Você está na página 1de 12

Seletividade fisiológica e ecológica de pesticidas para inimigos naturais

de insetos

Resumo
Os inseticidas usados no manejo integrado de pragas (MIP) também podem
ser prejudiciais aos inimigos naturais que estão naturalmente presentes ou são
liberados nos agroecossistemas. Além da mortalidade por agrotóxicos, efeitos
subletais (como redução da fecundidade, fertilidade, taxas de predação /
parasitismo, entre outros) podem ser observados em predadores e
parasitóides. Portanto, avaliar a nocividade desses compostos químicos aos
organismos benéficos, visando a integração de métodos químicos e biológicos
no controle de pragas, é importante para fundamentar o desenvolvimento de
programas de MIP mais eficientes, racionais e sustentáveis. Este capítulo
enfoca conceitos relacionados à seletividade de pesticidas a artrópodes
benéficos no controle de pragas. Após uma introdução abordando alguns
aspectos do manejo de pragas e conceitos relacionados à seletividade de
agrotóxicos, apresentamos resultados de estudos sobre os efeitos dos
agrotóxicos sobre os inimigos naturais em países Neotropicais. Muitos desses
estudos foram realizados de acordo com as metodologias propostas pela
Organização Internacional para o Controle Biológico e Integrado de Plantas e
Animais Nocivos (IOBC), incluindo o enquadramento dos compostos em
classes de toxicidade e persistência. A pesquisa enfoca os efeitos letais e
subletais de produtos fitossanitários sobre inimigos naturais, em diferentes vias
de exposição (aplicação tópica, contato residual, alimentação de material
tratado, etc.) e estágios de vida de predadores e parasitóides. Os efeitos
subletais incluíram alterações no comportamento e nos parâmetros biológicos
(ou seja, reprodução e desenvolvimento). Com essas informações, é possível
decidir se um inseticida e um inimigo natural podem ser usados juntos em
programas de MIP, potencializando o controle de pragas. Este campo de
pesquisa deve ser estimulado a incorporar novas estratégias de manejo de
pragas na América Latina.

Palavras-chave
Ecotoxicologia Avaliação de risco Controle biológico Controle químico
Baixar capítulo PDF
37.1 Introdução
A cada ano, a produção agrícola dos países sul-americanos aumenta,
principalmente devido ao uso de cultivares mais produtivas e com diferentes
níveis de resistência a pragas e doenças, melhor preparo do solo, fertilização
balanceada e uso de agroquímicos.
Apesar desse cenário, diversos fatores têm contribuído para evitar um aumento
ainda maior da produção agrícola, destacando a presença de inúmeras pragas
e doenças, obrigando os agricultores a fazer uso intensivo de agroquímicos. No
entanto, o elevado número de aplicações de produtos químicos e a falta de
conhecimento prévio de seus impactos nos agroecossistemas podem levar ao
aumento dos custos de produção e causar consequências negativas para o
meio ambiente. Um exemplo é a redução ou eliminação de populações
benéficas de organismos, como inimigos naturais. Consequentemente, podem
ocorrer desequilíbrios ecológicos, resultando no aparecimento de pragas
secundárias, ressurgimento e seleção de populações de pragas resistentes aos
compostos.

Devido aos efeitos negativos dos produtos químicos no homem e no meio


ambiente, o conceito de manejo integrado de pragas (MIP) foi desenvolvido
com foco na incorporação contínua de novas tecnologias, visando a redução
desses produtos nas lavouras. Dentro desse conceito, o principal objetivo é
maximizar os efeitos dos produtos fitossanitários sobre as pragas, com impacto
mínimo sobre os organismos benéficos presentes nos agroecossistemas. Isso
é muito importante, pois na América Latina existe uma grande ocorrência de
inimigos naturais que podem ser aplicados em programas de MIP (Melo et
al.2004; Zucchi et al.2010)

Portanto, este capítulo cobre vários aspectos relacionados à seletividade de


produtos fitossanitários. Serão enfatizados conceitos de seletividade e
resultados de experimentos quanto aos efeitos dos agroquímicos sobre os
inimigos naturais, bem como suas implicações no MIP em diferentes culturas.

37.2 Seletividade de Agroquímicos Versus MIP


Para garantir o sucesso dos programas de MIP, o monitoramento da população
de pragas deve ser realizado constantemente (Gallo et al. 2002) Dessa forma,
recomenda-se dividir a área cultivada em subáreas menores, visando a
execução de estratégias de manejo específicas em cada uma. O
monitoramento é feito por amostragem de insetos nas plantas, podendo esta
amostragem ser feita com a presença de um operador (coleta direta, rede
entomológica) ou sem a sua presença (armadilhas, com ou sem atratividade),
dependendo do inseto a ser amostrado. Para algumas pragas, os danos a
algumas partes das plantas (frutos, folhas) são amostrados em vez da
presença de insetos (por exemplo, no caso da broca do café, Hypothenemus
hampei (Ferrari) (Curculionidae), ou de maneira complementar à amostragem
de insetos (como como a traça-do-tomateiro, Tuta absoluta (Meirick)
(Gelechiidae)).
A partir dos dados coletados, é possível estimar a densidade populacional do
inseto na área e, assim, comparar com informações da literatura para
determinar se a população do inseto atingiu um nível que requer intervenção
humana para sua redução (limiar econômico). Se isso ocorrer, o agricultor ou
técnico responsável deve decidir quais métodos de controle devem ser
aplicados, baseando-se em fatores econômicos, sociais e ambientais (Gallo et
al.2002) Além disso, para algumas situações específicas, existe o nível de não
ação, que é a densidade populacional de inimigos naturais capazes de
controlar naturalmente uma praga. Um exemplo é o caso do bicho-mineiro do
café, Leucoptera coffeella (Guérin-Mèneville & Perrottet) (Lyonetiidae). Nesse
caso, são amostradas folhas de café com presença de minas (sinal de dano da
praga) e, além disso, é levado em consideração o estado das minas, pois
podem apresentar indícios de predação. Se isso ocorrer, é um indicativo de
que inimigos naturais presentes na área estão exercendo controle biológico
sobre a praga. No caso específico do bicho-mineiro do café, se mais de 60%
das minas amostradas apresentarem sinais de predação, não é necessário
adotar outras medidas de controle (Picanço2010)

Desta forma, a amostragem de pragas e inimigos naturais é um dos alicerces


do IPM. Caso seja necessária uma intervenção com inseticidas, é interessante
que esses produtos causem o menor impacto possível aos inimigos naturais,
liberados ou naturalmente presentes na área. Nesse contexto, a integração
entre táticas de controle biológico e químico deve ser estimulada pelo uso de
produtos seletivos aos inimigos naturais (Parra2014) De acordo com Ripper et
al. (1951), a seletividade pode ser definida como a capacidade de um produto
de controlar a praga alvo, causando o menor impacto possível em organismos
benéficos, como predadores, parasitóides e polinizadores, e pode ser dividida
em:

Seletividade Fisiológica
Relacionado à natureza química do inseticida e sua relação com os insetos.
Diferenças nos processos de absorção, penetração, transporte, ativação e
degradação dos inseticidas em cada espécie de inseto podem fazer com que
um produto seja mais tóxico para a praga do que para seu inimigo natural em
uma situação em que ambos tenham contato com o composto ou com seus
resíduos.

Seletividade Ecológica
Intrínseco ao organismo benéfico e ao seu habitat, isso ocorre devido às
diferenças de comportamento entre pragas, inimigos naturais e polinizadores,
fazendo com que o produto químico tenha contato apenas com certas
espécies, principalmente com pragas. Assim, para obter este tipo de
seletividade, é necessário conhecer a bioecologia das pragas e os artrópodes
benéficos que estão presentes nos diferentes agroecossistemas.

Ao implementar programas IPM, a compatibilidade ou integração entre os


métodos de controle é recomendada. A preservação de inimigos naturais no
agroecossistema é uma das estratégias mais importantes em programas de
MIP, uma vez que o uso de compostos químicos pode impactar negativamente
suas populações (Degrande et al.2002) Os inseticidas sintéticos usados no
controle de pragas agrícolas pertencem a diferentes grupos químicos e seus
modos de ação podem atuar sobre diferentes grupos de insetos. Infelizmente,
poucos agricultores usam meios seguros para avaliar os riscos aos quais seu
investimento pode estar sujeito e sofrer com o ataque de pragas em suas
lavouras. Em muitos casos, para reduzir as populações de pragas, compostos
químicos são pulverizados sem orientações técnicas, gerando ainda maior
instabilidade no agroecossistema devido à eliminação dos agentes
controladores desses organismos indesejáveis. Assim, desequilíbrios
sucessivos são gerados pelo impacto promovido por intervenções químicas,
muitas vezes levando a uma falta geral de controle de pragas (Bueno et
al.2017)

O controle biológico pode ser responsável pela estabilidade da população de


artrópodes-praga em agroecossistemas. Além de manter suas populações em
equilíbrio e abaixo do limite econômico, seja pela manutenção de inimigos
naturais existentes ou pela liberação de insetos criados em massa no campo, o
método biológico ainda minimiza a intervenção humana em comparação com
outros métodos de controle (Bueno et al.2017)

O uso de produtos químicos de alta toxicidade e amplo espectro de ação é


reconhecido como a principal causa dos desequilíbrios ecológicos nos
agroecossistemas. A maioria dos inseticidas usados é neurotóxica, ou seja,
agem no sistema nervoso dos insetos (por exemplo, piretróides,
neonicotinóides e organofosforados). Em geral, esses produtos possuem um
amplo espectro de ação; portanto, eles tendem a ser menos seletivos
(Foerster2002) Para evitar essa situação, o uso de produtos seletivos é
considerado uma estratégia viável, justificando estudos nesta linha de pesquisa
(Degrande et al.2002; Foerster2002) Muitas características biológicas de
inimigos naturais podem interferir em sua suscetibilidade a produtos
fitossanitários, como sexo, idade, tamanho, hábitos diários e estágio de
desenvolvimento (Foerster2002) Nesse contexto, trabalhos estão sendo
desenvolvidos por pesquisadores levando em consideração algumas dessas
características, conforme exemplificado a seguir.
37.3 Estudos dos efeitos dos agroquímicos em organismos benéficos
A maioria dos resultados foi obtida de acordo com uma metodologia
padronizada pela “Organização Internacional para o Controle Biológico e
Integrado de Plantas e Animais Nocivos” (IOBC), que leva em consideração a
mortalidade causada pelos produtos e a redução das atividades benéficas
(predação e parasitismo ), bem como características biológicas. Outros testes
de seletividade também serão discutidos, como persistência do efeito de
resíduos de agrotóxicos sobre os inimigos naturais, mudanças de
comportamento desses organismos e exposição de insetos benéficos a plantas
oriundas de sementes tratadas.

Predadores da família Chrysopidae (Green Lacewings)


Embora os adultos de Chrysopidae se alimentem de fontes vegetais (pólen,
néctar e melada), as larvas são predadoras polífagas. Portanto, esses insetos
são importantes agentes de controle biológico para diversas espécies de
artrópodes-praga em diversas culturas de interesse econômico.

Porém, para manter a população de crisopídeos em programas de MIP que


incluem o uso de produtos fitossanitários, é necessário avaliar o impacto dos
inseticidas sobre esses organismos. Esses estudos permitem selecionar
produtos que causam efeitos baixos ou nenhum efeito negativo sobre o
predador. Assim, é possível integrar métodos químicos e biológicos, utilizando
inseticidas seletivos associados à liberação desses inimigos naturais ou
visando sua manutenção em agroecossistemas.

Nesse contexto, Godoy et al. (2010) realizaram um estudo sobre o efeito de


inseticidas (tiametoxam, imidaclopride, milbemectina, piriproxifeno e
espirodiclofeno) em adultos de Chrysoperla externa (Hagen) e Ceraeochrysa
cubana (Hagen) (Chrysopidae). Eles concluíram que a milbemectina, o
piriproxifeno e o espirodiclofeno são inofensivos aos predadores e podem ser
recomendados nos programas de MIP visando à manutenção desses inimigos
naturais em citros.

Lacewings são freqüentemente encontrados em lavouras de café, atuando


como reguladores de populações de pragas, portanto, Vilela et al. (2010)
realizaram um estudo com o objetivo de avaliar os efeitos do espirodiclofeno,
fenpropatrina, enxofre e abamectina nos três primeiros instares larvais de C.
externa . Eles descobriram que a fenpropatrina (em duas dosagens, 0,15 e
0,30 g ia / L) e a abamectina na dosagem mais alta (0,0225 g ia / L) foram os
produtos mais prejudiciais às larvas de predadores. Esses produtos afetaram a
sobrevivência de ninfas de três instares, além de causar alterações no período
larval. O espirodiclofeno (0,12 g ia / L) causou efeito moderado, enquanto o
enxofre (4,0 e 8,0 g ia / L) foi inofensivo para as larvas de C. externa .

Haramboure et al. (2013) avaliaram o efeito de diferentes concentrações de


cipermetrina, via aplicação tópica, em larvas de C. externa na Argentina. As
larvas apresentavam sintomas de intoxicação por inseticida, como tremores,
redução do movimento e efeito knockdown (paralisia por intoxicação por
inseticida). A proporção de amostras que exibiram esses sintomas foi maior
com o aumento da dosagem. Porém, em todas as dosagens avaliadas, os
insetos se recuperaram após 96 horas, provavelmente devido à ação
enzimática relacionada à desintoxicação. Esses resultados indicam que larvas
de C. externa apresentam alta tolerância a esse piretróide. Outro estudo,
também realizado na Argentina, mostrou que o piriproxifeno e o acetamipride
podem diminuir a sobrevivência e aumentar a duração do primeiro ínstar larval
de C. externa (Rimoldi et al. 2017)

Hemiptera Predatoria
Testes de seletividade foram realizados para diferentes espécies de insetos
predadores. Esses inimigos naturais, tanto ninfas quanto adultos, são polífagos
e têm hábitos predatórios, alimentando-se de ovos, lagartas, ácaros, pulgões e
tripes. Entre as espécies estudadas estão Orius insidiosus (Say)
(Anthocoridae), Macrolophus basicornis (Stål) (Miridae) e Podisus nigrispinus
(Dallas) (Pentatomidae).

Moscardini et al. (2013) avaliaram o efeito de inseticidas usados na cultura do


tomate sobre os ovos de O. insidiosus . Abamectina, cartap, spirotetramat +
imidacloprid e flubendiamida foram prejudiciais; a pimetrozina era ligeiramente
prejudicial; pyriproxyfen e Rynaxypyr eram inócuos; entretanto, o último produto
afetou os parâmetros reprodutivos de O. insidiosus , demonstrando a
importância da avaliação dos efeitos subletais em estudos de seletividade.

Os inseticidas recomendados para o controle de pragas da roseira também


tiveram os efeitos letais e subletais avaliados em ovos e ninfas de O. insidiosus
. Ovos de predadores foram imersos em soluções inseticidas por 5 segundos e
depois mantidos em laboratório. O inseticida deltametrina foi prejudicial aos
ovos e ninfas de quinto instar, enquanto o formetanato e o espinosade foram
ligeiramente prejudiciais. O formetanato não afetou negativamente as
características reprodutivas de fêmeas originadas de ovos tratados. Spinosad
reduziu o número e a viabilidade de ovos colocados por fêmeas de ninfas de
quinto instar tratadas (Torres et al.2007)
Para avaliar os efeitos dos inseticidas sobre O. insidiosus , pode-se utilizar a
aplicação tópica, ou seja, o produto a ser testado é aplicado diretamente no
dorso do inseto. Assim, adultos desse predador foram submetidos à aplicação
de produtos químicos usados na cultura do crisântemo, sendo o clorotalonil
inócuo. O mancozebe e o dicofol foram ligeiramente prejudiciais, e o lufenurom
mostrou ser moderadamente prejudicial. Os demais produtos, bifentrina,
triazofos, metomil e acetamiprida, foram considerados nocivos. Devido à baixa
toxicidade do clorotalonil, mancozebe dicofol, esses compostos podem ser
recomendados em programas de MIP visando a conservação desse predador
nesta cultura (Albernaz et al.2009)

O percevejo M. basicornis é um potencial agente de controle biológico da traça-


do-tomateiro, T. absoluta , mas pode ser influenciado negativamente por
diversos produtos fitossanitários usados no controle de pragas do tomateiro.
Em laboratório, Passos et al. (2017) trataram folíolos de tomate com inseticidas
recomendados para o controle desse lepidóptero e, a seguir, ninfas e adultos
de M. basicornis foram expostos aos folíolos. Os produtos não classificados
como inofensivos em laboratório também foram avaliados em casa de
vegetação. Abamectina e clorfenapir foram tóxicos para ninfas e adultos do
predador em todos os bioensaios. O cloridrato de Cartap era ligeiramente
tóxico para adultos em laboratório, mas tóxico para ninfas em laboratório e
moderadamente tóxico em estufas. Clorantraniliprol e teflubenzuron foram
inofensivos para M. basicornis na maioria dos bioensaios, exceto para ninfas
em teste de laboratório, onde foram classificadas como moderadamente
tóxicas e levemente tóxicas. Assim, esses produtos devem ser preferidos em
programas de IPM para conservar as populações deste predador.

Outra rota de exposição de predadores a inseticidas em agroecossistemas é


por meio do néctar extrafloral contaminado quando se utiliza o tratamento de
sementes, uma vez que muitos desses insetos utilizam esses recursos para
complementar sua alimentação. Os efeitos dos inseticidas utilizados no
tratamento de sementes de soja (tiametoxam e clorantraniliprol) foram
avaliados sobre o predador zoofitófago P. nigrispinus . O tiametoxam causou
aumento na mortalidade, além de afetar a fecundidade, o período de pré-
oviposição e a sobrevivência das fêmeas quando comparado ao
clorantraniliprol. No entanto, a expectativa de vida de fêmeas de P. nigrispinus
foi prolongada por clorantraniliprole, que também aumentou a taxa intrínseca
de aumento populacional ( r m ) e a taxa de crescimento finito ( l) e redução do
tempo de duplicação da população (TD) quando comparado ao tiametoxame.
Outros parâmetros como taxa reprodutiva líquida ( R 0 ) e intervalo
intergeracional médio ( T ) não foram afetados por nenhum dos inseticidas.
Além disso, foram avaliadas a distância percorrida e a velocidade média das
mulheres expostas a esses produtos, mas esses parâmetros não foram
influenciados. Assim, o tratamento de sementes com esses inseticidas
apresentou risco baixo (clorantraniliprol) e moderado (tiametoxam) para P.
nigrispinus (Gontijo et al.2017)

Doru lineare (Dermaptera: Forficulidae)


Este é um dos predadores mais comuns na cultura do milho, atacando
principalmente ovos e lagartas de Spodoptera frugiperda (JE Smith)
(Noctuidae). Esse inimigo natural está presente durante todo o ciclo da cultura,
desde a emergência das mudas até a colheita, e deve ser preservado em
sistemas agrícolas por meio de agrotóxicos seletivos.

Para conhecer o impacto dos inseticidas em D. lineare, foi realizado um


trabalho avaliando produtos usados no milho em ovos e ninfas de primeiro
ínstar do predador. Triflumuron, deltametrina, diflubenzuron, lambda-cialotrina
+ tiametoxam, alfa-cipermetrina, metoxifenozida, lambda-cialotrina, clorpirifós,
lufenuron, tebufenozida, azadiractina, carbaril e espinosade foram avaliados.
Concluiu-se que triflumuron, diflubenzuron, lambda-cialotrina + tiametoxam,
lambda-cialotrina, clorpirifós, lufenuron e carbaril reduziram a viabilidade do
ovo. A sobrevivência das ninfas dos ovos tratados foi reduzida por
deltametrina, diflubenzuron, lambda-cialotrina + tiametoxam, lambda-cialotrina,
clorpirifós e carbaril. Para ninfas no teste de contato residual, todos os
inseticidas foram prejudiciais dentro de 96 horas após a exposição dos insetos
aos seus resíduos (Zotti et al.2010)

Coccinelídeos predatórios
Os insetos da família Coccinellidae são importantes agentes de controle
biológico em diversas culturas de importância econômica. Larvas e adultos de
algumas espécies, como Coleomegilla maculata (DeGeer) e Hippodamia
convergens (Guérin-Méneville), são predadores vorazes de pulgões, tripes,
ovos e pequenas lagartas. Moscardini et al. (2015) avaliaram o efeito dos
inseticidas tiametoxam e clorantraniliprol, usados no tratamento de sementes
de girassol, nas características biológicas e reprodutivas desses predadores.
Larvas e adultos de C. maculata e H convergens foram expostos aos produtos
alimentando-se de nectários extraflorais de plantas tratadas. Ambos os
inseticidas prolongaram o período de pupa de C. maculata exposta na fase
larval. Para H. convergens , houve redução da viabilidade dos ovos e aumento
do período embrionário dos insetos expostos na fase larval, bem como
alteração da proporção sexual causada pelo tiametoxame. Esses inseticidas
também prolongaram o estágio de pupa de insetos originados de adultos
expostos.
A seletividade fisiológica de inseticidas usados no algodão para ovos e larvas
de terceiro ínstar de Cycloneda sanguinea (Linnaeus) (Coccinellidae) foi
avaliada por Pedroso et al. (2012) O inseticida triflumuron foi inofensivo para os
ovos de C. sanguinea e levemente nocivo para as larvas. O espinosade foi
ligeiramente prejudicial aos ovos e larvas, enquanto os outros produtos
(clorfenapir, clotianidina e imidaclopride + ß-ciflutrina) foram prejudiciais aos
ovos e larvas do predador.

Na Argentina , foi avaliada a seletividade de quatro inseticidas usados na


horticultura (pyriproxyfen, teflubenzuron, acetamiprid e cipermetrina) a Eriopis
connexa (Germar) (Coccinellidae), importante agente de controle de pragas da
horticultura na região Neotropical. Todos os compostos causaram efeito letal e /
ou subletal no predador. No entanto, os inseticidas neurotóxicos foram mais
tóxicos que os reguladores de crescimento, e a pupa apresentou maior
suscetibilidade aos produtos em relação à fase adulta (Fogel et al.2016)

Parasitóides
Trichogramma pretiosum Riley (Trichogrammatidae) é uma das espécies mais
utilizadas em programas de controle biológico no mundo. Os insetos desse
gênero são parasitóides generalistas de ovos, utilizados principalmente no
controle de lepidópteros-praga, por meio de liberações inundativas em
agroecossistemas. T. pretiosum foi registrado em vários países da América
Latina (Zucchi et al.2010), assumindo importância no controle de diversos
insetos fitófagos. No Brasil, por exemplo, é registrado para algumas culturas o
controle de lepidópteros desfolhantes, como a traça-do-tomateiro ( T. absoluta )
e a lagarta-do-cartucho ( S. frugiperda ). Portanto, é imprescindível a realização
de estudos visando a determinação de produtos seletivos a este inimigo
natural.

O efeito dos inseticidas usados na cultura do tomate (acetamiprid, lufenuron,


imidacloprid, novaluron, triflumuron e piriproxifeno) foi avaliado em estágios
imaturos de T. pretiosum , e acetamiprid, imidacloprid, lufenuron e piriproxifen
foram tóxicos para o parasitóide (Carvalho et al.2010b) Quando esses
inseticidas foram avaliados em adultos, o piriproxifeno foi levemente prejudicial,
devido à redução da capacidade de parasitismo das fêmeas da geração
materna. Acetamipride, imidaclopride, lufenuron e triflumuron foram inofensivos
para T. pretiosum adultos e poderiam ser recomendados em programas de IPM
de tomate, a fim de preservar este parasitóide (Carvalho et al.2010a)

Com o objetivo de investigar o efeito de outros produtos recomendados para o


controle de pragas do tomateiro, abamectina, acetamiprid, cartap e clorpirifós
foram testados para T. pretiosum em diferentes estágios de desenvolvimento.
Foi avaliado o parasitismo de fêmeas expostas aos produtos em ovos de
Ephestia kuehniella (Zeller) (Pyralidae). Foi observada redução de até 98,3%
no parasitismo causado pelo acetamiprida e redução de 100% devido ao efeito
dos demais inseticidas avaliados (Moura et al.2006)

Moura et al. (2004) relataram o efeito residual de acetamipride, clorfenapir,


imidaclopride, tiaclopride e tiametoxam nas duas primeiras gerações de
parasitóides de fêmeas de T. pretiosum tratadas em laboratório. Imidaclopride
e clorfenapir foram os mais prejudiciais; e o tiaclopride reduziu a taxa de
parasitismo, embora não tenha afetado a longevidade. Os efeitos deletérios do
clorfenapir e do tiaclopride foram transmitidos à geração subsequente desse
parasitóide. Como o tiametoxame e o acetamipride foram seletivos nas
condições avaliadas, eles são adequados para uso em programas de MIP em
tomate.

Nörnberg et al. (2011) verificaram a persistência (duração da atividade nociva)


de dez produtos, recomendados na produção integrada de frutas, sobre T.
pretiosum . Adultos foram expostos a folhas de videira tratadas com os
produtos, e foi avaliado o efeito residual sobre o parasitismo aos 3, 10, 17, 24 e
31 dias após a pulverização. Os princípios ativos malatião e os fungicidas
tetraconazol, mancozebe tiofanato de metila foram classificados como de curta
duração (<5 dias de ação nociva); o inseticida / acaricida abamectina como
levemente persistente (5–15 dias de ação nociva); o inseticida clorpirifós como
moderadamente persistente (16-30 dias de ação nociva); e inseticidas fosmet e
carbaril e fungicida / acaricida sulfúrico como persistentes (> 31 dias de ação
nociva).

Com o objetivo de utilizar T. pretiosum juntamente com produtos químicos na


cultura do milho convencional, Stefanello Júnior et al. (2008) investigaram o
efeito de 16 formulações comerciais de inseticidas registradas para esta cultura
sobre a capacidade de parasitismo desta espécie em laboratório. Alfa-
cipermetrina e lufenuron foram ligeiramente deletérios; spinosad foi
moderadamente prejudicial; cipermetrina, deltametrina, deltametrina +
triazofos, triclorfon, paration-metil, triazofos, lambda-cialotrina, malatião,
fenitrotiona, beta-ciflutrina e clorpirifós foram prejudiciais a adultos de T.
pretiosum no teste de toxicidade inicial. Os inseticidas triflumuron e novaluron
eram inócuos; portanto, eles devem ser preferidos em programas de IPM de
milho onde este parasitóide é usado.

Além de parasitóides de ovos, como Trichogramma spp., Também existem


espécies que parasitam outras fases do desenvolvimento de pragas. Luna-Cruz
et al. (2015) avaliaram o efeito de inseticidas sobre Tamarixia triozae (Burks)
(Eulophidae), um parasitóide do psilídeo Bactericera cockerelli(Šulc) (Triozidae)
ninfas, comuns em plantações de Solanaceae na América Central e do Norte.
Adultos parasitóides foram expostos a folíolos de tomate tratados com
inseticidas recomendados para o controle do psilídeo (espirotetramata,
espiromesifeno, beta-ciflutrina, pimetrozina, azadiractina, imidacloprida,
abamectina e espinosade), e todos eles tinham pelo menos algum nível de
toxicidade para o parasitóide. Spinosad foi classificado como prejudicial;
abamectina era moderadamente prejudicial e os outros levemente prejudiciais.
Spinosad e abamectin também apresentaram maior persistência do efeito letal
sobre o parasitóide (41 e 24 dias, respectivamente), enquanto os demais
inseticidas não ultrapassaram 13 dias. Assim, produtos que causam menor
mortalidade e apresentam menor persistência no meio ambiente podem ser
considerados nos programas de manejo de B. cockerelli .

Em resumo, há um grande volume de trabalhos publicados nos últimos anos a


respeito dos efeitos de produtos fitossanitários sobre inimigos naturais na
América Latina. No entanto, as pesquisas devem continuar à medida que
novas moléculas químicas são registradas comercialmente para colaborar no
desenvolvimento de programas de IPM.

37.4 Considerações Finais


As pesquisas sobre os efeitos dos compostos químicos nos organismos
benéficos foram deixadas de lado por muitos anos. Porém, a demanda da
sociedade por produtos agrícolas melhores e com menos produtos químicos
tem estimulado o aumento de estudos nesta linha de pesquisa. A integração
entre métodos químicos e biológicos de controle de pragas é importante para o
desenvolvimento de programas de MIP em diferentes culturas de valor
econômico na região Neotropical.

Nos primeiros estudos sobre seletividade, apenas a mortalidade causada pelos


compostos em insetos benéficos foi enfatizada. Pesquisas que consideraram
os efeitos subletais dos produtos sobre as populações desses organismos
foram escassas. Com o tempo, os pesquisadores também se preocuparam
com os efeitos dos compostos no comportamento e na reprodução de inimigos
naturais e polinizadores. Além disso, a estrutura de pesquisa no Brasil e em
outros países latino-americanos, como Argentina e Colômbia, melhorou muito.
Portanto, existem melhores condições para o estudo da seletividade de
agrotóxicos a inimigos naturais em condições de laboratório, semicampo e
campo.

Os produtos fitossanitários são utilizados em grande quantidade para o controle


de pragas em países da América Latina (principalmente no Brasil, considerado
o maior consumidor de produtos químicos do mundo). Assim, é de extrema
importância a realização de pesquisas que busquem o uso racional desses
compostos, respeitando os fatores de mortalidade natural e a ação dos
inimigos naturais nos agroecossistemas.

Você também pode gostar