Você está na página 1de 5

PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DA PARAÍBA

TRIBUNAL DE JUSTIÇA
GAB. DES. ROMERO MARCELO DA FONSECA OLIVEIRA

ACÓRDÃO

APELAÇÃO Nº 0051803-59.2011.815.2001.
ORIGEM: 13ª Vara Cível da Comarca da Capital.
RELATOR: Des. Romero Marcelo da Fonseca Oliveira.
1º RECORRENTE: Revista Politika.
ADVOGADO: Felipe Ribeiro Coutinho e outros.
2º RECORRENTE: Eraldo Marinho Fernandes.
ADVOGADO: Luiz Filipe F. Carneiro da Cunha.
RECORRIDOS: Os Recorrentes.

EMENTA: INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. VEICULAÇÃO DE


MATÉRIA EM REVISTA. IMPUTAÇÃO DE CONDUTA ILÍCITA.
PROCEDÊNCIA PARCIAL DO PEDIDO. APELAÇÃO DA RÉ. ALEGAÇÃO DE
ERRO ESCUSÁVEL. TROCA DE PRENOMES. CARÁTER INFORMATIVO.
SUPOSTA AUSÊNCIA DE DANOS À IMAGEM DO AUTOR. COMPROMISSO
ÉTICO E LEGAL COM A INFORMAÇÃO VEROSSÍMIL. RELATIVIZAÇÃO
DA LIBERDADE DE IMPRENSA. ABUSIVIDADE COMPROVADA.
NOTORIEDADE DO CONSTRANGIMENTO. DANOS À IMAGEM
PRESUMIDOS. DEVER DE INDENIZAR. DESPROVIMENTO DO APELO.
RECURSO ADESIVO DO AUTOR. MAJORAÇÃO DO QUANTUM
INDENIZATÓRIO. CABIMENTO. FIXAÇÃO EM PATAMAR RAZOÁVEL E
PROPORCIONAL À LESÃO SOFRIDA. OBRIGAÇÃO DE FAZER.
RETRATAÇÃO PÚBLICA. PUBLICAÇÃO DA ÍNTEGRA DA SENTENÇA.
IMPOSSIBILIDADE. PROVIDÊNCIA PREVISTA NA LEI DE IMPRENSA QUE
NÃO FOI RECEPCIONADA PELA CF/88. AUSÊNCIA DE PREVISÃO NA
LEGISLAÇÃO CIVIL. PRECEDENTES DO STF E STJ. PROVIMENTO
PARCIAL DO RECURSO.

1. Age com culpa e causa dano moral passível de indenização o meio jornalístico que
divulga fato inverídico e ofensivo à moral alheia, imputando-lhe o cometimento de conduta
criminosa, sem a devida averiguação da veracidade dos fatos.

2. O direito ao recebimento de indenização, de natureza material ou moral, tem seu alicerce


na prática de ato ilícito pelo lesante, e na configuração dos requisitos caracterizadores da
responsabilidade civil, qual sejam: dano, nexo causal e culpa.

3. Na fixação do quantum indenizatório, o magistrado deve sopesar a situação financeira


das partes, o abalo experimentado pela vítima, a duração do dano, a fim de proporcionar
uma compensação econômica para esta, e impor um caráter punitivo ao causador do dano,
impedindo a prática de tais ilícitos.

4. “A Lei de Imprensa previa a possibilidade de se determinar a publicação das sentenças


cíveis e criminais proferidas em causas nas quais se discutissem ofensas perpetradas pela
imprensa, no mesmo veículo de comunicação em que a ofensa tivesse sido veiculada. Esse
direito não se confunde com o direito de resposta, de modo que ele não encontra
fundamento direto na constituição federal. A sobrevivência do direito à publicação da
sentença, portanto, deve ser apreciada com os olhos voltados à legislação civil. O princípio
da reparação integral do dano não tem alcance suficiente para abranger o direito à
publicação da sentença cível ou criminal” (REsp 885248/MG, Rel. Ministra NANCY
ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 15/12/2009, DJe 21/05/2010).

VISTO, relatado e discutido o presente procedimento referente à Apelação


n.º 0051803-59.2011.815.2001, em que figuram como partes Eraldo Marinho
Fernandes e a Revista Politika.

ACORDAM os eminentes Desembargadores integrantes da Colenda Quarta


Câmara Especializada Cível do Tribunal de Justiça da Paraíba, à unanimidade,
acompanhando o Relator, em conhecer da Apelação e negar-lhe provimento,
conhecer do Recurso Adesivo e dar-lhe provimento parcial.

VOTO.

Revista Politika interpôs Apelação contra a Sentença prolatada pelo Juízo


da 13ª Vara Cível da Comarca desta Capital, f. 102/105, nos autos da Ação de
Indenização por Danos Morais em seu desfavor ajuizada por Eraldo Marinho
Fernandes, que julgou parcialmente procedente o pedido, condenando-a ao
pagamento da quantia de R$ 4.000,00 a título de danos morais, em virtude da
veiculação de matéria afirmando, equivocadamente, ter sido o Autor detido na
Operação “Confraria”, que apurava irregularidades nos contratos celebrados pelo
Município de João Pessoa.

Em suas razões recursais, f. 107/119, alegou que a notícia não visava


macular a imagem do Autor, revestindo-se de caráter meramente informativo,
afirmando que ocorreu apenas a troca do prenome do Sr. Evandro de Almeida
Fernandes pelo do Promovente, no corpo da matéria jornalística, equívoco que
entende não ser suficiente para lhe causar danos de ordem moral.

Pugnou pelo provimento do Apelo e pela reforma da Sentença, para que a


pretensão inicial seja julgada totalmente procedente, ou, subsidiariamente, requereu
a minoração do montante indenizatório arbitrado pelo Juízo.

Contrarrazoando, f. 145/164, o Autor aduziu que, ao contrário do que alegou


a Ré, a matéria não se limitou à troca do prenome de Evandro de Almeida
Fernandes, que exercia à época da operação o cargo de Secretário de Infraestrutura
do Município de João Pessoa, posto que se utilizou da expressão “o ex-presidente da
Cagepa, Heraldo Marinho” (sic), indicando expressamente o cargo que ocupava,
sem deixar dúvidas ao leitor em relação a quem se referia.

Sustentou que as inverdades publicadas a seu respeito lhe causaram angústia


e preocupação, posto que denegriram sua imagem de homem probo e íntegro, não
havendo que se falar, em seu entender, em mero aborrecimento ou dissabor
cotidiano.

Asseverou que o direito à informação e a liberdade de expressão não são


absolutos, sendo vedada a divulgação de notícias falsas que exponham a intimidade
e acarretem danos à honra e à imagem de outrem, em ofensa ao Princípio da
Dignidade da Pessoa Humana, requerendo, ao final, o desprovimento do Apelo e a
manutenção da quantia indenizatória fixada na Sentença.

Incontinenti, interpôs Recurso Adesivo, f. 125/144, pugnando pela reforma


da Sentença, para que seja majorada a indenização para o valor de R$ 10.000,00,
bem como para que se determine à Ré a obrigação de fazer consistente na
publicação da íntegra da Decisão condenatória, como forma de retratação pública
pelo erro cometido.

Sem contrarrazões da parte Promovida, consoante Certidão de f. 166-v.

A Procuradoria de Justiça ofertou Parecer, f. 172/174, sem pronunciamento


sobre o mérito da causa, por entender que não estão configuradas quaisquer das
hipóteses previstas no artigo 82, do Código de Processo Civil.

É o Relatório.

Os Recursos são tempestivos, a Apelante/Ré recolheu o preparo, f. 120, e o


Autor é beneficiário da gratuidade judiciária, pelo que, presentes os demais
requisitos de admissibilidade, deles conheço, analisando-os conjuntamente,
porquanto discutem a existência ou não do dever de indenizar, e trazem pleitos no
sentido de modificar o quantum indenizatório.

O Supremo Tribunal Federal, o Superior Tribunal de Justiça e os Tribunais


de Justiça pátrios sedimentaram o entendimento de que a veiculação de matéria
jornalística em que se atribui a prática de conduta ilícita inverídica a outrem
configura a existência de responsabilidade civil, em razão do dever dos veículos de
comunicação de, ao divulgarem notícia imputando prática criminosa a terceiro,
verificarem, ao menos, a possível autenticidade da informação, sob pena de exceder
manifestamente os limites sociais do direito à liberdade de imprensa e à
informação1.
1 “O Tribunal Pleno, na ADPF 130, Rel. Min. Carlos Britto, DJe de 06-11-2009, decidiu que não afronta a
liberdade de imprensa ou a livre manifestação do pensamento a responsabilização civil de jornalistas ou
de veículos de imprensa por danos morais decorrentes de matérias jornalísticas”. (STF. Re 571151 AGR,
relator (a): Min. Teori Zavascki, Segunda Turma, julgado em 25/06/2013, acórdão eletrônico DJe-158 divulg
13-08-2013 public 14-08-2013).

“O direito à informação não elimina as garantias individuais, porém encontra nelas os seus limites,
devendo atentar ao dever de veracidade, ao qual estão vinculados os órgãos de imprensa, pois a falsidade
dos dados divulgados manipula em vez de formar a opinião pública, bem como ao interesse público, pois
nem toda informação verdadeira é relevante para o convívio em sociedade, não se exigindo, contudo,
prova inequívoca da má-fé da publicação”. (STJ. RESP 1414004/DF e RESP 1374177/GO).

“O veículo de comunicação exime-se de culpa quando busca fontes fidedignas, quando exerce atividade
investigativa, ouve as diversas partes interessadas e afasta quaisquer dúvidas sérias quanto à veracidade
do que divulgará”. (STJ. RESP 1269841/SP, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em
17/10/2013, DJe 25/10/ 2013).

APELAÇÃO. CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS.


CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. PROVA ORAL PRESCINDÍVEL. PRELIMINAR
REJEITADA. PEDIDO INDENIZATÓRIO A VALOR CERTO. CONDENAÇÃO JUDICIAL A QUANTIA
SUPERIOR. IMPOSSIBILIDADE. SENTENÇA ULTRA PETITA. DECLARAÇÃO PARCIAL DE
NULIDADE. LIMITAÇÃO DO MONTANTE CONDENATÓRIO. CABIMENTO. PUBLICAÇÃO DE CARTA
DE LEITOR, IMPUTANDO CRIME DE OMISSÃO DE SOCORRO A MÉDICO. CONDUTA ILÍCITA DA
SUBSCRITORA DO TEXTO E DA EMPRESA JORNALÍSTICA. CONFIGURAÇÃO. DANO MORAL.
In casu, a Ré veiculou em sua Edição nº 6, Ano I, de setembro de 2011, f.
34/63, uma reportagem que tratava de uma investigação realizada para apurar
supostas fraudes em licitações e desvio de verba pública no Município de João
Pessoa, afirmando que o Autor havia sido detido na referida operação, atribuindo-
lhe participação no suposto esquema ilícito, tendo admitido, posteriormente, o
equívoco da informação veiculada.

Comprovada a ausência de veracidade da notícia, surge aí o dever de


indenizar, levando em conta que a prova do abalo moral se satisfez com a simples
comprovação da veiculação dos exemplares que traziam dentre suas matérias aquela
de cunho ofensivo ao Autor, independentemente de prova objetiva do dano, que se
presume em decorrência da notoriedade do constrangimento sofrido pela ampla
veiculação da informação inverídica em renomada revista e com circulação em todo
o Estado, motivo pelo qual entendo que o valor arbitrado pelo Juízo merece ser
majorado para o valor de R$ 10.000,00, montante que se figura compatível com os
danos sofridos pelo Autor, bem como à condição financeira da requerida.

EXISTÊNCIA. RESPONSABILIDADE CIVIL SOLIDÁRIA RECONHECIDA. SÚMULA Nº 221/STJ.


QUANTUM INDENIZATÓRIO. RECURSOS DESPROVIDOS NO MÉRITO. [...] Atribuir a prática de
ilícito penal e ético inverídico a outrem importa em conduta ilícita e configura a existência de
responsabilidade civil. Os veículos de comunicação, ao divulgarem notícia imputando prática criminosa a
terceiro, ainda que subscrita por leitor e não por membro de sua equipe de jornalismo, devem verificar,
ao menos, a possível autenticidade da informação, sob pena de exceder manifestamente os limites sociais
do direito à liberdade de imprensa e de assumir a obrigação de reparar eventuais danos, conforme
estabelecido no art. 927, do Código Civil. [...] A inverídica imputação da prática de ilícito penal gera
manifesta ofensa à honra, à imagem e ao nome da pessoa, causando dor e sofrimento de cunho moral.
Como uníssono na jurisprudência pátria, a indenização por danos morais não deve implicar em
enriquecimento ilícito, tampouco pode ser irrisória, de forma a perder seu caráter de justa composição e
prevenção. (TJMG; APCV 1.0145.08.471598-9/001; Rel. Des. Leite Praça; Julg. 01/12/2014; DJEMG
02/12/2014)

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS MATERIAIS E MORAIS. SENTENÇA DE


IMPROCEDÊNCIA. RECURSO DO AUTOR. IRRESIGNAÇÃO NO TOCANTE À CONFIGURAÇÃO DA
RESPONSABILIDADE CIVIL E, EM CONSEQUÊNCIA, DO DEVER DE INDENIZAR. 1. Publicação em
jornal e revista de circulação nacional a respeito da participação do demandante em esquema fraudulento
de avaliação de cursos de universidades. 2. Comprovação do nexo de causalidade entre o fato ilícito, o
dano e a atitude de preposto da requerida, o qual confirmou a repórter as denúncias por si feitas ao MEC.
Veiculação de notícia inverídica em jornal e revista de alcance nacional. […] (TJSC; AC 2010.081950-3;
Capital; Primeira Câmara de Direito Civil; Rel. Des. Raulino Jacó Brüning; Julg. 09/04/2015; DJSC
08/05/2015; Pág. 148)

APELAÇÃO CIVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS.


NOTÍCIA VEICULADA NO SITE DA RÉ. INVERACIDADE DAS INFORMAÇÕES. ABUSO DO DIREITO
DE INFORMAR. Comprovado que a notícia veiculada pela parte ré extrapolou o direito de informar, ao
indicar que a parte autora tinha envolvimento com crimes contra a propriedade intelectual, seqüestro e
cárcere privado, situação inverídica, resta evidente o dever de indenizar. Sentença reformada. Dano
moral. Pessoa física. Hipótese de dano moral in re ipsa, pois é presumível o abalo advindo da injusta
acusação, dispensando maiores digressões. [...] (TJRS; AC 0414815-39.2014.8.21.7000; Canoas; Décima
Câmara Cível; Rel. Des. Paulo Roberto Lessa Franz; Julg. 27/11/2014; DJERS 10/12/2014)
Por fim, quanto ao pleito de retratação pública, providência que estava
prevista apenas na Lei de Imprensa, a qual não foi recepcionada pela Constituição
Federal, por decisão do Supremo Tribunal Federal na Ação de Descumprimento de
Preceito Fundamental nº 130, entendo que não é cabível, porquanto não há previsão
neste sentido na legislação civil vigente, entendimento consonante com o firmado
pelo Superior Tribunal de Justiça2.

Posto isto, conhecidos os Recursos, nego provimento à Apelação da Ré e


dou provimento parcial ao Recurso Adesivo do Autor, aumentando o valor da
indenização por danos morais para a quantia de R$ 10.000,00.

É o voto.

Presidiu o julgamento realizado na Sessão Ordinária desta Quarta Câmara


Especializada Cível do Tribunal de Justiça da Paraíba, no dia 22 de setembro de
2015, conforme Certidão de julgamento, com voto, o Excelentíssimo
Desembargador Frederico Martinho da Nóbrega Coutinho, participando do
julgamento, além deste Relator, o Excelentíssimo Desembargador João Alves da
Silva. Presente à sessão o Exm.º Procurador de Justiça Dr. José Raimundo de Lima.

Gabinete no TJ/PB em João Pessoa,

Des. Romero Marcelo da Fonseca Oliveira


Relator

2 “[…] Até que seja aprovada a nova Lei de Imprensa, atualmente em discussão no Congresso Nacional, resta
assegurado aos cidadãos apenas o exercício do direito de resposta, não a faculdade de requerer a publicação, na
íntegra, das sentenças cíveis ou criminais que julgarem processos relacionados a ofensas perpetradas por
veículos de comunicação.

Não é possível argumentar, neste ponto, que o princípio da reparação integral do dano (previsto, de maneira
expressa, apenas no art. 944 do CC/02, mas também presente, como cânone de interpretação, no CC/16) indique
solução diversa. Isso porque, não obstante a publicação da sentença possibilite uma maior amplitude na
reparação do dano de imagem causado ao ofendido, não se pode estabelecer, a partir de uma regra geral de
indenização por ato ilícito, o permissivo para impor uma obrigação de fazer ao devedor, salvo se tal obrigação se
encontra previamente ajustada em contrato.

Abrir-se tal precedente permitira que, no futuro, qualquer ato de injúria, independentemente de sua prática por
veículo de imprensa, ou qualquer ato privado que implique lesão ao direito à imagem (como o apontamento
indevido de título a protesto, a reprodução indevida de marca etc), fosse punido, pelo juízo cível, com a
imposição de pedidos públicos de desculpas, publicação de retratação em pequenos periódicos e assim por
diante. Seria temerário permitir, sem lei prévia, que toda essa amplitude fosse extraída da mera interpretação da
regra geral contida nos arts. 159 do CC/16, 189 e 944 do CC/02”. (STJ, REsp 885.248/MG, Terceira Turma
Julgadora, Rel. Min. Nancy Andrighi, j. 15/12/2009, publicado no DJE de 21/05/2010)

Você também pode gostar