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O VAZIO E A NÃO-
DUALIDADE
O Ser/Não-ser, Vazio/Não-dualidade
Nas religiões, na Ciência e nas Filosofias.
Compilado e organizado por: Flávio Capllonch Cardoso/Karma Tenpa Dhargye
NAS RELIGIÕES
HINDUISMO:
ISHA UPANISHAD
1) – BRAHMAN – A UNIDADE : Unidade de Deus e o Mundo [versos 4-5] O senhor e o
mundo, ainda quando parecem distintos, não diferem na realidade um do outro, eles são
um só Brahma.
O ÚNICO IMÓVEL
Brahma é a única realidade estável e eterna. É Uno porque não há nada mais, dado que
toda existência e não-existência se trata dele. É estável e imóvel, porque movimento
implica mudança no espaço e mudança no tempo, e Ele, ao estar além do espaço e do
tempo, é imutável. Possui eternamente em si tudo o que é, foi ou sempre será e,
portanto Ele não aumenta nem diminui. Esta além da causalidade e da relatividade e,
portanto, em Seu ser não há mudança de relações.
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multiplicidade, divisões de tempo e espaço, relações e agrupamentos de circunstância e
causalidade. Todas essas coisas são reais na consciência, porém, somente simbólicas do
ser, como se o imaginado por uma mente criadora fosse verdadeira representação de sí
mesma, sem constituir-se em absolutamente real em comparação com ela mesma, ou
real com um gênero diferente de realidade. Porém a consciência mental não é o poder
que cria o universo. Trata-se de algo infinitamente mais potente, veloz e livre de
restrições que a mente. É a pura e onipotente auto-sapiência do Absoluto isenta de
ataduras de qualquer lei da relatividade. As leis da relatividade, sustentadas pelos
deuses, são suas criações temporárias. Sua aparente eternidade é somente duração,
incomensurável para nós, do mundo que eles governam. São leis que regulam o
movimento e a mudança, não leis que liguem o senhor ao movimento. Os deuses,
portanto, são descritos como correndo em seu deslocamento. Mas o senhor está livre e
não lhe afeta seu próprio movimento. A criação não é fazer, porém chegar-a-ser em
termos e formas de existência consciente. No vir-a-ser, cada indivíduo é Brahma
diversamente representado e entrando em diversas relações com Aquele no rol da
consciência divina; no Ser, cada indivíduo é todo Brahma. Brahma, como o Absoluto ou o
Universal, tem o poder de colocar-se atrás de Sí Mesmo narelatividade. (multiplicidade)
(…) O indivíduo pode até se considerar como eternamente diferente do Uno, ou se
quiser, eternamente uno com Ele, porém ainda diferente, ou pode, em sua consciência,
voltar inteiramente à pura Identidade. Porém nunca pode considerar-se como
independente de certo gênero de Unidade, pois tal parecer corresponderia a uma
verdade inconcebível no universo ou além dele. (…) Essa coexistência, difícil de conceber
para o intelecto lógico, pode experimentar-se mediante a identificação da consciência
com Brahma. Inclusive ao afirmar a Unidade, devemos recordar que Brahma está além
de nossas diferenciações mentais e se trata de um fato que não condiz com o
pensamento que discrimina, senão com o Ser que é Absoluto, Infinito, e que escapa a
nossa discriminação. Nossa consciência é representativa e simbólica; não pode conceber
a coisa-em-si-mesma, o Absoluto, a não ser por negação, em uma espécie de Vazio,
esvaziando de tudo quanto pareça conter o Universo, e tudo o que está aqui no
espaço/tempo e além do espaço/tempo. A idéia de uma meta final no movimento da
Natureza mesma é ilusória. Pois Brahma é Absoluto e Infinito. Nada, dentro das
aparências do universo, pode ser inteiramente Brahma enquanto consciência relativa;
tudo é somente uma representação simbólica do Incognoscível.
TAOISMO:
TAO TE KING
Pela origem, AMBOS SÃO UMA COISA SÓ, Diferindo apenas no nome.
BUDISMO
MAHA-PRAJNA-PARAMITA
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A MAIS ALTA E PERFEITA SABEDORIA
Assim, eu ouvi. Certa vez, o Abençoado, juntamente com vários dos maiores
Bodhysattvas e um grande número de bhikhus, se encontravam em Rajagriha, no monte
Gridhrakuta. O Abençoado estava absorvido no samadhi e o nobre Avalokitesvara
meditava sobre o profundo Prajna-Paramita. O venerável Sariputra, influenciado pelo
Abençoado, absorvido no samadhi, perguntou ao nobre Bodhysattva Avalokitesvara: – Se
um homem ou uma mulher quisesse estudar o Prajna-Paramita, como podia fazê-lo? O
nobre Avalokitesvara respondeu: – Deve o homem ou a mulher primeiramente se livrar
de todas as suas idéias egocêntricas. Deverá refletir: “Personalidade? O que é
personalidade? Será uma entidade permanente ou será feita de substâncias
impermanentes que desaparecem?”. A personalidade é composta dos cinco agregados
do apego: A forma, a sensação, a percepção, as formações mentais e a consciência, que
são, por natureza, desprovidas de natureza própria. A forma é vazia de qualquer
substância própria e o vazio não é diferente da forma; na realidade, a forma é o vazio. A
sensação é vazia de substância própria, o vazio não é diferente da sensação, nem a
sensação é diferente do vazio; na realidade, a sensação é o vazio A percepção também é
vazia de substância própria, o vazio não é diferente da percepção, nem a percepção é
diferente do vazio; na verdade, a percepção é o vazio. As formações mentais também
são vazias de substância própria, o vazio não é diferente das formações mentais, nem
formações mentais são diferente do vazio; na verdade, as formações mentais são vazias.
A consciência também é vazia de substância própria, o vazio não é diferente da
consciência, nem a consciência é diferente do vazio; portanto na verdade, a consciência é
vazia. Assim sendo, Sariputra, todas as coisas que têm a natureza do vazio não têm nem
princípio nem fim. Eles não são culpados, nem sem culpa; eles não são perfeitos nem
imperfeitos. No vazio não há forma, nem sensação, nem percepção, nem consciência. Na
realidade não há olhos, nem ouvidos, nem nariz, nem língua, nem sensibilidade do
contato, nem mente. Não há visão, audição, olfato, gustação, tato, nem processos
mentais, nem objetos desses processos mentais, nem conhecimento, (consciência) nem
ignorância. Não há destruição dos objetos ou cessação do conhecimento, nem cessação
da ignorância. [não há substância própria] Na Realidade [Absoluto] não existem as
Quatro Nobres Verdades: não há Dor, nem causa da Dor, nem cessação da Dor, nem
Nobre Caminho que leva à cessação da Dor. Não há decadência ou morte, nem
destruição da noção de decadência e morte. Não há o conhecimento do Nirvana, não há
obtenção do Nirvana, nem não-obtenção do Nirvana. Porque não há obtenção do
Nirvana? Porque o Nirvana é o domínio do “não-pensar”. Se o ego ou a personalidade
fosse uma entidade permanente, não se poderia alcançar o Nirvana. Somente porque a
personalidade é constituída de elementos impermanentes que se desintegram, essa
personalidade pode alcançar o Nirvana. Enquanto o homem estiver à procura da mais
alta e perfeita Sabedoria, ele estará ainda habitando o domínio da consciência objetiva.
No mais profundo Samadhi, tendo transcendido a consciência objetiva, ele também
ultrapassa a discriminação e o conhecimento; transcendendo as garras do medo, “ele” já
estará se deliciando no Nirvana. A perfeita compreensão e a paciente aceitação disso é a
mais alta e perfeita Sabedoria – Prajna-Paramita. Todos os Budhas do passado, presente
e futuro, tendo alcançado o mais alto Samadhi, se encontram na realização da Suprema
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Sabedoria. Assim sendo, Sariputra, todos deveriam procurar a auto-realização da
Suprema Sabedoria – Prajna-Paramita, da Verdade Transcendental, que realiza o fim de
todos os sofrimentos, a Verdade que é eternamente verdadeira. Ó Prajna-Paramita!
Verdade Transcendental que se estende ao agitado oceano da vida e morte, leva contigo
em segurança todos os teus seguidores para a outra margem, para a Iluminação. Ouçam
o mantra, o Grande Misterioso Mantra: “Vá, vá em segurança à outra margem, ó Prajna-
Paramita! Que assim seja!” Tadyata Om Gate, Gate, Parasamgate, Bodhi, SOha
(2) –Que as condições resultantes não tem nenhuma natureza verdadeira intrínseca; e,
“A Porta Aberta para a Vacuidade” – Kenchen Thrangu Rinpoche – Ed. Bodigaya M. Eckhart cita Sto. Agostinho:
“A alma tem uma porta celestial para penetrar na natureza divina, onde algumas coisas
são reduzidas ao vazio”. Evidentemente temos de esperar que a porta celestial se abra
ante as nossas repetidas batidas ou incessantes pancadas, quando se é “ignorante no
saber”, “insensível no amor”, “escuro na luz”. Tudo vem dessa experiência fundamental, e
somente quando ela é compreendida é que penetramos no reino do vazio onde a
divindade mantém nossas mentes discriminatórias inteiramente “reduzidas ao vazio”. 2
Para entrar em contato com essa “fonte” e saber o que ela é, (para ver minha própria
face antes mesmo que eu tenha nascido), tenho de mergulhar no “Grande Vazio do Tao
Absoluto”.3
[2,3] – Mística Cristã e Budista – Suzuki O que pensam os cristãos de “o divino núcleo de
absoluta quietude” ou de “o simples núcleo que é o deserto tranqüilo em que não se
insinuam quaisquer distinções”? M. Eckart está de perfeito acordo com a doutrina
budista do Shunyata, [VAZIO], quando sustenta a idéia da divindade como “puro nada”,
[ein bloss niht]. 4 Realmente, o que foi criado não tem realidade; “Todas as criaturas são
puro vazio”, todas as coisas foram feitas por ele e, sem ele, nada do que foi feito, se fez.
[João, 1,3] O imperador Wu era um bom estudante da filosofia budista e desejava que o
primeiro princípio fosse elucidado por Bodhidarma o grande mestre vindo da Índia. O
primeiro princípio consiste na identidade do Ser e do Não-ser, além da qual os filósofos
não podem ir. O imperador imaginou se esse bloqueio não poderia, de algum modo, ser
rompido por Bodhidarma. Daí sua pergunta. Bodhidarma sabia que qualquer resposta
que desse seria decepcionante. Então respondeu as questões; “Que é a Realidade? Que é
a Divindade?” “A vasta Vacuidade, sem nada Santo dentro dela”. [4,5] – Mística Cristã e
Budista- Suzuki Uma passagem do “Prajnaparamita-Hridaya-Sutra” bastante impregnada
da idéia de “Shunyata”. “Assim ó Shariputra, todas as coisas têm o caráter do vazio”. À
pergunta “como pode o inivíduo estar sempre com Budha?”. Obteve a seguinte resposta
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de um mestre Zen: “Não tenhais perturbações na mente. Sede perfeitamente sereno
com relação ao mundo objetivo. Permanecer assim todo o tempo, num vazio absoluto e
calmo, é o caminho para a união com Budha7”.
[6,7] – Introdução ao Zen Budismo – Suzuki
PRODUZIR O VAZIO
Se compreendermos o corpo de Budha, Não existe mais nada. Fonte original, Nossa
própria natureza É o puro e verdadeiro Budha.
Esse verso do Sutra Shodoka, “O canto do Satori imediato”, de Yoka Daïshi, significa que,
se compreendemos a realidade, se obtivermos a realização completa, nosso corpo torna-
se Budha. Tornar-se Budha significa receber e apreender a vida Cósmica. Temos de
compreender que nosso corpo e o Cosmos não estão separados; eles formam uma
unidade. A essência do sutra do Hannya Shingyo (Prajna Paramita) é:
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Os fenômenos não são diferentes do vazio, o vazio não é diferente dos fenômenos
ZERO = INFINITO
O “Prajna” não é alcançado quando alguém atinge o mais profundo centro interno do
“próprio” ser. Não consiste na “permanência” em um ponto místico secreto do “próprio”
ser, mas permanência em parte alguma em particular, no ser ou fora dele. Não consiste
na auto-realização como afirmação do “próprio” ser limitado, ou no gozo da “própria”
essência espiritual interna, mas ao contrário é isenta da necessidade de auto-afirmação
e auto-realização de qualquer espécie. Numa palavra, Prajna não é auto-realização, mas
realização pura e simples além do sujeito e do objeto. Evidentemente, numa realização
desse tipo a “Vacuidade” já não mais se opõe à “Plenitude”, porque Vacuidade e Plenitude
são UM. O Zero é igual ao Infinito. Onde existe “alguma coisa”, um objeto definido ou
limitado, não é possível existir a “Plenitude”. Mais uma vez, a “Vacuidade” de todas as
formas limitadas é a plenitude do “UM”: entretanto, o UM jamais deve ser encarado
como uma forma isolada. Para evitar essa tentação, os mestres Zen sempre se referem a
Vacuidade11 .
[11] – Trechos do Livro THE ZEN DOCTRINE OF NO MIND – Daisetz Teitaro Suzuki
NA CIÊNCIA MODERNA
Todas os fenômenos dos mundos externo e interno, com exceção do espaço natural e da
vacuidade, existem na impermanência. Das maiores cadeias de montanhas, estrelas e
galáxias à corrente interna de energia de vida dos seres humanos com suas emoções e
pensamentos sempre em mutação, tudo está continuamente se desintegrando
momento a momento e se transformando em outra manifestação de vida e de energia
elemental. A dança cósmica da criação, transformação e destruição, nos níveis grosseiro,
sutil e muito sutil, segue o ritmo cósmico fundamental e a melodia do carma, da
vacuidade e do surgimento interdependente dos fenômenos. Em minha opinião, os
yogues tântricos antigos e modernos, os mahasiddhas, santos, filósofos tibetanos
(gueshes) e outros Seres Sagrados que pesquisam o mundo interior e os físicos do
século XX, que investigam o mundo externo, independentemente uns dos outros,
descobriram a verdade da vacuidade e da interdependência dos fenômenos. É claro, que
da perspectiva budista, tudo isso é criado pela mente. Acreditamos que a investigação
científica interna da mente sutil e da energia, realizada por muitas gerações de yogues,
santos e grandes meditadores, é muito mais profunda e poderosa que a investigação
científica do nível grosseiro, realizada por nossa geração atual. Entretanto, ambos
parecem estar tocando a mesma realidade a partir de ângulos diferentes e em
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diferentes níveis, Os cientistas estão tocando a vacuidade e o surgimento
interdependente dos fenômenos do ponto de vista objetivo, no nível grosseiro,
baseados nos objetos manifestos e no que pode ser registrado pelas máquinas e
conceitualmente formulado pela matemática. Os mahasiddhas e grandes meditadores
tocam a vacuidade diretamente, subjetivamente e sem conceitos, nos níveis sutil e muito
sutil, baseados em sua experiência pessoal da dissolução de seus elementos, ventos e
consciência, resultado de terem aprendido a cuidar de seus canais, ventos e gotas.
Ambos estão tocando a vacuidade e o surgimento interdependente dos fenômenos
utilizando as estruturas de suas próprias metodologias científicas. Os yogues budistas
afirmam o seguinte:
Em minha opinião, a visão dos yogues budistas está muito próxima da visão dos físicos
de hoje. Talvez suas explicações sejam exatamente as mesmas, ou talvez, muito pouco
diferentes. Mesmo não podendo ter certeza sobre isso, não há como negar que os
físicos de hoje podem virtualmente concordar com a visão budista da realidade. Por isso,
muitos cientistas estão começando a se interessar por aspectos específicos do budismo
tibetano, e também por outras tradições espirituais antigas, como o hinduísmo e o
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taoísmo. Os cientistas estão iniciando um diálogo com os yogues budistas porque o
budismo pesquisou por completo a relação mente-matéria, os níveis sutil e muito sutil
de consciência e os cinco elementos. Se os cientistas tivessem acesso a esse nível sutil
subjetivo e objetivo da realidade, não precisariam comunicar-se com os Lamas. Isso não
significa que os cientistas precisam tornar-se budistas. Os Lamas modernos como eu
desejam apenas oferecer a essência da prática e da filosofia Prajnaparamita, Pramana,
Abhidharmakosha, do Tantra e outros métodos aos cientistas, para que eles os utilizem
como lhes parecer mais adequado. Sua Santidade o Dalai Lama está pedindo à geração
atual de Lamas que mostrem a qualidade da investigação budista ao mundo. Hoje em
dia, quase tudo já foi examinado e pesquisado. As únicas coisas interessantes que ainda
não foram pesquisadas por completo são as mensagens das antigas culturas de
sabedoria, como o budismo tibetano. Precisamos fazer uma ponte entre a maravilhosa
pesquisa dos cientistas modernos e a maravilhosa investigação dos lamas, yogues e
mahasiddhas. Eu gostaria de organizar uma série de conferências sobre isso e publicar
os resultados para poder apresentar com clareza as boas novas dos cientistas e yogues
ao mundo. Não é necessário que os cientistas entendam tudo sobre o budismo ou que
os budistas entendam tudo sobre a ciência. Precisamos apenas explorar conjuntamente
as áreas de interesse comum e fazer uma ponte, iniciar o diálogo e a comunicação. Essa
troca é muito importante pois, no próximo século, todos nós estaremos ligados à ciência
ou à tecnologia, mas ainda estaremos procurando respostas profundas para o “sentido
da vida e da realidade”. Se você está interessado em pesquisar o solo comum entre o
budismo e a ciência, por favor, considere as seguintes citações de uma seleção dos mais
influentes cientistas do mundo interno e externo dos últimos dois mil e quinhentos anos
como ponto de partida para sua reflexão. Por favor, não se sinta desencorajado ou
impaciente ao ler suas palavras. É natural que os cientistas, em seu trabalho de
investigação da realidade, usem seus termos científicos próprios para explicar suas
descobertas. Mesmo não conhecendo o significado de algumas destas palavras, é
possível ter algum sentimento sobre as verdades que eles estão tentando revelar.
Precisamos sentir e entender que essas duas correntes de visão e resultados
experimentais possuem ambas a capacidade de desvelar algo da natureza fundamental
do universo. Embora os cientistas do mundo interno e externo se expressem de formas
diferentes, sinto que existe certamente uma relação entre suas visões de mundo e, se
fosse possível sintetizá-las, isso seria de grande benefício para a sociedade, tanto em
termos do desenvolvimento da ciência e da tecnologia, quanto para o desenvolvimento
da paz interior e da paz no mundo.
A VACUIDADE
“Forma é Vacuidade, Vacuidade é Forma Vacuidade não é outra coisa que forma. Forma
também não é outra coisa que vacuidade”. “Assim, os sentimentos, a discriminação e
os fatores composicionais são vazios. Portanto… na vacuidade não há corpo existente
por si mesmo, sentimento existente por si mesmo, consciência existente por si mesma.
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Não há forma existente por si mesma, som existente por si mesmo, cheiro existente
por si mesmo, gosto existente por si mesmo, objetos táteis existentes por si mesmos,
fenômenos mentais existentes por si mesmos”.
A INTERDEPENDÊNCIA
Na ciência interna budista, temos a imagem de uma rede feita de jóias cobrindo o
telhado do palácio de Indra, na qual cada jóia reflete a rede e o palácio inteiros. Lama
Tsong Khapa, um famoso budista tibetano, cientista interno e filósofo do século XIV,
fundador da escola Guelupa, afirmou: “A Rainha das Razões, a Interdependência dos
Fenômenos, mostra que “todas as coisas carecem de existência por si mesmas, pois
sãofenômenos dependentemente relacionados”. E em seu texto Os Três Principais Aspectos
do Caminho, ele diz: “Quem enxergar a relação causa-efeito completamente não ilusória de
todos os fenômenos do samsara e do Nirvana e destruir todas as percepções dualistas
enganosas entrará no caminho que satisfaz os conquistadores”. Pantchen Tchoekyi
Gyaltsen, um famoso budista tibetano do século XVI, cientista interno e detentor da
linhagem de Lama Tsong Khapa, afirmou em seu texto Lama Tchoepa: “Não há
contradição, mas sim harmonia, entre a ausência de um único átomo existente por si mesmo
no samsara e no Nirvana e a relação dependente não ilusória entre causa e efeito.” Niels
Bohr, o físico dinamarquês do século XIX ganhador do Prêmio Nobel, afirmou: “As
partículas materiais isoladas são abstrações, sendo suas propriedades definíveis e
observáveis apenas por meio da interação com outros sistemas”. Thomas Stapp, um famoso
físico americano do século XX, afirmou em um relatório patrocinado pela Comissão
Norte-Americana de Energia Atômica: “O mundo físico não é uma estrutura construída a
partir de entidades não analisáveis existentes independentes umas das outras, mas sim uma
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rede ele relações entre elementos cujos significados surgem totalmente a partir de suas
relações com o todo”. e “Uma partícula elementar não é uma entidade não-analisável que
existe independente de outras, mas sim um conjunto de relações que se estendem a outras
coisas”.
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consciência espiritual estão em relação íntima com o processo de criação constante que
se persegue nas profundezas do mundo atômico. Assim se exprime P. Jordan: “A cada
instante, há qualquer coisa de totalmente nova no interior de cada átomo”.
“Le Zen” – de Robert Linssen – Ed. Marabout Université
Matthieu Ricard: – Quando fala da ‘vacuidade’ dos fenômenos, o budismo diz que estes
‘aparecem’, mas não refletem absolutamente a existência de entidades fixas. A física
moderna nos diz que um elétron, por exemplo, pode ser considerado uma partícula ou
uma onda, duas noções completamente incompatíveis, segundo o senso comum. Certos
fenômenos de interferência causados por elétrons só podem ser explicados supondo-se
que um elétron passe no mesmo instante por dois buracos diferentes. Segundo o
budismo, os átomos não podem ser considerados como entidades fixas, existentes sob
um modo único e determinado; por conseguinte, como o mundo da manifestação
grosseira, que supostamente é composto dessas partículas, teria uma realidade fixa?
Tudo isso contribui para destruir nossa noção de solidez das aparências. É nesse sentido
que o budismo afirma que a natureza última dos fenômenos é vacuidade, e que essa
vacuidade traz em si um potencial infinito de manifestações. […]. Fala-se de partículas
que ‘não tem partes’, que não podem ser subdivididas. Ou seja, o componente último da
matéria. Consideremos agora uma dessas partículas indivisíveis, concebida como uma
entidade autônoma. Como poderia ela se associar com outras partículas para constituir
a matéria? Se essas partículas se tocarem, o oeste de uma partícula, por exemplo, tocará
o leste da outra. Mas se têm direções, elas podem ser novamente divididas e então
perdem seu caráter ‘indivisível’. Se não tem nem lados nem direções, então se
assemelham a um ponto matemático – sem dimensão, espessura ou substância. Se
tentarmos juntar duas partículas sem dimensão, ou elas não se tocam e não podem se
juntar, ou entram em contato e, ao fazerem isso, se confundem. Assim, uma montanha
de partículas indivisíveis poderia se fundir em uma só dessas partículas! A conclusão,
portanto, é que não podem existir partículas indivisíveis, descontínuas, dotadas de uma
existência intrínseca, que seriam os constituintes da matéria. Além disso, se um átomo
possui uma massa, uma dimensão, uma carga etc., será ele idêntico ao conjunto de seus
atributos? Existe fora de seus atributos? O átomo não é idêntico a sua massa nem a sua
dimensão. Tampouco é outra coisa além de sua massa e de sua dimensão. O átomo,
portanto, tem um conjunto de características, mas ”não é” nenhuma delas. O átomo,
portanto, não passa de um conceito, uma etiqueta que não abarca uma entidade
existente de modo independente e absoluto. Tem uma existência apenas convencional,
relativa. […] Ao demonstrar que não podem existir partículas indivisíveis, o budismo não
pretende dar conta de fenômenos físicos, no sentido no qual a ciência os entende hoje:
ele procura quebrar o conceito intelectual da solidez do mundo fenomenal. Pois é esse
conceito que faz apegar-nos ao ‘eu’ e aos fenômenos; portanto, é esse conceito a causa
da dualidade entre o eu e o outro, existência e não-existência, apego e repulsa etc., é a
causa de todos os nossos tormentos. De qualquer modo, nesse particular o budismo vai
ao encontro, intelectualmente falando, de certas visões da física contemporânea e sua
contribuição deveria ser incluída na história das idéias. Eu gostaria de citar, por exemplo,
um dos grandes físicos de nossa época, Henri Margenau, professor da Universidade de
Yale, que escreve: “No fim do século XIX, sustentava-se que todas as interações
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implicavam objetos materiais. Hoje em dia, em geral já não se considera isso uma
verdade. Prefere-se pensar que se trata da interação de campos de energia ou de outras
forças que são, basicamente, não-materiais”. E Heisenberg dizia: “Os átomos não são
coisas”. Para Bertrand Russel: “A idéia de que existe ali uma bolinha, uma massinha
sólida que seria o elétron, é uma intrusão ilegítima do senso comum, derivada da noção
do tato”, e ele acrescenta: “A matéria é uma fórmula cômoda para descrever o que
sobrevêm no lugar onde, na verdade, a matéria não está, portanto, no lugar onde não há
nada”. Por outro lado, Sir James Jeans, em suas Rede’s lectures (Conferencias de rede)
chegava a dizer que “O universo começa a parecer mais um grande pensamento do que
uma grande máquina”. […] “O Monge e o Filósofo” – Jean-François Revel (Filósofo) e
Matthieu Ricard (Monge)
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O ponto de partida da revolução espiritual encontra-se nas revelações recentes sobre a
natureza estranha do infinitamente pequeno. As descobertas relativas aos constituintes
últimos da matéria são cada dia mais fascinantes. A importância do papel do
infinitamente pequeno em todos os fenômenos não somente físicos mais igualmente
bioquímicos, biológicos, neurofisiológicos, e psicológicos se revela cada dia mais
importante. Cada vez mais, a natureza energética, não causal, atemporal e talvez não-
condicionada do infinitamente pequeno nos conduz ao limiar de mundos físicos e
espirituais. Além da antiga mecânica quântica, os sábios, como Robert Tournaire,
elaboraram uma mecânica sub-quântica. Nessa reside igualmente uma das revoluções
metafísicas e espirituais mais fundamentais dos tempos modernos. Esta posição de
equilíbrio e síntese entre o materialismo ultrapassado e o espiritualismo se encontra,
nos parece, definida nas tendências modernas do Zen. Os progressos da biologia e da
neurofisiologia psicológica são efeitos de descobertas do infinitamente pequeno. A
evolução das espécies, as mutações, correspondem a mudanças de ordem molecular
nos genes. O gene é uma molécula complexa de ácido desoxiribonucleico [DNA] que
transmite a hereditariedade desde a concepção. Os genes são reunidos em
cromossomos. Cada célula humana contém 48 cromossomos ou 24 pares. E.
Schrödinger escreveu: “Grupamentos incrivelmente pequenos de átomos, pequenos demais
para se conformarem às leis estatísticas exatas, jogam uma regra dominante nos eventos
muito bem ordenados que se produzem no interior de um organismo vivo”. Na obra “A Física
e o segredo da vida orgânica” o físico alemão P. Jordan nos mostra como alguns fótons
de luz projetados sobre a retina de um olho habituado a escuridão são suficientes para
criar uma sensação luminosa, portanto “um processo de consciência no interior do cérebro
humano”. Jordan acrescenta que “os fenômenos de ordem de grandeza atômica
correspondem, do ponto de vista físico, ao movimento tão fino e tão tênue dos pensamentos e
das sensações”. Os trabalhos do Dr. Roger Godel “A experiência liberadora, Vida e
Renovação” e os do Prof. Pierre Rylant, da Universidade de Bruxelas, colocaram em
evidência a importância dos fenômenos eletrônicos e elétricos em todas as
manifestações da consciência. “Toda a neurofisiologia, escreveu o Prof. P. Chauchard,
repousa sobre a atividade psico-química do sistema nervoso. A atividade nervosa é
uma verdadeira sociologia neurônica de onde emerge o indivíduo superior”. Os
fenômenos da consciência são não somente ligados a transformações eletrônicas, e não
se limitam somente à intervenção de neurônios específicos.
Assim escreve o Prof. Pierre Rylant: “Não é possível, como mostrou claramente
Sherrington, limitar a consciência a intervenção de neurônios específicos”. Uma certa
forma de consciência se acha intimamente ligada a energia formando a essência de toda
materialidade. É de se supor que os caracteres de surgimento e de renovação onde se
encontram marcados os mais altos estados de consciência espiritual estão em relação
íntima com o processo de criação constante que se busca nas profundezas do mundo
atômico.
Vamos examinar um fato bem mais significativo ainda. “Não existe no universo nenhum
ser, nenhum objeto, alguma coisa, algum átomo independente”. Assim se exprime T.
Chardin: “Quanto mais, pelos meios de um poder sempre aumentado, penetramos
profundamente na matéria, mais as interligações de suas partes nos confundem. Cada
elemento do cosmos esta positivamente tecido de todos os outros, mais acima dele
mesmo, pelo misterioso fenômeno da composição que o faz subsistente, num conjunto
organizado, e mais abaixo, pela influência sofrida das unidades de ordem superior que
o englobam e o dominam para sua própria finalidade. Impossível cortar-se essa rede,
isolar uma peça, sem que essa não se desfie e se desmanche por todos os lados. A
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perder de vista, a nossa volta, o universo se mantém por seu conjunto… e não há
senão uma maneira realmente possível de o considerar, é tomando-o como um bloco
inteiro”.
A física moderna nos ensina, com efeito, que independentemente do seu aspecto
corpuscular claramente definido e localizado, cada corpúsculo atômico comporta um
aspecto oposto complementar: o aspecto ondulatório. A ação de um elétron, por seu
aspecto ondulatório, se estende ao universo inteiro. Existe uma presença potencial do
aspecto ondulatório de cada corpúsculo atômico que nos constituem, que se estende
até os últimos confins do universo [em expansão ou não]. E reciprocamente, cada átomo
das nebulosas situadas nos abismos insondáveis de milhares de anos luz, está presente
em cada um de nós, em cada objeto, em cada grão de areia de nosso planeta. Lá se
encontra trabalhando a constante, mas invisível interpenetração mútua de todos os
constituintes do universo. Tudo se comporta como se o cosmos inteiro não fosse mais
que um bloco imenso perfeitamente homogêneo. Tudo está em tudo, verdadeiramente,
com uma intensidade, uma continuidade, uma profundidade tais que a imaginação é
impotente para conceber a mais fraca parte desta interfusão universal. Repetindo – não
diremos nunca suficientemente – afim de que cada um se impregne profundamente:
Tudo está em tudo; o universo inteiro está em nós e reciprocamente. Parece a primeira
vista uma linguagem muito paradoxal vinda de um visionário ou poeta. Nada é,
entretanto mais conforme à verdade ao mesmo tempo física e metafísica.
Assim escreveu T. Chardin: “O raio de ação próprio a cada elemento cósmico deve ser
prolongado por direito até os limites últimos do mundo. Pois que o átomo é
naturalmente co-extensivo a todo espaço no qual ele se situa, e já que este espaço
universal é o único que conhecemos, somos forçados a admitir que é esta imensidão
que representa o domínio de ação comum a todos os átomos. Cada um deles tem por
volume, o volume do universo inteiro. O átomo não é mais o mundo microscópico e
fechado que imaginávamos… Ele é o centro infinitesimal do mundo”.
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cultura, quando de uma primeira aproximação. Mas para a aproximação última, dizem
paradoxalmente os mestres Zen e do Ch’an, tudo isso deve ser ultrapassado e esquecido.
No seu discurso a seu discípulo Thot, Hermmes Trimegisto disse que “o infinito se move
em sua estabilidade”. Este enunciado paradoxal parece ser bastante verídico. O homem é
uma imagem estampada desse processo universal de interfusão, de interações no
âmago de uma estabilidade aparente tanto quanto provisória. Qual significado teriam
um fígado, ou um rim sem o conjunto do organismo para o equilíbrio do qual eles
contribuem? Somente a interligação, a interação e a organização do conjunto dão, tanto
ao indivíduo global como aos órgãos particulares, sua plena significação. Do mesmo
modo que uma pedra é exteriormente estável, tomada em bloco e de maneira
superficial, malgrado sua estabilidade exterior, tudo se movimenta intensamente em
profundidade, do mesmo modo a totalidade universal se move intensamente ao longo
de sua aparente estabilidade exterior. Do mesmo modo que o homem parece à primeira
vista uma individualidade imutável cuja aparente continuidade, e a vida mesma, são
baseadas na interfusão rápida e complexa da circulação sangüínea, alimentando os
órgãos separados, mas interdependentes. Igualmente a totalidade universal vive ao
ritmo de uma interfusão prodigiosa entre os elementos aparentemente separados que a
constituem. Segundo uma antiga imagem indiana, a interfusão infinitamente complexa e
sutil é o “respirar” da realidade universal. O ritmo de renovação do campo unificado da
criação será a fonte de vida subjacente a esse “respirar” fundamental. Tudo que foi dito
se aplica ao universo “exterior” ou mundo manifestado, de modo que nosso pensamento
pode concebê-lo e compreende-lo nos limites do tempo e do espaço. Os mestres do
Ch’an e do Zen vão muito mais em profundidade, em direção ao que alguns filósofos
chamam de “noumeno” ou mundo não manifestado. A exposição que acabamos de fazer
serve de aproximação intermediária entre essas duas faces opostas e complementares
do Real.
OS KOANS E O “MONDO”
A primeira vista, esses enunciados parecem uma mistificação. Na verdade eles estão
cheios de ensinamentos. A interpretação correta desse texto permite dar uma visão
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panorâmica das etapas que conduzem ao satori segundo o Ch’an e o Zen. Ao longo da
fase anterior a qualquer procura não colocamos nada em dúvida, não refletimos sobre
os grandes problemas da existência. Deixamos os outros pensarem por nós. Quando
vemos, dizemos muito simplesmente: “Essas montanhas são montanhas”. Os contornos
exteriores representam aos nossos olhos a única realidade. Os rochedos não são mais
que rochedos, a terra é a terra. Quando começamos a despertar para a busca interior,
descobrimos que as imagens que nos dão nossos sentidos ao contato com o mundo
exterior não correspondem à realidade. Vemos que nada é imóvel. Tudo se move, tudo
se transforma. Em lugar dos rochedos, da terra e das montanhas, descobrimos a ação
duma energia prodigiosamente ativa animando partículas estranhas que se movem com
a velocidade da luz. Conhecemos, seja por intuição, seja por pesquisa científica, a vida
secreta e a natureza profunda de toda matéria. Os aspectos superficiais e sua
multiplicidade de nuanças são secundários diante de uma essência comum de natureza
energética formando sua realidade profunda. Quando olhamos as montanhas, ao longo
dessa fase, elas não são mais, para nós, as mesmas montanhas de antes. Elas parecem
miragens desprovidas de qualquer consistência real. No início de nossas buscas, temos
tendência a nos orientar para uma atitude de oposição extrema à nossa primeira
atitude. Sofremos a tal ponto a magia encantadora da realidade profunda das coisas,
que esta luz interior mascara aos nossos olhos sua aparência de superfície. A matéria se
tornou para nós o véu, a ilusão [maya] e dizemos: “as montanhas não são mais as
montanhas”. Chegaremos a discernir um dia que não existe nenhuma cisão entre o
mundo material tal como o vemos superficialmente e a pura essência da Mente Cósmica
em profundidade. Essas distinções resultam de uma falta de penetração e da faculdade
de síntese de nossa mente. Tudo é a Mente Cósmica. Nem um grão de areia esta fora
desta Totalidade Una. Deste instante em diante, quando nosso olhar pousa de novo
sobre as montanhas, dizemos como no início: “as montanhas são as montanhas”. Mas
situamos sua aparência material no lugar justo que elas ocupam em um conjunto
infinitamente mais vasto e profundo. As montanhas não são mais absolutamente uma
ilusão. A noção de ilusão ou de maya provém de um vício de funcionamento em nossa
mente. É essa última que nos dá, dos seres, das coisas e de nós mesmos noções
ilusórias. Quando o Desperto diz: “as montanhas são as montanhas” essas palavras
exprimem um estado de visão panorâmica englobando as aparências de superfície e a
realidade profunda. Seus olhos lhes dão uma imagem do mundo exterior condicionada
por sua escala de observação física enquanto que, simultaneamente, a Mente Cósmica
se revela como sendo a única realidade das montanhas ao nível das profundidades
últimas. Quando de nosso contato com o Prof. D. T. Suzuki, o eminente especialista do
Zen nos apresentou o seguinte koan: “Quando eu entendo, eu vejo; e quando eu vejo,
entendo”, o que parece menos paradoxal. Por isso, devemos compreender que na
experiência do satori nossa percepção das coisas não é distinta, mas global, mas isso não
diminui nada a capacidade que temos de perceber claramente a singularidade das
coisas em um certo nível. Quando capto o som de um sino longínquo, duas
possibilidades se apresentam na minha maneira de reagir. Ou bem estou distraído, sem
nenhuma profundeza de percepção e a experiência é banal. Ela se limita a simples
audição de um som que não tem nenhum dom de me emocionar ou de me revelar o que
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quer que seja. Fico fechado em mim mesmo. O sino e o som são fenômenos
completamente estranhos que não me interessam. Ou bem eu estou “desperto”, nesse
caso, todas as provocações do meio, quer sejam visuais, auditivas, olfativas, táteis, me
revelam a unidade e a interdependência dos seres e das coisas. Quando entendo o som
de um sino longínquo, sou eu em certo sentido – pela Mente Cósmica – a essência
energética desse sino. Sou as moléculas do ar que ele faz vibrar, sou a onda sonora que
se propaga no espaço. Sou a essência mesma do espaço. Estando atento à natureza
profunda de todas as coisas, todo evento exterior, todo movimento me permite vibrar
em perfeita identidade de essência comum por uma ressonância secreta renovando-se
de instante em instante. Num certo sentido tudo que vejo, eu percebo através desta
realidade mais profunda. Não se trata de uma auto-sugestão, nem duma criação mental
qualquer. Ao contrário. Tudo que escuto, compreendo através desta identidade
insondável. Ela acaba por ocupar a meu ver um lugar de tal modo preponderante que é
ela que forma a nota dominante de todas as percepções distintas. Ao final desse
processo eu posso dizer efetivamente: “Quando entendo, eu vejo; quando eu vejo,
entendo”.
Extratos do livro de Robert Linssen – “LE ZEN” – Ed . marabout université Tradução: Flávio Capllonch Cardoso
A visão da matéria que emerge do estudo dos átomos e dos núcleos mostra-nos que
essa matéria, em sua maior parte, acha-se concentrada em minúsculas gotas separadas
por distâncias consideráveis. No vasto espaço existente entre as gotas nucleares
compactas e intensamente ferventes movem-se os elétrons. Estes constituem apenas
uma reduzidíssima fração da massa total, embora confiram a matéria seu aspecto sólido
e forneçam os vínculos necessários a construção das estruturas moleculares. Eles se
acham ainda envolvidos nas reações químicas, sendo também responsáveis pelas
propriedades químicas da matéria. As reações nucleares, por outro lado, geralmente não
se verificam de modo natural nessa forma de matéria, em virtude do fato de que as
energias disponíveis não são suficientemente elevadas para perturbar o equilíbrio
nuclear. Essa forma de matéria, entretanto, com sua grande variedade de formas e
texturas e sua complexa arquitetura molecular, só consegue existir sob condições muito
especiais, quando a temperatura não é muito elevada, de modo que as partículas não se
agitem em demasia. Quando a energia térmica aumenta cerca de cem vezes mais, como
sucede na maioria das estrelas, todas as
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