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Lembranças e reminiscências da madrugada do Código Florestal.

Os
personagens que se destacaram. Dona Marina e Serra, silenciosos.

Hélio Fernandes

Compareceram 450 deputados à votação que começou na terça-feira e entrou pela


madrugada de ontem, quarta. Como não era nada definitivo, 82 por cento é um bom número de
comparecimento. Houve muita hostilidade. Vejamos.

Dona Marina, presidenciável – Ficou o dia e a noite no plenário. Praticamente sem uma
palavra, mas acompanhando tudo. Era chamada de “candidata para 2014”, e nos bastidores do PV
isso era fato consumado. Parece mesmo. Mas Dona Marina se baseia em quê? Nos 20 milhões que
em 2010, à ultima hora, “fugiram” para ela? Não tem uma possibilidade em 1 milhao de ganhar. De
Dilma, Lula ou outro adventício.

“Grande Aldo” – Nunca imaginou que fosse tão aplaudido pelos mais reacionários dos
ruralistas. Ficou tão empolgado que exagerou, hostilizou, agrediu, foi advertido, jeitosamente mas
duramente, pelo presidente da Câmara. Se acomodou, reconheceu que se exaltou. Não respondeu
mais a ninguém.

Marco Maia – Desde a Constituinte de 1946, conheci grandes presidentes da Câmara. O de


hoje, que presidiu a votação do Código Florestal (ou do assim chamado) merecidamente fica entre
os melhores. Presente, sério, compreensivo, duro, regendo tudo como um maestro no Scala de
Milão. A sessão chegou ao fim por causa dele.

Chico Alencar-Ivan Valente – Foram os mais destacados, pelo menos do lado


ambientalista. Falaram varias vezes para “encaminhar” a votação, denunciaram os interesses
multinacionais, que “comandavam os ruralistas”, davam os nomes dessas multinacionais. Não
tiveram a menor ilusão, sabiam que estavam perdendo, mas combateram até o final.

Ronaldo Caiado – Foi o grande artífice da vitória (momentânea) dos ruralistas. Estava em
todos os lugares, discursando, convencendo. A colaboração de Aldo Rebelo foi teórica, a de
Caiado, efetiva. Sendo conservador quase reacionário, grande vitorioso.

Alfredo Sirkis – Foi insistente, não desapareceu um minuto que fosse. Seu combate foi
incessante, e fustigando os ruralistas de forma veemente. Chegou a falar como líder do PV,
mostrou que essa bancada também está dividida. Na tribuna, o líder nominal do PV foi ao
presidente e disse que ele é que devia falar. O que Marco Maia podia fazer? Deu a palavra a ele.

Henrique Eduardo Alves – Obedecendo às ordens de Michel Temer, desapareceu, ou


melhor, não apareceu. Falou uma vez 40 segundos como líder (?), muito cumprimentado pelos
ruralistas. Como é que aparecerá no Planalto? Nenhum constrangimento, será recebido por
Palocci.

Candido Vaccarezza – Líder inexpressivo, ou melhor, sem expressão. Apenas pedia calma,
não se destacou em qualquer momento, não é nenhuma personalidade, está longe de ser orador.
Por que o governo “entroniza” um líder como esse? É a vocação da derrota. Paulo Teixeira, “líder
do PT”, é muito melhor. Sem ser brilhante, é mais competente e até combatente.

***
A EXPLOSÃO DA BASE

A grande derrota do governo Dilma, se deu em duas fazes. E não foi vitória dos ruralistas,
e sim conspiração dos trânsfugas do PMDB e do próprio PT. Não era segredo que o governo
perderia, como aconteceu na semana passada.

A aprovação do Código Florestal representou duas derrotas alarmantes (o Planalto entende


que essa é a palavra?) na mesma noite. É realmente para preocupar. A primeira, acachapante, que
palavra, levou o Planalto ao desespero. 410 deputados votaram contra o governo, aprovaram a
alteração do Código. Era apenas o início.

Já se conhecia a insatisfação do PT e do PMDB. O partido do governo “se queixava” que o


PMDB estava recebendo compensações exageradas. A cúpula do PMDB, através do próprio vice-
presidente, reclamava: “O PT leva tudo, o PMDB fica assistindo”. Isso é o que chamam de “base”,

O PT fez tudo para parar na primeira votação, não conseguiu. Os que não queriam votar
mais, não tinham comando ou liderança, mas não podiam se enganar. Sabiam que não venceriam
e, mais grave, a base partidária explodiria, não sobraria coisa alguma. Foi o que aconteceu.

O PT e o PMDB, unidos, dariam a vitória ao Planalto. Mas tiveram que ir para o


“sacrifício”. Aí o governo estava empenhadíssimo, a mobilização foi total. Os 63 do PT e PMDB que
votaram contra a aprovação, passaram a 182, foram derrotados pelos 273 que apoiaram os
ruralistas. Votando com o que haviam estabelecido, teriam ganho.

***
DIVIDIR, DIMINUIR E TRAIR

Os 182 que votaram com o Planalto, com os outros 63 (que fugiram do compromisso),
atingiriam o número de 245, mais do que suficiente para a derrota dos ruralistas. Estes, que
tiveram 273 votos, recuariam para 210, se os 63 tivessem honrado os compromissos e as
compensações que receberam.

***
“ISSO É UMA VERGONHA”

O bordão de Casoy, usurpado por Dilma. Se a base tivesse votado de forma, digamos,
homogênea, a presidente não precisaria utilizar o que o apresentador consagrou como chavão. Mas
o que é que a presidente Dilma dizia que era uma vergonha?

***
PLURIPARTIDARISMO E PARLAMENTARISMO

No pluripartidarismo não há certeza de vitoria, mesmo com a vasta distribuição de cargos.


E ainda mais grave: o pluripartidarismo dentro do presidencialismo é uma excrescência. O
presidencialismo só pode ser exercido com o sistema bipartidário.

Para um território maior e uma população bem mais alta (190 milhões na Filial e 300
milhões na Matriz), os representantes aqui, inacreditavelmente exagerados. São 513 e ainda
querem aumentar esse número. Nos EUA são 425 deputados.

Na Itália, o maior exemplo desse sistema parlamentarista, o povo vota nos partidos, o
presidente e o primeiro-ministro não são eleitos. O presidente (personagem idoso e notável)
chama o líder do partido majoritário e “pede a ele que forme o Gabinete”. Ele então vai fazendo
acordos com os diversos partidos, até conseguir maioria suficiente, que resista a “um voto de
confiança”.
No pluripartidarismo parlamentarista, os acordos são feitos  antes, abertamente, o povo
acompanha, sabe que é assim mesmo. No pluripartidarismo brasileiro, os “acordos” são feitos
depois, não escapam de identificação de CORRUPTOS, e são mesmo.

***

PS – Agora o país terá que esperar um tempo enorme até que o projeto chegue ao Senado,
seja discutido, votado, emendado, aprovado de qualquer maneira. Aí volta para a Câmara,
dependerá das emendas feitas no Senado.

PS2 – Então vai para a presidente, que tem c-o-n-s-t-i-t-u-c-i-o-n-a-l-m-e-n-t-e o Poder de


veto. Mas o que é que ela chama de VERGONHA? A traição dos “partidários” ou a ameaça, que o
“líder” Vaccarezza transmitiu usando o nome dela?

quarta-feira, 25 de maio de 2011 | 10:35

Código Florestal: 7 horas de confusão, baixaria, derrota momentânea do


governo, nem ruralidade ou ambientalistas. Apenas interesses colossais.
Inédito: o Planalto ameaça a Câmara. E agora?
Helio Fernandes

O governo tentou tudo para não haver votação. Não conseguiu de jeito nenhum. A base se
dividiu de tal forma assustadora (para o Planalto), tentaram de tudo. Não houve jeito. Eram
dezenas de “líderes” no esforço inútil de “encaminhar” uma votação, dezenas de vezes, e sempre
ultrapassados.

Há 15 dias, derrotado, o próprio governo, em nota oficial, afirmou: “Só votaremos quando
tivermos certeza da vitória”. Ora, como essa base, montada e coordenada (?) em cima de cargos,
de concessões e exploração dos recursos públicos, exibe inacreditável fragilidade, tiveram que
votar.

Daquela multidão do plenário, poucos ruralistas sabiam o que deviam ou precisavam votar.
Dez ex-ministros do Meio Ambiente foram ao Planalto recomendando a REJEIÇÃO, redigiram
documento. Eram dos mais diversos partidos, não foram seguidos.

Os ruralistas votavam em causa própria, choravam de forma lancinante, embora de vez em


quando deixassem escapar: “Somos poderosos, não queremos ser controlados por ninguém”. Era
isso.

Alguns deputados foram para a tribuna, e garantiram sem constrangimento: “Meu pai,
ruralista, me disse, vai lá e vota”. O resto não interessava. E o refrão dos ruralistas durante toda a
noite foi este: “Se não plantarmos, vocês todos (e apontavam para os ambientalistas) irão morrer
de fome”. Se apresentavam como “os salvadores da humanidade”.

Só por produzirem alimentos têm que enriquecer fora da lei, convencidos de que são
absolutos, e a humanidade depende unicamente deles ou todos ficaremos sem comer? Só um
exemplo; se a industria automobilística não fabricar carros, caminhões e todas as maquinas
agricolas que precisam, produzirão cavando com as mãos?

É evidente que todos são importantes, dependendo uns dos outros, só formarão uma
comunidade se se entenderem. E isso pode acontecer, mas não com ódio e arrogância. E o que
havia no plenário, até a madrugada, era ódio e arrogância.

Muitas brigas localizadas, pessoais, intransferíveis. O líder Vaccarezza, na semana


retrasada dizia sobre Aldo Rebelo: “Ele nos mostrou um relatório e apresentou outro
completamente diferente”. Era o “grande Aldo”, o “maior brasileiro”. Nunca um comunista foi tão
aplaudido pelos conservadores capitalistas. Perdão, a elite reacionária, chamada de ruralista.

***
PS – Agora, esse esboço de Código Florestal vai para o Senado, de lá volta para a Câmara,
é uma tragédia burguesa de muitos capítulos. Ou se entendem, se acertam, decidem em favor do
país, ou podem fechar para balanço.

PS2 – Mas não termina aí. Em determinado momento, num silencio espantoso, Vaccarezza
foi para a tribuna e leu uma porção de coisas que traduziu e simplificou assim: “Acabei de falar
com a presidente Dilma, ela me disse: “Não tem importância SE VOTAREM DIFERENTE DO QUE
ESTABELECI, VETAREI TUDO”. Assombro geral. E meu.

PS3 – tendo ficado assistindo pela madrugada, a recompensa do repórter: nunca em toda a
minha vida assisti ameaça tão aberta e ostensiva quanto essa. E sou o único repórter que cobri e
escrevi sobre a Constituinte de 1946. Espantoso o “recado” do Executivo.

PS4 – Quem está em pânico: Palocci. Agora, a CPI quase certo de sair. Pode não dar em
nada. Mas antes ele será chamado ao Congresso, onde será massacrado.

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