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Brasil é o terceiro país mais perigoso do mundo para defensores da terra e do

meio ambiente, aponta relatório da Global Witness

Maria Fernanda Ribeiro

O Brasil é o terceiro lugar mais perigoso do mundo para os defensores da terra e do


ambiente, atrás da Colômbia e das Filipinas, segundo Relatório da Organização Não-
Governamental (ONG) Global Witness divulgado hoje. Foram 24 ativistas mortos em
2019, quatro a mais que no ano anterior. Noventa por cento das mortes estão
concentradas na região Amazônica.

“Medo é uma realidade aqui, mas não nos paralisa porque se a gente deixar o medo
tomar conta, ele vence. Essa terra é do povo e vamos continuar a lutar”, a declaração é
da missionária Jane Dwyer, que assumiu a responsabilidade de continuar o trabalho
após o assassinato de Dorothy Stang, no município de Anapu, no Pará, um dos
estados mais violentos do Brasil, com oito dos 24 assassinatos. Irmã Doti, como era
conhecida, foi assassinada por dois pistoleiros e seu corpo atravessado por seis tiros
enquanto caminhava por uma estrada de terra do PDS Esperança, Projeto de
Desenvolvimento Sustentável que ela criou para assentar famílias pobres da
Transamazônica. Era uma manhã de 12 de fevereiro de 2005.

Em todo o mundo, a Global Witness registrou 212 defensores assassinados e assim


2019 se tornou o ano com o maior número de mortes. Em média, quatro defensores
são mortos todas as semanas desde dezembro de 2015, mês em que o acordo climático
de Paris foi criado. As demais mortes no Brasil foram registradas no Amazomas (5),
no Maranhão (4) e no Mato Grosso (2). Amapá, Mato Grosso do Sul, Bahia,
Pernambuco e Rondônia registraram uma morte cada.

O relatório mostra ainda que mais de dois terços dos assassinatos no mundo
ocorreram na América Latina, o que a classifica como o continente mais afetado
desde que a Global Witness começou a publicar os dados em 2012. Trinta e três
mortes ocorreram na região amazônica, com quase 90% dessas concentradas no
Brasil.
“Quem vive na Amazônia corre risco”, afirma Jean Bellini, coordenadora nacional da
Comissão Pastoral da Terra (CPT). Segundo ela, os povos indígenas e as comunidades
tradicionais da floresta vivem há gerações no meio da mata, na beira dos rios, com
outro modelo de vida e de estrutura social. “Todos esses povos compartilham do uso
comum do espaço e o agraonegócio e os grileiros querem colocar essa terra no
mercado. A Amazônia é a última fronteira da expansão do capital, por isso os povos
sofrem tanta violência.”

Madeira

A exploração madeireira foi o setor com o maior aumento de mortes no mundo desde
2018, com 85% a mais de ataques registrados contra defensores que se opõem à
indústria. No Brasil foram quatro casos, sendo o assassinato do indígena Paulo
Paulino Guajajara um dos mais emblemáticos e que chamou a atenção do mundo
todo. Paulino foi morto em novembro em um confronto com invasores na Terra
Indígena Arariboia, na região de Bom Jesus das Selvas, no Maranhão.

Mais quatro líderes comunitários de Guajajara foram mortos desde o assassinato de


Paulo Paulino. Entre 2000 e 2018, 42 indígenas Guajajara foram assassinados no
conflito em andamento com madeireiros ilegais, segundo o relatório.

Para a Global Witness, “os povos indígenas correm um risco desproporcional de


represálias.” No ano passado, 40% das vítimas pertenciam a comunidades indígenas e,
entre 2015 e 2019, mais de um terço de todos os ataques fatais foram direcionados aos
povos originários. A ONG contabiliza dez indígenas assassinados no Brasil no ano
passado.

Enquanto a extração illegal de madeira foi a responsável pelo aumento no número de


mortes, a mineração foi o setor mais letal do mundo, com 50 defensores assassinados
em 2019. Mais da metade dos assassinados pertenciam a comunidades na América
Latina afetadas pela mineração. As Filipinas foram o país com mais assassinatos
relacionados à mineração, com 16 mortos. Três desses óbitos estão no Brasil, nos
estados do Amapá, Bahia e Mato Grosso.
Mulheres assassinadas

Em todo o mundo, mais de um em cada defensores mortos em 2019 eram mulheres.


De acordo com o relatório, “muitas vezes a espinha dorsal de sua comunidade, as
mulheres tendem a assumir mais a responsabilidade de cuidar das crianças e dos
parentes idosos, além de tentar ganhar seu sustento e de trabalhar como ativistas. As
mulheres que agem e se manifestam também podem enfrentar ameaças específicas de
gênero, incluindo violência sexual. Se outros membros de sua família são defensores,
eles também podem ser alvo.”

No Brasil, duas mulheres foram assassinadas no ano passado: Rosane Santiago


Silveira, na Bahia, em 29 de janeiro, em conflito envolvendo a resistência à expansão
do eucalipto em reserva ambiental na Bahia. Ela foi encontrada morta em casa , com
pés e mãos amarradas, com perfurações de facas e balas e um pano enrolado no
pescoço, indicando o estrangulamento.

A segunda vítima foi Dilma Ferreira da Silva, em 22 de março, no Pará.


Coordenadora do Movimento dos Atingidos por Barragens, ela foi degolada e, assim
como Rosane, também foi encontrada morta em casa, no assentamento Salvador
Allende, zona rural de Baião.

Para Ben Leather, chefe de campanhas da Global Witness, os assassinatos


representam apenas o ponto mais nítido dos riscos que os ambientalistas enfrentam no
Brasil, como ameaças, criminalização e ataques contra os parentes dos defensores.
“As políticas do presidente Bolsonaro parecem priorizar os lucros a curto prazo dos
ruralistas e das corporações internacionais, significando que os defensores se tornarão
ainda mais importantes e precisarão do nosso apoio mais do que nunca."

Número total de assassinatos por país.


Colombia 64
Philippines 43
Brazil 24
Mexico 18
Honduras 14
Guatemala 12
Venezuela 8
India 6
Nicaragua 5
Indonesia 3
DRC 2
Burkina Faso 2
Romania 2
Kazakhstan 2
Uganda 1
Peru 1
Cambodia 1
Bolivia 1
Ghana 1
Kenya 1
Costa Rica 1

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