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*****
Roman se recostou na cadeira do escritório, e Reese estremeceu com
o grito de protesto da mobília. Grande em estatura e caráter, o líder do
Resgate Contratado do Oeste era um homem respeitado e amado como um
reverenciado chefe e estimado amigo.
— Como as costelas estão se curando? — Roman perguntou.
— Posso respirar sem dor agora. — Respondeu Reese. — Estou feliz
que só elas que foram quebradas.
Reese sabia que foi chamado ao escritório de Roman para mais do
que um inquérito sobre sua saúde. Ele esperou. Se qualquer coisa que Roman
tivesse em mente fosse séria, o homem iria começar a mexer em sua caneta.
Bem na hora, Roman pegou sua caneta ao lado de um bloco grosso
de calendário que ocupava a maior parte da mesa. Ele girou a caneta em torno
de seus dedos com habilidade antes de bater na mesa algumas vezes.
— O resgate de inundação acabou sendo difícil para todos. — Roman
começou. — Santos e Flyer precisaram de pontos. Isaías quebrou um dente e
Parker um dedo. Rhys acabou com um cotovelo torcido, e você esteve
cuidando das queimaduras de corda nas mãos e nos braços de Morgan.
— Depois de três semanas, todo mundo está praticamente curado. —
Comentou Reese. Ele se perguntou onde Roman estava indo com essa
conversa.
— Você está? — Roman levantou uma sobrancelha, e seus olhos azuis
escuros penetraram em Reese.
Reese se mexeu na cadeira, desejando estar em qualquer lugar,
menos sentado na frente do capitão quando o homem estava em uma missão
de pesca. Não querendo morder a isca, Reese permaneceu em silêncio.
—Posso ser um homem muito paciente quando preciso. — Afirmou
Roman. — Não tenho problema em ficar sentado aqui a tarde toda. É melhor
eu avisar que Jimmy queria ir fazer um piquenique na lagoa para termos um
tempo sozinhos. Vou deixar você explicar por que estou atrasado.
A frustração aumentou e Reese ficou de pé. Ele não era bobo.
Inferno, na maioria das vezes, ele era o psiquiatra residente da fazenda. Todos
vinham até ele para expor preocupações e problemas. Reese reconheceu que
Roman acabara de usar sua apreensão do famoso temperamento de Jimmy
para tentar convencê-lo a falar.
— O que você quer de mim? — A pergunta explodiu.
Reese estava cansado. Dor, tristeza, solidão e as necessidades de
todos os outros o sobrecarregaram.
— Como apontou, já faz três semanas. — Declarou Roman. —Naquela
primeira semana, você foi drogado até as guelras de analgésicos e relaxantes
musculares, mas ainda assim insistiu em ir ao funeral daquela garota. Com a
ajuda de Tristen, você projetou e compôs o cartão de simpatia até que
expressasse quão profundamente era sua tristeza por uma vida perdida tão
jovem. Duas vezes você enviou dinheiro para a família. Uma vez para pagar o
funeral, e mais para ajudar a pagar a equipe de limpeza para entrar e
descontaminar a casa da família do lixo da enchente.
As pernas de Reese cederam e ele aterrissou com força no assento da
cadeira.
— Como você sabia?
— Eu sei de tudo. — As palavras de Roman eram afiadas. — Este é o
meu domínio.
Reese baixou o olhar. O homem dominante era o líder por uma razão.
Reese nunca desafiaria o capitão, mesmo se quisesse gritar que ele precisava
ficar sozinho.
Ele olhou para uma mancha em uma das tábuas largas do chão. O
silêncio se alongou e a tensão engrossou o ar ao redor deles. A corda da
compostura de Reese se esticou até que ele não aguentou mais a tensão.
— Eu queria levá-la de volta para seus pais. — Ele confessou. — Ela
era tão corajosa e doce.
— Você arriscou sua vida para salvar uma jovem mãe e seu filho. —
Apontou Roman.
Ser lembrado de por que ele soltou Misty torceu as entranhas de
Reese. Seu peito doía, e ele se perguntou se seu coração estava sangrando
pela dor.
— Prometi a mim mesmo que ela não seria encontrada enterrada na
lama. — Reese levantou, precisando dar o fora de lá e ir lamber suas feridas.
— Sente-se. — Roman ordenou.
Reese sentou-se.
Roman se inclinou para frente.
— Agora me escuta. Você conheceu uma pessoa especial e algo sobre
ela formou uma conexão entre vocês. Não por culpa sua, ela morreu.
Reese se encolheu.
— Se eu tivesse...
— Não. — Roman interrompeu. — Nós dois sabemos que você usou
todas as habilidades que tinha, não apenas para sobreviver, mas para resgatar
ao mesmo tempo. Nada que você fez ou poderia ter feito mudaria sua morte.
Era a hora dela. Sua única escolha foi tentar salvar outras duas vidas, ou não.
— Claro que salvaria aquela mulher. — Reese se opôs. — Ela estava
se afogando e carregando um bebê.
No momento em que as palavras saíram de seus lábios, Reese
percebeu que havia caído na armadilha do capitão. Também percebeu o que
Roman queria que ele visse e acreditasse. Ele era um salvador até o osso, e
não importa quão difícil fosse a decisão, ele sempre escolheria salvar uma
vida.
Roman enganchou as pontas dos dedos.
— Acho que você finalmente entendeu. Todos nós tentamos com tudo
em nosso conjunto de habilidades salvar a todos que precisam. Mas nós não
podemos e não fazemos. Nós só podemos prometer fazer o nosso melhor.
— Meu melhor não foi bom o suficiente. — Admitiu Reese.
O olhar de Roman se fixou em Reese.
— Sim, foi. O universo decidiu que os desejos dele não eram os
mesmos que os seus.
Os dois continuaram a olhar um para o outro até Reese desviar o
olhar.
— Sei que está programado para você tirar uma semana de férias no
próximo mês. — Disse Roman. — Por que não usa esta semana para terminar
qualquer coisa que você esteja fazendo e sai mais cedo? Inferno, tire duas
semanas e obtenha sua cabeça no lugar.
Quatorze dias cheios de sol, areia e surfe soaram muito bem. Reese
quase podia sentir o cheiro tentador do oceano.
— Parece bom, capitão. — Disse Reese. — Obrigado.
— Todo mundo vai até você para ajudar a lidar com os problemas da
vida. — Disse Roman. — Enquanto você está aproveitando as ondas, deixe sua
mente descansar. Deixe-se relaxar e lembrar de como a vida pode ser boa.
— Pensei em fazer uma viagem de trem pelo interior este ano. —
Brincou Reese. Todo mundo sabia que Reese precisava visitar a praia pelo
menos duas vezes ao ano. Ele era um surfista de coração.
— Besteira. — Roman respondeu. — Agora sai daqui.
Sorrindo, Reese saiu do escritório, ocupado planejando duas semanas
de felicidade no oceano.
*****
Dias depois, Reese encostou a cabeça no pequeno travesseiro preso à
poltrona que ele estava reclinando. Ao lado dele, Carson estava encolhido em
uma cadeira que ficava inclinada em relação à de Reese. O marido de Isaías
percorreu um longo caminho desde sua chegada a Los Héroes.
A tortura mental e física que ele suportou nas mãos de um louco que
tentava sequestrar o piloto do Resgate Contratado do Oeste quase o matou.
Somente o amor de Isaías, o especialista em armas, e uma
combinação agressiva de reabilitação mental e física, restauraram a
capacidade de Carson de viver uma vida um pouco normal. Reese e Carson
passaram muitas horas juntos, sentados em silêncio até que o homenzinho
estivesse pronto para dizer alguma coisa.
Mais cedo, quando Carson perguntou se ele tinha tempo para
conversar, Reese ficou surpreso. Eles não se reuniam há um bom tempo, e
Reese achava que Carson havia passado da necessidade de sua ajuda. Parecia
que estava errado.
Uma pequena voz em sua cabeça sussurrou que ele estava errado
sobre muitas coisas ultimamente. Precisando do ambiente acolhedor, Reese
sugeriu a reunião no grande pátio localizado no centro da fazenda.
A combinação de um teto de vidro, grandes flores, plantas verdes e
uma enorme piscina fazia do pátio um dos lugares favoritos de Reese. Sua
localização no meio da fazenda, e as portas do pátio que levam diretamente
aos seus quartos, tornaram o local ainda melhor. Reese só conseguia pensar
em uma coisa para tornar o pátio extraordinário. Areia. Os caras,
especialmente Garrett, vetaram a ideia.
Nos últimos quinze minutos, Carson ficou sentado arrastando os pés
e mastigando a unha do polegar.
— Como o gatinho que você adotou está se ajustando à fazenda? —
Reese pensou que perguntar a Carson algo fácil e divertido ajudaria o homem
a encontrar as palavras que ele precisava dizer. O gatinho fofo, com suas
manchas brancas e multicoloridas, brincava no canto do pátio.
Um brilho apareceu nos olhos azuis de Carson, e um sorriso tímido
enfeitou seus lábios carnudos.
— Oh, Kitty está indo muito bem. Ela é tão fofa e Isaiah não se
importa com o pelo dela preso às nossas coisas.
Reese deu a Carson um sorriso gentil, feliz com a óbvia alegria do
homem. Tudo a respeito do bem-estar emocional de Carson aconteceu em
pequenos passos.
Ele observou Carson passando a mão pelo braço marcado e
deformado. Passaram horas discutindo a lesão causada por um acidente de
avião. No início de suas conversas, Carson havia expressado que estava
disposto a pagar com um braço fraco pelos grandes presentes de seu
relacionamento com Isaías e uma nova vida em Los Héroes.
Levou muito tempo para Carson entender e acreditar que não havia
preço a pagar para que coisas boas aconteçam.
Reese levantou a caneca de café de uma pequena mesa ao lado dele
e tomou um gole. Por experiência, poderia dizer que Carson estava pronto
para lhe dizer o que estava em sua mente. Agora, era apenas uma questão de
esperar e deixar Carson ser Carson.
O pequeno loiro pareceu encolher-se em sua cadeira antes de olhar
para a xícara de café de Reese e sussurrar:
— As coisas estão muito boas.
Reese piscou e registrou a vasta informação por trás dessas quatro
palavras. Em um instante, sabia o que estava incomodando Carson. Eles
haviam tocado na culpa do sobrevivente no passado. Agora, em vez de viver
alegremente o resto de sua vida com Isaías, Carson chegara ao ponto de se
preocupar que a maravilha não ia durar.
Amanhã, Reese embarcaria em um avião indo para a Califórnia. Nas
próximas duas semanas, estaria curtindo o oceano. Mente lutando, ele tentou
encontrar as palavras certas para ajudar seu amigo a aceitar e aproveitar a
vida que ele tinha. Carson precisava entender que o futuro não precisava ser
assustador.
— Carson, o que você faz todos os dias? — Reese perguntou.
— Eu conserto qualquer coisa na fazenda que precise, e me certifico
de que o lugar permaneça em boas condições. — Carson endireitou os ombros
e ergueu o queixo. O orgulho parecia bom no homem. — Também faço
quaisquer reformas aprovadas por Roman.
— E quanto a Isaías? — Reese continuou. — Uma vez que você sai de
sua cama de manhã, você o ignora e vai tomar café da manhã sem olhar para
trás?
— Claro que não. — As sobrancelhas de Carson baixaram até
pairarem em linha reta logo acima de seus olhos. — Nós fazemos a cama
juntos. Ele geralmente decide de que armas precisará para o dia enquanto eu
as pego.
Reese assentiu.
— Até agora, nós estabelecemos que você e Isaías começam seus
dias arrumando o seu quarto e você trabalha o dia todo na manutenção da
fazenda. — Reese inclinou a cabeça para o lado e estudou Carson. — E quanto
ao seu relacionamento com Isaiah? Ele te comanda o tempo todo? Você tem
alguma opinião sobre o que gostaria?
Carson se levantou com as mãos cerradas em punhos.
— Isaías nunca me faz fazer algo que eu não queira. Nós
conversamos sobre as coisas. Ele me ama.
— Você já mostrou a ele que o ama? — Reese perguntou. Esperava
que, mantendo as emoções de Carson perto da superfície, evitaria que o
homem pensasse demais em todas as respostas. Por enquanto, tudo bem.
— Claro que sim. — Respondeu Carson.
— Como? — Reese perguntou. — Pode me dar um exemplo de algo
que você faz por amor a Isaías?
— Eu garanto que suas roupas de resgate estejam limpas e que
qualquer coisa que ele possa precisar para uma missão esteja fácil de
encontrar. — Respondeu Carson. — A vida é dura o suficiente para ele com
todas as responsabilidades que tem de ensinar sobre armas e cursos de
autodefesa, e salvar as pobres vítimas de pessoas desagradáveis. Tento ter
certeza de que ele nunca precise se preocupar com as pequenas coisas, como
ficar sem sabão ou xampu. — Carson esfregou a mão pelo braço machucado
em agitação. — Trabalhei duro para chegar a um acordo com o que Sammie
fez comigo, de modo que a maioria dos pesadelos parasse para que eu não
acordasse muito o Isaiah.
— Sente-se, querido. — Reese não pegou a mão de Carson para
puxá-lo de volta para a cadeira. Ele não queria fazer Carson se calar com um
toque indesejado. Esperou que Carson se sentasse antes de dizer: — Você e
Isaiah fazem alguma coisa durante o dia juntos ou suas vidas são só sobre o
trabalho?
— Por que está me perguntando isso? — Carson perguntou. —
Quantas vezes fiquei tão empolgado com um piquenique ou um passeio que
Isaiah me deu que não pude deixar de contar sobre eles? — As bochechas de
Carson enrubesceram. — Até admiti que às vezes viemos para cá no meio da
noite e nadamos na piscina.
Reese imaginou que com todos os casais que moravam na fazenda, a
piscina tinha mais ação durante as primeiras horas da manhã do que todas as
camas da casa juntas. Carson não precisa saber disso.
— Relacionamentos não acontecem por acaso. — Afirmou Reese. —
As pessoas têm a oportunidade de se encontrar, mas o que acontece depois
disso é com elas.
— O que você quer dizer? — Carson estudou o rosto de Reese, nunca
tirando os olhos dele.
— Você acabou de listar todo o trabalho que você faz para manter
seu relacionamento com Isaiah correndo suavemente. — Dessa vez, Reese
pegou a mão de Carson. — Sua vida é tão boa agora porque você e Isaiah
trabalham para fazer desse jeito. Haverá alguns percalços ao longo do
caminho? — Reese encolheu os ombros e respondeu sua própria pergunta. —
Provavelmente. Mas juntos, você e Isaiah continuarão trabalhando duro mais
do que nunca para superá-los.
Reese quase podia ver as rodas na mente de Carson girando
enquanto ele pensava sobre suas palavras.
Finalmente, Carson disse:
— Parece que você está dizendo que estou fazendo meu próprio
futuro. Que sou responsável por todas as coisas boas que acontecem comigo.
Reese sorriu para seu amigo.
— Você é.
O sorriso de Carson começou pequeno e cresceu.
— Eu sou.
— Querido? — A voz profunda de Isaías chamou sua atenção. —
Quando você terminar, gostaria de ir cavalgar comigo?
— Estou pensando que ele está falando com você. — Comentou
Reese. — Isaías nunca me chamou de querido.
As risadinhas de Carson soaram como se fossem sinos anunciando
que um novo anjo havia entrado no céu.
— Você é tão engraçado. — Carson correu para tirar seu corpo
cicatrizado da espreguiçadeira e foi em direção a um Isaiah sorridente. No
meio do caminho, Carson parou e se virou. — Obrigado.
— De nada, meu amigo. — Reese respondeu, e quis dizer cada
palavra com todo o seu ser.
Mais tarde naquela noite, Reese estava deitado na cama, olhando
através da escuridão e não vendo nada. O suor irrompeu e banhou seu corpo
necessitado. Ele abriu as pernas inquietas, abrindo-se para o olhar de um
amante imaginário.
Rangendo os dentes, mergulhou a unha no pequeno orifício na
cabeça do seu pau, tentando estimular suas bolas a desistirem do seu sêmen.
Respirando pesadamente, acariciou o comprimento de seu pau duro e
palpitante e seu saco. Com a outra mão, beliscou seus mamilos, desejando
que uma boca e dentes estivessem trabalhando ao invés de seus dedos.
Nenhum arrepio de antecipação ou desejo aconteceu.
Derrotado, Reese deixou as mãos caírem na cama. Durante a última
hora, apenas a frustração encontrou seus esforços para obter liberação.
Odiando-se por sua fraqueza, Reese deixou a cama e vestiu um
short. O que ele estava prestes a fazer arranhava a coceira, mas deixava sua
alma vazia depois. Ele também sabia que seus encontros secretos comiam na
outra pessoa, emocionalmente batendo nos dois.
Reese abriu a porta e com passos silenciosos fez o seu caminho até o
final do corredor. Depois de uma batida suave, abriu a porta e entrou no
quarto.
Morgan levantou o cobertor, revelando seu lindo corpo nu.
— Já era hora de você chegar aqui.
Capítulo 2
Reese entrou na sala de jantar pronto para cavar batatas fritas, ovos
e um monte de salsicha. Ele olhou ao redor e viu que era o último a chegar.
Garrett impôs um prazo estrito para as refeições na fazenda. Reese sabia que
ainda tinha um minuto ou mais antes que comida fria fosse jogada na frente
dele. Pegou uma das poucas cadeiras vazias e sentou-se.
Ele acordou cedo, mas juntar as coisas demorou mais do que
esperava. No final do dia, estaria afundando os pés nas areias quentes de
Oceanside. Não podia esperar.
— Está tudo embalado para a sua viagem? — Morgan perguntou.
O olhar de Reese se fixou no especialista em informática, vestindo
sua habitual camisa xadrez de mangas compridas e jeans. O homem nunca
pareceu reagir ao calor de Nevada e usava o mesmo uniforme todos os dias,
variando apenas as cores. O quão diferente a roupa de Morgan era comparado
com o short curto, chinelos e a camisa alta de estampa floral de Reese.
— Sim, o avião sai ao meio-dia. — Ele respondeu.
Houve um tempo que Reese pensou que ele e Morgan poderiam
trabalhar as coisas entre eles e se tornar um casal. Mas, em termos de
personalidade, as coisas nunca se encaixavam entre eles, e o tempo que
passavam juntos tornou-se apenas uma maneira de liberar alguma pressão.
Na verdade, Reese fez um passe para o Flyer. Na época, ele não sabia que
Flyer já havia conhecido Styx e era louco pelo mecânico. Seus avanços foram
abatidos como se ele fosse um pato voando no meio da temporada de caça.
— Bem, divirta-se. — Os olhos de Morgan se arregalaram e suas
bochechas coraram. — Desculpa.
Eles podem ser apenas amigos com benefícios, mas Reese contou a
Morgan sobre a noite em que ele encontrou seu pai morto em uma praia da
Califórnia. Nada, desde então, traumatizou Reese da maneira como seu auto
esforço aos oito anos de idade não trazer seu pai de volta à vida, tinha. Não
importava que o homem tivesse ido surfar sozinho, no meio da noite, com
muita erva. Apenas Morgan sabia a magnitude das visitas emocionais de Reese
ao túmulo de seu pai no início de cada uma de suas férias.
Reese sorriu para Morgan.
— Está bem. Depois de visitar o túmulo do meu pai, estou pensando
em ter um grande hambúrguer no meu bar favorito. De lá, é mar e areia todo
o caminho.
— Bem, acho que deve encontrar um lugar divertido com homens
quentes e tirar a borda fora. — Jimmy disse.
— Foi uma ótima coisa para dizer. — Tristen repreendeu.
— Reese trabalha duro e não teve uma pausa em um tempo. —
Defendeu Jimmy. — Estou apenas dizendo.
— Você está sempre dizendo. — Respondeu Tristen.
— Garrett mencionou que ele precisa pegar alguns suprimentos na
cidade hoje. — Roman interrompeu a mais recente briga dos irmãos. — Ele
não tem problema em deixá-lo no aeroporto. Dessa forma, você não precisará
manter seu jipe no estacionamento de lá até voltar. Basta ligar e alguém vai
buscá-lo.
— Parece bom. — Respondeu Reese.
A conversa se voltou para a nova pista de obstáculos que a equipe
estava construindo dentro do muro de concreto que cercava a fazenda e dez
acres de terra. Até agora, os planos se assemelhavam a um curso da American
Ninja Warrior, uma competição na televisão que ganhou popularidade em todo
o país. Reese balançou a cabeça ante a antecipação do grupo de não apenas
conquistar os obstáculos, mas bater os tempos um do outro. Cada um deles
sempre gostou de um desafio.
*****
Horas depois, Reese se ajoelhou na frente da lápide de Galen Charles
Palmer e tocou a ponta do dedo no granito cinza.
Na estrada que serpenteava pelo cemitério, o motorista do Uber
esperava para levá-lo ao hotel que ele reservara para sua estadia em
Oceanside. Reese decidiu no último minuto visitar seu pai direto do aeroporto.
Dessa forma, teria o resto da noite para lidar com as emoções que sempre
corriam por ele enquanto prestava homenagem ao único pai que conhecera.
Sim, o procedimento incluía uma grande quantidade de álcool.
— Oi, pai. — Reese engoliu o nó se formando em sua garganta. —
Porra, por que isso ainda dói tanto? — Reese olhou para baixo em um esforço
inútil para piscar as lágrimas. Desistindo, fechou os olhos e inclinou o rosto
para o céu. — Sinto muito.
Reese ficou de pé e virou as costas para o túmulo. Ele puxou o ar
profundamente em seus pulmões, tentando acalmar os tremores que tomavam
seu corpo.
Depois de alguns instantes, encarou a lápide do pai e caiu de joelhos.
— Falhei novamente, pai. Não consegui te salvar, e não consegui
salvar uma menina doce que não merecia morrer. — Reese enxugou as
lágrimas e o nariz escorrendo. — É demais, pai. — Reese curvou-se quando a
dor torceu suas entranhas e coração. Às vezes a agonia fazia parecer que ele
ia morrer. — Mal posso me manter, muito menos assumir os fardos de outra
pessoa. Tentei tanto. Como eu gostaria de alguém com quem compartilhar a
vida. Estou sozinho desde que você me deixou e isso dói.
Reese desabou no chão, seus ombros tremendo sob os soluços
dominando seu ser. Ele chorou pela mãe que nunca conheceu, que não
conseguiu lidar com um bebê e fugiu, e pelo pai que partiu cedo demais.
Chorou pelo vazio dentro de um garotinho que se tornou um tutelado de um
sistema judiciário, quando ninguém se apresentou para reivindicá-lo. Reese
chorou por Misty e a grande perda de sua família.
Quando não havia mais lágrimas, ele levantou a cabeça e olhou para
as letras formando o nome do pai. Recompondo-se, sentou, tirou um lenço do
bolso do short e limpou o rosto.
— Estou indo para a praia. — A respiração de Reese engatou. —
Como sempre, uma noite eu vou até Trestles. Ainda não posso ficar lá para as
minhas férias. Isso traz de volta muitas lembranças da noite que você... —
Reese desviou o olhar da pedra, incapaz de terminar a frase. — De qualquer
forma, quando eu ver a estrela cadente dourada, saberei que você está me
dizendo que ainda está cuidando de mim. Eu te amo pai.
Reese respirou fundo, então se levantou e fez o caminho de volta
para a minivan em espera. Quando se aproximou do veículo, viu que o
motorista segurava um smartphone e estava digitando com os polegares.
Aproveitando-se da distração do motorista, desviou o rosto manchado de
lágrimas e deslizou para o banco de trás.
— Você está pronto? — Perguntou o motorista e colocou o telefone no
console entre os bancos da frente.
— Sim, obrigado. — Reese não podia esperar para deixar o cemitério,
e só respirou mais fácil quando atravessaram os portões de saída de ferro
forjado.
Reese se recostou no banco, pensando naquela hamburgueria na rua
do hotel. Ele decidiu que um milk-shake de chocolate e anéis de cebola seriam
ótimos acréscimos ao cheeseburger triplo com todos os ingredientes que
planejava pedir. Seu estômago roncando aprovou a ideia.
— Só para avisá-lo. — Disse o motorista. — A rota direta para o hotel
está em reforma, e um grande acidente encerrou a próxima melhor
alternativa. Vamos ter que dar uma volta para chegar ao hotel.
— Tudo bem. — Reese suspirou. Nada nunca foi bem em suas visitas
ao túmulo de seu pai. — Faça o melhor que puder.
O celular do motorista vibrou e sibilou. O homem se abaixou e
apertou um botão ao lado do telefone. Depois de alguns segundos olhando
para a tela, ele virou a cabeça para o para-brisa.
Nos vinte minutos seguintes, o telefone do homem tocou mais três
vezes. Cada vez que o motorista lia a mensagem, Reese ficava mais
preocupado. Até agora eles tinham viajado para o tráfego mais pesado, e os
nervos de Reese estavam prestes a disparar.
O telefone apitou de novo.
— Por favor, dirija o veículo e pare de olhar para o seu telefone. —
Ordenou Reese.
Ele rangeu os dentes quando o motorista o ignorou e olhou para o
telefone. Reese olhou pelo para-brisa e viu que o semáforo estava vermelho.
No último minuto, o motorista pisou no freio. Apenas o cinto de segurança
impediu que Reese se espatifasse no banco da frente. Na distância Reese ouviu
sirenes, e elas estavam se aproximando.
O telefone apitou e o motorista pegou o aparelho. Com o
temperamento queimando diante do flagrante desrespeito do homem pelo
perigo, Reese desafivelou o cinto de segurança e bateu no telefone.
— Ei! — O homem gritou.
O tolo deve ter colocado o pé no acelerador. A van atirou para frente
e Reese foi jogado de volta contra seu assento. Reese registrou sirenes
estridentes e buzinas. Fora da janela lateral, viu um caminhão de bombeiros
indo em direção a eles.
O mundo desacelerou.
O caminhão se aproximou e Reese apoiou as mãos nos braços da
poltrona, sabendo que o impacto seria horrível. Pela janela, viu a expressão de
horror no rosto do bombeiro que estava dirigindo o caminhão. Olhos e boca
bem abertos, o homem parecia estar gritando alguma coisa.
O tempo voltou à velocidade normal.
O caminhão de bombeiros bateu na van com um impacto que enviou
Reese voando. Seu corpo bateu na porta e uma luz brilhante explodiu em sua
cabeça. Tudo ficou preto.
*****
Vozes abafadas falavam, mas ele não conseguia entender o que elas
estavam dizendo. Uma névoa cinza flutuava na frente dele com a escuridão se
infiltrando nas bordas. Ele tentou lutar contra o cinza. A dor o cortou e um
pesado cobertor de exaustão tentou afogá-lo. Ele desistiu e deixou o escuro
assumir.
Uma voz masculina o trouxe à superfície.
— Alguém descobriu quem é esse cara?
— Ainda não. — Respondeu uma mulher. — A polícia informou que
um impacto com um caminhão de bombeiros o expulsou de uma minivan do
Uber logo antes de o veículo explodir em chamas. Eles não encontraram
nenhuma identificação e o motorista morreu no acidente.
— Espero que eles possam descobrir quem ele é. — Disse o homem.
— Ele vai precisar de algum apoio importante da família e dos amigos quando,
ou se, ele recuperar a consciência.
— O que você está pensando, doutor? — Perguntou a mulher. — Você
está preocupado que ele não vai acordar?
— Vamos ter que esperar para ver. — Respondeu o médico. — Seu
cérebro sofreu uma lesão. Há danos permanentes. Só vamos saber a extensão
se ele acordar.
A mulher disse alguma coisa, mas ele perdeu a briga com o nevoeiro
se aproximando e foi para baixo.
*****
Jimmy atravessou a porta aberta do escritório e Roman empurrou a
cadeira para trás, dando ao seu punhado espaço para sentar em seu colo. O
amor de sua vida não hesitou e no momento seguinte, Roman tinha um
homem sexy em seus braços.
Roman cobriu os lábios de Jimmy e saboreou o doce sabor da
essência de seu marido. Mãos deslizaram ao redor de seu pescoço e dedos
puxaram as pontas de seu cabelo.
Ele quebrou o beijo e sorriu, admirando o rosto corado de Jimmy. O
amor e a doce e possessiva necessidade desse homem acalmavam as bordas
de sua natureza dominante.
— Você está puxando a cauda do tigre, punhado?
— Não. — O brilho nos olhos verde-claros de Jimmy disse sim. —
Estou te dando outra coisa para pensar em vez de o que estava colocando essa
carranca em seu rosto.
— Reese se foi há duas semanas, e ninguém ouviu falar dele. —
Admitiu Roman.
— Ele está de férias. — Jimmy apontou. — Talvez tenha perdido a
noção do tempo porque está conectado com alguém e está ocupado criando
um futuro.
Roman bagunçou o cabelo sedoso de Jimmy com as pontas dos
dedos.
— Vamos torcer para que tenha conhecido alguém que é bom para
ele.
— Você está dizendo que Morgan não é o único para Reese? — Jimmy
bufou. — É uma piada que eles achem que ninguém percebe suas reuniões
noturnas.
A pergunta de Jimmy soou inocente. Roman sabia melhor. Anos
atrás, antes do Resgate Contratado do Oeste, Roman e Morgan tiveram um
encontro curto. Roman não deixou um rápido boquete impedi-lo de contratar
Morgan como o especialista em computadores da equipe. Quando encontrou e
levou Jimmy para Los Héroes, seu parceiro mal-humorado disse que entendia
que o passado era passado.
Ser compreensivo não significou que Jimmy não tivesse tido algumas
palavras com Morgan. Roman pensava que, se Morgan encontrasse um
parceiro permanente, aquele lugar minúsculo na parte de trás da mente de
Jimmy seria apaziguado de uma vez por todas.
— Morgan e Reese não se encaixam. — Declarou Roman. — Para ser
feliz, ambos precisam de alguém com uma personalidade mais forte.
— Ah, e agora você é um especialista no que eles precisam em seus
homens? — O rosto de Jimmy ficou vermelho.
Jimmy tentou escorregar do colo de Roman, mas Roman não ia
deixar seu marido fogoso sair com uma birra. Haveria uma surra com o nome
de Jimmy se o homem não se acalmasse.
— Eu conheço os homens da minha equipe. — Disse Roman. — Faço
o meu negócio para reconhecer os problemas em suas vidas antes que eles
consigam descobrir que algo está errado. Reese tem flertado na beira do
esgotamento por algum tempo. Estou preocupado que a morte daquela garota
o tenha jogado sobre a borda.
Jimmy estudou Roman por um momento.
— O que seu instinto está dizendo?
— Eu vou dar a Reese mais alguns dias. — Declarou Roman. — Se
ninguém souber dele, tentarei contatá-lo. Depois disso, começaremos a
procurar.
Os olhos de Jimmy se arregalaram.
— Você acha que algo está errado, não é?
— Minha intuição está começando a emitir sinais de alerta. — Admitiu
Roman. — Ele tem quarenta e oito horas. Férias ou não, se ele não ligar ou
atender nossas ligações, terá o Resgate Contratado do Oeste batendo na porta
do seu quarto de hotel.
*****
Do outro lado do quarto silencioso, a luz fraca brilhava entre as ripas
das persianas. Ele não sabia por que estava aqui ou onde era o aqui. Ele
tentou sentar, mas seu corpo doía e não respondia ao que queria fazer. Ele
ficou lá, tentando se orientar. Franziu o nariz para os aromas intensos de
produtos químicos e plástico.
Uma sensação dolorosa o fez levantar a mão. A fita cobria a parte de
cima e fixava um tubo que levava a uma bolsa pendurada em um suporte de
metal. A visão do tubo e bolsa enviou seu coração batendo em pânico.
A necessidade de sair o dominou, e ele lutou para se sentar. A dor
deslizou por seus braços e pernas, mas ignorou e conseguiu alcançar seu
objetivo.
Sua cabeça latejava com a batida de seu coração e seu estômago
revirou. Algumas respirações profundas acalmaram seu corpo um pouco. Ele
tocou o lado de sua cabeça e sentiu pedaços afiados de metal embutidos na
borda de seu cabelo. Algo ruim aconteceu. Ele tentou se lembrar, mas o
nevoeiro não o deixava encontrar o caminho para limpar o pensamento. Algo
estava errado.
Ele não gostava deste lugar e queria sair.
Depois de tirar o cobertor, saiu da cama, mas outro tubo o deteve
quando puxou o pau dele. Agindo por instinto, ele manobrou seu corpo e o
tubo ao redor até que estava sentado na beira da cama com as pernas
penduradas para o lado.
Fadiga e dor disseram que ele deveria se deitar. Uma voz interior
disse para sair de lá agora.
Agarrando a bolsa pendurada no tubo para o seu pau, ele tentou ficar
de pé. Apenas apoiando as mãos no colchão ele evitou cair no chão. Levou
alguns minutos para se firmar em suas pernas bambas.
Ele chegou de volta e puxou o suporte de metal ao lado dele. Usando
o suporte para manter-se estável, atravessou o quarto até os armários ao
longo de uma parede. Ele não pensou no que estava fazendo. Suas mãos
pareciam saber onde tudo estava localizado. Era como se tivesse realizado
essas ações antes.
Abriu uma gaveta e encontrou uma pequena seringa. Em outra
gaveta, enfiou a mão em uma cesta e encontrou gazes estéreis. Atrás das
gazes, outra cesta continha Band-Aids.
Ele se virou e com seus suprimentos entrou no banheiro. Cinco
minutos depois, saiu sem o soro, o cateter e a saco urinário.
Depois de abrir a porta alguns centímetros, olhou para o corredor e o
encontrou vazio. Não hesitando, saiu do quarto. Enquanto caminhava, ele
esfregou a testa, mas a névoa que nublava seu pensamento ainda não estava
clara.
Ele continuou passando por outro corredor e depois outro. No
corredor seguinte, virou para a direita e parou. Deveria ter um lugar para ele
entrar e tirá-lo de lá. Tudo o que viu foram portas de cada lado de um longo
corredor vazio.
Ele se virou e começou a andar. Um sinal chamou sua atenção. Nada
no sinal registrou, exceto a seta apontando para a esquerda. Ele decidiu que
era para onde precisava ir.
Ao aproximar-se da placa, notou uma porta aberta. Ele olhou para o
quarto e viu uma camisa, short e uma bolsa de lona preta na cama. Ao lado
das roupas havia um par de chinelos.
Entrando no quarto, ouviu a água correndo no banheiro adjacente.
Ele tirou a camisola fina que usava e vestiu a camisa e o short. A bolsa estava
aberta e dentro viu uma carteira. Instintos disseram para olhar dentro da
carteira. Ao encontrar dinheiro, tirou as notas e enfiou-as no bolso do short.
Os chinelos eram muito pequenos, então os deixou e saiu pela porta.
Ele se virou para onde a placa apontava e encontrou as portas de correr de
metal que estava procurando. Um momento de clareza o atingiu, e ele sabia
que eram elevadores.
Um conjunto de portas estava aberto e ele entrou no elevador.
Estudou todos os botões do painel de metal. Decidiu apertar o botão com uma
estrela ao lado dele. As portas se fecharam e o chão pareceu cair debaixo de
seus pés. Sua cabeça latejou em resposta. Ele esfregou os olhos, tentando
limpar o cinza que nublava sua visão.
Um baque ecoou no pequeno espaço, seguido por um solavanco do
chão que quase dobrou os seus joelhos. As portas se abriram e na frente dele,
a brilhante luz do sol atravessava as portas de vidro da frente.
Ignorando tudo ao seu redor, ele se apressou o mais rápido que suas
pernas trêmulas permitiram e não parou até que estava do lado de fora na
calçada. Inclinando o rosto para cima, deixou o calor penetrar em um corpo
que não havia percebido estar gelado.
Luz do sol significavam coisa boa. Neste momento, era a única coisa
que ele sabia. Se virou e desceu a rua, apreciando a superfície quente do
concreto aquecendo a sola dos pés.
Ele continuou andando. Algumas pessoas olhavam enquanto passava.
Os ignorou. Deixou os instintos que guiaram seu caminho até agora tomarem
conta. Enquanto caminhava, os prédios altos se diluíam e as casas se
alinhavam nas ruas.
Mais de uma vez seu corpo não o levaria mais longe e teve que
sentar em um banco em um ponto de ônibus.
Um grande parque apareceu. As crianças corriam e gritavam
enquanto brincavam em vários equipamentos. Em outras áreas, grupos de
crianças chutavam uma bola para trás e para frente em uma competição
acirrada. Ele entrou no parque e seus pés o levaram por todas as pessoas em
direção a uma área arborizada.
Sob a copa fresca das árvores, seguiu o caminho mais fundo no
silêncio. Sua cabeça latejava e a exaustão começou a reclamar seus músculos.
À frente, viu algumas pessoas andando na direção dele. Ele deixou o caminho
e atravessou a vegetação espessa e de baixo crescimento. Videiras
arranharam suas pernas nuas, deixando para trás picadas que coçavam.
Galhos afiados enterravam-se nas solas dos seus pés.
Ele usou a última de sua energia para subir uma pequena colina.
Cambaleando pelo outro lado, procurou por um lugar para descansar.
Encontrou uma árvore que perdeu a batalha para ficar em pé e se inclinou
para o lado. Parte das raízes da árvore se afastou da terra e ficou exposta em
uma cobertura que parecia um guarda-chuva.
Ele deixou seu corpo afundar no chão e se arrastou para o abrigo que
essas raízes criaram. Ele nem percebeu quando seu corpo parou de se mover.
*****
Roman deixou seu olhar repousar em todos os homens da sala. O
grupo incluía sua equipe, Garrett, e todos os seus maridos. O que ele tinha a
dizer não seria fácil.
Morgan falou primeiro.
— Você já ouviu alguma coisa, capitão?
— Reese não me contatou. — Respondeu Roman. — Algum de vocês
recebeu uma ligação ou mensagem dele?
Os homens balançaram a cabeça ou deram uma resposta negativa.
Roman afastou a pontada de preocupação e endureceu sua determinação de
encontrar seu amigo e empregado desaparecido. Se ele tivesse o seu caminho,
e faria, a equipe estaria na Califórnia até o meio dia do dia seguinte.
— Pedi a Morgan para verificar os registros do aeroporto. — Começou
Roman. — De acordo com eles, no dia em que saiu para suas férias, Reese
aterrissou no aeroporto de Oceanside e pegou sua bagagem no final da tarde.
— Isso é bom, certo? — Flyer, o piloto da equipe, perguntou. —
Podemos trabalhar com isso. Alguém sabe em qual hotel ele está hospedado?
— Liguei para o que ele costuma usar. — Disse Morgan. — Eles me
deram uma volta sobre questões de privacidade. Posso ter entrado em seu
sistema de computador e descobri que Reese tinha uma reserva lá, mas nunca
fiz o check in.
— Isso é estranho. — Comentou Santos, um dos rastreadores da
equipe. — Reese é uma pessoa de hábitos. Ele gosta de fazer as coisas da
mesma maneira todas as vezes.
— Estava pensando a mesma coisa. — Rhys, o outro rastreador,
comentou.
— Entrei em contato com o departamento de polícia de Oceanside. —
Admitiu Roman. — Não houve acidentes perto ou ao redor do aeroporto
naquele dia. Mas houve um grande engavetamento perto do cemitério onde o
pai de Reese está enterrado.
Morgan ficou de pé.
— Merda. É melhor verificarmos o hospital e ver se ele está lá.
— Sente-se. — Roman ordenou. Rangendo os dentes, esperou que
Morgan se sentasse. O que ele estava prestes a dizer devastaria sua equipe. —
Liguei para o hospital naquela área. Por causa de questões de privacidade, eles
não poderiam me dar nenhum nome. Eles disseram que um homem de vinte e
tantos anos foi levado do acidente, DOA1.
Capítulo 3
1
Dead On Arrival, que significa morto na chegada. Usado para descrever uma pessoa que é declarada morta
imediatamente ao chegar a um hospital.
frente.
— Olha, nós encontramos Frankenstein.
Ele estudou o homem que falara. Rugas profundas cobriam um rosto
bronzeado. Seu sorriso revelou dentes perdidos e enegrecidos. Uma camisa
sem mangas esfarrapadas, short manchado e tênis sujos completavam a
imagem de um sem-teto.
— Precisamos ensinar-lhe uma lição sobre boas maneiras. — Um
homem mais baixo saiu das sombras. Sua roupa lembrava a de seu
companheiro. — Ninguém leva a nossa comida.
— O que você vai fazer, Frankiestein? — O primeiro homem bateu
nele, forçando-o a se afastar e dar alguns passos para trás.
— Olhe para isso. — Disse o segundo homem. — Ele tem alguns
movimentos. Depois que o derrotarmos, acho que devemos descobrir o quanto
a bunda dele se move no final do meu pau.
— Parece bom. — O primeiro homem concordou. — Já faz um tempo
que não temos carne nova.
O mais alto dos dois correu para ele, que deu um passo para o lado,
agarrou o braço do sujeito e usou o ímpeto do próprio homem para jogá-lo de
cabeça contra a lixeira.
Movimento ao lado dele o fez instintivamente sacudir a cabeça para
trás. O punho do homem número dois roçou sua bochecha. Ele levantou o
braço e plantou o punho no estômago do sujeito, e o homem gritou e se
inclinou, segurando o abdômen. Ele apertou as mãos e as colocou na parte de
trás da cabeça do cara. O homem desabou no chão.
Agachando-se, ele olhou ao redor, pronto para outro ataque. Ambos
os homens estavam imóveis a seus pés. Não querendo ficar por perto até que
eles acordassem, correu até a lixeira e pegou o saco branco que esperava que
estivesse cheio de comida. Ele já estava farto do parque e decidiu que era hora
de ir embora.
Algum tempo depois, ele sentiu o cheiro. Andou mais rápido quando o
cheiro ficou mais forte. Calor o encheu. Sua mente agarrou a palavra casa.
Logo ele ouviu isso. O barulho das ondas na escuridão cada vez mais profunda,
ele desceu um declive íngreme.
Parou quando seus pés descalços encontraram pedras ásperas em
vez de areia macia. Isso parecia errado para ele, mas o oceano estava
chamando. Ele fez o seu caminho sobre as pequenas pedras e não parou até
que seus dedos tocaram a água. Sua alma cantou uma canção de boas-vindas
ao mar. Este é o lugar onde ele esperaria na escuridão até que seu amigo sol
surgisse novamente.
Ele acordou com o sol cumprimentando-o e, pela primeira vez, sua
mente clareou o suficiente para que começasse a se fazer perguntas. Por que
estava aqui? Por que estava sozinho? Ele estava perdido? As pequenas ondas e
espuma branca o fizeram feliz, mas as pedras sujas e a areia negra cheia de
algas pareciam errado.
— Olhe para isso. — Desgosto cobria as palavras do orador.
Ele olhou e viu dois garotos adolescentes usando roupas de mergulho
sob shorts e carregando pranchas de surf.
— Aquela tempestade na semana passada fez um número na praia.
— Observou o segundo adolescente.
— Até as ondas sugam. — Reclamou o primeiro adolescente.
— Vamos pegar o trem até Trestles. — O segundo adolescente
sugeriu.
— Sim, vamos lá.
Ele se levantou e seguiu os dois antes mesmo de pensar nisso. A
palavra Trestles transformou seu coração em uma massa latejante, e sua
respiração saia rápida. Saudade, necessidade e anseio instigaram-no a seguir
os rapazes.
Eles deixaram a praia para trás e continuaram pela rua. Logo os dois
entraram em um imóvel. Ele seguiu, ignorando a multidão de pessoas lá
dentro.
Aberturas envoltas em vidro com pequenos balcões embaixo cobriam
uma parede. Os garotos se aproximaram de uma.
— Precisamos de dois bilhetes para San Onofre. — Disse um deles.
— São vinte e dois dólares. — Afirmou a mulher atrás do vidro.
Ele observou um dos meninos tirar dinheiro do bolso e empurrar
algumas das notas através de uma abertura no vidro. A mulher entregou aos
adolescentes pequenos pedaços de papel.
Os garotos se afastaram do vidro, atravessaram o local e
encostaram-se a uma parede.
— Próximo, por favor. — A mulher gritou.
Ele deu um passo à frente. Eles se encararam. Observou o olhar dela
subir para o cabelo dele e se acomodar no lado onde ele sentia o metal
embutido em sua cabeça.
A mulher falou primeiro.
— Não posso lhe dar um bilhete a menos que me diga onde está
indo.
— Trestles. — A palavra saiu distorcida e logo acima de um sussurro.
Ele limpou a garganta. — Trestles. — Ele esperava que ela o entendesse dessa
vez. Ele tentou o seu melhor para formar a palavra, mas não podia ter certeza
se conseguiu.
— Você precisará comprar uma passagem para San Onofre. —
Afirmou a mulher. — De lá você pode caminhar até Trestles. É isso que quer?
Ele assentiu.
A senhora moveu as mãos e levantou um pedaço de papel.
— Onze dólares.
Ele enfiou a mão no bolso, tirou dinheiro e colocou no balcão. Ela
olhou para ele, suspirou e pegou algumas das notas antes de lhe entregar um
pedaço de papel. Ele o pegou e colocou a pilha de dinheiro de volta no bolso.
Quando se virou, os meninos tinham indo embora. O pânico o fez
correr para a parede onde os viu pela última vez. Olhando ao redor, suspirou
de alívio quando os viu do lado de fora na plataforma da estação.
Quando saiu, um trem enorme prateado parou na estação. Ele seguiu
os adolescentes para o trem.
Estava indo para Trestles.
*****
Lee Sanchez colocou o suculento e quente cachorro-quente no pão,
acrescentou picles especial e esguichou o ketchup por cima. Todo o tempo ele
manteve um olho no loiro alto sentado na beira da praia.
O cara não se encaixava no perfil padrão de um sem-teto que decidiu
que a praia seria um ótimo lugar para ficar. Por um lado, o cara fez um grande
esforço para manter-se limpo, e apesar de estar do lado magro, músculos
deliciosos cobriam o homem.
A linha de grampos em um lado da cabeça do homem preocupava
Lee, assim como a fileira de pontos pretos decorando seu braço e ao longo de
uma coxa.
Mais de uma vez, Lee também observou o cara olhando para a
distância como se não estivesse ciente de seu entorno.
Uma outra coisa sobre o cara intrigou o inferno fora de Lee. Quando
Tony, o policial local, apareceu, o homem desapareceu à vista de todos. Como
um ex-detetive disfarçado, Lee achou impressionante a tática do loiro. Aquele
cara tinha algum treinamento profissional em seu passado.
— Ei, Vinnie. — Lee gritou para o homem mais velho e grisalho
sentado num banco próximo. Hoje seu amigo estava falando com uma loira de
vinte e poucos anos. Mais vezes do que não, Vinnie teria a dama que ele
estava perseguindo em cima dele no final do dia. Lee riu. Aos setenta e
alguma coisa, Vinnie iria.
Vinnie deu à mulher um sorriso de mil megawatts antes de olhar para
Lee.
— O que você precisa?
Lee preparou outro cachorro quente.
— Que olhe o carrinho por um tempo.
Vinnie se levantou e curvou-se para a loira antes de galantemente
estender a mão.
— Lee, meu amigo. Acho que a doce Chrissy e eu ficaremos felizes
em ajudá-lo.
A loira riu e colocou a mão na de Vinnie. Lee balançou a cabeça
diante das palhaçadas de seu amigo e embrulhou os dois cachorros-quentes.
Com sua oferta para quebrar o gelo em uma mão, Lee contornou o
longo carrinho de metal e passou pela placa anexada à frente, proclamando
Lee's Dogs.
Quando chegou à beira da areia, Lee caiu ao lado do objeto de sua
curiosidade e estendeu um cachorro-quente.
— Você gostaria de se juntar a mim para consumir um dos melhores
cachorros-quentes na terra do sol e do mar azul? — Ele perguntou, esperando
que, se mantivesse seu tom amigável, não assustaria o homem.
Olhos verdes olharam para Lee. Eles o lembraram das árvores no
Meio Oeste durante o verão. Ele suspeitava que um homem bonito espreitasse
sob aquela espessa juba de pelos faciais.
Agora que Lee estava mais perto, podia ver o amarelo esverdeado de
hematomas desbotados cobrindo a têmpora, a testa, os braços e as pernas do
homem. A pele inchada sob cada olho continha meia lua de amarelo
arroxeado.
Lee esperou enquanto o olhar do homem percorria seu curto cabelo
preto, sua pele morena e sua constituição robusta. Algumas pessoas tinham
um problema com sua herança mexicana. Esperava que esse homem não fosse
um deles.
O homem pegou o cachorro-quente e, depois de abrir a embalagem,
devorou a refeição em três mordidas. Lee entregou o outro e viu o mesmo
destino.
O cara limpou a garganta, depois limpou novamente.
— Obrigado.
Lee estremeceu.
Aquela voz rouca e estridente não tinha sido usada há algum tempo.
Sua preocupação aumentou alguns entalhes com as palavras arrastadas.
Algum tipo de evento catastrófico aconteceu com aquele homem.
Estendendo a mão, ele disse:
— Meu nome é Lee.
O homem respondeu agitando sua mão e assentindo.
— Parece que você sofreu algum tipo de acidente. — Afirmou Lee. —
Deve ter sido muito desagradável para os médicos colocarem esses grampos
em sua cabeça.
O homem levantou um ombro em um encolher. Lee observou-o
passar o dedo pela fileira de pontos ao longo de uma coxa musculosa. Agora
que estava mais perto, Lee podia ver a pele começando a crescer sobre as
bordas do fio. Esses pontos precisavam sair.
— Você gostaria de ir até a clínica? — Ele perguntou. Seus instintos
estavam gritando que esse cara estava em apuros. — Os médicos podem dar
uma olhada e ver como você está se recuperando.
Antes que Lee pudesse reagir, o homem ficou de pé e saiu correndo.
Logo ele se perdeu na multidão. Lee não se incomodou em correr atrás do
cara.
Ele empurrou o suficiente por um dia. Só podia esperar que o loiro
voltasse.
*****
Ele não sabia o que fazer. Não conseguia encontrar nada limpo o
suficiente para cortar os pontos. Não sabia onde encontrar o instrumento que
precisava para tirar os grampos. Talvez devesse colocar dinheiro no balcão da
estação de trem e ir para outro lugar.
A areia quente contra as pernas dele o acalmou. Seu amigo sol tinha
subido para a beira do abrigo de praia. Ele observou o belo homem de cabelos
escuros que conversara com ele. Quando o sol tocava a beira do teto do
abrigo, o homem empurrava o carrinho de cachorro-quente pelo caminho,
trazendo consigo o aroma de carne cozida de dar água na boca.
Estudou as pessoas na praia já sentadas em cadeiras de pernas
curtas ou deitadas em cobertores. Seu olhar descansou em uma mulher
vestindo um maiô azul. A achou bonita, mas nenhuma borboleta tremulou em
seu estômago. Ele se mexeu e observou algumas garotas adolescentes se
aconchegando em um cobertor e rindo por cima de um tablet. Quanto mais ele
olhava para as meninas sorridentes e vibrantes, mais lágrimas nublavam sua
visão. Ele desviou o olhar. Por que um caroço enorme se formou em sua
garganta, não sabia.
Mais abaixo na praia, um grupo de homens estava montando uma
rede de vôlei. Camisetas foram arrancadas e jogadas na areia. Ele admirava as
barrigas lisas, as coxas duras e a pele dourada e bronzeada. Seu pau reagiu.
Ele olhou para a mulher. Nada aconteceu.
Os homens jogavam uma bola de vôlei de um lado para o outro.
Músculos ondulavam. Sua respiração ficou presa ao ver um em particular. As
pernas estavam abertas e os joelhos dobrados, prontos para manter o homem
firme enquanto ele jogava a bola pela rede. Ele tinha um desejo de se ajoelhar
entre aquelas pernas e passar as mãos por toda aquela pele dourada.
Seu olhar descansou no pacote proeminente que enchia um apertado
short vermelho de natação. O pensamento de deslizar os dedos sob o cós até
que eles encontrassem o cabelo grosso fez seu pau endurecer. Ele pode não
saber muito sobre si mesmo, mas acaba de descobrir uma coisa. Seu corpo
queria um homem, em vez de uma mulher.
Alguém caiu ao lado dele.
A inesperada felicidade inundou-o com a visão do homem de cabelos
escuros. Lee colocou um pacote de papel em suas mãos.
— Fiz algo diferente de cachorro-quente para o café da manhã.
Ele estudou o homem chamado Lee. Desejou poder ver a cor dos
olhos escondidos pelo óculos escuro de aviador. Seus dedos queriam tocar o
cabelo preto e espesso do homem. Eles coçavam para explorar a sombra de
um bigode e barba para ver se a barba escura iria espetar as pontas dos
dedos. Imaginou os lábios firmes de Lee pressionados contra os dele.
— Vá em frente, experimente. — Lee insistiu.
Ele piscou e olhou para baixo. Levou um momento para descobrir que
o homem estava falando sobre a comida e tirou a embalagem. Desta vez o pão
estava torrado.
— Em vez de condimentos, coloco uma tira de bacon de cada lado e
cubro a coisa toda com ovos mexidos. — Lee continuou falando, indiferente
aos seus pensamentos. — Claro, cubro a criação com ketchup. Sou um dos
poucos fornecedores que acreditam que o ketchup faz o mundo girar. Meus
clientes obtêm ketchup, a menos que me peçam para não adicionar.
Ele deu uma mordida e cantarolou. O sanduíche provava tão bom. Ele
parecia nunca encontrar o suficiente para comer.
— Eu diria que você aprovou. — Disse Lee.
Engoliu o último pedaço e sorriu. Seu sorriso se alargou quando Lee
lhe entregou outro. O segundo desapareceu tão rápido quanto o primeiro.
— Eu não queria te incomodar ontem. — Lee pegou as embalagens
vazias e as esmagou juntas em uma bola apertada. — Esses pontos precisam
sair. Tenho um amigo que é paramédico. Se você não quer ir a uma clínica, eu
poderia pedir a ele para vir aqui e removê-los para você.
Pressão percorreu suas coxas e ele olhou para baixo para ver as
pontas dos dedos cravando na pele. Ele tentou se concentrar na palavra
paramédico. Sabia que eles ajudavam pessoas em problemas médicos. Por que
esse pensamento o fez querer gritar?
Uma mão quente cobriu a sua. Uma sensação de calma tomou conta
dele.
— Está tudo bem. — Assegurou Lee. — Tatum tentaria apenas ajudá-
lo. Não deixarei ninguém fazer nada que você não queira. Pode confiar em
mim. Acha que poderia pelo menos me dizer seu primeiro nome?
Ele virou a mão e agarrou a de Lee como se fosse a tábua de
salvação que realmente era.
— Eu não sei. — Ele confessou.
Lee acariciou a pele sensível ao longo do lado de seu polegar. As
pequenas ondas de prazer se espalhando por seu braço empurraram o pânico
crescente tentando segurá-lo.
— O que você não sabe? — Lee perguntou.
Ele olhou para as mãos unidas e sussurrou:
— Não sei quem sou. Não sei onde é esse lugar ou o que estou
fazendo aqui. Eu nem sei o que é ontem.
A mão que ele segurava ficou imóvel, e o corpo de Lee ficou rígido.
Pensando que talvez ele não devesse ter dito o que tinha, tentou se levantar e
ir embora.
— Não fuja. — Disse Lee e apertou os dedos. — Fiquei surpreso. Eu
gostaria de tentar te ajudar. Vai me deixar?
Ansiedade o subjugou e dor bateu em sua cabeça. Ele não entendia o
que estava acontecendo. O nevoeiro que sempre pairava nas bordas de seu
cérebro se ergueu e cobriu o mundo.
Lentamente, sua visão clareou e os raios do sol cintilando na
superfície do oceano apareceram. Uma mão segurou a dele. Seu olhar pousou
naquela mão e examinou a pele morena coberta de cabelos negros.
Por alguma razão, pensamentos de segurança e aquela mão
combinaram em confiança.
— Você está de volta comigo? — A calma da voz de Lee inundou o
medo que borbulhava sob a superfície.
— Eu não sei o que aconteceu. — Ele admitiu.
— Você ficou imóvel e olhou para longe. — Disse Lee. — Acho que
você teve algum tipo de convulsão.
— O que vou fazer?
Ele estava ficando cansado. A fome, a solidão. Tudo comia sua
energia até que seu amigo sol se tornou a única razão para continuar.
Lee apertou a mão dele.
— Chamei Tatum. Ele deverá estar aqui em breve. Você pode confiar
nele. Ele cuidará desses pontos e grampos. Também é bom em falar com as
pessoas. Ele tem o dom de ser capaz de entender quais são seus problemas,
mesmo que você não possa dizê-los.
— Você vai ficar comigo? — Ele perguntou. — Estou tão confuso.
Ele lutou contra o desejo de fugir, para escapar do nada frustrante
em seu cérebro. Apenas a mão de Lee o segurou no lugar.
— É claro. — Afirmou Lee. — Vou ficar com você até que não precise
mais de mim.
Ele olhou nos olhos castanhos de Lee.
— Não entendo o que está acontecendo comigo.
— Vou ajudá-lo se você me deixar. — Assegurou Lee.
Ele assentiu.
— Ok.
Longas pernas nuas deram um passo na frente deles. Ele olhou por
cima do short laranja e uma camiseta branca sem mangas para pegar cabelo
loiro-escuro desgrenhado com as pontas descoradas de um ouro mais claro.
Um bigode curto e barba cobriam a metade inferior do rosto do homem, e
grandes olhos castanhos olhavam para ele.
Lee se levantou e puxou sua mão até que ele ficou de pé. Pela
primeira vez, percebeu que era mais alto que Lee. A força do caráter do
homem o fez parecer maior.
— Ei, Tatum. — Disse Lee, cumprimentando o homem. — Estou feliz
que você estava livre para descer e dar uma olhada no meu amigo aqui.
O homem estudou-o. Ele se perguntou o que o cara estava pensando.
— Você parece familiar. — Disse Tatum. — Eu te conheço?
*****
— O que você tem? — Roman exigiu.
Eles estavam em Oceanside a uma semana e não encontraram
nenhum sinal de Reese. As barreiras que estavam enfrentando tinham Roman
pronto para puxar o cabelo para fora. Sua lista de contatos para abrir portas
estava ficando escassa. Ele estava pensando em ligar para Cade, do Resgate
Contratado, e pedir ajuda. Algo grande estava errado. Reese nunca sairia por
mais de três semanas sem ligar para a equipe.
— O legista confirmou que nenhum dos corpos que passaram pelo
necrotério nas últimas duas semanas era Reese. — Disse Parker. — Recebi um
relatório do hospital mais próximo do cemitério onde o pai de Reese está
enterrado. Nenhum paciente foi admitido que se encaixasse na descrição de
Reese. Claro, pedi que verificassem variações do nome dele ou de qualquer
indigente. Isso também acabou sendo negativo.
— Não vi muita coisa na minha investigação sobre as empresas de
táxi locais. — Admitiu Rhys. — Você sabe quantos homens loiros usam shorts e
chinelos que pegam no aeroporto nesta época do ano? Estamos no auge da
temporada turística. Depois de correr e checar nomes, descrições e destinos,
cheguei à conclusão de que, a menos que Reese tenha mudado seu nome para
Duane, nenhuma das possibilidades é ele.
— Eu posso ter alguma coisa. — Morgan falou. — Verifiquei com o
Uber para ver se algum de seus motoristas levou clientes ao cemitério. No dia
em que Reese saiu, eles levaram dois clientes e no dia seguinte um.
— Você achou alguma coisa que possamos usar? — Roman
perguntou.
— Descartei os dois clientes do primeiro dia. — Declarou Morgan. —
Um era mulher e o outro acabou envolvido em um acidente do outro lado da
cidade. Reese não tinha motivos para estar lá.
— E a última pessoa? — Perguntou Isaiah.
— O motorista levou-o para um hotel diferente do que Reese
geralmente ficava, e ele fez check-out no dia seguinte. — Respondeu Morgan.
— Por que Reese iria sair no dia seguinte? — Rhys perguntou.
— Talvez ele tenha conhecido alguém. — Ofereceu Flyer.
A sala ficou em silêncio enquanto todos pensavam sobre essa ideia.
— Fui até a praia. — Disse Santos. — Uma grande tempestade chegou
há algumas semanas e bagunçou a areia. Reese não iria desperdiçar suas
férias em uma praia tão ruim assim.
— Tudo bem, amanhã começamos a procurar por essa terceira
pessoa. — Ordenou Roman. Se tivessem sorte, encontrariam Reese no dia
seguinte. Mas como sempre, ele nunca deixava nenhuma porta aberta. —
Rhys, gostaria que investigasse o acidente do outro lado da cidade.
Capítulo 4
*****
Ele olhou em volta da pequena casa que Lee o trouxera. Da cadeira
de balanço de madeira que sentou, podia ver o lugar inteiro. Uma pequena
cozinha tomava um canto com uma mesa e duas cadeiras espremidas em um
cubículo. Através de uma porta, ele podia ver um chuveiro e vaso sanitário.
Outra levava ao quarto de Lee. A cadeira de balanço e um sofá ocupavam a
maior parte da sala de estar com uma pequena televisão no canto.
Seu olhar seguiu Lee quando o homem pegou duas garrafas de água
da geladeira e as levou para a sala de estar. Em um mundo envolto por um
nevoeiro cinza que ameaçava tirar o pouco que ele entendia, Lee era sua
salvação.
— Você está bem, Ricky? — Lee entregou-lhe uma garrafa e sentou
no braço do sofá.
Ricky. Esse era o nome dele? Nada. Nenhuma resposta veio. Nenhum
nome existia, exceto Lee e Tatum.
— Ei, está tudo bem. — Lee se agachou a seus pés e cobriu sua mão.
— Nós vamos levar um dia de cada vez. Não se preocupe.
Ele olhou para a garrafa de água amassada. Se ele a apertasse com
mais força, o topo poderia estourar ou o plástico poderia se partir.
— Obrigado. — Disse ele. Quando falou, sua língua pareceu ficar no
caminho e ele teve que trabalhar por cada palavra.
Lee sorriu e seus quentes olhos castanhos brilharam.
— Pelo que está me agradecendo?
— Deixar-me vir aqui. — Ele respondeu. — Não vou enlouquecer e te
machucar.
Ele ouvira as preocupações de Tatum e precisava que Lee soubesse
que nunca faria nada de mal a ele.
Lee tocou as pontas dos dedos na sua bochecha.
— Eu não acredito que vá se tornar violento e não tenho certeza se
poderia me machucar se o fizesse. Antes de começar a vender cachorro-
quente, passei anos trabalhando disfarçado para o departamento de polícia de
Los Angeles. Nunca consegui desligar o sexto sentido de saber quando o perigo
está próximo.
Ele não respondeu. Precisava pensar sobre o que Lee acabou de lhe
dizer e talvez fazer perguntas. A dor o fez piscar de volta a umidade que
enchia seus olhos. Ele não sabia quais eram essas perguntas.
Esfregou o latejar em sua cabeça.
— Aposto que um banho quente te faria se sentir melhor. — Disse
Lee. — Você é mais alto que eu, mas porque sou mais corpulento, acho que
pode se encaixar em minhas roupas.
Ele não pôde resistir e tocou o lado da garganta de Lee. Encontrou a
pele quente.
— Acho que você é perfeito. — Ele deixou escapar.
Sua mão foi afastada. Ele se perguntou se fez algo errado. Não
deveria estar tocando Lee? Ele gostava de tocar em Lee.
— Não faça cara feia assim. — Ordenou Lee. — Vamos tomar banho e
pedir uma pizza.
Ele assentiu e se levantou. Lee também se levantou e agora seus
corpos estavam a apenas alguns centímetros de distância. Seus olhares se
encontraram. Se abaixasse a cabeça, poderia beijar Lee.
Lee parou qualquer movimento, colocando uma mão contra o seu
peito.
— Querido, você está cheio de cortes e contusões. Seu cérebro
precisa de algum alimento, descanso e tempo. Não posso em sã consciência
começar algo com você. Estaria me aproveitando.
— E se eu quiser te beijar? — Ele perguntou. Gostaria de beijar Lee.
Lee colocou um pouco de pressão no seu peito e ele recuou.
— Vamos esperar alguns dias e ver se alguma de suas lembranças
voltará. — Aconselhou Lee.
Ele não gostava que lhe dissessem não, mas Lee estava certo. Ele se
virou e entrou no banheiro, onde tirou a camisa e levou a mão ao chuveiro
para ligar a água. Parte dele se perguntava o que alguns dias eram.
Lee se juntou a ele e colocou algumas roupas no balcão da pia.
— Puta merda.
Ele olhou por cima do ombro para ver o que tinha assustado Lee,
apenas para encontrar o homem olhando para suas costas.
— Qual é o problema? — Ele perguntou.
— Todo o lado do seu corpo, do seu ombro até o quadril, é um
grande hematoma. — Exclamou Lee. — Isso tem que doer.
— Tudo dói desde que acordei. — Ele admitiu. Na maior parte do
tempo ele ignorou a dor. Somente quando o sol ia embora ele deixava a dor
física e o horrível espaço vazio trazer lágrimas aos seus olhos.
Lee abriu um pequeno armário em cima da pia e pegou uma garrafa.
Ele reconheceu isso como um analgésico que havia tomado antes. Esse
pensamento o fez sorrir.
— O que está pensando? — Lee perguntou quando pegou um copo no
balcão e encheu com água.
Ele tocou o topo da garrafa de plástico branco com o rótulo vermelho.
— Sei o que é isso. Tomei isso antes quando tive dor de cabeça ou
dores musculares.
— Isso é fantástico. — Lee exclamou. — Você se lembra por que teve
músculos doloridos?
Ele procurou, mas havia apenas vazio.
— Aqui. — Lee entregou-lhe comprimidos. — Beba isso e entre no
chuveiro antes que a água quente acabe.
Ele pegou as pílulas e as engoliu com um gole de água. Depois de
deixar o short cair no chão, foi para o box, mas um suspiro o deteve.
— Droga. — Sussurrou Lee.
Olhando para Lee, ele pegou o homem lambendo os lábios enquanto
observava sua bunda. Calor e felicidade afastaram o vazio e o medo. Uma
risada escapou.
— Você gosta do que vê, Lee? — Perguntou ele.
— Ricky, você tem um inferno de uma bunda. — Lee admitiu.
— Se tirar seu short, verei se posso devolver o seu elogio. — Ele
ofereceu gostando dessa ideia.
A risada de Lee enviou arrepios até sua virilha. Ele esfregou seu
abdômen.
— Pare com os movimentos sensuais e entre no chuveiro, meu
amigo. — Lee colocou a mão em seu ombro, empurrando-o para o box. — Nós
concordamos em dar-lhe alguns dias para curar.
Ele pisou sob o jato de água, resmungando:
— Não acredito que tenha concordado com alguns dias, seja o que
for.
A risada de Lee o fez sorrir e pegar a barra de sabão.
*****
Roman sentou na cadeira e tentou manter seu temperamento sob
controle enquanto sua equipe relatava um monte de nada. Quase mais uma
semana se passou, e estavam longe de encontrar Reese.
Ficava chateado que Parker não tivesse aparecido para a reunião. Era
melhor o homem estar seguindo uma pista quente, ou Roman estaria dando a
ele uma bronca.
— Tem alguma coisa para relatar sobre os passageiros do Uber? —
Ele perguntou a Morgan. — Você deveria ter conseguido algo agora.
A caneta na mão de Roman se partiu em duas. Sim, estava um pouco
nervoso. Até ligou para o detetive para o qual havia relatado sobre pessoa
desaparecida quando chegaram pela primeira vez à cidade. A ligação foi para o
sul depois da segunda vez que o detetive sugeriu que Reese poderia ter
abandonado seu trabalho e ido embora.
Roman explicara em termos inequívocos a sua opinião sobre essa
ideia e o telefonema terminou abruptamente.
— Investiguei dois dos passageiros. — Respondeu Morgan. —
Acontece que um é uma senhora de Ohio que visitou o cemitério para
encontrar uma tia-avó que deveria ser atriz em filmes mudos.
— E o outro? — Roman pensou em jogar os pedaços de caneta pela
sala. Eles eram profissionais. Este era um deles. Reese deveria estar em casa
em segurança em Los Héroes até agora.
— O outro cara veio do Canadá. — Respondeu Morgan. — Ele tem um
metro e meio, cabelo preto e é de ascendência asiática.
— E a terceira pessoa? — Roman ficou de pé, pronto para sair do
quarto do hotel e começar a vasculhar a cidade com as próprias mãos.
— Pedi a Parker que desse uma olhada nesse indivíduo. — Respondeu
Morgan. — Pensei que com os dois trabalhando nisso, poderíamos descobrir
algo mais rápido.
— Alguém tem ideia de onde Parker está? — Ele perguntou.
— Ele ligou há pouco tempo. — Rhys falou. — Disse que estava a
caminho.
Parker irrompeu pela porta, acenando com uma folha de papel.
— Encontrei algo.
Capítulo 5
*****
Lee entregou o último cachorro do dia. Ele queria trancar as coisas e
colocar o carrinho em sua caminhonete para que pudesse descer e sentar na
praia com Ricky.
Na última semana, Ricky floresceu. O tom cinzento em sua pele havia
se transformado em um suave marrom dourado. Aqueles lindos olhos verdes
se iluminaram e ficavam mais claros com mais reconhecimento a cada dia.
Refeições regulares acrescentaram peso necessário àquele belíssimo quadro de
mais de um metro e oitenta.
Lee estava achando difícil manter as mãos longe do homem.
Ele fez uma pausa. Um homem de meia-idade, com a barriga
pendurada no cós da roupa de banho, sentou ao lado de Ricky. Lee tinha
aprendido que Ricky poderia se comportar muito bem com atenção indesejada.
Isso não significa que não iria intervir se houvesse uma necessidade.
O estranho colocou a mão no joelho de Ricky. Lee encaixou a última
trava no lugar e começou a descer o caminho curto. Quando alcançou os dois
homens, Ricky empurrou a mão de seu joelho.
— Não estou interessado. — Disse Ricky.
— Eu posso fazer valer a pena. — O homem com excesso de peso
falou.
Lee se moveu na frente de Ricky e estendeu a mão.
— Ei, luz do sol. Você está pronto para me ajudar a colocar o carrinho
na caminhonete antes de vermos o pôr do sol?
O estranho empurrou o braço de Lee. Em um movimento, Lee
colocou o cara no chão com os dedos em volta da garganta do homem.
— Se me tocar de novo, vai me ver para sempre em seus pesadelos.
— Ele ameaçou.
— Desculpe. — O cara levantou as mãos em sinal de rendição. — Eu
tenho observado ele por um tempo e queria esse doce pedaço de bunda. Por
que você não pode encontrar um diferente?
Lee apertou ainda mais a garganta do homem, admirando o tom de
púrpura que cobriu o rosto do sujeito.
— Ele não é um pedaço de bunda. — Lee apertou com mais força, e o
homem começou a lutar. — Saia daqui.
— Lee. — Ricky puxou o braço de Lee. — Acho que tem que soltá-lo
antes que ele possa sair.
Lee sorriu para Ricky.
— Só para você, luz do sol.
Ele afrouxou o aperto e o homem rolou, tossindo e ofegando. Lee se
levantou e estendeu a mão. Ricky pegou e juntos começaram o caminho em
direção ao carrinho de cachorro-quente.
— Você está bem?
— Ele teria saído. — Disse Ricky. — As mulheres são piores. Elas não
querem aceitar um não como resposta.
— Elas não deveriam estar dando em cima de você em primeiro lugar.
— Elas não estão realmente vindo até mim para um encontro. —
Explicou Ricky. — Acham que estou trocando sexo por dinheiro. Desde que
você cortou meu cabelo e estou usando roupas novas, a maioria me deixou em
paz.
— Entendo, luz do sol. — Lee odiava que as pessoas achassem que
Ricky se prostituiria. — Mas me irrita quando te incomodam. Vou lhe dar uma
pequena faca para carregar, caso alguém não aceite um não como resposta.
Ricky permaneceu quieto, parecendo mais decidido a guardar o
carrinho e voltar para a praia.
Depois que colocaram o carrinho na traseira da caminhonete de Lee,
voltaram para a amada praia de Ricky. Ele fazia questão de estar com Ricky
quando o sol se punha. A primeira vez que Lee viu Ricky chorar quase
despedaçou seu coração. Agora ele consolava o homem mais alto o melhor que
podia.
O sol ficou laranja e começou a passar pela linha do horizonte. Uma
lágrima desceu pela bochecha de Ricky.
Lee colocou o braço em volta dos ombros dele. O tempo passou e o
sol se afundou no mar. Mais lágrimas seguiram a primeira. Logo o sol
desapareceu e, com um soluço, Ricky enterrou o rosto no ombro de Lee.
Mantendo o tom gentil e calmo, Lee perguntou:
— Por que você está chorando?
— Algo terrível vai acontecer quando a escuridão chegar. —
Sussurrou Ricky. — Sem o sol para assistir, o oceano vai roubar toda a minha
felicidade. A dor que ele deixa dói muito.
Lee não entendeu a declaração de Ricky e perguntou:
— Como isso pode acontecer?
— Eu não sei. — Respondeu Ricky. — Mas acontece.
Lee abraçou Ricky mais apertado. No passado de Ricky, algo ruim
aconteceu no oceano durante a noite. Estava certo disso.
Dois dias depois, Lee assistiu a magnífica figura de Ricky na prancha
de surfe que ele pegou emprestada de Lee acenar por alguns segundos antes
de cair na água. Ele podia assistir Ricky em uma roupa molhada abraçando seu
corpo o dia todo e nunca se cansar da visão. O homem era lindo e a atração
entre eles ficava mais forte a cada dia.
A maneira como Ricky lidava com a prancha disse a ele que antes do
ferimento na cabeça, o homem poderia surfar nas ondas grandes. Agora, com
um lado esquerdo mais fraco, Ricky lutava. O homem determinado não
deixaria problemas de equilíbrio impedi-lo, no entanto. Durante todo o dia, Lee
notou uma melhoria emocionante.
Ricky sentou na prancha e deixou uma onda levá-lo para a praia,
onde Lee esperava.
— As ondas estão fantásticas, Lee. — Gritou Ricky.
— Sim, elas estão. Por que você não vem me ajudar a guardar o
carrinho?
Ricky olhou para o oceano e observou as ondas de um metro e meio
se curvando em direção a eles.
— Elas podem ir embora.
— Elas vão voltar. — Lee tranquilizou o homem bonito. — O sol vai se
pôr em breve, e posso ver que você já teve o suficiente por hoje. — As mãos
de Ricky tremiam devido ao esforço.
Ricky levantou e pegou a prancha.
— Eu me diverti muito!
Lee riu. Ele amava a exuberância de Ricky. Inferno, amava tudo
sobre Ricky, exceto que ele não sabia se poderia reivindicar o loiro alto para si.
Juntos, guardaram o carrinho e também a prancha na caminhonete.
Quando Lee, com Ricky ao seu lado, voltou para a praia, revisou seus planos
para lidar com a próxima meia hora mais ou menos.
Ricky se jogou na areia. Lee sentou ao lado dele. No reflexo nos olhos
de Ricky, Lee pôde ver o brilho alaranjado do sol tocando a borda da superfície
do oceano. A visão borrada com as lágrimas de Ricky.
Lee começou a cantarolar. Não havia rima ou ritmo na sua música.
Na maior parte se assemelhava a uma valsa antiga. Ricky olhou para ele antes
de olhar para o sol poente. Lee pegou a mão de Ricky e ficou de pé, puxando o
homem mais alto com ele.
Ele segurou a mão de Ricky e colocou o outro braço ao redor da
cintura fina do homem. Enquanto continuava a cantarolar, Lee começou a
balançar para frente e para trás.
— O que você está fazendo? — Ricky sussurrou.
— Estamos comemorando o fim de um dia maravilhoso. — Respondeu
Lee.
Ele recuou e Ricky conseguiu girar debaixo do braço. Lee cantarolou e
balançou, girou e arrastou Ricky até a água, até que a espuma branca se
espalhou pelos pés deles.
Com o zumbido de Lee e sua dança de celebração, ao longe o sol
afundou no oceano. Quando a escuridão se instalou sobre a praia, o brilho de
fogueiras apareceu aqui e ali. O riso e a música de violão enchiam o ar. A
música de Lee acabou.
Ricky olhou para Lee.
— Isso foi lindo. Obrigado.
— Você é o único que é lindo. — Afirmou Lee, e quis dizer isso com
todo o seu coração.
Lee não poderia ter parado o que aconteceu a seguir nem se sua vida
dependesse disso. Em movimentos lentos, Ricky se inclinou e Lee inclinou o
rosto para cima. Seus lábios se tocaram, se separaram e se encontraram
novamente.
Para Lee, naquele instante, as razões para viver vieram juntas. O
gosto único de Ricky, de homem e mar, registrou em sua alma. Se algum dia
ele fosse forçado a entregar Ricky, ainda teria uma parte do homem a partir
daquele momento.
— É hora de ir para casa. — Lee sussurrou.
— Você é a minha casa. — Ricky sussurrou de volta.
Um movimento chamou a atenção de Lee e ele viu uma estrela
cadente dourada atravessando o céu escuro. Ricky também viu e ficou olhando
para o céu por longos momentos.
Um largo sorriso cobriu seu rosto e uma lágrima escorreu por sua
bochecha.
Lee enxugou a lágrima com o polegar.
— Porque está chorando?
— Essa estrela me fez sentir como se alguém estivesse me dando um
grande abraço. — Ricky olhou para Lee. — Quase tão bom quanto os seus.
— Quando algumas pessoas veem uma estrela cadente, fazem um
pedido. — Disse Lee. — Talvez seja disso que você está se lembrando. Um
grande pedido que se tornou realidade.
Ricky deu de ombros.
— Talvez. Vamos para casa.
— Você entendeu, luz do sol. — De braços dados, eles deixaram a
praia.
Lee só podia esperar que um milagre ocorresse, e que o desejo que
fez para a estrela se tornasse realidade, que o passado de Ricky não o tire
dele.
*****
— Invada. — Roman ordenou.
Fazia três dias desde que Parker adquiriu uma cópia impressa dos
documentos de admissão de um amigo que trabalhava em um hospital do
outro lado da cidade.
Um indigente foi trazido de um acidente envolvendo uma minivan do
Uber. A van tinha vindo do cemitério onde o pai de Reese foi enterrado.
É verdade que o acidente ocorrera do outro lado da cidade, do hotel
em que Reese tinha uma reserva, mas Roman aprendera há muito tempo que
nunca devia descartar nenhuma pista em potencial.
Ele havia atingido uma parede de bobagens burocráticas com o
hospital. Nada do que tentou resultou em obter a informação de que precisava
para ver se o indigente e Reese eram o mesmo homem. Não discutir com os
administradores do hospital ou contatar suas próprias fontes não adiantou
nada. Outra discussão inútil com o detetive designado para o caso de
desaparecimento de Reese não o levou a lugar nenhum.
A única informação que o hospital liberou ainda assombrava Roman.
Sim, um indigente esteve internado no hospital para tratamento. Não, não era
mais um paciente.
O temperamento de Roman se inflamara. Que tipo de tratamento?
Por que ele foi libertado? Ele estava morto?
— Me dê meia hora, capitão. — Os dedos de Morgan voaram sobre as
teclas de seu laptop.
— Tem que ser ele. — Disse Flyer pelo que pareceu a centésima vez.
— Os papéis que o amigo de Parker lhe deu descreveram Reese até a cicatriz
de bala na parte de trás de seu ombro direito. — O joelho de Flyer balançava,
e o homem colocou o último pedaço de uma barra de granola em sua boca. —
Vamos esperar que Santos possa se misturar o suficiente para encontrar algo.
Roman enviara Santos a uma missão de reconhecimento no hospital
para ver se ele poderia descobrir alguma informação sobre o indigente.
Isso pode ser um tiro longo, mas era tudo o que Roman tinha no
momento.
— Minha preocupação é a lesão na cabeça com a qual o indigente foi
admitido. — Comentou Parker. — Uma fratura do crânio com sangramento no
cérebro é preocupante. O restante dos ferimentos do homem era superficial,
mas as ramificações de uma lesão cerebral poderiam ser de longo prazo.
— Não sabemos se é Reese ou não. — Apontou Roman. — Quando
encontramos Reese, vamos lidar com qualquer situação que nos seja
apresentada.
— Somos uma família. — Rhys falou.
Roman sorriu pela primeira vez em semanas e repetiu:
— Sim, somos uma família.
— Estou dentro. — Anunciou Morgan, teclas clicando sob seus dedos
ocupados. — O que você precisa primeiro, capitão?
— Você pode descobrir em que andar e quarto ele estava? — Roman
perguntou.
Alguns segundos depois, Morgan respondeu:
— Depois que o indigente saiu da emergência, foi levado para o
quarto andar, quarto quarenta e quatro.
— Qual foi a data de alta dele?
Longos minutos se passaram.
— Um, capitão. — Disse Morgan. — Não há alta listada, apenas uma
nota dizendo que o paciente deixou por conta própria.
— Olhe as câmeras de vigilância no dia em que ele saiu. — Roman
exigiu. — Talvez possamos dizer se é Reese ou não.
— Santa foda! — Morgan exclamou. — Capitão, tem que ver isso.
Todos na sala se reuniram em volta de Morgan e do computador. O
coração de Roman caiu.
— Merda, esse é Reese? — Rhys explodiu.
Um homem numa camisola hospitalar caminhava pelo corredor do
hospital. A cada passo, seu pé esquerdo arrastava e seu braço pendia flácido
ao seu lado.
— O rosto dele está todo inchado e metade da cabeça está raspada.
— Comentou Flyer. — Porra, olhe para todas essas contusões. Como ele está
de pé?
— Reese odeia hospital com paixão. — Declarou Morgan. — Nada
poderia fazê-lo ficar em um.
Morgan apertou um botão e a imagem no monitor congelou. O
estômago de Roman rolou.
Sob todo o inchaço e contusões estava Reese.
Capítulo 6
*****
— Ei, Ricky.
Ele olhou para cima de falar com o adolescente.
— Oi, Tatum.
Olhando para o menino problemático, ele disse:
— Ligue para sua mãe. Pelo menos deixe-a saber que você está vivo.
Se as coisas não correrem bem, volte. Eu e meu amigo vamos ajudá-lo.
— Ok. — O adolescente concordou. — Eu só não quero ter que, você
sabe, me vender para comer.
— Encontre-me antes de fazer isso. — Disse ele.
— Aqui. — Tatum tentou entregar ao adolescente um pedaço de
papel e dinheiro. — Eu tenho um amigo que administra um abrigo para
adolescentes. Ele pode te ajudar.
O adolescente não pegou os papéis.
— Eu não sei. O último abrigo que fui, uma velha senhora tentou ir
para a cama comigo.
— Andy é bastante protetor das pessoas que ele ajuda. — Tatum
tirou um cartão da carteira. — Se você tiver algum problema, aqui está o meu
número.
O garoto pegou os papéis que Tatum estendeu.
— Ok.
Depois de dar alguns passos em direção ao caminho que levava à
praia, o adolescente parou e olhou para ele.
— Obrigado por tentar me ajudar.
— Volte e me encontre se precisar. — Disse ele, segurando a sacola
vazia.
— Eu vou. — O menino respondeu e se afastou.
Ele observou por um momento, esperando que o adolescente
encontrasse o caminho de casa. Isso era importante. Ele olhou para Lee,
certificando-se de que o homem bonito ainda estava lá. Sempre se certificava
de que Lee estivesse por perto.
Mudando sua atenção, ele olhou para Tatum.
— Oi.
O homem olhou para ele.
— Você se lembrou de alguma coisa?
Ele deu um passo para trás, surpreso com a pergunta abrupta do
homem e o olhar intenso.
— Não. — De alguma forma, ele sabia que Tatum não estaria
satisfeito com essa resposta.
Ele estava certo quando Tatum perguntou:
— Alguma coisa parece familiar? Resgates, Nevada ou médico de
equipe?
Seu coração disparou. O nevoeiro nas bordas de sua mente se fechou
e uma dor cortante perfurou suas têmporas. Ele agarrou a cabeça, tentando
fazer a agonia parar.
Mãos gentis envolveram seus ombros.
— Está tudo bem, luz do sol. — A voz maravilhosa de Lee murmurou
em seu ouvido. — Vamos sentar na areia quente e deixar você se acalmar.
Ele sentou. A areia o abraçou, e uma mão o encorajou a descansar a
cabeça contra um ombro largo. Os aromas de carne, cebola, picles e Lee
acalmaram a ansiedade que corria por seu sistema.
— Deixe-o. — Ordenou Lee.
Ele nunca tinha ouvido tal raiva no tom de Lee antes.
— Isso pode ser grande, Lee. — Exclamou Tatum. — Eu acho que...
— Dê o fora daqui. — Gritou Lee.
Ele abriu os olhos e deu um tapinha no peito de Lee.
— Está tudo bem. Estou bem agora.
Lee segurou sua bochecha.
— Eu não te quero chateado. Você está indo tão bem.
— Socorro.
Ele sentou-se. Sua mente registrou a voz jovem, feminina e
assustada. O latejar em suas têmporas se intensificou.
— Ajude-me!
Ele pulou de pé. Na água, uma jovem adolescente tentava puxar um
corpo flácido para a margem.
Não hesitando, ele saiu correndo. Lee e Tatum se juntaram quando
ele entrou na água e foi até a garota.
— Minha mãe afundou. — A menina soluçou. — Eu a encontrei, mas
ela não está se movendo.
Ele agarrou a mulher por um braço e Tatum pegou o outro. Lee
segurou os tornozelos da mulher e a levaram para a praia. Uma vez que a
tinham deitado na areia, a rolou de lado. A água escorreu de sua boca.
Balançando o ombro, ele gritou:
— Você pode me ouvir?
Quando ela não respondeu, ele se inclinou e verificou se ela estava
respirando.
— Sem respiração. — Anunciou ele.
Juntos, com a ajuda de Tatum, eles colocaram a mulher de costas.
Ele olhou para Tatum.
— Meu braço está muito fraco para compressões.
— Entendi. — Tatum moveu-se para o lado da mulher e começou a
bombear seu peito.
Quando Tatum fez uma pausa, ele soprou ar na boca da mulher. Eles
continuaram até que a viu respirar.
— Pare. — Ele ordenou.
Com o coração disparado, ele assistiu a mulher respirar. No fundo, as
sirenes se aproximavam.
Homens carregando uma prancha e caixas médicas de cor laranja
correram pela areia. Ele viu quando eles colocaram a prancha ao lado da
mulher.
— O que temos, Tatum? — O mais baixo dos homens perguntou.
— Vítima de afogamento. — Afirmou Tatum. — Inconsciente quando
a puxamos para fora. Realizamos ressuscitação cardiopulmonar até que ela
começou a respirar novamente.
Ele se virou e voltou para o carrinho de Lee. Vinnie sentou no
banquinho atrás da gaveta de dinheiro. Ele puxou o segundo banquinho que
trouxeram para ele quando ajudava Lee a vender cachorros e sentou-se.
— Você está bem, luz do sol? — Lee colocou um braço ao redor de
seus ombros.
Usando uma pinça, colocou salsicha em um pão, depois acrescentou
molho e ketchup antes de enrolar a coisa toda em um invólucro de alumínio.
Ele entregou o pacote para um menino que deu o dinheiro a Vinnie.
— Estou bem. — Ele respondeu. — Podemos tomar sorvete?
— Você fez bem lá atrás. — Elogiou Lee.
— Ele fez mais do que bem. — Tatum se aproximou. — Ele ajudou a
salvar a vida daquela mulher.
Com as mãos trêmulas, ele embrulhou outro cachorro-quente.
— Não sei como fiz isso. — Ele admitiu.
— Seria fascinante testá-lo. — Comentou Tatum. — Você parece não
ter noção de números, mas respirou duas vezes naquela mulher logo depois de
eu ter comprimido o peito trinta vezes. Eu me pergunto se isso foi uma tarefa
aprendida subconsciente ou se seu cérebro está encontrando uma maneira
diferente de completar uma atividade que você realizou centenas de vezes.
O olhar de Lee estreitou.
— Você sabe alguma coisa, Tatum? Você sabe quem é Ricky?
O ketchup explodiu da garrafa sob seu aperto esmagador.
— Merda. — Lee gritou e pulou para fora do caminho do gêiser de
vermelho. — Solte, Ricky.
Ele colocou a garrafa no balcão, olhou para Tatum e esperou a
resposta do homem. O suor escorria entre suas omoplatas quando o medo do
desconhecido entupiu sua garganta.
— Eu não tenho certeza. — Tatum puxou um conjunto de chaves de
seu short. — Preciso fazer um telefonema.
— Você não pode nos deixar suspensos, cara. — Objetou Lee.
— Não quero incomodar Ricky mais do que já tenho. — Tatum bateu
os dedos no carrinho. — Vou te deixar saber se encontrar alguma coisa.
Ele observou Tatum desaparecer no caminho para o estacionamento.
— Você tem medo de descobrir sua identidade? — Lee perguntou. —
Sei que seu corpo se curou e sua mente está mais clara. O que te assusta?
— E se eu for uma pessoa terrível? — Ele perguntou. — Você ainda
será meu amigo se fiz coisas horríveis? Eu posso ser um assassino.
— Sou um bom juiz de caráter, e não há nenhuma maneira que eu
acredite que você é nada, além da boa pessoa que é agora. — Lee traçou um
dedo pelo seu rosto. — Eu iria tão longe a ponto de dizer que acredito que
você é um profissional de algum tipo.
— Striper. — Ele brincou. — Talvez eu dance nu para viver.
Os olhos de Lee arregalaram e fogo queimou em suas profundezas.
— Eu pagaria para ver isso.
Seu pênis encheu e ele precisou lamber seus lábios para molhá-los.
— Pare com isso. — Lee ordenou. — Vou ter que fechar e levá-lo para
casa.
Ele se abaixou e apertou a mão contra o seu pau, tentando parar a
dor. Ele queria Lee com tudo em seu ser, mas as perguntas não respondidas
permaneciam como se fossem uma parede espessa de pedra entre eles.
Havia também o pôr do sol e a dança deles. Ele adorava sua
homenagem ao amigo girando e balançando ao zumbido de Lee. Ficou
surpreso quando os outros começaram a se juntar a eles. Agora, a felicidade
substituiu as lágrimas quando um grupo de pessoas dançou ao seu sol poente.
— Por que deixou de ser detetive? — Ele perguntou. — Acho que
seria ótimo em encontrar os bandidos.
Lee sorriu seu lindo sorriso branco.
— Você está mudando de assunto, luz do sol?
Ele deu de ombros, sem se importar em negar a acusação de Lee.
— Deixei a força depois de ficar disfarçado por um longo tempo e o
caso explodir na minha cara.
O tom de Lee disse que algumas coisas horríveis haviam acontecido.
Ele pegou a mão de Lee e segurou-a entre as suas.
— Pessoas inocentes morreram porque homens com poder e dinheiro
pagaram meus supervisores. — O polegar de Lee roçou as costas de sua mão.
— Consegui escapar da bala de um assassino e acabei buscando refúgio na
procuradoria do distrito. Quando a poeira baixou, o esgotamento me pegou em
suas garras e saí de lá. Saí daquela cidade e nunca mais olhei para trás.
— Estou feliz que você esteja aqui. — Afirmou.
— Eu também, luz do sol. — Lee beijou as costas da sua mão. — Eu
também.
*****
A frustração aumentou. Eles sabiam que Reese tinha saído do
hospital, mas para onde ele foi depois disso, veio em branco. Santos estava
vasculhando as ruas ao redor do hospital, e Rhys procurava nos parques na
área.
Roman enfiou os dedos pelos cabelos. Eles chegaram a um beco sem
saída. Reese estava em algum lugar lá fora, mas onde? Que ele estava ferido
deixou toda a equipe no limite. Eles precisavam encontrá-lo, droga.
Ele pensou em ligar para Jimmy. Uma palavra e seu marido mal-
humorado estaria no próximo avião. O pensamento de segurar Jimmy em seus
braços fez com que Roman pegasse seu telefone.
Antes que pudesse ativar o smartphone, ele tocou. Roman não
reconheceu o número piscando na tela.
— Roman. — Afirmou.
— Oi. — Disse uma voz masculina. — Eu não tenho certeza se lembra
de mim, mas meu nome é Tatum Janis. No ano passado, em setembro,
participei de um seminário sobre resgate com corda em Reno. Tive o prazer de
conhecer você e alguns de sua equipe.
Roman pensou de volta naquele seminário. Ele se lembrou de um
paramédico com cabelo loiro de dois tons que o impressionou com seu
entusiasmo e conhecimento de técnicas de resgate. Se já não tivesse dois
médicos, teria convidado Tatum para Los Héroes para uma entrevista.
— Eu me lembro de você. — Roman admitiu. — Como está, Tatum?
— Estou bem. — Respondeu Tatum. — Estou me mantendo ocupado.
A razão de eu estar ligando é meio estranha, mas estava pensando se está
procurando por um dos seus médicos?
Roman congelou, sem ousar esperar que eles pudessem ter uma
pista sobre Reese.
— Você poderia explicar o que quer dizer com essa pergunta? —
Roman perguntou.
— Eu tenho um amigo que me ligou sobre um cara com uma grave
lesão na cabeça...
Capítulo 7
Capítulo 8
*****
Reese abriu a porta da geladeira e olhou para dentro em busca de
algo para comer. Ele havia deixado Lee dormindo e se moveu com cuidado
pela casa escura e silenciosa, para não acordar ninguém. Melancia cortada e
coxas de frango empanadas chamaram sua atenção.
Depois de puxar os recipientes da prateleira, ele os colocou no balcão
e foi em busca de um prato e talheres.
O movimento na porta fez com que parasse no ato de tirar um garfo
de uma gaveta. Ele reconheceu Morgan e notou que o homem ainda usava
jeans, uma camiseta branca e uma camisa de flanela de mangas compridas.
Reese se perguntou se o homem dormia nelas quando estava escuro. Lee disse
a Reese que, quando estava escuro, era melhor dormir nu. Reese não tinha
objeções a essa ideia.
— Posso me juntar a você? — Morgan perguntou.
— Claro. — Respondeu Reese e pegou um garfo para Morgan.
Juntos, encontraram pratos e encheram-nos de melancia e frango
antes de se sentarem no balcão que dividia a cozinha da sala de estar.
— Você se lembra de alguém aqui? — Morgan perguntou antes de
colocar um pedaço de melancia em sua boca.
— Se eu pensar muito e tentar lembrar, não há nada lá. — Reese
tentou explicar. — Quando o vi pela primeira vez na praia, sabia que você
trabalhava com computadores e que gosta de brincar com dispositivos
eletrônicos. Não sabia seu nome até você me contar. Uma vez que disse
Morgan, o nome se encaixou como se fosse seu. Não sei mais como explicar
isso. Quer dizer, sei que é seu, mas é como se você não pudesse ter outro
nome.
Morgan olhou fixamente para Reese.
— Você sabe mais alguma coisa sobre mim? Talvez tenha impressões
de coisas, como coisas que fizemos juntos?
Reese tentou pensar, mas se distraiu com Morgan rasgando sua
carne de frango em pedacinhos.
— Nós fizemos coisas juntos? — Ele perguntou.
Morgan se levantou, fazendo a cadeira guinchar sobre o piso.
— Claro que não. — Ele negou. — Quero dizer, hum, bem, fomos em
resgates juntos, conversamos e coisas assim. — Morgan pegou seu prato e
colocou-o ao lado da pia. — Foi ótimo conversar com você. Eu tenho que ir.
Reese observou o homem desaparecer ao virar da esquina que dava
para os quartos. Pensou que talvez ele e Morgan tivessem feito muito mais do
que falar e coisas assim. Não importa. Ele tinha Lee.
Com movimentos rápidos e eficientes, limpou os pratos dele e o de
Morgan e os carregou, junto com os talheres, para a lava-louças. Ele queria
ficar nu e se aconchegar com Lee.
*****
Roman olhou para os papéis que os médicos lhe haviam enviado por
fax, depois para o monitor do computador, onde os dois médicos falavam
sobre os resultados dos testes de Reese. Lee sentou ao lado dele, agarrando-
se a cada palavra dos médicos. Reese não tinha interesse e ficou olhando pela
janela.
O fato de Reese não ter tumores ou coágulos sanguíneos agradou a
Roman. Seu interior tinha se contorcido quando os médicos relataram que ele
tinha lesões cerebrais, bem como convulsões leves causadas por uma lesão
cerebral traumática. Em algum momento durante o acidente inicial, Reese
sofreu um derrame que afetou seu discurso e o lado esquerdo.
Eles agora estavam explicando suas conclusões, a maioria das quais
Roman já havia deduzido. Perda de memória, problemas de percepção com o
tempo e números, incapacidade de reconhecer letras. Sim, aqueles eram
óbvios.
A descoberta que surpreendeu Roman, mas não deveria, foi o
diagnóstico de desassociação com as pessoas. Roman concordava e discordava
disso.
Reese tinha um relacionamento profundo e íntimo com Lee. Ele tinha
ouvido falar das interações de Reese com adolescentes sem-teto na praia e
seu desejo de ajudá-los.
Por outro lado, Reese não fez nenhum esforço para interagir com a
equipe ou com qualquer outra pessoa na casa.
Quando os médicos pararam, Roman perguntou:
— Quais são as suas recomendações?
Cinco minutos depois, Roman tinha duas canetas quebradas ao lado
de sua mão.
— Você deve estar brincando comigo. — Ele exclamou. — Nós
colocamos Reese em toda essa ladainha e agora decide que devemos sentar e
esperar para ver?
— Sentimos que, neste momento, seria o melhor curso de ação. —
Afirmou um dos médicos.
O temperamento de Roman subiu. Ele esperou que os médicos
terminassem a conversa e desligou o monitor o mais rápido possível.
Levantou-se, foi até o armário e pegou três copos e uma garrafa de uísque.
Ele carregou os copos entre os dedos de uma mão e a garrafa com a
outra e voltou para a mesa.
Depois de derramar o líquido em cada copo, se sentou em sua
cadeira e apreciou a queimadura. Os outros dois homens estavam tomando
suas bebidas, e Reese tinha se movido até que estava quase sentado no colo
de Lee.
— Alguma ideia? — Roman perguntou.
Reese falou primeiro.
— Eles disseram que nenhuma cirurgia ou drogas trarão de volta a
minha memória. As convulsões me impedem de dirigir um carro ou qualquer
outro equipamento grande. Não sou mais a pessoa que morava nesta casa e
todos sabemos que não posso mais realizar meu trabalho com o Resgate
Contratado do Oeste.
— É verdade que você não poderia sair em resgate, mas isso não
significa que não podemos encontrar outra coisa por aqui para você fazer. —
Roman ofereceu. — Você tem uma casa em Los Héroes.
— Obrigado. — Reese piscou um par de vezes e parecia querer dizer
alguma coisa. Em vez disso, ele olhou pela janela antes de olhar para Lee.
— Fico feliz que não haja nenhum inchaço cerebral ou qualquer outro
problema físico que precise de tratamento. — Disse Lee. — Quanto aos
problemas de tempo e perda de memória, se os médicos decidirem que em
algum momento Reese deveria fazer terapia, tudo bem. Enquanto Reese
estiver seguro e feliz, estou feliz.
Lee entrelaçou os dedos nos de Reese. O largo sorriso e amor
aquecendo os olhos de Reese quando ele olhou para Lee selou uma conclusão
que Roman tinha grande problema em engolir.
Lee tinha uma vida em San Clemente, e a casa que Reese estava
desesperado para encontrar em seu coração antes do acidente, agora
descansava com Lee.
Reese seria a primeira perda de Roman com um de sua equipe. O
fato fez seu coração doer. Roman esperava convencer Lee e Reese a ficarem
um pouco mais por causa da equipe. Os homens precisariam de algum tempo
para chegar à mesma conclusão que Roman acabara de ter.
Capítulo 9
Reese vagou pela fazenda, inquieto. Ele havia deixado Lee no quarto
conversando com Vinnie ao telefone e se perguntou se deveria ir aos estábulos
e brincar com Sunny, o cavalo que se lembrava dele, mas que ele não
reconhecia. Havia aprendido que cada membro da equipe tinha pelo menos um
cavalo que eles usavam para resgatar. Reese suspirou. Sunny era boa o
suficiente, mas ele não tinha certeza se um cavalo caberia na casa de Lee.
Pensando que talvez Garrett tivesse algum bolo de chocolate ou
biscoitos na cozinha, ele se dirigiu para aquele lado.
Na cozinha, abriu a porta da geladeira e encontrou um prato
contendo pedaços do pegajoso bolo de chocolate. Hum.
— Oi.
Reese se virou com o prato nas mãos.
— Oi.
Ele viu Kevin sentado junto ao balcão comendo um sanduíche quando
entrou na cozinha, mas seu objetivo de bolo estava tão próximo que ignorou o
menino.
Kevin era uma vítima que a equipe havia recuperado durante um
resgate para ajudar os parceiros de Parker, os encanadores. Pelo que os
detetives descobriram em suas conversas com Kevin, ele havia sido
sequestrado de seu quintal e levado para um motel onde havia outros
meninos. A polícia concluiu que Kevin fazia parte de uma rede de tráfico sexual
infantil e foi vendido a um pedófilo do passado de Parker. Reese achou toda a
situação doentia ainda mais perturbadora quando soube que o pedófilo exigia
que Kevin o chamasse de papai.
Morgan tinha uma queda por Kevin e odiava que o menino fosse
colocado num orfanato enquanto as autoridades procuravam por sua mãe.
Morgan não só estava usando suas habilidades de computação maluca para
ajudar na busca, tinha entrado no programa de assistência social para trazer
Kevin de volta ao Resgate Contratado do Oeste para visitas. Parker disse a
Reese que Morgan gostaria de ser o pai adotivo de Kevin, e se sua mãe não
fosse encontrada, teria a oportunidade de adotá-lo.
— Garrett foi ao pátio para pegar um tomate para uma salada que
está fazendo. — Disse Kevin. — Eu devo terminar meu sanduíche até ele
voltar. Tenho quatro anos e posso ficar sozinho por alguns minutos.
Reese colocou o prato de bolo no balcão. Ele podia sentir o cheiro da
manteiga de amendoim no sanduíche de Kevin. Talvez ele devesse fazer um
desses para si mesmo.
— Você não fala muito, não é? — Kevin colocou o resto do sanduíche
na boca.
— Desde que machuquei minha cabeça, não entendo muitas coisas
que as pessoas dizem, então não sei o que dizer de volta. — Respondeu Reese.
— Sua cabeça dói? Às vezes eu tenho dores de cabeça. Quando não
entendo alguma coisa, devo fazer perguntas. — Continuou Kevin.
— E você faz muitas perguntas. — Comentou Garrett enquanto
entrava na cozinha. — Depois que eu cortar esse tomate, vou levá-lo para
fora, para Morgan.
— Os caras estão experimentando o novo curso. — Disse Kevin a
Reese.
— Pista de obstáculos. — Garrett corrigiu.
— Pista de obstáculos. — Repetiu Kevin.
— Eu posso levar você até lá. — Ofereceu Reese. Ele queria ver o que
os caras haviam construído. Parecia divertido.
Kevin deslizou do banquinho e saiu da cozinha.
— Ok, vamos lá.
Reese piscou, surpreso com o quão rápido o garoto podia se mover.
O carinha estava quase na porta da frente.
— É melhor se apressar se quiser continuar com isso. —Aconselhou
Garrett.
Abandonando seu bolo, Reese o seguiu.
A pista de obstáculos acabou por ser bastante grande. A equipe havia
escolhido construí-la ao lado do muro de concreto que separava a fazenda do
hangar de avião e dos galpões de máquinas.
Uma vez que o pequeno Kevin tinha pulado para Morgan e o grande
homem tinha varrido a criança rindo em seus braços, Reese estudou a pista.
Começava com postes embutidos no chão, com peças de madeira
redondas e planas presas ao topo. Uma vez que uma pessoa conseguia pular
de polo a polo, ele tinha que segurar uma alça e deslizar por uma longa
tirolesa. No final da tirolesa, tinha que soltar a alça e deixar seu impulso levá-
lo a uma barra a alguma distância e agarrar-se a ela.
A essa altura, essa pessoa estava mais no alto do que o topo da
cabeça de Reese.
Em seguida, a pessoa tinha que balançar seu corpo para frente e para
trás, até soltar e poder pegar grandes fixadores do tamanho de bolas de tênis
embutidos em uma longa tábua. Então tinha que atravessar a tábua agarrando
mais fixadores. Após essa jornada, a pessoa pulava uma curta distância até
um tubo horizontal fino e tentava atravessá-lo. Então pulava, agarrando-se a
um grande aro e oscilava de aro para aro.
Reese sacudiu a cabeça, pensando em quão cansados os braços de
uma pessoa deveriam estar depois disso.
Após os aros, a pessoa tinha que cair num mini trampolim e pular
alto e longe o suficiente para pegar uma rede de segurança. Seu último desafio
era subir pela rede até uma plataforma. Uma bandeira presa ao poste da
plataforma acenava na brisa. A pessoa completava o percurso uma vez que
puxasse a bandeira do poste.
— É muito legal. — Exclamou Parker. — Vamos adicionar mais
balança e escalar obstáculos em seguida. Também queremos instalar algum
tipo de recurso de segurança com água sob os obstáculos em vez dos
acolchoados grossos que temos agora. Menos oportunidade para ferimentos.
Reese observou um dos rastreadores, Santos, atravessar o percurso.
Os grandes músculos do brasileiro se arqueavam com o esforço de segurar o
peso fora do chão usando apenas a parte superior do corpo. No meio da tábua
com fixadores ele caiu nos acolchoados.
Todo mundo riu e bateu palmas quando Santos levantou o braço e
deu-lhes o sinal de que estava bem.
Reese olhou em volta e viu que toda a equipe e seus parceiros
estavam reunidos. Eles apontavam, riam e aplaudiam Jimmy, que tentava sua
habilidade contra os obstáculos.
Um vazio se estabeleceu no estômago de Reese. Ele não pertencia a
essas pessoas. A areia, o oceano e seu amado sol da praia o chamavam.
Queria o amor de Lee e a segurança dos seus braços. Este lugar e as pessoas
eram agradáveis, mas não mais para ele.
— Quero tentar.
— Eu não sei. — Disse Rhys ao marido, Joe. — Sua prótese não tem
tido o melhor ajuste ultimamente.
Parker explicou a Reese que Joe perdera uma perna durante seu
serviço nas forças armadas.
— Se eu cair, os acolchoados vão me pegar. — Respondeu Joe.
Rhys deu um beijo nos lábios de Joe.
— O meu caubói vai mostrar suas habilidades?
Joe riu.
— Querido, pensei que fiz isso mais cedo nesta manhã.
Rhys beijou Joe mais uma vez.
— Apenas tenha cuidado.
O caubói tirou o chapéu e colocou-o na cabeça de Rhys antes de
caminhar até o ponto inicial do percurso. Depois de se sentar no chão, ele tirou
uma bota, mas deixou a outra no membro artificial. Também tirou a camiseta
para as vaias da multidão e revelou peitorais musculosos, um tanquinho de
seis e grandes músculos nos braços. Reese podia apreciar a vista do caubói.
— Vai, Joe, vai! — Tristen aplaudiu. Jimmy e Tolliver, marido de
Garrett, juntaram-se a ele.
Joe fez bem sobre a parte dos polos do percurso e fez a tirolesa
parecer simples. Ele pegou a barra e estendeu a mão para os grandes aros.
Músculos esticados e suor brilhavam quando Joe seguiu de fixador para
fixador.
Nos últimos, Joe olhou para o tubo fino que era seu próximo desafio.
Pulando, ele tentou centrar os pés para uma aterrissagem sólida no tubo, mas
sua bota de caubói escorregou.
Reese saiu correndo, sabendo que nada de bom sairia do homem
perdendo o equilíbrio.
Quando Joe caiu, ele colocou o braço para fora e tentou agarrar no
tubo. Sua mão errou e seu braço atingiu o pedaço de metal com força. Reese
ouviu o estalo agudo de ossos se quebrando.
Quando Joe pousou nas almofadas, Reese ouviu outro estalo alto.
Sem hesitar, ele pulou nos acolchoados e passou as mãos habilmente
sobre o corpo e os membros do homem que estava gemendo.
— Diga-me o que dói. — Ele ordenou.
— Meu braço e ombro. — Joe falou. — Merda, acho que desloquei
meu ombro.
Reese concordou com a suposição de Joe a respeito de seu ombro,
mas o osso saindo de seu antebraço tornou a realocação do ombro mais
complicada e dolorosa.
Depois de tirar a camiseta, amarrou um torniquete acima da ferida
que sangrava. Ele esperaria para pressionar a ferida até que tivesse curativos
estéreis.
— O que você precisa de mim? — Parker perguntou.
— Um veículo para levá-lo ao hospital, um kit de primeiros socorros e
você para segurá-lo, para que eu possa juntar o ombro. — Ele respondeu.
Sem uma palavra, Parker colocou os braços ao redor do peito e do
ombro bom de Joe. Reese se preparou para a alavancagem de que precisava.
— Expire, Joe, agora. — Ele ordenou.
Não dando ao homem tempo para pensar, ele agarrou o braço acima
da fratura, puxou e torceu. Um pop alto foi a sua recompensa.
Joe flexionou o ombro.
— Droga, isso parece melhor.
Uma picape branca com Resgate Contratado do Oeste, pintado do
lado da porta da frente, parou ao lado da pista. Rhys saltou do lado do
motorista e correu pela frente do veículo.
— Coloquei seu estojo médico na traseira. — Ele gritou.
Roman tirou o estojo da carroceria e colocou ao lado de Reese.
— Termine e vamos levá-lo para a cidade.
Reese retirou os suprimentos que precisava e embrulhou o braço de
Joe.
— Olhe para isso. — Jimmy exclamou. — Ele ainda é um de nós.
Silêncio cumprimentou a declaração de Jimmy.
Reese olhou em volta e viu a verdade nos rostos desconfortáveis que
o cercavam. Apesar do anúncio esperançoso de Jimmy, Reese não pertencia a
este lugar, e todos sabiam disso.
Ele olhou para a fazenda.
Um homem de boa vontade e amor que vendia cachorros-quentes
para ganhar a vida andava na direção dele.
O homem que era sua casa.
Epílogo
FIM