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ESTADO DO ESPÍRITO SANTO

PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL
8/7/2009

APELAÇÃO CRIMINAL Nº 024050062686


APTES.: SAMUEL CARLOS DOS SANTOS E
FÁBIO PEREIRA RODRIGUES
APDO.: MINISTÉRIO PÚBLICO
RELATOR: O SR. DESEMBARGADOR PEDRO VALLS FEU ROSA
REVISOR: O SR. DESEMBARGADOR SERGIO BIZZOTTO PESSOA DE
MENDONÇA

R E L A T Ó R I O

O SR. DESEMBARGADOR PEDRO VALLS FEU ROSA (RELATOR):-

Trata-se de Apelação Criminal interposta por Samuel


Carlos Santos e Fábio Pereira Rodrigues, irresignados
com suas condenações nas iras do artigo 209, § 2º, do
Código Penal Militar, à pena de 02 (dois) anos e 06
(seis) meses de reclusão no regime aberto.

Em razões de apelação, a defesa de Samuel Carlos San-


tos alega, preliminarmente, a ocorrência de prescri-
ção, com base o artigo 123, IV do Código Penal Militar
e, no mérito, alega a ausência de provas para ensejar
sua condenação, requerendo sua absolvição.

O Ministério Público, em contrarrazões, pugna pela re-


jeição da preliminar e, no mérito, pelo improvimento
do recurso, mantendo incólume a decisão atacada.

Em razões de apelação, a defesa de Fábio Pereira Ro-


drigues, busca a desclassificação do crime imputado ao
Apelante, para o previsto no artigo 210, do Código Pe-
nal Militar e, alternativamente, que seja considerado
o crime na modalidade tentada, reduzindo a pena-base
em 2/3 (dois terços).
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Em contrarrazões, o Ministério Público requer que seja
negado provimento ao recurso, mantendo incólume a sen-
tença.

A Douta Procuradoria Geral de Justiça, em Parecer,


pugna pelo conhecimento do recurso, para, no mérito,
negar-lhe provimento.

Este o breve resumo dos fatos, que tomo à guisa de re-


latório.

Ao revisor, por disposição legal.

V O T O

PRELIMINAR

1- DA PRESCRIÇÃO

O SR. DESEMBARGADOR PEDRO VALLS FEU ROSA (RELATOR):-

Em razões de apelação, a defesa de Samuel Carlos San-


tos sustenta a ocorrência da Prescrição, alegando que
da data do recebimento da denúncia até a presente
data, já se passaram 06 (seis) anos, estando, pois, a
pena extinta com base no artigo 123, inciso IV do Có-
digo Penal Militar.

Para tanto, fundamenta seu apela nos seguintes argu-


mentos:

1- Fato ocorrido em 11 de novembro de 2001;


2- Denúncia recebida em 29 de maio de 2002;
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3- Pena de reclusão de 02 (dois) a 08 (oito) anos;
4- Sentença condenatória em 02 (dois) anos e 06
(seis) meses de reclusão;
5- Da data do recebimento da denúncia até a pre-
sente data já se passaram 06 (seis) anos, estando a
pena já extinta pela prescrição.

De fato, verifica-se, que entre a data do recebimento


da denúncia, até a data da publicação da sentença,
transcorreram aproximadamente 06 (seis) anos.

Entrementes, para a análise da prescrição deve ser ob-


servado o artigo 125, do Código Penal Militar, “in
verbis”:

“Art. 125. A prescrição da ação penal, salvo o dispos-


to no § 1º deste artigo, regula-se pelo máximo da pena
privativa de liberdade cominada ao crime, verificando-
se:
V - em oito anos, se o máximo da pena é superior a
dois e não excede a quatro;

(...)
§ 1º Sobrevindo sentença condenatória, de que somente
o réu tenha recorrido, a prescrição passa a regular-se
pela pena imposta, e deve ser logo declarada, sem pre-
juízo do andamento do recurso se, entre a última cau-
sa interruptiva do curso da prescrição (§ 5°) e a sen-
tença, já decorreu tempo suficiente. (grifei)

(...)
§ 5º O curso da prescrição da ação penal
interrompe-se:
I - pela instauração do processo;
II - pela sentença condenatória recorrível.
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Pelo exposto, no caso analisado, não há como subsistir
o argumento utilizado pelo nobre advogado, pois o pa-
râmetro para aferir a existência ou não da Prescrição
deverá, no caso, regular-se pela pena imposta, que foi
de 02 (dois) anos e 06 (seis) meses e, por
conseguinte, consoante redação do artigo 125, inciso V
do Código Penal Militar, prescreverá em 08 (oito)
anos.

Posto isso, rejeito a preliminar.

V O T O S

O SR. DESEMBARGADOR SERGIO BIZZOTTO PESSOA DE


MENDONÇA (REVISOR):-
Acompanho o voto do Eminente Relator.

O SR. DESEMBARGADOR BENÍCIO FERRARI:-


Voto no mesmo sentido.

*
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V O T O

MÉRITO

O SR. DESEMBARGADOR PEDRO VALLS FEU ROSA (RELATOR):-

1-DA INSUFICIÊNCIA DO MATERIAL PROBATÓRIO

Quanto ao mérito o Apelante alega a ausência de provas


para ensejar sua condenação, requerendo sua absolvi-
ção.

Consta, nos autos, que o Ministério Público ofereceu


denúncia em desfavor de Samuel Carlos dos Santos, Fa-
bio Pereira Rodrigues, Gildo Gomes da Silva e Reginal-
do Antonio Calefi, todos soldados da polícia Militar,
como incursos nas sanções do artigo 209, § 2º do Códi-
go Penal Militar, por terem no dia 11 de novembro de
2001, os três primeiros denunciados que se encontravam
de serviço na Radio Patrulha 1110, desviando-se das
suas funções, levaram o quarto denunciado para jantar.
Ao passarem em frente à Igreja Matriz de São João Ba-
tista, Centro da cidade de Aracruz, constataram que um
motoqueiro, Flávio santos Souza, fazia manobras impró-
prias e ao ver a viatura, imprimiu velocidade a sua
motocicleta e fugiu, sendo perseguido e detido pelos
policiais. Durante a perseguição, o primeiro denuncia-
do atirou duas vezes e o segundo uma vez. Um desses
disparos atingiu a vítima, Marciel Souza Santos, cau-
sando-lhe lesões graves, descritas no laudo de fls.
50.

A vítima, Maciel Souza dos Santos, quando ouvida em


juízo, às fls. 93/94, assim declarou:
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“...o depoente percebeu uma viatura trafegar em alta


velocidade, em perseguição a uma motocicleta, na qual
se encontrava seu primo; que se recorda que se tratava
de uma viatura Santana branco e não se lembra do núme-
ro exato de policiais que se encontravam em seu inte-
rior; que o depoente se recorda de ter ouvido disparos
vindos da viatura na direção da motocicleta; que ainda
tentou esconder-se atrás de um jipe, entretanto”, aca-
bou por ser atingido por um tiro na região abdominal;
que a viatura passou pelo depoente sem socorrê-lo;”

A testemunha Flávio Santos Souza em juízo, às fls.


91/92, assim declarou:

“(...) o depoente trafegava de motocicleta em frente a


Igreja Católica do Centro, quando ao cruzar com o se-
máforo de fronte ao ponto de táxi, esquina com a
Venâncio Flores, avançou o sinal que estava fechado;
que o depoente também se encontrava sem capacete; que
tão logo entrou a direita, já ouviu tiros serem dispa-
rados em sua direção; que pós o terceiro tiro, olhou
para trás e pôde perceber que os mesmos partiram de
uma viatura; que na viatura havia o motorista e mais
três policiais; que o policial Reginaldo Calefi é quem
gritou ao depoente determinando que este parasse; que
o depoente não parou, pois ficou com medo dos tiros;
que o depoente partiu com a moto em alta velocidade,
sendo perseguido pelos policiais por diversas ruas até
ser detido em frente ao Supermercado Devens(...) que
não sabe ao certo, mais acredita que cerca de 12 tiros
foram disparados contra si pela viatura; que ao ser
detido em frente ao supermercado, o depoente foi colo-
cado no porta-malas da viatura (...) em seguida, foi o
depoente levado a um bar ao lado do Posto Aracruz
(...)que um dos policiais não podendo o depoente pre-
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cisar qual deles, buscou dentro do bar um revólver en-
rolado em um pano que se tratava de um revólver de
cabo branco; que os policiais ordenaram que o depoente
pegasse a arma, tendo este se recusado; que os poli-
ciais novamente disseram para o depoente que pegasse a
arma ou seria levado para os eucaliptos, tendo mais
uma vez; o depoente se recusado a pegar a arma, em se-
guida foi o depoente colocado no banco de trás da via-
tura e levado para o 5° Batalhão...”.

O Apelante, Fabio Pereira Rodrigues quando ouvido em


juízo às fls. 38/40, assim declarou:

“...Que a todo tempo o motoqueiro era perseguido pela


guarnição, durante aquela perseguição foram efetuados
disparos de arma de fogo, tanto pelo interrogando
quanto pelo SD PM SAMUEL CARLOS, primeiro acusado;
Que, os disparos foram efetuados para o alto com o ob-
jetivo de intimidar e fazer com que o motoqueiro pa-
rasse...”

O Apelante, Samuel Carlos Santos, quando ouvido em ju-


ízo às fls. 45/46, assim declarou:

“...o interrogando e os colegas de farda foram em per-


seguição ao motoqueiro; que o motoqueiro foi na dire-
ção do bairro conhecido por “Buraco da Gilda”, e ao
descer por uma rua, o interrogando efetuou um disparo
para o alto, com o intuito de intimidá-lo e fazer pa-
rar; que cem ou duzentos metros mais adiante e ainda
em perseguição, o interrogando efetuou o segundo dis-
paro;...”

Vejamos os argumentos utilizados pelo magistrado de


piso, para fundamentar a condenação:
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“(...) De acordo com as informações prestadas pela
testemunha Luciana Pereira Rangel Favalessa (fls. 90),
ao ouvir o primeiro disparo várias crianças brincavam
no local e depois de ouvir um segundo disparo, o rapaz
que foi ouvido gritou por socorro. Já esse rapaz, Ma-
ciel Souza dos Santos , a vítima, informa ter sido
atingido quando procurava se esconder atrás de um
jipe. Assim, independente de para que direção foram
efetuados os disparos, estes vieram a atingir a
vítima, em plena rua.

E, ainda assevera:

“O dolo eventual encontra-se muito bem evidenciado de


sua conduta. Os acusados efetuaram disparos de arma de
fogo numa região habitada, para fazer parar uma moto-
cicleta, que perseguiam porque o condutor inicialmente
fez manobra de “cavalo de pau”, estava sem capacete e
avançou semáforo durante a perseguição policial. Se a
atitude dos acusados não fosse criminosa por si só,
dispensando maiores comentários, de se indagar, usan-
do-se o bom senso, qual o bem maior em confronto, a
vida e a incolumidade física do condutor e de tercei-
ros, ou as regulamentações de trânsito? Obviamente ha-
veria outras maneiras de interceptá-lo, por exemplo,
pedindo apoio a outras guarnições, o que não consta
tenha sido feito.”

Nesse desiderato, analisei detidamente o conteúdo des-


tes autos e pude perceber que as provas coligidas no
processo revelam de forma inconteste que os acusados
efetuaram os disparos, assumindo, assim, o risco de
causar lesões em terceiros.

Ademais, vê-se que os policiais militares agiram de


forma arbitrária, recorrendo ao uso de arma de fogo,
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contra pessoa que não obedeceu à ordem de parar. Res-
salto, por certo, que o caso em análise não se encon-
tra inserto em situações excepcionais.

Certo é, que a indiferença na ocorrência do resultado


previsto pelo agente e a possibilidade de sua verifi-
cação são indicativos que caracterizam o dolo eventual
ficando, desnecessário provar quem desferiu o tiro, já
que concorreram para o resultado, assumindo o risco na
produção do resultado.

Pelo exposto, diante do quadro fático, vê-se de forma


segura que a prova carreada é suficientemente forte
para sustentar um decreto condenatório em desfavor do
Apelante, não subsistindo o argumento utilizado pelo
nobre advogado.

RECURSO DA DEFESA DE FÁBIO PEREIRA RODRIGUES

1- DA DESCLASSIFICAÇÃO – INEXISTÊNCIA DE DOLO – MERA


CULPA

Conforme relatado, a defesa de Fábio Pereira


Rodrigues, busca a desclassificação do crime para o
previsto no artigo 210 do Código Penal Militar.

Conforme já exposto, as provas coligidas no processo


revelam de forma inconteste que os acusados efetuaram
os disparos em via pública, assumindo, assim, o risco
de causar lesões em terceiros, ficando caracterizado o
dolo eventual.

Além do mais, a utilização de arma de fogo para impe-


dir a fuga de um suspeito ou visando a parar veículo,
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sem que haja risco à integridade física do agente po-
licial ou de terceiros, é defeso, principalmente, nas
circunstâncias em que o acusado procedeu, pois se tra-
tava de uma perseguição onde o suspeito transgrediu
regulamentações de trânsito.

Assim, o simples fato de o réu acreditar que o moto-


queiro pudesse fugir da abordagem policial não legiti-
mava a sua conduta, pois o policial militar não pode
colocar em risco um bem maior daquele que está tentan-
do proteger. No caso vertente, indiscutivelmente, hou-
ve esta desproporcionalidade.

Diante do quadro fático, vê-se de forma segura que a


prova carreada é suficientemente forte para sustentar
um decreto condenatório em desfavor do Apelante, não
subsistindo o argumento utilizado pelo nobre advogado.

2- DA DIMINUIÇÃO DE PENA – CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS


TOTALMENTE FAVORÁVEIS.

Alega a defesa, que a imposição da pena acima do míni-


mo legal, se mostra inadequada, devendo ser corrigida
a interpretação do juiz “a quo” no que concerne as du-
as moduladoras da pena, “intensidade do dolo” e “danos
causados”, esperando que seja reformada a sentença,
reduzindo a pena-base para o mínimo legal previsto,
qual seja, 02 (dois) anos.

Quanto ao pedido do apelante, não vejo como assim pro-


ceder, isso porque, o magistrado ao dosar sua pena
ressaltou:

“Tendo em conta a extensa gravidade do delito, no mí-


nimo para a imagem da Corporação junto à população de
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Aracruz, sua personalidade, que é a do homem comum; a
intensidade do dolo em sua conduta; que os danos cau-
sados foram graves; que os meios empregados, a arma de
fogo, e o modo de execução, disparando indevidamente
em via pública, não favorecem; que os motivos para a
ação foram de somenos importância; que as circunstân-
cias de tempo e lugar militam em seu favor; que seus
antecedentes não são maculados e que nada se apurou
com relação a sua atitude após o delito.”

Depois da análise do artigo 59, do Código Penal, o


juiz fixou a pena-base do apelante em 02 (dois) anos e
06 (seis) meses, apenas 06 (seis) meses acima do mí-
nimo legal, para uma pena que poderia variar de 02
(dois) a 08 (oito) anos.

Vejamos a doutrina:

"A imposição da pena está condicionada à culpabilidade


do sujeito. Na fixação da sanção penal, sua qualidade
e quantidade estão presas ao grau de censurabilidade
da conduta" (Damásio Evangelista de Jesus "In" Código
Penal Anotado", Ed. Saraiva, 12ª Edição, 2002, página
206).

“São oito componentes, divididos da seguinte forma: a


culpabilidade, que representa o conjunto dos demais,
acrescida dos antecedentes, da conduta social, da per-
sonalidade, dos motivos, das circunstâncias, das con-
seqüências do crime e do comportamento da vítima.
Logo, se os sete elementos inseridos no quadro da cul-
pabilidade forem favoráveis teremos menor censurabili-
dade; se forem desfavoráveis, encontraremos maior cen-
surabilidade” (Guilherme de Souza Nucci, “in” Manual
de Direito Penal, 2ª Edição, Editora RT, 2006, página
416).
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Dessa forma, sendo vários os componentes desfavorá-


veis, o apelante não poderia ter sua pena dosada no
mínimo legal, agindo com acerto o magistrado de piso,
demonstrando total equilíbrio na aplicação da pena,
não havendo, portanto, que se falar em pena exacer-
bada.

3-DA AUTORIA INCERTA OU COLATERAL – CRIME TENTADO

O Apelante argumenta que o crime deveria ser tipifica-


do na forma tentada, pleiteando a redução da pena em
2/3 (dois terços), nos termos do artigo 30 do Código
Penal Militar, tendo em vista que não se determinou
quem foi o autor do disparo que vitimou o Sr. Maciel
Souza dos Santos.

Pois bem, de fato não se determinou quem foi o autor


do disparo que vitimou o Sr. Maciel Souza Santos, pois
o projétil que atingiu a vítima não pode ser retirado
de seu corpo, para ser submetida à prova pericial sem
causar-lhe lesões graves, conforme descrito no laudo
de fls. 50.

Assim, na lição de Rogério Greco, temos:

“dessa autoria colateral surgirá uma outra, chamada


autoria incerta. Sabe-se quem são os possíveis
autores, mas não se consegue concluir (...) quem foi o
produtor do resultado. Daí dizer-se que a autoria é
incerta”. (GRECO, 2002, pág. 438).
Também elucidando o assunto, trago a lição de Luiz
Flávio Gomes:
“Ocorre autoria colateral quando várias pessoas execu-
tam o fato (contexto fático único) sem nenhum vínculo
subjetivo entre elas. Exemplo: policiais de duas via-
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turas distintas, sem nenhum acordo ou vínculo entre
eles, abusivamente, disparam contra vítima comum, que
vem a falecer em razão de um dos disparos.”
“Autoria incerta (ou autoria com resultado incerto):
se dá quando, na autoria colateral, não se descobre
quem produziu o resultado ofensivo ao bem jurídico.
Exemplo: vários policiais disparam suas armas contra
vítima comum e não se descobre quem efetivamente foi o
autor do disparo letal. (....) Diante da impossibili-
dade de se descobrir o autor do disparo letal, todos
devem responder por tentativa de homicídio (apesar da
morte da vítima). Punir todos por homicídio consumado
é um absurdo porque apenas um dos disparos foi letal.
Deixá-los impunes tampouco é admissível. Logo, a solu-
ção nesse caso menos ruim é a consistente em punir to-
dos por tentativa.” (GOMES, Luiz Flávio. Espécies de
autoria em direito penal . Jus Navigandi, Teresina,
ano 10, n. 982, 10 mar. 2006. Disponível em:
<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=8081>.
Acesso em: 18 maio 2009.)
Após analisar detidamente os autos, neste ponto tenho
que razão assiste ao nobre causídico, motivo pelo
qual, dou provimento ao apelo para reformar a sentença
do magistrado de piso, aplicando a causa de diminuição
de pena contida no artigo 30, inciso II, do Código Pe-
nal Militar.

Passo à dosimetria da pena.

No que tange à pena base aplicada, observo que a mesma


não deve ser modificada, uma vez que a magistrada de
piso analisou corretamente todos os critérios legais
previstos no artigo 59 do Código Penal.

Deste modo, parto da pena-base de 02 (dois) anos e 06


(seis) meses de reclusão, para fazer nova dosimetria.
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Constato a ausência de circunstâncias atenuantes e


agravantes

Passo à verificação de causas de aumento ou diminuição


de pena: reconheço existente a causa de diminuição,
prevista no artigo 30, inciso II, do Código Penal Mi-
litar. Aplico a fração de 1/2 (meio) para calcular a
redução cabível, o que transforma em definitiva a pena
de 01 (um) ano e 06(seis) meses de reclusão, no regime
aberto.

Tendo reconhecido a tentativa, em virtude da autoria


incerta, estendo os efeitos para o co-réu, SAMUEL
CARLOS SANTOS, aplicando, assim, a fração de 1/2
(meio) para calcular a redução cabível, o que trans-
forma em definitiva a pena de 01 (um) ano e 06(seis)
meses de reclusão, no regime aberto.

Mantenho os demais termos da sentença.

CONCLUSÃO

Diante do exposto, dou provimento parcial ao recurso


da defesa de FÁBIO PEREIRA RODRIGUES, estendendo os
efeitos para o co-réu, SAMUEL CARLOS SANTOS, para
aplicar a causa de diminuição prevista no artigo 30,
II – Tentativa – do Código Penal Militar, aplicando a
fração de (1/2) meio, o que transforma em definitiva a
pena de 01 (um) ano e 06(seis) meses de reclusão, no
regime aberto.

É como voto.

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V O T O S

O SR. DESEMBARGADOR SERGIO BIZZOTTO PESSOA DE


MENDONÇA (REVISOR):-
Eminente Presidente, estudei esse processo com
toda a boa vontade, no sentido de tentar considerar
que teria havido não bem um dolo eventual, mas uma
culpa consciente.
A prova foi direcionada no sentido de eviden-
ciar que os disparos foram efetuados, sim, em direção
a motocicleta e não em outra direção, porque houve uma
alegação no sentido de que o disparo foi efetuado para
o alto, mas depois essa prova veio a perder sintonia
com uma outra melhor, no sentido de que não, os dispa-
ros foram efetuados, sim, em direção àquela pessoa que
está detida.
Depois disso, é que a técnica da defesa mudou.
Então, não se procurou tentar esconder, omitir
o fato de que os disparos foram efetuados em direção
àquela pessoa, mas no sentido de que essa conduta foi,
não dolosa, mas culposa. Mas entendo que não.
Ainda que não tenha havido uma posição uníssona
com referência a autoria do disparo, alguns querem,
sim, culpar no sentido de que somente um efetuou os
disparos e os outros não teriam culpa da coisa.
Temos que reconhecer que havia um contexto. Os
policiais estavam em perseguição.
Muito bem. Essa situação do dolo eventual, pa-
rece-me certa. Não podemos considerar a conduta somen-
te como de culpa consciente, porque havia o risco de
ser a pessoa atingida. Esse risco foi assumido e assim
mesmo não se procurou evitá-lo.
Penso que V.Exª está correto. Procurei uma si-
tuação em razão das consequências extrapenais para os
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acusados, procurei de todas as formas tentar entender
que o caso foi culposo e desclassificar o delito do
art. 210, mas realmente não consegui.
Entendo que houve realmente dolo eventual e não
a culpa consciente, acho que a condenação está justa e
acompanho o voto de V.Exª.

O SR. DESEMBARGADOR BENÍCIO FERRARI:-


Eminente Presidente, só estou em dúvida com re-
ferência ao cumprimento da pena que não ficou estipu-
lado.

O SR. DESEMBARGADOR PEDRO VALLS FEU ROSA (RELA-


TOR):-
Ficou em um ano e seis meses.

O SR. DESEMBARGADOR BENÍCIO FERRARI:-


Em que regime seria?

O SR. DESEMBARGADOR PEDRO VALLS FEU ROSA (RELA-


TOR):-
Em regime aberto.

*
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O SR. DESEMBARGADOR BENÍCIO FERRARI:-


Porque isso não foi mencionado.

O SR. DESEMBARGADOR PEDRO VALLS FEU ROSA (RELA-


TOR):-
Não, mas está no voto.

O SR. DESEMBARGADOR BENÍCIO FERRARI:-


Acompanho o voto de V.Exª.

D E C I S Ã O

Como consta da ata, a decisão foi a seguinte: à


unanimidade, dar provimento parcial ao recurso.

* *

rpm*

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