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CONCEITOS, CARACTERÍSTICAS E DESACORDOS NO TERCEIRO


SETOR.
* Rodrigo Mendes Pereira

I – Introdução.

Como ponto inicial, destaca-se que o Terceiro Setor é um campo e um conceito


recentes, que vêm sendo objeto de inúmeras discussões. Desta forma, como estamos no
início do processo de conhecimento das características, dos elementos e da própria
essência e lógica do Terceiro Setor, não existe unanimidade no tocante a seu conceito e
abrangência, e isto inclusive porque os conceitos variam conforme a ênfase dada a um
dos elementos ou características do Terceiro Setor, tais como: diferenciação dos “outros
setores”, abrangência, finalidade ou natureza jurídica das organizações que o compõem.

Pretende-se, num primeiro momento, tratar a questão da forma mais abrangente


possível, trazendo ao leitor informações que o levem a uma reflexão sobre o tema, ou
melhor, que o leve a chegar a suas próprias conclusões. Em síntese, serão desenvolvidos
os seguintes aspectos: conceitos (jurídicos e não-jurídicos) e características do
Terceiro Setor; metodologias e critérios para a identificação e classificação das
organizações sem fins lucrativos, levando em conta os dois principais estudos e
pesquisas existentes em nosso país (FASFIL e Mapa do Terceiro Setor); e a maneira
como a Constituição Federal e o Código Civil identificam e denominam as
organizações sem fins lucrativos.

Já nas conclusões, serão noticiados alguns pontos de consenso e desacordo na


identificação das organizações que integram o Terceiro Setor, assim como o autor
ofertará seu próprio conceito de Terceiro Setor.

II – Conceitos, Elementos e Características Gerais do Terceiro Setor.

Buscando ser didático, abaixo serão transcritos conceitos, elementos e


características ofertados por vários autores e organizações. Frise-se que a compilação
dos conceitos e elementos tem como finalidade possibilitar ao leitor um fácil acesso aos
vários posicionamentos e pontos de vista , assim como introduzi-lo nesse recente campo
de conhecimento que está em contínuo processo de busca e consolidação de sua
identidade.

Segundo Luiz Carlos Merege (1999), pesquisador e coordenador do CETS –


Centro de Estudos do Terceiro Setor – da EAESP/FGV, em seu artigo denominado “O
Papel do Terceiro Setor na Estrutura de uma Nova Sociedade”: “A denominação de
Terceiro Setor para as atividades da sociedade civil surge de uma análise mais
profunda das atividades organizadas por iniciativa da sociedade civil que as distingue
das outras atividades econômicas. Recebeu essa denominação por englobar atividades
que não estão dentro da órbita de atividades governamentais e muito menos se
identificam com as atividades privadas, sejam do setor agrícola, industrial ou do setor
de serviços, como são tradicionalmente definidas pela metodologia das contas
nacionais. São organizações que não têm as características de apropriação privada de
lucros, que prestam um serviço público e que sobrevivem basicamente da transferência
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de recursos de terceiros, sejam famílias, governo ou empresas privadas. Por não se


enquadrarem dentro das categorias das atividades estatais ou das atividades de
mercado, passaram a ser identificadas como um Terceiro Setor.” (MEREGE, 1999)

Mário de Aquino Alves (2001), também pesquisador do CETS da


EAESP/FGV, em seu artigo denominado “Perfil da Captação de Recursos no Brasil”,
além de ofertar sua própria definição para o Terceiro Setor, explicita e tece algumas
considerações críticas aos conceitos propostos pelos seguintes estudiosos: Lester
Salamon, pesquisador da Johns Hopkins University e pioneiro na mensuração do
Terceiro Setor em nível mundial, e Rubem César Fernandes, antropólogo, secretário
executivo do ISER e do Viva Rio.

“A utilização do termo “Terceiro Setor” faz emergir a idéia que existe um


“Primeiro Setor” (Estado) e um “Segundo Setor” (Mercado). Desta forma, uma
definição primária associa o Terceiro Setor às atividades simultaneamente não-
governamentais e não lucrativas.
(...)
Um conceito mais elaborado de Terceiro Setor nos é fornecido por
FERNANDES, que o identifica como sendo:
“um conjunto de iniciativas particulares com um sentido público (...) encontramos uma
variedade de prestadores de serviços que não costumam ser incluídos nos diretórios
convencionais dos ‘agentes não-governamentais’. Muitos não estão sequer registrados em
qualquer instância jurídica. Trabalham à margem dos controles formais. Outros têm registros
institucionais, mas não distinguem entre os serviços com a clareza analítica que se espera das
agências civis.”

Já o pesquisador da Johns Hopkins University, Lester Salamon, preferiu


desenvolver um conceito mais restrito que possibilitasse a mensuração do fenômeno em
escala mundial.

“Embora a terminologia utilizada e os propósitos específicos a serem perseguidos variem de


lugar para lugar, a realidade social subjacente é bem similar: uma virtual revolução associativa
está em curso no mundo, a qual faz emergir um expressivo ‘terceiro setor’ global, que é
composto de: (a) organizações estruturadas; (b) localizadas fora do aparato formal do Estado;
(c) que não são destinadas a distribuir lucros auferidos com suas atividades entre os seus
diretores ou entre um conjunto de acionistas; (d) autogovernadas; (e) envolvendo indivíduos
num significativo esforço voluntário”.

Esta última definição, embora bastante útil para os pesquisadores que


pretendam avaliar o tamanho e o peso que o setor tem na economia e na sociedade,
incorre na seguinte distorção: ao restringir a composição do setor a organizações
estruturadas, o autor americano dá uma ênfase maior na parte “formal” do Terceiro
Setor, negligenciando um aspecto importante do associativismo que é a possibilidade
da geração de ações informais e espontâneas. No nosso entendimento, este é um
aspecto que não pode ser negligenciado.

Da análise do dois conceitos, gostaríamos de oferecer à apreciação um conceito


de Terceiro Setor que nos parece mais abrangente e explicativo:

Terceiro Setor é o espaço institucional que abriga um conjunto de ações de


caráter privado, associativo e voluntarista, geralmente estruturadas informalmente,
voltadas para a geração de bens e serviços públicos de consumo coletivo; se ocorrer
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excedentes econômicos neste processo, estes devem ser reinvestidos nos meios para a
consecução dos fins estipulados.” (ALVES, 2001)

Rubem César Fernandes (1997), já citado acima, também traz uma síntese
sobre o Terceiro Setor, onde ressalta que um processo de mutação vem tentando
compatibilizar as divergências entre os elementos que o compõem.

“Em resumo, pelo que foi visto até aqui, pode-se dizer que o Terceiro Setor é
composto por organizações sem fins lucrativos, criadas e mantidas pela ênfase na
participação voluntária, num âmbito não-governamental, dando continuidade às
práticas tradicionais da caridade, da filantropia e do mecenato e expandindo o seu
sentido para outros domínios, graças, sobretudo, à incorporação do conceito de
cidadania e de suas múltiplas manifestações na sociedade civil (Fernandes, 1995 e
1996a).

Essa definição soa um tanto estranha porque combina palavras de épocas e de


contextos simbólicos diversos, que transmitem, inclusive, a memória de uma longa
história de divergências mútuas. A filantropia contrapôs-se à caridade, assim como a
cidadania ao mecenato. São diferenças que ainda importam mas que parecem estar em
processo de mutação. Perdem a dureza da contradição radical e dão lugar a um jogo
complexo e instável de oposições e complementaridades. Não se confundem, mas já não
se separam de todo tampouco. Recobrem-se parcialmente, alterando situações de
conflito, de cooperação e de indiferença. A irmã de caridade que defende sua creche
como uma “ação de cidadania” ou o militante de organizações comunitárias que
elabora projetos de mecenato empresarial tornam-se figuras comuns.” (FERNANDES,
1997, p. 27)

Dando continuidade a essa linha que enfatiza a heterogeneidade e as


contradições do Terceiro Setor, Maria da Glória Marcondes Gohn, pesquisadora da
UNICAMP, citada na dissertação de mestrado de Carvalho (2002) e da qual foi a
orientadora, elabora a seguinte caracterização que se torna adequada para definir o
Terceiro Setor:

“o terceiro setor é um tipo de ‘Frankenstein’: grande, heterogêneo, construído


de pedaços, desajeitado, com múltiplas facetas. É contraditório, pois inclui
tanto entidades progressistas como conservadoras. Abrange programas e
projetos sociais que objetivam tanto a emancipação dos setores populares e a
construção de uma sociedade mais justa, igualitária, com justiça social, como
programas meramente assistenciais, compensatórios, estruturados segundo
ações estratégico-racionais, pautadas pela lógica de mercado. Um ponto em
comum: todos falam em nome da cidadania.(...) O novo associativismo do
terceiro setor tem estabelecido relações contraditórias com o ‘antigo’
associativismo advindo dos movimentos sociais populares (na maioria urbanos)
dos anos 70 e 80. (2000, p. 60, 74).” (CARVALHO, op. cit., p. 44)

Por sua vez, Rosa Maria Fischer (2002), pesquisadora e diretora do CEATS –
Centro de Empreendedorismo Social e de Administração do Terceiro Setor – da
FIA/FEA/USP, propõe um conceito amplo, fundamentado na linha de pensamento
americana preconizada por Lester Salamon, e que é capaz de envolver e retratar toda a
diversidade do Terceiro Setor.
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“Terceiro Setor é a denominação adotada para o espaço composto por


organizações privadas, sem fins lucrativos, cuja atuação é dirigida a finalidades
coletivas ou públicas. Sua presença no cenário brasileiro é ampla e diversificada,
constituída por organizações não-governamentais, fundações de direito privado,
entidades de assistência social e de benemerência, entidades religiosas, associações
culturais, educacionais, as quais desempenham papéis que não diferem
significativamente do padrão conhecido de atuação de organizações análogas em
países desenvolvidos. Essas organizações variam em tamanho, grau de formalização,
volume de recursos, objetivo institucional e forma de atuação. Tal diversidade é
resultante da riqueza e pluralidade da sociedade brasileira e dos diferentes marcos
históricos que definiram os arranjos institucionais nas relações entre o Estado e o
Mercado.

Os principais componentes do nonprofit sector americano – freqüentemente


utilizado como parâmetro para compreensão do setor em outros países – podem ser
encontrados na caracterização do Terceiro Setor no Brasil. Segundo a definição
“estrutural/operacional” de Salamon e Anheir (1992), utilizada por Landin, essas
organizações caracterizam-se por serem privadas, sem fins lucrativos, formais,
autônomas e incorporarem algum grau de envolvimento de trabalho voluntário.
Entretanto, o conceito de que tais organizações, em virtude dessas características
comuns, constituem um “setor” diferenciado do tecido social, não está suficientemente
consolidado, nem no ambiente acadêmico nem no universo das práticas cívicas,
associativas e de solidariedade. Pode-se detectar desde manifestações de desconfiança
e rejeição, até o simples estranhamento na adoção de um conceito que, para abranger
a amplitude e a diversidade da realidade que busca definir, tende a ser genérico e
impreciso. O próprio nome atribuído a este espaço é alvo de uma disputa nas quais
competem, mais do que conceitos e tradições acadêmicas, visões de mundo, valores e
identidades dos próprios envolvidos nessas organizações. Assim, não-governamental,
sem fins lucrativos, da sociedade civil, filantrópica e beneficente são termos que
dividem os corações e mentes dos profissionais, militantes e voluntários que atuam
nesse espaço.” (FISCHER, 2002, p. 45/46)

III – Metodologia para a Identificação e Classificação das Organizações do


Terceiro Setor.

Antes de se apresentar conceitos de autores que por sua formação enfatizam o


aspecto jurídico, oportuno se torna trazer ao leitor dois estudos e pesquisas nacionais,
que objetivam dimensionar – mensurar e classificar – o Terceiro Setor no Brasil, e cujas
metodologias são baseadas em critérios e classificações internacionais, e isto porque
eles visam possibilitar a comparação dos dados em perspectiva nacional e internacional.
Especificam-se, agora, os estudos e pesquisas abordados:

a) As Fundações Privadas e as Associações Sem Fins Lucrativos no Brasil:


2002, que foi identificado pela sigla FASFIL, realizado pelo Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística – IBGE - e pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada –
IPEA -, em parceria com a Associação Brasileira de Organizações Não-Governamentais
– ABONG - e o Grupo de Institutos, Fundações e Empresas – GIFE -, que teve e tem
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como objetivo apresentar um retrato mais completo das instituições privadas sem fins
lucrativos que atuam no Brasil.

b) Mapa do Terceiro Setor, que foi identificado pelo termo MAPA, realizado
pelo Centro de Estudos do Terceiro Setor – CETS – da Fundação Getúlio Vargas – FGV
-, com apoio da Fundação Salvador Arena e da Fundação Orsa e colaboração de
diversas organizações da sociedade civil, que tem como meta construir uma ampla base
de dados sobre o Terceiro Setor no Brasil, que sirva como referência nacional e
internacional de consulta, e promover o intercâmbio de experiências entre as
organizações sociais.

O dois estudos, em linhas gerais, seguiram duas etapas. A primeira objetivou


definir e identificar quais seriam as organizações ou entidades sem fins lucrativos que
integram o Terceiro Setor. Para tanto, ambos os estudos utilizaram a metodologia do
“Manual sobre as Instituições Sem Fins Lucrativos no Sistema de Contas Nacionais
(“Handbook on Nonprofit Institutions in System of National Accounts”), elaborado pela
Divisão de Estatísticas da Organização das Nações Unidas – ONU - e recomendado por
ela a seus membros, e que tem como base o preenchimento simultâneo de cinco critérios
que serão abaixo explicitados.

A segunda etapa dos estudos envolve a classificação das organizações ou


entidades enquadradas como “sem fins lucrativos”.

Assim, se a primeira etapa define o que as organizações sem fins lucrativos têm
em comum, a segunda etapa especifica de que forma, dentro do universo das entidades
“sem fins lucrativos”, elas se diferenciam uma das outras, levando em conta suas
finalidades ou atividades principais.

IV – Identificação ou Definição das Organizações do Terceiro Setor: Critérios para


a Inclusão ou Exclusão.

Segundo os estudos, que, frise-se, utilizaram a metodologia acima especificada,


para ser caracterizada como sem fins lucrativos e integrar, assim, o Terceiro Setor, a
organização ou entidade deve preencher, simultaneamente, cinco critérios ou
requisitos, assim explicitados pelo FASFIL:

“(i) privadas, não integrantes, portanto do aparelho de Estado;

(ii) sem fins lucrativos, isto é, organizações que não distribuem eventuais
excedentes entre os proprietários ou diretores e que não possuem como razão primeira
de existência a geração de lucros – podem até gerá-los desde que aplicados nas
atividades fins;

(iii) institucionalizadas, isto é, legalmente constituídas;

(iv) auto-administradas ou capazes de gerenciar suas próprias atividades; e

(v) voluntárias, na medida em que podem ser constituídas livremente por


qualquer grupo de pessoas, isto é, a atividade de associação ou de fundação da
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entidade é livremente decidida pelos sócios ou fundadores.” (As Fundações privadas e


as associações sem fins lucrativos no Brasil: 2002, 2004, p. 15)

Embora ambos os estudos tenham utilizado a mesma metodologia na primeira


etapa – preenchimento simultâneo dos cinco critério para a definição e identificação –
eles discordam em alguns aspectos, e isto devido à divergência na interpretação e
aplicação dos cinco critérios. Um bom exemplo é o fato de os sindicatos terem sido
excluídos no FASFIL e incluídos no MAPA.

Aprofundando a questão, passa-se a detalhar algumas questões sobre a definição


ou identificação das “sem fins lucrativos” – primeira etapa - trazidas pelo FASFIL.

Optou-se por esse estudo, na medida em que ele foi realizado a partir do
Cadastro Central de Empresa – CEMPRE - do IBGE, para o ano de 2002, que cobre o
universo das organização inscritas no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas – CNPJ,
do Ministério da Fazenda, que no ano de referência declararam, ao Ministério do
Trabalho e Emprego, exercer atividade econômica no Território Nacional. Observe-se,
também, que o Cadastro abrange tanto entidades empresarias como órgãos da
administração pública e instituições privadas sem fins lucrativos, que foram o foco do
estudo. Assim sendo, por partir do CEMPRE, acredita-se que esse estudo é mais
adequado à realidade brasileira, especialmente no tocante à natureza jurídica das
entidades sem fins lucrativos, nos termos em que são definidas em nosso sistema legal.

Conforme já mencionado, objetivando definir e identificar quais seriam


efetivamente as entidades “sem fins lucrativos” que integram o universo do Terceiro
Setor, o FASFIL utilizou um critério de exclusão de entidades que estavam enquadradas
como “Entidades sem Fins Lucrativos” no CEMPRE (código de natureza jurídica
iniciada por 3). Em linhas gerais, o critério utilizado consiste na exclusão das entidades
que não preenchem simultaneamente as cinco características acima explicitadas, quais
sejam: privadas, sem fins lucrativos, institucionalizadas, auto-administradas e
voluntárias.

As cooperativas foram previamente excluídas, conforme detalhado em item


próprio.

Segundo esse critério, foram excluídas do universo das organizações “sem


fins lucrativos” que integram o Terceiro Setor, em síntese, as seguintes entidades
pelos motivos abaixo sintetizados:

• Entidades de Mediação e Arbitragem, que são essencialmente de cunho


mercantil.

• Caixas Escolares e Similares, cemitérios, cartório, conselhos, consórcios,


e fundos municipais, que são reguladas pelo governo.

• Partidos políticos, sindicatos, entidades do sistema “S”, que são


gerenciadas e financiadas a partir de um arcabouço jurídico específico, não
sendo, portanto, facultada livremente a qualquer organização o desempenho
dessas atividades.
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Dentre as organizações, cujo enquadramento ou não enquadramento no Terceiro


Setor causam maior polêmica, destacam-se: os partidos políticos, os sindicatos e as
entidades do sistemas “S”. Assim, optou-se por detalhar, caso a caso, a motivação do
FASFIL para excluí-las.

• Serviço Social Autônomo (entidades do sistema “S”): “Os serviços sociais


autônomos, embora sejam pessoas jurídicas de direito privado sem fins
lucrativos, são criados ou autorizados por lei. São também mantidos por
dotações orçamentárias ou por contribuições parafiscais. Diante dessas
características, foram excluídos do grupo das Fundações Privadas e das
Associações Civis sem Fins Lucrativos, por não atenderem ao critério de
organizações voluntárias, na medida em que não podem ser livremente
constituídos por qualquer grupo de pessoas.” (op. cit., p. 16)

• Partidos Políticos: “Os partidos políticos são regidos por um arcabouço


jurídico específico e controlados e fiscalizados pelo Tribunal Superior
Eleitoral-TSE. Trata-se, pois, de um sistema de partidos ancorados no
direito público. Para que a organização partidária possa funcionar, deve
haver um reconhecimento do TSE, que irá verificar vários requisitos, entre
eles o seu caráter nacional. Portanto (não) podem ser livremente
constituídos por qualquer grupo de pessoas. Tendo em vistas estas
especificidades, os partidos políticos não atendem ao critério de
organização voluntária.” (op. cit, p. 17). Acrescentou-se o termo “não”
entre aspas, por se entender que houve um equívoco na redação original.

• Entidades Sindicais: “No Brasil, a Constituição Federal assegura a


liberdade de associação sindical ou profissional. Contudo, estabelece o
regime da unicidade sindical, ou seja, é vedada a criação de mais de uma
organização sindical, em qualquer grau, representativa de categoria
profissional ou econômica, na mesma base territorial, que será definida
pelos trabalhadores ou empregadores interessados, não podendo ser inferior
à área de um município.
A Constituição Federal estabelece, também, a contribuição sindical
oficial, com desconto em folha de pagamento, para custeio do sistema
confederativo da representação sindical.
Cabe acrescentar que a Constituição Federal e a CLT (Decreto-Lei nº
5.452, de 1º de maio de 1943) elencam várias prerrogativas que só podem
ser exercidas por organizações sindicais, tal como, a participação nas
negociações coletivas de trabalho.
Diante dessas características, foram excluídas as entidades sindicais do
grupo das Fundações Privadas e das Associações Civis sem Fins Lucrativos,
por não atenderem ao critério de organização voluntária, na medida em que
não podem ser livremente constituídas por qualquer grupo de pessoas, pois
sua criação é condicionada a uma categoria profissional específica e a não
existência de uma outra entidade sindical na mesma base territorial.” (op.
cit., p. 17).

Note-se, que as entidades excluídas acima citadas – entidades do sistema “S”,


partidos políticos e entidades sindicais - não deixam de ser entidades sem fins
lucrativos. Deixam, sim, de integrar o Terceiro Setor, e isto levando em conta o critério
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adotado, que é baseado no “Manual sobre as Instituições Sem Fins Lucrativos no


Sistema de Contas Nacionais” recomendado pela ONU e no conceito de Terceiro Setor
elaborado pelo pesquisador da Johns Hopkins University, Lester Salamon.

Finaliza-se, com a seguinte conclusão do FASFIL, que delimitou quais seriam


as espécies jurídicas existentes em nosso país que se enquadrariam no universo do
Terceiro Setor, levando em conta os cinco critérios de identificação:

“No caso brasileiro, esses critérios correspondem a três figuras jurídicas dentro
do novo Código Civil: associações, fundações e organizações religiosas. As
associações, de acordo com o art. 53 do novo Código Civil regido pela Lei nº 10.406,
de 10 de janeiro de 2002, constituem-se pela união de pessoas que se organizam para
fins não-econômicos. As fundações são criadas por um instituidor, mediante escritura
pública ou testamento, a partir de uma dotação especial de bens livres, especificando o
fim a que se destina, e declarando, se quiser, a maneira de administrá-la. E, também, as
organizações religiosas que foram recentemente consideradas como uma terceira
categoria. Com efeito, a Lei 10.825, de 22 de dezembro de 2003, estabeleceu como
pessoa jurídica de direito privado as organizações religiosas, que anteriormente se
enquadravam na figura de associação ...” (op. cit., p. 15)

V – Particularidades das Cooperativas.

As cooperativas foram previamente excluídas, o que ocasionou, inclusive, a


sua não identificação na listagem das entidades excluídas do FASFIL. A exclusão
prévia foi motivada pelo fato delas terem um objetivo de caráter econômico, visando à
partilha dos resultados, e, assim, estarem classificadas no CEMPRE como “Entidades
Empresariais” (código de natureza jurídica iniciada por 2).

Detalhando a questão, transcreve-se as explicações do FASFIL:

“Cabe ressaltar que as sociedades cooperativas não foram incluídas na


classificação das Fundações Privadas e Associações sem Fins Lucrativos, ou no
universo das entidades sem fins lucrativos. Embora sejam estruturas híbridas, as
cooperativas se organizam com um objetivo de caráter econômico, visando à partilha
dos resultados dessa atividade entre seus membros cooperados ...” (op. cit., p. 14, nota
de rodapé [4])

Observe-se, ainda, que embora as cooperativas tenham fins lucrativos, existe


uma certa tendência de incluí-las no Terceiro Setor, e isto em grande parte
motivado pela definição de Terceiro Setor ofertada pela corrente européia, que se
contrapõe à definição proposta por Lester Salamon, da linha de pensamento americana e
cujos elementos foram absorvidos pelo “Manual sobre as Instituições Sem Fins
Lucrativos no Sistema de Contas Nacionais”, utilizado como metodologia de
identificação das organizações pelo FASFIL e pelo MAPA.

O professor Luiz Carlos Merege (2001), em seu artigo denominado “Realidade


e Perspectivas do Terceiro Setor no Brasil”, caracteriza a corrente européia e a
diferencia da corrente americana, da seguinte forma:
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“A corrente européia, identifica o Terceiro Setor com a economia social, que


engloba os setores de cooperativismo (“onde se identifica a figura do trabalhador com
aquela do empresário”), do mutualismo (“onde se identifica o uso de serviços com a
adesão à organização”) e do associativismo (“onde predomina a forma livre de
associação dos cidadãos”). Segundo Jacques Defourny (1999) a economia social
compreende todas as organizações que por questões éticas seguem os seguintes
princípios: “ (1) de colocar a prestação de serviços aos seus membros ou à
comunidade acima da simples procura por lucro; (2) de autonomia administrativa;
(3) de um processo democrático na tomada de decisões e (4) a primazia das pessoas e
do trabalho sobre o capital na distribuição dos resultados de atividades.”
(...)
Uma primeira diferença entre os dois enfoques é que a definição da Johns
Hopkins University por excluir a distribuição de lucros entre seus diretores, acionistas
ou associados, não considera o sub-sistema das cooperativas e do mutualismo,
centrando seu foco no associativismo. No caso do associativismo o excedente
econômico não pode ser apropriado por dirigentes ou associados, devendo ser aplicado
na atividade meio ou fim da organização ...” (MEREGE, 2001)

VI – Particularidades das Organizações Religiosas.

As organizações religiosas foram incluídas no Terceiro Setor tanto pelo


FASFIL quanto pelo MAPA, embora, frise-se, tenham finalidade específica e
tratamento e identificação individualizados pela Constituição Federal e pelo Código
Civil. Por outras palavras, embora as organizações religiosas preencham
simultaneamente os cinco requisitos, seu enquadramento ou não no Terceiro Setor é
objeto de discussão, e isto em virtude da especificidade de sua natureza, de sua estrutura
e de sua finalidade. Esclarece-se, ainda, conforme detalhado abaixo, que o próprio
Banco Mundial entende que não se incluem entre as ONGs as igrejas, os sindicatos,
os partidos políticos e as cooperativas.

Tanto o FASFIL quanto o MAPA, quando da classificação das organizações,


deixaram claro que no grupo religião foram agrupadas apenas as organizações que têm
como finalidade cultivar crenças religiosas e administrar serviços religiosos ou rituais,
tais como igrejas, sinagogas, mosteiros, ordens religiosas, templos, paróquias, pastorais,
centros espíritas etc. Desta forma, não foram incluídas no grupo religião as instituições
de origem religiosa que desenvolvem outras atividades e que têm personalidade jurídica
própria, como, por exemplo, escolas, hospitais, creches etc. Estas organizações foram
classificadas levando em conta as atividades que exercem e, assim, integraram os
respectivos grupos de atividades afins (educação, saúde, assistência social etc).

Sobre o assunto acima tratado, oferta-se parecer que consta como anexo da Carta
Circular nº 01/2004 da ANAMEC – Associação Nacional de Mantenedoras de
Escolas Católicas do Brasil, de autoria de seu Consultor Jurídico Eduardo de
Rezende Bastos Pereira:

“O Código Civil, na parte que trata das pessoas jurídicas de direito


privado, não interferiu no funcionamento das “organizações religiosas” (Paróquias,
Dioceses, Arquidioceses, Institutos de Vida Consagrada etc).
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O Professor Roberto Dornas, presidente da CONFENEN – Confederação


Nacional do Estabelecimentos Particulares de Ensino, comenta em boletim daquela
entidade que:

“... Parece-nos surgir um problema quanto ao entendimento do que seja


organização. A nosso ver, não se confunde com associação e sociedade. Entendemos
que organização religiosa é estritamente igreja ou entidade destinada exclusivamente à
profecia vocacional, a tratar e cuidar apenas de religião, crença e fé.

As associações mantidas por entidades religiosas ou formadas por religiosos


com outros objetivos – como escolas, hospitais, instituições de assistência social – não
são organizações religiosas para os fins previstos na lei 10.825/2003. Em
conseqüências, têm que adaptar seus estatutos ao novo Código Civil”

É este também o meu entendimento.” (Circular nº 01/2004 da ANAMEC).

VII – Classificação das Organizações do Terceiro Setor.

No tocante à classificação, o FASFIL adotou como parâmetro a “Classificação


dos Objetivos das Instituições sem Fins Lucrativos ao Serviço das Famílias”
(“Classification of the Purpose of Non-Profit Institutions Serving Households –
COPNI”), de classificação definida e reconhecida como tal pela Divisão de Estatísticas
da ONU que, adequada às necessidades do estudo, representou uma “COPNI ampliada”.
Segundo esse parâmetro, as entidades sem fins lucrativos são classificadas nos seguintes
grupos e sub-grupos:

Habitação: Assistência Social:


Habitação Assistência social.
Saúde:
Religião:
Hospitais
Religião.
Outros serviços de saúde
Associações Patronais e Profissionais:
Cultura e Recreação:
Associações empresariais e patronais
Cultura e arte
Associações profissionais
Esportes e recreação
Associações de produtores rurais
Educação e Pesquisa:
Educação infantil
Ensino fundamental
Ensino médico Meio Ambiente e Proteção Animal:
Educação superior Meio ambiente e proteção animal.
Estudos e pesquisas
Educação profissional
Outras formas de educação/ensino.
Assistência Social: Desenvolvimento e defesa de direitos: Associação de
Assistência social. moradores
Centros e associações comunitárias
Outras instituições privadas sem fins lucrativos não Desenvolvimento rural
especificadas anteriormente: Emprego e treinamento
Outras instituições privadas sem fins lucrativos não Defesa de direitos de grupos e minorias
especificadas anteriormente Outras formas de desenvolvimento e defesa de direitos

Já o MAPA adotou como parâmetro a “Classificação Internacional de


Organizações Não-Lucrativas – ICNPI”, que foi inicialmente desenvolvida por meio de
um processo de colaboração que envolveu uma equipe acadêmicos da CNP – Johns
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Hopkins Comparative Nonprofit Sector Project. Essa classificação organiza as


atividades do Terceiro Setor numa estrutura básica de doze grupos subdivididos em
trinta sub-grupos:

Grupo 7: Serviços Legais, Defesa de Direitos Civis e


Grupo 1: Cultura e Recreação
Organizações Políticas:
Cultura e artes
Organizações cívicas e de defesa de direitos civis
Esportes e recreação
Serviços legais
Outras em recreação e clubes sociais
Organizações Políticas
Grupo 2: Educação e Pesquisa:
Grupo 8: Intermediárias Filantrópicas e de Promoção
Educação fundamental e médica
de Ações Voluntárias:
Educação superior
Fundações financiadoras
Outras em educação
Outras intermediárias e de promoção do voluntariado
Pesquisa
Grupo 3: Saúde:
Hospitais e clínicas de reabilitação
Grupo 9: Internacional:
Casas de saúde
Atividades internacionais
Saúde mental e intervenção em crises
Outras em saúde
Grupo 4: Assistência e Promoção Social:
Assistência social Grupo 10: Religião:
Emergência e amparo Associações e congregações religiosas
Auxílio à renda e sustento
Grupo 11: Associações Profissionais, de Classes e
Grupo 5: Meio ambiente: Sindicatos:
Meio ambiente Organizações empresariais e patronais
Proteção à vida animal Associações profissionais
Organizações sindicais
Grupo 6: Desenvolvimento e Moradia:
Desenvolvimento social, econômico e comunitário Grupo 12: Não Classificado em Outro Grupo:
Moradia Não classificada anteriormente
Emprego e treinamento

VIII – Visão sob o Prisma Jurídico: Aspectos Gerais.

Com a intenção de preparar o leitor para a oportuna abordagem jurídica do tema,


ofertam-se conceitos elaborados ou referidos por autores com formação e atuação na
área jurídica, ou ainda que dão ênfase a esse aspecto.

Maria Nazaré Lins Barbosa (2001), professora do Curso de Direito do


Terceiro Setor da EAESP-FGV, em seu artigo “Terceiro setor e organizações
internacionais”, traz a definição legal do Banco Mundial: “Na terminologia do Banco
Mundial, ONG é toda associação, sociedade, fundação, charitable trust, entidade ou
outra pessoa jurídica que seja considerada parte do setor não governamental no
sistema legal de que se trate e que não distribua lucros. Não se incluem entre as ONGs
os sindicatos, partidos políticos, cooperativas ou igrejas. Nesse sentido lato, quaisquer
entidades do terceiro setor são genericamente chamadas de ONGs.” (BARBOSA,
2001).

Outra valiosa contribuição da autora acima referida, inserta no mesmo artigo, diz
respeito a definição, levando em conta a finalidade, dos tipos jurídicos fundamentais sob
a ótica do Banco Mundial, quais sejam: organizações de Benefício Mútuo e de
Interesse Público. A distinção entre os dois tipos fundamentais é extremamente
relevante, uma vez que está relacionada com a própria identidade do terceiro setor –
quem é quem neste universo – e repercute na própria relação financeira entre as
organizações e o poder público, na medida em que dá parâmetros para uma graduação
12

clara de benefícios e incentivos fiscais e acesso aos recursos público, isto é, maiores
benefícios, incentivos e acesso aos recursos públicos devem ser concedidos às entidades
de interesse público.

“É importante distinguir dois tipos de ONGs porque desta distinção dependem


os direitos e as obrigações que a lei lhes assinala. Trata-se, de um lado, das ONGs que
estão organizadas e que funcionam primordialmente para o benefício mútuo ou interno
de um determinado grupo de indivíduos (que pertencem geralmente a uma organização
manejada e controlada por seus próprios membros e por isso chamadas de
memberships organization – “ MBOs”). De outro lado, estão as ONGs que têm por
missão principal o benefício de toda a sociedade ou de segmentos do conjunto da
sociedade (que correspondem, geralmente, às organizações de benefício público –
“PBOs”).

Essa distinção vem sendo proposta por estudiosos e consta do Manual de


Práticas Construtivas em Matéria de Regime Legal aplicável às ONGs elaborado pelo
Banco Mundial, e é importante para melhor delimitar a relação financeira entre as
ONGs e o Estado. É necessário, principalmente, estabelecer uma gradação clara de
incentivos entre entidades sem fins lucrativos de fim público – que complementam a
ação do Estado – de outras que beneficiam principalmente seus próprios membros ou
instituidores.

Trata-se de aspecto relacionado com a própria identidade do terceiro setor


(quem é quem neste universo), e que deveria ser relevante para efeitos fiscais. Deste
modo, entidades que beneficiam principalmente seus próprios associados – tais como
clubes recreativos ou literários – não deveriam poder usufruir dos mesmos benefícios
fiscais previstos para entidades de perfil assistencial de interesse público geral.
Seguindo essa tendência, no Brasil, a Lei 9.790/99 estabeleceu que apenas as entidades
de interesse público teriam acesso a termos de parceria celebrados com o poder
público.” (BARBOSA, 2001).

Continua Maria Nazaré Lins Barbosa (2003) em seu “Manual de ONGS”


escrito em conjunto com Carolina Felippe de Oliveira, dando ênfase à natureza
jurídica das organizações que compõem o Terceiro Setor, da seguinte maneira:

“No entanto, com freqüência, pessoas reúnem esforços ou recursos não com a
finalidade de obter resultados lucrativos ou financeiros para seus sócios, mas para
atingir outros fins: lazer, cultura, recreação, estudo ou difusão de idéias, benemerência
e tantos outros. Entidades dessa natureza podem ganhar reconhecimento jurídico ao
registrarem seus estatutos (e não um contrato) em um cartório de registro civil de
pessoas jurídicas. Essas entidades sem fins lucrativos constituem-se sob a forma de
associações ou fundações.

Tanto as fundações quanto as associações regem-se, assim, por estatutos


registrados em cartório. Porém, as fundações caracterizam-se como um patrimônio
afetado a um fim, estando submetidas à fiscalização do Ministério Público. As
associações caracterizam-se por ser uma reunião de pessoas. Não precisam contar com
um patrimônio prévio.
13

E o que são institutos, organizações não-governamentais (ONGs), organizações


da sociedade civil (OSCs), organizações sociais (OSs), organizações da sociedade civil
de interesse público (OSCIPs) etc.? Todas essas denominações referem-se a entidades
de natureza privada (não-públicas) sem fins lucrativos, que juridicamente ou são
associações ou fundações. Essas associações ou fundações, conforme o caso, podem
pleitear a obtenção de determinados títulos ou qualificações (título de utilidade
pública, qualificação como organização da sociedade civil de interesse público etc.).
No entanto, sob o aspecto jurídico, a característica básica da entidade é ser associação
ou fundação.“ (BARBOSA, 2003, p. 13/14)

Já José Eduardo Sabo Paes (2004), ressaltando que ao se procurar conceituar o


Terceiro Setor, faz-se normalmente referência à natureza e campos de atuação das
organizações que o integram, propõe um conceito que enfatiza a composição do
Terceiro Setor. Ao incluir as sociedades como integrantes das entidades de interesse
social sem fins lucrativos que compõem o Terceiro Setor, o autor o faz levando em
conta as disposições do Código Civil anterior – revogado pelo novo Código Civil (Lei
10.406/02 ) – que incluía entre as pessoas jurídica sem fins lucrativos, além das
associações e fundações, também as sociedades civis. Observe-se, que o novo Código
Civil exclui da finalidade das sociedades as atividades sem fins econômicos ou
lucrativos, uma vez que determina que as sociedades prestam-se ao desenvolvimento
das atividades econômicas e à partilha dos resultados, ou seja, são pessoa jurídicas com
fins lucrativos.

“ Portanto, o Terceiro Setor é aquele que não é público e nem privado, no


sentido convencional desses termos; porém, guarda um relação simbiótica com ambos,
na medida em que ele deriva sua própria identidade da conjugação entre a metodologia
deste com as finalidades daquele. Ou seja, o Terceiro Setor é composto por
organizações de natureza “privada” (sem objetivo do lucro) dedicadas à consecução
de objetivos sociais ou públicos, embora não seja integrante do governo
(Administração Estatal)
(...)
Em termos do direito brasileiro, configuram-se como organizações do Terceiro
Setor, ou ONGs – Organizações Não-Governamentais, as entidades de interesse social
sem fins lucrativos, como as associações, as sociedades e as fundações de direito
privado, com autonomia e administração própria, cujo objetivo é o atendimento de
alguma necessidade social ou a defesa de direitos difusos ou emergentes. Tais
organizações e agrupamentos sociais cobrem um amplo espectro de atividades, campos
de trabalho ou atuação, seja na defesa de direitos humanos, na proteção do meio
ambiente, assistência à saúde, apoio a populações carentes, educação, cidadania,
direitos da mulher, direitos indígenas, direitos do consumidor, direitos das crianças
etc.“ (PAES, 2003, p. 98/99)

Outro aspecto destacado por José Eduardo Sabo Paes (2004), que está em
conformidade com o entendimento do Banco Mundial, é a opção dos países anglo-
saxões, cuja legislação é o resultado de séculos de experiência social e jurídica, em
distinguir em duas categorias as organizações do ventilado setor, tendo como parâmetro
as suas finalidades.

Nesse sentido, o autor aponta a primeira categoria formada por organizações de


interesse (ou caráter) público, que são aquelas que objetivam o benefício de toda a
14

sociedade ou de segmentos do conjunto da sociedade. Ela incluiria as organizações


assistencialistas ou de caridade no sentido tradicional, assim como as denominadas
ONGS, dedicadas à defesa de direitos sociais, difusos e emergentes, que buscam
resolver as causas e não apenas os sintomas dos males sociais.

Entendemos que também se pode incluir na categoria de interesse público as


organizações sem fins lucrativos instituídas pelas empresas (filantropia empresarial) que
tenham como finalidade o desenvolvimento de ações no campo social. Observe-se,
ainda, conforme foi determinado pela Lei das OSCIPs (Lei 9.790/99), que o interesse
público decorre tanto da execução direta de ações e projetos sociais quanto da
realização de doações ou prestação de serviços intermediários de apoio às organização
de interesse público.

A segunda categoria apontada pelo autor engloba as organizações de ajuda


mútua ou de auto-ajuda, que objetivam defender interesses coletivos, mas num círculo
restrito, específico, de pessoas, ou seja, o benefício mútuo ou interno de um
determinado grupo. Dentro dessa categoria, segundo o autor, incluem-se,
exemplificativamente: associações de classe, clubes sociais, associações de moradores
de um determinado bairro, associações de funcionário de uma determinada empresa etc.

Embora a matéria envolva comentários sobre a imunidade de impostos


determinada pelo artigo 150, VI, “c”, da Constituição Federal, ao tecer considerações
sobre a referida norma constitucional, José Eduardo Sabo Paes (2004), citando Sacha
Calmon Navarro Coelho, também nos traz elementos importante para identificar o que
seria “instituição” segundo a Constituição Federal.

“Primeiro, há que se perquerir sobre o significado e alcance da palavra


“instituição” empregada no texto constitucional:

“ A palavra instituição não tem a ver com tipos específicos de entes jurídicos, à luz de
considerações estritamente formais. (...). Instituição é palavra destituída de conceito jurídico-
fiscal. Inútil procurá-lo aqui ou alhures, no direito de outros povos. (...). O que caracteriza é
exatamente a sua função e os fins que exercem e buscam, secundária a forma jurídica de sua
organização, que tanto pode ser fundação, associação, etc. O destaque deve ser para a função,
fins”. (grifei) (443).

Portanto, a instituição referida no texto constitucional, ora interpretado, pode


ser qualquer organização de caráter permanente, sem fins lucrativos, que tenha
objetivos ou finalidades eminentemente sociais. Pode-se organizar-se, juridicamente,
sob a forma de qualquer entidade permitida em lei: associação, fundação ou serviço
social autônomo.” (op. cit., p. 491)

Partindo do fato de que o texto constitucional refere-se às instituições de


educação e de assistência social, assim como que no tocante à educação não restam
maiores dúvidas quanto a sua compreensão, continua o autor, agora citando Ives
Gandra Martins, enfocando o sentido lato que deve ser entendido a palavra
”assistência social”.

“As instituições de assistência social são todas aquelas pessoas jurídicas de


direito privado, associações civis, fundações, serviços sociais, dedicadas à previdência,
saúde e assistência social (445), sendo certo, ainda, para clarear o significado do
15

campo da assistência social, que a própria Constituição define no seu art. 6º, que a
educação, a saúde, o trabalho, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à
maternidade e à infância, a assistência aos desamparado são direitos sociais.
_______
“445 Ives Gandra Martins em “Comentários à Constituição do Brasil”, Ed. Saraiva, 6º v., tomo
1, 1990, p. 181/183, coloca em apoio da jurisprudência do Tribunal Federal de Recursos, hoje,
Superior Tribunal de Justiça, de que as instituições a que se refere o art. 150, são de assistência
social lato sensu, abrangendo previdência, saúde e assistência social propriamente dita.””.
(op. cit., p. 492)

Alexandre Ciconello (2004), advogado da Associação Brasileira de


Organização Não Governamentais – Abong -, em seu artigo “O Conceito Legal de
Público no chamado “Terceiro Setor””, enfatizando que embora eles sejam
fundamentais para o entendimento da organização da sociedade civil brasileira, não
foram abordados em seu artigo o universo dos sindicatos, partidos políticos e
cooperativas, uma vez que eles têm trajetórias e legislação específicas, traz
contribuições valiosas para o delineamento, sob o prisma jurídico, das organizações que
integram o Terceiro Setor, e isto, inclusive, ao explicitar os seguintes pontos:

• As entidades do terceiro setor não necessariamente objetivam finalidade


pública.

• A idéia de finalidade pública não está vinculada ao formato jurídico de uma


associação ou fundação.

• É uma distorção relacionar o conceito de Terceiro Setor a entidades privadas


sem fins lucrativos com finalidade pública, uma vez que isto induz a uma
interpretação equivocada de que entidades que compõem o Terceiro Setor
têm uma natural vocação pública.

Segundo o autor referido: “Atualmente, o novo Código Civil define e separa com
clareza as categorias de pessoas jurídicas de direito privado: associações são
constituídas pela união de pessoas para fins não-econômicos (artigo 53); fundação é
constituída por uma dotação especial de bens, realizada por um instituidor que
especificará o fim a que se destina e declarará, se quiser, a maneira de administrá-la; e
sociedades são constituídas por pessoas que, reciprocamente, se obrigam a contribuir
com bens ou serviços para o exercício de atividade econômica e a partilha, entre si, dos
resultados (artigo 981).

O que interessa destacar, após uma breve descrição da classificação das


pessoas jurídicas de direito privado, é que o nosso direito positivo garante a liberdade
associativa plena para fins lícitos e a liberdade de destinação do patrimônio para um
finalidade específica definida pelo instituidor. Contudo, as entidades sem fins lucrativos
não necessariamente objetivam uma finalidade pública. Podem ser constituídas para
realizar objetivos de natureza particular, de benefício exclusivo de seus associados, ou
de uma coletividade muito restrita. As associações comerciais, as diversas associações
de interesse mútuo, clubes recreativos, por exemplo, têm uma atuação voltada
exclusivamente para o benefício de seus associados.

Concluímos, pois, que a idéia de finalidade pública ou interesse público não


está vinculada ao formato jurídico de uma associação ou fundação ...
16

(...)
...Outra distorção refere-se à associação do conceito de Terceiro Setor a
entidades privadas sem fins lucrativos, induzindo a uma interpretação equivocada de
que as entidades que compõem esse setor têm uma natural vocação pública.

A idéia de um “setor social”, em contraposição ao Estado e ao mercado, gera


um discurso homogeneizado, com uma forte tendência a eliminar os conflitos inerentes
às dinâmicas de nossa sociedade civil ...
(...)
Podemos concluir, pois, que o conceito de “Terceiro Setor” mais atrapalha do
que contribui para a nossa tentativa de identificar o conceito legal de público entre as
organizações sem fins lucrativos brasileiras. Do ponto de vista jurídico, é mais
adequado falar do universo das entidades sem fins lucrativos, mais especificamente das
associações e fundações, e verificar, por meio de benefícios públicos conferidos a essas
entidades – imunidades de impostos, incentivos fiscais, facilidade de acesso a fundos
públicos, títulos e qualificações -, como o Estado incentiva aquelas que desenvolvem
atividades de interesse público.” (CICONELLO, 2004, p. 46/47 e 54/55)

Aproveita-se o momento, para trazer ao leitor o real significado das palavras


“social”, “público” e “interesse”, e isto porque talvez a distorção, de se relacionar o
conceito de Terceiro Setor a entidades privadas sem fins lucrativos com finalidade
pública, deva-se ao fato de se confundir – tratando-os como se fossem a mesma coisa –
o interesse público com o interesse social.

Consta no Dicionário Aurélio Básico da Língua Portuguesa, as seguintes


definições:

• “Social: ... 1. Da sociedade ..., ou relativo a ela (...). 3. Que interessa à


sociedade ...”.

• “Público: (...) 1. Do, ou relativo, ou pertencente ou destinado ao povo, à


coletividade. 2. Relativo ou pertencente ao governo de um país. 3. Que é do
uso de todos; comum. 4. Aberto a quaisquer pessoas ...”.

• “Interesse: (...) 3. Vantagem, proveito; benefício. 4. Aquilo que convém,


que importa, seja em que domínio for...”.

Ora, pode-se concluir que seriam de interesse social, ou seja, seriam


convenientes à sociedade, tanto as entidade de interesse (ou caráter) público, que são
aquelas que objetivam o benefício de toda a sociedade ou de segmentos do conjunto da
sociedade, quanto as organizações de ajuda mútua ou de auto-ajuda, que objetivam
defender interesses coletivos, mas num círculo restrito, específico, de pessoas, ou seja, o
benefício mútuo ou interno de um determinado grupo.

Finalizando esse tópico, e na mesma linha do posicionamento de seu advogado


Alexandre Ciconello, é o posicionamento institucional da Associação Brasileira de
Organização Não Governamentais – Abong, que consta no tópico “Ambiente legal
atual” das “Propostas da Abong para o Marco Legal das ONGs”.
17

“Do ponto de vista jurídico, o termo ONG não se aplica. Nossa legislação prevê
apenas 3 formatos institucionais para a constituição de uma organização sem fins
lucrativos (associação, fundação, organização religiosa). Portanto, toda ONG é uma
associação civil ou uma fundação privada.

Contudo, entre as associações e fundações existentes no Brasil, temos objetivos


e perspectivas de atuação bastante distintos, às vezes até opostos. Não existe uma
identidade comum entre: organizações comerciais, clubes de futebol, hospitais e
universidades privadas, fundações e institutos empresariais, clubes recreativos e
esportivos, organizações não-governamentais, organizações filantrópicas, creches,
asilos, abrigos, lojas maçônicas, centros de juventude, associações de interesse mútuo.

A idéia de finalidade pública ou interesse público não está vinculada com o


formato jurídico de uma associação ou fundação. Para localizar o conceito legal de
público, devemos investigar objetivamente as normas que buscam identificar o caráter
público de certos segmentos da sociedade civil brasileira. Em geral, tais normas são
construídas dentro de uma visão específica de sociedade civil, por parte do Estado, em
um dado momento histórico.” (Propostas da Abong para o Marco Legal das ONGs,
maio de 2004)

IX – Identificação das Organizações Sem Fins Lucrativos pela Constituição


Federal e pelo Código Civil.

Pretende-se, nesse item, verificar como a Constituição Federal e o Código Civil


identificam e denominam as organizações ou entidades sem fins lucrativos, ou melhor,
as pessoas jurídicas de direito privado sem fins econômicos ou lucrativos.

Em um primeiro momento, destaca-se que a Constituição Federal enfatiza a


liberdade de associação para fins lícitos (art. 5º, XVII), inclusive a liberdade de
associação sindical e profissional (art. 8º, caput), e, ainda, a liberdade de crença e de
exercício de cultos religiosos (art. 5º, VI).

Em um segundo momento, ressalta-se que a Constituição Federal identifica e


denomina de forma específica as seguintes organizações sem fins lucrativos:

• Associações (art. 5º, XVIII e XIX).

• Fundações Privadas (art. 150, VI, “c”).

• Sindicatos (art. 8º, incisos I à VIII, e art. 150, VI, “c”).

• Partidos Políticos (art. 17 e art. 150, VI, “c”).

• Cultos Religiosos e Igrejas (art. 19, I, e art. 150, VI, “b”).

• Serviço Social Autônomo (art. 240, e art. 62 dos Atos das Disposições
Constitucionais Transitórias).
18

A título de esclarecimentos, informa-se que a Constituição Federal também


identifica de forma específica as fundações públicas (art. 37, XIX), que integram o
poder público e não a sociedade civil, e as cooperativas (art. 5º, XVIII, e art. 174, § 2º),
que embora possuam fins lucrativos, sofrem certa tendência de serem incluídas no
Terceiro Setor, especialmente em virtude da definição de Terceiro Setor da corrente
européia, conforme já detalhado em item próprio.

Quando a Constituição Federal dispõe sobre a imunidade de impostos (art. 150,


VI), que é um tema relevante para as organizações sem fins lucrativos, uma vez que se
procurou beneficiar com a imunidade as organizações de interesse público, em linhas
gerais, ela trata de forma específica, nos termos acima, os templos de qualquer culto,
os partidos políticos, inclusive suas fundações, e as entidades sindicais. Já as demais
organizações são identificadas pela expressão instituições de educação e de assistência
social, sem fins lucrativos. Reportando aos ensinamentos acima ofertados sobre o
sentido amplo dado à palavra “assistência social”, destaca-se que a doutrina jurídica
vem entendendo que dentro da expressão instituições sem fins lucrativos estão
enquadradas as associações, as fundações e os serviços sociais autônomos.

Já o Código Civil, que é a lei a quem compete a definição das espécies de


pessoas jurídicas, as identifica e denomina, nos termos abaixo.

O artigo 44 identifica como pessoas jurídicas de direito privado as


associações, as sociedades, as fundações, as organizações religiosas e os partidos
políticos.

As “sociedades” são pessoas jurídicas de direito privado com fins


econômicos ou lucrativos, conforme explicitado pelo artigo 981 a seguir transcrito:

“Art. 981. Celebram contrato de sociedade as pessoas que reciprocamente se


obrigam a contribuir, com bens ou serviços, para o exercício de atividade econômica e
a partilha, entre si, dos resultados.

Parágrafo único. A atividade pode restringir-se à realização de um ou mais negócios


determinados.”.

O Código Civil, em seus artigos 1.093 a 1.096, trata a “cooperativa” como


“sociedade cooperativa”, e ressalta os seguintes aspectos:

• A sociedade cooperativa é regulada por legislação especial e pelas


disposições do Código Civil acima citadas (arts 1.093 a 1.096).

• Aplicam-se subsidiariamente à sociedade cooperativa às disposições


referentes à sociedade simples.

• A sociedade cooperativa tem características peculiares, e dentre elas, a


distribuição dos resultados, proporcionalmente ao valor das operações
efetuadas pelo sócio (cooperado) com a sociedade.
19

Já as demais pessoas jurídicas identificadas no referido artigo 44 – associações,


fundações, as organizações religiosas e os partidos políticos – são pessoas jurídicas
sem fins econômicos ou lucrativos.

Sobre elas, o Código Civil, em síntese, assim as identifica e caracteriza:

• Associação: união de pessoas que se organizam para fins não econômicos


(art. 53).

• Fundação: dotação especial de bens livres destinado ao fim especificado


pelo instituidora, que poderá, inclusive, declarar a maneira que a fundação
será administrada; a fundação apenas poderá constituir-se para fins
religiosos, morais, culturais ou de assistência. (art. 62).

• Organizações Religiosas: liberdade de criação, organização, estruturação


interna e o funcionamento, sendo vedado ao poder público negar-lhes
reconhecimento ou registro dos atos constitutivos e necessários ao seu
funcionamento (art. 44, § 1º).

• Partidos Políticos: são organizados e funcionarão conforme o disposto em


lei específica (art. 44, § 3º).

X – Conclusões.

Pretende-se, nas conclusões, levando em conta os aspectos abordados:

• Destacar alguns pontos de consenso e desacordo na identificação das


organizações que integram o Terceiro Setor.

• Ofertar um conceito de Terceiro Setor.

(1) Consensos e Desacordos, sob o prisma jurídico.

Destacam-se, sob o prisma jurídico, alguns pontos de consensos e desacordos:

(a) Existe consenso que as figuras jurídicas básicas do sistema legal


brasileiro que integram o Terceiro Setor são as associações e as fundações; assim
como que essas entidades, desde que desenvolvam atividades de interesse público,
podem ser detentoras de títulos e certificados que lhe possibilitam o gozo de benefícios
e incentivos fiscais e o acesso aos recursos públicos. Dentre eles, destacam-se, no
âmbito federal:

• Declaração de Utilidade Pública Federal, por ato do Ministro da Justiça.


• Registro no Conselho Nacional de Assistência Social – CNAS.
• Certificado de entidade Beneficente de Assistência Social, expedido pelo
CNAS.
• Reconhecimento como Organização da Sociedade Civil de Interesse Público
– OSCIP, expedido pelo Ministério da Justiça.
20

(b) Caminha-se ao consenso de que a idéia de finalidade pública não está


vinculada ao formato jurídico de uma associação ou fundação, assim como de que é
uma distorção relacionar o conceito de Terceiro Setor a entidades privadas sem
fins lucrativos com finalidade pública, uma vez que isto induz a uma interpretação
equivocada de que entidades que compõem o Terceiro Setor têm uma natural vocação
pública. Desta forma, caminha-se para a conclusão de que seriam de interesse social, ou
seja, seriam convenientes à sociedade e, assim, integrariam ao Terceiro Setor, tanto
as entidade de interesse (ou caráter) público, que são aquelas que objetivam o
benefício de toda a sociedade ou de segmentos do conjunto da sociedade, quanto as
organizações de ajuda mútua ou de auto-ajuda, que objetivam defender interesses
coletivos, mas num círculo restrito, específico, de pessoas, ou seja, o benefício mútuo
ou interno de um determinado grupo.

(c) Caminha-se ao consenso de que as sociedades cooperativas não integram o


Terceiro Setor, e isto em virtude delas se organizarem como um objetivo de caráter
econômico, visando a partilha dos resultados dessa atividade entre seus membros
cooperados.

(d) Caminha-se ao consenso de que, por serem identificadas, tratadas e


reguladas por legislação específica, assim como por terem finalidades particulares,
não integram o Terceiro Setor: os sindicatos e os partidos políticos.

(e) Ainda não existe um posicionamento claro sobre o enquadramento ou não


no Terceiro Setor das organizações religiosas e dos serviços sociais autônomos
(entidades dos sistema “S”).

(2) Conceito de Terceiro Setor Proposto pelo Autor.

Terceiro Setor é o espaço ocupado pelas organizações da


sociedade civil, sem fins lucrativos ou econômicos, de interesse
social, e que não possuem finalidade, natureza ou legislação
específicas; assim como pelos projetos, ações e atividades de
interesse social desenvolvidos por indivíduos, empresas e governo,
normalmente por meio de grupos, movimentos ou alianças
(parcerias) intersetoriais, com o objetivo de fomentar, apoiar ou
complementar a atuação das organizações formalmente
constituídas e acima caracterizadas.

Para melhor compreensão do conceito acima formulado, alguns pontos e


elementos merecem ser destacados:

(a) Não integram o Terceiro Setor as organizações estatais (Primeiro Setor) e as


organizações com fins lucrativos ou caráter econômico (Segundo Setor). Por terem
caráter econômico, ficam excluídas as sociedades cooperativas.

(b) Embora sejam organizações da sociedade civil sem fins lucrativos ou


econômicos e, inclusive, de interesse social, não são abrangidas pelo conceito
formulado os partidos políticos, os sindicatos, os serviços sociais autônomos e as
organizações religiosas, e isto porque elas possuem finalidade, natureza ou legislação
21

específicas. Ressalta-se que as organizações religiosas são aquelas que têm como
finalidade cultivar crenças religiosas e administrar serviços religiosos e rituais.

(c) Pela atual legislação de nosso país, estariam incluídas no Terceiro Setor,
segundo o conceito proposto, as organizações constituídas sob a modalidade de
associações ou fundações.

(d) Pelo conceito formulado, caracterizam-se como organizações de interesse


social, ou seja, convenientes à sociedade, tanto as organizações de interesse ou caráter
público, que são aquelas que objetivam o benefício de toda a sociedade ou de segmentos
do conjunto da sociedade (entidades assistenciais, beneficentes, filantrópicas, de defesa
de direitos, de origem empresarial - ”braço social” -, etc.), quanto as organizações de
ajuda mútua ou de auto-ajuda, que objetivam defender interesses coletivos, mas num
círculo restrito, específico, de pessoas, ou seja, o benefício mútuo ou interno de um
determinado grupo (associações de classe, associações de moradores, associações
comerciais, clubes sociais, recreativos e esportivos etc.).

(e) O conceito proposto levou em conta dois aspectos. O primeiro, jurídico-


formal, quando explicita as organizações da sociedade civil, sem fins lucrativos ou
econômicos (associações e fundações), de interesse social (caráter público e ajuda
mútua). E o segundo, não-jurídico e informal, quando explicita os projetos e ações de
fomento, apoio e complementação das atividades desenvolvidas pelas associações e
fundações de caráter público e ajuda mútua.

AUTOR

* Rodrigo Mendes Pereira. Assessor jurídico e técnico em projetos sociais. Graduado


em Direito pela USP, pós-graduado pela FIA/FEA/USP (MBA - Gestão e
Empreendedorismo Social) e com cursos de extensão nas áreas de Direito e
Administração do Terceiro Setor e de Captação de Recursos pela EAESP/FGV.
Coordenador e professor de cursos focados no Terceiro Setor da Escola Superior de
Advocacia – ESA - da OAB/SP, articulista da rede Bom Dia de jornais e do portal
Agência Social, palestrante, instrutor e autor de artigos sobre o Terceiro Setor. Membro
fundador e ex-Vice-Presidente da Comissão de Direito do Terceiro Setor da OAB/SP.
Atualmente é consultor associado à Criando Atividades Alternativas. E-mail:
romepe@terra.com.br

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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em material didático do curso Princípios e Técnicas de Captação de Recursos, GVpec,
da EAESP-FGV. São Paulo, julho de 2001.

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Gerência do Cadastro Central de Empresas. – Rio de Janeiro: IBGE, 2004. 148 p. –
(Estudos e pesquisas. Informações econômicas, ISSN 1679-480x; n. 4), p. 14, 15 e 16.
ISBN 85-240-3774-1.
22

BARBOSA, Maria Nazaré Lins Barbosa. Terceiro setor no panorama internacional:


aspectos jurídicos. Artigo publicado em material didático do curso de Direito do
Terceiro Setor, GVpec, da EAESP-FGV. São Paulo, 2º semestre de 2001.

__________. Manual de ONGS: guia prático de orientação jurídica / Maria Nazaré Lins
Barbosa e Carolina Felippe de Oliveira; Coordenação Luiz Carlos Merege. - 4. ed. rev.
atual. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2003, p. 13/14. ISBN 85-225-0353-2

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CARVALHO, Denise Gomide. Mulheres na coordenação de organizações do terceiro


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