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Resumo
Em suas análises sobre a modernidade e, em especial sobre a obra poética
de Baudelaire, Walter Benjamin aproxima paixão e política.
DATAS
1492, 1792, 1822, 1922.
Datas são pontos de luz sem os quais a densidade acumulada dos eventos
pelos séculos dos séculos causaria um tal negrume que seria impossível
sequer vislumbrar no opaco dos tempos os vultos das personagens e as
órbitas desenhadas pelas suas ações. A memória carece de nomes e de
números. A memória carece de numes.
A QUESTÃO DO SENTIDO
Um dos significados mais antigos da palavra número, em latim numerus, é
precisamente este: parte de um todo, elemento de uma série ordenada.
Essa visão sintática do tempo dá suporte a duas opostas filosofias: uma, que
é cumulativa e finalista; a outra, que é pontual e, com licença do
neologismo, contingencial. Em ambas está presente o modelo do tempo
como serialidade, sucessão, cadeia de antes-e-depois. Mas a questão do
sentido separa as águas. E é a questão do sentido do tempo que preside as
teorias da História.
***
Essas visões do tempo são o sangue mesmo que circula há séculos pelas
veias de nossas crenças judeu-cristãs, progressistas, evolucionistas,
marxistas ou não.
Convém lembrar que esse cânon está enxertado em certezas maiores que
remetem à ideia de progresso, vinda das Luzes, e à ideia de evolução
formulada no século XIX. Progresso e evolução: conceitos forjados embora
por linhas filosóficas distintas, acabaram convergindo, como o fizeram o
positivismo, com a sua lei dos três estados, o darwinismo e o spencerismo.
Lorenz resume a sua teoria pela negação do nexo determinista entre tempo
e causalidade:
GUTIERREZ Bela de verdade: e creio que, se vista da terra, seria mais bela.
GUTIERREZ Com que então tu, na verdade, arriscastes a tua vida e a dos
teus companheiros sobre o fundamento de uma simples opinião
especulativa.
Em palavras simples, pode-se dizer que para Leopardi o tempo de cada ser
humano é inteiramente gasto em procurar a satisfação de desejos e em
construir representações o mais das vezes falazes, subtraindo-se, o quanto
possível, às sensações dolorosas e às chamadas verdades duras e amargas.
Bom é o que eu quero, verdadeiro o que represento em meu espírito.
Vontade e representação que podem bem ser, no nível de uma psicologia
atomizada e sensualista, capricho e auto-ilusão. E no intervalo entre prazer
e dor, o sujeito se arrasta no tédio, poeira que enche as horas neutras de
saciedade ou alívio. Mas o tédio prolongado também é letal, daí a
necessidade da ação, incerta embora e pontuada de riscos.
Lembro uma carta que Maquiavel escreve a seu amigo Francesco Vettori,
datada de 10 de dezembro de 1513; carta que o saudoso Italo Bettarello
nos lia, a nós estudantes de Literatura Italiana e seus alunos no fim dos anos
50. Nela o secretário florentino, exilado da pátria e confinado em um
vilarejo rústico perto de Sancasciano, narra como passava o seu mísero dia.
Quando cai a noite, volto para casa e entro no meu pequeno estúdio; e no
limiar da porta me dispo daquela veste que usei durante o dia, cheia de
lama e pó, e envergo trajes reais e curiais; e revestido condignamente,
entro nas antigas cortes dos homens antigos, onde, recebido
amoravelmente por eles, me nutro daquele alimento que verdadeiramente
é meu, e para o qual eu nasci; então não me envergonho de falar com eles
e perguntar-lhes a razão das suas ações; e eles, por humanidade, me
respondem; e não sinto por quatro horas de tempo nenhum tédio, esqueço
toda aflição, não temo a pobreza, não me assombra a morte; todo inteiro
me transfiro neles.
E porque, diz Dante, não se faz ciência sem reter o que se entendeu, eu
anotei aquelas coisas de que ia fazendo cabedal durante a conversação, e
compus uma obrinha, De principatibus, onde me aprofundo quanto posso
nas cogitações dessa matéria, disputando o que é um principado, de que
espécie sejam os estados, como se adquirem, como se mantêm, porque se
perdem.