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TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO TC 002.

680/2012-2

GRUPO II – CLASSE I – Primeira Câmara


TC 002.680/2012-2
Natureza: Recurso de Reconsideração (Tomada de Contas
Especial)
Entidade: Base Aérea de Anápolis (00.394.429/0080-04)
Recorrentes: Elson Tadeu Gomes (426.661.046-72) e Hemiliana
Sousa Barbosa (887.008.441-87)
Representação legal: Fernando Villela de Andrade Vianna
(OAB/RJ 134.601) e outros, representando Elson Tadeu Gomes
(peças 70 e 84); Renato Otto Klos (OAB/RJ 117.110) e outros,
representando Hemiliana Sousa Barbosa (peças 85 e 145).

SUMÁRIO: TOMADA DE CONTAS ESPECIAL. BASE AÉREA


DE ANÁPOLIS. CONSUMO IRREGULAR E DESVIO DE
GASES. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DE MILITAR,
CIVIS E DE PESSOA JURÍDICA. CONTAS IRREGULARES.
DÉBITO E MULTA. RECURSO DE RECONSIDERAÇÃO.
EVIDÊNCIAS INSUFICIENTES PARA DEMONSTRAR O
NEXO ENTRE AS CONDUTAS DOS RESPONSÁVEIS E A
TOTALIDADE DO DÉBITO APURADO. IMPOSSIBILIDADE
DE RESPONSABILIZAÇÃO DOS EMPREGADOS DA
EMPRESA CONTRATADA. PRECEDENTES. PROVIMENTO
PARCIAL. REDUÇÃO DO DÉBITO E DA MULTA. CIÊNCIA
AOS INTERESSADOS.
1. Não é possível a imputação de débito caso as evidências dos
autos não demonstrem, de forma inequívoca, o nexo de
causalidade entre as condutas indicadas nos ofícios de citação e
o dano apurado.
2. O vínculo contratual entre a entidade privada e o Poder Público
não permite a responsabilização dos agentes da empresa
contratada (administradores, sócios ou empregados) por
prejuízos causados ao erário. Na hipótese de estarem presentes
os requisitos para a desconsideração da personalidade jurídica,
os sócios e os administradores da empresa contratada podem
ser alcançados, mas não os empregados.

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de reconsideração interposto por Elson Tadeu Gomes e Hemiliana


Sousa Barbosa, respectivamente, gerente de operações e empregada da White Martins Gases
Industriais Ltda., à época dos fatos, em face do Acórdão 1.529/2015-TCU-Primeira Câmara, que assim
concluiu:
“9.1. excluir da relação processual o sr. Algomiro Pereira;
9.2. considerar revel, para todos os efeitos, o sr. Sérgio Silva Valdemar, dando-se prosseguimento
ao processo, com fundamento no art. 12, § 3º, da Lei 8.443/1992;

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9.3. rejeitar as alegações de defesa apresentadas pelos srs. Elson Tadeu Gomes e Hemiliana Souza
Barbosa, e pela empresa Fermáquinas Máquinas e Equipamentos - Eireli - EPP;
9.4. julgar irregulares as contas dos srs. Sérgio Silva Valdemar, Elson Tadeu Gomes e da Sr ª
Hemiliana Souza Barbosa, com fundamento nos arts. 1º, I, e 16, III, ‘d’, da Lei 8.443/ 1992, e
condená-los, em solidariedade com a empresa Fermáquinas Máquinas e Equipamentos - Eireli -
EPP, ao pagamento das quantias a seguir especificadas, fixando-lhes o prazo de 15 (quinze) dias, a
contar das notificações, para que comprovem, perante o Tribunal (art. 214, III, ‘a’, do RI/TCU), o
recolhimento das dívidas aos cofres do Tesouro Nacional, atualizadas monetariamente e acrescidas
dos juros de mora, calculadas desde as datas indicadas até o efetivo recolhimento, nos termos da
legislação em vigor:
Data Valor (R$)
16/ 3/2010 94.734,00
17/ 5/2010 41.729,00
9.5. condenar os srs. Sérgio Silva Valdemar, Elson Tadeu Gomes e a Srª Hemiliana Souza Barbosa,
em solidariedade, ao pagamento do débito no valor de R$ 79.168,82 (setenta e nove mil, cento e
sessenta e oito reais e oitenta e dois centavos), atualizado monetariamente e acrescido dos juros de
mora desde 17/5/2010, até o efetivo recolhimento, nos termos da legislação em vigor, fixando-lhes
o prazo de 15 (quinze) dias, a contar da notificação, para que comprovem, perante este Tribunal
(art. 214, III, ‘a’, do RI/TCU), o recolhimento da dívida aos cofres do Tesouro Nacional;
9.6. aplicar a multa prevista no art. 57 da Lei 8.443/1992 aos srs. Sérgio Silva Valdemar, Elson
Tadeu Gomes, Hemiliana Souza Barbosa e à empresa Fermáquinas Máquinas e Equipamentos -
Eireli - EPP, individualmente, no valor de R$ 17.000,00 (dezessete mil reais), fixando-lhes o prazo
de 15 (quinze) dias, a contar das notificações, para que comprovem, perante o Tribunal (artigo 214,
III, ‘a’, do RI/TCU), o recolhimento da dívida aos cofres do Tesouro Nacional, atualizada
monetariamente desde a data do presente acórdão até a data do efetivo recolhimento, se for paga
após o vencimento, na forma da legislação em vigor;
9.7. autorizar, desde já, nos termos do art. 28, II, da Lei 8.443/1992, a cobrança judicial das
dívidas;
9.8. encaminhar cópia desta deliberação ao Ministério Público Militar para ciência.”
2. Tal acórdão foi adotado no âmbito de tomada de contas especial instaurada pela Base
Aérea de Anápolis (BAAN), órgão do Comando Aéreo da Aeronáutica (Comaer), vinculado ao
Ministério da Defesa, em desfavor do então suboficial Sérgio Silva Valdemar, na condição de
encarregado da Subseção de Gases daquela unidade militar, em razão de desvio na aquisição e
consumo de gás acetileno no período de 17/11/2008 a 25/08/2009.
3. Após diversas investigações, que expandiram o período e o escopo das irregularidades
apuradas, a comissão tomadora das contas produziu relatório concluindo que a entrega de gases
adquiridos pelo Comaer da empresa White Martins na sede da empresa Fermáquinas teve a
intermediação do militar Sérgio Silva Valdemar, em conluio com Elson Tadeu Gomes e Hemiliana
Sousa Barbosa (empregados da White Martins) e Algomiro Pereira (sócio da Fermáquinas).
4. Foram identificados os seguintes débitos:
a) R$ 112.269,09, referentes a diferenças no faturamento e no controle de estoque de gases
da BAAN no período de janeiro de 2005 a setembro de 2009;
b) R$ 8.628,73, referentes a notas fiscais de venda que, por estarem ilegíveis, não foram
consideradas como comprovantes de liquidação no procedimento mencionado no item “a” acima;
c) R$ 94.734,00, referentes ao extravio de 79 cilindros de gás da BAAN.
5. Encaminhados os autos a esta Corte de Contas, promoveu-se a regular citação de todos os
responsáveis, sendo que apenas o militar permaneceu revel, enquanto os demais apresentaram defesa.

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6. Em seguida, o Relator a quo, ao analisar o processo, determinou a citação da empresa


Fermáquinas, por entender que as notas fiscais constantes dos autos nas quais consta a informação de
entrega na empresa demonstram que a responsabilidade é da pessoa jurídica, e não do sócio
administrador, Algomiro Pereira. Além disso, observou que o montante do débito a ser atribuído à
empresa em razão do desvio de gases deveria ser reduzido, pois essas notas fiscais perfazem o total de
apenas R$ 41.729,00.
7. Promovida a citação pela unidade técnica, em conformidade com a determinação do
relator, a empresa Fermáquinas apresentou alegações de defesa.
8. Por meio do Acórdão 1.529/2015, cujo dispositivo está reproduzido acima, a Primeira
Câmara do TCU rejeitou as alegações de defesa dos responsá veis remanescentes e condenou-os,
solidariamente, ao pagamento dos débitos que especifica, além de impor- lhes, individualmente, a
multa prevista no art. 57 da Lei 8.443/1992.
9. Inconformados, os empregados da White Martins à época dos fatos, Elson Tadeu Gomes e
Hemiliana Sousa Barbosa, interpuseram recurso de reconsideração, que é objeto do presente exame.
10. Admitido o processamento do recurso, porquanto preenchidos os requisitos previstos no
art. 33 da Lei 8.443/1992, conferi efeito suspensivo aos itens 9.4, 9.5, 9.6 e 9.7 do Acórdão recorrido
em relação aos recorrentes, estendendo-o a todos os responsáveis com eles condenados em
solidariedade.
11. Instruído o presente feito, faço reproduzir, na essência e com os ajustes que julgo
pertinentes, o exame técnico, bem como o encaminhamento, oferecido pela Secretaria de Recursos
deste Tribunal (peça 146):
“EXAME TÉCNICO
10.Delimitação
10.1. O presente recurso tem por objeto examinar:
a) os efeitos do julgamento de ação penal pela Justiça Militar sobre a apreciação da presente TCE
pelo TCU;
b) a existência de conluio entre os recorrentes e o encarregado da Subseção de Gases da Baan à
época dos fatos;
c) a dosimetria das sanções aplicadas pelo Tribunal aos recorrentes.
11.Observações preliminares
11.1. Antes de iniciar a análise das alegações dos recorrentes, algumas observações
importantes se fazem necessárias.
11.2. Como visto, o débito imputado aos recorrentes se divide em três parcelas (em valores
históricos):
1) R$ 112.269,09, referentes ao controle de estoque de gases da Baan de janeiro de 2005 a
setembro de 2009;
2) R$ 8.628,73, referentes a notas fiscais de venda que ficaram pendentes de análise no controle de
estoque mencionado no item 1;
3) R$ 94.734,00, referentes ao extravio de 79 cilindros de gás da Baan.
11.3. O primeiro débito, no valor de R$ 112.269,09, foi identificado em relatório elaborado
por uma comissão instituída pela Baan, de 17/5/2010 (peça 2, p. 287-298). Primeiro, apurou-se a
diferença a maior, no período considerado, entre os volumes faturados de gases, avaliados por meio
das notas fiscais de venda registradas no Siafi, e as entregas efetivas, registradas nas prestações de
contas da Baan (peça 2, p. 293-294). Segundo, apurou-se a diferença a menor, no mesmo período,
entre o estoque inicial de gases em determinados meses e o estoque final do mês anterior (peça 2, p.
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295-296). Os desvios apurados por esses dois métodos foram somados para se chegar aos volumes
totais de gases desviados no período, aos quais se aplicaram os “preços unitários vigentes” para se
obter o valor do débito (peça 2, p. 296, item 4.1.3, “a”).
11.4. O segundo débito, no valor de R$ 8.628,73, foi identificado nesse mesmo relatório
(peça 2, p. 289-290, item 3.1.2), sendo relativo à falta de envio de cópia legível de oito notas fiscais
de venda à comissão da Baan pelo Centro Logístico da Aeronáutica - Celog.
11.5. O terceiro débito, no valor de R$ 94.734,00, foi identificado em outro relatório (peça 2,
p. 189-195) e quantificado financeiramente em laudo de avaliação da Baan (peça 2, p. 185-188).
Resultou da comparação entre o número de cilindros de gases informados como aplicados pelas
empresas Linde Gases e White Martins e o verificado em inventário desses cilindros realizado na
Baan em 9/2/2010. Apurou-se que 79 cilindros supostamente aplicados não foram encontrados no
inventário.
11.6. Na verdade, a soma das notas fiscais de venda pendentes de análise que deram origem
ao segundo débito (peça 2, p. 289-290) não perfaz R$ 8.628,73, mas sim R$ 8.539,63, conforme
quadro abaixo. Dessas notas fiscais, cujas cópias não se encontram nos autos, pelo menos cinco, no
total de R$ 5.449,58, à toda probabilidade, não são da White Martins, pois não seguem o padrão de
numeração que adotava à época, com 6 dígitos, conforme se pode verificar nas dezenas de notas da
empresa acostadas aos autos (peça 1, p. 101-164 e 253-279; peça 4, p. 61-125). Portanto, mesmo
que se considere esse débito procedente, apenas R$ 3.090,05 podem ser imputados aos recorrentes,
visto que foram responsabilizados por sua condição de empregados da White Martins.
NFv Valor (R$)
41531 2.600,00
46767 639,00
67206 669,68
67698 708,90
71997 832,00
Subtotal 5.449,58
195865 1.796,63
224320 466,06
238532 827,36
Subtotal 3.090,05
Total 8.539,63
11.7. É de se questionar se o mesmo não ocorreu com as diferenças de estoque apuradas por
comparação entre notas fiscais de venda e as prestações de contas da Baan, que constituem a maior
parte do primeiro débito, já que se ignora quais foram as notas fiscais consideradas para essa
apuração, visto que não são listadas nos autos.
11.8. No caso do terceiro débito, verifica-se que, dos 79 cilindros extraviados, 62 eram da
empresa Linde Gases, no valor total de R$ 72.366,85, e apenas 12 da White Martins, no valor total
de R$ 22.367,37 (cf. tabela abaixo, baseada na da peça 2, p. 188). Ora, como o débito decorre da
informação fornecida por cada empresa sobre o número de cilindros de sua propriedade aplicados
na Baan, não procede a atribuição de responsabilidade aos recorrentes pela informação prestada
pela Linde Gases. Portanto, caso considerado procedente o débito em questão, apenas a parcela
informada pela White Martins lhes deve ser imputada.
Gás WM LG Total Preço Valor Valor Total
Méd. WM LG
1 10 3 13 1.160,67 11.606,70 3.482,01 15.088,71
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2 0 40 40 1.160,67 0,00 46.426,80 46.426,80


3 0 3 3 710,00 0,00 2.130,00 2.130,00
4 0 9 9 1.160,67 0,00 10.446,03 10.446,03
5 1 3 4 1.160,67 1.160,67 3.482,01 4.642,68
6 0 0 0 1.160,67 0,00 0,00 0,00
7 6 4 10 1.600,00 9.600,00 6.400,00 16.000,00
Total 17 62 79 - 22.367,37 72.366,85 94.734,22
11.9. Também é relevante ressaltar que os recorrentes foram acusados, em suas citações,
pelas seguintes irregularidades:
1) acatar, indevidamente, as orientações do 2° Tenente (então suboficial) Sérgio Silva Valdemar,
para realizar entregas de produtos gasosos adquiridos pelo Comaer na empresa Fermáquinas;
2) alterar o modus operandi da empresa White Martins para justificar o transporte de cargas
destinadas à empresa Fermáquinas sem as correspondentes notas fiscais devidamente “certificadas”
no ato de entrega;
3) descumprir cláusulas contratuais, no que diz respeito ao local de entrega do objeto contratado,
visto que foi definido no contrato endereço específico para tal fim, bem como na entrega de
quantidades volumétricas de gases acima das inicialmente contratadas.
11.10. Já o militar Sérgio Silva foi acusado de “desvio de produtos gasosos adquiridos pelo
Comaer junto à empresa White Martins Gases Industriais Ltda. em co nluio com os empregados
das empresas fornecedora (White Martins) e receptora indevida (Fermáquinas)”.
11.11. Ou seja, todas as acusações centram-se na entrega de produtos gasosos na empresa
Fermáquinas, em local diverso do previsto no contrato. A entrega na Fermáquinas foi
considerada comprovada no acórdão recorrido com base em observações manuscritas no campo
“Informações Complementares” de algumas notas fiscais da White Martins, tais como as seguintes:
“entregue Fermáquinas”, “entregue na Fermáquinas” e “mercadoria entregue na Fermáquinas”.
Apresenta-se, a seguir, quadro com a lista dessas notas fiscais:
Nº Valor (R$) Peça 1, P. Data
230978 3.209,00 124 e 260 08/04/09
231260 2.761,00 125 e 261 19/06/09
231597 3.209,00 126 e 262 24/04/09
232324 3.209,00 127 e 263 09/05/09
233294 3.209,00 128 e 264 21/05/09
233329 896,00 129 e 265 21/05/09
233499 3.209,00 130 e 266 03/06/09
235319 3.209,00 132 e 268 07/07/09
237072 2.761,00 134 e 270 14/08/09
237248 2.836,50 135 e 271 23/07/09
238177 3.209,00 139 e 275 07/08/09
239764 3.433,00 140 e 276 25/08/09
239765 1.176,00 141 e 277 25/08/09
239898 3.442,50 142 e 278 01/09/09
239899 1.960,00 143 e 279 01/09/09

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Total 41.729,00 - -
11.12. Ocorre que, como visto, não existe nos autos relação das notas fiscais consideradas para
apuração do débito relativo ao controle de estoque de gases da Baan (primeiro débito, acima), de
modo que não se pode afirmar que essas notas tenham sido incluídas na fixação do seu valor.
Também não há nenhuma dessas notas entre as oito que ficaram pendentes de análise (segundo
débito). Portanto, não foi demonstrada a relação entre as supostas entregas na Fermáquinas e os
desvios de produtos gasosos que constituíram o primeiro e o segundo débito apontado acima, de
modo que também não se estabeleceu a responsabilidade dos recorrentes por esses desvios.
11.13. Quanto ao excesso nas entregas efetuadas na Fermáquinas, o que consta dos autos é o
relatório do Inquérito Policial Militar - IPM instaurado pela Baan, de 11/11/2009 (peça 1, p. 282-
288), citado no relatório do acórdão recorrido, segundo o qual foram fornecidas – e entregues
naquela empresa – pela White Martins, no período de 17/11/2008 a 25/8/2009, quantidades de gás
acetileno muito superiores às contratadas pelo Celog (2.010 kg, sendo mais de 13 vezes o previsto
para a Baan e quase 5 vezes o previsto para todo o Comaer), em discordância com o Anexo 1 do
Contrato Celog 38/2008 (peça 1, p. 90-93). Porém, o relatório do IPM não trata da responsabilidade
dos empregados da White Martins, ora recorrentes, e também não demonstra a relação entre essas
supostas entregas na Fermáquinas e os desvios de produtos gasosos que constituíram o primeiro e o
segundo débito, acima.
11.14. A entrega de cilindros na Fermáquinas pode ter sido, em tese, uma das formas do
extravio de cilindros verificado no período em questão (terceiro débito), embora, como visto, o
número de cilindros cujo desvio pode ser atribuído aos recorrentes tenha sido bem menor que o
considerado no acórdão recorrido. Mas não existe comprovação nos autos de que qualquer dos 12
cilindros da White Martins extraviados tenha sido entregue na Fermáquinas.
11.15. Portanto, não se demonstra nos autos que a entrega irregular na Fermáquinas de
produtos gasosos adquiridos para a Baan, admitida em depoimentos pelos recorrentes, tenha
contribuído para causar qualquer parcela dos danos que deram origem aos três débitos imputados
pelo acórdão recorrido. Como essa entrega constitui, como visto, o cerne da acusação aos
recorrentes, não há fundamento para atribuir-lhes responsabilidade por nenhum de tais débitos.
11.16. Além disso, como se verá no tópico a seguir, a Justiça Militar, no julgamento de ação
penal, asseverou que não se pode afirmar que tenha havido entrega de cilindros da Baan na
Fermáquinas, negando, pois, esse fato.
12.Os efeitos do julgamento de ação penal pela Justiça Militar sobre a apreciação da presente
TCE pelo TCU
12.1. Alegam os recorrentes que:
a) sequer responderam a processo criminal;
b) o julgamento da ação penal na Justiça Militar absolveu os denunciados com fundamento,
principalmente, no in dubio pro reo.
12.2. Análise:
12.3. Os recorrentes já haviam argumentado, em suas alegações de defesa, que não
responderam a processo penal. A esse respeito, a unidade técnica observou, em trecho transcrito no
relatório do acórdão recorrido, que (com destaques acrescidos):
12.Em pesquisa no site do Superior Tribunal Militar, há a seguinte informação no
acompanhamento do Processo 0000125-24-2009-7.11.0011:
‘Sentença: Em 17/3/2014: o CEJ/Aer, por maioria de votos (3x2) julgou IMPROCEDENTE o
pedido condenatório contido na denúncia para ABSOLVER o acusado SÉRGIO SILVA
VALDEMAR da imputação de ter praticado o art. 303 do CPM, isso com fulcro no art. 439, alínea
‘e’, do CPPM; e, por maioria de votos (4x1), julgou improcedente o pedido condenatório contido

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na denúncia para ABSOLVER o acusado ALGOMIRO PEREIRA, da imputação de ter praticado o


art. 254 do COM, isso com fulcro no art. 439, alínea ‘e’ do CPPM.’
13.O crime do art. 303 mencionado é o de peculato e o de art. 254 é o de receptação.
14.Vigora no ordenamento jurídico brasileiro o princípio da independência das instâncias, em razão
do qual podem ocorrer condenações simultâneas nas diferentes esferas - cível, criminal e
administrativa. O artigo 935 do Código Civil prescreve que a ‘responsabilidade civil é
independente da criminal, não se podendo questionar mais sobre a existência do fato, ou sobre
quem seja o seu autor, quando estas questões se acharem decididas no juízo criminal’. Esse
dispositivo precisa ser conjugado com o artigo 66 do Código de Processo Penal, o qual estabelece
que ‘não obstante a sentença absolutória no juízo criminal, a ação civil poderá ser proposta
quando não tiver sido, categoricamente, reconhecida a inexistência material do fato ’.
15.Interpretando os dois dispositivos conjuntamente, tem-se que a sentença penal impedirá a
propositura ou continuidade de ação nos âmbitos civil e, por extensão, administrativo, apenas
se houver sentença penal absolutória negando categoricamente a existência do fato ou
afirmando que não foi o réu quem cometeu o delito. Esse entendimento é pacífico no Supremo
Tribunal Federal, conforme fica claro nos Mandados de Segurança 21.948-RJ, 21.708-DF e
23.635-DF. Nesse último, por exemplo, o STF decidiu que a sentença proferida em processo penal
é incapaz de gerar direito líquido e certo de impedir o TCU de proceder à tomada de contas, mas
poderá servir de prova em processos administrativos se concluir pela não ocorrência material do
fato ou pela negativa de autoria.
16.Nesse mesmo sentido é o teor do art. 126 da Lei 8.112/1990, segundo o qual a
‘responsabilidade administrativa do servidor será afastada no caso de absolvição criminal que
negue a existência do fato ou sua autoria’.
17.No caso em análise, a sentença mencionada não foi categórica em afastar a autoria ou a
existência do fato, permanecendo intacta a competência do TCU para apreciar, de forma
independente, as irregularidades aqui apontadas.
12.4. Nesta oportunidade, os recorrentes acrescentam que os denunciados, o militar Sérgio
Silva Valdemar, encarregado da Subseção de Gases da Baan à época dos fatos, e Algomiro Pereira,
sócio administrador da empresa Fermáquinas - Máquinas e Equipamentos Ltda., foram absolvidos
pela Justiça Militar, com fundamento, principalmente, no princípio in dubio pro reo.
12.5. Em consulta ao sítio do Superior Tribunal Militar - STM na Internet, verifica-se que a
sentença do CEJ/Aer de 17/3/2014 foi objeto de apelação do Ministério Público Militar - MPM, à
qual foi negado provimento por aquela corte, por maioria, em 5/3/2015, mantendo-se, na íntegra, a
sentença contestada. Após a oposição de embargos infringentes pelo MPM, também denegados, o
acórdão do STM transitou em julgado, em 17/8/2015.
12.6. A ementa do acórdão do STM que denegou a apelação teve o seguinte teor:
APELAÇÃO. MINISTÉRIO PÚBLICO MILITAR. PECULATO-DESVIO. INSUFICIÊNCIA DE
PROVAS. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO IN DUBIO PRO REU.
A insuficiência de provas sobre a autoria e a materialidade do delito e a ausência dos elementos
objetivos do tipo previsto no art. 303 do CPM impõem a absolvição dos Réus, aplicando-se o
Princípio in dubio pro reo.
Recurso conhecido e não provido. Decisão por maioria.
12.7. Porém, ao contrário do que a ementa leva a crer, o voto condutor do acórdão do STM
que denegou a apelação do MPM, lavrado pelo Ministro Relator Artur Vidigal de Oliveira, foi
bastante assertivo sobre os fatos e a sua autoria.
12.8. Com efeito, verifica-se que afirma categoricamente a inocência do militar Sérgio Silva e
considera não comprovada a entrega de cilindros na Fermáquinas. Faz isso, com base, em suma,
nas seguintes considerações:

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a) o acusado não era o único militar responsável pelo Setor de Gases , pois várias notas fiscais
possuem diversas assinaturas de pessoas diferentes, entre elas, do Chefe do Setor, Cap. Paulo
Henrique Pereira, e outras não possuem assinatura alguma;
b) embora o MPM afirme que o acusado era responsável pela elaboração dos mapas
demonstrativos do movimento físico e do crédito de gases, o quadro de consumo era elaborado pelo
Chefe do Setor;
c) não se tem registro formal demonstrando que foi o acusado quem deu a ordem para que os
cilindros de gases fossem entregues na Fermáquinas;
d) conforme trecho de depoimento do Chefe do Setor de Gases, ele mesmo teria recebido notas
fiscais para serem assinadas na base aérea, referentes a material que não havia sido entregue, fato
este que refuta a afirmação de que o acusado se dirigia à empresa White Martins para assinar notas
fiscais irregulares;
d) o relatório das diligências realizadas junto à Fermáquinas informa que o desvio dos cilindros
pode ter ocorrido com outros funcionários da empresa White Martins ou até mesmo com
outras empresas fornecedoras de gases, como por exemplo, a empresa Linde ;
e) acrescenta que existem vários cilindros de gases estocados na Fermáquinas, mas que é
impossível determinar se algum deles seria de propriedade ou locado ao Comando da
Aeronáutica, pois não contêm identificação que permita fazer tal associação;
f) portanto, não se pode afirmar, com certeza, que os cilindros foram efetivamente entregues
na Fermáquinas, como também não se pode precisar quando a observação “entregar na
Fermáquinas” foi posta nas notas fiscais, tampouco de quem seria tal anotação;
g) assim, no caso, nada restou comprovado, nem o delito, nem a autoria, pois além de não
haver provas de quem teria sido o autor dos desvios, não há sequer elementos suficientes para
se afirmar que esses produtos teriam sido apropriados ou desviados ;
h) o que restou comprovado no processo foi a falta de organização da Baan no que se refere
ao controle e estoque de seus cilindros de gases, de forma que vários cilindros tidos como
desaparecidos foram posteriormente encontrados .
12.9. Verifica-se, pois, que o STM afirmou expressamente que não há certeza sobre a entrega
de cilindros na Fermáquinas, nem sobre o extravio de cilindros, e que não foi comprovada a
responsabilidade do militar Sérgio Silva pela apropriação ou desvio dos produtos gasosos
adquiridos pela Baan e nem sequer a efetiva ocorrência de tais fatos.
12.10. Além disso, como observado acima, não se estabeleceu relação concreta e inequívoca
entre a suposta entrega indevida de gases na Fermáquinas e qualquer dos três débitos cobrados pelo
acórdão recorrido.
12.11. Assim, entende-se que houve sentença penal absolutória negando a existência do fato
atribuído a todos os responsáveis e também a autoria do militar Sérgio Silva. Logo, aplica-se o
entendimento expresso no voto condutor do acórdão recorrido, nos seguintes termos:
(...) somente a sentença proferida em juízo penal com a negativa de autoria ou a inexistência do
fato tem repercussão na esfera administrativa , consoante interpretação conjunta do art. 935 do
Código Civil, do art. 66 do Código de Processo Penal e do art. 126 da Lei 8.112/1990. (...)
12.12. Portanto, entende-se que não deve subsistir qualquer dos débitos e multas imputados
pelo Acórdão 1529/2015-1ª Câmara nos itens 9.4 a 9.7, os quais devem ser anulados, por meio do
provimento ao presente recurso, quanto aos recorrentes, e de ofício, quanto a Sérgio Silva
Valdemar e a Fermáquinas Máquinas e Equipamentos - Eireli - EPP.
13.A existência de conluio entre os recorrentes e o encarregado da Subseção de Gases da
Baan à época dos fatos.
13.1. Alegam os recorrentes que:

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a) não há nos autos comprovação cabal de que os recorrentes agiram em conluio com o militar
Sérgio Silva Valdemar;
b) em homenagem ao princípio da presunção de inocência, os julgados do TCU asseveram a
necessidade de prova plena e cabal para se caracterizar a prática de conluio;
c) a unidade técnica, na análise das alegações de defesa, considerou o conluio caracterizado com
base apenas em indícios, não provas.
13.2. Análise:
13.3. A acusação de conluio é expressa nos seguintes termos pelos ofícios de citação
encaminhados aos recorrentes (relatório do Acórdão 1529/2015-1ª Câmara, item 17.1.1., com
destaque acrescido): “Na qualidade de empregados da empresa White Martins Gases Industriais
Ltda., ter atuado em conluio com o Sr. Sérgio Silva Valdemar, 2º Tenente então lotado na Base
Aérea de Anápolis (Baan), para o desvio de produtos gasosos adquiridos pelo Comaer junto à
empresa White Martins, acatando, indevidamente, as orientações do 2° Tenente (então suboficial)
(...), para realizar entregas de produtos gasosos adquiridos pelo Comaer na empresa
Fermáquinas, bem como alterando o modus operandi da empresa White Martins para justificar o
transporte de cargas destinadas à empresa Fermáquinas sem as correspondentes Notas Fiscais
devidamente ‘certificadas’ no ato de entrega, descumprindo cláusulas contratuais, no que diz
respeito ao local de entrega do objeto contratado, visto que foi definido no contrato endereço
específico para tal fim, bem como na entrega de quantidades volumétricas de gases acima das
inicialmente contratadas.”
13.4. Acrescenta-se que isso se fez alterando o procedimento habitual da empresa e
descumprindo o item 6.2.3 do Contrato Celog 38/2008.
13.5. Tal acusação é baseada essencialmente em depoimentos dos próprios recorrentes
colhidos pela Baan, como os seguintes:
Elson Tadeu Gomes (4/11/2009, peça 1, p. 239):
(...) que tomou conhecimento por funcionários da empresa que todo pedido de gás era feito por
telefone pelo Sergio Silva, onde o mesmo pedia para que o referido gás fosse entregue na empresa
Fermáquinas de Goiânia. A cada duas ou três vezes por mês, ele se dirigia à empresa White
Martins para assinar as notas referentes ao pedido realizado anteriormente. (...) Perguntado se
atendeu algum outro pedido de gás da BAAN que fosse solicitado por outra pessoa diferente do
Sérgio Silva, respondeu que tem conhecimento através dos funcionários da empresa que somente
ele que solicitava. Perguntado se soube de alguma nota de gás acetileno assinada dentro da BAAN,
respondeu que não sabe afirmar. Perguntado se existe algum comprovante da White Martins
relativo a entrega deste referido gás na Fermáquinas conforme solicitação do Sérgio Silva,
respondeu que não, pois, por orientação do próprio Sergio Silva a funcionários da empresa,
somente um Oficial da Base poderia solicitar tal comprovante.
Hemiliana Sousa Barbosa (23/7/2010, peça 3, p. 114):
(...) que recebia os pedidos de gases por telefone de uma pessoa que se identificava como o SO
Sérgio Silva; que o SO Sérgio Silva solicitava que gases tipo Acetileno e Oxigênio fossem
entregues na empresa Fermáquinas em Goiânia; que o SO Sérgio Silva não apresentava nenhuma
justificativa para a entrega de gases na Fermáquinas; que o SO Sérgio Silva solicitava, com
frequência, a entrega de gases na Fermáquinas; que os cilindros cheios entregues na Fermáquinas
eram trocados por cilindros vazios; que, das operações que acompanhou, não houve locação de
cilindros para a Fermáquinas; que não conhece (...) a empresa Fermáquinas; que o SO Sérgio Silva
passava na empresa cerca de três vezes por mês para assinar as notas fiscais referentes às entregas
feitas na Fermáquinas.
13.6. Os recorrentes subdividiram a acusação de conluio que lhes foi formulada nos seguintes
tópicos:
a) acatamento de orientações divergentes do previsto no contrato - mudança do local de entrega;

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b) e sem ao menos apostilamento ou justificativas expressas;


c) alteração do modus operandi do transporte e entrega dos produtos - mudança de rota e não
certificação das notas fiscais na entrega;
d) fornecimento acima do contratado.
13.7. Após qualificar esses fatos como meros indícios, que não constituiriam provas,
alegaram que os praticaram com base na justificável confiança de que as orientações do militar
fiscal/gestor do contrato eram legítimas e estavam de acordo com o contrato e que a obrigação de
apostilamento era da administração pública militar.
13.8. Essas alegações são pouco aceitáveis, pois, como bem destacado no voto condutor do
acórdão do STM referido acima:
O órgão acusatório baseia sua Denúncia, principalmente, nos depoimentos prestados pelos
funcionários da empresa WHITE MARTINS, ELIOFRÁSIO DE LIMA RIBEIRO e HEMILIANA
SOUSA BARSOSA (mídia à fl. 1879), os quais afirmam que o 1° Réu [SÉRGIO SILVA] era o
único responsável por fazer os pedidos dos materiais perante a empresa, e que era dele a ordem
para que fossem entregues nas instalações da FERMÁQUINAS. Declaram, ainda, que, nesse caso,
o Ten. SÉRGIO solicitava que as Notas Fiscais fossem guardadas na empresa WHITE MARTINS
para que, posteriormente, ele mesmo fosse à sede da empresa para assinar as NFs.
(...)
(...) há de se destacar que, caso fosse essa a dinâmica dos fatos, a WHITE MARTINS teria sido
duplamente negligente em sua atuação. Primeiro porque estava fazendo entrega de mercadoria em
local diverso daquele constante do instrumento de contrato. Em segundo lugar, não é crível que os
funcionários da empresa não tivessem desconfiado de que havia algo de errado.
Ora, se um militar faz requisição de um produto via telefone, sem assinar nenhum tipo de
solicitação, e determina a entrega em sede diversa daquela constante em contrato, e, depois, ainda
pede para que, nesse caso, as assinaturas das NF's sejam feitas não na OM, mas, sim, na sede da
empresa, a consequência lógica seria a desconfiança de uma possível fraude, o que levaria à
obrigação da empresa de apurar, junto à Base Militar, o que estava sendo pedido.
13.9. Ou seja, embora a qualificação dessa conduta como “conluio” denote um elemento
volitivo talvez difícil de comprovar com base nos elementos dos autos, é claro que, caso se
considere que ocorreu de fato a entrega de cilindros na Fermáquinas e que isso concorreu para o
desvio de produtos gasosos da Baan, os atos atípicos praticados pelos recorrentes sem dúvida
concorreram para isso e para o possível dano ao erário decorrente. Nesse sentido, o
pronunciamento do representante do Ministério Público junto ao TCU (peça 45):
A meu ver, fica caracterizado o nexo de causalidade entre as condutas dos empregados da White
Martins e o dano causado, considerando que a exclusão dos atos praticados eliminaria a
possibilidade do desvio dos cilindros com gás. A obediência às cláusulas contratuais atinentes ao
local de entrega e aos quantitativos previstos certamente teria evitado que o dano se materializasse.
13.10. No entanto, apesar de haver, de fato, indícios de irregularidade, não f icou demonstrado
nos autos, como visto acima, que a suposta entrega irregular na Fermáquinas de produtos gasosos
adquiridos para a Baan tenha contribuído para causar qualquer parcela dos danos que deram origem
aos débitos imputados pelo acórdão recorrido.
13.11. Além disso, no citado acórdão, o STM afirmou expressamente que não há certeza sobre
a entrega de cilindros na Fermáquinas, nem sobre o extravio de cilindros, e que não foi comprovada
a responsabilidade do militar Sérgio Silva pela apropriação ou desvio dos produtos gasosos
adquiridos pela Baan e nem mesmo a efetiva ocorrência de tais fatos.
13.12. Ora, na ausência de relação entre os fatos apontados e os débitos imputados e negados a
existência dos fatos e a sua autoria, por sentença penal transitada em julgado, não há como entender
que subsista a responsabilidade dos recorrentes pelos referidos débitos, os quais devem, portanto,
ser tornados insubsistentes.
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14.A dosimetria das sanções aplicadas pelo Tribunal aos recorrentes.


14.1. Alegam os recorrentes que:
a) o acórdão recorrido não apresenta qualquer justificativa acerca da dosimetria adotada nas
condenações impostas;
b) não houve individualização da conduta dos responsáveis;
c) é necessário ajustar os valores das condenações, adequando-as proporcionalmente ao grau de
responsabilidade de cada um dos recorrentes e do agente público.
14.2. Análise:
14.3. Apesar de, realmente, não ter sido explicitada a justificativa adotada para a aplicação da
mesma multa ao militar, à empresa e aos dois recorrentes, não é difícil concluir que o Tribunal
provavelmente considerou que, por terem atuado em conluio, os responsáveis fizeram por merecer
penas de idêntico valor. Não houve, portanto, falta de individualização das suas condutas, mas
apenas sua idêntica valoração, o que se encontra dentro da margem de discricionariedade conferida
pela legislação ao Tribunal.
14.4. Nesse sentido, é bastante esclarecedor o voto condutor do Acórdão 9402/2015-2ª
Câmara, do qual se destaca o seguinte excerto (com destaques acrescidos):
4. Como visto no Relatório, o embargante questiona suposta omissão em relação à fundamentação
que teria levado à fixação da multa.
5. Como se sabe, é pacífico o entendimento de que o juízo de valor a respeito da gravidade das
irregularidades não sanadas e da conduta do responsável é que orienta a determinação do
valor da multa, assim como o de que há certa discricionariedade na sua estipulação entre os
limites fixados legal e regimentalmente (v.g.: Acórdão 1.519/2009, da 1ª Câmara; Acórdãos
6.585/2009 e 3.544/2014, da 2ª Câmara; e Acórdãos 557/2006, 3.083/2010, 123/2014 e 795/2014,
do Plenário).
6. Bem se sabe, ainda, que a possibilidade de aplicação de multa pela Corte de Contas possui
previsão legal, nos termos dos art. 57 e 58 da Lei nº 8.443, de 1992, e que o quantum
correspondente à sanção aplicada decorre do julgamento do TCU, na dosimetria da pena, em
face da conduta do gestor responsável pela irregularidade no trato da coisa pública.
7. Assim, identificada a irregularidade, o Relator formula proposta, balizado em análise que
considera, dentre outros aspectos, a natureza da irregularidade e a conformidade entre a atuação do
responsável em face do comportamento que lhe é determinado pela lei, submetendo a sua proposta
à deliberação do Colegiado, a quem compete a última palavra sobre o assunto.
8. De todo modo, a despeito de o Tribunal valorar as circunstâncias fáticas e jurídicas,
quando da fixação da sanção, buscando uma maior adequação punitiva, a dosimetria da pena
no TCU consiste em procedimento pautado por certa discricionariedade, como, aliás, ocorre
nas sanções administrativas em que não se exige a dosimetria objetiva, comum à aplicação
das normas de direito penal, destacando-se que no processo de contas não há um rol de
agravantes e atenuantes legalmente reconhecido, a fim de possibilitar a alteração objetiva da pena
prevista in abstrato.
9. Contudo, a despeito de toda essa discricionariedade, o TCU está adstrito, na dosimetria da
sanção pecuniária, aos limites impostos nas cabeças dos arts. 57 e 58 da Lei nº 8.443, de 1992,
bem como, ainda, à gradação trazida pelos incisos I a VIII do art. 268 do RITCU.
10. No presente caso concreto, nota-se que a proporcionalidade da multa em relação ao débito
decorreu do grau de reprovação das condutas perpetradas pelo ora embargante, de sorte que a multa
aplicada (...) decorreu dos fatos indicados na Proposta de Deliberação (do acórdão ora embargado),
[...]:
14.5. O valor da multa aplicada aos responsáveis, com base no art. 57 da Lei Orgânica do
TCU, não superou o valor máximo fixado em 2015 (R$ 49.535,41) conforme os parâmetros
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estabelecidos pelo art. 267, caput, do RI/TCU, e, por consectário lógico, dentro dos propósitos dos
princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.
14.6. Destarte, caso mantida a aplicação de multa aos recorrentes, não procede sua
irresignação quanto ao respectivo valor.
CONCLUSÃO
15.Das análises anteriores, conclui-se que:
a) o valor total do débito relativo a oito notas fiscais pendentes de análise é de R$ 8.539,63 e não
de R$ 8.628,73;
b) desse débito, apenas R$ 3.090,05 referem-se a notas fiscais da White Martins e poderiam, em
tese, ser imputados aos recorrentes;
c) ignora-se se as notas fiscais consideradas para apurar o débito relativo a diferenças de estoque
apuradas por comparação entre notas fiscais de venda e as prestações de contas da Baan foram
todas emitidas pela White Martins, pois não são listadas nos autos;
d) quanto ao débito relativo ao extravio de 79 cilindros, no valor de R$ 94.734,22, verifica-se que
apenas 12 deles, no valor de R$ 22.367,37, eram da White Martins, sendo todos os demais, no
valor de R$ 72.366,85 da empresa Linde Gases;
e) portanto, caso considerado procedente esse débito, apenas a parcela informada pela White
Martins, no valor de R$ 22.367,37, deve ser imputada aos recorrentes;
f) todas as acusações aos responsáveis centram-se na entrega de produtos gasosos na empresa
Fermáquinas, em local diverso do previsto no contrato;
g) porém, como não existe nos autos relação das notas fiscais consideradas para apuração do
débito relativo ao controle de estoque de gases da Baan, não se pode afirmar que as notas fiscais
referentes às entregas na Fermáquinas tenham sido incluídas na fixação do valor do débito
correspondente;
h) também não há nenhuma dessas notas entre as oito que ficaram pendentes de análise;
i) portanto, não foi demonstrada a relação entre as supostas entregas na Fermáquinas e os desvios
de produtos gasosos que constituíram os débitos referidos nas duas alíneas anteriores, de modo que
também não se estabeleceu a responsabilidade dos recorrentes por esses desvios;
j) embora o excesso nas entregas efetuadas na Fermáquinas seja apontado no relatório do
Inquérito Policial Militar - IPM de 11/11/2009, este não trata da responsabilidade dos empregados
da White Martins, nem foi estabelecida sua relação com o débito relativo ao controle de estoques
de produtos gasosos na Baan;
k) não existe comprovação nos autos de que qualquer dos 12 cilindros da White Martins
extraviados tenha sido entregue na Fermáquinas;
l) portanto, não se demonstra que a entrega irregular na Fermáquinas de produtos gasosos
adquiridos para a Baan tenha contribuído para causar qualquer parcela dos três débitos imputados
pelo acórdão recorrido;
m) em sentença proferida em apelação penal, o Superior Tribunal Militar afirmou expressamente
que não há certeza sobre a entrega de cilindros na Fermáquinas, nem sobre o extravio de cilindros,
e que não foi comprovada a responsabilidade do militar Sérgio Silva pela apropriação ou desvio
dos produtos gasosos adquiridos pela Baan e nem sequer a efetiva ocorrência de tais fatos;
n) à vista de sentença penal absolutória negando a existência do fato atribuído a todos os
responsáveis e também a autoria do militar Sérgio Silva, não deve subsistir qualquer dos débitos e
multas imputados pelo acórdão recorrido;

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o) caso se considere que ocorreu de fato a entrega de cilindros na Fermáquinas, os atos atípicos
praticados pelos recorrentes sem dúvida concorreram para isso e para o possível dano ao erário
decorrente;
p) não houve falta de individualização das condutas dos responsáveis, mas apenas sua idêntica
valoração, o que se encontra dentro da margem de discricionariedade conferida pela legislação ao
Tribunal;
q) o valor da multa aplicada aos responsáveis, com base no art. 57 da Lei Orgânica do TCU,
observou os parâmetros estabelecidos pelo art. 267, caput, do RI/TCU, e, por consectário lógico,
manteve-se dentro dos propósitos dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade;
r) logo, caso mantida a aplicação de multa aos recorrentes, não procede sua irresignação quanto ao
respectivo valor.
16. Com base nessas conclusões, propõe-se o conhecimento do recurso interposto para que lhe seja
dado provimento.
PROPOSTA DE ENCAMINHAMENTO
17.Ante o exposto, submete-se à consideração superior a presente análise do recurso de
reconsideração interposto por Elson Tadeu Gomes e Hemiliana Souza Barbosa contra o Acórdão
1529/2015-TCU-1ª Câmara, propondo-se, com fundamento no art. 32, inciso I, e 33, da Lei
8.443/1992 c/c o art. 285, caput e § 1º, do RI/TCU:
a) conhecer do recurso e, no mérito, dar-lhe provimento, para tornar insubsistentes, quanto aos
recorrentes, os itens 9.4 a 9.7 do acórdão recorrido;
b) estender, de ofício, a medida proposta na alínea anterior a Sérgio Silva Valdemar e à
Fermáquinas Máquinas e Equipamentos - Eireli - EPP;
c) dar conhecimento aos recorrentes e aos demais interessados da decisão que vier a ser prolatada.”
12. A proposta recebeu a anuência dos dirigentes da Serur (peças 147 e 148).
13. Por sua vez, o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União (MPTCU),
representado pelo Procurador Sérgio Ricardo Costa Caribé, discordou do encaminhamento proposto
pela unidade instrutora, sugerindo negar provimento ao recurso, sob o argumento de que a sentença
da Justiça Militar não reconheceu a inexistência dos fatos, tampouco a negativa de autoria das
pessoas que figuram como responsáveis nestas contas. Ao contrário, a sentença teria se
fundamentado apenas na falta de provas, o que seria insuficiente para afastar o princípio da
independência das instâncias.
14. Ademais, o representante do Parquet afasta os argumentos dos recorrentes acerca
inexistência do conluio e da falta de proporcionalidade no valor da multa a eles imposta (peça 150).
15. Estando os autos em meu gabinete, o responsável Sérgio Silva Valdemar, cujas contas
haviam sido julgadas à revelia, protocolou a petição à peça 155, aduzindo a nulidade da sua citação e
apresentando argumentos e documentos em sua defesa.

É o relatório.

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VOTO

Em exame, recurso de reconsideração interposto por Elson Tadeu Gomes e Hemiliana


Sousa Barbosa, respectivamente, gerente de operações e empregada da White Martins Gases
Industriais Ltda., à época dos fatos, em face do Acórdão 1.529/2015-TCU-Primeira Câmara, que
julgou irregulares suas contas e os condenou em débito e multa.
2. O total dos débitos imputados aos recorrentes é de R$ 215.631,82, em valores históricos,
sendo R$ 136.463,00 em solidariedade com a empresa Fermáquinas e com o militar Sérgio Silva
Valdemar, ex-encarregado da Subseção de Gases da Base Aérea de Anápolis (BAAN), e R$ 79.168,82
em solidariedade apenas com o referido militar. O valor da multa, por sua vez, foi fixado em
R$ 17.000,00, para todos os responsáveis.
3. As irregularidades que fundamentaram a condenação dos recorrentes foram, em suma, as
seguintes, conforme se depreende das citações a eles encaminhadas:
a) acatar, indevidamente, as orientações do militar Sérgio Silva Valdemar para realizar
entregas de produtos gasosos adquiridos pelo Comaer na empresa Fermáquinas;
b) alterar o modus operandi da empresa White Martins para justificar o transporte de
cargas destinadas à empresa Fermáquinas sem as correspondentes notas fiscais devidamente
“certificadas” no ato de entrega;
c) descumprir cláusulas contratuais, no que diz respeito ao local de entrega do objeto
contratado, visto que foi definido no contrato endereço específico para tal fim, bem como na entrega
de quantidades volumétricas de gases acima das inicialmente contratadas.
4. O militar Sérgio Silva Valdemar, por seu turno, foi citado pelo desvio de produtos gasosos
adquiridos pelo Comaer junto à empresa White Martins em conluio com os empregados das empresas
fornecedora (White Martins) e receptora indevida (Fermáquinas), valendo-se da sua condição de
encarregado pelos pedidos e recebimentos dos gases no âmbito da unidade militar. Já a Fermáquinas
foi citada pelo recebimento indevido de gases e cilindros da White Martins que deveriam ser entregues
na BAAN.
5. Como se nota, todas as irregularidades que levaram à condenação dos responsáveis
centram-se no desvio de gases e cilindros adquiridos da empresa White Martins que deveriam ter sido
entregues na BAAN, mas que foram direcionados para a empresa Fermáquinas, gerando um prejuízo
ao erário correspondente ao valor dos produtos desviados.
6. Logo, a responsabilização nesta tomada de contas deve levar em consideração,
estritamente, o nexo de causalidade entre a conduta ou omissão das pessoas arroladas e os referidos
desvios para a empresa Fermáquinas de produtos adquiridos da White Martins.
7. Em seu parecer, a Secretaria de Recursos propõe dar provimento ao presente recurso, com
exclusão dos débitos e multas. Em síntese, a Serur entendeu que não houve demonstração de que a
entrega irregular na Fermáquinas tenha contribuído para causar qualquer parcela dos débitos
imputados pelo acórdão recorrido. A unidade especializada também considerou que a sentença penal
proferida no âmbito da Justiça Militar reconheceu a inexistência do fato e da autoria, o que vincularia a
decisão desta Corte, adotada na esfera administrativa.
8. O MPTCU, por sua vez, divergindo da unidade técnica, considera que não houve sentença
penal absolutória negando a existência do fato e da autoria. Além disso, o representante do Parquet
reforça o seu entendimento de que houve conluio entre os prepostos da White Martins e o militar
Sérgio Silva Valdemar. Por conseguinte, propõe negar provimento ao recurso.

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9. Percorrendo os autos, identifiquei algumas inconsistências na imputação de


responsabilidades, as quais, a meu ver, impõem a revisão parcial do acórdão recorrido. Deste modo,
discordo em parte tanto das conclusões da unidade técnica como do MPTCU, pelas razões que
exponho a seguir.
10. Primeiramente, conforme exposto no relatório precedente, é preciso lembrar que o débito
imputado aos responsáveis decorre de três etapas distintas de ap uração, conduzidas no âmbito da fase
interna da TCE, resumidas a seguir:
a) R$ 112.269,09, referentes a diferenças no faturamento de gases e no controle de estoque
da BAAN, no período de janeiro de 2005 a setembro de 2009;
b) R$ 8.628,73, referentes a notas fiscais de venda que, por estarem ilegíveis, não foram
consideradas como comprovantes de liquidação no procedimento mencionado no item “a” acima;
c) R$ 94.734,00, referentes à constatação do extravio de 79 cilindros de gás da BAAN, que
não foram devolvidos vazios às empresas fornecedoras, conforme declaração das próprias empresas.
11. Nos tópicos seguintes (II, III e IV), analisarei cada uma das parcelas acima, procurando
identificar nos autos a presença ou não de evidências que permitam relacionar tais danos às condutas
imputadas aos responsáveis nos respectivos ofícios de citação. No tópico V, tratarei a questão da
responsabilização com maior profundidade, examinando em especial a situação dos recorrentes, na
condição de empregados da White Martins. Por fim, os demais argumentos levantados nesta etapa
processual serão abordados no tópico VI.
II
12. Quanto ao primeiro débito, no valor de R$ 112.269,09, relativo a diferenças no
faturamento de gases e no controle de estoque da BAAN, verifico que o procedimento utilizado para
mensurá- lo constitui indício, apenas, de que houve pagamento por gases que não foram computados no
controle da BAAN, assim como que houve o desaparecimento de gases do estoque da unidade.
Todavia, o procedimento não comprova, de forma objetiva, se os gases faturados a maior ou
desaparecidos foram adquiridos da White Martins, nem se de fato foram desviados para a
Fermáquinas. Tampouco apresenta evidências sobre a contribuição dos responsáveis para esses
desvios.
13. O indício mais contundente considerado para a imputação de responsabilidades no acórdão
recorrido foi o testemunho dos empregados da White Martins e do próprio militar Sérgio Silva
Valdemar confirmando a ocorrência de desvios para a Fermáquinas de produtos faturados na BAAN.
Porém, tais testemunhos, por si só, não permitem concluir que toda a diferença verificada no
faturamento e nos estoques decorreu do referido esquema. Também não são suficientes para
demonstrar a responsabilidade das pessoas arroladas.
14. Com efeito, a par dos testemunhos considerados no acórdão condenatório, há nos autos
informação de que, no período em que ocorreram os desvios, “vários foram os fornecedores de gases
da BAAN e tantos mais foram os funcionários envolvidos em tais operações”. Também consta que “é
bem provável, inclusive, que façam parte de outros esquemas fraudulentos de desvios de gases que não
envolvam a ‘Fermáquinas’, mas sim outras empresas” (peça 3, p. 118-119).
15. Assim, se forem consideradas unicamente as declarações existentes no processo,
desacompanhadas de outras evidências documentais, não é possível demonstrar de forma inequívoca o
nexo entre as condutas dos responsáveis e a totalidade do dano apurado. Pode ser, por exemplo, que
parte dos gases faturados a maior tenha sido direcionada para outra empresa, com o envolvimento de
outros agentes. Pode ser, ainda, que uma parcela das divergências decorra de falhas nos registros
contábeis e patrimoniais considerados na apuração. Desse modo, a meu ver, não é adequado imputar

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todo o desvio aos responsáveis arrolados nesta tomada de contas especial, especialmente diante das
condutas que lhes foram atribuídas nas respectivas citações.
16. Por outro lado, os testemunhos presentes nos autos indicam que as notas fiscais dos
produtos desviados para a empresa receptadora frequentemente continham observações como
“Entregue na Fermáquinas” (peça 5, p. 147). E, de fato, existe no processo uma série de notas fiscais
com esse tipo de indicação, inclusive com a assinatura do militar Sérgio Silva Valdemar, exatamente
como apontado nos depoimentos (peça 1, p. 124-130, 132, 134, 135, 139-143). Tais documentos, aliás,
levaram o Relator a quo a limitar a responsabilidade solidária da empresa Fermáquinas ao valor dessas
notas, correspondente a R$ 41.729,00, conforme despacho à peça 49, demonstrando que elas foram
incluídas no débito imputado.
17. Fora essas notas, não há nos autos outros documentos aptos a comprovar que o total das
diferenças apuradas no quantitativo de gases faturados e no controle de estoque tenha sido de fato
desviado para a Fermáquinas, razão pela qual entendo que o valor do primeiro débito deve se limitar a
R$ 41.729,00.
III
18. No que tange ao segundo débito, referente a notas fiscais de venda que, por estarem
ilegíveis, não foram aceitas como comprovantes de liquidação na apuração realizada na fase interna da
TCE, verifico que existe um erro na soma dos valores incluídos no cômputo do dano, conforme
assinalado com muita propriedade pelo Auditor da Serur: ao invés de R$ 8.628,73, a soma das notas
fiscais perfaz um montante menor, de R$ 8.539,63 (peça 2, p. 289-290).
19. Ademais, considerando que não há cópia dessas notas fiscais nos autos, é possível lançar
dúvidas sobre se todas elas foram de fato emitidas pela White Martins, visto que a numeração de parte
delas não segue o padrão de numeração que a referida empresa adotava à época, com seis dígitos,
conforme se depreende das outras notas juntadas aos autos. Do total de notas consideradas no segundo
débito, apenas três seguem o padrão de seis dígitos, perfazendo o total de R$ 3.090,05.
20. De qualquer forma, ainda assim não é possível afirmar, de maneira contundente, que os
produtos relativos a essas notas foram de fato desviados da BAAN para a Fermáquinas, visto que,
como afirmado, as referidas notas não estão nos autos e não existem outros documentos que forneçam
tal evidência.
21. Assim, a fim de atender o comando regimental pelo qual a apuração do débito deve ser
feita por meios confiáveis, de modo a se obter quantia que seguramente não exceda o valor real devido
(RI/TCU, art. 210, §1º, II), entendo que essa parcela do débito deve ser excluída da condenação.
IV
22. Em relação ao terceiro débito, relativo ao desvio de cilindros que deveriam ter sido
devolvidos vazios às empresas fornecedoras, verifico que, dos 79 cilindros dados como extraviados,
apenas 12 eram da White Martins, no valor total de R$ 22.367,37. Os outros 62 eram da empresa
Linde Gases, perfazendo um total de R$ 72.366,85.
23. Ressalte-se que o número de cilindros extraviados foi obtido a partir de declaração das
próprias empresas, Linde Gases e White Martins. Destarte, entendo não ser razoável imputar débito
nesta TCE relativo à parcela computada com base em informações prestadas pela Linde Gases, uma
vez que se está apurando desvios de gases adquiridos da White Martins, conforme conduta informada
nos ofícios de citação enviados aos responsáveis.
24. Ainda assim, não existe qualquer comprovação nos autos de que algum dos 12 cilindros
considerados extraviados pela White Martins tenha sido entregue na Fermáquinas. Frise-se: o que
consta, relativamente ao terceiro débito, são apenas as declarações das empresas de que a Base Aérea
lhe deve os cilindros.
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25. De fato, a entrega na Fermáquinas pode até ter sido, e m tese, uma das formas do extravio
dos cilindros, mas com base exclusivamente nos elementos dos autos, entendo que não há como se
estabelecer a responsabilidade dos recorrentes e das demais pessoas arroladas por esses desvios.
26. Desse modo, em observância novamente ao art. 210, §1º II do RI/TCU, considero que a
parcela do débito relativa ao desvio de cilindros deve ser excluída da condenação.
V
27. Neste ponto, é importante analisar a responsabilidade pelo débito remanescente, em
especial dos recorrentes, que foram citados na condição de empregados da White Martins, empresa à
época contratada pela BAAN.
28. Entendo que, em relação a esses responsáveis, deve ser aplicado o mesmo entendimento
adotado nos Acórdãos 835/2015-TCU-Plenário e 2.267/2015-TCU-Primeira Câmara, quando esta
Corte acolheu a tese de que, numa relação meramente contratual entre Poder Público e pessoa jurídica
de direito privado, não se imputa responsabilidade solidária aos particulares, agentes das empresas
privadas, salvo nas hipóteses de desconsideração da personalidade jurídica, quando os sócios e os
administradores podem ser alcançados.
29. Em outras palavras, o que a jurisprudência recomendaria, no caso em análise, seria a
responsabilização do agente estatal solidariamente com as pessoas jurídicas contratadas e
beneficiadas, e não com os agentes dessas empresas (empregados, administradores ou sócios).
30. Excepcionalmente, a personalidade jurídica das empresas privadas poderia ser
desconsiderada pelo Tribunal. Ocorre que o fundamento da condenação imposta aos recorrentes,
empregados da White Martins, não foi a existência de elementos que justificassem a desconsideração
(desvio de finalidade ou confusão patrimonial), mas a sua participação direta nas irregularidades, fato
que, por si só, não fundamenta a aplicação da disregard doctrine.
31. Não obstante, ainda que estivessem presentes os elementos para o emprego da
desconsideração da personalidade jurídica, é preciso lembrar que tal instituto alcança sócios e
administradores, e não e mpregados, admitidos mediante regime trabalhista. Os e mpregados, nessa
condição, agem em nome da empresa, razão pela qual seus atos devem ser imputados à pessoa jurídica.
É a pessoa jurídica, e não seu agente, que responde pelas irregularidades e respectivos danos.
32. A título de ilustração do raciocínio, se houver pagamento por serviços não executados em
um contrato de obra pública, o débito recairá sobre o fiscal da obra (agente público) e sobre a
construtora, não se cogitando responsabilidade do engenheiro (empregado da empresa) que preparou e
assinou o relatório de medição com informações inverídicas. De maneira similar, no caso em análise, a
responsabilização solidária deve recair sobre o militar (agente público) e sobre as pessoas jurídicas
eventualmente beneficiadas, ante a ausência dos requisitos para a desconsideração.
33. Das empresas privadas envolvidas, Fermáquinas e White Martins, considero que apenas a
primeira se beneficiou, de alguma forma, das irregularidades evidenciadas nos autos, eis que foi a
destinatária dos gases desviados da BAAN, objeto do primeiro débito analisado anteriormente.
34. Em relação à White Martins, ao contrário do defendido pela unidade técnica e pelo
MPTCU, não vislumbro a presença do conluio entre seus empregados e o militar Sérgio Silva
Valdemar.
35. Com feito, os elementos constantes no processo demonstram que os empregados da White
Martins faziam as entregas na Fermáquinas atendendo às solicitações do militar. É razoável considerar
que tais solicitações possuíam aparência de legalidade e de legitimidade para os recorrentes, visto que
o referido agente público era, à época dos fatos, o representante da BAAN perante a contratada e o
responsável por requisitar o fornecimento de gases. Ademais, não há indícios de que os recorrentes
tenham se beneficiado pessoalmente às custas da irregularidade.
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36. Sendo assim, entendo que a responsabilização pelo débito remanescente, no valor histórico
de R$ 41.729,00, deve recair, exclusivamente, sobre o militar Sérgio Silva Valdemar e a empresa
Fermáquinas, excluindo da relação processual os empregados da White Martins e, consequentemente,
tornando sem efeito a condenação a eles imposta.
VI
37. Os recorrentes também aduziram que o Tribunal deve considerar os efeitos do julgamento
de ação penal no âmbito da Justiça Militar que tratou dos fatos narrados nesta TCE. Na aludida ação, já
transitada em julgado, o militar Sérgio Silva Valdemar e o sócio administrador da Fermáquinas foram
absolvidos.
38. Sobre este ponto, perfilho as conclusões do representante do MPTCU, adotando, desde já,
os fundamentos que as suportam como minhas razões de decidir, no sentido de que deve ser aplicado
ao caso o princípio da independência das instâncias, haja vista que a sentença da Justiça Militar não
reconheceu a inexistência dos fatos, tampouco a negativa de autoria das pessoas que figuram como
responsáveis nestas contas, mas se fundamentou apenas na falta de provas.
39. Com efeito, a ementa do acórdão do Superior Tribunal Militar (STM) que decidiu a ação
em última instância é bastante elucidativa:
“APELAÇÃO. MINISTÉRIO PÚBLICO MILITAR. PECULATO-DESVIO. INSUFICIÊNCIA
DE PROVAS. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO IN DUBIO PRO REU.
A insuficiência de provas sobre a autoria e a materialidade do delito e a ausência dos
elementos objetivos do tipo previsto no art. 303 do CPM impõem a absolvição dos Réus,
aplicando-se o Princípio in dubio pro reo”. (grifei)
40. Ademais, o dispositivo legal utilizado como fundamento da decisão foi o art. 439, alínea
“e” do CPPM, qual seja, “não existir prova suficiente para a condenação”.
41. Deste modo, a despeito das assertivas presentes no voto condutor do Acórdão do STM que,
segundo a análise da Serur, poderiam levar ao entendimento de que houve negativa do fato e da
autoria, penso que a tese sustentada pela unidade especializada não deve ser adotada, mormente
porque, conforme bem anotou o representante do MPTCU, expressa a opinião do Ministro-Relator e
não a do Colegiado do STM. Logicamente, em se tratando do STM, seria a decisão de um órgão
colegiado – e não a opinião de um único Ministro, ainda que seja o Relator – que poderia vir a
determinar a comunicação entre as instâncias, ainda mais considerando que a decisão não foi unânime.
42. Entendo necessário, ainda, enfrentar os argumentos apresentados na petição do militar
Sérgio Silva Valdemar, que foi julgado à revelia, acerca da possível nulidade de sua citação.
43. Em síntese, o militar alega, a partir de fundamentos do Código de Processo Civil, do
Código de Processo Penal e do Código de Processo Penal Militar, que deveria ter sido citado na
unidade em que estivesse servindo, sendo que, à época da citação, que foi direcionada para a cidade de
Anápolis, ele servia em unidade militar sediada em Brasília, conforme comprovantes de movimentação
anexados.
44. As alegações do responsável não merecem prosperar. Compulsando os autos, verifiquei
que Sérgio Silva Valdemar foi citado no endereço então constante na base da Receita Federal, com
aviso de recebimento (peças 9, 16 e 22), de modo que foi respeitado o art. 179, II do Regimento
Interno desta Corte.
45. Nesse sentido, a jurisprudência do TCU informa que a utilização do endereço constante na
base de dados da Receita Federal é válida para fins de citação, competindo ao responsável manter seu
domicílio atualizado perante os órgãos públicos (Acórdão 3.254/2015-Primeira Câmara).

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46. Ressalte-se que o endereço do militar Sérgio Silva Valde mar na base da Receita Federal
ainda hoje é aquele para o qual foi direcionada a sua citação, conforme verifiquei em consulta
realizada em meu Gabinete, fato que reforça a ausência de nulidade na citação.
47. Por fim, considerando que, conforme defendi neste voto, o débito imputado deve ser
reduzido para R$ 41.729,00, de responsabilidade solidária do militar Sérgio Silva Valdemar e da
empresa Fermáquinas, o valor da multa também deve ser diminuído proporcionalmente, em
conformidade com a orientação firmada pelo Tribunal em situações similares (Acórdãos 2.194/2015-
TCU-Segunda Câmara, 1.397/2014-Plenário e 4.719/2009-Segunda Câmara).
48. Diante do exposto, voto no sentido de que seja aprovado o acórdão que ora submeto à
deliberação deste Colegiado.

TCU, Sala das Sessões Ministro Luciano Brandão Alves de Souza, em 12 de julho de
2016.

Ministro BRUNO DANTAS


Relator

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ACÓRDÃO Nº 4631/2016 – TCU – 1ª Câmara

1. Processo nº TC 002.680/2012-2
2. Grupo II – Classe de Assunto: I - Recurso de reconsideração (Tomada de Contas Especial).
3. Recorrente: Elson Tadeu Gomes (426.661.046-72) e Hemiliana Sousa Barbosa (887.008.441-87).
4. Entidade: Base Aérea de Anápolis (00.394.429/0080-04).
5. Relator: Ministro Bruno Dantas.
5.1. Relator da deliberação recorrida: Ministro Weder de Oliveira.
6. Representante do Ministério Público: Procurador Sérgio Ricardo Costa Caribé.
7. Unidades Técnicas: Secretaria de Recursos (SERUR); Secretaria de Controle Externo no Estado de
Goiás (SECEX-GO).
8. Representação legal:
8.1. Fernando Villela de Andrade Vianna (OAB/RJ 134.601) e outros, representando Elson Tadeu
Gomes.
8.2. Renato Otto Klos (OAB/RJ 117.110) e outros, representando Hemiliana Sousa Barbosa.

9. Acórdão:
VISTOS, relatados e discutidos estes autos de recurso de reconsideração interposto por
Elson Tadeu Gomes e Hemiliana Sousa Barbosa, respectivamente, gerente de operações e empregada
da White Martins Gases Industriais Ltda., à época dos fatos, em face do Acórdão 1.529/2015-TCU-
Primeira Câmara.
ACORDAM os Ministros do Tribunal de Contas da União, reunidos em Sessão da
Primeira Câmara, ante os motivos expostos pelo Relator, em:
9.1. conhecer do recurso de reconsideração para, no mérito, dar- lhe provimento parcial;
9.2. excluir da relação processual Elson Tadeu Gomes e Hemiliana Sousa Barbosa;
9.3. excluir o item 9.5 do Acórdão 1.529/2015-Primeira Câmara; e
9.4. dar a seguinte redação aos itens 9.3, 9.4 e 9.6 do Acórdão 1.529/2015-Primeira
Câmara:
“9.3. rejeitar as alegações de defesa apresentadas pela empresa Fermáquinas Máquinas e
Equipamentos - Eireli - EPP
9.4. julgar irregulares as contas de Sérgio Silva Valdemar, com fundamento nos arts. 1º, I,
e 16, III, ‘d’, da Lei 8.443/1992, e condená- lo, em solidariedade com a empresa
Fermáquinas Máquinas e Equipamentos - Eireli - EPP, ao pagamento da quantia a seguir
especificada, fixando- lhe o prazo de 15 (quinze) dias, a contar das notificações, para que
comprove, perante o Tribunal (art. 214, III, ‘a’, do RI/TCU), o recolhimento da dívida aos
cofres do Tesouro Nacional, atualizada monetariamente e acrescida dos juros de mora,
calculada desde a data indicada até o efetivo recolhimento, nos termos da legislação em
vigor:
Data Valor (R$)
17/5/2010 41.729,00
9.6. aplicar a multa prevista no art. 57 da Lei 8.443/1992 a Sérgio Silva Valdemar e à
empresa Fermáquinas Máquinas e Equipamentos - Eireli - EPP, individualmente, no valor
de R$ 4.000,00 (quatro mil reais), fixando- lhes o prazo de 15 (quinze) dias, a contar das
notificações, para que comprovem, perante o Tribunal (artigo 214, III, ‘a’, do RI/TCU), o
recolhimento da dívida aos cofres do Tesouro Nacional, atualizada monetariamente desde a
data do presente acórdão até a data do efetivo recolhimento, se for pa ga após o
vencimento, na forma da legislação em vigor;”

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9.5. dar ciência do inteiro teor desta deliberação aos recorrentes e aos demais responsáveis,
Sérgio Silva Valdemar e empresa Fermáquinas Máquinas e Equipamentos, assim como ao Ministério
Público Militar.

10. Ata n° 24/2016 – 1ª Câmara.


11. Data da Sessão: 12/7/2016 – Ordinária.
12. Código eletrônico para localização na página do TCU na Internet: AC-4631-24/16-1.
13. Especificação do quorum:
13.1. Ministros presentes: Walton Alencar Rodrigues (Presidente), Benjamin Zymler, José Múcio
Monteiro e Bruno Dantas (Relator).
13.2. Ministros-Substitutos presentes: Augusto Sherman Cavalcanti e Weder de Oliveira.

(Assinado Eletronicamente) (Assinado Eletronicamente)


WALTON ALENCAR RODRIGUES BRUNO DANTAS
Presidente Relator

Fui presente:

(Assinado Eletronicamente)
LUCAS ROCHA FURTADO
Subprocurador-Geral

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