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COMO TENHO REAGIDO AO MEU PECADO?

Texto base: Lucas 22.54-62.

CONTEXTO IMEDIATO

Após ser traído por Judas, Jesus, que estava no Getsêmani, foi preso pelo Sinédrio. O Sinédrio
era como o tribunal religioso da época, composto por 71 homens influentes na sociedade. Os
membros do Sinédrio governavam e julgavam o povo judeu de acordo com a Lei de Moisés e as
tradições judaicas. O chefe do Sinédrio era o sumo-sacerdote.

Jesus foi preso durante a noite. Nesse horário o templo estava fechado, e por ser o local de
reunião do Sinédrio para julgamentos, o julgamento de Jesus devia acontecer nele. Contudo os líderes
do Sinédrio tinham pressa em condenar Jesus, por isso ele foi levado inicialmente para uma espécie
de audiência na casa de Anás (apenas o livro de João descreve esse fato), e posteriormente foi
conduzido à casa de Caifás. Caifás era o sumo-sacerdote da época, e Anás, seu sogro, foi seu
antecessor. O julgamento de Jesus aconteceu na casa do próprio Caifás. Pedro estava seguindo, de
longe, todo o processo de julgamento, e estava no pátio da casa de Caifás se aquecendo no fogo
enquanto observava tudo.

TU ME NEGARÁS

Jesus havia dito a Pedro que ele o negaria três vezes antes que o galo cantasse, e Pedro negou
essa possibilidade, dizendo preferir a morte que negá-lo (Mt 26:34,35).

Lucas 22.61,62: Então, voltando-se o Senhor, fixou os olhos em Pedro, e Pedro se lembrou da palavra
do Senhor, como lhe dissera: Hoje, três vezes me negarás, antes de cantar o galo. Então, Pedro,
saindo dali, chorou amargamente.

De alguma forma era possível que Pedro, no pátio da casa, olhasse para Jesus e pudesse ver
seus olhos. É o que o texto destaca que acontece quando a terceira negação de Pedro se concretiza.

Pedro chora ao negar Jesus. Não só isso: o texto acrescenta uma ênfase, ao dizer que Pedro
chorou amargamente. Podemos nós, hoje, imaginar os sentimentos que envolveram Pedro naquele
momento?

LÁGRIMAS DE CULPA

Pela descrição dada pelo texto, é plausível afirmar que culpa e tristeza foram sentimentos
presentes. Pedro sabia exatamente o que havia acabado de fazer, negado aquele com que havia
caminhado tantos anos, servido com amor, aprendido muito mais do que ele poderia imaginar quando
foi chamado às margens do lago de Genesaré. Diante do seu pecado, ao olhar para Cristo, Pedro chora
amargamente, pois lembrou das palavras que Cristo havia dito a ele.
Culpa e tristeza são sentimentos que caminham juntos. O sentimento de culpa de Davi no
Salmo 38 o leva a afirmar que é “como fardo pesado que excede sua força”. Pedro sabia que havia
pecado ao negar Cristo, por três vezes, estando ali diante de seu mestre, e sentir culpa era uma
consequência óbvia e imediata de seu pecado.

• Considerações sobre o pecado

1 Jo 3:4 afirma que “o pecado é a transgressão da Lei”, e o Catecismo Maior de Westminster,


na sua pergunta 24, define pecado como “qualquer falta de conformidade com a Lei de Deus ou a
transgressão de qualquer lei por ele dada como regra à criatura racional”. O pecado está sempre
diante de nós, pois nossa natureza humana é caída após o pecado de Adão. Rm 3:9-12 e 1 Jo 1:8,10
mostram que não há ser humano livre da maldição do pecado.

Deus nos oferece redenção por meio da pessoa de Cristo. Rm 3:23-26 mostra que, apesar de
todos estarmos decaídos, a obra de Cristo é suficiente para nos resgatar e transformar nossa natureza
decaída. Agora não estamos mais sobre domínio do pecado, mas pertencemos a Cristo (Rm 8:1,2).
Somos capacitados pelo Espírito de Deus a andar em sua lei, que agora está impressa em nossos
corações (Hb 10.15, Ez 36:26,27).

Apesar de regenerados e adotados por Deus e justificados por Cristo, ainda somos pecadores,
pois não conseguimos viver de modo perfeito, sem que quebremos algum dos mandamentos do
Senhor. Enquanto vivermos travaremos batalhas com o pecado, e por vezes sairemos derrotados, pois
“o espírito está pronto, mas a carne é fraca” (Mt 26:41). Nunca devemos esquecer que todo pecado é
um grave crime contra Deus e sua total e perfeita santidade. Quando uma pessoa santificada pela
obra de Cristo e pela ação do Espírito Santo peca ele está em falta com a lei de Deus, e renega a
redenção oferecida por Cristo.

Assim, tendo ciência da podridão dos nossos atos pecaminosos e da pureza do ser de Deus,
podemos facilmente entender a reação de Pedro ao negar Jesus. Sentimentos como culpa e tristeza
tomam o apóstolo, que só consegue fazer uma coisa: chorar amargamente.

Nós poderíamos tranquilamente substituir o nome de Pedro pelo nosso próprio nome. A
negação de Jesus feita por Pedro é um exemplo do que fazemos toda vez que pecamos. Cada um dos
nossos pecados nega a soberania e supremacia de Cristo sobre nossas vidas. Ao descumprirmos a lei
de Deus não somos apenas desobedientes: nosso desejo de fazermos nossa vontade revela nosso
orgulho, nossa insubmissão às leis de Deus mostram nossa idolatria de nós mesmos. O desprezo das
leis dadas por Deus como forma de amor e pureza do seu povo são fruto de sentimentos de ingratidão
e descontentamento. Somos tão arrogantes ao pecar que desejamos tomar o lugar do próprio Deus,
agindo da forma que bem entendemos, sem levar em conta aquilo que é de sua vontade. Por isso a
reação de Pedro não é nada além de justa: seu amargo choro revela a culpa que sentiu por saber que
negou um Deus que sempre o amou.

“Quando pensamos nos votos que declaramos e no que realmente temos cumprido, devemos chorar
com profundas lágrimas de tristeza, bem como Pedro. [...] Pensar que temos ofendido um senhor tão
bom e amável é uma razão mais que suficiente para chorarmos constantemente. Que jamais
tenhamos olhos insensíveis para com o pecado, a menos que desejemos ser, em breve, consumidos
pelas chamas do inferno!”

Charles Spurgueon
UMA FORMA ERRADA DE LIDAR COM A CULPA

Conseguimos perceber que é natural, e até mesmo esperado, que a nossa reação ao pecar
seja um sentimento de culpa. Contudo, nem sempre sabemos lidar com esse sentimento da maneira
correta. Quando temos consciência do nosso pecado, e estamos entristecidos por conta disso, uma
série de pensamentos pode passar pela nossa mente, e nem todos são verdadeiros e coerentes com
verdades ou princípios bíblicos.

Lutamos tanto contra o pecado (às vezes contra o mesmo pecado!), e as derrotas parecem
mais evidentes que as vitórias. Nos sentimos cansados e desmotivados, pois a santificação prometida
parece distante. Ao olharmos para os lados vemos irmãos na fé progredindo em sua carreira cristã
enquanto nós continuamos parados, estagnados, parece que até retrocedendo ao invés de avançar.
Chegamos a pensar que nossa salvação está posta em xeque e estamos a ponto de decair da graça.

Diante do nosso pecado nossa culpa pode se tornar tão grande que nossos olhos só
conseguem se atentar a enorme distância entre a santidade de Deus e nosso pecado imundo. A
distância é tão grande que parece um caminho impossível de percorrer. A culpa dá lugar ao
constrangimento, e pensamos “como posso me dirigir a um Deus tão puro nesse estado tão
deplorável?”, e dessa forma, nos afastamos ainda mais de Deus.

Irmãos, não se enganem: pensamentos como esses não passam de armadilhas do inimigo para
que não busquemos o perdão prometido pelo nosso próprio Pai. O nome de Satanás não foi escolhido
ao acaso. Satanás é um termo hebraico que significa “o acusador”.

“O alvo de Satanás é sempre o mesmo: eliminar a semente escolhida”.

Joel Beeke, Lutando contra Satanás, p. 25.

“Um dos métodos de Satanás é atacar aos cristãos enchendo-lhes com interrogações, dúvidas,
incertezas e miséria”.

Thomas Brooks, Remédios preciosos contras as artimanhas do Diabo, p. 81.

Satanás faz com que questionemos a misericórdia de Deus, e procura persuadir que não temos
parte na salvação. Ele argumenta que nenhum filho de Deus poderia ser como somos, ressaltando
nossos pecados. Nos leva ao desespero. Mas não devemos nos esquecer que para os que estão em
Cristo já não há nenhuma condenação! (Cl 2:13-15). Além disso, não devemos achar que os nossos
pecados tem o poder de remover de nós a salvação, pois somos salvos pela graça e não por
merecimento. Somos salvos pela obra de Cristo, e não pelas nossas próprias obras.

“O desânimo é uma artimanha comum de Satanás. Satanás quer que os cristãos pensem que eles
lutam há tanto tempo contra ele, mas não conseguiram nada na luta. Tropeçam e pecam todos os
dias, e não adianta prosseguir. “Minha luta contra o pecado não adianta nada, a minha tentativa de
viver uma vida santa é inútil. Não adianta servir a Deus”. Satanás se enfia na vida, tentando os
crentes a serem desertores do exército de Cristo. A única resposta [...] é a nossa esperança de
salvação futura. Quando Satanás o faz sentir vontade de entregar os pontos na batalha contra o
pecado, [...] creia que você já foi salvo, e seja salvo. [...] Se você for cristão, você tem um futuro
maravilhoso. A sua salvação não pode ser tirada”.
Joel Beeke, Lutando Contra Satanás, p. 70-71.

DESCANSO NA CONFISSÃO

Saber que nosso pecado não é suficiente para nos separar definitivamente de Deus é uma
verdade muito reconfortante. Contudo, não minimiza a gravidade do pecado.

O culpa do pecado não é suficiente para criar um abismo intransponível, mas somos
constrangidos pelo enorme amor de Cristo, que morreu por nós (2Co 5:14). Não perdemos nossa
salvação, mas perdemos a alegria nela (Sl 51:12). Ao pecarmos, deixamos de andar no Espírito, e
voltamos a satisfazer as concupicências da carne (Gl 5:16-17). Por isso a culpa do pecado tem grande
peso sobre os cristãos. A culpa é destrutiva, e tem o poder de consumir o crente. Veja como Davi
descreve seu estado físico enquanto convivia com o pecado em Sl 32:3,4 e Sl 38:3,4.

Graças a Deus Pai temos a bênção do perdão. Ao reconhecermos nossos pecados devemos
nos arrepender de nossas atitudes, e isso deve mover em nosso coração o desejo de confessar nossos
pecados a Deus, reconhecendo nosso erro. Ao orar pelo povo, Daniel faz confissão de pecados,
reconhecendo que a eles pertencia o corar de vergonha, por ter descumprido as leis de Deus. (Dn 9:4-
8).

Deus nos garante perdão, por meio da pessoa de Cristo (1Jo 1:9, 2:1). Veja que Davi no Salmo
32 alcançou perdão após confessar seu pecado a Deus (Sl 32:5). A confissão é o caminho para o
perdão. Quem confessa seus pecados alcança misericórdia (Pv 28:13). Deus se agrada de um coração
quebrantado, que reconhece seus erros e teme ao Senhor (Sl 51 1,2,17).

CONCLUSÃO

Depois de chorar amargamente, não sabemos mais o que Pedro fez, até o fim do livro de João,
onde Jesus aparace para ele. Não temos registro de uma oração de confissão. Mesmo assim, podemos
ter certeza que ele se arrependeu e alcançou o perdão de Deus. O livro de Atos cita Pedro várias vezes,
e várias das obras que ele fez em nome de Cristo. Somente um coração arrependido e convicto do
perdão poderia fazer tais coisas.

Pedro nos ensina a chorarmos pelos pecados que cometemos, mas a também nos
arrependermos para continuarmos sendo úteis ao Reino de Deus na terra. Que nossos corações
estejam sempre dispostos a buscar o perdão do Pai.

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