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I. DOS FATOS
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Na data de 23/09/2020, por volta das 15:00h, a Requerente se encontrava no interior do
estabelecimento da empresa Requerida para realização da compra de alguns mantimentos,
quando sofreu uma queda decorrente de um tropeço em folhas de compensado posicionadas no
chão do corredor, utilizadas como tapumes horizontais para cobertura de uma obra que estava
em andamento, sem qualquer sinalização.
De cor semelhante ao piso, a Requerente não percebeu que a fina tapagem encobria um
buraco do qual as lajotas foram retiradas e o concreto perfurado, resultando em um buraco
ocultado, sem qualquer proteção que impedisse o passeio pelos transeuntes, o que lhe causou
uma violenta queda e graves escoriações.
Na mesma data, 23/09/2020, lhe foi outorgado receituário médico para aquisição de
medicamentos para consumo imediato após a alta hospitalar (Doc. 06), os quais a Requerente
não possuía condições financeiras de adquirir. Em meio ao desespero que a situação infligia,
com o braço direito imobilizado, ainda convalescente e sofrendo de dores excruciantes, se
direcionou à Requerida, a qual após muita insistência, e como forma de ameninar a
responsabilidade pelo ocorrido, aviou a receita em seu próprio estabelecimento, uma vez que no
interior do supermercado há uma farmácia comercial, identificada como FarmaLíder, sucursal
membro de seu conglomerado empresarial.
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médica, a fim de que lhe fosse dispensado tratamento regular após o protocolo de trauma que
recebera em modalidade de urgência.
Assim, na data de 25/09/2020, após consulta com o médico responsável pelo tratamento
ortopédico da fratura em seu braço, lhe foram outorgados outros 2 (dois) receituários, para
aquisição de medicação diversa (Docs. 08 e 09). Entretanto, a Requerida se negou a lhe fornecer
essa segunda leva de medicamentos, lhe prejudicando o tratamento e lhe sujeitando à situação
de lastimável penúria, face a necessidade de socorrer à caridade de parentes, amigos e vizinhos,
lhe ensejando um constrangimento inimaginável, enquanto permanecia com seus movimentos
limitados e sentido dores terríveis.
Em meio ao mais absoluto pesar, inerente à situação que ora experimentava, na data de
06/10/2020 teve que comparecer ao Instituto Médico Legal para realização de perícia agendada,
no que foi emitido em 14/10/2020 o Laudo nº 2020.01.009754-TRA (Doc. 10), o qual atesta a
ofensa à integridade corporal por ação contundente com ensejo de incapacidade para as
ocupações habituais por mais de trinta dias, capitulada no Art. 129, §1º do Código Penal.
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Em razão das restrições de atendimento médico-clínico por conta da pandemia do vírus
Sars-Covid/19, a Prefeitura de Belém havia restringido todos os atendimentos e agendamentos,
dificultando a evolução de seu tratamento, no que a Requerente buscou auxílio junto à Caritas
Brasileira, grupo assistencial empreendido por voluntários no Santuário de Nossa Senhora da
Conceição Aparecida, localizada na Av. Pedro Miranda, nº 1566, Pedreira, Belém/PA, CEP:
66.085-023, local onde até o presente tem se valido de acompanhamento e auxílio mediante o
recebimento de cesta básica.
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“Art. 35. A instalação de tapume depende da concessão de licença e não poderá ter
altura inferior a 2,00m (dois metros).”
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“Art. 67. Para efeitos desta lei, somente profissionais habilitados e devidamente
cadastrados na Prefeitura poderão assinar, como responsáveis técnicos, autores ou
co-autores, qualquer documento, projeto ou especificação a ser submetido à
Prefeitura.”
É evidente que a Requerida não cumpriu com o dever de zelar pela segurança e
integridade daqueles que se encontrassem no interior do seu estabelecimento, sendo omissa no
dever de sinalizar o estorvilho, no dever de impedir o acesso à grota, coibindo casos como o
ocorrido.
A Constituição Federal garante em seu Art. 170, V que a ordem econômica, fundada
na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos
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existência digna, conforme os ditames da justiça social, observado, entre outros, o princípio
da defesa do consumidor.
O mesmo diploma legal, em seu Art. 4º, inciso I, ao determinar que a Política
Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos
consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses
econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das
relações de consumo, atendidos – dentre outros - o princípio do reconhecimento da
vulnerabilidade do consumidor no mercado de consumo.
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“Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa,
pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação
dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição
e riscos.
...
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“Art. 17. Para os efeitos desta Seção, equiparam-se aos consumidores todas as vítimas
do evento."
Estando presente nos fatos mencionados o nexo de causalidade entre o ato ilícito e o
dano causado, é indiscutível o dever de indenizar, haja vista a responsabilidade da Requerida
perante seus clientes, devendo suportar as consequências jurídicas do ato ilícito.
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de seus direitos, inclusive com a obrigação probatória invertida à Requerida em seu favor, no
processo civil, quando, a critério do juiz for verossímil a alegação ou quando for ele
hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiência.
Cumpre enaltecer que a lei impõe a reparação de um dano cometido mesmo que sem
culpa. Quando a responsabilidade é legal ou “objetiva”, prescinde da culpa e se satisfaz
apenas com o dano e o nexo de causalidade, não se exigindo prova de culpa do agente danoso
para que seja obrigado a reparar o dano. Em alguns, ela é presumida pela lei. Em outros, é de
todo prescindível, porque a responsabilidade se funda no risco e no proveito tirado da relação.
Esta teoria de risco justifica a responsabilidade objetiva uma vez que não pode o
consumidor ter pra si as consequências do risco da atividade, e desloca-se da noção de culpa
para ideia de risco, ora encarada como “risco-proveito”, que se funda no princípio segundo o
qual é reparável o dano causado a outrem em consequência de uma atividade realizada em
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benefício do responsável; ora mais genericamente como “risco criado”, a que se subordina
todo aquele que, sem indagação de culpa, expuser alguém a suportá-lo.
O constituinte de 1988 fez inserir no texto da Carta Magna, no capítulo reservado aos
direitos fundamentais do Homem, em seu art. 5º, XXXII, o dever do Estado de promover a
defesa do consumidor. Regulamentando esse dispositivo, de ordem pública e interesse social,
pela Lei complementar de nº 8.078/1990, que adotou pela primeira vez o Princípio da Boa-Fé
Objetiva, então recepcionado pelo Código Civil, que inovou ainda mais com os Princípios da
Função Social do Contrato, que tem por escopo, entre outros, equilibrar as relações jurídicas
civis e de consumo, corrigindo as cláusulas abusivas, a fim de que prevaleça a tão proclamada
justiça contratual e bem estar social, objetivo fundamental para o Estado Democrático de
Direito.
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Neste escopo, a prática ilícita alcança milhares de consumidores hipossuficientes
lesados pelo mesmo infortúnio, o que perfaz ato ilícito preconizado no Art. 7º, VII da Lei nº
8.137/1990.
Mostra-se como urgente a necessidade de que o Poder Judiciário coíba tal pratica,
utilizando os recursos disponíveis para que a Requerida não mais se prevaleça da boa-fé de
seus consumidores, ainda que ludibriados como “Associados” e permaneça a gerar tantos
transtornos como os experimentados pela Requerente.
Saltam aos olhos, Excelência, os danos sofridos pela Requerente da presente demanda,
sejam de ordem moral - físicos inclusive - sejam de ordem material. Objetivamente, o elenco
dos prejuízos sofridos pela mesma é entristecedor.
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acreditando que poderia ao menos contar com o mínimo apoio por parte da Requerida, o que
não ocorreu.
No que toca ao prejuízo material este se circunscreve não somente ao gasto com
tratamento médico e deslocamento, mas também na perda do único meio de seu sustento, haja
vista que até o presente momento permanece com seus movimentos limitados e, portanto,
impossibilidade de exercer atividade laboral, que de natureza braçal, é o único meio de
manutenção própria, se valendo da caridade de terceiros por não gozar de auxílios
governamentais.
A moral do ser humano é reconhecida como bem jurídico, recebendo dos mais diversos
diplomas legais a devida proteção, estando amparada, inclusive, pelo Art. 5º, inciso V da
Constituição Federal de 1988:
"Art. 5º (omissis):
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Aliás, a lei nº 10.406/2002 assim determina:
"Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência,
violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato
ilícito."
"Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica
obrigado a repará-lo."
Ocorre que o dano moral, como sabido, deriva de uma dor íntima, uma comoção
interna, um constrangimento gerado naquele que o sofreu e que repercutiria de igual forma em
uma outra pessoa nas mesmas circunstâncias. Esse é o caso em tela, onde, conforme foi exposto
alhures, a negligência da Promovida gerou a ocorrência do incidente relatado e a humilhação,
vexame e constrangimento profundos dele decorrentes. Vejamos o que ensina o mestre Sílvio de
Salvo Venosa em sua obra sobre responsabilidade civil:
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escorrega em poça d´água e sofre fratura de patela. A presença de marcas indeléveis
ou de cicatrizes resultantes de cirurgia necessária à recuperação da saúde da vítima dá
causa à exigência de indenização por danos estéticos. Desde que as naturezas dos
danos não se confundam, ainda que a origem dos fatos possa ser a mesma, os danos
morais puros são cumuláveis, numa mesma ação, com os estéticos. A pensão mensal
devida em razão de ato ilícito tem seu dies a quo na data do fato danoso e seu termo
final na data em que a vítima esteja completamente recuperada para suas atividades
laborais. Acórdão: Apelação cível 2004.009171-0, Relator: Des. Luiz Carlos
Freyesleben. Data da Decisão: 30/11/2006.”
"Do ponto de vista estrito, o dano imaterial, isto é, não patrimonial, é irreparável,
insusceptível de avaliação pecuniária porque é incomensurável. A condenação em
dinheiro é mero lenitivo para a dor, sendo mais uma satisfação do que uma
reparação (Cavalieri Filho, 2000:75). Existe também cunho punitivo marcante nessa
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modalidade de indenização, mas que não constitui ainda, entre nós, o aspecto mais
importante da indenização, embora seja altamente relevante. Nesse sentido, o Projeto
de Lei nº 6.960/2002 acrescenta o art. 944 do presente código que "a reparação do
dano moral deve constituir-se em compensação ao lesado e adequado desestímulo ao
lesante". Como afirmamos, se o julgador estiver aferrolhado a um limite
indenizatório, a reparação poderá não cumprir essa finalidade reconhecida pelo
próprio legislador." (Sílvio Salvo Venosa, Direito Civil. Responsabilidade Civil, São
Paulo, Ed. Atlas, 2014, p. 41).”
Daí, o valor da condenação deve ter por finalidade, também, dissuadir o réu infrator de
reincidir em sua conduta, consoante tem decidido a jurisprudência pátria:
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Registro do Acordão Número : 197708 Data de Julgamento : 18/08/2004 Órgão
Julgador : Segunda Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais do
D.F. Relator : ALFEU MACHADO Publicação no DJU: 30/08/2004 Pág. : 41 - até
31/12/1993 na Seção 2, a partir de 01/01/1994 na Seção 3).”
Por tudo o que foi anteriormente relatado, é evidente que o Requerente sofreu prejuízo
de ordem material. No presente caso, prima-se pela reparação dos danos emergentes, ou seja,
tudo aquilo que se perdeu. A fim de tratar a matéria o legislador editou o seguinte dispositivo do
Código Civil:
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“AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. ACIDENTE EM SUPERMERCADO. QUEDA DE CAIXA
DE VERDURAS, ATINGINDO REGIÃO LOMBAR DE CLIENTE QUE ALI ESTÁ
REALIZANDO COMPRAS. PRETENSÃO DA RÉ EM ATRIBUIR A
RESPONSABILIDADE À CONSUMIDORA. Se no interior de estabelecimento
comercial supermercado são transportadas caixas contendo mercadorias, em horário
de movimento de consumidores, devem ser adotadas providências para que não
ocorram acidentes. Não se pode pretender dizer que a culpa por queda de uma caixa de
verduras, transportada por funcionário no horário de funcionamento do mercado, em
seu interior, seja de consumidor que, desatendo, dá um ou dois passos atrás, ficando no
caminho do deslocamento das caixas. É natural que as pessoas que estejam nos
mercados, entre as gôndolas, circulem, de um lado para outro, andem para frente, ou
de costas, por curto espaço, sem que isso possa, nem de longe, consistir em conduta
culposa de consumidor. Sentença de procedência da demanda confirmada por seus
próprios fundamentos. (Recurso Cível Nº 71001504166, Segunda Turma Recursal
Cível, Turmas Recursais, Relator: Clovis Moacyr Mattana Ramos, Julgado em
05/12/2007). (TJ-RS - Recurso Cível: 71001504166 RS, Relator: Clovis Moacyr
Mattana Ramos, Data de Julgamento: 05/12/2007, Segunda Turma Recursal Cível,
Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 13/12/2007).”
Devido aos fatos, o resultado da ação não deve ser outro, senão além da condenação
ao dano material e lucros cessantes, bem como seja ressarcido o Requerente pelo abalo
psíquico que sofreu, presumido pelo fato da prática de ato ilícito, a título de danos morais
emergentes da situação vivenciada.
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III.IV – A condenação da Requerida ao pagamento das custas processuais e
honorários advocatícios em caso de recurso;
Dá-se à causa o valor de R$ 40.000,00 (Quarenta mil Reais), para os fins de direito.
OAB/PA nº 11.841-B
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