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Dogmática – cardeal Muller

1. Objetivo e programa da Dogmática


A teologia católica que hoje se ensina nas universidades, centros de estudos superiores e
seminários oferece, tanto no seu conjunto como nas suas várias disciplinas, uma abundância de
material científico quase incompreensível. Em particular, a especialidade de dogmática, que assume a
função de integrar os resultados de cada uma das disciplinas teológicas específicas em uma visão
global, compilou tal quantidade de material que é quase impossível para os alunos completar com
sucesso a tarefa de alcançar uma síntese global, sem falar em uma visão concreta da interconexão
interna dos temas centrais. A discrepância entre o acúmulo de conhecimento concreto e a ausência de
uma síntese conceitual poderia trazer à mente as palavras irônicas que Mefistófeles dedica ao aluno no
Fausto de Goethe:
“Ele tem todos os componentes em mãos, mas falta, infelizmente, o vínculo espiritual.»
Mas isso não autoriza simplesmente jogar ao mar, como mero lastro histórico, as múltiplas
variedades da teologia cristã. A vastidão de seu campo surge como consequência necessária da
pretensão de validade universal da fé cristã. Ao proclamar a verdade de que Deus se revelou na
criação, redenção e reconciliação como origem e fim do homem e do mundo, a teologia é obrigada a
não excluir, por princípio, qualquer parte do conhecimento como possível objeto de sua reflexão.
Apesar e sobretudo das tensões e convulsões concretas, a história de 3.500 anos da revelação
oferece um continuo de tradição em que Javé sempre figura como o sujeito da revelação e o povo da
aliança do Antigo e do Novo. O Testamento encontra sua identidade na resposta de fé à palavra de
Deus falada na história. Precisamente pela universalidade da revelação manifestada em Jesus Cristo, é
necessário realizar um trabalho de mediação crítica e positiva entre a concepção histórica e
escatológica da verdade do cristianismo e todas as formas de expressão do humano. Portanto, é
perfeitamente válido confrontar a auto compreensão cristã não apenas com as reivindicações de
verdade das religiões concretas da humanidade que competem entre si e com o cristianismo, mas
também com as concepções teóricas e práticas da visão do mundo e do homem da filosofia e das
ciências históricas, sociais e naturais.
O movimento ecumênico e as tentativas de inculturação do cristianismo —ainda de origem
européia— nas jovens Igrejas da América Latina, África e Ásia também são campos de trabalho para a
teologia católica. E, por fim, embora não no último semestre, o estudo da teologia exige que o aluno se
familiarize com as diversas ciências auxiliares, e mais especificamente que conheça línguas
estrangeiras e aprenda a manejar métodos filológico-históricos e instrumentos hermenêuticos.
O "vínculo espiritual" é o "fio de Ariadne" com o qual se escapa do labirinto do objeto
material aparentemente inesgotável da teologia. Este fio é descoberto quando a unidade da teologia é
concebida a partir da origem do ato de fé pessoal e indivisível. A unidade da teologia depende da
unidade precedente da fé, apoiada, por sua vez, tanto na sua confissão como na sua prática, na
autocomunicação de Deus. Se a razão teológica é entendida como explicação da fé, segue-se que ela é
parte constitutiva da fé. E, como a fé, também a teologia é determinada pelo acontecimento do
encontro do homem com a palavra de Deus na forma de sua auto mediação no acontecimento de
Cristo e na missão do Espírito. A fé é o resultado da ação do Espírito. A almejada perspectiva
universal que garante a visão da unidade interior de cada um dos temas e métodos da teologia é a auto
manifestação do Deus Trino na mediação da pessoa e da história de Jesus de Nazaré para o salvação
de todos.
A construção e estrutura da confissão de fé cristã (credo) permite-nos descobrir os três níveis
de referência, entrelaçados entre si, da teologia. O "eu" - ou respectivamente o "nós" - dos homens
estabelece, pela fé, uma relação com Deus. Essa relação é mediada por Jesus Cristo e permanece
presente na Igreja por meio do Espírito de Deus. Os três principais mistérios da fé cristã são assim
mencionados: a Trindade, a encarnação e o dom do Espírito/santificação do homem. Em coordenação
com eles aparecem os três círculos de tópicos básicos: teologia, cristologia, antropologia. Portanto,
cada um dos tratados dogmáticos pode ser apresentado de acordo com a seguinte perspectiva global:

Os três dogmas básicos do cristianismo


A Trindade de Deus:
As pessoas da única essência divina
A encarnação:
O Filho eterno torna-se homem
O Espírito e a graça:
A vinda de Deus no Espírito Santo

Da função da teologia de estabelecer uma relação entre a multiplicidade de temas (objeto


material) e a unidade de perspectiva (objeto formal) emergem os objetivos e o programa do "Manual
de dogmática":
1.Informações Básicas
Essas informações terão a seguinte articulação (exceto nos casos em que a própria natureza do
tema exija modificações):
I. as abordagens das questões no momento atual,
II. fundamentos bíblicos,
III. a evolução histórica (dos dogmas),
4. exposição sistemática.
2. Introdução a uma formação teológica independente
Este Manual não é, de acordo com seu gênero literário, uma enciclopédia teológica ou um
substituto para qualquer dicionário. Não é uma introdução ao cristianismo nem um catecismo. É uma
introdução à teologia dogmática.
3. Metodologia
Os tratados específicos de teologia dogmática estão listados na seguinte ordem:
1. Epistemologia teológica da revelação
2. Antropologia Teológica
3. Doutrina da criação
4. Teologia
5. Cristologia/soteriologia
6. Pneumatologia
7. Teologia trinitária
8. Mariologia
9. Escatologia
10. Eclesiologia
11. Doutrina dos sacramentos
12. Doutrina da Graça

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