Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
1. INTRODUÇÃO
Depois de cerca de sete anos de preparação no Poder Executivo e mais uns dez de
debates no Congresso Nacional, foi sancionada em 17 de março de 1964 (portanto antes da
instalação do regime militar) a Lei nº 4.320. Muito ousada para a época, implementou no
Brasil o regime de competência na despesa (muitos países ricos só fazem o mesmo a partir
dos anos 80). Mesmo com o advento da Constituição Federal de 1988 (CF/88), os dispositivos
da Lei 4.320 que não tenham sido derrogados continuam a definir até hoje, com visão
abrangente e instrumentos integrados, as normas gerais para o orçamento anual e a
contabilidade pública, das três esferas de governo.
1
Economista, Consultor de Orçamento e Fiscalização Financeira da Câmara dos Deputados. E-mail:
htollini@gmail.com.
2
Economista e técnico em contabilidade, da carreira do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e
Social, a serviço do Senado Federal. E-mail: zeroberto@joserobertoafonso.ecn.br.
As opiniões aqui expressas, como de praxe, são de exclusiva responsabilidade dos autores e não das instituições
a que pertencem.
2
A CF/88 adotou uma série de outras medidas sobre orçamentos e finanças públicas –
aliás, com transformações até mais profundas do que as realizadas no âmbito da dita reforma
tributária. Assim, foram introduzidos novos instrumentos como o Plano Plurianual (PPA) e a
Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), fora a segmentação do orçamento anual, buscando
aperfeiçoar e ampliar o controle institucional e legal da gestão fiscal. Nesse sentido, torna
efetiva a participação do Congresso Nacional no processo orçamentário, e de seu órgão
auxiliar de controle externo, o Tribunal de Contas da União (TCU), na fiscalização.
3
Por iniciativa parlamentar, foi incluída uma norma de caráter programático, determinando que o Presidente da
República enviasse ao Congresso Nacional, em 180 dias, um projeto de lei complementar para regulamentar o
disposto no art. 163 da CF/88 (finanças públicas, dívida pública, concessão de garantias pelas entidades públicas,
emissão e resgate de títulos da dívida, e fiscalização financeira da administração pública direta e indireta).
4
Pouco depois de publicada, foram propostas ações de inconstitucionalidade para derrubar no todo ou em parte a
Lei de Responsabilidade Fiscal, que foram rejeitadas pelo Supremo Tribunal Federal – na votação mais polêmica
e apertada, foi mantida a aplicação de limites aos gastos com pessoal específicos e discriminados por Poder.
3
Além dos normativos que levaram à proposição da LRF, a CF/88 prevê no capítulo
dedicado aos orçamentos, mais precisamente no art. 165, § 9º, que lei complementar regule as
finanças públicas. Ela deverá dispor sobre o exercício financeiro, a vigência, os prazos, a
elaboração e a organização do PPA, da LDO e da lei orçamentária anual (LOA), e
estabelecerá normas gerais para gestão financeira e patrimonial da administração direta e
indireta, bem como as condições para a instituição e o funcionamento de fundos. Na prática,
quando promulgada, a nova lei substituirá a Lei 4.320.
Mais de duas décadas depois de entrar em vigor a CF/88, a aprovação de tal lei
complementar nunca esteve perto de se concretizar – algumas poucas tentativas frustradas
foram feitas. Essas tentativas, a maioria delas de meados da década de 90, esbarraram quase
sempre nas diferentes visões dos poderes quanto ao processo orçamentário, em especial em
relação à execução obrigatória das despesas. Nessa época todos os entes da Federação ainda
lutavam para ajustar os seus orçamentos, que sentiam os efeitos do fim da hiperinflação sobre
o valor real das despesas orçadas.
elaboração das leis do ciclo orçamentário e da execução da LOA, além da definição dos
critérios para a apuração do resultado primário.
Este trabalho compara a Lei 4.320, cuja vitalidade nos permitiu chegar até aqui, com o
Substitutivo aprovado pela CCJ, a proposta de LRO. Para tanto, separa em duas seções a
análise do que ainda resta a avançar para obter-se maior qualidade na gestão financeira
pública. A primeira seção aborda os atuais problemas e propõe soluções para tornar mais
responsável e transparente a gestão orçamentária e fiscal no País. A segunda seção analisa os
principais problemas relacionados ao processo orçamentário (com foco no governo federal), e
para contorná-los propõe a instituição de regras de responsabilidade orçamentária. Para tanto,
destaca a visão de médio prazo, a apreciação legislativa e as alterações nos processos e
procedimentos orçamentários.
6
O Senador Virgílio registrou em seu parecer que incorporou inúmeras sugestões apresentadas em ciclo de
seminários nacionais realizados ao longo do segundo semestre de 2009, bem como no II Seminário Nacional de
Orçamento, realizado em abril de 2010, dos quais participaram centenas de servidores públicos federais,
estaduais e municipais, de diferentes poderes, órgãos e entidades.
5
geração de superávit primário. Apesar desse sucesso, a LRF não foi suficiente para impedir
que alguns entes da Federação recorressem à chamada “contabilidade criativa” para ajudá-los
a atingir suas metas. Em 2010, o próprio governo federal adotou prática não-convencional, ao
registrar como receita primária recursos obtidos de empresa estatal por intermédio de
triangulação financeira feita com o BNDES. A existência dessas brechas, por vezes em
valores significativos, é um indício de que os mecanismos de controle fiscal previstos na LRF
precisam ser aprimorados. A proposta de LRO procura fechar essas brechas.
Na definição das despesas que não serão computadas como sendo despesas com
pessoal para fins de atendimento ao limite máximo de gasto com essa rubrica, há dificuldades
na segregação da despesa decorrente de sentença judicial por Poder e órgão autônomo, que
tem limites específicos. Há ainda problemas como o registro da folha de pagamento pelo valor
líquido, excluindo parcela do imposto de renda retido na fonte paga pelo servidor público
estadual e municipal, o que possibilita o registro a menor da efetiva despesa com pessoal e
reduz o requerimento de recursos mínimos aplicados nos setores de educação e saúde. A
proposta de LRO corrige essas situações, ao especificar o que são despesas realizadas (que
incluem inativos), fechar a margem para interpretações que levam alguns órgãos atualmente a
6
não computar parte dos gastos com pessoal e excluir do cálculo da despesa com pessoal as
sentenças judiciais transitadas em julgado. Acresce que a proposta de LRO tipifica melhor o
que constitui crime contra as finanças públicas.
O Conselho de Gestão Fiscal (CGF), composto por representantes das três esferas de
governo e de todos os seus poderes, apesar de previsto na LRF desde 2000, ainda aguarda
aprovação de projeto de lei em tramitação na Câmara dos Deputados para que seja instalado.
Para instigar sua imediata instalação, a proposta de LRO veda a criação pela União de órgão
ou cargo em comissão enquanto o CGF não tiver sido instalado. Ademais, por entender que o
CGF é um órgão supra-federativo e, portanto, mais imune do que atualmente o Ministério da
Fazenda no exame dos pleitos dos governos, atribui-se a ele (apoiado pelo Ministério da
Fazenda) a verificação do cumprimento dos limites e condições relativos à realização de
operações de crédito de cada ente da Federação.
2.2. Transparência
Em relação aos tribunais de contas, a proposta de LRO exige a instituição, pelo TCU,
de portal eletrônico de transparência fiscal, contendo sistema nacional de dados nas áreas de
educação, saúde e previdência. Para todos os tribunais de contas, a LRO exige ampla
divulgação de suas decisões, pareceres, alertas, instruções, relatórios e votos, inclusive da
manifestação das unidades técnicas que compõem a instrução dos processos. A LRO
estabelece ainda regras para o parecer prévio dos tribunais sobre as contas do Chefe do Poder
Executivo e determina que os tribunais apreciem, de ofício, os relatórios exigidos pela LRF.
7
Comissão Parlamentar de Inquérito da Câmara dos Deputados, relatada pelo Dep. Pedro Novais (PMDB/MA),
destinada a investigar a dívida pública da União, Estados e Municípios, o pagamento de juros da mesma, os
beneficiários destes pagamentos e o seu impacto nas políticas sociais e no desenvolvimento sustentável do País.
9
realizadas por fora da lei orçamentária). Outras recomendações seriam o desdobramento na lei
orçamentária e a demonstração em separado nos relatórios de execução das parcelas dos juros
nominais apropriadas a título de juros reais e de atualização monetária do principal da dívida
mobiliária, e o restabelecimento do equilíbrio econômico-financeiro de contrato de
refinanciamento firmado entre a União e os Estados, a partir da data de sua revisão.
3. PROCESSO ORÇAMENTÁRIO
A Lei 4.320 dedicou a seção I do Capítulo II do Título II para tratar das previsões
plurienais. Previa-se a criação de um “Quadro de Recursos e de Aplicação de Capital”, a ser
aprovado por decreto do Poder Executivo e anualmente reajustado. Entretanto, com o advento
da CF/88 tal norma deixou de existir, passando a vigorar um modelo que contempla dois
novos instrumentos de planejamento, o PPA e a LDO. Apesar de permitir maior flexibilidade
ao Poder Executivo no planejamento de médio prazo, pois não exigia aprovação do Poder
Legislativo, o modelo da Lei 4.320 falhava ao contemplar apenas as receitas e despesas de
capital, deixando de prever os custos associados com a manutenção das obras por concluir ou
o funcionamento das concluídas.
A Lei 4.320 introduzia também os programas, que deveriam constar tanto do referido
“Quadro”, inserido no orçamento plurianual de investimento (OPI), quanto da proposta e da
lei orçamentária. Os programas deveriam estar correlacionados a metas objetivas em termos
de realização de obras ou prestação de serviço, ou seja, os resultados que se pretende obter
com a realização de cada programa. Entretanto, na prática o OPI estava completamente
dissociado da lei orçamentária, e os programas se tornaram um mero classificador rígido dos
gastos, padronizado nacionalmente, em dois níveis. A mesma dissociação passou a ocorrer
entre o PPA e a LOA, até que em 1999 o governo federal introduziu uma reforma na
concepção dos programas orçamentários, para que passassem a refletir a organização da ação
pública voltada para o enfrentamento de um problema ou o aproveitamento de uma
oportunidade, conforme detectado pela sociedade. Apesar de todas as dificuldades
enfrentadas, a reforma logrou êxito ao exigir a utilização tanto pelo PPA quanto pela LOA de
uma mesma estrutura de programas (coisa que não acontecia antes!), de forma a possibilitar a
integração entre esses instrumentos.
Entretanto, a reforma não foi suficiente para fazer com que o PPA seja um
instrumento indutor da alocação dos gastos públicos no médio prazo.8 Em suas últimas
versões, o PPA federal tornou-se complexo, abrangente, e imbuiu-se de um espírito
determinista, com a pretensão de especificar detalhadamente o gasto das principais ações
orçamentárias em cada um dos quatro exercícios do período do plano. Como a base temporal
do plano é fixa, mas a economia é dinâmica, criaram-se mecanismos de revisão e
8
Entre os insucessos obtidos, podem-se mencionar o continuado distanciamento em relação à LOA, as
dificuldades de concepção dos programas, a inadequação dos indicadores, a mensuração das metas, a falta de
poder burocrático dos gerentes de programas, os conflitos com os setores de controle e meio ambiente, a
avaliação independente dos programas e a utilização dessas informações na elaboração da LOA.
11
flexibilização do PPA ao longo de sua vigência, entre eles o que permitia a sua alteração por
novas ações incluídas na LOA. O PPA, que já não orientava a LDO e a LOA do primeiro
exercício do seu período de vigência por conta do descasamento das datas de
encaminhamento e aprovação, na prática deixou de orientar a alocação dos gastos na LOA dos
demais exercícios.
9
A idéia expressa na proposta inicial do Senador Jereissati era que o Parlamento aprovasse o projeto uma única
vez, pelo seu custo total. As dotações correspondentes a parcelas desse custo seriam incorporadas à LOA dos
12
Para evitar que a plurianualidade ameace o equilíbrio fiscal no médio prazo (ou
conceda crédito de forma ilimitada), a proposta de LRO institui cenário fiscal de médio
prazo, definido anualmente na LDO. Em anexo específico, a LDO conterá tabela detalhada
explicitando os fluxos esperados de receitas e despesas, de forma a demonstrar o espaço fiscal
disponível em cada um dos quatro exercícios subseqüentes para novas iniciativas de
investimentos. Assim, garante-se que o total de gastos seja mantido dentro de montante
compatível com a arrecadação de receitas e com a trajetória pretendida de evolução da dívida.
Além de instituir cenário fiscal, a proposta de LRO introduz visão de médio prazo na
alocação dos recursos orçamentários. Para tanto, dispõe sobre como se dará a seleção dos
gastos a serem considerados prioritários e estabelece condições que permitem aferir
efetivamente essa priorização. Nesse sentido, determina que no máximo vinte por cento dos
programas finalísticos constantes do PPA sejam anualmente indicados como prioritários pela
LDO, e que durante o período abrangido pelo PPA as LOAs apresentem, para esses
programas prioritários, crescimento na alocação de recursos acima da média daquela dos
demais programas.
O Título III da Lei 4.320, com apenas dois artigos, trata da elaboração da lei
orçamentária pelo Poder Legislativo. O art. 32, primeiro desses artigos e não derrogado pela
CF/88, determina que se uma proposta orçamentária não for encaminhada pelo Poder
Executivo no prazo fixado, o Poder Legislativo considere a lei orçamentária que estiver em
vigor como proposta orçamentária para o ano seguinte. Apesar de a existência desse artigo
contrariar alguns juristas, que consideram inconcebível a hipótese de o Poder Executivo não
encaminhar uma proposta orçamentária (o que seria enquadrado como crime de
responsabilidade previsto no art. 85, VI, da CF/88), na prática a situação pode ocorrer e
precisa estar prevista na legislação. A proposta de LRO mantém o disciplinamento da Lei
4.320, acrescendo que o Congresso deverá compatibilizá-la com a LDO do exercício.
exercícios subseqüentes de acordo com previsão constante de cronograma de desembolso financeiro do projeto
(anualmente revisto). Com esse encaminhamento de plurianualidade, não haveria execução de projetos
plurianuais por intermédio de restos a pagar, a não ser em caráter residual.
13
regimento comum do Congresso Nacional.10 Entretanto, nada impede que a nova lei
complementar de finanças públicas ajude nesse disciplinamento, até porque a prática tem
demonstrado ser a auto-regulamentação do Congresso insuficiente para coibir abusos e
estabelecer regras perenes.11
Prova das dificuldades que o Congresso enfrenta para manter sua intervenção anual
nos projeto da LOA dentro dos limites da razoabilidade advém da comparação entre a prática
do Congresso brasileiro com aquela de outros países. Nos países desenvolvidos, mesmo
naqueles de regime presidencialista, os parlamentos normalmente aprovam pouquíssimas
emendas à proposta encaminhada pelo Poder Executivo, e as emendas adotadas exigem o
cancelamento de programação constante da proposta original em montante equivalente ao
aprovado. No Brasil, temos duas particularidades em nosso processo de apreciação que não
encontram similaridade em qualquer outro país do mundo: a aprovação a cada ano de
aproximadamente dez mil emendas ao projeto LOA e a existência de uma reserva
orçamentária no projeto de LOA cuja finalidade exclusiva é financiar as emendas aprovadas
pelo Poder Legislativo.
Para aproximar os costumes adotados no Legislativo brasileiro às melhores práticas
internacionais, e preservar a ordem fiscal das contas públicas, é preciso estabelecer regras
mais rígidas para frear a vontade, por vezes descontrolada, que os parlamentares demonstram
de aprovar emendas ao PLO.12 Nesse intuito, e cedendo em parte à prática arraigada em nosso
parlamento, a proposta de LRO prevê que os deputados federais ficariam limitados à
apresentação de dez emendas individuais, enquanto os senadores seriam proibidos de
apresentá-las.13 O valor total do conjunto dessas 5.130 emendas seria limitado ao equivalente
a 0,3% da RCL da União.14 Os representantes do povo disporiam, portanto, de pequeno valor
que alocariam para suprir as demandas mais prementes de suas bases eleitorais, em
complemento às políticas públicas.
10
O que na prática não vem ocorrendo, já que o processo legislativo orçamentário não segue o estipulado no art.
90 da Resolução nº 1, de 1970-CN, que institui o Regimento Comum do Congresso Nacional. Para tratar da
tramitação de matérias orçamentárias, o CN adota resolução específica (a atual é a Resolução nº 1, de 2006-CN).
11
Em média, a cada cinco anos o CN vota uma nova resolução que trata da tramitação de matérias
orçamentárias. Durante a sua curta vigência, é comum a resolução ser desrespeitada quando contraria a vontade
dos parlamentares mais influentes na Comissão Mista de Orçamento.
12
Na justificativa do PLS 229/09, o Senador Tasso Jereissati ressalta justamente a necessidade de uma “profunda
transformação” na atual sistemática de elaboração orçamentária no Congresso Nacional.
13
A simples eliminação da possibilidade de os parlamentares apresentarem emendas de cunho meramente
eleitoreiro ao projeto de LOA seria desejável, mas de implementação inviável dentro do atual processo político
brasileiro. Com 10 emendas, voltaríamos ao mesmo quantitativo estabelecido pela Resolução nº 01, de 1995-CN,
implementada a partir das conclusões da CPI que investigou o escândalo conhecido como “anões do orçamento”.
14
No processo de apreciação do PLO 2011, o montante das emendas individuais aprovadas pelos parlamentares
deve corresponder a 1,4% da RCL.
14
Nos últimos anos, por determinação repetida anualmente nas LDO, a reserva para
alocação exclusiva pelo Poder Legislativo constante dos projetos de LOA tem
correspondido a um por cento da RCL (aproximadamente R$ 5,5 bilhões no projeto de LOA
para 2011). A LDO exige que essa reserva seja considerada como despesa primária, mesmo
que não haja qualquer programação a ela atrelada, o que obriga o Poder Executivo a abdicar
de recursos que poderiam ser destinados a inúmeras finalidades. Assim, fere-se a lógica da
elaboração orçamentária, pela qual um poder faz uma proposta de alocação e o outro poder
revisa, alterando aquilo que julgar impertinente. Apesar desses óbices quanto a esse tipo de
reserva, sem paralelo em outros países, a proposta de LRO institui reserva no projeto de LOA,
de valor modesto equivalente a 0,5% da RCL, para financiar as emendas individuais e de
bancada aprovadas pelo Poder Legislativo.
15
Irregularidades na utilização de recursos públicos por parte de entidades privadas beneficiárias de emendas
individuais do relator-geral do PLOA 2001, Senador Gim Argello (PTB-DF), nas áreas de cultura e turismo,
culminaram com a sua renúncia à função.
16
Constituição Federal, art. 166, § 3º, inciso II.
17
O art. 166, § 3º, inciso III, alínea “a”, da CF/88, permite a correção pelo Congresso de “erros ou omissões”
encontrados nos projetos de LOAs.
15
passa a conter despesas para as quais não haverá receitas suficientes, exigindo a imposição
durante a execução orçamentária de limites para empenho e pagamento das despesas. Dada a
grande discrepância gerada entre os valores aprovados na LOA e os limites autorizados
(contingenciamento), resta comprometida a previsibilidade dos gastos no exercício, ficando os
órgãos setoriais sem saber se poderão ou não gastar todo o orçamento ao longo do exercício.
Existem várias opções para eliminar o viés altista que o Congresso tem na reestimação
das receitas do projeto de LOA.18 A alternativa adotada pela proposta de LRO é a instituição
de um comitê de receitas, sendo metade de seus membros originários do Poder Executivo, e a
outra metade composta por representantes do Poder Legislativo e da sociedade civil. Esse
comitê teria a atribuição de definir as receitas que constariam da proposta de LOA, bem como
da LOA, sendo que eventual acréscimo na estimativa de receita seria incorporado à LOA
durante a sua execução no ano seguinte.
18
Se havia alguma polêmica quanto a esse viés, ela se dirimiu nos últimos anos, em que o Poder Executivo
encaminhou propostas orçamentárias com estimativa de receitas bastante inflada, e mesmo assim o Congresso
elevou ainda mais as previsões, de modo a acomodar as emendas (inclusive quando a crise financeira
internacional se manifestou fortemente em outubro de 2008).
16
proposta de LRO reflete a evolução havida nessa área nas últimas décadas, normatizadas na
CF/88, na LRF, mas principalmente repetidas nas sucessivas leis de diretrizes orçamentárias
do governo federal. Assim, incorpora normas que por sua característica deveriam constar de
legislação permanente, além de estendê-las a todos os entes da Federação, proporcionando
maior segurança às ações dos agentes públicos do ciclo de gestão.
A Lei 4.320, nos arts. 36 e 92, ainda em vigor atualmente, define os restos a pagar
(RAP) como sendo as despesas empenhadas e não pagas até o final do exercício financeiro,
distinguindo-se as processadas das não processadas, e parte da dívida flutuante. A proposta de
LRO mantém esses conceitos, mas restringe a inscrição em RAP ao saldo da disponibilidade
financeira da respectiva destinação de recurso, e inova ao estabelecer regras diferenciadas
para cancelamento de RAP por grupo da despesa, com previsão de punições severas aos
administradores que as descumprirem. Estabelece, para as despesas correntes, o cancelamento
do RAP não pago até o final do terceiro mês seguinte ao do encerramento do exercício
financeiro. Para as despesas de capital o prazo de cancelamento sobe para seis meses,
ressalvadas as operações de crédito efetivamente realizadas e as despesas que exijam a
realização de licitação internacional para a sua concretização, para as quais o prazo de
cancelamento será de dois anos. Já para os investimentos de caráter plurianual financiados por
vinculações constitucionais ou legais, o prazo de cancelamento será de três anos.
A Lei 4.320 dedicou o Título VII para tratar dos fundos especiais. Em quatro artigos,
a lei define o que constitui fundo especial, exige dotação orçamentária, estabelece a
transferência para o exercício seguinte do saldo positivo apurado em balanço, e possibilita a
adoção de normas peculiares de controle, prestação e tomada de contas. A CF/88 exigiu que
os fundos então existentes, instituídos ou mantidos com recursos públicos, fossem revalidados
num prazo de cinco anos. Após revalidação inicial feita por intermédio dos dois PPA
seguintes, os fundos readquiriram o caráter de permanentes, já que nunca mais houve
qualquer revalidação.
Exceto pelos fundos que constam das constitucionais ou leis orgânicas, a proposta de
LRO estabelece vigência máxima de cinco anos para os fundos, renováveis por lei específica
por prazos sucessivos máximos de cinco anos. Adicionalmente, a proposta de LRO categoriza
os fundos conforme possuam ou não personalidade jurídica própria, sendo que os que
possuírem personalidade própria serão capitalizados por dotação expressa na LOA, mas não
terão a sua programação detalhada na LOA. Acresce proibição à constituição de fundo
financeiro por cotas em que o Poder Público seja detentor de mais de dois terços das cotas, de
18
forma a assegurar que sejam administrados segundo princípios de gestão compatíveis com as
exigências do mercado.
A contabilidade passa a caracterizar-se pelo foco nos atos e fatos que afetem ou
possam afetar o patrimônio e, por conseguinte, a situação patrimonial líquida do ente. Propõe-
se a modernização dos procedimentos de escrituração contábil, com a separação da
contabilidade patrimonial daquela relativa ao orçamento, e das demonstrações contábeis,
instituindo regras para consolidá-las nacionalmente. Nessa linha, a receita e a despesa
patrimonial passam a ser contabilizadas independentemente de recebimento ou de pagamento
registrados durante a execução da LOA, pelo regime de competência. A receita orçamentária
continuará a ser apropriada no exercício financeiro no momento de sua arrecadação, e a
despesa orçamentária no momento de seu empenho. A proposta de LRO determina ainda que
o CGF institua e padronize na federação regras de avaliação e mensuração de todos os ativos
e passivos.
superiores.19 Esse arranjo só foi rompido na grande reformulação levada a cabo em 1999,
conduzida pelas secretarias de orçamento e de planos do Ministério do Planejamento, com a
participação de todos os órgãos setoriais, e consubstanciada no PPA 2000-2003. A partir de
então, cada ente da Federação formulou os seus próprios programas, voltados para enfrentar
os problemas ou aproveitar as oportunidades que a sua própria realidade apresentava.
Por fim, a Lei 4.320 dedicou os oito artigos do Título VIII ao controle da execução
orçamentária. Neles, disciplinava o controle da legalidade dos atos, da fidelidade funcional e
do cumprimento do programa de trabalho, tanto pelo controle interno quanto pelo externo,
além da prestação de contas anual. A proposta de LRO expande as atribuições das
fiscalizações interna e externa, dispõe sobre a avaliação da gestão administrativa e estabelece
as condições para o funcionamento do controle social. Assim, estão previstas a participação
popular e a realização de audiências públicas durante a elaboração dos instrumentos
orçamentários, bem como o controle de suas execuções.
4. CONCLUSÕES
19
De forma similar ao classificador funcional mais aceito atualmente, o Classificador das Funções de Governo
(COFOG), adotado pelos países da OCDE e difundido pelo Manual de Estatísticas de 2001 do Fundo Monetário
Internacional.
20
despesa de acordo com a arrecadação das receitas e as metas de resultado fiscal, mas também
incorporar uma visão de médio prazo que assegure qualidade na alocação dos recursos. A
responsabilidade orçamentária envolve ainda a busca por ganhos de eficiência na gestão das
despesas das programações de apoio, de forma a aumentar o espaço fiscal disponível (sem
aumento da carga tributária) para o financiamento das programações finalísticas, que
beneficiam os cidadãos com mais bens e serviços públicos ofertados diretamente à sociedade.
Nesse sentido, é preciso repensar o PPA. Não há país desenvolvido em que um plano
de governo de médio prazo, que se sobreponha à lei orçamentária, tenha que ser aprovado
pela Legislatura. A CF/88 determina que ele seja abrangente, e em seus últimos formatos
tornou-se complexo e detalhista, deixando de constituir-se no necessário planejamento
estratégico. Mais do que isso, o plano e o orçamento anual precisam recuperar a sua
capacidade de determinar a alocação final do gasto, o que ocorre apenas quando a execução
orçamentária for a mais próxima possível da programação original. A conquista dessa
aderência à realidade, com respeito à restrição fiscal do ente e uma alocação eficiente dos
recursos, passa por uma série de normas que estão consubstanciadas na proposta de lei de
responsabilidade orçamentária ora em debate no Senado.
Além de simplificar, agregar e encontrar uma forma de tornar o PPA seletivo (sem
ferir a CF/88) e aprofundar a função fiscal e alocativa da LDO no médio prazo, o Poder
Executivo também precisa adotar procedimentos mais modernos de gestão financeira.
Ademais da reforma contábil atualmente em curso, com a adoção pela contabilidade do setor
público de conceitos e técnicas já empregados no setor privado, são desejáveis a instituição de
banco de projetos, a imposição de maiores restrições ao acúmulo de restos a pagar, a mudança
21
A iniciativa dos senadores de reabrirem o debate sobre a nova lei que virá a substituir
a Lei 4.320 deve ir além de se olhar o passado, para avaliar e exaltar as mudanças
inegavelmente promovidas. Esta é uma excelente oportunidade de se olhar para frente,
quebrar paradigmas, identificar o tanto de entraves e problemas que ainda precisam ser
solucionados. Já passa da hora de a responsabilidade chegar ao orçamento público no Brasil.
22
BIBLIOGRAFIA