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Resumo
A Ortodontia contemporânea tem aumentado, substancialmente, a utilização de fios
superelásticos durante o alinhamento e nivelamento dentário e a sua permanência tem
alcançado estágios avançados do tratamento, com a premissa de trabalhar, o máximo pos-
sível, com forças de baixa intensidade. Essa mudança de protocolo tem desafiado os orto-
dontistas a criar mecanismos de controle de movimentação dentária e de efeitos colaterais
indesejados, que comumente são atribuídos a esses fios, em razão da sua alta flexibilidade
e baixa resistência à expressão dos momentos da força, gerados, por exemplo, por aces-
sórios como os elásticos intermaxilares. O objetivo desse trabalho é descrever, ilustrando
com casos clínicos, a viabilidade e aplicabilidade desses acessórios na correção das relações
anteroposteriores ainda em estágios iniciais do tratamento, com fios superelásticos, com ou
sem propriedade de transformação térmica.
Descritores: Ortodontia, elásticos intermaxilares, fios superelásticos.
Abstract
Contemporary orthodontics has considerably increased the use of superelastic wires
during teeth alignment and leveling and their permanence has reached advanced stages of
treatment with the premise of working as much as possible with low levels of force. This
protocol change has been challenging orthodontists to create mechanisms to control tooth
movement and unwanted side effects that are commonly attributed to these wires, due to
their great flexibility and their low resistance to the expression of moments of force gener-
ated, for example, by accessories like intermaxillary elastics. The objective of this article is
to describe, using clinical cases to illustrate, the viability and applicability of intermaxillary
elastics in anteroposterior relationships correction during early stages of treatment with
superelastic wires with or without heat activating properties.
Descriptors: Orthodontics, intermaxillary elastics, superelastic wires.
1
Mestre e Doutora em Ortodontia – FOB/USP.
De acordo com Cabrera et al.4, a força indicada para correções intermaxilares deve variar entre
200 e 250g e se deve empregar o fio mais rígido possível para evitar efeitos indesejados. Isso por-
que, por ter apoio nos arcos superior e inferior, o elástico fica disposto de forma oblíqua, gerando
um componente de força horizontal, que gera a correção anteroposterior e um vertical, de extrusão
anterior superior e posterior inferior, no caso do elástico de Classe II e anterior inferior e posterior
superior no caso de elástico de Classe III.
Além do componente vertical, há também a tendência de mudança de angulação e rotação
nos dentes onde o elástico se apoia. Por esse motivo, é interessante que o elástico posterior seja
apoiado sempre no penúltimo dente colado, para que haja um dente distal que possa exercer resis-
tência de rotação mesial e ainda permitir que o dente que receba o elástico possa ser conjugado a
esse dente posterior, restringindo ainda mais o efeito rotacional.
Para ser utilizado com fios flexíveis, o principal componente de diferenciação é a intensidade de
força. Com o montante indicado de 200 a 250 g, realmente a utilização de fios leves fica contrain-
dicada, já que a força exercida por esses fios é bem inferior, o que pode acarretar movimentações
dentárias sem nenhuma resistência aos momentos de inclinação e rotação, gerando falta de con-
trole do trespasse vertical e do plano oclusal. A indicação de fios de aço fundamenta-se no conceito
de criar resistência advinda do fio, para evitar que ao receber o vetor horizontal da força elástica,
o dente não expresse o momento inevitavelmente gerado, de inclinação mesio-distal e rotação em
torno do próprio longo eixo. Dado esse conceito, parte-se da premissa de que quem evita o efeito
colateral é a rigidez do fio. Ou seja, a força do elástico não ultrapassa a força do fio. Assim sendo,
ao empregar-se elásticos em fios de níquel-titânio é necessário adequar a força do elástico de for-
ma que a mesma seja inferior à força do fio. Para isso, tem que se conhecer a força desses fios, no
calibre selecionado para uso do elástico. Se for reduzida a força, segundo a relação momento/força
(M=FxD), automaticamente, o momento também estará, por si só, reduzido. Além disso, ao exercer
uma força inferior ao fio, quando o mesmo começar a ser tensionado pelo movimento de inclina-
ção, oferecerá resistência que tenderá a impedir que o momento se expresse de forma significativa
ou ainda, corrigi-lo pela ação da sua superelasticidade.
Como exemplo, cita-se o trabalho de Baccetti et al (2009)3 que avaliaram as forças produzidas
por fios de calibre .012” e .014” superelásticos, deflexionados de 1,5 mm a 6,0 mm em quatro
tipos de braquetes autoligados. A força média do calibre .014”, com 6,0 mm de deflexão nesses
braquetes foi de aproximadamente 100 g. Desta feita, o elástico a ser empregado nesse momento
Maltagliati LA.
não pode ter força superior a 100 g. Consultando a Tabela 2, sabe-se que o elástico deve ser do
tipo leve (menor que 100 g) e o diâmetro dependerá da distância dos pontos de apoio do elástico,
ou seja, do quanto o elástico deverá ser estendido. Se os pontos de apoio forem os ganchos do
Caso clínico 1
Paciente do sexo masculino, 14 anos de idade, padrão II por deficiência mandibular, mesofa-
cial, má oclusão de Classe II, suave apinhamento superior e inferior, primeiros molares superiores
em mordida cruzada. Trespasse vertical normal e horizontal aumentado. Foram utilizados braque-
tes autoligados Portia (3M), prescrição Roth e se realizou levantamento de mordida posterior, para
possibilitar o descruzamento dos primeiros molares. O primeiro fio empregado foi o .014” níquel-
titânio termoativado (3M Unitek) e o elástico foi introduzido na segunda consulta, quando da cola-
gem do aparelho inferior. O elástico aplicado foi o 5/16” leve, dos caninos superiores aos primeiros
molares inferiores. Seguiu-se então a sequência de fios de níquel-titânio .016” e .016”x.022”
termoativados e .018”x.025” superelástico. Em seguida, foi inserido o fio de aço .019”x.025” e
os elásticos indicados para uso apenas noturno. Seguiu-se a coordenação interarcos e, após três
meses com o fio de aço, o aparelho foi removido (Figuras 1-19).
Relato de caso | Case report
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Figura 5 – Foto intrabucal lateral direita inicial. Figura 6 – Foto intrabucal lateral esquerda inicial.
Figura 9 – Foto intrabucal frontal fio .016” niquel titanio termoativado e levante de mordida posterior.
Figura 10 – Foto intrabucal lateral direita fio .016” niquel Figura 11 – Foto intrabucal lateral esquerda fio .016” niquel
Relato de caso | Case report
titanio termoativado e levante de mordida posterior. titanio termoativado e levante de mordida posterior.
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Figura 16 – Foto intrabucal lateral direita final. Figura 17 – Foto intrabucal lateral esquerda final.
A presença do componente vertical fez com que Philippe9 contraindicasse o uso dos elásticos
intermaxilares na correção das más oclusões de Classe II para casos com mordida profunda ou
para pacientes face curta. Isso porque, em pacientes com sobremordida e má oclusão de Classe II,
o componente vertical do elástico tenderá a provocar extrusão dos incisivos superiores, especial-
mente, quando empregado ainda em fios leves. Para contornar esse efeito, além do uso de elástico
leve, indica-se a utilização de “bite turbos” na palatina dos incisivos superiores, evitando a extrusão
desses dentes e favorecendo a dos pré-molares e molares (Caso 2). Nesses casos, inicia-se o trata-
mento pelo arco superior, evoluindo o fio até o calibre .016”x.022” de níquel-titânio termoativado,
posicionam-se os stops nas distais dos incisivos laterais superiores e se instala os “bite turbos” na
superfície palatina dos incisivos centrais superiores. O arco inferior é montado quando o superior
estiver no .016” niti termoativado e assim, o elástico é instalado com o fio .016”x.022” superior e
.016” niti termoativado inferior, exercendo maior efeito extrusivo posterior inferior, já que haverá
desoclusão pelo “bite turbo” e o fio inferior é de menor calibre, colaborando para a correção da
Classe II e da sobremordida, ao mesmo tempo que impede a extrusão dos incisivos superiores.
Caso clínico 2
Paciente 13 anos, sexo feminio, padrão II, mesofacial, má oclusão de Classe II, sobremordida
profunda, dentadura mista, elemento 35 girado. Foram utilizados braquetes autoligados Bio Quick
(Forestadent), prescrição Roth. O alinhamento foi iniciado com fio .014” níquel-titânio termoativa-
do. Os “bite turbos” e os elásticos intermaxilares 5/16” leve foram inseridos, quando foi instalado
o fio .014”x.025” superior e .018” inferior, ambos de níquel-titânio termoativado. O alinhamento
seguiu com fio .016”x.022” níquel-titânio termoativado, depois .019”x.025” superior e .018”
inferior, ambos de aço e o elástico trocado para 3/16” médio, apenas noturno. Na finalização,
os elásticos foram modificados para configuração de intercuspidação e o aparelho removido três
meses depois (Figuras 20-50).
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Figura 24 – Foto intrabucal lateral direita inicial. Figura 25 – Foto intrabucal lateral esquerda inicial.
Figura 33 – Foto intrabucal oclusal superior fio .016”x.022” Figura 34 – Foto intrabucal oclusal inferior fio .016”x.022”
niquel titanio termoativado e levante de mordida anterior niquel titanio termoativado.
com “bite turbo”.
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Figura 35 – Foto extrabucal perfil final. Figura 36 – Foto extrabucal frontal fi- Figura 37 – Foto extrabucal sorriso fi-
nal. nal.
Figura 39 – Foto intrabucal lateral direita final. Figura 40 – Foto intrabucal lateral esquerda final.
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Figura 41 – Foto intrabucal oclusal superior final. Figura 42 – Foto intrabucal oclusal inferior final.
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Nos pacientes Classe III, também se deve iniciar o alinhamento pelo arco superior para que a
maior movimentação de compensação seja no arco inferior e, na maior parte das vezes, não há
necessidade de levantamento de mordida. Nesse caso, os stops estarão posicionados nas distais
dos caninos inferiores e, se houver apinhamento inicial desses dentes, recomenda-se deixar um dos
incisivos (o mais fora do alinhamento) para ser incluído depois que o elástico já corrigiu pelo menos
parcialmente a Classe III. No caso de cruzamento de mordida anterior, o levante é feito com “build
up” posterior, que facilita a extrusão dos incisivos inferiores. Caso esse efeito não seja desejado,
aconselha-se posicionar os braquetes desses dentes um pouco mais oclusal (cerca de 1 mm) para
reverter o efeito na finalização do alinhamento. Quando o paciente tem boa colaboração com o
uso dos elásticos em fios leves, é comum observar-se sobrecorreção (Figuras 51-55).
Figura 51 – Foto intrabucal lateral direita, início de tratamen- Figura 52 – Foto intrabucal lateral direita, fio .016” niquel
to, relação intermaxilar de classe III. titanio termoativado, quando iniciou o uso de elástico inter-
maxilar de classe III 5/16” leve.
Relato de caso | Case report
Figura 53 – Foto intrabucal lateral direita, fio .019”x.025” Figura 54 – Foto intrabucal lateral direita, fio .019”x.025”
aço superior e .016”x.025” niquel titanio termoativado in- aço superior e .016”x.025” niquel titanio termoativado infe-
ferior. Denota-se a sobrecorreção obtida da má oclusão de rior e elástico de intercuspidação curtos, 1/8” leve.
classe III.
Conclusão
A utilização de elásticos intermaxilares em fases iniciais do tratamento ortodôntico, com fios de
níquel-titânio, com ou sem capacidade de transformação térmica, é viável à medida que se ajusta a
intensidade de força a ser empregada, modificando diâmetro e espessura do elástico.
O emprego de acessórios e a sistematização do tratamento ajudam a sobrepor efeitos colate-
rais dos componentes verticais da força dos elásticos intermaxilares.
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