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Olhares circunstanciados...

http://dx.doi.org/10.1590/0102-445093806057590158

D E L T A

Olhares circunstanciados: etnografia da linguagem e


pesquisa em Linguística Aplicada no Brasil
Situated views: linguistic ethnography and research in
Applied Linguistics in Brazil

Pedro de Moraes GARCEZ (UFRGS/CNPq)


Lia SCHULZ (UFRGS, UNILASALLE)

RESUMO

Este artigo discute a etnografia como escolha teórico-metodológica para


a pesquisa em Linguística Aplicada no Brasil. Com base em descrição
narrativa e transcrição de episódio interacional flagrado em sala de
aula de escola pública, propomos que a análise de dados de práticas de
linguagem em articulação com trabalho de campo de natureza etnográfica
potencializa o entendimento adequado de ações situadas. Argumentamos
que a aproximação à perspectiva dos participantes sobre o que ocorre em
dado momento e cenário interacionais precisos, associada a uma mirada
estendida a outros momentos e cenários, evita conclusões precipitadas e
estabelece conexões com estruturas sociais menos facilmente observáveis
(por exemplo, um projeto político-pedagógico). Após qualificar o projeto
de pesquisa em tela, sustentamos por que o trabalho etnográfico, ainda
que oneroso, vale a pena, se criterioso e metodologicamente reflexivo. Por
fim, destacamos a valorização desse olhar circunstanciado na pesquisa
em esferas de atividade profissional cruciais para a cidadania.

Palavras-chave: etnografia; pesquisa qualitativa interpretativa;


Linguística Aplicada.

D.E.L.T.A., 31-especial, 2015 (1-34)


31 esp.
2015 Ana Carolina
Pedro Vilela-Ardenghi & Ana
de Moraes Garcez, Lia Raquel
Schulz Motta

ABSTRACT

This article discusses ethnography as a theoretical and methodological


choice for research in Applied Linguistics in Brazil. Based on narrative
description and transcripts of an interactional episode observed in a public
school classroom, we propose that the analysis of language practice data in
conjunction with ethnographic fieldwork strengthens proper understanding
of situated actions. We argue that privileging the participants’ perspectives
of what goes on at any given time and precise interactional settings, when
associated with additional observation of related moments and settings,
helps avoid hasty conclusions and establishes connections with less easily
observable social structures (e.g., a political-pedagogical project). After
describing the research project in which the episode was observed, we
argue why laborious ethnographic work is worthwhile if it is rigorous
and methodologically reflective. Finally, we highlight the value of this
comprehensive outlook for researching in spheres of professional activity
that are crucially important for civic life.

Key-words: ethnography; interpretive qualitative research; Applied


Linguistics.

Introdução

O objetivo deste artigo é refletir sobre a contribuição da etnografia


para a investigação da educação em linguagem no âmbito da Linguística
Aplicada e, assim, discutir como esse aporte metodológico contribui
para as bases epistemológicas da área. Também apresentamos nosso
entendimento de como o trabalho de campo pode iluminar esse fazer
investigativo, construindo conhecimentos acerca das ações humanas
realizadas por meio do uso da linguagem, no caso em tela, em cenários
escolares de periferia socioeconômica, e ajudando a pensar a educação
em perspectivas circunstanciadas no cotidiano escolar e aproximadas
às percepções que os participantes das atividades têm sobre o que
acontece ali.
Para tanto, apresentamos as pesquisas realizadas pelo Grupo de
Pesquisa ISE – Interação Social e Etnografia, que envolveram a estada
prolongada em campo para o estudo da fala-em-interação em uma es-
cola pública da rede municipal de Porto Alegre reconhecida há muito
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por seu projeto político pedagógico inclusivo e autoral (CENPEC 2003:


207-221). As nossas reflexões procuram demonstrar que a etnografia
foi fundamental para o nosso entendimento do cenário, das ações dos
participantes e dos objetos de pesquisa. Particularmente, nos permitiu
ver o que é e como se faz educação de qualidade em situação natural,
em tempo real, isto é, com as condições que há e nos dias que vivemos.
Assim, compartilhamos aqui o nosso depoimento de como aprendemos
a ver o que é convivência satisfatória na sala de aula contemporânea,
o que é ensinar crianças e adolescentes – educando(-se com) toda a
comunidade escolar –, o que é engajamento com propostas sempre
criticamente definidas e redefinidas, desde a configuração dos objetos
de estudo até a avaliação. Essas aprendizagens nos têm sido úteis
para, na interlocução pedagógica com outros agentes de educação em
linguagem (por exemplo, na formação inicial e continuada de profes-
sores), demonstrarmos conhecimento de causa, e assim não sermos
vistos apenas como “especialistas acadêmicos que expõem ideias sem
muita relevância ou conexão com a realidade educacional escolar em
que atuam os professores” (Garcez, 2013: 218), “os que viajam”, ou
“exigem que o professor faça um percurso acadêmico extenso, próximo
ao que foi empreendido pelo formador na sua atividade de pesquisa
universitária” (p. 219).

1. As perspectivas de ações concretas e situadas que só com


o trabalho de campo podemos compreender e mostrar

“Ô, sora, quando é que fica pronto aquele documentário que vocês
fizeram da gente?”
“Vai passar na TV?”
Nestes tempos em que os economistas ditam como deve ser “a
escola” (pública) (por exemplo, Pessôa, 2014), olhemos situadamente
uma escola pública de ensino fundamental, localizada na periferia de
uma capital brasileira, que desde os anos oitenta construiu um projeto
político-pedagógico (doravante PPP) em que todos os alunos podem
aprender. E todos quer dizer todos os que chegam, sem triagem. Todos
os que chegam – e que ali ficam. Nessa escola, PPP não é apenas um
documento, mas um conjunto de ações em diversas atividades políticas 3
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e pedagógicas realizadas por diferentes agentes em diferentes mo-


mentos, fazendo bom sentido educacional em encontros educacionais
satisfatórios para os participantes. É possível imaginar tal cenário?
Mais do que imaginar, é possível conhecê-lo, pois, por meio de
trabalho de campo de cunho etnográfico, registramos minuciosamente
partes da construção e da execução desse projeto. Estivemos lá, vive-
mos as cenas, acompanhando as pessoas de carne e osso fazendo o dia
a dia dessa escola que, muito antes de se falar em planos de metas, já
estabelecia e corria atrás de objetivos a cada ano escolar. O registro sis-
temático e minucioso da vida acontecendo nessa escola nos possibilitou
não apenas realizar trabalhos acadêmicos sobre a fala-em-interação de
sala de aula, a construção de participação, aprendizagem e do regime
de gênero em que isso se dá, mas nos permitiu também fazer parte do
chão da sala de aula vivida, do chão das palavras que construíram a
concretude das ações ali realizadas, da “caminhada”, como se referem
os protagonistas a esse trabalho (Persch, Pacheco & Monteiro 2006).
Em agosto de 2005, ao retornamos à escola para mais uma etapa de
pesquisa, encontramos já no portão da escola o menino que nos fez as
perguntas reproduzidas acima. Conhecemos Wilson1 em 2003, quando
iniciamos o trabalho de campo. Embora já houvesse contato com a
escola desde 2001, entramos como grupo a partir de 2003. Éramos três
pesquisadores naquele ano, Pedro, coordenador, Lia e Luciana, bolsistas
de iniciação científica2. O projeto tinha como objetivo compreender
como se construía na prática interacional o PPP da escola, mediante
análise de práticas e ações de construção conjunta de entendimentos
e de conhecimentos, com atenção particular a sequências canônicas
de sala de aula e possíveis alternativas (Garcez, 2006, 2012), reparo
e correção (Loder & Jung, 2008, 2009; Kanitz, 2010). Iniciamos a

1. Utilizamos pseudônimos para preservar a identidade dos participantes (ver Garcez,


Bulla e Loder 2014: 271).
2. A geração dos dados em 2003 foi realizada pelo grupo formado pelo investigador prin-
cipal, primeiro coautor deste artigo, e duas bolsistas do Programa de Iniciação Científica
PIBIC UFRGS/CNPq, a segunda coautora deste trabalho, e Luciana Etchebest da Concei-
ção. Posteriormente, uniram-se ao projeto e trabalharam com a segmentação, transcrição
e análise dos dados as bolsistas PIBIC UFRGS/CNPq, Paola Guimaraens Salimen, em
2004, e Paloma Silva de Melo, em 2005-2006, e finalmente o então doutorando Alexandre
do Nascimento Almeida, cuja tese (Almeida 2009) recebeu em 2010 o prêmio ANPOLL
4 de melhor tese em Linguística.
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negociação de entrada formal em janeiro de 2003. Em uma reunião


com a direção da escola, apresentamos o projeto de pesquisa, que foi
entregue aos educadores para que pudessem analisá-lo e decidir quanto
a nossa presença na escola. A partir da resposta afirmativa, iniciamos
o planejamento da observação de várias turmas. O primeiro período
de trabalho de campo intenso na escola aconteceu entre fevereiro e
dezembro de 2003.
Voltando às perguntas de Wilson que abriram esta seção, apresen-
tamos a seguir um exemplo de olhar circunstanciado em que o trabalho
de campo foi indispensável para o entendimento – tão aproximado à
perspectiva dos participantes quanto nos foi possível – do que estava
acontecendo em um momento registrado por câmeras. Foi uma das
primeiras aulas que gravamos depois de um longo período de obser-
vação prévio, registro de notas de campo e entrevistas informais. Os
dados gerados no trabalho etnográfico possibilitaram ampliar a nossa
análise para o evento, a seguir narrado e particularizado por meio de
trechos de fala-em-interação transcritos.
Era uma tarde quente de início da primavera de 2003, que se seguia
a uma manhã fria. Era um daqueles dias de setembro subtropical, que
começam a esquentar por volta do meio-dia e fazem a gente ir tirando
os agasalhos vestidos de manhã. Wilson, então um menino de nove
anos, era estudante da turma de primeiro ano de segundo ciclo. Em
ocasiões anteriores em que estivemos presentes, ele foi um dos alunos
que mais se surpreendeu ao entrar na sala de aula e ver os equipamentos
de gravação. Gostou da ideia das câmeras e pediu para que lhe mos-
trássemos como é que se operava aquele tipo de máquina. Wilson era
filho único de uma família que residia há tempo no bairro em que fica a
escola, um “morro” localizado na zona sul de Porto Alegre, considerado
por muitos como periferia, tanto geográfica quanto socioeconômica.
Anos mais tarde, em entrevista informal com a supervisora escolar3,
soubemos que ele vivia inicialmente com a mãe e dois tios, mas que
esses haviam sido presos e estavam na Penitenciária Estadual por en-
volvimento com o tráfico de drogas. Wilson estudava na escola desde
a educação infantil e há muito não via os tios, que, no entanto, men-
cionava seguidamente, assim como o fato de estarem presos. Naquele

3. Entrevista realizada por Lia Schulz em 15 de agosto de 2005. 5


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dia, ele entrou correndo na sala de aula e sentou-se bem na frente da


mesa da professora juntamente com Daniel, colega e amigo. Agitados
pela correria no pátio antes do início da tarde letiva, a turma recém
adentrara a sala de aula do prédio antigo da escola, remanescente da
construção de madeira dos anos 1960.
Lívia, a professora, trabalhava há anos na escola. Naquele dia,
pediu silêncio para iniciar a aula e lembrou aos alunos a razão da nossa
presença ali, que, para ela, tinha a ver com a gravação da fala dos alunos,
e não deveria atrapalhar o andamento da atividade proposta para o dia.
A turma estava trabalhando a temática ambiental do tratamento do lixo.4
A atividade do dia envolvia leitura de uma história em quadrinhos que
tratava de reciclagem do lixo, brochura distribuída pelo Departamento
Municipal de Limpeza Urbana da Prefeitura.
Lívia começou então a explicar a dinâmica para formação de gru-
pos para a atividade de leitura, discussão e compreensão do texto. Os
alunos seriam distribuídos de acordo com um número que receberiam
dela, contando de um a cinco. Todos os que ficassem com o número
um formariam um grupo, os que ficassem com o número dois, outro, e
assim por diante. Wilson e Daniel ficaram em grupos diferentes e, por
isso, permaneciam onde estavam. Diante da chamada da professora
para que fossem para os grupos, Daniel resistiu, mas cedeu, enquanto
Wilson seguiu se recusando a ir para um grupo. A seguir apresentamos
a transcrição5 do segmento interacional, para depois discutirmos em
detalhe as ações dos participantes envolvidos.
1/00:05:21/EXCERTO I (transcrição simplificada)

01 Lívia: vocês vão ficar sem trabalhar os dois,


02 (.)
03 Daniel: ah sora ( )
04 Lívia: vocês vão- eu tô perguntando
05 (.)
06 Lívia: trabalho em grupo (.) ou vocês se colocam em um grupo
07 ou ficam sem trabalhar ficando sem trabalhar é fora
08 da sa[la na na na na na] na
09 Daniel: [eu não sei de que grupo eu sou],

4. Nos dados analisados em Garcez e Melo (2007: 12-16), as crianças de uma turma de
primeiro ano do primeiro ciclo em 2006 apresentam em conselho participativo o que apren-
deram sobre hábitos para evitar o desperdício de água, isso em resultado do projeto que
vinham realizando sobre a importância da água e do consumo racional desse recurso.
5. Os critérios e procedimentos de geração, segmentação e transcrição adotados aqui estão
6 detalhadamente apresentados e discutidos em Garcez, Bulla e Loder (2014: 266-274).
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10 (1,8)
11 Lívia: [[tu é o cinco.
12 Wilson: [[vamos sentar aonde Daniel,
13 (1,2)
14 Wilson: a gente tamos decidin[do] ((Daniel vai para o seu grupo))
15 Lívia: [lá do] lado do Leo. ((para Daniel))
16 Lívia: não não tem decidir
17 (0,6)
18 Wilson: então vou ficar sozinho
19 (1,2)
20 Laura: oh sora o Wilson é o um
21 Wilson: ah meu Deus por favor manda essa guria
22 calar a boca
23 (1,4)
24 Lívia: quem,
25 (0,4)
26 Wilson: a La::ura[:]
27 Lívia: [to]do mundo viu que tu é desse grupo
28 todo mundo viu que tu não queres esse
29 gru:[po]
30 Diego: [al]i tá o um [ó::]
31 Laura: [o:] Wil[son vem aqui com a gente]
32 Lívia: [aí não ( )]<alguém decidiu
33 aqui> qual o grupo que iria ficar,
34 (0,6)
35 Lívia: alguém pôde di[zer professora e]u quero sentar=
36 Laura: [o Wilson vem com a gente]
37 Lívia: =com aquela lá porque aquela lá é minha amiga
38 e eu gosto de trabalhar mais com ela,
39 (.)
40 Lívia: então porque que tu, só tu v[ai pod]er escolher com=
41 Laura: [so:ra]
42 Lívia: =onde tu quer ficar
43 Wilson: (º º) ((olhando para baixo))
44 (.)
45 Lívia: bo[m em]tão tu vai ter que subir
46 Laura: [sora]
47 (.)
48 Laura: bota lá o Wilson comigo a: Paula e a: Meire
49 (0,2)
50 Lívia: hum,
51 (.)
52 Laura: comigo e a Paula
53 (1,1)
54 Laura: quer ir,
55 (0,7)
56 Wilson: onde
57 (.)
58 Laura: comigo a Paula e a Meire
59 (1,3)
60 Lívia: e aí Wilson,
61 (3,5)
62 Lívia: tu recebeu um convite quer ir?
63 (1,5)
64 Lívia: quer ir?
65 (1,8)
66 Lívia: então não tem [grupo]
67 Wilson: [vou pen]sar
68 Lívia: não tem vou pensar.
69 (0,8) 7
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70 Lívia: vamos sentar ((para outros alunos))


71 (0,9)
72 Lívia: bom (0,7) grupo SEIS nós vamos subir ((para Wilson))
73 (2,8)
74 Lívia: ai que calor
75 (0,9)
76 Wilson: eu quero ficar no: [la]do do=
77 Lívia: [oh]
78 Wilson: =Danie[l]
79 Lívia: [n-] não
80 (.)
81 Lívia: não é onde eu quero sentar (0,3) é onde
82 eu coloquei sentado por acaso ninguém
83 escolheu por quê que tu quer escolher,
84 (3,3)
85 Lívia: além- além de não ter- ninguém ter escolhido
86 tu ainda tens duas vanta:gens em cima de todos
87 outros
88 (0,6)
89 Lívia: um grupo levantou e veio te convidar tu ainda
90 assim não quis tu quer sentar ao lado de Daniel
91 ai não dá. ((distribui os livros))

Um minuto depois, após a distribuição dos materiais, Lívia voltou


a falar com Wilson, que ainda permanecia no mesmo lugar.
1/00:06:22/EXCERTO II (transcrição simplificada)

01 Lívia: e tu,
02 (1,1)
03 Lívia: vai ficar vai subir
04 (1,1)
05 Lívia: então pode ir subindo pega a tua mochila e vai lá
06 pra Silvana
07 (0,4)
08 Wilson: não não vou ( )
09 (3,9)
10 Wilson: >a senhora deixa eu sentar em outro grupo<
11 Livia: qual o grupo que tu quer sen[tar],
12 Wilson: [no] que me convidaram
13 (0,5)
14 Lívia: senta.
15 (3,2)
16 Wilson: ( ) sentado lá,
17 Lívia: ahn,
18 Wilson: tem gente lá,
19 (.)
20 Lívia: tu tem dúvidas ( )
21 (0,4)
22 Wilson: tenho
23 (.)
24 Lívia: ( )
25 (0,4)
26 Wilson: nesse daqui, ((ele aponta para um outro grupo))
27 (0,6)
28 Lívia: lá. ((apontando para o grupo que o convidou))
29 (0,4)
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30 Lívia: é lá onde te convidaram ou aqui onde tu foi (.)


31 eleito pra ficar.
32 (6,9)
33 Wilson: lá onde me convidaram
34 (.)
35 Lívia: então vai.
36 (0,9)
37 Wilson: mas não tem classe lá sora.
38 (1,1)
39 Lívia: oh que problema né o quê que tu vai fazer
40 sem a tua classe lá.
41 (3,8)
42 Wilson: ah meu Deus do céu. ((leva a classe para o grupo))

Wilson foi trabalhar com o grupo que o escolheu. Lívia então


iniciou as instruções para as atividades em cada grupo, nas quais to-
dos passariam boa parte da tarde, lendo e discutindo o que liam sobre
hábitos e cuidados ambientais relativos ao tratamento de resíduos
sólidos.
Olhando para a transcrição como um todo, podemos afirmar
que se trata de uma situação de resistência por parte de um aluno em
participar da atividade proposta pela professora. Se considerarmos a
priori apenas os papéis institucionais ali envolvidos, o de professor e o
de aluno, poderíamos até mesmo dizer que a professora vale-se desse
status institucional para exercer poder sobre o aluno e assim, obrigá-
lo a participar da aula. Olhando isoladamente para alguns enunciados
como os que reproduzimos abaixo, um observador poderia ver coerção
autoritária por parte da professora Lívia:
→ 01 Lívia: vocês vão ficar sem trabalhar os dois,
02 (0,2).
... ((três linhas omitidas))
→ 06 Lívia: trabalho em grupo (.) ou vocês se colocam em um grupo
07 ou ficam sem trabalhar ficando sem trabalhar é fora
08 da sa[la na na na na na] na
09 Daniel: [eu não sei de que grupo eu sou],

Se as linhas 06 e 07 acima podem ser interpretadas como uma


ameaça, a 16 abaixo seria o auge do autoritarismo despótico da figura
que ocupa o papel institucional de professor:
14 Wilson: a gente tamos decidin[do] ((Daniel vai para o seu grupo))
15 Lívia: [lá do] lado do Leo. ((para Daniel))
→ 16 não não tem decidir

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Assim como esta:


→ 68 Lívia: não tem vou pensar.

E também estas:
→ 81 Lívia: não é onde eu quero sentar (0,3) é onde
82 eu coloquei sentado por acaso ninguém
83 escolheu por quê que tu quer escolher,

Além disso, com base no registro audiovisual (não reproduzido


aqui), poderíamos apontar a resistência de Wilson como uma questão
de conflitos com base em diferenças de classe social, já que se trata de
um menino de periferia, discutindo com uma professora de classe mé-
dia, ou até mesmo como uma questão de conflito étnico-racial (Wilson
é negro, e Lívia, branca). Outros observadores ligeiros já criticaram
Lívia por estar dando tanta atenção para um aluno apenas, enquanto o
resto da turma fica desatendida, e que o fato de Wilson afinal ir para
um grupo diferente daquele para o qual tinha sido sorteado revela a
falta de critérios no disciplinamento dos alunos pela professora.
Em contraste, na nossa busca de aproximação do que Lívia e seus
colegas educadores, do que ela, Wilson e seus colegas de turma estão
a ver no que fazem, percebemos o PPP sendo executado. Para isso, a
mirada etnográfica de que dispomos nos faz considerar que há muito a
ser levado em conta para um olhar externo circunstanciado, de perto e
no todo. Trata-se assim de uma história natural, para usar a expressão
que McDermott e Raley (2011: 373) “conclamam e impõem”, “uma
análise [que] examina organismos e seus ambientes entremeados em
tempo real em situações consequentes para seus participantes e além”
(ênfase no original)6.
Podemos dizer que Wilson faz um grande esforço para ser posto
à margem, na periferia da sala de aula e da atividade de leitura. Ob-
servamos esse mesmo comportamento em outras aulas também. No
entanto, justamente por termos registros de campo, vemos que é Lívia
quem resiste. Ciente da biografia de Wilson e diante dos desafios que

6. Esta e as demais citações de fontes publicadas somente em inglês aparecem aqui na


10 nossa tradução informal para os propósitos deste artigo.
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ele impõe à condução da aula, mas orientada pelo projeto político-


pedagógico amplamente discutido e acordado, segundo o qual todos os
alunos podem aprender, todos os alunos devem permanecer na escola,
diferença não é deficiência, o trabalho de grupo qualifica a aprendi-
zagem, e aprendizagem e “disciplina” não são aspectos excludentes,
mas ocupam espaços diferentes, Lívia não enquadra o menino da
maneira mais fácil; ela não aceita o convite dele para que ela o deixe
à margem. Há um árduo trabalho de Lívia justamente para inseri-lo e
incluí-lo na atividade, no grupo e como membro legítimo da sala de
aula, inclusive com direitos especiais. Vemos aí a atuação na sala de
aula de um esforço acordado entre os educadores: todos farão a sua
parte para não corroborar tudo o que conspira para que Wilson se en-
caminhe para a marginalidade. Vemos aí também um empenho crítico,
que não organiza metas apenas por pressão externa e nem se dobra ao
poder de avaliações generalizantes (de autoridades educacionais ou de
índices de resultados de provas de larga escala, por exemplo). Note-se
ainda que isso se dá numa aula de leitura.7
Melo (2006) denominou de controle social justificado por parte da
professora o que acontece na interação transcrita acima. Tal prática não
estaria relacionada apenas a coerção das ações dos alunos, mas a um
propósito mais amplo, como a inclusão social que se dá em sala de aula.
Não podemos olhar para os enunciados isolados, conforme ilustrado
acima, e deixar de fora, por exemplo, as explicações e justificativas
que Lívia usa para o que está fazendo. Como aponta Melo (2006),
é crucial atentar para a prestação de contas8 que, mesmo se custosa
interacionalmente, mostra ao aluno o quanto suas atitudes podem ser
insustentáveis na convivência em grupo.
Também notamos de passagem que em nenhum momento a
professora corrige a fala de Wilson, o que seria uma prática comum
em uma sala de aula considerada tradicional (Batista, 1998; Garcez,

7. No ano anterior, conforme definido em reunião de metas em fevereiro, houve um esforço


concentrado para intensificar e qualificar o ensino de leitura em toda a escola. Em 16 de
abril, acompanhamos as atividades de noite de formação em que os educadores, Lívia entre
eles, apresentaram e discutiram leituras sobre concepções de leitura segundo os textos de
Emilia Ferreiro, Luiz Carlos Cagliari e Angela Kleiman, entre outros.
8. Empregamos aqui as expressões “explicações e justificativas” e “prestação de contas”
para referir ao que muitas vezes é referido na literatura sociológica, mesmo em português,
como accounts (cf. Del Corona & Ostermann 2013: 213-214). 11
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2006, 2012). Mesmo quando Wilson utiliza uma forma linguística que
poderia ser considerada desprestigiada e passível de correção, Lívia
não torna tal fato relevante para a discussão, ou seja, a fala do aluno é
considerada legítima e oportuna.
→ 14 Wilson: a gente tamos decidin[do] ((Daniel vai para o seu grupo))
15 Lívia: [lá do] lado do Leo. ((para Daniel))
16 não não tem decidir

Considerando todos esses aspectos, ainda assim alguém poderia


olhar para o excerto de transcrição e ver apenas uma parte da história.
Tendo em vista claramente o episódio de resistência de um aluno em
participar da aula, vemos que repetidamente Wilson propõe ficar à
margem do que está sendo proposto pela professora. Porém, em entre-
vistas9 com a professora e com a supervisora da escola, soubemos que
inúmeras vezes, quando pressionado a participar e se engajar nas aulas,
Wilson mencionou a saudade que tem dos tios que estão presos para se
justificar. Quer dizer, há mais um elemento indicando o quanto a história
familiar de Wilson o faz se colocar na interação em uma posição de
quem não participa da atividade pedagógica, de quem é excluído.
A professora, no entanto, teria motivos para enquadrá-lo dessa for-
ma, assim como a escola. Já que é um aluno que se recusa a participar,
que atrapalha o andamento da aula, seria muito fácil para a escola e
para Lívia excluí-lo mesmo. Mas não é o que acontece. Assim como
Wilson se orienta para a não participação em diversas ocasiões, Lívia
também – ao não aceitar a recusa do aluno, ao prestar contas de sua
insistência pela participação e ao dar oportunidades para Wilson falar,
argumentar e escolher como e onde quer participar da aula. Ela assim
garante que ele vai ler e discutir a história sobre o destino correto do
lixo, e por que isso importa. Faz isso ao assumir posicionamentos que
estão intimamente ligados à história de engajamento da escola com
a comunidade por meio de práticas que almejam a inclusão social na
aprendizagem (Moll, 2000). Podemos afirmar que há uma questão
relacionada à construção das ações dos participantes em sala de aula
por meio da resistência de ambas as partes, tanto da não participação

9. Entrevista informal realizada com a supervisora e com a professora em 15 de agosto de


12 2005 na sala dos professores da escola, registrada em notas de campo de Lia Schulz.
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de Wilson e de sua insistência em se colocar à margem, como da pro-


fessora engajada com a proposta inclusiva da escola.
Se tal interação fosse analisada sem enquadramento etnográfico, ou
mesmo se apenas essa aula fosse discutida e analisada como um evento
em si, muito se perderia de vista em termos de entendimento das ações
dos participantes. Com isso, queremos dizer que não veríamos aqui a
engenhosidade (McDermott & Raley, 2011) de Wilson para expressar
sua condição e de Lívia para educar. Para nós, contudo, esse é um entre
tantos os momentos em que presenciamos a realização concreta do
PPP da escola, que prima por inclusão e é construído conjuntamente
em diversas instâncias por educadores que se engajam arduamente
na sua realização prática. E justamente por isso, decidimos conhecer
esse lugar e acompanhar de perto como acontecia a vida nessas salas
de aula. A visão que construímos e a narrativa que apresentamos é
parcial: não vimos tudo; fomos menos sistemáticos do que seríamos
nos anos seguintes; contamos o que entendemos. Outras narrativas
poderiam ser produzidas. Queremos propor, contudo, que as circuns-
tâncias situadas, que em linhas gerais trouxemos aqui, qualificam a
descrição narrativa acima como conhecimento sistemático e oferece
as complexas “interconexões entre estrutura social, cultura e interação
social ao mesmo tempo em que considera atentamente a necessidade de
reconciliar as dimensões conflitivas e consensuais da aprendizagem”
(Mehan, 1998: 264).

2. E o trabalho que isso dá! Vale a pena?


Nossa história na escola

Diferentemente de pesquisar cenários escolares em que o fracasso


predominasse e acabássemos por realizar uma pesquisa de “descrição
do fracasso” da educação pública (cf. Keller, 2004; Jardim, 2006),
queríamos conhecer boas práticas. Em meados do ano 2000, tínhamos
ouvido falar do trabalho da professora que organizara o livro Mapas
da cidade (Zatt & Souza, 1999), resultado de projeto inovador e pio-
neiro de interlocução escrita entre alunos de duas escolas públicas de
periferia socioeconômica localizadas em pontos distantes de Porto
Alegre. Isso propiciou nosso primeiro contato com a escola em 2001,
ano em que fizemos as primeiras visitas regulares, dando início a um 13
esp.
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Pedro Vilela-Ardenghi & Ana
de Moraes Garcez, Lia Raquel
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trabalho de campo que se estenderia até 2008.10 Foi um trabalho de


campo extenso, mas intermitente: muito intenso em certos momentos,
bem menos intenso em outros. Nunca estivemos na escola todos os
dias, afinal, quem poderia afastar-se por inteiro do resto da sua roti-
na de estudante, professor, filha, pai etc.? Contudo, trabalhando em
equipe, multiplicamos olhares, oitivas, anotações e diários de campo.
Foi trabalhoso? Certamente, mas exequível e, para os fins propostos,
necessário e proveitoso.
Nos ano de 2001 a 2005, mais intensamente em 2003, o trabalho
de pesquisa esteve voltado para a compreensão do PPP da escola
conforme observável na organização da fala-em-interação. Geramos
dados de diferentes maneiras: além da observação participante, reali-
zamos entrevistas informais com professores, com a equipe diretiva e
com alunos. Colecionamos diferentes materiais e documentos, alguns
produzidos pelos educadores, como o relatório de sua pesquisa socio-
antropológica, outros da própria Secretaria Municipal de Educação.
Além disso, registramos e coletamos textos e cartazes que tratavam do
projeto PPP, relatos de autoria dos educadores, e exemplares do jornal
da escola, em que eram publicados textos de autoria de estudantes,
professores e funcionários.
Depois de inúmeras visitas de negociação de entrada, e de mais de
um ano de observações regulares de eventos com registro em anotações
de campo, iniciamos a geração dos dados audiovisuais, em agosto de
2003, com o consentimento de três professoras que já estavam sendo
acompanhadas pelo grupo. Para as gravações, utilizamos formulários
de consentimento informado para que professores, alunos e responsá-
veis autorizassem o uso das imagens. As gravações foram realizadas
somente depois de recebidos os consentimentos assinados. Nesse pri-
meiro período de estada na escola, os registros audiovisuais somaram
doze horas/aulas de gravação, incluindo interações de sala de aula e
de reuniões. Os dados audiovisuais foram acompanhados das notas

10. Tiveram apoio do CNPq, pelo que agradecemos, os projetos de pesquisa “A organi-
zação do reparo conversacional, intersubjetividade e controle social” (2002-2005, pro-
cesso 551226/2002-1), “Reparo, intersubjetividade e controle social: conversa cotidiana
e fala-em-interação de sala de aula” (2005-2008, processo 305339/2004-4) e “Interação
social e etnografia do projeto político-pedagógico da escola pública cidadã” (2006-2008,
14 processo 400872/2006-4).
esp.
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Brasil-paraíso: estereótipo e circulação
Olhares circunstanciados... 2015

de campo dos pesquisadores e triangulados juntamente com todo o


material obtido em campo. Com a geração desses dados concluída em
dezembro de 2003, iniciamos o processo de segmentação, transcrição
seletiva e análise sequencial de segmentos de fala-em-interação.
Voltamos à escola para dar continuidade ainda a outros projetos
devido às evidências que tivemos da relação entre o PPP e a organização
da fala-em-interação: a construção da participação nos conselhos de
classe (Schulz, 2007; Garcez & Melo, 2007), o aprendizado nas aulas
de língua (Conceição, 2008) e a construção de identidades e o regime
de gênero (Almeida, 2009). Novamente observamos e acompanhamos
diferentes atividades e cenários, desde aulas, reuniões, atividades no
pátio, no laboratório de informática e nos arredores da escola. Também
realizamos entrevistas informais e formais com professores, estudantes,
funcionários e equipe diretiva, coletamos materiais escritos e redigimos
notas e diários de campo. Pode-se dizer que, em 2006, realizamos um
trabalho ainda mais concentrado e sistemático de etnografia escolar,
pois ampliamos o escopo de observação para alcançar turmas de todos
os ciclos de formação, todas as idades e espaços escolares e assim termos
um quadro mais completo em que sustentar nosso entendimento do que
estava acontecendo ali. Isso só foi possível por se tratar de etnografia
em equipe (Heller, 2011: 100). O projeto de pesquisa “Interação social
e etnografia do projeto político-pedagógico da escola pública cidadã”
(2006 a 2008) resultou em diversos trabalhos de iniciação científica
(Conceição & Garcez, 2003, 2004; Schulz & Garcez, 2003; Melo &
Garcez, 2005; Reis & Garcez, 2008; Stein & Garcez, 2009), quatro
monografias de conclusão de curso de licenciatura (Schulz, 2004; Melo,
2006; Reis, 2008; Kanitz, 2010), duas dissertações de mestrado (Schulz,
2007; Conceição, 2008), e uma tese de doutorado em Letras (Almeida,
2009).11 Divulgamos nossos estudos também em diversas apresentações
em eventos acadêmicos, muitos delas em conferências plenárias.
Um dos diferenciais que encontramos na escola pesquisada foi o
fato de essa instituição em particular apresentar uma história de en-
gajamento e construção conjunta do seu projeto, de autoria coletiva e
forte laço com a comunidade a que escola pertencia. Tal história era

11. Na sua revisão de estudos que sustentam a sua compreensão de aprendizagem, Garcez,
Frank & Kanitz (2012) baseiam-se em larga medida nesses relatórios de pesquisa. 15
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referida pelos educadores como “a caminhada”. Um dos pontos cha-


ves para essa construção coletiva foi justamente a realização de uma
pesquisa socioantropológica (Moojen et al., 1997), empreendimento
dos educadores para conhecer a comunidade e saber de fato quem eram
seus alunos na década de noventa.

Figura 1 – Um dos cartazes de boas-vindas nas paredes da escola para a reunião


de planejamento para o ano letivo de 2006. Foto tirada por Pedro de Moraes
Garcez em 1º de março de 2006.

A partir daí, o grupo de educadores construiu coletiva e gradual-


mente uma proposta de inclusão que tornou a escola alvo de diversos
relatórios de pesquisa em Educação (Moll, 2000; CENPEC, 2003;
Titton, 2003; Monteiro, 2010). A preocupação dos educadores, que
inicialmente era a evasão escolar, passou a ser a inclusão e as questões
de aprendizagem relacionadas a ela. Para dar corpo ao projeto da escola,
a necessidade de conhecer os alunos e as famílias que frequentavam a
escola tornou-se evidente, e a iniciativa para uma pesquisa na comuni-
dade partiu dos próprios educadores (Titton, 2003). Durante a realização
dessa pesquisa é que a escola realizou a elaboração dos princípios que
guiam o projeto político-pedagógico da escola até hoje:
16
esp.
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Brasil-paraíso: estereótipo e circulação
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• Todos os alunos podem aprender;


• Todos os alunos devem permanecer na escola;
• Diferença não é deficiência;
• O trabalho de grupo qualifica a aprendizagem;
• Aprendizagem e “disciplina” não são aspectos excludentes,
mas ocupam espaços diferentes.
A partir da análise da história da escola por meio de seus próprios
registros, pudemos observar a importância de todo um trabalho intenso
de construção e de realização permanente de tais princípios. Os edu-
cadores publicaram, além de relatos de experiências das suas práticas
pedagógicas nos anos 1990 e 2000, um livro com a história da escola
(Persch, Pacheco & Monteiro, 2006), em que são descritos os diferentes
projetos de inclusão, participação e autoria que ultrapassam a teoria.
O trabalho de campo realizado pelo grupo de pesquisa pôde
evidenciar essa realização prática do PPP em diversas instâncias: da
construção da participação e do protagonismo dos alunos nos seus
processos de aprendizagem vistos nos conselhos de classe participati-
vos (Schulz, 2007), a construção de conhecimento conjunto nas aulas
de língua inglesa (Conceição, 2008), até a construção de gênero nas
salas de aula e outros espaços escolares (Almeida, 2009). Fizemos
devoluções das nossas observações aos educadores, informal e par-
cialmente em diversas ocasiões, formal e sistematicamente em duas
noites de formação.

3. Que pesquisa é essa? Pesquisa interpretativa de cunho


etnográfico, etnografia linguística?

A pesquisa realizada pelo grupo discutida acima pode ser definida


como qualitativa ou interpretativa, que faz uso de metodologia etnográ-
fica (Erickson, 1990; Toohey, 2007) e microetnográfica (Erickson, 1992;
Garcez, 2007). Segundo Erickson (1990: 81-86) a pesquisa qualitativa
interpretativa, ou etnográfica, se presta para a observação específica de
ocorrências reais, particulares, de ações situadas ecologicamente, com
vistas à compreensão acerca das perspectivas de construção de sentido 17
esp.
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e ação de atores em cenários de interesse investigativo. Os relatórios


de pesquisa dessa natureza, chamados muitas vezes de etnografias
(Angrosino, 2006), descrevem elementos da ecologia dessas situações,
e assim buscam explicar o que se se passa ali. Ainda segundo Erickson
(1990)12, as perguntas de pesquisa devem ser do tipo:
1. O que está acontecendo em termos da ação social neste cenário
específico?
2. O que essas ações significam para os atores na hora em que
são realizadas?
3. Como isso tudo se organiza em padrões de organização social
e de princípios culturais para se conduzir a vida cotidiana?
4. Como o que está acontecendo aqui se liga com o que se passa
mais adiante em outros sistemas de ação?
5. Como a organização da vida cotidiana neste cenário se compara
com a organização em outros momentos ou lugares?
As razões por que buscar respostas para esse tipo de perguntas
dizem respeito a:
1. a invisibilidade da vida cotidiana: fazer o que é familiar ficar
estranho, problemático, visível, passível de exame e refle-
xão;
2. o interesse por compreensão específica, mediante a documen-
tação de detalhes concretos da prática: descrição + argumen-
tação + documentação rigorosa = explicação, conhecimento
reflexivo;
3. o entendimento de que os significados locais podem variar mui-
to, mesmo que as ocorrências sejam aparentemente iguais;

12. Segue atual a discussão não só de métodos etnográficos, mas da metodologia interpre-
tativa, que é feita pelo autor neste texto já antigo, reproduzido em diversas publicações,
também em tradução ao espanhol. É particularmente relevante aqui pela disseminação
e influência que teve no Brasil a partir de encontros de estudos realizados pelo autor no
Brasil em meados de 1991, dos quais participaram, entre outros, Luiz Paulo da Moita
18 Lopes, Marilda Cavalcanti e Stella Maris Bortoni-Ricardo.
esp.
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Brasil-paraíso: estereótipo e circulação
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4. a necessidade de compreensão comparativa sobre o que se


passa em cenários diferentes;
5. a necessidade de compreensão comparativa além das fronteiras
do cenário local.
O trabalho de campo com orientação etnográfica tem como guia
as perguntas que fundamentam a pesquisa. Segundo Erickson (1990),
como um método de investigação, o trabalho de campo envolve a par-
ticipação intensiva e de longa data do pesquisador no cenário escolhido
como campo, o registro detalhado do que é observado em termos de
notas de campo e coleção de diferentes materiais e documentos, assim
como a subsequente sistematização dos dados. Trata-se de um diálogo
constante entre indução e dedução, fazendo com que muitas vezes ter-
mos específicos da investigação sofram mudanças durante o trabalho
de campo. É fundamental, porém, que as perguntas guias da pesquisa
não se percam de vista, já que a exposição muito longa a cenários tão
ricos pode gerar inúmeras possibilidades de pesquisa.
Angrosino (2009: 30) define a etnografia como “a arte e a ciência
de descrever um grupo humano”, ressaltando que se trata de gente de
carne e osso, e não de indivíduos. Reforçando o que tantos já disseram
sobre a duplicidade do termo etnografia, o autor esclarece que pode
referir-se ao método, baseado na pesquisa de campo, e um produto,
a narrativa resultante de uma pesquisa etnográfica. Os métodos et-
nográficos, segundo o autor, embora tenham surgido no trabalho dos
antropólogos, foram oportunamente adotados por pesquisadores das
mais diversas áreas e disciplinas.
No caso das pesquisas educacionais no Brasil, o trabalho de André
(1995) tem sido referência. A autora conceitua a etnografia como um
tipo de pesquisa realizada por antropólogos para estudar uma cultura
ou uma sociedade através da descrição. Para estudar cenários educa-
cionais, a autora defende o uso de uma adaptação do método, ou seja,
a pesquisa em educação não seria uma etnografia, mas uma pesquisa
de tipo etnográfico, que possibilitaria entender o cotidiano escolar de
forma sistemática e minuciosa.
E é justamente o trabalho de campo guiado por questões específicas
de pesquisa sobre o uso da linguagem que tem tornado a etnografia
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uma escolha metodológica frequente nas pesquisas em Linguística


Aplicada. Quando ainda dificilmente se poderia imaginar um público
leitor para discussões sobre as relações teóricas e os dilemas práticos
do fazer etnográfico em Linguística Aplicada, Moita Lopes e Cavalcanti
(1991: 137) chamaram atenção para a “pesquisa de base antropológica”
como meio para reflexão sistemática na área. Desde então, Moita Lopes
(1994; 1996; 1998; 2006) e Cavalcanti (1986; 2006) têm demonstrado
que as pesquisas de observação e registro de cenários naturais em que
as ações humanas se dão por meio do uso da linguagem tornaram-se
centrais do fazer pesquisa em Linguística Aplicada.
Já Moita Lopes (1996: 87), ao analisar as tendências de pesquisa
em ensino e aprendizagem de línguas, destacava a pesquisa de natureza
etnográfica como uma das metodologias preponderantes na área. O
autor apontava a adoção, em pesquisas desenvolvidas no Brasil e no
mundo, da descrição densa do cotidiano escolar para entender padrões
característicos das interações de sala de aula sem recorrer a categorias
preestabelecidas. Pelo contrário, ao observar, registrar, entrevistar,
gravar aulas e analisar o que está acontecendo nos contextos situados,
salientava a possibilidade de o pesquisador direcionar o entendimento
dos processos de ensino aprendizagem a partir de questões específicas
de pesquisa.
Cavalcanti (2006) propõe um olhar metametodológico para pen-
sarmos as implicações das escolhas metodológicas que são feitas em
cenários como a educação indígena, justamente pelos perigos que as
narrativas que lidam com a cultura do outro podem sofrer, principal-
mente quando endereçadas a interlocutores externos, o que em geral
é o caso em etnografias. A autora prefere nomear seu trabalho como
uma pesquisa de natureza etnográfica, pois utiliza alguns princípios da
etnografia para a geração dos dados, mas não se limita a ela na análise.
E talvez seja por isso que Moita Lopes (2006) se refira ao trabalho do
linguista aplicado como indisciplinar.
Alguns antropólogos têm se manifestado no Brasil acerca do uso
da etnografia por outras áreas, em especial a da educação. Fonseca
(1999: 59) manifesta seu “entusiasmo” (palavra da autora) pelo inte-
resse de outros pesquisadores por métodos etnográficos. Porém, afirma
que certos cuidados são necessários para que uma pesquisa possa ser
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de fato enquadrada como etnográfica. A autora apresenta uma série


de características que fariam um trabalho de pesquisa ser enquadrado
enquanto etnografia e argumenta que é preciso haver cuidados no uso
do método etnográfico apenas para caracterizar eventos únicos sem a
devida sistematização. Tal adoção não deve ser feita apenas para tratar
de situações específicas, que poderiam ser descritas pela expressão po-
pular “cada caso é um caso”. Para Fonseca (1999), é preciso estranhar,
sistematizar e comparar acontecimentos e situações para fundamentar-
se como etnográfico de fato.
Com efeito, há autores em Antropologia no Brasil que veem a
adoção da etnografia em outras áreas como um avanço inadequado,
já que se trataria de um método específico (e exclusivo?) da pesquisa
antropológica. Rocha e Eckert (2008) afirmam que o emprego de proce-
dimentos técnicos próprios da pesquisa etnográfica, como a observação
e as entrevistas, fora da Antropologia não configuraria uma etnografia.
Valente (1996) chama atenção para os riscos da popularização do mé-
todo etnográfico na área da Educação, argumentando que diversos dos
trabalhos que se dizem etnográficos receberiam avaliações negativas
justamente por falta de formação antropológica e conhecimento do
método por parte dos autores não antropólogos.
Assim, não é sem razão a hesitação e a cautela em afirmar que se faz
etnografia em Linguística Aplicada (ver Lucena, 2015; Bastos & Biar,
2015). Ela também se justifica em razão da multiplicidade de relações
entre fazer etnográfico e os diferentes quadros teóricos que vigoram na
paisagem acadêmica atual na área, o que pode derivar lamentavelmente
para um “ecletismo irrefletido”, “grosseiramente chamado de ‘feirinha
das Ciências Sociais’” por Garcez (2012: 8), referindo-se ao movimento
do pesquisador que “vai ao mercado de conceitos e arcabouços em
voga naquele momento, em que todos os aportes se justificavam de
modo simplista pela suposta vantagem autoevidente de ‘quanto mais
ângulos de visão melhor’”.
Portanto, é preciso garantir que o trabalho etnográfico, em Lin-
guística Aplicada como em qualquer área, seja também pesquisa de
qualidade, ou de cada vez mais qualidade. Rampton, Maybin e Roberts
(2014: 21) definem expressamente que a boa pesquisa em etnografia da
linguagem deve ser “cuidadosa, lógica, responsável, explícita, cética,
21
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bem informada, comparativa e original, conduzindo à produção de as-


serções interessantes em que as pessoas (em determinada comunidade
discursiva) possam confiar”. Segundo eles, “em resposta às maneiras
inevitavelmente muito diversas em que a etnografia da linguagem vai
sendo apropriada, só um aumento de reflexividade metodológica pode
resolver” (p. 2). Esse é um desafio a enfrentar nos estudos da lingua-
gem no Brasil, dado que há pouca reflexão metodológica sistemática.
Ao que estamos informados, há poucas oportunidades de treinamento
em métodos etnográficos, e a maior parte dos pesquisadores entre
nós chegou à prática de pesquisa etnografia por tentativa e erro, ou
se jogando em águas profundas para ver se sabia nadar. As diversas
histórias naturais de investigação em Fritzen e Lucena (2012) parecem
atestar isso e clamar por oportunidades mais frequentes e sistemáticas
de reflexividade metodológica.
Há que considerar, contudo, que etnografias da linguagem no âm-
bito da Linguística Aplicada se produzem em comunidades discursivas
interessadas em práticas de linguagem e se voltam também para in-
terlocução com comunidades profissionais não acadêmicas. Conforme
formulam Rampton, Maybin e Roberts (2014: 21),
Julgados segundo padrões textuais de trabalho puramente acadê-
mico, os produtos escritos resultantes de etnografias da linguagem
colaborativas empreendidas com profissionais de educação, saúde,
justiça etc. muitas vezes parecem relativamente discretos, conceitual
ou metodologicamente. Entretanto, o trabalho e a experiência em que
isso se apoia de fato ampliam seriamente a etnografia da linguagem,
se pudermos garantir que no âmbito da etnografia da linguagem
haja sempre movimento aberto entre o trabalho teórico, descritivo e
intervencionista, e que haja diálogo contínuo ou mesmo trabalho em
equipe realmente entre pessoas com essas inclinações diferentes, mas
complementares.

O que apresentamos aqui poderia ainda ser mais especificamente


referido como microetnografia escolar, em que registros audiovisuais
de interação tornam-se fundamentais (Garcez, 2007). Para Erickson
(1990), as vantagens da adoção da microetnografia dizem respeito
à possibilidade de ampliação da análise tendo em vista as inúmeras
oportunidades de se rever os dados e reavaliar as próprias análises, redu-
22 zindo tipificações ou simplificações que poderiam ser feitas no registro
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manual das observações de campo. Além disso, a análise de registros


audiovisuais também possibilitaria a observância de fenômenos mais
sutis, imperceptíveis na observação participante, como os que dizem
respeito ao movimento dos corpos.
Acreditamos que tenham sido objeto de nossa atenção as sete ca-
racterísticas13 que Rampton, Maybin e Roberts (2014: 2-3) consideram
constitutivas da etnografia nas diversas disciplinas acadêmicas:
a) Consideração pelas racionalidades locais em um jogo entre ‘estra-
nhamento’ e ‘familiaridade’
b) Antietnocentricidade e relevância
c) Ecologias culturais
d) Sistemas e particularidade
e) Conceitos de sensibilização, abertura aos dados, e preocupações
com idealização
f) Reflexividade e participação
g) A irredutibilidade da experiência

Com feito, Rampton, Maybin e Roberts (2014: 13) chamam ex-


pressamente a atenção de seus leitores para o fato de que empregam
no título do trabalho a expressão etnografia da linguagem14, e não
antropologia da linguagem. A primeira razão que apontam para isso é
que nenhum dos três autores é antropólogo (acrescentando parenteti-
camente a isso a observação de que os seus colegas antropólogos “não
têm manifestado grande interesse pelos detalhes da comunicação”15).
A segunda razão é estarem convencidos de que, desde a proposta de

13. Note-se que a extensão temporal do trabalho de campo não é um critério.


14. As expressões originais em inglês são linguistic ethnography e linguistic anthropology.
Embora comumente se empregue em português a tradução antropologia linguística, isso
nos parece enviesar o sentido ao associar a empreitada à (disciplina) Linguística em vez
de ressaltar o foco na linguagem. Optamos por etnografia da linguagem e antropologia
da linguagem, seguindo a tradução em italiano (Antropologia del linguaggio) do título
da obra de Duranti (1997).
15. Contudo, tratando de etnografia, a sociolinguista canadense Monica Heller (2011:
46-47), presidente da Associação Americana de Antropologia (2013-2014) afirma:
Claramente, como representamos os recursos e as práticas de linguagem que queremos
discutir diz muito sobre como pensamos a esse respeito. ... Nossos próprios relatos,
nossas representações, são turnos de fala importantes numa conversa que se estende.
Temos que pensar sobre isso em termos do que queremos dizer, para quem, em termos
de como o que dizemos pode ser entendido e em termos do que podem ser as conse-
quências potenciais das asserções que queremos fazer. 23
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etnografia da fala ou da comunicação de Gumperz e Hymes (1972,


antropólogos? linguistas?), os conceitos e métodos etnográficos têm
relevância ampliada, tanto para outras disciplinas além da Antropologia,
de Sociologia às Ciências da Saúde, quanto para o engajamento dos
etnógrafos (da linguagem) com profissionais tais como professores,
médicos e outros. Essa também é a nossa visão. Apreciamos o legado
e a prática antropológica, mas não somos antropólogos. Tampouco
encontramos muito nossos colegas antropólogos no Brasil que tenham
interesse ou mesmo apreciação pelos “detalhes da comunicação”16, mas
temos a convicção de que a etnografia que fizemos nos fundamenta e
qualifica para a interlocução com os profissionais com quem interagi-
mos, no nosso caso professores e outros agentes educacionais na escola,
na administração escolar, em organizações e na academia.
Rampton, Maybin e Roberts (2014: 6) afirmam que a etnografia
“tem ganho peso nos estudos da linguagem, de modo que já não é
mais um método de coleta de dados suplementar”; pelo contrário,
“é a Linguística que passa a recurso operacional precioso por sua
capacidade de identificar movimentos sutis de negociação prática das
relações sociais”. Apontam três razões: o desenvolvimento do pós-
estruturalismo, a revisão crítica conceitual que disso vem decorrendo
e a alteração recentemente percebida na dinâmica de produção de
conhecimento interdisciplinar. Destacamos aqui, esse terceiro e mais
recente movimento como de particular relevância para os linguistas
aplicados. Segundo os autores, há um deslocamento em curso entre
o que nomeiam como modo 1 e modo 2 de interdisciplinaridade: os
pesquisadores passam menos a identificar problemas focais em uma
(sub)disciplina e cruzar para outros paradigmas investigativos a fim
de superar impasses na sua disciplina de origem; em vez disso, cada
vez mais tomam como ponto de partida “questões do ‘mundo real’
que têm relevância na ordem social, técnica ou das políticas”, muitas
vezes engajando-se “do princípio ao fim com agentes não acadêmicos,
sendo a complexidade multidimensional do problema o que motiva
esses encontros”.
Certamente é o que temos vivido em muitas das nossas atividades
de formação inicial e principalmente continuada de professores (ver

24 16. Ver, contudo, Coelho (2013), entre outros escritos da autora.


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exemplos mencionados em Garcez, 2013). Conforme já apontam


Rampton, Maybin e Roberts (2014: 6), isso se observa não apenas
em relação a etnografias da linguagem em cenários educacionais (ver
Pires Santos, Lunardelli, Jung & Machado e Silva, 2015). Há exemplos
atuais de etnografias da linguagem na Linguística Aplicada no Brasil
em cenários de atendimento em saúde (Ostermann & Souza, 2009),
de segurança (Del Corona & Ostermann, 2013), e de organizações
empresariais, (Oliveira, Vilhena & Novaes, 2013). Segundo essa óti-
ca, de mudança na pesquisa interdisciplinar para crescente tolerância
à ambiguidade e destaque para investigação colaborativa com vistas
também a contribuições não acadêmicas, “se a etnografia se caracte-
riza por compromisso com o diálogo e sensibilidade adaptativa aos
retornos que recebe de diferentes interlocutores ... então esse modo 2
de interdisciplinaridade pode ser especialmente compatível com uma
sensatez etnográfica”. Dito de outro modo, quanto mais se exige que
a investigação esteja voltada para a resolução de problemas mediante
trabalho investigativo conjunto em configurações variadas de espe-
cialistas acadêmicos e profissionais, mais demanda há para os olhares
circunstanciados para ocorrências reais, particulares, mediadas por
práticas de linguagem, de ações situadas ecologicamente, isto é, de
etnografia da linguagem.17

4. O que aprendemos no campo: contribuições para pensar


pesquisa em cenários de uso da linguagem em Linguística
Aplicada (especialmente)

O registro sistemático e minucioso da vida acontecendo na escola


em que se passou o episódio de resistência de Wilson em ir para um
grupo e participar da aula de leitura que apresentamos acima nos deu
condições para superar impressões atômicas e reconstruir a visão das
engenhosidades pessoais dos participantes e do sucesso na realização

17. Na discussão que fazem sobre análise de narrativas em cenários profissionais na área
da saúde, Bastos e Biar (neste volume) parecem também adotar essa perspectiva quando
afirmam que a “simplicidade da proposta de análise” que adotam “propicia a troca de
inteligibilidades entre os campos teóricos e profissionais, o desenvolvimento de um
vocabulário conjunto de trabalho e problematizações diversas sobre a natureza situada e
interacional dos dados gerados em campo”. 25
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do PPP, a construção de participação, da aprendizagem e do regime


de gênero em que isso se fez ali. Com isso, pudemos ainda em 2009
conversar com os próprios educadores também sobre o que eles mesmos
talvez pudessem ter dificuldade em ver no que faziam, como o racismo
que todos queremos, eles e nós, combater (Almeida, 2009: 110-121).
Ver e contar histórias mais completas sobre o que entendemos estar
ocorrendo em cenários que queremos conhecer produz conhecimento
relevante. No nosso caso, esse conhecimento tem sido crucial para,
na interlocução pedagógica com outros conhecedores, agentes de
educação em linguagem, por exemplo, na formação inicial e conti-
nuada de professores, nos qualificarmos como interlocutores sensatos,
dignos. Ou seja, por podermos contar uma história íntegra sobre o que
está acontecendo em termos da ação social no cenário específico que
estudamos, conseguimos alcançar o que essas ações significam para
os atores na hora em que são realizadas e relacionar isso a padrões de
organização social e de princípios culturais vigentes na condução da
vida cotidiana nesses cenários, ligando o que se passou ali como que
se passa mais adiante em outros sistemas de ação, outros momentos
ou lugares (ver Lucena, 2015).
Acreditamos que uma das principais contribuições que a etnogra-
fia nos trouxe, senão a principal, foi a qualificação dos nossos olhares
para os cenários escolares e particularmente os cenários de educação
pública contemporânea. Assim podemos pensar a formação de profes-
sores a partir de um posicionamento de quem esteve recentemente lá,
ou seja, de quem aprendeu com as pessoas que fazem escola e vivem
cotidianamente a sala de aula da educação básica hoje. Sentimos o
peso das paredes, o barulho das conversas e das classes arrastadas, o
calor repentino de um início de setembro, as tensas negociações de
participação, as resistências, as perguntas sem resposta e as respostas
controversas, os múltiplos entendimentos do que é fazer sala de aula
e mesmo assim fazê-la a cada momento.
Em vez de recapitular o que todos os que estão do lado de fora acham
que sabem, é só chegar mais perto do que muitos professores e alunos
vivenciam de fato. Assim as salas de aula surgem como lugares onde dia
após dia os participantes lutam para se reconciliar uns com os outros,
com os seus futuros, com as normativas políticas e os movimentos da
história, lugares onde a estética vernácula é combustível tão potente
26 quanto a transmissão de conhecimento, lugares onde o currículo
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coabita com a música popular e a cultura midiática, um lugar onde os


estudantes fazem o melhor que podem com matérias nada promissoras,
e onde os participantes se batem com o significado da estratificação de
classe social, em esforços empreendidos pela flexão de ambivalência
social (e desejo sexual). (Rampton, 2006: 3-4)

Vimos tudo isso, e mais, já que também vimos um lugar onde os


estudantes, incluindo os educadores, se constroem cidadãos, discu-
tindo temáticas relevantes em textos e atividades pedagógicas muito
promissoras. Ter um olhar situado para o cotidiano escolar e registrá-lo
minuciosamente nos torna etnógrafos da linguagem conhecedores das
experiências de ensino e aprendizagem que podem ser relevantes para
outros cenários e contextos.
Nesse sentido, podemos afirmar que o uso da etnografia, ainda que
oneroso, vale a pena por diferentes razões. Compreender as pessoas de
carne e osso e as suas relações sociais em cenários complexos, mais
do que categorias a partir de generalizações prévias, nos leva a cuidar
com a elaboração de propostas pedagógicas que atentem para essas
complexidades. Entendendo as ações a partir da aproximação das pers-
pectivas dos participantes e, assim, descentralizando nossa perspectiva
do que está acontecendo naquele aqui-e-agora, nos mantemos atentos
para evitar a adoção do modelo de mundo do colonizador (Wiley, 2006:
142), em que especialistas acadêmicos salientam aspectos de uma
grande narrativa epistêmica, composta por discursos que sustentam a
sua falsa superioridade, segundo a qual “para progredir, desenvolver-
se ou modernizer-se, a periferia deve receber conhecimento e técnicas
difundidas do centro em vez de em razão de sua própria inventividade”.
Em suma, a etnografia nos permite ver e descrever a engenhosidade
humana (McDermott & Raley, 2011) que vale a pena difundir.
Entender cenários complexos e concretos e, ao mesmo tempo,
compreender de forma ampliada diferentes cenários para construir
conhecimentos a partir do que é específico; estranhar o cotidiano e
aguçar os sentidos e trabalhar individualmente e em grupo, construindo
narrativas e amarrando os sentidos dos diferentes pontos de vista; ter o
privilégio do diálogo contínuo na devolução das análises e na discussão
do que foi a pesquisa para os sujeitos pesquisados posteriormente e
mesmo durante todo o processo... Ver, sentir e pensar escola e sala de 27
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de Moraes Garcez, Lia Raquel
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aula com quem sabe fazer e faz isso tão bem quanto é possível fazer.
Tudo isso é a etnografia que mencionamos aqui, experiência trans-
formadora.
A própria história da etnografia, rebento do colonialismo europeu,
fez com que seu desenvolvimento se voltasse para o exame constante
das lentes do analista e para os perigos da síndrome do colonizador.
Entendemos que, se o conhecimento que produzimos em Linguística
Aplicada se faz constantemente sobre práticas de linguagem em cená-
rios, e se tem compromisso de relevância social, é preciso praticar e
desenvolver olhares circunstanciados e a reflexividade metodológica,
como neste número temático.
Recebido em outubro de 2014
Aprovado em outubro de 2014
E-mails: pedmgarcez@gmail.com;
liaschulz@gmail.com

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