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A Força do Rapé

Maria Rappé
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[ ÍNDICE ]

Prefácio……………………………………………………………………….………… 3
Apresentação………………………………………………………… …………………4
Responsabilidade………………………………………………………...……...……...7
A Morte do Ego………………………………………………………… ……...……….8
Efeitos do Rapé: Benefícios e Limpezas…………………………………………..... 10
Rapé e Ayurveda………………………………………………………………...……. 14
Feitio………………………………………………………………...……...……...……. 15
Instrumentos de Sopro: kuripe e tepi/tipi……………………………………...…… 17
Dieta e Alimentação……………………………………………………… ……...……..19
O Sopro………………………………………………………… ……...……...…………..22
Os tipos de rapé: cinzas……………………………………………………...……...….. 24
Nissum do Rapé……………………………………………………… ... ………...…….. 27
A Floresta e a Cidade……………………………………………………………………. 29
O Rapé e a Cidade - matrix artificial…………………………. ……...……...……...…..31
Solução Natural: Cultura Artesanal………………………………………………….… 36
O Rapé e a Mediunidade………………………………………………………………... 38
O Canto………………………………………………………………………….……...… 40
Anexo 1: Tabaco e a importância de não tragá-lo…………………………………… 41
Anexo 2: Estudos dos tipos de rapé utilizados pelo povo Nuke Kuin………...…… 44
Anexo 3: Cantos do rapé………………………………………………………………... 47
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Prefácio

Essa obra é uma canalização e cocriação. Ela não tem validade bio-médica e não
deve servir para substituir ou suspender qualquer tratamento alopático da medicina
científica. Trata-se de um estudo sobre a espiritualidade, mediunidade e plantas de
poder, um estudo de xamanismo e investigação interior. É uma obra que não se finaliza
em si. Sua natureza, como a própria Natureza, está em eterna transformação e
aperfeiçoamento, portanto nenhuma palavra aqui é final. Seu propósito é ser uma porta
de iniciação que lança o estudante a uma profunda jornada de autoconhecimento e
conhecimento sobre Gaia, nossa Mãe Terra, nesses tempos de recordação ancestral e
transição a uma Nova Era.

Pedimos, de coração, que todos os preconceitos e tabus sobre os temas aqui


tratados, bem como das palavras utilizadas, sejam deixados de lado. Pratiquem o próprio
discernimento e adaptações a sua realidade pessoal e não tenham medo de entrar em
contato com pajés, txais, irmãs e irmãos mais experientes no caminho para pedir
esclarecimentos. Ninguém envolvido nessa obra tem a intenção de ser autoridade
máxima no estudo do Rapé Sagrado, ou enriquecer gananciosamente com sua
publicação. A intenção verdadeira e justa é de valorizar todas as culturas e virtudes aqui
mencionadas.

Maria Rappé é a mentora espiritual que conduziu esse estudo. Ela é uma Mestra
Ascencionada entre as caboclas e caboclos e, ao mesmo tempo, representa o coletivo
dos povos das matas nos reinos espirituais. Junto a ela, muitos outros parentes se
fizeram presentes: Pena Branca, Guaraci, Jurema, Jussara, Jupira... Okê caboclo!

Por fim, todo canal humano de informação tem o viés da própria experiência
pessoal e é natural que confusões de ideias possam se manifestar durante o processo.
Que o fluxo do Amor e da Verdade seja nosso propósito comum! Assim é.

Boa leitura a todxs.


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Apresentação

O rapé é uma medicina sagrada concebida pelos ancestrais dos povos indígenas
da Floresta Amazônica. Seu uso medicinal e 'recreativo' espalhou-se entre outras
culturas, o que não impediu que os txais mantivessem forte o estudo tradicional do rapé.

Diferentemente do rapé “comum” - aquele que é vendido nas tabacarias


comerciais em potes metálicos – o rapé indígena é artesanal e deve sempre ser soprado,
não cheirado ou aspirado. É a intensidade do sopro que ativa a intenção e trabalho de
cura do rapé. O sopro é tão sagrado quanto o próprio rapé em si.

Quem sente o chamado para estudar o rapé indígena sente, no fundo, um


chamado para estudar a própria mediunidade. As medicinas sagradas, de forma geral,
ajudam na comunicação e percepção dos planos sutis que nos cercam.

Essa medicina da floresta é composta por folhas de tabaco, secas e moídas, e


cinzas de árvores medicinais, que são peneiradas e misturadas. A proporção de ambos
varia muito entre as diferentes tradições e tipos de rapé, mas, em geral, concorda-se que
haja mais tabaco do que cinzas ou, pelo menos, proporções iguais (50% / 50%).
Falaremos mais acerca do tabaco e das cinzas ao longo do trabalho.

Os tipos de rapé também variam enormemente e costuma-se diferenciar cada


rapé de acordo com as cinzas da árvore que é usada. Rapé de Tsunu refere-se à mistura
de tabaco com cinzas de tsunu; rapé de mulateiro usa-se as cinzas de mulateiro etc.

Considerando-se os tempos atuais, é relevante notar que a tradição dessa


medicina da floresta não está somente nas mãos de nossos irmãos / irmãs indígenas e,
portanto, é possível encontrar uma infinidade de misturas, usando-se outras ervas
medicinais, outros tipos de tabaco etc. Consideremos essas variações, simplesmente,
como estudos: cada estudante está em seu próprio processo, fazendo suas próprias
descobertas acerca dos ensinamentos dos vegetais, assumindo seus próprios “riscos” ao
provar cada mistura.
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Existem plantas que não são próprias para serem absorvidas pelo nariz ou
mesmo oralmente, e saber suas propriedades é fundamental para evitar qualquer dano
ao estudante ou a qualquer outra pessoa que entre em contato com a medicina.

Os benefícios de cada rapé precisam ser seguros o suficientes para que


nenhum dano afete negativamente os outros. O rapé, assim como todas as
medicinas, requer enorme responsabilidade: jamais induza alguém a recebê-lo
contra a própria vontade. Faz parte da ética das medicinas da floresta trabalhar com
o consentimento – trataremos mais sobre isso adiante.

Medicinas Sagradas: intenção e harmonia espiritual

O rapé é uma medicina sagrada da tradição indígena, o que significa que seu uso
é fundamentalmente espiritual. Diferente de outros métodos medicinais – tal qual a
medicina científica ocidental – os curandeiros indígenas trabalham pela cura das causas
energéticas que originam qualquer doença ou mal acometido pelas pessoas. Portanto, o
rapé é um meio de cura holístico, isto é, trata os corpos físico, emocional e mental, em
alinhamento com o Espírito. O termo “corpo espiritual” se refere à manifestação do
alinhamento entre três primeiros corpos com a energia Cósmica que possibilita a Vida.

“Espírito”, também chamado de Grande Espírito, Nhamandu, Yuxibu,


Kukapinhutxari, Sol Central, Deus, Criador etc. é o que mantém a Unidade e coerência de
tudo o que existe. Povos nativos da América do Norte também falam do Grande Mistério,
que seria a Fonte Original da qual o Grande Espírito partiu. Espírito é a força criativa,
amorosa e inteligente que alimenta toda a vida, todo movimento, toda a Criação. No
plano terrestre, especialmente, é dado a todos os seres o livre-arbítrio, permitindo que
façamos escolhas que vão em direção a essa energia superior ou na direção oposta, com
todas as variações e sutilezas que implicam a vida na Terra.

É importante lembrar: tudo o que trabalha na direção do Espírito envolve


Inteligência e Amor em harmonia, de maneiras que a consciência Humana ainda não
consegue compreender plenamente.
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Considerando essa harmonia, quando trabalhamos com o rapé ou qualquer outra
ferramenta medicinal, é necessário firmar uma intenção (intento, propósito) que
coopere com a espiritualidade. Essa intenção não precisa se restringir à uma palavra ou a
uma única energia específica, e isso vai de acordo com quem está a trabalhá-la. Intenções
elevadas, tais como: firmar a cura, o amor, a compreensão, a limpeza de karmas ou
energias negativas, abrir caminhos, facilitar o recebimento de informações
espiritualmente elevadas etc. são exemplos de intenções complementares que
fortalecem o uso e o feitio das medicinas sagradas.

É cada vez mais comum realizar feitios com a energia de orixás e arcanjos, de
acordo com as energias que querem ser ancoradas.

O processo todo é regado e nutrido por esses tipos de intenções que protegem e
guiam os envolvidos. Desde quando as folhas de tabaco são abertas e colocadas ao Sol,
até o momento em que o pajé finalmente o sopra com seu tepi, existe uma intenção
coerente que fortalece o momento de cura.

De fato, a chave para alinhar a boa intenção à boa ação é a coerência.

Os guardiões ou elementais das plantas envolvidas – o tabaco e as árvores


medicinais – trabalham de maneira certeira se esse canal de intenção é respeitado. Os
elementais dos vegetais são dádivas do Criador à Terra, e dádivas da Terra a todos os
seres que sobre ela vivem.

Cada vegetal tem seu trabalho específico quando interage com outras formas de
vida. A ciência ocidental vislumbra um aspecto disso nas propriedades medicinais e
princípios ativos das plantas, estudando as características químicas presentes sob o
prisma da matéria; por outro lado, outras tradições medicinais ao redor do mundo
prestam atenção nas propriedades energéticas específicas de cada planta e elemento
envolvidos. Os txais referem-se a essas propriedades como forças e espíritos das
medicinas.

Entre muitas técnicas usadas na floresta para acessar e trazer essas forças, as
principais são os cantos e rezos sagrados – em algumas tradições, chamados de ícaros.
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São sons e palavras recebidos pelos pajés durante os efeitos de cada medicina, por meio
de dietas, jejuns e períodos de isolamento na mata. Através desses cantos é possível
intensificar e direcionar os efeitos de cada medicina da floresta, aliviando os pesos das
mazelas. São palavras de alegria, proteção e limpeza que acessam diferentes
sentimentos de quem os ouve e facilita o trabalho de cada elemental. Ao abrir-se sem
expectativas para a experiência, não é necessário conhecer o idioma cantado para sentir
seus efeitos positivos.

Essa abertura permite a consagração. Quando usamos medicinas da floresta


respeitando as tradições ancestrais que as acompanham, estamos invariavelmente
consagrando as medicinas.

Consagrar: “Um ato sagrado feito em coletividade, comunhão.”

Mesmo que a pessoa esteja se auto-aplicando, sozinha na dimensão material,


uma série de seres e energias estão acompanhando e trabalhando com esse indivíduo. A
solidão, de um ponto de vista espiritual, é uma ilusão. Por isso, ressaltamos a
importância da intenção e auto-observação do próprio estado emocional, pois isso
determinará quais tipos de energia estará atraindo para si. O rapé, como tudo em nossa
experiência terrestre, tem um polo positivo e um polo negativo (nissun, no idioma pano).
O uso inadequado dessa medicina pode, sim, atrair vícios e drenar as energia vitais.

Responsabilidade

A responsabilidade de trazer ou se entregar a essa Força não pode ser


subestimada. O livre-arbítrio de se usar, ou não, uma certa medicina precisa sempre estar
presente, bem como a consciência e a coragem de cada um quando finalmente são
consagradas.

Obrigar e coagir qualquer pessoa a receber um sopro de rapé, e mesmo soprar


ou receber essa medicina de maneira leviana, seja por Ego, orgulho, vaidade etc. tem
efeitos negativos imprevisíveis. Recomenda-se, acima de tudo, discernimento ao se
aplicar ou receber um sopro, buscando-se ter clareza sobre as próprias intenções e a
coerência da medicina com todo o processo pelo qual o indivíduo está passando.
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É primordial que a pessoa que irá receber uma medicina tenha consentimento da
aplicação, assim como é fundamental a presença plena de quem aplica, sem “má
vontade”.

Um conselho que é dado a todos os iniciados: não seduza ninguém a soprar rapé.
Apresente a medicina, diga o que sabe, o que sente e o que já estudou, sempre com
muito respeito, e coloque-se à disposição caso a pessoa queira um sopro; no entanto,
evite a todo custo dizer coisas como: “você precisa do rapé”, “essa medicina vai fazer
você sentir assim ou assado”. Um dos mistérios do rapé é a impossibildade de prever
qual será a reação de cada um, pois pode ser uma experiência tranquila ou intensa que
depende de muitos fatores, muitas energias que nós, humanos aprendizes, normalmente
não temos plena consciência.

A Morte do Ego

Esse conceito não é novo, nem é exclusivo do caminho xamânico. A morte do Ego
é uma passagem há muito tempo conhecida no caminho espiritual humano, em todas as
religiões, e é parte fundamental do processo de ascensão individual. Essa “morte” pode
ser experienciada de infinitas maneiras, diferentemente para cada indivíduo, podendo
ser dolorosa, rápida, vagarosa, surpreendente, libertadora... sempre a depender de qual
camada de Ego está sendo dissipada e em qual ciclo pessoal o indivíduo se encontra. Ela
também pode acontecer de maneira marcante muitas ou poucas vezes, a depender da
caminhada de cada um.

Quando nos deparamos com esse momento de morte, somos enfrentados pelos
nossos medos e traumas mais profundos. Esse encontro pode ser tão forte que a pessoa
só o suporta por um curto período de tempo antes do corpo emocional e físico reagir na
forma de limpeza.

Todas medicinas sagradas nos colocam de frente para esses medos. Sob seus
efeitos, é comum precisarmos passar por várias cerimônias enfrentando os mesmos
traumas, hábitos e padrões até começarmos a assimilar as informações, encontrando
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caminhos para trabalhar os aspectos de nós mesmos que foram revelados.

Os espíritos das medicinas não fazem isso para nos torturar, muito pelo
contrário: o objetivo é nos guiar, como tutores, pelo caminho de aprendizado do
guerreiro e da guerreira interior. Eles mostram nossos medos e nos estimulam a
encontrar soluções criativas para encará-los. Bioquimicamente, o efeito das medicinas
sagradas ajuda a reajustar nossas sinapses e a formar novos caminhos mais saudáveis de
pensamento e sentimento, não apenas no cérebro, mas em todo o corpo.

Pensemos assim: se a maioria dos medicamentos alopáticos querem “esconder”


nossas doenças, tratando apenas os sintomas, as medicinas da floresta querem nos
mostrar abertamente o que nos faz mal. Elas querem que percebamos e mudemos
nossos padrões negativos que enraizam os males. É muito fácil tomar várias pílulas
farmacêuticas e esquecê-las depois de um tempo, ocultar sintomas que voltam
ciclicamente... Por outro lado, é impossível soprar rapé ou engolir ayahuasca e não se
lembrar.

Cada medicina nos guiará por esse processo de morte a sua maneira. A
ayahuasca nos permite visitar planos mentais e etéreos com muita facilidade, num mar
de cores e mirações, com referências inacreditáveis.

O rapé também caminha ao nosso lado nesses momentos de morte, mas sua
presença é como uma voz interna. Ele é capaz de silenciar nosso diálogo interno - a
“mente automática” que julga, categoriza etc. - e facilita o acesso ao Eu Observador.

Primariamente, sentimos seu gosto e seu cheiro por todo o corpo, muitas vezes
como se fosse algo muito antigo ali dentro, uma memória ancestral. O rapé pode, sim,
levar a estados de miração, mas o seu trabalho principal é alinhar o pensamento e os
sentimentos(1): ele ajuda a enfrentarmos nossos medos, angústias e, ao mesmo tempo,
nos protegermos da raiva e julgamentos obsessivos. Quanto mais inquieta é a mente da

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- Sentimentos são considerados, nessa obra, como a união da razão (mente) e o emocional. O sentimento não é
puramente um pensamento frio e calculista, nem uma emoção reativa e incontrolada. Geralmente, um sentimento é
associado a uma memória e ou experiência que desencadeiam processos de aprendizado interno fundamentais de
auto-conhecimento. Por exemplo, um sentimento de nostalgia que remete à infância, ou algum sentimento de ansiedade
relacionado a bloqueios, situações traumatizantes etc.
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pessoa, quanto mais ansiedade ela cultiva em sua própria realidade, mais difícil será para
ela lidar com o rapé sem sentir os efeitos negativos já presentes no corpo. Ele trará tudo
para o físico, para não escondermos de nós mesmos o que nos afeta. O rapé trabalha,
literal e essencialmente, a antiga ideia “Corpo é Mente, Mente é Corpo”.

Eventualmente, através da prática, caminhar na própria escuridão se torna


possível, com ou sem rapé, e a pessoa adquire a compreensão do papel da medicina para
ela até aquele momento de morte do ego. Trabalhando com respeito e paciência, isso
inevitavelmente acontece, de maneira única para cada um.
Esses momentos de pura clareza e compreensão – renascimentos, clarões,
insights - são presentes do Eu Superior para nossa percepção humana, e felizmente são
vivenciados por todos em algum momento. Basta trabalharmos com intenção nesse
sentido, se comprometendo no respeito à Terra e toda vida... Morrer e renascer se torna
cada vez mais fácil, cada vez menos doloroso, como é na própria natureza. Essa clareza
sem esforço, no caminho de ascensão espiritual, gradualmente se torna nosso modo
natural de ver o mundo.

Efeitos do Rapé: Benefícios e Limpezas

Quem está acostumado com o rapé sabe o quão desafiador é prever os efeitos
específicos de cada aplicação e quanto tempo durará. Cada pessoa tem diferentes graus
de facilidade ou dificuldade em aceitar as medicina da floresta, realizar sua limpeza e
meditar em sua força.

Comecemos pelos efeitos mais amplos: o rapé realiza primeiramente o


alinhamento energético dos corpos físico, mental e emocional em conjunção com as
energias espirituais que os envolvem. Esse alinhamento acontece a partir de pontos
energéticos do corpo humano, principalmente o coração, o estômago e os chakras
inferiores mais conectados à energia material. A medida que esses canais são alinhados,
outras camadas e pontos energéticos mais sutis podem ser acessados por meio da
medicina e da meditação.

Antes de prosseguirmos, uma observação: o tabaco, seu principal veículo, é


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reconhecidamente uma medicina que conecta o plano material com o espiritual; é uma
panacéia que pode tratar qualquer doença se trabalhado com sabedoria. Vale a pena,
em momento oportuno, falarmos do tabaco em um trecho especial do livro, visto seu uso
contraditório na atual sociedade industrial. Da mesma forma, um glossário sobre os
chakras irá facilitar a localização do leitor na discussão.

Para o alinhamento mencionado acontecer, diversos aspectos desses pontos


enérgeticos que precisam ser desbloqueados e limpos. Isso pode acontecer com mais
força no corpo físico, emocional ou mental – em ordem, do mais denso ao mais sutil –
recebendo os direcionamentos do campo espiritual que é ativado pela intenção do
sopro, e sempre acontecerá em todas essas dimensões com mais ou menos força de
acordo com a necessidade do indivíduo.

O rapé traz o aumento de sensibilidade da pessoa com o próprio corpo e com as


energias ao seu redor. Em um ambiente harmonioso, ela terá a facilidade de sentir a si
mesma integralmente e perceber a conexão entre seus processos físicos, emocionais e
mentais despertados pelo rapé. Uma vez alinhada, torna-se fácil perceber as pessoas e
energias ao seu redor e contemplá-las, interagir e, eventualmente, cocriar em canções e
agradecimentos.

Os efeitos do que chamamos de limpeza podem variar dentro das amplas


possibilidades. A mais comum, primeiramente, a limpeza do muco das cavidades nasais
(sinus). O rapé ajuda expelir as impurezas que causam essas obstruções e a limpeza se
manifesta na forma de catarro, cuspe, espirros. lágrimas e tosses. Recomenda-se que a
pessoa não engula esses líquidos, cuspindo-os na terra ou em recipientes adequados que
preservem a higiene do ambiente. Fazer a limpeza na terra é uma forma de devolver
aquilo que Gaia nos emprestou, temporariamente, para nos curar. O elemento “terra”
que aqui nos referimos é mesmo que encontramos sob a gramas, em canteiros ou em
vasos de plantas. É importante que estejam em locais apropriados para tal limpeza, com
plantas resilientes para a transmutação de energias, tais como suculentas ou árvores
robustas.

Sabemos que é impossível não engolir mesmo que um pouco da medicina ao


longo do processo, mas a experiência geral confirma que isso não representa nenhum
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risco sério à saúde. Pode haver alguma irritação do estômago que esteja carregado de
alimentos, causando enjôos, mas isso também, não se observa em todos os casos.

O importante é estar atento à própria limpeza física para preservar a harmonia


consigo mesmo, os outros e o ambiente. À Terra o que é da Terra: ela cuidará
tranquilamente de nossos fluidos expelidos, assim como cuidará de nossos corpos
quando não precisarmos mais deles nessa experiência humana.

Como mencionado, é muito comum saírem lágrimas de nossos olhos ao receber


um sopro. Isso é causado, em parte, pelo acúmulo de toxinas nos canais lacrimais e pelo
excesso de energia no terceiro olho (o sétimo chakra), responsável pela clarividência e
mediunidade dos planos sutis. Quando não deixamos muitas emoções fluírem através
das expressões do rosto, acontece esse bloqueio. Isso pode ser observado quando existe
a fixação em uma certa expressão facial, como testas franzidas e semblantes que dão a
impressão de que a pessoa está constantemente brava ou preocupada. Dificuldades e
bloqueios em rir, chorar ou mesmo se expressar podem ser momentaneamente limpas
em uma aplicação de rapé. Por outro lado, essa limpeza também acontece devido à dor
de se receber um sopro. Para quem ainda não conhece, é importante estar ciente de que
a aplicação envolve uma dose de intensidade que varia de acordo com o sopro e a
própria sensibilidade da pessoa.

Um pedido duplo: para quem receber, lembre-se de que você é naturalmente


forte e essa Força começa dentro de si... jamais negue-a ou diga-se incapaz de lidar com o
rapé; para quem soprar, procure estabelecer uma conexão sincera com quem está
recebendo o sopro, de modo que a pessoa tenha um alinhamento harmonioso e se
conscientize sobre o próprio processo, sem interferências externas.

Um terceiro tipo comum de limpeza concerne à energia do estômago. Esse


ponto é o centro do plexo solar (o terceiro Chakra) e é por ele que recebemos as
energias que nutrem nosso corpo fisico, tanto os alimentos quanto as emoções que
digerimos. O nosso centro de energia solar, de onde surge nosso poder pessoal e senso
de prosperidade, também se manifesta a partir desse chakra. O rapé acessa e limpa as
impurezas dessa região, podendo expeli-las solidamente (vômito) ou na forma de gases.
Os incômodos dessa região não são originados pelo rapé, apenas vem à tona com sua
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aplicação: uma azia crônica pode se intensificar, um alimento tóxico pode ser expelido,
ou uma emoção mal-digerida e pré-existente de ansiedade pode ser fisicamente
revelada e mentalmente trabalhada.

Maus hábitos e vícios emocionais favorecem o surgimento de toxinas no corpo,


que podem se acumular no estômago, criando “crostas” durante muito tempo antes de
serem limpas. O rapé e a ayahuasca acessam e limpam as energias desse órgão, o que
explica porque muitas pessoas vomitam sólidos após uma aplicação, mesmo que estejam
em jejum.

Interessantemente, o rapé também favorece a clareza mental. Estudos


científicos já corroboram que a saúde de nossos órgãos digestivos afeta direta e
indiretamente nossa cognição cerebral. Levando em conta a complexidade emocional
envolvida na trajetório de cada indivíduo, esse trabalho integral das medicinas no corpo
faz todo sentido: purificar o plexo solar permite mais facilidade de relaxar, meditar e
pensar claramente. Revela-se, assim, uma forte conexão entre o plexo solar e o
terceiro olho.

Continuando pelo trato digestivo, a limpeza por meio das fezes é


absolutamente comum. O chakra básico (raiz), ligado ao ânus e à genitália, nos conecta
ao senso de saúde, segurança física e instinto de sobrevivência. Portanto, medos,
traumas e anseios podem se manifestar nesses órgãos por meio de disfunções
intestinais, como a prisão de ventre, diarréia, ou por dores no baixo ventre, pernas etc.
Quando esse canal é acessado pelas medicinas da floresta, o corpo pede que a
evacuação seja feita. É absolutamente natural que as toxinas e restos não absorvidos dos
alimentos durante a digestão sejam expelidos por aí, e as medicinas apenas expandem
essa compreensão para apreciarmos o conforto de um corpo limpo.

Um último tipo de limpeza diz respeito a uma variedade muito mais sutil de
manifestação. A limpeza de traumas emocionais e karmas negativos pode ser
manifestada das formas já citadas anteriormente, assim como pode variar de maneiras
muito específicas para cada um.

Acessando o centro cardíaco (quarto chakra), podem-se experienciar a


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aceleração dos batimentos do coração, tremores e vibrações nas extremidades do corpo,
estados alterados de consciência, visualizar e ouvir múltiplos planos de existência
(clarividência e clariaudiência), mãos e pés subitamente muito quentes ou muito frios,
suor... Esses são alguns dos exemplos de “limpezas” e superações que cada um pode
acessar em seu processo.

Ocasionalmente, alguém diz que um determinado rapé ou sopro possibilitou


uma miração. Tratando-se da medicina do rapé, é difícil prever quando esse estado
ocorre ou não, quanto tempo dura e o quão benéfico, de fato, é. Sabemos que o tipo e a
quantidade de rapé, a presença de quem o sopra e o contexto, cerimonial ou não, são
variáveis fundamentais para acessar esse fenômeno.

Quando estamos na presença de um pajé em um ritual de medicinas, é muito


mais fácil de acontecerem mirações do que, digamos, ao receber um sopro de um
recém-iniciado em um parque, ou se auto-aplicar em casa. Atenção: não estamos dizendo
que esses últimoa cenários não sejam possíveis, pois de fato acontecem. Por isso
dizemos, novamente, que o discernimento do uso da medicina é sempre crucial. Essa
imprevisibilidade faz parte dos mistérios da medicinas sagradas e isso é, com certeza, um
fator muito empolgante para quem segue esse estudo.

Rapé e Ayurveda

Para além da tradição indígena, de um ponto de vista da Ayurveda (tradição


medicinal milenar da Índia) o rapé traz características de ser quente e seco. De fato, os
elementos que essa medicina trabalha são o fogo do Sol e das cinzas queimadas, a terra
em seu estado mais seco no pó, e o ar do sopro. É, portanto, comum a pessoa receber o
sopro, ter muita sede e sentir um calor repentino, chegando a suar. Essa elevação da
temperatura do corpo também é uma limpeza. Muitas vezes, beber água é o mais
apropriado e satisfaz enormemente o corpo, complementando o trabalho do rapé.
Muitas vezes depois de um sopro, principalmente se o processo de limpeza é muito
intenso, sentimos um gosto doce ao bebermos água, o que ativa o sentimento de calma
e gratidão.

Os Huni Kuin alertam que, entretanto, beber água pura pode “lavar” os efeitos
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do rapé, não permitindo que a medicina realize sua cura. De fato, se o objetivo é sentir a
força do rapé e acessar os seus estados de transe, a água anulará esse efeito. É
necessário discernimento, portanto, de quando a água complementará o trabalho do
rapé e quando ela o interrompe.

Caso a pessoa tenha seus elementos de ar-éter e fogo desequilibrados (regidos


pelos doshas vaata e pitta na ayurveda), vale a pena se perguntar qual abordagem é
mais adequada. Um sopro de rapé muitas vezes pode não ser o mais adequado para
sanar algumas mazelas e podem haver outras técnicas mais eficazes, como uma
meditação, exercícios de respiração ou a sananga, um colírio indígena.

O uso excessivo e inadequado do rapé, sem atenção a uma dieta adequada e sem
respeito a sua energia podem desequilibrar esses doshas. De forma bem simplificada, o
vaata rege o campo mental (ar), o criativo e o mediúnico (éter), trazendo uma
constituição leve ao corpo. Pessoas com muito vaata costumam ser magras, com ossos
finos.

Seu uso excessivo podem agravar distúrbios nesse dosha: incapacidade de se


acalmar, ataques psíquocos e desconexão com o próprio corpo são efeitos adversos que
o mal uso do rapé (e do tabaco, em geral) podem trazer. Existem relatos de estudantes
que começaram a se aplicar mais de 3 vezes ao dia, sem atenção à dieta e saúde do corpo
físico, e perderam de 10 a 20 quilos em questão de poucos meses.

Por fim, falar de limpeza significa falar de toxinas, lembramos que os efeitos do
rapé e seus espíritos guardiões são melhores percebidos durante a dieta do rapé,
processo de iniciação pelo qual os pajés, curandeiras e curandeiros tradicionalmente
passam para limpar o corpo de toxinas provindas da alimentação e firmar, em si, o
espírito guardião do rapé. Esse tópico será tratado posteriormente com mais detalhes.

Feitio

Novamente, o fundamento no preparo das medicinas sagradas é a intenção com


a qual se trabalha. Tal qual os povos da floresta nos ensinam, as energias sutis em tudo
que nos enolve, consumimos ou criamos são as causas de todas as doenças e curas.
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Do lado técnico, o rapé requer a cooperação do ser humano com a Natureza para
ser propriamente feito. Algumas condições naturais necessárias são o clima seco e
ensolarado. Na ausência dessas condições, as folhas de tabaco e as cinzas podem ficas
úmidas, dificultando tanto a técnica de pilar quanto de peneirar. O tabaco úmido não se
transforma em pó ao ser moído. As cinzas, também, precisar estar secas para que sejam
peneiradas de maneira apropriada.

O tabaco seco ao Sol quente preserva a natureza do vegetal, não adicionando


nenhum elemento desagradável provindo de sua exposição ao fogo. É normal, com o uso
artificial de calor, que o tabaco queime e fique com um gosto amargo, carburado. Mesmo
uma pequena quatidade de tabaco queimado irá afetar a energia de todo o rapé feito,
deixando-o com um aroma muito desagradável. O rapé bem feito tem um cheiro bom,
profundo e diverso, especialmente para quem já se alinhou com sua força, podendo ser
devidamente apreciado.

O pilão é o instrumento de feitio tradicional usado pelos povos indígenas e pode


variar em tamanho e material, sendo mais comum o uso de pilões de madeira ou pedra.
Quanto maior o pilão, mais tabaco pode ser pilado no mesmo trabalho. Algumas culturas
indígenas adotam outros métodos para moê-lo como, por exemplo, moedores de grãos
ou o uso de “martelos” em sacos de pano fechados com as folhas de tabaco.
independente do método, o importante é lembrar que uma intenção elevada de cura
deve ser mantida durante o feitio.

O tabaco é pilado durante tempo o suficiente para que ele se transforme em um


pó. Tradicionalmente, cantam-se rezos no ritmo das batidas, tendo o pilão como um tipo
de instrumento. Então esse pó deve ser peneirado em panos voal, com buracos
pequenos o suficiente para que apenas o pó mais fino passe. O que estiver grosso
demais pode ser separado e pilado novamente.

Quanto mais vezes for pilado e peneirado, mais fino será o rapé e maior a sua
qualidade de feitio e trabalho.

As cinzas são feitas a partir da queima de um único tipo de madeira em uma


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fogueira ou forno natural. A transmutação das cinzas é uma alquimia de alta ordem de
purificação: transforma-se a matéria viva em carbono e minerais, retornando uma planta
ao seu estado de pedra, cristal. Sua presença no rapé é responsável pelo equilíbrio
alcalino e etéreo que nos purifica na consagração dessa medicina, facilitando a
comunicação com planos espirituais mais elevados, onde os mestres, grandes pajés e
elementais das plantas habitam em união. Se apenas as cascas de uma madeira forem
queimadas, teremos sua pureza ainda mais elevada.

Após a queima completa da madeira, apagadas todas as brasas, as cinzas


também devem ser peneiradas. Elas são leves, portanto sensíveis ao vento e à umidade.
É necessário tomar muito cuidado com a pressão da mão sobre o pano voal, pois podem
haver pedaços de carvão que não devem, de maneira alguma, compor o tabaco.
Peneiradas com delicadeza e paciência, toda a cinza será separada dos carvões e outras
impurezas.

Ao final, o tabaco e as cinzas, ambos peneirados, são misturados e pilados


novamente. É possível peneirar mais uma vez após a junção, obtendo o rapé já em sua
etapa final. Qualquer matéria grossa demais para passar pela peneira nesse momento,
pode ser soprado para a terra, em forma de agradecimento.

Instrumentos de Sopro: kuripe e tepi/tipi

Como explicado, o rapé deve sempre ser soprado, e nunca cheirado. Para isso,
faz-se uso do kuripe / curipi e do tepi / tipi.

O kuripe é o instrumento usado para as auto-aplicações. Ele é de uso pessoal e


recomenda-se que não seja compartilhado com outras pessoas além de seu dono. Os
instrumentos de sopro carregam uma energia própria de seu portador. Tantos as
bênçãos quanto as mazelas da pessoa permanecem e são trabalhados no kuripe ao longo
do tempo.

O tepi é o instrumento usado pelo pajé e curandeiro para soprar em outras


pessoas. Ele também carrega uma energia particular tanto de sua confeção quanto de
18
seu portador, e pode ser compartilhado se autorizado pelo dono. O uso desse
instrumento é tradicionalmente permitido após o curandeiro realizar a dieta do rapé,
que limpará seu canal para que o sopro transmita cura espiritual junto à medicina. O
sopro carrega a intenção e energia da pessoa que o realiza, portanto deve ser feito com
consciência e responsabilidade.

Os aplicadores podem ser feitos de diversos materiais, de acordo com as


preferências do artesão ou do estudo em questão. É muito comum encontrarmos tepis e
kuripes feitos de bambu, uma madeira abundante em toda natureza. Outras madeiras
também podem ser trabalahdas, se devidamente lixadas e perfuradas. Ossadas de
animais sagrados também são matérias comuns entre os indígenas, tais quais os ossos de
gavião real, onça, jibóia, arara, veado, queixada e outros seres previamente caçados ou
encontrados mortos.

A estrutura também é formidavelmente variada, podendo ter muitos tamanhos.


Encontramos formas de arco, tepis em V e até mesmo retos. Existem inclusives kuripes
que adaptados para virarem tepis. Frequentemente acrescentam-se detalhes artísticos:
pinturas, pirografias, cordões, macramê, miçangas, moldes de cera, argila e durepox,
conchas, penas, garras, dentes...

Também se encontram canos de metal, plástico e acrílico, apesar de serem


menos comuns. Existe a preferência, entre os rapezeiros, de se usarem os materiais mais
naturais possíveis.

(acrescentar fotos)

Por último, recomendamos a limpeza cotidiana desses instrumentos, tanto


externa quanto interna. Tiras finas de madeira, arames e papel podem servir para essa
função, tomando cuidado para que não quebrem durante o manejo e obstruam o canal
por onde passa o sopro.
19
Dieta e Alimentação

A dieta é uma prática comum entre todos os povos que cultivam a tradição do
uso medicinal do rapé. Todas as medicinas da floresta possuem dietas similares, e esse é
um estudo que recomendamos a todos pesquisarem na própria caminhada. Por um lado,
faltam estudos escritos no assunto, deixando-nos quase que exclusivamente à tradição
oral e criando muita especulação no campo científico, estritamente racional. Por outro, a
riqueza de experiências e ensinamentos das dietas que nos são passadas, especialmente
pelos mais velhos, mostra quanto vigor o corpo humano é capaz de revelar na ausência
de alimentos – benditos jejuns - e na busca por uma consciência mais elevada. E nada
disso se restringe à idade física, pois muitos curandeiros jovens realizam intuitivamente
jejuns de muitos dias, guiados essencialmente pelo Espírito. É uma chave de harmonia
universal: o estudo holístico das dietas e do “aparelho” humano está aberto a todos que
façam essa escolha.

A dieta do rapé trata-se de uma iniciação a partir da qual o indivíduo estará mais
adaptado à Força do Rapé, conhecendo seus efeitos em todas as dimensões corpóreas,
alinhando-se com os espíritos curandeiros que o cercam e, finalmente, tornando-se apto
para aplicar com respeito o rapé em outras pessoas. Originalmente, a dieta é feita em
contato constante com a mata, por isso existem cosiderações de adaptações da cidade.

Durante 21 dias, deve-se seguir um protocolo habitual com as medicinas e com a


alimentação. O rapé deve somente ser auto-aplicado pelo estudante com um kuripe 2
vezes ao dia: ao acordar, em jejum, e antes de dormir, em meditação. É possível que se
apliquem mais vezes, respeitando o ritmo de cada um, e em geral se recomenda que uma
outra aplicação seja feita perto do pôr-do-sol, ao fim de um dia de trabalho, para limpar
as energias que a pessoa acumula da rua e de outras atividades.

Os sopros devem ser feitos na intenção de se alinhar com o espírito do rapé,


pedindo que ele se apresente, e então observar o que ocorre em meditação. Ao final
desse estudo, a pessoa se torna apta a soprar o rapé em outros. Durante a dieta, não se
podem receber sopros de terceiros por tepi, mesmo que sejam de pajés ou pessoas mais
experientes, pois a dieta do rapé é fundamentalmente um processo de
auto-conhecimento acompanhado pela medicina sagrada.
20

A alimentação e os hábitos nessa dieta devem ser regrados, excluindo-se:


− Sal
− Açúcar (todos os tipos)
− Carnes (todos os tipos)
− Alimentos processados
− Vícios (isto é, álcool, cigarro, substâncias sintéticas, medicamentos
alopáticos)
− Atos sexuais, inclusive com parceiros fixos e masturbação

Existe uma discussão sobre o consumo de frutas doces durante a dieta. Diversas
culturas, tais como os Huni Kuin e certos povos peruanos, são enfáticos ao dizer que o
gosto doce precisa ser eliminado da dieta, pois pode atrapalhar o discernimento do
estudante, atraindo a polaridade negativa do rapé – o nissum – e prejudicando o
desenvolvimento intencionado originalmente. Esse nissum pode manifestar a preguiça e
compulsão alimentar, desequilíbrios associados ao doce em diversas tradicões
medicinais.
Historicamente, isso faz sentido a exclusão das frutas doces se pensarmos que o
açúcar da cana foi introduzido há poucos séculos na dieta indígena e a tradição do rapé,
incluindo sua dieta, é anterior a esse período. Antes do açúcar, o único doce possível era
o sabor das frutas, e os pajés em geral consensuam na ausência desse alimento,
principalmente durante as dietas mais longas.

Existem outras tradições que não excluem frutas. Muitos dos curandeiros e
curandeiras não a recomendam levando em consideração o dia-a-dia contemporâneo,
principalmente nas cidades, que requer uma dose maior de energia para se lidar com
tantas interações e informações. Não queremos que ninguém seja incapaz de executar
suas atividades diárias e, mesmo que isso seja possível com o corte do doce, inclusive
frutas, e uma substituição planejada por outros alimentos ricos em energia ao longo dos
21 dias, é preciso que a mente e a vontade do iniciante estejam em alinhamento com
essa rotina para enfrentar esse periodo de desintoxicação. Cabe a cada um fazer
escolhas de acordo com sua autorresponsabilidade.

Outra questão é o uso de laticínios. Como a vasta maioria dos alimentos dessa
21
categoria são processados, não seria aconselhável seu uso durante a dieta do rapé. No
caso de leites e laticínios produzidos artesanalmente, mais diretamente do animal, é
preciso estar atento às condições de criação e à digestibilidade da lactose para cada
indivíduo. É fato que a produção lactase (enzima que digere a lactose) no corpo humano
está presente apenas no código genético de populações europeias, e ela tende a
diminuir a medida que os indivíduos atingem a idade adulta. Por isso, a intolerãncia à
lactose é relativamente comum na população humana, e cada indivíduo manifesta essa
indigestibilidade com reações diferentes, que podem variar de desconfortos intestinais a
alergias de pele, acne etc. A presença de qualquer intolerância alimentar afetará, com
certeza, o estudo do rapé durante a dieta, pois afetará a concentração e meditação do
estudante.

Durante as aplicações, lembramos de se manter uma intenção elevada de


autoconhecimento, interiorização, paz, cura e limpeza de energias negativas, tudo
dentro do propósito de conhecer o rapé. É importante reservar um período de tempo
para cada sopro, de modo que o processo não seja interrompido por outros
compromissos, pessoas, energias dissonantes, ansiedade ou pressa.

Ao final desse período, cada um terá passado pelos seus próprios processos
físicos, emocionais, mentais e espirituais, acessando os próprios campos espirituais com
suas próprias experiências. A partir desse momento, a pessoa terá a firmeza necessária
para aplicar o rapé em outros com o respeito necessário e a pureza de servir.

Com o tempo, fora das dietas mais restritas, é comum a muitos sentirem a
necessidade de diminuir produtos açucarados e de origem animal. Isso é comum a todos
no caminho de autoconhecimento espiritual, com ou sem a presença das medicinas da
floresta, pois faz parte do despertar da consciência que a humanidade está
experenciando nessa transição da Terra. A desintoxicação de anos de má alimentação é
completa ao incorporarmos alimentos vivos no dia a dia: a sustituição consciente afasta o
sentimento de falta.
O rapé e a ayahuasca também são alimentos para o Espírito. Sendo de origem
vegetal, eles trabalham muito bem com os corpos que se alimentam da energia de
vegetais. As células das plantas continuam vivas e ativas, mesmo após serem cortadas e
cozinhadas, e fornecem muita energia vital quando nos alimentamos com respeito e
22
gratidão. Principalmente para quem mora no meio urbano e passa a maior parte dos dias
sem contato direto com a natureza, o chamado para a reeducação alimentar costuma ser
maior.

O rapé - na verdade, o tabaco em geral - suprime o apetite após a aplicação, e


pode ser um importante aliado no estudo de jejuns intermitentes ou prolongados. A
melhor maneira de consagrá-lo, aliás, é de estomago vazio, com pelo menos 2 horas de
distância de qualquer refeição.

O Sopro

De acordo com o Livro de Cura do povo Huni Kuin do Rio Jordão, “Una isi
kayawai”, conta-se que “O Sopro está relacionado com o pensamento positivo, é uma
grande energia que cura e tira o ruim, traz a proteção na vida espiritual, salva e defende
o dia a dia”.2

O estudo dos sopros é iniciado pela dieta de 21 um dias, consagrando o rapé com
o KUXPA (kuripe). Nesse processo o sopro do praticante vai se desenvolvendo, começa
com pouco rapé e um sopro curto; depois, para sentir mais a força, aumenta-se a dose e
faz-se um sopro mais longo. O interessante no momento do sopro é estar conectado
com a medicina, procurando um equilíbrio entre corpo e mente, estar em uma
freqüência positiva, firmado na dieta para poder servir de canal para passar a medicina.

Sempre que for feita uma aplicação em outra pessoa, é fundamental lembrar de
se pedir licença, tanto a ela quanto aos seus guias espirituais. Isso facilita a conexão e o
processo de ambos. Não é incomum alguém soprar o rapé em outra de maneira
equivocada e passar, também, pelos efeitos da medicina. São os mistérios do rapé...

Quando se assopra em alguém, é preciso ter muita responsabilidade, pois quem


assopra vai estar passando sua energia para o outro - é importante estar presente neste
momento. Algumas vezes pode ser que um guia espiritual participe do processo, se

2
Una isi kayawai foi organizado e baseado nos estudos da etnia Huni-Kuin , onde estão catalogadas 109 espécies de
ervas medicinais da floresta Amazônica.
23
conectando no momento do sopro. Antes de assoprar é interessante se conectar com a
pessoa e sentir a energia, olhar nos olhos para deixar fluir o sopro que ela deve receber.
Cada um tem uma energia própria e organismos diferentes: em alguns, dá-se um sopro
mais leve; em outros, um sopro médio; e outras precisam de um sopro forte, tudo
dependendo também da necessidade do momento.

Em relação ao tipo de sopros, pajés do povo Huni Kuin contam sobre três tipos
de sopros: DAMATI, USHABAE E BUXKATXÃ.

Inicia-se com o sopro Damati, que é um sopro devagar, leve, suave, tranquilo,
onde a pessoa vai sentir a força chegando devagar, indicado para quem está
consagrando pela primeira vez ou para pessoas que são sensíveis ao rapé.
O segundo sopro, Ushabae, é o caminho do sonho, um sopro comprido e forte
no final, faz a pessoa sonhar bem, ter um sono tranqüilo e acordar bem. Uma observação
interessante: outras tradições fazem o mesmo sopro “ao contrário”, decrescente - forte
no começo e leve no final – na intenção de trazer bons sonhos e acalmar a pessoa. É um
estudo indicado para se fazer à noite, logo antes de dormir.
O terceiro sopro chama Buxka Txau, um sopro curto e forte, que traz energia e
vigor, força para trabalhar e coisas fortes, nesse sopro você se conecta com KOINUMAN
TANANE que é um Yuxibu Guardião da medicina do rapé. Foi ele quem trouxe o rapé para
a humanidade, contam os pajés.

Na tradição katukina, aprendemos a existência de 4 sopros:


O primeiro é o sopro do Jabuti, que é longo, devagar e leve, semelhante ao
Damati dos Huni Kuins;
O segundo é o sopro do Gavião Real, sopro em espiral e forte no final;
O terceiro é o sopro da Jibóia, também conhecido como TXAXU, comprido,
constante e forte no final;
O quarto sopro é o sopro do Beija Flor, que é um sopro curto e forte.

Os txais também contam que um dos espíritos guardiões do rapé é Inu Bake, a
onça pintada; o espírito guardião do nixi pae (ayahuasca) é YUBE, a Jibóia; e o espírito
guradião da sananga é Nawa Tete, o Gavião Real. Todos esses yuxibus trabalham em
harmonia na egrégora espiritual das três medicinas.
24

Em nossos estudos aprendemos que o rapé é uma medicina ancestral e uma


ciência espiritual que requer muita disciplina e dietas para estar sempre apto a trabalhar
com elas. O sopro é uma ação mágica que será um canal para passar a medicina, então é
sempre fundamental ter responsabilidade neste trabalho. Estamos trabalhando com a
cura e com o próximo, portanto a pessoa que assopra tem que estar sempre bem de
saúde, na dieta e alinhado espiritualmente para realmente passar a cura. Caso contrário,
pode-se trazer a doença.

O segredo é simples: estar consciente e conectado com os espíritos da floresta,


koinumantanane, a jibóia, a onça, o gavião real, todos os seres... e soprar a cura, o
sopro do pajé, noss@ pajé interior, o sopro do amor!

Os tipos de rapé: cinzas

Os rapés levam diferentes nomes de acordo com a cinza que é usada. Cada
tradição fala sobre seus usos e diferentes relações com cada árvore, além das misturas e
rezos específicos. Na sessão de anexos disponibilizamos alguns registros validados por
pajés e curandeiros sobre a especificidade de cada rapé para cada cultura.

A presença das cinzas no rapé sagrado é uma antiga alquimia recebida e


aprimorada pelos povos indígenas. Essa substância traz a força de purificação do fogo,
que transforma a planta a um estágio mineral, e trabalha em equilíbrio com o tabaco,
trazendo a elevação sentida em um sopro de rapé.

Pode-se dizer que as cinzas possuem uma natureza “alcalina”, ajudando os


corpos energéticos do Ser Humano a eliminarem o excesso de acidez e toxinas que os
hábitos de vida desconectados da Criação tendem a trazer. Uma forma de interpretar a
importância das cinzas na medicina do rapé é lembrarmos da imagem da Fênix, que se
consome em seu próprio fogo e renasce das cinzas.

Após queimar completamente a madeira e deixar a brasa apagar, é necessário


peneirar as cinzas em pano voal com muita delicadeza. Quando o tempo está seco, a
25
parte mais pura passará facilmente pelo pano e ficarão retidos apenas o carvão e outros
grãos maiores. A suavidade nesse momento é essencial, pois há o risco do carvão se
despedaçar e passar para o rapé, contaminando-o com um cheiro ácido.

Apesar de menos enfatizado, a variação do rapé também pode levar em conta os


tipos de tabacos, que é muito relativa à região onde o rapé é feito, dependendo da
disponibilidade. No Acre, usa-se normalmente o tabaco mói, enrolado em grandes
“braços” de 2 metros de comprimento, aproximadamente. É comum os txais misturarem
um pouco de fumo de corda para que o rapé fique mais forte, pois o mói, apesar de ter
um cheiro muito agradável, não é tão forte quanto aquele. No resto do Brasil, o uso do
fumo de corda de grau “escuro” é o mais comum, dando-se preferência também a folhas
de tabaco colhidas e secas de maneira orgânica, sem adição de prudutos químicos, álcool
ou qualquer tipo de enfraquecimento.

Entre todas as cinzas, a mais comum é a de tsunu. O Tsunu, na verdade, significa


“cinza branca” e se refere a uma família de árvores sagradas constituídas de várias
espécies na floresta amazônica, entre elas o famoso pau-pereira (Platycyamus regnellii),
mais comum na região centro-oeste e sudeste do Brasil. O Rapé de Tsunu é muito
tradicional nos trabalhos de cura e nas dietas. É um rapé forte que trabalha todos os
aspectos da medicina: alinhamento, ancoramento e limpeza. É o rapé mais indicado para
quem está iniciando seus estudos e para quem procura trabalhar equilíbrio e cura
energética.

O rapé de cumaru pode ser feito a partir das cinzas dessa árvore ou com as
raspas de sua casca. No primeiro caso, o aroma predominante será o de tabaco; no
segundo, a presença do cumaru se sobrepõe. Seu efeito é majoritariamente “clareante”,
eliminando congestões nasais, alergias e bloqueios mentais. O cheiro do cumaru é o
principal responsável por esse efeito, tornando-o um rapé muito apropriado para a cura
e para afastar “panemas” (males dos do espírito).

O rapé de canela-de-velho costuma ser muito forte. Ele fortalece a conexão do


curandeiro com a Terra, com os espíritos da mata e promove a limpeza física e
energética. Por causa de sua força, deve ser usado com discernimento, tanto
ritualisticamente quanto no estudo pessoal.
26

O rapé de murici é feito com as cinzas de sua árvore. Suas frutas também tem
propriedades medicinais, mas não são usadas nessa medicina. É um rapé que traz
ancoramento, firmeza e concentração, trabalhando principalmente nos chkras do baixo
ventre (umbigo, sacral e raiz). Frequentemente também é usado para acalmar a mente e
auxiliar o sono quando soprado à noite. Seu sopro, quando bem executado, permite que
a energia acumulada no baixo ventre seja espalhada por todo o corpo. É usado também
para aliviar desconfortos da constipação e diarréia, estabilizando o fluxo digestivo.

O rapé de mulungu trabalha, também, os chakras inferiores, promovendo o


relaxamento. A casca do mulungu é, tradicionalmente, um anti-depressivo, e pode ajudar
pessoas a encontrarem maior felicidade e aliviar estresses acumulados do dia a dia.
Recomenda-se soprar esse rapé ao final do dia ou à noite por trazer, muitas vezes, um
relaxamento profundo. O uso do rapé de mulungu trabalha sobre distúrbios psicológicos
e emocionais como depressão, sindrome do pânico, insônia e estresse, acalmando a
pessoa e ajudando-a a entender quais escolhas e situação da vida estão
enfraquecendo-a.

O rapé de paricá / angico / virola (cinzas do tronco) tem uma qualidade


notadamente quente. É importante diferenciar quando esse rapé é feito a partir das
cinzas ou das sementes – conhecidas popularmente como yopo. No caso de se usar
apenas suas cinzas, não há DMT em sua composição. Ele segue sendo um rapé que
promove forte conexão espiritual, e recomenda-se já ter alguma experiência no caminho
xamânico para consagrá-lo. Ele trabalha especialmente o corpo emocional, trazendo à
consciência nossas carências. A partir do equilíbrio entre a mente e as emoções, surge a
possibilidade de cultivarmos o amor próprio. Não há nada no mundo externo – nem
mesmo o rapé – que pode preencher nossos vazios emocionais, pois “o
auto-conhecimento é se apaixonar pelo próprio vazio”, como dizem os Mestres.

O rapé de Apurinã é um tipo diferente, feito pelo povo amazônico de mesmo


nome, e foge do feitio tradicional. A única planta utilizada é o awiri da mesma família da
coca e do tabaco, e as folhas são colhidas e secas naturalmente, ainda verdes. O
resultado final é um rapé único, de cor verde, que auxilia quem o usa a estabilizar seus
níveis vitais, trazendo calma, foco e concentração. É um rapé leve, frio, que não traz
27
limpeza física.

O rapé de yopo vem de uma planta de poder que se difere dos demais. Feito a
partir das semenetes dessa árvore sagrada (conhecida como a família do angico, paricá,
virola, yupa, tiborana etc.), em sua composição encontramos o DMT, mesma substância
presente nas folhas da chacrona (ayahuasca). Além de realizar o trabalho de limpeza e
alinhamento, seu sopro pode facilmente levar a um estado alterado de consciência, que
se assemelha ao sono e pode durar vários minutos ou algumas horas. Para navegar
tranquilamente nesse transe, o praticante precisa ser experiente no caminho xamânico e
firme em suas intenções. A pessoa pode experienciar mirações, desdobramentos astrais
e / ou aleteração dos sentidos físicos. Tudo depende da intensidade e da intenção do
trabalho espiritual ali realizado. Recomendamos cautela ao usá-lo e fortalecer, antes, o
estudo nos outros tipos, já que o rapé de yopo é de um nível de estudo mais profundo.

Nissum do Rapé

O nissum é o nome dado no idioma pano às energias negativas de onde se


originam todos os males do ser humano, sejam físicos, emocionais, mentais ou
espirituais. Existem várias naturezas de nissum que podem ser facilmente identificados
na língua portuguesa. A depressão, a falta de energia, a compulsão, a obsessão, a
preguiça, a vaidade e outras caracteristicas negativas dão ideia do que se tratam.

Cada medicina da floresta, cada planta medicinal trabalha no polo positivo e


negativo. Se o ser humano, comandante do canal de cura, estiver alinhado em intenções,
pensamentos e sentimentos de maneira positiva, da mesma maneira reagirão as
medicinas sagradas, e o mesmo acontecerá no polo negativo. É preciso estar atento a
esse alinhamento já que ninguém está insento de sofrer os revezes, por mais experiente
que esteja. Quanto mais afinado o estudo e a percepção, melhor estará a intuição da
curandeira e curandeiro.

No caso do rapé, o nissum se manifesta mais notadamente na forma de preguiça,


indisposição, impaciência, fraqueza de corpo e mente, inquietação e nervosismo. Podem
ser acompanhados de compulsão alimentar, dores de cabeça e desistências espontâneas
de decisões. Em casos graves, onde a energia negativa permanece por muito tempo, a
28
pessoa pode ter hipotrofia (perda de massa muscular), depressão, canalizações
mediúnicas erráticas e limpezas físicas excessivas (vômitos, diarréias) nas quais se torna
muito difícil de discernir boas e más informações.

Caso sejam observados esses fenômenos, recomenda-se que o uso do rapé seja
suspenso durante algum tempo (dias, semanas) a depender do aconselhamento de um
curandeiro mais experiente e da intuição do próprio estudante. É sabido que a sananga
age no sentido de equilibrar qualquer nissum atraído pelo rapé, assim como rapé pode
ser eficaz para trabalhar os nissum e bloqueios experiementados durante a ayahuasca.
Esse entendimento traz harmonia, pois as medicinas sagradas agem em
complementariedade. Importante sempre levar em cosideração os hábitos e fatores de
saúde presentes na vida de cada um previamente, para além do contexto xamânico.

Os Huni Kuin recomendam que se evite ao máximo o consumo de alimentos


doces, inclusive frutas, quando for feito um estudo ou tratamento com o rapé,
principalmente nas primeiras aplicações de alguém. O doce atrai o nissum do rapé, e isso
é facilmente identificado pela falta de cognição motora (“moleza”) e uma limpeza física
agressiva após um sopro nessas circunstâncias. Pessoas com históricos familiares de
diabetes, insensibilidade à insulina e absorção errática de açúcares no corpo (hipo e
hiperglicemia) devem ficar atentos a essas questões.

O rapé vem, nesses casos, para auxiliar no alinhamento a mente e o corpo com a
mudança de hábitos alimentares que, nada mais são, do que vícios emocionais
manifestados no consumo excessivo de doces e carboidratos refinados. Não se pode
esperar que a simples aplicação de rapé “cure” esses problemas, então é necessário que
se tomem as medidas necessárias para o aperfeiçoamento do veículo humano. Ele pode
ajudar na limpeza de toxinas, mas isso depende da permissividade da pessoa em seu
processo interno de se libertar dessas toxinas, o que muitas vezes está arraigado a nível
subconsciente: por mais que a pessoa diga que quer livrar o próprio corpo do excesso de
açúcar, existem mecanismos fisiológicos e implantes energéticos que impedem que essa
limpeza seja executada imediatamente.

É importante respeitar o próprio processo de assimilação de informações e


adaptação corpórea dentro de hábitos mais saudáveis na esfera física, mental e
29
emocional. Se a aplicação do rapé continuar sem esse respeito, sem essa consciência, o
rapé servirá apenas como uma “máscara” temporária, que pode dar uma força
momentânea, mas que não impedirá o ressurgimento de males antigos e predispostos. O
mau uso dessa medicina causa, inclusive, o vício, e lembramos de que o tabaco possui
nicotina e esse vegetal tem uma relação antiga com o Ser Humano, cujo karma e uso
ainda estamos coletivamente compreendendo e limpando.

A Floresta e a Cidade

Viver na floresta, no campo ou na cidade envolvem rotinas essencialmente


diferentes. As energias ao redor, o ritmo dos dias, a conexão com os seres e os ciclos
naturais são percebidos de várias maneiras, e o indivíduo estará sujeito a demandas
energéticas específicas dependendo de onde mora. Ainda que todos estejamos sob as
mesmas influências no plano terrestre, como os movimentos relativos dos astros e as
estações do ano, a forma e frequência dessa percepção é notadamente afetada.

Vejamos assim, em uma parábola: em sua casa à beira do rio, o caboclo ribeirinho
acorda todos os dias com o canto do galo, enquanto o Sol lentamente desponta no
horizonte. Levanta, lava o rosto e percebe pela vigésima vez que sua canoa está com
buracos e ele precisa ir à cidade mais próxima comprar o material para consertá-la. Ainda
pela manhã, aproveita que seu facão está próximo e capina pelo seu terreno, como
costuma fazer antes que o dia fique quente demais, e encontra um trecho em que o
mato está invadindo sua plantação de mandioca. Demora cerca de 2 horas nesse rabalho
de remoção até que fique satisfeito com o resultado e retorna à sua casa, onde sua
companheira cozinhou algumas bananas e café para o desjejum, depois de ter
alimentado os animais e passeado pela horta. Antes de comer, senta na soleira e sopra
um rapé com o filho pra relaxar o corpo após ter capinado por tanto tempo. Quando se
recompõe, come calmamente, comenta sobre o peixe do dia anterior (que estava uma
delícia) e que precisa ir pra cidade comprar a massa que tapa buracos de canoas. O filho
fica empolgado com a ideia e quer ir junto pra comprar uma camiseta do Neymar com o
dinheiro que ganhou de alguns turistas em troca de um passeio pelo igarapé onde
moram. Quem sabe, na volta,pode até jogar bola com os amigos se o tabaco ainda não
estiver seco o suficiente para ser pilado.
Assim que o pai termina de se trocar e arrumar o que precisa para a viagem, o
30
tempo fecha repentinamente. O céu escuro acompanha um cheiro de terra molhada e a
família toda sabe, sem dizer uma palavra, que em alguns minutos iria começar a chover.
Nesse movimento, intuitivamente o pai e o filho correm para colocar o tabaco em sacolas
fechadas antes que a chuva caísse.
Não vale a pena sair de barco e depois pegar uma carona na estrada para ir à
cidade molhados, então adiam a viagem. Um pouco decepcionado, o filho pede ao pai um
sopro de rapé para ajudar a combater uma tristeza que nele começava a crescer. Sentam,
sem falar muito, consagram a medicina e, sem outras obrigações da casa, entram na
força da medicina durante um tempo. Quando se recompõe, o filho pega o violão e toca
algumas canções que aprendeu com os parentes Shawandawa. A mãe fica feliz com a
cantoria e canta junto; o pai, filho de uma pajé desse povo, dá um discreto sorriso de
orgulho e olha pela janela, percebendo que a chuva iria demorar mais do que pensava.
Naquele dia, não poderiam ir para a cidade, nem fazer o rapé, nem jogar bola. De
fato, a chuva durou muito mais do que esperavam: caiu água durante três dias, o rio
encheu significativamente e navegar por suas curvas se tornara muito mais fácil. Com
sorte, esse ano não iria encher demais para não comprometer as plantações e a pesca
seria proveitosa.
Mesmo sem fazer mais que a metade do que inicialmente tinham planejado, a
família não se entregou à insegurança e ansiedade. Mesmo que algumas tristezas e
preocupações tenham surgido, o dia foi bem aproveitado e as atividades se adaptaram
aos ciclos naturais que os cercam e os nutrem.

“Aproveitar o dia” pode ter um significado muito diferente para quem vive na
cidade. Muitas vezes, se não há a sensação de produção, diz-se que o dia foi
desperdiçado e não fizemos “nada”. Muita gente cria a necessidade de sair de casa todos
os dias, dizendo que só assim realmente está “vivendo a vida”. Em certos bairros, muitos
tem medo de sair de casa, pois seus pais, amigos e jornais dizem que a rua está cada vez
mais perigosa. Se chove desavisado e a pessoa está na rua sem guarda-chuva, precisa
esperar embaixo de um toldo ou enfrentar a estranha lama suja de fumaça das calçadas.
Outros mais “sortudos” entram em seus carros e vão a reuniões em cômodos fechados
do outro lado da cidade sem dar mais de 500 passos em um dia e há dias sem pegar sol.
O Sol, inclusive, é temido: todos os médicos e colegas recomendam que se passe
protetor solar obsessivamente, que só é trocado ocasionalmente pelo “cenoura e
bronze” na piscina ou na praia. Quem não tem piscina e vive na rua, desconfia com raiva
31
da Polícia que a todo momento fuzila olhares e balas desconfiadas, enraivecidas. Só não
fuzilam outros políciais porque o Capitão não permite, assim como o trabalhador
engravatado não xinga pessoalmente seu chefe porque o Capital não permite.

Ironicamente, todas essas energias não são exclusivas da cidade: sentimentos de


raiva, desespero, insegurança, medo ou ilusão estão presentes em toda a humanidade,
em todos os lugares. A diferença é que na cidade elas acontecem em um espaço muito
menor, entre muros e pavimentos, e com uma frequência muito maior,
consequentemente. É possível, sim, se proteger das energias negativas ao redor, tal qual
a negatividade gerada de uma briga entre o casal que mora no andar acima, mas é
necessário bastante concentração, organização e consciência por parte do indivíduo. Em
outros ambientes, onde esses fatores externos não são tão agressivos, é muito mais fácil
manter o equilíbrio, simplesmente porque a ocorrência desses agravantes é muito mais
rara. E ainda assim, uma mente fragilizada pode atrair todos os tipos de males ao seu
encontro, independente de onde está, pois nossos pensamentos atraem nossas
circunstâncias.

Tendo visto tudo isso e pensando no ambiente urbano: como as medicinas da


floresta podem auxiliar nosso equilíbrio e nossa caminhada no auto-conhecimento? Mais
especificamente: como o rapé trabalha na cidade? Quais os benefícios e desequilíbrios
que ele pode acessar?

O Rapé e a Cidade - matrix artificial

Precisamos partir de um ponto que dissolva algumas controvérsias próprias da


Terra na matéria, isto é, a 3a dimensão. Existem diversos planos – dimensões - de
existência em que atuamos, muito além do que conseguimos ver ou compreender com a
nossa atual inteligência humana. Essa vida, verdadeiramente, é uma experiência de
intensa interação com a matéria (3ªD, ou fisicalidade) e as emoções (4ªD, ou Plano
Causal, ou Plano Astral), necessária para realizarmos aprendizados específicos que só
podem acontecer nessas condições. O desapego talvez seja o mais fundamental desses
aprendizados: quando nascemos, desapegamos do mundo espiritual, e quando
morremos, deixamos para trás a matéria. Existem muitos outros planos superiores a
32
esses, mais próximos da pureza do Grande Espírito, nos quais as dores da matéria e do
tempo linear não existem ou tem um impacto muito menor.

Ao nascermos, nossa alma faz a escolha consciente de vir sob determinadas


condições físicas, locais e famílias, próprios para que os aprendizados escolhidos possam
ocorrer da melhor maneira possível. Todos esses fatores são guiados pelo Amor que nos
liga a determinados aspectos da existência e a outras almas que reencontramos ao longo
de nossa jornada eterna, ao longo de várias reencarnações. Uma vez que viemos para cá,
esquecemos todas as memórias tangíveis de outras vidas e nossa ligação imanente com
o campo espiritual, nossa origem com a Criação. Isso é visto, na dualidade, como uma
faca de dois gumes: se por um lado, esse esquecimento faz parte das regras de
aprendizado da Terra, por outro, muitos de nós passamos por tempos difíceis ao tentar
preencher o vazio que essa amnésia ressoa em nossa alma e corpo.

Entretanto, o esquecimento é de fato uma bênção e temporário. Só se afastando


das memórias de traumas e experiências é que podemos ter liberdade de mudar padrões
que carregamos há várias vidas. De fato, por mais que nossa memória “material” esqueça
a clareza de eventos marcantes da existência, ainda carregamos em nosso código
genético todos os potenciais e traumas que se revelam em nossos dons e hábitos. Um
exemplo prático e comum: um músico muito criativo e talentoso com o péssimo hábito
de se alcoolizar diariamente... É muito provável que não é a primeira reencarnação que
ele desenvolve o dom da música, nem de recorrer ao álcool para “amenizar” seus
sofrimentos emocionais.

Sobre o local de nascimento, escolhemos nascer na cidade, no campo ou na


floresta por diversos motivos... motivos que só podem ser compreendidos por cada
indivíduo, grupo e cultura em seu próprio tempo, por suas próprias escolhas. Você pode
nascer na cidade com a missão de melhorá-la e somar seus ensinamentos de alma a esse
ambiente, ou pode ser para entender, um dia, que não é o seu verdadeiro lugar e que
mudar para outro lugar mais ligado à natureza será mais benéfico para o seu próprio
crescimento. O mesmo acontece para todos os seres humanos em todos os sítios do
planeta. Como bem ensinam os Mestres Ascencionados, a libertação que todos
buscamos está em nossa mudança de crenças, hábitos, pensamentos e vibrações que nos
aprisionam por vidas sem fim, independente de onde geograficamente passamos nossos
33
dias.

O rapé é um veículo energético atrelado a determinadas vibrações e Forças,


como já explicamos anteriormente. É à energia da Floresta que, em última instância, ele
nos encaminhará, pois sua origem é a Floresta Amazônica e foi nela em que se aprendeu
e se utilizou o rapé para a cura. Seu trabalho espiritual nos alinha com a forma mais
natural dos nossos corpos físicos, emocionais e mentais, nos “puxando de volta” à
essência.

É cada vez mais possível, no plano terrestre, vibrarmos afinados em todas as


harmônicas de energia, da mais densa à mais sutil. Esse alinhamento amplo e elevado -
um desafio de tornar realidade – permite que a mente e o espírito trabalhem em
comunhão a ponto de alterar a matéria. Em nossa história, foram raras as ocasiões desse
desdobramento espiritual, sejam por monges ou por Avatares e Profetas em suas
missões planetárias. Esse estado, no entanto, permanece uma potência – uma
possibilidade - ainda que dormente em nosso DNA. Nessa era da humanidade, estamos
começando a vislumbrar a ligação do DNA com múltiplas dimensões da existência em um
trabalho muito além do químico, inclusive ao se relacionar com energias vibratórias de
cura. Diversas técnicas medicinais – incusive as medicinas da floresta – estão sendo
estudadas por alterar a vibração de nossas estruturas moleculares e permitir, assim,
regenerações milagrosas.

Quando nos ancoramos a esse ponto “primordial”, percebemos que estudar o


rapé se trata de voltar à origem, ao alinhamento natural do nosso Ser em conexão com
o Grande Espírito (acima) e Gaia (abaixo). As toxinas que limpamos são todas invenções
do Ser Humano durante milhares de anos de existência, pensamentos negativos que se
materializaram com o tempo e expressam vibrações mais baixas do ser.

Sistemas de escravidão, crenças e relações aprisionantes, alimentos desprovidos


de energia vital, doenças, opressões etc. surgiram, primeiramente, na mente Humana
para então se manifestar em nossa realidade de maneira concreta e constante. Nesse
sentido, a experiência coletiva tem o grande peso de manter e reproduzir determinadas
manifestações negativas. O medo é o grande motor desse dreno de Vida, e cada um
permite ou não esse medo de ter lugar em nossas vidas por meio de nossas escolhas.
34

As medicinas da floresta não escondem a doença, o sintoma, o medo: ao


congrá-las, o incômodo torna-se perceptível a partir de nossa matéria, nossa terra, de
maneira incontornável. A compreensão das sensações físicas, emocionais e mentais –
todas interligadas no Ser Humano de maneira holística – possibilita a expansão da
consciência anteriormente presa a um determinado parâmetro mental.

Vemos, assim, a experiência da dor, morte e doença para além do sofrimento. O


sofrimento é a constante repetição e revisitação de processos dolorosos que atravessam
nossas vidas. É o sofrimeito que dá espaço para o medo, o ódio e a autodestruição
surgirem em nossos pensamentos e hábitos.

É necessário um trabalho consciente partindo da própria pessoa para que a cura


seja realizada. Se remoemos esse sofrimento na Força do rapé, sentimos o corpo todo se
tornando desconfortável e até doloroso. Enquanto a limpeza não se manifesta, essas
doenças se tornam gradualmente impossíveis de serem ignoradas.

De fato, ignoramos nossas dores de diversas maneiras: convencendo-nos que


aquela dor precisa estar ali e não é possível se livrar dela, distraindo-nos com coisas que
nos anestesiam e estimulam outras partes do corpo, vitimizando-se, procurando causas
no mundo externo etc.

É claro que, vivendo na cidade, as possibilidades de distrações e hábitos são


muito mais variadas, tão variadas quanto as energias com as quais nos defrontamos.
Inalamos muitas toxinas pelo ar, pela comida, pelas interações do dia a dia, e mais
distante das naturezas nos vemos e nos sentimos. E, ainda assim, o Ser Humano
permanece absolutamente resiliente, desenvolvendo técnicas medicinais em todos os
campos, padrões mais altos de higiene e organização espacial.

Mesmo que muitos vivam em uma miséria material absurda, as possibilidades de


melhoria de vida são plenamente possíveis onde existe Amor, União e Cooperação,
independente das condições sociais. As misérias de espírito, de mente e os esgotos
emocionais podem estar presentes em qualquer situação material, de riqueza ou
pobreza. A “riqueza” do ouro possui abismos de absoluto sofrimento que nenhum
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dinheiro no mundo seria capaz de acabar. A riqueza financeira pode, sim, ser benéfica se
colocada em prol da Terra e da Humanidade, mas não paga sozinha uma passagem ao
paraíso.

Todas as riquezas verdadeiras da Terra nasceram dela mesma, na forma de


plantas, pedras, animais e de nós Seres Humanos, enquanto zeladores dessa criação. O
rapé, e todas as medicinas da floresta, é uma parte dessa riqueza quando olhamo-o com
o coração.

Quando começamos a entender o trabalho verdadeiro do rapé, vemos que vai


muito além de uma sensação física e limpeza. Todos os componentes, rezos, intenções,
curandeiros, parentes e grupos formam uma rede que trabalha em coletividade e é
sentida e agradecida por cada indivíduo. A força que desfrutamos quando nos
desarmamos de todos os nossos apegos, sofrimentos e distrações, simplesmente se
entregando à purificação dos nossos corpos é uma das pontas “finais” que liga todo esse
processo, toda essa corrente de vibração. O rapé, quando nos alinhamos com nosso Ser
sagrado, é a medicina da alegria e do respeito, pois nossa essência é essa alegria e esse
respeito.

Na floresta, esse estado de contentamento que o Universo harmonioso vibra é


facilitado externamento pela sabedoria da Terra, em seus ciclos, cores, sons, cheiros,
gostos...

Na cidade, no entanto a possibilidade de nos perdermos entre muros e paredes –


nossa matrix artificial – é um risco constante. As toxinas que permitimos que nos
adentrem não são parte de nós, mas nós as criamos e adotamos. Elas montam, junto com
tudo o que exise, as estruturas físicas, mentais e emocionais que nos aprisionam, como
labirintos metálicos de concreto em todas as direções.

Nessa matrix artificial é permitido, devido ao livre-arbítrio, pegar as riquezas da


natureza e transformá-las em veneno, desrespeitando nosso equilíbrio natural. Pegar
pedras, fundi-las em fogo e asfaltá-las sobre terra fértil é um cenário comum no
ambiente urbano; envenenar alimentos com agrotóxicos e processá-los, retirando todos
os benefícios nutricionais, mantado-os muito antes de chegarem às mesas; plantas
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medicinais, enteógenos e animais gananciosamente extraídos da natureza em troca de
dinheiro, doença e violência.

Solução Natural: Cultura Artesanal

É fundamental que o rapé se mantenha sempre artesanal, onde quer que seja
feito, para preservar suas qualidades espirituais e medicinais. Isso garante que o estudo
de cada curandeir_ se faça presente e consciente, em respeito à Natureza. Dentro dessa
energia, apresentar e levar o rapé de maneira igualmente respeitosa mantém a
coerência de todo o propósito dessa medicina na Terra. Um dos maiores males do tabaco
na história humana foi apresentá-lo a várias culturas do mundo após um processo
ganacioso de enfraquecimento da planta, e o isso deve ser evitado com qualquer
medicina sagrada. Felizmente, os indígenas de toda a América mantiveram vivas as
sabedorias que o tabaco, enquanto um mestre vegetal e espiritual, carrega em seu
trabalho na Terra. Essa ancestralidade ressoa na memória de milhões de seres humanos,
e muitos de nós tem uma história de relacionamento profunda com essa e outras plantas
ao longo de inúmeras existências terrestres. Um dia, todos os prazeres brotaram da
terra...

O rapé, junto com todas as alquimias vegetais, nos auxilia no nosso alinhamento
pessoal e cultural com a Terra. No caso dessa medicina,isso é feito de maneira muito
impactante física e mentalmente, o que o caracteriza como uma planta de poder, um
enteógeno, um veículo mediúnico ancestral, que nos permite entrar em contato com
nossos diversos planos da existência. Quando alinhados com a nossa verdade, nosso Eu
Superior, o tabaco intensifica a limpeza desse canal e protege contra qualquer energia
negativa. Nesse estado, lembramos que nossa própria Natureza está dentro de nós
mesmos.

Mesmo na cidade, essa Natureza interior pode ser alcançada, e o rapé não é o
único canal para isso. Qualquer elemento da natureza, quando o colocamos sabiamente
em nossas mãos, pode nos auxiliar a limpar nossos corpos vibracionais e nossas auras de
negatividade. O segredo é alinhar-se, sem medo, com o elemento que escolher e manter
o coração aberto para os seus aprendizados.
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Não há espaço para a vergonha ao aprender com uma planta: todos os Seres
Humanos fazem uso da matéria para crescer, seja pelos alimentos, pela arte, pelas
atividades físicas, pelas sensações físicas. A vida inteira é um aprendizado mútuo com
todos os elementos e forças com os quais nos envolvemos.

Na cidade, se nos propomos a utilizar o rapé, temos que estar conscientes de que
há mais trabalho energético envolvido do que na floresta. A necessidade de criarmos
uma energia harmoniosa durante e ao redor da aplicaçção se faz ainda maior do que
quando próximos à natureza. O rapé aumenta nossa sensibilidade física e pode baixar a
pressão sanguínea significativamente. Na Força dessa medicina, a mente se mostra com
muita nitidez e reatividade aos estímulo sensíveis e isso adquire muitas formas, das mais
densas às mais sutis. Mesmo os indivíduos que já acostumaram sua pressão ao rapé,
ainda são estimulados fortemente na glândula pineal, região foto-sensível do cérebro.
Por isso, momentos e ambientes livres de estresse são sempre fundamentais para a boa
saúde de um sopro.

Esse duplo trabalho das medicinas da floresta, a limpeza e ativação da


sensibilidade, agrada muitas pessoas que estão iniciando seu estudo com as medicinas e
a espiritualidade longe da natureza. Além de ir na direçã contrária da agressiva ilusão
urbana – frequentemente vestida de sujeira e apatia – também fornece uma ligação
direcionada à saúde a à união, que se revela tanto nas energias envolvidas na aplicação
quanto no encontro com a família humana caminhando, cada um à sua maneira, junto das
sabedorias indígenas. As vivências, rodas, rituais, feitios e oficinas possibilitam
reencontros em uma vibração de respeito e cura natural, um frequência ainda oculta
entre os inúmeros endereços.

O intercâmbio de pessoas, a troca de trabalhos, os cantos e rezos que


atravessam o continente para contarem suas histórias são todos parte da corrente que a
Força do rapé faz parte. São principalmente nas pessoas, em suas perceções, hábitos e
encontros que esse elemental da natureza encontra maneiras de cuidar do que está em
volta.
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O Rapé e a Mediunidade

Todos os seres humanos são médiuns, independente da natureza do trabalho


espiritual. “Médium” significa “meio” e diz respeito justamente à intermediação que
fazemos entre o Espírito e o mundo. O Ser Humano tem a qualidade especial de captar e
acionar as energias que estão ao nosso redor enquanto agimos no meio terrestre. Somos
o canal perfeito de ação sincronizada nesse mundo, servindo tanto aos trabalhos mais
bonitos de Amor e restauração, quanto ao mais grotesco, de acordo com as nossas
escolhas vibracionais.

Um médium em equilíbrio e com propósito elevado trabalha em cocriação


harmoniosa com os seres ao redor, suas próprias energias superiores (guias espirituais) e
as ferramentas que estão em seu alcance. Não é preciso realizar incorporações aos
moldes da Umbanda e da Mesa Branca de Kardec para se observar, de fato, como um
médium. Um curandeiro praticando Reiki, um músico cantando ou tocando sua flauta e
uma professora, esteja ela instruindo Yoga ou matemática em sua escola, está realizando
um trabalho mediúnico. A sofisticação desse trabalho só pode ser medida em relação ao
quão fluido é seu trabalho energético, o quanto sua intuição espiritual e veículo físico
estão alinhados para a execução daquela atividade.

As medicinas da floresta trabalham esse campo de ação, quer estejamos cientes


disso durante sua utilização ou não. Os espíritos dos vegetais ali presentes, os guias
espirituais e outros elementais da natureza são fortemente acionados e se aproximam
do trabalho realizado no plano humano. Estarmos conscientes desse processo é
fundamental para essa “fusão” de energias. Quanto mais nos comunicarmos em intento
com essas energias envolvidas, respeitando sua natureza e praticando a não intervenção
do Ego, mais o trabalho se torna fácil, fluido, menos obstáculos tanto o curandeiro
quanto os outros envolvidos encontrarão em seus processos.

O rapé, como já foi dito, pede esse respeito para preservar a limpeza e
funcionamento correto dos veículos humanos, culminando em limpezas acertadas e
forte regeneração de energia.
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Para que a cura se encaminhe bem, recomendamos algumas atitudes antes e


durante o sopro:
− Pedir licença aos guias espirituais e à pessoa que receberá o sopro;
− Manter a mente concentrada em palavras, cantos ou rezos positivos;
− Limpar sua ação de qualquer viés voltado puramente ao Ego
(reconhecimento, vaidade, competitividade, desconfiança), de modo a evitar qualquer
karma negativo gerado nessa ignorância;
− Estar presente durante e depois do sopro, atento para qualquer auxílio
necessário relacionado ao conforto e boa saúde das pessoas em tratamento;
− Agradecer pelo trabalho realizado, pessoas e energias envolvidas,
independente de como nosso corpo emocional reagir às situações.

Essas instruções são uma parte essencial do curandeirismo indígena, e podem


ser facilmente encontradas entre os princípios de todas as escolas terapêuticas
espiritualmente elevadas, novas e antigas. Esses princípios éticos se ampliam do
momento da aplicação para o ambiente, o território e o grupo de trabalho, pois a boa
saúde se expressa com mais ênfase de acordo com o alinhamento dessas coletividades.

A verdadeira mediunidade trabalha em direção a essa harmonia e,


consequentemente, o mesmo faz o rapé. Não se trata de ver cores, sair do corpo, ouvir
entidades, ler pensamentos, prever o futuro... Tudo isso pode acontecer de várias
maneiras, mas o trabalho espiritual das medicinas sagradas é muito mais profundo e
seus veículos humanos devem estar cientes que o princípio de suas intenções precedem
todas essas manifestações.

O rapé alinha os corpos humanos com as energias da natureza e os guias


espirituais, cristalizando todo o trabalho mediúnico a partir da cura do ser humano
enquanto um veículo de trabalho na Terra. Esse veículo é dado para que aprendamos
mais com a nossa jornada, e também para que cuidemos de nós mesmos, dos nossos
irmãos e do planeta porque não há separação entre nós. Um sopro mal executado pode
ser um risco a esse equilíbrio, pode abrir buracos energéticos que o trabalho das
medicinas, por si só, pode não ser apto a consertar.
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O estudo disciplinado do rapé permite que estejamos afinados com o trabalho


sensível de cura, originado na floresta, e abre caminhos para a percepção e caminhada
bem intencionada. A exposição mal direcionada a essa energia pode desencadear
processos pessoais que requerem atenção e cuidado, principalmente em ambientes
onde a energia é mais densa.

O rapé pode ser um forte elo com a natureza e seu potencial curativo que já
reside dentro de cada ser humano, assim como pode ser uma “válvula de escape”,
substituta de outros vícios, quando a intenção não é trabalhada coerentemente. Todos
os alimentos naturais que nutrem a alma também são tóxicos quando usados sem
discernimento, em excesso, e as medicinas da floresta não são exceção. O estudo da
autoaplicação e da consagração em grupo são “termômetros” que devem ser aliados às
observações pessoais para entendermos como as medicinas estão trabalhando em cada
momento, em cada situação. Alinhando-se e elevando-se as intenções, não há nada que
as medicinas tragam em si que seja incontornável, incompreensível ou
fundamentalmente danoso para ninguém.

A medicina sagrada é cura, é alegria, é a manifestação dos guias da natureza para


quem sabe verdadeiramente perceber e respeitar!

O Canto

Cantar, dançar, criar música são as formas mais poderosas de criar e expandir
energia em nossa existência humana. As medicinas da floresta participam dessa
cocriação inspirando imagens, palavras, sons e harmonias que são recebidas por nós.

Existem inúmeras canções que falam especificamente da força do rapé, da


ayhuasca, da sananga, e diversos cantos sagrados que fortalecem ou aliviam essa força.
As tradições indígenas sabem disso há gerações e se comunicam com essas forças
através de palavras e sons especiais para cada propósito. Os pajés, em seus estudos,
realizam diversas dietas e jornadas de meses e anos com esses vegetais para receber
seus cantos.
41

Listamos nessa obra, em anexo, alguns cantos populares que nos foram
permitidos publicar que falam da força do rapé.

Anexos:

Anexo 1:

Tabaco

A polêmica do tabaco continua sempre sem pesquisa científica aprofundada,


algo que busque entender como a mente afeta o estado de saúde de quem o fuma. Algo
que leve a sério a espiritualidade em seu sentido mais medicinal, como uma forma
natural de se lidar com a vida e as plantas.

Sim, o tabaco é uma planta. Um vegetal que primordialmente era usado como
uma "panacéia", isto é, que cura qualquer doença. É uma planta de ligação espiritual que
atrai e limpa energias. É uma medicina profundamente mediúnica, capaz de ajudar a
pessoa a se comunicar com os espíritos ancestrais e elementais da natureza.

Entretanto, todo positivo tem um negativo. Usado em uma energia de vício, ele é
um imã de energias que o puxam para a depressão, amargura e dão espaço para os mais
diversos males se manifestarem no corpo.

Tradicionalmente, tabaco é usado como um veículo de intenção e, por isso, o


rezo é tão enfatizado em suas cerimônias sagradas. O próprio cachimbo é um
instrumento de poder que trabalha com a força do tabaco. Passá-lo em roda é um sinal
de paz, igualdade e fraternidade, um hábito que abriu muitas portas ao longo da história
para comnicação e alianças harmoniosas, até entre não-índios. Muitos padres cristãos,
em suas missões pela América, evitaram mutos conflitos e construiram amizados ao se
familiazarem e respeitarem o uso do cachimbo sagrago.

Ligada à energia da limpeza e proteção, o tabaco fará exatamente isso com


qualquer coias a qual ele seja direcionado: pitar em paz afasta o caos, fumar em
42
ansiedade afasta a alegria.

A importância de não tragar

Um parente disse em uma roda, certa vez: "Antes do branco vir, a gente não tinha
uma palavra para 'vício'. Ninguém que estivesse cachimbando seria chamado de viciado,
nem ia pensar isso, porque o tabaco pra nós Kariri-Xocó sempre foi sagrado. Vício é
cachaça, é outras coisas... Não tem trabalho espiritual ali."

A polêmica do tabaco continua sempre sem pesquisa científica aprofundada,


algo que busque entender como a mente afeta o estado de saúde de quem o fuma. Algo
que leve a sério a espiritualidade em seu sentido mais medicinal, como uma forma
natural de se lidar com a vida e as plantas.

Sim, o tabaco é uma planta. Um vegetal que primordialmente era usado como
uma "panacéia", isto é, que cura qualquer doença. É uma planta de ligação espiritual que
atrai e limpa energias.

Tragar sua fumaça é a última coisa que alguém iria querer fazer... se o cigarro
industrializado (ou mesmo o tabaquinho "orgânico" que vendem na banca) é fraco o
bastante para alguém colocá-lo no pulmão, é porque o enfraqueceram. E uma planta de
poder fraca tende a atrair seu semelhante: a fraqueza. Pegue um dia aquele fumo de
corda bem escuro, que não teve nenhum processo de lavagem químico, e tentem
respirar essa fumaça. Depois de tossir uns 5 minutos e, possivelmente, vomitar, talvez a
pessoa até queira parar de tragar... foi o que aconteceu comigo.

Um pajé que solta sua fumaça sobre a pessoa, em um trabalho de cura, não está
dizendo para ela fumar, comprar seu tabaco etc. Ele está fazendo seu trabalho, naquele
momento específico, com o propósito de você sair dali fortalecido. Por outro lado, uma
indústria que quer seu dinheiro e, ao mesmo tempo, precisa colocar "MORTE" em todas
as embalagens de uma planta castrada de todas as suas propriedades benéficas... bom, é
43
bem claro o que ela quer de você.

A fumaça, se tragada, traz limpeza intensa: há algo dentro de si que está


machucando e precisa sair. Talvez um pensamento, uma emoção ou um alimento que
está tirando sua vitalidade. Essa limpeza é sentida até se a fumaça apenas ir à boca. Não
é possível sustentar um estado mental de raiva, frustração e insegurança na força do
tabaco. Ele pede mente limpa, canal limpo, entendimento e compaixão consigo e com os
outros ao seu redor. É um presente da Terra, junto às outras plantas medicinais, por isso
que cada fumaça solta deve ter uma intenção, um pensamento elevado, ou
simplesmente um silêncio pacífico. Se tragado no vicio, é um desrespeito consigo e com
ela.

Existem tradições que, inclusive, diferenciam o termo "pitar" ou "cachimbar


enquanto algo sagrado, do termo "fumar", que seria um vício.

Já pensou porque tem uns caboclos que vivem 100 anos "fumando" a vida
inteira? Ou mascam tabaco desde pequenos e tem todos os dentes branquinhos? Um
palpite é que a mente dessas pessoas nunca assimilou o tabaco como algo ruim e nunca
atraíram doenças para o corpo.

Antes de sair mergulhando no tabaco, um alerta: cada um é único em seu


aprendizado, cada um tem um karma para limpar com os próprios hábitos. Seja honesto
sobre suas intenções com essa planta (com todas as plantas), sobre como você se sente e
expanda sua consciência para além do próprio prazer. Somos estudantes do que
colocamos em nossa realidade com o propósito maior de se conhecer.

Tudo no mundo tem uma polaridade positiva e outra negativa. Não é diferente
com o tabaco e com todas as medicinas.

Anexo 2
44
Estudos dos tipos de rapé utilizados pelo povo Nuke Kuin

Rapé Vashawa - Rapé de Deus

Feito das cinzas da casca da árvore Vashawa, a árvore-dos-pajés do povo Nuke


Kuin (Katukina). Desde o surgimento, Kukapunhutxari, Deus, mostrou essa árvore aos
pajés como uma árvore sagrada. Os pajés foram orientados para tirar sua casca, que se
renova a cada 5 meses, queimá-la e misturar suas cinzas com o tabaco moído. Ela cura e
traz alegria, tira as doenças de toda a aldeia, de todo. Com a força desse rapé, o pajé
consegue ver tudo que a aldeia precisa, pois ele facilita o recebimento de informações
do mundo espiritual.

A árvore Vashawa, em si, é grande, é um pajé, e as sementes são seus filhos, suas
crianças. Os jovens que estão começando o trabalho espiritual para se tornarem
curandeiros Nuke Kuin tomam esse rapé pensando nos espíritos bons, em um futuro
melhor com suas família, em se conectar mais com as famílias. O Vashwa traz as
informações espirituais para essa concentração, para lembrar a cultura katukina, os pajés
que já se foram, os cantos e histórias de seu povo.

É um rapé dado por Deus - por isso, Rapé de Deus. Com ele, é difícil pegar
qualquer doença. Ele ajuda o índio e o não índio, principalmente se eles tomam
ayahuasca. Se não toma e se bebe bebidas alcoólicas, por exemplo, não adianta.

O rapé Vawashawa precisa ser rezado antes de soprado para abrir caminhos,
iluminar o corpo e orientar a pessoa para trabalhar na Luz. Ele ajuda a mudar os hábitos,
eliminar os vícios autodestrutivos, e a trazer para o bom caminho. Se for tomado com
medo, sem amor, com o coração fechado, não se recebe a força.

Ele precisa da permissão dos pajés para ser tomado, de modo que a pessoa possa
conhecer seu significado espiritual e cultural e, assim, estar alinhada com a medicina. Ele
deve ser tomado pela manhã, ao acordar, e antes de dormir para receber informações e
bons sonhos.

Não se conhece tradução de Vashawa para o português.


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Rapé Yonô (Tsunu)

O Yonô é uma árvore comprida com casca branca e grossa. Seu tronco é muito
liso e poucos seres o atacam. Se o atacam, morrem. O povo katukina usa apenas a casca
ou os galhos para fazer as cinzas, sem derrubá-lo. Depois de 3 meses, a casca volta a se
formar. Seu espírito e forte, assim como seu corpo, portanto dificilmente diversos
animais e espíritos chegam perto. Yonô significa “afasta espírito”.

Os pajés tomam esse rapé e afastam todos os espíritos maus que estão na
floresta ou na aldeia. É um rapé de cura, concentração e proteção. Quem o usa não se
atrela a espíritos ruins, então doenças e energias ruins não chegam perto - o Yonô desvia
as negatividades. Ele pode ser tomado a qualquer momento do dia com a intenção de
proteção.

Rapé Rowë (Mulateiro)

Rowë é uma árvore muito comprida, dura e os ventos não derrubam sua força. A
medida que envelhece, a cada 3 meses, seu tronco naturalmente descasca, ficando liso e
verde.

É um rapé de cura que limpa o corpo assim como a árvore faz consigo mesma. A
pessoa fica “lisa”, então nem picada de mosquito nem doença pode atacá-la. A força
desse rapé deixa a pessoa igual à árvore, daí a sua força.

Rapé Akô (Cumaru-de-Cheiro)

É uma árvore muito boa para construção de casas devido a sua dureza. Assim
como o Rowë, a cada 3 meses ela descasca e fica lisa. Ela solta muita semente e é muito
fácil encontrar suas mudas pela floresta. Sua casca não é queimada, mas sim ralada e
misturada com o tabaco moído, pilados e misturados na mesma proporção.
46
O seu cheiro limpa o corpo das pessoas. Quando a pessoa o sente, ela pode se
limpar por dentro a partir do estômago. Por isso, é normal a pessoa vomitar com sua
força.

É uma árvore ligado à força feminina, principalmente por causa de seu cheiro.
Como as mulheres costumam ser mais cheirosas do que os homens, ele se alinha muito
bem com o feminino. Quem o sopra se abre mais para o amor. Torna-se mais fácil de
entender como cuidar do companheiro ou da companheira. Se a pessoa está solteira,
ensina como cuidar da família, principalmente da mãe, e pode ajudar, inclusive, a atrair
uma parceira.

Os pajés homens não usam esse rapé para não misturar as energias de seu
trabalho espiritual. Eles podem fazer o rapé, assim com as mulheres, mas eles não o
tomam. As mulheres, quando começam a dieta do rapé (iniciação para ancorar o espírito
da medicina sagrada e soprá-la), fazem-no com o Akô. Os homens usam Vashawa, Rowë
ou Yonô. Durante muitos anos, não haviam mulheres pajés entre os Katukina, mas isso
felizmente está mudando com algumas novas iniciações feminina recentes no trabalho
espiritual.

O Akô também é muito ligado à fertilidade, ajudando as mulheres a ter muitos


filhos e vários maridos ou namorado, um costume normal entre os Nuke Kuin. Além
disso, auxilia as pessoas a terem mais longevidade.

Anexo 3
47
Canções do Rapé

Observação: todas as autorias foram retiradas desse livro para


proteger aqueles conectados às medicinas da floresta. Para encontrar
os autores das canções, uma pesquisa na internet ou entre os txais será
o bastante.

Força do Rapé

Tom: G
[Introdução] Em Am B7

Em
É a força do Rapé
quero ver quem vai ficar de pé
Em
Senta para levantar
o espirito do alto olhar
Em
Quem é o eu da questão
é o eu da imensidão

Em
Quem desperta faz brilhar
Am B7 Em
o espirito do alto olhar

Em
Quem desperta faz brilhar
Am B7 Em
o espirito do alto olhar
48

( Em Am B7 )

Em
É a força do Rapé
quero ver quem vai ficar de pé
Em
Senta para levantar
o espirito do alto olhar
Em
Quem é o eu da questão
é o eu da imensidão

Em
Quem desperta faz brilhar
Am B7 Em
o espirito do alto olhar
Em
Quem desperta faz brilhar
Am B7 Em
o espirito do alto olhar

O Sopro do Rapé

Na força da mata eu tomo meu rapé ||


para me limpar para me proteger ||

Nos olhos da grande Águia Dourada ||


Sou o corvo negro e vou voar também ||

Eu vou seguindo neste caminho ||


Quem vai me guiando não me deixa sozinho ||
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Salve essa Força, a Força do Rapé ||
Que tem como Mestre Caboclos e Pajés ||

Dume Deshke Rezado

Abro o rezo do Rapé


Chamando os espiritos dos pajés
Os encantados de yuxibu
No sopro sagrado Dume Putu

Chega a cura espiritual que vem lá do astral


Da floresta encantada
No rezo da medicina sagrada

Vem limpando os pensamentos


Trazendo discernimento
Curando o corpo e a alma
Na força da jibóia e da onça pintada
Medicina ancestral
Cura as panemas e todo mal
Fortalecendo a imunidade
E abrindo a mediunidade

Pau pereira, tsunu, parica, cumaru, emburana e mulateiro


Cinzas dos índios guerreiros

É a força do pai tabaco


Dume Deshke rezado
Neste rezo do Rapé
Com as bênçãos dos pajés

Ne a ne ne a ne...
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A Sagrada Medicina
O cachimbo traz a força
O tabaco traz a cura
A fumaça leva o intento
E a Terra cura, e a Terra cura

Vou seguindo essa trilha


Um caminho natural
Vou guiado pela chama
Dessa força ancestral

E essa força vem de dentro


Lá do meu interior
É o que liga meu intento
Com a fonte do amor

O cachimbo traz a força


O tabaco traz a cura
A fumaça leva o intento
E a Terra cura, e a Terra cura

Minha oração é com a chanduca


Minha cura é com o rapé
Purifica minha alma
E limpa da cabeça aos pés

Da floresta vem a força


É a luz que me ilumina
Agradeço aos caboclos
A Sagrada Medicina
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O cachimbo traz a força


O tabaco traz a cura
A fumaça leva o intento
E a Terra cura, e a Terra cura

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