso­
nificado. Compare com 6.9, em que as almas dos mártires são vistas sob o altar
e clamor: a té qu ando.

Todo-Poderoso. Acrescente o artigo: o Todo-Poderoso.

8. O quarto anjo. Omita anjo.

Foi-lhe perm itido (έδόθη). Na ΤΕΒ,^/cv-lhe concedido.

Com fogo (èv ττυρί). Literalmente, “no fogo”. O elemento em que o abrasa-
mento acontece.

9. Se arrependeram para lhe darem glória. Glorificá-lo por meio do arrepen­


dimento.

10. Seu reino se fez tenebroso. Compare com Êx 10.21-22.

Mordiam (έμασσώντο). Somente aqui no texto do Novo Testamento.

De dor (έκ του πόνου). Estritamente, de sua dor. Sua, a força do artigo του.

12. Eufrates. Vide nota sobre 9.14.

Do O riente (άπο τών ανατολών ήλιου). Literalmente, como na rv, desde o


nascimento do sol. Vide nota sobre Mt 2.2; e sobre o oriente do alto, Lc 1.78.

13. Rãs. Possivelmente com referência a Ex 8.1-14.

14. [D a terra e[] de todo o mundo. Conforme a k j v (cp. tr ). Omita da terra e,


como na arc. Na bj, de to d a a terra.
452
A pocalipse - Cap. 16

Mündo (οικουμένης). Vide nota sobre Lc 2.1

A batalha (πόλεμον). Na tb, mais literalmente, guerra. Batalha é μάχη.

N aquele grande Dia (εκείνης). Omita. Leia, como na nvi e teb : “do gran­
de Dia”.

15. Eis - vergonhas. Essas palavras são parentéticas.

Como ladrão. Compare com Mt 24.4*3; Lc 12.39; lTs 5.2,4; 2Pe 3.10.

Vigia (γρηγορών). Vide nota. sobre Mc 13.35; lPe 5.8.

Guarda as suas vestes. Edersheim registra:

Durante a noite o capitão do templo fazia suas rondas. Quando ele se aproximava,
os guardas tinham que se levantar e o saudar de uma maneira particular. Qualquer
guarda encontrado dormindo em serviço era surrado ou suas roupas eram jogadas
no fogo. Há registro da confissão de um dos rabis de que em determinada ocasião seu
próprio tio materno tinha, de fato, passado pela punição de ter as roupas queimadas
pelo capitão do templo108.

Vergonhas (άσχημοσύνην). Somente aqui e em Rm 1.27. De ά, não, e σχήμα,


forma. Deformidade, indecoro-, quase correspondendo à expressão não em boaforma.

16. Armagedom. A forma grega exata é "Ap Μαγεδών. A palavra é composta


do termo hebraico Har (in), montanha, e Megiddon ou Megiddo (raa, M ‘ghiddô):
a montanha de Megido. Acerca de ocorrências de Megido sozinho, vide Jz 1.27;
lRs 4.12; 9.15; 2Rs 9.27. Vide também Jz 5.19; Zc 12.11; 2Cr 35.22; 2Rs 23.30.
Stanley comenta:

Cercada como é pelas colinas da Palestina a norte e a sul, seria natural o lugar se tor­
nar a arena de guerra entre os habitantes da planície, que confiamem seus carros, e os
israelitas das terras das altas vizinhanças. Por isso, principalmente, deve sua celebri­
dade, como campo de batalha do mundo, que, por meio de sua adoção na linguagem do
livro de Apocalipse, passou a ser umprovérbio universal. Se esse livro misterioso pro­
cede da mão de um pescador galileu, é mais fácil entender por que razão este homem,
com as cenas daquelas muitas batalhas constantemente diante dele, extrairía o nome

108. Edersheim, T h e Tem ple .

453
A pocalipse - C ap. 17

figurativo do conflito final entre as hostes do bem e do mal do “lugar que é chamado
na língua hebraica de Harmagedon”109.

Megido ficava na planície de Esdraelon. Conforme citação de Lee:

lugar escolhido para acampamento em toda peleja realizada na Palestina desde os dias
de Nabucodonosor, rei da Assíria, até a desastrosa marcha de Napoleão Bonaparte do
Egito para a Síria. Judeus, gentios, sarracenos, cruzados cristãos e franceses anticris-
tãos; egípcios, persas, drusos, turcos e árabes, guerreiros de toda nação sob o céu já
montaram sua barraca na planície de Esdraelon e já contemplaram a bandeira de sua
pátria umedecida pelo orvalho do Tabor e do Hermom110.

Duas grandes matanças em Megido são mencionadas no Antigo Testamento,


a primeira celebrada no cântico de Débora (Jz 5.19) e a segunda foi aquela na
qual o rei Josias caiu morto em batalha (2Rs 23.29). Essas duas podem estar
presentes na mente do profeta, mas a alusão não é a nenhum lugar ou evento em
particular. Milligan diz: ‘A palavra, como Eufrates, é a expressão de uma ideia, a
ideia da destruição rápida e esmagadora que surpreenderá todos que se uniram
contra o Senhor”.

17. Templo do céu. Omita do céu.

21. Saraiva. VideÊx 9.18.

Pedras do peso de um talento (ώς ταλαντίαια). O adjetivo, com o sentido


concorda com saraiva; saraiva de um talento de peso-, ou seja,
de um talento de peso,
tendo cada pedra esse peso. Pedras, por conseguinte, é explanativa, e não está no
texto. Pedras de saraiva são um símbolo da ira divina. Fide Is 30.30; Ez 13.11.
Compare com Js 10.11.

Capítulo 17

1. Assentada sobre m uitas águas. É dito da Babilônia, Jr 51.13; a riqueza da


Babilônia devia-se ao Eufrates e a um vasto sistema de canais. Alguns comen­
taristas interpretam que o símbolo se refere à Babilônia; para outros, à Roma
pagâ, à Roma papal, à Jerusalém. Dante alude a essa passagem em seu discurso
ao lúgubre papa Nicolau III, na Confusão dos Simoníacos.

109. Stanley, Sinai and Palestine.


\10. Citação de Lee, a partir de Clarke’s Travels. Vide Thomson, The Land and the Book Palestina
Central e Fenicia, p. 208ss.; e Stanley, Sinai and Palestine, cap. ix.
454
A pocalipse - Cap. 17

A vós vos figurava o Evangelista,


Quando a que é sobre as águas assentada
Prostituir-se aos Reis foi dele vista:
Nascera de cabeças sete ornada,
E o valor nos dez cornos possuía,
Enquanto ao esposo sua virtude agrada111.

2. Se prostituíram . A imagem de uma prostituta cometendo prostituição com


reis e povos, ocorre, com frequência, nos profetas, representando a deserção da
igreja de Deus e sua ligação a outros. Vide Is 1.21; Jr 2.20; 3.1,6,8; Ez 16.15-
16,28,31,35,41; 23.5,19,44; Os 2.5; 3.3; 4.14. A palavra é aplicada a cidades pagãs
só em três passagens: a Tiro, em Is 23.15-17; a Nínive, em Na 3.4 e aqui.

3. Assentada. Para lidar com a besta e guiá-la.

Uma besta de cor escarlate. A mesma coisa que em 13.1. Depois, essa besta
é sempre mencionada como το θηρίον, a besta. Para escarlate, vide nota sobre
M t 27.6.

4. Púrpura (πορφύρουν). Vide nota sobre Lc 16.19.

Adornada (κεχρυσωμένη). Literalmente, dourada.

Pedras preciosas (λίθψ τιμίψ). Literalmente, pedra preciosa.

Cálice de ouro. Compare com Jr 51.7.

Abominações (β&λυγμάτων). Vide nota sobre Mt 24.15.

5. Na sua testa, estava escrito o nome. Como era costume com prostitutas,
que tinham o nome inscrito em uma etiqueta. Sêneca, dirigindo-se a uma sacer­
dotisa devassa, diz: Nomen tuumpependit afronte, teu nome pende de tua testa. Vide
Juvenal, falando de a depravada Messalina “ter assumido falsamente a identidade
de Licisca”112.

Mistério. Alguns entendem que a palavra faz parte do nome, outros enten­
dem como uma sugestão de que o nome deve ser interpretado simbolicamente.

111. Dante, A D iv in a Com édia, Inferno, xix, 106-111, p. 123.


112. Juvenal, Sátiras, vi, 123ss.

455
A pocalipse - C ap. 17

Babilônia. Vide nota sobre lPe 5.13. Tertuliano, Irineu e Jerônimo usam a pa­
lavra Babilônia como representando o Império Romano. Na Idade Média, Roma
foi frequentemente intitulada de a B abilôn ia O cidental. A seita dos Fraticelli, or­
ganização eremita dos franciscanos do século XIV, que levou o voto de pobreza
ao extremo e ensinava que eram possuídos pelo Espírito Santo e isentos de pe­
cado, primeiro familiarizou a mente comum com a noção de que Roma era a Ba­
bilônia, a grande prostituta do Apocalipse113. Sobre a passagem citada de Dante
(em 17.1, “Inferno”, xix, 111), o Deão Plumptre comenta:

As palavras têm o interesse de ser uma interpretação medieval de Ap 17.1-15, na qual,


contudo, a prostituta e a besta parecem um tanto estranhamente mescladas. A pros­
tituta é a corrupta igreja de Roma; as sete cabeças são as sete colinas sobre as quais a
cidade foi construída, ou, talvez, com uma exegese totalmente distinta, os sete dons
do Espírito, ou ainda os sete sacramentos com os quais aquela igreja, em seu início,
foi dotada; os dez chifres são os D ez Mandamentos. Enquanto a igreja foi fiel ao seu
cônjuge, ela teve a força moral que vem desses dons e a lei divina que ela representava.
Quando falhou, ela tornou-se uma prostituta, e sua prostituição com reis era o símbo­
lo de sua submissão aos poderes seculares para a opressão das nações.

6. Santos - testemunhas. Os santos incluem os mártires ou testemunhas, mas a


última palavra enfatiza o testemunho dos santos, o qual foi a causa da morte deles.
Para testemunha, vid e nota sobre 1Pe 5.1.

8. Irá à perdição (ύπάγειν). Seguindo essa leitura, a tradução é: ir p a ra a perdição


(cp. r v ; t e b , encaminhar-se). Alguns bons textos trazem υ π ά γει, v a i (cp. t b ; ara e
n v i , caminha). Para o verbo, vide nota sobre Jo 6 .2 1 ; 8 .2 1 .

No livro (επί). Literalmente, sobre.

Desde a fundação do mundo. No grego comum do Novo Testamento, essas


palavras pertenceríam a estão escritos. Constrói com as palavras imediatamente
precedentes. Compare com 13.8 e com Mt 25.34.

Mas que virá (καί πάρεσται). E virá. Contra a leitura καίπερ εστίυ, e contudo ê
Literalmente, estará presente. Na a r a , aparecerá-, na bj, reaparecerá.
(cp. k jv ).

9. Aqui há (ώδε). Indicando atenção e discernimento espiritual para o que se


segue. Vide nota sobre 13.18.

1 IS. Vide Milman, Latin Christianity, livro xiii, cap. vi.

456
A pocalipse - Cap. 17

Sentido (ò νους). I. Νους é ο órgão d a percepção e apreensão m entais - de vida


consciente, a mente , compreendendo as faculdades da percepção e da compreen­
são, do sentimento, do julgamento, da determinação.
(a) A fa c u ld a d e intelectiva ou entendim ento (Lc 24.45). Como aqui, de acordo com
alguns.
(b) A r a z ã o , considerada como a faculdade de percepção das coisas divi­
nas; de reconhecimento da bondade e que odeia a perversidade (Rm 1.28;
7.23; Ef 4.17).
(c) O p o d e r d e ju lg a m en to calm o e im parcial (2s 2.2).
II. Νους é um m odo p a rtic u la r de p en sa r eju lg a r, consciência m oral como um há­
bito d a m ente ou opinião. Daí pensam entos, sentimentos, propósitos (Rm 14.5, opinião
bem definida-, lCo 1.10, em um mesmo sentido ). Alguns traduzem aqui por sentido,
sig n ifca d o.

Sete montes. Muitos intérpretes consideram que isso determina de maneira


conclusiva que a mulher mencionada é Roma, cidade construída sobre sete mon­
tes. Outros negam a referência ao local e entendem o princípio da grandiosida­
de e da ambição mundanas. Outros ainda afirmam que muitas cidades além de
Roma podem se vangloriar de suas sete colinas, como Constantinopla, Bruxelas
e, em especial, Jerusalém.

Sobre os quais. A expressão causa redundância com onde (δπου; não traduzi­
do na a r c ), por comunicar a mesma ideia: “sete monte, onde sobre eles”. Trata-se
de um hebraísmo.

10. Caíram (’έπεσαν). Literalmente. Palavra usada constantemente na l x x para


queda violenta ou para expulsão de reis ou reinos. Vide Ez 29.5; 30.6; Is 21.9;
Jr 1.15; 51.8.

12. Reis, que (ο'ίτι.νες). O relativo composto qualificando: “do tipo que".

13. Intento (γνώμην). O sentido principal é a fa c u ld a d e de conhecer, mente, ra­


zão-, então, aqu ilo que é pen sa d o ou conhecido-, opin ião, p ro p ó sito . Vide At 20.3;
lCo 7.25; Fm 14.

Entregarão (διαδι,δώσουσι,ν). Leia διδόασιν, o tempo presente, entregam . A


força de διά é sobre, acim a : d a r acima-, daí entregar.

Poder e autoridade (δύναμιν καί εξουσίαν). Para a distinção, vid e nota sobre
2Pe 2.11.
457
A pocalipse - C ap. 18

15. As águas. A explicação do símbolo dado aqui está de acordo com Is 8.7;
SI 18.4,16; 124.14.

Povos, e multidões. V ide nota sobre lPe 2.9; Mc 12.37.

16. Na besta (επί). Leia καί, e·. “os dez chifres £../] e a besta”. Como no ntia.

Desolada (ήρημωμενην). Literalmente, com o verbo no particípio per­


feito.

Comerão a sua carne. Um toque de extrema hostilidade. V id e SI 27.2;


Miqueias 3.3. Xenofonte, falando do ódio entre os espartanos puros e os
ilotas, diz que nenhum dos espartanos puros escondia sua disposição para
comer o ilota cru. Observe o plural σάρκας, ca rn es (cp. bj), e v id e nota sobre
T g 5.3.

Queimarão (κατακαύσουσιν). Na rv, comunicando a força de κατά, p a ra b a ix a


queim arão completamente. De acordo com alguns intérpretes, a imagem é mudada
da mulher para uma cidade; mas isso é desnecessário, já que a linguagem, prova­
velmente, é tirada da punição para fornicação por parte da filha de um sacerdote
(Lv 21.9; compare com Lv 20.14).

17. Tem posto (εδωκεν). Na nvi, com o sentido mais estrito do aoristo, colocou.
Na teb e ara, incutiu. Literalmente, deu.

Cumpram o seu intento (ποιήσαι την γνώμην αότοϋ). V ide nota sobre o
versículo 13. Na rv, mais literalmente, executar o seu propósito; na bj, r e a liz a r o seu
desígnio.

Tenham uma mesma ideia (ποιήσαι μίαν γνώμην). Literalmente, f a z e r um


Na rv, c h e g a r a u m propósito; na tb, o chegarem a um acordo.
propósito.

As palavras (τα ρήματα). Porém, leia oi λόγοι, as p a la v ra s p ro fitica s. Para a


distinção, vid e nota sobre Lc 1.37.

18. Reina (εχουσα βασιλείαν). Literalmente, tem um reino.

C a pítu lo 18

1. Foi iluminada. Compare com Ez 43.2.


458
A pocalipse - C ap . 18

2. Fortemente com grande voz (έν ίσχύϊ φωνή μεγάλη). Literalmente, em


Omita μεγάλη, gran de, e leia ισχυρά φωνή, com uma
fo rç a com um a g ra n d e vo z.
p oderosa voz. Como na n v i .

Caiu —Babilônia. A ar c observa a colocação do verbo caiu segundo a posição


enfática do grego: “Caiu! Caiu a grande Babilônia”. Compare com Is 21.9.

Se tomou (εγενετο). Literalmente.

Demônios (δαιμόνων). Tradução apropriada; contra a k jv e rv , diabos. A r v


estranhamente confina dem ônios à nota de margem. V ide nota sobre Mc 1.34; vid e
Is 13.20-22; 34.13-15; vid e também nota sobre Lc 11.24.

Abrigo (φυλακή). V ide nota sobre lPe 3.19 e At 5.21. Na r v , em nota de mar­
gem, prisão; na tb, gu arida.

Refúgio (φυλακή). A mesma palavra traduzida acima por a b rig o . Na r v ,


na tb , g u a r id a . Contudo, alguns explicam não como uma g u a ­
cela d e p risã o ;
r id a onde são mantidos, mas como um lugar de seg u ra n ça ao qual eles re­
correm.

Ave (όρνεου). Só em Apocalipse, aqui e em 19.17,21. Compare com Jr 1.39.

3. Beberam ou π έ π ω κ α ν ). Na
(π έπ ω κ ε ν tb, têm bebido. Todavia, alguns leem
π έ π τ ω κ α ν , têm caído. Como na rv .

Do vinho (εκ του οίνου). Dessa forma, se lermos têm bebido. Se adotarmos
πέπτωκαν, têm caído, εκ é instrum ental, pelo. Como na rv .

Da ira. O vinho da fornicação transformou-se em ira contra ela mesma.

Mercadores (έμποροι). Originalmente, a palavra tem o sentido de alguém em


por mar ou terra, sobretudo para comerciar. Daí m ercador como dis­
um a jo r n a d a
tinto de κάπηλος, varejista ou ven dedor am bulante.

A abundância de suas delícias (τής δυνάμεως του στρήνους αυτής). Literal­


mente, como na teb, com o p o d e r de seu luxo. Στρήνος relaciona-se com στερεός,
firm e , dificil, teim oso (v id e nota sobre firm es, lPe 5.9). Daí fo rç a excessiva, luxúria,
libertinagem . Ocorre somente aqui no texto do Novo Testamento. O verbo rela­
cionado, στρηνιάω, v iv e r em delícias, ocorre em 18.7,9.

459
A pocalipse - C ap . 18

4. Sai dela. Compare com Jr 11.6,45; Is 48.20; 52.11; Nm 16.26.

Sejas participante dos (συγκοινωνήσητε). Esse verbo composto não ocorre


com frequência no texto do Novo Testamento. Ele só é encontrado em Ef 5.11;
Fp 4.14 e aqui. Acerca do substantivo relacionado συγκοινωνός, com panhia, vid e
nota sobre 1.9.

5. Se acumularam (ήκολούθησαν). Literalmente, seguiram . Porém, os melhores


textos trazem έκολλήθησαν, apegaram -se. Compare com Jr 51.9. Para aplicações
diferentes do verbo, v id e nota sobre Mt 19.5; Lc 15.15; At 5.13. Compare com a
frase clássica para seguir de perto um inimigo em fuga, hoerere in terga hostium,
g r u d a r n a s costas do inim igo. V ide também Zc 14.5 ( l x x ): “O vale dos montes
c h e g a r á (εγκολληθήσεται) até Azei”. A ideia radical da metáfora é de seguir ou
alcançar para depois se juntar a.

6. Dobro (διπλώσατε). Somente aqui no texto do Novo Testamento. Compare com


Is 40.2; Jr 16.18; Zc 9.12. A lei levítica insiste em dupla recompensa. VideÊx. 22.4,7,9.

7. Em delícias esteve (έστρηνίασεν). V ide nota sobre o versículo 3.

Tormento (βασανισμόν). Só em Apocalipse. Acerca da palavra relacionada


βάσανος, tormento, vid e nota sobre M t 4.23-24.

Estou assentada como rainha, não sou viúva. Vide Is 47.8; Sf 2.15.

8. Portanto - virão as suas pragas. V ide Is 47.8-9.

Que a julga (ό κρίνων). Leia κρίνας, ju lg o u . Como na t e b .

11. Mercadores (γόμον). Somente aqui, no versículo 12 e em At 21.3. De γεμω, estar


repleto. Daí, literalm ente, carga ou carregamento. Como na rv, em nota de margem.
As principais características da descrição seguinte são tiradas da destruição
de Tiro, Ez 26; 27.

12. Linho fino (βύσσου). V ide nota sobre Lc 16.19.

Púrpura (πορφύρας). V ide nota sobre Lc 16.19.

Seda (σηρικού). Propriamente um adjetivo com o sentido de pertencente a seres.


De Σήρες, seres, povo da índia, talvez da China moderna.
460
A p o c a l ip s e - C a p. 18

Antes da época de Justiniano, quando o bicho-da-seda foi, pela primeira vez,


trazido para Constantinopla, pensava-se que os seres juntavam, ou penteavam, a
substância felpuda tecida pelos bichos nas folhas de determinas árvores. Por isso,
Virgílio, ao falar a respeito dos seres, diz que eles pen teiam (no latim, depectant)
as finas lãs das folhas114.
A seda era um caro artigo de luxo entre os romanos, por isso, Tácito relata
que, no reinado de Tibério, foi decretada uma lei contra “homens desgraçarem-
-se com vestes de seda”115. Gibbon registra:

Duzentos anos depois da era de Plínio o uso de seda pura ou até mesmo mista ficou
confinado aosexo feminino, até os opulentos cidadãos de Roma e das províncias fica­
reminconscientementefamiliarizados comoexemplodeHeliogábalo, oprimeiroque,
por esse hábitoefeminado, deslustrou a dignidade de umimperadore de umhomem.
Aureliano reclamou que, em Roma, 4 5 0 gramas de seda eramvendidos a por 3S6
gramas deouro116.

Na época de Justiniano, os persas detinham o monopólio desse comércio. Dois


monges missionários que residiam na China transmitiram a Justiniano o projeto
de introduzir os ovos do bicho-da-seda em uma cana oca e os transportar dessa
maneira.

Escarlata. V ide nota sobre Mt 27.6.

Madeira odorífera (ξύλον θύϊνον). Somente aqui no texto do Novo Testa­


mento. De θυία ou θύα, o citrus, uma árvore do norte da África nativa de Barbary,
usada como incenso e em marchetaria. Plínio fala da mania, entre os romanos,
das mesas feitas com essa madeira. As mais caras dessas mesas eram chamadas
de orbe, círculos, por causa do tampo maciço cortado do tronco em todo seu diâ­
metro. Plínio menciona tampos de 1,2 metros de diâmetro e quase quinze cen­
tímetros de espessura. Os mais caros eram os tirados de perto da raiz, porque
é a parte mais larga da árvore e porque a madeira era colorida, mostrando os
seus veios. Por isso, elas eram descritas por diferentes epítetos de acordo com
os desenhos dos veios encontrados nela, se semelhantes aos do tigre, da pantera
ou do pavão.

Vaso (σκεύος). Vide nota sobre lPe 3.7 e At 9.15. Também sobre bens, M t 12.29;
Mc 3.27; e sobre am ain adas as velas, At 27.17.

114. Virgílio, Geórgicas, ii, 121.


115. T ác ito , Anais, ii, 33.
116. Gibbon, Decline and Fall, cap. xl.

461
A pocalipse - C ap. 18

D e marfim (έλεφάντινοί'). Somente aqui no texto do Novo Testamento. As


referências a marfim são frequentes no Antigo Testamento. A frota de Társis
trouxe marfim para Salomão junto com bugios e pavões (lRs 10.22). Seu grande
trono foi feito de marfim (lRs 10.18). A casa de marfim de Acabe (lRs 22.39),
provavelmente, era uma casa com painéis de marfim. “Palácios de marfim” são
mencionados em SI 45.8, e “casas de marfim” em Am 3.15. Os assírios comer­
cializavam em grandes quantidades esse material. Sobre o obelisco, no Museu
Britânico, os cativos ou os que prestavam tributo são representados carregando
um dente de elefante. Os egípcios, desde tempos remotos, fizeram uso do marfim
em decoração, trazendo-o em sua maior parte da Etiópia, onde, de acordo com
Plínio, havia tanta abundância de marfim que os nativos faziam batente da porta
e cercas de marfim, e também os estábulos para seu rebanho. Nos primórdios da
Grécia, o marfim era usado, com frequência, com propósitos ornamentais, em
arreios de cavalos, alças de barrilete, e no enfeite de escudos. Homero retrata
uma mulher asiática pintando marfim com púrpura para fazer enfeites de arreios
de cavalos e descreve que as rédeas dos cavalos de carro eram adornadas com
marfim. A estátua de Júpiter, de Fídias, foi feita em marfim e ouro. Na Odisséia,
de Homero, Telemaco dirige-se, assim, a seu companheiro, o filho de Nestor,
enquanto eles contemplam o esplendor do palácio de Menelau:

Bemalimentados, aproximou-se
Telêmaco do filho deNestor. Falou-lhe aopé
doouvido umsegredo queexcluía os demais:
“Tesouro domeupeito, estou deslumbrado. Que
Espetáculo! Pela sala vibramfulgurações de bronze
ede ouro ede âmbar edeprata edemarfim!
Imaginas assimo palácio olímpico de Zeus?117

Mármore (μαρμάρου). De μαρμαίρω, c in tila r ou brilhar.

13. Cinamomo (κινάμωμον). Mencionado como um dos ingredientes do óleo


santo de unção (Ex 30.23) e como um perfume para a cama (Pv 7.17).

E cardamomo (και άμωμον) Essas palavras são acrescentadas pelos me­


lhores textos. Planta aromática da índia com semente semelhante ao cacho da
uva, da qual é feito unguento. Virgílio, ao descrever a vinda da era de ouro, diz:
“O am om u m assírio brota como uma planta comum”118. Forbiger (comentando

117. Homero, Odisséia, iv, 68-74, p. 93-94.


118. Virgílio, Éclogas, iv, 25. Compare comÉclogas, iii, 89.
462
A pocalipse - C ap . 18

Virgílio) diz que o melhor crescia na Armênia, e um de qualidade pior, na Mé­


dia e no Ponto.

Flor de farinha (σεμίδαλιν). Somente aqui no texto do Novo Testamento.

Cavalgaduras (κτήνη). Vide nota sobre Lc 10.34. Na n v i e t e b , bois.

Mercadorias de cavalos. Mercadorias não está no texto grego. Esse termo


retoma a construção de γόμον, mercadorias, com o genitivo, no versículo 12.

Carros (ρεδών). Palavra latina, embora de origem gaulesa, rheda. O carro ti­
nha quatro rodas.

14.0 fruto (ή οπώρα). Originalmente, dofim do verão ou início do outono, por isso,
em geral, usado para ofruto maduro das árvores. Ocorre somente aqui no texto do
Novo Testamento. Compare com o composto φθινοπωρινά, outono (árvores). Vide
nota sobre infrutíferas, Jd 12, e compare com frutas de verão, Jr 40.10.

Do desejo da tua alma (τής επιθυμίας τής ψυχής σου). Literalmente.

Coisas gostosas (λιπαρά). De λίπος, banha. Por isso, literalmente, gordu­


ra. Ocorre somente aqui no texto do Novo Testamento. Homero usa a pa­
lavra uma vez no sentido de oleoso ou brilhante com óleo, como a pele untada
depois do banho. “A cabeleira deles brilha, apresentam-se de cara bonita.”119
Assim também Aristófanes120, e ainda para referir-se a pratos gordurosos,
oleosos12‘. Para a lisura escorregadia de um mar calmo, como usada por Teó-
crito. A expressão λιπαροί πόδες, pés brilhantes, ou seja, macios, sem rugas,
é frequente em Homero. Por isso, diz de Agamemnon, levantando de sua
cama: “Nos pés sandálias: brilho vigoroso”’24. Também para a condição de
vida-, alguém rico, confortável; como Homero a respeito de um próspero ve­
lho123. Para coisas brilhantes, frescas ou novas. Para solo, produtivo. A cidade
de Atenas era chamada de λιπαραι, um epíteto favorito. Aristófanes brinca
com os dois sentidos da palavra, brilhante e oleoso, dizendo que se alguém,
de modo lisonjeiro, chamar Atenas de brilhante, ele liga a ela a honra de
sardinhas - oleosidade124.

119. Homero, Odisséia, xv, 3 3 2 -3 3 3 , p. 87.


120. Aristófanes, P lu to , 616.
121. Id., A s R ãs, 163.
122. H o m ero , llía d a , ii, 44, p. 69.
123. Id., O disséia, xi, 136.
124. Aristófanes, O sA ca m ia n o s, 638, 9.
463
A p o c a l ip s e — C ap. 18

Excelentes (λαμπρά). Na t b , esplêndidas; a tradução da k j v , agradáveis, é inde­


finida. Vide nota sobre Lc 23.11; Tg 2.2. No texto do Novo Testamento, o termo
é usado, na maioria das vezes, para vestimenta. Vide nota sobre 15.6.

16. Adornada (κεχρυσωμενη). Vide nota sobre 17.4.

17. Piloto (κυβερνήτης). De κυβερνάω, governar. Estritamente, timoneiro. Somen­


te aqui e em At 27.11.

Todo o que navega em naus (πας επί τών πλοίων ò όμιλός). Os melhores
textos substituem por: ό επί τόπον πλέων, que navega em qualquer lugar, lite­
ralmente, navega para um lugar. Como na r v . Na t b , todos os que navegam para
qualquer porto.

Negociam no mar (την θάλασσαν εργάζονται). Literalmente, trabalham o mar,


como no latim, mare exercent, viver do mar. Na n v i , ganham a vida no mar.

19. Lançaram pó sobre a cabeça. Compare com Ez 27.30. Vide nota sobre
Lc 10.13.

20. Julgou a vossa causa quanto a ela (εκρινεν το κρίμα υμών εξ αυτής). Na
r v , mais literalmente, julgou seu julgamento sobre ela, ou a partir dela. A ideia é

de exigir julgamento da parte de (εξ). Compare com o verbo composto έκδικεΐς,


vingas, ou vingança exata a partir de (6.10). O sentido é: aquelejulgamento que lhe é
devido, ou o que elajulgou em relação a você.

21. Um forte anjo (εις άγγελος ισχυρός). Literalmente, sendo um numeral. Na


t e b e n v i , anjo poderoso.

Uma grande mó. Vide nota sobre Mt 18.6.

Com - ímpeto (όρμήματι). Literalmente, com um impulso ou empurrão. Somen­


te aqui no texto do Novo Testamento.

22. Harpistas. Vide nota sobre 14.2.

Músicos (μουσικών). Somente aqui no texto do Novo Testamento. Parece não


haver motivo especial para mudar a tradução para música dos tocadores, como na
t b . O termo música tinha um sentido muito mais amplo entre os gregos que o

que ligamos a ele.


464
A p o c a l ip s e - C a p. 18

A educaçãoprimitiva emAtenas consistiadedois ramos: g in á s tic a parao corpoe m ú ­


sica para amente. A música, desdeo início, englobava tudopertencenteàprovínciaou

àocupaçãodas nove musas; não apenas aprender o uso da lira ou comoparticipar de


umcoro, mas tambémoouvir, aprendererepetirascomposiçõespoéticas, bemcomoa
prática dapronúncia exata eelegante, cujaexecuçãoposterior, emumalíngua como a
grega, compalavraslongas, sílabasmedidasegrandediversidadedeacentuaçãoentre
umapalavra e outra, deve ter sido muitomais difícil deadquirirdoque acontececom
qualquer língua europeia moderna. Conforme a gama de idéias é ampliada, também
as palavras m ú sica e p ro fe sso r d e m ú sica adquirem um sentido expandido para com­
preender matérias de instrução, aomesmo tempo, mais amplas e mais diversificadas.
Em meados do século Y a.C., emAtenas, por isso, vierama ser encontrados entre os
professores de música, homens de habilidades e eminência mais destacadas, mestres
detodoensinoerealizações daera, ensinandoo queeraconhecidosobreAstronomia,
Geografia e Física, alémde ser capazes de manter discussões dialéticas comseus pu­
pilos sobretodos os vários problemasvindos àtona, naépoca, entreos intelectuais125.

Flauteiros (αυλητών). Na a r a , tocadores deflautas. Somente aqui e em Mt 9.23.


As flautistas, em geral personagens dissolutas, eram presença indispensável nos
banquetes gregos. No Symposium, Platão faz Erixímaco dizer: “Proponho que
seja dito para aquela flautista que acaba de entrar para sair e tocar para si mesmo
ou, se preferir, para as mulheres que estão lá dentro. Hoje, em vez disso, conver­
semos”126. Mais uma vez, Sócrates diz:

A conversa sobre os poetas parece-me como umentretenimentolugar-comumpara o


qual acompanhia vulgar temrecursos; que, por nãoconseguiremconversaredistrair
uns aos outros, enquantoestãobebendo, como somdesuasprópriasvozes econversa
pelomotivodesuaestupidez, aumentamopreçodas flautistas nomercado, contratan­
dopor umagrande somaavoz de uma flauta, emvez deseuprópriosopro, para ser o
meio da relaçãoentre eles127.

Compare com Is 24.8; Ez 26.13.

Mó. Compare com Jr 25.10; Mt 24.41.

23. Esposo —esposa. Compare com Jr 25.10.

Os grandes (μεγιστάνες). Na t b , príncipes. Vide nota sobre 6.15.

125. Grote, History of Greece, vi, cap. lxvii.


126 . Platão, Symposium, 176.
127. Sócrates, Protagoras, 347.

465
A p o c a l ip s e — C a p. 19

Foram enganadas (4πλανηθησαν). Ou desviadas. Vide nota sobre Mc 12.24.

Pelas tuas feitiçarias (4v τη φαρμακεία σου). Vide nota sobre 9.21. Na rv,

mais literalmente, com tuafeitiçaria.

C a pítu lo 19

1. Aleluia (αλληλούια). Hebraico. Louve o Senhor. Só em Apocalipse e nesse ca­


pítulo. Quinze dos salmos também começam ou terminam com essa palavra. Os
hinos de louvor judaicos (SI 104-109), entoados principalmente nas festas de
Páscoa e dos Tabernáculos, derivavam seus títulos de o Grande Hallel por causa
do uso frequente dessa expressão.

Honra. Omita. Acerca das doxologias em Apocalipse, vide nota sobre 1.6.

2. Verdadeiros (άληθινα'ι). Vide nota sobre Jo 1.9.

Tinha corrompido (^Oeipev). Na tb, corrompia. O tempo imperfeito deno­


tando hábito.

Das mãos dela (ac). Literalmente, “desde as mãos dela”. Vide nota sobre 2.7; 18.20.

Vingou (4ξεδίκησ6ν). Vingança exigida a partir de (4ξ).

3. Fumaça dela. Compare com Is 34.10.

5. Vós, todos os seus servos —tanto pequenos como grandes. Compare com
SI 114.13; 134.1.

7. As bodas do Cordeiro. Para a imagem, compare com Is 54.1-8; Ez 16.7-14;


Os 2.19; Mt 9.15; Jo 3.29; Ef 5.25.

8. Linho fino (βύσσινου). Vide nota sobre Lc 16.19. As quatro vestimentas do sa­
cerdote judeu comum eram feitas de linho ou bisso. Seu sentido simbólico depen­
de, em parte, da brancura e do brilho de sua substância (καθαρόν κα'ι λαμπρόν,
puro e brilhante).

Justiças (δικά κύματα). Mais estritamente, como na n v i , atosjustos.

10. Olha, não faças tal (όρα μή). Veja não (fazer isso).
466
A pocalipse - C ap. 19

O testemunho de Jesus (ή μαρτυρία του ΊησοΟ). Alguns explicam como ο


testemunho que procede de Jesus. Este, por meio da transmissão de seu testemu­
nho aos cristãos, transmite-lhes o espírito de profecia. Outros explicam como o
testemunho que é prestado a Jesus. A forma de dar esse testemunho, a substância
e essência desse testemunho é o Espírito de profecia.

11. Um cavalo branco. Compare com 6.2.

12. Diademas (διαδήματα). Vide nota sobre iPe 5.4; Tg 1.12.

13. Salpicada (β€βαμμένου). As leituras diferem, algumas apresentando


ρεραντισμένον, salpicada; outras, περιρεραμμένον, espargida. Na n v i , tin g id a .
Compare com Is 43.2,3.

A Palavra de Deus (ò Λόγος του 0eob). Esse nome para nosso Senhor
é encontrado dentro do Novo Testamento só nos escritos de João. Ele é um
dos elos que conecta o Apocalipse aos outros escritos de João. Compare com
Jo 1.1-14; Uo 1.1. Alguns objetam a isso com base no fato de que a expressão,
no Evangelho de João, é usada de forma absoluta, o Verbo, ao passo que aqui
ela é qualificada, a P a la v r a de D eu s, a qual o evangelista não emprega em ne­
nhuma outra passagem-, e, em lJo 1.1, P a la v r a d a v id a . Porém, como observa
Alford:

Pode-se deixar paraqualquer leitor comsensodejulgamentojusto decidir se, quando


se usa a notável designação ό Λόγος, a Palavra, não há umargumento muito maior
pela identidade que pela diversidade, toda vez que se acrescenta, como nessa ocasião
solene descrita emApocalipse, o atéaqui nãoouvido adjunto d e D eus.

A ideia de Deus representada aqui sustenta a expressão absoluta o Verbo, em


João 1.1. Insiste ainda mais nisso o fato de que, no Evangelho, ό Λόγος aplica-se
ao Cristo pré-histórico, ao passo que, nesta passagem, ao Cristo histórico. Mas
no versículo 12, não no versículo 13, a referência é ao nome do Cristo histórico.
E o nome “que ninguém sabia, senão ele mesmo”, expressando o caráter do todo
de sua obra redentora. O nome no versículo 13 é aquele que pertence original e
essencialmente a Ele.

14. Seguiam-no (ήκολούθ^ι). Observe o tempo imperfeito denotando progresso


e, assim, descrevendo o movimento de avanço do anfitrião.

15. Espada. Vide nota sobre 1.16.


467
A pocalipse - Cap. 19

Ferir (πατάσση). Vide nota sobre 11.6.

Regerá (ποιμανει). Vide n o ta sobre 2.27.

Lagar. Vide n o ta sobre 14.19.

Do furor e da ira (τοϋ θυμοϋ τής όργής). Omita e, e traduza, como a n v i : do


nota sobre Jo 3.36.
f u r o r d a ira. Vide

Do Deus Todo-Poderoso (του Θεού τοϋ παντοκράτορος). Literalmente, do


nota sobre 1.8.
D eus o todo-governador. Vide

16. Na sua coxa. Alguns explicam sobre a veste no lugar em que ela cobre a coxa
à qual a espada está presa. Compare com SI 44.3. Outros explicam em parte sobre a
veste, em parte sobre a própria coxa em que, em uma imagem equestre, o manto cai
da coxa. De acordo com a primeira explicação, και, e, tem que ser tomado como ex­
plicativo ou determinativo das palavras na veste. Outros ainda supõem uma espada
sobre o punho da qual está escrito o nome. Os expositores referem-se ao costume
de gravar o nome do artista sobre a coxa da estátua. Por isso, Cícero diz: “Uma das
mais belas estátuas de Apoio, sobre a coxa da qual foi gravado o nome de Myron
em pequenas letras de prata”128. Heródoto descreve uma imagem de Senuseret car­
regando, atravessado de ombro a ombro no peito, a inscrição do caráter sagrado
do Egito: “Com meus próprios ombros conquistei essa terra”123. Rawlinson diz que
as imagens assírias são encontradas em inscrições cuneiformes gravadas ao longo
delas e sobre o tecido, como também sobre o corpo.

17. Um anjo (ενα άγγελον). Literalmente, sendo um numeral.

As aves (όρνέοις). Vide nota sobre 18.2. Na Th, pássaros.

Meio do céu. Vide n o th sobre 8.13.

Ajuntai-vos (συνάγεσθε). Os melhores textos trazem συνάχθητε, sede reunidos,


como na r v . Compare com Ez 39.17ss.

A ceia do grande Deus (το δείπνου τοϋ μεγάλου Θεοϋ). Em lugar de τοϋ μεγάλου,
leia το μεγα τοϋ, e traduza: a gran de ceia de Deus. Na n v i e teb , g ran de banquete.

128. Cícero, Contra Ferres, iv, 43.


129. Heródoto, ii, 106.

468
A p o c a l ip s e — Cap. 2 0

18. Tribunos (χιλίαρχων). Vide n ota sobre Mc 6.21; Lc 7.2.

20. Foi presa (έττιάσθη). Vide nota sobre At 3.7.

Sinal. Vide nota sobre 13.16.

Lago (λίμνην). Vide nota sobre Lc 5.1.

Enxofre. V ide nota sobre 14.10.

21. Se fartaram (έχορτάσθησαν). V ide nota sobre M t 5.6.

C apítulo 2 0

1. Do abismo. Vide nota sobre 9.1. Esse deve ser distinguido do lago de fogo.
Compare com o versículo 10.

Cadeia (άλυσιν). Vide nota sobre Mc 5.4. Somente aqui nos escritos de João.

Na sua mão (étrí). Literalmente, sobre·, repousando sobre ou pendurada sobre.

2. Ele prendeu (έκράτησ^ν). V ide nota sobre Mc 8.3; At 3.11.

O dragão (τον δράκοντα). Vide nota sobre 12.3. A palavra é comumente deri­
vada de ’έδρακον, o segundo aoristo de δέρκομαι, v e r claramente, em alusão à vista
aguçada do dragão fictício.

Antiga (άρχαίον). Vide nota sobre lJo 2.7.

O diabo. Observe os três epítetos: a a n tig a serpente, o diabo, Satanás. Vide nota
sobre Mt 4. 1; Lc 10 . 18 .

3. Pôs selo. VidenotdL sobre Jo 3.33.

Importa (ôei). De acordo com o propósito de Deus. Vide nota sobre Mt 16.21;
Lc 2.49; 24.26.

4. Tronos. Vide nota sobre 2.13.

Assentaram-se. Todos os membros fiéis da igreja de Cristo. Compare com


reinaram com Cristo.

469
A pocalipse - C ap . 2 0

Degolados (πεπελεκισμενων). De πέλεκυς, machado. Somente aqui no texto do


Novo Testamento.

Viveram. Equivale a viveram d e novo. Compare com o versículo 5.

5. Reviveram (άνεζησαν). Leia εζησαν, viveram , como no versículo 4.

6. Tem parte (εχων μέρος). Expressão peculiar a João referindo-se a uma pessoa.
Compare com Jo 13.8.

Segunda morte. V ide nota sobre 2.11.

8. Gogue e Magogue. Vide Ez 38.39. Compare com Gn 10.2, em que Magogue


aparece como filho de Jafé. Magogue é um nome genérico para as nações do
norte e, de acordo com Ezequiel, Gogue é seu príncipe. Josefo diz que os descen­
dentes de Magogue eram os citas.

9. Sobre a largura (επ'ι το πλάτος). Literalmente, acim a d e (επί). Como distinto


dos “quatro cantos” do versículo 8. Eles se espalharam na terra.

O arraial (την παρεμβολήν). V ide nota sobre fo r ta le z a , At 21.34. Cercando e


defendendo a cidade. Compare com SI 34.7.

A cidade amada. Compare com SI 78.68.

[D e Deus] do ceú. Conforme a k jv (cp. t r ). N o n t ia (cp. t m ), do cêu d a p a r te


de Deus.Omita, como na arc .

12. Diante do trono. Leitura correta, θρόνου, trono-, contra a leitura Θεοί), D eus
( kjv , cp. t r ).

Os livros (βιβλία). Sem artigo. Leia livros. Como na nvi e teb . Compare com Dn 7.10.

Livro, que é o da vida. Vide nota sobre 3.5.

13. O mar. Como é entendido comumente, o mar quer dizer o mar literal. A pas­
sagem representa que os mortos que ali se encontram ressuscitarão, como relata
Alford. Outros intérpretes, contudo, dizem que não pode ser o mar literal, como
por exemplo Milligan. Ele argumenta que os símbolos em Apocalipse devem ser
sempre interpretados da mesma maneira. Ele comenta:
470
A pocalipse - Cap. 21

Símbolos sâoumaforma defalare, logo, sujeitos às regras queregulamentamainterpre­


tação detodafala [···] O poder dessaconvenção, queliga umdeterminadosentidoa um
determinadosomnostermoscomuns, nãoémenosobrigatórionapresençaquenaausência
dametáforadequalquertipo. Assim, quandolemosemApocalipse“omar”comumemblema
denaçõesinquietasepecadorasdaterra, somosobrigados- anãoserquesejamosproibidos
pelocontexto- apersistirnessainterpretaçãoeaentenderomardo m undo inquieto epecador.

Inferno (ò αδης). Na n v i , Hades. Vide nota sobre Mt 16.18.

14. Esta é a segunda morte. Acrescente o lago defogo. Como na a r a , t b , b j .

15. E aquele que (e’í τις). Literalmente, se alguém. Como na a r a .

C apítulo 2 1

1. Novo (καινόν). Vide nota sobre M t 26.29. Compare com Is 65.17.

O mar já não existe (ή θάλασσα ούκ êotiv eti). Literalmente. Aqui como
em 20.13. Alguns explicam o mar como o mundo ímpio. Não posso deixar de
achar essa interpretação forçada. De acordo com essa explicação, a passagem é
extremamente tautologies. A primeira terra passou, e o mundo ímpio não existe mais.

2. Eu, João. Omita João.

Nova Jerusalém. Outros juntam nova com descia e traduzem por: descendo
nova do céu.

Uma esposa. Compare com Is 61.10; 62.5.

3. Com os homens. Homens de forma geral. Não mais como um povo isolado
como Israel.

Habitará (σκηνώσα). Literalmente, tabernáculo. Só em Apocalipse e em


Jo 1.14. A palavra “denota muito mais do que a mera noção geral de habitar. Nela
repousa uma das particularidades dessa identificação de Cristo e seu povo que é
fundamental para o profeta”. Videnota sobre Jo 1.14. Compare com Ez 37.27-28.

Povo (λαο'ι). Observe o plural, povos (como na nvi ), porque muitas nações par­
ticipam do cumprimento da promessa. Compare com o versículo 24.

E o mesmo Deus estará com eles e será o seu Deus. E será foi inserido. No
grego, está: estará com eles seu Deus.
471
A pocalipse - C ap . 21

4. E Deus limpará. Omita Deus. Leia, como na t b : e enxugará.

Toda lágrima (παν δάκρυον). Literalmente. Compare com Is 25.8.

Não haverá mais morte (ò θάνατος ούκ εσται exi). Traduza, como a rv : a
morte não existirá mais.

Pranto (πένθος). Melhor, como na teb , luto, uma vez que a palavra tem o sen­
tido de pesar manifestado. Vide nota sobre M t 5.4; T g 4.9. Compare com Is 65.19.
Sócrates observa:

Suponhamos que seja pura a alma que se separa do corpo £...]. Ora se tal é o seu es­
tado, é para o que se assemelha que ela se dirige, para o que é invisível, para o que é
divino, imortal e sábio; é para o lugar onde sua chegada importa na posse da felicidade,
onde divagação, irracionalidade, terrores, amores tirânicos e todos os outros males da
condição humana cessam de lhe estar ligado, e onde, como se diz dos que receberam a
iniciação, ela passa na companhia dos deuses o resto do seu tempo!'30

Também Sófocles:

O pesar não atinge os m ortos191.

“Como são felizes os mortais que, tendo esses fins em vista, partem para o
Hades, pois só a eles é dado viver lá, mas para os outros, todas as coisas lá são
malignas.”132 E Euripides:

A morte, sem lágrimas, esquece suas dores193.

5. Verdadeiras e fiéis (αληθινοί καί πιστοί). A ordem apropriada em grego é a


inversa, como na a ra :fiéis e verdadeiras.

6. Está cumprido (γέγονεν). A leitura correta é γέγοναν, elas se realizaram (cp.


bj ). Ou seja, essas palavras.

O Alfa e o Ômega. Vide nota sobre 1.8.

Quem quer que tiver sede. Compare com Is 55.1.

ISO. Platão, Diálogos II: Fêdon, 81, p. 113.


181. Sófocles, Édipo em Colono, tradução Cristiane Patrícia Zaniratto, 955. Disponível em: < h ttp ://
pensamentosnomadas.files.wordpress.com/2 0 1 2 /0 3 /cSa9dipo-em-colono.pdf>. Acesso em: 28 jun.
2013.
132. Id., Fragmento.
133. Euripides, Troades, 606.

472
A p o c a l ip s e - C a p. 21

Fonte (πηγής). V ide nota sobre Jo 4.6.

Da água da vida. Vide Jo 4.10,14. Compare com Is 12.3.

7. Todas as coisas (πάντα). A leitura correta é ταϋτα, estas coisas. Como n a ara .

Seu Deus (αύτφ Θεός). Literalmente, Deus para ele.

Meu filho (μοι ò υιός). Literalmente, ofilho para mim. Vide nota sobre Jo 1.12.
Essa é a única passagem dos escritos de João onde a palavra υιός, filh o, é usada
para a relação do homem com Deus.

8. Tímidos (δειλοΐς). O caso dativo. Por isso, como na a r c , quanto aos tímidos. Na
bj e teb , quanto aos covardes. Somente aqui, em Mt 8.26 e Mc 4.40.

Abomináveis (έβδελυγμενοις). Vide nota sobre abominação, Mt 24.15. Propria­


mente, poluídos com abominação.

Fomicadores (πόρνοις). Tradução muito melhor que a da k jv , prostitutos. N a


ara , impuros·, na bj e teb , impudicos.

Feiticeiros. Vide nota sobre feitiçarias, 9.21.

A sua parte será (το μέρος αύτών). Literalmente, a passagem toda diz: quanto
aos tímidos r...j sua parte. Será foi suprido.

9. Veio [[até mim[]. Conforme a kjv (cp. t r ). Omita, como na a r c .

Taças. Salvas é a tradução mais apropriada. Vide nota sobre 5.8.

10. Em espírito. Vide nota sobre 1.10.

Monte. Compare com Ez 40.2.

A grande cidade, a santa Jerusalém. Omita grande. Traduza o artigo de for­


ma usual, e não como pronome demonstrativo, e na construção junte santa com
cidade. Como na n v i : a Cidade Santa, Jerusalém.

11. Glória de Deus. Não apenas esplendor divino, mas a presença do próprio
Deus da glória. Compare com Ex 60.34.

Luz (φωστηρ). Estritamente, corpo luminosa, aquele com que a cidade é iluminada,
o Cordeiro celestial. Vide o versículo 23. A palavra ocorre somente aqui e em Fp 2.15.
473
A pocalipse - C ap . 21

Jaspe. Vide nota sobre 4.3.

Como o cristal resplandecente (κρυσταλλίζοντι). Literalmente, brilhante


como cristal.

12. E tinha (εχουσάν τε). Na rv, mais simples e literalmente, tendo.

Portas (πυλώνας). Propriamente portas grandes. Vide nota sobre Lc 16.20;


At 12.13. Compare com Ez 68.30ss.

13. Levante (ανατολής). Vide nota sobre M t 2.2, e sobre oriente do alto, Lc 1.78.
Vide as tribos arranjadas pelas portas em Ez 68.31-34.

Banda do poente (δυσμών). Literalmente.

14. Fundamentos (θεμελίους). Vide nota sobre o verbo relacionado θεμελιώσει,


confirmará, lPe5.10.

Neles, os nomes (έν αύτοις όνόματα). A leitura correta é: επ’ αύτών δώδεκα
ονόματα, sobre eles doze nomes. Na tb e t e b , os doze nomes.

15. Cana de ouro. Acrescente μέτρον, como medida. Vide 11 . 1. Compare com
Ez 40.5. Na t e b , uma medida, uma cana de ouro.

16. Quadrado (τετράγωνος). De τετρά, quatro, e γωνία, ângulo. Somente aqui no


texto do Novo Testamento. Compare com Ez 48.16,20.

Doze mil estádios (επί σταδίων δώδεκα χιλιάδων). Estritamente, ao cumpri­


mento de (επί) doze. Para o termo coletivo χιλιάδες, milhares, vide nota sobre 5.11.
Para estádios, vide nota sobre 15.20. Os doze mil estádios seriam 2.219,24 quilô­
metros. As interpretações variam muitíssimo, sendo impossível apresentá-las. A
descrição parece ser de um imenso cubo, o que pode ter sido sugerido pelo Santo
dos Santos do tabernáculo, que tinha esse formato134·. Mas as opiniões divergem

134. Essa planta cúbica não se aplica só ao tabernáculo, mas também à arca do dilúvio, ao templo
de Salomão e à “casa do rei”, e é minuciosamente desenvolvida em The Holy Houses, pelo Dr.
Timothy Otis Paine. Esse livro, cheio de erudição curiosa, trata o tabernáculo, a arca de Noé, o
templo e o capitólio, ou casa do rei, como desenvolvidos a partir de um tipo em comum; mas que
prossegue até a totalmente indefensável hipótese de que o templo da visão de Ezequiel era o de
Salomão, e que, por conseguinte, todos os dados dos dois livros de Reis e das profecias de Jere­
mias e Ezequiel são fornecidos para uma completa restauração do templo, com a visão profética
de Ezequiel fornecendo os detalhes omitidos no registro histórico dos livros de Reis.

474
A pocalipse - C ap. 21

quanto a se os doze mil estádios são a medida dos quatro lados da cidade juntos
ou se representam o comprimento de cada lado da cidade. A primeira explicação
é estimulada pelo desejo de reduzir a vasta dimensão da cidade. Outra dificulda­
de é levantada quanto à altura. Düsterdieck, por exemplo, sustenta que as casas
tinham três mil estádios de altura. Levanta-se a questão se a superfície vertical
do cubo inclui a colina ou rocha sobre a qual a cidade está colocada, percepção
essa à qual Alford se inclina. Essas coisas são suficientes para mostrar como são
totalmente fúteis as tentativas de reduzir essas visões simbólicas em afirmações
matemáticas. O Professor Milligan comenta habilmente: “Tampouco, não tem a
menor relevância reduzir as enormes dimensões mencionadas. Nenhuma redu­
ção as traz aos limites da verossimilhança, e não se exige nenhum esforço nesse
sentido. A ideia é só para ser imaginada”.

17. Côvados (πηχών'). O sentido original da palavra é a parte do braço entre a


mão e a junta do cotovelo, o antebraço. Daí côvado ou vara, uma medida da distân­
cia da junta do cotovelo até o topo do dedo médio, ou seja, aproximadamente 45
centímetros. Contudo, o comprimento exato é debatido. C ôvado deriva do latim
cubitus, o cotovelo, sobre o qual o indivíduo se reclina {cubai). Alguns entendem os
cento e quarenta e q u atro côvados como representando a altu ra do muro; outros re­
presentando a espessura. Se for a altura, então eles devem ser interpretados como
iguais a doze mil estádios, uma vez que o comprimento, a largura e a altura da
cidade são iguais (v. 16). Contudo, deve-se observar que há uma distinção entre
a medida da cidade e a medida do muro. Düsterdieck comenta: “O muro mais in­
significante, é suficiente para excluir tudo que é impuro”.

A medida de homem, que é a de um anjo. Milligan afirma: “Este é o lugar


de moradia dos homens, por isso, mesmo quando um anjo medir o local, ele mede
de acordo com a medida de um homem”.

18. A fábrica (ένδόμησις). Somente aqui no texto do Novo Testamento. De kv,


em, e δωμάω, construir. Literalmente, aquele q u e fo i contruído em. Por isso, a fá b ric a
do seu muro é o material construído no muro; do qual o muro é composto.

Vidro (ύάλω). Somente aqui e no versículo 21. Para o adjetivo relacionado


ύάλινος, de vidro, v id e nota sobre 4.6.

19. De toda pedra preciosa. Compare com Is 54.11-12; lCr 29.2.

Safira (σάπφειρος). Compare com Is 54.11; Ez 1.26. Provavelmente, lá pis-lazú li.


Supõe-se que nossa safira seja representada p e lo ja c in to do versículo 20. Plínio des-
475
A pocalipse - Cap. 21

creve a σάπφειρος como opaca e salpicada com partículas de ouro, além de afirmar
que ela veio da Média (ou seja, Pérsia e Bokhara), de onde o suprimento é trazido
até hoje. King, citado por Lee, diz:

Antes de as verdadeiras pedras preciosas seremintroduzidas apartir da índia, a pe­


dra l ã p is - la z ú li detinha o mais alto lugar na avaliaçãodas nações primitivas daÁsia e
Grécia; na verdade, ela era quase a única pedraconhecida por essas nações tendo cor
bonita, oque arecomendava135.

Calcedônia (χαλκηδών). Da Calcedônia, onde a pedra foi descoberta nas mi­


nas de cobre da vizinhança. Era, provavelmente, uma espécie inferior de esme­
ralda, como cristal de carbonato de cobre, que ainda é popularmente chamada de
“a esmeralda de cobre”. Plínio descreve-a como pequena e frágil, mudando de cor
quando girada, como as penas verdes no pescoço dos pavões e pombos.

Esmeralda. Vide nota sobre 4.3.

20. Sardônica (σαρδόνυξ). A mais bela e mais rara variedade de ônix. Plínio
define-a como originalmente significando um a m arca branca em um sárdio, como
a unha hum ana (δνυξ) p o sta sobre a carne, e am bos transparentes. O ônix recebe esse
nome por causa da parecença de seus veios brancos e amarelos com as sombras
na unha humana. Os gregos primitivos não faziam distinção entre o ônix e a
sardônica.

Sárdio. Vide nota sobre 4.3.

Crisólito (χρυσόλιθος). De χρυσός, ouro, e λίθος, pedra. Literalmente, p ed ra de


ouro. Identificada por alguns com nosso topázio-, por outros, com o âm bar. Plínio
descreve-o como “translúcido com brilho dourado”.

Berilo (βήρυλλος). Plínio diz que ele lembra o verdor do mar puro. Supõe-se
que é da mesma natureza da esmeralda, ou similar a ela.

Topázio (τοπάζιον). Compare com Jó 28.19. O nome foi derivado de uma ilha
do mar Vermelho onde a gema foi descoberta. A pedra é o nosso perid o to . Os lapi-
dários romanos distinguiam as duas variedades, a chrysopteron, nossa crisólita, e a
prasoides, n o s s o peridoto. A primeira é muito mais dura e a cor amarela predomina
sobre a verde. O topázio moderno era totalmente desconhecido na Antiguidade.

1S5. King, Precious Stones and Gems.


476
A pocalipse - Cap. 21

Crisópraso. De χρυσός, ouro , e πράσου, alho-porro. A cor é um verde dourado


translúcido como o do alho-porro. De acordo com Plínio, essa pedra era uma
variedade do berilo.

Jacinto (υάκινθος). Vide nota sobre 9.17.

Ametista (αμέθυστος). De ά, não, e μεθύω, ser em bebedado com vinho. Supunha-


-se que a pedra prevenia a intoxicação. Plínio distingue-a do jacinto, no fato de
que, na última, o tom violeta da ametista é diluído. A pedra é o quartzo de ame­
tista, ou cristal de rocha, de cor púrpura por causa do manganês de ferro.

21. Pérolas (μαργαρίται). A pérola parece ser conhecida desde os tempos mais
remotos pelos gregos asiáticos em consequência das relações deles com os per­
sas. Entre os motivos que impeliram César a tentar a conquista da Grã-Bretanha
estava o da fama de suas áreas de pesca de ostra. As pérolas detinham a clas­
sificação mais alta entre as pedras preciosas. O termo latino unio (u nidade ) era
aplicado à pérola porque não se encontrava duas pérolas exatamente iguais; mas,
com o tempo, a palavra ficou restrita às pérolas finas, esféricas, enquanto o nome
genérico passou a ser m argarita. Shakespeare usa union para se referir à pérola
em H am let:

O rei beberá àmelhor saúde de Hamlet:


E nataça uma union, ele lançará
Mais rica do queaquela quequatro sucessivos reis
Na coroa daDinamarca usaram.

E mais uma vez:

Bebedesta poção: estátua u n ion aqui?156

Cada uma das portas (άνά εις 'έκαστος των πυλώνων). Na rv, cada um a das
salientando, assim, a força do genitivo πυλώνων, d e p o rta s. A ideia
d iversa s p o rta s,
de diversas é transmitida por άνά, como: Lc 9.3, άνά δύο χιτώνας, “duas túnicas
cada u n i’ (cp. teb ); e Jo 2.6, άνά μετρητάς δύο η τρεις, “em cada um a cabiam duas
ou três metretas”.

P raça (πλατεία). V ide n o t a sobre Lc 14.21. De πλατύς, am p lo . Daí o c a m i­


nho am p lo .

136. Shakespeare, H a m let, ato v, seção 2.


477
A pocalipse - C ap. 22

22. Não vi templo. Agora, a cidade toda é um templo santo de Deus. Vide nota
sobre 1.6.

23. A glória de Deus a tem alumiado. Compare com Is 60.19-20.

A sua lâmpada (ό λύχνος). Tradução melhor que a da e c p , luz. Vide nota sobre
Jo 5.35.

2 4 . [Daqueles que estão salvos.] Conforme a kjv (cp. t r ). Omita, como na arc.

À sua luz (διά τού φωτός). “No meio da luz”, ou “mediante a luz”. Contra a lei­
tura: év τω φωτί, na luz (cp. nvi).

Trarão (φέρουσιν). Trata-se do tempo presente, trazem (cp. a r a ), denotando


hábito.

Glória e honra. Omita e honra. Compare com Is 60.3.

27. Que contamine (κοινοϋν). O particípio. Porém, a leitura correta é o adjetivo


κοινόν, comum, daí não santificado. Na n v i , impuro.

Que £...] cometa (ποιούν). Literalmente, faça ou execute.

Além disso, por todo o tempo que durar nossa vida, estaremos mais próximos do
saber, parece-me, quando nos afastarmos o mais possível da sociedade e união como
corpo, salvo emsituações de necessidade premente, quando, sobretudo, não estiver­
mos mais contaminados por sua natureza, mas, pelo contrário, nos acharmos puros
de seucontato, eassimatéo diaemque oDeus houver desfeitoesses laços. E quando
dessamaneira atingirmos apureza, pois queentãoteremos sidoseparados dademên­
cia docorpo, deveremos mui verossimilmente ficar unidos aseres parecidos conosco;
epor nós mesmos, unicamente por nós mesmos, conheceremos semmistura alguma
tudoo queé. E nisso, provavelmente, éque hádeconsistir averdade. Comefeito, élí­
cito admitirquenãosejapermitido apossar-sedoqueépuro, quandonão seépuro!137

C apítulo 22

1. Puro. Omita.

Claro (λαμπρόν). Vide nota sobre Lc 23.11. Na t e b , brilhante.

137 . Platão, Diálogos II: Fédon, 67, p. 89-90.

478
A pocalipse - C ap. 22

2. No meio da sua praça. Alguns ligam essas palavras às precedentes. Como na nvi.

D e uma e da outra banda (εντεύθεν και έκεΐθεν). Na rv, neste lado e naquele,
no ntia, daqui e dali (campo interlinear). Contra a leitura εντεύθεν και έντεϋθεν,
que a kjv traduz: em cada lado; cp. teb, dos dois braços.

Árvore (ξύλον). Fide nota sobre Lc 23.31 e Ap 2.7.

Doze frutos (καρπούς δώδεκα). Literalmente. Alguns traduzem por frutifica


doze vezes, como na nvi e teb, ou safras defruto. Sobre esses dois versículos, com­
pare com Ez 47.1-12; J1 3.18; Zc 14.8.

3. O servirão (λατρεύσουσιν). Vide nota sobre Lc 1.74.0 sentido original da pala­


vra é servirpor salário. Nas páginas do Novo Testamento, é usada para a adoração
ou culto a Deus nos encontros pretendidos para sua adoração. Ela passou a ser
usada pelos judeus em um sentido muito especial, denotar o serviço feito para
Jeová pelos israelitas como seu povo peculiar. Vide Rm 9.4; Atos 26.7; Hb 9.1,6.
Por isso, a relevante aplicação do termo para o serviço cristão por Paulo, em Fp 3.3.

4. Verão o seu rosto. Compare com lJo 3.2; M t 5.8; Êx 33.20; SI 17.15.

5. Ali (εκεί). Substitua por ετι, m ais nenhuma. Na nvi, não haverá m a is noite.

6. O Senhor, o Deus (Κύριος ό Θεός). Tradução preferível; contra a tb e bj, o


S en h or Deus.

Dos santos profetas (των άγιων προφητών). Substitua αγίων, santos, por
πνευμάτων, espíritos, e traduza, como na nvi: o D eu s dos espíritos dos profetas. Tex­
tos melhores registram: των πνευμάτων των προφητών.

Acontecer (γενεσθαι). Tradução melhor que a da kjv, serfeitas.

7. Guarda (τηρών). Uma das palavras favoritas de João, ocorrendo em seus es­
critos com mais frequência que em todo o resto do Novo Testamento junto. Vide
nota sobre guardada, em lPe 1.4.

Livro (βιβλίου). Diminutivo, propriamente livrinho ou rolo. Vide nota sobre


carta, Mt 19.7; carta, Mc 10.2; livro, Lc 4.17.

8. Eu, João, sou aquele que vi (εγώ ’Ιωάννης ό βλεπων). A kjv desconsidera ο
artigo com o particípio - o vendo, o que vê. Textos melhores registram ò άκούων
479
A pocalipse - Cap. 22

κ α ί βλέπω ν, m as a arcinverte os verbos. Por isso, a tb traduz: Eu, João, sou o que
ouvi e vi. Contudo, o n tia observa o particípio presente: o que ouve e que vê (campo
interlinear).

Ouvido e visto (ήκουσα καί εβλεψα). Tempo aoristo. Não há necessidade de


traduzir como particípio. Na rv, corretamente, quando eu ouvi e vi; na ara e tb,
quando as ouvi e vi. O apelo para ouvir e ver é comum a todos os escritos de João.
Vide Jo 1.14; 19.35; 21.14; lJo 1.1-2; 4.14.

9. Olha, não faças tal (δρα μή). Literalmente, veja não.

Teus irmãos, os profetas. A irmandade espiritual de João com os profetas é


exibida em Apocalipse.

10. Seles (σφράγισης). Na rv, lacres; na teb, mantenhas em segredo. Há dezoito


ocorrências dessa palavra em Apocalipse e duas no Evangelho, mas só cinco em
outras passagens do Novo Testamento. Ela quer dizer confirmar ou atestar (Jo
3.33); lacrarpara segurança (Mt 27.66; Ap 20.3); ocultar ou manter segredo (Ap 10.4;
22.10); assinalar uma pessoa ou coisa (Ap 7.3; Ef 1.13; 4.30).

Tempo (καιρός). Vide nota sobre M t 12.1.

11. Injusto (άδικων). Na rv, melhor, iníquo; na bp, malvado.

Faça injustiça (άδικησάτω). O verbo tem o sentido áe fazer com perversidade.


Por isso, a rv traduz, corretamente: que pratique iniquidade.

Quem está sujo (ò ρυπών). Somente aqui no texto do Novo Testamento.


Acerca do substantivo relacionado ρύπος, imundo, vide nota sobre lPe 3.21. O
termo ρυπαρία, imundícia, ocorre somente em T g 1.21; e o adjetivo ρυπαρός,
imundo, só em Tg 2.2.

Suje-se (ρυπωσάτω). Os melhores textos trazem ρυπανθήτω, que seja feito


imundo. Como na rv.

Faça justiça (δικαιωθήτω). Leia δικαιοσύνην ποιησάτω, que pratique equidade.


Como n a rv.

Seja santificado (άγιασθητω). A arc transmite literalmente a força da voz


passiva. Na rv, que sejafeito santo.
480
A pocalipse - C ap . 22

12. Meu galardão está comigo (ò μισθός μου μετ’ εμού). Μισθός, galardão,
recompensa, refere-se estritamente a salário. Compare com Is 40.10; 42.11. Vide
nota sobre 2Pe 2.13.

([Será] (εσται). Conforme a kjv e ntia (cp. tr e tm); a arc não traz. Leia εστιν,
é. segundo sua obra é (cp. rv).

D ar (άποδοΰναι). Literalmente, d a r de v o lta ou em reto m o p o r. Dessa forma, é


apropriado seu uso com μισθός, recompensa. Por isso, é melhor a tradução da ara
e TB: retribuir. Vide nota sobre presta contas, Lc 16.2; e davam , At 4.33.

14. Aqueles que lavam as suas vestiduras (oi πλύνοντες τάς σχολάς αυτών).
Conforme a melhor leitura; contra a leitura oi ποιοΰντες τάς εντολάς αύτοϋ,
aqueles que p ra tica m os seus m andam entos (cp. kjv e ntia). Compare com 7.14.

Para que tenham direito à árvore da vida (ίνα εσται ή εξουσία αυτών επί
το ξύλον τής ζωής). Literalmente, a f im de que deles seja a a u to rid a d e sobre a árvore
da vid a . Para εξουσία, direito, autoridade, vid e nota sobre Jo 1.12. A preposição επί
pode ser a de direção: “para que tenham o direito de se chegarem a (como na tb),
ou pode ser traduzida por sobre.

15. Os cães (oi κύνες). A kjv omite o artigo em “os cães”. Compare com Fp 3.2.
Este era o termo de reprovação com que os judaizantes estigmatizavam, como
impuros, os gentios. Na lei mosaica a palavra é usada para denunciar as devas­
sidões da adoração pagã (Dt 23.18). Compare com Mt 15.26. Aqui a palavra é
usada para aqueles cuja impureza moral os exclui da nova Jerusalém. Lightfoot,
sobre Fp 3.2, comenta:

Como termodereprovação, apalavra nos lábios de umjudeu representavaprincipal­


mente im p u re za ; nos deumgrego, a trevim en to . A s matilhas decães quevagavampelas
cidades orientais, semcasa e semdono, alimentavam-se de restos edo lixo das ruas,
disputando-os entre eles mesmos eatacando os transeuntes, esse fato explica as duas
aplicações da imagem.

Feiticeiros. Vide nota sobre 9.21, e compare com 21.8.

Os que se prostituem (πόρνοι). Na t b , m elh o r, Jorm cários.

Comete (ποιων). Ou p ra tica (cp. tb). Compare com p ra tic a a verdade, Jo 3.21;
Do 1.6. V ide nota sobre Jo 3.21.
481
A pocalipse —Cap. 22

16. A Raiz. Compare com Is 11.1,10. V ide nota sobre N a za ren o , Mt 2.23.

Estrela da manhã. Vide nota sobre 2.28.

17. O Espírito. Na igreja.

A esposa. A igreja.

Ouve. A voz do Espírito e da esposa.

19. Da árvore da vida. Conforme a melhor leitura, του ξύλου, d a árvore-, em


contrapartida, na k j v , “do L iv r o de Vida”.

20. Ora (vai). Palavra de afirmação, sim. Omita, como na t b , n v i , b j, entre outras.

21. Nosso Senhor (ημών). Omita.

Com todos vós (μετά ιτάντων υμών). As leituras diferem. Alguns leem: μετά
πάντων, com todos, omitindo vós. Outros: μετά τών αγίων, com todos os santos.

482
L ista de P alavras e E xpressões G regas
E mpregadas somente por J oão

Palavras peculiares ao Evangelho, às epístolas ou ao Apocalipse estão mar­


cadas respectivamente com Jo, lJo, 2J0, SJo, Ap. Também palavras comuns ao
Evangelho e a qualquer um dos outros escritos.

"Αλφα, | Alfa, 'ϊ


Ap Ap 1.8,11; 21.6; 22.13
το A καί το Ω, ' Alfa e Omega, *
Άβαδδών, Abadom, Ap Ap 9.11
αγγελία, mensagem, lJo lJ o 3 .ll
αγγέλλω, anunciar, Jo 20.18
αΙχμαλωσία, cativeiro, Ap Ap 13.10
ακμάζω, estar madura, Ap Ap 14.18
άλιεύω, ir pescar, Jo 21.3
άλλαχόθεν, por outra parte, Jo 10.1
αλληλούια, aleluia, Ap Ap 19.1,3-4,6
αλόη, aloés, Jo 19.39
αμαρτίαν έχειν, ter pecado, Jo, lJo 9.41; 15.22,24; 19.11;
lJo 1.8
αμέθυστος, ametista, Ap Ap 21.20
ό ’Αμήν, o Amém, Ap Ap 3.14
άμήν, αμήν, na verdade, na ver­ Jo 1.51; 3.3,5; 5.19 etc.
dade,
αν (forma contraída se, Jo 13.20; 16.23 (cp. ara);
de έάν), 20.23 (cp. ara)
άνά εις έκαστος, cada uma das, Ap Ap 21.21
αναμάρτητος, sem pecado, Jo 8.7 (passagem rejei­
tada)
άνάστασις ζωής, ressurreição da vida, Jo 5.29
άνάστασις κρίσεως, ressurreição do ju­ Jo 5.29
ízo (cp. ara),
ανθρακιά, brasas, Jo 18.18; 21.9
άνθρωποκτόνος, homicida, assassino, Jo, lJo 8.44; lJo 3.15
αντίχριστος, anticristo, lJo, 2J0 lJo 2.18,22; 4.3; 2Jo 7
άντλέω, tirar (água ou vinho), Jo 2.8-9; 4.7,15
άντλημα, algo com que tirar, Jo 4.11
άπεκρίθη κα'ι είπε, ele respondeu e dis­ Jo 2.19; 3.3; 4.10 etc.
se,
483
L ista de Palavras e E xpressões G regas E mpregadas somente por J oão

απέρχομαι εις τα ir, seguir, ir após, Jo 12.19


όπίσω,
Άπολλύων, Apoliom, Ap Ap 9.11
αποσυνάγωγος, expulso/expulsar Jo 9.22; 12.42; 16.2
da sinagoga,
άραφος, sem costura, Jo 19.23
άρκος, um urso, AP Ap 13.2
Άρμαγεδών, Armagedom, Ap Ap 16.16
άρχιτρίκλινος, mestre-sala, Jo 2.8-9
ό αρχών του κόσμου príncipe deste mun­ Jo 12.31; 14.30; 16.11
(τούτου), do,
άψινθος, absinto, Ap Ap 8.11
βάλλε ιν σκάνδαλον lançar tropeços dian­ Ap Ap 2.14
ενώπιον, te,
βαίον, ramos, Jo 12.13
βασανισμός, tormento, Ap Ap 9.5; 14.11; 18.7,
10,15
βάτραχος, rãs, Ap Ap 16.13
βήρυλλος, berilo, Ap Ap 21.20
βιβλαρ ίδιον, livrinho, Ap Ap 10.2,8-10
βίβρώσκω, comer, Jo 6.13
βότρυς, cachos (de uva), Ap Ap 14.18
βροντή, trovão, Jo, Ap 12.29; Ap 4.5; 6.1 etc.
Em Mc 3.17, como
uma tradução
βύσσινος, linho fino, Ap Ap 18.16; 19.8,14
Γαββαθά, Gabatá, Jo 19.13
γενετή, nascença, Jo 9.1
γεννηθήναι άνωθεν, nascer de novo, ou Jo 3.3
nascer do alto,
γεννηθήναι έκ (τού) nascer de Deus, Jo, lJo 1.13; Do 3.9; 4.7; 5.1,
Θεού, 4,18
γεννηθήναι εκ (τού) nascer do Espírito, Jo 3.5-6,8
πνεύματος,
γέρων, velho, Jo 3.4
γλωσσόκομον, bolsa, Jo 12.6; 13.29
δακρύω, chorar, Jo 11.35
δειλιάω, ter medo, atemori­ Jo 14.27
zar,
484
L ista de Palavras e E xpressões G regas E mpregadas somente por J oão

δέκατος, décimo, décima, Jo, Ap 1.39; Ap 21.20


το δέκατον, a décima parte, Ap Ap 11.13
διάδημα, coroa, diadema, Ap Ap 12.3; 13.1; 19.12
διαζωννύω, cingir-se, Jo 13.4-5; 21.7
διαυγής, transparente, Ap Ap 21.21
Δίδυμος, Dídimo (gêmeo), Jo 11.16; 20.24; 21.2
διπλοώ, dobrar, em dobro, Ap Ap 18.6
δράκων, dragão, Ap Ap 12.3-4,7; 13.2 etc.
δωδέκατος, duodécimo, décimo Ap Ap 21.20
segundo,
έγκαίνια, Festa da Dedicação, Jo 10.22
έγχρίω, unção, Ap Ap 3.18
eivai έκ του κόσμου, ser deste mundo, Jo, lJo 8.23; 15.19; 17.14,16;
18.36; U0 2 .I6; 4.5
eivai έκ των άνω, ser de cima, Jo 8.23
eivai k των κάτω, ser de baixo, Jo 8.23
έκκεντέω, trespassar, Jo, Ap 19.37; Ap 1.7
eKveÓG), retirar-se, Jo 5.13
έκ τοϋ αίώνος, desde o princípio Jo 9.32
do mundo,
έλεφάντινος, de marfim, Ap Ap 18.12
Ελληνικός, grego, Ap Ap 9.11
έμέω, vomitar, Ap Ap 3.16
έμπόριον, negócio (casa de; Jo 2.16
cp. ara), merca­
doria,
έμφυσάω, assoprar sobre, Jo 20.22
ένδώμησις, construção, fábrica, Ap Ap 21.18
έξακόσιοι, seiscentos, Ap Ap 13.18; 14.20
έξέρχ^σθαι άττό, παρά vir de Deus, sair de Jo 8.42; 13.3; 16.27,30
του Θεοΰ, Deus,
έξυπνίζω, despertar do sono, Jo 11.11
έττάρατος, maldito, amaldiço­ Jo 7.49
ado,
έιτ€νδύτης, túnica, capa, Jo 21.7
έιτιδέχομαι, receber, 3J0 3Jo 9-10
έττιχριω, ungir, Jo 9.6,11
τα έρχόμενα, o que há de vir, o Jo 16.13
que está por vir,
485
L ista de Palavras e E xpressões G regas E mpregadas somente por J oão

(ή) εσχάτη ημέρα, ο último dia, Jo 6.39-40,44,54; 7.37;


11.24; 12.48
ζηλεύω, ser zeloso, Ap Ap 3.19
ζεστός, quente, Ap Ap 3.15-16
ήλος, cravos, pregos, Jo 20.25
ήμίωρον, meia hora, Ap Ap 8.1
ό ήν, que era (epíteto de Ap Ap 1.4,8; 4.8
Deus),
ήπερ, mais do que, Jo 12.43
ό θάνατος ό δεύτερος, a segunda morte, Ap Ap 2.11; 20.14; 21.8
θαύμα (μέγα) maravilhei-me com Ap Ap 17.6
θαύμαζε ιν, grande admira­
ção,
θε ιώδης, enxofre, Ap Ap 9.17
θεοσεβής, temente a Deus, Jo 9.31
θεωρείν θάνατον, ver a morte, Jo 8.51
θήκη, bainha, Jo 18.11
θρέμμα, gado, Jo 4.12
θύϊνος, odorífero (madeira), Ap Ap 18.12
ίασπις, jaspe, Ap Ap 4.3; 21.11,18-19
Ιλασμός, propiciação, Do Uo 2.2; 4.10
το ιππικόν, cavaleiros, Ap Ap 9.16
ίρις, arco-íris, arco ce­ Ap Ap 4.3; 10.1
leste,
καθαιρώ, limpar, Jo 15.2
κατάθεμα, maldição, Ap Ap 22.3
κατασφραγίζω, selar, Ap Ap 5.1
κατήγωρ, acusador, Ap Ap 12.10
καύμα, calor, calma, Ap Ap 7.16; 16.9
κέδρος, cedro, Jo 18.1
κειρία, faixas para um de­ Jo 11.44
funto, ataduras,
κεράννυμι, misturar, Ap Ap 14.10; 18.6 (cp. ara)
κέρμα, dinheiro, Jo 2.15
κερματιστής, cambistas, cambia- Jo 2.14
dores,
κηπουρός, jardineiro, hortelão, Jo 20.15
κιθαρωδός, harpistas, Ap Ap 14.2; 18.22
κιννάμωμον, canela, cinamomo, Ap Ap 18.13
486
L ista de Palavras e E xpressões G regas E mpregadas somente por J oão

κλεμμα, roubos, ladroíces, Ap Ap 9.21


κλήμα, ramo, vara, Jo 15.2,4-6
Κοίμησις, repouso, Jo 11.13
κολλούριον, colírio, Ap Ap 3.18
κολυμβήθρα, tanque, Jo 5.2,4,7; 9.7,11
κομψότερον εχειν, melhorar, sentir-se Jo 4.52
melhor,
κριθή, cevada, Ap Ap 6.6
κρίθινος, feito de cevada, Jo 6.9,13
κρυσταλλίζω, como o cristal, Ap Ap 21.11
κρύσταλλος, cristal, Ap Ap 4.6; 22.1
κυκλεύω, cercar, Ap Ap 20.9
κυκλόθεν, ao redor, Ap Ap 4.3-4,8; 5.11
ή κυριακή ήμερα, o dia do Senhor, Ap Ap 1.10
λέντιον, toalha, Jo 13.4-5
λιβανωτός, incensário, Ap Ap 8.3,5
Λιθόστρωτος, Litóstrotos, Pavi­ Jo 19.13
mento (cp. ara ),
λιπαρός, gostosas, Ap Ap 18.14
λίτρα, libra, Jo 12.3; 19.39
λόγχη, lança, Jo 19.34
μώρμαρος, mármore, Ap Ap 18.12
μασσάομαι, morder, Ap Ap 16.10
μεσουράνημα, meio do céu, Ap Ap 8.13; 14.6; 19.17
μεσόω, no meio, em meio, Jo 7.14
na metade,
Μεσσίας, Messias, Jo 1.41; 4.25
μετρητής, talha, Jo 2.6
μετωπον, testa, Ap Ap 7.3; 9.4; 13.16 etc.
μηρός, coxa, Ap Ap 19.16
μίγμα, mistura, composto, Jo 19.39
μονή, moradas, Jo 14.2,23
μουσικός, músicos, Ap Ap 18.22
μυκάομαι, rugir, bramar, Ap Ap 10.3
μύλινος, feito de pedra de Ap Ap 18.21
moinho, de mó,
νίκη, vitória, lJo lJo 5.4
Ν ικολα'ίτης, nicolaítas, Ap Ap 2.6,15

487
Lista de Palavras e E xpressões G regas Empregadas somente por João

νι,πτήρ, bacia, Jo 13.5


νύσσω, perfurar, furar, Jo 19.34
οζω, cheirar mal, Jo 11.39
όθόνιον, lençóis, faixas de li­ Jo 19.40; 20.5-7
nho,
δλυνθος, figos verdes, Ap Ap 6.13
όνάριον, jumentinho, Jo 12.14
δπου εκεί, onde, para um lu­ Ap Ap 12.6,14
gar.
οπώρα, fruto, frutas, Ap Ap 18.14
δρασις, visão, vista, Ap Ap 4.3; 9.17
δρμημα, ímpeto, Ap Ap 18.21
δρνεον, ave, Ap Ap 18.2; 19.17,21
ή ούαί, o ai, Ap Ap9.12; 11.14(cp. ara)
ούαί (com acusativo ai, Ap Ap 8.13; 12.12
de pessoa),
ούκοΰν, logo (interrogativo), Jo 18.37
ούρα, cauda, Ap Ap 9.10,19; 12.4
όψάρων, peixe, Jo 6.9,11; 21.9-10,13
δψις, aparência, rosto, Jo, Ap, 7.24; 11.44; Ap 1.16
παίδαρων, rapaz, Jo 6.9
παράκλητος, Consolador, Advo­ Jo, lJo 14.16,26; 15.26; 16.7;
gado, lJo 2.1
πάρδαλις, leopardo, Ap Ap 13.2
πελεκίζω, degolar, matar com Ap Ap 20.4
machado,
πέμπτος, quinto, Ap Ap 6.9; 9.1; 16.10;
21.20
πενθερός, sogro, Jo 18.13
περιδέω, envolto, Jo 11.44
περιπατειν εν andar na verdade, 2Jo, 3Jo 2jo 4; 3jo 3-4
άληθεια,
περιπατειν εν τή andar nas trevas, Jo, lJo 8.12; 12.35; lJo 1.6;
σκοτις; ουσκότει, 2.11
περιπατειν εν τω andar na luz, lJo lJo 1.7
φωτί,
πέτομαι, voar, Ap Ap 12.14
πλήσσω, ferido, Ap Ap 8.12

488
L ista de Palavras e E xpressões G regas E mpregadas somente por J oão

πνεύμα τής πλάνης, espírito de erro, lJo Do 4.6


ποδήρης, até os pés, Ap Ap 1.13
ποιεί ν την αλήθειαν, praticar a verdade, Jo, lJo 3.21; lJo 1.6
πορφυρούς, púrpura, Jo, Ap 19.2,5; Ap 18.16
ποταμοφόρητος, arrebatada ou ar­ Ap Ap 12.15
rastada pela cor­
renteza
πότερος, se, Jo 7.17
προβατική, das ovelhas, Jo 5.2
προβάτιον, ovelhinhas, Jo 21.17
προσαιτέω, mendigar, pedir es­ Jo 9.8
molas,
προσκυνητής, adorador, Jo 4.23
προσφάγιον, alimento, algo para Jo 21.5
comer,
πρωινός, da manhã, cedo, Ap Ap 2.28
ò πρώτος κα'ι ό o Primeiro e o Ul­ Ap Ap 1.17; 2.8; 22.13
έσχατος, timo (ou Derra­
deiro),
πτέρνα, calcanhar, Jo 13.18
πτύσμα, cuspir, Jo 9.6
πύρινος, de fogo, Ap Ap 9.17
πυρρός, vermelho, Ap Ap 6.4; 12.3
ρεδη (ρόδα), carros, carruagens, Ap Ap 18.13
ρεω, fluir, correr, Jo 7.38
ρυπαίνω, sujar, tornar imun­ Ap Ap 22.11
do,
ρυπόω, ser ou ficar sujo, Ap Ap 22.11
imundo,
'Ρωμαϊστί, em latim, Jo 19.20
σαλπιστής, trombeteiros, toca­ Ap Ap 18.22
dores de trom-
beta,
σάπφειρος, safira, Ap Ap 21.19
σάρδιον, sárdio (pedra), Ap Ap 21.20
σαρδόνυξ, sardônica, sardônio, Ap Ap 21.20
σεμίδαλις, flor de farinha, fa­ Ap Ap 18.13
rinha fina,
σηρικός (σιρικός), seda, Ap Ap 18.12
489
L ista de Palavras e E xpressões G regas E mpregadas somente por J oão

σίδηρος, ferro, AP Ap 18.12


σκέλος, perna, Jo 19.31-33
σκηνοπηγία, Festa dos Taberná- Jo 7.2
culos,
σκηνόω, habitar, estender o Jo, Ap 1.14; Ap 7.15 (cp. tira);
tabernáculo, 12.12; 13.6; 21.3
σμαράγδινος, de esmeralda, Ap Ap 4.3
σμάραγδος, esmeralda, Ap Ap 21.19
στρηνιάω, viver em delícias, Ap Ap 18.7,9
στρήνος, luxúria, Ap Ap 18.3 (cp. ara )
συμμαθητής, condiscípulos, Jo 11.16
συνεισερχομαι, ir com, entrar com, Jo 6.22; 18.15
σώματα, escravos (lit., cor­ Ap Ap 18.13
pos),
ταλαντιαΐος, peso de um talento, Ap Ap 16.21
τεκνίον, filhinhos, Jo, lJo 13.33; lJo 2.12,28; 3.18;
4.4; 5.21
τεταρταίος, de quatro dias, Jo 11.39
τετράγωνος, quadrado, Ap Ap 21.16
τετράμηνος, quatro meses, Jo 4.35
τιθέναι ψυχήν, dar a vida, Jo,lJo 10.11,15,17-18; 13.37-
38; 15.13; lJo 3.16
τιμιότης, opulência, Ap Ap 18.19
τίτλος, título, Jo 19.19-20
τόξον, arco, Ap Ap 6.2
τοπάζ lov, topázio, Ap Ap 21.20
τρίχινος, de crina, de pelo, de Ap Ap 6.12
cilício,
ύακίνθινος, de jacinto, Ap Ap 9.17
υάκινθος, jacinto, Ap Ap 21.20
ΰάλινος, de vidro, Ap Ap 4.6; 15.2
ύαλος, vidro, Ap Ap 21.18,21
υδρία, talha, cântaro, Jo 2.6-7; 4.28
υφαντός, tecida, Jo 19.23
φανός, lanternas, Jo 18.3
φάρμακον, feitiçarias, Ap Ap 9.21
φαρμακός, feiticeiros, Ap Ap 21.8; 22.15
φιάλη, taça ou salva, Ap Ap 5.8; 15.7; 16.1-2 etc.

490
L ista de Palavras e E xpressões G regas E mpregadas somente por J oão

φιλοιτρωτεύω, querer ser ο mais 3Jo 3 J0 9


importante, ter ο
primado ou pri­
mazia,
φλυαρέω, tagarelar, dizer to­ 3Jo 3 J0 10
lices,
φοινιξ, ramos de palmeira, Jo, Ap 12.13; Ap 7.9
palmas,
φραγελλιον, chicote de cordas, Jo 2.15
azorrague de
cordéis,
χάλαζα, saravaiva, granizo, Ap Ap 8.7; 11.19; 16.21
χάλκεος, de bronze, Ap Ap 9.20
χαλκηδών, calcedônia, Ap Ap 21.19
χαλκολίβανον, latão reluzente, bron­ Ap Ap 1.15; 2.18
ze polido,
χαμαί, no chão, na terra, Jo 9.6; 18.6
Χάρτης, papel, 2J0 2jo 12
χείμαρρος, ribeiro, riacho, Jo 18.1
χλιαρός, morno, Ap Ap 3.16
χοΐνιξ, medida, um que- Ap Ap 6.6
niz,
χολάω, indignar-se, ficar Jo 7.23
cheio de ira,
χρίσμα, unção, lJo lJo 2.20,27
χρυσόλιθος, crisólito, Ap Ap 21.20
χρυσόιτρασος, crisópraso, Ap Ap 21.20
χρυσόω, adornada de ouro, Ap Ap 17.4; 18.16
ψωμίον, bocado, pedaço de Jo 13.26-27,30
pão,

491
R eferências
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Plumptre, E. H. T he E p istles to the Seven Churches o f A sia. Expositor. 1.* série. vols.
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494
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New York, 1880.
Wetstein, John J. Novum Testamentum Graecum·. with various readings and
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495
Índice T emático

A badom , 426 Altar, 415, 421, 422, 426, 432, 448,


Abismo, 4 3 3 , 469 452
Abominações, 455 Amado, 329; -s, 284, 293, 294
Abomináveis, os, 473 Amém (título), 389
Abraão, 1 4 3 Ametista, 477
Abrigo, 4 5 9 Amigo, 232
Absinto, 4 2 3 Amigo do esposo, 85
Ações de graça, 4 1 0 Amor, 114, 165, 181, 206, 270, 277,
Acusação, 2 2 6 291, 296, 297, 298, 299, 325, 363
Acusador, 4 3 8 Anás, 222, 224
Adoradores, 9 8 Ancião, 323; -ãos, 397, 407
Advogado, 2 6 9 André, 58, 178
Aflição, 2 1 3 , 3 4 7 Animais, 400, 445
Água, 52, 74, 134, 238, 302, 303; -s, Ânimo, 215
84, 355, 454, 458 Anjo, 337, 422, 423, 431, 446, 451,
Água da vida, 473; -s, 421 452, 464, 468, 475; -s, 62, 242,
Água viva, 93 359, 418
Águia, 401 Ano, 173, 222, 427; -s, 69, 107, 148
Aguilhão, 425 Anticristo, 279, 326
Ai, 426 Antipas, 370
Alegria, 86, 206 Aparência, 131
Aleluia, 466 Aprisco, 158
Alfa (título), 347, 352, 472 Arca, 435
Alma, 161, 180, 330, 451, 463; -s, Arco, 412
415 Arco celeste, 395, 430
Alpendres, 107 Armagedom, 453
Índice T em ático

A r r a ia l, 470 Cadeia, 469


Á rvore, 365, 479 Cães, 481
Á r v o r e da v id a , 481, 482 C a fa rn a u m , 119
A sa s, 401, 425, 439 C aifás, 173
Á sia , 341, 352 C a im , 289
A s p e c to , 424 Calcanhar, 189
Á tr io , 432 C a lc e d ô n ia , 476
A u d iê n c ia , 225 C á lice, 222, 446, 455
A u to r id a d e , 457 Calma, 420
A ve, 459; -s, 468 Calvário, 234
A zorrague, 68 C a m a , 108, 377
C a m b ia d o r e s, 67
B a b il ô n ia , 456, 459 C a m in h o , 52, 198; -s, 449
Bacia, 187 C an a, 474
Bainha, 222 C an á, 104
Balaão, 370 C a n á d a G a lile ia , 64
Balança, 413 C a n d e ia , 113
Banda, 479 C â n ta r o , 101
B arco, 119, 121, 245, 246 C â n tic o d e M o is é s ,449
B a rq u in h o , 121; -s, 121 C â n tic o d o C o rd eiro , 449
B a ta lh a , 437, 453 C a r d a m o m o , 462
B e m , 1 1 2 , 333 C a rg a , 380
B en s, 291 C arne, 41,75, 124,217,278, 294,458
B erilo , 476 C a r r o s, 425, 463
Besta, 433, 440, 442, 449, 455 C a sa , 68, 69, 142, 195, 236
B eta b a ra , 52 C a sa d e v e n d a s, 69
Betesda, 107 C a s tiç a l, 363; -is, 353, 433
B e ts aid a, 60 C a tiv e ir o , 4 4 1
B e z e r r o , 401 C au d a, 425
Blasfêmia, 367; -s, 441 C a u sa , 464
B o ca , 328, 333 C a v a le ir o s, 427
B o ca d o , 191, 192 C a v a lg a d u r a s, 463
B od as, 64 C a v a lo , 411, 467; -s, 424, 425, 428,
B o d a s d o C o r d e ir o , 466 429, 463
B o feta d a , 224; -s, 231 C a v e r n a s, 417
B o lsa , 175, 192 C edrom , 2 2 0
B ra sa s, 223, 246 C ego, 149, 150, 169; -s, 154
C eia , 185, 468
464
Ca beç a , C eifa , 1 02
Cabelos, 425 Celestiais, coisas, 78
498
Í ndice T em ático

César, 232, 233 C ô v a d o s, 246, 475


Cestos, 119 C oxa, 468
Céu, 61, 80, 85, 122, 394, 433, 435, C ria tu ra , 410
437, 438, 441 C r im e , 228
Cevada, 117 C r is ó lito , 476
Chaga, 440, 451 C r isó p r a so , 477
Chave de Davi, 385 C r is ta l, 399, 474
Chaves da m orte e do inferno, 358 C r isto , 51, 59, 99, 103, 127, 135,
Chifres, 440 301, 327
Cidade, 90, 433, 470, 473 C r u z , 233
Cilício, 416 C u id a d o , 157
Cinamomo, 462 C u r r a l, 154
Cinto, 354
Coisas, 29, 376, 405, 473 D efu n to , 169
Colírio, 392 D e líc ia s , 459, 460
Coluna, 387; -s, 430 D e m é t r io , 333
Comida, 101, 121 D e m ô n io , 130, 146; -s, 429, 459
Companheiro, 347 D em ora, 431
Composto, 239 D e n t e s , 425
Comunhão, 256 D e s c u lp a , 209
Concupiscência, 278 D e s e jo , 463; -s , 144
Condenação, 111 D e s e r t o , 51, 174
Condiscípulos, 165 Desgraçado, 391
Confiança, 282, 293, 298, 306 D e u s , 11, 27, 28, 33, 47, 53, 72, 84,
Conselho, 173 87, 99, 114, 115, 121, 124, 130,
Conservos, 416 143, 152, 153, 166, 193, 215,
Consolador, 201 258, 270, 292, 294, 296, 298,
Cooper adores, 332 304, 305, 307, 309, 325, 331,
Coorte, 221 344, 382, 433, 434, 437, 446,449,
Cor, 455 468, 470, 471, 472, 473, 478, 479
Coração, 186, 195, 291, 292 D e u s d o c é u , 434
Cordeiro, 53, 407, 438, 444; -s, 248 D e u s P a i, 325
Cordéis, 68 D e u s T o d o -p o d e r o s o , 468
Coroa, 229, 369, 387, 412; -s, 398, D ia , 64, 148, 176, 240, 417, 427; -s,
425 165, 169, 368
Corpo, 433 D ia d o ju íz o , 299
Corrente, 439 D ia d o S e n h o r , 352
Costume, 228 D ia b o , 127, 144, 288, 368, 437, 469
Costura, 235 D ia d e m a s , 436, 440, 467
Couraças, 425 D íd im o , 165

499
Índice T em ático

Dinheiro, 68, 414; -s, 117, 175 Especiarias, 240


Diótrefes, 332 Esperança, 285
D is c íp u lo , 152, 222, 238; -s , 64, 118, Espinhos, 229
121, 128, 194 Espírito, 74, 75, 98, 99, 134, 167,
D is p e r s o s , 132 189, 236, 293, 295, 303, 349,
D is s e n s ã o , 135 394, 473, 482
D ita d o , 102 Espírito da verdade, 201, 211
D ito , 232 Espírito de vida, 434
159
D iv is ã o , Espírito Santo, 55, 134, 243, 304
D o lo , 60 Esposa, 85, 465, 471, 482
D o m , 92 Esposo, 465
D o m in a d o r , 415 Estádios, 165, 448, 474
D or, 452 Estranhos, 331
D o u tr in a ,129, 223, 327, 370 Estrela da manhã, 381, 482
D o z e , os, 1 26 Estrelas, 359, 436
Dragão, 436, 437, 469 Eufrates, 426, 452
Evangelho, 446
É feso , 352, 361 Exemplo, 188
E fra im , 174
E lia s, 51 F á b r ic a ,475
E m p regad os, 65 Faixas, 170
E n d e m o n in h a d o , 160 Fariseus, 90, 135
E n fe r m o s , 107 Fé, 301, 370, 447
E n gan ad ores, 326 Febre, 106
E n g a n o , 446 Feitiçarias, 429, 466
E n o m , 84 Feiticeiros, 473, 481
E n te n d im e n to , 310 Feras, 414
E n v ia d o , 150, 188 Festa, 70, 106, 117, 127, 129, 193
E n x o fr e , 428, 446, 469 Festa da Dedicação, 160
E rro , 295 Festa da Páscoa, 184
E sc â n d a lo , 275 Festa dos Tabernáculos, 127
E sc a r la ta , 461 Fiel testem unha (título), 342
E s c o r p iõ e s , 423, 425 Figos, 416
E s c r ito s , 115 Figueira, 61
E sc r itu r a , 70, 133, 162, 219, 242; -s , Filadélfia, 384
114 F ilh in h o s , 193, 268, 276, 279, 288
Esmeralda, 397, 476 F ilh o , 81, 105, 111, 216, 256, 261,
Esmirna, 366 281, 436, 437, 473; -s, 39, 93,
Espada, 222, 355, 370, 412, 414, 143, 245, 276, 284, 323, 325,
442, 467 330, 378
500
Í ndice T em ático

F ilh o d e D e u s , 55, 127, 153, 163, G r a n d e s, 417, 465


288, 298, 305, 375 G rão, 179
F ilh o d o H o m e m , 62, 112, 353 G r e g o , 235
F ilh o u n ig ê n ito , 11 , 48, 81, 296 G r e g o s , 132, 133, 178
F ilh o s d o d iab o, 289 G u ia , 420
F ilip e , 59, 178
F im , 185 H arpas, 408, 449
F im (título), 352 Harpistas, 445, 464
F la u te ir o s , 465 Hebraico, 235
F lo r d e fa rin h a , 463 Hebreu, 426
F o g o , 354, 391, 422, 427, 428, 433, Herdade, 90
448, 452 Hissopo, 236
F o ic e , 448 Homem, 33, 36, 54, 71, 72, 107,
F o m e , 420 108, 113, 135, 143, 213, 4 0 1 ;-ns,
F o n te , 91, 95, 473 31, 82, 114, 137, 409, 424, 434,
F o rça , 355, 386, 438 471
F o r n a lh a , 423 H o m ic id a , 144, 290
F o r n ic a d o r e s , 473 H o n r a , 115, 411, 466, 478
F r u to , 463; -s, 479 H o r a , 57, 64, 92, 96, 106, 179, 185,
F u m a ç a , 423, 428, 450, 466 233, 383, 427; - s , 106
F u n d a ç ã o d o m u n d o , 441, 456 H o r to , 221, 240
F u n d a m e n to s , 474 H o s a n a , 178
F u ro r, 468
I d e ia , 458
G a b a t á , 233 ídolos, 311
Gado, 93 Ig r e ja , 331, 332; -s, 340, 352, 378
Gafanhotos, 423 Ilhas, 417
Gaio, 329 Im a g e m , 442
G a la rd ã o , 102, 435, 481 ímpeto, 464
G a lo , 225 Incensário, 421
G e n te , 177 Incenso, 408,421
G e n tio s , 332 Inferno, 414, 471
Glória, 16, 42, 43, 114, 130, 152, Iniquidade, 286, 309
182, 183, 220, 345, 434, 452, Injustiça, 130, 267, 480
473, 478 In ju sto , 480
Gogue, 470 Intento, 457, 458
Gostosas, coisas, 463 Ira, 89, 417, 446, 459, 468
Gozo, 257, 330 Irmã, 169
Graça, 44, 46, 324, 341 Ir m ã o , 58, 275, 290, 300, 306, 347;
Graças, 118 -s, 243, 273, 290, 330, 438, 480
501
Í ndice T em ático

Iscariotes, 202 Latim, 235


Israel, 55, 77 Lavrador, 205
Israelita, 60 Lázaro, 163
L eã o , 401, 440
Jacinto, 427, 477 L e ã o [título), 407
Jacó, 93 L e i, 60, 137, 162, 182, 231, 232
Jaspe, 395, 474 Lenço, 170, 241
J e ru sa lém , 473 Lençóis, 239
Jesus, 56, 59,64,71, 72,104,135,166, Leopardo, 440
172, 190, 231, 238, 244, 447, 467 Letras, 129
J esu s C r isto , 47, 218, 261, 294, 325, L e v a n te , 474
337, 342, 348, 349, 439 Levitas, 51
J esu s N a z a r e n o , 234 L ib ra , 174; -s, 239
J eza b el, 376 Linguagem, 144
João, 33, 50, 53, 338, 339, 347, 471, L in h o , 450, 460, 466
479 Litóstrotos, 233
Jonas, 59, 248 L iv r o , 352, 406, 417, 470, 479; -s,
Jordão, 163 470
Judas, 186, 193, 202 L iv r o d a v id a , 384
Judas Iscariotes, 127, 192 L o u v o r, 419
Judeia, 84 L u a , 416, 436
Judeu, 85, 227; -s, 50, 67, 97, 109, L u g a r, 169, 173, 197
127, 151, 165, 235, 237, 240, 367 L u z , 11, 16, 31, 34, 35, 36, 82, 149,
Ju ízo, 111, 153; -S, 450 258, 261, 274, 473, 478
J u m e n tin h o , 178 L u z d o m u n d o , 136
J u stiça , 131, 211, 288, 289, 480; -S,
466 M a d e ir a , 4 6 1

J u sto , 269 M ã e , 64
M a g o g u e , 470
L ã , 354 M a l, 82, 112, 219, 333
L ad rão, 154, 155, 383, 453 M a lfe ito r , 2 2 6
L agar, 448, 468 Maligno, 276, 309, 310
L a g o , 469 M a n á , 1 2 1 , 372
L á g r im a , 421, 472 M a n d a m e n to , 159, 194, 207, 273,
L â m p a d a , 478; -s , 399 274; -s, 200, 270, 326
L a n ça , 237 M a n h ã , 225
L a n te r n a s , 2 2 1 M ã o , 431; -s, 249, 429
L a o d ic e ia ,388 M a r, 117, 245, 410, 449, 464, 470,
L a r g u r a , 470 471
L atão, 355 M aravilha, 152
502
Índice T emático

M a r fim , 4 6 2 M u n d o , 11, 1 6 , 3 6 , 3 7 , 5 4 , 8 1 , 8 2 ,
M a r ia , 1 6 5 139, 140, 153, 180, 202, 204,
M a r ia M a d a le n a , 2 3 6 208, 218, 269, 277, 291, 295,
M a r id o , 9 5 297, 299, 309, 387, 438, 452, 453
M árm ore, 4 6 2 M urmuração, 129
M a r ta , 1 6 5 Músicos, 464
M a u s, 3 6 2
M e d id a (u n id a d e ), 4 1 3 N ação, 173, 174, 4 0 9 , 441; -õ e s,
M e d id a d e h o m e m , 4 7 5 380, 432, 450
M e io , 1 4 8 N ardo, 1 7 4
M e io d o céu, 423, 446, 468 N a sc e n te , 4 1 8
M e n s a g e m , 258 N a ta n a e l, 6 0
M e n te , 378 N au s, 4 2 3 , 4 6 4
M e n tir a , 145, 282 N azaré, 6 0
M e n tir o s o , 1 4 5 , 2 8 0 N a z a r e n o , 22 1
M ercad ores, 4 5 9 , 4 6 0 N eve, 3 5 4
M e r c e n á r io , 1 5 6 , 1 5 7 N ic o d e m o s , 7 2 , 2 3 9
M ês, 4 2 7 ; -e s, 1 0 2 , 4 3 2 , 4 4 0 N ic o la ita s, 3 6 4 , 3 7 2
M e sa s, 68 N o it e , 2 4 5
M e s s ia s , 5 9 , 9 9 N om e, 16, S 3, 4 0 , 7 0 , 181, 2 0 0 , 2 0 3 ,
M e s tr e , 7 2 , 7 7 , 1 6 7 , 1 8 7 209, 214, 276, 293, 306, 331,
M e s tr e -s a la , 65 3 7 0 , 3 7 5 , 4 4 0 , 4 4 4 , 45 5 ; -s, 4 7 4
M e ta d e , 4 3 9 N o v a J e r u sa lé m , 3 8 8 , 4 7 1
M e tr e ta s , 65 N úm ero, 4 4 3
M ig u e l, 4 3 7 N u v e m , 4 3 0 ; -n s , 3 4 6
M ila g r e , 1 0 6 ; -s , 1 0 5
M is e r á v e l, 3 9 1 O bra, 1 3 0 ; -s , 8 2 , 110, 113, 121,
M is e r ic ó r d ia , 3 2 4 162, 199, 200, 362, 367, 376,
M is té r io , 3 5 9 , 4 5 5 378, 380, 382, 429, 449
M ó, 4 6 4 , 4 6 5 O fic ia l, 1 0 5 ; -is, 2 2 1
M o is é s , 6 0 , 1 2 2 O lh o s , 1 8 2 , 2 5 2 , 2 7 8 , 3 7 5 , 3 9 2 , 4 0 0 ,
M o n te , 9 6 , 1 1 7 , 4 7 3 ; -s , 4 1 7 , 4 5 7 407
M o r a d a , 2 0 3 ; -s, 1 9 6 O liv e ir a s, 4 3 3
M o r te , i l l Ô m e g a (títu lo ), 3 4 7 , 3 5 2 , 4 7 2
M o r te , 147, 164, 227, 290, 307, O r a ç õ e s, 4 0 8 , 4 2 1 , 4 2 2
369, 378, 439, 472 Ó r fã o s, 2 0 2
M o r to , 1 6 9 , 4 5 1 ; -s , 1 1 2 Oriente, 452
M u lh e r , 6 4 , 9 2 , 1 0 0 , 2 1 3 , 2 3 6 , 3 7 7 O u ro , 3 5 4 , 3 9 1
M u ltid ã o , 1 0 7 , 1 1 7 , 1 2 9 , 1 3 5 , 1 7 0 , O u v id o s , 3 6 5
1 7 7 ; -õ es, 4 5 8 O v e lh a s, 154, 155, 161, 249
503
Índice T em ático

Pa c iê n c ia , 348, 362, 386 Peito, 190, 191, 354, 450


P ai, 43, 68, 93, 97, 98, 109, 111, P e ix e , 246, 248; -s, 118, 246, 247
112, 121, 123, 125, 137, 141, P e ix in h o s , 118
145, 158, 161, 180, 198, 199, P e n a [instrumento), 333
212, 243, 255, 256, 269, 276, P e n a [punição), 2 99
277, 278, 281, 304, 344, 444; -s, Perdição, 219
96, 148, 276 P é r g a m o , 369
P a la v ra , 20, 70, 103, 114, 133, 134, Pernas, 237
141, 144, 147, 148, 203, 219, Pérolas, 477
253, 268, 270, 304, 386; -s , 87, Pés, 175, 353, 436
127, 160, 184, 203, 218, 458 Peso, 454
P a la v ra d e D e u s , 338, 349 P e s s o a s , 383
P a la v ra d e D e u s [título), 467 P e s te , 414
P a lm a s, 4 1 9 Pilatos, 226
P a lm eira , 177 P ilo to , 464
432
P a n o d e sa co , P le n itu d e , 45
P ão, 117, 189, 246, 248 Pó, 464
P ã o d a v id a , 122 P o b re, 3 9 1 ;-s, 175, 193
P ã o d o céu , 122 P o b r e z a , 367
P ã o v iv o , 124 P o ç o , 93
P a p el, 328 P o ç o d o a b ism o , 423
P a rá b o la , 155; -s , 214 P o d er, 39, 112, 159, 217, 345, 380,
P a ra íso , 366 405, 410, 411, 414, 429, 432,
P a r a lític o s, 107 438, 448, 457
P a recer, 114 P o d e r o s o s , 417
P a r te [lugar), 154 P o e n te , 474
P a r te (participação), 328 P o m b a , 55
P a r te [sorte), 470, 473; -s, 235 P o n ta s, 407
P á sc o a , 67, 70, 226, 228 Porta, 223, 385, 393, 394; -s, 474,
Pastor, 154, 155 477
P a tm o s, 348 Porta das ovelhas, 106, 155
P á tria , 104 P o r te ir a , 223
P a z, 203, 324, 341, 412 P o r te ir o , 154
P eca d o , 54, 138, 142, 146, 154, 209, P o u c o , 117, 2 1 2
263, 286, 287, 307; -s , 153, 266, Povo, 174, 409, 471; - s , 458
267, 287 Praça, 433, 477, 479
P e d a ç o s, 119 Pragas, 429, 433, 449, 460
P ed ra , 374; - s , 454 Praia, 245
P ed ra p r e c io s a , 475; - s , 455 Pranto, 472
P ed ro , 59 Prazer, 213
504
Índice T em ático

P reço, 1 7 4 Refúgio, 459


P reparação, 2 4 0 R e i, 119, 233, 426; -s, 344, 409
P r e sb íte r o , 3 2 9 R e i d e Isr a e l, 178
P r e s e n te s , 4 3 4 R e i d o s ju d e u s , 227, 234
P r im a d o , 3 3 2 Rei dos santos, 450
P r im e ir o ( título ), 3 5 8 R e in o , 347, 438, 452; -s, 434
P r im íc ia s , 4 4 6 R e in o d e D e u s , 73
P r im o g ê n it o d o s m o r to s , 3 4 3 R e lâ m p a g o s, 399, 435
P r in c ip a is, 1 3 5 , 1 8 2 R e lv a , 118
P r in c ip a is d o s sa c e r d o te s , 1 7 2 , 1 7 7 R e p o u s o , 164, 447
P r ín c ip e , 7 2 ; -s , 1 3 1 R e s s u r r e iç ã o , 166
P r ín c ip e d e s t e m u n d o , 1 8 1 , 2 0 4 R e s s u r r e iç ã o d a v id a , 112
P r ín c ip e d o s r e is d a te r r a , 3 4 3 R e v e la ç ã o , 335
P r in c íp io , 2 0 , 2 8 , 1 3 9 , 1 4 4 , 1 5 3 , R ib e ir o , 2 2 0
210, 252, 277, 281, 289, 326, R io s, 134
389 R iq u e z a s , 410
P r in c íp io {título), 3 5 2 Rochas, 417
P r isã o , 8 5 , 3 6 8 Rosto, 355, 425, 479
P r o fe c ia , 3 3 9
P r o fe ta , 5 1 , 1 3 5 ; -s , 2 9 4 , 4 7 9 , 4 8 0 SÁBADO, 151, 237
P r o fu n d e z a s d e S a ta n á s, 3 7 9 S a b e d o r ia , 443
P ro m essa , 2 8 1 S a c e r d o te s, 51, 235, 344
P r o p ic ia ç ã o , 2 6 9 , 2 9 6 Sacrifícios da idolatria, 371, 377
P r o s titu iç ã o , 1 4 3 S a fira , 475
P u rifica çã o , 8 5 ; -õ e s , 6 5 S a la , 223
P úrpura, 2 3 1 , 4 5 5 , 4 6 0 S a lim , 84
S a lo m ã o , a lp e n d r e , 161
Q uadrado, 474 S a lte a d o r , 154, 228
Questão, 85 S a lv a ç ã o , 97, 419, 438
S a lv a d o r , 103, 297
R a b i, 5 6 , 6 1 , 7 2 S a lv a s, 408, 450
R a b o n i, 2 4 3 S a m a ria , 92
R a in h a , 4 6 0 S a m a r ita n o , 146
R a iz {título), 4 8 2 S a n g u e , 40, 125, 238, 302,409, 422,
R a iz d e D a v i, 4 0 7 433, 438, 451
R a m o s, 1 7 7 S a n to , 280, 385
R a p a z, 1 1 7 S a n to s , 422, 441, 456
R ãs, 4 5 2 S a r a iv a , 422, 454
R eb a n h o , 1 5 9 S a r d e s, 381, 383
R ed e, 2 4 6 S á r d io , 476

505
Ín d ic e T e m á t ic o

Sardônica, 395, 476 Tanque, 107


Satanás, 192, 386, 437 Tarde, 119
Saúde, 329 Temor, 299
Seda, 460 Templo, 67, 69, 387, 420, 432, 435,
Sede, 94, 472 448, 454, 478
Segrego, 431 Templo do tabernáculo, 450
Segunda m orte, 369, 470, 471 Tempo, 107, 128, 339, 377, 435,
Seio, 48, 190 439, 480; -s, 439
Selo, 416, 469; -S, 411 Tentação, 387
Semente, 288 T erra, 86, 149, 181, 246, 247, 407,
Senhor, 89, 347, 404, 419, 434, 452, 412, 415, 417, 422, 436, 452
479 Terrem oto, 434
Senhora eleita, 323 T errestres, coisas, 78
Sentido, 457 Tesouro, 137
Sepulcro, 240; -s, 112 , 434 Testa, 418, 455
Sepultura, 165, 176 Testemunhas, 432, 456
Serpente, 437; -s, 429 Testem unho, 16, 34, 50, 113, 137,
Serviço, 210 304, 305, 333, 338, 349, 439,
Servidores, 132 450, 467
Servo, 142, 188, 207, 222, 338, 449; Tiatira, 375
- S , 105, 227, 337, 466 Tiberíades, 245
Sete Espíritos (título), 342 Tímidos, os, 473
Sete Espíritos de Deus (título), 382, Tinta, 328
399 Título, 234
Sicar, 90 Toalha, 186
Siloé, tanque, 149, 150 Tocha, 423
Simão, 127, 175, 192, 248 Todo-poderoso, 347, 452
Simão Pedro, 58, 126, 222 Tomé, 244
Sinagoga, 125, 151, 183, 223, 386; Topázio, 476
-s, 210 Torm ento, 447, 460
Sinagoga de Satanás, 368 Trabalho, 16, 362; -s, 447
Sinal, 16, 190, 244, 436, 442, 449, T rem or de terra, 416
4 6 9 ;-is, 67, 105, 117, 121 Treva, 260; -s, 11, 32, 82, 136, 182,
Soberba, 278 184, 261, 274
Sogro, 222 Tribo, 409, 441; -s, 346
Sumo sacerdote, 222 Tribulação, 367, 368, 420
Tribunal, 233
T aças, 451, 473 Tribuno, 222; -s, 417, 469
Talento, 454 Tristeza, 213
Talhas, 65 Trom beta, 352, 394; -s, 421
506
Í n d ic e T e m á t ic o

Trono, 370, 395, 397, 420, 446, Vergonhas, 453


470; -S, 397, 469 Veste, 231, 415; -s, 186, 236, 384,
Tropeços, 371 391, 419, 453
Trovões, 399, 430 Vestiduras, 481
Túnica, 233, 246 Vez, 90, 248
Vida, 16, 31, 112, 125, 156, 166,
Ú l t im a h o r a , 279 180, 195, 198, 207, 253, 254,
Últim o (título), 358 278, 290, 291, 305, 306, 369,
Últim o dia, 123, 133, 184 422, 439, 470
Unção, 280, 282 Vida eterna, 11, 80, 95, 102, 127,
Unigênito, 43 217, 255, 281, 290, 305, 306, 310
Urso, 440 Videira, 205
Uvas, 448 Vidro, 399, 475
Vinagre, 236
Vara, 205, 380, 431, 437 Vinda, 283
Varão, 437 Vindima, 448
Vaso, 461; -s, 381 Vinho, 64, 459
Velho, 73 Virgens, 445
Vento, 76 Visão, 427
Ventre, 133 Vitória, 301
Verbo, 27, 28 Viúva, 460
Verdade, 15, 16, 44, 83, 98, 146, Vontade, 123, 129, 306, 405
198, 211, 219, 227, 238, 261, Voz, 51, 77, 114, 353, 393,426, 445,
265, 303, 324, 325, 330, 332 459; -es, 399, 435
Verdadeiro, 385
Verdura, 424 Z elo, 69

507
Índice de Palavras G regas

A , 347 αιώνιος, 255, 305, 446


άβυσσος, 423 ακμάζω, 448
άγαλλιάω, 113, 148 άκολουθέω, 59, 117, 447, 460
αγαπάω, n o , 164, 185, 248 ακούω, 125, 211, 306, 382
αγάπη, 206, 270, 277, 296 άκρατον, 446
άγγελος, 337 άκρίς, 423
αγιάζω, 162, 2 1 9 ,4 8 0 αλαζονεία, 278
άγιος, 127, 218, 385 αλείφω, 163
άγνίζω, 286 αλήθεια, 44, 98, 146
αγνός, 286 αληθής, 35, 112, 238
αγοράζω, 192, 409, 445 αληθινός, 35, 98, 102, 122, 132, 137, 205,
αγράμματος, 116 274, 310, 389
άγω, 158 άληθώς, 60, 131, 142
αγωνίζομαι, 227 άλλαχόθεν, 154
αδελφός, 273, 290 αλληλούια, 466
άδικέω, 369, 480 άλλήλων, 261
αδικία, 130, 267, 309 άλλομαι, 95
άθετέω, 184 άλυσις, 469
αίγιαλός, 245 αμαρτάνω, 267, 307
αιμα, 40, 302 αμαρτία, 138,142,146,154,263,267,287,307
αίρω, 53, 108, 159, 161 αμέθυστος, 477
αίσχύνομαι, 283 άμήν, 61, 154, 346
αΐτέω, 92, 93, 166, 214, 306, 307 αμνός, 53
αίτια, 228 άμπελος, 205
αιχμαλωσία, 133 αμπελουργός, 205
αιών, 36, 153, 279 άμωμον, 462
Í n d ic e de P alavras G regas

άναβαίνω, 126, 243 άριστάω, 247


άναβλέπω, 150 άρνέομαι, 281
άναγγέλλω, 99, 109, 212, 215 άρνίον, 248, 407
άναγινώσκω, 338 αρπάζω,157, 161
άνάκειμαι, 190 άρραφος, 235
άναπίπτω, 118, 187, 249 άρρην, 54, 437
άνάστασις, 112 άρτι, 193, 194, 211, 215, 275
ανατολή, 418 άρτος, 117
άνήρ, 54, 95 άρχαιος, 273, 437
άνθρακία, 223 άρχή, 20, 139, 252, 389
άνθρωποκτόνος, 144, 290 άρχιτρίκλινος, 65
άνθρωπος, 54, 72, 143 άρχων, 181, 343
ανοίγω, 61, 385, 394 άσθενέω, 105, 107
άνομία, 286 άστήρ, 381
άντί, 46 άσχημοσύνη, 453
άντλέω, 65 αυλή, 154, 158, 223
αντλημα, 93 αυλητής, 465
άνω ,139 αυτός, 71
άνωθεν, 73 άφίημι, 90, 106, 176, 244, 266, 363
άξίως, 331 άχρι, 369
απαγγέλλω, 254 άψινθος, 423
άπ’ άρτι, 61, 189, 447
άπειθέω, 89 βάθος, 379
απέρχομαι, 105, 126, 138,210 βα'ίον, 177
άπιστος, 244 βάλλω, 108, 186, 205, 244, 299, 404
άπό, 122, 130, 141, 144, 184, 252 βάρος, 380
αποβαίνω, 246 βαρύς, 301
άποδίδωμι, 481 βασανίζω, 436
αποθνήσκω, 124 βασανισμός, 460
άποκάλυψις, 335 βασιλεία, 347
άπολαμβάνω, 326 βασιλεύς, 344
άπόλλυμι, 219 βασιλικός, 105
άπορέομαι, 189 βαστάζω,161, 175
αποστέλλω, 33, 52, 81, 103, 219, 224, βδελύσσομαι, 473
243, 296 βέβρωκα, 119
αποσυνάγωγος, 151 Βηθαβαρά, 52
αποχωρίζομαι, 416 Βηθανία, 52
άπτομαι, 243, 309 Βηθεσδά, 107
απώλεια, 219 βήμα, 233
αρεστός, 293 βήρυλλος, 476
510
Í n d ic e de Pa la v ra s G regas

βία, 39 δεϊπνον, 185,186


βιβλίον, 116 δεσπότης, 415
βίος, 31, 291 δέχομαι, 104
βλασφημία, 367 δή, 368
βλέπω, 53, 241, 407 δηλόω, 202
βόσκω, 248 δηνάρκιν, 117, 175
βρέχω, 433 διά, 30, 349, 438
βρώμα, 101 διαβάλλομαι, 115
βρώσις, ιοί, 121 διάβολος, 127, 289, 368
βύσσινος, 466 διαδίδωμι, 457
διαζώννυμι, 186
γαζοφυλάκιον, 137 διάνοια, 310
γάμος, 64 διασπορά, 132
γεμίζω, 65, 119 διατρίβω, 84
γενετή, 148 διδακτός, 124
γεννάω, 73, 75 διδάσκαλος, 77, 167, 187
γέρων, 73 διδαχή, 129, 223, 327
γεωργός, 205 Δίδυμος, 165
γή, 36, 86 δίδωμι, 47, 111, 284, 385, 386, 458
γίνομαι, 29, 30, 33, 39, 40, 44, 47, 95, διεγείρω, 120
108, 148, 159, 185, 203, 206, 245, διέρχομαι, 95
288, 328, 348, 368, 394 δίκαιος, 266
γίνώσκω, 37, 71, 77, 127, IS 1, 140, δικαιοσύνη, 211
141, 187, 199, 217, 270, 295 δικαίωμα, 450, 466
γλωσσόκομον, 175 δίκτυον, 246
γνώμη, 457 Διοτρέφης, 332
γογγύζω, 123 διπλόω, 460
γόμος, 460 διψάω, 94
γράμμα,115 διώκω, 109
γραφή,70, 114, 162 δοκιμάζω, 294
γράφω, 69, 137, 277, 352 δόλος, 60
γρηγορέω, 382 δόξα, 42, 152, 183
γυνή, 213 δοξάζω, 134, 193, 206
δουλεύω, 142
δαιμονίζομαι, 160 δούλος, 105
δαιμόνιον, 130 δράκων, 436, 469
δακρύω, 168 δύναμις, 39
δει, 80, 96, 337, 469 δυνατός, 417
δεικνύμι, 337 δυσμαί, 474
δειλιάω, 203 δωρεάν, 92, 209
511
Í n d ic e de Pa la v ra s G regas

έάω, 376 έμός, 141


Έβραϊστί, 426 έμπορίον, 69
εγκαίνια, 160 έμπορος, 459
έγκαλέω,115 έμπροσθεν, 44, 291
εθέλω, 59, 120 εμφανίζω, 202
εθνικός, 332 έμφυσάω, 243
έθνος, 173, 174, 380 Ιν, 42, 55, 201, 409, 422
ε’ίδω, οιδα, 71,72,77,97,131,137,187,338,394 ένδόμησις, 475
είδωλόθυτον, 371 ενέργεια, 39
εΐδωλον, 311 ενταφιάζω, 240
είκών, 442 ενταφιασμός, 176
είμί, 132, 139, 148 έντέλλομαι, 207
είναι εκ, 60, 146 εντολή, 159, 194
είρήνη, 324 έντυλίσσω, 241
είς, 48, 140, 304, 352 ενώπιον, 293
εις, εν, 161 εξέρχομαι, 143
έκ, εξ, 85, 111, 130, 139, 184, 278, 294, εξετάζω, 247
295, 309, 386, 429, 449 έξηγέομαι, 49
εκβάλλω, 68, 155, 181 έξομολογέομαι, 384
έκδικέω, 466 εξουσία, 39, 159
εκείνος, 34, 49,55,69,99,108,129,150, έξυπνίζω, 164
152, 184, 192, 193, 203, 238, 273 έξω, 299
έκκεντέω, 346 εορτή, 70, 193
εκλέγομαι, 188 επαγγελία, 258
εκλεκτός, 323 έπενδύτης, 246
έκνεύω, 108 επί, 406, 410, 424, 449
εκπίπτω, 363 έπίγειος, 78
έλάσσων, 66 επιθυμία, 144, 278
ελαύνω, 120 έπίκειμαι, 169
ελέγχω, 82, 146 έπιλέγομαι, 107
ελεεινός, 391 επιπίπτω, 190
έλεος, 324 επιστρέφω, 182
ελεφάντινος, 462 επιφάνεια, 336
έλκος, 451 έπιχρίω, 149
ελκύω, 124, 246 επουράνιος, 78
Έλλην-ες, 133, 178 έράω, 110
ελπίζω, 115 εργάζομαι, 109, 331, 464
έμβλέπω, 56 έργον, 105, 199
έμβριμάομαι, 167 έρευνάω, 114, 378
εμέω,390 έρημόω,458
512
Í n d ic e de Pa la v ra s G regas

Ερχομαι, 38, 96, 197, 212, 218, 326, 327 θεραπεύω, 108
έρωτάω, 214, 238, 308 θερισμός, 102
εστί, 257 θεωρεω,47,96,120,123, 147,157, 183,291
’έσχατος, 123 θήκη, 222
ΕΟωθΕv, 406 θηρίον, 433
εύαγγελίζω, 431, 446 θλίψις, 213, 347, 367
εύθεως, 120 θρέμμα, 93
εύθύνω, 52 θρηνεω,213
εύλογεω, 178 θρόνος, 370, 397
ευλογία, 410 θύϊνος, 461
εΰοδούμαι, 329 θυμός, 89
ευρίσκω, 58 θύρα, 385
εύχομαι, 329 θυρωρός, 154, 223
εχω, 136, 213, 298, 415 θυσιαστήριον, 415, 421

ζάω, 93, 125, 367 ίάομαι, 105, 108


ζεστός, 390 ΐδε, ’ίδετε, 53, 85
ζηλεύω, 392 ’ίδιος, 38, 58, 104, 109, 130
ζήλος, 69 Ιερεύς, 344
ζητεω, 130 Ιερόν, 67
ζήτησις, 85 Ίεροσολυμΐται, 131
ζόφος, 32 ’Ιησούς, 47
ζυγός, 413 ίλασμός, 269
ζωή, 31, 112, 127, 253, 254, 255, 369 ίμάτιον, 186, 231
ζωννύω, 249 'ίνα, 102, 194, 207, 208, 210, 215, 326
ζώον, 400 ’Ιουδαίος, 50, 84
ζωοπο ιεω, 111 ιππικόν, 427
ίρις, 395
ήκω, 122, 143 Ίσκαριώτης, 127, 192
ήν, 20, 33, 44, 252 Ίσραελίτης, 60
ήπερ, 183 'ίστημι, 52, 144
Ισχυρός, 277
θάνατος, 290, 378, 414 ισχύς, 39
θαρσεω,215 Ιχθύς, 246
θεάομαι, 42, 47, 55, 56, 253 Ίωάνης, 33, 59
θειον, 446
θέλημα, 405 καθαιρώ, 205
θέλω, 76, 107, 114, 129, 135, 144 καθαρίζω, 263
Θεός, 47 καθαρός, 205
θεοσεβής, 153 καθώς, 194
513
/
I n d ic e de Pa la v ra s G regas

καί, 37, 40 κλήμα, 205


καινός, 194, 240, 273 κοιλία, 133
καιρός, 128 κοιμάομαι, 164
καίτοιγε, 90 κοίμησις, 164
καίω, 113 κοινωνέω, 328
κακοποιός, 226 κοινωνία, 256
κακός, 362, 451 κόκκος, 179
κάλαμος, 333 κόλασις, 299
καλέω,284 κολλούριον, 392
καλός, 155, 162 κολλυβιστής, 67
καλώς, 95, 146, 331 κόλπος, 48, 190
κάμνω,363 κολυμβήθρα, 107
καρδία, 195 κομψότερον, 106
κατά, 326 κοπιάω, 103
καταβαίνω, 67, 122 κόπος, 362, 447
καταβολή, 441 κόπτω, 346
καταγινώσκω, 292 κόσμος, 29, 36, 139
κατακαίω, 458 κόφινος, 119
καταλαμβάνω, 32, 182 κράββατος, 108
κατασφραγίζομαι, 406 κράζω, 44, 131, 183
κατεσθίω, 69, 436 κρατέω, 418
κατηγορέω, 115, 438 κράτος, 39
κατηγορία, 115 κραυγάζω, 228
κατήγορος, 438 κρίθινος, 117
κάτω,139 κρίμα, 153
Κέδρων, 220 κρίνω, 82, 415
κείμαι, 309, 395 κρίσις, 111, 299
κειρίαι, 170 κρούω, 393
κέντρον, 425 κρύπτω, 372
κεραμικός, 381 κρυσταλλίζω, 474
κεράννυμι, 446 κτίζω, 29
κερματιστής, 67 κτίσμα, 410
κιβωτός, 435 κυβερνήτης, 464
κιθάρα, 408 κυρία, 323
κιθαρωδός, 445 κυριακός, 352
κινάμωμον, 462 κύριος, 419
κλάδος, 205 κύων, 481
κλαίω, 167, 213, 407
κλάσμα, 119 λαλέω, 141, 152, 184, 213, 215, 394
κλέπτης, 154, 155, 383 λαλιά, 103, 144
514
Í n d ic e de Pa la v r a s G regas

λαμβάνω, 38, 86, 115, 212, 382, 387,404 μεθύω, 66


λαμπάς, 399 μείζων, 292, 314
λαμπρός, 450, 464 μελαν, 328
Λαοδικεία, 388 μελει, 157
λαός, 174, 471 μέλλω, 105, 390
λατρεία, 210 μένω, 57, 89, 125, 272
λατρεύω, 420, 479 μέσος, 52
λέγω, 140, 212, 215, 394 μεσουράνημα, 423
λεντιον, 186 μεσόω, 129
λευκός, 102, 374, 384 μετά, 201, 280, 298, S53
ληνός, 448 μεταβαίνω, 185, 290
ληστής, 154, 228 μετοικεσία, 133
λίαν, 325 μετρητής, 65
Λιθόστρωτος, 233 μήτι, 101
λίνον, 450 μιαίνω, 225
λιπαρός, 463 μίγμα, 239
λίτρα, 174 μικρόν, 212
λόγος, 20, 28, 103, 144, 184, 203, 253, μιμέομαι, 333
268, 270, 467 μισεω, 208, 274
λόγχη,237 μισθός, 102, 327
λοιδορεω, 152 μισθωτός, 156
λούω, 187 μνημεΐον, 112
λυπέω, 213 μοιχεύω, 377
λύπη, 213 μολύνω, 445
λυχνία, 353 μονή, 196
λύχνος, 113 μονογενής, 22, 43, 48, 296
λύω, 52, 69, 109, 162, 288 μόνος, 115
μόσχος, 401
μακάριος, 188 μουσικός, 464
μάννα, 372 μυκάομαι, 430
μαργαρίτης, 477 μυριάς, 410
μάρμαρον, 462 μυρίζω, 163
μαρτυρέω, 44, 303, 333,338
μαρτυρία, 34, 113, 338 ναός, 69
μάρτυς, 342 νάρδος, 174
μασσάομαί, 452 νεφελη, 346
μαστιγόω, 229 νεφρός, 378
μαστός, 354 νεώτερος, 249
μάχαιρα, 412 νικάω, 216, 276, 301, 365, 449
μεγιστάνες, 417 νίκη, 301
515
Í n d ic e de Palavras G regas

νιπτήρ, 187 όσος, 38


νίπτω, 187 όστις, 147, 255, 346, 353
νοέω,182 όταν, 149, 301, 404, 421
νόμος, 162 ούδείς, 260
νους, 457 ούκέτι, 207
νύσσω, 237 ού μή, 105, 122, 187
οΰν, 106, 123, 129, 131, 138, 212
ξηραίνω, 206, 448 ουτος, 50, 130, 132
ξηρός, 107 οφείλω, 188, 272
ξύλον, 365 όχλος, 50, 135, 170, 177
όψάριον, 118, 246
όγκος, 380 όψία, 119
όδηγέω, 211 όψις, 131, 355
οδός, 52
όζω, 169 παιδάριον, 117
όθεν, 279 παιδίον, 105, 245, 276
όθόνιον, 239 παιδίσκη, 223
οικία, 195 παλαιός, 273
οίκοδομέω, 69 παντοκράτωρ, 347
οικουμένη, 36 πάντοτε, 141
όλος, 130, 153 παρά, 33, 124, 135, 201, 258, 325
όλυνθος, 416 παράγω,274
ομοίως, 1 ίο παράδεισος, 366
όμολογέω, 151, 183, 265, 294, 326 παραδίδωμι, 126, 187, 221, 236
όμοΰ, 102 παράκλητος, 201, 269
όνάριον, 178 παρακΰπτω, 24 1
όνομα, 40, 209, 331 παραλαμβάνω, 38, 197
όντως, 142 πάρδαλις, 440
όπισθεν, 406 παρεμβολή, 470
όπίσω, 44 παρθένος, 445
οπτασία, 336 παροιμία, 155, 214
όπώρα, 463 παρουσία, 283
όραμα, 336 παρρησία, 128, 129
όρασις, 336 πάς, 29, 122, 210, 277, 285
όράω, 47, 53, 89, 117, 212, 346 πάσχα, 228
όργή, 89, 417 πατάσσω, 433
όρμημα, 464 πατήρ, 43, 145
όρνεον, 459 Πάτμος, 348
ορφανός, 202 πατρίς, 104
όσιος, 385, 450 πείθω, 89, 291, 312
516
Í n d ic e de Pa l a v r a s G regas

πειράζω, 117 πολεμέω, 372


πελεκίζομαι, 470 πόλεμος, 453
πενθερός, 222 πολύς, 103
πένθος, 472 πολύτιμος, 174
περί, 123, 211, 253 πονηρός, 82, 219, 451
περιβάλλω, 231, 384, 398 πορεύομαι, 105, 197,210
περιζώννυμι, 354 πορνεία, 143
περιπατέω, 56, 126,164,249,261,330,362 πόρνος, 473
περισσεύω, 119 πορφύρεος, 231
περισσός, 155 ποταμοφόρητος, 439
πέτρος, 59 ποταπός, 284
πηγή, 91, 95 πραιτώριον, 225
πήχυς, 475 πράσσω, 82, 83
πιάζω, 132, 138, 245, 247 πρεσβύτερος, 323
πίνω, 93 προάγω, 327
πίπτω, 457 προαιτιάομαι, 115
πιστεύω, 39, 67, 70, 128, 141, 153, 163, προβατικός, 106
183, 195, 305 πρόβατον, 249
πιστικός, 174 προπέμπω, 331
πίστις, 301 πρός, 27, 255, 269, 307
πιστός, 244, 330, 342, 389 προσευχή, 421
πλανάω, 129, 135, 265, 288, 377 προσκυνέω, 96, 97, 99
πλάνη, 295 προσκυνητής, 98
πλάνος, 326 προσφάγιον, 245
πλατεία, 477 προσφέρω,210
πλήρης, 44 προτρέχω, 241
πληρόω, 129, 207, 214, 257, 382 πρόφασις, 209
πλήρωμα, 45 προφητεύω, 432
πλοιάριον, 121, 246 πρω'ί, 225
πλοιον, 119 πρωινός, 381
πλουτέω, 391 πρώτον, 208
πνεύμα, 75, 98, 99, 134, 342, 349 πρώτος, 45
πνευματικώς, 433 πρωτότοκος, 343
πνέω, 120 πτέρνα, 189
ποδήρης, 353 πτωχεία, 367
ποιέω, 29, 83, 109, 130, 267, 286, 301, πυλών, 474
439, 458 πυρετός, 106
ποιμαίνω, 249, 381, 420 πυρόομαι, 391
ποίμνη, 159 πυρρός, 412
ποιος, 162, 227, 249 πωρόω, 182
517
Í n d ic e de Pa l a v r a s G regas

ράβδος, 380 συγκοινωνός, 347


ράπισμα, 224 συγχράομαι, 92
ρέδα, 463 συκή, 61
ρέω {fluir), 134 συλλαμβάνω, 222
ρήμα, 87, 116, 218 συμβουλεύω, 391
ρομφαία, 355, 414 συμμαθητής, 165
ρυπόω,480 συμφέρω, 210
συνάγω, 221, 441
σάββατον, σάββατα, 240 συναγωγή, 125, 223
σάλπιγξ, 352, 394 συνέδριον,173
Σαμαρεΐτις, 92 συνεργός, 332
σάπφειρος, 475 συνέρχομαι, 223
σαρδόνυξ, 476 συνήθεια, 228
σάρξ, 41, 75 συντρίβω, 381
σεισμός, 416 σύρω, 124
σημαίνω, 337 σφάζω, 289, 407, 415, 440
σημεΐον, 67, 105, 121 σφραγίζω, 87, 121, 480
σηρικόν, 460 σχίσμα, 159
Σίμων, 127 σχοινίον, 68
σκανδαλίζω, 126,210 σώζω, 164
σκάνδαλον, 275 σωτήρ, 103, 297
σκεύος, 381, 461 σωτηρία, 97
σκηνόω, 41, 420, 471
σκληρός, 125 ταλαίπωρος, 391
σκοτία, 32, 136, 260, 274 ταλαντιαΐος, 454
σκότος, 32, 82, 261 ταράσσω, 180
σμαράγδινος, 397 τάφος, 112
σουδάριον, 170, 241 τάχιον,192
σπείρα, 221 τάχος (έν τάχει), 337
σπλάγχνα, 291 τεκνίον, 193, 268
στάδιον, 448 τέκνον, 39, 323
σταφυλή, 448 τέλειος, 299
στέφανος, 369, 387, 398 τελειόω, 102, 113, 270
στήθος, 190, 191 τελέω, 236, 449
στήκω, 52, 144 τέλος, 185
στόα, 107 τεταρταίος, 169
στόμα, 328 τετράγωνος, 474
στρήνος, 459 τετράμηνον, 102
στύλος, 387 τηρέω, 200, 270, 339, 380, 386
συγκοινωνέω, 460 τίθημι, 156, 208, 291
518
Í n d ic e de Pa la v r a s G regas

τιμή, 411 φιάλη, 408


τίτλος, 234 φίλέω, 110, 169, 209, 215, 241, 248, 249
τοίοΟτος, 99 φιλοπρωτεύω, 332
τόξον, 412 φλυαρέω, 332
τοπάζ ιον, 476 φόβος, 299
τόπος, 173, 197 φοΐνιξ, 177, 419
τότε, 192 φορέω, 231
τρυγάω, 448 φορτίον, 380
τρώγω, 125, 188 φραγέλλιον, 68
τύπος, 244 φρέαρ, 91, 93, 423
τυφλόω, 276 φυλακή, 85, 459
φυλάσσω, 219, 310
ύακίνθινος, 427 φυλή, 346, 409, 441
ύάλινος, 399, 449 φωνή, 51, 77
υγιαίνω, 329 φώς, 31, 113, 136, 258, 261
υγιής, 107, 130 φωστήρ, 136, 473
υδρία, 65, 93 φωτίζω, 32
ύδωρ, 84, 302, 303
υιός, 39, 93, 105 χαίρω,86, 327
υπάγω, 120, 126, 132, 138, 164, 167, χαλκηδών, 476
177, 197, 208, 211, 451 χαλκολίβανον, 355
ύπαντάω, 166, 178 χαμαί, 149
ύπάντησις, 178 χαρά, 86, 213, 330
ύπέρ, 164 χάραγμα, 442
υπηρέτης, 132, 221, 227 χαρίζομαι, 284
ύπό, 61 χάριν, 289
υπόδειγμα, 188 χάρις, 44, 324
υπολαμβάνω, 332 χάρτης, 328
υπομονή, 386 χείμαρρος, 220
ύστερέω, 64 χιλιάδες, 410
υφαντός, 235 χιλίαρχος, 222
ύψόω, 80, 181 χλιαρός, 390
χλωρός, 414
φαίνω, 32, 274 χοΐνιξ, 413
φανερόω, 244, 284, 391 χολάω, 130
φανέρωσις, 336 χορτάζω, 12ι
φανός, 221 χόρτος, 1 18
φαρμακεία, 429 χρίω, 163
φαύλος, 82, 112 χρίσμα, 280
φέρω,327 χρόνος, 431
519
Í n d ic e de Palavras G regas

χρυσίου, 391 ψυχή, 180, 330, 415


χρυσόλιθος, 476 ψυχρός, 390
χρυσόω,455 ψωμίζω, 191
χωρέω, 65, 143 ψωμιού, 191
χωρίου, 90
χωρίς, 30 Ω, 347
ώδε, 456
ψευδοπροφήτης, 294 ώυ, 48
ψευδός, 145 ό ώυ, και ό ήυ, 341
ψεύστης, 145, 280 ώρα, 179, 279
ψηλαφάω, 253 ώς, 43
ψήφος, 374 ώτάριου, 222

520
Estudo no V ocabulário
G rego do N ovo T estamento

V olume

II
Em 1863, Marvin R. Vincent publicou a tradução de Gnomon o f the New Testament, uma
das principais obras de Bengel no campo da exegese do Novo Testamento. Desse trabalho,
surgiu o impulso necessário para a produção de um comentário léxico-gramatical do
Novo Testamento, seguindo a mesma linha de pesquisa e método, Trata-se de Estudo
no Vocabulário Grego do Novo Testamento (Word Studies in the New Testament), publicado
a partir de 1886. Em seu estudo do vocabulário neotestamentário, Vincent propõe-se
demonstrar a força e o valor original das palavras gregas, segundo seus significados
lexicais, etimologia, história, flexões, com as particularidades de seu emprego pelos
escritores sagrados,

A obra de Vincent diferencia-se pela abordagem do texto grego a partir de suas palavras
e expressões, antes de sua análise como componentes de construções linguísticas mais
amplas. Esse trabalho específico com as palavras visa a encaminhar o estudante à
compreensão mais completa dos textos, ultrapassando as dificuldades e limitações Impostas
pelo processo de tradução formal. Também inclui uma tarefa prévia de comparação e
seleção dos melhores textos, Ao explorar os potenciais das palavras, individualmente
e nas sentenças, Vincent determina com maior rigor os possíveis sentidos dos textos
e sugere leituras melhores e mais próximas dos originais. Por essas razões, esta obra
constitui uma verdadeira introdução à crítica bíblica textual.

M arvin R. V incent (1884-1922), doutor em teologia pelo Union Theological Seminary (Nova
York), teve carreira eclesiástica e magisterial. Liderou Igrejas no Brooklyn e em Troy. Foi
professor de latim na Troy University (Nova York), e deteve a cadeira Baldwin de literatura
sagrada e exegese do Novo Testamento no Union Theological Seminary (Nova York). Além de
seu Estudo no Vocabulário Grego do Novo Testamento, ele escreveu, nessa mesma área; Siudmfs
New Testament Handbook (1898), That Monster, the Higher Critic (1894), A Critical and Exegetical
Commentary on the Epistles to the Philippians and to Philemon (1897), History of the Textual Criticism
o f the New Testament ( 1899),
ISBN fiSEbBicm-i

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