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FORMAÇÃO PROFISSIONAL NA MODALIDADE EaD: influências pós-

modernas e os desafios para a atuação do Assistente Social na atualidade

Marcos Felipe Zanella1


Maryanne da Silva. Rodrigues2

RESUMO: Este trabalho tem como objetivo discutir alguns elementos e discursos da
pós-modernidade que incidem sobre a formação profissional dos/das assistentes sociais
nos dias atuais no que diz respeito ao ensino superior na modalidade de ensino à
distância (EaD). Abordaremos como o pós-modernismo, sob a reiteração massiva de
uma hiperindividualização, cria um terreno fértil para a legitimação dos ideais
neoliberais, sobretudo, no campo educacional, que refletem, consequentemente, na
prática profissional do Serviço Social. Cabe apontarmos que o pós-modernismo é um
movimento intelectual novo com velhas ideologias que não transpõe a teoria Moderna,
pois, não ocorreu um processo de ruptura, mas sim uma reordenação do modelo
existente, onde tem-se uma análise aparente e imediatista do indivíduo. Ou seja,
fragmenta-se a realidade na qual o homem está vinculado e passa-se a analisar
isoladamente aquele determinado problema sem entender suas complexidades. Em um
primeiro momento, discutiremos os aspectos gerais quanto ao embate do moderno e do
pós-moderno tendo como foco os métodos de análise da realidade. Em seguida, faremos
uma análise com relação à formação profissional na modalidade de ensino à distância
(EaD) e suas influências sobre a prática profissional. Diante dessas particularidades, o
campo da educação sofre ataques sistêmicos no seu interior, e a formação profissional
em Serviço Social, seja pelo modo presencial, mas em sua maioria pela EaD também
está vinculada à essas novas configurações, tendo em vista a massiva expansão das
discussões pós-modernas de supervalorização do “ser individual” e das identidades,
apontando causas e soluções das expressões da “questão social” apenas no campo das
aparências, rechaçando suas determinantes históricas.

Palavras-chave: Ensino à distância. Formação profissional. Pós-modernidade. Prática


profissional.

1
Marcos Felipe Zanella graduando do curso de Serviço Social na Universidade Federal da Paraíba.
Contato: socram_zanella@hotmail.com
2
Maryanne da Silva Rodrigues graduanda do curso de Serviço Social na Universidade Federal da
Paraíba. Contato: jeetvous@hotmail.com

ANAIS DA III JORNADA NE DE SERVIÇO SOCIAL 2017 – ISSN 2358-0275


1. INTRODUÇÃO

O Serviço Social ao longo de sua existência buscou consolidar-se enquanto uma


profissão emancipada e destituída das raízes de cunho conservador que a direcionava.
Na década de 1960 vivenciamos um processo de intensão de ruptura que foi deflagrado
pela conjuntura militarizada que vivenciava o Brasil e a América Latina. Porém, entre
as décadas de 1970/80 o movimento de reconceituação que buscava a ruptura com o
Serviço Social tradicional ganha força e se legitima sob uma nova fundamentação
teórico-prática - ao apropriar-se da teoria marxista e utilizar novas formas de
intervenção social - e se reconhece enquanto uma profissão de caráter sócio-político e
interventivo, cujo o principal elemento de trabalho são as expressões da questão social.
É inegável que o Serviço Social não rompe totalmente com o conservadorismo, tendo
em vista que algumas práticas e teorias tradicionais ainda permanecem enraizadas na
profissão e ganham mais espaço com o movimento intelectual pós-moderno que
reordena um modelo existente tendenciado por práticas conservadoras.
Em um primeiro momento, discutiremos os aspectos gerais quanto ao embate do
moderno e do pós-moderno tendo como foco os métodos de análise da realidade. Em
seguida, faremos uma análise com relação à formação profissional na modalidade de
ensino à distância (EaD) e suas influências sobre a prática profissional. Findaremos a
nossa explanação relacionando como a precarização da reflexão teórica utilizada na
modalidade EaD influencia os profissionais do Serviço Social a terem práticas
profissionais não articuladas a dimensão de totalidade, mas sim a uma análise
fragmentada da sociedade.

2. Serviço Social e EaD: formação profissional sob risco


ANAIS DA III JORNADA NE DE SERVIÇO SOCIAL 2017 – ISSN 2358-0275
Os ideais neoliberais que adentraram o país na década de 1990 não apenas
pregam a reformulação de um plano econômico, mas assumem a característica de uma
nova ideologia de tendência global (LAURELL, p.152). Sendo assim, cabe-nos
entender que todas as dimensões da sociedade – políticas, ideológicas, culturais – são
sistematicamente modificadas a fim de atenderem os anseios do mercado. Não obstante,
a educação brasileira também é um importante alvo do projeto neoliberal,
principalmente no que diz respeito à reificação da lógica mercantilista pela qual as
políticas sociais brasileiras transitam. Neste ponto, analisaremos como o ensino
superior, na modalidade de ensino à distância (EaD), contribui para legitimar a
hegemonia dominante, bem como tratar dos efeitos disto na formação profissional em
Serviço Social.
O acesso à educação superior, no Brasil, passou por uma expansão expressiva ao
longo dos últimos anos. Por outro lado, entretanto, ao passo que a “democratização”
deste acesso foi notória, foi possível perceber que as empresas educacionais tiveram
lucros exorbitantes através de alguns programas governamentais de acesso ao ensino
superior (FIES, PROUNI, por exemplo).
Por conseguinte, cabe aqui ressaltar que a lógica neoliberal se faz presente,
tendo em vista que houve a diminuição do uso do fundo público para a efetivação de
políticas educacionais públicas que garantam acesso universal em detrimento de outras
formas de entrada no ensino superior realizada através de financiamentos ou outras
formas estreitamente ligadas à lógica mercantil. Segundo o CFESS:
Esse largo período está pautado em particularmente dois eixos:
manutenção e aprofundamento do setor privado mercantil como
hegemônico no setor, fortalecendo novos nichos de mercado para o
capital; utilização da modalidade de EaD como estratégia para a
ampliação do acesso de camadas da população a este nível de ensino,
das estatísticas educacionais e do consenso em torno de um projeto
societário baseado em uma sociabilidade individualista e voltada para
atender às necessidades mercantis (CFESS, 2011, p. 15)

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Consequentemente, a partir da ampla mercantilização do ensino superior, a formação
profissional dos/das estudantes de Serviço Social apreendida nessas instituições de ensino é
amplamente precarizada e vem sendo redefinida, reassumindo velhas práticas conservadoras em
que a individualização das expressões da questão social – ressaltamos aqui a influência pós-
moderna do recorte individual para a identificação/solução dos problemas sociais - é acentuada
através de políticas sociais focalizadas e seletivas. De acordo com o CFESS,

[...] apreende-se que a modalidade de EaD não atende às necessidades


reais da maior parte da população brasileira - inserida no mundo do
trabalho na condição de classe trabalhadora -, tanto de ter acesso ao
ensino superior de qualidade, público e gratuito, quanto de ser
atendida, no âmbito dos serviços sociais públicos e privados, por
profissionais de serviço social, formados/as de forma solidamente
qualificada nas dimensões teórico-metodológica, ético-política e
técnico-operativa. (CFESS, 2011, p. 34)

A massificação do ensino superior intrinsecamente ligada aos anseios do


mercado não caminha ao lado de uma formação político-profissional crítica que esteja a
par de um projeto de sociedade livre e emancipada. Estendendo nossa crítica para além
do Serviço Social discutido dentro do ensino à distância, faz-se importante saber que
nossa profissão vem ao longo da história afirmando seu campo de atuação nas esferas
públicas e privadas, legitimando-se socialmente e junto aos/às usuários e usuárias,
fortalecendo desse modo um projeto profissional que atualmente ultrapasse uma
dimensão puramente técnico-operativa, pois
Os projetos profissionais apresentam a autoimagem de uma profissão,
elegem os valores que a legitimam socialmente, delimitam e priorizam
os seus objetivos e funções, formulam os requisitos (teóricos,
institucionais e práticos) para o seu exercício, prescrevem normas para
o comportamento dos profissionais e estabelecem as balizas da sua
relação com os usuários de seus serviços, com as outras profissões e
com as organizações e instituições sociais, privadas e públicas (entre
estas, também e destacadamente com o Estado, ao qual coube,
historicamente, o reconhecimento jurídico dos estatutos profissionais).
(NETTO, 1999, p. 95)

3. Reflexos pós-modernos na prática dos/das Assistentes Sociais

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Proferir sobre prática profissional demanda retroceder historicamente e analisar não
apenas o indivíduo em sua subjetividade, mas também a sua formação profissional e as
condicionantes que contribuíram para a mesma. Para que isto fosse realizado
estabelecemos anteriormente uma breve contextualização de alguns elementos que serão
discutidos neste ponto. No que compete a prática do assistente social, esta será
tendenciada em sua grande maioria pela corrente teórica que irá nortear a formação. O
que se percebe com as novas modalidades de ensino – ampliadas desde os anos 1990 - é
que a prática profissional vem sendo cada vez mais desresponsabilizada e tendenciada
ao pós-modernismo devido aos vários fatores intrínsecos durante a formação, dentre os
quais destacamos a flexibilização teórica e a carência da supervisão no campo do
estágio.
Diante desta perspectiva, a ação do assistente social que teve uma formação
profissional fragilizada, acrítica e despolitizada possivelmente não condizirá com os
preceitos da teoria marxista, mas, estará tendenciado a vertente pós-moderna. O que
implica na formação destes novos profissionais além de tratar o usuário como alguém
que necessita de alguma ajuda (e não como um ser humano de direito que está inserido
dentro de uma hegemonia voltada a corresponder cada vez mais lógica neoliberal), é
corroborar com a lógica capitalista de expropriação da força de trabalho.
Desta forma, percebemos que a perda da consciência de classe destes
profissionais enquanto interventores sociais, gerará uma fragmentação na profissão
entre os que tiveram uma formação continuada voltada para método marxista - com
produção prática e teórica articulada as tendências metodológicas do Serviço Social, e
os que tiveram fragilidades durante a formação na qual se utilizam de métodos ecléticos,
na maioria das vezes tendenciados pelo movimento Pós-moderno.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

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O processo de formação dos/das Assistentes Sociais inseridos nas modalidades
de ensino à distância vem sendo duplamente tensionado: seja pelo perfil das pessoas
recém formadas, seja pela qualidade e relevância dos conteúdos discutidos no decorrer
deste processo. Contudo, segundo o CFESS,
A expansão do ensino superior privado ligeiro presencial ou à
distância, com o suporte na LDB e forte apoio institucional do
Ministério da Educação ao longo de seguidos governos ocorre
para configurar nichos de valorização do capital médio num
período em que o capitalismo promove uma intensa
oligopolização do capital, com tendências de concentração e
fusão de capitais, e dificuldades de investimento produtivo e de
valorização. Constitui ainda uma via deacesso ao fundo público
e ao crédito, a exemplo dadiscussão acerca do apoio do BNDES
a essas instituições, na perspectiva da valorização e do suporte
ao lucro privado fácil e rápido, tendência esta que vem
crescendo no contexto da recente crise.Trata-se da introdução de
tecnologia capital intensiva para o treinamentoem grande escala
e baixo custo – nesse caso os tutores e congêneres são super -
explorados -, em curto espaço de tempo, com alta lucratividade.
(CFESS, 2011, p. 7)

Pelo exposto ao longo deste trabalho, entendemos que o capitalismo


contemporâneo, a partir dos discursos idealizados pós-modernos acerca da “superação
do moderno” introjeta e fortalece as diretrizes do projeto neoliberal no curso da
sociedade, seja no campo da política, seja no campo ídeo-cultural, seja no da economia.
Particularmente, o campo da educação sofre ataques sistêmicos no seu interior, e a
formação profissional em Serviço Social, seja pelo modo presencial, mas em sua
maioria pela EaD também está vinculada à essas novas configurações, tendo em vista a
massiva expansão das discussões pós-modernas de supervalorização do “ser individual”
e das identidades, apontando causas e soluções das expressões da “questão social”
apenas no campo das aparências, rechaçando suas determinantes históricas.
Sabendo dos compromissos do Serviço Social, profissão diretamente ligada às
lutas históricas da classe trabalhadora, e da importância das lutas coletivas em defesa de
uma sociedade livre e emancipada, cabe-nos resistir e reacender o sonho possível de um
novo tipo de sociabilidade.

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REFERÊNCIAS

CANTALICE, Luciana B. de O. As incidências Pós-modernas na Produção do


Conhecimento em Serviço Social. Rio de Janeiro: PPGSS/UERJ, 2013. 300p.

CONSELHO REGIONAL DE SERVIÇO SOCIAL. Notas do CRESS sobre o


EaD.Disponível em <http://www.cress-
es.org.br/site/index.php?option=com_content&view=article&id=404:confira-a-nota-do-
cress-17-sobre-o-ead&catid=42:direto-do-conselho&Itemid=86>, acesso em
05/06/2016.

LAURELL, Asa Cristina. Avançando em Direção ao Passado: a política social do


neoliberalismo. Estado e Políticas no Neoliberalismo. São Paulo: Cortez, 1995.

NETTO, José Paulo. Entrevista Moderno e Pós-moderno. Disponível em


<www.scielo.br/pdf/tes/v9n2/10.pdf> acesso em 04/06/2016.
__________________A construção do projeto ético-político do Serviço Social frente
à crise contemporânea. In: Programa de Capacitação em Serviço Social e política
social. Brasília: Cead, 1999. Módulo 1.

____________________ Transformações societárias e Serviço Social – notas para


uma análise perspectiva da profissão no Brasil. IN: Serviço Social & Sociedade. nº 50
Ano XVII (abr.). SÃO PAULO: Cortez, 2003. Pp. 87-132.

SOUZA, Maria A. Serpa. A importância da tradição Marxista para o Serviço Social.


Disponível em <http://revista.uepb.edu.br/index.php/qualitas/article/view/417/322>,
acesso em 07/06/2016.

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