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Anatomia dos Sistemas

Autores: Prof. Cassio Marcos Vilicev


Prof. Helder Cravo da Costa
Colaboradoras: Profa. Renata Guzzo Souza Belinelo
Profa. Raquel Machado Cavalca Coutinho
Profa. Laura Cristina da Cruz Dominciano
Professores conteudistas: Cassio Marcos Vilicev e Helder Cravo da Costa

Cassio Marcos Vilicev

Doutor em Ciências pela Faculdade de Medicina Veterinária da Universidade de São Paulo (2013). Mestre em
Ciências pelo Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo (2005). Possui especialização em
Educação a Distância pela Universidade Paulista – UNIP (2012) e especialização em Didática do Ensino Superior pela
Universidade Sant’Anna (1999). É graduado em Educação Física pela Universidade de Mogi das Cruzes (1989) e em
Fisioterapia (1998) pela Universidade Bandeirante de São Paulo.

Sua carreira profissional começou como professor de Educação Física em escolas particulares de São Paulo, onde
permaneceu de 1990 a 1998. Dedica-se à Universidade Paulista – UNIP e à Faculdade Santa Rita de Cássia, desde
2004, como professor titular dos cursos de Graduação e Pós-Graduação em Odontologia, Fisioterapia, Enfermagem,
Nutrição e Educação Física. É líder das disciplinas de Anatomia Humana, Cinesiologia e Semiologia desde 2006. Tem
vários trabalhos publicados em diversas áreas das Ciências Biomédicas.

Helder Cravo da Costa

Mestre em Ciências Morfofuncionais pelo Instituto de Ciências Biológicas da Universidade de São Paulo (2013).
Possui especialização em Treinamento Esportivo pela Universidade do Norte do Paraná (1999). Graduado em Educação
Física pela Faculdade de Educação Física de Sorocaba – Associação Cristã de Moços (1998) e em Biomedicina pelo
Centro Universitário Nossa Senhora do Patrocínio – Itu (2010).

Sua carreira profissional começou como professor de musculação em academias e preparador físico das equipes
de base representativas da cidade de Sorocaba entre 1998 e 2002. Atuou como professor de anatomia em cursos
técnicos da área da saúde: Enfermagem, Radiologia, Instrumentação Cirúrgica e Nutrição de 2000 a 2010. Dedica‑se à
Universidade Paulista – UNIP como professor assistente dos cursos de Educação Física, Fisioterapia, Nutrição, Psicologia,
Radiologia, Enfermagem e Biomedicina, desde 2008, nas disciplinas de Anatomia Humana, Citologia, Histologia,
Bioquímica, Fisiologia, Neurofisiologia e Patologia.

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

V711a Vilicev, Cassio Marcos.

Anatomia dos sistemas / Cassio Marcos Vilicev, Helder Cravo da


Costa. – São Paulo: Editora Sol, 2019.

256 p., il.

Nota: este volume está publicado nos Cadernos de Estudos e


Pesquisas da UNIP, Série Didática, ano XXV, n. 2-078/19, ISSN 1517-9230.

1. Sistema nervoso. 2. Sistema digestório. 3. Sistemas genitais.


I. Título.

CDU 612

U500.58 – 19

© Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma e/ou
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Unip Interativa – EaD

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Prof. Dr. Luiz Felipe Scabar
Prof. Ivan Daliberto Frugoli

Material Didático – EaD

Comissão editorial:
Dra. Angélica L. Carlini (UNIP)
Dra. Divane Alves da Silva (UNIP)
Dr. Ivan Dias da Motta (CESUMAR)
Dra. Kátia Mosorov Alonso (UFMT)
Dra. Valéria de Carvalho (UNIP)

Apoio:
Profa. Cláudia Regina Baptista – EaD
Profa. Betisa Malaman – Comissão de Qualificação e Avaliação de Cursos

Projeto gráfico:
Prof. Alexandre Ponzetto

Revisão:
Ana Fazzio
Rose Castilho
Juliana Mendes
Sumário
Anatomia dos Sistemas

APRESENTAÇÃO.......................................................................................................................................................9
INTRODUÇÃO......................................................................................................................................................... 10

Unidade I
1 ORGANIZAÇÃO DO SISTEMA NERVOSO.................................................................................................. 12
1.1 As origens da neuroanatomia.......................................................................................................... 13
1.2 Introdução à terminologia da neuroanatomia......................................................................... 78
1.3 Divisão do SN.......................................................................................................................................... 80
1.3.1 Divisão do SN com base nos critérios anatômicos.................................................................... 81
1.3.2 Divisão do SN do ponto de vista funcional.................................................................................. 85
1.3.3 Divisão do SN com base na segmentação ou metameria....................................................... 86
1.4 Papéis do SN............................................................................................................................................ 86
1.5 O tecido nervoso.................................................................................................................................... 87
1.5.1 Visão geral dos neurônios.................................................................................................................... 88
1.5.2 Classificação dos neurônios................................................................................................................ 90
1.5.3 Sinapses....................................................................................................................................................... 91
1.5.4 Arco reflexo................................................................................................................................................ 91
1.5.5 Neurogênese no SNC............................................................................................................................. 93
1.5.6 Lesão e reparo no SNP........................................................................................................................... 94
1.6 Neuroglias................................................................................................................................................ 94
1.6.1 Neuroglias no SNC.................................................................................................................................. 94
1.6.2 Neuroglias no SNP.................................................................................................................................. 96
2 SISTEMA NERVOSO CENTRAL...................................................................................................................... 97
2.1 Generalidades sobre o encéfalo...................................................................................................... 97
2.2 Morfogênese do SN............................................................................................................................100
2.2.1 Da fertilização até a nidação............................................................................................................101
2.2.2 Folhetos embrionários.........................................................................................................................103
2.2.3 Formação do SN.....................................................................................................................................104
2.3 Anatomia da medula espinal..........................................................................................................106
2.4 Anatomia do bulbo.............................................................................................................................112
2.5 Anatomia da ponte.............................................................................................................................115
2.6 Anatomia do mesencéfalo...............................................................................................................117
2.7 Anatomia do diencéfalo...................................................................................................................119
2.7.1 O tálamo................................................................................................................................................... 120
2.7.2 O hipotálamo.......................................................................................................................................... 123
2.7.3 O epitálamo............................................................................................................................................. 129
2.7.4 O subtálamo............................................................................................................................................ 130
2.8 Anatomia do telencéfalo..................................................................................................................131
2.8.1 Lobos do telencéfalo........................................................................................................................... 132
2.8.2 Os núcleos da base............................................................................................................................... 135
2.8.3 As áreas corticais.................................................................................................................................. 137
2.8.4 O mapa citoarquitetônico do córtex cerebral........................................................................... 138
2.8.5 O homúnculo de Penfield.................................................................................................................. 139
2.9 Anatomia do cerebelo.......................................................................................................................141
2.10 O sistema ventricular......................................................................................................................143
2.11 Barreiras encefálicas........................................................................................................................144
2.12 A nutrição sanguínea do encéfalo.............................................................................................144
3 SISTEMA NERVOSO AUTÔNOMO.............................................................................................................146
3.1 As diferenças anatômicas, fisiológicas e farmacológicas
relevantes entre as partes simpática e parassimpática do SNA..............................................147
3.1.1 Diferenças anatômicas....................................................................................................................... 147
3.1.2 Diferenças fisiológicas........................................................................................................................ 148
3.1.3 Diferenças farmacológicas................................................................................................................ 149
3.2 Papéis do SNA.......................................................................................................................................151
3.3 Reações do SNA...................................................................................................................................152
3.4 Sistema nervoso entérico.................................................................................................................154
4 SISTEMA NERVOSO PERIFÉRICO...............................................................................................................155
4.1 Os nervos periféricos..........................................................................................................................155
4.2 Os gânglios.............................................................................................................................................157
4.3 As terminações nervosas..................................................................................................................158

Unidade II
5 SISTEMA DIGESTÓRIO: PARTE SUPRADIAFRAGMÁTICA.................................................................164
5.1 A boca e os anexos.............................................................................................................................164
5.2 A faringe.................................................................................................................................................174
5.3 O esôfago................................................................................................................................................176
6 SISTEMA DIGESTÓRIO: PARTE INFRADIAFRAGMÁTICA...................................................................177
6.1 O estômago............................................................................................................................................177
6.2 O intestino delgado............................................................................................................................179
6.3 O intestino grosso...............................................................................................................................181
6.4 O mesentério.........................................................................................................................................183
6.5 O reto e o ânus.....................................................................................................................................184
6.6 O fígado...................................................................................................................................................186
6.7 A vesícula biliar....................................................................................................................................188
6.8 Os ductos extra‑hepáticos...............................................................................................................188
6.9 O pâncreas..............................................................................................................................................189
6.10 O baço....................................................................................................................................................189
6.11 O peritônio...........................................................................................................................................190
Unidade III
7 SISTEMA URINÁRIO.......................................................................................................................................194
7.1 Os rins......................................................................................................................................................194
7.2 Os ureteres.............................................................................................................................................198
7.3 A bexiga urinária.................................................................................................................................199
7.4 A uretra....................................................................................................................................................200
8 SISTEMAS GENITAIS MASCULINO E FEMININO..................................................................................201
8.1 Sistema genital masculino..............................................................................................................201
8.1.1 Os testículos.............................................................................................................................................201
8.1.2 Os epidídimos......................................................................................................................................... 203
8.1.3 O funículo espermático...................................................................................................................... 203
8.1.4 Os ductos deferentes........................................................................................................................... 204
8.1.5 O escroto.................................................................................................................................................. 204
8.1.6 As glândulas seminais......................................................................................................................... 205
8.1.7 Os ductos ejaculatórios...................................................................................................................... 205
8.1.8 A próstata................................................................................................................................................ 205
8.1.9 As glândulas bulbouretrais................................................................................................................ 205
8.1.10 O sêmen.................................................................................................................................................. 206
8.1.11 O pênis..................................................................................................................................................... 206
8.1.12 A ereção................................................................................................................................................. 208
8.2 Sistema genital feminino.................................................................................................................210
8.2.1 A vagina..................................................................................................................................................... 211
8.2.2 O útero.......................................................................................................................................................212
8.2.3 As tubas uterinas...................................................................................................................................214
8.2.4 Os ovários..................................................................................................................................................215
8.2.5 Os órgãos genitais externos..............................................................................................................216
8.2.6 As mamas..................................................................................................................................................217
APRESENTAÇÃO

Caro aluno,

Neste livro-texto, iremos continuar o estudo da anatomia humana, focando o sistema nervoso, o
sistema digestório, o sistema urinário e os sistemas genitais masculino e feminino.

Dentro do sistema nervoso, estudaremos os órgãos que são compostos por tecido nervoso, como o
encéfalo, a medula espinal e os nervos, destacando os neurônios, as células da glia e as vias aferentes e
eferentes de condução do impulso nervoso e suas terminações nervosas. Além disso, aprenderemos as
divisões anatômicas do sistema nervoso e a divisão fisiológica.

Do ponto de vista anatômico, veremos os sistema nervoso central e o sistema nervoso periférico,
enfatizando as características morfofuncionais de cada estrutura.

Do ponto de vista fisiológico, compreenderemos as divisões somática e visceral. A integração


anatômica e fisiológica desse sistema é de suma importância para entendermos o funcionamento do
sistema nervoso.

Estudaremos também o sistema digestório, que realiza o processamento dos alimentos para extração
dos seus nutrientes. Esse sistema é formado por uma sequência de órgãos tubulares, com uma entrada e
uma saída específica, o qual será responsável por uma série de processos físicos e químicos, permitindo
o processamento e a absorção dos nutrientes.

Alguns órgãos que fazem parte desse processo são: boca, faringe, esôfago, estômago, intestino
delgado e intestino grosso. Além disso, alguns outros órgãos são considerados anexos ao sistema
digestório, mas desempenham papéis fundamentais para o processo digestivo: glândulas da boca,
dentes, língua, pâncreas, fígado e vesícula biliar.

O metabolismo celular produz uma série de metabólitos e excretas que devem ser extraídos do
nosso organismo. Assim, o sistema urinário desempenhará esse papel fundamental na homeostasia dos
líquidos corporais. A partir de um processo de filtração, os rins fazem a depuração do sangue produzindo
a urina – um veículo aquoso que transportará os resíduos solúveis.

Após a sua formação, a urina será transportada dos rins para a bexiga urinária por meio dos ureteres,
onde será temporariamente estocada para sua futura eliminação para o meio externo através da uretra.

Tanto no homem quanto na mulher, esses órgãos possuem características semelhantes, exceto a uretra,
que, no sexo masculino, apresenta papéis e características anatômicas particulares, como servir de passagem
para a urina e o sêmen, apresentando, assim, uma interface entre sistemas urinário e genital.

A respeito desse último, estudaremos os órgãos que são responsáveis pela reprodução, destacando os genitais
masculinos, pelos quais serão transportados os espermatozoides até os genitais femininos, onde ocorrerá o
encontro com o ovócito, promovendo a sua fertilização e o futuro desenvolvimento em embrião e feto.
9
INTRODUÇÃO

Esta disciplina Anatomia dos Sistemas objetiva servir como base e recurso aos estudantes que buscam
carreiras relacionadas à área da saúde, entre elas Enfermagem, Nutrição, Fisioterapia e Educação Física.
Este livro-texto representa uma introdução imprescindível à anatomia humana para os estudantes. O
foco é favorecer os conhecimentos aplicados das estruturas anatômicas do organismo humano e noções
sobre as bases para aplicação de outras disciplinas básicas. Retratamos, neste material, conhecimentos
práticos que possibilitarão aos estudantes da área da saúde o uso de fatos concernentes às circunstâncias
reais com que eles poderão deparar na profissão que escolheram.

Após a unidade inicial subdividida em neuroanatomia, seguem mais duas unidades abrangendo
os aspectos anatômicos, funcionais e clínicos do sistema digestório e do aparelho urogenital. Todos os
capítulos são acompanhados de Saiba Mais, Leituras Obrigatórias, Lembretes e Observações, que facilitarão
sobremodo a memorização dos temas principais. As fotografias, tal como as figuras apresentadas e
ricamente legendadas, ilustram bem as características de cada tema complementando o aprendizado.

A revisão terminológica, relevante num livro dessa natureza, abrangendo a versão dos epônimos
muito utilizados na clínica médica, está resguardada tecnicamente pela terminologia anatômica. Há,
ainda, notas explicativas com termos e expressões definidos, facilitando sobremodo a compreensão do
texto, mesmo para os principiantes ainda não familiarizados com a terminologia da área.

Por fim nos direcionamos aos estudantes da área da saúde: no primeiro dia em que você avalia
um paciente ou põe as mãos sobre ele, carece de um conhecimento básico de anatomia humana
para elucidar suas observações. É na anatomia que você descobre a linguagem científica básica que o
conduzirá ao longo de toda a sua carreira profissional e possibilitará a você dialogar com seus colegas
de uma equipe multidisciplinar.

10
ANATOMIA DOS SISTEMAS

Unidade I
Você̂ está dirigindo pela autoestrada e ouve um forte ruído à sua esquerda. Prontamente desvia
para a direita. Matheus deixa uma anotação na mesa da cozinha: “Vejo você mais tarde. Fique com
tudo pronto às 19 horas” – você sabe que “tudo pronto” é o jantar para os convidados. Você está
dormitando, porém logo acorda e imediatamente o seu bebê começa a choramingar. O que tais fatos
têm em comum? Eles são exemplos diários do funcionamento de seu sistema nervoso (SN), que traz
quase que permanentemente suas células corporais em atividade.

O SN é o sistema regente de controle e comunicação do organismo. Todo pensamento, ato e emoção


refletem a sua atividade. Suas células se comunicam por sinais elétricos e químicos, os quais são velozes
e específicos, geralmente promovendo respostas instantaneamente.

Com somente 2 quilogramas de peso, cerca de 3% da massa corporal total, o SN é um dos menores,
todavia mais complexos, dos 12 sistemas corporais. Essa rede de bilhões de neurônios e um número
ainda maior de células da neuroglia está organizada em duas subdivisões principais: o sistema nervoso
central (SNC) e o sistema nervoso periférico (SNP).

Encéfalo

Medula espinal

Nervos espinais

Figura 1 – SNC e SNP

Observação

Os neurônios são células especializadas para a condução e a transmissão


de sinais elétricos no SN. Já as células da neuroglia ajudam os neurônios a
realizarem seus papéis – os astrócitos e os oligodendrócitos, por exemplo
– no SNC, bem como as células de Schwann e as células satélites no SNP.
11
Unidade I

Lembrete

O SNC corresponde ao encéfalo e à medula espinal dos vertebrados, e o


SNP corresponde aos neurônios, às células da neuroglia, aos gânglios e aos
nervos cranianos e espinais que se situam fora do SNC.

Conquanto seja muitas vezes comparado a um computador, o SN é bem mais complexo e mutável
do que qualquer dispositivo eletrônico. Ainda assim, como em um computador, o veloz fluxo de
dados e a alta atividade de processamento dependem de atividade elétrica. Porém, diferentemente
do computador, partes do cérebro apresentam a capacidade de reorganizar as conexões elétricas
anteriormente estabelecidas conforme a chegada de novos dados, de tal modo que compõem parte do
processo de aprendizagem.

Em conjunto com os órgãos endócrinos, o SN controla e adequa as atividades de outros sistemas.


Esses dois sistemas partilham relevantes características estruturais e funcionais. Ambos dependem
de alguma maneira de comunicação química com tecidos e órgãos-alvo, e habitualmente agem de
maneira complementar.

Assim, o SN normalmente age provendo ligeiras e sucintas respostas a estímulos, alterando


provisoriamente as atividades de outros sistemas orgânicos. A resposta pode ser praticamente
imediata, ou seja, em poucos milissegundos, e os fins esvaecem logo após interromper a
atividade nervosa. Em compensação, as respostas endócrinas caracteristicamente possuem
desenvolvimento mais brando do que as do SN, porém comumente persistem mais tempo, ou
seja, horas, dias ou anos. Os órgãos endócrinos modulam a atividade metabólica dos demais
sistemas em resposta à disponibilidade de nutrientes e à demanda energética. Eles também
coordenam processos ininterruptos por longos períodos, isto é, de meses a anos, como o
crescimento e o desenvolvimento.

Lembrete

Os órgãos endócrinos são responsáveis pela produção de hormônios,


lançados diretamente na corrente sanguínea, atingindo determinados
tecidos-alvo.

1 ORGANIZAÇÃO DO SISTEMA NERVOSO

A neuroanatomia denota o estudo do SN. Ela apresenta o nome de sistema porque é composta
por um tecido fundamental que é o tecido nervoso, o qual, por sua vez, é composto de células
nervosas designadas de neurônios. Os neurônios, portanto, são as unidades morfofuncionais
desse sistema.

12
ANATOMIA DOS SISTEMAS

1.1 As origens da neuroanatomia

Conceberemos qual poderia ter sido um dos primeiros instrumentos dos homens das cavernas
para observar o sistema neural central, a “inauguração da neuroanatomia” com outro nome. Os
homens das cavernas, quiçá, montaram um “machado” com uma extremidade distal esférica
e uma extremidade proximal cilíndrica para empunhá-lo e erguê-lo. Ao abaixá-lo com força
sobre o cume da cabeça de algum desafeto, abria-lhe o crânio mais como arma do que como
uma ferramenta cirúrgica. Prontamente, vieram muitos séculos antes dos instrumentos mais
adequados, como o trépano, uma técnica cirúrgica na qual “buracos” foram efetuados no crânio
do indivíduo para abrandar a pressão intracraniana determinada por traumatismo craniano, de
tal modo que essa técnica tivesse sido realizada para abrir os crânios com finalidades mais
nobres, ou seja, as terapêuticas, contribuindo assim para o alívio e a sobrevivência dos indivíduos,
conforme ilustra a figura seguir.

Figura 2 – Trepanação

Os egípcios desenvolveram informações aprofundadas de anatomia e fisiologia. Entretanto,


não consideravam o cérebro relevante. A primeira citação do cérebro designadamente como órgão
ocorreu nos papiros do antigo Egito. Os papiros são documentos preciosos, pois relatam a literatura
médica mais antiga do mundo. Eles demonstram uma medicina baseada em evidências e apresentam
descrições das doenças cardíacas, digestivas, pulmonares e nervosas. Além dos papiros, as esculturas
egípcias, de aproximadamente 1500 a.C., também deixaram seu legado relacionado aos aspectos
de saúde, uma vez que mostram, por exemplo, degenerações tróficas em partes do organismo, que
significam um comprometimento de estruturas neuroanatômicas secundárias a patologias nervosas,
como acontece em membros inferiores com amiotrofia típica nos casos de poliomielite, conforme
ilustra a figura seguinte.
13
Unidade I

Figura 3 – Placa de calcário representando um indivíduo com deficiência física

Observação

A poliomielite é uma doença infecciosa aguda causada pelo poliovírus,


que danifica o SNC e leva à destruição de neurônios motores, resultando
em paralisia flácida.

O surgimento dos filósofos na Grécia e as escolas de medicina, por volta do século 5 a.C., levaram
ao o caminho necessário para a efetivação de investigações sobre a anatomia humana. Para Platão,
o cérebro era “a nossa parte mais divina”. Assim, ele seguiu a teoria cefalocêntrica, segundo a qual o
cérebro era o centro da alma. Platão adotou o termo enkephalon. Em seus estudos, ele descreveu os
giros e os sulcos cerebrais, conforme ilustra a figura seguinte.

Observação

O termo giro não era conhecido pelos gregos ou romanos. Até o


início do século XIX, essas estruturas anatômicas eram designadas
de circunvoluções.

14
ANATOMIA DOS SISTEMAS

Sulco frontal superior

Sulco frontal inferior Giro frontal superior

Giro frontal médio


Sulco pré-central

Giro pré-central
Sulco central

Giro pós-central
Sulco pós-central

Sulco intraparietal

Figura 4 – Vista superior dos giros e dos sulcos cerebrais

Saiba mais

Você gostaria de saber um pouco mais sobre o tema? Leia este artigo
sobre o legado de Hipócrates e do Corpus hippocraticum no período
abrangido entre os séculos V e IV a.C. até o período greco-romano, com
Galeno, em II d.C.

REBOLLO, R. A. O legado hipocrático e sua fortuna no período


greco‑romano: de Cós a Galeno. Scientiae Studia, São Paulo, v. 4, n. 1,
p. 45-82, 2006. Disponível em: <http://www.revistas.usp.br/ss/article/
view/11067>. Acesso em: 4 set. 2016.

Alcméon, da escola de medicina de Crotona, foi o primeiro a motivar a noção anatômica a


partir de observações experimentais. Ele considerava que o cérebro era o centro de emoções,
conhecimento, mente e alma, e integrou os papéis dos órgãos dos sentidos ao cérebro. Segundo
Alcméon, todos os vasos sanguíneos originavam-se da cabeça e seu papel era distribuir o pneuma,
ou seja, a origem da alma e da vida ao cérebro.

Contudo, outros filósofos acreditavam que o pneuma fosse distribuído ao cérebro diretamente
da respiração nasal. Alcméon cometeu alguns erros bizarros, por exemplo: achava que o
espermatozoide fosse parte do cérebro do homem desde os 14 anos de idade. Em dissecções de
animais, ele descobriu o nervo óptico e as tubas auditivas, afirmando erroneamente que as cabras
respiravam pela orelha.
15
Unidade I

Surge então a figura lendária de Hipócrates de Cós, considerado o “pai da medicina”. No campo
da anatomia, nada efetuou de relevante. A base fundamentada de seu ensinamento é “teres aos
deuses o direito de viver e confiá-los aos homens”. Atribui-se a Hipócrates uma ampla coleção de
trabalhos médicos, enquanto outros são conferidos a discípulos seus e a outros autores.

Figura 5 – Escultura de Hipócrates

Os conhecimentos sobre o SN na medicina hipocrática são muito deficitários. As ideias de anatomia e


fisiologia são inconsistentes; sabia-se que o cérebro era constituído de duas metades divididas por uma
membrana e que fazia continuidade com a medula espinal. Conforme a teoria dos quatro humores, o
cérebro seria a fonte da fleuma. As meninges eram bem conhecidas pela conjuntura que proporcionava
o tratamento cirúrgico dos casos de traumatismo craniano. A trepanação era utilizada com assiduidade.

Observação
As meninges são revestimento do SNC originado do mesênquima e de
células da crista neural. Há três meninges: dura-máter, aracnoide-máter e
pia-máter, conforme ilustram as figuras 6, 7 e 8.

Figura 6 – Dura-máter

16
ANATOMIA DOS SISTEMAS

Figura 7 – Aracnoide-máter

Figura 8 – Pia-máter

O cérebro é reconhecido como o centro receptor das sensações. No livro Dos Lugares no
Homem, de Hipócrates, depara-se com a seguinte observação a propósito dos sentidos da audição
e do olfato:

A meninge é perfurada no ponto através do qual nós escutamos. [...] Esta


é a única perfuração da membrana que protege o cérebro. Na região das
narinas não existe perfuração, porém uma espécie de porosidade, parecida
a uma esponja; por este motivo um indivíduo escuta a uma distância maior
do que aquela em que ele sente os cheiros (HIPÓCRATES, 1995, p. 23 apud
REZENDE, 2009, p. 62).

Nessa época, o termo neuron empregava-se especialmente aos tendões, que eram confundidos com
os nervos. Reconheciam-se tão somente os nervos mais facilmente identificáveis, como o óptico, o
acústico, o trigêmeo, o vago, o plexo braquial e os nervos ulnar e isquiático.

17
Unidade I

Lembrete

O V par de nervo craniano, ou nervo trigêmeo, apresenta componentes


sensitivos para a sensibilidade geral da face e componentes motores para
os músculos da mastigação.

O X par de nervo craniano, ou nervo vago, possui componentes


sensitivos para as vísceras torácicas e abdominais, e componentes motores
para os músculos da faringe e da laringe.

Saiba mais

Você sabia que a lombalgia ocupacional gera influências negativas


na performance das atividades laborais e de vida na equipe de
Enfermagem e que a lombalgia está relacionada com o nervo isquiático?
O profissional de Enfermagem que deseja assistir, tratar e cuidar do
outro também precisa de cuidados, fazendo-se necessário que suas
condições de saúde física, mental e espiritual estejam em equilíbrio.
Portanto, recomendamos a leitura do artigo científico:

BORGES, T. P.; et al. Aplicação da massagem para lombalgia ocupacional


em funcionários de Enfermagem. Revista Latino‑Americana de Enfermagem,
Ribeirão Preto, v. 20, n. 3, p. 511-9, maio/jun. 2012. Disponível em: http://
www.scielo.br/scielo.php?pid=S0104-11692012000300012&script=sci_
abstract&tlng=pt. Acesso em: 10 set. 2016.
Em outro livro, Da Natureza do Homem, Hipócrates propunha uma conexão entre o cérebro e a
doença sagrada, a epilepsia. Para ele, essa patologia era uma modificação advinda do cérebro que tinha
como causa fatores naturais – a suposição de uma origem divina era consequência da inexperiência
humana. Cada uma das doenças possuía uma causa própria, decorrente de fatores externos.

Seu texto renuncia às superstições e às bruxarias que rodeavam a doença, e Hipócrates não acreditava
que o “homem pudesse ser vitimado por um deus, representado de derradeira perfeição”, expressando,
assim, que a doença era hereditária e a sua origem estava situada no cérebro. Como tal, não precisava
ser tratada com feitiçaria, mas com dieta e drogas.

Outro anatomista importante no período grego foi o filósofo Aristóteles. Ele realizou centenas de
dissecções em animais, porém aparentemente não teve a oportunidade de dissecar cadáveres humanos.
Aristóteles dá excelentes descrições de alguns órgãos, sob o ponto de vista da anatomia comparada.
Essas descrições foram, eventualmente, ilustradas com desenhos. Ele cometeu vários equívocos ao
sustentar a teoria cardiocêntrica egípcia (quadro a seguir). Aristóteles dizia que o coração era o órgão
18
ANATOMIA DOS SISTEMAS

mais formidável do organismo, a sede da alma e também da inteligência. Ele falava que de todas as
partes do organismo não havia nenhuma tão fria como o cérebro, além de a mais seca e que apresenta
menos sangue, servindo o cérebro somente para o resfriamento do sangue.

Quadro 1 – Estudiosos gregos influentes que apoiavam a doutrina cardiocêntrica

Teoria Cardiocêntrica

Aristóteles Praxágoras Diócles

IV século a. C.
Crisipo Zenão
III século a. C.
Estoicos
II século a. C.
Ateneu
I século a. C.

Adaptado de: Crivelatto e Domenico (2007).

Quando Atenas perdeu sua soberania, o centro médico de maior notabilidade na história da
humanidade foi, sem dúvida, Alexandria, no Egito. Fundada por Alexandre, o Grande, apresentou-se
como uma cidadela onde os melhores intelectos da Antiguidade fundamentaram os alicerces para o
estudo sistemático da matemática, da física, da astronomia, da literatura, da geografia, da biologia e da
medicina. Sua grandiosa biblioteca foi utilizada para arquivar mais de 500 mil papiros. Lá se encontravam
cópias de todos os textos escritos pelos filósofos e médicos gregos.

Figura 9 – A grande biblioteca de Alexandria

19
Unidade I

A escola de medicina de Alexandria floresceu devido à decadência progressiva da escola de medicina


de Cós. As necessidades dos conhecimentos médicos fizeram que se tornasse imprescindível a prática
de dissecação humana, até então proibida pelos gregos. A autorização da dissecação em Alexandria
aconteceu durante a primeira metade do século III a.C., onde, pela primeira vez, a anatomia efetivou-se
como uma disciplina. Esse parêntese da história foi interrompido após a renovação religiosa adivinda
com o catolicismo, que se opôs à manipulação de cadáveres humanos.

Os dois primeiros e maiores professores de anatomia no período Alexandrino foram Herófilo da


Macedônia e Erasístrato de Cós. Eles dissecaram cadáveres de condenados à morte e descreveram
cuidadosamente suas estruturas anatômicas. Herófilo foi reputado por Galeno como referência em
anatomia. Considerado como o “açougueiro de homens”, realizou aproximadamente 600 dissecações
em cadáveres humanos, e os meios utilizados por ele afrontaram os seus contemporâneos. Murmúrios
públicos denuncianaram Herófilo de praticar vivissecção com a autorização do faraó Ptolomeu.
Entretanto, há possibilidades de a informação dessa prática realizada por ele não apresentar um fundo de
verdade, pois a inveja de seus opositores poderia ter afetado negativamente o humor desses indivíduos.

Figura 10 – Herófilo da Macedônia

Figura 11– Erasístrato de Cós

20
ANATOMIA DOS SISTEMAS

Lembrete

Vivissecção é a ação de dissecar um indivíduo vivo com a finalidade de


efetuar estudos de natureza morfofuncional.

Ao contrário de Aristóteles, Herófilo considerou o cérebro como a sede da inteligência, no lugar


do coração. Ele, um especialista em SN, descreveu a anatomia do cérebro e do cerebelo, bem como
dos ventrículos encefálicos, tendo valorizado a importância dessas cavidades do interior do cérebro e
das meninges. Em suas descrições sobre as meninges, chamou-as de chorioid, pela semelhança com a
membrana que envolve o feto.

Herófilo refere-se ao IV ventrículo e ao sulco do soalho na parte inferior, como a confluência


dos seios da dura-máter, designado posteriormente como “o torcular de Herófilo”, torcula (L.), cujo
significado é o de uma cisterna ou poço para coletar o líquido da prensa de vinho. Ele foi também o
primeiro a reconhecer que eram os nervos, e não as artérias, que geravam os movimentos voluntários,
e distinguiu os nervos sensitivos dos nervos motores, embora ainda imperasse certa confusão entre
nervos motores e tendões.

Observação

Os nervos sensitivos levam informações da periferia até o SNC, enquanto


os nervos motores conduzem as respostas do SNC até um órgão efetuador.

Os seios da dura-máter servem como canais de baixa pressão para o


fluxo de sangue venoso em direção à circulação sistêmica.

Figura 12 – O torcular de Herófilo

21
Unidade I

Nessa mesma época, Erasístrato preocupou-se mais com as funções do organismo do que com a
forma, por isso é considerado o “pai da Fisiologia”. Em relação ao SN, Erasístrato e Herófilo compararam
o cérebro humano ao dos animais, observando que a superfície cerebral no homem possuía maior
complexidade e maior número de circunvoluções, o que explicaria a superioridade da inteligência
humana sobre a dos animais. Erasístrato também determinou o cérebro e o cerebelo como estruturas
parenquimatosas. Com maior segurança do que Herófilo, separou os nervos motores dos nervos sensitivos
e descreveu o trajeto dos nervos dos órgãos e dos sentidos. Ele reconheceu o córtex cerebral, e não a
dura-máter, como a origem dos nervos cranianos.

A última colaboração da Idade Antiga veio do anatomista Claudius Galeno. Suas descrições
raramente se adequam aos órgãos humanos, pois foram focadas em macacos, bois, ursos e porcos.
Quanto não teria realizado Galeno na anatomia, se lhe fosse consentida a dissecação de cadáveres
humanos, uma vez que viveu numa época onde milhares de infelizes eram sacrificados pelo capricho
brutal da população romana, em particular pelos seus imperadores, entretanto eles não autorizavam
a anatomia a servir-se dos cadáveres.

Figura 13 – Retrato de Galeno

Durante a sua permanência em Roma, Galeno desenvolveu intensa atividade: realizava conferências
e palestras para o público, escrevia sem parar e era médico das classes mais pobres. Sua personalidade
era de um egocêntrico presunçoso e autoritário; queria estar sempre com a veracidade e buscava
contradizer seus predecessores e contemporâneos, exceto Herófilo e Hipócrates, que ele reverenciava –
em cuja obra e doutrina dos quatro humores Galeno se fundamentava para a explicação etiopatogênica
das doenças e do seu tratamento.

Com Galeno, os conhecimentos sobre o SN tiveram um enorme progresso. Foi um cefalocentrista,


entre os cardiocentristas, que deixou cristalina sua visão sobre o controle do movimento dos músculos
pelos nervos que provêm do cérebro. Ao contrário de Aristóteles, Galeno considerava o cérebro como o
centro das sensações e do pensamento, a sede da alma, porque dizia que nele se gerava o raciocínio e
se conservava a recordação das imagens sensoriais.
22
ANATOMIA DOS SISTEMAS

Saiba mais

Você gostaria de aprender um pouco mais sobre o tema? O renomado


historiógrafo da medicina Roy Porter escreve em texto fascinante para o
público sobre a história da medicina a partir de diferentes pontos de vista,
como da história das doenças, dos médicos, do corpo, do laboratório, das
terapias, da cirurgia e do hospital. Leia:

PORTER, R. Das tripas coração: uma breve história da medicina. Tradução


de Vera Ribeiro. Rio de Janeiro: Record, 2004.

Quadro 2 – Aspectos crolonológicos de relevantes filósofos e médicos


gregos seguidores da doutrina cefalocêntrica

Teoria Cefalocêntrica
Alcméon Pitágoras
VI e V séculos a.C.
Anaxágoras Diógenes Filolau
V século a.C.
Hipócrates Platão
IV século a.C.
Herófilo Erasístrato
III século a.C.
Galeno
II século d.C.

Adaptado de: Crivelatto e Domenico (2007).


As principais observações de Galeno estão no campo do SN. Ele estudou a anatomia do encéfalo em
seus detalhes e considerou o cérebro como a sede de funcionamento de toda a alma. Para ele, os nervos
originavam-se do cérebro e da medula espinal, e não do coração, como ensinava Aristóteles. Classificou
os nervos cranianos em nove pares: nervo óptico; nervo oculomotor; nervo facial; nervo troclear; nervo
trigêmeo; nervo palatino; nervo acústico; grupo vocal; nervo hipoglosso. Descreveu igualmente 30
pares de nervos espinais, o grande simpático toracoabdominal e a dupla inervação vagal e simpática dos
órgãos abdominais.

Lembrete

O III par de nervo craniano, ou nervo oculomotor, é um nervo motor


para alguns músculos extrínsecos do olho.

O XII par de nervo craniano, ou nervo hipoglosso, é um nervo motor


responsável pela inervação dos músculos extrínsecos e intrínsecos da língua.

23
Unidade I

Conceitos Gregos Sobre o Desenvolvimento do Cérebro

Sede da sensação e da compreensão


(Alcméon, século V a.C.)

O mensageiro do entendimento. A origem das atividades


emocionais e morais (Hipócrates, 400 a.C.)

Sede da alma racional


(Platão, 427-347 a.C.)

Sede de resfriamento do calor corporal


(Aristóteles, 384-322 a.C.)

Centro de comando corporal


(Herófilo, 335-280 a.C.)

Sede de funcionamento de toda a alma


(Galeno, 129-216 d.C.)

Figura 14 – Diagrama esquemático que representa os pensamentos sobre o


cérebro, segundo filósofos e médicos gregos entre os séculos V a.C. e II d.C.

Lembrete

A terminologia anatômica atual determina o número de 12 pares de


nervos cranianos.

Saiba mais

Vamos relaxar! No site a seguir, você conhecerá 45 fatos curiosos sobre


o cérebro humano. Boa leitura!

45 FATOS curiosos sobre o cérebro humano. Revista Galileu, 2 set. 2016.


Disponível em: <http://revistagalileu.globo.com/Caminhos-para-o-futuro/
Saude/noticia/2016/09/45-fatos-curiosos-sobre-o-cerebro-humano.
html>. Acesso em: 4 dez. 2016.

24
ANATOMIA DOS SISTEMAS

Galeno classificou os nervos em dois tipos: moles ou sensitivos (para os órgãos dos sentidos)
e duros (para os movimentos), atraindo a atenção para o fato de que existem órgãos com os
dois tipos de nervos, como a língua e os olhos, favorecidos ao mesmo tempo com sensitividade e
movimento. Ele explicou a duplicidade dos órgãos dos sentidos, dos ventrículos encefálicos e dos
próprios hemisférios cerebrais para a casualidade de que “se um deles sofrer lesão, o outro suprirá
a função do que for lesado” (GALENO, 1854, p. 557 apud REZENDE, 2009, p. 69). Ainda descreveu
o corpo caloso, o fórnice e o infundíbulo da hipófise e admitiu que essa estrutura anatômica se
comunicava com a cavidade nasal.

Observação

O corpo caloso consiste num conjunto de fibras transversais, que,


ao cruzarem a linha média, abrem-se em leques, de forma a alcançar
os diferentes pontos de toda a convexidade cerebral. Emergindo abaixo
do corpo caloso, está o fórnice – feixe complexo de fibras nervosas. O
infundíbulo da hipófise é uma formação nervosa em forma de funil.

Ainda sobre Galeno, ele apresentou pela primeira vez que o organismo era controlado pelo cérebro.
Localizou uma alma funcional no enkephalon – a parte com a qual ele acreditava que pensávamos –, onde
se encontra o pneuma psíquico. De tal modo, impôs ao cérebro os papéis da percepção que Aristóteles
havia atribuído ao coração. Galeno sustentava a teoria de que o pneuma psíquico, uma substância
que ele acreditava se desenvolver nos ventrículos encefálicos, fluiria através dos nervos cominando
a sensação e os movimentos voluntários. Em sua visão, os vasos sanguíneos transportavam a energia
vital, queimada pelo coração, levada então até a base inferior do cérebro, onde ela se transformava em
princípios espirituais (rete mirable).

Ventrículo preenchido com


pneuma psíquico
Pneuma psíquico alterado
por estímulos sensoriais
Se mu
Co
ns m
o

Visão

Cheiro Consciência
Audição

Fonte secundária de
pneuma psíquico
Artéria carótida
Pneuma psíquico conduzido
pelos nervos espinais

Pneuma vital – fonte primária


de pneuma psíquico

Figura 15 – Representação da formação do pneuma psíquico

25
Unidade I

Galeno cometeu muitos erros, como o concernente à sua teoria da circulação sanguínea; todavia,
sem nenhum equívoco, ele foi o médico e anatomista com o prestígio mais duradouro sobre a medicina:
1.500 anos.

O desenvolvimento da tradição ético-religiosa, que vai se desdobrar por toda a Idade Média, impediu
os estudos de anatomia. Concomitantemente, as invasões dos bárbaros enfraqueceram o Império
Romano e devastaram a Biblioteca de Alexandria, onde estavam guardados os estudos gregos sobre
medicina. No obscurantismo provocado pelo cristianismo na Europa, coube aos árabes os cuidados do
material recuperado da biblioteca.

O conhecimento obtido da medicina grega, por meio de obras traduzidas, faria da Escola de
Galeno a mais importante no mundo árabe islâmico. Hipócrates, Herófilo e Erasístrato, antecessores de
Galeno, e os mais relevantes representantes da medicina clássica, seriam, ao mesmo tempo, venerados
ao longo de todo o período de ouro dessa cultura. A medicina grega estaria sempre presente e guiaria
os trabalhos e as pesquisas, devido aos obstáculos de desenvolverem tais atividades em anatomia e
fisiologia, pela proibição da prática de vivissecção e dissecação. As noções do organismo humano
emanavam dos gregos.

Na Idade Média, o organismo passou por um processo de ressignificação. As atenções dos indivíduos
eram voltadas para as ameaças divinas, em comparação às quais os perigos ao organismo passaram a
ser desdenhadas. Essa seria uma das explicações aceitáveis para a redução do interesse dos indivíduos
diante das questões de saúde, como a medicina e, consequentemente, a anatomia. Além disso, os roubos,
as epidemias, a fome, as batalhas empreendidas pelas cruzadas religiosas, os pagamentos de impostos,
enfim, tudo no feudalismo contribuiu para que as inquietações dos indivíduos se retrocedessem para a
necessidade de segurança proporcionada pela terra e pela religião.

Saiba mais

Vamos nos posicionar na História? Neste artigo você irá entender


por que a Idade Média tem sido frequentemente encarada como “A
Idade das Trevas”, em razão da intransigência religiosa e do misticismo
por excelência. Tal fato se deve, em grande parte, ao período seguinte –
Renascimento – quando o termo foi cunhado, em oposição à Antiguidade
“luminosa”, humanista e racional, e à redescoberta do humanismo nos
séculos XV e XVI. Para saber mais acerca do assunto, acesse:

ALMEIDA, C. C. Do mosteiro à universidade: considerações sobre


uma história social da medicina na Idade Média. Aedos, v. 2, n. 2,
p. 36-55, 2009. Disponível em: <http://seer.ufrgs.br/aedos/article/
view/9830/5643>. Acesso em: 4 dez. 2016.

26
ANATOMIA DOS SISTEMAS

Por esses aspectos, no período medieval, a evolução da anatomia foi estorvada. Os poucos estudos
das estruturas cerebrais foram imaginados por desenhos e pinturas sem o cuidado de ser realístico
ou conceber a autêntica forma do cérebro. As figuras foram construídas usando-se de diagramas
esquemáticos, bidimensionais, os quais retratavam papéis cerebrais diversos, deixando claro que o
conceito anatômico era incompleto. Funções da visão, da audição, da gustação, da alma e mentais,
por exemplo, eram projetadas para células, isto é, os ventrículos laterais, esboçados sem propósito de
expressar a realidade da estrutura anatômica legítima, conforme ilustra a figura a seguir.

Figura 16 – Diagrama esquemático com ilustrações medievais da doutrina celular da função cerebral.
Observa-se que não há preocupação em representar o cérebro de forma realista e com perspectiva

De tal maneira, foram descobertos, em manuscritos medievais, esboços do cérebro, efetuados


por autor desconhecido, que mostram um texto de origem em Salerno, os quais datam do ano
de 1250 e expõem o cérebro com giros e sulcos, todavia de maneira simples, irrigado por uma
rede de vasos sanguíneos oriundos do pescoço e da região cervical. Um pouco mais real do que
os diagramas esquemáticos, mas não existe o cuidado de representar integramente a estrutura
cerebral, porém se avizinha um pouco mais da anatomia realística do que os diagramas.

Figura 17 – Desenho medieval esboçando o cérebro e os vasos sanguíneos

27
Unidade I

No final da Idade Média e durante o Renascimento, a arte se preocupava mais com a


representação da imagem humana. Nessa época, surgem magníficos professores e anatomistas,
entre eles Jacopo Berengario. Conta a história ter ele dissecado mais de 100 cadáveres humanos.
Professor em Bolonha durante 25 anos, Berengario realizou vivissecções, e em suas discussões
expôs de maneira clara a presença de líquidos nos ventrículos encefálicos. Ele se opôs a alguns
anatomistas que acreditavam na presença de “um vapor ou espírito”, encontrado em indivíduos
vivos o qual era “condensado” em líquido após a morte. Era claro para ele, portanto, que esse
líquido não era “vapor” em organismos vivos. Berengario também descreveu a medula espinal,
terminando no adulto ao nível de L2.

Nenhuma pesquisa sobre a história da anatomia no período medieval pode ser considerada
completa sem citar o nome de Mondino de Luzzi. Ele foi contemplado como o primeiro “restaurador da
anatomia”. Mondino efetuou dissecções em cadáveres humanos de criminosos e escreveu o manual de
dissecação, a Anatomia Mondini.

Figura 18 – Uma lição de anatomia. Mondino ilustra a dissecação de cadáver durante


a cátedra. Um cirurgião efetua a dissecação e o professor Mondino aponta as estruturas anatômicas

Mondino encarou uma área muito desafiadora, como a anatomia do cérebro, entretanto foi hábil
em prover uma descrição brilhante e racional por meio de suas dissecações. Atribuiu muitos dos papéis
cerebrais aos ventrículos, brevemente destacando Galeno, que enfatizou o parênquima cerebral.

28
ANATOMIA DOS SISTEMAS

Figura 19 – Ventrículo encefálico

Segundo Mondino, uma vez que as membranas, a dura-máter e a pia-máter são levantadas, o
cérebro vai aparecer. Ele observou que o encéfalo humano tem duas partes: a anterior, a qual chamou de
prosencéfalo, e a posterior, que denominou de cerebelo. A parte anterior do encéfalo foi dividida em dois
hemisférios cerebrais (direito e esquerdo), conforme ilustra a figura seguinte. Mondino dedicou grande
atenção à descrição dos ventrículos encefálicos. “Os ventrículos encefálicos são em número de quatro. O
ventrículo anterior é o ventriculus anterior magnus, sendo ele subdividido em: uma parte direita e uma
esquerda” (CRIVELLATO; RIBATTI, 2006, p. 585, tradução nossa).

Hemisfério direito Hemisfério esquerdo

Figura 20 – Hemisférios cerebrais

29
Unidade I

Lembrete

Nessas duas partes dos hemisférios cerebrais (direita e esquerda),


descritas por Mondino, encontram-se os ventrículos laterais da terminologia
anatômica atual.

Cerebelo (L.), do latim cerebellum: pequeno cérebro (figura a seguir). O


cérebro posterior, que está localizado na fossa posterior do crânio.

Hemisfério direito Hemisfério esquerdo

Figura 21 – Vista superior do cerebelo

Mondino complementou:

Estes ventrículos são espaçosos e, especialmente, em sua parte


anterior temos o local de origem das nossas fantasias, já na parte
posterior se encontram as nossas imaginações, enquanto na parte do
meio está o ponto de encontro do modo de pensar da maioria dos
indivíduos e as noções comumente admitidas pelos seres humanos,
ou seja, o nosso senso comum (CRIVELLATO; RIBATTI, 2006, p. 585,
tradução nossa).

Conforme Mondino, os papéis desses ventrículos laterais são, portanto, propor a fantasia, a
imaginação e o senso comum. O terceiro ventrículo, chamado por ele de ‘’lacuna’’, ou ventrículo médio,
está disposto no fundo da parte mediana do cérebro.

Este ventrículo é uma cavidade arredondada semelhante a um lago, e o seu


papel está relacionado com a sede da meditação e do raciocínio (CRIVELLATO;
RIBATTI, 2006, p. 585, tradução nossa).

30
ANATOMIA DOS SISTEMAS

O quarto ventrículo, denominado por Mondino de ventrículo posterior, está localizado na


região posterior do encéfalo, ou seja, junto ao cerebelo. Mondino representou essa região como
o ponto de origem da medula espinal e vários nervos motores. Para ele, o ventrículo posterior
tinha uma forma piramidal e foi interpretado como o lugar da memória. De tal modo, Mondino
seguiu a doutrina da localização psicológica de Galeno relacionada às funções situadas dentro dos
ventrículos encefálicos.

Lembrete

O encéfalo apresenta quatro ventrículos: dois laterais (I e II ventrículos),


o III ventrículo e o IV ventrículo.

Curiosamente, Mondino descreveu uma estrutura com coloração “vermelho-sangue”, que possui
a forma de um “verme longo caminhando no solo”, encontrada no espaço entre os dois ventrículos
laterais. Esta estrutura anatômica corresponde aos plexos corióideos dos ventrículos laterais. De
acordo com Mondino, esse órgão vascular foi relacionado com a atividade do pensamento, porque sua
contração gera a obstrução da passagem do espírito vital, seguida de bloqueio de qualquer faculdade
do pensamento.

Figura 22 – Plexos corióideos

Observação

Os plexos corióideos, estruturas que se projetam para dentro dos


ventrículos encefálicos, são responsáveis pela produção de líquido
cerebrospinal (LCS).

31
Unidade I

Notavelmente, Mondino não se limitou à descrição do cérebro para o aparelho ventricular,


mas também considerou o tecido cerebral, comparando-o a uma substância como a medula óssea.
Ele mencionou estruturas distintas na base de cada um dos ventrículos laterais e chamou‑as
de anchae por apresentarem uma forma curva que lembrava as nádegas. Há uma divergência
histórica sobre essas estruturas descritas por Mondino. Elas seriam, quiçá, os corpos quadrigêmeos
ou, mais provavelmente, as estruturas descritas por ele, na realidade, são os núcleos caudados
da anatomia moderna.

Observação

Os corpos quadrigêmeos são estruturas anatômicas localizadas na


região posterior do mesencéfalo, formadas por dois colículos superiores e
dois colículos inferiores.

Tálamo

III ventrículo
Glândula pineal
Colículo superior
Mesencéfalo
Colículo inferior

Vérmis
Hemisfério cerebelar
direito
Hemisfério
cerebelar esquerdo

Figura 23 – Vista superior/posterior do cerebelo

Observação

O núcleo caudado é cosiderado um dos núcleos da base. É assim


denominado por ter uma longa extensão ou cauda.

O discípulo de Mondino de Luzzi, Guido da Vigevano, realizou dissecações em cadáveres e, a partir


de seu manuscrito Anathomies, foi o primeiro cientista que utilizou quadros para esquematizar suas
descrições anatômicas, sendo ele o precursor no desenvolvimento da proximidade entre a neuroanatomia
e o desenho artístico, como demostram as figuras a seguir.

32
ANATOMIA DOS SISTEMAS

Figura 24 – Tábuas de anatomia: Guido da Vigevano

Guido fez esboços de trepanações cranianas por meio de um bisturi e um martelo, cujo intuito era
mostrar o encéfalo e as duas meninges, até então conhecidas como a dura-máter e a pia-máter. Ele
definiu as meninges como película.

Figura 25 – Trepanações cranianas

33
Unidade I

Outros achados relevantes de Guido da Vigevano estão relacionados com a medula espinal e a origem
dos nervos espinais. Esses pares de nervos espinais atravessam os forames intervertebrais, formam os
plexos nervosos e atingem todo o organismo. Ele demonstrou uma vaga padronização da estrutura
cortical encontrada na superfície encefálica. Posto isto, os esboços de Guido foram uma contribuição
valiosa para os avanços da história da neuroanatomia.

Figura 26 – Medula espinal e nervos espinais

Ainda durante a Idade Média, existiu John Arderne, um importante cirurgião em Nottinghamshire
e Londres, que teve, ao longo de sua vida profissional, oportunidades de aprender e desenvolver
suas habilidades como cirurgião militar, pois nesse ínterim histórico ocorreu a Guerra dos Cem
Anos do século XIV. De tal modo, ele observou os ferimentos causados pelas primeiras batalhas que
utilizaram a pólvora.

Arderne descreveu seus estudos em latim e obviamente usou os ensinamentos de muitos dos
autores escolásticos de enorme autoridade, como Galeno e Avicena. As figuras seguintes mostram,
em cortes sagitais, a dissecação da cabeça ao períneo. Na figura a seguir, o cérebro é visto dividido em
partes: frontal, média e terços posteriores, além dos giros e sulcos que são representados como linhas
interrompidas. Na figura 28, ele manteve o mesmo padrão de secção do encéfalo. Nesta imagem,
além da representação do cérebro, há uma tentativa de retratar de forma realística outras regiões e
órgãos do corpo humano.
34
ANATOMIA DOS SISTEMAS

Figura 27 – Dissecção da cabeça ao períneo

Figura 28 – Dissecção da cabeça ao períneo

O Renascimento foi um período que suplicava por “titãs” e que os compôs por força do pensamento,
paixão, caráter, versatilidade e sabedoria. A anatomia também teve tais “titãs”. Eles aniquilaram a anatomia
escolástica de Galeno e cimentaram os fundamentos da anatomia cientifica. O precursor desse trabalho
titânico foi Leonardo da Vinci, o verdadeiro criador foi Vesalius, e a findar esse trabalho esteve Harvey.

As produções que proporcionavam a articulação entre a arte e a ciência demonstrada em alguns


dos primeiros estudos conhecidos sobre o cérebro não somente influíam como também deram forma ao
objeto-livro, surgindo como referências em algumas de suas páginas. O trabalho conjunto entre cientistas
e artistas já acontecia, da mesma maneira, no comentário das observações e, também, na preparação

35
Unidade I

dos esquemas de representação daquilo que muitas vezes só poderia ser idealizado e explicado. Neste
contexto, o próprio pesquisador era ao mesmo tempo cientista e artista, como foi o caso de Da Vinci.

O grande renascentista italiano Leonardo da Vinci se dedicou com ardor às pesquisas minudenciadas
do organismo humano, esboçando inúmeros desenhos com estudos anatômicos que representavam as
estruturas interiores e as proporções do corpo, objetivando um maior realismo em sua obra. Ele estudava
o organismo instituindo comparações e buscando simetrias com o microcosmos.

Figura 29 – Leonardo da Vinci, o gênio do Renascimento

Da Vinci fez diversos desenhos representando o funcionamento dos órgãos corpóreos, como o cérebro,
o esqueleto, o caminho de veias e as estruturas digestivas. Em algum momento da história, quiçá acirrado
por um revigorado interesse na anatomia, ele tornou-se um “consumidor voraz “ de cadáveres. Por volta
de 1508, Da Vinci fez moldes, em cera derretida, dos ventrículos encefálicos, para estudar a sua estrutura.

Figura 30 – Fisiologia do cérebro, de Leonardo Da Vinci

36
ANATOMIA DOS SISTEMAS

Figura 31– Forma dos ventrículos, de Leonardo Da Vinci

O médico alemão Johann Dryander é considerado o primeiro anatomista a publicar um livro com
imagens de suas dissecações. Ele divulgou em sua obra Anatomia Capitis Humani imagens que retratavam
o impacto da transição dos desenhos da doutrina medieval, isto é, a teoria das células cerebrais, com a
total despreocupação voltada para a representação realística do cérebro. A visão moderna que Dryander
exibia em suas imagens representava as estruturas intracranianas de maneira realística, uma novidade
para o período, como era vista por ele na dissecação das meninges, do cérebro, dos ventrículos e do
crânio, conforme ilustra a figura seguir.

Figura 32 – Imagens da obra de Johann Dryander, Anatomia Capitis Humani

37
Unidade I

Quando Michelangelo Buonarroti pintou A Criação de Adão, como parte da encomenda da pintura
do teto da Capela Sistina, em Roma, feita em 1508 pelo Papa Júlio II, registrou em carta a melancolia de
escultor forçado a desempenhar ocupação de pintor: “Isso não é da minha profissão. Perco o meu tempo
sem resultado. Que Deus me ajude!” (NÉRET, 2000. p. 23).

Michelangelo seguramente não era um católico impetuoso; sua religiosidade permanecia mais para
o corpo criado do que para a mente do divino criador. Manifestava sua curiosidade de homem do
Renascimento, que o levara à dissecção de organismos humanos para que melhor compreendesse as
formas que compunham sua escultura e sua pintura.

A partir de 1990, foram feitas descobertas acerca de alguns segredos contidos na pintura da Capela
Sistina. Nesse ano, o médico americano Frank Meshberger descobriu que na cena A Criação de Adão o
manto de Deus significava seguramente um corte de um crânio e do cérebro nele contido. Entre os anos
de 1989 e 2003, o oncologista brasileiro Gilson Barreto pesquisou e descobriu a série completa do que ele
denominou de O Código Michelangelo. A dissecção de praticamente todas as partes do organismo humano
estava representada, e cada uma disfarçadamente apontada por rastros nas pinturas da Capela Sistina.

A primeira descoberta de um desenho escondido nas imagens da Capela Sistina, a que mostrou um
cérebro idêntico com a imagem divina, faz jus a um cuidado especial. Nessa imagem, o Deus criador, em
meio a seu manto envolvente e a um grupo de anjos, corresponderia às partes mais centrais do cérebro
humano, como o corpo caloso. Na realidade, a imagem de Deus possui leve defeito diagonal que, em geral, se
observa em processos de dissecação, contudo todas as partes anatômicas estão corretamente representadas
na pintura. Há somente um detalhe que evade à correção anatômica que nenhum pesquisador conseguiu
esclarecer: o braço estendido de Deus ultrapassa os limites de uma possível representação de caixa craniana.

Saiba mais

A fim de aprofundar suas leituras sobre esses temas, leia:

ASSIS JUNIOR., H. Leonardo e Vesalius no ensino de anatomia humana.


Metrocamp Pesquisa, v. 1, n. 1, p. 118-30, 2007.
KICKHÖFEL, E. H. P. A lição de anatomia de Andreas Vesalius e a ciência
moderna. Scientiae Studia, São Paulo, v. 1, n. 3, p. 389-404, jul./set., 2003.
Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid
=S1678-31662003000300008>. Acesso em: 28 maio 2016.

LIRA, W; ALVES, K. S. G. A anatomia do corpo humano através da arte.


In: ENCONTRO NACIONAL DE EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS, 13., 2009, Castelo
Branco. Actas... Castelo Branco (Portugal): Escola Superior de Educação do
Instituto Politécnico de Castelo Branco, 2009. Disponível em: <http://files.
didatica-das-ciencias9.webnode.com/200000026-339b934957/Artigo%20
A%20anatomia%20do%20corpo%20atrav%C3%A9s%20da%20arte%20
ATAS.pdf>. Acesso em: 10 jan. 2017.

38
ANATOMIA DOS SISTEMAS

Figura 33 – A arte secreta de Michelangelo: uma lição de anatomia na Capela Sistina

As bases da anatomia como ciência foram determinadas por Vesalius de Bruxelas, em 1543,
quando ele publicou os desenhos e os textos que compõem a obra De Humani Corporis Fabrica,
que corrigia e reformulava os conceitos e as ilustrações anatômicas do período, na busca de uma
“exatidão real”. A obra de Vesalius, ao priorizar a observação e a pesquisa, é apresentada como o
início da ciência moderna. Ele é considerado o pai da anatomia e um autêntico representante da
Renascença, reunindo ciência e arte. Entretanto, é chamado pelos seus inimigos da fé católica de o
Martinho Lutero da anatomia humana.

Vesalius começa o seu livro e traz o tema a respeito do cérebro e do sistema nervoso:

O encéfalo é a sede da alma dos indivíduos e das suas faculdades. Ele reside
no crânio, sendo que magnificamente se ajusta ao seu formato na cavidade
superior da cabeça, e assim, ocupa todo esse espaço (GOMES et al., 2015, p.
157, tradução nossa).

Em alguns trechos de seu livro, Vesalius faz menções da abertura do crânio com analogias à de
um cofre:

Primeiro, o encéfalo está protegido por uma membrana, a dura-máter. Após


a sua remoção, surgem as partes dos hemisférios cerebrais direito e esquerdo,
que por sua vez é contínuo pela medula oblonga e medula espinal.

[...]

39
Unidade I

Após a remoção da dura-máter, percebam que ela envia uma dobra entre
os dois hemisférios cerebrais (foice do cérebro), e entre o cérebro e o
cerebelo (tentório do cerebelo). Assim, a exposição dos hemisférios cerebrais
possibilita a visualização de duas grandes cavidades (ventrículos laterais), os
giros cerebrais e a substância branca subcortical. Em um nível mais profundo,
observam-se estruturas subcorticais, como o tálamo, o globo pálido, o
putame, o núcleo caudado e as cápsulas internas e externas. A remoção
da parte posterior do cérebro revela o cerebelo e o tronco encefálico. Após
“virar” anteriormente o cerebelo e todo o tronco encefálico, enfim a medula
espinal aparece.

[...]

Internamente, os ventrículos laterais estão conectados com o III ventrículo,


e este por sua vez é contínuo por um canal (aqueduto do mesencéfalo) que
termina no IV ventrículo. Nos ventrículos pode ser observado um plexo ou
redes (plexo corióideo). Vejam o septo (septo pelúcido), o corpo caloso, a
abóbada (fundo de saco) e o cerebelo, sua relação com esses ventrículos
(GOMES et al., 2015, p. 157, tradução nossa).

A figura a seguir (A, B, C, D) ilustra essa descrição:

Figura 34 – Ilustração de Fabrica (1555), de Andreas Versalius

Então, Vesalius segue com a sua descrição detalhada do crânio, da coluna vertebral e dos
nervos periféricos:

40
ANATOMIA DOS SISTEMAS

Em uma visão da base do encéfalo, se revelam os sete pares de nervos


cranianos, além do primeiro par de nervos que representam os nervos
ópticos, sendo que estes acabam junto à túnica do olho. Entretanto, o órgão
do olfato (trato olfatório) não deve ser classificado como um nervo, mas
observem que se encontra na base do encéfalo (GOMES et al., 2015, p. 157).

Figura 35 – Ilustração de Fabrica (1555) SNP

Ele também dá considerações funcionais adequadas ao seu tempo, citando o “catarro do cérebro”
e o seu fluxo através de um canal em forma de funil (infundíbulo) até as narinas, depois de ter sido
“destilado” por uma glândula quadrada (hipófise):

Com a reflexão de que o “espírito vital” é produzido nos plexos corióideos e,


desde o ar aspirado para os ventrículos encefálicos por meio da respiração, a
força inata das substâncias cerebrais cria o “espírito animal” que o encéfalo
faz uso, em partes, para os comandos principais da mente (GOMES et al.,
2015, p. 157).

Observação

Pequeno glossário das estruturas anatômicas mencionadas por Vesalius:

• Bulbo ou medula oblonga é a parte inferior do tronco encefálico.

• Foice do cérebro é um septo vertical mediano em forma de foice


que ocupa a fissura longitudinal do cérebro separando os dois
hemisférios cerebrais.
41
Unidade I

• Tentório do cerebelo é uma dobra da dura-máter que separa o


cerebelo do lobo occipital do cérebro.

• Tálamo é parte do cérebro.

• Globo pálido e putame são estruturas que formam os núcleos da base.

• Cápsula interna consiste em um feixe de fibras localizadas no cérebro


que apresenta partes do neurônio que se dirigem ao córtex cerebral
ou partem dele com destino a regiões subcorticais.

• Cápsula externa é uma lâmina branca encontrada entre alguns dos


núcleos da base.

• Aqueduto do mesencéfalo é uma passagem estreita no mesencéfalo


que une o III ventrículo ao IV ventrículo.

• Septo pelúcido é uma estrutura anatômica fina que separa os dois


ventrículos laterais.

Tálamo

Mesencéfalo

Ponte
IV ventrículo cerebral

Cerebelo
Bulbo

Medula espinal

Figura 36 – Vista medial do tálamo, tronco encefálico e cerebelo no plano de secção sagital

42
ANATOMIA DOS SISTEMAS

Lembrete

O tronco encefálico é dividido em mesencéfalo, ponte e bulbo.

Foice do cérebro

Figura 37 – Vista inferior da meninge dura-máter

Corpo caloso
Ventrículo lateral
Septo pelúcido
Núcleos da base
(núcleo caudado)

Figura 38 – Vista anterior do cérebro no plano de secção coronal

Nomes relevantes seguiram Vesalius ou foram contemporâneos dele. Em Roma, Bartolomeu


Eustachio foi professor de anatomia da Universidade della Sapienza; por sua vez, conseguiu autorização
da Igreja para realizar dissecações. Ele fez muitas descobertas, e a sua fama – póstuma, aliás – adveio
de seus maravilhosos desenhos anatômicos. Eustachio foi um dos primeiros anatomistas a reproduzi-los
em cobre, em vez de madeira.
43
Unidade I

Figura 39 – Ilustração de Eustachio mostrando o SNC e os nervos periféricos e cranianos

Em 1663, o médico e anatomista Franciscus Sylvius descreveu uma marca profunda na superfície lateral
do cérebro que começava próximo da órbita curvando-se posterior e superiormente, seguia tão distal quanto
a origem do tronco encefálico, separando o cérebro em uma parte superior e uma inferior, que foi chamada de
sulco lateral. Em seu tributo, é nomeada, também, de fissura de Sylvius. Ele ainda descreveu outras estruturas
anatômicas, como a artéria média do cérebro, a cisterna da fossa lateral do cérebro, a veia média profunda do
cérebro, as veias médias superficiais do cérebro e a cavidade do septo pelúcido.

Sulco lateral

Cerebelo Ponte

Figura 40 – Sulco lateral

Professor de anatomia em Bolonha, Costanzo Varolio é conhecido mundialmente no campo da


neuroanatomia. Seu nome está associado com a formação de uma estrutura anatômica denominada
de ponte ou ponte de Varolio. Ele comparou a base e os pedúnculos cerebelares médios a uma
44
ANATOMIA DOS SISTEMAS

ponte, sob a qual passavam as fibras longitudinais para a medula oblonga como se fosse a água
sob uma ponte. Essa estrutura anatômica é hoje denominada de base da ponte, contendo as fibras
corticospinais e pontocerebelares.

Figura 41 – Costanzo Varolio

Observação

As fibras corticospinais são vias descendentes do córtex cerebral até a


medula espinal.

Partes dos neurônios dos núcleos pontinos constituem as fibras


transversais da ponte ou fibras pontocerebelares.

Antes de Costanzo Varolio, a ponte fora ilustrada por Bartolomeu Eustachio, em seu livro Tabulae
Anatomicae de 1552, mas infelizmente esse trabalho permaneceu inédito por mais de 150 anos.

Varolio também contribuiu em outras descrições neuroanatômicas no século XVI. Teve particular
atenção às origens intracranianas dos nervos e desenvolveu um novo método de dissecar o cérebro
no plano axial, a partir da base cerebral em direção à convexidade. Esse método permitiu uma melhor
visualização da estrutura cerebral e dos nervos cranianos. Ele também é considerado o primeiro a ter
descrito os lobos cerebrais, ao postular que cada hemisfério cerebral era composto de três prominências,
as quais Varolio denominou de anterior, média e posterior, acreditando que corresponderia ao I, II e III
ventrículos, respectivamente.
45
Unidade I

Um dos maiores filósofos ocidentais de todos os tempos foi René Descartes. Ele era conhecedor da
descrição completa do organismo humano oferecida por Vesalius, em 1543.

Figura 42 – René Descartes

No tocante à relação mente-cérebro, ou melhor, alma-corpo, Descartes menosprezou tanto


a informação aristotélica de alma como forma do organismo quanto o conhecimento de alma
como preceito de vida dos escolásticos. Ele definiu a alma como substância consciente ou
pensamento, uma vez que a alma era diferente do organismo por apresentar uma natureza
inseparável, enquanto o organismo era sempre divisível. Embora distintos, a alma interatuava
com o organismo.

Através da glândula pineal, Descartes cria um pequeno órgão vestigial no cérebro. Esse órgão foi
sugerido por tratar-se de uma das poucas partes não duplicadas do cérebro. Descartes reconstituiu a
doutrina do ser dualista, de que alma e organismo eram compostos por diferentes substâncias – uma
teoria que se tornou crença habitualmente acolhida por pensadores europeus.

Ele foi um exímio anatomista e fisiologista e estudou fenômenos simples, como o movimento
involuntário que ocorre em um membro quando alguém queima a sua mão ou o seu pé em uma
brasa; sugeriu essa ideia como arco reflexo. De forma brilhante, detalhou os componentes desse evento:
primeiro a sensação de dor, em seguida a sua condução pelos nervos sensitivos que levam os estímulos
até o SNC, posteriormente as respostas pelos nervos motores, que são excitados, e por fim os músculos
responsáveis pelo ato.

46
ANATOMIA DOS SISTEMAS

Figura 43 – Ilustrações neuroanatômicas de René Descartes

Lembrete

O arco reflexo é a resposta involuntária rápida a certo estímulo


periférico originado pela alça de conexão sináptica localizada na
medula espinal. É designado de simples, ao compreender somente um
neurônio sensitivo e um motor, ou composto, quando entre eles existe
um interneurônio.

Em razão da ausência de tecnologia apropriada para “desvendar” o cérebro, Vesalius e outros


anatomistas do período restringiam-se a representações das características morfológicas do órgão. Isso
também lhe permitia exceder discussões teológicas polêmicas, como a de que a prática da dissecção
cerebral demandaria uma atitude de blasfêmia, pois denotaria a dissecção da alma.

Os anatomistas levavam em consideração o dualismo articulado por René Descartes. Por mais que o
cérebro pudesse ser dito a sede da alma, ele não era a alma, e essa noção de que o órgão não tinha outros
significados além da sua materialidade teria tornado pouco atraente a sua representação pitoresca e
reproduzida, em oposição ao que aconteceu com o coração, largamente usado nas pinturas com temas
religiosos, como o Sagrado Coração de Jesus.

47
Unidade I

Figura 44 – O Sagrado Coração de Jesus

No Barroco, período profundamente religioso, o organismo passa a ser representado de forma


contorcida e dramática, com a teatralização nas obras. De tal modo, a pintura busca a união entre o
profano e o sagrado em um organismo comum. Rembrandt foi um grande conhecedor de anatomia,
utilizando-se desse tema em seus quadros. Como na pintura A Lição de Anatomia do Dr. Deyman,
ele apresentou a dissecação de um cérebro, baseado nas ilustrações de Veasalius. O homem morto
na imagem é Joris Fonteijn, conhecido como “Janeiro Negro”, um ladrão que sofreu a pena de morte.
Como era tradicional nesses dissecações, o estômago e os intestinos eram removidos antes do cérebro.
Gysbrecht Calcoen, um indivíduo que visava proporcionar assistência e proteção aos seus membros,
detém a calvária, enquanto Dr. Deyman remove a foice do cérebro.

Figura 45 – A Lição de Anatomia do Dr. Deyman

48
ANATOMIA DOS SISTEMAS

Em 1600, o médico, anatomista e fisiologista inglês Thomas Willis, autor do livro Patholigiae
Cerebri, apresentou excelentes ilustrações que possibilitaram um conceito de localização de alguns
papéis cerebrais, como o senso comum, a imaginação e a memória, situadas, respectivamente, no corpo
estriado, no corpo caloso e no córtex cerebral.

Figura 46 – Retrato de Thomas Willis da página de título de Pathologiae Cerebri (1667)

Lembrete

O corpo estriado é um dos núcleos da base.

Para Willis, o centro do movimento e da memória se abrigam no cérebro; o do movimento


involuntário, no cerebelo; da imaginação, no corpo caloso; e o da sensibilidade e do senso comum,
no corpo estriado, deixando óbvio que foi precursor em um enfoque ordenado da função cerebral
fora dos ventrículos. Suas ideias estavam próximas da realidade, entretanto os saberes ainda eram
muito empíricos.

Ele desponta como favorável à conhecida teoria dos espíritos animais, que se compõem no cérebro
mediante destilação com base no sangue arterial e, a partir dos nervos, descem as regiões de atuação
como os causadores da sensação e do movimento.

Em sua obra De Cerebri Anatome, Willis introduziu um novo sistema de numeração dos nervos
cranianos, agrupados conforme as suas funções, descreveu extensamente sobre os núcleos da
base, o tronco encefálico e o cerebelo, além de realizar esquemas detalhados das inervações vagal
e simpática.

49
Unidade I

Figura 47 – Página de título De Cerebri Anatome (2. ed., 1664). Ilustração mostra Willis à direita do cadáver.

Figura 48 – Os nervos cranianos e o tronco encefálico.

Figura 49 – Inervação vagal

50
ANATOMIA DOS SISTEMAS

Thomas Willis descreveu a clássica anastomose da circulação arterial e a sua função – complexo
vascular na base do encéfalo –, conhecida como “polígono de Willis”, rompendo para sempre com a ideia
galênica da rete mirable, ou seja, dos princípios espirituais.

Ele utilizou pela primeira vez a terminologia “ação reflexa”. Outra descrição relevante dele foi a de
sugerir que o plexo corióideo fosse o responsável pela absorção do LCS.

Figura 50 – Ilustração da base de um encéfalo humano revelando o “polígono de Willis”

Na imagem anterior, observa-se que os giros cerebrais ainda não eram descritos com as mais elevadas
precisões. Eles servem como um “pano de fundo” para as estruturas anatômicas da base do encéfalo
que Thomas Willis ambicionou realçar, e algumas terminologias anatômicas ainda prevalecem até hoje,
como o pedúnculo cerebral e as pirâmides.

Nicolaus Steno criticou de maneira inconveniente o trabalho de Willis, ao afirmar que as melhores
descrições sobre o encéfalo que temos até o presente momento são aquelas que nos são oferecidas por
este senhor.

Leitura obrigatória

TORTORA, G. J.; DERRICKSON, B. Encéfalo e nervos cranianos. In:___.


Princípios de anatomia e fisiologia. 14. ed. Rio de Janeiro: Guanabara-Koogan,
2016. p. 523-4. Disponível em: <https://online.minhabiblioteca.com.br/#/
books/9788527728867/cfi/6/2!/4/2/2@0:15.1>. Acesso em: 3 dez. 2016.

Outra descrição relevante foi que Thomas Willis insinuou a ideia da barreira hematoencefálica, ao
sugerir que somente as partículas menores, as quais seriam essenciais para o rápido desempenho dos
papéis cerebrais, passsariam do sangue para o cérebro.
51
Unidade I

Observação

A barreira hematoencefálica é uma estrutura que evita ou dificulta


a passagem de substâncias do sangue para o parênquima nervoso,
cujo substrato anatômico são as junções oclusivas que unem as células
endoteliais do revestimento capilar.

Saiba mais

Agora, você já é capaz de compreender os papéis da barreira


hematoencefálica. Para isso, sugerimos a leitura do artigo científico:

CABREIRA, L. M. B; CECCHINI, A. L. Imunopatologia da esclerose


múltipla. Biosaúde, Londrina, v. 8, n. 2, p. 125-144, jul./dez. 2006. Disponível
em: <http://www.uel.br/revistas/uel/index.php/biosaude/article/view/125-
144/19402>. Acesso em: 4 dez. 2016.

Após Willis, a combinação de anatomia e ilustração do encéfalo ficou estancada até o final do
século XVIII. O anatomista francês Félix Vicq d’Azyr, que incialmente se mostrou talentoso poeta, fora
convencido por seu pai a prosseguir a tradição familiar de entrar para a medicina.

Encantado com as ideias de Étienne Bonnot de Condillac e John Locke, Vicq d’Azyr foi convencido
de que o estudo humano deve ser alumiado pelo estudo dos animais; para ele, o lugar do homem na
natureza não é totalmente compreendido sem uma simbiose com as demais espécies.

Figura 51 – Retrato de Félix Vicq d’Azyr. A assinatura de Vicq d’Azyr foi tomada de uma carta manuscrita
encontrada na Biblioteca da Académie Nationale de Médecine e eletronicamente importada para o retrato

52
ANATOMIA DOS SISTEMAS

Vicq d’Azyr dissecou muitos animais pertencentes a espécies diferentes, incluindo raras
amostras obtidas na África, e progressivamente desenvolveu um amplo conhecimento no campo
da anatomia comparativa.

Figura 52 – O mandril

Os conhecimentos sobre a neuroanatomia não avançaram após as contribuições realizadas por


Andreas Vesalius. Durante o século XVI, os tratados anatômicos de Jean Riolan e Raymond Vieussens
e as descrições encefálicas estavam “enterradas” em capítulos dedicados à esplancnologia, sendo a
dura‑máter considerada como um “envelope” semelhante à pleura e ao peritônio que revestem as
paredes torácica e abdominal, respectivamente.

Em contrapartida, Vicq d’Azyr era fascinado pelo encéfalo, considerando esses órgãos como os
responsáveis pelo pensamento. De tal modo, ele percebeu que o avanço da neuroanatomia se beneficiaria
imensamente com os conhecimentos funcionais desses órgãos.

Vicq d’Azyr dividiu a superfície convexa do cérebro em três grandes áreas: frontal, parietal e occipital,
correspondendo às áreas anterior, média e posterior, como os lobos de outros anatomistas. Estudou o
córtex cerebral, delimitando a fissura longitudinal do cérebro, o giro pré-central e o giro pós-central,
entretanto não os nomeou. Foi também o primeiro anatomista a descrever o fascículo mamilotalâmico,
a estria da camada granular interna do córtex cerebral e o forame cego, sendo este correspondente à
terminação na fissura mediana anterior da medula espinal.

53
Unidade I

Figura 53 – A) Desenho de um cérebro humano seccionado ao longo do plano sagital e que ilustra o corpo caloso, a estria da lâmina
granular interna do córtex cerebral (faixa interna de Baillanger) e a glândula pineal. O bulbo olfatório, o pedúnculo e as estrias
também são ilustrados em conjunto com a substância perfurada anterior. B) Desenhos de uma secção parassagital do cérebro
humano que ilustra o fascículo mamilotalâmico

Vicq d’Azyr também forneceu insuperáveis representações da formação do hipocampo. Ele identificou
os sulcos occipitoparietal e calcarino; os giros do cíngulo – o pré-cúneo e o cúneo –, o unco; a substância
perfurada anterior; a ínsula; o trato espinotalâmico; vários sulcos cerebelares; e a estrutura interna da
medula espinal. Além disso, é de Vicq d’Azyr, e não de Samuel Thomas Sömmerring como comumente
se acredita, a descoberta da substância nigra.

Figura 54 –Reprodução de duas figuras em cores, de Vicq d’Azyr, as quais representam seções
horizontais através do cérebro humano tomadas a dois níveis diferentes dorsoventrais

54
ANATOMIA DOS SISTEMAS

Vicq d’Azyr também complementou a descrição dos núcleos da base, fez uma clara distinção entre
o núcleo caudado e o putame, observou a existência dos dois segmentos do globo pálido, que foram
nomeados cinquenta anos mais tarde pelo alemão neuroanatomista Karl Friedrich Burdach e, por fim,
demonstrou experimentalmente, bem como anatomicamente, a existência do forame interventricular
entre os ventrículos laterais e o terceiro ventrículo.

Em geral, porém, o seu trabalho sobre a fisiologia cerebral era muito menos preciso do que a sua
contribuição para a organização estrutural do cérebro. Como ele defendia uma ideia medieval e arcaica,
sustentada por Galeno em relação à decussação dos nervos ópticos, acreditava que as fibras ópticas
não cruzassem a linha média, exceto em alguns peixes, ao imaginar que o cruzamento dessa estrutura
anatômica estivesse completo.

Lobo parietal Sulco central


Sulco
occipitoparietal Lobo frontal
Lobo occipital Giro do cíngulo
Sulco calcarino
Corpo caloso
Septo pelúcido
Diencéfalo

Mesencéfalo
Cerebelo
Ponte

Bulbo

Figura 55 – Vista medial do encéfalo em plano de secção sagital

Sulco central
Lobo parietal
Lobo frontal

Lobo da ínsula
Lobo occipital Sulco lateral
(com afastamento)

Lobo temporal

Figura 56 – Vista lateral do encéfalo

Lembrete

Decussação é uma formação neuroanatômica formada por fibras


nervosas que cruzam o plano mediano de forma oblíqua, como a decussação
motora ou das pirâmides.
55
Unidade I

Observação

Pequeno glossário de algumas estruturas anatômicas mencionadas por


Vicq d’Azyr:

• Glândula pineal, do latim pinealis, relativo ao pinho. É parte do


epitálamo, sendo um órgão ímpar, mediano, que se localiza numa
depressão entre os colículos superiores, abaixo do corpo caloso, do
qual está separado pelo III ventrículo e pelas veias cerebrais.

• Bulbo olfatório é a principal estação retransmissora da via olfatória.

• Substância perfurada anterior é uma área achatada, deprimida, na


superfície basal do hemisfério cerebral logo rostralmente ao trato
olfatório. É assim denominada devido aos numerosos minúsculos
orifícios deixados na sua superfície pela retirada de pequenos vasos
de sangue penetrantes quando a pia-máter é removida.

• Pedúnculos cerebrais são dois feixes maciços de fibras, que possuem


fibras corticofugais para níveis inferiores.

• Hipocampo é uma estrutura anatômica em forma de “C” em


cortes coronais, salientando-se no interior do corno temporal do
ventrículo lateral. Recebeu esse nome graças à semelhança com um
cavalo-marinho.

• Giro do cíngulo, do latim cingulum, significa cinto ou cinta.


Paleocórtex de quatro camadas situado superiormente ao corpo
caloso. Parte do lobo límbico.

• Cúneo, do latim cuneos, quer dizer cunha. O cúneo é um lóbulo em


forma de cunha na face medial do lobo occipital entre os sulcos
occipitoparietal e calcarino.

• Unco, do latim uncus, referente a gancho. É a extremidade anterior


curvada medialmente do giro para-hipocampal.

• Trato espinotalâmico. Trato é um feixe de fibras nervosas com a mesma


origem, trajeto, função e destino. As fibras podem ser mielínicas ou
amielínicas. Portanto, o trato espinotalâmico é uma via ascendente
que passa pela medula espinal até o tálamo.

56
ANATOMIA DOS SISTEMAS

• Ínsula é uma estrutura anatômica profunda no sulco lateral.

• Substância nigra é uma massa pigmentada de neurônios disposta


entre os pedúnculos cerebrais e o tegmento.

• Forame interventricular, ou forame de Monro, é a abertura entre o


ventrículo lateral e o III ventrículo. Está situado entre as colunas do
fórnice e a extremidade anterior do tálamo.

Tálamo

Nervo óptico

Quiasma óptico
Pedúnculo cerebral

Ponte

Figura 57 – Vista anterior do tálamo e do tronco encefálico

Figura 58 – Forame interventricular

57
Unidade I

Saiba mais

A hidrocefalia é uma patologia multifatorial que surge


predominantemente na infância. Neste artigo, o autor realiza uma
revisão histórica do diagnóstico e do tratamento, comentando as
técnicas atuais, os resultados e as complicações.

CUNHA, A. H. G. B. Hidrocefalia na infância. Revista Brasileira de Neurologia


e Psiquiatria, Salvador, v. 20, n. 1, 2006. Disponível em: <https://rbnp.emnuvens.
com.br/rbnp/article/download/74/35>. Acesso em: 9 dez. 2016.

No século XVIII, tivemos anatomistas relevantes, como as figuras ilustres de Antônio Pacchioni,
Giovanni Maria Lancisi, Domenico Felice Cotugno, Giovanni Fantoni, Jacques-Bénigne Winslow e Samuel
Thomas von Sömmering.

Figura 59 – A reprodução de um medalhão honorário do Pacchioni Dissertationes Físico-anatomicae (1721).


“Esquerda: o anverso mostra o retrato de Antônio Pacchioni”. “Direita: o reverso representa uma cena mitológica:
um gênio alado orienta uma criança (o próprio Pacchioni) em direção a Apollo, que, enquanto descobre um
cadáver humano (anatomia), mostra a seu aluno o caminho para o templo de glória. A criança aos pés de
Apollo segura em sua mão esquerda uma pinha (símbolo de Esculápio, o deus da Medicina e da cura na
mitologia grego-romana); nas mãos de Pacchioni, uma lupa”. A latina inscrição diz:
Non Inglorius Ibis (“Você não fica sem honra”)

Em 1705, Antônio Pacchioni descreveu as granulações da dura-máter. Ele postulou que os


movimentos diastólico e sistólico das meninges poderiam forçar o fluido nervoso através dos nervos do
cérebro em direção à periferia por meio da “função de espremê-los”. Suas preocupações com a anatomia
funcional das meninges levou-o a ser lembrado por duas características dessa estrutura anatômica: as
granulações aracnóideas e o forame de Pacchioni.

58
ANATOMIA DOS SISTEMAS

Figura 60 – Granulações e forame de Pacchioni

Giovanni Maria Lancisi foi um importante médico italiano, professor de cirurgia, anatomia e
medicina teórico-prática na Universidade de Roma. No campo da neurociência, Lancisi escreveu
Dissertatio Physiognomica (1710), no qual ele retratou a relação entre o mimetismo do músculo frontal
e as fibras das meninges e do cérebro, e Dissertatio de Sede Cogitantis Animae (1712), dedicado ao
médico Giovanni Fantoni, em que ele considerava o problema das localizações cerebrais e especificidade
das funções corticais.

Figura 61 – Giovanni Maria Lancisi

59
Unidade I

Lancisi e outros autores compartilharam dos conceitos a respeito de as fibras de Pacchioni se


cruzarem no corpo caloso, bem como a ideia de Pacchioni sobre o fluido nervoso que era “espremido”
nos nervos do cérebro, sendo gerado pelo movimento das meninges. Em Dissertatio de Sede Cogitantis
Animae (1712), por outro lado, ele sugeriu que a glândula pineal desempenhasse um papel relevante,
uma vez que foi conectada até o tálamo através das habênulas. É interessante notar que a teoria de
Lancisi foi recusada em 1749 por Johann Gottfried Zinn, que realizou uma série de experimentos
cerebrais em cães.

Lembrete

Habênulas, do latim Habenula, diminutivo de Habena, “freio ou rédea”,


consistem em um par de massas nucleares.

Os estudos anatômicos de Lancisi foram muito meticulosos, e ele forneceu uma excelente descrição
do corpo caloso:

Ao corpo caloso, queremos dizer que a sua superfície medular é semelhante


a uma faixa branca, com um dedo e meio de largura, que, na sua parte
superior, funciona quase horizontalmente sob a sutura sagital. Ele é mais
estreito na sua parte anterior e maior na sua parte posterior. Apresenta a
forma de fundo de saco e colunas, e se curva, assumindo uma forma elíptica;
neste formato, o corpo caloso se une e conecta os hemisférios cerebrais. O
septo pelúcido, por outro lado, não é nada mais do que um prolongamento
interior do corpo caloso e um fundo de saco, também, localizado na parte
medular e mediana do cérebro (GRONDONA, 1965, p. 412 apud DI IEVA,
2007, tradução nossa).

Em amostras de cérebros de cavalos, Lancisi observou as fibras que cruzam o corpo caloso e
a sua união entre os dois hemisférios cerebrais. Após a remoção dos hemisférios cerebrais e da
pia-máter, ele escreveu que os nervos medulares serão vistos numa direção transversal e paralela
um ao outro.

Em Dissertatio de Sede Cogitantis Animae (1712), Lancisi continua:

Na parte superior do corpo caloso [...]. Eu observei uma coisa completamente


ignorada ou não observada até agora: cada fibra transversal medular é
interceptada em um ângulo direito a dois nervos, que são medulares,
rodados e têm um diâmetro variável. Esses não são revestidos pela
dura‑máter, mas é envolvido pela aracnoide-máter ao longo do corpo
caloso para a frente e para trás (GRONDONA, 1965, p. 417 apud DI IEVA,
2007, tradução nossa).

60
ANATOMIA DOS SISTEMAS

Em resumo, ele descreveu a nervali longitudinales ab anterioribus ad posteriora excurrentes,


que ainda são chamadas de “estrias longitudinais mediais” ou estrias de Lancisi, conforme a
figura a seguir.

Figura 62 – Encéfalo humano (CC: corpo caloso; IG: indusium griseum;


mLS: estrias longitudinais mediais; ILS: estrias longitudinais laterais,
CR: radiação do corpo caloso; C: cerebelo)

Em suas dissecações, Lancisi também notou a presença de estrias longitudinais laterais. No


entanto, em sua concepção do corpo caloso como a sede da alma e dos nervos como as fibras em
que os espíritos poderiam fluir, ele interpretou as estrias longitudinais mediais, as quais ele descreveu
como um “caminho” para o fluxo da alma ou quiçá para a consciência, localizada entre a parte
anterior do corpo caloso e as colunas anteriores do fundo de saco, entre a parte posterior do corpo
caloso e o tálamo, consistindo numa espécie de conexão entre a sede da alma e os órgãos periféricos,
ou seja, entre a alma e o corpo.

Lancisi descreveu que a parte superior do corpo caloso, de ambos os lados, está coberta pelo
giro do cíngulo, do qual está separado pelo sulco caloso em forma de fenda. Ele se encontra coberto
por uma fina camada de substância cinzenta, o indusium griseum (giro supracaloso) e pelas estrias
longitudinais mediais e laterais, conforme ilustram as figuras a seguir.

61
Unidade I

Figura 63 – 1: Radiação do corpo caloso, fórceps menor (frontal) (telencéfalo); 2: Joelho do corpo caloso (telencéfalo); 3: Estria
longitudinal lateral, indúsio cinzento, corpo caloso (telencéfalo); 4: Estria longitudinal medial, indúsio cinzento, corpo caloso
(telencéfalo); 5: Córtex cerebral (telencéfalo); 6: Substância branca do cérebro (telencéfalo); 7: Massa cinzenta (telencéfalo);
8: Esplênio do corpo caloso (telencéfalo); 9: Cerebelo (metencéfalo); 10: Radiação do corpo caloso, fórceps maior (occipital)
(telencéfalo); 11: Radiação do corpo caloso (telencéfalo); 12: Nesta área da dissecção horizontal projetando uma radiação do corpo
caloso foram intersectadas fibras ascendentes para a coroa radiada, dando uma aparência desordenada para as fibras; 13: Sulco
lateral (fissura de Silvio) (telencéfalo); 14: Polo occipital (telencéfalo)

Formado em medicina pela Universidade de Nápoles, em 1756, Domenico Felice Cotugno realizou
diversas viagens a Roma, onde sofreu fortes influências de Giovanni Battista Morgagni, dedicando-se
aos estudos da anatomia humana.

Figura 64 – Domenico Felice Cotugno

62
ANATOMIA DOS SISTEMAS

Cotugno descreveu a presença do líquido cerebrospinal (LCS) sob a dura-máter, dentro dos
ventrículos encefálicos, circulando pela medula espinal e nos hemisférios cerebrais. Ele também
esclareceu a circulação do LCS dos ventrículos encefálicos através do aqueduto do mesencéfalo
até o espaço subaracnóideo. Além disso, concluiu que sua descoberta só foi possível devido ao fato
de que uma nova técnica de dissecação tinha sido introduzida, sem que se separasse a cabeça do
resto do corpo.

Seu discípulo, Heinrich Johann Nepomuk von Crantz, observou que a descoberta de seu mestre
em anatomia era viável baseada em 20 dissecações realizadas em cadáveres humanos, posicionados
verticalmente e de cabeça para baixo.

Há um consenso histórico de que Domenico Cotugno foi o primeiro a descobrir o LCS no espaço
subaracnóideo. O nome fluido cerebrospinal foi introduzido por François Magendie na primeira metade
do século XIX.

Algumas décadas mais tarde, Giovanni Fantoni corrigiu os erros cometidos por Antônio
Pacchioni. Por um lado, ele mostrou que a dura-máter não apresenta qualquer feixe muscular; por
outro, Fantoni afirmou que as granulações aracnóideas são as responsáveis p​​ ela reabsorção do LCS,
e não pela sua secreção.

O LCS é conduzido até o seio sagital superior da dura-máter em vez da


convexidade do hemisfério cerebral. De tal modo, combina com as leis da
natureza, sendo que o próprio seio, e não as meninges, são irrigadas pela
presença do líquido, e o sangue irá, por conseguinte, ser diluído (FANTONI,
1738 apud OLRY, 1999, p. 10).

O francês Jacques-Bénigne Winslow descreveu as duas camadas da dura-máter sobre o encéfalo. A


camada externa está intimamente aplicada à face interna do crânio. A camada interna envia tabiques
para dentro entre as divisões maiores do encéfalo, designadas de foice do cérebro, tentório do cerebelo
e foice do cerebelo.

Samuel Thomas von Sömmering também foi um dos mais experientes e famosos neuroanatomistas
do século XVIII. Além da sua descrição do tronco encefálico e da classificação dos 12 pares de nervos
cranianos, instituiu a teoria de que a alma se situa no ventrículo encefálico e tem contato com os nervos
do corpo.

O seu estudo foi alinhado com o de Vicq d’Azyr e versava sobre a preocupação de dividir o corpo em
partes compreensíveis ao estudo. Em sua magnífica obra Uber das Organ der Seele (1796), Sömmering
realizou ilustrações do cérebro humano com lucidez e exatidão.

63
Unidade I

Figura 65 – Ilustração em corte sagital e da base do encéfalo humano

Ainda no século XVIII, David Hartley preocupou-se com as localizações cerebrais, mostrando
primeiramente que o córtex cerebral não era a sede da sensação, nem a causa exclusiva do movimento.
A base da sensação e do movimento era a substância branca do cérebro e do cerebelo. Ademais, Hartley
definiu a memória como a insistência das impressões sobre a substância cerebral. As circunvoluções do
cérebro eram para aumentar o espaço disponível para a memória.

Hemisfério direito Hemisfério esquerdo


Córtex cerebral
(substância cinzenta)
Fissura longitudinal
Substância branca
Giro cerebral
Sulco
Corpo caloso
Ventrículo cerebral
(ventrículo lateral)

Figura 66 – Vista anterior de encéfalo humano em plano de secção frontal

Contrariando as teorias holísticas dos séculos XVII e XIX sobre o funcionamento cerebral, Luigi
Rolando defendeu que o SN poderia ter áreas caracterizadas do ponto de vista morfofuncional.

Figura 67 – Luigi Rolando

64
ANATOMIA DOS SISTEMAS

Ele averiguou ainda que apesar da variabilidade existiam sempre dois giros, dispostos
transversalmente à fissura de Sylvius, um na região frontal e o outro na região lateral. Entre eles
havia um sulco, também constante, que recebeu o nome de fissura de Rolando em sua homenagem,
atualmente denominado sulco central.

Sulco central Sulco pré-central


Sulco pós-central
Sulco lateral
Sulco temporal
superior

Cerebelo Ponte

Figura 68 – Vista lateral do encéfalo humano

Após estudar os giros, os sulcos e a fissura, Rolando descreveu o cerebelo como a bateria que
produz a eletricidade necessária para gerar a contração muscular.

Os conceitos de Rolando contrariaram a ideia holística e abriram caminho para uma nova teoria
de organização funcional do cérebro, dando características topográficas para os papéis cerebrais.

O francês Marie Jean-Pierre Flourens, estudioso de anatomia comparada, sugeriu que as


funções se encontrassem precisamente nas várias partes do córtex cerebral. Ele identificou o
cerebelo como um coordenador motor – mesmo tendo idealizado de maneira errônea que esse
controle era feito contralateralmente. Flourens descreveu perfeitamente o sistema vestibular
como portador da vertigem e do nistagmo.

Figura 69 – Marie Jean-Pierre Flourens

65
Unidade I

Lembrete

Córtex é a “casca” formada por substância cinzenta e organizada


em camadas.

O médico e anatomista vienense Franz Joseph Gall descreveu as intumescências cervical e


lombossacral da medula espinal, diferenciou as substâncias cinzenta e branca, além de fazer a descrição
das origens encefálicas dos nervos cranianos óptico, troclear e abducente.

Figura 70 – Franz Gall

Intumescência cervical

Intumescência lombossacral

Figura 71 – Intumescências cervical e lombossacral da medula espinal

66
ANATOMIA DOS SISTEMAS

Lembrete

Intumescências cervical e lombossacral são regiões de onde emergem


as raízes nervosas que compõem os plexos braquial e lombossacral, que
inervam os membros superiores e inferiores, concomitantemente.

Observação

O pequeno nervo troclear, ou IV par de nervo craniano, e o VI par de


nervo craniano, ou nervo abducente, são também nervos motores para um
dos músculos extrínsecos do olho.

Gall propôs, no começo do século XIX, que o comportamento humano poderia estar correlacionado
com características faciais externas. Numa fase inicial do seu trabalho, ele se juntou ao anatomista
Johann Kaspar Spurzheim e publicaram uma série de artigos científicos sobre a anatomia funcional
e a psicologia.

Por discordar de Gall quanto à necessidade de um maior rigor científico para prosseguir suas
afirmações, Spurzheim se separou e fundou a frenologia. Depois de décadas de notoriedade, a disciplina
de frenologia desmoronou em infelicidade, quando foi recomendada como método para eleger membros
do parlamento, entre outros.

Figura 72 – Johann Kaspar Spurzheim

67
Unidade I

Lembrete

Frenologia é uma teoria que reivindica ser apropriado determinar o


caráter, as características da personalidade e o grau de criminalidade pelo
formato da cabeça, observando os “caroços” ou as “protuberâncias”.

Genialidade
n to
cime

Cu
he Militâ

ltu
Co
n ó ria ncia

ra
M em
Enigma

Humor

Terror
Eu

Figura 73 – Mapa frenológico

Franz Gall era um conhecedor da fisiologia cerebral. Apesar dos ataques, as suas ideias resistiram até
os experimentos do neurologista francês Jean-Baptiste Bouillaud, que criou individualmente a teoria da
localização, especialmente no que se referia à fala.

Compete a Pierre Paul Broca, anatomista, antropologista e cirurgião – um aluno de Bouillaud –,


mostrar a relação entre o lobo frontal esquerdo e a linguagem denominada área de Broca. Suas conclusões,
fundamentadas em avaliações clínicas e estudos anatômicos e, em especial, no estudo de dois pacientes
e suas posteriores necropsias, são consideradas, hoje em dia, o marco inicial da neuropsicologia. Em 1865,
Paul Broca associou o hemisfério esquerdo com a produção da fala e a ideia de dominância manual.

Figura 74 – Pierre Paul Broca

68
ANATOMIA DOS SISTEMAS

Figura 75 – Área de Broca. Nesta região, observam-se as áreas 44 e 45 de


Brodmann, assim como o ramo horizontal (parte anterior da área 45),
o sulco central e o ramo ascendente (parte posterior dessa mesma área)

Ao estudar a anatomia comparada dos sulcos e dos giros cerebrais de mamíferos, Paul Broca, em
1877, descreveu que o “grande lobo límbico” era formado pelos giros do cíngulo e para-hipocampal,
e a “fissura límbica” era constituída pelos sulcos, recentemente, chamados de sulco do cíngulo, sulco
subparietal e sulco colateral, tendo aceitado o termo límbico em razão do seu significado (do latim
limbus: orla, anel em torno de), uma vez que essas estruturas anatômicas, presentes em todos os
mamíferos, estão em torno do topo do tronco encefálico.

Figura 76 – O grande lobo límbico de Broca

69
Unidade I

Figura 77 – Sulcos e giros da face medial e da parte têmporo-occipital da face inferior do cérebro humano. Os sulcos das faces medial
e inferior do cérebro A) delimitam os seus giros, B) formando um anel giral mais interno, o giro do cíngulo (GCi) continua com o
giro para-hipocampal (GPH), compondo um verdadeiro giro límbico disposto em torno do corpo caloso (CC) e do tálamo (Ta). O giro
para‑hipocampal (GPH) continua com o giro do cíngulo (GCi) através do istmo (Ist), que se dispõe posteriormente ao esplênio do corpo
caloso (Espl), e apresenta também precisas conexões ou continuidades com o giro do pré-cúneo (PreCu) e com o giro lingual (GLi).
O sulco do cíngulo (SCi), o sulco subparietal (SSubP) e o sulco colateral (SCol), em conjunto, formam a fissura límbica, que separa o
anel giral interno de um anel giral externo formado pelo giro frontal superior (GFS) ou medial (GFM), lóbulo paracentral (LPaC), giro
do pré‑cúneo (PreCu), giro do cúneo (Cu), giro lingual (GLi), giro fusiforme (GFu), e pelo giro temporal inferior (GTI), que, por sua vez,
continua com os giros da face superolateral do cérebro, ao longo das suas margens superior e inferolateral. O sulco do cíngulo (SCi)
separa o giro do cíngulo (GCi) do giro frontal superior (GFS) ou medial (GFM), e os seus ramos – sulco paracentral (SPaC) e ramo marginal
ascendente (RMSCi) – delimitam anterior e posteriormente o lóbulo paracentral (LPaC). O sulco occipitoparietal (SPO), que separa os
giros do pré-cúneo e do cúneo, emerge do ponto aproximadamente médio do sulco calcarino (FCa); enquanto a metade distal do sulco
calcarino (FCa) separa o cúneo (Cu) do giro lingual (GLi), a sua metade proximal separa o giro lingual (GLi) do pré-cúneo (PreCu) e do
istmo do cíngulo (Ist). O sulco colateral (SCol) separa o giro para-hipocampal (GPH) do giro fusiforme (GFu) e pode ser contínuo ou
distinto do sulco occipitotemporal (SOT) que separa o giro para-hipocampal (GPH) do giro temporal inferior (GTI) e do sulco rinal (SRi) –
que separa o unco do giro para-hipocampal (Un) do restante do polo temporal (PoTe). Na região subcalosa, sob o rostro do corpo caloso
(Ro), dispõem-se verticalmente, imediatamente à frente da comissura anterior (ComAnt), os giros paraolfatório (GPaOlf) e paraterminal
(GPaTe), delimitados pelos sulcos paraolfatórios anterior (SPaOlfAnt) e posterior (SPaOlfPost). Anteriormente a estes, dispõe-se o polo
do cíngulo (PoCi), constituído por uma prega de conexão entre o giro do cíngulo (GCi) e o giro reto (GRe), que contorna a porção mais
posterior do sulco rostral superior (SRoSup), que, por sua vez, separa esses dois giros. O giro reto (GRe) é constituído pela extensão basal
do giro frontal superior (GFS) ou medial (GFM) e abriga no seu interior o sulco rostal inferior (SRoInf). FM: forame interventricular de
Monro; Fo: fórnice; IIIv: terceiro ventrículo; VL: ventrículo lateral

70
ANATOMIA DOS SISTEMAS

Os trabalhos de Broca sobre a determinação das localizações cerebrais foram seguidos pelas
interpretações neurológicas de Charcot, Gowers e Jackson, sobretudo quanto à representação da
área motora, permitindo o começo da cirurgia de retirada dos tumores encefálicos antecipadamente
localizados pelo exame neurológico. Esses relatos possibilitaram, também, a Fritsch e Hitzig detectar a
localização do córtex motor, o que, por sua vez, abriu as portas para Ferrier começar seus experimentos
com estimulação cortical, determinando uma nova fase na neurociência.

Saiba mais

Este texto é uma tradução do capítulo “Brain and Behavior” (Cérebro


e Comportamento) feita pela professora Maria Carolina Doretto. Nele
você encontrará uma revisão morfofuncional do SN. Bons estudos!

KANDEL, E. R.; SCHWARTZ, J. H. Brain and behavior. In: ___. Principles


of neural sciences. 2. ed. New York: Elsevier, 1985. Capítulo traduzido
para o português por Maria Carolina Doretto. Disponível em: <http://
atividadeparaeducacaoespecial.com/wp-content/uploads/2014/07/
C%C3%89REBRO-E-COMPORTAMENTO1.pdf>. Acesso em: 9 dez. 2016.

A topografia funcional já não conseguia esclarecer de forma persuasiva as diversas manifestações


clínicas relatadas na literatura médica. Pesquisadores desgostosos com essa circunstância passaram a
se dedicar ao estudo das conexões entre as áreas cerebrais para poder encontrar os seus papéis, dando
origem aos mapas corticais.

O primeiro destaque é para Alfred Campbell, que em seu trabalho estruturou diferenças regionais
do córtex cerebral em relação à histologia, agregadas às descobertas clínico-patológicas dos hipotéticos
papéis desempenhados por essa região, culminando na anatomia, na patologia e na fisiologia.

Joseph Jules Dejerine introduziu novas técnicas de dissecação de fibras brancas, agregadas à coloração
por hematoxilina ferrosa, e conseguiu demonstrar diferentes correlações entre as áreas corticais e as
suas projeções em territórios da linguagem, o que permitiu a descrição de lesões occipitotemporais, com
extensão do esplênio do corpo caloso.

Observação

A coloração por hematoxilina ferrosa é utilizada em histologia, em


técnicas de coloração biológica.

As lesões occipitotemporais produziam inesperada perda do campo visual direito, atingindo a


aptidão de leitura. Entretanto, os pacientes conservavam ilesa a aptidão de leitura, embora não
compreendessem o que havia sido escrito. O quadro clínico foi chamado de alexia sem grafia.
71
Unidade I

Lembrete

O corpo caloso é dividido em: rostro, joelho, tronco e esplênio.

O neurologista alemão Carl Wernicke descreveu a relação causal entre a lesão no primeiro giro
temporal esquerdo e uma das formas clínicas da afasia, denominada afasia sensorial.

O nome afasia sensorial foi sugerido por Wernicke para fazer frente à afasia motora descrita
anteriormente por Broca. Na afasia motora de Broca, os pacientes falam pouco, entretanto compreendem
a linguagem, enquanto na afasia sensorial de Wernicke a fala está preservada, porém a sua linguagem
é inapropriada e a sua compreensão da linguagem dos outros está prejudicada.

Figura 78 – Diagrama de Wernicke de organização da linguagem no cérebro. No diagrama, a) ponto no qual a rota acústica entra no
tronco encefálico; a1) terminação cortical da rota acústica; b) centro para imagens motoras verbais; b1) saída do tronco encefálico
para rotas motoras centrífugas; O) polo occipital; F) polo frontal; C) sulco central; S) sulco lateral. A afasia poderia ser causada por
qualquer lesão na rota a-a1-b-b1, porém o quadro clínico iria variar de acordo com o local preciso da lesão.

Saiba mais

Seduziremos você a realizar a leitura do artigo científico


Desenvolvimento Histórico e Fundamentos Metodológicos da
Neuropsicologia Cognitiva. Nele você compreenderá o surgimento da
neuropsicologia descrita como uma resultante dos estudos sobre as
relações entre afasia e as lesões cerebrais. Para tanto, acesse:

KRISTENSEN, C. H. et al. Desenvolvimento histórico e fundamentos


metodológicos da neuropsicologia cognitiva. Psicologia: Reflexão e
Crítica, v. 14, n. 2, p. 259-74, 2001. Disponível em: <http://www.scielo.
br/pdf/%0D/prc/v14n2/7853.pdf>. Acesso em: 4 set. 2016.

72
ANATOMIA DOS SISTEMAS

Nos trabalhos científicos envolvendo as anatomias macroscópica, microscópica e funcional, o


fisiologista francês François Magendie e Sir Charles Bell desenvolveram a Lei de Bell-Magendie: as raízes
espinais anteriores são motoras, e as raízes posteriores são sensitivas.

Magendie descreveu o LCS em 1827, e o forame de Magendie, atualmente designado como


abertura mediana do IV ventrículo, localizado no teto do IV ventrículo, em 1842. Ele também
descreveu o espaço de Magendie, ou espaço subaracnóideo, correspondente aos principais sulcos
dos hemisférios cerebrais.

Figura 79 – Encéfalo humano, hemisfério direito. 1: árvore da vida; 2: comisssura posterior;


3: tonsila cerebelar; 4: língula; 5: mesencéfalo; 6: véu medular; 7: cisterna quadrigeminal;
8: teto do IV ventrículo; 9: aqueduto do mesencéfalo; 10: ponte; 11: Forame de Luschka;
12: Forame de Magendie

Entre a pia-máter e a aracnoide-máter, há um espaço virtual chamado subaracnóideo. Este espaço


subaracnóideo percorre o LCS, cujo papel consiste em suavizar os efeitos do peso relativo ao SNC
(princípio de Arquimedes), prevenindo, de tal forma, os traumas devido ao contato com a superfície
óssea. Nele podem também ser injetados anestésicos. O LCS é retirado para exames, como a análise
microbiológica na suspeita de meningite.

A ideia de que espíritos animais percorriam os nervos, originada dos pensadores gregos,
permaneceu como uma verdade até o século XVII, quando ficou evidenciada a natureza elétrica
na condução nervosa, enfatizando-se, para isso, o trabalho de Luigi Galvani primeiramente, e,
no século seguinte, o de Emil Du Bois-Reymond, que realizou seus estudos sobre a transmissão
nervosa nas décadas de 1840 e 1870.

Ele sugeriu que os órgãos efetuadores seriam excitados pelos nervos por meio de corrente elétrica,
ou de substâncias químicas liberadas nas terminações nervosas, terminando, assim, o ciclo dos espíritos
como determinantes de atividade nervosa.

73
Unidade I

Figura 80 – Luigi Galvani em experimentos com modelos animais (sapos)

Figura 81 – Máquina elétrica e arcos metálicos

Figura 82 – Trabalhos de Du Bois-Reymond mostrando o fluxo de corrente elétrica através do galvanômetro

74
ANATOMIA DOS SISTEMAS

O anatomista italiano Filippo Pacini redescobriu cerca de um século após Abraham Vater, anatomista
alemão, as terminações nervosas encapsuladas de vasta distribuição. Essas terminações nervosas,
atualmente, são designadas de corpúsculos de Vater-Pacini, nomeados em homenagem aos dois
anatomistas. Outras terminações nervosas encapsuladas foram descritas pelo anatomista alemão Georg
Meissner, em 1853. Hoje são designadas de corpúsculos de Meissner.

Em 1860, Johann Friedrich Wilhelm Krause descreveu novas terminações nervosas encapsuladas,
os bulbos terminais de Krause, vastamente disseminadas e relacionadas à sensibilidade térmica.
As terminações nervosas livres posicionadas no estrato germinativo da epiderme que conduzem
sensibilidade tátil foram descritas por Friedrich Sigmund Merkel, anatomista alemão, em 1880. Em 1898,
o anatomista italiano Ângelo Ruffini descreveu as terminações nervosas encapsuladas designadas de
corpúsculos de Ruffini.

Observação

Corpúsculo de Vater-Pacini: receptor sensorial encapsulado localizado


no tecido subcutâneo, no periósteo e no pâncreas sensível à vibração de
alta frequência.

Corpúsculo de Meissner: receptor sensorial encapsulado localizado nas


papilas dérmicas que responde a estímulos de vibração de baixa frequência.

Corpúsculos de Krause: receptores sensoriais encapsulados sensíveis a


estímulos mecânicos encontrados na região limítrofe entre pele e mucosa.

Corpúsculo de Merkel: receptor sensorial do tipo terminação nervosa


com expansão e sensível a estímulos táteis.

Corpúsculos de Ruffini: receptores sensoriais encapsulados sensíveis à


pressão encontrados na derme espessa e fina, no tecido subcutâneo e nas
cápsulas articulares.

Grandes células em forma de frasco presentes no cerebelo foram descritas por Johannes Evangelista
Purkinje, fisiologista da Boêmia, em 1837. Theodor Schwann, anatomista alemão, descreveu, em 1838,
as células produtoras de mielina no SNP, denominadas de células de Schwann.

75
Unidade I

Figura 83 – Johannes Evangelista Purkinje

Lembrete

Mielina é o envoltório multilamelar que rodeia os axônios, sendo


constituído por oligodendrócitos no SNC, ou por células de Schwann no SNP.

Saiba mais

Vamos facilitar a compreensão dos próximos tópicos? Leia o artigo


Origem e desenvolvimento da mielina no SNC: um Estudo de Revisão:

MENDES, P. B.; MELO, S. R. Origem e desenvolvimento da mielina no


SNC: um estudo de revisão. Saúde e Pesquisa, Maringá, v. 4, n. 1, p. 93‑99,
jan./abr. 2016. Disponível em: <http://periodicos.unicesumar.edu.br/
index.php/saudpesq/article/view/1654/1208>. Acesso em: 9 dez. 2016.

O aprimoramento do microscópio no começo do século XIX proporcionou aos cientistas sua primeira
chance de observar tecidos animais em magnificações maiores. Os nodos de Ranvier, que consistem em
interrupções na bainha de mielina ao longo do axônio, no qual o citoplasma da célula de Schwann entra
em contato com o axônio, foram descritos por Louis-Antoine Ranvier, histologista francês, em 1871.

No século XX, destacou-se o artista e médico Frank Henry Netter. Suas ilustrações inicialmente eram
distribuídas aos médicos em cartões ou folders, até que, em 1899, foi publicado o Atlas de Anatomia
Humana, que se encontra na 5ª edição, publicada em 2011.

76
ANATOMIA DOS SISTEMAS

As contribuições para a neuroanatomia, durante o século XX, foram inacreditáveis no que diz
respeito à anatomia aplicada e, especialmente, à anatomia microcirúrgica. Com a finalidade de avançar
as técnicas cirúrgicas, tornou-se necessária a compreensão de todas as vias de acesso, ou seja, das mais
variadas formas de atingir determinadas áreas do encéfalo; assim, o conhecimento da neuroanatomia e
as suas ilustrações agora se voltam para a prática neurocirúrgica.

Diversos estudos foram executados de forma descritiva sobre a anatomia aplicada à neurocirurgia,
a fim de abordar as mais variadas temáticas, como as vias de acesso, as craniectomias, a anatomia de
estruturas aplicadas à técnica cirúrgica, além de estudos que visam buscar a correlação da superfície
cerebral com as estruturas anatômicas, e destas com os exames de imagem.

Saiba mais

A craniectomia é uma forma de tratar a hipertensão intracraniana


proporcionando espaço adicional para alojar o tecido cerebral lesado.
Define-se traumatismo cranioencefálico como uma agressão ao cérebro,
em consequência de um trauma externo, resultando em alterações
cerebrais momentâneas ou permanentes, de natureza cognitiva ou de
funcionamento físico, sendo essa lesão um problema de saúde pública na
atualidade. A equipe de Enfermagem é de suma relevância nos processos
que abrangem o tratamento terapêutico nesses tipos de lesões. Para isso,
convidamos você a realizar a leitura do artigo científico:

SILVA, S. R. A. et al. O traumatismo craniano encefálico moderado e grave.


Intesa, v. 9, n. 1, p. 38–42, jan./jun., 2015. Disponível em: <http://gvaa.com.br/
revista/index.php/INTESA/article/download/3245/3203>. Acesso em: 2 dez. 2016.

Os modernos estudos por ressonância magnética permitiram correlacionar a anatomia topográfica


cortical como suas conexões pela tractografia, assim como a sua atividade específica na realização de
determinado papel pela ressonância magnética funcional, possibilitando observar as diversas maneiras
de inter-relação entre diferentes áreas topográficas, in vivo, com número de indivíduos e padronização
de amostra nunca antes cogitado.

Figura 84 – Ressonância magnética mostrando a área de Broca (região triangular)

77
Unidade I

Por fim, a neurofisiologia também teve um grande avanço durante o século XX. O fisiologista
americano Walter Cannon explicou como o sistema nervoso autônomo (SNA) regula o meio interno
do corpo. Ele foi o criador de duas elocuções mnêmicas na língua inglesa que, durante muito tempo,
esclareceram as diferenças funcionais entre a parte simpática e a parte parassimpática do SNA. Segundo
ele, a função simpática seria fight or flight, ou seja, “lutar ou fugir”; enquanto a parassimpática seria rest
and digest, isto é, “repousar e digerir”.

Lembrete

SNA é o sistema motor regulado pelo hipotálamo e constituído por


pequenos neurônios motores, situados no tronco encefálico e na medula
espinal, da qual partem fibras que se direcionam aos gânglios periféricos
ou gânglios autônomos.

O quadro a seguir mostra a evolução na linha do tempo de outros anatomistas e as suas contribuições
relevantes no avanço dos estudos em neuroanatomia.

Quadro 3

Nascimento Nome Contribuições


1675-1715 Domenico Mistichelli Descreveu a decussação das pirâmides.
1682-1771 Giovanni Battista Morgagni Descreveu o tubérculo cuneiforme.

1723-1765 Descreveu o gânglio sensitivo trigeminal e


Johann Lorenz Gasser a impressão trigeminal.

1752-1832 Descreveu os gânglios vestibular e coclear (do nervo


Antonio Scarpa vestibulococlear).

1791-1874 Descreveu o cruzamento dos tratos piramidais na decussação


Jean Cruveilhier das pirâmides.

1810-1868 Descreveu o trato corticoespinal anterior e o


Ludwig Türck trato corticopontino.
Descreveu as aberturas pareadas nos recessos laterais do teto
1820-1875 Hubert von Luschka (aracnóideo) do IV ventrículo através das quais o liquor deixa o
IV ventrículo e chega à cisterna magna.

1843/44-1926 Descreveu o aparelho de Golgi, o órgão tendíneo de Golgi e os


Camillo Golgi neurônios do tipo Golgi.

1861-1940 Descreveu a anatomia e as variações dos principais nervos, do


Henry Head plexo braquial e as áreas dos dermátomos.
Descreveu o circuito que conecta o hipocampo ao hipotálamo,
1883-1958 James Papez tálamo e giro do cíngulo. Subsequentemente, esse circuito serviu
de base para o conceito de sistema límbico.

1.2 Introdução à terminologia da neuroanatomia

A terminologia da neuroanatomia é detalhada na descrição da organização tridimensional complexa


do encéfalo. Os eixos do SN são com facilidade entendidos em animais, que possuem um SNC mais
simples do que aquele dos seres humanos. No gato, por exemplo, o eixo rostrocaudal se estende
aproximadamente em linha reta desde o nariz até a cauda.
78
ANATOMIA DOS SISTEMAS

Dorsal

Rostral Caudal

Ventral

Figura 85 – Os eixos anatômicos e a sua relação com o SNC

Esse é o eixo longitudinal do SN, comumente designado de neuroeixo, porque o SNC possui uma
organização longitudinal predominante. O eixo dorsoventral, perpendicular ao eixo rostral, se estende desde o
dorso até o abdome. As terminologias posterior e anterior são sinônimos de dorsal e ventral, respectivamente.

Dorsal
(superior)

Rostral

Ventral
(inferior)
Ventral Dorsal
(anterior) (posterior)

Caudal

Figura 86 – Os eixos anatômicos e a sua relação com o SNC

Lembrete

Neuroeixo é a linha imaginária que se estende da extremidade inferior


da medula espinal até a região mais superior do encéfalo.

O eixo longitudinal do SN humano não é reto como no gato. Durante a formação, o encéfalo – e, por
conseguinte, seu eixo longitudinal – sofre uma curvatura proeminente, ou flexura, na região do
mesencéfalo. Em vez de descrever as estruturas anatômicas rostrais a essa flexura, normalmente
se usam as terminologias superior e inferior. Essa curvatura do eixo reflete a insistência da
flexura cefálica.

79
Unidade I

Determinam-se três planos fundamentais em relação ao eixo longitudinal do SN nos quais as secções
anatômicas são realizadas. As secções horizontais são realizadas paralelamente ao eixo longitudinal, de
um lado a outro. As secções transversais são realizadas perpendicularmente ao eixo longitudinal, entre as
faces anterior e posterior. As secções transversais do hemisfério cerebral são aproximadamente paralelas
à sutura coronal do crânio e, por conseguinte, também denominados cortes coronais. As secções sagitais
são realizadas paralelamente tanto ao eixo longitudinal do SNC quanto à linha mediana, entre as faces
anterior e posterior. Uma secção mediossagital divide o SNC em duas metades simétricas, enquanto
uma secção parassagital é realizada fora da linha mediana.

O quadro a seguir mostra o significado, com exemplos, de alguns afixos ou termos que são utilizados
frequentemente em neuroanatomia.

Quadro 4

Afixos ou termos Significado Exemplo


Arac- Teia de aranha Aracnoide-máter
Braquio Braço Tronco braquiocefálico
Colículo Saliência Colículo inferior
Córtex “Casca” exterior Córtex cerebral
Di- Através Diencéfalo
Dura Duro, resistente Dura-máter
-encéfalo Pertencente ao encéfalo Mesencéfalo
Fago Comer Fagocitose
Fascículo Feixe Fascículo lateral
Foice Em forma de foice Foice do cerebelo
Glosso- Língua Glossofaríngeo
Lemnisco Fita Lemnisco lateral
Mes- Meio Mesencéfalo
Met- Depois Metencéfalo
Miel- Medula Mielencéfalo
Pedúnculo Ponte Pedúnculo cerebelar
Pros- Em Prosencéfalo
Romb- Em forma de diamante Rombencéfalo
Sub- Abaixo Subcortical
Tel- Final Telencéfalo
Trígono Com formato triangular Trígono do n. hipoglosso

1.3 Divisão do SN

O SN é um todo. Sua divisão em partes tem um significado somente didático, pois estão
intensamente relacionadas dos pontos de vista morfológico e funcional. O SN pode ser decomposto
levando-se em consideração os critérios anatômico, funcional e embriológico. Existe ainda uma
classificação quanto à segmentação.

80
ANATOMIA DOS SISTEMAS

1.3.1 Divisão do SN com base nos critérios anatômicos

Essa divisão, que é uma das mais estimadas, é composta por SNC e SNP. O SNC é aquele que se situa
dentro do esqueleto axial, ou seja, a cavidade craniana e o canal vertebral, constituído pela superposição
dos forames vertebrais; e o SNP é aquele que se situa fora desse esqueleto.

Em geral, idealiza-se que o SNC apresenta duas partes principais, o encéfalo e a medula espinal,
que formam o neuroeixo. O encéfalo é dividido nas seguintes partes: o cérebro, o tronco encefálico e
o cerebelo. O termo cérebro designa o par de hemisférios cerebrais e o diencéfalo. O tronco encefálico
abrange o mesencéfalo, a ponte e o bulbo ou a medula oblonga. No homem, a relação entre o tronco
encefálico e o cérebro pode ser rudemente confrontada à relação que há entre o tronco e a copa de
uma árvore.

A figura a seguir mostra a localização do SNC e do SNP no organismo e esquematiza o encéfalo e a


medula espinal, vistos lateralmente. Os principais nervos periféricos são mostrados em amarelo.

Figura 87 – O sistema nervoso (SN)

Lembrete

De acordo com a localização de suas partes, o SN é dividido em SNC e SNP.

O mesencéfalo é a parte estreita do encéfalo que conecta o cérebro na ponte e no cerebelo. A sua
cavidade estreita é designada como aqueduto do mesencéfalo, que interliga o III ventrículo e o IV ventrículo. O
mesencéfalo compreende muitos núcleos e feixes de fibras nervosas ascendentes e descendentes.

O bulbo apresenta uma forma cônica, conectando-se com a ponte, superiormente, e a medula
espinal, inferiormente. Abrange muitas quantidades de neurônios, designadas de núcleos, e serve de via
para as fibras nervosas ascendentes e descendentes.
81
Unidade I

A ponte situa-se sobre a face anterior do cerebelo, inferior ao mesencéfalo e superior ao bulbo.
Ela deriva o seu nome do amplo número de fibras transversais, que conectam os dois hemisférios
cerebelares, sobre sua face anterior. Também abrange muitos núcleos e fibras nervosas ascendentes
e descendentes.

Lembrete

O tronco encefálico é composto por aglomerados de neurônios


chamados núcleos e por feixes de fibras.

O cerebelo é a formação nervosa volumosa, localizada atrás do bulbo e da ponte, adentrando a


constituição do teto do IV ventrículo. O bulbo, a ponte e o cerebelo rodeiam uma cavidade preenchida
com LCS, o IV ventrículo. Este se conecta superiormente ao III ventrículo por meio do aqueduto do
mesencéfalo; inferiormente, continua com o canal central da medula espinal. Comunica-se com o
espaço subaracnóideo por meio de três aberturas na parte inferior do teto. É através dessas aberturas
que o LCS dentro do SNC atinge o espaço subaracnóideo.

O cérebro, a maior parte do encéfalo, compõe-se de dois hemisférios, que são conectados por uma
massa de substância branca, designada como corpo caloso. Cada hemisfério cerebral expande-se do
osso frontal ao osso occipital no crânio: superiormente à fossa anterior do crânio e à fossa média do
crânio; posteriormente, o cérebro permanece acima do tentório do cerebelo. Os hemisférios cerebrais
são separados por uma fenda profunda, a fissura longitudinal do cérebro, dentro da qual se projeta a
foice do cérebro.

A figura a seguir mostra em secção sagital mediana o encéfalo. É possível observar o tronco
encefálico, a estrutura cerebelar com suas fissuras e folhas, seu córtex, superficialmente, e sua região
profunda composta de substância branca, na qual se encontram seus núcleos profundos.

Figura 88 – Tronco encefálico e cerebelo

82
ANATOMIA DOS SISTEMAS

O diencéfalo está quase totalmente escondido da superfície do encéfalo. Inclui o tálamo, dorsalmente,
e o hipotálamo, ventralmente. O tálamo é uma massa ovoide, ampla de substância cinzenta, que se
localiza de cada lado do III ventrículo. A sua extremidade anterior constitui o limite posterior do forame
interventricular, a abertura entre os ventrículos laterais e o III ventrículo. O hipotálamo compõe a parte
inferior da parede lateral e o assoalho do III ventrículo.

Lembrete

Uma das regiões mais relevantes do SNC, o hipotálamo, pertence


ao diencéfalo.

A medula espinal localiza-se dentro do canal vertebral, na coluna vertebral, e é envolvida por três
meninges: a dura-máter, a aracnoide-máter e a pia-máter. A medula espinal é aproximadamente
cilíndrica; inicia superiormente no forame magno do crânio, onde é contínua com o bulbo, e
acaba inferiormente na região lombar. Abaixo, a medula espinal afila-se no cone medular, a partir
do ápice do qual um prolongamento da pia-máter, o filamento terminal, desce para aderir ao
dorso do cóccix.

Figura 89 – Região proximal da medula espinal, dentro do canal vertebral (a parte posterior das
vértebras foi removida para exposição da medula). Em sua parte proximal, observa-se sua
conformação cilíndrica e a emergência de filetes nervosos que formam os nervos espinais.
Vê-se, ainda, a dura-máter, semirremovida nesta peça

83
Unidade I

Figura 90 – Em sua região distal, vê-se sua terminação cônica e a


cauda equina, que preenche a porção distal do canal vertebral

O SNP abrange os nervos cranianos e espinais, bem como os gânglios e as terminações nervosas.
Portanto, são vias que transportam os estímulos ao SNC ou que carregam até os órgãos efetuadores as
ordens procedidas da parte central.

Lembrete

Gânglios são grupos de neurônios do exterior do SNC.

Nervos são feixes de axônios periféricos com um trajeto comum.

Os 31 pares de nervos espinais estão aderidos por meio das raízes anteriores ou motoras e das raízes
posteriores ou sensitivas. Cada raiz adere à medula por uma sequência de radículas, as quais abraçam
toda a extensão do segmento medular correspondente. Cada raiz nervosa posterior possui um gânglio
da raiz posterior, cujas células dão origem às fibras nervosas periféricas e centrais.

Os 12 pares de nervos cranianos estão conectados com o encéfalo; os 2 primeiros pares de nervos
cranianos, o nervo olfatório e o nervo óptico, apresentam origens encefálicas no telencéfalo e no diencéfalo,
respectivamente. Os demais pares de nervos cranianos possuem origens encefálicas no tronco encefálico.

Lembrete

O I par de nervos cranianos, ou nervo olfatório, conduz impulsos


olfatórios originados da cavidade nasal, portanto são nervos sensitivos.

O II par de nervos cranianos, ou nervo óptico, são nervos sensitivos e


conduzem impulsos de visão oriundos da retina.
84
ANATOMIA DOS SISTEMAS

Ainda que os nervos fiquem circundados por bainhas fibrosas em seu caminho através de diversas
partes do corpo, eles são relativamente desprotegidos e frequentemente lesionados por traumatismos.

Saiba mais

A análise da evolução filogenética do SN possibilita a concepção da sua


morfologia, que sejam entendidas relações entre os desenvolvimentos e
as interações das estruturas nervosas e os prováveis comportamentos dos
seus referentes seres, provocando questionamentos sobre a própria noção
de fatos, como a consciência. Assim, sugerimos que você aprecie o artigo
científico a seguir, acessando:

RIBAS, G. C. Considerações sobre a evolução filogenética do sistema


nervoso, o comportamento e a emergência da consciência. Revista Brasileira
de Psiquiatria, São Paulo, v. 28, n. 4, p. 326-38, 2006. Disponível em: <http://
www.scielo.br/pdf/%0D/rbp/v28n4/12.pdf>. Acesso em: 4 set. 2016.

1.3.2 Divisão do SN do ponto de vista funcional

Do ponto de vista funcional, pode-se dividir o SN em sistema nervoso somático (SNS) e sistema
nervoso visceral (SNV). O SNS é também designado como SN da vida de relação, ou seja, aquele que
relaciona o organismo com o meio. Para isso, a parte aferente do SNS se encaminha aos centros
nervosos gerados em receptores periféricos, comunicando a estes centros sobre o que se passa no
meio ambiente. Em contrapartida, a parte eferente do SNS conduz aos músculos estriados esqueléticos
o comando dos centros nervosos, derivando movimentos que levam a maior relacionamento ou
integração com o meio externo.

O SNV, ou da vida vegetativa, relaciona-se com a inervação das estruturas viscerais e é


muito interessante para a integração da atividade das vísceras no sentido da homeostase. De tal
modo, como o SNS, caracteriza-se no SNV uma parte aferente e outra eferente. O componente
aferente leva os impulsos nervosos oriundos de receptores das vísceras, os visceroceptores, a
áreas específicas do SNC. O componente eferente traz impulsos de certos centros nervosos até
as estruturas viscerais acabando, pois, em glândulas, no músculo liso ou no músculo estriado
cardíaco. Por definição, designa-se como SNA somente o componente eferente do SNV, e o SNA
se divide em simpático e parassimpático.

Observação

O controle de papéis como a digestão, a frequência cardíaca, a micção e


a deglutição é realizado por uma parte do SN chamada de SNA.
85
Unidade I

1.3.3 Divisão do SN com base na segmentação ou metameria

Pode-se dividir o SN em sistema nervoso segmentar e sistema nervoso suprassegmentar. A


segmentação no SN é demonstrada pela conexão com os nervos. Refere-se, pois, ao sistema nervoso
segmentar todo o SNP, mais aquelas partes do SNC que estão em relação direta com os nervos
típicos, ou seja, a medula espinal e o tronco encefálico. O cérebro e o cerebelo dizem respeito ao
sistema nervoso suprassegmentar. Os nervos olfatório e óptico se ligam ao cérebro, todavia não são
considerados nervos típicos.

De tal modo, nos órgãos do sistema nervoso suprassegmentar, a substância cinzenta situa-se por
fora da substância branca e forma uma camada fina, o córtex, que reveste toda a superfície do órgão.
Já nos órgãos do sistema nervoso segmentar não há córtex, e a substância cinzenta pode se situar por
dentro da branca, como acontece na medula espinal. O sistema nervoso segmentar aportou na evolução
antes do suprassegmentar, e, funcionalmente, pode-se dizer que lhe é subordinado. Da mesma maneira,
as comunicações entre o sistema nervoso suprassegmentar e os órgãos periféricos, os receptores e os
efetuadores, realizam-se por meio do sistema nervoso segmentar.

Lembrete

A substância cinzenta é a parte do tecido nervoso onde predominam


corpos celulares de neurônios, enquanto a substância branca é a parte do
tecido nervoso onde predominam axônios mielínicos.

1.4 Papéis do SN

O SN efetua trabalhos complexos. Ele nos possibilita sentir diversas fragrâncias, dialogar
e recordar acontecimentos do passado. Do mesmo modo, ele produz sinais que controlam os
movimentos corporais e regula o funcionamento dos órgãos internos. Essas várias atividades
podem ser divididas em: sensitivas (aporte), integradoras (processamento) e motoras (saída).

No papel sensitivo, os receptores sensitivos detectam estímulos internos, como o


aumento da pressão arterial, ou estímulos externos, como uma gota de água caindo na
perna. Essas informações sensitivas são levadas ao encéfalo e à medula espinal por meio dos
nervos cranianos e espinais.

No papel integrador, o SN processa as informações sensitivas, avaliando-as e tomando as


resoluções apropriadas para cada resposta em uma atividade designada de integração.

No papel motor, após o processamento das informações sensitivas, o SN pode desencadear


uma resposta motora específica por meio da ativação de efetores, como os músculos e as
glândulas, através dos nervos cranianos e espinais. A estimulação dos efetores gera a contração dos
músculos e a secreção de hormônios pelos órgãos endócrinos.

86
ANATOMIA DOS SISTEMAS

Os três papéis fundamentais do SN ocorrem, por exemplo, quando você escuta o aparelho
de telefone tocar. O som do toque estimula receptores sensitivos em suas orelhas, sendo ele o
papel sensitivo. Essas informações auditivas são então transmitidas para o encéfalo, onde são
processadas, e é tomada a decisão de receber o telefonema, sendo ele o papel integrador. Após isso,
o encéfalo estimula a contração de músculos específicos que lhe possibilitarão apanhar o telefone
e apertar a tecla adequada para atendê-lo, sendo ele o papel motor.

O diagrama da figura a seguir mostra uma visão geral funcional do SN, apresentando a relação
entre o SNC e o SNP, assim como os componentes e os papéis das divisões aferentes e eferentes.

Sistema Nervoso Central


(encéfalo e medula espinal)
Processamento de
informação
Informação Comandos
sensitiva motores na
na parte parte
Sistema eferente
Nervoso aferente
Periférico Inclui

Sistema nervoso Sistema nervoso


somático autônomo

Parassimpático e simpático

Receptores Receptores
sensitivos sensitivos Músculos lisos
especiais somáticos Músculo
Músculo estriado
estriado cardíaco
esquelético Glândulas
Receptores sensitivos viscerais

Receptores Efetuadores

Figura 91 – Uma visão geral funcional do SN

1.5 O tecido nervoso

Os tecidos do organismo são classificados em quatro tipos fundamentais, com base na estrutura e na
função: o tecido epitelial, que forra as superfícies do corpo, as cavidades do corpo, os ductos, e forma as
glândulas; o tecido conjuntivo, que liga, sustenta e protege as partes do corpo; o tecido muscular, que
se contrai para produzir movimentos; e o tecido nervoso, que principia e transmite impulsos nervosos
de uma parte do organismo para outra.

87
Unidade I

O tecido nervoso incide tão somente em dois tipos de células: os neurônios e as neuroglias. Assim,
a menor unidade morfofuncional do SN é o neurônio, e uma célula especializada na transmissão de
impulsos nervosos.

Existem tipos diferentes de neurônios contudo, pode-se observar que eles são constituídos pelos
dendritos, que recebem impulsos de outras células; pelo corpo ou pericário, que é o centro metabólico
do neurônio e onde é processado o impulso nervoso; e pelo axônio, que é o prolongamento que conduz
o impulso nervoso. A figura seguinte mostra uma visão geral dos neurônios. Já a neuroglia (glia = cola)
suporta, nutre, protege os neurônios e mantém a homeostase no líquido intersticial que banha os
neurônios. As neuroglias são em torno de cinco vezes mais numerosas que os neurônios.

Corpo
Núcleo do corpo
Dendrito

Axônio
Bainha de mielina

Figura 92 – Visão geral dos neurônios

Lembrete

O SN é formado por células nervosas, os neurônios, e por células


chamadas de conjunto de neuroglia.

Axônio é o prolongamento do neurônio que leva o potencial de ação do


pericário até seu alvo.

Dendrito é um dos prolongamentos que parte do pericário e recebe um


influxo sináptico.

1.5.1 Visão geral dos neurônios

Os nomes conferidos aos neurônios foram indicados em razão do seu tamanho, forma, aspecto,
função ou provável descobridor, como a célula de Purkinje, do cerebelo. O tamanho e a forma dos
corpos celulares são bastante variáveis. O diâmetro do corpo celular pode variar de 4 micrômetros a 125
micrômetros, por exemplo, a célula granular do cerebelo, como o neurônio motor da medula espinal.
88
ANATOMIA DOS SISTEMAS

Os neurônios podem exibir formas piramidal, ampuliforme, estrelada ou granular. Uma peculiaridade
adicional desses pericários é o número de organização de seus processos. Alguns neurônios têm poucos
dendritos, enquanto outros apresentam numerosas projeções de dendritos. Com exceção de dois tipos
celulares, designados como células amácrinas, sem axônio, como os neurônios da retina e as células
granulares do bulbo olfatório, todos os neurônios têm pelo menos um axônio e um ou mais dendritos. A
figura a seguir ilustra os tipos básicos de neurônios quanto ao número de prolongamentos.

Dendrito

Corpo Corpo

Axônio Corpo
Axônio Axônio
Fusiforme Estrelado Piramidal Piriforme

Figura 93

Os dendritos (grego: déndron = árvore), em geral, são curtos, de alguns micrômetros a alguns
milímetros de comprimento, ramificados como se fossem galhos de uma árvore. Os dendritos têm
“espinhas” que servem como pontos de contato sinápticos.

Os axônios (grego: áxon = eixo), na maioria dos neurônios, são longos e finos, e se originam do
pericário ou de um dendrito principal, em uma região designada como cone de implantação. O axônio
possui comprimento muito variável, dependendo do tipo de neurônio, podendo ter, na espécie humana,
de alguns milímetros a mais de um metro. Eles são mielínicos ou amielínicos.

Lembrete

O axônio, apresentando ou não bainha de mielina, é também


denominado de fibra nervosa.

Cada neurônio apresenta somente um axônio, todavia cada axônio normalmente contém vários ramos
designados como colaterais. Um axônio e seus colaterais acabam em ramos finos separados entre si, designados
como telodendros. A extremidade distal de cada telodendro se expande no interior de pequenas estruturas
em forma de bulbo, denominadas terminações axônicas. Nessas terminações são armazenadas substâncias
químicas, chamadas de neurotransmissores. As moléculas dos neurotransmissores liberadas pelas terminações
axônicas constituem o meio de comunicação em uma sinapse.

Alguns neurônios, entretanto, especializam-se em secreção. Seus axônios terminam próximos


a capilares sanguíneos, que captam o produto de secreção liberado, em geral, um polipeptídio. Os
neurônios desse tipo são designados como neuromoduladores e se encontram na região do cérebro.

89
Unidade I

Lembrete

Neurotransmissores são moléculas envolvidas na transmissão do


impulso nervoso. São eles que medeiam a passagem do sinal elétrico entre
dois neurônios ou entre um neurônio e uma fibra muscular.

Neuromoduladores são substâncias químicas aptas a alterar a


transmissão do impulso nervoso.

Leitura obrigatória

O neurônio é a unidade morfofuncional do SN. No ser humano


maduro, se for destruído por traumatismo ou doença, não será
substituído; é incapaz de realizar divisão celular. Leia o texto a seguir
na Biblioteca Virtual:

SNELL, R. S. Neuroanatomia clínica. 7. ed. Tradução de Marcio Moacyr de


Vasconcelos. Rio de Janeiro: Guanabara-Koogan, 2013. Posição 2. Disponível
em: <https://online.minhabiblioteca.com.br/#/books/978-85-277-2451-7/
cfi/6/2[;vnd.vst.idref=capa.html]>. Acesso em: 10 dez. 2016.

1.5.2 Classificação dos neurônios

Os neurônios podem ser classificados de acordo com a sua forma e função. Quanto à forma,
distinguem-se em neurônios multipolares, com muitos dendritos que se estendem a partir de todo o
corpo. Os neurônios multipolares são encontrados no corno anterior da medula espinal, nas células de
Purkinje no córtex do cerebelo e nas células piramidais no córtex do telencéfalo.

Outro tipo de neurônio classificado em razão de sua forma são os neurônios bipolares, que possuem
um dendrito e um axônio, e estão presentes na retina, no epitélio olfatório, em gânglios dos nervos
cranianos e na orelha interna.

Os neurônios pseudounipolares são os que apresentam um axônio dendrítico e se desenvolvem


durante o período fetal de um neurônio bipolar. Eles são encontrados no gânglio espinal e nos gânglios
sensitivos dos nervos trigêmeo, facial, glossofaríngeo e vago.

Por fim, os neurônios unipolares aparecem raramente em vertebrados e são encontrados,


principalmente, durante a embriogênese. A figura a seguir ilustra os neurônios classificados quanto
à forma.

90
ANATOMIA DOS SISTEMAS

Unipolar Bipolar Pseudounipolar Mutipolar

Figura 94

Funcionalmente, os neurônios podem ser classificados em três tipos: aferentes ou sensitivos; eferentes
ou motores; interneurônios ou de associação. Os neurônios sensitivos são aqueles que transmitem o
impulso oriundo da periferia para a parte central do SN. Os neurônios motores transmitem o impulso da
parte central do SN em direção à periferia. Os interneurônios realizam a conexão entre os neurônios na
parte central do SN, ou seja, ligam um neurônio a outro.

Lembrete

Neurônio sensitivo ou neurônio aferente leva a informação ao SNC.

Neurônio motor é o que inerva o músculo estriado esquelético e a


musculatura lisa das vísceras.

Interneurônio, situado entre dois outros neurônios, apresenta


prolongamentos curtos.

1.5.3 Sinapses

As sinapses são pontos de transmissão descontínua de estímulos de um neurônio para outro ou


para uma célula efetora, sendo ela um músculo ou uma glândula. Quanto à forma e ao modo de
funcionamento, reconhecem-se dois tipos de sinapses: elétricas e químicas.

1.5.4 Arco reflexo

Os impulsos nervosos que se difundem em direção ao SNC, dentro ou fora dele, adotam modelos
característicos, dependendo do tipo de informação, origem e destino. A via seguida pelos impulsos
nervosos que geram um reflexo é designada como arco reflexo.

91
Unidade I

Etapa 1 Etapa 2 Sensação


Ativação de
Raiz transmitida ao
Chegada do Posterior encéfalo via
estímulo e um neurônio
ativação do sensitivo colateral
receptor

ARCO
REFLEXO
Estímulo Receptor
Legenda
--- Neurônio sensitivo
Efetuador Raiz
Etapa 3 (estimulado)
Anterior --- Interneurônio
Etapa 4 Processamento
Etapa 5 da informação excitador
Ativação do
Resposta do neurônio no SNC --- Neurônio
efetuador motor motor (estimulado)

Figura 95

Lembrete

Reflexo é uma continuação rápida e previsível de ações involuntárias


que ocorrem em resposta a determinadas alterações no ambiente.

Os reflexos, em geral, são usados para o diagnóstico de distúrbios do SN e para a localização da lesão.
Caso um reflexo esteja ausente ou aguçado, o enfermeiro pode desconfiar de que a lesão se situa em
algum local de uma certa via de condução. Diversos reflexos somáticos podem ser testados por meio
da simples percussão de determinadas partes do organismo. Entre os reflexos somáticos clinicamente
relevantes estão os seguintes:

• Reflexo patelar: esse reflexo de estiramento compreende a extensão da perna ao nível do joelho,
por meio da contração do músculo quadríceps femoral, em resposta à percussão do ligamento
patelar. Ele é inibido por lesões em nervos sensitivos ou motores que suprem o músculo, ou em
centros de integração situados no segundo, terceiro ou quarto segmentos lombares da medula
espinal. Geralmente, está ausente em indivíduos com diabetes mellitus ou neurossífilis, uma
vez que acarretam degeneração dos nervos. Tal reflexo está aguçado em doenças ou lesões que
envolvem determinados tratos motores descendentes que se originam de centros superiores do
encéfalo e se direcionam para a medula espinal.

• Reflexo aquileu: esse reflexo de estiramento compreende a flexão plantar do pé, por meio da
contração dos músculos gastrocnêmios medial, lateral e sóleo, em resposta à percussão do tendão
de Aquiles. A ausência desse reflexo sugere lesão dos nervos que suprem os músculos posteriores
da perna ou dos neurônios da região lombossacral da medula espinal. Ele também pode ocultar‑se
em indivíduos com diabetes mellitus, neurossífilis, etilismo e hemorragias subaracnóideas. Um
reflexo aquileu aguçado sugere compressão medular ou lesão dos tratos motores do primeiro e
do segundo segmentos sacrais da medula.

92
ANATOMIA DOS SISTEMAS

• Sinal de Babinski: esse reflexo é produzido por meio da estimulação branda da margem lateral
da planta do pé. O hálux se estende, com ou sem abertura em leque dos outros dedos dos pés. Esse
acontecimento normalmente é visto em crianças com menos de um ano e meio de idade devido
à mielinização incompleta das fibras do trato corticospinal. A constância do sinal de Babinski
após essa idade é anormal e sugere intercepção do trato corticospinal secundária a uma lesão,
em geral, na sua parte superior. A resposta almejada após um ano e meio de idade é o reflexo de
flexão plantar, ou Babinski ausente, isto é, a flexão plantar de todos os dedos dos pés.

• Reflexo cutâneo abdominal: esse reflexo compreende a contração dos músculos que compõem
a parede abdominal em resposta à estimulação da parte lateral do abdome. A resposta almejada
é uma contração da musculatura abdominal, acontecimento que gera o desvio do umbigo no
sentido do estímulo. A ausência desse reflexo está agregada a lesões nos tratos corticospinais.
Ele também pode estar ausente em lesões dos nervos periféricos ou dos centros de integração na
parte torácica da medula espinal, como pode acontecer, neste último caso, na esclerose múltipla.

A maioria dos reflexos autônomos não é instrumento diagnóstico prático, pois é penoso
estimular os efetores viscerais, localizados em partes internas do organismo. Uma ressalva é o
reflexo pupilar, no qual as pupilas reduzem de diâmetro quando os olhos são sujeitos à luz. Como
esse arco reflexo abrange sinapses de partes inferiores do encéfalo, a ausência do reflexo pupilar
normal pode sugerir lesão encefálica.

1.5.5 Neurogênese no SNC

A neurogênese, ou seja, a formação de novos neurônios a partir de células-tronco indiferenciadas,


ocorre com frequência em alguns animais, por exemplo, novos neurônios surgem e esvaecem, a
cada ano, em alguns pássaros canoros. No passado, o mistério em humanos e em outros primatas
era: “não existiriam novos neurônios” no encéfalo adulto.

Em 1992, cientistas canadenses descobriram sua imprevista revelação de que o fator de


crescimento epidérmico (EGF), proteína parecida com um hormônio, estimulava células removidas
de encéfalos de ratos adultos a se multiplicarem, como neurônios e astrócitos. Antes, conhecia-se que
o EGF excitava a mitose em uma série de células não neuronais e gerava a cicatrização de lesões e a
regeneração tecidual. Em 1998, pesquisadores mostraram que um número significativo de neurônios
surge no hipocampo adulto, região encefálica crucial para o aprendizado.

A quase completa falta de neurogênese em outras áreas do encéfalo e da medula espinal parece
ser resultado de dois fatores: influências inibitórias da neuroglia, principalmente dos oligodendrócitos,
e falta de estímulos para o crescimento que estavam presentes durante o período fetal.

Os axônios do SNC são mielinizados pelos oligodendrócitos, e não pelas células de Schwann;
essa mielina do SNC é um dos fatores que bloqueiam a regeneração neuronal. Quem sabe, o mesmo
mecanismo obstrua o desenvolvimento do axônio, uma vez que se alcance uma certa região-alvo
durante o desenvolvimento.

93
Unidade I

Do mesmo modo, posteriormente a uma lesão no axônio, os astrócitos vizinhos multiplicam‑se


velozmente, compondo um tipo de tecido cicatricial que atua como um obstáculo físico
para a regeneração. Assim, uma lesão no encéfalo ou na medula espinal se torna persistente.
Investigações em decurso procuram formas de aperfeiçoar o ambiente para que os axônios
medulares existentes possam atingir as regiões lesadas. Pesquisadores também estão tentando
achar formas de excitar células-tronco adormecidas a “trocar” neurônios inutilizados durante
uma lesão ou patologia e de desenvolver neurônios formados em laboratório que possam ser
usados em eventuais transplantes.

1.5.6 Lesão e reparo no SNP

Os axônios e os dendritos que estão acompanhados de um neurolema podem ser reparados, contanto
que o pericário esteja ileso, as células de Schwann continuem funcionais e não tenha sucedido uma
ligeira organização de tecido cicatricial. A maioria dos nervos no SNP é constituída por prolongamentos
que são cobertos por neurolema. Um indivíduo que apresenta uma lesão nos axônios de um nervo do
membro superior, por exemplo, tem uma excelente oportunidade de readquirir o papel do neurônio.

1.6 Neuroglias

Outras células compõem, ainda, o SN, auxiliando para fornecer sustentação funcional ao neurônio – cada
uma com um papel definido – e formando coletivamente as neuroglias – células da glia ou gliócitos. Algumas
neuroglias são encontradas no SNC e no SNP, além de serem as células mais comuns do tecido nervoso,
podendo a proporção entre neurônios e neuroglias variar de 1:10 a 1:50. Em comparação aos neurônios, a
neuroglia não produz nem conduz impulsos nervosos e pode multiplicar-se e dividir-se no SN maduro.

Lembrete

As células da neuroglia desempenham diversos tipos de papéis relevantes


no SN tanto no SNC como no SNP.

1.6.1 Neuroglias no SNC

No SNC, a neuroglia compreende: os astrócitos, os oligodendrócitos, a micróglia e um tipo de glia


com disposição epitelial, as células ependimárias. Os astrócitos (grego: astronm = estrela); (grego:
kytos = vaso oco) possuem semelhança a uma estrela e estão entre as neuroglias mais numerosas e
maiores no encéfalo.

Há dois tipos de astrócitos: os protoplasmáticos, localizados na substância cinzenta, e os fibrosos,


encontrados na substância branca. São funções dos astrócitos: a manutenção da constância no meio
interno do SNC, por meio da ingestão de metabólitos neuronais; a participação na estrutura da barreira
hematoencefálica; a fagocitose de células mortas; a cicatrização no SNC, por exemplo, após infarto
cerebral, em caso de esclerose múltipla; a formação e o intercâmbio do glutamato; além da sustentação
e do isolamento de neurônios.
94
ANATOMIA DOS SISTEMAS

Figura 96 – Astrócitos protoplasmáticos e astrócitos fibrosos

Lembrete

Os astrócitos realizam os papéis de sustentação e isolamento do neurônio.

Os oligodendrócitos (grego: oligo = pouco); (grego: dendron = árvore); (grego: glia = cola) são
menores do que os astrócitos e possuem poucos prolongamentos, que também podem formar pés
vasculares. O papel dos oligodendrócitos é a produção das bainhas de mielina que servem de isolantes
elétricos para os neurônios do SNC. Um único oligodendrócito contribui para a formação da mielina de
vários axônios.

As micróglias (grego: micros = pequeno); (grego: glia = cola), diferentemente de outros neurônios
e outras neuroglias, é de origem mesodérmica e aparece precocemente durante o desenvolvimento do
SNC. Elas são células pequenas e alongadas, que possuem poucos prolongamentos e desempenham o
papel de defesa do neurônio. Dentre os papéis das micróglias estão: a apresentação de antígenos; a
fagocitose; a mobilidade ameboide; e as secreções de citocinas e de fatores de crescimento. A figura a
seguir ilustra diferentes tipos de células da neuroglia no SNC.

Figura 97 – Micróglias e oligodendrócitos

95
Unidade I

As células ependimárias (grego: ependyma = roupa de cima) são células cuboides ou prismáticas
que forram, como epitélio de revestimento simples, as paredes dos ventrículos encefálicos, do
aqueduto do mesencéfalo e do canal da medula espinal. Um tipo de célula ependimária modificada
recobre tufos de tecido conjuntivo, rico em capilares sanguíneos, que se projetam da pia-máter,
constituindo os plexos corióideos, responsáveis pela formação do líquido cerebrospinal. Ela tem a
função de regulação das trocas entre o LCS dentro dos ventrículos encefálicos e no canal da medula
espinal mediante movimentos ciliares.

Além disso, há sugestão de que as células ependimárias também apresentariam um papel absortivo.
Crê-se que as tais células carreguem substâncias químicas do LCS para a hipófise, cujo desempenho
implicaria administração da produção de hormônios pelo lobo anterior da hipófise.

Lembrete

As células ependimárias localizam-se nos ventrículos e estão associadas


à produção do LCS.

Astrócito

Micróglia

Vaso de sangue

Neurônio Oligodendrócito

Figura 98 – Visão esquemática da disposição das neuroglias no SNC

1.6.2 Neuroglias no SNP

A neuroglia periférica compreende as células-satélites, ou anfícitos, e as células de


Schwann, oriundas da crista neural. Assim, as células-satélites envolvem os corpos celulares,
dos gânglios sensitivos e do SNA, e as células de Schwann circundam os axônios, formando
os seus envoltórios, quais sejam: a bainha de mielina e o neurilema. Cada célula de Schwann
mieliniza apenas um axônio. Já os papéis das células-satélites consistem em regular a troca
de nutrientes e produtos residuais entre o pericário e o líquido extracelular, bem como em
colaboram para o isolamento do neurônio de quaisquer outros estímulos que não sejam
aqueles situados nas sinapses.

96
ANATOMIA DOS SISTEMAS

Saiba mais

Confrontado com outras espécies, o encéfalo humano é o mais complexo


e influente, porque, além do grande número de neurônios, apresenta a
capacidade admirável de reparar seus próprios papéis. O encéfalo expõe
o crescimento de conexões neuronais. Durante nossa vida, somente um
neurônio pode realizar de 6 mil a 20 mil conexões sinápticas com outros
neurônios situados em várias partes do encéfalo, e o número de sinapses
que cada neurônio é apto a fazer tem maior importância no papel encefálico
do que o próprio número dessas células. Nosso encéfalo teve um longo
caminho evolutivo. Com o intuito de desvendar os mistérios encefálicos,
indicamos a leitura do seguinte artigo científico:

SCHMIDEK, W. R.; CANTOS, G. A. Evolução do sistema nervoso,


especialização hemisférica e plasticidade cerebral: um caminho ainda a ser
percorrido. Revista Pensamento Biocêntrico, Pelotas, n. 10, jul./dez. 2008.
Disponível em: <http://www.fflch.usp.br/df/opessoa/Evolucao-Cerebro.
pdf>. Acesso em: 4 set. 2016.

2 SISTEMA NERVOSO CENTRAL

2.1 Generalidades sobre o encéfalo

A arte de pensamento do nosso encéfalo arquitetou a tecnologia para lançarmos foguetes no


espaço, sanarmos patologias, mapearmos o genoma humano e fracionarmos os átomos, mas com
todas essas concretizações, o encéfalo humano continua ainda vastamente desconhecido em seu
próprio funcionamento.

Esse conjunto de estruturas anatômicas consiste em um dos maiores órgãos do corpo humano,
formado por aproximadamente 100 bilhões de neurônios e de 10 a 50 trilhões de neuroglias. No homem
adulto médio, o encéfalo humano pesa cerca de 1.400 mil gramas, o equivalente a 2% da massa corporal
total. O encéfalo do homem é, em média, um pouco mais pesado do que o da mulher, ainda que isso não
tenha relações com a inteligência. Dessa maneira, o peso do nosso encéfalo varia segundo numerosas
situações, como a idade, a massa corporal, a estatura e a etnia.

Entretanto, o ser humano não é o que apresenta o maior encéfalo entre os vertebrados, pois esse não
é somente o órgão do pensamento, porém especialmente e primitivamente um aparelho reflexo para a
percepção dos sentidos e do movimento muscular. Por isso, os animais grandes possuem, para o serviço
de seu volumoso corpo, um encéfalo pesado. Assim, o encéfalo da baleia é seis vezes maior do que o
humano, e o do elefante, três vezes maior.

97
Unidade I

Sabe‑se que o desenvolvimento humano se iniciou intimamente nos macacos. O fato característico
e determinante para o ser humano não é o aumento de seu encéfalo, mas a sua transformação e o
desenvolvimento do lobo frontal. Superpondo‑se o perfil craniano do macaco, do homem primordial de
Java (que viveu há 1 milhão de anos), do homem europeu da Idade do Gelo (há 100 mil anos), do negro
australiano e do europeu da atualidade, observa‑se que nos últimos 100 mil anos o encéfalo aumentou
muito pouco, contudo deslocou‑se para diante, numa espécie de linha ondulada: o ser humano de hoje
em dia é superior ao seu ancestral menos por sua massa encefálica do que pela posse do lobo frontal.
De tal modo, quanto maior a fronte, tanto mais volumoso será o encéfalo.

Figura 99 – Durante a evolução das espécies, aconteceu um aumento progressivo na parte


mais rostral do SNC, a chamada encefalização

Lembrete

Percorrendo a escala dos vertebrados, podemos verificar agora uma


tendência evolutiva, a da encefalização. Há um aumento gradativo do
encéfalo, provocado por um acúmulo de células e circuitos nervosos na
parte cefálica do animal.

Fatores de variação anatômica, como a idade, fazem que o peso do encéfalo humano se altere. Assim,
ele alcança o seu peso máximo entre 20 e 30 anos de idade. Entre os 30 e 40 anos de idade, paralisa o
seu desenvolvimento e, a partir dos 50 anos, reduz rapidamente. Dos 50 anos aos 70 anos de idade se
aponta o maior descenso, de tal maneira que nos indivíduos de 70 a 80 anos o encéfalo humano pesa
de 50 a 100 gramas a menos do que quando se tinha 30 anos.

98
ANATOMIA DOS SISTEMAS

Nenhum órgão avoluma tão veloz desenvolvimento durante os primeiros anos de vida como o
encéfalo humano. O encéfalo do recém‑nascido pesa em média 400 gramas; esse peso é duplicado
com 1 ano de idade, ou seja, 800 gramas, e triplicado aos 5 anos, ou seja, 1.200 gramas. Durante a vida
intrauterina, o acelerado desenvolvimento encefálico acontece desde o sexto mês até o oitavo mês
de gestação. O peso do encéfalo no sexto mês de gestação é de 100 gramas, dobra no oitavo mês de
gestação, ou seja, 200 gramas, e quadruplica no recém‑nascido, chegando a 400 gramas.

Lembrete

Quanto maior o encéfalo de uma espécie, consequentemente com uma


quantidade elevada de sulcos e giros, mais evoluída ela será! Portanto, se
o córtex cerebral humano fosse “alisado e retificado”, desaparecendo os
sulcos, daria uma superfície de cerca de 2 metros de comprimento.

Não têm valor algum todos os dados da literatura sobre diferenças no tamanho craniano e no peso
encefálico nos diversos povos e raças. O exame encefálico é um dos mais difíceis trabalhos técnicos das
medidas biológicas. O encéfalo possui 70% de água, ou seja, 1 quilograma desse líquido; por aí se pode
calcular quão grandes serão os erros e as alterações nas medidas em consequência da simples variação
no grau da umidade do encéfalo por ocasião do exame.

Na série dos pesos encefálicos, os europeus estão mais próximos dos negros que dos chineses, que
compõem a raça de encéfalo maior. Mesmo assim, entre os países europeus, o peso médio do encéfalo
humano varia, como nos alemães (1.425 gramas), nos suecos (1.399 gramas), nos ingleses (1.346 gramas),
nos italianos (1.301 gramas) e nos franceses (1.280 gramas), contudo as discrepâncias entre a estatura
e a massa corporal de uns e outros indivíduos, também, é um fator relevante.

Comparando‑se, como fez no começo deste século o pesquisador Moebius, o tamanho da cabeça
de 100 indivíduos das classes educadas com o de 100 presos débeis mentais, atingimos este resultado:
tanto a maioria dos indivíduos instruídos como dos criminosos apresentaram uma cabeça de tamanho
médio, sendo 55‑58 o número de seu chapéu. Nos indivíduos cujo chapéu possui o número 55, há
mais criminosos (10%) e menos indivíduos educados (1%), enquanto acima de 58 o número do chapéu
corresponde mais a indivíduos cultos (40%) do que a criminosos (3%).

Obtém‑se, assim, um resultado típico para todas as pesquisas dessa espécie: 100 indivíduos educados
apresentam, juntos, dimensões encefálicas e cranianas maiores do que os 100 criminosos. Porém, como
um indivíduo isolado não se pode estabelecer relação alguma. Há indivíduos cultos com cabeça pequena
e dementes com crânio grande. Um encéfalo pequeno pode ser capaz de muito, e um grande, nada valer.

O mesmo resultado se tem comparando o encéfalo dos indivíduos produtivos. Não há relação
direta entre o tamanho do encéfalo e a capacidade mental; a maioria dos indivíduos bem‑dotados
apresenta um encéfalo de tamanho médio, enquanto são relativamente poucos os que possuem
encéfalo grande ou pequeno, entretanto com exceções: três dos maiores gênios em terrenos diversos,
Rafael, Dante e Bach.
99
Unidade I

A seguir, exemplificamos uma lista de alguns indivíduos de encéfalo médio: Bismarck


(político), 1.807 gramas; Kant (filósofo), 1.600 gramas; Giacomini (anatomista), 1.495 gramas;
Broca (anatomista), 1.484 gramas; Dante (poeta), 1.427 gramas; Einstein (físico), 1.230 gramas;
Coveiro (zoólogo), 1.830 gramas; Webster (advogado), 1.518 gramas; Tiedemann (médico),
1.253 gramas; Hausmann (urbanista), 1.225 gramas; Franz Gall (pai da localização das funções
cerebrais), 1.198 gramas.

Observamos que o encéfalo de Einstein não era maior do que a média, no entanto ele continha um
número expressivamente menor de neurônios por unidade de volume. Esse achado aceita a conjectura
de que, no encéfalo de Einstein, as conexões neuronais eram muito mais complexas do que a média.
Graças ao número superior de sinapses por volume, os neurônios poderiam ficar mais distantes uns
dos outros.

Portanto, as variações do peso encefálico nos seres humanos, conforme observado anteriormente,
modificam-se dentro de limites muito extensos, sendo considerados como normais os encéfalos entre
1.050 e 2.000 gramas. Acima do peso máximo apontado, os indivíduos são designados como macrocéfalos,
e abaixo desses valores, como microcéfalos. Uma vez que não há necessidade de alargamento para
adequar o encéfalo pequeno, o crânio também se mantém pequeno.

Saiba mais

O desenvolvimento da inteligência é regido concomitantemente por


aspectos genéticos, neurológicos e cognitivos. Ofertamos a você a leitura
do artigo científico a seguir:

TORRES, V. S. Desenvolvimento da inteligência: aspectos envolvidos.


Revista de Ciências Humanas, Florianópolis, n. 28, p. 11‑34, 2000.
Disponível em: <https://periodicos.ufsc.br/index.php/revistacfh/article/
view/23969/21438>. Acesso em: 12 dez. 2016.

Esperamos que a leitura seja de bom deleite!

2.2 Morfogênese do SN

O desenvolvimento pré‑natal da espécie humana ocorre durante 266 dias, correspondendo ao


período de 38 semanas. Na clínica médica, o período da gestação é calculado a partir do primeiro dia
da última menstruação, ou seja, pós‑menstruação. Dessa maneira, aos 266 dias relativos ao período de
desenvolvimento pré‑natal adicionam‑se 14 dias, totalizando 280 dias, ou 40 semanas de gestação.
Uma vez que o tempo entre a menstruação e a ovulação com a concepção subsequente é modificável,
pois nem sempre obedece aos 14 dias, diferentes meios podem ser utilizados para estimar a data do
nascimento, quando o dia da concepção é desconhecido.

100
ANATOMIA DOS SISTEMAS

A determinação do tempo de desenvolvimento pré‑natal é realizada a partir do instante da


fertilização, ou seja, pós‑concepção. Assim, o desenvolvimento pré‑natal pode ser dividido em três
períodos. O primeiro período, denominado desenvolvimento precoce, corresponde às primeiras semanas
de desenvolvimento – entre a primeira e a terceira semana. O segundo período, denominado período
embrionário, envolve da quarta até a oitava semana de desenvolvimento. O terceiro período, chamado
de período fetal, abrange da nona até a trigésima oitava semana de desenvolvimento pré‑natal.

2.2.1 Da fertilização até a nidação

O desenvolvimento de cada ser humano começa com a fertilização do ovócito pelo espermatozoide.
Após a fertilização, tem início uma série de eventos que caracterizam a formação do zigoto, que dará
origem ao futuro embrião. O zigoto é uma célula única na qual estão presentes os 46 cromossomos
oriundos dos gametas dos pais, portanto 23 cromossomos dos pais e 23 cromossomos das mães.

A partir de 24 horas contadas após a fertilização, o zigoto começa a sofrer sucessivas divisões
mitóticas, primeiramente originando inúmeras células, até que por volta do sexto dia após a
fertilização, já no útero, esse conjunto de células se implanta no endométrio. Damos a esse fenômeno
o nome de nidação.

Repetidas mitoses, chamadas de clivagem, convertem o zigoto em um agrupamento de células,


uma mórula (latim: morus = amora), por volta do quarto dia após o coito. No quinto dia, a mórula
torna‑se blastocisto (grego: kystis = vesícula), à medida que surgem espaços intercelulares que
confluem compondo uma cavidade central ou blastocele (grego: koilos = cavidade), conforme ilustra
a figura a seguir.

Figura 100 – Ilustrações sequenciais da primeira clivagem do zigoto com a formação da mórula

Observação

A clivagem da célula tem início cerca de 30 horas após a fertilização. As


primeiras células formadas são chamadas de blastômeros (grego: blasto =
broto ou embrião; meros = partes).

Crê‑se que sejam necessários, possivelmente, dois ou três dias para que se originem cinco ou seis
clivagens, e, enquanto isso ocorre, o ovo passa através da tuba uterina. A mórula está envolta pela zona
pelúcida e é constituída por uma massa celular externa, em torno de uma massa celular interna.

101
Unidade I

A partir do estágio de oito blastômeros, eles se juntam fortemente entre si, levando a um
fenômeno de compactação do embrião, que, no entanto, é maciço. Ao penetrar na cavidade
uterina, a mórula com 12 a 16 blastômeros tem 72 horas de evolução a partir da fertilização.
Uma vez que a mórula se encontra dentro do útero, suas células periféricas segregam líquido, o
que leva à formação de uma cavidade em seu interior. Esse estágio embrionário é denominado
blástula ou blastocisto.

O blastocisto é formado por uma camada de células periféricas que abrangem o trofoblasto (grego:
trophe = desenvolver ou nutrir), que corresponde à massa celular externa, e um maciço celular interno,
o nó ou botão embrionário, que corresponde à massa celular interna ou embrioblasto. Calcula‑se que no
quarto dia, a partir da fertilização, o blastocisto conte com cerca de sessenta células.

Observação

O embrioblasto é o grupo de blastômeros localizados centralmente,


que dará origem ao embrião. A implantação do blastocisto completa‑se
durante a segunda semana do desenvolvimento. Com a progressão da
implantação, acontecem modificações no embrioblasto, as quais resultam
em uma placa bilaminar chamada de disco embrionário, composto pelo
epiblasto e pelo hipoblasto.

O trofoblasto é a camada celular externa que comporá a parte


embrionária da placenta.

Células especializadas do trofoblasto produzem projeções em forma de dedos, denominadas


de sinciciotrofoblastos, que originam‑se de uma parte específica do trofoblasto, chamada de
citotrofoblasto, situado próximo ao embrioblasto. O blastocisto ampara‑se contra o aborto, secretando
um hormônio que indiretamente impede a menstruação. Até mesmo antes do início da implantação,
o sinciciotrofoblasto secreta gonadotrofina coriônica humana, a hCG. Esse hormônio é análogo ao
hormônio luteinizante em seus efeitos e, portanto, é capaz de conservar o corpo lúteo além do tempo
que, caso oposto, deveria regredir.

Cerca de seis a nove dias após a fertilização, a hCG pode ser detectada no sangue da mulher
grávida. Na urina, o hormônio pode ser detectado somente 14 dias pós‑fertilização. A hCG
também parece ser responsável pelas sensações de vômito, a êmese da gestação, durante os
estágios iniciais.

A secreção de estrógenos e progesterona é conservada, e a menstruação normalmente é suspensa.


A hCG cai em torno da décima semana da gestação. De fato, esse hormônio só é imprescindível durante
as primeiras cinco ou seis semanas de gestação, porque a própria placenta se torna uma glândula ativa
secretora de esteroides nesse momento.

102
ANATOMIA DOS SISTEMAS

Lembrete

O blastocisto corresponde ao estágio de desenvolvimento do embrião


que sucede a mórula e precede a gástrula. Consiste em uma camada de
células e uma cavidade preenchida por líquido.

2.2.2 Folhetos embrionários

Durante a segunda semana de gestação, enquanto o blastocisto está sendo incluído na mucosa
uterina, o embrioblasto se prolifera rapidamente. Ele se achata, e forma‑se o folheto embrionário, que
consiste de duas camadas: o ectoderma (grego: ecto = externo; derm = pele) e o endoderma (grego:
endo = interno; derm = pele).

A terceira semana do desenvolvimento embrionário é caracterizada por formação da linha primitiva,


desenvolvimento da notocorda e começo da morfogênese, ou gastrulação, processo pelo qual o folheto
embrionário bilaminar é convertido em folheto embrionário trilaminar, momento em que uma terceira
camada, a mesoderma (grego: meso = meio; derm = pele) forma‑se entre o endoderma e o ectoderma.
Cada um dos três folhetos embrionários dará origem a tecidos e órgãos específicos.

Lembrete

O ectoderma origina a epiderme, os sistemas nervosos central e


periférico, o olho, a orelha interna e os vários tecidos conectivos da cabeça.

O mesoderma dá origem a todos os músculos esqueléticos, células


sanguíneas e revestimentos dos vasos sanguíneos, a todo o músculo liso
visceral, todos os revestimentos serosos das cavidades do corpo, órgãos
dos sistemas urinário e genital, à maior parte do sistema cardiovascular e a
todos os tecidos conjuntivos do tronco.

O endoderma origina os revestimentos epiteliais das vias respiratórias e


o trato gastrintestinal, incluindo glândulas associadas.

Observação

A partir do nó ou botão embrionário, células mesodérmicas


indiferenciadas (células mesenquimais) migram em sentido cefálico,
compondo um bastão celular sólido, o processo notocorda, o qual, logo em
seguida, assume uma luz constituindo um canal, a notocorda.

103
Unidade I

O SN dos vertebrados tem origem no folheto embrionário mais externo do embrião, ou seja, no
ectoderma – dado importante, pois remete à origem evolutiva do SN, que, primitivamente, teria
aparecido na superfície externa dos animais. Na espécie humana, o surgimento do SN acontece na
terceira semana de vida, quando parte do ectoderma se transforma no neuroectoderma, o que se traduz
em um espessamento, a placa neural.

2.2.3 Formação do SN

Quando o embrião humano está com 1,5 milímetro de comprimento e aproximadamente 18 dias
de vida, o ectoderma torna‑se encorpado para compor a placa neural, que é piriforme e mais larga
cranialmente, e desenvolve um sulco neural longitudinal, que em seguida exibe uma invaginação
para o interior do embrião, compondo o sulco neural, cujas extremidades terminam se juntando e se
sobressaindo do ectoderma para formar um tubo que se situa no interior do mesoderma, designado como
tubo neural. Nesse momento de junção logo abaixo do ectoderma, compõem‑se dois prolongamentos
laterais, as cristas neurais.

sulco neural
placa neural

gânglio espinhal
goteira neural

crista neural
tubo neural

Figura 101 – Formação do tubo neural e da crista neural

O desenvolvimento do tubo neural, precursor do cérebro e da medula espinal, determina um


processo chamado de neurulação. O tubo neural dá origem a elementos do SNC, enquanto a crista
neural dá origem a elementos do SNP, além de elementos não pertencentes ao SN. Portanto, os
elementos procedidos da crista neural são: os gânglios sensitivos, os gânglios do SNA, a medula da
glândula suprarrenal, os paragânglios, os melanócitos, as células de Schwann, os anfícitos, as células C da
tireoide e os odontoblastos. Contudo, pesquisas mais atualizadas confirmaram que algumas estruturas
tidas como oriundas do ectoderma na realidade se originam da crista neural, como a dura‑máter, a
aracnoide‑máter e algumas partes do crânio.

104
ANATOMIA DOS SISTEMAS

Lembrete

A neurulação faz parte da organogênese nos embriões vertebrados e é


o processo de formação do tubo neural, rudimento do SNC.

A extremidade anterior do tubo neural se desenvolve mais do que a parte posterior e compõe
uma dilatação, designada vesícula encefálica ou arquencéfalo, o começo do SNC. Essa parte
anterior, dilatada, vai compor o encéfalo, e a parte posterior, que não se diferencia tanto, vai
compor a medula espinal.

A vesícula encefálica, prosseguindo o seu desenvolvimento, divide-se em três vesículas primordiais,


designadas respectivamente: como prosencéfalo, a anterior; mesencéfalo, a média; e rombencéfalo, a
posterior. Esta última é contínua com o tubo neural restante, a medula espinal.

Na fase seguinte, o prosencéfalo se divide outra vez, constituindo duas novas vesículas, o telencéfalo,
a mais anterior, e o diencéfalo, a segunda. A segunda vesícula primitiva, e que agora passou a ser a
terceira, persiste inalterada e prossegue sendo o mesencéfalo.

A última vesícula, o rombencéfalo, diferencia-se outra vez, constituindo duas novas vesículas: o
metencéfalo, que vai formar a ponte e o cerebelo; e o mielencéfalo, que vai constituir o bulbo. As
três vesículas encefálicas primordiais que dão origem a cinco vesículas secundárias estão ilustradas
na figura a seguir.

Telencéfalo

Diencéfalo
Prosencéfalo

Mesencéfalo
Mesencéfalo

Rombencéfalo Metencéfalo

Mielencéfalo

Figura 102 – Vesículas encefálicas

105
Unidade I

A figura a seguir mostra o desenvolvimento do encéfalo desde o estágio de cinco vesículas (em
torno da quinta semana) até um nível avançado, contudo ainda incompleto, do desenvolvimento
(ao nascimento). Observe como a estrutura se torna progressivamente maior e mais complexa com o
surgimento de sulcos e giros a partir do sexto mês de gestação.

5 semanas 7 semanas 14 semanas

24 semanas 40 semanas

Figura 103 – Desenvolvimento do encéfalo humano na vida intrauterina

2.3 Anatomia da medula espinal

Na estrutura anatômica do SNC, a medula espinal situa‑se dentro do canal vertebral, que tem o papel
de protegê‑la. Contudo, as lesões medulares podem acontecer nos traumatismos da coluna vertebral,
como em acidentes automobilísticos, hoje em dia cada vez mais corriqueiros. O termo medula procede
de miolo, em razão de sua posição no interior das vértebras.

O seu limite superior é o bulbo, no plano transversal, passando entre os côndilos do osso occipital
e C1, sendo esse plano que passa pela decussação das pirâmides, e seu limite inferior é L2. Em adultos,
o seu comprimento fica em torno de 40 a 45 centímetros, com 1 centímetro de diâmetro. Em homens
adultos, o peso da medula espinal varia entre 25 gramas e 30 gramas, e, em mulheres adultas, o peso da
medula espinal varia entre 23 e 28 gramas. A medula espinal representa, portanto, um quinto do peso
do cerebelo, somente 2% do peso do cérebro.

Figura 104 – Limite superior da medula espinal

106
ANATOMIA DOS SISTEMAS

O desenvolvimento em comprimento da medula espinal é equivalente ao da coluna vertebral até o


terceiro mês de vida intrauterina, preenchendo toda a extensão do canal vertebral. As raízes medulares
possuem um percurso horizontal para organizarem os nervos espinais e transcorrerem pelos seus
forames intervertebrais.

Com base nesse período, a coluna vertebral tem um crescimento mais veloz do que a medula
espinal, existindo uma ascensão ilusória, por isso, ainda que a medula espinal prossiga crescendo,
a sua situação dentro do canal vertebral é cada vez mais superior. No momento do nascimento,
a parte inferior da medula espinal localiza‑se ao nível de L3 e, na idade adulta, ao nível do disco
intervertebral de L1.

Cone medular
LCS

Filamento terminal Filamento terminal

Raiz do 1° nervo sacro


(parte da cauda equina)

Fim do saco da aracnoide e dura (S2)


Nascimento
Adulto

Figura 105 – Desenvolvimento em comprimento da medula espinal

As raízes medulares, que, no começo, eram horizontais, passam, após a formação embriológica, a
conduzir‑se inferiormente de maneira mais oblíqua, para alcançarem os relativos forames intervertebrais.
Um conjunto de raízes situadas embaixo da medula espinal expõe uma aparência de “rabo de cavalo”,
sendo designado de cauda equina. Em razão de uma ascensão ilusória da medula espinal, inutiliza‑se a
correspondência entre os segmentos medulares e os segmentos vertebrais. O quarto segmento lombar
vertebral, por exemplo, localiza‑se debaixo da medula espinal, ao nível da cauda equina. A medula
espinal corresponde à parte caudal do tubo neural, expondo raras mudanças durante a sua formação
embriológica. O canal central, com as células ependimárias, é virtual. As raízes medulares, tanto quanto
os nervos espinais, constituem parte do SNP.

Com uma aparência cilíndrica em quase toda a sua extensão, com algumas variações, a medula
espinal é delicadamente achatada no seu eixo anteroposterior e possui duas dilatações: cervical, que se
estende dos segmentos C4 até T1 da medula espinal; e lombossacral, que se estende dos segmentos L1
até S3 da medula espinal.

107
Unidade I

Essas dilatações da medula espinal – denominada de superior a intumescência cervical e de inferior a


intumescência lombossacral – estão diretamente correlacionadas com o surgimento das raízes nervosas,
que constituem o plexo braquial e o plexo lombossacral, que inervam os membros superiores e os
membros inferiores, nessa ordem. A região final da medula espinal é delicada e compõe o cone medular,
o qual se liga ao filamento terminal meníngeo.

Ao examinar a superfície externa da medula espinal intacta, após sua remoção do canal vertebral,
verifica‑se, em toda a sua extensão, a presença de seis sulcos: três sulcos anteriores e três sulcos
posteriores. Esses sulcos são detalhes anatômicos relevantes para a orientação da medula espinal post
mortem e a correspondência com as suas estruturas internas.

Anteriormente, observa‑se que a fissura mediana anterior é central, bem profunda e com
vasos de sangue no seu interior. Posteriormente, o sulco mediano posterior é pouco profundo,
com vasos de sangue pouco aparentes, somente ao nível cervical, e o sulco intermédio posterior
é localizado entre o sulco mediano posterior e os sulcos laterais posteriores. Lateralmente,
verificam‑se o sulco lateral anterior e o sulco lateral posterior, pouco profundo. Pelo sulco
lateral anterior saem as radículas anteriores, enquanto pelo sulco lateral posterior adentram
as radículas posteriores.

As estruturas anatômicas designadas de radículas são pequenos filamentos nervosos, podendo ser
anteriores e posteriores. Um conjunto de radículas constitui as raízes, que também podem ser anteriores
e posteriores. Essas estruturas anatômicas são vistas na superfície externa da medula espinal. Do mesmo
modo, o gânglio, que é uma dilatação arredondada só encontrada na raiz posterior, portanto designado
como gânglio da raiz posterior.

Radículas da raiz posterior

Substância cinzenta Radículas da raiz anterior


Substância branca Raiz posterior do n. espinal

Gânglio espinal
Ramo posterior do n. espinal

Ramo anterior do n. espinal


Raiz anterior do n. espinal

Gânglio espinal Nervo espinal

Figura 106 – A medula espinal

108
ANATOMIA DOS SISTEMAS

Outra estrutura anatômica vista na superfície externa da medula espinal é o tronco, que consiste
na união das raízes anteriores e posteriores. Ele irá passar pelo forame intervertebral das vértebras
adjacentes. Já o segmento é a parte da medula espinal que corresponde ao conjunto de radículas
tanto anteriores quanto posteriores que adentram na constituição de uma raiz de cada lado e, enfim,
a composição de um tronco nervoso. A medula espinal contém 31 segmentos, pois esse é o número de
troncos nervosos, são eles: 8 cervicais, 12 torácicos, 5 lombares, 5 sacrais e 1 coccígeo.

O primeiro segmento cervical está entre o osso occipital e C1; por consequência, são 8 segmentos
cervicais. Ainda, é sabido que os segmentos coccígeos precisavam ser três troncos, contudo dois dos
segmentos, que se reservavam à cauda equina, retrocedem e por esse motivo somente um segmento
coccígeo é funcional.

Como a medula espinal é menor do que a coluna vertebral, as radículas e as raízes necessitam se
alongar para atingir os respectivos forames intervertebrais que lhes correspondem. Constitui‑se, deste
modo, no interior da coluna vertebral, depois de L2, um amontoado de radículas e raízes longas, que são
designadas de cauda equina.

Figura 107 – Visão posterior da parte inferior da medula espinal e da cauda equina, após a abertura da dura‑máter

Lembrete

Medula espinal é um conjunto de raízes nervosas que emergem das


partes mais distais da medula espinal e continuam no canal vertebral
abaixo de L2 até emergirem pelos respectivos forames intervertebrais.

Outra estrutura anatômica relevante encontrada na medula espinal é o filamento terminal. Ele
consiste num fio de pia‑máter que se compõe no cone medular e atravessa o saco dural, onde é
reforçado por dura‑máter, fixando a medula espinal ao cóccix.
109
Unidade I

Observação

O saco dural é o envoltório terminal das meninges até os níveis de L2 e L3.

Os papéis da medula espinal estão relacionados à participação de processamento das informações


sensoriais oriundas dos membros, do tronco e de muitos órgãos internos, ao comando direto dos movimentos
corporais e ao desempenho das diversas funções viscerais. Também provê um caminho para a transmissão
de dados sensoriais nos tratos que sobem até o encéfalo e dados motores nos tratos descendentes.

Ao realizar um corte transversal da medula espinal, é percebido que, em oposição ao visto no


encéfalo, a substância cinzenta se encontra na parte profunda, e a substância branca, superficialmente.
A substância cinzenta apresenta o aspecto de borboleta ou, também, da letra H, motivo pelo qual
é comumente designada de “H medular”. As duas partes posteriores do H medular são designadas
como colunas, cornos dorsais ou cornos posteriores. Já as duas partes anteriores do H medular são
denominadas colunas, cornos ventrais ou cornos anteriores.

Substância
cinzenta

Figura 108 – Fotomicrografia de secção de medula espinal corada com Luxol Fast Blue. Vê‑se profundamente
o “H” medular e, em seu entorno, a substância branca

Na substância branca, existem as fibras nervosas, na maioria com mielina, posicionadas paralelamente
ao eixo longitudinal da medula espinal. Essas fibras nervosas se derivam tanto na medula espinal e
projetam‑se para o encéfalo, sendo chamadas de fibras ascendentes ou vias sensitivas, como ao
contrário, ou seja, derivam‑se no encéfalo e caminham para a medula espinal, sendo denominadas
fibras descendentes ou vias motoras.

Todas essas fibras nervosas são reunidas em funículos ou cordões, em cada lado da medula espinal.
O funículo anterior está localizado entre a fissura mediana anterior e o sulco lateral anterior; o funículo
lateral está entre o sulco lateral anterior e o sulco lateral posterior; e o funículo posterior fica entre o
sulco lateral posterior e o sulco mediano posterior. Na parte cervical, o funículo posterior é dividido em
dois fascículos, grácil e cuneiforme, pelo sulco intermédio posterior, conforme ilustra a figura a seguir.

110
ANATOMIA DOS SISTEMAS

Sulco mediano
posterior Sulco lateral posterior

Funículo posterior

Funículo lateral

Sulco lateral anterior Fissura mediana anterior Funículo anterior

Figura 109 – Esquema de medula espinal em secção transversal

Leitura obrigatória

As vias ascendentes podem ser estudadas segundo a sua localização


nos funículos medulares ou conforme as suas características funcionais.
Elegemos aqui que você estude de acordo com as suas características
funcionais. Fisiologicamente, o sistema somestésico pode ser dividido em
três: exteroceptivo (sensibilidade tátil proveniente da pele); proprioceptivo
(proveniente de receptores em músculos e articulações); interoceptivo
(proveniente de receptores localizados em todo o organismo). Na Biblioteca
Virtual, faça o estudo dessas vias, ao realizar a leitura e esquematizá‑las
para uma maior compreensão das vias ascendentes:

MARTINEZ, A. M. B.; ALLODI, S.; UZIEL, D. Medula espinal, gânglios da


raiz dorsal, nervos espinais e vias ascendentes. In: ___. Neuroanatomia
Essencial. Rio de Janeiro: Guanabara‑Koogan, 2014. Disponível em:
<https://online.minhabiblioteca.com.br/#/books/978‑85‑277‑2396‑1/
cfi/6/40!/4/2@0:0>. Acesso em: 10 jan. 2017.

Lembrete

Funículos são cordões de substância branca ao longo da medula espinal.

A quantidade de substância branca se altera em relação à substância cinzenta, conforme o nível


craniocaudal da medula espinal, tendo maior volume nos níveis mais altos. Portanto, nas intumescências
cervical e lombar, a coluna anterior concentra mais a substância cinzenta, em virtude da formação dos
plexos nervosos.
111
Unidade I

Como todo o SNC, a medula espinal é protegida por membranas fibrosas designadas de meninges.
Entre as meninges existem os espaços meníngeos, sendo eles: o espaço epidural ou extradural, que
se localiza entre a dura‑máter e o periósteo do canal vertebral; o espaço subdural, que se situa
entre a dura‑máter e a aracnoide‑máter; e o espaço subaracnóideo, entre a aracnoide‑máter e o
tecido nervoso.

Leitura obrigatória

A introdução de anestésicos nos espaços meníngeos da medula espinal


de feitio, para bloquear as raízes nervosas que os atravessam, estabelece o
procedimento de costume na prática médica, principalmente em cirurgias
das extremidades inferiores, do períneo, da cavidade pélvica e em algumas
cirurgias abdominais. Habitualmente são realizadas anestesias raquidianas
e anestesias epidurais ou peridurais.

As lesões que afetam a medula espinal geram sintomas de perdas sensitivas


ou paralisias motoras que se refletem nos núcleos e tratos envolvidos.

Sugerimos a leitura da “Nota Clínica: Punções Espinais, Mielografia,


Anestesia Espinal e Anestesia Caudal” na Biblioteca Virtual:

MARTINI, F. H.; TIMMONS, M. J.; TALLISTSCH, R. B. O sistema nervoso:


a medula espinal e os nervos espinais. In: ___. Anatomia humana. 6. ed.
Tradução de Daniella Franco Curcio. Porto Alegre: Artmed, 2009. Disponível em:
<https://online.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788536320298/
cfi/399!/4/4@0.00:8.47>. Acesso em: 2 set. 2016.

2.4 Anatomia do bulbo

O bulbo ou medula oblonga se conecta com a ponte, superiormente, e a medula espinal,


inferiormente. A união do bulbo e da medula espinal está na origem das raízes ventrais e das raízes
dorsais do primeiro nervo espinal cervical, que corresponde aproximadamente ao nível do forame
magno, considerado o seu limite inferior. O seu limite superior, entre o bulbo e a ponte, é mais
evidente, sendo marcado pelo sulco bulbopontino, que aparece na face ventral, na região de transição
entre essas duas estruturas.

Apresenta forma cônica, e a sua extremidade larga é dirigida superiormente. O canal central da
medula espinal continua para cima na metade inferior do bulbo; na metade superior do bulbo, alarga‑se,
como a cavidade do IV ventrículo. Suas medidas aproximadas são 3 centímetros de comprimento, 2
centímetros de largura e 1,5 centímetro de espessura.

Também abrange vários núcleos, que são massas de substância cinzenta, nas quais os neurônios
compõem sinapses mútuas. Vários desses núcleos coordenam funções corporais vitais. O centro
cardiovascular regula a frequência cardíaca, a intensidade do batimento cardíaco e o diâmetro
112
ANATOMIA DOS SISTEMAS

dos vasos sanguíneos. A área respiratória rítmica do centro respiratório adequa o ritmo básico
da respiração. Outros núcleos no bulbo coordenam os reflexos do vômito, da tosse, do espirro, da
deglutição e do soluço.

Na face ventral do bulbo, está a fissura mediana anterior, que é continuada inferiormente com a fissura
mediana anterior da medula espinal. A fissura mediana anterior acaba superiormente em uma depressão,
designada como forame cego. Em cada lado da fissura mediana, existe uma tumefação, denominada
pirâmide, que é composta de feixes de fibras nervosas, designadas como fibras corticospinais, as quais
se originam dos grandes neurônios no giro pré‑central do córtex cerebral. As pirâmides adelgaçam‑se
inferiormente, e é cá que a maioria das fibras descendentes passa para o lado contrário, compondo a
decussação das pirâmides.

Observação

As pirâmides estão relacionadas com a motricidade voluntária, por


meio do trato corticoespinal ou piramidal. A decussação das pirâmides
oferece o cruzamento de informações de 85% das fibras do trato
corticoespinal ou piramidal.

As fibras arqueadas externas anteriores são tipos de fibras nervosas. Elas nascem da fissura mediana
anterior, acima da decussação das pirâmides, e passam lateralmente sobre a superfície do bulbo para
adentrar o cerebelo.

Posterior e lateralmente às pirâmides, estão as olivas, com aproximadamente 1,5 centímetro de


comprimento. São elevações ovais geradas pelos núcleos olivares inferiores subjacentes. No sulco
entre a pirâmide e a oliva, nascem as radículas do nervo hipoglosso. Posteriormente às olivas, estão
os pedúnculos cerebelares inferiores, que conectam o bulbo ao cerebelo. No sulco entre a oliva e o
pedúnculo cerebelar inferior, nascem as raízes do nervo glossofaríngeo, as raízes do nervo vago e as
raízes do nervo acessório.

Observação

O IX par de nervo craniano, ou nervo glossofaríngeo, possui um


componente motor para a musculatura da faringe e o músculo estilofaríngeo.
Apresenta um componente sensitivo responsável pela sensibilidade da
faringe, da pele de parte da orelha externa e da raiz da língua (sensibilidade
geral e gustativa).

O XI par de nervo craniano, ou nervo acessório, é um nervo motor


para os músculos trapézio e esternocleidomastóideo, bem como para os
músculos do palato mole e da faringe.

113
Unidade I

Lembrete

As olivas são responsáveis pelo centro de associação para a postura, o


equilíbrio e o tônus muscular.

A face ventral da metade superior do bulbo constitui a parte inferior do assoalho do IV


ventrículo. Já a face ventral da metade inferior do bulbo é continuada com a face posterior da
medula espinal e apresenta um sulco mediano posterior. Em cada lado do sulco mediano, existe
uma tumefação alongada, o tubérculo grácil, oriundo do núcleo grácil subjacente. Lateralmente
ao tubérculo grácil, existe uma tumefação semelhante, o tubérculo cuneiforme, oriundo do núcleo
cuneiforme subjacente.

Observação

O tubérculo grácil é responsável pela parte da via aferente da


sensibilidade proprioceptiva consciente do membro inferior, enquanto
o tubérculo cuneiforme é responsável pela parte da via aferente da
sensibilidade proprioceptiva consciente do membro superior.

As figuras seguintes ilustram estruturas anatômicas encontradas no tronco encefálico.

Sulco bulbopontino
Fissura mediana anterior
Oliva
Pirâmide

Figura 110 – Face ventral do bulbo

114
ANATOMIA DOS SISTEMAS

Tálamo

Colículo superior
Colículo inferior
Mesencéfalo

Pedúnculo cerebelar superior


Pedúnculo cerebelar médio
Pedúnculo cerebelar inferior

IV ventrículo
Tubérculo cuneiforme
Tubérculo grácil
Sulco mediano dorsal

Figura 111 – Vista dorsal do tronco encefálico e do tálamo

Lembrete

O bulbo é a parte inferior do tronco encefálico.

Leitura obrigatória

Leia o texto a seguir na Biblioteca Virtual:

TORTORA, G. J.; DERRICKSON, B. Encéfalos e nervos cranianos.


In: ___. Princípios de anatomia e fisiologia. 14. ed. Rio de Janeiro:
Guanabara‑Koogan, 2016. <https://online.minhabiblioteca.com.br/#/
books/9788527728867/cfi/6/48!/4/174/4/2@0:25.9>. Acesso em: 10
dez. 2016.

2.5 Anatomia da ponte

A ponte é anterior ao cerebelo, sendo a estrutura anatômica que conecta o bulbo ao mesencéfalo,
repousando sobre a parte basilar do osso occipital e o dorso da sela do osso esfenoide. Apresenta
aproximadamente 2,5 centímetros de comprimento e deve o seu nome à aparência da sua face ventral,
que representa uma ponte, conectando os hemisférios cerebelares. O limite superior da ponte é a fossa
interpeduncular, o seu limite inferior é o sulco bulbopontino e o seu limite lateral é a emergência do
nervo trigêmeo.
115
Unidade I

A face ventral da ponte é convexa de lado a lado e exibe diversas fibras transversas, que convergem
em cada lado para constituir o pedúnculo cerebelar médio. Há um sulco raso na linha média, o sulco
basilar, que abriga a artéria basilar.

No sulco bulbopontino, entre a ponte e o bulbo, nascem, em ordem medial‑lateral, o nervo abducente,
mais próximo à linha média, logo acima das pirâmides, o nervo facial e o nervo vestibulococlear, ambos
mais lateralmente, próximo do flóculo do cerebelo.

Observação

O VII par de nervo craniano, ou nervo facial, possui componentes


motores e sensitivos. Ele conduz impulsos motores, para os músculos da
face, e sensitivos, para a sensibilidade gustativa na língua.

O nervo facial nasce medialmente ao nervo vestibulococlear e preserva relações anatômicas íntimas
com o nervo. Entre o nervo facial e o nervo vestibulococlear, nasce o nervo intermédio, que é a raiz
sensitiva do nervo facial.

Observação

O VIII par de nervo craniano, ou nervo vestibulococlear, é um nervo


sensitivo, que conduz impulsos de audição e equilíbrio originados na
orelha interna.

A face dorsal da ponte é encoberta da vista pelo cerebelo, compõe a metade superior do
assoalho do quarto ventrículo e apresenta formato triangular. A face posterior é limitada
lateralmente pelos pedúnculos cerebelares superiores e dividida em metades simétricas por um
sulco mediano.

Lateralmente a esse sulco mediano, existe uma elevação alongada, a eminência medial do IV
ventrículo. A extremidade inferior da eminência medial do IV ventrículo é suavemente expandida,
compondo o colículo facial, que é formado pela raiz do nervo facial, contornando o núcleo
do nervo abducente. O assoalho da parte superior do sulco limitante é de cor cinza‑azulada
e chama‑se locus ceruleus; sua tonalidade se deve a um grupo de neurônios fortemente
pigmentados. Lateralmente ao sulco limitante está a área vestibular, produzida pelos núcleos
vestibulares subjacentes.

Lembrete

A ponte é a parte média do tronco encefálico.

116
ANATOMIA DOS SISTEMAS

2.6 Anatomia do mesencéfalo

O mesencéfalo representa o menor e menos diferenciado segmento do tronco encefálico infratentorial


e situa‑se superiormente à ponte, expandindo‑se acima, até o diencéfalo e o III ventrículo. Separa‑se da
ponte pelo sulco pontino superior e do cérebro por um plano que une os corpos mamilares, relacionados
ao diencéfalo, a comissura posterior.

Mede cerca de dois centímetros de comprimento e conecta a ponte e o cerebelo com o cérebro. O
seu eixo longitudinal inclina‑se anteriormente, durante sua ascensão, por meio da abertura no tentório
do cerebelo. O mesencéfalo é atravessado por um canal estreito, o aqueduto do mesencéfalo, que é
preenchido por LCS.

Na face dorsal do mesencéfalo, estão quatro colículos, ou corpos quadrigêmeos, que são
eminências arredondadas divididas em um par superior e um par inferior, pelo sulco vertical e pelo
sulco transverso. Acima dos colículos superiores, sobre o sulco que os separa, vê‑se a glândula pineal,
que é parte do epitálamo. Na linha média embaixo dos colículos inferiores, o nervo troclear surge.
Esses são nervos de pequeno diâmetro que contornam a face lateral do mesencéfalo e adentram a
parede lateral do seio cavernoso.

Os colículos superiores agem como centros reflexos para certas atividades visuais. Mediante os
circuitos neurais da retina para os colículos superiores e os colículos superiores para os músculos
extrínsecos do bulbo do olho, os estímulos visuais induzem os movimentos do bulbo do olho a
seguir as imagens em movimento, por exemplo, um carro em movimento, e a analisar imagens
inertes, como você̂ está praticando ao ler esta frase. Outros reflexos dos colículos superiores são
o reflexo de acomodação, que adequa o formato da lente para visão de perto em relação à visão
à distância, e os reflexos que coordenam os movimentos dos olhos, da cabeça e do pescoço em
resposta aos estímulos visuais.

Colículos inferiores são parte das vias auditivas, retransmitindo os impulsos dos receptores da
audição, localizados na orelha, para o tálamo. Eles também são centros reflexos para o reflexo de
sobressalto, ou reflexo de Moro, aos movimentos súbitos da cabeça e do corpo que acontecem no
momento em que se é surpreendido por um ruído alto, como o tiro de uma arma.

Na face ventral do mesencéfalo, existe uma depressão profunda na linha média, a fossa
interpeduncular, que é delimitada em cada lado pelos pilares do cérebro. Diversos vasos de sangue
pequenos perfuram o assoalho da fossa interpeduncular, e essa região se designa como substância
perfurada posterior. O nervo oculomotor emerge de um sulco no lado medial dos pilares do cérebro e
prossegue em frente, na parede lateral do seio cavernoso.

Na face lateral do mesencéfalo, os braços dos colículos superior e inferior sobem em direção
anterolateral. O braço do colículo superior prossegue do colículo superior para o corpo geniculado
lateral e o trato óptico. O braço do colículo inferior une este ao corpo geniculado medial.

117
Unidade I

Acima dos colículos superiores, sobre o sulco que os separa, observa‑se a glândula pineal, que é
parte do epitálamo. Abaixo dos colículos inferiores, emerge o nervo troclear, único par craniano a
emergir dorsalmente.

A substância nigra é uma lâmina cinzenta pigmentada, de coloração mais escura, composta por
neurônios, abrangendo melanina, que separa, de cada lado, o tegmento do mesencéfalo do pilar do
cérebro em uma secção transversal. Os neurônios que liberam dopamina se expandem da substância
nigra até os núcleos da base e auxiliam na coordenação das atividades musculares subconscientes. A
perda desses neurônios está associada à doença de Parkinson.

Do mesmo modo, tem‑se os núcleos rubros, cujo nome concerne à cor avermelhada que o núcleo
rubro possui, em cortes realizados em peças anatômicas não fixadas. Tal coloração se dá em virtude do
rico suprimento de sangue e de um pigmento, abrangendo ferro, nos corpos celulares dos neurônios.

O núcleo rubro, importante para o controle da motricidade, apresenta formato oval, localizado no
tegmento do mesencéfalo. Ao núcleo rubro, chegam especialmente fibras originárias do cerebelo e do
córtex motor. Dele partem, por sua vez, fibras que se dirigem ao núcleo olivar inferior. Dele se origina
também o trato rubroespinal.

As figuras a seguir mostram estruturas anatômicas relacionadas ao tronco encefálico.

Braço do colículo
superior
Braço do colículo
inferior Colículo
superior
Colículo
inferior
Nervo troclear
Nervo trigêmeo
Pedúnculo cerebral

Nervo facial Pedúnculos cerebelares


Nervo abducente Nervo vestibulococlear
Pirâmide Nervo glossofaríngeo

Nervo hipoglosso
Nervo vago
Oliva Nervo acessório
Raízes ventrais
cervicais
Sulco lateral anterior Sulco lateral posterior

Figura 112 – Vista lateral do tronco encefálico, na qual são observadas as estruturas anatômicas
e a emergência aparente no encéfalo dos nervos cranianos troclear a hipoglosso

118
ANATOMIA DOS SISTEMAS

Braço do colículo Glândula pineal


superior Colículo
superior
Colículo inferior
Braço do colículo
inferior Nervo troclear
Fossa romboide
Fóvea superior Sulco mediano
Sulco limitante
Pedúnculos cerebelares Colículo facial
Área vestibular
Locus ceruleus Estrias medulares
Parte aberta do bulbo Eminência medial Trígono do hipoglosso
Fóvea medial Trígono do vago
Tubérculo grácil Óbex
Parte fechada do Tubérculo cuneiforme Sulco mediano posterior
bulbo Fascículo grácil
Fascículo cuneiforme Sulco intermédio posterior
Sulco lateral posterior

Figura 113 – Vista posterior do tronco encefálico após remoção do cerebelo, na qual se percebem as estruturas
anatômicas e a emergência aparente, no encéfalo, do nervo craniano troclear

Leitura obrigatória

Agora que você possui conhecimentos sobre o tronco encefálico,


compreenderá as anotações clínicas envolvidas com essas estruturas
anatômicas. Leia o texto na Biblioteca Virtual:

SNELL, R. S. O tronco encefálico. In: ___. Neuroanatomia clínica. 7. ed. Tradução de


Marcio Moacyr de Vasconcelos. Rio de Janeiro: Guanabara‑Koogan, 2013. Disponível
em: <https://online.minhabiblioteca.com.br/#/books/978‑85‑277‑2451‑7/cfi/6/38!
/4/2/4/444/8/4/2@0:96.9>. Acesso em: 10 dez. 2016.

Lembrete

O mesencéfalo conecta a ponte com o diencéfalo.

2.7 Anatomia do diencéfalo

O diencéfalo, ou “cérebro intermédio”, pode ser dividido para estudos em duas grandes partes,
situadas dorsal e ventralmente em relação ao sulco de Monro, ou sulco hipotalâmico. O termo
diencéfalo faz referência à parte do SNC que, em conjunto com o telencéfalo, forma o cérebro. É
composto, sobretudo, por estruturas anatômicas pares, contendo o tálamo como a estrutura central.
As outras estruturas anatômicas do diencéfalo localizam‑se à volta do tálamo. Portanto, o diencéfalo
119
Unidade I

subdivide‑se em quatro partes: tálamo, hipotálamo, epitálamo e subtálamo. A sua observação se faz
tão somente após a retirada de todas as estruturas anatômicas do telencéfalo ou em secções sagitais,
secções coronais ou secções horizontais.

As partes do diencéfalo são designadas como órgãos circunventriculares, porque se localizam nas
paredes do III ventrículo e monitoram as modificações químicas no sangue, pois não apresentam, nessa
região, a barreira hematoencefálica. Os órgãos circunventriculares incluem parte do hipotálamo, da
glândula pineal, da hipófise e algumas estruturas próximas. Funcionalmente, essas regiões controlam
as atividades homeostáticas do aparelho neuroendócrino, como a regulação da pressão arterial, do
equilíbrio hídrico, da fome e da sede.

Os órgãos circunventriculares também são considerados locais de entrada, no encéfalo, do HIV,


vírus causador da aids. Uma vez no encéfalo, o HIV pode provocar demência, ou seja, a deterioração
irreversível do estado mental, e outros transtornos neurológicos.

2.7.1 O tálamo

Principal estação de retransmissão de impulsos sensitivos que chegam ao córtex cerebral oriundos
de outras partes do encéfalo e da medula espinal. O tálamo é uma massa de substância cinzenta, em
formato oval, que compõe a maior parte do diencéfalo, ou seja, corresponde a 4/5 dele. Do grego
thalamos, significa “câmara interna” ou “leito nupcial”, daí o nome pulvinar do tálamo. Suas dimensões
são: 30 a 40 milímetros de comprimento; 20 milímetros de largura; 22 milímetros de altura. Existem dois
tálamos, um de cada lado do III ventrículo.

Figura 114 – Pulvinar do tálamo

Ele apresenta quatro faces: superior, inferior, medial e lateral, das quais somente a face superior e a
face medial estão expostas. A face superior situa‑se entre a estria terminal e a estria medular. A inferior
restringe‑se com o tegmento do mesencéfalo, e a lateral é delimitada pela cápsula interna, que a separa
de um dos núcleos da base, o corpo estriado.

120
ANATOMIA DOS SISTEMAS

A face medial do tálamo compõe parte da parede lateral do III ventrículo e usualmente é conectada ao
tálamo contrário por uma faixa de substância cinzenta, a aderência intertalâmica. Porém, essa aderência
está ausente em aproximadamente 30% dos cérebros, consistindo, pois, em uma variação anatômica.
Pesquisas mostraram que a aderência intertalâmica de brasileiros adultos se encontra ausente em 29,5%
dos casos – esse número é maior em negros do que em brancos.

Na região posterior, inferiormente ao pulvinar do tálamo, encontram‑se duas estruturas anatômicas


denominadas corpos geniculados, lateral e medial, também designados como metatálamo. O corpo
geniculado lateral, que tem relação com a visão, e o medial, que relaciona‑se com a audição, unem‑se
aos colículos superiores e inferiores, respectivamente, por meio de seus braços.

Lembrete

O corpo geniculado medial retransmite impulsos auditivos, da orelha


para a área auditiva primária do córtex cerebral.

O corpo geniculado lateral retransmite impulsos visuais, da retina para


a área visual primária do córtex cerebral.

Núcleo Núcleo
geniculado geniculado
lateral medial

Figura 115 – Os núcleos talâmicos aparecem representados em


cores e separados em grupos pela lâmina medular interna

Uma depressão relevante que se estende do aqueduto do mesencéfalo até o forame interventricular
é designada como sulco hipotalâmico e sinaliza a separação anatômica entre o tálamo, acima do sulco,
e o hipotálamo, abaixo do sulco. Na extremidade posterior do sulco hipotalâmico se situa o epitálamo.

O tálamo é um centro de integração com o córtex cerebral, o cerebelo e a medula espinal.


Sabe‑se que após a remoção do córtex cerebral o tálamo é hábil em distinguir sensações grosseiras.
Entretanto, o córtex cerebral é fundamental à interpretação das sensações com base nas experiências
prévias. Por exemplo, se o córtex sensitivo for destruído, ainda será possível distinguir a presença

121
Unidade I

de um objeto quente na mão, mas o reconhecimento da forma, do peso e da temperatura correta


do objeto ficará comprometido.

Ele abrange muitos núcleos relevantes, e cada um deles emite axônios para determinada parte do
córtex cerebral. O grupo anterior integra o circuito de Papez e, assim, é relacionado com as emoções, a
regulação da vigilância e a memória. O grupo lateral contribui com as funções motoras, provavelmente
no planejamento do movimento, do mesmo modo que faz parte das vias sensitivas, como o tato, a
pressão, a propriocepção, a vibração, o calor, o frio e a dor oriundos da face e do corpo para o córtex
cerebral. O grupo mediano apresenta um papel relacionado com a memória e o olfato. O grupo medial
tem função de ativar o córtex cerebral. Esse grupo atua, também, nas emoções, no aprendizado, na
memória, na consciência e na cognição, ou seja, no pensamento e no conhecimento de uma forma geral.

Observação

O circuito de Papez é uma alça de conexões composta entre várias


estruturas do sistema límbico, por exemplo, o hipocampo, os corpos
mamilares do hipotálamo, os núcleos do tálamo anterior e medial, o giro
do cíngulo e o córtex entorrinal.

III ventrículo Núcleos


anteriores do
tálamo
Núcleos
laterais e Aderência
ventrais do intertalâmica
tálamo

Núcleos Núcleos mediais


posteriores do e medianos do
tálamo tálamo
III ventrículo

Figura 116 – Secção horizontal do encéfalo, em que figuram


centralmente os núcleos talâmicos separados pela lâmina medular interna

Observação

Os núcleos talâmicos organizam e ampliam os sinais enviados para o córtex


cerebral. É em razão disso que uma pessoa é capaz de se concentrar e conversar
com outra pessoa em um restaurante grande e agitado, por exemplo.

122
ANATOMIA DOS SISTEMAS

Ao se efetuar uma secção sagital mediana no cérebro, é possível um estudo da anatomia pouco
minudenciada do diencéfalo que nos possibilita observar tão somente algumas estruturas e limites
anatômicos. Na parte ventral do diencéfalo se observam, da região anterior para a posterior, o quiasma
óptico, o infundíbulo, o túber cinéreo e os corpos mamilares. Essas estruturas anatômicas serão
detalhadas mais à frente, quando estudarmos a estrutura e a função do hipotálamo.

Hipotálamo Aderência
intertalâmica
Lâmina terminal

Tálamo

Quiasma óptico

Nervo óptico

Recesso do infundíbulo
Infundíbulo Estria medular do
tálamo
Hipófise Túber
cinéreo Glândula pineal
Corpo mamilar Sulco hipotalâmico

Figura 117 – Secção sagital mediana no encéfalo para identificação das estruturas do diencéfalo

2.7.2 O hipotálamo

Situado na frente e abaixo do tálamo, é formado pelo quiasma óptico – em forma de X –, pelos
tratos ópticos, que são prolongamentos do quiasma óptico, pelos corpos mamilares, pelo túber cinéreo
e pela hipófise com o seu infundíbulo.

Lobo frontal
Fissura horizontal
Nervo óptico
Quiasma óptico
Hipotálamo
Corpos mamilares
Lobo temporal
Ponte
Bulbo

Cerebelo
Vérmis

Figura 118 – Vista inferior do encéfalo

123
Unidade I

Essa minúscula estrutura diencefálica, com massa de somente 4 a 5 gramas, e aproximadamente


entre 1 e 2 centímetros, é uma parte muito relevante do SNC e essencial à vida. Controla o SNA e os
órgãos endócrinos e, assim, a homeostase corporal. Tem localização adequada a essa finalidade, pois
reside no centro do sistema límbico.

O sistema límbico é por vezes chamado de “cérebro emocional”, pois seu papel principal está conexo
com um encadeamento de emoções, como a dor, o prazer, a docilidade, o afeto e a ira. Ele também está
envolvido com o olfato e a memória. Experimentos indicaram que, quando diferentes áreas de sistemas
límbicos de animais são acionadas, as reações dos bichos sugerem que estejam sentindo dor intensa ou
prazer extremo.

O estímulo de outras áreas do sistema límbico de animais produz docilidade e sinais de afeição.
A excitação do corpo amigdaloide ou de certos núcleos hipotalâmicos de um gato gera um padrão
comportamental conhecido como ira, ou seja, o gato exibe as suas garras, ergue sua cauda, expande
seus olhos, rosna e saliva. Em contrapartida, a retirada do corpo amigdaloide faz que o gato não sinta
receio nem exprima agressividade.

Da mesma forma, o indivíduo cujo corpo amigdaloide está lesado não consegue distinguir
manifestações de temor em outras pessoas ou sentir pânico em condições em que isso frequentemente
seria apropriado, como ao ser agredido por um animal.

Junto a outras partes do telencéfalo, o sistema límbico também parece apresentar papéis na memória
(lesões do sistema límbico geram mudanças de memória). Uma parte do sistema límbico, o hipocampo
parece ter uma característica não observada em outras estruturas anatômicas do SNC; ter células que
podem passar por mitoses. De tal modo, a parte do encéfalo que é responsável por alguns enfoques da
memória pode desenvolver novos neurônios, mesmo em indivíduos senis.

Observação

Pequeno glossário das estruturas anatômicas encontradas no hipotálamo:

• Corpos mamilares (do latim, diminutivo de mamma, “mamilo ou


mama”) são duas eminências arredondadas, com aproximadamente
5 milímetros de diâmetro, de substância cinzenta, notáveis na parte
anterior da fossa interpeduncular. Apresentam dois papéis relevantes
que estão integrados na evocação de memórias episódicas, como
lembrar eventos, sendo importante na formação e evocação de
memórias espaciais, por exemplo, encontrar um objeto e/ou um
lugar. As memórias ligadas a emoções fortes e envolvendo atividades
tradicionalmente benéficas à sobrevivência, como localizar comida,
outros indivíduos ou possíveis parceiros sexuais, são mais facilmente
armazenadas nessas estruturas anatômicas.

124
ANATOMIA DOS SISTEMAS

• Quiasma óptico é uma estrutura anatômica que está situada na


parte anterior do assoalho do ventrículo. Acolhe as fibras mielínicas
do nervo óptico, que aí cruzam em parte e prosseguem nos tratos
ópticos, que se dirigem aos corpos geniculados laterais depois de
contornar os pilares do cérebro.

• Túber cinéreo é uma área ligeiramente cinzenta, mediana,


localizada atrás do quiasma óptico e dos tratos ópticos, entre
estes e os corpos mamilares. No túber cinéreo se prende a hipófise
por meio do infundíbulo.

O quadro resume os principais papéis dos núcleos do hipotálamo.

Quadro 5

Núcleos do hipotálamo

Hipotálamo anterior
Núcleos pré‑ópticos:
– Ventrolateral: sono‑vigília.
– Medial: controle hormonal parvocelular; termorregulação.

Hipotálamo posterior
Corpo mamilar: memória; emoção.
Tuberomamilar: sono‑vigília (histamina).

Hipotálamo lateral
Hipotálamo lateral e área perifornical: vigília, ingestão de alimentos (orexina).

Hipotálamo medial
Paraventricular: ocitocina e vasopressina.
Supraóptico: ocitocina e vasopressina.
Arqueado: funções viscerais.
Supraquiasmático: ritmo circadiano.
Ventromedial: apetite; comportamento compulsório.
Dorsal medial: ingestão de alimentos e água; regulação da massa corporal.
Periventricular: hormônios parvocelulares.

125
Unidade I

Leitura obrigatória

Ainda que pequeno, o hipotálamo não deve ser notado como uma estrutura
anatômica de pouca relevância; é o maior centro do cérebro para a manutenção
do meio interno do corpo humano. Não há um tecido corporal que resista
ao seu prestígio. As conexões do hipotálamo são complexas, e somente as
principais vias devem ser memorizadas para utilização na parte clínica.

Incitamos você a consultar o conteúdo: “Distúrbios clínicos associados


a lesões hipotalâmicas”, na Biblioteca Virtual:

SNELL, R. S. O hipotálamo e suas conexões. In: ___. Neuroanatomia


clínica. 7. ed. Tradução de Marcio Moacyr de Vasconcelos. Rio de
Janeiro: Guanabara‑Koogan, 2013. Posição 13. Disponível em:
<https://online.minhabiblioteca.com.br/#/books/978‑85‑277‑2451‑7/
cfi/6/70!/4/2/4/160/2@0:0>. Acesso em: 14 dez. 2016.

2.7.2.1 Conexões do hipotálamo com a hipófise

O hipotálamo é conectado à hipófise por duas vias: as fibras nervosas, que prosseguem dos núcleos
supraóptico e paraventricular para o lobo posterior da hipófise, ou neuro‑hipófise, e os vasos de sangue
portais longos e curtos, que conectam os sinusoides na eminência mediana e no infundíbulo com plexos
capilares no lobo anterior da hipófise, ou adeno‑hipófise. Tais vias permitem que o hipotálamo influencie
as atividades dos órgãos endócrinos.

2.7.2.2 Trato hipotálamo‑hipofisário

O hormônio vasopressina, ou hormônio antidiurético, é produzido, sobretudo, nos neurônios do


núcleo supraóptico. Seu papel é causar vasoconstrição, mas também desempenha um papel antidiurético
relevante, elevando a absorção de água nos túbulos contorcidos distais e nos túbulos coletores do rim.

O outro hormônio é a ocitocina, que é produzida no núcleo paraventricular. A ocitocina estimula


a contração do músculo liso do útero e causa a contração das células mioepiteliais que circundam os
alvéolos e os ductos da mama. Próximo ao término da gestação, a ocitocina é produzida em grandes
quantidades e estimula as contrações uterinas do trabalho de parto. Depois, quando o recém‑nascido
suga a mama, um reflexo nervoso a partir do mamilo estimula o hipotálamo a produzir mais hormônio.
Isso provoca a contração das células mioepiteliais, e ajuda a ejeção de leite das mamas.

O núcleo supraóptico, que produz vasopressina, age como osmorreceptor. Caso a pressão osmótica
do sangue que circula por meio do núcleo supraóptico fique elevada demais, os neurônios aumentam
sua produção de vasopressina, e a consequência antidiurética desse hormônio aumenta a reabsorção de
água pelos rins. Dessa forma, a pressão osmótica do sangue retorna a limites normais.
126
ANATOMIA DOS SISTEMAS

2.7.2.3 Sistema portal hipofisário

Os hormônios são produzidos em grânulos e transportados ao longo dos axônios das células
neurossecretoras até a eminência mediana e o infundíbulo, onde os grânulos são liberados por exocitose
em capilares fenestrados na extremidade superior do sistema portal hipofisário.

O sistema portal hipofisário é constituído de cada lado da artéria hipofisária superior, que é um
ramo da artéria carótida interna. A artéria hipofisária superior adentra a eminência mediana e divide‑se
em tufos de capilares. Esses capilares drenam para vasos descendentes longos e curtos, que acabam
na adeno‑hipófise, dividindo‑se em sinusoides vasculares que passam entre as células secretoras da
adeno‑hipófise.

O sistema portal transporta os hormônios de liberação e os hormônios inibidores da liberação


para as células secretoras da adeno‑hipófise. Os hormônios de liberação estimulam a produção e a
liberação de hormônio adrenocorticotrófico, hormônio folículo‑estimulante, hormônio luteinizante,
hormônio tireotrofina e hormônio do crescimento. Já os hormônios inibidores impedem a liberação
de hormônio estimulante de melanócitos e de hormônio luteotrópico. O hormônio luteotrópico,
ou hormônio lactogênico, ou ainda prolactina, estimula o corpo lúteo a secretar progesterona
e a glândula mamária a produzir leite. O hormônio inibidor do hormônio do crescimento, ou
somatostatina, inibe a liberação de hormônio do crescimento.

2.7.2.4 Papéis do hipotálamo

Controle autonômico

O hipotálamo cumpre influência controladora sobre o SNA e parece unir o sistema autônomo e o
sistema neuroendócrino, preservando, assim, a homeostase corporal. Fundamentalmente, o hipotálamo
deve ser visto como um centro nervoso superior para o controle dos centros autonômicos inferiores no
tronco encefálico e na medula espinal.

A estimulação elétrica do hipotálamo mostra que a área anterior do hipotálamo e a área pré‑óptica
influenciam as respostas parassimpáticas; estas abrangem diminuição da pressão arterial, redução da
frequência cardíaca, contração da bexiga urinária, elevação da motilidade do trato gastrintestinal,
elevação da acidez do suco gástrico, salivação e constrição pupilar.

Já a estimulação do núcleo posterior e do núcleo lateral causa respostas simpáticas, que incluem
aumento da pressão arterial, aceleração da frequência cardíaca, interrupção do peristaltismo no trato
gastrintestinal, dilatação pupilar e hiperglicemia.

Controle endócrino

Os neurônios dos núcleos hipotalâmicos, por meio da produção de fatores de liberação ou inibidores
da liberação, controlam a produção hormonal da adeno‑hipófise.

127
Unidade I

Regulação da temperatura

A parte anterior do hipotálamo regula os mecanismos que dissipam a perda de calor e, ao ser
estimulada, essa área causa sudorese e dilatação dos vasos de sangue cutâneos que diminuem a
temperatura corporal. Já a estimulação da parte posterior do hipotálamo procede à inibição da sudorese
e à vasoconstrição dos vasos de sangue cutâneos, também podem existir tremores, por meio dos quais
os músculos estriados esqueléticos geram calor.

Regulação do consumo alimentar

A estimulação da região lateral do hipotálamo ocasiona a sensação de fome e procede à


elevação da ingestão de alimentos. O principal núcleo envolvido é o paraventricular, que, por meio
de receptores hipotalâmicos, monitora os níveis de insulina produzidos pelo pâncreas. É provável
que os níveis de insulina e noradrenalina circulantes estimulem o hipotálamo a desencadear o
impulso da fome. Ao estimular a região medial do hipotálamo, a alimentação é inibida e o consumo
alimentar diminui. A destruição bilateral do centro da saciedade gera apetite voraz incontrolável,
ocasionando obesidade extrema.

Regulação da ingesta de água

A estimulação de outras áreas da região lateral do hipotálamo gera elevação imediata na vontade
de ingerir água; essa área é chamada de centro da sede. Além disso, o núcleo supraóptico do
hipotálamo desempenha um controle prudente sobre a osmolaridade do sangue por meio da secreção
de vasopressina.

Emoções e comportamento

As emoções e o comportamento são papéis do hipotálamo, do sistema límbico e do córtex


pré‑frontal. O hipotálamo é o integrador dos dados aferentes recebidos de outras áreas do SN e produz
a expressão física das emoções; pode determinar elevação da frequência cardíaca, aumento da pressão
arterial, secura da boca, bem como rubor ou palidez da pele e sudorese. Ademais, produz com constância
atividade peristáltica maciça do trato gastrintestinal.

A estimulação dos núcleos laterais do hipotálamo pode gerar os sinais e os sintomas de raiva,
enquanto as lesões dessas áreas podem levar à passividade. O núcleo ventromedial, ao ser estimulado,
pode gerar passividade, enquanto lesões desse núcleo podem provocar raiva.

O hipotálamo, por meio de seus hormônios liberadores para a hipófise, desempenha influência
essencial sobre o desenvolvimento sexual normal. Existem diferenças até microanatômicas entre o
hipotálamo “masculino” e o hipotálamo “feminino”, que podem influir no comportamento sexual.
Alguns homossexuais masculinos apresentam seus detalhes hipotalâmicos mais semelhantes aos
das mulheres.

128
ANATOMIA DOS SISTEMAS

Controle dos ritmos circadianos

O hipotálamo coordena muitos ritmos circadianos, incluindo a temperatura corporal, a atividade


adrenocortical, a contagem de eosinófilos e a secreção renal. O sono e a vigília, embora dependentes das
atividades do tálamo, do sistema límbico e do sistema reticular ativador, também são controlados pelo
hipotálamo. As lesões da parte anterior do hipotálamo interferem gravemente no ritmo de sono e de vigília.

As conexões da retina com o núcleo supraquiasmático desencadeiam modificações no hormônio


do crescimento, nos hormônios corticosteroides e nos hormônios sexuais que se alteram conforme
a percepção de dia e de noite. Essas modificações cíclicas são designadas como ritmo circadiano. A
destruição daquele núcleo não suprime o ritmo, porém o torna fixo nas 24 horas. Os mecanismos
complexos desse ritmo e a sua relevância estão para ser explicados. O interessante é que as mulheres
esquimós não ovulam durante o inverno ártico, cujo escuro dura longos períodos, demonstrando a
relação entre o ambiente e os processos internos.

2.7.3 O epitálamo

O epitálamo (grego: epi, “sobre”; thalamos, câmara interna) localiza‑se na extremidade posterior do
III ventrículo, inferiormente ao esplênio do corpo caloso, anteriormente à fissura cerebral transversa e
superiormente ao mesencéfalo. O lúmen do III ventrículo estende‑se por pequena distância em sua base,
compondo o recesso pineal.

A estrutura não endócrina mais relevante do epitálamo é uma depressão em forma de triângulo,
composta pela comissura das habênulas, pelas estrias medulares e pela comissura posterior. As
estruturas habenulares e as estrias medulares são estruturas límbicas. Embora se acredite que os núcleos
habenulares e as suas conexões se relacionem com o sistema límbico, não se sabe qual seu papel exato.
Talvez os núcleos habenulares participem do olfato, especialmente nas respostas emocionais a odores,
como o perfume da pessoa amada ou os biscoitos de chocolate que estão assando no forno.
Habênula e
comissura das Glândula
Estria medular pineal
do tálamo habênulas

Colículo
superior

Colículo
inferior

Comissura
posterior

Figura 119 – Vista medial dos hemisférios cerebrais de estruturas neurais (habênula, comissura das habênulas
e estria medular) e endócrinas (glândula pineal) do epitálamo, além de estruturas de outras regiões encefálicas

129
Unidade I

A comissura posterior marca o limite posterior entre o diencéfalo e o mesencéfalo. Constitui‑se de


fibras originadas de núcleos dessa região encefálica ainda não completamente explicadas. Dentre elas,
existem fibras que cruzam da área pré‑tectal para o núcleo de Edinger‑Westphal do lado contralateral,
muito relevante no reflexo consensual, isto é, a constrição das pupilas dos dois olhos, e não apenas do
olho estimulado, em uma resposta reflexa bilateral ao excesso de luz.

As estruturas endócrinas mais relevantes do epitálamo são a glândula pineal e o órgão subcomissural.
Esse órgão, ainda pouco pesquisado, é uma protuberância situada abaixo da comissura posterior do
epitálamo, relacionada com o controle de secreção de aldosterona pela glândula suprarrenal. Já a
glândula pineal é mais clara e mais bem-pesquisada, além de ser considerada uma glândula sem ductos,
que mede, aproximadamente, 8 milímetros de comprimento.

A base da glândula pineal está presa às demais estruturas anatômicas do epitálamo por um
pedúnculo de substância branca. Esse pedúnculo se divide anteriormente em duas lâminas, uma
dorsal e outra ventral, as quais são separadas uma da outra pelo recesso pineal do III ventrículo. É
ricamente irrigada e possui capilares fenestrados, não existindo, portanto, barreira hematoencefálica
na glândula pineal. Sua inervação se faz por fibras simpáticas pós‑ganglionares oriundas do
gânglio cervical superior, as quais são relevantes na regulação da síntese do hormônio da glândula
pineal, a melatonina. Essa inervação simpática traz dados do núcleo supraquiasmático, que age na
regulação do ciclo circadiano.

Propõe‑se, contudo, que a melatonina iniba outras glândulas endócrinas e participe da regulação de
ciclos circadianos, inclusive do ciclo vigília‑sono. Atualmente, tem sido sugerida a existência de conexão
funcional entre a glândula pineal e o sistema imunológico. A melatonina influenciaria o sistema imune
pela participação de mediadores, como os opioides, os endógenos e as citocinas, e pela interação direta
com células do sistema imunológico.

O sistema imune, por sua vez, é hábil em modular o funcionamento do corpo pineal. A melatonina
atuaria como removedora de radicais livres e de agentes antineoplásicos. Como a secreção de melatonina
diminui gradualmente com a idade, explora‑se que esse fato seja o responsável pelo surgimento de
muitos distúrbios relacionados ao envelhecimento.

2.7.4 O subtálamo

Pequena região situada na parte posteroinferior do diencéfalo, na transição com o mesencéfalo.


Limita‑se superiormente com o tálamo, lateralmente com a cápsula interna e medialmente com o
hipotálamo. Como não é uma estrutura anatômica superficial, pode apenas ser observada em secções,
preferencialmente a secção coronal. Única estrutura anatômica do diencéfalo que não se relaciona com
o lúmen do III ventrículo.

Macroscopicamente, a única estrutura anatômica identificável inequivocamente é o núcleo


subtalâmico, cujo epônimo é o corpo de Luys. Esse núcleo possui uma forma de lente biconvexa, com a
sua extremidade inferior aproximando‑se da substância negra.

130
ANATOMIA DOS SISTEMAS

O subtálamo também abrange diversos tratos importantes que ascendem a partir do tegmento para
os núcleos talâmicos; as extremidades cranianas dos lemniscos medial, espinal e trigeminal são exemplos.

Por essa riqueza de conexões e por seu relevante papel na regulação da atividade motora, o subtálamo
é considerado funcionalmente como um dos núcleos da base.

2.8 Anatomia do telencéfalo

O grande desenvolvimento dos hemisférios cerebrais sucedidos durante a evolução das


espécies foi atingido com a caracterização do cérebro humano, cujas competências mais distintas
se devem, particularmente, ao aparecimento e à formação do neocórtex, responsável pelo maior
tamanho do SNC em relação ao corpo e ao grau de encefalização, e, principalmente, à sua
complexa rede neural.

Assim, o nosso telencéfalo é a “sede da inteligência”. Ele é o responsável por nossa aptidão à ler,
escrever, falar, realizar cálculos, compor músicas, lembrar o passado, planejar o futuro e “fantasiar”
situações que nunca existiram. O telencéfalo é formado por um córtex cerebral externo, uma região
interna de substância branca e núcleos de substância cinzenta localizados profundamente na substância
branca, chamados de núcleos da base.

O córtex cerebral é uma região de substância cinzenta que compõe a face externa do telencéfalo.
Ainda que apresente somente de 2 a 4 milímetros de espessura, o telencéfalo contém bilhões de
neurônios dispostos em camadas. Durante a morfogênese do SN, quando o encéfalo cresce ligeiramente,
a substância cinzenta do córtex se desenvolve muito mais rápido que a substância branca, mais profunda.

Os dois hemisférios cerebrais têm um formato ovoide, de menores proporções anteriormente, de


160 a 180 milímetros de diâmetro no plano sagital e de 140 a 150 de milímetros de diâmetro no
plano transversal. Em relação ao peso atribuído para o cérebro, a maior parte pertence aos hemisférios
cerebrais, pois o diéncefalo é uma parte muito pequena em comparação aos hemisférios cerebrais.
Raramente o peso de ambos os hemisférios cerebrais é idêntico; na maioria das vezes, o hemisfério
cerebral direito varia em relação ao hemisfério cerebral esquerdo em alguns gramas. Além disso, há uma
assimetria cerebral.

Cada hemisfério cerebral possui um polo frontal, um polo occipital e um polo temporal, e tem três
superfícies: a superolateral, a medial e a inferior ou basal. À medida que as superfícies superolaterais dos
hemisférios cerebrais se organizam sob a calvária, as superfícies mediais se confrontam, existindo entre
si a foice do cérebro, e as superfícies inferiores ou basais repousam sobre a metade anterior da base do
crânio, entre a fossa anterior do crânio e a fossa média do crânio, e sobre o tentório do cerebelo.

Os hemisférios cerebrais são incompletamente separados pela fissura longitudinal do cérebro e


ligados por feixes de fibras de ambos os lados, que compõem as comissuras. A fissura longitudinal do
cérebro abrange a segunda prega afoiçada da dura‑máter, a foice do cérebro e as artérias cerebrais
anteriores. Nas profundezas da fissura longitudinal do cérebro, a grande comissura, o corpo caloso, une
os hemisférios cerebrais por meio da linha média.
131
Unidade I

Ao examinar os hemisférios cerebrais a olho nu, observa‑se que sua superfície não é lisa, mas, sim,
pregueada. Essas pregas, anatomicamente chamadas de giros, são dobras do tecido nervoso e uma
tática evolutiva para aumentar a área do córtex cerebral sem que seja necessário elevar o volume do
crânio. Cada giro é delimitado por sulcos ou fissuras. Certos sulcos são constantes e adquirem nomes,
sendo usados para delimitar anatomicamente os lobos do cérebro. A figura a seguir exemplifica alguns
giros e lobos do cérebro.

Giro pré-central
Lobo frontal
Giro pós-central

Lobo occipital Giro temporal


superior
Giro temporal
inferior
Cerebelo

Figura 120 – Vista lateral do encéfalo

2.8.1 Lobos do telencéfalo

A tradicional divisão de cada hemisfério cerebral em cinco lobos, sendo quatro relacionados aos
ossos do crânio e o lobo insular, toma como principais limites o sulco central, o sulco lateral e uma linha
imaginária que liga a emergência superomedial do sulco parieto-occipital com a incisura pré‑occipital,
que, por sua vez, localiza‑se na margem inferolateral, aproximadamente 5 centímetros anteriormente
ao polo occipital.

Figura 121 – Lobos do cérebro (vermelho: lobo frontal; azul: lobo parietal; laranja: lobo temporal; verde: lobo occipital)

O mais atual ponto de vista de considerar o giro pré‑central e o giro pós‑central como um lobo do
cérebro – chamado de lobo central – e as estruturas límbicas como outro lobo isolado – chamado de
lobo límbico – torna a divisão dos lobos do cérebro menos tirânica e mais relevada, uma vez que cada
um dos lobos do cérebro passa a concentrar áreas mais afins dos pontos de vista anatômico e funcional.
De tal modo, cada hemisfério cerebral é composto por sete lobos do cérebro: frontal, central, parietal,
occipital, temporal, insular e límbico.
132
ANATOMIA DOS SISTEMAS

O lobo frontal ocupa a área anterior ao sulco central e superior ao sulco lateral. Nesse lobo, o
giro frontal inferior no hemisfério cerebral esquerdo, na maioria dos indivíduos, contém a área da
fala de Broca, que é fundamental para a articulação da fala. Grande parte do lobo frontal abrange
o córtex de associação pré‑frontal. Este é relevante no pensamento, na cognição e nas emoções. Os
transtornos psiquiátricos do pensamento, como a esquizofrenia e os transtornos do humor, por exemplo,
a depressão, estão ligados a papéis anormais do córtex pré‑frontal de associação. Embora o órgão
sensorial do olfato, o bulbo olfatório, permaneça situado na face ventral do lobo frontal, suas conexões
estão prevalentemente no lobo temporal.

O lobo parietal ocupa a área posterior ao sulco central e superior ao sulco lateral, estendendo‑se
posteriormente até o sulco parieto-occipital. Ele intercede nas percepções de tato, dor e posição dos
membros. Esses papéis são executados pelo córtex somatossensorial primário, que está́ situado no giro
pós‑central. As áreas sensoriais primárias são os estágios principais do processamento cortical para os
dados sensoriais. O lóbulo parietal superior contém áreas somatossensoriais de ordem superior para o
processamento posterior dos dados somatossensoriais e outras áreas sensoriais. Juntas, essas áreas são
fundamentais para uma autoimagem completa do corpo e intercedem nas interações comportamentais
com o mundo em torno. Uma lesão nessa parte do lobo parietal no hemisfério direito, o lado do encéfalo
humano especializado na consciência espacial, gera sinais neurológicos bizarros que abrangem o desmazelo
de uma parte do corpo no lado contrário da lesão. Por exemplo, um paciente pode não vestir uma parte do
corpo, ou pentear somente metade do cabelo. O lóbulo parietal inferior participa da integração de vários
dados sensoriais para a percepção, a linguagem, o raciocínio matemático e a cognição visuoespacial.

O lobo temporal ocupa a área inferior ao sulco lateral. Ele desempenha uma abundância de papéis sensoriais
e participa da memória e das emoções. O córtex auditivo primário, situado no giro temporal superior, age nas
áreas adjacentes no giro temporal superior e dentro do sulco lateral; e o sulco temporal superior, na percepção
e na localização de sons. O giro temporal superior no lado esquerdo é especializado na fala. Lesão da parte
posterior desse giro, que está situada na área de Wernicke, afeta a compreensão da fala. O giro temporal
médio, principalmente a parte próxima do lobo occipital, é fundamental para a percepção do movimento
visual. O giro temporal inferior atua na percepção da forma visual e das cores. O giro temporal transverso
anterior é relevante, pois nele se encontra o centro cortical da audição.

O lobo occipital ocupa a pequena área atrás do sulco parieto-occipital, e seu papel mais considerável
é a visão. O córtex visual primário está situado nas paredes e partes mais profundas do sulco calcarino
na face medial do encéfalo. Enquanto o córtex visual primário é relevante nos estágios principiais
do processamento visual, as áreas visuais adjacentes de ordem superior cumprem um papel na
elaboração da mensagem sensorial, possibilitando que sejam observadas a forma e a cor dos objetos.
Por exemplo, na face ventral do encéfalo está uma parte do giro occipitotemporal medial relevante para
o reconhecimento facial. Pacientes com uma lesão nessa área confundem faces com objetos inertes –
uma condição designada de prosopagnosia.

Profundamente, no sulco lateral, encontram‑se partes do lobo frontal, do lobo parietal e do lobo
temporal. Esse território é designado como lobo insular. Posteriormente, durante o desenvolvimento
pré‑natal, o lobo insular torna‑se encoberto. Partes desse lobo são relevantes no paladar, nas percepções
corporais internas, na dor e no equilíbrio.
133
Unidade I

Observação

Os lobos do hemisfério cerebral não estão definidos nitidamente na face


medial e na face inferior. Todavia, permanecem diversas áreas relevantes
que devem ser reconhecidas e detalhadas a seguir:

• Lóbulo paracentral é uma área do córtex cerebral que rodeia a


endentação determinada pelo sulco central na margem superior. A
parte anterior do lóbulo paracentral é uma extensão do giro pré‑central
na face superolateral, e a parte posterior do lóbulo paracentral é uma
extensão do giro pós‑central. Na parte anterior e na parte posterior
do lóbulo paracentral se situam, concomitantemente, a área motora
e a área sensitiva relacionadas com a perna e o pé.

• Pré‑cúneo é uma área do córtex delimitada anteriormente


pela extremidade posterior e ascendente do sulco do cíngulo e
posteriormente pelo sulco parieto-occipital.

• Cúneo é uma área triangular do córtex cerebral delimitada acima


pelo sulco parieto-occipital, inferiormente pelo sulco calcarino e
posteriormente pela margem superomedial.

• Área septal é a região situada abaixo do rostro do corpo caloso e


adiante da comissura anterior à lâmina terminal. Consiste em um
dos centros do prazer do cérebro. A área septal abrange o giro
paraterminal e os giros paraolfatórios.

• O giro occipitotemporal medial estende‑se do polo occipital ao polo


temporal. É limitado medialmente pelo sulco colateral e sulco rinal,
e lateralmente pelo sulco occipitotemporal. O giro occipitotemporal
lateral é lateral ao sulco e contínuo com o giro temporal inferior.

• Giro lingual é uma região que está localizada na face inferior


do hemisfério cerebral. Anterior ao giro lingual está o giro
para‑hipocampal; o último acaba anteriormente, como o unco
semelhante a um gancho.

Assim, o unco, o giro para‑hipocampal, o istmo do giro do cíngulo e o giro do cíngulo compõem
uma formação contínua que circunda as estruturas inter‑hemisféricas, e que muitos consideram
como um lobo independente, o lobo límbico, parte relevante do sistema límbico, relacionado com o
comportamento emocional e o controle do SNA.

134
ANATOMIA DOS SISTEMAS

Encontramos na face inferior do lobo frontal o bulbo e o trato olfatório, localizados sobre um sulco,
chamado de sulco olfatório. Medialmente ao sulco olfatório está o giro reto, e lateralmente ao sulco
olfatório há uma série de giros orbitais.

2.8.2 Os núcleos da base

Essa terminologia é empregada em uma coletânea de massas de substância cinzenta localizada dentro
de cada hemisfério cerebral. Os núcleos da base executam um papel relevante no controle da postura e
dos movimentos voluntários. À diferença de várias outras partes do SN demandadas no controle motor,
os núcleos da base não apresentam conexões aferentes ou conexões eferentes diretas com a medula
espinal. Tais núcleos são: o corpo estriado, o núcleo amigdaloide, o claustro, o núcleo accumbens e o
núcleo basal de Meynert. Alguns dos papéis atribuídos a cada núcleo da base serão mostrados a seguir.

O corpo estriado, localizado lateralmente ao tálamo, abrange o núcleo caudado, o putame e o globo
pálido. Ele pode ser dividido em: núcleo estriado, composto de núcleo caudado e putame, os quais são
semelhantes do ponto de vista histológico e de origem embrionária; e núcleo pálido, representado pelo
globo pálido.

No globo pálido, por conseguinte, distinguem‑se duas regiões: o globo pálido medial e o globo pálido
lateral. O globo pálido e o putame localizam‑se lado a lado, compondo uma estrutura macroscópica,
o núcleo lentiforme, separado do núcleo caudado pela cápsula interna. O núcleo lentiforme apresenta
a forma e o tamanho aproximado de uma castanha‑do‑pará e não aparece na superfície ventricular,
localizando‑se profundamente no interior do hemisfério cerebral.

O núcleo caudado e o putame controlam as contrações involuntárias de determinados músculos


estriados esqueléticos. Por exemplo, quando um indivíduo está deambulando, o núcleo caudado e o
putame controlam as fases cíclicas dos movimentos dos membros superiores e inferiores, que acontecem
entre o momento em que a decisão “começar a andar” é realizada e o momento em que a ordem “parar
de andar” é dada.

O globo pálido regula o tônus muscular necessário para a execução de determinados movimentos
voluntários do corpo. Por exemplo, quando você decide apanhar um objeto, o globo pálido posiciona o
ombro e estabiliza o braço enquanto você̂ conscientemente busca e segura o objeto com o antebraço,
o punho e a mão.

O núcleo amigdaloide é considerado parte do sistema límbico. Mediante suas conexões, influencia
a resposta corporal às mudanças ambientais. Na sensação de medo, por exemplo, altera a frequência
cardíaca, a pressão arterial, a coloração da pele e a frequência respiratória.

O claustro é uma delgada calota de substância cinzenta localizada entre o córtex da ínsula e o núcleo
lentiforme. Entre o claustro e o núcleo lentiforme há outra lâmina branca, a cápsula externa. O claustro
parece estar envolvido no processamento de informação visual em nível subconsciente. Evidências
indicam que ele atua na focalização da atenção em padrões específicos ou características importantes.

135
Unidade I

O núcleo accumbens é uma massa de substância cinzenta localizada na zona de união entre o
putame e a cabeça do núcleo caudado numa área chamada de corpo estriado ventral.

O núcleo basal de Meynert macroscopicamente é de visualização difícil. Localiza‑se na base do


cérebro, entre a substância perfurada anterior e o globo pálido, região chamada de substância inominada,
e contém neurônios grandes e ricos em acetilcolina.

A figura a seguir mostra alguns dos núcleos da base.

Núcleo
caudado

Tálamo Putame

Cápsula Globo pálido


interna (lateral)
Globo pálido
(medial)

Núcleo
subtalâmico
Corpo Substância
mamilar negra

Figura 122 – Secção coronal do encéfalo, no qual é possível observar o núcleo subtalâmico. Veja sua redondeza
anatômica com núcleos mesencefálicos, como a substância negra

Leitura obrigatória

Os distúrbios dos núcleos da base são, em geral, de dois tipos: os


hipercinéticos e os hipocinéticos. A doença de Parkinson envolve os dois
tipos de perturbações motoras. Conheça mais sobre essa patologia na
Biblioteca Virtual:

SNELL, R. S. Os núcleos da base (gânglios da base) e suas conexões.


In: ___. Neuroanatomia clínica. 7. ed. Tradução de Marcio Moacyr de
Vasconcelos. Rio de Janeiro: Guanabara‑Koogan, 2013. Disponível em:
<https://online.minhabiblioteca.com.br/#/books/978‑85‑277‑2451‑7/
cfi/6/58!/4/2/6/2@0:0>. Acesso em: 10 dez. 2016.

As informações contidas serão de grande valia para você lidar com


pacientes neurológicos.

136
ANATOMIA DOS SISTEMAS

2.8.3 As áreas corticais

O córtex cerebral age como centro integrador para os dados sensoriais, e como uma região de
tomada de decisões para vários tipos de respostas motoras. Um exame anatômico dos dois hemisférios
cerebrais demonstra que os giros e sulcos corticais são quase semelhantes. Entretanto, ao examinar
o córtex cerebral do ponto de vista funcional, ele pode ser dividido em três especializações: as áreas
sensoriais, ou campos sensoriais, responsáveis por estímulos sensoriais, traduzindo‑os em percepção,
ou seja, em consciência; as áreas motoras, responsáveis por comandar os movimentos dos músculos
estriados esqueléticos; as áreas de associação, ou córtex de associação, responsáveis por integrar as
informações de áreas motoras e de áreas sensoriais, além de comandar os comportamentos voluntários.

Para que a informação do ambiente resulte em um comportamento apropriado, ela deve ser
trabalhada em várias fases: as primárias, as mais básicas, de tratamento da informação; as secundárias, de
percepção e reconhecimento; as terciárias, de associação. Já a informação para o comportamento parte
de uma fase terciária, para que, em uma região motora, sejam planejados e executados os movimentos
relativos a esse comportamento.

O cérebro possui áreas especializadas em receber o que é captado pelos sentidos, chamadas de
áreas sensoriais primárias. Já em áreas sensoriais secundárias, é executada a análise das informações
recebidas pelas áreas primárias. As informações já adequadamente analisadas são, então, transmitidas
às chamadas áreas de associação, as áreas terciárias, nas quais o que se percebe é associado às decisões
seguintes, conscientes, e também são desenvolvidos processos não diretamente relacionados com a
percepção ou o comportamento, como a memória.

A “decisão” da área de associação é transmitida às áreas motoras secundárias, onde um ato


é planejado conforme os seus objetivos e as variáveis do meio. A execução em si é papel do córtex
motor primário, que coordena diretamente o movimento. Os componentes dos movimentos não são
conscientes, ou seja, o indivíduo não se intera de quantos músculos se contraem, bem como de quando
e quantos músculos se contraem.

A informação que passa por uma via geralmente é processada em mais de uma dessas áreas. As áreas
funcionais dos córtex cerebrais não basicamente correspondem aos lobos do cérebro. Por conseguinte,
a especialização funcional não é simétrica no córtex cerebral, ou seja, cada lobo do cérebro apresenta
funções especiais não compartilhadas com os lobos do telencéfalo correspondente do lado contrário.
Essa lateralização cerebral do papel é, muitas vezes, mencionada como dominância hemisférica, ou
dominância. A capacidade verbal e a linguagem tendem a estar concentradas no lado esquerdo do
cérebro, e as habilidades espaciais, no lado direito do cérebro. O hemisfério cerebral esquerdo é o
hemisfério dominante para os indivíduos destros, do mesmo modo que o hemisfério cerebral direito é
dominante para muitas pessoas canhotas.

No entanto, até essas generalizações estão sujeitas a modificações. As conexões neurais no cérebro,
bem como em outras partes do SN, mostram determinado grau de plasticidade. Por exemplo, se um
indivíduo perder um dedo, as regiões do córtex motor e do córtex sensorial, antecipadamente destinadas
a controlar o dedo, não ficarão inativas. Diante disso, as regiões vizinhas do córtex cerebral estendem
137
Unidade I

seus campos funcionais e adotam a parte do córtex cerebral que não é mais utilizada pelo dedo ausente.
Igualmente, as habilidades frequentemente associadas com um lado do córtex cerebral podem ser
desenvolvidas pelo outro hemisfério cerebral, por exemplo, quando um indivíduo destro, com a mão
direita fraturada, aprende a escrever com a mão esquerda.

2.8.4 O mapa citoarquitetônico do córtex cerebral

Durante o século passado, estudos clinicopatológicos em seres humanos e eletrofisiológicos e de


retirada em animais produziram evidências de que áreas distintas do córtex cerebral exercem papéis
especializados. Entretanto, no século XIX, o anatomista Korbinian Brodmann dividiu o córtex cerebral
em 52 áreas citoarquitetônicas diferentes de especialização, o que simplifica demais e ilude o leitor.

A divisão simples das áreas corticais em motoras e sensitivas é errônea, pois muitas áreas sensitivas
são mais extensas do que as descritas originalmente, e sabe‑se que respostas motoras são obteníveis
por estimulação de áreas sensitivas. Até que uma terminologia aceitável seja concebida para descrever
as diversas áreas corticais, as principais áreas serão denominadas segundo sua localização anatômica. O
quadro a seguir resume alguma das principais conexões anatômicas do córtex cerebral.

Quadro 6

Papel
1, 2, 3 Propriocepção tátil.
4 Controle do movimento voluntário.
5 Estereognosia.
6 Planejamento dos movimentos dos membros e olhos.
7 Consciência espacial visuomotora e percepção.
8 Associado com o controle do movimento dos olhos.
9 Associado com lógica e cálculos.
10 Associado com atenção e alerta.
11 e 12 Associado a processo decisório e comportamentos éticos.
13 e 14 Associado a somatossensorial, memória verbal e motivação.
17 Visão.
18 Visão e profundidade.
19 Visão, cor, profundidade e movimento.
20 Visão de formas.
21 Visão de formas.
22 Audição e fala.
23, 24, 25, 26, 27 Emoções, aprendizado e memória.
28 Odor/olfato, emoções, aprendizado e memória.
29, 30, 31, 32, 33 Emoções.
34, 35, 36 Odor/olfato e emoções.
37 Percepção, visão, leitura e fala.
38 Odor/olfato, emoções, personalidade.

138
ANATOMIA DOS SISTEMAS

39 Percepção, visão, leitura e fala.


40 Percepção, visão, leitura e fala.
41 Audição.
42 Audição.
43 Paladar.
44 Fala, planejamento do movimento.
45 Pensamento, cognição e planejamento do comportamento.
46 Pensamento, cognição, planejamento do comportamento e movimento dos olhos.
47 Pensamento, cognição e planejamento do comportamento.

Movimentos oculares Planejamento motor


Atenção visuoespacial Antecipação Motricidade
Raciocínio figurativo e analítico Somestesia
Processamento visuoespacial
Memória operacional espacial
Raciocínio analítico
Fala Aproximações matemáticas
Julgamento moral Atenção visuoespacial
Memória operacional Percepção de velocidade
de objetos
Visão analítica
Cálculos matemáticos
Olfação Percepção de movimentos
Prazer tátil
Percepção de cores
Antecipação da dor Compreensão linguística
Olfação Audição
Reconhecimento de objetos
Pré-ativação semântica Dor Reconhecimento
de faces

Figura 123 – Divisão do córtex cerebral por Brodmann em 52 áreas citoarquitetônicas


(A) e em áreas funcionais, (B) segundo sua ativação utilizando métodos de imagem

2.8.5 O homúnculo de Penfield

Os córtices somestésico primário e motor primário são topograficamente organizados e possuem


uma representação ponto a ponto da superfície corporal deformada, constituindo homúnculos. Essa
organização topográfica é sustentada nos feixes ascendentes e descendentes, permitindo a localização
de estímulos e sensações, bem como o controle dos atos motores.

139
Unidade I

As proporções do homúnculo motor são diferentes das do corpo em dimensão real, porque a área
motora situada em uma região específica do córtex é proporcional ao número de unidades motoras
envolvidas no controle da região corpórea, e não ao seu tamanho real. Como resultado, o homúnculo
proporciona uma recomendação do grau de controle motor apurado acessível a cada região. Por exemplo,
as mãos, a face e a língua, apropriadas de movimentos complexos, surgem em tamanhos muito grandes,
à medida que a representação do tronco é moderadamente pequena. Essas proporções são semelhantes
às do homúnculo sensitivo.

O homúnculo sensitivo e o homúnculo motor diferem em outros aspectos, porque algumas


regiões intensamente sensíveis, como a planta, contêm poucas unidades motoras, enquanto
outras regiões que possuem fartura de unidades motoras, como os músculos do olho, não são
particularmente sensíveis.

Figura 124 – Divisão funcional do córtex em áreas sensitivas, motoras e associativas (integrativas). Veja que essa
divisão, diferentemente das demais, não respeita limites anatômicos, como os giros e os sulcos. Secção coronal
do hemisfério cerebral direito, ao nível de corte indicado no inserto. Nota‑se a representação da superfície
corporal nos córtices somestésico primário e motor primário

Observação

Quando há lesão da área motora, pode existir redução da força muscular,


que é chamada de paresia. Quando há perda total da força, acontece
paralisia ou plegia.

Hemiplegia é a paralisia da metade direita ou esquerda do corpo humano.

140
ANATOMIA DOS SISTEMAS

Leitura obrigatória

Assim como a informação ascende para níveis de processamento


progressivamente mais complexos no SNC por meio das vias ascendentes,
a informação processada percorre uma via de mesma direção, porém em
sentido contrário, pelas vias descendentes. É desse jeito que a informação
eferente do SN alcança os efetores (músculos e glândulas).

Convidamos você a estudar sobre as vias descendentes na Biblioteca Virtual:

MARTINEZ, A. M. B.; ALLODI, S.; UZIEL, D. Telencéfalo e vias descendentes.


In: ___. Neuroanatomia essencial. Rio de Janeiro: Guanabara‑Koogan,
2014. Disponível em: <https://online.minhabiblioteca.com.br/#/
books/978‑85‑277‑2396‑1/cfi/6/48!/4/344/2@0:88.1>. Acesso em: 10
dez. 2016.

2.9 Anatomia do cerebelo

O cerebelo é a formação nervosa volumosa localizada atrás do bulbo e da ponte, entrando


na constituição do teto do IV ventrículo. Repousa sobre a fossa cerebelar do osso occipital e
permanece espaçado ao lobo occipital do cérebro por uma prega da dura‑máter designada de
tenda do cerebelo.

Apresenta um desenho quase ovoide, ou de borboleta, alongado transversalmente e achatado


anteroposteriormente. A face superior do cerebelo é identificada por ser inteira, apenas com uma
pequena elevação na parte mediana. Já a face inferior exibe uma clara divisão entre o lado direito e o
lado esquerdo, onde se encontra o verme. A face anterior fica volvida para o IV ventrículo.

O cerebelo apresenta as seguintes dimensões. Seu diâmetro transversal possui em média 9


centímetros, seu diâmetro anteroposterior 6 centímetros e o seu diâmetro vertical 5 centímetros.
Pesa de 130 a 150 gramas, ou seja, corresponde a 1/8 do peso do cérebro, porém seu peso absoluto
é um pouco maior nos homens do que nas mulheres. Após o nascimento, o cerebelo cresce mais
do que o resto do encéfalo, de modo que o peso relativo do corpo humano é um pouco maior em
recém‑nascidos do que em adultos.

O cerebelo tem um papel importante no sequenciamento das atividades motoras e na breve


progressão de um movimento para o subsequente. Além disso, auxilia a controlar a interação
momentânea de grupos musculares agonistas e antagonistas, isto é, grupos que agem de forma
coordenada, por exemplo, um se contraindo e o outro relaxando. Cumpre também um papel
fundamental, assessorando o córtex cerebral a coordenar a série de movimentos, planejando o
próximo ato com antecedência de frações de segundo. Além disso, há evidências atuais de que o
cerebelo também estaria envolvido em funções cognitivas e com a emoção.
141
Unidade I

Lembrete

O cerebelo coordena movimentos complexos, além de controlar a


postura e o equilíbrio.

Esse órgão apresenta uma estrutura ímpar, mediana, longitudinal, inferior e de forma alongada, que
se interpõe entre os dois hemisférios cerebelares, chamada de verme. Alguns autores classificam um
verme superior como a discreta saliência longitudinal no meio da face superior do cerebelo. Possui duas
grandes massas laterais que se assemelham aos hemisférios cerebrais e preenchem a fossa cerebelar do
osso occipital, chamadas de hemisférios cerebelares.

Pode‑se dividir o cerebelo em três lobos, de acordo com suas conexões. O lobo anterior, que
se associa à medula espinal e atua nos movimentos grosseiros da cabeça e do corpo, também é
chamado de paleocerebelo. O lobo posterior, que se associa ao neocórtex e controla os movimentos
finos dos membros, também se denomina neocerebelo. Já o lobo flóculo nodular, que se associa
ao sistema vestibular, sendo, portanto, fundamental no controle do equilíbrio e do balanço, é
designado também de arquicerebelo.

A superfície do cerebelo tem dobras e sulcos profundos que sugerem uma árvore em cortes
histológicos. Observa‑se, assim, que o cerebelo é formado de um centro de substância branca, o
corpo medular do cerebelo, donde surgem as lâminas brancas do cerebelo, forradas externamente
por uma fina camada de substância cinzenta, o córtex cerebelar. O corpo medular do cerebelo
com as lâminas brancas que dele surgem, quando observadas em cortes sagitais, recebem o
nome de “árvore da vida”. No século XVIII, o óleo de cedro era usado como bálsamo, e por isso
essa árvore ficou conhecida como árvore da vida. Winslow, em 1740, deu o nome de arbor vitae
cerebelli ao cerebelo.

Leitura obrigatória

Cada hemisfério cerebelar é conectado por vias nervosas especialmente


ao mesmo lado do corpo humano, assim uma lesão em um hemisfério
cerebelar gera sinais e sintomas que limitam o mesmo lado do corpo. Na
Biblioteca Virtual, leia os sinais e os sintomas típicos de disfunção cerebelar;
certamente será de grande valia para sua vida profissional:

SNELL, R. S. O cerebelo e suas conexões. In: ___. Neuroanatomia


clínica. 7. ed. Tradução de Marcio Moacyr de Vasconcelos. Rio de Janeiro:
Guanabara‑Koogan, 2013. Disponível em: <https://online.minhabiblioteca.
com.br/#/books/978‑85‑277‑2451‑7/cfi/6/2[;vnd.vst.idref=capa.html]>.
Acesso em: 10 dez. 2016.

142
ANATOMIA DOS SISTEMAS

2.10 O sistema ventricular

O encéfalo possui cavidades, e o fluido que preenche as “cavernas” e os canais dentro do encéfalo
compõe o sistema ventricular. O fluido que percorre esse sistema é o LCS, o mesmo líquido do
espaço subaracnóideo. O LCS é formado por um tecido especial, os plexos corióideos, localizados
nos ventrículos encefálicos. Ele escorre dos ventrículos pareados do cérebro para uma sequência de
ventrículos não pareados, interconectados no centro do tronco encefálico. Esse líquido sai do sistema
ventricular e adentra o espaço subaracnóideo por meio de pequenos orifícios ou aberturas, perto
do local onde o cerebelo se fixa no tronco encefálico. No espaço subaracnóideo, o LCS é absorvido
pelos vasos por meio de estruturas anatômicas especiais chamadas de granulações aracnóideas – as
granulações de Pacchioni.

O LCS tem três papéis fundamentais:

• Proteção mecânica: o LCS funciona como um meio amortecedor que protege os delicados tecidos
do encéfalo e da medula espinal de cargas que, de outra forma, ocasionariam o impacto dessas
estruturas anatômicas contra as paredes ósseas da cavidade craniana e do canal vertebral. O LCS
também possibilita que o encéfalo “flutue” na cavidade craniana.

• Papel homeostático: o pH do LCS influencia a ventilação pulmonar e o fluxo sanguíneo


encefálico, o que é relevante para a manutenção do controle homeostático para o tecido
encefálico. O LCS também funciona como um sistema de transporte para hormônios
polipeptídicos secretados pelos neurônios hipotalâmicos que atuam em locais longínquos
do encéfalo.

• Circulação: o LCS é um meio para trocas secundárias de nutrientes e excretas entre o sangue e o
tecido encefálico adjacente.

O LCS produzido nos plexos corióideos de cada ventrículo lateral passa para o III ventrículo por
meio de duas aberturas estreitas e ovais, os forames interventriculares. Mais LCS é introduzido
pelo plexo corióideo do teto do III ventrículo, e o fluido então escorre pelo aqueduto do
mesencéfalo, em direção ao IV ventrículo. O plexo corióideo do IV ventrículo colabora com mais
LCS, que entra no espaço subaracnóideo por meio de três aberturas no teto do IV: uma única
abertura mediana e duas aberturas laterais, uma em cada lado. Na sequência, o LCS circula no
canal central da medula espinal e no espaço subaracnóideo que circunda a superfície do encéfalo
e da medula espinal.

Geralmente, o LCS é reabsorvido tão rapidamente quanto é produzido pelos plexos corióideos, a
uma taxa de 20 mℓ/h (480 mℓ/dia). Como as taxas de produção e de reabsorção se equivalem, a pressão
liquórica comumente é constante. Pela mesma razão, o volume do LCS fica constante.

143
Unidade I

Lembrete

O LCS é produzido, a partir do sangue, pelas células ependimárias que


revestem os plexos corióideos dos ventrículos.

2.11 Barreiras encefálicas

O SN apresenta uma série de mecanismos ou táticas que propende a proteger seu parênquima
de avarias e da entrada de substâncias tóxicas e patógenos. Entre essas técnicas, estão as barreiras
encefálicas, que agem como uma barreira física, impossibilitando ou bloqueando a passagem de
substâncias do sangue para o parênquima nervoso (barreira hematoencefálica), do sangue para o LCS
(barreira hematoliquórica) e do LCS para o tecido nervoso (barreira liquor‑encefálica). As barreiras
são relevantes para o controle do microambiente do parênquima nervoso, a estabilidade de íons e a
manutenção do ambiente neuroquímico.

Leitura obrigatória

O que é uma elevação anormal no volume de LCS dentro do crânio?


Descubra sobre essa e outras situações na Biblioteca Virtual:

SNELL, R. S. O sistema ventricular, o líquido cerebrospinal e as


barreiras hematoencefálica e hematoliquórica. In: ___. Neuroanatomia
Clínica. 7. ed. Tradução de Marcio Moacyr de Vasconcelos. Rio de Janeiro:
Guanabara‑Koogan, 2013. Disponível em: <https://online.minhabiblioteca.
com.br/#/books/978‑85‑277‑2451‑7/cfi/6/82!/4/4/2/2/2@0:0>. Acesso
em: 10 dez. 2016.

Indubitavelmente, você irá adquirir informações importantes para o


seu trabalho voltado para a neurologia infantil.

2.12 A nutrição sanguínea do encéfalo

O encéfalo é nutrido por duas artérias carótidas internas e duas vertebrais. As quatro artérias
localizam‑se dentro do espaço subaracnóideo, e seus ramos se anastomosam sobre a face inferior do
encéfalo compondo o círculo arterial do cérebro, também chamado de polígono de Willis.

144
ANATOMIA DOS SISTEMAS

Artéria cerebral anterior


Artéria comunicante
anterior
Artéria
comunicante
posterior

Artéria
cerebral
posterior

Artéria
cerebral
média

Artéria carótida
interna Artéria basilar

Figura 125 – Círculo arterial do cérebro

A artéria carótida interna se inicia na bifurcação da artéria carótida comum, na qual comumente
existe uma dilatação localizada chamada de seio carótico. Ela ascende no pescoço e perfura a base do
crânio atravessando o canal carótico do osso temporal. À vista disso, a artéria prossegue horizontalmente
para a frente através do seio cavernoso e emerge no lado medial do processo clinoide anterior, ao
perfurar a dura‑máter. Agora, ela adentra o espaço subaracnóideo ao penetrar a aracnoide‑máter e
volta‑se posteriormente até a extremidade medial do sulco lateral do cérebro. Aqui, ramifica‑se nas
artérias cerebrais anterior e média.

Artéria
carótida
interna
(parte
cervical)
Artéria
carótida
externa

Artéria tireóidea superior


Artéria carótida comum

Figura 126 – Vista lateral da cabeça e do pescoço

145
Unidade I

A artéria vertebral, ramo da primeira parte da artéria subclávia, sobe no pescoço atravessando
os forames nos processos transversários das vértebras cervicais, adentra o crânio através do forame
magno e penetra a dura‑máter e a aracnoide‑máter para alcançar o espaço subaracnóideo. À vista disso,
prossegue para cima, para a frente e medialmente sobre o bulbo. Na margem inferior da ponte, junta‑se
ao vaso do lado contrário constituindo a artéria basilar.

A artéria basilar, composta pela junção das duas artérias vertebrais, sobe em um sulco na face
anterior da ponte. Na margem superior da ponte, ramifica‑se nas duas artérias cerebrais posteriores.

O círculo arterial do cérebro situa‑se na fossa interpeduncular na base do cérebro e é composto pela
anastomose entre as duas artérias carótidas internas e as duas artérias vertebrais. As artérias comunicante
anterior, cerebrais anteriores, carótidas internas, comunicantes posteriores, cerebrais posteriores e basilar
colaboram para o círculo. O círculo arterial do cérebro possibilita que o sangue nutrido pelas artérias
carótidas internas ou vertebrais seja difundido a qualquer parte dos dois hemisférios cerebrais. Ramos
corticais e centrais originam‑se do polígono e nutrem a substância cerebral.

Variações nos tamanhos das artérias que compõem o círculo arterial do cérebro são frequentes e
expõem‑se à falta de uma ou das duas artérias comunicantes posteriores.

O corpo estriado e a cápsula interna são nutridos especialmente pelos ramos centrais estriados
mediais e laterais da artéria cerebral média; os ramos centrais da artéria cerebral anterior nutrem o
restante dessas estruturas anatômicas. O tálamo é nutrido especialmente por ramos das artérias
comunicante anterior, basilar e cerebral posterior.

O mesencéfalo é nutrido pelas artérias cerebral posterior, cerebelar superior e basilar. A ponte é
nutrida pelas artérias basilar e cerebelares inferior anterior e superior. Já o bulbo, pelas artérias vertebral,
espinais anterior e posterior, cerebelar inferior posterior e basilar. Por fim, o cerebelo, pelas artérias
cerebelares superior, inferior anterior e inferior posterior.

3 SISTEMA NERVOSO AUTÔNOMO

Nossos pensamentos conscientes, planos e atos concebem somente uma pequena fração das
atividades do SN. Se toda a consciência fosse abolida, os processos vitais fisiológicos ainda permaneceriam
praticamente inalterados, como uma noite de sono não é um fato que ameace a vida. Além disso,
profundas condições de inconsciência não são essencialmente mais ameaçadoras, desde que a nutrição
do organismo seja provida.

Indivíduos que sofreram graves traumatismos cranioencefálicos sobreviveram em coma durante


décadas. A sobrevivência nessas conjunturas é provável, porque os ajustes rotineiros nos sistemas
fisiológicos são executados pelo sistema nervoso autônomo (SNA), independentemente de nosso
discernimento consciente. O SNA regula a temperatura corporal e coordena os papéis cardiovasculares,
respiratórios, digestivos, urinários e reprodutores. De tal modo realizando‑o, adequa a água, os eletrólitos,
os nutrientes e as concentrações de gases dissolvidos nos líquidos corporais.

146
ANATOMIA DOS SISTEMAS

A designação SNA foi mencionada no século passado porque os anatomistas que o descreveram
acreditavam que seus elementos funcionassem com certa independência do SNC. Atualmente, sabe‑se
que esse sistema não tem autonomia, portanto outros nomes foram sugeridos: sistema neurovegetativo,
sistema nervoso visceral, vegetativo, autonômico e automático. Nenhum desses termos se revelou
apropriado. A designação “sistema nervoso autônomo”, ainda que incorreta e limitada para exprimir seu
papel, é a mais convencional e radicada. Realmente, como indica o próprio termo autônomo (grego:
autónomos = regido por leis próprias, independente), referente a essa subdivisão motora do SNP ao
apresentar uma certa independência funcional.

Esse tópico estuda a estrutura anatômica e as partes do SNA. Cada parte possui uma organização
anatômica e funcional característica. Nosso estudo sobre o SNA se iniciará com a descrição das
partes simpática e parassimpática. Entretanto, o SNA também abrange uma terceira parte a qual
a maioria dos indivíduos desconhece: o sistema nervoso entérico (SNE) – uma extensa rede de
neurônios e nervos situada nas paredes do trato digestório. Ainda que as atividades do SNE sejam
influenciadas pelas partes simpática e parassimpática, muitos reflexos viscerais complexos podem
ser principiados e coordenados localmente, sem instruções do SNC. Em conjunto, o SNE tem
aproximadamente 100 milhões de neurônios – pelo menos a mesma quantidade que na medula
espinal – e todos os neurotransmissores no encéfalo.

3.1 As diferenças anatômicas, fisiológicas e farmacológicas relevantes entre


as partes simpática e parassimpática do SNA

Com base em suas características anatômicas, funcionais e farmacológicas, o SNA pode ser dividido
em duas partes: simpática e parassimpática. A seguir apontamos algumas dessas diferenças encontradas
no SNA.

3.1.1 Diferenças anatômicas

Essas diferenças dizem respeito, naturalmente, à morfologia, bem como determinam a localização
dos corpos dos neurônios pré e pós‑ganglionares, o tamanho das fibras pré e pós‑ganglionares e a
posição dos gânglios, a saber:

• O corpo do neurônio pré‑ganglionar localiza‑se entre os segmentos T1 e L2 da medula espinal


na parte simpática, enquanto na parte parassimpática localiza‑se no tronco encefálico e entre os
segmentos S1 e S4 da medula espinal.

• O corpo do neurônio pós‑ganglionar localiza‑se nos gânglios paravertebrais e nos gânglios pré‑vertebrais
na parte simpática, enquanto na parte parassimpática localiza‑se nos gânglios parassimpáticos.

• A fibra pré‑ganglionar é curta na parte simpática e longa na parte parassimpática.

• A parte simpática apresenta longas fibras pós‑ganglionares, enquanto a parte parassimpática tem
fibras curtas.

147
Unidade I

• A posição do gânglio é próxima do SNC, na parte simpática, e das vísceras, portanto longe do SNC
na parte parassimpática.

A figura a seguir mostra as diferenças anatômicas entre as partes simpática e parassimpática do SNA.

Parassimpático

Vísceras:

Glândula lacrimal

Simpático

Coração

Parassimpático
Bexiga urinária

Figura 127 – Diferenças anatômicas entre os sistemas nervosos simpático e parassimpático

3.1.2 Diferenças fisiológicas

Essas diferenças dizem respeito, naturalmente, à função. Em geral, as partes simpática e


parassimpática apresentam ações antagônicas. Por exemplo, no coração, o simpático gera a
taquicardia e o parassimpático a bradicardia. Poucas vísceras são inervadas apenas pelo simpático
ou pelo parassimpático.

A parte simpática do sistema desempenha papel difuso no organismo, porque as fibras


pré‑ganglionares compõem sinapses com diversos neurônios pós‑ganglionares e a medula suprarrenal
libera os transmissores simpáticos, como a adrenalina e a noradrenalina, que são distribuídos a todo
o organismo através da corrente sanguínea. A parte parassimpática do SNA apresenta um controle
mais individualizado, porque as fibras pré‑ganglionares realizam sinapses com apenas alguns neurônios
pós‑ganglionares e não há um órgão comparável à medula suprarrenal.

As terminações pós‑ganglionares simpáticas liberam noradrenalina na maioria das terminações e


acetilcolina em algumas terminações, como as glândulas sudoríparas. As terminações pós‑ganglionares
parassimpáticas liberam acetilcolina.

A parte simpática do SNA prepara o organismo para emergências e atividade muscular intensa,
enquanto a parte parassimpática poupa e armazena energia.

148
ANATOMIA DOS SISTEMAS

Lembrete

A parte simpática do SNA: sistema de alerta.

A parte parassimpática do SNA: sistema de equilíbrio visceral.

A fim de promover o aprendizado das diferentes ações desses dois elementos do SNA, pode ser benéfico
pensar que a atividade simpática é máxima em um homem que se encontra em um descampado com
um touro prestes a agredi‑lo. Seus pelos são arrepiados com temor e sua pele empalidece em razão da
vasoconstrição, que redistribui o sangue da pele e das vísceras para o miocárdio e os músculos estriados
esqueléticos. As pálpebras superiores são elevadas e as pupilas se dilatam vastamente para que ele possa
observar em qual direção correr. Sua frequência cardíaca se eleva, bem como a resistência periférica das
arteríolas, o que aumenta a pressão arterial. Os brônquios se dilatam para possibilitar fluxo respiratório
máximo de ar. A atividade peristáltica é inibida e os esfíncteres intestinais são contraídos. O músculo
esfíncter interno da uretra também é contraído – com certeza essa não é a ocasião para urinar ou defecar!
O glicogênio é convertido em glicose para produzir energia e ele sua para reduzir calor corporal.

Figura 128 – Este indivíduo está fazendo hábil utilização da parte simpática do SNA

Lembrete

Geralmente, tanto a parte simpática como a parassimpática apresentam


papéis antagônicos (contrários), ou seja, uma corrige o excesso da outra.

3.1.3 Diferenças farmacológicas

Para que aconteça a transmissão do impulso nervoso das fibras autônomas para as vísceras, deve
existir nesse local a liberação de neurotransmissores, como a noradrenalina (NA) e a acetilcolina (ACh).

Reconhecer as localizações dos subtipos de receptores colinérgicos e adrenérgicos possibilita a prescrição


de fármacos específicos para a aquisição dos efeitos inibitórios ou excitatórios em órgãos‑alvo seletivos.

Por exemplo, a atropina, um fármaco anticolinérgico que bloqueia receptores muscarínicos da ACh, é
rotineiramente administrado antes de cirurgias para prevenir a salivação e diminuir as secreções do sistema
respiratório. Ela também é utilizada pelos oftalmologistas a fim de dilatar as pupilas para exame do olho.
149
Unidade I

O fármaco anticolinesterásico neostigmina inibe a acetilcolinesterase, precavendo, de tal modo, a


quebra enzimática da ACh e possibilitando que ela se acumule nas sinapses. Ele também é utilizado no
tratamento da miastenia grave, uma situação em que a atividade do músculo estriado esquelético está
danificada pela falta de estimulação da ACh.

A NA é um de nossos neurotransmissores da “sensação legal”, e fármacos que estendem a atividade da


NA na membrana pós‑sináptica auxiliam a melhorar a depressão. Os fármacos utilizados no tratamento
de resfriados, tosse, alergias e congestão nasal incluem simpaticomiméticos, como a fenilefrina, que
mimetiza o simpático atuando em receptores α‑adrenérgicos.

Muitas pesquisas farmacêuticas estão voltadas para a obtenção de fármacos que afetam somente
uma subclasse de receptores, e não todo o sistema adrenérgico ou colinérgico. Uma relevante contribuição
foi a descoberta de fármacos que ativam especialmente receptores β2. Indivíduos asmáticos utilizam
esses ativadores β2 para dilatarem seus bronquíolos pulmonares sem a ativação de receptores β1, que
poderiam elevar sua frequência cardíaca. Classes seletivas de fármacos que controlam a atividade do
SNA são mostradas no quadro a seguir.

Quadro 7

Classe do fármaco Receptor a que se liga Efeitos Exemplo Uso clínico


Agentes nicotínicos (pouco Receptores nicotínicos Efeitos característicos de Nicotina. Utilizada em produtos
valor terapêutico, porém da ACh de todos os estimulação simpática, para reduzir a
relevantes em razão de sua neurônios ganglionares ritmo cardíaco irregular, dependência do fumo.
presença no tabaco). e no SNC. pressão sanguínea
elevada.
Agentes Receptores muscarínicos Copia os efeitos da 1‑Pilocarpina; 1‑Glaucoma (drenagem
parassimpaticomiméticos da ACh. ACh, eleva os efeitos do humor aquoso);
(agentes muscarínicos). do SNP. 2‑Betanecol.
2‑Dificuldade para urinar
(eleva a contração da
bexiga urinária).
Inibidores de Nenhum, se liga à Efeito indireto em 1‑Neostigmina; 1‑Miastenia grave (eleva
acetilcolinesterase. enzima (AChE) que todos os receptores da a disponibilidade da ACh);
degrada a ACh. ACh, estende o efeito 2‑Sarin.
da ACh. 2‑Utilizado como arma
química em guerras
(da mesma maneira, é
vastamente utilizado
como inseticida).
Agentes Receptores adrenérgicos. Eleva a atividade 1‑Albuterol 1‑Asma (dilata os
simpaticomiméticos. simpática prática (Ventolin); bronquíolos por se ligar
em consequência aos receptores β2);
da maior liberação 2‑Fenilefrina.
de NA ou de sua 2‑Resfriado
ligação aos receptores (descongestionante
adrenérgicos. nasal, liga‑se aos
receptores α1).
Agentes simpaticolíticos. Receptores adrenérgicos. Reduz a atividade Propranolol. Hipertensão arterial
simpática por (membro de uma classe
bloquear receptores de fármacos designados
adrenérgicos ou inibir de β‑bloqueadores que
a liberação de NA. diminuem a frequência
cardíaca e a pressão
sanguínea).

150
ANATOMIA DOS SISTEMAS

Lembrete

A parte simpática do SNA é noradrenérgica, isto é, ativada pela


noradrenalina, enquanto a parte parassimpática do SNA é colinérgica, ou
seja, ativada pela acetilcolina.

3.2 Papéis do SNA

O SNA e os órgãos endócrinos mantêm a homeostase corporal. O controle endócrino é mais vagaroso
e desempenha sua influência por meio dos hormônios hematogênicos.

Na maior parte do tempo, o SNA funciona no nível subconsciente. Não pressentimos, por exemplo,
que nossas pupilas estão dilatando ou que as nossas artérias estão se constringindo. O sistema não
deve ser notado como uma parte isolada do sistema nervoso, pois é sabido que ele exerce um papel
com as atividades somáticas na expressão das emoções e que diversas atividades autonômicas, como a
micção, podem ser mantidas sob controle voluntário. As atividades do SNA e dos órgãos endócrinos são
integradas dentro do hipotálamo.

As partes simpática e parassimpática do SNA colaboram na manutenção da estabilidade do ambiente


interno. A parte simpática prepara e mobiliza o organismo em uma emergência, quando há atividade
física intensa e súbita, pânico ou ira. Já a parte parassimpática procura manter e armazenar energia,
como no requerimento da digestão e da absorção de alimentos ao elevar as secreções das glândulas do
trato gastrintestinal e ao estimular o peristaltismo, conforme ilustra a figura a seguir.

Figura 129

Nada como uma excelente refeição e uma poltrona aconchegante para facilitar as atividades da
parte parassimpática do SNA.

151
Unidade I

Lembrete

A divisão em sistema nervoso simpático e parassimpático baseia‑se


não apenas nas características anatômicas específicas de cada divisão, mas
também nas funções desempenhadas por elas.

3.3 Reações do SNA

A maior parte dessa fina regulação acontece inconscientemente ou sem nossa atenção. Você pode
sentir quando as suas artérias estão contraindo ou suas pupilas dilatando? Possivelmente, não. Porém,
se já ficou fechado num elevador antes de poder chegar ao banheiro e a sua bexiga urinária resolveu
contrair como se tivesse vontade própria, você teve uma excelente noção dessa atividade. Essas reações,
sendo conscientes ou não, são controladas pelo SNA.

Apresentamos duas condições extremas nas quais uma ou outra parte do SNA domina. Um caminho
mais fácil para rememorar os papéis relevantes das duas partes do SNA é refletir sobre o parassimpático
como a parte do “D”, ou seja, digestão, defecação e diurese (micção) e sobre o simpático como a parte
do “E”, isto é, exercício, excitação, emergência e embaraço. Lembre‑se, todavia, de que, embora seja
mais fácil refletir sobre as duas partes do SNA trabalhando de uma forma “tudo ou nada”, como foi
exibido, isso raramente ocorre. Um antagonismo dinâmico há entre as partes, e adaptações finas estão
ininterruptamente acontecendo nas duas.

As partes simpática e parassimpática do SNA, em geral, cumprem controle antagonista sobre uma
víscera. Entretanto, deve‑se salientar que muitas vísceras não apresentam esse controle dual fino do
SNA. Por exemplo, o músculo liso dos folículos pilosos; o músculo eretor do pelo responde à atividade
simpática com contração e não existe controle parassimpático.

As atividades de algumas vísceras são mantidas sob um estado constante de inibição por um
ou outro elemento do SNA. O coração de um atleta treinado é mantido em frequência baixa pelas
atividades do sistema parassimpático. Isso tem relevância estimável, porque o coração é uma bomba
mais eficaz quando se contrai lentamente do que durante contrações muito velozes, uma vez que
possibilita enchimento diastólico apropriado dos ventrículos.

Sintetizaremos, a seguir, as respostas mais relevantes ocorridas nas duas partes do SNA. Perante o
perigo, a parte simpática estimula “luta ou fuga”. Desse modo, acontecem:

• Produção de energia, deixando o indivíduo extremamente precavido com o objetivo de se proteger,


ao mesmo tempo em que acontece a inibição das funções digestivas, abrangendo a salivação.

• Contração de todos os esfíncteres intestinais e inibição do peristaltismo.

• Contração do esfíncter urinário.

152
ANATOMIA DOS SISTEMAS

• Vasoconstrição periférica, reduzindo o aporte sanguíneo na pele e no trato gastrintestinal. O


sangue é mais dirigido para a musculatura estriada esquelética e também para os pulmões.

• Dilatação dos bronquíolos, nos pulmões, o que permite maior troca gasosa.

• Vasodilatação das artérias coronárias.

• Elevação dos batimentos cardíacos quando estamos com receio, assim como aumento da contração
das células cardíacas – esse é um dos mecanismos que permitem maior aporte sanguíneo para a
musculatura estriada esquelética, como um preparo para a “luta”.

• Dilatação da pupila, quando o indivíduo está com receio e existe o relaxamento do músculo ciliar,
tornando o cristalino mais “raso”, o que permite chegar mais luz à retina.

• Estimulação da sudorese, do orgasmo e da secreção de adrenalina e noradrenalina.

A parte parassimpática, por sua vez, provoca o retorno às funções vegetativas regulares, harmonizando
uma digestão apropriada e sensação de tranquilidade. De tal modo, acontecem:

• Dilatação dos vasos sanguíneos que se dirigem ao trato gastrintestinal, causando, consequentemente,
maior afluxo sanguíneo no sistema digestório, que tem grande demanda metabólica.

• Elevação da secreção das glândulas salivares e aceleração do peristaltismo, o que, em conjunto


com o maior fluxo sanguíneo para o sistema digestório, gera a favorável absorção de nutrientes.

• Constrição dos bronquíolos.

• Controle e regulação dos batimentos cardíacos, especialmente por ramos do X par de nervos
cranianos, o nervo vago.

• Constrição da pupila e “ajuste” do cristalino.

• Contração da bexiga urinária.

• Envolvimento no estímulo do desejo sexual e na ereção dos órgãos genitais.

A figura a seguir representa as ações das partes simpática e parassimpática do SNA.

153
Unidade I

Figura 130 – Resumo de algumas ações do SNA

3.4 Sistema nervoso entérico

O canal alimentar, além de ser inervado pelo SNA e considerado o suprimento nervoso extrínseco,
recebe um suprimento nervoso intrínseco, o sistema nervoso entérico. Esse sistema trabalha sem a
interferência direta do hipotálamo e o restante do SNC, coordenando as complexas funções que ali
acontecem. O SNE, considerado o “cérebro dos intestinos”, situa‑se inteiramente na parede do intestino,
principiando no esôfago e estendendo‑se até o ânus.

Lembrete

O SNE é a parte do sistema nervoso que funciona independentemente


do hipotálamo e do resto do SNC, coordenando as complexas funções que
acontecem no canal alimentar.

Como o SNC, o SNE é formado por neurônios e neuroglias, as neuroglias entéricas, que são
fundamentais para manter a integridade da mucosa intestinal. Ele apresenta um número de neurônios
semelhante ao da medula espinal, calculado em cerca de 100 milhões de neurônios.

Ainda que esse número seja, aproximadamente, mil vezes menor que o do córtex cerebral, o elevado
número de neurônios, por si só, evidencia a relevância desse sistema para a função gastrintestinal. Com essa
quantidade de neurônios, as movimentações e as secreções organizadas pelo SNE são bastante concisas.

Deste modo, o SNE é composto por neurônios motores e sensitivos ligados por interneurônios
organizados em dois circuitos neuronais interconectados: o plexo submucoso, ou de Meissner, e o plexo
mioentérico, ou de Auerbach.

O plexo submucoso localiza‑se na camada submucosa, mais exatamente entre a camada muscular
circular e a mucosa, controlando as secreções gastrintestinais, pois ele inerva as glândulas secretoras, além
do fluxo sanguíneo local. Já o mioentérico, externo em relação ao submucoso, situa‑se entre as camadas
154
ANATOMIA DOS SISTEMAS

musculares longitudinal externa e circular interna controlando as movimentações gastrintestinais, como


a segmentação e o peristaltismo. Por isso o estímulo para que sejam executadas movimentações que
empurrem o conteúdo alimentar para frente, ou seja, o peristaltismo, e misturá‑lo com as enzimas, ou
seja, a segmentação. Portanto, a pressão que é exercida nas paredes do canal alimentar determinará o
tipo de movimento promovido pelo SNE.

Embora o SNE funcione sem a necessidade dos nervos extrínsecos do SNA, as estimulações simpática
e parassimpática podem inibir ou estimular ainda mais as funções gastrintestinais.

A estimulação simpática tende a inibir as secreções e as movimentações peristálticas, e a estimulação


parassimpática aciona as secreções e o peristaltismo.

Para findar, vale relembrar que o SNE não é completamente autônomo. Ele recebe informações
indiretas do encéfalo por meio de axônios das partes simpática e parassimpática, que proveem um
controle extra e podem sobrepor‑se às funções da parte entérica em algumas ocasiões, como em casos
de estresse agudo.

4 SISTEMA NERVOSO PERIFÉRICO

Toda a elegância do encéfalo humano seria infrutífera sem as suas ligações com o mundo exterior.
Pondere uma experiência elucidando essa afirmativa: voluntários de olhos vendados que foram
mantidos erguidos em um tanque de água morna com privação sensorial (uma condição que limita
as aferências sensoriais) tiveram delírios. Um deles via elefantes que eram ora de cor rosa, ora de cor
púrpura. Outro escutava um coro de vozes; outros, ainda, tinham delírios gustatórios. Grande parte
de nossa salubridade está sujeita a um fluxo contínuo de dados do meio externo.

Não menos relevante para nosso conforto são os comandos do SNC emitidos aos músculos estriados
esqueléticos e a outros órgãos efetores do corpo humano, os quais possibilitam que nos mexamos e
zelemos por contentar nossas necessidades. O SNP provê essas ligações entre o mundo exterior e o
nosso corpo. Fibras nervosas brancas cursam cada parte do corpo, permitindo que o SNC receba dados
e realize suas resoluções.

O SNP abrange todas as estruturas neurais que se situam externamente ao encéfalo e à medula
espinal, a saber: os nervos periféricos e seus gânglios agregados, bem como as terminações nervosas.

4.1 Os nervos periféricos

Os nervos são estruturas compostas por feixes de fibras nervosas que se mostram cobertas por um
tecido conjuntivo, o que lhes dá uma coloração clara e serve para ligar a parte do SNC à parte do SNP.

Observação

Os nervos podem ser de dois tipos: cranianos ou espinais.


155
Unidade I

Os 12 pares de nervos cranianos apresentam esse nome, porque se originam do encéfalo, dentro da
cavidade craniana, e passam através de diversos forames do crânio.

Cada nervo craniano possui um número, indicado por um numeral romano, e um nome. Os números
lembram a ordem, de anterior para posterior, na qual os nervos se originam no encéfalo. Os nomes
identificam a distribuição ou o papel dos nervos.

Três nervos cranianos (I, II e VIII) abrangem axônios de neurônios sensitivos e são, assim, chamados
de nervos sensitivos especiais. Na cabeça, eles são peculiares e estão conexos aos sentidos especiais do
olfato, da visão e da audição, concomitantemente. Os corpos celulares da maioria dos nervos sensitivos
estão situados em gânglios localizados fora do encéfalo.

Cinco nervos cranianos (III, IV, VI, XI e XII) são classificados como nervos motores, pois abrangem
somente axônios de neurônios motores quando deixam o tronco encefálico.

Os quatro nervos cranianos (V, VII, IX e X) são nervos mistos, abrangem axônios de neurônios
sensitivos que adentram o encéfalo e neurônios motores que deixam o encéfalo.

Leitura obrigatória

Convidamos você a acessar a Biblioteca Virtual, a identificar os nervos


cranianos pelo seu nome, número e tipo, a relatar o papel de cada um e a
compreender as suas correlações clínicas.

TORTORA, G. J.; DERRICKSON, B. Princípios de anatomia e fisiologia. 14.


ed. Rio de Janeiro: Guanabara‑Koogan, 2016, p. 507‑19. Disponível em:
<https://online.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788527728867/
cfi/6/48!/4/572/2@0:66.6>. Acesso em: 15 dez. 2016.

Lesões na cabeça e choques fortes abalando o encéfalo são eventos frequentes


em acidentes de carro. Os nervos cranianos parecem estar bem resguardados no
lado inferior do encéfalo, porém o encéfalo, mergulhado em LCS, é como um
tronco molhado de água; um golpe no topo da cabeça pode gerar um ricochete
sério do encéfalo no assoalho do crânio. Exames neurológicos habituais abrangem
testes para observar falhas orgânicas dos nervos cranianos.

Pedimos a você que conheça os métodos clínicos mais rotineiramente


utilizados para estabelecer as disfunções dos nervos cranianos. Para isso,
entre na Biblioteca Virtual:

VAN DE GRAAFF, K. M. Anatomia humana. 6. ed. São Paulo: Manole,


2003. p. 413. Disponível em: <https://online.minhabiblioteca.com.br/#/
books/9788520452677/cfi/435!/4/4@0.00:51.7>. Acesso em: 10 dez. 2016.
156
ANATOMIA DOS SISTEMAS

Os 31 pares de nervos espinais – 8 pares de nervos cervicais, 12 torácicos, 5 lombares, 5 sacrais e 1


coccígeo – têm origens na medula espinal e emergem através dos forames intervertebrais. Cada nervo
espinal é composto por fibras sensitivas e motoras, sendo, portanto, todos os pares nervos mistos.

Salvo nos nervos torácicos T2 a T12, os ramos anteriores dos nervos espinais associam‑se entre si e se
separam outra vez como redes de fibras nervosas para compor os plexos nervosos. Existem quatro plexos
de nervos espinais: cervical, braquial, lombar e sacral. Os nervos emergem dos plexos e são denominados
conforme as estruturas que eles inervam ou o trajeto que eles prosseguem.

Leitura obrigatória

Convidamos você a compreender a formação dos plexos nervosos. Para


tanto, acesse a Biblioteca Virtual:

VAN DE GRAAFF, K. M. Anatomia humana. 6. ed. São Paulo: Manole,


2003. p. 415‑25. Disponível em: <https://online.minhabiblioteca.com.br/#/
books/9788520452677/cfi/438!/4/4@0.00:49.8>. Acesso em: 15 dez. 2016.

4.2 Os gânglios

Dividem‑se em gânglios sensitivos dos nervos espinais, ou seja, os gânglios das raízes posteriores e
dos nervos cranianos, e gânglios autonômicos.

Os gânglios sensitivos são tumefações fusiformes localizadas na raiz posterior de cada nervo espinal,
logo proximais à junção da raiz com uma raiz anterior correspondente; são chamados de gânglios das
raízes posteriores. Gânglios idênticos que também são encontrados ao longo do percurso dos nervos
cranianos V, VII, VIII, IX e X são designados como gânglios sensitivos desses nervos.

Figura 131 – Gânglio espinal (apontado pela pinça)

157
Unidade I

Os gânglios autonômicos, muitos dos quais apresentam forma irregular, localizam‑se ao longo do percurso
das fibras nervosas motoras do SNA. São encontrados nas cadeias simpáticas paravertebrais em volta das
raízes das grandes artérias viscerais no abdome, e próximo das paredes de várias vísceras ou encravados nelas.

Observação

A doença herpes‑zóster é uma infecção viral do gânglio espinal, causa


dor e comumente é unilateral. São agrupamentos de vesículas na pele cheias
de líquido dispostas ao longo dos percursos dos nervos sensitivos periféricos
atingidos. A doença se desenvolve em adultos que foram expostos primeiro
ao vírus quando crianças e frequentemente é autolimitante. O tratamento
pode envolver doses altas de drogas antivirais como aciclovir (zovirax).

4.3 As terminações nervosas

Em sua parte distal, os nervos vão entrar em contato com os órgãos periféricos por meio de terminações
nervosas, que podem ser sensoriais ou motoras. As terminações nervosas sensoriais, também chamadas de
receptores sensoriais, serão vulneráveis a determinado tipo de estímulo, a partir do qual desencadearão
o surgimento de impulsos nervosos nas fibras sensitivas ao SNC. Existem, de tal modo, receptores táteis,
térmicos e dolorosos. Do ponto de vista morfológico, os receptores poderão expor‑se como terminações
nervosas livres ou ser envolvidos por cápsulas ou formações de natureza conjuntiva.

As terminações nervosas motoras irão determinar o contato entre as fibras nervosas e os efetuadores,
ou seja, os músculos ou as glândulas. Elas podem ser chamadas de junções neuromusculares ou junções
neuroglandulares. Morfologicamente, essas terminações se semelham às sinapses entre os neurônios,
acontecendo a liberação de um neurotransmissor, que agirá na membrana do efetuador.
Pressão: Vater-Pacini Meissner

Terminações livres Ruffini Krause

Fuso neuromuscular Terminação tendínea


propriorreceptor propriorreceptora

Figura 132 – Terminações nervosas sensoriais, como observadas ao microscópio óptico

158
ANATOMIA DOS SISTEMAS

Resumo
Vimos nesta unidade que o SNC é formado pelo encéfalo e pela
medula espinal e apresenta substâncias cinzenta e branca. Está
envolvido por meninges e banhado em LCS. A dura‑máter é a meninge
mais externa, espessa e em contato íntimo com o tecido ósseo. A
aracnoide‑máter é uma meninge em forma de rede que envolve o
espaço subaracnóideo, que contém LCS. A delgada pia‑máter junta em
todo o contorno do SNC. Os ventrículos laterais (I e II), bem como o III e
o IV ventrículos, são cavidades interligadas no interior do encéfalo que
são sucessivas com o canal central da medula espinal. Essas cavidades
são cheias de LCS, que compõe‑se ininterruptamente pelos plexos
corióideos a partir do plasma sanguíneo, sendo reabsorvido para o
sangue pelas granulações aracnóideas.

Os neurônios são as unidades fundamentais estruturais e funcionais


do SN, e células especializadas, chamadas neuroglias, oferecem suporte
estrutural e funcional para as suas atividades. Um neurônio apresenta
dendritos, um corpo celular e um axônio. Há vários tipos de neuroglias, como
os oligodendrócitos, as micróglias, os astrócitos e as células ependimárias
– encontradas no SNC – e as células de Schwann – encontradas no SNP.

O cérebro, consistindo de dois hemisférios convolutos, relaciona‑se com


as funções mais elevadas do encéfalo. O córtex cerebral possui circunvoluções
com giros e sulcos. Cada hemisfério cerebral apresenta os lobos frontal, parietal,
temporal e occipital. O lobo da ínsula localiza‑se profundamente no interior do
cérebro e não pode ser observado externamente. Os núcleos da base são massas
especializadas de substância cinzenta encontradas no interior da substância
branca do cérebro. O diencéfalo é composto de tálamo, hipotálamo, epitálamo e
subtálamo. O tronco encefálico é dividido em três partes: o mesencéfalo, a ponte
e o bulbo. O mesencéfalo apresenta os corpos quadrigêmeos e os pedúnculos
cerebrais. A ponte consiste em tratos de fibras que comunicam o cerebelo e o
bulbo com outras estruturas do encéfalo. O bulbo, que conecta o encéfalo à
medula espinal, é composto de tratos ascendentes e descendentes da medula
espinal. O cerebelo, outra parte do encéfalo, é formado por dois hemisférios
unidos pelo verme e sustentado por três pares de pedúnculos cerebelares.

A medula espinal é caracterizada por uma intumescência cervical, uma


intumescência lombossacral e dois sulcos longitudinais, que a dividem
parcialmente em metades direita e esquerda. Tratos espinais ascendentes
e descendentes da medula espinal são chamados de funículos. O sangue
arterial atinge o encéfalo por meio das artérias carótidas internas e das
artérias vertebrais.
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Unidade I

O SNP é composto de gânglios, terminações nervosas e nervos, divididos


em dois tipos: cranianos e espinais. Os 12 pares de nervos cranianos estão
conexos com o encéfalo e os 31 pares de nervos espinais estão ligados com
a medula espinal.

O SNA, uma divisão funcional do SN, é composto de partes do SNC e


partes do SNP. Músculo liso, músculo estriado cardíaco e glândulas recebem
inervação autônoma.

Exercícios

Questão 1. A região do encéfalo, indicada pelo número 1 na figura a seguir, é responsável por
captar mensagens enviadas dos órgãos dos sentidos e transmiti-las às regiões do cérebro onde
serão processadas.

Marque corretamente a alternativa que indica o nome dessa parte do encéfalo.

A) Tálamo.

B) Hipotálamo.

C) Ponte.

D) Bulbo.

E) Cerebelo.

Resposta correta: alternativa A.

160
ANATOMIA DOS SISTEMAS

Análise das alternativas

A) Alternativa correta.

Justificativa: o tálamo é encontrado em uma região na base do cérebro e está relacionado com a
captação de informações provenientes dos órgãos dos sentidos e seu direcionamento à parte do cérebro
que irá processá-la.

B) Alternativa incorreta.

Justificativa: o hipotálamo é uma região do encéfalo dos mamíferos, localizado abaixo do tálamo
e acima da hipófise (no interior central dos dois hemisférios cerebrais). Ele é uma pequena parte do
diencéfalo, sendo considerado uma das mais importantes estruturas do sistema nervoso central.

C) Alternativa incorreta.

Justificativa: a ponte (também chamada de protuberância, protuberância anelar ou ponte de Varólio)


é uma estrutura pertencente ao tronco cerebral. A ponte pertence ao rombencéfalo. Nasce da porção
anterior do metencéfalo, recebendo ainda uma contribuição da porção alar do mielencéfalo.

D) Alternativa incorreta.

Justificativa: é a porção inferior do tronco encefálico, juntamente com outros órgãos, como o
mesencéfalo e a ponte, que estabelece comunicação entre o cérebro e a medula espinhal. A forma do
bulbo lembra um cone cortado, no qual a substância branca é externa e a cinzenta, interna. É um órgão
condutor de impulsos nervosos.

E) Alternativa incorreta.

Justificativa: o cerebelo é a parte do encéfalo responsável pela manutenção do equilíbrio, pelo controle
do tônus muscular, dos movimentos voluntários, e aprendizagem motora. Dependemos do cerebelo para
andar, correr, pular, andar de bicicleta, entre outras atividades. É formado por dois hemisférios – os
hemisférios cerebelares – e por uma parte central, chamada de Vermis. O termo “cerebelo” deriva do
latim e significa “pequeno cérebro”.

Questão 2. Funcionalmente, o tronco encefálico serve para conduzir os tratos do cérebro para a
periferia como também da periferia para a porção central do sistema nervoso central; o tronco possui
diversos núcleos (acúmulos de neurônios), sendo responsáveis por controles sofisticados ditos reflexos,
como respiração, frequência cardíaca, tônus vascular, tônus intestinal e vesical, entre outros. Podemos
atribuir ao tronco cerebral o controle de várias funções, exceto:

A) Crescimento.

B) Equilíbrio.
161
Unidade I

C) Respiração.

D) Cardiovascular.

E) Gastrointestinal.

Resolução desta questão na plataforma.

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