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A revolta contra a beleza

Não raro vemos diversos críticos à arte, arquitetura e música modernas. Dentre os mais famosos, tenho
um apreço gigantesco por Sir Roger Scruton, autor de "Beleza" e do documentário "Why Beauty Matters"
(Porquê a beleza importa), que tentou, nessas obras, destacar tanto sua admiração quanto repulsa ao
moderno - seja na arte ou na arquitetura. Scruton defende, de maneira precisa, a ideia de que a beleza,
como ele diz: "foi tirada do povo e vendida de volta sob o conceito do luxo". Se analisarmos de maneira
cautelosa, foi realmente o que aconteceu. Para expôr uma situação do Brasil: imigrantes alemães no sul
do país construíram casas (em todos os casos mais ornamentadas e bem desenvolvidas) em algumas
cidades que hoje são mais caras que os apartamentos em centros urbanos. A arquitetura de hoje sofre
severamente com a influência de seus maiores nomes, como Walter Gropius, Mies van der Rohe e Le
Corbusier. No Brasil, Oscar Niemeyer, que também atuou com Le Corbusier, foi uma grande influência
do movimento.

Em todo lugar que se inicia a influência desse tipo de arquitetura, toda construção menor do estilo
anterior morre. Os únicos sobreviventes foram as igrejas, em sua maioria de origem católica ou ortodoxa.
A arquitetura têm mostrado uma leve resistência ao processo de degradação modernista, devido ao seu
alto custo de propagação. Porém, a arte, como pinturas e músicas, foi completamente impregnada, ao
passo de que hoje tornou-se raro encontrar pinturas realistas (ou qualquer outra que não tenha como
objetivo o eroticismo ou a feiura).

O ataque é diretamente à beleza, e ao valor que a beleza traz ao mundo. De acordo com os arquitetos
supracitados, a arquitetura devia ser solta de qualquer conceito histórico e qualquer evolução histórica
sobre beleza e arte. Adotaram uma percepção de "a função precede a forma". Tal pensamento gerou
inicialmente um ramo da arquitetura, onde a quantidade de ornamentos era mínima ou nula, e a ideia de
beleza na arquitetura foi toda apagada. Os prédios tomaram uma aparência mais compacta, bruta e seca.
Se fosse possível definir apenas uma maneira de reconhecer todos os períodos anteriores de arquitetura e
a arquitetura moderna seria: há ornamentos ou seções puramente voltados à estética? Caso a resposta seja
não, é evidente que se trata de uma construção moderna. (Trato aqui do Moderno, com M maiúsculo,
sendo o estilo da arquitetura, e não seu período de construção).

Infelizmente, devido ao curto período de história das Américas, nossa arquitetura se desenvolveu de
maneira rasteira, encontrando-se majoritariamente onde eram grandes centros urbanos. Cidades como
Ouro Preto, Fortaleza, Salvador, Recife, Rio de Janeiro foram grandes polos no Brasil onde houve muito
da arquitetura característica do país. Porém, devido ao nosso tempo de desenvolvimento relativamente
curto, não tornamos essa parte de nossa cultura apropriadamente abrangente. Dessa maneira, o processo
de substituição da nossa identidade arquitetônica foi facilitado. Apesar da subversão ter ocorrido também
na França e em outros países da Europa, a convivência com tais obras criou, na grande maioria da
população, um carinho pela beleza que a arquitetura europeia emana. Nossa convivência era rara e
restrita, que causou também uma restrição na nossa capacidade de perceber o belo e feio nas nossas
construções. Tanto que, uma das visões mais chocantes que há em toda a extensão das 3 Américas é
inversão dos valores de beleza. Antes dessa "revolução" proporcionada pelos arquitetos citados
anteriormente, os padrões seguiam o mais alto nível de beleza: algo bem ornamentado e que em muitos
casos se assemelhava à uma igreja. Nos dias de hoje, vemos que igrejas são feitas como construções
quaisquer. Antes, a igreja servia de inspiração, hoje inspiramos a igreja em outras construções. De longe,
e de maneira decisiva, essa é a consequência mais notória da "revolução" arquitetônica que o Ocidente
vêm sofrendo.

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