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Intuições para o Teorema do ponto fixo

Autorreferência na linguagem natural utilizando


diagonalização
Vamos pegar a frase (1) “Rodrigo está lendo x”. A diagonalização dessa
frase é (2) “Rodrigo está lendo “Rodrigo está lendo x””. Isso ainda não é o su-
ficiente para autorreferência. (2) afirma que Rodrigo está lendo (1), e não (2).
Reapre que, por exemplo, (2) é uma sentença, porém (1) possui exatamente um
pronome livre. Queremos construir uma frase que diz que Rodrigo está lendo
a ela mesma. Sem usarmos indexicais e similares, podemos fazer referrência à
própria operação de diagonalização. Por exemplo,

(3) “Rodrigo está lendo a diagonalização de x”

Qual a diferença interessante da frase (3) e da (1)? A (1) afirma que um


x está sendo lido. A (3) não afirma que um x está sendo lido, mas que algo
derivado (no sentido fraco da palavra) de x está sendo lido. Ou seja, outra
coisa, derivada de x, está sendo lida. Não conseguimos criar uma autorreferência
com (1), pois quando tentamos, a frase resultante (2) diz que Rodrigo está
lendo exatamente a frase (1). Mas, repare que isso não aconteceria com (3),
pois quando substituı́mos qualquer coisa pelo pronome x em (3) criamos uma
sentença, digamos, (4). (4) não afirma que Rodrigo está lendo a coisa substituta,
mas sim algo derivado dessa coisa. Isso nos dá espaço para pensarmos que a
sentença pode falar de algo derivado de uma frase qualquer e que essa coisa
derivada possa ser a própria sentença em questão. De fato isso acontece.
Vamos diagonalizar (3), formando um (4) adequado:

(4) “Rodrigo está lendo a diagonalização de “Rodrigo está lendo a diagonal-


ização de X””

(4) afirma que Rodrigo está lendo a diagonalização de (3). A diagonalização


de (3) é (4). (4) afirma então que Rodrigo lê ela mesma, e então temos autor-
referência.
Podemos abstrair esse exemplo concreto e pensar em casos gerais. Se temos
propriedade “ser C”, podemos criar um ponto fixo para “ser C” em linguagem
natural repetindo o mesmo procedimento: “A diagonalização de “A diagonal-
ização de x é C” é C”. Essa sentença afirma que ela própria é C.

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Quais são as ideias centrais em todo esse procedimento? Para mim, parecem
ser as seguintes:

(a) Ao dizermos que a diagonalização de uma frase possui uma certa pro-
priedade, não dizemos algo propriamente da frase, mas sim de uma outra frase
– uma sentença, que surge dessa frase.
(b) Algumas frases são diagonalizações de outras.

A partir de (a) e (b), é mais natural o pensamento de acharmos uma sentença


que, primeiramente é ela própria uma diagonalização de uma frase especı́fica, e
que afirma que a diagonalização dessa frase especı́fica possui certa propriedade,
para então ela falar de si própria. Ou seja, nossa frase autorreferente precisa
ser uma diagonalização de uma frase que fala de diagonalização! Mais especifi-
camente, uma diagonalização que fala que a diagonalização de uma frase possui
dada propriedade. Vamos transpor essas ideias pra lógica.

Teorema do ponto fixo


A enunciação do teorema é a seguinte: Sejam Γ um estoque de fórmulas com
os axiomas da igualdade e y um pronome distinto de x. Suponha que há uma
fórmula D tal que D com x e y representa em Γ a diagonalização. Seja C uma
fórmula tal que y ocorre livre em C e nenhum outro pronome ocorre livre em C.
Então existe uma sentença B tal que a equivalência Cy [pBq] ↔ B é dedutı́vel a
partir de Γ.

Queremos agora uma sentença que afirma “Eu possuo a propriedade que C
exprime”. De acordo com o nosso raciocı́nio anterior, podemos formar a sen-
tença B do seguinte modo:

“A diagonalização de “A diagonalização de x possui a propriedade que C


exprime” possui a propriedade que C exprime”

Tudo o que precisamos agora é olhar a frase de dentro e colocar ela em lin-
guagem de primeira ordem! Essa frase pode ser entendida como a seguinte:

∃y(Dxy ∧ Cy)

Essa frase diz que a diagonalização de x tem a propriedade que C exprime.


A diagonalização dessa frase é a nossa B.

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