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HEROÍNAS ANÔNIMAS: AS MULHERES NA GUERRA DO PARAGUAI

JERLYANE DAYSE MONTEIRO DOS SANTOS1


SERIOJA R. CORDEIRO MARIANO 2
Universidade Federal da Paraíba - UFPB

Esta comunicação é parte integrante das discussões desenvolvidas no grupo de


pesquisa “Sociedade e Cultura no Nordeste Oitocentista” (UFPB/CNPq), e tem por
objetivo analisar a participação das mulheres na guerra do Paraguai (1864-1870), tendo
em vista que por muito tempo essa historiografia foi dominada pela perspectiva
masculina, que sempre privilegiou a perpetuação da representação masculina, como a
figura dos heróis viris (DOURADO, 2002). Entretanto a partir da década de 1970,
através da “nova história”, e seus desdobramentos dentro do campo da história social, a
história das mulheres ganhou maior visibilidade. Inicialmente a história das mulheres
estava diretamente relacionada ao movimento político, através do movimento feminista,
mas ao longo da década de 1980, após sofrer a influencia das ciências sociais, o estudo
sobre a história das mulheres se afastou em definitivo do viés político e desviou o seu
campo de interesse para a questão de gênero 3. Segundo esta linha de interpretação, a
história das mulheres parte de um campo de estudo que envolve “uma evolução do
feminismo para as mulheres e daí para o gênero; ou seja, da política para a história
especializada e daí para a analise” (SCOTT, 1992).
A influência exercida pela ciência social ao estudo de gênero pluralizou a
categoria das “mulheres”, e produziu um vasto campo de histórias e de identidades
coletivas. Por isso, é através dessas novas possibilidades de pesquisa que vem surgindo,
cada vez com mais intensidade, as pesquisas voltadas para as mais diversas
representações de gênero. E é através dessa nova perspectiva que pretendemos abordar e

1
Graduanda em História pela UFPB. Contato pelo e-mail: jerlyanedayse@yahoo.com.br
2
Coordenadora do Grupo de Pesquisa “Sociedade e Cultura no Nordeste Oitocentista”.
3
“‘Gênero’ foi o termo usado para teorizar a questão da diferença sexual. (...) A categoria de gênero,
usada primeiro para analisar as diferenças entre os sexos, foi estendida à questão das diferenças dentro
das diferenças” (SCOTT, 1992).
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dar visibilidade à participação das mulheres na Guerra do Paraguai4 e contribuir para o


fortalecimento do viés historiográfico que se dedica ao estudo das mulheres. Pois, deste
a década de 1970, como dissemos inicialmente, o movimento feminista vem buscando o
reconhecimento da participação feminina na construção da história; e em alguns países
como a França, e os Estados Unidos às discussões estão bem avançadas; mas é
interessante observar que no Brasil desde as décadas de 1970 e 1980, estão sendo
produzidos trabalhos voltados para o resgate da história das mulheres. Algumas autoras
como Michelle Perrot, na França e Joan Scott, nos Estados Unidos, vêem despontando
nas discussões sobre este tema, tanto em relação à discussão teórica quanto em relação à
pesquisa documental. No Brasil, trabalhando com essa mesma linha de pesquisa
encontramos Rachel Soihet, que entre outras produções textuais é a autora do artigo
História das Mulheres, que é parte integrante do livro Domínios da História: Ensaios
de Teoria e Metodologia, organizado por Ciro Flamarion Cardoso e Ronaldo Vainfas
(1997); e seguindo essa mesma temática no cenário nacional, também podemos
encontrar, Mary Del Priori, que vem se destacando através do resultado de seus
trabalhos, inclusive ela encabeça um brilhante estudo sobre o resgate da participação
feminina na construção do Brasil, da colônia ao século XX. Esse estudo resultou no
livro, História das Mulheres no Brasil, organizado por Del Priore (2001), segue o
modelo de outros trabalhos realizados fora do país, mas que no Brasil é um trabalho
inédito e inovador. Estas duas autoras e seus respectivos trabalhos acima citados;
juntamente com Michelle Perrot, em A História dos Excluídos: operários, mulheres e
prisioneiros, e Joan Scott em seu artigo História das Mulheres, pertencente ao livro A
Escrita da História, novas perspectivas, organizado por Peter Burke (1992); também
contribuíram para a construção desta comunicação, que busca dar visibilidade a
participação feminina na Guerra do Paraguai, a partir das recentes discussões sobre
gênero dentro dos desdobramentos da nova historiografia.
Para a elaboração desta comunicação também foi utilizada a dissertação de
Maria Teresa Garritano Dourado (2002), que tem como linha de pesquisa a participação
das mulheres na Guerra do Paraguai. Dourado realizou a sua pesquisa de mestrado na

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A Guerra do Paraguai também é denominada pela historiografia como a Guerra da Tríplice Aliança, ou
a Grande Guerra.
3

Universidade Federal do Mato Grosso do Sul, um dos palcos onde foi encenado o teatro
da Grande Guerra5. Em seu trabalho ela dialoga com as fontes documentais, as quais
teve acesso através dos diversos arquivos pesquisados6, e também utilizou as
reminiscências de oficiais e viajantes para construir e embasar o seu trabalho. A
dissertação de Dourado possui uma grande importância para a nova historiografia que
busca dar visibilidade à mulher na construção da história. Estes trabalhos só têm a
contribuir e fortalecer a história das mulheres, pois busca a participação feminina como
sujeito de uma historiografia que por muito tempo foi dominada por homens, mesmo
que esta seja uma tarefa árdua, pois é necessário observar nas entrelinhas dos registros
oficiais, a presença e a contribuição feminina, ainda assim é um trabalho
recompensador, pois supre as lacunas historiográficas existentes e da visibilidade a
presença feminina, no processo de construção da nação.
Os trabalhos realizados sobre guerras, como dissemos inicialmente, são em sua
maioria produzida por homens, sobre homens e para homens. Quando nos referimos a
Guerra do Paraguai surgem vários outros problemas que podem ser facilmente
detectados, podemos citar alguns: dificuldade de acesso a fontes oficiais, pouca
informação sobre a história social da guerra e suas conseqüências, e com relação à
participação das mulheres brasileiras o que observamos é uma lacuna historiográfica
que se contrasta com relação à participação da mulher paraguaia, pois a participação
destas foi devidamente registrada pela historiografia, e tem como sua maior
representante, a primeira dama paraguaia, Elisa Alicia Lynch. Em oposição a essa
última perspectiva pretendemos analisar e dar maior visibilidade, nesta comunicação, a
participação das mulheres brasileiras nesse conflito, o que desde já, vale ressaltar, que
foi uma participação forte e ativa, mais que, entretanto, não foi registrada pela
historiografia tradicional; o que leva aos pesquisadores dessa temática a buscar o
registro da participação feminina através dos memorialistas, artistas7 e viajantes. Vale
destacar que a historiografia tradicional está permeada de lacunas e silêncios, o que

5
Teatralização da Guerra do Paraguai. No Brasil, o conflito ocorreu entre os estados, do Rio Grande do
Sul e do Mato Grosso.
6
Arquivo Histórico do Exército, Arquivo Histórico do Itamarati, Arquivo do Tribunal de Justiça MS,
Biblioteca Nacional, e o Centro Regional Dourados-MS; estes foram os arquivos utilizados por Maria
Teresa G. Dourado na sua pesquisa documental.
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Iconografia contemporânea a Guerra do Paraguai.
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torna ainda mais difícil o caminho a ser percorrido pelos historiadores das mulheres.
Uma outra dificuldade encontrada pelos historiadores interessados na temática é que os
poucos registros oficiais8 existentes sobre a participação das mulheres brasileiras na
Guerra do Paraguai referem-se às senhoras pertencentes as “boas famílias”.
As poucas mulheres que foram mencionadas pelos memorialistas, e saíram do
anonimato com direito a nomes e sobrenomes registrados na história, foram as
respeitáveis senhoras casadas com homens que pertenciam à elite, em sua maioria eram
oficiais do exército, estes vistos como heróis. A maior parte dessas mulheres que
participaram do conflito, não tiveram direito à visibilidade, pois sempre que são
lembradas aparecem no coletivo, são senhoras anônimas, que não ocuparam lugar na
memória e nem na história. É interessante salientar que essa historiografia foi produzida
e dominada por muito tempo pelos homens, e que por isso as mulheres envolvidas nesse
conflito não foram registradas, pois o olhar masculino não permitia que a mulher
ocupasse o lugar que lhe pertencia por direito. E dentro da óptica masculina, ao ser
registrada, a mulher foi discriminada e por vezes ironizada pelos memorialistas e pelos
viajantes9.
Desta forma, é necessário que o historiador ao pesquisar a história das mulheres
na Guerra do Paraguai, tenha consciência da dificuldade que vai encontrar para ter
acesso às fontes referentes à história social deste conflito; entretanto, percebendo a
importância historiográfica dos trabalhos que resgatam a presença feminina ao longo da
história, o que pretendemos é analisar a presença das “heroínas da pátria” no que foi
considerado o maior conflito da América Latina.
Vejamos como essas mulheres atuaram na Guerra do Paraguai. Algumas
mulheres, como Dona Senhorinha10, ganharam na historiografia forte destaque, uma das
suposições para esse destaque seria pelo fato dessas mulheres serem filhas, mães,

8
Ofícios, inventários e relações das pessoas resgatadas nas fronteiras do Mato Grosso.
9
Entre os viajantes e memorialistas que registraram em seus relatos vestígios da participação feminina na
Guerra do Paraguai estão, Taunay, Benjamim Constant, Cerqueira, Pedro Américo, e Rodrigues da Silva.
10
Rafaela Senhorinha da Conceição Barbosa, Senhora da Elite; era filha e esposa de oficiais do exercito
brasileiro, foi feita refém por duas vezes, pelo exército paraguaio, junto com os seus filhos e agregados. A
segunda vez que D. Senhorinha foi capturada passou cinco anos no território inimigo, em péssimas
condições de sobrevivência, só retornando ao país quando ela e os demais prisioneiros foram resgatados
pelas tropas brasileiras em 1869. Em sua pesquisa Dourado conseguiu reunir uma serie documentos sobre
D. Senhorinha.
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esposas, e irmãs de oficiais, ou seja, de uma elite. Outras como Jovita Alves Feitosa,
eram mulheres comuns que se destacaram por seus atos considerados heróicos. Mas
todas possuem um ponto em comum, sofreram os males da guerra em nome da pátria.
Pois como afirma o escritor Machado de Assis, ao incentivar o patriotismo feminino, a
guerra não era um lugar para as mulheres,
Não nascestes para guerra da pólvora e da espingarda. Nascestes para outra
guerra, em que a mais inábil e menos violenta, vale por dois Aquiles. Mas, nos
momentos supremos da pátria, não sois das últimas. De qualquer modo ajudais
os homens. Uma como, mãe espartana, arma seu filho e o manda para a
batalha; outra borda uma bandeira e entregam aos soldados, outras costuram as
fardas dos valentes; outras dilaceram as próprias saias para encher cartuchos;
outras preparam os fios para os hospitais; outras juncam de flores os caminhos
dos bravos (...). Não tendes uma agulha, não comandais um regimento, formais
coragens, não fazeis um assalto, fazeis uma oração, não distribuis medalhas,
espalhais flores, e estas, podeis estar certar, hão de lembrar, mesmo quando o
forem secas, os feitos do passado e as vitórias do país. (MACHADO DE
ASSIS, 19--, p. 118).

As idéias patrióticas disseminadas por Machado de Assis, espalharam-se por todo


o país e tomaram corpo, na figura de algumas mulheres, como D. Rosa Maria Paulina da
Fonseca, “senhora alagoana que ofertava seus sete filhos a causa brasileira”
(DOURADO, 2002, p. 73). Alguns de seus filhos, após a Guerra do Paraguai se
destacaram nacionalmente, entre eles, Severiano Deodoro, ganhou os títulos de
Marechal e Barão de Alagoas; um outro, Manuel Deodoro, posteriormente, foi o
responsável pela proclamação da Republica, sob o título de Marechal Deodoro da
Fonseca.
Uma outra senhora da elite que ficou conhecida por seu patriotismo foi à baiana,
Ana Justina Ferreira Néri, que teve direito a nome e sobrenome registrados na história
por ser viúva do oficial da marinha Capitão-de-fragata Isidoro Antonio Néri. Ana Néri
veio a se tornar à primeira enfermeira do exercito brasileiro. Após os seus entes
queridos – filhos e irmãos – apresentarem-se ao Comando das Armas, como voluntários
da Pátria; esta respeitável senhora se sentiu motivada pela solidão em que se encontrou
após a partida dos seus filhos e, como mãe protetora e abnegada ofereceu seus serviços
às autoridades. Ana Néri acompanhou e cuidou dos seus três filhos combatentes, seguiu
junto ao 40° batalhão de voluntários da Pátria, comandado por seu irmão, Joaquim
Mauricio Ferreira. Durante a guerra Ana Néri perdeu um filho e um sobrinho. Ela foi
lembrada através dos registros pessoais de diversos viajantes, entre eles, Beijamim
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Constant que registrou a participação de Ana Néri através das cartas que enviou a sua
mulher, nestas, ele se referia à Ana Néri, como “uma respeitável senhora brasileira”, e
que pelos serviços prestados aos feridos, junto ao campo de batalha, fez por merecer o
apelido de “mãe dos brasileiros”.
Ao analisar o envolvimento destas duas senhoras brasileiras que tiveram direito a
ter seus nomes registrados, junto à historiografia contemporânea a Guerra do Paraguai,
podemos observar que a participação feminina neste conflito não ficou restrita apenas,
ao envio de seus filhos, maridos, pais e irmãos, como destaca Machado de Assis ao
ressaltar a fibra da mãe patriota, representada na figura de D. Rosa Maria Paulina da
Fonseca. Pelo contrario, a presença feminina se fez forte no campo de batalha, como
podemos observar através da figura da senhora Ana Néri, entretanto, a presença
feminina só pode ser percebida através das entre linhas dos relatos de oficiais e
viajantes. Olhares masculinos, que não tiveram o interesse de registrar a participação
feminina no conflito.
As senhoras da elite tiveram a sua presença registrada pelos memorialistas, mas
como sabemos a participação feminina neste conflito não ficou restrita a essas “senhoras
respeitáveis”. 11 É tentando suprir esta lacuna que buscamos resgatar a participação das
mulheres comuns neste conflito e trazer a luz, a presença feminina no campo de batalha.
Muitas dessas mulheres eram

seguidoras do exercito, andarilhas e vivandeiras, movidas pelos mais diversos


motivos, econômicos, afetivos, comerciais, entre outros, acompanhavam os
homens, criando modos de vida e sobrevivência na retaguarda das tropas
(DOURADO, 2002, p. 79).

As vivandeiras eram as mulheres que acompanhavam o exército por interesses


econômicos e comerciais, pois vendiam víveres, bebidas e objetos de necessidades,
algumas eram também prostitutas, que por preconceito passaram despercebidas, sem
deixar registros de sua participação. Entre as andarilhas, estavam amantes e esposas
legítimas de soldados, elas eram as responsáveis por cuidar dos filhos, da comida, das
roupas e, quando necessário, enfrentavam os campos de batalha, por vezes pegando em
armas, mas na maior parte das vezes, socorriam os feridos, fazendo curativos e
11
Termo utilizado por Maria Teresa Garritano Dourado para denominar as senhoras da elite.
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conduzindo-os até os hospitais de sangue. Essas andarilhas sofriam os mesmos


intempéries que os soldados, tais como, o sol, o frio, a fome, a chuva, as doenças e por
vezes as péssimas condições de salubridade, em que se encontravam os acampamentos.
Elas estavam expostas a todos os males, quando necessário carregavam a artilharia
pesada, na maioria das vezes realizavam todo percurso a pé.
Através dos registros de Taunay12 observamos “que as mulheres, mesmo diante
das doenças, não tinham quaisquer direitos, nem a cuidados, remédios e, muito menos,
abrigo” (DOURADO, 2002, p.82).

Nesse mesmo dia 28 morreram algumas mulheres, mais desamparadas ainda do


que os outros doentes, mas despidas de quaisquer socorro e, por causa de sua
natural fraqueza, mais assignaladas13 com o estigma da última miséria.
(DOURADO, apud, TAUNAY, 2002, p. 103).

Em seus relatos Taunay registrou, mesmo que de forma irônica, o alistamento de


Jovita Alves Feitosa. Jovita uma jovem piauiense de família simples, se alistou, aos
dezessetes anos, como Voluntários da Pátria, levada pelo amor pela pátria e o
sentimento nacionalista. Ela cortou os cabelos, vestiu-se de homem e apresentou-se ao
Exercito. A sua “farsa” foi logo descoberta, e sua história foi noticiada pela imprensa,
inclusive Jovita foi à única mulher retratada vestida de soldada, mas não como uma
figura masculinizada, usando armas; pelo contrário, ela foi retratada com traços
claramente femininos, usando saia, brincos, braços entrecruzados e o olhar seguro,
penetrante que transmite determinação e firmeza, ao observador. Jovita não foi posta no
campo de batalha, mas foi aceita para ajudar no serviço de enfermagem em um hospital
militar, passando a usar farda com saiote (DOURADO, apud, DORATIOTO, 2002,
p.116).
Além de Taunay outros oficiais também registraram a presença feminina no
campo de batalha, entre eles, o oficial Dionísio Cerqueira, que partiu para a guerra aos
17 anos de idade, mas só escreveu suas memórias na maturidade. Em suas

12
Visconde de Taunay foi incorporado à Expedição de Mato Grosso como ajudante da Comissão de
Engenheiros, enquanto esteve no conflito escreveu suas experiências, que posteriormente resultaram na
publicação do livro, A Retirada de Laguna.
13
Dourado optou por não alterar a grafia dos documentos utilizados nas citações, e por estas citações
serem retiradas do seu trabalho a ortografia não alterada.
8

reminiscências Cerqueira registrou a presença feminina com “bravura e dignidade”.


Escrevendo os atos heróicos destas mulheres anônimas, que arriscavam suas vidas nas
avançadas mais perigosas para levar a “bóia” dos maridos (DOURADO, apud,
CERQUEIRA, 1929, p. 307). Algumas entravam no campo de batalha para socorrer os
feridos, “rasgam as suas saias em ataduras para lhes estancarem o sangue, montal-os na
garupa de seus cavalos e conduzil-os no meio das balas para os hospitaes”
(DOURADO, apud, CERQUEIRA, 1929, p. 307).
As lembranças escritas por Cerqueira vão de encontro com os relatos deixados
por outros memorialistas, que registram a presença feminina com ironia. Mas a presença
feminina neste conflito nem sempre era de forma voluntária, algumas eram enviadas
como uma forma de serem penalizadas por terem um comportamento considerado de
“má conduta” (DOURADO, 2002, p. 89).
As poucas mulheres comuns que saíram da condição de anonimato em que
estavam relegadas, “foi porque demonstraram ato de heroísmo, como Preta Ana”
(DOURADO, 2002, p.12). Que teve seu ato de bravura registrado por Taunay, ao rasgar
as próprias roupas para fazer o curativo dos soldados feridos, em meio a um combate. E
mesmo sendo digna de nota e admiração, ela só teve direito ao primeiro nome, sendo
sua etnia lembrada com preconceito.
Ao longo desta comunicação buscamos dar vida a personagens como Jovita
Alves Feitosa, Ana Néri e D. Rosa Maria Paulina da Fonseca, para mostrar as mais
diversas formas de participação das mulheres na guerra, algumas como “mães
abnegadas” outras como “jovens corajosas”, mas todas com o mesmo espírito patriótico
tão declamado por Machado de Assis, em seus poemas sobre as mulheres patrióticas.
Muitas mulheres não tiveram direito ao seu merecido reconhecimento, mas é
interessante que a contribuição feminina seja reconhecida, ou através do coletivo; ou
representadas por mulheres que tiveram a sua participação registrada por um ato de
heroísmo e bravura, como Preta Ana.
Por muito tempo as mulheres estiveram relegadas ao esquecimento, sendo vistas
e registradas pela historiografia como submissas e dóceis algo que não corresponde com
a real contribuição que as mulheres deram para a história. Por isso, é interessante trazer
à tona essas mulheres que participaram da guerra e contribuíram para a formação da
9

nação, pois a presença feminina neste conflito ocorreu de forma passiva, ao enviarem
seus entes queridos a guerra, mas também foi de forma ativa, pois como foi registrado
por diversos memorialistas, as mulheres estiveram presentes nos campos de batalha,
acompanhando os regimentos e, ajudando no que fosse necessário. E a forma como
foram registradas não faz jus a sua valiosa participação. Por isso, é que se faz tão
importante o papel dos historiadores das mulheres, pois estes devem mostrar a
participação feminina dando-lhes vida, nomes, e rostos, algo que por muito tempo lhes
foi negado.

Referências Bibliográficas

ASSIS, Machado de. Poesias Completas. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1979.
DOURADO, Maria Teresa G. Mulheres comuns Senhora respeitáveis: a presença
feminina na Guerra do Paraguai. UFMT, 2002.
DORATIOTO, Francisco. Guerra do Paraguai. In: MAGNOLI, Demétrio (org.). São
Paulo: Contexto, 2006.
PERROT, Michelle. Os excluídos da história: operários, mulheres e prisioneiros.
Tradução de Denise Bottmann. 2.ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1988.
PRIORE, Mary Del. (Org.) História das mulheres no Brasil. São Paulo: Contexto,
2001.
SCOTT, Joan. História das mulheres. In: Burke, Peter (org.). A Escrita da História:
novas perspectivas. São Paulo: Unesp, 1992.
SOIHET, Raquel. História das mulheres. In: CARDOSO, Ciro F.: VAINFAS, Ronaldo
(orgs.). Domínios da Historia: ensaios de teoria e metodologia. Rio de Janeiro: Campus,
1997.

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