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Camille Flammarion - Estela
Camille Flammarion - Estela
COM
LIVRO
CAMILLE FLAMMARION
ESTELA
Sumário
Prefácio
1° PARTE
- Depois do Baile
- O Mundo e a Igreja
- O jantar de Epicuro
- Esponsais Mundanos
- No domínio do Desconhecido
- Senhorita Eva
- Período de transição.
- Os Pirineus
- Crítica e Discussão
- O Solitário
- O Céu estrelado
2° PARTE
- Os outros mundos
- A fagulha
- Duque e Duquesa.
- A Ciência, a honra e o Amor.
- Heróica abnegação
- Ad augusta per angusta
- Felicidade suprema
- A vida de casal
- A vida de casal continua
- A vida de casal se perpetua
- Onde se parte de Lourdes para chegar a Deus
- Pleno céu
- Ciência - Verdade – Felicidade
- Viagem de férias
- Espíritos celestes - poeira terrestre
- Eternidade – Infinito
PREFACIO
Depois do baile
O Mundo e a Igreja
O jantar de Epicuro
Esponsais Mundanos
No domínio do Desconhecido
Senhorita Eva
Período de transição.
Os Pirineus
Crítica e discussão
O Solitário
O céu estrelado
FIM DA 1ª PARTE
2° PARTE
Os outros mundos
A fagulha
Duque e Duquesa.
Heróica abnegação
Felicidade suprema
A vida de casal
À noite, o equatorial foi dirigido para um magnífico
agrupamento de estrelas da constelação de Hércules,
denominado Messier 92.
- Porque esse nome? Interrogou Estela. E' necessário que
me ensines tudo.
- Este nome é o de um observador modesto que passava
as noites em uma torre da comunidade do Palácio de Cluny,
em Paris, nas ruínas das antigas termas de Juliano. Essas
construções existem ainda. São veneráveis. Messier ficava
ali todas as noites em busca de cometas, e, pesquisando
cometas, encontrou nebulosas, das quais publicou, em 1783
e 1784, o primeiro catálogo, elevando-se à cifra de 103. Olha
eis aqui justamente o exemplar do próprio Messier, com as
suas anotações manuscritas. E estendeu a Estela um pequeno
livro encadernado em vermelho.
- Oh! Que escrito antigo! Exclamou. Emociono-me, ao
folhear essas páginas seculares.
- Olha o número 92.
- Ei-lo. Está bem visível: 18 de Março de 1781. Nebulosa
bem nítida e de grande luminosidade, entre o joelho e a
perna esquerda de Hércules. Não tem nenhuma estrela. O
centro é brilhante, rodeado de nebulosidade; assemelha-se ao
núcleo de um cometa. Tem, com pouca diferença, a mesma
luminosidade e grandeza da que está na cintura de Hércules,
e traz o N.°3 do meu catálogo. Sabes o que mais me
impressiona nesta descrição? E' o joelho e a perna esquerda
de Hércules. Pode-se ver isso no céu?
- Olha tu mesma. Vem ver.
-Conduziu-a ao terraço e lhe mostrou a constelação.
- Olha! Está perto da minha estrela!
- Justamente. Perto da Lira. A coincidência é bastante
curiosa. Precisamente nesse rumo tinha eu os olhos quando
da tua aparição. Vês Hércules? - Onde?
- Observa aquela estrela brilhante, avermelhada: indica o
lugar da cabeça. Essa estrela se chama Alfa.
- Sim, vejo. Então aquela estrela é Alfa de Hércules?
- E tem uma história, das mais estranhas, por motivo da
natureza inteiramente bizarra da sua luz. Narrar-ta-ei mais
tarde. Agora, olha ali uma estrela também brilhante, porém
mais clara: tem o nome da letra grega - Beta e indica o
ombro direito de Hércules. Do outro lado, aquela segunda
estrela, sim, aquela, marca o ombro esquerdo e se chama
Delta. Aquela terceira assinala a anca direita e se denomina
Zeta. Continuando em linha reta, aquela outra corresponde à
coxa...
Enquanto Dargilan lhe mostrava a estrela, Estela Ihe deu
prolongado beijo na boca.
- Ah! Se não ficas quieta, não continuaremos. Prometeste
que não me tocarias.
- Eu te reprometo. - Onde estávamos?
- Na coxa de Hércules. Prestei bem atenção. Continua.
- Sim, é a estrela Eta. Depois a perna se encolhe com
aquele alinhamento, de sorte que o homem está de joelhos.
Agora, olha ali, depois de Delta; aquele outro alinhamento
de estrelas desenha o braço esquerdo, segurando um ramo,
enquanto o direito sustenta a maça. Pois bem, com essas
estrelas podes traçar o esboço de um homem ajoelhado.
- Inclinado, com a cabeça para baixo?
- Precisamente; vejo que o reconheces. Não se deve
pensar em encontrar nas constelações pinturas de Rafael,
Miguel Ângelo ou Rubens. Não. São simples agrupamentos
de linhas, esboços, como os podem desenhar as crianças, que
com dois traços de carvão fazem duas pernas, com outros
quatro um corpo, com outros dois os braços, com um círculo
a cabeça. Eis tudo. Ao traçar esses croquis, corporificando
nesses alinhamentos representações de seres reais ou
fictícios, a imaginação de nossos antepassados povoou esses
espaços silenciosos de uma vida extraterrestre, mais ou
menos bizarra e fantástica.
Viviam muito mais e muito melhor do que nós outros,
com a Natureza. A solidão das noites, o vento, a tempestade,
o raio, a fecundidade da flor ou da mulher, os devaneios do
sono, o murmúrio do riacho, os frêmitos da folhagem, os
mananciais sombreados, as quietas fontes - tudo para eles se
povoava de uma espécie de vida aérea, fugitiva e
imperceptível, e até nas profundidades celestes encontraram,
inventaram, pressentiram formas mais ou menos
extraordinárias. Sim, se observas com atenção, se segues
esses alinhamentos, se julgam que neles nada há que as
constelações na realidade não existem, e se pensas que os
nossos avós quiseram desenhar no céu figuras quaisquer,
para serem assim identificadas, tu encontrarás este esboço do
corpo de Hércules ou do Ajoelhado, qual o denominavam os
Gregos, da mesma forma que ao lado, na tua querida Lira,
adivinharás um instrumento de música, alongado, do qual
Vega indica o braço, o cimo, uma lira, cítara ou harpa, da
mesma forma que naquelas estrelas da Coroa, ali, ao outro
lado de Hércules, vês uma coroa formada com grande
exatidão, e mais distante adivinha um delfim, e um pássaro
sustentado por duas asas abertas. Essas denominações,
paralelos e criações mitológicas são graciosas e poéticas. Os
modernos quiseram completá-las, improvisando figuras nos
intervalos inocupados pelos antigos, mas foram pouco
felizes, pesadões, tediosos com as suas invenções canhestras:
o atelier do escultor, o fornilho do químico, o cavalete do
pintor, o relógio, a máquina pneumática, o sextante, o otante
e também a raposa, o ganso e o gato. Tudo isso é artificial se
parece ligado por ficções. Quanto era bem mais vivo a
mitologia pagã, com os seus doze signos do zodíaco,
avançando gravemente ao longo da esfera, com a Virgem
conduzindo a Arista, Andrômeda encadeada, Cassíope no
seu trono, ou o cavalo Pégaso lançado no espaço, e o jovem
Perseu sustentando na mão a sangrenta cabeça de Medusa!
Mas, não esqueçamos o nosso montão de estrelas de
Messier. Vem admirar ao telescópio.
- Parece uma pequena nuvem luminosa, disse Estela,
uma poeira de pequenas estrelas. Oh! Eu o vejo bem agora.
E' prodigioso!
- Cada um desses pequenos pontos é um sol semelhante
ao que nos ilumina. E' uma aglomeração de estrelas,
milhares de sóis iguais ao nosso.
O menor desses pontos luminosos é um milhão de vezes
maior do que a Terra.
- E' possível? Milhares de sóis'. Então esse conjunto deve
ocupar um espaço imenso. E' muito luminoso no centro. Está
longe daqui?
- Certamente seriam necessários mais de três mil séculos
num trem expresso para chegar até lá. Quanto à extensão, é
um universo. Em comparação, a Terra não passa de um grão
de pó.
- O Espaço é escuro em torno. E' o fundo do céu?
- Fundo do céu? Que queres dizer?
- E' verdade. O Espaço não tem limites. E essas estrelas
que vemos ali, de todos os tamanhos, a diversas distâncias
do conjunto, estão mais perto de nós ou mais longe?
- Mais perto, sem dúvida. Não vês uma, bastante
luminosa, um pouco à direita?
- Não, não vejo bem, respondeu, desviando a cabeça da
ocular.
Dargilan se aproximou para observar no equatorial.
Estela se mantinha em pé, ao lado dele, e suas cabeças se
tocaram.
- Tu és preciosa, disse Dargilan, abraçando-a pelo
pescoço. Eu estava procurando... Mas não, os sabugueiros
ainda não floriram.
- Meu Rafael! Amo-te!
- Querida, meu encanto, queres que te diga o meu
pensamento? Pois bem, não há nada mais lindo de que uma
bela jovem.
- Senhor Astrônomo!... E as estrelas?
Naquela primeira noite de trabalho, a observação
astronômica, apenas começada, foi subitamente
interrompida.
Pleno céu
Viagem de férias
Amo Rafael.
Só a ele amo no mundo.
Cremos na indestrutibilidade da força psíquica que nos
anima; não acreditamos na ressurreição dos corpos: o corpo
é pó e volta ao pó.
Espero reencontrar Rafael na existência que é a
continuação desta depois da morte, e prosseguir junta a
nossa vida intelectual, feliz e amante; queria também que
nossos corpos não fossem separados.
Com o meu bem-amado, na perspectiva da decomposição
desses pobres corpos na horrível noite do túmulo, prefiro a
incineração. Desejo que nossas cinzas sejam intimamente
misturadas e reunidas na mesma uma.
Se eu morrer antes dele - o que peço a Deus todos os dias
- rogo a Rafael que faça incinerar meu corpo, conservar
minhas cinzas e ordene, por testamento, seja seu corpo
também incinerado, conforme intenção a mim manifesta, e
reunir suas cinzas às minhas, em íntima fusão, na mesma,
uma.
Se ele morrer antes de mim, encontrar-me-ão morta
algumas horas depois. Sobreviver-lhe estaria acima das
minhas forças. Seria então fácil, nesse caso, queimar-nos
juntos e satisfazer minha vontade.
Escrito de meu próprio punho, em nosso paraíso
terrestre, aos s de Novembro de 189...
ESTELA DARGILAN.
Eternidade – Infinito
O pó fica para a Terra. A alma volta para o céu.
Fim