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CLUBE RECREATIVO 11 DE JUNHO: AGUDOS, SP

EIXO TEMÁTICO: E1 – Materiais, Técnicas e História da Construção


Subeixo: Materíais e técnicas tradicionais

RESUMO
Este estudo, que compõe parte do trabalho de conclusão para a obtenção do grau de Arquiteto e Urbanista,
desenvolvido na Universidade Paulista – UNIP, Campus Bauru/SP, tem por objetivo apresentar os materiais, técnicas
e a história da construção do antigo Clube Recreativo 11 de Junho, localizado na cidade de Agudos/SP. Por apresentar
grande valor cultural e arquitetônico para a cidade, palco de inúmeros acontecimentos históricos importantes e por
seu valor enquanto legítimo representante da arquitetura eclética, no interior paulista, o antigo Clube Recreativo é
considerado patrimônio cultural da cidade. Como todo patrimônio arquitetônico, sua preservação deve acontecer a
partir de projeto de restauro, embasado por inventário, cujo o objetivo é o amplo conhecimento da edificação, para
orientar intervenções que permitam a transmissão do bem às futuras gerações, na sua condição de maior veracidade.
Sua preservação se faz necessária porque ele guarda parte da história e da memória da cidade de Agudos, que teve sua
formação vinculada à cultura do café. Outra questão importante é o vínculo do Clube Recreativo com a história da
cultura e da educação local. O estudo foi realizado através de pesquisas histórica e iconográfica, buscando informações
sobre o período de sua construção e o contexto histórico e arquitetônico em que foi construído. Foram realizadas
também pesquisas de campo, visando levantar dados referentes aos materiais e técnicas empregados, as patologias,
seus usos e suas alterações ao longo do tempo. Outro ponto importante foi a coleta de informações junto aos moradores
da redondeza, na tentativa de colher histórias orais. Assim, foi constatado que o edifício, constitui um registro da
arquitetura eclética e de sistema construtivo típico da época, sendo esta a abordagem a ser apresentada aqui. Trata-se
de bem histórico que pode e deve ser preservado, principalmente devido à sua quase intocada configuração original.

PALAVRAS-CHAVE: Arquitetura eclética; patrimônio histórico; preservação do patrimônio; técnicas construtivas


tradicionais.

ABSTRACT
This study was developed by the University of São Paulo (UNIP), Campus Bauru / SP, to present the materials,
techniques and histories of the construction of the former Recreation Club 11 de Junho, located in the city of Agudos
/ SP. Because it presents great cultural and architectural value to the city, a stage of important and important events
for its value as a legitimate representative of the eclectic architecture, the interior of São Paulo, the former Recreativo
Clube is considered a cultural patrimony of the city. Like all architectural patrimony, his life must be a restoration
project, based on inventory, which is the great knowledge of edification, to guide the action that allows a transmission
of the future to future generations, in their condition of greater truthfulness. The main report for the memory of the
city of Agudos, that had their part information with the culture of coffee. Another important issue is the Recreational
Club Link with a history of local culture and education. The study was carried out through historical and iconographic
reports, seeking information about the period of its construction and the historical and architectural context in which
it was built. Field research was also carried out, focusing on the materials and techniques employed, such as
pathologies, their uses and their changes over time. Another important point was an information gathering with the
residents of the surrounding area, in an attempt to collect the stories. Thus, it was constituted the building, being a
record of the eclectic architecture and of the typical constructive system of the time, being this an approach to be
realized here. It is a historical good that can and should be preserved, mainly due to its almost untouched original
configuration.

KEY WORDS: Eclectic architecture; historical patrimony; preservation of the patrimony; traditional constructive
techniques.

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1. INTRODUÇÃO
O artigo apresentado é resultado parcial de pesquisa desenvolvida ao longo do ano de 2018, parte integrante
do trabalho de conclusão, para o grau de Arquiteto e Urbanista, do curso da Universidade Paulista - UNIP,
Campus Bauru/SP. Tem por objetivo principal apresentar a história de construção do edifício Clube
Recreativo 11 de Junho, localizado na cidade de Agudos, SP, assim como os materiais e técnicas
construtivas utilizadas. O edifício, objeto de estudo do presente artigo, foi palco de inúmeros
acontecimentos históricos importantes para a localidade durante o período áureo do café. Foi idealizado por
Coronel Leite, dono de uma das principais fazendas produtoras de café da época e importante membro da
política local. Faz parte da história da formação da cidade de Agudos e está localizado em seu centro
histórico.
O Ato de preservar um espaço e suas características deve ser posto em prática para salvaguardar a memória
de uma época: “[...] o conjunto de bens materiais e/ou imateriais que contam a história de um povo e sua
relação com o meio ambiente é o legado que herdamos do passado e que transmitimos à gerações futuras”
(CAU/MT, s/d.). Por isso, é importante termos em mente que o ato de preservar está ligado à nossa história
como país e como cidadãos. Nesse sentido “[...] é dever de patriotismo preservar os recursos materiais e as
condições ambientais em sua integridade, sendo exigidos métodos de intervenção capazes de respeitar o
elenco de elementos componentes do Patrimônio Cultural” (Lemos, 1981).
Ao apresentar a história de construção do Clube 11 de Junho, apresenta-se também sua relação com a
história da cidade, com a da produção cafeeira, das técnicas construtivas e materiais utilizados para sua
construção, que estão diretamente inter-relacionadas. A história de formação da cidade permite
compreender o contexto no qual o edifício foi erguido, sua influência e importância dentro da cidade de
Agudos e para a população local. Já a abordagem da história da produção cafeeira na cidade busca
relacionar a tipologia arquitetônica dentro dos movimentos e vertentes da época, bem como seus usos,
materiais e técnicas construtivas empregadas. Por fim, as principais modificações ao longo do tempo
permitem entender a evolução dos usos e suas necessidades, e as adaptações que a edificação sofreu para
abriga-los.
Assim, “[...] se devemos preservar as características de uma sociedade, teremos forçosamente que manter
conservadas as suas condições mínimas de sobrevivência, todas elas explicitadas no meio ambiente e no
seu saber” (Lemos, 1981). A citação faz referência ao meio ambiente, em que se inclui as edificações,
compreendidas aqui como exemplares construtivos de uma época, que englobam tanto os materiais e
técnicas, quanto o “saber fazer” de uma época. O Clube 11 de Junho se encaixa perfeitamente na definição
de Choay sobre o monumento histórico:
O monumento histórico relaciona-se de forma diferente com a memória viva e com a
duração.
Ou ele é simplesmente constituído em objeto de saber e integrado numa concepção linear
de tempo – neste caso seu valor cognitivo (conhecimento) relega-o inexoravelmente ao
passado, ou antes, à história em geral, ou à história da arte em particular -; ou então ele
pode, além disso, como obra de arte, dirigir-se à nossa sensibilidade artística, ao nosso
‘desejo de arte’: neste caso ele se torna parte constitutiva do presente vivido, mas sem a
mediação da memória ou da história (Choay, 2001, pg. 11).

Nesse sentido, a preservação deste patrimônio se faz necessária porque ele guarda parte da história e da
memória da cidade de Agudos, que teve sua formação vinculada à cultura do café. Outra questão importante
é o vínculo do Clube Recreativo com a história da cultura e da educação local, bem como sua importância
construtiva, que contempla materiais e sistemas construtivos tradicionalmente utilizados nas primeiras
décadas do séc. XX.

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2. O EDIFÍCIO NO CONTEXTO HISTÓRICO DA CIDADE.

Conforme De Rosa (2014), a área central do Estado de São Paulo foi, no final do século passado, aos poucos
sendo tomada pela cafeicultura, e a origem de Agudos está situada neste fenômeno. O início do povoamento
da cidade aconteceu a partir da concentração de uma vila em torno de uma capela dedicada a São Paulo.
Essa forma de povoado era costumeira, e segundo Bonduk:
No processo de crescimento do pequeno povoado nascido de um patrimônio religioso, o
conjunto formado pelo templo se amplia, de singela capela para uma igreja de maior
dimensão[...], nasce daí o largo da matriz, que se tornou, geralmente, o ponto focal desses
núcleos (2010, pg. 64-65).

Figura 01 – Mapa territorial do município de Agudos


Fonte: Livro Agudos: A açucena da Serra, pg.20.

A capela foi construída entre os anos de 1862 e 1868, surgindo assim, o nome da cidade como “São Paulo
dos Agudos”, o objetivo desse núcleo colonial era a catequização dos silvícolas que ali moravam. Agudos
era inicialmente chamada de São Paulo dos Agudos, devido à escolha do santo São Paulo como padroeiro
da cidade e por estar situada na Serra dos Agudos (FELIX, 2013, pg.17).
Em meados do século XIX, começaram a vir para essa região alguns mineiros em busca de terras
denominadas “sertão” animados com a possível terra farta para plantação. Muitos não tiveram sorte e não
resistiram aos ataques dos indígenas ferozes que habitavam essas áreas. Faustino Ribeiro (figura 02) foi um
desses mineiros em busca de oportunidades e um dos principais fundadores da cidade (DE ROSA, 2014,
pg. 17).

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Após a chegada de Faustino, fazendeiros de Lençóis Paulista se estabeleceram em Agudos interessados na
plantação de café, após adquirirem algumas terras e se fixarem na cidade, Coronel Delfino e o Genro
Capitão Benedito Ottoni construíram o primeiro casarão rural na Fazenda São João e várias residências
para os familiares em torno da capela e do Largo São Paulo na rua 13 de maio. Essa rua, segundo De Rosa,
juntamente com a “7 de setembro”, são as ruas mais antigas da cidade (2014, pg. 19).
[...]A capela, e algumas construções ao seu redor, compunham, no final do século XIX o
chamado Centro de São Paulo dos Agudos. Ali concentravam-se muitas casas comerciais,
que deslocaram, com o tempo, a outras ruas próximas[...], atualmente, o local é também
denominado CENTRO HISTÓRICO DA CIDADE DE AGUDOS (DE ROSA, 2014,
pg.191).
Assim, a partir de 1880 foi iniciado o cultivo do café na cidade, e em meados de 1900, devido à grande
produção do fruto, chegou ao município duas, das maiores ferrovias do Brasil: “O ramal de Agudos” trazida
pela Companhia Paulista de Estradas de Ferro” e a “Companhia da União Sorocabana”. A partir da chegada
da estada de ferro, a cidade prosperou e viu-se a necessidade de ampliar as áreas de educação e cultura para
a população.
A praça, inicialmente chamada de Largo da Capela e depois de Largo São Paulo, concentrava as principais
residências da cidade. Coronel Delfino foi o principal responsável pela maioria das construções no entorno
da praça e foi a partir da Capela em seu centro que o distrito de São Paulo de Agudos se originou. (FELIX,
2013, pg.19)
Podemos afirmar que a Praça Coronel Delfino ou praça da Matriz é um marco na história do início da
cidade e é de suma importância a sua preservação enquanto memória viva desses acontecimentos. Hoje,
nessa área, ainda existem alguns exemplares da arquitetura do início do século XX, como a Igreja Matriz
construída em 1905, o Agudos Palace Hotel, residências de famílias tradicionais e o Edifício “Clube
recreativo 11 de Junho” (figura 02), objeto de estudo do presente trabalho.

Figura 02 – Praça Coronel Delfino e localização do Clube Recreativo 11 de junho


Fonte: Livro Contos, Cantos e Encantos, pag. 02

A construção do Clube foi iniciada em 1925 e tardou dois anos para ser concluída. Inaugurado em 11 de
junho de 1927, a edificação fazia parte das novas e elegantes construções ecléticas do entorno do Largo
São Paulo e da cidade de Agudos. O edifício tem como tipologia construtiva o sobrado, e como estilo
arquitetônico, o ecletismo, muito difundido e usado na época pelas classes mais abastadas que queriam
trazer as referências da Europa para o Brasil, e consequentemente para suas residências no interior do estado

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de São Paulo. O Local tornou-se movimentado pelos eventos recreativos, literários e musicais promovidos,
onde pianistas, violonistas, poetas e cantores se apresentavam seguidamente (DE ROSA, 2014, pg.200)”.

Figuras 03 e 04: Ginásio Municipal São Paulo


Fonte: Espaço histórico Plinio Machado Cardia, s/d.

O Clube Recreativo funcionou até o ano de 1929, após dois anos de sua inauguração, que, entretanto, foram
suficientes para deixar sua marca na história da cultura dentro da cidade. Após o encerramento de suas
atividades, o edifício cedeu lugar a primeira escola de ensino secundário de Agudos (figura 03 e 04), onde
teve como principal incentivador o Padre Aquino. Ciente da necessidade da abertura de uma escola na
cidade, ele pediu apoio ao Coronel Leite, para que pudesse usufruir dos espaços do antigo clube,
empenhando-se na criação do Ginásio Municipal São Paulo (DE ROSA, 2014, pg. 201). Em meados de
1931, o Ginásio ganhou um edifício próprio deixando o prédio novamente em desuso por alguns anos. Mais
tarde, recebeu uma outra instituição de ensino, a Escola técnica de Comércio, organização honrosa, que
diplomou centenas de contadores em Agudos e outras cidades da região (DE ROSA, 2014, pg. 201).
Em 1990, o edifício foi ocupado pela Escola Particular, chamada Serelepe, que ofereceu uma gama de
habilitações aos que procuravam ingressar no mercado de trabalho, sendo Escola de 1º. grau, habilitação
específica em magistério e 2º grau, habilitação profissional plena em contabilidade e técnico em informática
e enfermagem, mesmo enfrentando as dificuldades financeiras como as outras escolas particulares da época.
Em 2013, após o falecimento da Prof.ª Anésia Bigarelli, idealizadora e diretora da Serelepe, a escola
encerrou suas atividades (DE ROSA, 2014, pg. 201).

3. TIPOLOGIA ARQUITETÔNICA, MATERIAIS, SISTEMA CONSTRUTIVO E ELEMENTOS


DECORATIVOS
De acordo com Lemos, o ecletismo é a somatória das criações individuais, é uma “linguagem eufórica da
liberdade” calçada na nova tecnologia que estava por vir, pois até então no final do século XIX, São Paulo
só conhecia as construções de taipa de pilão, e, foi através da chegada do café à capital juntamente com os
imigrantes, que a cidade passou a comportar a alta elite cafeeira, que trazia da Europa novos materiais e
novos estilos para se fazer arquitetura (1987, pg. 70-72).
O Ecletismo seria a liberdade ou licença de criar, de recriar e de combinar formas, de
misturar ornamentações próprias de estilos definidos regionalmente pela Europa afora.
Nessa hora, explicar o ecletismo é buscar a miscelânea (LEMOS, 1987, pg. 70).

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Segundo Mendes, na penúltima década do século XIX, o Brasil passou de monarquia para República e este
novo regime precisava modernizar o país. Logo após a semana de arte moderna do Brasil em 1922, a
arquitetura começou a intensificar a mistura de estilos que caracterizava o período Eclético no Brasil:
Nas duas primeiras décadas do século XX, surgiram as grandes reformas urbanas no
Brasil, inspiradas principalmente nos trabalhos de Haussmann em Paris, com ampla
repercussão pelo mundo. Os edifícios projetados e construídos nesses novos cenários
metropolitanos deveriam refletir, em sua tipologia estilística, o espirito da modernidade
da proposta parisiense (MENDES, 2015, pg. 25).
Assim, o termo arquitetura eclética é usado em referência aos estilos que exibiam combinações de
elementos que podiam vir da arquitetura clássica, medieval, renascentista, barroca, entre outras. Com isso,
buscava-se negar a ligação com o passado português fazendo referências a novas fontes de culturas, como
a França e a Itália (MENDES, 2015, pg.25).
Nesse contexto, Lemos classifica o ecletismo em nove grupos, cada qual em sua época e com suas
singularidades, onde, quando buscamos a comparação com o edifício Clube Recreativo 11 de junho, que,
apesar de sua construção tardia, podemos classifica-la no terceiro grupo (figura 05):
Terceiro Grupo: Construções diversas que, de um modo geral e num primeiro momento,
podemos chamá-las de neorrenascentistas despoliciadas, isto é, quase sempre executadas
por profissionais não qualificados e que vieram a ser popularizadas ao longo do tempo.
Nelas, as regras foram substituídas pela improvisação, pela recriação e até pela invenção.
Nesse despoliciamento também está implícito acolhimento, numa mesma obra, de
elementos decorativos não só renascentistas, mas também de outros estilos, o que
favorecia, inclusive, reinvenções personalistas. Esse é o grupo mais numeroso e mais
difundido e que, para muitos, é o único a merecer o epíteto do Ecletismo porque tolera
tudo[...] (LEMOS, 1987, pg. 75).
No interior do estado de São Paulo, podemos dizer que essa arquitetura foi trazida e difundida pela elite
burguesa cafeeira, que quase sempre morava na capital paulista e mantinha fazendas e casas de campos no
interior do estado. Assim, eles foram os principais responsáveis pela disseminação do ecletismo no interior
do estado, onde traziam todos os elementos arquitetônicos e suas ideias de visitas e viagens que faziam pela
Europa.

Figura 05 – Casas de aluguel em São Paulo classificadas no terceiro grupo de obras ecléticas.
Fonte: O ecletismo na Arquitetura brasileira, 1987, pg. 82.

O Clube Recreativo é uma amostra desse período na cidade de Agudos, que apresenta uma arquitetura
eclética, caracterizada pela simetria, busca de grandiosidade, rigorosa hierarquização dos espaços internos,
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bem como o porão baixo e a riqueza decorativa de ornamentos, como as cornijas, os áticos escalonados, os
ornamentos como flores coroando a fachada, a presença de guarda-corpo com balaústres na sacada, e as
esquadrias com o arco romano. Nesse sentido, a riqueza de misturas, detalhes e efeitos que se pode
conseguir com associações desse tipo só o ecletismo consegue nos apresentar devido a “somatória de
criações individuais, cada qual com a explicação de cada obra” (LEMOS, 1981, pg. 70).
Segundo Lemos, uma das características marcantes do período foram os novos materiais e produtos
existentes no mercado através da facilidade de importação, a taipa de pilão foi substituída pelo tijolo de
barro e o aprimoramento das técnicas em relação à madeira, ajudou na construção de estruturas de telhado
mais perfeita (LEMOS, 1981, pg. 74).
As primeiras manifestações da mecanização na produção de materiais de construção e a
presença dos imigrantes como trabalhadores assalariados respondiam pelas alterações das
técnicas construtivas nessa época. Surgiram então as casas construídas com tijolos e
cobertas com telhas tipo Marselha, onde a madeira serrada permitia um acabamento mais
perfeito de janelas, portas e beirais[...] (REIS FILHO, 2000, pg.48).
O Clube recreativo 11 de junho, construído nas primeiras décadas do século XX, apresenta tipologia,
características estruturais e construtivas que refletem os novos hábitos e influências dessas manifestações,
ainda que, no interior isso tenha acontecido tardiamente. Pode-se observar que o edifício é caracterizado
como um sobrado e que seu terreno é em declive (figura 06), o que resulta além do embasamento em
terrapleno, a utilização do porão alto ao fundo da edificação (figura 07), característica muito utilizada nos
edifícios ecléticos. Além do auxílio na ventilação das estruturas do prédio, o porão alto permite o uso do
barrote para o assentamento dos assoalhos de madeira eliminando o chão batido.

Figura 06 – perfil do terreno


Fonte: Google Earth, 2019.

Figura 07 – Porão alto


Fonte: Autores, 2018.

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[...]Em edifícios de reduzido número de pavimentos, como acontece em residências
particulares, o sobrado é quase sempre constituído de vigamento, ou barrotamento de
madeira. [...]Nos porões, embasamentos e pavimentos térreos, o piso poderá apoiar-se
diretamente sobre o terreno, o que se denomina pisos sobre terrapleno
(ALBUQUERQUE, 1952, pg.139).
O Terrapleno (figura 08) utilizado na parte frontal da edificação, como podemos observar na porta de
entrada da edificação (figura 09), consiste na não retirada da camada de terra existente, e sim o
apisoteamento da mesma e o acréscimo de mais terra natural, apresentando uma cota mais alta que a da
calçada, técnica essa, que garante uma maior proteção contra as umidades do solo e umidades externas para
com o piso interno (ALBUQUERQUE, 1952, pg.140).

Figura 08 e 09 – desenho do terrapleno e imagem do degrau da porta de entrada do edifício


Fonte: Livro construções civis, pag. 140 e autor, 2017.

Analisando o sistema construtivo da edificação, a técnica empregada, possivelmente é o de paredes


portantes em tijolos maciços de barro, assentados com argamassa à base de cal e areia, uma vez que, as
espessuras das paredes vão aumentando conforme se aproximam das fundações. Não é possível observar a
presença de pilares de concreto armado. As estruturas dos pavimentos são compostas por barrotamento de
madeira com a presença de vigamentos e madres de sustentação (figura 10), sendo em uma das salas do
pavimento térreo, onde há uma dimensão considerável, a presença de sustentação por madre estribada. O
emprego do tarugo (figura 11) também é essencial na estrutura dos barrotes, pois garante que os soalhos
não oscilem na presença de trânsito sobre eles.

[...]Um bom recurso para aumentar a rigidez dos soalhos será o uso de tarugos. Podem
ser utilizados de dois modos. É mais comum usar tarugos pregados em nível (fig.11)
porque apresenta dupla utilidade: servem de contraventamento entre barrotes e também
de apoio às extremidades das tábuas de soalho no caso de emprego de tabeiras[...]
(ALBUQUERQUE, 1952, pg.153).

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Figura 10 e 11 – Imagem da madre de sustentação do edifício e exemplo do Tarugo
Fonte: Autoras, 2017, Livro construções civis, pag. 152.

Os pisos empregados no edifício em sua maioria são os de soalhos de tábuas de peroba, salvo alguns
ambientes em terrapleno que foram utilizados revestimentos cerâmicos e hoje encontram-se substituídos
por piso frio. As tábuas além de servirem como piso, também carregam a função de cobrir a estrutura do
vigamento.
As tábuas de soalho usualmente empregadas em São Paulo são de tipo mecha e encaixe,
preparadas com auxílio de plainas mecânicas. A fixação da tábua ao vigamento é feita
com prego oculto. A mecha nunca tem comprimento igual à profundidade da ranhura, a
ranhura por sua vez, não deve ter nas suas duas partes, o mesmo comprimento. Com estas
precauções o soalho será bem unido, sem frinchas na superfície visível
(ALBUQUERQUE, 1952, pg.234).
Os soalhos dos ambientes são do tipo “tabeiras”, onde as tábuas assentadas funcionam como molduras nas
extremidades das paredes e ao centro pode-se combinar vários desenhos. No edifício os ângulos das
molduras das tábuas são colocados de topo, sendo no “[...]sistema de juntas de topo o carpinteiro coloca
primeiro a tábua 1, de um lado, depois a tábua 2 do lado adjacente, e na mesma marcha, continua o trabalho”
(ALBUQUERQUE, 1952, pg.237).
Nos forros de madeira os desenhos são parecidos com o dos soalhos (figura 12 e 13), no edifício eles são
confeccionados com o sistema de mexa e encaixe e acabamento ao redor das paredes parecido com as
tabeiras, esse acabamento é utilizado para esconder possíveis frestas de dilatação que o teto venha a
apresentar devido a oscilação do telhado. Em algumas salas do último pavimento os forros apresentam
ainda, detalhes em treliças de madeira, onde a ventilação é melhor aproveitada e o acabamento mais
estético.

Figura 12 e 13 – Imagem do acabamento do soalho e forro de madeira


Fonte: Autoras, 2017.

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A cobertura do edifício é composta por quatro águas ocultas por ático e sua estrutura é confeccionada com
tesouras de madeiras e telhas cerâmicas. Na platibanda da fachada é possível observar a presença de muitos
elementos decorativos, característicos do ecletismo e que foram os principais elementos preservados do
edifício. Esses elementos além de apresentarem função estética, auxiliam também na dispersão de águas
pluviais, evitando umidades indesejadas nas paredes e consequentemente manchas negras pela fachada.
Os principais elementos decorativos (figura 12, 13 e 14) encontrados na fachada são as molduras, os frisos,
as cornijas e o ático. As molduras são os elementos que se encontram na base da fachada e que traduzem o
tipo de estrutura utilizada no edifício “[...]assim, para melhor distribuir as cargas das colunas sobre o
terreno, é possível introduzir um soco, ou sapata resistente, que simultaneamente tem dois destinos, o real
de distribuir as cargas e o fictício e decorar” (ALBUQUERQUE, 1951, pg.133 e 134).
As cornijas que são os principais elementos decorativos do edifício e encontram-se na divisão entre a parede
e o começo do ático. Elas garantem a função real de proteger a fachada contra a ação das chuvas, evitando
que a água escorra pelas paredes.
O ático é o muro colocado para esconder o telhado na fachada e como aqui, sempre são decorados com
ornamentos afim de compor a estética do edifício. Esses ornamentos são sempre confeccionados de
materiais leves, para que não se soltem com facilidade da parede. No clube recreativo esses elementos são
compostos de detalhes de motivos florais.

Figura 12, 13 e 14: Detalhe das esquadrias e elementos decorativos


Fonte: Autoras, 2017.

Mesmo com as várias trocas de uso que o edifício sofreu ao longo de seus quase 90 anos, pode-se perceber
que não aconteceram alteração tão drásticas na estrutura do prédio, apenas adaptações para resolver as
necessidades de casa uso. As alterações que foram um pouco mais significativas, que acabaram por
descaracterizar o imóvel, parcialmente, foram as trocas das esquadrias da fachada frontal, possivelmente
na transição de ocupação do ginásio municipal para a escola de comércio, bem como a perda da varanda
com a retirada do guarda-corpo e a troca das esquadrias de portas para as de janelas. Atualmente, a mesma
fachada ainda apresenta esquadrias de madeira, ornamentos argamassados como frisos, capiteis, cornijas e
os áticos. Da varanda só ficou o piso, com as mãos francesas de argamassa, ornamentadas com motivos
florais.

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As fachadas laterais (figura 15) e de fundos (figura 16), não receberam o mesmo tratamento da frontal,
provavelmente devido à pouca visibilidade do local. Elas não apresentam ornamentação e detalhes, apenas
alguns frisos e as esquadrias, no caso das fachadas laterais e, na fachada dos fundos, só as esquadrias, não
contendo nenhum tipo de ornamento.

Figura 15 e 16 – Fachada lateral e fundo sem ornamentos


Fonte: Autoras, 2017.

No interior do edifício, as alterações que chamam a atenção são a substituição dos pisos antigos por pisos
cerâmicos, pintura dos forros de madeira e retirada de portas nos quais os vãos foram fechados por alvenaria
e a camuflagem de esquadrias com materiais de acabamentos de alvenaria. Uma intervenção constante em
relatos de pessoas que frequentaram o edifício, antes das intervenções, foi a substituição da escada de
madeira por escada de alvenaria, apensar de não haver foto dessa escada.
Pode-se observar no pavimento térreo que os acabamentos foram bastante alterados, principalmente o
revestimento dos pisos, devido talvez, à necessidade de adequação do local para receber o novo uso, que
no caso foram as escolas. As esquadrias e o forro de madeira possivelmente receberam, em algum momento,
o tom vermelho da tinta esmalte, provavelmente durante a época em que o edifício abrigou o colégio
Serelepe. No segundo pavimento, os pisos foram, de certa forma, preservados, mantendo o padrão e a
paginação original de sua construção. As pinturas das paredes se encontram com camadas de tinta esmalte
no tom cinza, e nos forros e esquadrias, no tom vermelho. A tinta atual, com certeza foi empregada para
garantir melhor higiene e facilidade na manutenção do edifício, visto que por muitos anos abrigou
instituições de ensino.
Parte do porão foi transformado em banheiro, não se sabe quando, possivelmente a partir da mudança do
primeiro uso do edifício. O espaço hoje não é o mais adequado para servir de banheiros devido seu espaço
ser muito apertado e faltar portas, ventilação natural e acessibilidade. Estes foram os espaços que mais
receberam alterações de revestimentos e pinturas, talvez, devido à dificuldade em acabar com patologias
acometidas pela estrutura do edifício, como infiltrações e umidades.
O portão de acesso dos veículos, feito em ferro fundido com ornamentação, fora fechado completamente
por chapas metálicas pintadas na mesma cor do portão, possivelmente para garantir a privacidade e
segurança dos alunos. Devido ao funcionamento da escola Serelepe também foi necessário um acréscimo
de anexos de aula aos fundos do terreno. Ele é feito em bloco estrutural e acomoda 3 salas de aula, uma
lavanderia, depósito e um pátio coberto, logo atrás desse anexo encontra-se a quadra de esportes da antiga
escola bastante abandona, talvez porque o atual uso do edifício não se utiliza desse espaço.
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Figura 14 e 15 – banheiros e Portão de acesso dos veículos
Fonte: Autoras, 1017.

CONCLUSÃO
Nos fins do século XIX o Brasil passou de uma Monarquia para a República e, segundo MENDES (et. al.
2015, pg 25) esse novo regime precisava modernizar o país. Surgiram, então, as grandes reformas urbanas
das duas primeiras décadas do século XX embasadas, principalmente, nos planos de Haussmann em Paris
que aconteceram na segunda metade do século XIX. “[...] Os edifícios projetados e construídos nesses
novos cenários metropolitanos deveriam refletir, em sua tipologia estilística, o espírito da modernidade de
proposta parisiense: o Ecletismo” (MENDES et. al., 2015, pg. 25). No caso específico do Estado de São
Paulo, pode se dizer que a cultura do café e os imigrantes que aqui chegaram para trabalhar nela, foram os
responsáveis pela interiorização o estilo eclético, levando-o para as cidades do interior do Estado, onde
mantinham suas fazendas de produção do grão.

O que se pode concluir, a partir dos estudos desenvolvidos para o edifício Clube Recreativo 11 de junho, é
que se trata de edificação muito importante para a história e a memória da cidade de Agudos, e nesse
sentido, precisa ser preservada. Também se revela neste trabalho que o antigo clube é exemplar da
arquitetura eclética produzida no interior paulista do início do século XX e apresenta-se bastante
conservado e pouco modificado. Sua relação com o contexto brasileiro é revelada por sua composição
construtiva e arquitetônica de técnicas muito empregadas na época de sua construção: edifício assobradado,
de dois pavimentos, utilizando alvenaria de tijolos “portantes” de barro, pisos de madeira sobre barrotes de
mesmo material, janelões de madeira, com bandeiras de vidro e telhado de estrutura de madeira e telhas de
barro, escondido pela presença do ático com elementos decorativos ornamentados. Suas características não
negam as influências do ecletismo trazidos de São Paulo para o interior, em uma época que a “nova”
arquitetura refletia a situação econômica do país.

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REFERÊNCIAS
Albuquerque, Alexandre, Construções Civís, 3ª Edição, São Paulo: Editora Empresa Gráfica da revista dos Tribunais
LTDA, 1952.
Bonduk, Nabil, Intervenções urbanas na recuperação de centros históricos, 1ª Edição, Brasília, DF: Iphan / Programa
Monumenta, 2010.
Choay, Françoise, A Alegoria do Patrimônio. 1ª Edição, São Paulo: Editora Estação Liberdade, 2001.
De Rosa, Maria (Lya), Agudos 100 anos de História, 1ª Edição, 2014.
De Rosa, Maria (Lya), Rua 13 de Maio antiga, uma rua, Muitas Histórias, 1ª Edição, 2014.
Fabris, Annateresa, et. al., O Ecletismo na Arquitetura Brasileira, 1ª Edição, São Paulo: Editora: Nobel/edusp, 1987.
Felix, Sandra Regina, Contos, Cantos e Encantos, 1ª Edição, Agudos: Editora Noovha America, 2013.
Lemos, Carlos A.C., 1925 – O que é patrimônio histórico, São Paulo: Editora Brasiliense, 2000.
Mendes, Chico; Veríssimo, Francisco e Bittar, Willian, Arquitetura no Brasil de Deodoro a Figueiredo, 1ª Edição, Rio
de Janeiro: Editora Imperial Novo Milênio, 2015.
Reis Filho, Nestor Goulart, Quadro da Arquitetura no Brasil, 1ª Edição, São Paulo: Editora Perspectiva, 1978.

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