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SEUS DEMÔNIOS
A conspiração era dele, o golpe foi dele, sem ele tudo estaria perdido ─ a democracia, os
generais “que fazem crochet”, a massa ignara, o Brasil. O general Olympio Mourão Filho,
comandante da 4ª Região Militar, em Minas Gerais, achava que tinha arriscado tudo para fazer a
revolução. Acabou ficando sem nada, exceto o elevado conceito que fazia de si mesmo e o
desprezo ferino por praticamente todos os demais, inclusive companheiros de farda.
Anotou em seu diário no dia 31 de março, terça-feira, às 3h15 da manhã: “Vou partir agora para
a luta às cinco horas da manhã, dentro de uma hora e cinquenta minutos, em más condições,
portanto, porque serei obrigado a parar no meio do caminho e o Exército inteiro vem contra
mim, como aconteceu em São Paulo em 1932. Ninguém me prenderá. Morrerei lutando”. Não
morreu e, a rigor, não lutou, mas foi indubitavelmente o pioneiro da rebelião militar lançada de
Minas Gerais que, desfechada em atmosfera duvidosa, chegou ao Rio de Janeiro quando a
vitória já estava decidida.
No caminho, um telefonema havia mudado tudo. O inimigo que Mourão esperava encontrar era
o destacamento avançado do conhecido Regimento Sampaio, sob o comando do coronel
Raimundo Ferreira de Souza. Como uma espécie de conspirador sênior (e controlador do
espeloteado comandante), o venerando marechal Odílio Denys acompanhava a movimentação
de Mourão e foi ele o indicado a falar como o chefe das forças teoricamente adversárias pelo
telefone de uma oficina mecânica: conhecia o coronel, que havia sido seu subordinado. “Estou
com a tropa e com mineiros para depor o governo e acabar com a ameaça do comunismo”,
informou. No fim da conversa, o coronel Ferreira de Souza já tinha mudado de lado: “Eu e toda
a minha tropa nos solidarizamos com o movimento revolucionário”.
Mourão não fez outra coisa, cultivando a reputação de lobo solitário ─ alguns achavam que um
bobo solitário, que falava demais, agia com impulsividade e cultivava o próprio ego a ponto de
denominar de Operação Popeye os planos para sair de Juiz de Fora e, em marcha forçada,
chegar ao Rio a tempo de “prender no Palácio Laranjeiras o presidente, o comandante do I
Exército e quantas autoridades mais fosse possível”. Por que Popeye? Porque ele fumava
cachimbo. “Manobra de louco? Não importa. Era minha manobra”, disse sobre a operação que
nunca executou. Em sua própria e famosa definição, “em matéria de política eu sou uma vaca
fardada. Se de acordo com minha consciência estou certo, os outros que me sigam”. Tantos o
seguiram. Depois, muitos o abandonaram.
04 de abril de 2014
Especial VEJA
Colaboradores: André Petry, Augusto Nunes, Carlos Graieb, Diogo Schelp, Duda Teixeira,
Eurípedes Alcântara, Fábio Altman, Giuliano Guandalini, Jerônimo Teixeira, Juliana Linhares,
Leslie Lestão, Otávio Cabral, Pedro Dias, Rinaldo Gama, Thaís Oyama e Vilma Gryzinski.
Fonte: http://lorotaspoliticaseverdades.blogspot.com/2014_04_04_archive.html