Você está na página 1de 148

Revisão técnica

Gustavo da Silva Santanna


Graduado em Direito
Especialista em Direito Ambiental Nacional
e Internacional e em Direito Público
Mestre em Direito
Professor em cursos de graduação e pós-graduação em Direito

S281C Scalabrin, Felipe


Ciência política e teoria geral do estado [recurso
eletrônico] / Felipe Scalabrin, Débora Sinflorio da Silva M elo;
(revisão técnica: Gustavo da Silva Santanna]. - Porto Alegre:
SAGAH, 2017.

ISBN 978-85-9502-189-1

1. Formas de organização política. 2. Estado. 3. Ciência


política. 4. Teoria geral do estado. I. Melo, Débora Sinflorio
da Silva. II. Título.

CDU 321.01
V________________________________ J
Catalogação na publicação: Ana Paula M. Magnus - CRB 10/2052
CIÊNCIA POLÍTICA
E TEORIA GERAL
DO ESTADO

Débora Sinflorio da Silva Melo


Graduada em Direito
Mestre em Corrupção e Estado de Direito

Felipe Scalabrin
Mestre em Direito Público
Membro do Grupo de Pesquisas "O processo civil contemporâneo: do Estado
Liberal ao Estado Democrático de Direito" (CNPQ)
Professor de programa de pós-gradução em Direito

2017

s a
SOLUÇÕES
G a EDUCACIONAIS
INTEGRADAS

H
© SAGAH EDUCAÇÃO S.A., 2017

Gerente editorial: Arysinha Affonso

Colaboraram nesta edição:


Editora: Maria Eduarda Fett Tabajara
Preparação de originais: Carla Paludo
Editoração: Kaéle Finalizando Ideias

s----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- \
Importante
Os links para sites da web fornecidos neste livro foram todos testados, e seu funciona­
mento foi comprovado no momento da publicação do material. No entanto, a rede
é extremamente dinâmica; suas páginas estão constantemente mudando de local
e conteúdo. Assim, os editores declaram não ter qualquer responsabilidade sobre
qualidade, precisão ou integralidade das informações referidas em tais links.
V _________________________________________________________________________________________________>

Reservados todos os direitos de publicação à


SAGAH EDUCAÇÃO S.A., uma empresa do GRUPO A EDUCAÇÃO S.A.

Av. Jerónimo de Ornelas, 670 - Santana


90040-340 Porto Alegre RS
Fone: (51) 3027-7000 Fax: (51) 3027-7070

São Paulo
Rua Doutor Cesário Mota Jr., 63 - Vila Buarque
01221-020 São Paulo SP
Fone: (11) 3221-9033

SAC 0800 703-3444 - www.grupoa.com.br

É proibida a duplicação ou reprodução deste volume, no todo ou em parte,


sob quaisquer formas ou por quaisquer meios (eletrônico, mecânico, gravação,
fotocópia, distribuição na Web e outros), sem permissão expressa da Editora.
Unidade 1

C iê n cia p o lítica e te o ria g e ral d o E s t a d o ..............................................................7


Considerações iniciais______ ____________________________________________ ____ ____ 7
Conceitos fundamentais............................................................................................................ 10
Importância da disciplina......................... ............................... ................................... ............. 12

Da s o c ie d a d e ............................................................................................. ............................... 14
Origens da sociedade................................................................................................................. 14
Poder social e sociedades políticas.................... ................................... .................. ............ 18
Sociedades políticas....................................................................................................................23

O rig e m d o E s ta d o .................................................................................. ..............................25


Estado como sociedade política..... ................... ................................... .................. .............25

E le m e n to s c o n stitu tiv o s do E s t a d o ......................................................................... 33


O Estado e os seus elementos.................................................................-.............................. 33

Unidade 2

A e v o lu ç ã o d o E s t a d o ........................................................................................................ 45
Tipos históricos de Estado________________________ ___ ______________ ___ ____ ___ 45

O p o d e r d o E sta d o : fin a lid a d e s e fu n ç õ e s d o E s t a d o ............................... 53


O advento do Estado contemporâneo..................................................................... .......... 53
O poder do Estado_____________________________________________________ ____ ___ 55
As finalidades e funções do Estado..-__ ______________________________________ ___—57

O E sta d o na o rd e m in te rn a c io n a l............................................................................6 4
Soberania no âmbito internacional........................................................................................ 64

E sta d o e d e m o c r a c ia ...........................................................................................................75
A democracia do passado_______________________________________________________ 75

Unidade 3

O su frá g io e siste m a s e le ito ra is .................................................................................. 86


Sufrágio.......................................................................................................................................... 86
Dos sistemas eleitorais__________________________________________________________ 90
Da importância dos partidos políticos........................................................ ........................93
Sumário

Fo rm as d e g o v e rn o ............................................................................................................. 96
Formas de governo_____________________________________________________________ 96
Governo e separação de poderes_______________________________________________ 99

S iste m a s d e g o v e rn o ........................................................................................................ 104


Dos sistemas de governo______________________________________________________ 104
Presidencialismo.......... ............. .... ................................................................................ .........105
Parlamentarismo_________________________________________ _____________________ 107

O E sta d o c o n s titu c io n a l.................................................................................................. 111


Dos Estados modernos________________________________________________________ 111
Influência da Declaração de Direitos do Homem e do Cidadão de 1789....... .......... 114
Formas de Estado............... .................... ....................... ...... ........... ............. ....................... 115

U nidade 4

O E sta d o d e D ire ito ............................................................................................................. 118


Dos elementos do Estado de Direito...................................... ............................................ 118
Fases do Estado de Direito em paralelo aos direitos fundamentais........................... 121
Estado de Direito e democracia_____________ ___________________________________ 123

A re la ç ã o e n tre E sta d o e e c o n o m ia ......................................................................126


Do capitalismo ao Estado moderno................................. .................. ...... ......... ...............126
Estado social e socialismo_____________ ____ _________________________ __ _______ 128

E sta d o s e g ru p o s s o c ia is ................................................................................................133
Da importância da opinião pública para
o Estado democrático de Direito atual____ ___________________________________ 133
Vinculaçãoda sociedade de massa
e a opinião pública............. ..... ........... .................. ............................ ............................. 135
Influência midiática na opinião pública.................. .............. .......... ........... ....................137

O fu tu ro d o E s ta d o ............................................................. ............................................. 141


Crise: o mundo em colapso____________________ ________________________________141
Estratégias de superação das crises
financeiras estatais__________________________________________________________ 143
UNIDADE

Ciência política e teoria


geral do Estado
/------------------ Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

■ Apresentar os conceitos básicos da disciplina.


■ Contrastar teoria do geral do estado e ciência política.
■ Reconhecer a importância do estudo da disciplina.

Introdução-------------------------------------- s
A ciência política e a teoria geral do Estado são disciplinas diretamente
relacionadas com a organização da vida em sociedade. Apresentam-se
como fonte indispensável para a compreensão das relações de poder
e da atuação do Estado ao tratarem de temas relevantes como poder
político, direitos políticos, democracia, legitimidade do poder, formas de
governo, sistemas de governo e funções do Estado.
Neste capítulo, você verá os conceitos básicos que orientam a disci­
plina, com a diferenciação entre ciência política e teoria geral do Estado,
e, ao final, identificará a importância prática e teórica do estudo.

Considerações iniciais
N à o é n o v a a id e ia s e g u n d o a q u a l o h o m e m s o m e n t e p o d e s e r c o m p r e e n d id o a

p a r t i r d a s u a in s e r ç ã o n a v i d a e m s o c ie d a d e . D e f a t o , o s e r h u m a n o é a g r e g a d o r

e d e p e n d e , p e la s u a p r ó p r i a e s s ê n c i a , d a a p r o x i m a ç ã o c o m o o u t r o . C o n f o r m e

A r is t ó t e le s , o h o m e m é u m s e r p o lít ic o . E m p a r a le lo , a c o n d iç ã o h u m a n a

t a m b é m t r a z u m a c o n s t a n t e a u t o r r e f l e x ã o : o h o m e m b u s c a c o n h e c im e n t o e

a p r o f u n d a m e n t o d a s e s t r u t u r a s q u e lh e s ã o a p r e s e n t a d a s . E n e s s a l i n h a d e
Ciência política e teoria geral do Estado
-

r a c io c ín io q u e se v e r if ic a a p re s e n ç a , d e s d e p r is c a s e r a s , d e u m p e n s a m e n to

c i e n t í f i c o . A c i ê n c i a s u r g e ju s t a m e n t e c o m o u m f e n ô m e n o d e a n á l i s e d a s r e l a ­

ç õ e s d e c a u s a e e f e it o , n a t e n t a t iv a d e s i s t e m a t i z a r e o r g a n i z a r o c o n h e c im e n t o

a d q u i r i d o . C o m a v i d a e m s o c i e d a d e , n ã o é d if e r e n t e .

O e s t u d o d a o r g a n i z a ç ã o p o lí t i c a e d o s c o m p o r t a m e n t o s p o lí t i c o s d a s o c i e ­

d a d e é d e s t in a d o à c i ê n c i a p o l í t i c a e n q u a n t o d i s c i p l i n a d o s a b e r . J á o e s t u d o

d o E s t a d o , e n q u a n t o o r g a n i z a ç ã o j u r í d i c a d a s o c ie d a d e , é d e s t in a d o à t e o r ia

g e ra l d o E s t a d o ( D A L L A R 1 , 2 0 1 3 ).

S o b a p e r s p e c t iv a d a c iê n c ia p o l í t i c a , r e le v a n t e s a s p e c to s d a v id a e m

s o c ie d a d e s ã o o b je t o d e r e f l e x ã o e c o m p r e e n d e m a s d e f i n i ç õ e s b á s i c a s d a s

in s t it u iç õ e s s o c ia is e o s e u p r ó p r io fu n c io n a m e n t o . N ã o é p o r o u tra r a z ã o

q u e o e s t u d o d a c i ê n c i a p o l í t i c a e n v o lv e t e m a s d e l i c a d o s , c o m o p o d e r p o l í ­

t i c o , d ir e i t o s p o l í t i c o s , d e m o c r a c i a , le g it im id a d e d o p o d e r , E s t a d o e g o v e r n o

( M O R A I S ; S T R E C K , 2 0 1 0 ).

S o b o e n f o q u e d a t e o r i a g e r a l d o E s t a d o , t a n t o s o u t r o s im p o r t a n t e s t e m a s

s ã o p o n t o s d e q u e s t io n a m e n t o e a b r a n g e m n ã o a p e n a s a d e f i n i ç ã o d e E s t a d o ,

m a s t a m b é m a s s u a s o r ig e n s , o s s e u s f u n d a m e n t o s e a s s u a s f i n a l i d a d e s . P o r

e s s a r a z ã o , o e s t u d o d a t e o r ia g e r a l d o E s t a d o n à o d e s c o n s id e r a a lg u m a s

c a t e g o r ia s e s s e n c i a i s , c o m o a s f o r m a s d e E s t a d o , a s f o r m a s d e g o v e r n o , o s

s is t e m a s d e g o v e r n o e a s f u n ç õ e s d o E s t a d o .

A l é m d i s s o , c o n s id e r a m o s a p o s s i b i l i d a d e d e d if e r e n t e s e n f o q u e s p a r a o

e s t u d o . S u r g e m , a s s i m , a s p e r s p e c t i v a s f i l o s ó f i c a , s o c i o ló g i c a e j u r í d i c a . S o b

o p r i s m a f ilo s ó f i c o , b u s c a m o s o s fu n d a m e n t o s d o E s t a d o e d a s o c ie d a d e ,

is t o é , a s u a j u s t i f i c a t i v a t e ó r i c a . S o b o p r i s m a s o c i o l ó g i c o , i d e n t i f i c a m o s o s

f a t o s c o n c r e t o s q u e r e v e la m a p r á t ic a s o c i a l n a i n d i s s o c i á v e l r e la ç ã o e x i s t e n t e

e n t r e o E s t a d o e a s c o n d ic i o n a n t e s s o c i a i s e x i s t e n t e s . P o r f i m , n a p e r s p e c t i v a

j u r í d i c a , p re te n d e m o s e v id e n c ia r a o r g a n iz a ç ã o e p e r s o n if ic a ç ã o d o E s t a d o

p o r m e io d o c o r p o n o r m a t iv o q u e o c o m p õ e ( D A L L A R I , 2 0 1 3 ) . N o á p ic e d e s s a

ú l t i m a f o r m u l a ç ã o , d e v e m o s c i t a r H a n s K e l s e n , p a r a q u e m o E s t a d o s e s it u a

n o p la n o d o d e v e r - s e r (sollen) ( D A L L A R I , 2 0 1 3 ).

A e s s e r e s p e i t o , c o n f i r a a p o s iç ã o d e M a x W e b e r ( a p u d B O N A V I D E S ,

2 0 0 9 , p. 4 2 ):

Com efeito, na sociologia política de Max Weber, abre-se o capítulo de fecundos


estudos pertinentes à política científica, à racionalização do poder, à legitim a­
ção das bases sociais em que o poder repousa, inquire-se ali da influência e
da natureza do aparelho burocrático; investiga-se o regime político, a essência
dos partidos, sua o rganização, sua técnica de com bate e proselitism o, sua
liderança, seus program as; interrogam -se as form as legítim as de autoridade,
com o autoridade legal, tradicional e carism ática; indaga-se da adm inistração
Ciência política e teoria geral do Estado

pública, com o nela influem os atos legislativos, ou com a força dos parla­
m entos, sob a égide de grupos socioeconóm icos poderosíssim os, em presta à
dem ocracia algum as de suas peculiaridades m ais flagrantes.

Fique atento

O componente humano presente na disciplina conjugada de ciência política e teoria


geral do Estado provoca uma compreensão que transborda a perspectiva meramente
jurídica ou sociológica. De fato, entender as relações entre o indivíduo e o Estado é
aceitar uma complexidade interdisciplinar: somente se apreende o todo se forem
considerados fatores históricos, económicos, filosóficos e, até mesmo, psicológicos
(MORAIS, 2010).

O a s p e c t o t e m p o r a l t a m b é m i n f l u e n c i a s o b r e m a n e ir a o e s t u d o d a d i s c i ­

p l i n a . A s s i m , a l g u m a s c a t e g o r ia s c o n c e i t u a d a s d e d e t e r m in a d a f o r m a h o je

p o d e r ã o n ã o m a is t e r a m e s m a d e f i n i ç ã o a m a n h ã . E s s a , a l i á s , é c o n s id e r a d a

u m a d a s g r a n d e s d i f i c u l d a d e s d o p e n s a m e n t o c i e n t í f i c o . C o n f i r a , a p r o p ó s it o ,

o p e n s a m e n t o d e P a u lo B o n a v i d e s ( 2 0 0 9 , p . 3 9 ) :

M as se o oxigênio, enxofre e o hidrogênio “se com portam da mesm a m aneira


na Europa, na A ustrália ou em Sirius”, se qualquer mudança na composição do
elem ento quím ico encontra no cientista condições fáceis e seguras de exame
e esclarecim ento, o mesm o não se dá com o fenôm eno social e político. Fica
este sujeito a im perceptíveis variações, de um para outro país, até mesm o na
prática do m esm o regim e; ou de um a outro século, de um a a outra geração.

P o r t a is r a z õ e s , c o m p r e e n d e r a c i ê n c ia p o lí t i c a e a t e o r ia g e r a l d o E s t a d o n a

a t u a lid a d e é t a m b é m c o n s id e r a r o s m o v im e n t o s a t u a is d e c r í t i c a e r e o r g a n iz a ç ã o

d a e s t r u t u r a l e s t a t a l, n o t a d a m e n t e c m r a z ã o d a r e a v a lia ç ã o d a p o s iç ã o d o E s t a d o

f r e n t e à s o c ie d a d e e d a d in â m i c a d a g lo b a li z a ç ã o ( C H E V A L L I E R , 2 0 0 9 ) . N à o

s e p o d e d e s c o n s id e r a r , t a m b é m , a c h a m a d a c r i s e d o E s t a d o c o n t e m p o r â n e o ,

q u e c o lo c a e m c h e q u e a d e f i n i ç ã o t r a d ic io n a l e o p a p e l d o e n t e e s t a t a l. B a s t a

c o n s id e r a r , c o m o e x e m p lo d e s s a c r i s e , a q u e s t ã o d o e s p a ç o g e o g r á f ic o d o E s t a d o :

As fronteiras, físicas e simbólicas, que delimitavam a esfera de influência, o es­


paço de dominação do Kstado, tornaram -se porosas: os Kstados são atravessados
por fluxos de todas as ordens, que eles são incapazes de controlar, de canalizar
e, se necessário, conter; já não tendo controle sob as variantes essenciais que
com andam o desenvolvimento econôm ico e social, a sua capacidade de regu­
lação tornou-se, concom itantem ente, aleatória (CHBVAM.IHR, 2009, p. 32).
Ciência política e teoria geral do Estado
-

Conceitos fundamentais
A s e g u i r , v o c ê i d e n t i f i c a r á o s c o n c e it o s d e c i ê n c i a p o l í t i c a e t e o r i a g e r a l d o

E s t a d o e c o n h e c e r á s u a s d if e r e n ç a s e s e m e lh a n ç a s .

Ciência política

A p o lít ic a , e n q u a n to p r á t ic a h u m a n a r e la c io n a d a c o m a n o ç ã o d e p o d e r, é o b je to d e

d e b a te e r e f le x ã o d e s d e o p a s s a d o lo n g ín q u o . D e s s a f o r m a , m u it a s o b r a s c lá s s ic a s

s ã o r e f e r ê n c ia a té h o je , c o m r e le v â n c ia p a r a P la t ã o , A r is t ó t e l e s , N ic o la u M a q u ia -

v e l , T h o m a s H o b b e s , J o h n L o c k e , A l e x i s d e T o c q u e v il le , R o u s s e a u , K a r l M a r x ,

G e o r g e B u r d e a u , e n t r e t a n to s o u t r o s . A p a la v r a r e m o n t a à n o ç à o g r e g a d e pólis.
S o b r e o c o n c e it o d e c i ê n c i a p o l í t i c a , D a l m o D a l l a r i ( 2 0 1 3 , p . 1 7 ) d e s t a c a

q u e e la “ f a z o e s t u d o d a o r g a n i z a ç ã o p o l í t i c a e d o s c o m p o r t a m e n t o s p o l í t i c o s ,

t r a t a n d o d e s s a t e m á t ic a à lu z d a T e o r i a P o l í t i c a , s e m l e v a r e m c o n t a o s e le m e n ­

t o s j u r í d i c o s ” . E s s a d e f i n i ç ã o c o n s id e r a q u e o e le m e n t o c e n t r a l d o e s t u d o é a

p o l í t i c a e , p o r e s s a r a z ã o , d e s á g u a n a n o ç ã o d e p o d e r C o m e f e it o , a c i ê n c i a

p o lí t i c a é c e n t r a d a n o e s t u d o d o p o d e r e , p o r t a n t o , d a a u t o r id a d e ( D U V E R G E R

a p u d D I A S , 2 0 1 3 , p . 9 ) . E m s ín t e s e , o o b je t o d a c i ê n c i a p o l í t i c a é o p o d e r .

P a r a m e lh o r e s t u d a r o s e u o b je t o , é p o s s í v e l i d e n t i f i c a r q u a t r o c a m p o s d e

a t u a ç ã o d a c ie n c ia p o lít ic a ( D I A S , 2 0 1 3 ):

■ a s i n s t i t u i ç õ e s e m q u e a t u a m o s s u je i t o s , c o m o o E s t a d o e o g o v e r n o ;

■ o s r e c u r s o s u t i l i z a d o s , c o m o a i n f l u ê n c i a e a a u t o r id a d e ;

■ o s m e io s p a r a a f o r m u la ç ã o d e d e c is õ e s p o l í t i c a s (decision-making)\
■ a s f u n ç õ e s d e s e m p e n h a d a s , c o m o a s o lu ç ã o c o n s e n s u a l d e c o n f l i t o s e

a im p o s i ç ã o d c d e c is õ e s p e lo s a t o r e s d o t a d a s d e a u t o r id a d e .

Teoria geral do Estado

O E s t a d o , e n q u a n t o o r g a n i z a ç ã o p o l í t i c a d a s o c ie d a d e ( e m d e t e r m in a d a b a s e

t e r r i t o r i a l e q u a l i f i c a d a p e lo p o d e r p o l í t i c o ) , t a m b é m é o b je t o d e in t e n s o d e ­

b a t e . A l i á s , a p e s a r d e s s a d e f in iç ã o i n i c i a l , o c o n c e i t o d e E s t a d o é p o lê m ic o

e m u lt if a c e t a d o , s e m p r e d e p e n d e n te d a p e r s p e c t iv a d e e x a m e ( D A L L A R I ,

2 0 1 3 ). S o b o e n fo q u e j u r í d i c o , s e g u r a m e n t e h a v e r á d e f in iç ã o d if e r e n t e d a

p e r s p e c t iv a m e r a m e n t e s o c i o ló g i c a d e E s t a d o .

A t e o r i a g e r a l d o E s t a d o s e d e d ic a “ a o e s t u d o d o E s t a d o s o b t o d o s o s a s ­

p e c to s , in c lu in d o a o r ig e m , a o r g a n iz a ç ã o , o fu n c io n a m e n t o e a s f in a lid a d e s ,

c o m p r e e n d e n d o - s e n o s e u â m b it o t u d o o q u e s e c o n s id e r e e x i s t i n d o n o E s t a d o
Ciência política e teoria geral do Estado

e i n f l u i n d o s o b r e e le ” ( D A L L A R I , 2 0 1 3 , p . 1 8 ). E e v i d e n t e , c o m i s s o , q u e o

e s t u d o d o E s t a d o t a m b é m d i z r e s p e it o à s c o n d iç õ e s d e p o s s i b ili d a d e d e s u a

c o m p re e n s ã o ( M O R A I S , 2 0 1 0 ).

Em te r m o s p r á t ic o s , a s q u e s tõ e s a b o rd a d a s n a t e o r ia g e r a l d o E s t a d o j á

e r a m t r a t a d a s p e lo s a u t o r e s c l á s s i c o s d a c i ê n c i a p o l í t i c a . A s i s t e m a t i z a ç ã o ,

c o m o d i s c i p l i n a a u t ô n o m a , d e v e u - s e p r i n c i p a lm e n t e à d o u t r i n a a le m ã d o f i n a l

d o s é c u lo X I X e i n í c i o d o s é c u lo X X , n o t a d a m e n t e c o m G e o r g J e l l i n e k e a

s u a t e o r ia g e r a l d o E s t a d o (Allgemeine Staatslehre, 1 9 1 1 ).

Diferenças e semelhanças

A p r e s e n t a d a s a s d e f in iç õ e s d e c i ê n c ia p o lí t i c a e t e o r ia g e r a l d o E s t a d o , v e r i f i c a ­

m o s , c o m c la r e z a , q u e a s d is c ip lin a s n à o se c o n fu n d e m . E n q u a n to a p r im e ir a d iz

r e s p e it o à s r e la ç õ e s d e p o d e r , a s e g u n d a d i z r e s p e it o à s r e la ç õ e s c o m o E s t a d o . E

c e r t o , p o r o u t r o la d o , q u e “ n à o h á p o s s ib ilid a d e d e d e s e n v o lv e r q u a lq u e r e s t u d o o u

p e s q u is a d e C i ê n c i a P o l ít ic a s e m c o n s id e r a r o E s t a d o ” ( D A L L A R I , 2 0 1 3 , p . 1 7 ).

A c i ê n c i a p o l í t i c a , c o m e f e it o , é d i s c i p l i n a m a i s a m p la e d a q u a l a t e o r i a

g e r a l d o E s t a d o f a z p a r t e . E s s a , a l i á s , é a c o n c e p ç ã o d e H e r m a n H e l l e r (a p u d

D I A S , 2 0 1 3 ) , q u e j á a p o n t a v a a d if ic u ld a d e e m d if e r e n c i a r a m b o s o s fe n ô m e n o s .

D e t o d o m o d o , p a r a e le , h á u m a d e p e n d ê n c ia r e c í p r o c a e n t r e a m b a s : a t e o r ia

g e r a l d o E s t a d o é ta m b é m p re s s u p o s to d a c iê n c ia p o lít ic a .
*

H á , p o r o u tro , u m a in e v it á v e l a p r o x im a ç ã o e n tre a m b a s . E q u e a s d u a s se

d e b r u ç a m s o b re a c o n v iv ê n c ia h u m a n a , o E s t a d o e a p o lít ic a :

[...] nào som ente para saber com o se constituem , nem som ente no sentido de
um a obra de arte ou de um a teoria da constituição, mas, em últim a instância,
no sentido de que constituem um a ciência da ordem. Têm um a tarefa com um ,
pois têm que responderá velha queslâo de com o nós, seres humanos, podemos
chegar a ter um a vida racional c boa (D IAS, 2013, p. 14).
Ciência política e teoria geral do Estado
-

Importância da disciplina
V a r i a d a s r a z õ e s j u s t i f i c a m o e s t u d o d a c i ê n c i a p o l í t i c a e d a t e o r ia g e r a l d o

E s t a d o . C o m e f e it o , a d i s c i p l i n a t e m r e l e v o j u r í d i c o e , n a p e n a d e D a l m o d e

A b r e u D a l l a r i , p o d e m s e r id e n t if ic a d a s t r ê s r a z õ e s p a r a s e c o n s id e r a r a m a t é r ia

im p o r t a n t e ( D A L L A R I , 2 0 1 3 ) .

A p r i m e i r a r a z ã o é d e c o n s c i ê n c i a : q u e m v i v e e m s o c ie d a d e p r e c is a s a b e r a

s u a o r g a n iz a ç ã o e o p a p e l q u e d e v e c u m p r i r , s o b p e n a d e s e t o r n a r u m a u t ô m a t o

d e s p id o d e i n t e le c t u a l id a d e e s e m v o n t a d e p r ó p r i a .

A s e g u n d a r a z ã o é d e o r d e m c r í t i c a . A s s i m , d e v e m s e r c o n h e c id a s a s

f o r m a s e o s m é t o d o s p e lo s q u a i s o s p r o b le m a s s o c i a i s s e r ã o c o n h e c i d o s e

a s s o lu ç õ e s p r o p o s t a s p a r a q u e s e “ e v i t e o e r r o d e p r e t e n d e r o t r a n s p la n t e ,

p u r o e s i m p l e s , d e f ó r m u l a s im p o r t a d a s , o u a a p l i c a ç ã o s i m p l i s t a d e id e ia s

c o n s a g r a d a s , s e m a n e c e s s á r ia a d e q u a ç ã o à s e x ig ê n c ia s e p o s s ib ilid a d e s d a

r e a li d a d e s o c i a l ” ( D A L L A R I , 2 0 1 3 , p . 1 3 ).

A t e r c e ir a r a z ã o é d e o r d e m p r á t i c a . Is s o p o rq u e a c iê n c ia p o lít ic a e d a

t e o r i a g e r a l d o E s t a d o c o l a b o r a m , d e f o r m a i n c i s i v a , p a r a a e la b o r a ç ã o d a

o rd e m j u r í d i c a . S ã o , p o r t a n t o , p a s s o s n e c e s s á r io s p a r a a c o m p r e e n s ã o d o

D ir e it o d e d e t e r m in a d a s o c ie d a d e . E s s a p e r s p e c t iv a p r á t ic a r e v e la a in d a o

e n f r e n t a m e n t o q u e d e v e e x i s t i r e n t r e a s c o n s t r u ç õ e s t e ó r i c a s e o c o t i d ia n o

d a q u e le s in s e r id o s e m d e t e r m in a d a c o m u n id a d e j u r í d i c a . D e fa t o , n ã o h á

q u a lq u e r u t il id a d e e m u m a r e f l e x ã o s o b r e o p a p e l d a a u t o r id a d e e d o E s t a d o

q u e n ã o c o n s id e r e a s p e c u l i a r i d a d e s d a s o c ie d a d e n a q u a l e s t á i n s e r i d a . P o r

is s o , d e v e s e r a c r e s c e n t a d a u m a ú l t i m a b o a r a z ã o p a r a o e s t u d o d a d i s c i p l i n a .

A q u a r t a r a z ã o p ro p o s ta é r e a t i v a . D e fa t o , c o m p r e e n d e r o s in s t it u t o s

é , t a m b é m , e n c o n t r a r a s s u a s q u a lid a d e s e o s s e u s d e f e it o s , s u a s v ir t u d e s

e s e u s v í c i o s , d e m o d o a b u s c a r o a p r im o r a m e n t o d a s i n s t i t u i ç õ e s . A s s i m ,

p o r e x e m p lo , n o q u e c o n c e r n e à t e o r ia g e r a l d o E s t a d o , n ã o b a s t a a p e n a s

id e n t if ic a r a e x is t ê n c ia d e p ro p o s ta s d e c o r r e n t e s d o p ro g r a m a e s t a t a l, m a s

c u m p r e p e r q u i r i r s o b r e a e f e t iv id a d e d a s u a a t u a ç ã o . S e o E s t a d o b r a s i l e i r o

t e m u m a a g e n d a , c u m p r e v e r i f i c a r s e e la v e m s e n d o c u m p r i d a . E , n o â m b it o

d a c iê n c ia p o lít ic a , se h á u m d e b a te s o b re a d e m o c r a c ia , c u m p r e r e f le t ir s o b re

a r e a l p o s s i b ili d a d e d e p a r t i c i p a ç ã o d a c o m u n i d a d e n a t o m a d a d e d e c is ã o . D e

ig u a l m o d o , m u d a n ç a s n a s r e g r a s d o jo g o p o lí t i c o p o d e m r e c e b e r u m a r e f l e x ã o

m a is t e n a z e m r a z à o d a s p o s t u r a s a d o t a d a s .
Ciência política e teoria geral do Estado

Referências '

BONAVIDES, P. Ciência política. 16. ed. São Paulo: Malheiros, 2009.

CHEVALLIER, J. O Estado pós-moderno. Belo Horizonte: Fórum, 2009.

DALLARI, D. de A. Elementos de teoria geral do Estado. 32. ed. São Paulo: Saraiva, 2013.

DIAS, R. Ciência política. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2013.

MORAIS, J. L. B. de; STRECK, L. L. Ciência política e teoria do Estado. 7. ed. Porto Alegre:
Livraria do Advogado, 2010.
V_______________________________________________________________________________ J
Da sociedade
/------------------ Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

■ Explicar teorias acerca das origens da sociedade.


■ Diferenciar ordem social de ordem jurídica.
■ Caracterizar o poder social e as sociedades políticas.

Introdução--------------------------------------v
Você certamente concordará que o convívio social traz vantagens e
desvantagens. Ainda assim, o homem continua a viver em sociedade.
É inegável, por outro lado, que aceitar o convívio social implica, para a
liberdade do sujeito, uma série de restrições. Uma vez no grupo social,
aqueles interesses protegidos pelo grupo devem ser observados, sob pena
de inevitável atrito. Aliás, é difícil refletir acerca de uma sociedade em que
não há conflito de interesses entre os sujeitos que dela participam. Nesse
sentido, afigura-se indispensável compreender as origens da sociedade
e as suas características essenciais.
Neste capítulo, você analisará as teorias sobre a origem da sociedade,
diferenciando ordem social e ordem jurídica e identificando o que é o
poder social e a sociedade política.

Origens da sociedade
O c o n v í v i o s o c i a l t r a z v a n t a g e n s e d e s v a n t a g e n s p a r a o s u je it o . A i n d a a s s i m ,

v e r i f i c a - s e q u e o h o m e m c o n t in u a a v i v e r e m s o c ie d a d e . E i n e g á v e l , p o r o u t r o

la d o , q u e a c e i t a r o c o n v í v i o s o c i a l i m p l i c a u m a s é r ie d e r e s t r i ç õ e s à lib e r d a d e

d o s u je it o . U m a v e z n o g r u p o s o c i a l , a q u e le s in t e r e s s e s p r o t e g id o s p e lo g r u p o

d e v e m s e r o b s e r v a d o s , so b p e n a d e in e v it á v e l a t r it o . A l i á s , é d i f í c i l r e f le t ir

a c e r c a d e u m a s o c ie d a d e e m q u e n à o h á c o n f l i t o d e in t e r e s s e s e n t r e o s s u je it o s

q u e d e la p a r t i c i p a m . O q u e j u s t i f i c a r i a e s s e c a r á t e r a g r e g a d o r d o h o m e m ?
Da sociedade 15

A r e s p o s t a p a r a e s s a in d a g a ç ã o é , e m ú l t i m a a n á li s e , a s o lu ç ã o p a r a a s o r ig e n s

d a s o c ie d a d e . S o b r e o t e m a ( D A L L A R I , 2 0 1 3 ) , p o d em se r d e sta c a d a s d u a s

g r a n d e s t e o r ia s e x p l i c a t i v a s d a g ê n e s e s o c i a l . A p r i m e i r a é d e n o m in a d a t e o r i a

n a t u r a l i s t a , s e g u n d o a q u a l h a v e r ia u m a d is p o s iç ã o n a t u r a l d o s h o m e n s p a r a a

v id a a s s o c ia t iv a e , p o r t a n t o , a v id a e m s o c ie d a d e n ã o d e p e n d e r ia d e u m a e s c o lh a

d o s u je it o , m a s d a p r ó p r ia n a t u r e z a h u m a n a . A s e g u n d a é d e n o m in a d a t e o r i a

c o n t r a t u a l i s t a , s e g u n d o a q u a l a s o c ie d a d e é f r u t o d e u m a c o r d o d e v o n t a d e s

e n t r e o s s u je it o s d a v id a a s s o c ia t iv a . C a d a u m a d e la s m e r e c e m a io r r e f le x ã o .

Teoria naturalista

A t e o r ia n a t u r a lis t a , t a m b é m d e n o m in a d a n a t u r a lis m o , a in d a é a c o r r e n t e m a is

a c e it a . O s e u c o n t o r n o j á p o d ia s e r id e n t if ic a d o n o p e n s a m e n t o d e A r is t ó t e l e s ,

q u a n d o , n o s é c u lo I V a . C . , p r o fe s s o u q u e o h o m e m é n a t u r a lm e n t e u m s e r p o lít ic o

( D I A S , 2 0 1 3 ). S e r ia , a s s im , in e re n te à r a z ã o h u m a n a b u s c a r a r e u n iã o c o m o u tro s d a

s u a e s p é c ie . N o p e r ío d o g r e c o - r o m a n o , e s s a lin h a d e p e n s a m e n t o fo i a m p la m e n t e

r e ite ra d a . V a le r e g is t r a r , p o r e x e m p lo , a im p o r t a n te r e f le x ã o d e C íc e r o (s é c u lo I a .C .)

n o s e n t id o d e q u e o in s t in t o d e s o c ia b ilid a d e é a lg o in e r e n t e a o h o m e m . H a v e r ia ,

a s s i m , u m a d is p o s iç ã o n a t u r a l d o h o m e m p a r a a v id a e m s o c ie d a d e ( D I A S , 2 0 1 3 ).

E s s a c o r r e n t e t a m b é m f o i p r e p o n d e r a n t e n o p e r ío d o m e d i e v a l . A s s i m ,

T o m á s d e A q u in o a c o m p a n h o u , c o m v ig o r , o s p a s s o s d o f iló s o fo g re g o p a ra

r e a f i r m a r a e x i s t ê n c i a d e f a t o r e s n a t u r a i s q u e im p õ e m a o h o m e m b u s c a r a

c o n s t a n t e a s s o c ia ç ã o c o m o u t r o s h o m e n s . N o p e r ío d o m o d e r n o , a d o u t r i n a d e

c i ê n c i a p o lí t i c a c o n t in u o u c o m a d e p t o s d e s s a p o s iç ã o . C o n s i d e r e o e x e m p lo d e

O r e s t e R a n e l l e t t i , p a r a q u e m b a s t a r i a a p e r c e p ç ã o d a r e a li d a d e p a r a c o n s t a t a r

q u e o h o m e m se m p re é e n c o n tra d o e m c o n v ív io c o m o u tro s ( D A L L A R I ,

2 0 1 3 ) . A a s s o c ia ç ã o c o m o o u t r o s e r i a , p o r t a n t o , u m a c o n d iç ã o e s s e n c i a l d a

v i d a h u m a n a . A i n d a n e s s e s e n t i d o , o a u t o r r e c o n h e c e a v i d a e m s o c ie d a d e

c o m o o m e io p a r a a s s e g u r a r a p le n a s a t i s f a ç ã o d a s n e c e s s i d a d e s h u m a n a s .

A s s i m , a p e n a s n o c o n v í v i o e n a c o o p e r a ç ã o c o m o s e m e lh a n t e s e r i a v i á v e l o

a t in g im e n t o d o s f i n s a lm e ja d o s p e la e x i s t ê n c i a h u m a n a .

Fique atento

A teoria naturalista considera a sociedade o resultado do natural impulso associativo


e cooperativo da vontade humana.
16 Da sociedade

Teoria contratualista

A t e o r ia c o n t r a t u a l i s t a , t a m b é m c o n h e c id a c o m o c o n t r a t u a l i s m o , c o n s id e r a ,

e m l i n h a s g e r a is , q u e a s o c ie d a d e t e m o r ig e m n a l i v r e m a n i f e s t a ç ã o d e v o n t a d e

d o s s u je i t o s , o s q u a i s , p o r m e io d e u m c o n t r a t o h ip o t é t ic o , d e c id e m s e a s s o c i a r

e f o r m a r a c o m u n id a d e . A s r a z õ e s q u e j u s t i f i c a m e s s a d e c is ã o d o h o m e m s ã o

v a r i a d a s p a r a c a d a d e f e n s o r d a c o r r e n t e . D e q u a lq u e r f o r m a , o p o n t o c e n t r a l

d a t e o r ia é q u e a v o n ta d e h u m a n a ju s t i f i c a a e x is t ê n c ia d a s o c ie d a d e , n à o

h a v e n d o u m im p u l s o n a t u r a l p a r a i s s o , c o m o o c o r r e c o m a t e o r i a n a t u r a l i s t a

( D A L L A R I , 2 0 1 3 ).

A l g u n s a u t o r e s i d e n t i f i c a m j á e m P la t ã o o p e n s a m e n t o c o n t r a t u a l i s t a , n a

m e d id a e m q u e o f iló s o f o a p r e s e n t o u u m m o d e lo d e o r g a n iz a ç ã o s o c ia l f u n d a d o

n a r a z ã o e n a v o n t a d e h u m a n a . A c r í t i c a , p o r o u t r o la d o , le m b r a q u e a p r o p o s t a

p l a t ô n i c a c o n t id a n a s u a o b r a Da república t r a t a v a d e u m m o d e lo id e a l d e

g o v e r n o , v o lt a d o a a f a s t a r o s m a l e f i c i o s e a s f r a g i l i d a d e s d a o r g a n i z a ç ã o s o c i a l

e m q u e e s t a v a in s e r id o ( D A L L A R I , 2 0 1 3 ) . N ã o h a v i a , p o r t a n t o , u m a t e n t a t iv a

d e e n c o n t r a r a s a u t ê n t ic a s o r ig e n s d a s o c ie d a d e n e m e x p r e s s a r e f e r ê n c ia à

fu n d a ç ã o d a s o c ie d a d e e m v ir t u d e d a v o n ta d e h u m a n a . O p e n s a m e n to d e

P la t ã o , p o r t a n t o , e r a v o lt a d o a u m m o d e lo id e a l d e s o c ie d a d e ( D I A S , 2 0 1 3 ) .

E m r a z ã o d is s o , a p r o x im a - s e m a is d o s u t o p is t a s d o s é c u lo X V I , c o m o T h o m a s

M o re e T o m m a s o C a m p a n e lla d o q u e d o s c o n t r a t u a lis t a s ( D A L L A R I , 2 0 1 3 ).

O c o n t r a t u a l i s m o , e n q u a n t o p r o p o s t a d e s i s t e m a t i z a ç ã o , s u r g e n o p e r ío d o

m o d e r n o . O s e u p r i m e i r o e x p o e n t e f o i H o b b e s . P a r a e le , o h o m e m v i v e r i a

i n i c i a l m e n t e e m u m e s t á g io p r i m i t i v o n o q u a l e s t a r ia e m c o n s t a n t e in s e g u ­

r a n ç a e t e m o r . I s s o p o r q u e o s e r h u m a n o é e s s e n c i a lm e n t e e g o ís t a e i n c l i n a d o

à a g r e s s iv id a d e , d e m o d o q u e , n e s s e e s t á g io , q u a lq u e r u m p o d e r ia t o m a r

d o o u t r o , p e la f o r ç a , o q u e f o s s e d o s e u in t e r e s s e . E n e s s e c h a m a d o e s t a d o

d e n a t u r e z a q u e H o b b e s a f i r m o u q u e o h o m e m é o lo b o d o h o m e m . A s s i m ,

e le v a - s e a r a z ã o h u m a n a p a r a s u p e r a r e s s e e s t á g io i n i c i a l e a v a n ç a r p a r a u m a

fa s e n a q u a l p o s s a e x i s t i r s e g u r a n ç a e p a z s o c ia l. S u r g e , e n tã o , o e s ta d o s o c ia l

c o m o e t a p a d e f o r m a ç ã o r a c i o n a l d a s o c i e d a d e , n a q u a l o h o m e m s e e n g a ja

e m m a n t e r a p a z e a s e g u r a n ç a . P a r a t a n t o , o s h o m e n s c e le b r a m u m p a c t o d e

p r e s e r v a ç ã o e m q u e c a d a u m d e v e a n u i r e m a b d i c a r d o d ir e i t o a t u d o e a c e i t a r

o d i r e i t o l i m i t a d o à li b e r d a d e c o n f e r i d a a c a d a u m . E i s a í o c o n t r a t o s o c i a l .

T o d a v i a , d a d a a n a t u r e z a t r a n s g r e s s o r a d o h o m e m , a s o c ie d a d e o r g a n i z a d a ,

p a r a H o b b e s , é s e m p r e d e p e n d e n t e d e u m p o d e r p a lp á v e l e c a p a z d e m a n t e r o

i n d i v íd u o d e n t r o d o s l i m i t e s d e f in id o s n o p a c t o s o c i a l . É a s s i m q u e s e j u s t i f i c a

o s u r g im e n t o d o E s t a d o c o m o m a n ife s t a ç ã o r e a l d e p o d e r a p ta a a s s e g u r a r a s

c o n d iç õ e s d e e x i s t ê n c i a d a s o c ie d a d e .
Da sociedade 17

H o b b e s t a m b é m d e f e n d ia q u e , a p ó s a s u p e r a ç ã o d o e s t a d o n a t u r a l , a m a ­

n u t e n ç ã o d o e s t a d o s o c i a l s e r i a o p r i m e i r o i m p e r a t i v o d e q u a lq u e r s o c ie d a d e .

H m r a z ã o d i s s o , d e f e n d ia q u e o p o d e r d o E s t a d o n à o d e v e r i a s o f r e r l i m i t a ­

ç õ e s , s e n ã o a q u e le q u e im p ô s o s l i m i t e s d e v e r i a s e r c o n s id e r a d o o a u t ê n t ic o

g o v e r n a n t e . A l é m d i s s o , d ia n t e d a r e l e v â n c i a d o p a p e l d o E s t a d o , m e s m o u m

g o v e r n o r u i m s e r i a m e lh o r d o q u e o r e t o r n o a o e s t a d o d e n a t u r e z a ( M O R A I S ;

S T R E C K , 2 0 1 0 ).

Fique atento

Com esse pensamento, Hobbes claramente legitima a defesa de um soberano para


conduzir a vida em sociedade e, assim, aproxima-se, no pensamento político, do
absolutismo (DALLARI, 2013).

O u t r o a u t o r t r a d ic io n a l m e n t e r e l a c io n a d o à t e o r ia c o n t r a t u a l i s t a é L o c k e .

S e g u n d o e le , o e s t a d o d e n a t u r e z a é t e n s o e p e r ig o s o , m a s n ã o n e c e s s a r ia m e n t e

u m e s ta d o d e g u e r r a . E l e ta m b é m s e a fa s t a d a c o n c e p ç ã o p e s s im is t a d a c o n ­

d iç ã o h u m a n a e n ã o c h e g a a d e f e n d e r a p r e d o m in â n c ia d a s m á s p a i x õ e s n e s s e

e s t á g io i n i c i a l ( M O R A I S ; S T R E C K , 2 0 1 0 ) . A d e m a i s , p a r a L o c k e , o s d ir e i t o s

n a t u r a is n à o s ã o e n tre g u e s p a ra o e s ta d o n a p a s s a g e m d o e s ta d o n a t u r a l p a ra

o e s t a d o c i v i l . E x i s t e m , p o r t a n t o , d i r e i t o s n a t u r a i s q u e a p e n a s s ã o p r o t e g id o s

p o r m e io d a v i d a e m s o c ie d a d e e d o E s t a d o .

Fique atento

Diferentemente de Hobbes, Locke foi um fervoroso defensor da corrente antiabsolutista,


sendo considerado uma das maiores influências históricas da Revolução Inglesa (1688)
eda Revolução Americana (1776).

O u t r o e x p o e n t e d o c o n t r a t u a lis m o f o i R o u s s e a u . N a s u a o b r a m a is d if u n d id a

(O contrato social ) , d e f e n d e u a n a t u r a l p r e d o m in â n c ia d a b o n d a d e h u m a n a

e o s e u c a r á t e r a s s o c i a t i v o , d e m o d o q u e a o r g a n i z a ç ã o d a s o c ie d a d e o c o r r e
18 Da sociedade

p o r m e io d e u m c o n t r a t o e n t r e t o d o s . P a r a e le , a o r d e m s o c i a l s e r i a u m d ir e i t o

s a g r a d o d e c o r r e n t e ju s t a m e n t e d a s c o n v e n ç õ e s s o c i a i s .

P a r a R o u s s e a u , c a s o o h o m e m s e m a n t iv e s s e n o e s t a d o n a t u r a l , e m a lg u m

m o m e n t o n ã o t e r i a f o r ç a s u f i c i e n t e p a r a f a z e r f r e n t e a o s o b s t á c u lo s p a r a a

s u a p r ó p r ia c o n s e r v a ç ã o . A s s i m , c o m u n g a e s f o r ç o s c o m o s d e m a i s . E , p a r a

c o n j u g a r d e f o r m a p le n a a f o r ç a e a l i b e r d a d e , R o u s s e a u p r o p õ e q u e c a d a

s u je i t o a b d iq u e c o m p le t a m e n t e d e t o d o s o s s e u s d i r e i t o s e m d e t r im e n t o d a

c o m u n i d a d e e J u s t a m e n t e e m r a z à o d e o i n d i v í d u o e s t a r in s e r id o n e la , t o d o s

o s d i r e i t o s a b d ic a d o s a in d a s e r ã o s e u s : a lib e r d a d e q u e a n t e s e r a i n d i v i d u a l s e

t o r n o u li b e r d a d e c o l e t i v a . E s s e e s q u e m a e x p l i c a , p a r a R o u s s e a u , a in e g á v e l

v a n t a g e m d o c o n t r a t o s o c i a l : o s u je i t o c o n t in u a l i v r e c o m o a n t e s . N e s s e c e ­

n á r io , o E s t a d o se a fig u r a c o m o m e ro e x e c u to r d a v o n ta d e g e ra l e x t r a íd a d a

s o c ie d a d e : o soberano não pode ser apenas um indivíduo , mas o corpo social


como um todo. D e s s a f o r m a , o b s e r v a m o s a im p o r t â n c i a d e s s e p e n s a m e n t o p a r a

a R e v o l u ç ã o F r a n c e s a ( 1 7 8 9 ) e p a r a a a s c e n s ã o d o p e n s a m e n t o d e m o c r á t ic o .

C e le b r a d a n o s s é c u lo s X V I I e X V I I I , a t e o r ia c o n t r a t u a lis t a r e c e b e u a c e n t u ­

a d a c r í t i c a n a e r a c o n t e m p o r â n e a . A p r i n c i p a l r a z ã o r e s id e n a n e g a ç ã o e m p í r i c a

d a s u a e x i s t ê n c i a ( D A L L A R I , 2 0 1 3 ) . A i n d a q u e s e ja f á c i l a p r e s e n t a r , n o p la n o

t e ó r i c o , a d i s t i n ç ã o e n t r e e s t a d o n a t u r a l e e s t a d o s o c i a l , n à o h á n o t í c ia d e u m a

r e u n iã o d e c o r r e n t e d e u m p a c t o p a r a e v i t a r a v io l ê n c ia o u r e a f i r m a r a lib e r d a d e .

A s s i m , a in d a q u e a p r e s e n t e in e g á v e l v a l o r f i l o s ó f i c o e r a c i o n a l , a h ip ó t e s e d e

t r a b a l h o d a t e o r i a c o n t r a t u a l i s t a p a r t e d e u m a p r e m is s a n à o c o n f i r m a d a n a

p r á t ic a . T a l v e z s e ja ju s t a m e n t e p o r e s s a r a z ã o q u e , n a a t u a l id a d e , p r e d o m in a

a id e ia d e q u e a s o c ie d a d e é r e s u lt a d o d e u m a n e c e s s id a d e n a t u r a l , a in d a q u e

o b t e m p e r a d a p e la p a r t i c i p a ç ã o d a v o n t a d e h u m a n a e m s e r e u n i r e a g r u p a r .

Fique atento

Prevalece a adoção da teoria naturalista quanto à origem da sociedade.

Poder social e sociedades políticas


A c o m p le x id a d e d a v id a h u m a n a r e v e la q u e o a g r u p a m e n t o n à o é a lg o a le a t ó r io .

P e lo c o n t r á r i o , é p o s s í v e l i d e n t i f i c a r p a d r õ e s p a r a a c a r a c t e r i z a ç ã o d o q u e s e

c o m p r e e n d e p o r s o c ie d a d e . C o m e f e it o , a p r o c u r a p o r t a is p a d r õ e s a f i g u r a -

- s e r e le v a n t ís s im a n à o s ó p a r a u m a c o m p r e e n s ã o g e ra l d o s e r h u m a n o , m a s
Da sociedade 19

e s p e c ia l m e n t e p a r a m e lh o r a v a l i a r a a t u a ç ã o d e c a d a g r u p o s o c i a l . A c i e n c i a

p o l í t i c a i d e n t if ic a t r ê s c a r a c t e r í s t i c a s e s s e n c i a i s p a r a q u e s e p o s s a r e c o n h e c e r

u m a s o c ie d a d e e d if e r e n c iá - la d e u m a m e r a r e u n iã o d e p e s s o a s . S ã o e la s

( D A L L A R I , 2 0 1 3 ):

■ f in a lid a d e s o c ia l;

■ o rd e m s o c ia l;

■ p o d e r s o c ia l.

Finalidade social

A f in a li d a d e s o c i a l r e s id e n a id e ia s e g u n d o a q u a l o h o m e m t e m p le n a c o n s c i­

ê n c i a d a n e c e s s id a d e d e v i v e r e m s o c ie d a d e e b u s c a , e n t ã o , f i x a r u m o b je t iv o

p a r a a v i d a s o c i a l c o m p a t ív e l c o m a q u il o q u e c o n s id e r e n e c e s s á r io p a r a a s u a

s u b s is t ê n c ia . A s s i m , o e s t a b e le c im e n t o d e u m a f in a lid a d e é , e m ú l t i m a a n á li s e , o

r e c o n h e c im e n t o d e q u e u m a s o c ie d a d e , p a r a s e r c o n s id e r a d a c o m o t a l, d e v e t r a ç a r

o b je t iv o s c o m p a t ív e is c o m a q u il o q u e c o n s id e r e r e le v a n t e ( D A L L A R I , 2 0 1 3 ).

A g r a n d e d if ic u ld a d e r e s id e n a id e n t if ic a ç ã o d e s s a f in a lid a d e . C o m o e n c o n t r a r

u m o b je t iv o c o m u m p a r a t o d o s a q u e le s q u e p a r t ic i p a m d e u m g r u p o s o c i a l?

P a r a a d o u t r in a d e c i ê n c i a p o l í t i c a , p r e v a l e c e q u e e s s a f i n a l i d a d e , a o m e n o s

n a s s o c ie d a d e s c i v i l i z a d a s , s e r ia a b u s c a d o b e m c o m u m . A c o n s t a t a ç ã o ,

p o r é m , p e c a p e la d e f in iç ã o a b e r t a . C o m o e n c o n t r a r u m c o n c e it o d e b e m

c o m u m ? U m a p r o p o s t a in t e r e s s a n t e é p r o v e n ie n t e d a Encíclica I I ys e g u n d o a

q u a l o b e m c o m u m “ c o n s is t e n o c o n ju n t o d e t o d a s a s c o n d iç õ e s d e v i d a s o c i a l

q u e c o n s in t a m e f a v o r e ç a m o d e s e n v o lv im e n t o in t e g r a l d a p e r s o n a lid a d e

hum ana” I s s o s i g n i f i c a r i a , e m ú l t i m a a n á l i s e , q u e a f i n a l i d a d e d a s o c ie d a d e

r e p r e s e n t a r ia a b u s c a d c c o n d iç õ e s q u e p e r m it a m a c a d a p e s s o a o u a o g r u p o

s o c i a l o a t in g im e n t o d a s s u a s f i n a l i d a d e s p a r t i c u l a r e s , e s t a m p a n d o , a s s i m , o

d e s e n v o lv i m e n t o d a s u a p e r s o n a lid a d e .

Ordem social

O s e g u n d o e le m e n t o e s s e n c i a l p a r a c a r a c t e r i z a r u m a s o c i e d a d e é a o r d e m

s o c i a l. D e f a t o , p a r a g a r a n t ir q u e o o b je t iv o a lm e ja d o s e ja a t in g id o , é n e c e s s á r ia

u m a o r ie n t a ç ã o c o m u m d o s s u je i t o s n e s s e s e n t id o . A s s i m , a a ç ã o h a r m ô n i c a

d o s in t e g r a n t e s d a s o c ie d a d e d e p e n d e d e u m a o r d e n a ç ã o ( D A L L A R I , 2 0 1 3 ) .

P a r a q u e h a ja o r d e m s o c i a l , a s a ç õ e s d e v e m s e r r e a l i z a d a s d e f o r m a r e i ­

t e r a d a , o r d e n a d a e a d e q u a d a . A s s i m , é in d is p e n s á v e l q u e o s m e m b r o s d a

s o c ie d a d e a tu e m e m u m m e s m o s e n tid o d e f o r m a c o n t ín u a , r e a f ir m a n d o
20 Da sociedade

c o n s t a n t e m e n t e d e t e r m i n a d a s p r á t i c a s . A l é m d i s s o , é n e c e s s á r i o q u e h a ja

c e r t a o r d e n a ç ã o , is t o é , a o b s e r v â n c i a d e n o r m a s d e c o m p o r t a m e n t o s o c i a l ,

s e j a m e l a s j u r í d i c a s o u n ã o . C o m e f e it o , a e x i s t ê n c i a d e u m a o r d e m s o c i a l

r e v e l a q u e o i n d i v í d u o t e m a li b e r d a d e p a r a d a r c u m p r i m e n t o à n o r m a o u

n ã o , f ic a n d o s u je i t o a u m a e v e n t u a l p u n iç ã o p e la d e s o b e d iê n c ia d a q u i lo q u e

f o i c o n v e n c io n a d o e m s o c ie d a d e .

Fique atento

A conduta do indivíduo e do grupo deve ser compatível com a finalidade social.


Esperamos, assim, que as ações não se realizem de modo contrário ao buscado. Essa
adequação, por seu turno, deve considerar o conjunto cultural de cada sociedade.

A e x i g ê n c ia d e d e t e r m in a d o c o m p o r t a m e n t o e a t o le r â n c ia a c e r t a s p o s t u r a s

p o d e m r e c e b e r v a r i a d a s g r a d a ç õ e s p e r a n t e o g r u p o s o c i a l . É a s s i m q u e o d e s v io

d e c o n d u t a p o d e r e c e b e r d if e r e n t e s c o n s e q u ê n c ia s p e lo a g r u p a m e n t o , o r a s e n d o

s e v e r a m e n t e p u n id o , o r a s e n d o t o le r a d o . E s s a d i f e r e n ç a d e t r a t a m e n t o q u a n t o

a a ç õ e s d e s e ja d a s e in d e s e j a d a s t r a z á t o n a d if e r e n t e s e s p é c ie s d e o r d e n a ç ã o .

H á , p o r t a n t o , n í t i d a d if e r e n ç a e n t r e u m a e x i g ê n c i a d e c o m p o r t a m e n t o m o r a l

e u m a e x ig ê n c ia d e c o m p o rta m e n to ju r í d i c a ( D A L L A R I , 2 0 1 3 ). E n q u a n t o a

m o r a l e s t a b e le c e u m a r e g r a d e c o m p o r t a m e n t o c u jo c u m p r im e n t o n à o p o d e

s e r e x i g i d o , o D i r e i t o e s t a b e le c e u m a r e g r a d e c o m p o r t a m e n t o c u ja v i o l a ç ã o

p e r m it e r e a ç ã o o u c o r r e ç ã o . A n o r m a j u r í d i c a , p o r t a n t o , a p r e s e n ta c a r á t e r

b i l a t e r a l : c i a i m p r i m e d ir e i t o s e d e v e r e s , a u t o r i z a n d o o le s a d o a e x i g i r a r e ­

c o m p o s iç ã o so b p e n a d e a p lic a ç ã o d a s a n ç ã o p r e v is t a ( D A L L A R I , 2 0 1 3 ). A

o r d e m s o c i a l , p o r s u a v e z , t r a z e s p e c t r o m a is a m p lo d o q u e a o r d e m j u r í d i c a

— e s p a ç o d e d ic a d o a p e n a s à s n o r m a s d e d ir e i t o .

Poder social

O t e r c e i r o e le m e n t o p a r a o r e c o n h e c im e n t o d e u m a s o c ie d a d e c o m o t a l é a

e x i s t ê n c i a d e p o d e r s o c i a l . D e f a t o , s e a v i d a c m s o c ie d a d e e x i g e o r d e n a ç ã o ,

c o m o g a r a n t ir q u e e s s a p a u ta s e ja o b s e r v a d a ? É n e s s e c e n á r io q u e s u r g e a

q u e s t ã o d o p o d e r c a r a c t e r iz a d o c o m o o f e n ô m e n o e m q u e , n a p r e s e n ç a d e d u a s

o u m a i s v o n t a d e s d i f e r e n t e s , h a v e r á u m a p r e d o m in a n t e ( D A L L A R I , 2 0 1 3 ) .

A n o ç ã o b á s i c a d e p o d e r d i z r e s p e it o à p o s s i b ili d a d e d e d o m i n a ç ã o d e u m a
Da sociedade 21

v o n ta d e s o b re a o u tra ( D I A S , 2 0 1 3 ). A s s im , e m u m a r e la ç ã o d e p o d e r, h a v e r á

u m a v o n t a d e q u e s e s u b m e t e e o u t r a v o n t a d e q u e é s u b m e t id a .

M a s s e r á i m p r e s c i n d í v e l h a v e r a lg u m g r a u d e d o m i n a ç ã o p a r a q u e u m a

s o c ie d a d e p o s s a c o n c i l i a r e h a r m o n i z a r o s in t e r e s s e s d o in d iv íd u o ? A in d a g a ç ã o

é r e le v a n t e , p o is , c a s o s e c o n s id e r e d is p e n s á v e l a e x i s t ê n c ia d e u m p o d e r s o c i a l ,

n e m m e s m o o E s t a d o , e n q u a n t o a u t o r id a d e q u e s e im p õ e s o b r e o s u je it o , s e r ia

a lg o im p r e s c in d ív e l. A e s s a c o r r e n t e d e p e n s a m e n t o , a d e r e m o s a n a r q u is t a s . E m

li n h a s g e r a is , o a n a r q u i s m o p ro p õ e a d e s c o n s t it u iç ã o d o E s t a d o e d a s in s t it u iç õ e s

d e s e g m e n t o s e s p e c í f i c o s , c o m o a b u r g u e s ia , e m f a v o r d o e s t a b e le c im e n t o d e

u m c r e s c im e n t o d a s r e la ç õ e s s o c i a i s d e f o r m a l i v r e , f u n d a d o n a s o lid a r ie d a d e e

n o s u r g im e n t o d e a s s o c ia ç õ e s v o lu n t á r ia s e c o n t r a t o s l i v r e s ( D A L L A R I , 2 0 1 3 ).

Fique atento

Nesse cenário, proposto por Mikhail Bakunin, a nova organização social sería apta a
permitir que o individuo desfrute das vantagens decorrentes do seu próprio trabalho
por meio de reuniões associativas livremente criadas. O próprio autor, entretanto,
defendia o uso da violência para se atingir o objetivo de destruição do Estado e a
reconstrução de uma sociedade livre, razão pela qual era considerado antes um
agitador político do que um teórico dos modelos sociais. Foi, aliás, esse excessivo
apego à violência que trouxe o desprestígio e descrédito às correntes anarquistas.

A in t e r v e n ç ã o d e u m a v o n t a d e p r e p o n d e r a n t e p a r a g a r a n t ir a u n id a d e o r d e ­

n a d a e m t o r n o d e c e r t o s o b je t iv o s s e r e v e la r e a lm e n t e n e c e s s á r ia ( D A L L A R I ,
f

2 0 1 3 ). E ju s t a m e n t e e s s a p r e p o n d e r â n c ia q u e a c a b a m a n t e n d o a c o e s ã o d o g r u p o

s o c i a l . H á , p o r t a n t o , a n e c e s s id a d e d e u m p o d e r a p t o a g a r a n t i r a h a r m o n i a

d o s in t e r e s s e s i n d i v i d u a i s e c o l e t i v o s . A l i á s , b a s t a a a n á l i s e h i s t ó r i c a p a r a

c o n s t a t a r q u e m e s m o a s s o c ie d a d e s m a i s p u ja n t e s e o r g a n i z a d a s n à o f i c a m

in d e n e s a c o n f l i t o s i n t e r n o s , e n t r e s e u s p r ó p r i o s i n d i v í d u o s e e n t r e o u t r o s

g r u p o s s o c i a i s , j u s t i f i c a n d o a p r e s e n ç a d e a lg u m a a u t o r id a d e . C o m e f e it o , a

h i s t ó r i a d o h o m e m é t a m b é m a h i s t ó r i a d o p o d e r e d a d o m in a ç ã o .

D e f i n e - s e , a s s i m , o p o d e r s o c i a l c o m o a a p t id ã o c o n f e r i d a a a lg u é m e m

u m c o n te x to s o c ia l p a ra q u e s u b m e ta a su a v o n ta d e a o u tre m . P o r e s s e m o ­

t iv o , s ã o c a r a c t e r ís t ic a s e s s e n c ia is d o p o d e r s o c ia l a s o c ia lid a d e (q u e e x c lu i

a e x i s t ê n c i a d e m e r o s f a t o r e s i n d i v i d u a i s ) e a b i l a t e r a l i d a d e (q u e d e m o n s t r a

a e x i g ê n c i a d e u m a p lu r a l id a d e d e v o n t a d e s c o m a p r e p o n d e r â n c ia d o t i t u l a r

d o p o d e r s o c ia l) ( D A L L A R I , 2 0 1 3 ).
22 Da sociedade

Fique atento

é preciso ressaltar, entretanto, que não há verdadeiro consenso sobre a definição do


poder no âmbito da ciência política (DIAS, 2013). Pelo contrário, essa conceituação
revela um dos mais delicados e polêmicos pontos da disciplina.

R e c o n h e c id a a im p o r t â n c ia d o p o d e r s o c ia l, o u tro r e le v a n t e q u e s t io n a m e n t o d iz

re s p e ito à le g it im id a d e d e q u e e le s e r e v e s te . C o m b a s e n e s s a p ro b le m á t ic a , A d r ia n o

M o r e ir a d if e r e n c io u o m e r o e x e r c íc io d e p o d e r e o e m p r e g o le g ít im o d e s s e p o d e r ,

is t o é , d a a u t o r id a d e d a s d e c is õ e s t o m a d a s ( M O R E I R A , 1 9 9 7 ). A s s i m , p a r a e le ,

q u a n d o h á a o b e d ie n c ia p e lo c o n s e n t im e n to d o o u tro , d e c o rr e n te d o r e c o n h e c im e n to

d a le g it im id a d e d e q u e m m a n d a , h a v e r ia e m p r e g o d e a u t o r i d a d e . P o r o u t r o la d o ,

q u a n d o h á o b e d ie n c ia p e la im p o s iç ã o d a f o r ç a e d o t e m o r , d e c o r r e n t e d a a u s e n c ia

d e r e c o n h e c im e n t o d a le g it im id a d e d e q u e m m a n d a , h a v e r ia e m p r e g o d e p o d e r

S u r g e , a s s i m , m a is u m r e le v a n t e p r o b le m a q u e m e r e c e a t e n ç ã o d a c iê n c ia p o lít ic a

e q u e t r a z in f i n d á v e is r e f le x õ e s é t ic a s , f ilo s ó f i c a s e id e o ló g ic a s , d e s a g u a n d o n a

s e g u in t e in d a g a ç ã o : como um mero poder social se torna autoridade? E m o u tra s

p a l a v r a s , t r a t a - s e d e id e n t if ic a r a s f o n t e s d e l e g i t i m i d a d e d o p o d e r P a r a M a x

W e b e r , p o d e m s e r id e n t if ic a d a s t r ê s fo n t e s ( W E B E R , 1 9 9 1 ):

A u t o r id a d e t r a d ic io n a l — é a q u e la b a s e a d a n a t r a d iç ã o e n o s c o s t u m e s d e

d e t e r m in a d a s s o c ie d a d e s . C o m e f e it o , e s s a le g it im id a d e d e c o r r e d e u m status
a n t e r io r d e a c e it a ç ã o d o p o d e r p e la c o m u n id a d e . É , e m s ín t e s e , p o d e r le g it im a d o

p e la r e it e r a d a a c e it a ç ã o d a s u a o b s e r v â n c i a p e lo g r u p o s o c i a l . C o m o s e t r a t a

d e m e r a t r a d i ç ã o , e s s a a u t o r id a d e é c a r a c t e r i z a d a p e la a u s ê n c ia d e u m a r e g r a

e x p r e s s a q u e c o n fe r e p o d e r a o t it u la r .

A u t o r i d a d e c a r i s m á t i c a — é a q u e la b a s e a d a n o c a r is m a d o t it u l a r . N e s s e c a s o ,

a le g i t i m i d a d e d e c o r r e d a s q u a li d a d e s p e s s o a is d o t i t u l a r e s ã o r e c o n h e c id a s

p e la c o m u n id a d e ( p o r e x e m p lo , a n o t á v e l s a b e d o r ia , o s u c e s s o b é l ic o , o c a r á t e r

s a n t i f i c a d o ) . E s s e p o d e r é le g it im a d o p e la s c o n d iç õ e s in e r e n t e s a o t i t u l a r e

p o d e r á s e r c a r a c t e r i z a d a p e la a u s ê n c ia d e u m a r e g r a e x p r e s s a o u , a t é m e s m o ,

p o r c o n d u t a s c o n t r á r i a s a o d i r e i t o v ig e n t e . O d e s c o n f o r t o d e s s a a u t o r id a d e e

q u e a s o c ie d a d e p e r m a n e c e e s t á v e l a p e n a s e n q u a n t o d u r a r o líd e r .

A u t o r id a d e r a c io n a l (o u b u r o c r á t ic a ) — é a q u e la b a s e a d a e m u m a r e g r a

d e d ir e i t o q u e a t r i b u a p o d e r a o t i t u l a r . A s s i m , o e x e r c í c i o d o p o d e r é le g ít im o
p o rq u e e s tá e m c o n s o n â n c ia c o m a s le is e a s d e m a is r e g ra s e s c r it a s . C o m o se

v e r i f i c a , e s s a le g it im id a d e d e c o r r e d c u m a a u t o r i z a ç ã o e x p r e s s a d e c o r r e n t e

d a o r d e m j u r í d i c a . E m r a z ã o d i s s o , a a u t o r id a d e r a c i o n a l é c a r a c t e r i z a p e la

id e n t id a d e e n t r e le g it im id a d e e le g a lid a d e . O p o d e r é le g ít im o e n q u a n t o e x e r ­

c i d o n o s l i m i t e s a u t o r i z a d o s p e la le i.

A c r í t i c a d e s s a c l a s s i f i c a ç ã o é q u e o s e u c o n t e ú d o c o n s id e r a a p e n a s a o r ig e m

d o p o d e r s o c i a l e n ã o s e p r e o c u p a c o m o m o d o p e lo q u a l é c o n s t a n t e m e n t e

e x e r c i d o ( D A L L A R I , 2 0 1 3 ) . C o m e f e it o , n o s t e m p o s a t u a i s , o p o d e r s o c i a l

c o n f e r i d o a o t i t u l a r f i c a s u je i t o à c o n s t a n t e f i s c a l i z a ç ã o ( p a r a q u e n à o s e

t o r n e i l e g í t i m o ) , e n à o p o d e s e r d e s c o n s id e r a d a a p o s t e r io r c o n d u t a d o t i t u l a r ,

q u e , m e s m o s o b a é g id e d a l e i , s e ja c o n t r á r i a a o s in t e r e s s e s d a s o c ie d a d e . P o r

e s s a ra z ã o , G e o rg e B u rd e a u d e s ta c a q u e d e v e e s ta r p re se n te u m a c o n s ta n te

c o n v e r g ê n c ia e n t r e o s a n s e io s d o g r u p o s o c i a l e a a t u a ç ã o d o t i t u l a r d o p o d e r .

Sociedades políticas
A s o c ie d a d e c o m p r e e n d id a c o m o a g r u p a m e n t o h u m a n o o r d e n a d o p a r a d e t e r ­

m i n a d a f i n a l i d a d e e m t o r n o d e u m p o d e r s o c i a l r e v e la u m a d e f i n i ç ã o a m p la

a p o n t o d e s e r p o s s í v e l a i d e n t if ic a ç ã o d e in ú m e r a s s o c ie d a d e s e m c o e x i s t ê n ­

c i a . P a r a m e lh o r c o m p r e e n d e r a v i d a e m s o c i e d a d e , s u r g e a n e c e s s id a d e d e

d i f e r e n c i á - l a d e o u t r a s e s p é c ie s d e a g r u p a m e n t o s o u a s s o c i a ç õ e s h u m a n a s

( D A L L A R I , 2 0 1 3 ).

N e s s e s e n t id o , u m a d a s m a is c é le b r e s d if e r e n ç a s c o n s id e r a c o m o e le m e n t o

m a r c a n t e a f i n a l i d a d e d e d e t e r m in a d o a g r u p a m e n t o . A s s i m , p o d e r ia m s e r

i d e n t i f i c a d a s d u a s e s p é c ie s d c s o c i e d a d e s :

S o c ie d a d e s d e íin s p a r t ic u la r e s — s ã o a q u e l a s c o m p r o p ó s it o d e f i n i d o e

o r ie n t a d o p e lo s s e u s m e m b r o s . N e l a s , t o d a s a s a t i v i d a d e s s ã o d i r e c i o n a d a s

à c o n c r e t i z a ç ã o d o p r o p ó s it o d e f i n i d o p e lo s in t e g r a n t e s d e f o r m a d i r e t a e

im e d i a t a .

S o c i e d a d e s d e f i n s g e r a i s — s ã o a q u e la s c o m p r o p ó s it o in d e f in id o e g e n é r ic o .

N e la s , b u s c a - s e a c r ia ç ã o d e c o n d iç õ e s n e c e s s á r ia s p a r a q u e in t e g r a n t e s ,

s u je i t o s e o u t r a s s o c ie d a d e s a t in j a m o s s e u s f i n s p a r t i c u l a r e s . A s s o c ie d a d e s

p o l í t i c a s e s t ã o i n s e r i d a s n e s s a s e g u n d a d e f in iç ã o .
24 Da sociedade

D e s s e m o d o , a s s o c ie d a d e s p o l í t i c a s s ã o a q u e la s q u e , b u s c a n d o a c r ia ç ã o d e

c o n d iç õ e s p a r a o a t in g im e n t o d a s f in a l i d a d e s p a r t ic u la r e s d o s s e u s in t e g r a n t e s ,

c o m p re e n d e m a m a io r ia d a s a ç õ e s h u m a n a s , c o o rd e n a n d o - a s e m to rn o d e u m

o b je t iv o c o m u m . T r a t a - s e , p o r t a n t o , d e f e n ô m e n o m a is a m p lo d o q u e a q u e le

e x p e r i m e n t a d o n a s s o c ie d a d e s d e f i n s p a r t i c u l a r e s ( D A L L A R I , 2 0 1 3 ) .

A c a r a c t e r i z a ç ã o d a s s o c ie d a d e s p o l í t i c a s p o d e r e p r e s e n t a r u m f e n ô m e n o

m a is a m p lo o u m a i s r e s t r i t o . N ã o s e p o d e n e g a r , p o r e x e m p lo , q u e a f a m í l i a

é u m a s o c ie d a d e p o l í t i c a . P o r o u t r o la d o , a s o c ie d a d e p o lí t i c a d e m a io r a m ­

p lit u d e e m u m d e t e r m in a d o g r u p o s o c i a l o r g a n i z a d o é ju s t a m e n t e o E s t a d o .

C o m p r e e n d e m o s , p o r t a n t o , q u e a p r i m e i r a d e f i n i ç ã o d e E s t a d o é ju s t a m e n t e

c o m o s o c ie d a d e p o l í t i c a ( A Z A M B U J A , 2 0 0 8 ) .

Referências '

AZAMBUJA, D. Teoria geral do Estado. 4. ed. São Paulo: Globo, 2008.

DALLARI, D. de A. Elementos de teoria geral do Estado. 32. ed. São Paulo: Saraiva, 2013.

DIAS, R. Ciência política. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2013.

MORAIS, J. L. B. de; STRECK, L. L. Ciência política e teoria do Estado. 7. ed. Porto Alegre:
Livraria do Advogado, 2010.

MOREIRA, A. Ciência política. Coimbra: Almedina, 1997.

WEBER, M. Economia e sociedade. 5. ed. Brasília: UNB, 1991.

Leituras recomendadas

BONAVIDES, P. Ciência política. 16. ed. São Paulo: Malheiros, 2009.

CHEVALLIER, J. O Estado pós-moderno. Belo Horizonte: Fórum, 2009.


V__________________________________________________________________________________ )
Origem do Estado
/------------------ Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

■ Analisar as teorias de origem do Estado.


■ Reconhecer a importância da teoria contratualista de Estado.
■ Distinguir as formações natural e histórica do Estado.

Introdução-------------------------------------- ^
Você já percebeu que todas as sociedades civilizadas estão organizadas
em torno de um Estado? Realmente, o cenário mundial confirma que o
convívio organizado do homem é centrado nessa figura considerada
uma sociedade política. Com efeito, as razões pelas quais esse fenômeno
ocorre são indispensáveis para uma correta compreensão das relações
entre o Estado, o indivíduo e outros grupos sociais. Compreender as
origens do Estado significa, também, identificar os limites do seu poder.
Neste capítulo, você estudará as teorias sobre a origem do Estado,
diferenciando a sua formação natural e a sua formação histórica, bem
como conhecerá a importância da teoria contratualista.

Estado como sociedade política


A o r ig e m d a s o c ie d a d e r e v e la q u e o i n d i v í d u o s e r e ú n e e m t o r n o d e d e t e r m i­

n a d o s o b je t iv o s d e f o r m a o r g a n i z a d a e , p a r a a t i n g i r t a i s f i n a l i d a d e s , a c e it a

o u s e s u b m e t e a u m p o d e r d c c a r á t e r s o c i a l . A s s i m , r e v e la m - s e o s e le m e n t o s

g e r a lm e n t e p r e s e n t e s n a s o c ie d a d e : f in a lid a d e , o r d e m e p o d e r s o c ia l. E m

u m a p e r s p e c t i v a a m p l a , q u a n d o a f i n a l i d a d e a l m e j a d a r e s id e n a c r i a ç ã o d e

c o n d iç õ e s g e r a is p a r a a r e a l i z a ç ã o d o s o b je t iv o s i n d i v i d u a i s , e s s a s o c ie d a d e

é c o n s id e r a d a p o l í t i c a ( D A L L A R I , 2 0 1 3 ) .

A s o c i e d a d e p o l í t i c a c o m u n g a in t e r e s s e s g e r a is e i n d i v i d u a i s , n a m e d id a

e m q u e p r o p o r c io n a , a u m s ó t e m p o , a c o n s e c u ç ã o d e f in s p r ó p r io s e d e

o b je t iv o s c o m u n s p a r a to d o s o s s e u s in t e g r a n t e s . E f r e q u e n t e , in c lu s iv e ,
Origem do Estado
-

q u e se r e f ir a à b u s c a d o b e m c o m u m c o m o a f in a lid a d e ú lt im a d e u m a

s o c i e d a d e p o l í t i c a c o n s id e r a d a n a p e r s p e c t i v a m a i s a m p la d e p a r t i c i p a n t e s .

N e s s a p e r c e p ç ã o m a is a m p la , q u a n d o a c e it a u m a a u t o r id a d e s u p e r io r q u e

e s t a b e l e ç a a s r e g r a s d e c o n v i v ê n c i a e m t o r n o d e s s e o b je t iv o c o m u m , s u r g e a

p r i m e i r a c o n c e p ç ã o d e E s t a d o . D e f a t o , o E s t a d o é u m a e s p é c ie d e s o c ie d a d e

p o lít ic a . A e x p r e s s ã o E s t a d o , p o r é m , é r e v e la d o r a d e m o m e n to h is t ó r ic o

d e t e r m in a d o e e s p e c íf ic o .

C o u b e a M a q u ia v e l o se u e m p re g o n a o b ra O príncipe (1 5 1 3 ). D ia n t e

d a im p o r t â n c ia d a o b r a , q u e a p o n ta v a a s c a r a c t e r ís t ic a s p a ra u m g o v e rn o

d e s u c e s s o n o c o n t e x t o p o l í t i c o d a I t á l i a , o t e r m o s e d i f u n d i u a o lo n g o d o

s é c u lo X V I I , s u p e r a n d o c o n c e p ç õ e s m a is t r a d ic io n a is q u e f a z ia m a lu s ã o a o

“ e s ta d o ” c o m o g ra n d e p r o p r ie d a d e p a r t ic u la r {estados na Esp an h a e states


n a In g la t e r r a ) ( D A L L A R I , 2 0 1 3 ). M a is a d ia n t e , a e x p r e s s ã o p a s s o u a s e r

e m p re g a d a a p e n a s q u a n d o e s t iv e s s e m p re s e n te s a lg u m a s c a r a c t e r ís t ic a s

e s p e c i f i c a s . 1'o i e n t ã o q u e s u r g i u , n o s é c u l o X V I I I , o c h a m a d o E s t a d o m o ­

d e rn o ( D A L L A R I , 2 0 1 3 ).

A d i f i c u l d a d e e m i d e n t i f i c a r u m a e x a t a c o n c e it u a ç à o s o b r e o q u e s e e n ­

t e n d e p o r E s t a d o d e s á g u a e m s i m i l a r d e s a f io p a r a e n c o n t r a r a s s u a s o r ig e n s .

A s s i m , u m a p r i m e i r a c o r r e n t e d e f e n d e q u e a f i g u r a d o E s t a d o , a s s o c ia d a a u m a

s o c ie d a d e o r g a n i z a d a , s e m p r e e x i s t i u . N ã o s e r i a c o n c e b í v e l u m a s o c ie d a d e

s e m E s t a d o . N e s s e s e n t id o , o E s t a d o s e r i a ju s t a m e n t e o p r i n c í p i o o r g a n i z a d o r

d e t o d a a h u m a n id a d e . P o r o u t r o la d o , u m a s e g u n d a c o r r e n t e a f i r m a q u e o

a p a r e c im e n t o d o E s t a d o d e p e n d e d a s c o n v e n i ê n c i a s e o p o r t u n id a d e s d e c a d a

g r u p o s o c i a l , d e p e n d e n d o d a s c o n d iç õ e s c o n c r e t a s d e c a d a a g r u p a m e n t o e m

c a d a lo c a li d a d e . P o r f i m , u m a t e r c e ir a c o r r e n t e d e s t a c a q u e s o m e n t e p o d e s e r

c o n s id e r a d o E s t a d o a q u e la s o c ie d a d e p o l í t i c a c o m c a r a c t e r í s t i c a s p r ó p r i a s e

n a s c id a n a m e t a d e d o s é c u lo X V I I . P a r a e s s a c o n c e p ç ã o , a d e f i n i ç ã o d e E s t a d o

n ã o é g e n e r a l i z á v e l , m a s u m p r o d u t o h i s t ó r i c o d e c o r r e n t e d o r e c o n h e c im e n t o

d a id e ia d e s o b e r a n ia , is t o é , a c o n c e n t r a ç ã o d e p o d e r e m d e t e r m in a d o t e r r it ó r io

e s o b r e u m a d e t e r m in a d a c o m u n i d a d e — o q u e s o m e n te t e r ia o c o r r id o n o

s é c u lo X V I I ( M O R A I S ; S T R E C K , 2 0 1 0 ) .

\
Fique atento

Apesar de a expressão Estado ser uma inovação difundida no século XVII, a noção de
uma sociedade política organizava já existia na Antiguidade.
\ _________________________________________________________________________________________________________ J
Origem do Estado

Formação do Estado

A f o r m a ç ã o d o E s t a d o é te m a q u e s u s c it a d iv e r g ê n c ia s . V a r ia d a s s e r ia m a s

p o s s í v e i s c a u s a s p a r a o s u r g i m e n t o d e s s a s o c ie d a d e p o l í t i c a , s e n d o f r e q u e n t e

a c l a s s i f i c a ç ã o e n t r e f o r m a ç ã o o r i g i n á r i a e f o r m a ç ã o d e r iv a d a ( A Z A M B U J A ,

2 0 0 8 ) . A p r i m e i r a e s t a r i a r e l a c io n a d a a o a v a n ç o n a o r g a n i z a ç ã o d e u m a g r u ­

p a m e n t o p e la p r i m e i r a o p o r t u n id a d e , is t o é , s e m q u e h o u v e s s e u m a o r d e m

p o l í t i c a a n t e r io r . A s e g u n d a d i z r e s p e it o a s i t u a ç õ e s e m q u e n o v o s E s t a d o

s u r g e m a p a r t i r d e o u t r o s j á e x is t e n t e s . N e s s e c a s o , f a la m o s e m f r a c i o n a m e n t o

(q u a n d o u m a p a rte d o t e r r it ó r io d e u m E s t a d o é d e s m e m b ra d a e se c o n s tit u i

u m n o v o E s t a d o ) o u e m u n i ã o ( q u a n d o d o is o u m a i s E s t a d o s s e r e ú n e m p a r a

fo rm a r u m n o v o E s ta d o ).

Teorias naturalistas

A s t e o r ia s n a t u r a lis t a s b u s c a m e x p lic a r a fo rm a ç ã o o r ig in á r ia d o E s ta d o a

p a r t i r d e u m a c o n d iç ã o e s p o n t â n e a d o s e r h u m a n o . S e g u n d o e s s a s t e o r i a s ,

h a v e r ia u m a f o r m a ç ã o e s p o n t â n e a d o E s t a d o , q u e d is p e n s a q u a lq u e r a to v o lu n ­

t á r i o d a c o m u n id a d e . A s s i m , o s u r g im e n t o d o E s t a d o n ã o d e p e n d e d e q u a lq u e r

a to e s p e c íf ic o d o h o m e m , m a s s e r ia p ro d u to d a s u a n a t u r a l c a m in h a d a e m

s o c ie d a d e . T r a t a - s e , p o r t a n t o , d e u m a f o r m a ç ã o n a t u r a l e , d e s s a f o r m a , n ã o

c o n tra tu a l d o E sta d o .

A f o r m a ç ã o n a t u r a l d o E s t a d o é a s s i m d e f e n d id a p o r D a r c y A z a m b u j a :

[...] só um falo c perm anente c dele prom anam outros fatos perm anentes: o ho­
mem sem pre viveu em sociedade. A sociedade só sobrevive pela organização,
que supõe a autoridade e a liberdade com o elem entos essenciais; a sociedade
que alinge determ inado grau de evolução passa a constituir um hstado. Para
viver fora da sociedade, o hom em precisaria e sta r abaixo dos hom ens ou
acim a dos deuses, com o disse A ristóteles, e vivendo em sociedade ele natural
e necessariam ente cria a autoridade e o Kstado (A ZA M BU JA , 2008, p. 109).

A s p r i n c i p a i s c a u s a s n ã o c o n t r a t u a is p a r a o s u r g im e n t o d o E s t a d o s ã o s is t e ­

m a t i z a d a s p o r D a l m o d e A b r e u D a l l a r i d a s e g u in t e f o r m a ( D A L L A R I , 2 0 1 3 ) :

O r i g e m f a m i l i a r — c o n s id e r a q u e o n ú c le o f a m i l i a r é a c é lu la - m ã e d a s o c i e ­

d a d e p o lí t i c a . D e f a t o , a p a r t i r d a r e u n iã o d e d i v e r s a s f a m í l i a s , a c o m p le x id a d e

d o g r u p o s o c ia l a u m e n ta e , a s s im , s u rg e o E s t a d o e n q u a n to f ig u r a d e r e u n iã o

d a c o m u n id a d e . E s s a fo i a p ro p o s ta d e F u s t e l d e C o u la n g e s a o t r a t a r d o s u r ­

g im e n t o d o E s t a d o g r e g o e d o E s t a d o r o m a n o .
Origem do Estado
-

O r ig e m v io le n t a — c o n s id e r a q u e o E s t a d o é o r e s u lt a d o d a n a t u r a l s u ­

p e r io r id a d e d e f o r ç a d e d e t e r m in a d o g r u p o s o b re o u t r o . A s s i m , le m b r a

D a r c y A z a m b u ja q u e o E s t a d o é , d u r a n t e o s s e u s p r im e ir o s e s t á g io s , u m a

o r g a n i z a ç ã o im p o s t a p e lo v e n c e d o r p a r a m a n t e r a d o m i n a ç ã o d o v e n c i d o
t

( A Z A M B U J A , 2 0 0 8 ) . E t a m b é m d e n o m in a d a t e o r i a d a v i o l ê n c i a o u t e o r i a

d a c o n q u is t a .

O r ig e m e c o n ô m ic a — c o n s id e r a q u e a r e u n i ã o d o s u je i t o e m t o r n o d e u m

a p a r a t o d e p o d e r o r g a n iz a d o d e c o r r e d e m o t iv o s e c o n ô m ic o s . A s s i m , o E s t a d o

p r o p o r c io n a a r e u n i ã o d e v a r i a d o s i n t e r e s s e s , j á q u e n i n g u é m é b a s t a n t e e m

s i. M a i s d o q u e i s s o , e s s a t e o r i a d e s t a c a q u e o E s t a d o p r o p o r c io n a a d i v i s ã o

d o t r a b a lh o e a in t e g r a ç ã o d e d i v e r s a s a t i v i d a d e s d if e r e n t e s . A l g u n s a u t o r e s ,

c o m o M a r x e E n g e l s , v ã o a o e x t r e m o d e s s a t e o r ia p a r a e x p l i c a r a s r a z õ e s p e la s

q u a is o E s t a d o a u t o r i z a t a n t a s d e s i g u a l d a d e s : n a s u a o r ig e m e c o n ô m i c a , e le

i n s t i t u c i o n a l i z o u a p r o p r ie d a d e p r i v a d a , o a c ú m u lo d e p a t r i m ô n i o , a d i v i s ã o

d e c l a s s e e , p o r c o n s e q u ê n c i a , a lu t a e n t r e e la s . S o b r e o t e m a , c o n f i r a a c r í t i c a

d e D a r c y A z a m b u j a ( 2 0 0 8 , p . 1 0 3 ):

Q uanto à luta dc classcs, o que a história e a sociologia têm dem onstrado


é que ela sem pre existiu com o tam bém sem pre existiu a cooperação entre
as classes; que o Estado possa ser frequentem ente instrum ento dessa luta
é dem onstrável; m as, que ele tenha nela sua origem , é história distorcida e
sociologia para propaganda política.

O r i g e m n o d e s e n v o lv i m e n t o i n t e r n o — c o n s id e r a q u e t o d a s o c ie d a d e h u m a n a

t e m u m E s t a d o e m p o t e n c ia l q u e s u r g i r á à m e d id a q u e a s u a c o m p l e x i d a d e

a u m e n t a r. A s s i m , u m a s o c ie d a d e p o u c o d e s e n v o lv id a d is p e n s a a fig u r a d o

E s t a d o , m a s u m a s o c ie d a d e c o m m a io r d e s e n v o lv i m e n t o t e m p o r n e c e s s id a d e

o s u r g im e n t o d o E s t a d o . H á , e m r a z ã o d i s s o , u m s u r g i m e n t o d o E s t a d o n a t u ­

r a lm e n t e d e c o r r e n t e d o p r o g r e s s o d e u m a s o c ie d a d e .

Teorias contratualístas

A s t e o r ia s c o n t r a t u a lís t a s b u s c a m e x p lic a r a fo rm a ç ã o o r ig in á r ia d o E s ta d o a

p a r t ir d e u m a to v o lu n t á r io d o s e r h u m a n o . S e g u n d o e s s a s t e o r ia s , a fo rm a ç ã o

d o E s t a d o d e p e n d e d e u m a c o n v e n ç ã o e x p r e s s a r e a l i z a d a e n t r e o s in t e g r a n t e s

d e u m a s o c ie d a d e . A s s i m , e m l i n h a s g e r a is , o s u r g im e n t o d o E s t a d o d e p e n d e r ia

d e u m a t o c o n c r e t o d e r e u n i ã o e a c e it a ç ã o , p o r a lg u n s d e n o m in a d o c o n t r a t o

s o c ia l. T ra ta - s e , p o rta n to , d e u m a fo rm a ç ã o c o n tra tu a l d o E s ta d o .
Origem do Estado

P a r a o p e n s a m e n t o c o n t r a t u a lis t a , a s o c ie d a d e e o E s t a d o s à o c r ia ç õ e s

a r t i f i c i a i s d a r a z à o h u m a n a , d e r iv a d a s d e u m c o n s e n s o , t á c it o o u e x p r e s s o , d a

m a io r ia d o s in d iv íd u o s p a ra e n c e r r a r o e s ta d o d e n a t u r e z a e in ic ia r o e sta d o

c i v i l . A s s i m , a o r ig e m e a le g it im a ç ã o d o E s t a d o s ã o u m a d e c o r r ê n c ia d o

c o n t r a t o e n t r e o s in d iv íd u o s ( M O R A I S ; S T R E C K , 2 0 1 0 ). O p e n s a m e n to

c o n t r a t u a lis t a , e n t r e ta n t o , n à o é u n if o r m e , m e re c e n d o e s p e c ia l a te n ç ã o a s

id e ia s d e H o b b e s , L o c k e e R o u s s e a u .

N e s s e s e n t id o , H o b b e s d e s t a c a q u e , a n t e s d a v id a e m s o c ie d a d e , o h o m e m s e

e n c o n t r a v a e m u m a f a s e p r i m i t i v a , c a r a c t e r i z a d a p e la in s e g u r a n ç a e in c e r t e z a

c o n s t a n t e s . N o e s ta d o d e n a t u r e z a , p a r a e le , h a v e r ia u m a e te r n a g u e r r a d e

t o d o s c o n t r a t o d o s , d e r i v a d a d o c a r á t e r e m in e n t e m e n t e n e g a t iv o d o h o m e m

— q u e n à o p o s s u i u m a n a t u r e z a b o a . A s s i m , c o m o in t u it o d e p r e s e r v a r a

p r ó p r ia v i d a , o s e r h u m a n o la n ç a m ã o d e u m p a c t o e m q u e s e d e s p o ja d o s s e u s

d ir e i t o s e m d e t r im e n t o d e s e g u r a n ç a . E n t r e t a n t o , c o m o a t r a n s g r e s s ã o é ín s i t a

a o h o m e m , p a r a g a r a n t i r o c u m p r im e n t o d o p a c t o s o c i a l , o g r u p o e n t r e g a o

p o d e r s o c i a l p a r a u m n o v o s u je i t o , q u e ¿ j u s t a m e n t e o E s t a d o . P o r e s s a r a z ã o ,

a t e o r ia c o n t r a t u a l i s t a d e H o b b e s j u s t i f i c a , a u m s ó t e m p o , o s u r g i m e n t o d a

s o c ie d a d e o r g a n iz a d a (e s ta d o c i v i l ) e d o E s t a d o . C u r io s a m e n t e , a f ig u r a é

c h a m a d a , p o r H o b b e s , d e L e v ia t ã ( “ m e ta d e m o n s tr o e m e ta d e d e u s m o r t a l” ),

e n t e c a p a z d e g a r a n t i r a p a z e a d e f e s a d a v i d a d o s s e u s s ú d it o s ( M O R A I S ;

S T R E C K , 2 0 1 0 , p . 3 2 ).

O pensam ento do autor inglês traz am plos poderes para o soberano, já que
nào há parâm etros naturais para a ação estatal, um a que pelo contrato o ho­
mem se despoja de tudo, exceto da vida, transferindo o asseguram ento dos
interesses à sociedade politica, esp eciticam ente ao soberano. O Hstado e o
Direito se constroem pela dem arcação de lim ites pelo soberano que, por nào
ser partícipe na convenção instituidora c, recebendo por todo desvinculado
o poder dos indivíduos, tem aberto o cam inho para o arraigam ento de sua
soberania (M O RA IS; STREC K , 2010, p. 34).

A s s im , e m H o b b e s , o E s ta d o “ já n a s c e c o m p o d e re s su p re m o s ” ( D I N I Z ,

2 0 0 1 , p . 1 5 2 ).

R e a f ir m a m o s q u e , p a ra H o b b e s , é a m a n u t e n ç ã o d o p a c to s o c ia l q u e

p o s s ib ilit a a e x is t ê n c ia d e p a z e n t r e o g r u p o s o c ia l. A s c o n d iç õ e s p a r a o

c u m p r im e n t o d o c o n t r a t o , p o r s u a v e z , s à o u m a p r o v id ê n c ia d o s o b e r a n o

— a u t o r iz a d o a “ v e la r p a r a q u e o t e m o r a o c a s t ig o s e ja u m a f o r ç a m a io r

q u e o f a s c í n i o e x e r c id o p e lo d e s e jo d e q u a lq u e r v a n t a g e m p o s s a e s p e r a r d e

u m a v i o l a ç ã o d o c o n t r a t o ” ( D I N I Z , 2 0 1 0 , p . 1 6 1 ). C o m e f e it o , p a r a H o b b e s ,

a s u b m is s ã o a b s o lu t a é o p r e ç o a s e r p a g o p e lo s ú d it o p e la s a l v a ç ã o t r a z i d a
Origem do Estado
-

p e lo E s t a d o ( D I A S , 2 0 1 3 ) . P o r e s s a r a z ã o , o s e u p e n s a m e n t o é i n s p i r a ç ã o d o

m o d e lo a b s o l u t is t a .

A o p e n sa m e n to d e H o b b e s , c o n tra p õ e -s e L o c k e — d e fe n s o r d a s lib e r d a ­

d e s i n d i v i d u a i s e f e r v o r o s o a n t a g o n is t a d o m o d e lo a b s o l u t is t a . P a r a e le , n o

e s ta d o d e n a t u r e z a , o h o m e m j á p o s s u i u m d o m ín io r a c io n a l d e s u a s p a ix õ e s

e s e u s in t e r e s s e s , d e m o d o q u e n ã o s e p o d e c o n s id e r a r a e x is t ê n c ia d e u m a

g u e r r a p o t e n c ia l. P e lo c o n t r á r i o , n e s s e e s t á g io i n i c i a l d a s o c i e d a d e , h á u m a

p a z r e l a t i v a q u e p e r m it e a o h o m e m i d e n t i f i c a r o s s e u s l i m i t e s e r e c o n h e c e r

a e x is t ê n c ia d e a lg u n s d ir e it o s . D e fa to , n o p e n s a m e n to d e L o c k e , e x is t e m

d i v e r s o s d ir e i t o s in a t o s a o h o m e m , c o m o a v i d a , a lib e r d a d e e a p r o p r ie d a d e .

F a lt a , p o r é m , u m a fo r ç a c o e r c it iv a a p ta a s o lu c io n a r c o n f lit o s q u e p o s s a m

s u r g ir ( M O R A I S ; S T R E C K , 2 0 1 0 ).

A n e c e s s id a d e d e u m a f o r ç a c o e r c i t i v a p a r a a s s e g u r a r a p r o t e ç ã o d o s d ir e it o s

in a t o s a o h o m e m c o n d u z à e la b o r a ç ã o d e u m p a c t o e n t r e o s in t e g r a n t e s d a

s o c ie d a d e . S u r g e , e n t ã o , o c o n t r a t o s o c i a l c o m o f e r r a m e n t a d e le g it im a ç ã o d o

p o d e r e d e m a n u te n ç ã o d o s d ir e it o s n a t u r a is . A s s im , o p a c to s e s u s te n ta n a

n e c e s s id a d e d e p r o t e ç ã o d e d i r e i t o s p r e v ia m e n t e e x i s t e n t e s e n a s u a p r o t e ç ã o

c o n t r a p o s s í v e i s c o n f l i t o s . S u r g e m , a s s i m , o e s t a d o c i v i l e a fo n t e d a a u t o r id a d e

e s t a t a l. V e r i f i c a m o s , n e s s e p a n o r a m a , o c a r á t e r i n d i v i d u a l i s t a d e L o c k e : o

s u r g im e n t o d o e s t a d o c i v i l s e d á p a r a r e s g u a r d a r o s d i r e i t o s n a t u r a i s d e c a d a

s u je it o ( M O R A I S ; S T R E C K , 2 0 1 0 ), e m e s p e c ia l, a p r o p r ie d a d e ( A P P I O ,

2 0 0 5 ). O p o d e r d o E s t a d o , n e s s a lin h a , j á s u rg e lim it a d o a o s d ir e it o s n a t u r a is

a n te s e x is t e n t e s .

C o m o p o d e m o s p e r c e b e r , e n q u a n t o H o b b e s v i a n o E s t a d o u m e n t e p le ­

n ip o t e n t e , L o c k e id e n t if ic a n o E s t a d o u m e n te c o m p o d e r d e lim it a d o . P o r

e s s a r a z ã o , d e f e n d e e le q u e o s s u je i t o s d o c o n t r a t o p o d e m s e o p o r a o E s t a d o

q u a n d o h o u v e r v i o l a ç ã o a d i r e i t o s n a t u r a i s . E x i s t e , p o is , d i r e i t o d e r e s i s t ê n ­

c i a n a s o c ie d a d e p o l í t i c a d e f e n d id a p o r L o c k e ( M O R A I S ; S T R E C K , 2 0 1 0 ) .

A i n d a , p a r a e le , q u a n d o j á in s t a u r a d o s a s o c ie d a d e e o E s t a d o , a lé m d o l i m i t e

in ic ia l d e c o rr e n te d o s d ir e it o s n a t u r a is , d e v e r á s e r o b s e r v a d o o p r in c íp io

d a m a i o r i a . A s s i m , h a v e r á u m a p r o e m i n ê n c ia d o P o d e r L e g i s l a t i v o s o b r e o

P o d e r E x e c u t iv o ( M O R A I S ; S T R E C K , 2 0 1 0 ). A lé m d is s o , a o b s e r v â n c ia d a

le i é i m p o s i t i v a , p o r q u e é f u n d a d a n o p r ó p r io c o n t r a t o s o c i a l — o d e ix a r de

s e g u i r a le i c r i a d o p e lo P o d e r L e g i s l a t i v o é o m e s m o q u e q u e r e r r e t o r n a r a o

e sta d o n a tu ra l ( A P P I O , 2 0 0 5 ).
Origem do Estado

Fique atento

No pensamento de Locke, o soberano é limitado pelos direitos naturais e pela própria


sociedade civil. Vale lembrar que Locke, além de ser o pai do liberalismo, é considerado
uma das maiores influências históricas da Revolução Inglesa (1688) e da Revolução
Americana (1776).

O p e n s a m e n t o d e R o u s s e a u t a m b é m é d ig n o d e r e f e r ê n c ia J á q u e c o n f i r m a

a e v o lu ç ã o d a o r ig e m d o E s t a d o d e u m m o d e lo a b s o l u t is t a p a r a u m m o d e lo

d e m o c r á t ic o . C o m R o u s s e a u , a te s e d o e s ta d o d e n a t u re z a a p e n a s f a c ilit a o

e n t e n d im e n t o d a s o c ie d a d e . N a r e a li d a d e , a f o r m a ç ã o d e u m a s o c ie d a d e t e r ia
r

m a io r c a r á t e r h i s t ó r i c o . E c é le b r e a s u a a f i r m a ç ã o d e q u e , q u a n d o o p r i m e i r o

h o m e m r e i v i n d ic o u p r o p r ie d a d e e o s d e m a is , in g ê n u o s , a c e it a r a m , t e r ia s u r g id o

a s o c ie d a d e . A s s i m , a n o ç ã o d e e s t a d o d e n a t u r e z a é e m p r e s t a d a a p e n a s p a r a

i l u s t r a r o c o n t r a t o s o c i a l e a le g it im id a d e d o p o d e r s o c i a l .

N a c o m p r e e n s ã o d e R o u s s e a u , p a r a m a n t e r a lib e r d a d e e a ig u a ld a d e d o

in d iv íd u o , p ro p ò e - s e q u e o c o n t r a t o s o c ia l s e ja u m a e n tre g a d o p a r t ic u la r (v o n ta d e

i n d i v i d u a l ) p a r a o g e r a l (v o n t a d e g e r a l) , d e m o d o q u e , q u a n d o o c o r r e a in c u r s ã o

n o e s t a d o c i v i l , n à o h á u m a a b d ic a ç ã o d a lib e r d a d e , m a s s im u m a e n t r e g a d e la

p a r a t o d a a c o m u n id a d e . E , c o m o o s u je it o f a z p a r t e d o g r u p o s o c i a l , n ã o h á

q u a l q u e r p e r d a . P e lo c o n t r á r i o , n o p a c t o s o c i a l , o i n d i v í d u o m a n t é m a s u a

c o n d iç ã o d c lib e r d a d e e ig u a ld a d e . E , p o is , n o p r i n c í p i o d a v o n t a d e g e r a l q u e

r e s id e a le g it im id a d e d o p o d e r e m R o u s s e a u ( M O R A I S ; S T R E C K . , 2 0 1 0 ). N e s s a

li n h a d e e n t e n d im e n t o , o p o d e r n ã o d e c o r r e d a s u b m is s ã o a u m t e r c e ir o , m a s

d a u n iã o h a v id a e n t r e ig u a i s . T r a t a - s e d e c o n c e p ç ã o n a q u a l c a d a u m r e n u n c ia

a s e u s in t e r e s s e s p a r t ic u la r e s e m d e t r im e n t o d a c o le t i v id a d e . C o n f i r a :

Enfim , dando-se cada um a todos, nào se dá a ninguém , e com o não haverá


nenhum associado sobre o qual não se adquira o m esm o direito que se cedeu,
ganha-se o equivalente a tudo que se perde e m ais força para se conservar
aquilo que se tem. Se, afinal, retira-se do pacto social aquilo que não pertence
à sua essência, verem os que ele se reduz aos seguintes term os: cada um põe
em com um sua pessoa e todo seu p o d er sob suprem a d ireção da vontade
geral; e enquanto corpo, recebe-se cada m em bro com o parte indivisivel do
todo (ROUSSEAU, 2017, p. 24).
Origem do Estado
-

A p r im o r d ia l c o n t r ib u iç ã o d e s s e p e n s a m e n to é o to m d e m o c r á t ic o : é in ­

d is p e n s á v e l o r e s p e i t o à v o n t a d e g e r a l e n c a r n a d a n a m a i o r i a . O p o d e r , n e s s a

p a s s a g e m , n à o m a is p e r t e n c e a u m p r í n c i p e o u o l i g a r c a , m a s à p r ó p r i a c o ­

m u n id a d e . T r a z , p o r o u t r o la d o , a p r o b le m á t ic a r e v e r s a : R o u s s e a u c o n s a g r a o

d e s p o t is m o d a m a i o r i a e s u f o c a q u a lq u e r p e n s a m e n t o p o l í t i c o c o n t r á r i o à v o z

d o m in a n t e ( M O R A I S ; S T R E C K , 2 0 1 0 ) . S e j a c o m o f o r , n o s e u p e n s a m e n t o , h á

u m a in e g á v e l p r o p o s t a d e l i m i t a ç ã o d o E s t a d o , j á q u e o s o b e r a n o n ã o t e m o

d ir e i t o d e s o b r e c a r r e g a r u m i n d i v í d u o e m d e t r im e n t o d o o u t r o ( D I A S , 2 0 1 3 ) :

A ssim , fica claro que o poder soberano, por m ais que seja totalm ente abso­
luto, sagrado e inviolável, nào ultrapassa nem pode ultrap assar os lim ites
das convenções gerais, e que todo homem pode dispor plenam ente dos seus
bens e da sua liberdade naquilo que foi estipulado por essas convenções; de
m odo que o soberano nunca tem direito de sobrecarregar m ais um súdito que
o outro, um a vez que seu poder nâo é m ais com petente, quando o assunto se
torna particular” (ROUSSEAU, 2017, p. 40).

A i m p o r t â n c i a d a t e o r ia c o n t r a t u a l i s t a d a f o r m a ç ã o d o E s t a d o é i n e g á v e l ,

j á q u e n ã o a p e n a s r e v e la a p ro te ç ã o d e d ir e it o s d o in d iv íd u o c o m o ta m b é m

e n u n c ia q u e o E s t a d o , d e s d e a s u a o r ig e m , é l i m i t a d o .

Referências

APPIO, E. Teoria geral do Estado e da constituição. Curitiba: Juruá, 2005.

AZAMBUJA, D. Teoria geral do Estado. 4. ed. São Paulo: Globo, 2008.

BONAVIDES, P. Ciência política. 16. ed. São Paulo: Malheiros, 2009.

DALLARI, D. de A. Elementos de teoria geral do Estado. 32. ed. São Paulo: Saraiva, 2013.

DIAS, R. Ciência política. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2013.

DINIZ, A. C. de A. Direito, Estado e contrato social no pensamento de Hobbes e Locke:


uma abordagem comparativa. Revista de Informação Legislativa, Brasília, v. 29, n. 152,
outydez. 2001.

MORAIS, J. L. B. de; STRECK, L. L. Ciência política e teoria do Estado. 7. ed. Porto Alegre:
Livraria do Advogado, 2010.

ROUSSEAU, J.-J. Do contrato social. Petrópolis: Editora Vozes, 2017.


\ _________________________________________________________________________________________________________ J
Elementos constitutivos
do Estado
s ------------------ Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

■ Identificar os elementos constitutivos do Estado.


■ Diferenciar os conceitos de povo e nação.
■ Explicar os conceitos de soberania, poder e território.

Introdução-------------------------------------- s
A identificação dos elementos que constituem o Estado não deixa de ser
uma preocupação sobre a própria definição de Estado. Em razão disso,
conhecer os elementos que constituem essa relevante sociedade política
permite o aprofundamento do seu conceito. Ainda, essa reflexão instiga
um debate sobre outros relevantes temas da teoria geral do Estado,
como a diferença entre povo e nação, soberania e poder, e o papel do
território para a sociedade.
Neste capítulo, você estudará os elementos constitutivos do Estado,
bem como aprenderá a diferença entre povo e nação, identificando os
conceitos de soberania, poder e território.

O Estado e os seus elementos


A i d e n t if ic a ç ã o d o s e le m e n t o s q u e c o n s t i t u e m o E s t a d o é , e m ú l t i m a a n á l i s e ,

u m p r o b le m a s o b r e a p r ó p r i a d e f i n i ç ã o d e E s t a d o . B e m e n t e n d id o o q u e é

o E s t a d o , n à o r e m a n e s c e m d i f i c u l d a d e s n a i d e n t if ic a ç ã o d o s s e u s e le m e n t o s .

O c o r r e q u e f o i lo n g a a a f i r m a ç ã o h i s t ó r i c a d e s s a s o c i e d a d e p o l í t i c a , r a z ã o

p e la q u a l m u i t o s c o n s i d e r a m q u e a d e f i n i ç ã o é h i s t o r i c a m e n t e d e p e n d e n t e

d o s p r e s s u p o s t o s d e s u r g im e n t o d o E s t a d o . A lg u n s a in d a le m b r a m q u e a

i d e n t if ic a ç ã o d e s s e s e le m e n t o s n ã o e x c l u i a c o m p l e x i d a d e p r e s e n t e e m c a d a

s o c ie d a d e p o l í t i c a ( M O R A I S , 2 0 1 0 ) .
Elementos constitutivos do Estado
-

A p e s a r d e a e x p r e s s ã o E s t a d o t e r s e d if u n d id o c o m o p e n s a m e n to d e

M a q u ia v e l, n ã o se p o d e n e g a r a p r e s e n ç a d e a lg u m a a u t o r id a d e s o b re u m

a g r u p a m e n t o s o c i a l e m t e m p o s m u it o a n t e r io r e s . D e f a t o , a p e s a r d e a e x p r e s ­

s ã o s e r m a is r e c e n te , j á se r e g is t r a v a , n o p a s s a d o , o d e b a te s o b re a pólisy n a
G r é c ia A n t ig a , o u s o b re a re spublicae, n o Im p é r io R o m a n o . M e s m o n a é p o c a

m o d e r n a , a lg u n s a u t o r e s e m p r e g a r a m o u t r a s e x p r e s s õ e s , c o m o civitas , p a ra

d e s i g n a r a s o c ie d a d e p o l í t i c a o r g a n i z a d a ( B O N A V I D E S , 2 0 0 9 ) .

S o b r e u m a p o s s í v e l d e f i n i ç ã o d o E s t a d o , P a u lo B o n a v i d e s ( 2 0 0 9 ) r e g is t r a

q u e o t e r m o p o d e s e r e m p r e g a d o e m s e n t id o s d if e r e n t e s , c o n f o r m e a p e r s p e c t iv a

d e a n á l i s e , q u e s e r i a m a s s e g u in t e s :

A c e p ç ã o f i l o s ó f i c a — a b o r d a o E s t a d o d e s d e u m a p e r s p e c t iv a m o r a l e id e a l.

E o p e n s a m e n t o d e H e g e l, q u e c o n s id e r a o E s t a d o u m a v e r d a d e ir a s u b s t â n c ia

é t ic a d e s i m e s m a ; a p o g e u d e u m a d ia lé t ic a f ilo s ó f i c a q u e c o n c i l i a a c o n t r a d iç ã o

h a v id a e n t r e a f a m í l i a e a s o c ie d a d e .

A ce p çã o ju r íd ic a — c o n s id e r a q u e o E s t a d o é a m a n i f e s t a ç ã o c o n c r e t a d a

o r d e m j u r í d i c a v ig e n t e . N a p e r s p e c t iv a j u r í d i c a , a d e f in iç ã o é p u r a m e n t e a r t i ­

f i c i a l e n ã o a p r e s e n t a d a d o s d a r e a li d a d e e m p í r i c a . P o r i s s o , o s a d e p t o s d e s s a

c o r r e n t e d e s t a c a m o p a p e l d o D i r e i t o e d a r e g u l a ç ã o s o c i a l n a id e n t if ic a ç ã o d o

E s t a d o . É a p r o p o s t a , p o r e x e m p lo , d e H a n s K e l s e n e d e G i o r g i o D e l V e c c h i o .

A c e p ç ã o s o c i o l ó g i c a — b u s c a a id e n t if ic a ç ã o d o E s t a d o a p a r t i r d e e le m e n t o s

c o n c r e t o s e d a p r ó p r ia s o c ie d a d e . C o n s id e r a , p o rta n to , q u e a c o m p r e e n s ã o

d o E s t a d o é d e p e n d e d o s e u e n t o r n o . A s s i m , a o r g a n iz a ç ã o d a s o c ie d a d e

r e p re s e n ta u m a in f lu ê n c ia d ir e t a p a r a o q u e s e e n te n d e p o r E s t a d o . E s s a s

in f lu ê n c ia s e x t e r n a s , q u e p o d e m s e r d e v a r ia d a s o r d e n s , t r a z e m a c o n c e p ç ã o

s o c io ló g ic a . E s t á p r e s e n t e , p o r e x e m p lo , e m K a r l M a r x , e m F r a n z O p p e n h e im e r

e c m L e o n D u g u it .

T a m b é m h á p o lê m ic a s o b r e q u a is s e r ia m o s e le m e n t o s e s s e n c i a is d o E s t a d o .

A l g u n s a p o n t a m d o is e le m e n t o s : s o b e r a n ia e t e r r i t ó r i o ( S a n t i R o m a n o ) . O u t r o s

in d ic a m t r ê s c a r a c t e r ís t ic a s : p o v o , t e r r i t ó r i o e p o d e r ( J e l l i n e k ) . A l g u n s p r o p õ e m

q u e s e j a m a g r e g a d o s o u t r o s e le m e n t o s , c o m o a f i n a l i d a d e o u , a t é m e s m o ,

a r e g u l a ç ã o d a v i d a s o c i a l c o m o p r e t e n d ia A t a l i b a N o g u e i r a ( D A L L A R I ,

2 0 1 3 ). A p r in c ip a l d is c u s s ã o , s e m g ra n d e r e p e r c u s s ã o p r á t ic a , g ir a c m to rn o

d a i n c l u s ã o d a f i n a l i d a d e e s t a t a l n o s s e u s e le m e n t o s . O c o r r e q u e n ã o e x i s t e

s o c ie d a d e o r g a n i z a d a s e m u m o b je t iv o c o m u m . A s s i m , a i n d a q u e n ã o s e t r a t e

d e e le m e n t o d o E s t a d o , a lg u m a f i n a l i d a d e e s t a r á p r e s e n t e .
Elementos constitutivos do Estado

D e to d o m o d o , se a d e f in iç ã o d o E s t a d o te m c a r á t e r h is t ó r ic o , fo i c o m

o a d v e n t o d o c h a m a d o E s t a d o M o d e r n o q u e a d e f in iç ã o m a is a c e it a fo i

d i f u n d i d a . A s s i m , é c o m J e l l i n e k q u e s e v e r i f i c a m o s e le m e n t o s e s s e n c i a i s

d o E s t a d o . P a r a e le , o E s t a d o “ é a c o r p o r a ç ã o d c u m p o v o , a s s e n t a d o n u m

d e t e r m in a d o t e r r i t ó r i o e d o t a d a d e u m p o d e r o r i g i n á r i o d e m a n d o ” ( B O N A ­

V I D E S , 2 0 0 9 , p . 7 0 ).

Povo e nação

A e x p r e s s ã o p o v o c a r r e g a , n o s d ia s a t u a i s , u m a i n e v i t á v e l c a r g a id e o ló g ic a . O

t e r m o f o i e m p r e g a d o p o r v a r i a d a s r a z õ e s e e m d if e r e n t e s c o n t e x t o s h i s t ó r i c o s ,

o q u e e x ig e a q u i u m a a p re s e n ta ç ã o p a ra e v it a r c o n fu s õ e s . O p r im e ir o p a s s o

é s i m p l ó r i o : a p a l a v r a p o v o d e s ig n a o e le m e n t o s u b je t i v o , o u p e s s o a l, p a r a a

e x is t ê n c ia e a c o n s t it u iç ã o d o E s t a d o . A s s im , s e m u m p o v o , n à o h á E s t a d o .

O p o v o n à o s e c o n f u n d e c o m a p o p u l a ç ã o . M a r c e l o C a e t a n o le m b r a q u e

e s t a ú l t i m a d e s ig n a a p e n a s a e x p r e s s ã o n u m é r i c a , d e m o g r á f i c a o u e c o n ô m ic a ,

is t o é , o c o n ju n t o d e p e s s o a s q u e e s t ã o n o t e r r i t ó r i o d e u m E s t a d o , a in d a q u e

t e m p o r a r ia m e n t e . C o m c e r t e z a , s im p le s m e n t e e s t a r n o t e r r it ó r io n à o é s u f ic ie n t e

p a r a e v i d e n c i a r a e x i s t ê n c i a d e a lg u m v í n c u l o j u r í d i c o c o m e s s e E s t a d o . P o r

e s s a r a z à o , p o p u la ç ã o e p o v o n à o p o d e m s e r c o n s id e r a d o s s i n ô n i m o s à l u z

d a c iê n c ia p o lít ic a .

O p o v o ta m b é m n ã o se c o n fu n d e c o m a n a ç à o . A e x p re s s ã o n a ç ã o , v ig o ­

r o s a m e n t e u t i l i z a d a d u r a n t e a R e v o l u ç ã o F r a n c e s a , o c a s io n o u o s u r g im e n t o

d a n a c i o n a li d a d e e , j á n o s é c u lo X I X , p a s s o u a s e r s in ô n im o d c E s t a d o p a r a

a l g u n s . N a a t u a l i d a d e , p o r é m , o t e r m o n a ç à o g a n h a u m a c o n o t a ç ã o d if e r e n t e

e s e a f a s t a d a s c a r a c t e r í s t i c a s d o E s t a d o p a r a d e s i g n a r o s la ç o s h i s t ó r i c o s e

c u lt u r a is d e u m a c o m u n id a d e . É , p o rt a n t o , o v ín c u lo h is t ó r ic o e c u lt u r a l d e

u m a s o c ie d a d e e q u e s e m a n if e s t a , p o r e x e m p lo , e m u m m e s m o c o n t e x t o

d e t r a d i ç õ e s , e m u m a l í n g u a c o m u m e e m u m a id e n t id a d e d e v a l o r e s o u d e

c r e n ç a s ( D A L L A R I , 2 0 1 3 ).

Fique atento

Quando se fala em povo, portanto, há um sentido específico a ser identificado. Trata-se,


como você pode perceber, de uma conquista recente.
V_____________________________________________________________________________________________________________
Elementos constitutivos do Estado
-

A s s i m , a n o ç à o d c p o v o e m p r e g a d a p e lo s g r e g o s e r o m a n o s é a p e n a s u m

in d ic a t iv o m u it o d is t a n t e . P a r a a q u e la s s o c ie d a d e s , a e x p r e s s ã o p o v o e ra

s in ô n im o d e c i d a d à o , is t o é , i n d i v í d u o a u t o r i z a d o a p a r t i c i p a r d a s o c ie d a d e

p o lí t i c a e t o m a r d e c is õ e s q u e a f e t a s s e m a c o le t i v id a d e . N e s s e s d o is e x e m p lo s , a

m a io r i a d o s s u je it o s n ã o e r a c o n s id e r a d a c id a d ã e , p o r t a n t o , t a m b é m n à o f a z i a

p a r t e d o p o v o , a in d a q u e in t e g r a s s e a m e s m a s o c ie d a d e p o lí t i c a . E , p o r s é c u lo s ,

a h is t ó r ia d o p o v o fo i a h is t ó r ia d a s e g re g a ç ã o e n tre c la s s e s d e u m a m e s m a

s o c ie d a d e . D e f a t o , a in d a n a R e v o l u ç ã o F r a n c e s a , a u t o r e s d e p e s o d e f e n d ia m

q u e o c i d a d à o d e v e r i a d e s i g n a r a p e n a s a q u e le m e m b r o d a s c l a s s e s d ir ig e n t e s

( D A L L A R I , 2 0 1 3 ) . A i n d a n o s é c u lo X V I I I , e m r a z à o d o p a p e l d a a r i s t o c r a c i a

b u r g u e s a , c r e s c e n t e e m n ú m e r o s , a d e f i n i ç ã o d e p o v o f o i a m p lia d a . N o s é c u lo

X I X , c o u b e a J e l l i n e k t r a ç a r a s l i n h a s g e r a is p a r a u m a c o m p r e e n s ã o j u r í d i c a

d a d e f in iç ã o d e p o v o .

P a r a J e llin e k (1 9 5 4 ), a e x p r e s s ã o p o v o d e v e s e r c o m p r e e n d id a a p a r t ir

d o p r ó p r io E s t a d o . A s s im , p o d e m s e r e n c o n tr a d a s d u a s p e r s p e c t iv a s : u m a

s u b je t iv a e o u tr a o b je t iv a . N a p e r s p e c t iv a s u b je t i v a , d a d o q u e o p o v o é

e le m e n t o e s s e n c i a l d o p r ó p r i o E s t a d o , a n o ç ã o r e v e l a q u e o p o v o é p a r t í c i p e

d o p o d e r p ú b lic o d o E s t a d o ( J E L L I N E C K , 1 9 5 4 ). A s s i m , q u a n d o o E s t a d o

e x e r c e a lg u m a to d e p o d e r , é ta m b é m o p o v o e m m o v im e n t o a t u a n d o . N a

p e r s p e c t i v a o b j e t i v a , s i g n i f i c a q u e e s s e s m e s m o s s u je i t o s s à o d e s t i n a t á r i o s

d a a t u a ç ã o e s t a t a l e , p o r t a n t o , s o f r e r ã o o s e f e it o s d a s d e c i s õ e s d o E s t a d o .

N e s s a d u p la p e r s p e c t i v a d e a n á l i s e , J e l l i n e k c o n c l u i q u e o s s u je i t o s d e v e m

s e r c o n s id e r a d o s , a u m s ó t e m p o , m e m b ro s d o E s t a d o , p o r is s o , e s tà o e m

u m a r e la ç ã o d e c o o r d e n a ç ã o , t it u la r iz a n d o d ir e it o s ( p e r s p e c t iv a s u b je t iv a ) e

s u b o r d in a d o s a o E s t a d o — d e s s a f o r m a , s à o t i t u l a r e s d e d e v e r e s n a s r e l a ç õ e s

de p o d er do E sta d o .

A c o n c l u s ã o d e J e l l i n e k é q u e t o d o s o s i n d i v í d u o s p a r t ic i p a n t e s d a c o n s ­

t it u i ç ã o d e u m E s t a d o t a m b é m s e r à o t i t u l a r e s d e d ir e i t o s e m f a c e d o E s t a d o

( d i r e i t o s p ú b l ic o s s u b je t i v o s ) e d e v e r ã o s e r c o n s id e r a d o s n e s s a d u p la a n á l i s e

(d ir e it o s e d e v e re s ) ( J E L L I N E C K , 1 9 5 4 ). A e x p r e s s ã o p o v o , p o rt a n t o , é s o ­

b r e m a n e i r a a la r g a d a : a g o r a t o d o s o s in t e g r a n t e s d o E s t a d o f a z e m p a r t e d o

p o v o e s à o c id a d ã o s .

J e llin e k (1 9 5 4 ), p o r é m , n à o c h e g a a r e c o n h e c e r q u e to d o in d iv íd u o p o d e

p a r t i c i p a r a t iv a m e n t e d a s d e c is õ e s d o E s t a d o . I s s o p o r q u e , n a c o m p r e e n s ã o

d e le , h a v e r ia d if e r e n ç a e n tre c id a d a n ia a t iv a e c id a d a n ia p a s s iv a . A p e n a s a

ú l t i m a a u t o r i z a r i a q u e c e r t o s s u je i t o s e x e r c e s s e m a t r i b u i ç õ e s c o m o s e f o s s e m

o p r ó p r io E s t a d o .
Elementos constitutivos do Estado

C o m a lg u m a s a d a p t a ç õ e s , a d e f in iç ã o p r o p o s t a p o r J e l l i n e k ( 1 9 5 4 ) é e m p r e ­

g a d a a té h o je . A s s i m , D a lm o d e A b r e u D a l l a r i (2 0 1 3 , p . 1 0 4 ) e x p li c a q u e p o v o é o:

[...] conjunto de indivíduos que, através de um momento jurídico, se unem para


constituir o Estado, estabelecendo com este um vínculo ju ríd ico de caráter
perm anente, participando da formação da vontade do Estado e do exercício do
poder soberano. Essa participação e este exercício podem ser subordinados, por
motivos de ordem prática, ao atendim ento de certas condições objetivas, que
assegurem a plena aptidão do individuo, lo d o s os que se integrarem no Estado,
através da vinculaçào jurídica perm anente, fixada no momento da unificação e
da constituição do Estado, adquirem a condição de cidadãos, podendo, assim,
conceituar o povo com o o conjunto dos cidadãos do Estado. Dessa forma, o
indivíduo, que no momento mesmo de seu nascim ento atende aos requisitos
fixados pelo Estado para considerar-se integrado nele é, desde logo, cidadão.

C o n c l u i m o s , p o r t a n t o , q u e p o v o é o c o n ju n t o d e c i d a d ã o s d e u m E s t a d o .

A c i d a d a n i a , p o r s u a v e z , é a d q u i r i d a q u a n d o o i n d i v í d u o é in t e g r a d o a o

E s t a d o m e d ia n t e o p r e e n c h im e n t o d e c e r t o s r e q u i s i t o s e la b o r a d o s p o r o c a s i ã o

d o p r ó p r io s u r g i m e n t o d o E s t a d o (o a t o d e s u a c o n s t i t u iç ã o ) ( B O N A V I D E S ,

2 0 0 9 ). P o d e m , a in d a , s e r e x ig id o s o u tro s r e q u is it o s p a r a q u e o c id a d ã o p o s s a

p a r t i c i p a r d a f o r m a ç ã o d a v o n t a d e d o E s t a d o e d o e x e r c í c i o d a s o b e r a n ia . S ã o

a s c o n d iç õ e s p a r a a c i d a d a n i a a t iv a .

No Brasil, adquire-se a cidadania brasileira por meio das regras constitucionais sobre
nacionalidade. Assim, por exemplo, são brasileiros natos (art. 12,1, da Constituição
Federal de 1988) (BRASIL, 1988):
■ os nascidos na República Federativa do Brasil, ainda que de pais estrangeiros, desde
que estes não estejam a serviço do seu País;
■ os nascidos no estrangeiro, de pai brasileiro ou mãe brasileira, desde que qualquer
deles esteja a serviço da República Federativa do Brasil;
■ os nascidos no estrangeiro de pai brasileiro ou de mãe brasileira, desde que sejam
registrados em repartição brasileira competente ou venham a residir na República
Federativa do Brasil e optem, em qualquer tempo, depois de atingida a maioridade,
pela nacionalidade brasileira.
Vale acrescentar que diversos cargos apenas podem ser ocupados por brasileiros natos,
o que confirma a existência de condições específicas para o exercício de algumas
funções da cidadania ativa. Assim, por exemplo, o cargo de Presidente da República é
privativo de brasileiro nato (art. 12, § 3o, da Constituição Federal de 1988) (BRASIL, 1988).
V ______________________________________________________________________________________________________________ J
Elementos constitutivos do Estado
-

P o r f i m , a n o ç à o d e p o v o f o i r e v is it a d a p o r F r i e d r i c h M ü l l e r ( 2 0 0 3 ) . P a r a o

a u t o r a le m ã o , a lé m d o p o v o d e s t in a t á r io (o s s u je it o s q u e r e c e b e m a a t u a ç ã o d o

E s t a d o ) e d o p o v o a t iv o (o s s u je it o s q u e r e a li z a m a a t u a ç ã o d o E s t a d o ) , t a m b é m

d e v e s e r c o n s id e r a d a a p r e s e n ç a d e u m p o v o le g it im a d o r (o s s u je it o s q u e j u s t i f i c a m

a a t u a ç ã o d o E s t a d o ) e d e u m p o v o íc o n e (o s s u je it o s in d e v id a m e n t e m e n c io n a d o s

c o m o fo n t e d e le g it im a ç ã o ) . A l i á s , o p o v o íc o n e m e r e c e e s p e c ia l a t e n ç à o .

Saiba mais

A respeito do povo ícone, leia O papel do processo na construção da democracia: para


uma nova definição da democracia participativa (RODRIGO; SCALABRIN, 2009).

O povo ícone é a q u e l e i n v o c a d o p e l o s s e u s r e p r e s e n t a n t e s , m a s c u j a s
d e c is õ e s n à o s ã o a t r i b u í v e i s a o p r ó p r i o p o v o e m t e r m o s d e d i r e i t o v ig e n t e ,

m a s t ã o s o m e n t e c o m o p a l a v r a v ã d e f a l s a le g it im id a d e . E m o u t r o s t e r m o s ,

s e o p o v o d it a o s c r i t é r i o s d e e s c o lh a e d e c is ã o d o E s t a d o ( q u e d e v e r á s e m p r e

a g ir e m c o n s o n â n c ia c o m o o r d e n a m e n to ju r í d i c o ) , e n tã o to d a a r e s o lu ç ã o

e s t a t a l d e v e s u b s u m ir - s e a o s t e x t o s d e m o c r a t ic a m e n t e p o s to s ( M Ü L L E R ,

2003) — e m n à o o f a z e n d o , t e r ía m o s o u s o d a p a l a v r a p o v o c o m o m e io p a r a

t o r n a r v á l i d o a lg o q u e n a o r ig e m n à o o é :

A instância prolatora da sentença [...] que nào se pode basear em textos de


norm a de m odo plausível em term os de m étodo exerce contrariam ente uma
violência que ultrapassa esse lim ite, um a violência selvagem , transbordante,
co n sistente tào som ente nesse ato que já não é co n stitu cio n al; ela exerce
um a violência “a tu a l” N esse caso a invocação do povo e ap en as icônica
(M Ü LL ER , 2003, p. 67).

D a í p o rq u e “ R o u s s e a u a b a n d o n a o d is c u r s o ic ô n ic o s o b re o p o v o . O s

a t in g id o s p e la s d e c is õ e s d e v e m s e r s im u lt a n e a m e n t e o s a u t o r e s d a s d e c is õ e s ,

o s o u t o r g a n t e s d a n o r m a d e v e m s e r id ê n t ic o s a o c o n ju n t o d e d e s t i n a t á r i o s ”

( M Ü L L E R , 2 0 0 3 , p . 7 1 ).

Soberania e poder político

O p o d e r p o l í t i c o c o m o e le m e n t o d o E s t a d o s u s c i t a a c e s a d i v e r g ê n c i a . A a c e p ­

ç ã o , q u e o r a s e c o n f u n d e c o m o c o n c e it o d e s o b e r a n ia , é , m u i t a s v e z e s , e m p r e -
Elementos constitutivos do Estado

g a d a a p e n a s p a r a f a ls a m e n t e a u t o r i z a r m a n o b r a s d e c u n h o p o l í t i c o r e a li z a d o s

p e lo E s t a d o ( D A L L A R I , 2 0 1 3 ) . N o â m b it o d o D i r e i t o I n t e r n a c io n a l P ú b l i c o , a

c r í t i c a à e x p r e s s ã o s o b e r a n ia é a in d a m a io r . N à o s e p o d e d e s c o n s id e r a r , p o r é m ,

q u e a s o b e r a n ia é a b a s e d o c h a m a d o E s t a d o M o d e r n o .

P a r a c o n f i r m a r o s e u s u r g im e n t o c o m o E s t a d o M o d e r n o , D a l m o d e A b r e u

D a l l a r i ( 2 0 1 3 ) d e s t a c a q u e o t e r m o n à o e r a e m p r e g a d o n a A n t ig u i d a d e . C o n f i r a :

Com efeito, os term os majestas , imperium e potestas , usados em diferentes


circunstâncias com o expressões de poder, ou indicam poderio civil ou m i­
litar, ou revelam o grau de autoridade de um m agistrado, ou ainda podem
externar a potência e a força do povo romano. N enhum a delas, porém , indica
poder suprem o do Estado em relação a outros poderes ou para decidir sobre
determ inadas m atérias (D A LLA R I, 2013, p. 82).

P a r a J e l l i n e k ( 1 9 5 4 ) , a a u s ê n c ia d o c o n c e it o d e s o b e r a n ia d e s s e e d o s s é c u lo s

v i n d o u r o s s e r i a a p o u c a i n f l u ê n c i a d o E s t a d o n a s r e l a ç õ e s in t e r n a s . D e f a t o ,

n ã o h a v i a u m a o p o s iç ã o d e p o d e r e s n o s E s t a d o s d a A n t i g u i d a d e . E s s e q u a d r o ,

p o r é m , m o d i f i c a - s e n o s é c u lo X I I I , q u a n d o o m o n a r c a p a s s a a a m p l i a r a s s u a s

e s f e r a s d e c o m p e t ê n c ia e c o n f l i t a c o m o u t r a s i n s t â n c i a s d e p o d e r , c o m o o s

t i t u l a r e s d a t e r r a ( o s b a r õ e s ) e o s t i t u l a r e s d a r e l i g i ã o (a I g r e j a ) . S u r g e , a s s i m ,

u m p r o b le m a d e m ú l t i p l a s s o b e r a n ia s q u e p r e c i s a m s e r e q u a c io n a d a s . C o m o

a p o g e u d a s m o n a r q u ia s , n o f i n a l d a Id a d e M é d i a , v e r i f i c a - s e q u e o c o n c e it o

d e s o b e r a n ia e s tá m a d u r o o s u f ic ie n t e p a r a s e r t e o r ic a m e n t e a p re s e n ta d o .

A s s im , e m 1 5 7 6 , B o d in a p re s e n ta n o Les six livres de la république a im p o r ­

t â n c ia d o te rm o .

P a r a J e a n B o d i n , a s o b e r a n ia é o p o d e r a b s o lu t o e p e r p é t u o d a R e p ú b l i c a ,

is t o é , d o E s t a d o . E n q u a n t o p o d e r a b s o l u t o , n à o p o d e r i a s e r l i m i t a d o p o r

q u a l q u e r o u t r o p o d e r o u c a r g o e s t a b e l e c i d o p e lo h o m e m . A s s i m , a ú n i c a

r e s t r i ç ã o p o s s í v e l s e r i a a q u e la d e c o r r e n t e d a s l e i s d i v i n a s e d a s l e i s n a t u r a i s e

q u e a n t e c e d e m o h o m e m . E n q u a n t o p o d e r p e r p é t u o , a s o b e r a n ia n ã o p o d e r ia

s e r l i m i t a d a n o t e m p o . P o r f i m , a in d a q u e n à o m e n c io n a d a e x p r e s s a m e n t e ,

a lg u n s r e c o n h e c e m q u e , j á e m B o d i n , s e r á p o s s í v e l i d e n t i f i c a r a id e ia s e g u n d o

a q u a l o t i t u l a r d a s o b e r a n ia e s t a r ia a c i m a d o d ir e i t o in t e r n o e l i v r e p a r a t o m a r

d e c is õ e s n o p la n o i n t e r n a c i o n a l .

A n o ç ã o d e s o b e r a n ia f o i t a m b é m t r a b a lh a d a p o r R o u s s e a u . P a r a e le , o t it u l a r

à s o b e r a n ia é o p o v o . C o m o o E s t a d o é f r u t o d o c o n t r a t o s o c i a l e d a v o n t a d e

g e r a l, a s o b e r a n ia s e r ia in a l i e n á v e l e i n d i v i s í v e l , v e r d a d e ir a m a n i f e s t a ç ã o a t iv a

d a v o n ta d e d a c o m u n id a d e ( D A L L A R I , 2 0 1 3 ).

T o d a s e s s a s d e f in iç õ e s , e n tre ta n to , r e v e la m o c a r á t e r p o lít ic o d a s o b e r a n ia . D e

fa to , c o m p r e e n d ia - s e a s o b e r a n ia , e m s e n tid o m a is a m p lo , c o m o o p o d e r d o E s t a d o
Elementos constitutivos do Estado
-

d e e x p r e s s a r a s u a v o n t a d e e d e e s t a b e le c e r f b r ç a d a m e n t e e s s a v o n t a d e . A n o ç ã o ,

p o r t a n t o , e r a in d ic a t iv a d a f o r ç a c o e r c it iv a e a b s o lu t a d o E s t a d o . A le g it im id a d e

d e s s e p o d e r n à o é a s u a m a r c a e s s e n c ia l, b a s ta n d o q u e s e ja in c o n t e s t á v e l (a b s o lu to ).

A p a r t i r d o s é c u lo X I X , s u r g e u m a p r e o c u p a ç ã o e m a p r e s e n t a r o c a r á t e r

j u r í d i c o d a s o b e r a n ia . D i v e r s a s t e o r i a s f o r a m f o r m u la d a s p a r a , c a d a u m a a o

s e u m o d o , t e n t a r i d e n t i f i c a r a o r ig e m e a f u n d a m e n t a ç ã o d o p o d e r p o l í t i c o

d o E s t a d o . A s s i m , h á u m a e v o lu ç ã o d a d e f i n i ç ã o , q u e a n t e s e r a m e r a m e n t e

p o lí t i c a . N e s s a p e r s p e c t iv a p u r a m e n t e j u r í d i c a , a s o b e r a n ia s e a p r e s e n t a c o m o

o p o d e r d e d e c id ir , e m ú lt im a in s t â n c ia , a s n o r m a s ju r íd ic a s e a s u a e f ic á c ia .

A s s i m , a s o b e r a n ia s e r i a u m p o d e r j u r í d i c o p a r a a t i n g i r f i n s j u r í d i c o s . C o m o

a n o ç à o d e o rd e n a m e n to ju r íd ic o é a m e s m a p a ra to d o s o s E s t a d o s , e s s a c o n ­

c e p ç ã o p e r m it e i d e n t i f i c a r u m a ig u a l d a d e e n t r e E s t a d o s . T o d o s o s E s t a d o s

c o m s o b e r a n ia e s t ã o , n o p la n o i n t e r n a c i o n a l , e m p a t a m a r id ê n t ic o .

H á t a m b é m q u e m d e f e n d a o c a r á t e r c u l t u r a l i s t a d a s o b e r a n ia ( D A L L A R I ,

2 0 1 3 ) . A s s i m , p r o p õ e M i g u e l R e a l e q u e a s o b e r a n ia é o p o d e r d e o r g a n i z a r - s e

ju r id ic a m e n t e e d e f a z e r v a le r , d e n tro d o s e u t e r r it ó r io , a u n iv e r s a lid a d e d a s

s u a s d e c is õ e s n o s l i m i t e s d o s f i n s é t i c o s d e c o n v i v ê n c i a . N e s s a p e r s p e c t i v a , a

s o b e r a n ia n à o é s i m p l e s e x p r e s s ã o d e u m p o d e r d e f a t o , m e r a m e n t e p o l í t i c o ,

m a s t a m b é m n à o e s t á in t e g r a lm e n t e s u b m e t id a a o D i r e i t o , j á q u e d e v e c o n s i ­

d e r a r ta m b é m fa to re s é t ic o s d e c o n v iv ê n c ia . P a r a M ig u e l R e a le , e s s a s e r ia a

c o r r e t a c o n c e p ç ã o p o l í t i c a d e s o b e r a n ia .

N a a t u a l i d a d e , o c o n c e it o d e s o b e r a n i a p r o g r e d iu p a r a c o n s i d e r a r d u a s

p e r s p e c t i v a s . P r i m e i r o , é p o d e r s u p r e m o d o E s t a d o , n o s e n t id o d e q u e e le

é o m a is e le v a d o p o d e r d a q u e la s o c ie d a d e e , p o r t a n t o , a ú l t i m a in s t â n c i a d c

d e c is ã o s o b re q u a lq u e r n o r m a j u r í d i c a . T r a t a - s e d e d im e n s ã o in t e r n a q u e

e v i d e n c i a a s u p e r io r id a d e d o E s t a d o s o b r e a s d e m a i s o r g a n i z a ç õ e s d a p r ó p r i a

s o c ie d a d e . S e g u n d o , é p o d e r d e i n d e p e n d ê n c i a d o E s t a d o , n o s e n t id o d e q u e

e le n à o s e s u b m e t e a p o t ê n c ia s e s t r a n g e i r a s . A s s i m , o E s t a d o é in d e p e n d e n t e

n a s s u a s r e la ç õ e s c o m o s d e m a is E s t a d o s .

Fique atento

Há quem considere que o conceito clássico de soberania passa por uma séria crise,
sendo mitigado pela comunidade internacional. É o que ocorre, por exemplo, com a
submissão do Brasil à jurisdição do Tribunal Penal Internacional (art. 5o, § 4o, da Consti­
tuição Federal de 1988 e o Estatuto de Roma, internalizado pelo Decreto Presidencial
n° 4.388, de 25 de setembro de 2002).
Elementos constitutivos do Estado

Território e localidade geográfica

A q u e s t ã o r e la c io n a d a à im p o r t â n c ia d a lo c a lid a d e g e o g r á f ic a d e u m a s o c ie d a d e

s e t o r n o u r e a lm e n t e r e le v a n t e c o m o s u r g im e n t o d o E s t a d o M o d e r n o . D e f a t o ,

o t e m a s e r e l a c i o n a d ir e t a m e n t e c o m a e x t e n s ã o d o p o d e r p o l í t i c o d e c a d a

E s t a d o . A p re s e n ç a d e m ú lt ip la s e d is t in t a s in s t â n c ia s d e p o d e r t r a z à to n a o

p r o b le m a r e la c io n a d o à e x t e n s ã o g e o g r á f ic a d e s s e p o d e r ( D A L L A R I , 2 0 1 3 ) .
t

E a s s i m q u e s u r g e o p r o b le m a e m t o r n o d o t e r r i t ó r i o d o E s t a d o .

N a a t u a l id a d e , n ã o h á g r a n d e s d i v e r g ê n c i a s s o b r e a c o n s id e r a ç ã o d o t e r ­

r i t ó r i o c o m o u m e le m e n t o i n d i s p e n s á v e l d o E s t a d o , j á q u e e s s a l i m i t a ç ã o

g e o g r á f ic a c i r c u n s c r e v e a a t u a ç ã o le g ít im a d o e n t e e s t a t a l. E m o u t r a s p a l a v r a s ,

n ã o h a v e r i a s o b e r a n ia s e m a p r e s e n ç a d e u m lo c a l p a r a e la s e r e x e r c i d a .

D e fa to , é p o n to p a c íf ic o q u e o t e r r it ó r io é o e s p a ç o f ís ic o p a ra o e x e r c íc io

d a s o b e r a n ia d o E s t a d o . O E s t a d o , a li á s , d e té m s o b e r a n ia g e r a l e e x c lu s iv a

s o b r e o s e u t e r r i t ó r i o ( D A L L A R I , 2 0 1 3 ) . O t e r r i t ó r i o c o m p r e e n d e o s o lo e

a s á g u a s in t e r io r e s . T o d a v ia , a s o b e r a n ia s e e s te n d e a o m a r t e r r it o r ia l e a o

e sp a ç o a é re o .

A s d iv e r g ê n c i a s a in d a p r e s e n t e s d iz e m r e s p e it o , p r i m e i r o , à r e la ç ã o j u r í d i c a

q u e e x is t e e n tre o E s t a d o e t e r r it ó r io , s e g u n d o , a o s lim it e s c o n c re to s d e s s e te r­

r i t ó r i o e , t e r c e ir o , à i m p o r t â n c i a d o t e r r i t ó r i o e m u m c o n t e x t o d e g lo b a li z a ç ã o .

Q u a n t o à p r im e ir a d iv e r g ê n c ia , s o b re a n a t u r e z a d a r e la ç ã o e n tre o E s ­

t a d o e o t e r r i t ó r i o , P a u lo B o n a v i d e s ( 2 0 0 9 ) a p r e s e n t a a s e g u in t e s ín t e s e d a s

p r in c ip a is t e o r ia s :

T e o r ia d o t e r r it ó r io - p a t r im ô n io — s e g u n d o e s s a t e o r i a , n à o h á d if e r e n ç a

e n tre imperium e dominium, d e m o d o q u e o E s t a d o é c o n s id e r a d o o p r o p r ie t á r io

d e to d o o t e r r it ó r io , ta l c o m o o c o r r e n a s r e la ç õ e s p r iv a d a s . A s s im , o E s t a d o

é o d o n o d e t o d o o s e u t e r r i t ó r i o . O p r o b le m a d e s s a t e o r i a , t íp ic a d o E s t a d o

m e d i e v a l , é q u e e la t o r n a im p o s s í v e l a p r o p r ie d a d e p r i v a d a , j á q u e t o d a s a s

te rra s p e rte n c e m a o E s ta d o .

T e o r i a d o t e r r i t ó r i o - o b j e t o — p a r a e s s a t e o r i a , h á u m a r e la ç ã o d e d ir e i t o r e a l

e s p e c í f i c a p a r a o E s t a d o e o s e u t e r r i t ó r i o , a s s i m , o E s t a d o e x e r c e o d o m í n io

s o b r e t o d o o t e r r i t ó r i o , s e m p r e j u í z o d a e x i s t ê n c i a d e u m d ir e i t o r e a l p a r t ic u la r .

A c r ít ic a fe ita a e s s a t e o r ia é q u e , a p e s a r d e t o r n a r p o s s ív e l a p r o p r ie d a d e

p r i v a d a , e la m a n t é m e s s a p r o p r ie d a d e n o d o m í n i o d o E s t a d o .

T e o r ia d o t e r r it ó r io - e s p a ç o — se g u n d o e s s a t e o r ia , o te r r it ó r io é a p e n a s a

e x t e n s ã o e s p a c i a l d a s o b e r a n ia d o E s t a d o . A s s i m , o E s t a d o e x e r c e o imperium
Elementos constitutivos do Estado
-

so b re o t e r r it ó r io e n à o o dominium. A r e la ç ã o q u e e x is t e , p o r t a n t o , é d e

c a r á t e r p e s s o a l. C o n s i d e r a m o s q u e o p o d e r d o E s t a d o s o b r e o t e r r i t ó r i o é , n a

r e a li d a d e , o p o d e r q u e e le p o s s u i s o b r e a s p e s s o a s d a q u e la l o c a li d a d e . P a r a

a lg u n s a d e p t o s d e s s a t e o r i a , i n c l u s i v e , a s v i o l a ç õ e s a o t e r r i t ó r i o r e p r e s e n t a m ,

n a r e a li d a d e , v i o l a ç õ e s à p e r s o n a li d a d e j u r í d i c a d o E s t a d o . O p r o b le m a d e s s a

t e o r i a é q u e n ã o h á u m a j u s t i f i c a t i v a p a r a a s s it u a ç õ e s e m q u e d e t e r m in a d o

t e r r it ó r io n ã o e stá o c u p a d o .

T e o r i a d o t e r r i t ó r i o - c o m p e t ê n c i a — p a r a e s s a t e o r i a , o t e r r i t ó r i o é o â m b it o

d e v a lid a d e d a o r d e m j u r í d i c a d o E s t a d o , p o is a e f i c á c i a d e u m a n o r m a j u r í d i c a

é s e m p r e d e p e n d e n t e d e u m e s p a ç o g e o g r á f i c o c e r t o d e a t u a ç ã o . A l é m d is s o ,

é e s s a d e l i m i t a ç ã o d e e s p a ç o q u e p e r m it e a v i g ê n c i a s im u lt â n e a d e d if e r e n t e s

o r d e n s e s t a t a is . E m o u t r o s t e r m o s , s e m u m a d e l i m i t a ç ã o e s p a c i a l , n ã o s e r ia

p o s s ív e l id e n t if ic a r o c o m e ç o e o f im d e c a d a o rd e m j u r í d i c a e s t a t a l, o q u e

o c a s i o n a r i a u m c o n f l i t o n o r m a t iv o .

C o n s id e r a n d o a d iv e r g ê n c ia e x is t e n t e , D a lm o d e A b r e u D a l l a r i ( 2 0 1 3 ) in d ic a

a s c a r a c t e r ís t ic a s e s s e n c ia is d a t e r r it o r ia lid a d e d o s E s t a d o s :

■ n à o h á E s t a d o s e m t e r r it ó r io , j á q u e a s u a p r iv a ç ã o im p lic a r ia a p r iv a ç ã o

d o p r ó p r io E s t a d o ;

■ o t e r r it ó r io é o li m i t e d a a t u a ç ã o s o b e r a n a d o E s t a d o , s e m p r e d e p e n d e n d o

d e le m e s m o a e s c o lh a p e la a c e it a ç ã o d e n o r m a s e s t r a n g e i r a s ;

■ o t e r r i t ó r i o é o b je t o d e r e l a ç õ e s j u r í d i c a s d e in t e r e s s e e s t a t a l , d e m o d o

q u e o E s t a d o p o d e , in c lu s iv e , a lie n a r u m a p a r c e la d o t e r r it ó r io e m

c i r c u n s t â n c i a s e s p e c í f i c a s , e m d e t r im e n t o d o s d ir e i t o s d e p a r t i c u l a r e s

d e t e n t o r e s d a p r o p r ie d a d e p r i v a d a d a á r e a .

O s e g u n d o p o n to d e d iv e r g ê n c ia d iz r e s p e ito a o s li m i t e s c o n c r e t o s d o

t e r r i t ó r i o . A q u e s t ã o n ã o o s t e n t a d i f i c u l d a d e p r á t ic a c m t e r r a f i r m e , m a s g e r a

in t e r e s s a n t e s d i v e r g ê n c i a s n o q u e d i z r e s p e it o a o m a r e a o e s p a ç o a é r e o . J á f o i

m e n c io n a d o q u e t e r r i t ó r i o c o m p r e e n d e o s o lo e a s á g u a s i n t e r i o r e s . T o d a v i a ,

a s o b e r a n ia s e e s t e n d e a o m a r t e r r i t o r i a l e a o e s p a ç o a é r e o .

N o p a s s a d o , c h e g o u - s e a c o n s id e r a r q u e o lim it e m a r ít im o d e u m E s t a d o

s e r ia a d is t â n c ia d e u m t ir o d e c a n h ã o (terrae potestas fin itu r ubi fin itu r


armorum vis). C o u b e a o D i r e i t o I n t e r n a c io n a l s u p e r a r a c o n c e p ç ã o p u r a m e n t e
Elementos constitutivos do Estado

b é lic a p a r a in d ic a r , c o m m a io r s e g u r a n ç a , a s b a liz a s d o t e r r it ó r io m a r ít im o

( D A L L A R I , 2 0 1 3 ). A t u a lm e n t e , a C o n v e n ç ã o d e M o n te g o B a y , c o n h e c id a

c o m o C o n v e n ç ã o d a s N a ç õ e s U n id a s s o b re o D ir e it o d o M a r ( C N U D M ) ,

t r a z a r e g u l a m e n t a ç ã o ( B R A S I L , 1 9 5 5 ) . N o B r a s i l , a L e i n ° 8 .6 1 7 , d e 4 d e

j a n e i r o d e 1 9 9 3 ( L e i d o M a r ) a ju s t o u o d i r e i t o i n t e r n o à r e f e r i d a c o n v e n ç ã o

( B R A S I L , 1 9 9 3 ).

A s s i m , o m a r t e r r i t o r i a l é a f a i x a a d ja c e n t e à c o s t a , q u e in c id e a té 12 m i l h a s

n á u t ic a s a c o n t a r d a l i n h a d e b a s e ( c o r r e s p o n d e n t e à m a r é - b a i x a q u e c o n t o r n a

a c o s t a s e m a c o m p a n h a r a s e n t r a d a s , d e n o m in a d a s á g u a s in t e r io r e s ) . H á q u e

s e c o n s i d e r a r , p o r o u t r o la d o , a c h a m a d a z o n a e c o n ô m ic a e x c l u s i v a ( Z E E ) .

T r a t a - s e d a f a i x a a d ja c e n t e , q u e m e d e 1 8 8 m i l h a s m a r í t i m a s a c o n t a r d o l i m i t e

e x t e r i o r d o m a r t e r r i t o r i a l . A p e s a r d e n à o in t e g r a r o e s p a ç o d e s o b e r a n ia d o

E s t a d o , n e s s a z o n a , o E s t a d o e x e r c e e x p lo r a ç ã o , a p r o v e it a m e n t o , c o n s e r v a ç ã o

e g e s tã o d o s r e c u r s o s n a t u r a is d e fo rm a e x c lu s iv a .

Q u a n t o a o e s p a ç o a é r e o , h á e v id e n t e d i f i c u l d a d e e m e s t a b e le c e r o s l i m i t e s

d a s o b e r a n ia e s t a t a l a c i m a d a t e r r a f i r m e e d o m a r t e r r i t o r i a l . O t e m a p a s s o u

a d e s p e r t a r i n t e r e s s e c o m o a v a n ç o t e c n o l ó g ic o d a S e g u n d a G u e r r a M u n d i a l

e h o je t e m r e l e v â n c i a í m p a r d ia n t e d a i n i m a g i n á v e l p o t ê n c ia d e d e s lo c a m e n t o

h u m a n o p e lo a r ( B O N A V I D E S , 2 0 0 9 ) . N e s s e s e n t i d o , c o n s i d e r a - s e q u e a

c o l u n a d e a r e x i s t e n t e s o b r e o t e r r i t ó r i o d o E s t a d o a e le p e r t e n c e p a r a f i n s

d e s o b e r a n ia . A p e s a r d e n à o e x i s t i r u m e x p r e s s o lim it e d e a lt u r a , o T r a t a d o

s o b re o s P r in c íp io s q u e R e g e m a s A t iv id a d e s d o s E s t a d o s n a E x p lo r a ç ã o e

U t iliz a ç ã o d o E s p a ç o E x t e r io r , In c lu in d o a L u a e O u t r o s C o r p o s C e le s t e s ,

d e 1 9 6 7 , c o n s id e r a q u e o e s p a ç o e x t r a - a t m o s f é r ic o é d e l i v r e a c e s s o a to d o s

o s p o v o s , s e n d o in s u s c e t ív e l d e a p r o p r ia ç ã o ( B O N A V I D E S , 2 0 0 9 ) . A s s im , o

e s p a ç o u l t r a t e r r e s t r e , i n c l u s i v e a L u a , n à o p o d e s e r a p r o p r i a d o p o r q u a lq u e r

E s t a d o d o g lo b o .

P o r f i m , a t e r c e ir a q u e s t ã o p o lê m ic a d i z r e s p e it o à im p o r t â n c i a d o t e r r i t ó r i o

e m u m c o n t e x t o d c g lo b a liz a ç ã o . A l i á s , p a ra J a c q u c s C h c v a ll ie r (2 0 0 9 ) , o

s é c u lo X X I v i v e n c i a u m m o m e n t o d e d e s t e r r i t o r i a l i z a ç ã o o u d e s c o n c e n t r a ç à o ,

v a l o r i z a n d o s o lu ç õ e s d e s t in a d a s à a u t o n o m ia lo c a l e , c o n t r a d it o r ia m e n t e , a m ­

p lia n d o a in t e r d e p e n d ê n c ia e x i s t e n t e e n t r e o s E s t a d o s . A l i á s , a c r i s e m u n d i a l

é e x e m p lo d e s s a c r e s c e n t e in t e r d e p e n d ê n c ia e n t r e o s E s t a d o s .
Elementos constitutivos do Estado

Referências

BRASIL lei n° 8.617, de 4 de janeiro de 1993. Dispõe sobre o mar territorial, a zona con­
tígua, a zona econômica exclusiva e a plataforma continental brasileiros, e dá outras
providências. 1993. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8617.
htm>. Acesso em: 01 set. 2017.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF:


Senado Federal, 1988.

BRASIL. Decreto n° 1.530, de22dejunhode 1995. Declara a entrada em vigor da Conven­


ção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, concluída em Montego Bay, Jamaica,
em 10 de dezembro de 1982.1955. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/
ccivil_03/decreto/1995/d1530.htm>. Acesso em: 01 set. 2017.

DALLARI, D. de A. Elementos de teoria geral do Estado. 32. ed. Sào Paulo: Saraiva, 2013.

MORAIS, J. L. B. de; STRECK, L. L. Ciência política e teoria do Estado. 7. ed. Porto Alegre:
Livraria do Advogado, 2010.

BONAVIDES, P. Ciência política. 16. ed. São Paulo: Malheiros, 2009.

MÜLLER, F. Quem é o povo? A questão fundamental da democracia. São Paulo: Max


Limonad, 2003.

JELLINEK, G. Teoria general dei Estado. Buenos Aires: Albatros, 1954.

CHEVALLIER, J. O Estado Pós-moderno. Belo Horizonte: Fórum, 2009.

Leituras recomendadas

DIAS, R. Ciência política. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2013.

RIBEIRO, D. G.; SCALABRIN, F. O papel do processo na construção da democracia; para uma


nova definição da democracia participativa. Revista Brasileira de Direito Processual,
Belo Horizonte, v. 17, n. 65, jan7mar. 2009.
V ____________________________________________________________________________________________ J
ã

-------------------------------------- U N I D A D E

A evolução do Estado
/------------------ Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

■ Caracterizar o Estado na Antiguidade.


■ Responder se houve ou não Estado na Idade Média.
■ Identificar as características do Estado moderno.

Introdução--------------------------------------^
Analisar o Estado por uma perspectiva histórica permite compreender o
presente e prospectar o futuro. Com efeito, consideramos relevante a ca­
racterização do Estado nos mais variados momentos da história humana,
desde os seus primórdios, na Antiguidade, até os tempos modernos.
Trata-se, portanto, de um tema que garante uma melhor compreensão
inclusive quanto aos elementos do Estado.
Neste capítulo, você vai ler sobre os primeiros agrupamentos organi­
zados na Antiguidade e sobre a existência de um Estado na Idade Média,
além de vislumbrar a ascensão do Estado moderno.

Tipos históricos de Estado


O e s t u d o d o E s t a d o e a id e n t if ic a ç ã o d o s s e u s e le m e n t o s e s s e n c i a i s p o d e m s e r

r e a liz a d o s d e v á r i a s f o r m a s . B a s t a r e c o r d a r q u e P la t ã o b u s c o u t r a t a r d e m o d e lo s

t e ó r i c o s d e E s t a d o p a r a t e n t a r i d e n t i f i c a r a m e lh o r f o r m a d e g o v e r n o e m u m a

s o c ic d a d c p o lít ic a . T a m b é m h o u v e q u e m , n o p a s s a d o , b u s c a s s e id e n t if ic a r

m o d e lo s d e E s t a d o q u e d i f i c i l m e n t e s e r i a m a lc a n ç a d o s n a p r á t ic a . F o i a s s i m ,

a l i á s , q u e T h o m a s M o o r e e la b o r o u o s e u m o d e lo . S e j a q u a l f o r o c r i t é r i o d e

c l a s s i f i c a ç ã o , s e m p r e p o d e m o s b u s c a r a i d e n t if ic a ç ã o d e e le m e n t o s c o m u n s

n o s E s t a d o s c o n c r e t a m e n t e e x is t e n t e s .
A evolução do Estado
-

A s s i m c o m o a h i s t o r i a d a h u m a n id a d e é d i v i d i d a , p a r a f i n s d i d á t i c o s , e m

v a r ia d o s p e r ío d o s , t a m b é m o s d if e r e n t e s E s t a d o s p r e s e n t e s n a s o c ie d a d e p o d e m

s e r c a t a lo g a d o s a p a r t i r d e m a r c o s h i s t ó r i c o s . C o m e f e it o , a u t i l i d a d e d e s s a

c l a s s i f i c a ç ã o r e s id e ju s t a m e n t e n a i d e n t i f i c a ç ã o d e c a r a c t e r í s t i c a s e s s e n c i a is

p r e s e n t e s e m u m a m e s m a s o c ie d a d e e e m u m a m e s m a c u l t u r a p o l í t i c a .

N e s s e s e n t id o , J e l l i n e k j á d e f e n d ia q u e t o d o f a t o h i s t ó r i c o e t o d o f e n ô m e n o

s o c i a l p e r m it e m u m a c o m p a r a ç ã o c o m o u t r o s f a t o s e f e n ô m e n o s , d e m o d o a

e x t r a i r s e m e l h a n ç a s e d i f e r e n ç a s e n t r e e le s . A p a r t i r d a í , p o d e m o s i d e n t i f i c a r

t i p o s h i s t ó r i c o s d e E s t a d o s q u e n o s p e r m it e m m e lh o r c o m p r e e n d e r o E s t a d o

a t u a l — j á q u e e s t á p r e s e n t e a í u m a r e la ç ã o d e c o n t in u i d a d e h i s t ó r i c a ( J E L L I ­

N E K , 1954) — e c o n je c t u r a r a c e rc a d o fu t u ro d o E s t a d o ( D A L L A R I , 2 0 1 3 ).

O s t ip o s h i s t ó r i c o s d e E s t a d o c o n s id e r a m q u a t r o p e r ío d o s : a A n t i g u i d a d e ,

a Id a d e M é d i a , a e r a m o d e r n a e a e r a c o n t e m p o r â n e a . A ú l t i m a e q u i v a l e a o s

d ia s a t u a i s e r e d u n d a n a n a t u r a l m a r c h a c r o n o l ó g ic a d a e x p e r i ê n c i a e s t a t a l.

O Estado na Antiguidade

N a A n t i g u i d a d e , p o d e m s e r d e s t a c a d o s o s s e g u in t e s t i p o s d e E s t a d o :

■ E s t a d o t e o c r á t ic o ;

■ E s ta d o g re g o ;

■ E s ta d o ro m a n o .

O E s t a d o t e o c r á t ic o , ta m b é m c h a m a d o d e E s t a d o A n t ig o o u E s t a d o

O r i e n t a l , é c a r a c t e r i z a d o p e la n a t u r e z a u n i t á r i a e p e la in t e n s a r e l ig io s i d a d e

d o r e g im e p o l í t i c o . N e s s e E s t a d o , v i g o r a v a a n o ç à o d e u n id a d e g e r a l d o p o d e r

p o lí t i c o . A s s i m , o E s t a d o n ã o s o f r i a d i v i s õ e s , n e m t e r r i t o r i a i s , n e m f u n c i o n a i s

( D A L L A R I , 2 0 1 3 ) . A l é m d i s s o , o p a p e l d a r e l i g i ã o n e s s e t ip o d e E s t a d o j u s ­

t i f i c a v a n ã o a p e n a s o s is t e m a j u r í d i c o c o m o t a m b é m a le g it im id a d e d o p o d e r

e s t a t a l, q u e e ra u m a d e c o r r ê n c ia d o p o d e r d iv in o .

O e x e m p lo h is t ó r ic o , d a d o p o r J e l l i n e k ( 1 9 5 4 ) , é o E s t a d o d e Is r a e l n o p e r ío d o

d o s s e u s m o n a r c a s , is t o é , a n t e s d a c o n q u is t a r o m a n a . N e s s e p e r ío d o , o E s t a d o

d e I s r a e l e r a t e o c r á t ic o e u n it á r io . P o r o u t r o la d o , d if e r e n t e m e n t e d e o u t r o s p o v o s

o r ie n t a is , e s s e p o v o c o n h e c e u a id e ia d e l i m i t a ç ã o d o p o d e r , n a m e d id a e m q u e

m e s m o o s r e is d e v ia m o b s e r v â n c ia a o s m a n d a m e n t o s d iv in o s ( J E L L I N E K , 1 9 5 4 ).

O u t r o e x e m p lo , m e n c io n a d o p o r D a r c y A z a m b u ja ( 2 0 0 8 , p . 1 6 4 ), é o E s t a d o e g íp c io .

N e le , t u d o “ d e p e n d e d o f a r a ó , q u e d e s c e n d e d o s d e u s e s e é e le p r ó p r io u m d e u s ” .

O E s t a d o g r e g o , o u E s t a d o h e lé n ic o , e r a , n a r e a li d a d e , f r a g m e n t a d o . I s s o

p o rq u e n à o h a v ia u m a u n id a d e e n t r e o s p o v o s h e lé n ic o s , m a s u m a p lu r a lid a d e d e
A evolução do Estado

c i d a d e s c o m c a r a c t e r í s t i c a s c o m u n s . A s d u a s m a is c é le b r e s , A t e n a s e E s p a r t a ,

a p r e s e n t a v a m e s s e s c a r a c t e r e s e r e v e la v a m q u e o p o v o g r e g o c o n s id e r a v a q u e

a c i d a d e (o u c i d a d e - E s t a d o , o u pólis) d e v e r i a s e r a u t o s s u f i c i e n t e ( D A L L A R I ,

2 0 1 3 ) . A s s i m , a u n id a d e d e s s a s v e r d a d e i r a s c i d a d e s f o r t i f i c a d a s e r a in t e r n a

( J E L L I N E K , 1 9 5 4 ). A l é m d is s o , n e s s e t ip o d e E s t a d o , o p a p e l d o i n d i v í d u o

e r a a c e n t u a d o . A v a l o r i z a ç ã o d o d e b a t e p o l í t i c o p r o p o r c io n o u o s u r g im e n t o

d c u m a v e r d a d e ir a c l a s s e p o l í t i c a d e r i v a d a d a s e lit e s d o m in a n t e s e c o m p a r ­

t i c i p a ç ã o d ir e t a n a s d e c is õ e s d o E s t a d o ( D A L L A R I , 2 0 1 3 ) . O E s t a d o g r e g o ,

n e s s e s e n t id o , p o d e s e r c o n s id e r a d o o b e r ç o d a p o l í t i c a e d a d e m o c r a c ia .

Fique atento

O Estado grego foi resumido por Jellinek (1954, p. 234) da seguinte forma: 'El Estado
helénico es una asociación de ciudadanos, unitaria, independiente y que tiene por
base leyes y autoridades proprias. Esta asociación ofrece un doble carácter: estatista y
religioso. El principio superior para la administración y el derecho, es, en esta asociación,
la conformidad a ley'.

O E s t a d o r o m a n o , p o r s u a v e z , t a m b é m f o i c a r a c t e r i z a d o p e lo m o d e lo

d e c i d a d e s - E s t a d o ( J E L L I N E K , 1 9 5 4 ) . N à o p o d e m o s n e g a r , la d o o u t r o , a

d i f i c u l d a d e d e r e u n i r o f e n ó m e n o h i s t ó r i c o d o I m p é r i o R o m a n o e m u m t ip o

e s t a n q u e d c E s t a d o . C o m e f e it o , R o m a p a s s o u p o r v á r i a s f o r m a s d c g o v e r n o ,

c o m d if e r e n t e s m o d o s d e a d m i n i s t r a ç ã o d a J u s t i ç a e d is t in t o s m e io s d e p a r ­

t i c i p a ç ã o p o l í t i c a a o lo n g o d a s u a h i s t o r i a . A l g u n s t r a ç o s e s s e n c i a i s , p o r é m ,

s ã o d e s t a c a d o s p o r D a l m o d e A b r e u D a l l a r i . E n t r e e le s , a o r ig e m f a m i l i a r d a

o r g a n i z a ç ã o p ú b l ic a , a in t e n s a p a r t i c i p a ç ã o d o p o v o n a s q u e s t õ e s d o g o v e r n o ,

a v a l o r i z a ç ã o d a s m a g is t r a t u r a s e a u n id a d e d o p o d e r p o lí t i c o d a p r ó p r ia c id a d e

d e R o m a ( D A L L A R I , 2 0 1 3 ). V a le r e g is t r a r ta m b é m q u e :

Nos primeiros séculos, o Estado romano era em tudo semelhante ao Estado grego,
desde a extensão dim inuta até a absorção igualm ente absoluta do indivíduo na
vida política. M as o destino e a am bição dos romanos era o Estado universal.
Conform e ia conquistando novas terras e populações, Roma deixava de ser um
Estado-cidade e se transform ava em verdadeiro Estado. Com o as cidades gre­
gas, Roma tinha o seu cullo religioso oficial e obrigatório» mas o gênio romano
era mais prático. Anexava ao seu culto o dos deuses dos povos conquistados
e, assim , chegou um momento em que todos os deuses do m undo conhecido
eram ou podiam ser adorados na cidade eterna (AZAM BUJA, 2008, p. 166).
A evolução do Estado
-

O Estado na Idade Média

P a r a o s h i s t o r i a d o r e s , a I d a d e M é d ia é c o n s id e r a d a u m p e r ío d o s e m g r a n d e s

in o v a ç õ e s e m to d a s a s á re a s d o s a b e r. A lg u n s c h e g a m a a p o n ta r q u e s e r ia a

noite negra da história da Humanidade ( D A L L A R I , 2 0 1 3 ), já q u e se tra ta v a

d e u m p e r ío d o r e p le t o d e i n s t a b i l i d a d e e c o m s it u a ç õ e s m u it o h e t e r o g ê n e a s .

F ic a , a s s im , b a s ta n te d i f í c i l id e n t if ic a r m o s a s c a r a c t e r ís t ic a s d c u m p re te n s o

E s t a d o m e d ie v a l .

D a l m o d e A b r e u D a l l a r i a r r o l a t r ê s g r a n d e s e le m e n t o s i d e n t i f i c a d o r e s d a

é p o c a m e d i e v a l e d e s t a c a q u e e s s e s e le m e n t o s c o n t r ib u e m p a r a a e v o lu ç ã o

h is t ó r ic a , q u e , p o s t e r io r m e n t e , o c a s io n o u a a s c e n s ã o d e u m n o v o t ip o d e

E s t a d o , f o r t a le c i d o e h o m o g ê n e o . S à o o s s e g u in t e s e le m e n t o s :

C r is t ia n is m o — é a b a s e id e o ló g ic a p a r a r e c o n h e c e r a p r e s e n ç a d e v a lo r e s

u n i v e r s a i s . O p e n s a m e n t o c r i s t ã o t r a z u m a n o v a m o r a li d a d e p a r a a v i d a e m

s o c i e d a d e e , a lé m d i s s o , p r o m o v e u m a u n i d a d e p o l í t i c a b a s e a d a n a c r e n ç a

r e l i g i o s a . N e s s e s e n t id o :

M otivos religiosos e pragm áticos levaram à conclusão de que todos os cris­


tãos deveriam ser integrados num a só sociedade política. E, com o havia a
aspiração a que toda a H um anidade se tornasse cristã, era inevitável que se
chegasse à ideia do Estado universal, que incluísse todos os hom ens, guiados
pelos m esm os principios e adotando as m esm as norm as de com portam ento
público e particular (D A LLA R I, 2013, p. 74).

A Ig r e ja a in d a s e a p r e s e n t o u c o m o v e r d a d e ir o e x e m p lo d e a s s o c ia ç ã o

p o lít ic a u n it á r ia e q u e n à o a d m it ia d iv is ã o ( J E L L I N E K . , 1 9 5 4 ). A im p o r t â n ­

c i a d a I g r e j a t a m b é m é r e v e la d o r a d o c o n f l i t o d e f o r ç a s p o l í t i c a s , p o r v e z e s

a n t a g ô n ic a s , e m u m a m e s m a b a s e t e r r i t o r i a l , o q u e a p e n a s f o i s u p e r a d o n o

f i n a l d a Id a d e M é d ia .

I n v a s ã o d o s b á r b a r o s — é o e le m e n t o p o l í t i c o e c u l t u r a l q u e r e v e la a p r o l i ­

f e r a ç ã o d c s it u a ç õ e s d c i n s t a b i l i d a d e p o l í t i c a , c o m o r o m p im e n t o d a o r d e m

a n t e r io r e o n a t u r a l s u r g im e n t o d e v a r i a d o s p o v o s in d e p e n d e n t e s ( D A L L A R I ,

2 0 1 3 ). A l é m d is s o , a s in v a s õ e s b á r b a r a s n o a n t ig o I m p é r io R o m a n o p r o v o c a r a m

u m a v e r d a d e ir a m i s c ig e n a ç ã o c u l t u r a l , c o m a t r a n s f o r m a ç ã o d o s p a d r õ e s t r a ­

d i c i o n a i s ( M O R A I S ; S T R E C K , 2 0 1 0 ) e o r o m p im e n t o d a b u r o c r a c i a a n t e r io r .

F e u d a l i s m o — é o e le m e n t o e c o n ô m ic o q u e in f l u e n c io u s o b r e m a n e ir a o m o d o

d e f u n c io n a m e n t o d a s o c ie d a d e e d a a u t o r id a d e n a é p o c a . A o r g a n iz a ç ã o f e u d a l
A evoluçào do Estado

e r a c a r a c t e r i z a d a p e la p r e s e n ç a d e u m s u s e r a n o ( d e t e n t o r d e t e r r a s e d e p o d e r

m i l i t a r a p t o a p r o t e g e r a r e g iã o ) e d c u m v a s s a l o ( s u j e i t o q u e r e c e b ia a p o s s i­

b ili d a d e d e c u l t i v a r a t e r r a p a r a o s e u s u s t e n t o e d e v e r i a e n t r e g a r u m a p a r c e la

d a p r o d u ç ã o , a lé m a p r e s e n t a r o s e u a p o io e m t e m p o d e g u e r r a ) ( D A L L A R I ,

2 0 1 3 ). N e s s a r e la ç ã o , q u e e r a e s s e n c ia lm e n t e p a t r im o n ia l ( A Z A M B U J A ,

2 0 0 8 ), s u r g iu a p r im e ir a c é lu la d o p o d e r p o lít ic o , q u e , m u it a s v e z e s , e ra a

ú n i c a r e a lm e n t e r e s p e it a d a . O s e n h o r f e u d a l e r a o t i t u l a r d o p o d e r p o l í t i c o ,

d o p o d e r e c o n ô m ic o e d o p o d e r j u r í d i c o ( M O R A I S ; S T R E C K . , 2 0 1 0 ) . A l i á s ,

o f e u d a li s m o r e v e l a , n o v a m e n t e , a p r e c a r i e d a d e d a s f r o n t e i r a s p o l í t i c a s e d o s

l i m i t e s d a a u t o r id a d e n a Id a d e M é d ia .

A s c a r a c t e r í s t i c a s c i t a d a s r e v e la m a d i f i c u l d a d e d e i d e n t i f i c a r u m E s t a d o

m e d ie v a l . C o m e f e it o , o q u e s e v e r i f i c a n e s s a é p o c a é a e x i s t ê n c i a d e d i v e r s a s

s o c i e d a d e s p o l í t i c a s f r a g m e n t a d a s , c o m m ú l t ip lo s c e n t r o s d e p o d e r e , a té

m e s m o , f r o n t e ir a s p o u c o d e f in id a s . A a u s ê n c ia d e u m a a u t o r id a d e c e n t r a l iz a d a

e a m u l t i p l i c i d a d e d e o r d e n s j u r í d i c a s d if e r e n t e s c o n f i r m a m q u e , n a Id a d e

M é d i a , a d o m i n a ç ã o e r a m a is c a r i s m á t i c a d o q u e r a c i o n a l i z a d a ( M O R A I S ;

S T R E C K , 2 0 1 0 ). N e s s e m e s m o s e n t id o , H e r m a n H e lle r (a p u d M O R A I S ;

S T R E C K , 2 0 1 0 ) d e s t a c a q u e , d u r a n t e m e io m i l ê n i o , n à o h o u v e u m a u n id a d e

d e d o m in a ç ã o , in d e p e n d e n t e n o e x t e r i o r e in t e r io r , q u e a t u o u d e m o d o c o n t ín u o

e c o m p o d e r p r ó p r i o , c o m u m a l i m i t a ç ã o t e r r i t o r i a l e d e p e s s o a l. E s s a f i g u r a

a i n d a p r e c i s o u s e r g e s t a d a p o r m e io d a s m u d a n ç a s p o l í t i c a s e d o p e n s a m e n t o

t e ó r i c o q u e f l o r e s c e u n o s é c u lo X V .

O Estado moderno

A s f r a q u e z a s d a s o c ie d a d e p o l í t i c a m e d ie v a l o c a s i o n a r a m o i n e v i t á v e l a v a n ç o

p a ra u m a n o v a o r g a n iz a ç ã o p o lít ic a ( D A L L A R I , 2 0 1 3 ). S u r g ia , e n f im , o

E s ta d o m o d e rn o .

A f r a g m e n t a ç ã o d o p o d e r p o l í t i c o d a Id a d e M é d ia o c a s io n o u n ã o a p e n a s

in s e g u r a n ç a j u r í d i c a , m a s t a m b é m i n s a t i s f a ç ã o e c o n ô m ic a e t e m o r p o lí t i c o .

C o m o a r e la ç ã o e n t r e o s s u je it o s e a a u t o r id a d e e r a p a t r im o n ia l, h a v ia c o n s t a n t e

in s a t is f a ç ã o d e c o r r e n t e d a t r ib u t a ç ã o i n d i s c r i m i n a d a ( D A L L A R I , 2 0 1 3 ) . A l é m

d i s s o , a a u s ê n c ia d e u m a a u t o r id a d e s ó li d a o c a s i o n a v a c o n s t a n t e s e m b a t e s

p e l a c o n q u i s t a d e t e r r a s : o e s t a d o d e g u e r r a e r a f r e q u e n t e e a h i s t ó r i a r e v e la

o q u ã o s a n g r e n t a f o i a I d a d e M é d ia n a E u r o p a c o n t in e n t a l .

A n e c e s s id a d e d e u m p o d e r s o b e r a n o e a d e q u a d a m e n te d e f in id o e m

u m a á r e a g e o g r á f ic a f o i c o n s e q u ê n c ia n a t u r a l d a s in c e r t e z a s d a Id a d e

M é d ia ( D A L L A R I , 2 0 1 3 ). P o r e s s a r a z ã o , t r ib u t a m o s à P a z d e W e s t f á l i a

a c r ia ç ã o d o E s t a d o m o d e rn o . T r a t a - s e d e u m a s é r ie d e tra t a d o s d e p a z
A evolução do Estado
-

f ir m a d o s e m t e r r it o r io e u ro p e u p a ra c o lo c a r f im à G u e rra dos 30 an o s,

n o s q u a is se e s t a b e le c e o r e s p e it o à s u p r e m a c ia , e m e s p a ç o s d e f in id o s ,

d o s so b e ra n o s d a é p o c a .

S o b r e o s u r g i m e n t o d o E s t a d o m o d e r n o , N o r b e r t o B o b b io d e s t a c a d u a s

t e s e s a n t a g ô n ic a s e ig u a lm e n t e v á lid a s p a r a j u s t i f i c a r a r e a lid a d e p o lít ic a

p o s t e r io r à é p o c a m e d ie v a l :

T e o r ia d a d e s c o n t in u id a d e — se g u n d o e ssa c o rre n te de p e n sa m e n to , o E s ­

t a d o m o d e r n o r e p r e s e n t o u u m a v e r d a d e ir a r u p t u r a c o m a s o c ie d a d e p o l í t i c a

m e d ie v a l p o r m e io d e u m p r o c e s s o d e i n e v i t á v e l c o n c e n t r a ç ã o d o p o d e r d e

c o m a n d o s o b re d e t e r m in a d o t e r r it ó r io m a is v a s t o e d a m o n o p o liz a ç ã o d e

a l g u n s s e r v i ç o s e s s e n c i a i s p a r a a o r d e m i n t e r n a . A s s i m , s e r i a m e le m e n t o s

c o n s t it u t iv o s d o E s t a d o m o d e rn o “ a p re s e n ç a d e u m a p a ra to a d m in is t r a t iv o

c o m a f u n ç ã o d e p r o v e r a p r e s t a ç ã o d e s e r v i ç o s p ú b lic o s e o m o n o p ó lio le g ít im o

d a fo rç a ” ( B O B B I O , 2 0 0 7 , p . 6 9 ).

T e o r i a d a c o n t in u id a d e — s e g u n d o e s s a lin h a d e e n t e n d im e n t o , o E s t a d o

m o d e r n o é , n a r e a l i d a d e , u m p r o d u t o d a e v o lu ç ã o d a s i n s t i t u i ç õ e s m e d i e v a i s .

P o r e s s a r a z ã o , m u i t o s e le m e n t o s p r e s e n t e s n o p e n s a m e n t o m o d e r n o ( c o m o

a n o ç à o d e s o b e r a n ia e d e p o v o ) j á e r a m t r a t a d o s p e lo s p e n s a d o r e s g re g o s

e r o m a n o s . N à o é à t o a , p o r e x e m p lo , q u e , m e s m o n o p e r ío d o m e d ie v a l,

p e r s is t ia a n o ç à o d e u m r e i e d e u m im p é r io , q u e s o m e n te g a n h o u v ig o r

g r a ç a s a o s c o m e n t a d o r e s m e d i e v a i s d a le g i s l a ç ã o r o m a n a . É , p o r t a n t o , a in d a

n a Id a d e M é d ia q u e s e c o lo c a c m d is c u s s ã o a q u e s t ã o d a f u n d a m e n t a ç ã o

d o p o d e r , q u e d e p o is e v o lu ir á p a r a o p e n s a m e n t o s o b re o E s t a d o m o d e rn o

( B O B B IO , 2 0 0 7 ).

A p e s a r d a d i s t i n ç ã o a p r e s e n t a d a , h á c o n s e n s o n o s e n t id o d e q u e o E s t a d o

m o d e r n o r e p r e s e n t o u u m a in o v a ç ã o p a r a o p e n s a m e n t o d a é p o c a ( M O R A I S ;

S T R E C K , 2 0 1 0 ) . D e f a t o , o E s t a d o m o d e r n o a p r e s e n t a a lg u m a s c a r a c t e r í s t i c a s

e s s e n c i a i s q u e r e v e la m e s s a d if e r e n ç a :

C o m o p o d e r p o lít ic o s o b e r a n o — é n e s s e m o m e n to h is t ó r ic o q u e se r e c o ­

n h e c e a a u t o n o m ia d e c a d a s o c i e d a d e p o l í t i c a o r g a n i z a d a n a f o r m a e s t a t a l

( M O R A I S ; S T R E C K , 2 0 1 0 ). E m o u tro s te r m o s , s ig n ific a q u e o E s t a d o m o ­

d e r n o é c a r a c t e r i z a d o c o m o p o d e r p o l í t i c o c o m a u t o r id a d e p le n a , q u e n ã o s e

s u b m e t e a o u t r a s n o p la n o in t e r n o e q u e é in d e p e n d e n t e n o p la n o e x t e r n o . A

n o ç ã o d e s o b e r a n ia , p o rt a n t o , é o p r im e ir o p a s s o p a ra id e n t if ic a r a c h e g a d a

d o E s ta d o m o d e rn o .
A evoluçào do Estado

C o m o p o d e r in s t it u íd o — o c o r r e t a m b é m u m a d i s s o c i a ç ã o e n t r e a a u t o r i­

d a d e e o i n d i v í d u o . S c a n t e s h a v i a u m a p le n a id e n t id a d e e n t r e a p e s s o a d o

g o v e r n a n t e e o s e u p o d e r s o b re o s s ú d it o s , a p a r t ir d o E s t a d o m o d e r n o , o

p o d e r é d e s p e r s o n a li z a d o e g a n h a u m t i t u l a r a r t i f i c i a l , c h a m a d o d e E s t a d o .

A s s i m , o E s t a d o s e t o r n a u m a in s t i t u i ç ã o . P o r e s s a r a z ã o , o E s t a d o m o d e r n o

d e ix a d e s e r p a t r im o n ia l. A o c o n t r á r io d a fo r m a e s t a t a l m e d ie v a l, e m q u e o s

m o n a r c a s , m a rq u e s e s , c o n d e s e b a rõ e s e ra m d o n o s d o t e r r it ó r io e d e tu d o o

q u e n e le s e e n c o n t r a v a ( h o m e n s e b e n s ) , n o E s t a d o m o d e r n o p a s s a a h a v e r a

i d e n t if ic a ç ã o a b s o lu t a e n t r e E s t a d o e m o n a r c a e m t e r m o s d e s o b e r a n ia e s t a t a l

( M O R A I S ; S T R E C K , 2 0 1 0 ). P o r e s s a r a z ã o , o E s ta d o m o d e rn o se to rn a u m

c a m p o ig u a lm e n t e f é r t i l p a r a o p e n s a m e n t o a b s o l u t is t a , a f i n a l , o e n t e a r t i f i c i a l

p r e c i s a r i a d e u m r e p r e s e n t a n t e p e r s o n if ic a d o .

C o m o p o d e r p ú b lic o — o u t r o p o n t o r e le v a n t e d i z r e s p e it o à d i s t i n ç ã o e n t r e

s o c ie d a d e c i v i l e s o c ie d a d e p o l í t i c a . C o m o E s t a d o m o d e r n o , é f e it a a d i f e r e n ­

c i a ç ã o e n t r e e s f e r a p ú b l ic a e e s f e r a p r i v a d a . E s s a m u d a n ç a s u r g e ju s t a m e n t e

e m r a z ã o d o o c a s o d o m o d e lo e c o n ô m ic o f e u d a l. A s s i m ;

(...) o novo m odo dc produção em gestação (capitalism o) d em an d av a um


conjunto de norm as im pessoais/gerais que desse segurança e garantias aos
súditos (burguesia em ascensão), para que estes pudessem com ercializar e
produzir riquezas (e delas desfrutas) com segurança e com regras determ inadas
(M O RA IS; STRECK , 2010, p. 43).

S u r g e , a s s i m , u m a p a r a t o b u r o c r á t ic o d e s t in a d o à o r g a n iz a ç ã o d o s n o v o s m e io s

d e p r o d u ç ã o e d a g a r a n t ia d a e s t a b ili d a d e e c o n ô m ic a : o E s t a d o s e t o r n a u m a

o r g a n i z a ç ã o d if e r e n t e d a s o c ie d a d e c i v i l .

Fique atento

A noção emprestada ao termo Estado moderno difundiu-se com o pensamento de


Jellinek, ao agregar os elementos essenciais desse tipo estatal. Para ele, o Estado *é
a corporação de um povo, assentado num determinado território e dotada de um
poder originário de mando' (BONAVIDES, 2009, p. 70). Assim, no pensamento do autor,
três são os elementos essenciais do Estado moderno: povo, território e poder político
(soberania). Apesar das críticas, são os elementos presentes até hoje no estudo da
teoria geral do Estado (MORAIS; STRECK, 2010).
A evolução do Estado

\
Referências

AZAMBUJA, D. Teoria geral do Estado. 4. ed. São Paulo: Globo, 2008.

BOBBIO, N. Estado: governo; sociedade, para uma teoria geral da política. 14. ed. São
Paulo: Paz e Terra, 2007.

BONAVIDES, P. Ciência política. 16. ed. São Paulo: Malheiros, 2009.

DALLARI, D. de A. Elementos de teoria geral do Estado. 32. ed. São Paulo: Saraiva, 2013.

JELLINEK, G. Teoria general dei Estado. Buenos Aires: Albatros, 1954.

MORAIS, J. L. B. de; STRECK, L. L. Ciência política e teoria do Estado. 7. ed. Porto Alegre:
Livraria do Advogado 2010.

Leitura recomendada

DIAS, R. Ciência política. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2013.


\ _____________________________________________________________________________________________________________________ s
O poder do Estado:
finalidades e funções
do Estado
/------------------ Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

■ Conceituar o que é Estado na contemporaneidade.


■ Determinar o poder de auto-organização estatal.
■ Identificar as finalidades e funções do Estado.

Introdução--------------------------------------^
A compreensão do Estado por urna perspectiva histórica trouxe os ele­
mentos do Estado moderno. O avanço civiiizatório, por outro lado, permi­
tiu o surgimento do atual Estado contemporâneo. As mudanças havidas
nos días atuais exigem uma melhor compreensão desse novo Estado,
bem como do seu poder social da sua finalidade e da sua funcionalidade.
Neste capítulo, você vai ler sobre o Estado contemporâneo, com
especial ênfase na questão do poder, da organização e da finalidade
desse Estado.

O advento do Estado contemporâneo


N a p e r s p e c t iv a h is t ó r ic a , a e v o lu ç ã o d o c o n c e it o d e E s t a d o a c o m p a n h a

o e s tu d o d a s d if e r e n t e s é p o c a s d a v id a e m s o c ie d a d e . A s s im , é p o s s ív e l

f a z e r m o s r e f e r ê n c ia a u m E s t a d o p re s e n te n a A n t ig u id a d e e , t a m b é m , a u m

E s t a d o n a m o d e r n id a d e . D c f a t o , n a é p o c a m o d e r n a , s u r g e u m a d e f i n i ç ã o

m a is p r e c is a d e E s t a d o .

E s s a , a liá s , é a p ro p o sta d e J e llin e k , p a ra q u e m E s ta d o m o d e rn o re p re s e n ta

o a p o g e u d a e s t r u t u r a j u r í d i c a d a s o c ie d a d e p o lít ic a . N a c o n c e p ç ã o d o

c é le b r e a u t o r a le m ã o , a n o ç ã o d e E s t a d o i m p l i c a , n e c e s s a r ia m e n t e , a e x i s t ê n c ia
O poder do Estado: finalidades e funções do Estado
-

d e u m a c o r p o r a ç ã o d e p o v o , p r e s e n t e e m u m d e t e r m in a d o t e r r i t o r i o e c o m

p o d e r . A s s i m , a t e o r ia g e r a l d o E s t a d o c a r a c t e r i z a o E s t a d o m o d e r n o c o m o

s o c ie d a d e p o lí t i c a d o t a d a d e e le m e n t o s u b je t iv o — o p o v o — e d o is e le m e n t o s

o b je t iv o s — o t e r r i t o r i o e o p o d e r ( J E L L I N E K , 1 9 5 4 ).

O a v a n ç o d a h is t o r ia h u m a n a c o n d u z iu o d e b a te p a ra u rn a n o v a é p o c a .

É a c h a m a d a e r a c o n t e m p o r á n e a , q u e , a p e s a r d o im p r e c is o m a r c o i n i ­

c ia l, re p re s e n ta o s te m p o s a t u a is . H a v e r ia , e m r a z ã o d e s s e a v a n ç o , u m a

m u d a n ç a n o c o n c e it o d e E s t a d o . E m o u tro s te rm o s , p o d e m o s a p re s e n ta r

u m c o n c e it o d e E s t a d o c o n t e m p o r â n e o d is t in t o d o E s t a d o m o d e r n o . A

c o n s t a t a ç ã o d e c o r r e d a in e g á v e l c r is e d a e s t r u t u r a e s t a t a l a p r e s e n t a d a

n o s é c u lo X X . C o n f ir a - s e , a p r o p ó s it o , a c o n t u n d e n t e c r ít i c a d e D a r c y

A z a m b u ja ( 2 0 0 8 , p . 1 5 7 ):

O hom em pediu tudo ao Estado; o Estado não lhe deu quase nada. E não deu
porque não podia dar. O que se exigiu dele estava m uito além do seu poder,
ainda quando este fosse incom paravelm ente m aior do que de fato é. Embalde
o Estado se hipertrofiou e os seus órgãos se esfalfaram funcionando. A orga­
nização política, que deveria ser um aparelho regulado, seguro e rápido para
cum prir com eficiência um objetivo certo e lim itado, transform ou-se num a
engrenagem m onstruosa e desconjuntada. Nãos m ãos de bons governantes,
pouco eficiente; na dos maus, engenho infernal, que em vez de ordem e justiça
produz ao funcionar intranquilidade e ruína. M algrado todos os sacrifícios,
todas as leis, todos os órgãos, todos os im postos, todos os consertos e refor­
m as, o Estado m oderno não deu nenhum dos bens que inconsideradam ente
lhe exigiram . E tanlo lhe forçaram o m aquinism o que ele por fim explodiu
na crise em que ainda se debate.

A in d a e m c o n s t r u ç ã o , o E s t a d o C o n t e m p o r â n e o n à o d e s c o n s id e r a a

c r is e c o n c e it u a i q u e e s tá p re s e n te n o E s t a d o d a a t u a lid a d e . N e s s a lin h a ,

a id e ia d e s o b e r a n ia c e d e e s p a ç o p a r a a q u e s t ã o d o s D ir e it o s H u m a n o s ,

o s lim it e s d a r e g u la ç ã o t e r r it o r ia l s ã o q u e s t io n a d a s e m r a z ã o d o f lu x o d e

r iq u e z a a g o ra g lo b a liz a d o e , p o r f i m , o p r ó p r io p o v o g a n h a u m a id e n t i­

d a d e in t e r n a c io n a l c o m a r e u n iã o d e E s t a d o s e m a s s o c ia ç õ e s m a is a m p la s

( M O R A I S ; S T R E C K , 2 0 1 0 ).

D e t o d o m o d o , a in d a p r e v a le c e a d e f i n i ç ã o a p r e s e n t a d a p o r J e l l i n e k ( 1 9 5 4 ) ,

n a q u a l o s e le m e n t o s e s s e n c i a i s d o E s t a d o c o n t e m p o r â n e o s à o o p o v o , o t e r ­

r i t ó r i o e o p o d e r s o c i a l , t a m b é m c o m p r e e n d id o c o m o s o b e r a n ia . A l é m d is s o ,

a lg u n s d e s t a c a m o r e le v a n t e p a p e l d a f i n a l i d a d e q u e d e v e o r i e n t a r a a t u a ç ã o

e s t a t a l. C o m e f e it o , m e r e c e m e s p e c ia l a a t e n ç ã o e s t a s d u a s ú l t i m a s c a t e g o r ia s :

p o d e r e f in a lid a d e .
O poder do Estado: finalidades e funções do Estado

Saiba mais

Confira o interessante texto de Inocêncio Mártires Coelho


acerca do perfil do Estado contemporâneo no seguinte link: 0¿S0
https://goo.gl/A7JaVy

O poder do Estado
O p o d e r p o lí t i c o c o m o e le m e n t o d o E s t a d o é a c e p ç ã o q u e o r a s e c o n f u n d e c o m

o c o n c e it o d e s o b e r a n ia e t a n t a s o u t r a s v e z e s é e m p r e g a d o p a r a f a ls a m e n t e

a u t o r i z a r m a n o b r a s d e c u n h o p o l í t i c o r e a l i z a d a s p e lo E s t a d o ( D A L L A R I ,

2 0 1 3 ) . C o m e f e it o , a s o b e r a n ia é a b a s e d o c h a m a d o E s t a d o m o d e r n o . E s s e

c o n c e it o n a t u r a l m e n t e e v o l u i u p a r a c o n s id e r a r q u e o p o d e r p o l í t i c o d o E s t a d o

é s u p r e m o e in d e p e n d e n t e .

P r i m e i r o , a s o b e r a n i a é p o d e r s u p r e m o d o E s t a d o , n o s e n t id o d e q u e é e le

o m a is a lt o p o d e r d a q u e la s o c ie d a d e e , p o r e s s e m o t i v o , o ú l t i m o p a t a m a r d e

d e c is ã o s o b r e q u a lq u e r n o r m a j u r í d i c a . E , p o is , a d im e n s ã o in t e r n a d o p o d e r

e q u e d e m o n s t r a a s u p e r io r id a d e d o E s t a d o s o b r e a s d e m a i s o r g a n i z a ç õ e s d a

p r ó p r i a s o c ie d a d e . A s s i m , o E s t a d o r e g u l a a s s u a s r e l a ç õ e s in t e r n a s e e la b o r a

a s r e g r a s o b s e r v a d a s p e la s o c ie d a d e .

S e g u n d o , a s o b e r a n ia é p o d e r d e in d e p e n d ê n c ia d o E s t a d o , n o s e n t id o d e q u e

e le n à o s e s u b m e t e a p o t ê n c ia s e s t r a n g e i r a s . A s s i m , o E s t a d o é in d e p e n d e n t e

n a s s u a s r e la ç õ e s c o m o s d e m a is E s t a d o s .

A l é m d a s o b e r a n ia , p o d e m s e r d e s t a c a d o s a lg u n s o u t r o s t r a ç o s e s s e n c i a i s

d o p o d e r p o l í t i c o e s t a t a l . S ã o o s s e g u in t e s :

Im p e r a t iv id a d e e n a t u r e z a in t e g r a t iv a — s ig n if ic a q u e a p a r t ic ip a ç ã o d o

i n d i v íd u o n o E s t a d o a q u e p e r t e n c e é o b r ig a t ó r ia e in a b d ic á v e l ( B O N A V I D E S ,

2 0 0 9 ) . A s s i m , e n q u a n t o a s d e m a is a s s o c ia ç õ e s h u m a n a s s à o d e p a r t ic i p a ç ã o

v o lu n t á r ia , o in g r e s s o n a v id a s o c i a l e s t a t a l é c o m p u ls ó r io p a r a o s u je it o . A i n d a

s e g u n d o a im p e r a t iv id a d e , o E s t a d o p o s s u i o m o n o p ó lio d a c o a ç ã o o r g a n iz a d a e

in c o n d ic io n a d a : a s r e g r a s d e c o m p o r t a m e n t o s à o p o r e le im p o s t a s e p o r e le p o d e m

s e r m a t e r ia lm e n t e c u m p r id a s . E ju s t a m e n t e e s s a im p o s iç ã o m a t e r ia l d o E s t a d o

q u e r e v e la a s u a im p e r a t iv id a d e : o p o d e r e s t a t a l é i r r e s i s t í v e l ( D A L L A R I , 2 0 1 3 ).
O poder do Estado: finalidades e funções do Estado
-

C a p a c id a d e d e a u t o - o r g a n iz a ç ã o — o c a r á t e r e s t a t a l d e u m a s o c ie d a d e

p o lí t i c a t a m b é m t e m c o m o t r a ç o e s s e n c i a l a s u a a p t id ã o d c a u t o d e t e r m in a ç ã o .

T r a t a - s e d a e x i s t ê n c i a d e u m a a u t o n o m ia n a f o r m a c o m o s e r ã o o r g a n i z a d o s

o s s e u s c o m p o n e n t e s m a t e r i a i s ( B O N A V I D E S , 2 0 0 9 ) . E s s a c a p a c id a d e r e v e la

q u e o E s t a d o p o d e rá d e t e r m in a r a s u a e s t r u t u r a a d m in is t r a t iv a e a s fu n ç õ e s

a se re m d e se m p e n h a d a s.

IJ n id a d e e in d iv is ib ilid a d e — o p o d e r c o n fe r id o a o E s t a d o é e n tre g u e a
g

a p e n a s u m a e n t id a d e , a q u a l c o n d u z i r á a v i d a e m s o c ie d a d e . E p o r e s s a r a z ã o

q u e o p o d e r e s t a t a l d e v e s e r c o n s id e r a d o o u i n d i v i s í v e l . T ra ta -se d e p o d e r

q u e p o s s u i a p e n a s u m t it u la r : a p e s s o a q u e m a n ife s t a a e x p re s s ã o c o n c r e ta d o

E s ta d o . É a s s im q u e “ o p o d e r d o E s t a d o n a p e s s o a d e se u t it u la r é in d iv is ív e l:

a d iv is ã o s ó se fa z q u a n to a o e x e r c íc io d o p o d e r, q u a n to à s fo r m a s b á s ic a s d e

a t iv id a d e e s t a t a l” ( B O N A V I D E S , 2 0 0 9 , p . 1 1 9 ). A u n id a d e d o p o d e r — a g o r a

c o n fe r id o a o E s t a d o — é u m a d a s g r a n d e s c o n q u is t a s d a e r a m o d e r n a , j á

q u e , e m é p o c a s a n t e r io r e s , o p o d e r p e r t e n c ia à p e s s o a d o g o v e r n a n t e , n ã o a o

p r ó p r io E s t a d o . V a l e r e g i s t r a r , p o r o u t r o la d o , q u e , p a r a a s c o n c e p ç õ e s m a is

c o n t e m p o r â n e a s d o E s t a d o , a t it u la r id a d e d e s s e p o d e r p e r t e n c e , e m ú lt im a

a n á lis e , a o p o v o ( B O N A V I D E S , 2 0 0 9 ).

L e g a lid a d e c le g it im id a d e — a p e s a r d e c o n t r o v e r s o s , t a m b é m p o d e r ia m s e r

c o n s id e r a d o s t r a ç o s e s s e n c i a i s d o p o d e r e s t a t a l . O p r i n c í p i o d a l e g a lid a d e ,

n e s s e c o n te x to , s ig n if ic a q u e to d o o p o d e r e s ta ta l d e v e a tu a r d e a c o rd o c o m a s

r e g r a s j u r í d i c a s v ig e n t e s . D i t o d c o u t r o m o d o , a a t u a ç ã o e s t a t a l p r e s s u p õ e a

c o n f o r m id a d e c o m o s p r e c e it o s j u r í d i c o s p r e v ia m e n t e e s t a b e le c id o s . A s s i m , a

m o v im e n t a ç ã o d o E s t a d o o c o r r e “ r e s p e it a n d o r ig o r o s a m e n t e a h i e r a r q u ia d a s

n o r m a s , q u e v ã o d o s r e g u la m e n t o s , d e c r e t o s e le is o r d i n á r i a s a té a le i m á x im a

e s u p e r io r , q u e é a C o n s t it u i ç ã o ” ( B O N A V I D E S , 2 0 0 9 , p . 1 2 0 ). O p r i n c í p i o d a

le g it im id a d e , p o r s u a v e z , in f o r m a q u e o p o d e r e s t a t a l d e v e s e r e x e r c id o c o m o

c o n s e n t im e n t o d o s s e u s d e s t in a t á r io s . D e v e s e r , p o r t a n t o , u m p o d e r r e c o n h e c id o

p e la s o c ie d a d e . D e s s e m o d o , e n q u a n t o a le g a lid a d e d e n o t a o c a r á t e r f o r m a l d o

p o d e r e s t a t a l, a le g it im id a d e r e v e la o s e u c a r á t e r id e o ló g ic o : t r a t a - s e d a m a n i ­

f e s t a ç ã o d e c o n s e n t im e n t o e o b e d iê n c ia d o s d e s t in a t á r io s ( B O N A V I D E S , 2 0 0 9 ) .

A a p t id ã o d e a u t o - o r g a n i z a ç ã o d o E s t a d o d i z r e s p e i t o a o p o d e r p o l í t i c o

n o p la n o in t e r n o . A s s i m , o E s t a d o p o d e d e f i n i r c o m o s e r á e s t r u t u r a d o .

T r a t a - s e d e c o m p e t ê n c ia q u e a b r a n g e , in c lu s iv e , a d is t r ib u iç ã o d e t a r e fa s

e n tre d if e r e n t e s e n te s p ú b lic o s , b e m c o m o a s e s c o lh a s f u n d a m e n t a is s o b re

a c o n d u ç ã o in t e r n a d a s o c ie d a d e .
O poder do Estado: finalidades e funções do Estado

Exemplo

No âmbito da auto-organização do Estado, podemos referir a eleição por uma forma


de governo republicana ou monárquica e a adoção de um Estado unitário ou federado.
Também o sistema de governo é uma escolha decorrente da auto-organização.

A d i s t r i b u i ç ã o d a s t a r e f a s e s t a t a i s t a m b é m é u m t e m a r e l a c io n a d o c o m

a s u a a u t o - o r g a n iz a ç ã o . A s s im , n a m a io r ia d o s E s t a d o s D e m o c r á t ic o s , a s

f u n ç õ e s d o E s t a d o s ã o r a m i f i c a d a s e m d if e r e n t e s i n s t â n c i a s d e p o d e r , c o m o ,

p o r e x e m p lo , a d iv is ã o e n t r e P o d e r E x e c u t iv o , P o d e r L e g is la t iv o e P o d e r

J u d ic iá r io . A id e n t if ic a ç ã o d a s f u n ç õ e s d o E s t a d o , e n tre ta n to , é d e p e n d e n te

d e u m a p r é v ia r e f le x ã o s o b re a s p r e t e n s õ e s d e s s a c o m u n id a d e , is t o é , a s

f in a lid a d e s d o E s t a d o .

As finalidades e funções do Estado


E n q u a n t o , p a r a a l g u n s a u t o r e s , i d e n t i f i c a r a f i n a l i d a d e d o E s t a d o é a lg o i r ­

r e le v a n t e p a r a a t e o r ia g e r a l d o E s t a d o , p o rq u e r e p r e s e n t a r ia u m a q u e s tã o

m e ra m e n te p o lít ic a ( K e ls e n ) , o u tro s d e fe n d e m s e r im p o s s ív e l u m e s tu d o

c o m p le t o s o b r e a m a n i f e s t a ç ã o e s t a t a l s e m i d e n t i f i c a r a s u a f in a li d a d e ( G r o -

p p a l i ) ( D A L L A R I , 2 0 1 3 ) . P o r o u t r o la d o , m e s m o a q u e le s q u e n ã o c o n s id e r a m

a f i n a l i d a d e c o m o e le m e n t o e s s e n c i a l d o E s t a d o c o m p r e e n d e m q u e s e t r a t a

d e a s s u n t o d e e le v a d a im p o r t â n c ia ( J e l li n e k ) ( D A L L A R I , 2 0 1 3 ). C u m p r e ,

p o rta n to , id e n t if ic a r a s p r in c ip a is p ro p o s ta s p a ra o te m a e v e r if ic a r q u a l é a

f i n a l i d a d e d o E s t a d o n a a t u a l id a d e .

S o b r e o a s s u n t o , D a lm o d e A b r e u D a lla r i (2 0 1 3 ) a p re s e n ta u m q u a d ro

c o m p le t o d a s p r i n c i p a i s c l a s s i f i c a ç õ e s e m t o r n o d a f i n a l i d a d e e s t a t a l , a s q u a is

s e r ã o a p r e s e n t a d a s a s e g u i r . A p r i m e i r a d e la s d i f e r e n c i a f i n s o b j e t i v o s e f i n s

s u b je t iv o s d o E s t a d o :

F in s o b je t iv o s — d i z e m r e s p e i t o a o p a p e l d o E s t a d o a o lo n g o d a h i s t ó r i a

h u m a n a . P a r a e s s a c o r r e n t e , p o d e m s e r id e n t if ic a d o s a l g u n s f i n s u n i v e r s a i s

o b j e t i v o s , is t o é , f i n a l i d a d e s c o m u n s p a r a t o d o e q u a l q u e r E s t a d o , o u f i n s

p a r t i c u l a r e s o b je t iv o s , is t o é , in t e r e s s e s p a r t i c u l a r e s d e c a d a E s t a d o e m r a z à o

d a s c i r c u n s t â n c i a s d o s e u d e s e n v o lv i m e n t o h i s t ó r i c o .
O poder do Estado: finalidades e funções do Estado
-

K i n s s u b j e t i v o s — d iz e m r e s p e it o a o p a p e l d o E s t a d o c o m r e la ç ã o a o in d iv íd u o .

A s s i m , c o m o o E s t a d o s e d e s e n v o lv e a p a r t i r d c a ç õ e s h u m a n a s , é ló g i c o q u e

s u a s f i n a l i d a d e s s o m e n t e p o d e r ia m s e r a s ín t e s e d o s f i n s i n d i v i d u a i s , o q u e

e x p l i c a a e x i s t ê n c i a d a s i n s t i t u i ç õ e s e s t a t a is e a p r e s e n ç a d e c o n c e p ç õ e s t ã o

d if e r e n t e s d e E s t a d o e m c a d a é p o c a . E m s ín t e s e , o E s t a d o n a s c e e s e t r a n s f o r m a

c o n f o r m e a s f i n a l i d a d e s b u s c a d a s p e lo s i n d i v í d u o s q u e o c o m p õ e m .

A s e g u n d a c l a s s i f i c a ç ã o r e g is t r a d a d i z r e s p e it o à a m p lit u d e d a s f u n ç õ e s

d o E s t a d o . A s s i m , h a v e r ia f i n s e x p a n s i v o s , f i n s l i m i t a t i v o s e f i n s r e l a t i v o s :

F in s e x p a n s iv o s — s e g u n d o e s s a c o r r e n t e , to d o s o s f in s in d iv id u a is s e r ã o ,

m a i s c e d o o u m a i s t a r d e , a b s o r v id o s p e la s f i n a l i d a d e s e s t a t a is . C o m o s e p e r ­

c e b e , e s s a d o u t r i n a é t í p i c a d e E s t a d o s t o t a l i t á r i o s e q u e im p e d e m o p le n o

d e s e n v o lv im e n t o d o in d i v íd u o . D u a s l i n h a s d e p e n s a m e n t o a p r e s e n t a m o s f in s

e x p a n s iv o s d o E s t a d o . A p r im e ir a é c h a m a d a d e t e o r ia u t ilit á r ia , s e g u n d o a

q u a l o m á x i m o d e s e n v o lv i m e n t o m a t e r i a l s e o b t é m a p e n a s c o m o s a c r i f í c i o

d a lib e r d a d e e d e o u t r o s v a lo r e s c a r o s a o s e r h u m a n o . V a le r e g is t r a r q u e

a l g u n s i n c l u e m o E s t a d o d o b e m - e s t a r n e s s a c a t e g o r ia ( D A L L A R I , 2 0 1 3 ) .

A s e g u n d a é c h a m a d a d e t e o r ia é t ic a , q u e r e je it a o u t ilit a r is m o e d e fe n d e a

s u p r e m a c i a a b s o lu t a d e d e t e r m in a d o s f i n s é t i c o s d o E s t a d o . P a r a e s s a t e o r i a ,

o E s t a d o s e r i a a f o n t e m o r a l d a s o c i e d a d e , n ã o t o le r a n d o c o n d u t a s c o n t r á r i a s

à m o r a li d a d e p o r e le e s t a b e l e c id a s . E s s a c o n c e p ç ã o r e v e l a u m p e n s a m e n t o

t o t a l i t á r i o , j á q u e c o n d u z a u m e x a g e r a d o m o r a li s m o , “ q u e f o r n e c e a b a s e p a r a

a s u p r e m a c i a a b s o lu t a d a v o n t a d e d o s g o v e r n a n t e s , p o is s à o e s t e s q u e d it a m

a s r e g r a s m o r a is e m n o m e d o E s t a d o ” ( D A L L A R I , 2 0 1 3 , p . 1 1 0 ).

F in s lim it a d o s — s e g u n d o e s s a c o r r e n t e , a a t iv id a d e d o E s t a d o d e v e s e r r e ­

d u z i d a a o m í n i m o , s e m a p r e s e n ç a d c u m a f in a li d a d e o r ie n t a d a p a r a a t o m a d a

d e i n i c i a t i v a , e s p e c ia lm e n t e n a á r e a e c o n ô m ic a . P a r a o s a d e p t o s d e s s a l i n h a d e

p e n s a m e n to , a s f in a lid a d e s d o E s t a d o d e v e m s e r c o m p a t ív e is c o m o p a p e l d c

v ig ila n t e d a o rd e m s o c ia l q u e é o E s t a d o . N ã o h a v e r ia , p o rta n to , e s p a ç o p a ra a

in t e r v e n ç ã o e s t a t a l n o s t e m a s q u e d iz e m r e s p e it o e s t r it a m e n t e à e s f e r a p r i v a d a .

É e m to rn o d o s f in s lim it a d o s d o E s t a d o q u e s u rg e m a s t e o r ia s d o E s t a d o

l i b e r a l , q u e s e r i a v o c a c io n a d o a p e n a s p a r a a p r o t e ç ã o d e d ir e i t o s i n d i v i d u a i s ,

e m e s p e c i a l , a l i b e r d a d e , e n ã o d e v e r i a i n t e r f e r i r n a lib e r d a d e e c o n ô m ic a .

F i n s r e l a t i v o s — e s s a c o r r e n t e a p o n t a q u e d e v e m o s p e n s a r e m u m a n o v a p o s i­

ç ã o e n t r e E s t a d o e i n d i v í d u o q u e c o n s id e r e a n e c e s s id a d e d e u m a n o v a a t it u d e

e n t r e e le s . F u n d a - s e , e s s e n c i a lm e n t e , n a id e ia d e q u e a v i d a e m s o c ie d a d e é

s o l i d á r i a : a s a ç õ e s h u m a n a s s e r ia m d e c o la b o r a ç ã o e n t r e o s in d i v íd u o s . A s s i m ,
O poder do Estado: finalidades e funções do Estado

o p a p e l d o E s t a d o s e r i a c o n s e r v a r , o r d e n a r e a ju d a r o s e r h u m a n o a a t i n g i r a

m a io r s o li d a r ie d a d e p o s s í v e l n a s r e la ç õ e s h u m a n a s . A i n d a p a r a e s s a c o r r e n t e ,

n à o b a s t a r i a a s s e g u r a r a ig u a ld a d e j u r í d i c a , is t o é , a ig u a ld a d e p e r a n t e a le i.
/

E n e c e s s á r i o , a lé m d i s s o , “ g a r a n t i r a ig u a l d a d e d e t o d o s o s i n d i v í d u o s n a s

c o n d iç õ e s i n i c i a i s d a v i d a s o c i a l ” ( D A L L A R I , 2 0 1 3 , p . 111).

A t e r c e ir a c la s s if ic a ç ã o d if e r e n c ia f i n s e x c lu s iv o s e f i n s c o n c o r r e n t e s

do E sta d o :

F in s e x c lu s iv o s — s e r i a m a q u e la s f i n a l i d a d e s q u e a p e n a s d e v e m s e r d e r e s ­

p o n s a b i lid a d e d o E s t a d o , c o m o , p o r e x e m p lo , a s e g u r a n ç a e x t e r n a e in t e r n a

d o i n d i v í d u o . A l g u n s a u t o r e s d e n o m in a m d e f i n s e s s e n c i a i s .

F in s c o n c o rre n te s — s e r i a m a q u e la s f in a l i d a d e s q u e p o d e m s e r d e r e s p o n ­

s a b i li d a d e d e o u t r a s s o c i e d a d e s , c o m o a s o c ie d a d e c i v i l . A l g u n s a u t o r e s d e ­

n o m in a m d e f i n s c o m p l e m e n t a r e s , j á q u e , n e s s e c a s o , h á u m a s u p e r p o s i ç ã o

e n t r e a a t u a ç ã o d o E s t a d o e d a s o c ie d a d e c i v i l .

Fique atento

Todas as classificações citadas revelam que existe grande polêmica sobre a extensão
das finalidades do Estado. Enquanto, para alguns, o papel do Estado na vida em
sociedade deve ser reduzidíssimo, outros professam que o Estado deve atuar para
a consecução de todos os interesses individuais. De todo modo, vale registrar que
as classificações apontadas buscam debater e explicar as finalidades do Estado sem
identificar concretamente o objetivo de uma sociedade política estatal. Com efeito,
essa finalidade (a razão da própria existência de um Estado) seria algo variável em
cada agrupamento humano.

D e q u a lq u e r f o r m a , n à o s e p o d e n e g a r q u e o E s t a d o r e p r e s e n t a u m m e io

p a r a q u e o s in d i v íd u o s a t in j a m o s s e u s f i n s p a r t ic u la r e s . E s s a s e r i a , p o r t a n t o , a

f i n a l i d a d e g e r a l d o E s t a d o , e m p o s t u r a b e m le m b r a d a p o r D a r c y A z a m b u j a :

“ o E s t a d o é u m d o s m e io s p e lo s q u a i s o h o m e m r e a l i z a o s e u a p e r f e i ç o a ­

m e n t o f í s i c o , m o r a l e in t e le c t u a l . E is s o é q u e j u s t i f i c a a e x i s t ê n c i a d o E s t a d o ”

( A Z A M B U J A , 2 0 0 8 , p . 1 4 6 ). O a t in g im e n t o d o s f i n s p a r t ic u la r e s d e c a d a u m a

r e p r e s e n t a , e m ú l t i m a a n á l i s e , a b u s c a d o b e m c o m u m , c o m p r e e n d id o c o m o

o c o n ju n t o d a s c o n d iç õ e s d e v i d a s o c i a l q u e c o n s in t a m e f a v o r e ç a m o d e s e n ­

v o l v i m e n t o in t e g r a l d a p e r s o n a li d a d e h u m a n a . A b u s c a d o b e m c o m u m p a r a
O poder do Estado: finalidades e funções do Estado
-

c a d a p o v o , e m c a d a t e r r i t o r i o s o b e r a n o , d e m o n s t r a a e x i s t e n c i a d e d if e r e n ç a

e n t r e a s f in a lid a d e s d a s o c ic d a d c h u m a n a e d e a lg u m a s o c ie d a d e p o lít ic a

e s ta ta l e s p e c íf ic a ( D A L L A R I , 2 0 1 3 ).

A id e n t if ic a ç ã o d a f in a lid a d e d o E s t a d o c o n t r ib u i, d e fo r m a s ig n if ic a t iv a ,

p a r a i d e n t i f i c a r a s s u a s f u n ç õ e s o u c o m p e t e n c ia s . D e f a t o , é a p a r t i r d o s o b ­

j e t i v o s e s t a t a is q u e p o d e m o s i d e n t i f i c a r a s f o r m a s p a r a a c o n s e c u ç ã o d e s s e s

f i n s . S u r g e , a s s i m , u m in t e r e s s a n t e d e b a t e s o b r e a s f u n ç õ e s d o E s t a d o .

No Brasil, a Constituição Federal expressamente traça os objetivos do Estado no


seu art. 3o: 'Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:
I — construir uma sociedade livre, justa e solidária; II — garantir o desenvolvimento
nacional; III — erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais
e regionais; IV — promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo,
cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação'
\ ____________________________________________ _______________________________________________ J

P a r a D a r c y A z a m b u j a , o a t in g im e n t o d o b e m c o m u m d e p e n d e d a r e a li z a ç ã o

d e d u a s a t i v i d a d e s p e lo E s t a d o . A p r i m e i r a s e r i a a p r o t e ç ã o d o i n d i v í d u o e ,

p o r t a n t o , e s t a r i a r e l a c io n a d a c o m a s e g u r a n ç a , a o r d e m e a p a z . A s e g u n d a

s e r ia a p r o m o ç ã o d o i n d i v íd u o e , p o r t a n t o , e s t a r ia r e la c io n a d a c o m o p r o g r e s s o ,

o a v a n ç o c i v i l i z a t ó r i o e o a p e r f e iç o a m e n t o .

Q u a n t o à p r o t e ç ã o d o i n d i v í d u o , h a v e r ia c o n c o r d â n c ia s o b r e a n e c e s s id a d e

d e s e g u r a n ç a in t e r n a e e x t e r n a . A s s i m , c a b e r ia a o E s t a d o a d e f e s a d e a g r e s s õ e s

e x t e r i o r e s e i n t e r i o r e s , c o m a m a n u t e n ç ã o d e s e r v i ç o s p ú b l ic o s e s p e c í f i c o s ,

c o m o e x é r c i t o , m a r i n h a , d i p l o m a c i a , a d m i n i s t r a ç ã o in t e r n a d a j u s t i ç a , p o l í c i a

in t e r n a , a d m i n i s t r a ç ã o , e n t r e o u t r o s .

Q u a n t o à p r o m o ç ã o d o i n d i v í d u o , o c o n t e ú d o d a a t u a ç ã o e s t a t a l e n s e ja

a c e s a p o lê m ic a , j á q u e é d i s c u t í v e l a té o n d e p o d e o E s t a d o i n t e r f e r i r n a s r e la ç õ e s

p r i v a d a s p a r a a t i n g i r e s s a f i n a l i d a d e . S o b r e e s s a f u n ç ã o e s t a t a l , p o d e r ia m s e r

r e g is t r a d a s t r ê s c o r r e n t e s :

T e o r ia a b s t e n c io n is t a — d e fe n d e q u e o E s t a d o d e v e lim it a r a s u a a tu a ç ã o

à m a n u t e n ç ã o d a o r d e m , s e m q u a lq u e r i n t e r f e r ê n c i a n a i n i c i a t i v a i n d i v i d u a l .

A s s i m , o E s t a d o n ã o d e v e in t e r f e r i r n a v id a s o c ia l, g a r a n t id o a p e n a s a o s

s e u s i n d i v í d u o s a lib e r d a d e d e p r o f is s ã o , lib e r d a d e d e t r a b a l h o , lib e r d a d e d e


O poder do Estado: finalidades e funções do Estado

c o m é r c i o , c n t r c o u t r a s ( A Z A M B U J A , 2 0 0 8 ) . E s s a t e o r i a e q u iv a le a o c h a m a d o

E s t a d o l i b e r a l d o s é c u lo X V I I I a t é f i n s d o s é c u lo X I X .

T e o r i a s o c i a l i s t a — b a s e ia - s e n a in t e r v e n ç ã o d o E s t a d o e m t o d a s a s m a t é r ia s .

A s s i m , o E s t a d o d e v e f o r n e c e r t u d o o q u e o i n d i v í d u o n e c e s s i t a , p o r m e io d e

u m a s o c i a l i z a ç ã o d o s b e n s m a t e r ia i s e m o r a is d a s o c ie d a d e . N e s s a p e r s p e c t iv a ,

c a b e r i a a o E s t a d o a p r o d u ç ã o e a c i r c u l a ç ã o d e b e n s c o n s u m í v e i s p e lo i n d i ­

v íd u o . N o e x t r e m o , e s s a c o r r e n t e e q u i v a l e à a b o liç ã o d a p r o p r ie d a d e p r i v a d a

e m d e t r im e n t o d o s b e n s c o l e t i v o s e d e u m p e n s a m e n t o s o c i a l h o m o g ê n e o .

E q u i v a l e a o E s t a d o s o c i a l i s t a , d e d u v id o s a e x i s t ê n c i a h i s t ó r i c a e q u e s t io n á v e l

p o s s i b ili d a d e c o n c r e t a .

T e o r ia e c lé t ic a — a g r e g a e le m e n t o s d e a m b a s a s c o r r e n t e s a n t e r io r e s p a r a

s e g u i r u m c a m i n h o i n t e r m e d i á r i o . A s ín t e s e d e D a r c y A z a m b u j a m e r e c e r e ­

f e r ê n c ia : “ N e m d e i x a r d e f a z e r , c o m o q u e r i a m a s t e o r i a s a b s t e n c i o n is t a s , n e m

f a z e r , c o m o q u e r e r a s o u t r a s , m a s s i m a ju d a r a f a z e r , e i s o m o d o d e o E s t a d o

a t i n g i r o s s e u s f i n s ” ( A Z A M B U J A , 2 0 0 8 , p . 1 5 4 ). C o m o s e p e r c e b e , p a r a e s s a

c o r r e n t e , o E s t a d o n ã o é a p e n a s u m d e f e n s o r d a s lib e r d a d e s i n d i v i d u a i s , m a s

ta m b é m u m a u x il ia r d a in ic ia t iv a p r iv a d a p a ra v a r ia d a s fu n ç õ e s . A s s im , a

f u n ç ã o d o E s t a d o s e r i a s u p le t i v a e c o m p l e m e n t a r e m r e l a ç ã o à i n i c i a t i v a p r i ­

v a d a , a u x ilia n d o - a n a r e a liz a ç ã o d o p ro g re s s o e d a c iv iliz a ç ã o ( A Z A M B U J A ,

2 0 0 8 ) . E s s a t e o r ia e q u iv a le , e m c e r t o s e n t id o , a o E s t a d o s o c ia l d o s é c u lo

X X I , d e s t in a d o à p r o t e ç ã o d o i n d i v í d u o e , t a m b é m , à p r e s t a ç ã o d e s e r v i ç o s

p ú b l ic o s e s s e n c i a i s .

A p e s a r d e ta n ta s t e o r ia s s o b re a s fu n ç õ e s d o E s t a d o , d e s d e a A n t ig u id a d e ,

j á s e fa la s o b re o s lim it e s d e s s a a tu a ç à o . A s s im , A r is t ó t e le s j á a p o n ta v a q u e

e r a p e r ig o s o a t r i b u i r a a p e n a s u m i n d i v í d u o o e x e r c í c i o d o p o d e r , r a z ã o p e la

q u a l, in c lu s iv e p o r q u e s tõ e s d e o r d e m p r á t ic a , s e r ia d i f í c i l q u e a p e n a s u m

h o m e m a n t e v i s s e t u d o o q u e n e m m e s m o a le g is l a ç ã o s e r i a c a p a z d e a n t e c ip a r .

A p a r t i r d o s é c u lo X I V , é i n t e n s i f i c a d o o d e b a t e s o b r e o s l i m i t e s d a a t u a ç à o

e s t a t a l e a n e c e s s id a d e d e d i s t r i b u i ç ã o d e s u a s t a r e f a s e n t r e ó r g ã o d is t in t o s

( D A L L A R I , 2 0 1 3 ).

A t e o r i a d a s e p a r a ç ã o d o s p o d e r e s , d i f u n d i d a p e lo p e n s a m e n t o d e M o n ­

t e s q u i e u , p r e d o m in a a p a r t i r d o s é c u lo X V I I I . S e g u n d o p r o p o s t o p e lo a u t o r ,

“ q u a n d o n a m e s m a p e s s o a o u n o m e s m o c o r p o d e m a g is t r a t u r a o p o d e r L e ­

g i s l a t i v o e s t á r e u n id o a o P o d e r E x e c u t i v o , n à o h á lib e r d a d e , p o is q u e s e p o d e

e s p e r a r q u e e s s e m o n a r c a o u e s s e s e n a d o f a ç a m l e i s t i r â n i c a s p a r a e x e c u t á - la s

t ir a n ic a m e n t e ” ( D A L L A R I , 2 0 1 3 , p . 2 1 4 ). A t e o r ia p a s s a a s e r a d o ta d a e m
O poder do Estado: finalidades e funções do Estado
-

p r a t ic a m e n t e t o d o s o s E s t a d o s D e m o c r á t i c o s d o p e r ío d o . É , p o r t a n t o , m a is

u m t r a ç o e s s e n c ia l d o c h a m a d o E s t a d o lib e r a l. A lé m d is s o , e s tá p re s e n te

n a D e c l a r a ç ã o d o s D i r e i t o s d o H o m e m e d o C i d a d ã o d e 1 7 8 9 , c u jo a r t . X V I

e s t a b e le c e o s e g u in t e : “ T o d a s o c ie d a d e n a q u a l a g a r a n t ia d o s d ir e i t o s n ã o e s t á

a s s e g u r a d a , n e m a s e p a r a ç ã o d o s p o d e r e s d e t e r m in a d a , n ã o t e m C o n s t i t u i ç ã o ”

( D E C L A R A Ç Ã O ..., [2 0 0 0 ? ]).

P o d e m o s o b s e rv a r a c o n s a g ra ç ã o d a se p a ra ç ã o d e p o d e re s ta l c o m o p re ­

s e n t e a t é o s d ia s d e h o je n a C o n s t i t u i ç ã o d o s E s t a d o s U n i d o s d a A m é r i c a d e

1787. N e la , a s fu n ç õ e s d o E s t a d o sã o d iv id id a s e m trê s p o d e re s : E x e c u t iv o ,

L e g i s l a t i v o e J u d i c i á r i o . A l é m d is s o , e x i s t e m r e g r a s q u e p e r m it e m a l i m i t a ç ã o

d e u m p o d e r p e lo s d e m a i s , q u e é o c h a m a d o sistema de freio e contrapesos,


d e s t in a d o a g a r a n t i r a h a r m o n i a e n t r e t o d a s a s f u n ç õ e s ( M O R A I S ; S T R E C K ,

2 0 1 0 ). M e r e c e d e s ta q u e o p a p e l d e c a d a u m d e s s e s p o d e re s :

P o d e r L e g i s l a t i v o — é a f u n ç ã o d o E s t a d o d e s t in a d a à e la b o r a ç ã o d e n o r m a s

g e r a is e a b s t r a t a s q u e p e r m it e m u m a in o v a ç ã o n a o r d e m j u r í d i c a .

P o d e r E x e c u t iv o — é a f u n ç ã o d o E s t a d o d e s t in a d a à c o n c r e t iz a ç ã o d a s

n o r m a s j u r í d i c a s , m e d ia n t e a t u a ç à o g o v e r n a m e n t a l ( d e c i s õ e s p o l í t i c a s ) e

a t u a ç à o a d m i n i s t r a t i v a , c o m a in t e r v e n ç ã o , o f o m e n t o e a p r e s t a ç ã o d e s e r v i ç o s

p ú b l ic o s e s s e n c i a i s .

P o d e r J u d ic iá r io — é a f u n ç ã o d o E s t a d o d e s t in a d a à r e s o lu ç ã o d e c o n f lit o s e

s o lu ç ã o d c c o n t r o v é r s ia s j u r í d i c a s c o m a u to rid a d e c in s u s c e t ív e l d e c o n tro le e x te rn o .

A s e p a r a ç ã o d o s p o d e r e s t e m p o r f u n d a m e n t o p r e c ip u o a d e s c o n c e n t r a ç ã o

d o p o d e r p o l í t i c o . T r a t a - s e , p o r t a n t o , d e m a i s u m in s t r u m e n t o d e p r o t e ç ã o d a

lib e r d a d e d o i n d i v íd u o e m f a c e d o E s t a d o ( D A L L A R I , 2 0 1 3 ) . M a s e la t a m b é m

s e j u s t i f i c a p o r r a z õ e s d e o r d e m p r á t ic a : a d i v i s ã o d e t a r e f a s p r o p o r c io n a m a io r

e f i c i ê n c i a n a s a t i v i d a d e s r e a l i z a d a s p e lo E s t a d o .

O a u m e n t o n a c o m p l e x i d a d e d a s o c ie d a d e c o n t e m p o r â n e a , c o m in ú m e r a s

c o n t in g ê n c i a s a l h e i a s a o p e n s a m e n t o d o s é c u lo X V I l l , a c e n t u o u a c r í t i c a a o

m o d e lo t r a d i c i o n a l d c s e p a r a ç ã o d o s p o d e r e s , r a z ã o p e la q u a l , n a a t u a l id a d e ,

j á p o d e m o s d e s t a c a r d u a s m u d a n ç a s r e l e v a n t e s . A p r i m e i r a d i z r e s p e it o a o s

li m i t e s d e c a d a f u n ç ã o . A s s im , o m a is c o r r e t o s e r ia c o n s id e r a r a e x is t ê n c ia

d e f u n ç õ e s p r e d o m in a n t e s , d c s o r t e q u e o s d e m a i s p o d e r e s t a m b é m p o d e r ia m

e x e r c e r f u n ç õ e s t í p i c a s d e o u t r o s . A s e g u n d a c r í t i c a d i z r e s p e it o a o r e l a c i o ­

n a m e n t o e n t r e o s p o d e r e s , q u e n ã o a t u a m m a is d e f o r m a i s o l a d a , m a s s im

e m r e g im e d e m ú t u a c o la b o r a ç ã o ( M O R A I S ; S T R E C K , 2 0 1 0 ) .
O poder do Estado: finalidades e funções do Estado

P o r f i m , v a le r e g is t r a r q u e a C o n s t it u iç ã o b r a s ile ir a a d o ta o s is t e m a d e

s e p a r a ç ã o d c p o d e r e s o r a m e n c io n a d o . A s s i m , e s t a b e le c e o a r t . 2 o d a C o n s t i ­

t u iç ã o F e d e r a l d e 1 9 8 8 : “ S ã o P o d e r e s d a U n i à o , in d e p e n d e n t e s e h a r m ô n i c o s

e n t r e s i , o L e g i s l a t i v o , o E x e c u t i v o e o J u d i c i á r i o ” ( B R A S I L , 1 9 8 8 ).

Fique atento

No Brasil, é adotada a teoria da separação dos poderes por expressa previsão constitu­
cional. Trata-se, porém, de um modelo atenuado, já que existem funções típicas para
cada poder, além de funções atípicas para cada poder. É o que ocorre, por exemplo,
com a atribuição do Senado para processar e julgar, nos crimes de responsabilidade,
alguns agentes públicos, como ocorre com o Presidente da República.

Referências '

AZAMBUJA, D. Teoria geral do Estado. 4. ed. São Paulo: Globo, 2008.

BONAVIDES, P. Ciência política. 16. ed. São Paulo: Malheiros, 2009.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil, Brasília, DF:


Senado Federal, 1988.

DALLARI, D. de A. Elementos de teoria geral do Estado. 32. ed. São Paulo: Saraiva, 2013.

DECLARAÇÃO dos direitos do homem e do cidadão de 1789. [2000?]. Disponível


em: <http://pfdc.pgr.mpf.mp.br/atuacao-e-conteudos-de-apoio/legislacao/direitos-
-humanos/declar_dir_homem_cidadao.pdf>. Acesso em: 27 set. 2017.

JELLINEK, G. Teoria general dei Estado. Buenos Aires: Albatros, 1954.

MORAIS, J. L. B. de; STRECK, L. L. Ciência política e teoria do Estado. 7. ed. Porto Alegre:
Livraria do Advogado 2010.

Leituras recomendadas

BOBBIO, N. Estado, governo, sociedade, para uma teoria geral da política. 14. ed. São
Paulo: Paz e Terra S/A, 2007.

CHEVALLIER, ). O Estado pós-moderno. Belo Horizonte: Fórum, 2009.

DIAS, R. Ciência política. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2013.


\ ____________________________________________________________________________________________ J
O Estado na ordem
internacional
/------------------ Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

■ Identificar a importância da soberania no ámbito internacional.


■ Diferenciar soberania e autonomia estatal.
■ Explicar a relação do Estado com entidades não governamentais no
plano internacional.

Introdução--------------------------------------s
A existência de diversos Estados soberanos confirma a presença de urna
comunidade internacional. O estudo do Estado contemporâneo, portanto,
exige uma compreensão das relações entre os Estados a partir da sua
soberania, bem como permite distinguir soberania e autonomia estatais.
Além disso, desponta na ordem do dia a identificação dos demais pro­
tagonistas da ordem internacional.
Neste capítulo, você vai ler a respeito da importância da soberania no
âmbito internacional e da diferença existente entre esta e a autonomia
estatal. Além disso, analisará os principais sujeitos que se relacionam com
o Estado na ordem internacional.

Soberania no âmbito internacional


O a v a n ç o d o E s t a d o m o d e r n o i m p l i c o u o r e c o n h e c im e n t o d e q u e a n o ç ã o d e

E s t a d o é d e p e n d e n t e d e u m a r e l a ç ã o d e p o d e r . C o m e f e it o , o p o d e r p o lí t i c o

é e le m e n t o e s s e n c i a l d o c o n c e it o d e E s t a d o , d c s o r t e q u e n ã o h á E s t a d o s e m

p o d e r p o lí t i c o . O p o d e r p o lí t i c o d e u m E s t a d o , p o r s e u t u r n o , d e v e s e r s u p r e m o

n o p la n o in t e r n o e in d e p e n d e n t e n o p la n o e x t e r n o . O e s t u d o d o p o d e r p o lí t i c o

d o E s t a d o e q u i v a l e , p o r t a n t o , a o e s t u d o d a s u a s o b e r a n ia .
O Estado na ordem internacional

A a f ir m a ç ã o d o p o d e r p o lít ic o d o E s t a d o s e r e v e la t r a n s c e n d e n t a l p a r a

c o m p r e e n d e r a s r e la ç õ e s d e u m E s t a d o c o m o u tro s E s t a d o s . A l i á s , fo i n o

c o n te x to d e d e b a te s o b re o s lim it e s d o p o d e r d e u m s o b e ra n o e m fa c e d e

o u t r o q u e s u r g i r a m a s p r i m e i r a s d e f i n i ç õ e s d e s o b e r a n ia . A s s i m , J e a n B o d i n

d e s t a c o u a s o b e r a n i a c o m o p o d e r a b s o lu t o e p e r p é t u o d a R e p ú b l i c a , is t o é ,

d o E s t a d o . E n q u a n t o p o d e r a b s o lu t o , e la n à o p o d e r ia s e r l i m i t a d a p o r q u a l­

q u e r o u t r o p o d e r o u c a r g o e s t a b e le c id o p e lo h o m e m ; c o m o p o d e r p e r p é t u o ,

a s o b e r a n ia n ã o p o d e r ia s e r l i m i t a d a n o t e m p o . P o r f i m , a in d a q u e n ã o m e n ­

c i o n a d a e x p r e s s a m e n t e , a lg u n s r e c o n h e c e m q u e j á n o a u t o r d o Les Six Livres


de la Répuhlique s e r i a p o s s í v e l i d e n t i f i c a r a id e ia s e g u n d o a q u a l o t i t u l a r d a

s o b e r a n ia e s t a r ia a c i m a d o d ir e i t o in t e r n o e l i v r e p a r a t o m a r d e c is õ e s n o p la n o

in t e r n a c i o n a l ( D A L L A R I , 2 0 1 3 ) .

O te m a ta m b é m fo i t r a b a lh a d o p o r H u g o G r o t iu s n a o b ra De ju re belli ac
pacis ( 1 6 2 5 ) . C o m e le , a s o b e r a n ia é a lç a d a a o s u p r e m o p o d e r p o lí t i c o e x e r c id o

p o r u m a p e s s o a d e t e r m i n a d a , c u j o s a t o s s à o i n d i s c u t i v e l m e n t e l e g a is p a r a

q u a l q u e r i n d i v í d u o . C o m e f e it o , H u g o G r o t i u s a p r e s e n t o u “ u m s is t e m a d e

d ir e i t o s e o b r ig a ç õ e s j u r í d i c a s , q u e s ã o a p l i c á v e i s à s r e la ç õ e s e n t r e o s E s t a d o s ,

s o b a p r o t e ç ã o e s a n ç à o d o d ir e i t o n a t u r a l , n u m t e m p o e m q u e h a v i a m d e s a ­

p a r e c id o a u n id a d e e u r o p e ia e a p r o t e ç ã o r e l i g i o s a d e u m a m o r a l u n i v e r s a l ”

( D I A S , 2 0 1 3 , p . 1 3 4 ).

A p a r t i r d o s é c u lo X I X , s u r g e u m a p r e o c u p a ç ã o e m a p r e s e n t a r o c a r á t e r

j u r í d i c o d a s o b e r a n ia . H á , e m r a z ã o d i s s o , u m a e v o lu ç ã o d o c o n c e it o q u e , n o

m o m e n t o a n t e r io r , r e v e l a v a c l a r o c a r á t e r p o l í t i c o . A s s i m , n a p e r s p e c t i v a j u r í ­

d i c a , a s o b e r a n ia s u r g e c o m o o p o d e r d e d e c i d i r , e m ú l t i m a i n s t â n c i a , s o b r e a s

n o rm a s ju r íd ic a s e a s u a e f ic á c ia . E la é p o d e r ju r íd ic o q u e v is a f in s ju r íd ic o s .

Fique atento

Em termos teóricos, como a noção de ordenamento jurídico é a mesma para todos


os Estados, haveria uma igualdade jurídica entre Estados soberanos: todos estariam,
no patamar internacional, no mesmo degrau. Essa constatação teórica, porém, não
se revela plenamente correta na prática das relações internacionais.

A s s i m , a p e s a r d e t o d a s a s r e s t r i ç õ e s t e ó r i c a s e p o l í t i c a s , o r e c o n h e c im e n t o

d e u m E s t a d o n o c e n á r i o in t e r n a c i o n a l “ n ã o o b e d e c e a u m a r e g u l a ç ã o j u r í ­

d i c a p r e c i s a , f i c a n d o n a d e p e n d ê n c ia d a c o m p r o v a ç ã o d e p o s s u i r s o b e r a n ia ”
O Estado na ordem internacional
-

( D A L L A R I , 2 0 1 3 , p . 2 5 9 ) . O c o r r e q u e a s o b e r a n ia , n a p e r s p e c t iv a j u r í d i c a ,

r e p r e s e n t a a a u s e n c ia d c o u t r a in s t â n c i a d e p o d e r s u p e r io r , e le m e n t o a p e n a s

i d e n t i f i c á v e l e m u m a s it u a ç ã o d e f a t o (e n ã o d e d i r e i t o ) ( M O R A I S ; S T R E C K ,

2 0 1 0 ) . H á , p o r t a n t o , u m s é r io p r o b le m a d e r e c o n h e c im e n t o d a s o b e r a n ia n a

como identificar o momento em que uma sociedade política


p e r s p e c t iv a g lo b a l:

organizada pode ser considerada soberana?


A q u e s t ã o é r e a lm e n t e p r o b le m á t ic a e g e r a c o n t r o v é r s i a . P a r a a l g u n s , a

s o b e r a n ia d e v e r i a s e r r e c o n h e c id a a p e n a s p a r a a q u e le s E s t a d o s q u e p o s s u e m

c o n d iç õ e s d e im p o r a s u a v o n t a d e ( D A L L A R I , 2 0 1 3 ) . J á , p a r a o u t r o s , o r e c o ­

n h e c im e n t o d a s o b e r a n ia d e p e n d e r ia d a o b s e r v â n c i a d a s r e g r a s e s t a b e l e c id a s

p e la p r ó p r i a c o m u n i d a d e i n t e r n a c io n a l s o b r e o a s s u n t o . O c o r r e q u e , à l u z d o

D i r e it o in t e r n a c io n a l , o r e c o n h e c im e n t o d e u m E s t a d o p o r o u t r o é a to u n i la t e r a l

e m e r a m e n t e d e c la r a t o r io , q u e im p lic a a a c e it a ç ã o , d a q u e le q u e r e c o n h e ­

c e u , d a c o n d iç ã o d e s u je it o d e D i r e i t o i n t e r n a c i o n a l , d o E s t a d o r e c o n h e c id o

( M A Z Z U O L I , 2 0 1 4 ) . N ã o é , p o r t a n t o , o r e c o n h e c im e n t o d a s o b e r a n ia d e u m

E s t a d o n o p la n o i n t e r n a c io n a l q u e o c a s i o n a o s e u a u t ê n t ic o s u r g im e n t o . V a le

r e g i s t r a r , a in d a q u e v ig e n t e a p e n a s e n t r e E s t a d o s d a A m é r i c a , a C o n v e n ç ã o

d e M o n t e v id é u s o b r e o s D i r e i t o s e D e v e r e s d o s E s t a d o s ( 1 9 3 3 ) :

Art. 3° A existência política do Estado é independente do seu reconhecim ento


pelos dem ais Estados. A inda antes de reconhecido, tem o E stado o direito de
defender sua integridade e independência, prover a sua conservação e pros­
peridade, e conseguintem ente, organizar-se com o achar conveniente, legislar
sobre seus interesses, ad m in istrar seus serviços e determ inar a ju risd ição e
com petência dos seus tribunais (B R A SIL , 1937).

N o m e s m o s e n t id o , a C a r t a d a s N a ç õ e s U n i d a s ( B R A S I L , 1 9 4 5 ) e s t a b e le c e

a lg u n s p r i n c í p i o s b á s ic o s p a r a o s s e u s m e m b r o s , q u e c o n f i r m a m a n e c e s s id a d e

d e t r a t a m e n t o i g u a l i t á r i o e p a c í f i c o e n t r e E s t a d o s d o t a d o s d e s o b e r a n ia :

A rtigo 1 O s propósitos das N ações U nidas sào:


1. M anter a paz e a segurança internacionais e, para esse fim : tom ar, cole­
tivam ente, m edidas efetivas para evitar am eaças à paz e reprim ir os atos de
agressão ou outra qualquer ruptura da paz e chegar, por meios pacíficos e
de conform idade com os princípios da ju stiça e do direito internacional, a
um ajuste ou solução das controvérsias ou situações que possam levar a uma
perturbação da paz;
2. D esenvolver relações am istosas entre as nações, baseadas no respeito ao
principio de igualdade de direitos c de autodeterm inação dos povos, c tom ar
outras m edidas apropriadas ao fortalecim ento da paz universal;
3. Conseguir uma cooperação internacional para resolver os problemas interna­
cionais de caráter econômico, social, cultural ou hum anitário, e para promover
O Estado na ordem internacional

e estim ular o respeito aos direitos hum anos e às liberdades fundam entais para
todos, sem distinção de raça, sexo, língua ou religião; e
4. Ser um centro destinado a harm onizar a ação das nações para a consecução
desses objetivos com uns.

A rtigo 2 A O rganização e seus M em bros, para a realização dos propósitos


m encionados no A rtigo I, agirão de acordo com os seguintes Princípios:
1. A Organização é baseada no princípio da igualdade de todos os seus Membros.
2. Todos os M em bros, a fim de assegurarem para todos em geral os direitos
e vantagens resultantes de sua qualidade de M em bros, deverão cum prir de
boa-fé as obrigações por eles assum idas de acordo com a presente Carta.
3. Todos os M embros deverão resolver suas controvérsias internacionais por
m eios pacíficos, de modo que não sejam am eaçadas a paz, a segurança e a
justiça internacionais.
4. Todos os M embros deverão evitar em suas relações internacionais a ameaça
ou o uso da força contra a integridade territorial ou a dependência política
de qualquer Estado, ou qualquer outra ação incom patível com os Propósitos
das N ações Unidas.
5. Todos os M embros darão às Nações toda assistência em qualquer ação a que
elas recorrerem de acordo com a presente Carta e se absterão de dar auxílio a qual
Estado contra o qual as Nações Unidas agirem de modo preventivo ou coercitivo.
6. A O rganização fará com que os Estados que não são M em bros das Nações
Unidas ajam de acordo com esses Princípios em tudo quanto for necessário à
m anutenção da paz e da segurança internacionais.
7. Nenhum dispositivo da presente C arta autorizará as Nações Unidas a inter­
virem em assuntos que dependam essencialm ente da ju risd ição de qualquer
Estado ou obrigará os Membros a submeterem tais assuntos a um a solução, nos
term os da presente C arta; este princípio, porém , não prejudicará a aplicação
das m edidas coercitivas constantes do C apitulo VII.

A p e s a r d a t e n t a t iv a d e p o s it iv a ç à o n o p la n o in t e r n a c io n a l , o r e c o n h e c im e n t o

d a s o b e r a n ia d e u m E s t a d o a in d a é d e p e n d e n t e d a l i v r e m a n if e s t a ç ã o d e o u t r o

s u je it o d e D i r e it o in t e r n a c io n a l , o q u e r e v e la o c a r á t e r d i s c r i c i o n á r i o e r e a lm e n t e

n ã o r e g u la m e n t a d o d a q u e s t ã o . A l i á s , c o n f o r m e D a lm o d e A b r e u D a l l a r i , o b ­

s e r v a m o s q u e “ t e c n ic a m e n t e , o s E s t a d o s v i v e m e m s it u a ç ã o d e a n a r q u ia , p o is ,

e m b o r a e x i s t a u m a o r d e m j u r í d i c a e m q u e t o d o s s e in t e g r a m , n ã o e x i s t e u m

ó r g ã o s u p e r io r d e p o d e r , a q u e t o d o s s e s u b m e t a m ” ( D A L L A R I , 2 0 1 3 , p . 2 6 0 ) .

C o n q u a n t o p r o b le m á t ic o , o r e c o n h e c im e n t o d a s o b e r a n ia d e u m E s t a d o

n o p la n o in t e r n a c io n a l p r o d u z r e l e v a n t e s c o n s e q u ê n c ia s ( M A Z Z U O L l , 2 0 1 4 ) .

E a p e n a s p e lo r e c o n h e c im e n t o d a c o m u n i d a d e i n t e r n a c io n a l q u e u m E s t a d o

s e t o r n a s u je i t o d e d ir e i t o n o p la n o i n t e r n a c i o n a l . A p a r t i r d i s s o , p o d e r á s e r

t i t u l a r d e r e la ç õ e s j u r í d i c a s ( M A Z Z U O L l , 2 0 1 4 ) , c o m o , p o r e x e m p lo , c e le b r a r

t r a t a d o s , m a n t e r r e l a ç õ e s d ip lo m á t i c a s e p a r t i c i p a r d e o r g a n i z a ç õ e s in t e r n a ­

c i o n a i s . R e c o n h e c i d a a s o b e r a n ia d e u m E s t a d o , t o d o o s is t e m a d e p r o t e ç ã o
O Estado na ordem internacional
-

in t e r n a c io n a l s e t o r n a a c e s s í v e l . A s s i m , p o r e x e m p lo , u m n o v o E s t a d o p o d e r ia

b u s c a r a s u a a d e s ã o à s N a ç õ e s U n i d a s o u o u t r a s o r g a n i z a ç õ e s i n t e r n a c io n a i s .

A l é m d is s o , c a s o a d ir a à C o n v e n ç ã o d e M o n t e v id é u , a n t e s m e n c io n a d a , p o d e r á

s e v a l e r d e t o d o s o s d ir e i t o s in e r e n t e s a o s p a c t u a n t e s .

A s o b e r a n ia d e u m E s t a d o , q u a n d o r e c o n h e c id a p e la c o m u n id a d e in t e r n a ­

c i o n a l, t a m b é m im p l ic a a n e c e s s id a d e d e o b s e r v â n c ia d o D i r e it o c o s t u m e ir o e m

r e la ç ã o à q u e le E s t a d o , b e m c o m o a n e c e s s id a d e d c o b s e r v â n c ia d o s p r i n c í p i o s

d e D ir e it o in t e r n a c io n a l, c o m o o tra ta m e n to ig u a lit á r io , a n à o in t e r v e n ç ã o , a

a u t o d e t e r m in a ç ã o d o s p o v o s , a s o lu ç ã o p a c í f i c a d a s c o n t r o v é r s ia s in t e r n a c io n a is

e a p r o ib iç ã o d a a m e a ç a o u d o u s o d a fo r ç a ( M A Z Z U O L l , 2 0 1 4 ).

\
Fique atento

O reconhecimento da soberania de um Estado por outro é ato discricionário do Estado


que vai reconhecer.
\ ______________________________________________________________________________________________________________ )

Soberania e autonomia estatal

A e x is t ê n c ia d e p o d e r p o lít ic o , p o r é m , n e m s e m p re im p lic a a p re s e n ç a d e u m

E s t a d o s o b e r a n o . C o n f o r m e d e s t a c a d o p o r M a r c e l l o C a e t a n o , a s o b e r a n ia é o

p o d e r p o l í t i c o n a s u a f o r m a p le n a , o u s e j a , p o d e r p o l í t i c o s u p r e m o e in d e p e n ­

d e n t e . P a r a e le , s e u m a c e r t a c o l e t i v i d a d e t e m lib e r d a d e p le n a d e e s c o l h e r a

s u a o r g a n i z a ç ã o e p o d e s e o r ie n t a r n o s e n t id o q u e b e m lh e p a r e c e r , e la b o r a n d o

l e i s q u e c o n s id e r e c o n v e n i e n t e s , e s s a c o le t i v id a d e f o r m a u m E s t a d o s o b e r a n o .

O c o r r e q u e , e m d e t e r m in a d o s c a s o s , é p o s s ív e l e x i s t i r u m a o r g a n iz a ç ã o in t e r n a

l i v r e e m d e t e r m i n a d o s E s t a d o s s e m q u e e s s a m e s m a li b e r d a d e r e p r e s e n t e

s o b e r a n ia ( C A E T A N O ; T E L E S , 1 9 7 2 ).

Fique atento

Em outras palavras, há casos em que o poder político de uma sociedade é organi­


zado de tal forma que, mesmo sem soberania, existirá uma margem de liberdade na
organização daquele agrupamento.
O Estado na ordem internacional

A f o r m a a s s u m i d a p e lo E s t a d o , p o r t a n t o , o c a s i o n a u m a n o v a r e f l e x ã o

s o b r e a s o b e r a n ia e p e r m it e d i f e r e n c i á - l a d a m e r a a u t o n o m ia e s t a t a l. N e s s e

s e n t id o , M a r c e l l o C a e t a n o le m b r a q u e , n o s E s t a d o s f e d e r a d o s e n o s E s t a d o s

p r o t e g id o s , n ã o h á q u e s e f a l a r e m s o b e r a n i a , m a s a p e n a s e m p o d e r p o l í t i c o

v i n c u l a d o a u m o u t r o p o d e r s u p e r io r . N o p r i m e i r o c a s o , a U n i ã o ; n o s e g u n d o ,

o E s t a d o p r o t e t o r ( C A E T A N O ; T E L E S , 1 9 7 2 ). N a a t u a l i d a d e , p o r é m , a p r i ­

m o r d ia l d if e r e n ç a d i z r e s p e it o à f o r m a d o E s t a d o . N e s s e a s p e c t o , p o d e m s e r

d i f e r e n c i a d a s d u a s f o r m a s d e E s t a d o : o E s t a d o f e d e r a l e o E s t a d o u n i t á r io .

I n i c i a l m e n t e , a f o r m a u n i t á r ia s e f a z p r e s e n t e q u a n d o o E s t a d o p o s s u i a p e n a s

u m p o d e r p o l í t i c o c e n t r a l , q u e é o n ú c le o d e t o d a a s u a a t u a ç ã o e o r g a n i z a ç ã o .

J á a f o r m a f e d e r a t iv a s e c a r a c t e r i z a p e la c o n ju g a ç ã o d e v á r i o s c e n t r o s d e p o d e r

p o l í t i c o c o m a u t o n o m ia , m a s v i n c u l a d o s p o r u m p a c t o j u r í d i c o i n a f a s t á v e l

( D A L L A R I , 2 0 1 3 ) . P a r a m e lh o r c o m p r e e n d e r o E s t a d o f e d e r a l e o s l i m i t e s d a

s u a s o b e r a n ia , c u m p r e p e r q u i r i r a c e r c a d a s u a o r ig e m h i s t ó r i c a e i d e n t i f i c a r ,

c o m m a is c la r e z a , a s s u a s c a r a c t e r ís t ic a s e s s e n c ia is .

A p e s a r d e a lg u n s a n te c e d e n te s h is t ó r ic o s , o E s t a d o f e d e r a l, a p e s a r d a

in s p ir a ç ã o g r e g a , s u r g iu n o E s t a d o m o d e rn o ( B O N A V I D E S , 2 0 0 9 ) , c o m a

C o n s t it u iç ã o d o s E s t a d o s U n id o s d a A m é r ic a ( E U A ) e m 1787 ( D A L L A R I ,

2 0 1 3 ) . V a l e l e m b r a r q u e , e m 1 7 7 6 , a s 13 c o l ô n i a s b r i t â n i c a s d a A m é r i c a d e ­

c l a r a r a m in d e p e n d ê n c ia . A p a r t i r d i s s o , t o r n a r a m - s e 13 E s t a d o s s o b e r a n o s ,

c o m o r g a n iz a ç ã o p r ó p r ia e a d e q u a d a d e lim it a ç ã o g e o g r á fic a . A lg u n s a n o s

d e p o i s , o s 13 E s t a d o s c e le b r a r a m u m t r a t a d o i n t e r n a c io n a l d e a l i a n ç a , p a r a

q u e p u d e s s e m r e a l i z a r a lg u m a s a ç õ e s c o n ju n t a s ( n o t a d a m e n t e c o m o o b je t iv o

d c a s s e g u r a r a in d e p e n d ê n c ia r e c é m - a d q u ir id a ) . F o r m o u - s e , a s s i m , u m p a c t o

d e m ú t u o a u x í l i o q u e e s t a b e l e c ia u m a c o n f e d e r a ç ã o n o r t e - a m e r i c a n a , c o m a

a s s i n a t u r a d o s A r t i g o s d a C o n f e d e r a ç ã o e m 1781 ( D A L L A R I , 2 0 1 3 ) . O t r a t a d o

e m c o m e n to , a liá s , e x p re s s a m e n te a s s e n ta v a q u e c a d a E s ta d o e ra so b e ra n o ,

l i v r e e in d e p e n d e n t e .

C o m o t e m p o , a p r á t ic a d e m o n s t r o u q u e o s la ç o s c o n f e d e r a d o s n ã o e r a m

in t e n s o s o s u f i c i e n t e p a r a g a r a n t i r a e f i c á c i a d o s s e u s p r o p ó s it o s . A s s i m ,

h o u v e u m a n o v a c o n v e n ç ã o e n tre o s re p re se n ta n te s d o s E s ta d o s p a ra q u e

f o s s e m p r o p o s t a s m u d a n ç a s n o p a c t o a n t e r io r . N a c h a m a d a C o n v e n ç ã o d a

F ila d é lf ia , e m 1787, o s p re s e n te s se d iv id ir a m e m d u a s c o rre n te s d e p e n s a ­

m e n to . P a r a o p r im e ir o g r u p o , d e v e r ia o c o r r e r u m a m e ra r e v is ã o d o s A r t ig o s

d a C o n fe d e r a ç ã o . P a ra o s e g u n d o g r u p o , d e v e r ia o c o r r e r u m a r e e s tr u t u r a ç ã o

n a o r g a n iz a ç ã o p o lít ic a d o s E s t a d o s , c o m a fo r m a ç ã o d e u m g o v e r n o a o q u a l

t o d o s o s E s t a d o s e s t a r i a m s u b m e t id o s ( D A L L A R I , 2 0 1 3 ) .

C o m in t e n s o d e b a t e s o b r e o a s s u n t o , a c a b o u p r e v a l e c e n d o a s e g u n d a p o ­

s iç ã o : d e v e r ia o c o r r e r u m a r e f o r m u la ç ã o d o p a c to e n tre o s E s t a d o s , c o m a
O Estado na ordem internacional
-

s u b m is s ã o d e t o d o s a u m g o v e r n o c e n t r a l a p t o a c o n c e n t r a r a l g u m a s c o m p e ­

t e n c ia s e r e a l i z a r a g e s t ã o d e a lg u m a s a t i v i d a d e s e s p e c í f i c a s . P o r o u t r o la d o ,

o s E s t a d o s c o n t i n u a r i a m c o m a m p lo s p o d e r e s p o l í t i c o s e j u r í d i c o s s o b r e o

s e u t e r r i t o r i o . N e s s a m e s c l a d e c e n t r a l i z a ç ã o e lib e r d a d e , s u r g i a o p r i m e i r o

E s t a d o f e d e r a l, is t o é , o s E U A .

N o E s t a d o f e d e r a l, p o rta n to , e x is t e m d u a s f ig u r a s d is t in t a s . P r im e ir o ,

u m e n t e r e s p o n s á v e l p e lo g o v e r n o c e n t r a l e p o r a t r i b u i ç õ e s a p l i c á v e i s a t o -
$

d o s o s p a r t ic i p a n t e s d e s s a f e d e r a ç ã o . E f r e q u e n t e m e n t e c h a m a d o d e U n i ã o ,

c o m o , a liá s , o c o rr e n o s E U A e n o B r a s il. S e g u n d o , e x is t e m g o v e rn o s liv r e s

e a u t ô n o m o s q u e in t e g r a m a r e u n i ã o f e d e r a t iv a . S ã o o s E s t a d o s - m e m b r o s

( B O N A V ID E S , 2 0 0 9 ).

A s c a r a c t e r í s t i c a s f u n d a m e n t a i s d o E s t a d o f e d e r a l s à o a s s e g u in t e s :

E x i s t e a p e n a s u m E s t a d o s o b e r a n o — n a f o r m a f e d e r a t iv a , o s u r g im e n t o d a U n ià o

c r i a u m n o v o E s t a d o , f r u t o d a r e u n iã o d o s E s t a d o s a n t e r io r e s . E s t e s , p o r s u a v e z ,

p e r d e m a s u a in d e p e n d ê n c ia n o q u e t a n g e à s s u a s r e la ç õ e s in t e r n a c io n a is . A s s i m ,

o s E s t a d o s - m e m b r o s a b d ic a m d a s u a s o b e r a n ia e m d e t r im e n t o d a u n iã o o c o r r id a ,

e s o m e n t e s e r á s o b e r a n o o E s t a d o s u r g id o c o m a u n ià o d o s E s t a d o s a n t e r io r e s .

C o m e fe it o , “ p e lo p r ó p r io c o n c e it o d e s o b e r a n ia s e v e r if ic a s e r im p o s s ív e l a c o e x is ­

t ê n c ia d e m a is d e u m a s o b e r a n ia n o m e s m o E s t a d o , n ã o t e n d o , p o r t a n t o , q u a lq u e r

c o n s is t ê n c ia a p r e t e n s ã o d e q u e a s u n id a d e s f e d e r a d a s t e n h a m s o b e r a n ia lim it a d a

o u p a r c i a l” ( D A L L A R I , 2 0 1 3 , p . 2 5 4 ) . A s s i m , m a jo r it a r ia m e n t e e n t e n d e m o s q u e

a e x p r e s s ã o E s t a d o - m e m b r o c o n f e r id a à u n id a d e d a f e d e r a ç ã o é a p e n a s u m a r t i ­

f í c i o , j á q u e , n a v e r d a d e , n ã o s à o m a is E s t a d o s ( D A L L A R I , 2 0 1 3 ). O m o n o p ó lio

d a p e r s o n a lid a d e in t e r n a c io n a l f ic a c o m o E s t a d o f e d e r a l ( B O N A V I D E S , 2 0 0 9 ) .

E s s a c a r a c t e r ís t ic a t a m b é m r e v e la q u e a c id a d a n ia é v í n c u l o j u r í d i c o q u e s e d á

a p e n a s c o m o E s t a d o f e d e r a l e n ã o c o m o s E s t a d o s - m e m b r o s ( D A L L A R I , 2 0 1 3 ).

I m p o s s i b i l i d a d e d e s e c e s s ã o — a f o r m a f e d e r a t iv a é id e a liz a d a p a r a p e r d u r a r .

A s s i m , d if e r e n t e m e n t e d o q u e o c o r r e c o m u m a c o n f e d e r a ç ã o , n o E s t a d o f e d e r a l,

n ã o h á d ir e i t o d e s e c e s s ã o p a r a o s s e u s in t e g r a n t e s . A s s i m , u m E s t a d o - m e m b r o

n ã o p o d e r á s e r e t i r a r d a U n iã o a q u e a d e r iu p o r m e io s le g a is ( D A L L A R I , 2 0 1 3 ).

D i s t r i b u i ç ã o c o n s t i t u c i o n a l d e c o m p e t ê n c i a s — a f o r m a f e d e r a t iv a t e m a s u a

b a s e j u r í d i c a c m u m a C o n s t it u iç ã o e n ã o e m u m t r a t a d o p a s s ív e l d e d is c o r d â n c ia

p e lo s q u e ir ã o a d e r i r a o s s e u s t e r m o s ( d e n ú n c ia ) . A C o n s t i t u i ç ã o d o E s t a d o

fe d e ra l a s s u m e r e le v â n c ia ím p a r n à o a p e n a s p o r r e p r e s e n t a r o fu n d a m e n to

j u r í d i c o d e v a lid a d e d a o r g a n i z a ç ã o p o l í t i c a , o c im e n t o j u r í d i c o d a s u p r e m a c ia

( B O N A V I D E S , 2 0 0 9 ) , m a s t a m b é m p o r i m p l i c a r a d is t r ib u iç ã o d e c o m p e t ê n c ia s
O Estado na ordem internacional

d e s s e E s t a d o . A s s im , é o T e x t o C o n s t it u c io n a l q u e f ix a r á o s lim it e s d e a tu a ç ã o

le g ít im a d a U n iã o e d o s E s t a d o s - m e m b r o s ( D A L L A R I , 2 0 1 3 ).

C o m p a r t ilh a m e n t o d o p o d e r p o lít ic o e n t r e o s e n te s fe d e r a d o s — o u tra

c a r a c t e r ís t ic a e s s e n c ia l d o E s t a d o fe d e ra l é q u e h a v e rá u m e s p a ç o d e p o d e r

p o l í t i c o d e s t in a d o a c a d a e n t e f e d e r a d o . A s s i m , é p o s s í v e l q u e c a d a u n id a d e

fe d e ra d a p o s s u a u m g o v e rn o p r ó p r io , c o m r e g ra s ju r í d i c a s p r ó p r ia s e c o m ­

p a t í v e i s c o m o s in t e r e s s e s l o c a i s . N e s s e s e n t id o , c a d a m e m b r o d a f e d e r a ç ã o

p o s s u i a u t o n o m ia a d m i n i s t r a t i v a ( q u a n t o á m á q u in a b u r o c r á t ic a d o g o v e r n o )

e a u t o n o m ia l e g i s l a t i v a ( q u a n t o à e la b o r a ç ã o d e s u a s p r ó p r i a s l e is ) . T r a t a - s e ,

p o r é m , d e a u t o n o m ia l i m i t a d a , j á q u e a a t u a ç à o d a u n i d a d e d a f e d e r a ç ã o

s e m p r e e s t a r á v i n c u l a d a à C o n s t i t u i ç ã o d o E s t a d o f e d e r a l.

A s c a r a c t e r ís t ic a s c it a d a s e v i d e n c ia m a d if e r e n ç a e n t r e s o b e r a n ia e s t a t a l e

a u t o n o m ia e s t a t a l. A s o b e r a n i a é e le m e n t o q u e s e r e la c io n a c o m o p o d e r p o lít ic o

s u p r e m o e in d e p e n d e n te d o E s t a d o e c o n f i r m a a a p t id ã o d e s s e E s t a d o p a r a c o n t r a ir

r e la ç õ e s j u r í d i c a s n o p la n o in t e r n a c io n a l. O E s t a d o s o b e r a n o g o z a d a c o n d iç ã o

d e ig u a ld a d e p e r a n te o u t r o s E s t a d o s s o b e r a n o s . J á a a u t o n o m ia é c a r a c t e r ís t ic a

q u e s e r e la c io n a c o m a o r g a n iz a ç ã o in t e r n a d o E s t a d o e p o d e r á e s t a r p r e s e n t e

c a s o s e ja a d o ta d a a f o r m a f e d e r a t iv a . Q u a n d o h á a u t o n o m ia e s t a t a l, is s o s i g n i f i c a

q u e o s m e m b r o s d a f e d e r a ç ã o p o s s u e m lib e r d a d e p a r a o r g a n iz a r a s u a m á q u in a

a d m i n i s t r a t i v a e e la b o r a r a s le is d e s u a c o m p e t ê n c ia , s e m p r e o b s e r v a n d o o s

um
l i m i t e s e s t a b e le c id o s p e la C o n s t it u i ç ã o d o E s t a d o f e d e r a l. P o r e s s a r a z à o ,

Estado-membro pode ser dotado de ampla autonomia, masjamais será soberano.


H á g ra n d e r e le v â n c ia p r á t ic a n a d if e r e n ç a , j á q u e a p e n a s E s t a d o s c o m

s o b e r a n ia s à o c o n s id e r a d o s s u je it o s d e D ir e it o in t e r n a c io n a l c o m a p t id ã o

j u r í d i c a p a r a c o n t r a i r r e l a ç õ e s n o â m b it o i n t e r n a c i o n a l . A l i á s , o t e m a d a s

r e la ç õ e s i n t e r n a c io n a i s e n t r e o E s t a d o e o u t r o s a t o r e s d o c e n á r i o in t e r n a c io n a l

t a m b é m m e r e c e r e f l e x ã o m a i s d e t a lh a d a .

O Brasil é um Estado federal. Assim como a maioria dos Estados federais, o Brasil adota
um pacto constitucional, isto é, a existência de uma lei maior que, além de atribuir
direitos e limitar o próprio Estado, distribui funções entre diferentes entes públicos.
Trata-se da Constituição Federal promulgada em 1988, quando houve a abertura
democrática. No modelo brasileiro, a federação é composta de quatro figuras diferentes:
União, Estados, Distrito Federal e municípios.
\ ____________________________________________________________________________________________ J
O Estado na ordem internacional
-

As relações internacionais do Estado

U m a d a s g r a n d e s i n o v a ç õ e s n o q u e d i z r e s p e it o a o E s t a d o c o n t e m p o r â n e o é a

v a l o r i z a ç ã o d o D i r e i t o i n t e r n a c i o n a l . D c f a t o , s e a n t e s c a d a E s t a d o c o n s e g u ia

r e s o l v e r , d e f o r m a i s o l a d a , a s s u a s c o n t r o v é r s i a s , n o s é c u lo X X I , é n e c e s s á r io

q u e h a ja u m c o n s t a n t e d iá lo g o n ã o a p e n a s e n t r e o s E s t a d o s , m a s t a m b é m e n t r e

E s t a d o s e o u t r o s s u je it o s d o g lo b o . D e f a t o , a p ó s a S e g u n d a G u e r r a , v i m o s u m a

e s c a la d a n o s u r g i m e n t o d e o r g a n i z a ç õ e s i n t e r n a c i o n a i s ( D A L L A R I , 2 0 1 3 ) .

J á e m é p o c a s m a is r e c e n t e s , a v a l o r i z a ç ã o d a p r o t e ç ã o d o s d ir e i t o s h u m a n o s

e a a p r o x im a ç ã o d o E s t a d o c o m a s o c ie d a d e c i v i l p e r m i t i r a m a a s c e n s ã o d e

e n t id a d e s n ã o g o v e r n a m e n t a i s ( O N G s ) n o p la n o in t e r n a c io n a l .

D e s s e m o d o , é im p o r t a n t e i d e n t i f i c a r m o s a s p r i n c i p a i s p e s s o a s d e D i r e i t o

i n t e r n a c io n a l q u e e s t a b e le c e m r e l a ç õ e s c o m o E s t a d o . V a l e le m b r a r , a n t e c ip a ­

d a m e n t e , q u e a p e r s o n a lid a d e j u r í d i c a in t e r n a c io n a l é a a p t id ã o p a r a t i t u l a r i z a r

d ir e i t o s e o b r i g a ç õ e s p e r a n t e a o r d e m in t e r n a c i o n a l ( M A Z Z U O L l , 2 0 1 4 ) . O s

s e g u in t e s s u je i t o s m e r e c e m d e s t a q u e :

O u t r o s E s t a d o s — a s s u m in d o q u e o E s t a d o é f o r m a d o p e la c o n ju g a ç ã o d o s

e le m e n t o s c l á s s i c o s ( p o v o , t e r r i t ó r i o e s o b e r a n ia ) , s e m p r e q u e t a i s e le m e n t o s

e s t i v e r e m p r e s e n t e s , é p o s s í v e l o r e l a c io n a m e n t o e n t r e E s t a d o s , a t é p o r q u e

é in e r e n t e à s o b e r a n i a e s s a p o s s i b i l i d a d e . N e s s e s e n t i d o , a C o n v e n ç ã o d e

M o n t e v i d é u s o b r e D i r e i t o s e D e v e r e s d o s E s t a d o s e s t a b e le c e q u e u m E s t a d o

é p e s s o a d e D i r e i t o i n t e r n a c i o n a l q u a n d o p o s s u i p o p u la ç ã o p e r m a n e n t e , t e r ­

r i t ó r i o d e t e r m in a d o , g o v e r n o c c a p a c id a d e d c e n t r a r c m r e l a ç õ e s c o m o u t r o s

E s t a d o s ( a r t . I o).

O r g a n i z a ç õ e s i n t e r n a c i o n a i s — s ã o o s e n t e s c r i a d o s p e la v o n t a d e d o s E s t a ­

d o s p o r u m t r a t a d o c o n s t i t u t i v o , c o m a p a r e lh o i n s t i t u c i o n a l p e r m a n e n t e p a r a

a l c a n ç a r d e t e r m in a d a s f i n a l i d a d e s ( M A Z Z U O L l , 2 0 1 4 ) .

I n d i v í d u o — u m d o s p r i n c i p a i s d e b a t e s d a a t u a lid a d e d i z r e s p e it o a c o n s id e r a r

a p e s s o a n a t u r a l c o m o s u je i t o d c D i r e i t o i n t e r n a c i o n a l . H á b o n s a r g u m e n t o s

p a r a a m b o s o s la d o s ( M A Z Z U O L l , 2 0 1 4 ) . A q u e l e s f a v o r á v e i s le v a n t a m q u e

a lg u n s t r a t a d o s r e g u l a m d ir e t a m e n t e a s r e l a ç õ e s i n d i v i d u a i s , a t r i b u i n d o d i r e i ­

t o s . A l é m d i s s o , c a b c d e s t a c a r m o s q u e m u i t a s c o r t e s i n t e r n a c i o n a i s a c e it a m

a p o s t u la ç ã o d e s s a s p e s s o a s , c o m o o c o r r e c o m a C o m i s s ã o I n t e r a m e r i c a n a

d e D ir e it o s H u m a n o s . A in d a , a p e s s o a n a tu ra l p o d e re s p o n d e r c r im in a lm e n t e

e m c o r t e s i n t e r n a c i o n a i s , c o m o , p o r e x e m p lo , p e r a n t e o T r i b u n a l P e n a l I n ­

t e r n a c io n a l ( T P I ) .
O Estado na ordem internacional

O N G s — s ã o e n t id a d e s p r iv a d a s s e m f in s lu c r a t iv o s q u e a t u a m e m á r e a s

d e in t e r e s s e p ú b lic o , in c lu s iv e e m a lg u m a s f u n ç õ e s q u e t r a d ic io n a lm e n t e

s e r ia m d o E s ta d o ( M O U R A , 2 0 1 5 ). A p a r t ir d o s é c u lo X X , a s O N G s

p a s s a r a m a d e s e m p e n h a r r e le v a n t e p a p e l n o c e n á r io in t e r n a c io n a l. E la s

p ro m o v e m a a p lic a ç ã o d a s n o r m a s in t e r n a c io n a is e m v á r ia s á r e a s , c o m o

n a s q u e s t õ e s r e l a c i o n a d a s a d i r e i t o s h u m a n o s , p r o t e ç ã o d o m e io a m b ie n t e

e D ir e it o h u m a n it á r io . A lé m d is s o , a a n á lis e f e it a p o r O N G s s o b re o s

a c o n t e c im e n t o s n a s o c ie d a d e in t e r n a c io n a l fr e q u e n t e m e n t e c o n t r ib u i p a r a

a e x p a n s ã o e r e a liz a ç ã o d a s n o r m a s in t e r n a c io n a is . J á s e a d m it e , in c lu s iv e ,

q u e a l g u m a s O N G s o p in e m e m d e t e r m i n a d o s t e m a s e p o s t u l e m p e r a n t e

c o r t e s in t e r n a c io n a is .

O p a p e l c r e s c e n t e d a s O N G s n o r e l a c io n a m e n t o c o m o s E s t a d o s s o b e r a n o s

m e r e c e e s p e c ia l a t e n ç ã o d a t e o r i a g e r a l d o E s t a d o e m u m a p e r s p e c t iv a c o n ­

t e m p o r â n e a . J á s ã o in ú m e r a s a s o r g a n i z a ç õ e s q u e a s s u m e m p r o t a g o n is m o ,

c a u s a n d o v e r d a d e i r a s m u d a n ç a s d e p e n s a m e n t o p o r m e io d e i n t e r v e n ç õ e s

p e r a n t e o s d e m a i s s u je i t o s d e D i r e i t o i n t e r n a c i o n a l . S ã o e x e m p lo s d e O N G s

d e im p o r t â n c ia n a a t u a lid a d e : o C o m it ê O lím p ic o In t e r n a c io n a l ( C O I ) , o

W o r ld W id e F u n d f o r N a t u r e ( W W F ) , o G r e e n p e a c e , a H u m a n R i g h t s W a t c h ,

a A n is t ia In t e r n a c io n a l e o s M é d ic o s S e m F r o n t e ir a s ( M S F ) .

Link

Confira a entrevista de Salil Shetty, Secretário Geral da


Anistia Internacional, no linka seguir ou no código ao lado:

https://goo.gl/tB5CfZ
O Estado na ordem internacional

Referências

BONAVIDES, P. Ciência política 16. ed. São Paulo: Malheiros, 2009.

BRASIL. Decreto n° I570.de 13 de abril de 1937. Promulga as Convenções sobre direitos


e deveres dos Estados e sobre Asilo político, assinadas em Montevidéo a 26 de de­
zembro de 1933, por ocasião da Sétima Conferencia internacional americana. 1937.
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1930-1949/d1570.
htm>. Acesso em: 27 set. 2017.

BRASIL. Decreto n° 19.841, de 22 de outubro de 1945. Promulga a Carta das Nações Uni­
das, da qual faz parte integrante o anexo Estatuto da Corte Internacional de Justiça,
assinada em São Francisco, a 26 de junho de 1945, por ocasião da Conferência de
Organização Internacional das Nações Unidas. 1945. Disponível em: <http://www.
planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1930-1949/d19841.htm>. Acesso em: 27 set. 2017.

CAETANO, M. J. das N. A.; TELES, M. G. (Colab.). Manual de ciência política e Direito


constitucional. 6. ed. Lisboa: Coimbra Ed., 1972.

DALLARI, D. de A. Elementos de teoria geral do Estado. 32. ed. São Paulo: Saraiva, 2013.

DIAS, R. Ciência política. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2013.

MAZZUOLl, V. de O. Curso de Direito internacional público. 8. ed. São Paulo: Revista


dos Tribunais, 2014.

MORAIS, J. L. B. de; STRECK, L. L. Ciência política e teoria do Estado. 7. ed. Porto Alegre:
Livraria do Advogado, 2010.

MOURA, L. D. As organizações não-governamentais de proteção ao meio ambiente: a


influência sobre o Direito internacional e sobre a efetividade da proteção ambiental. In:
CONGRESSO NACIONAL DO CONPEDI, 24,2015, Belo Horizonte. Anais_ Belo Horizonte, 2015.

Leituras recomendadas

AZAMBUJA, D. Teoria geral do Estado. 4. ed. São Paulo: Globo, 2008.

CARESIA. G. Ongs internacionais personalidadejurídica, autorização para funcionamento


no brasil e atuação no sistema das nações unidas. [2010?]. Disponível em: <http://
www.egov.ufsc.br/portal/sites/default/files/anexos/32424-39161-1-PB.pdf>. Acesso
em: 27 set. 2017.

JELLINEK, G. Teoria general dei Estado. Buenos Aires: Albatros, 1954.

TORRONTEGUY, M. A. A ; DALLARI; S. G. 0 Papel das organizações não-governamentais


na cooperação internacional em saúde pública. Saudesoc., São Paulo, v. 21, n. 2,2012.
Disponível em: <http://www.producao.usp.br/bitstream/handle/BDPI/39459/S0104-
12902012000200006.pdf?sequence=1>. Acesso em: 27 set. 2017.
______________________________________________________________________________________________________________________________________ '
Estado e democracia
----------------- Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

■ Conceituar o que é democracia.


■ Diferenciar democracia direta, semidireta e representativa.
■ Demonstrar a crise na democracia atual.

Introdução-------------------------------------- ^
Não há Estado sem um correspondente regime de governo. Para su­
prir uma lacuna a esse respeito, a partir do século XVIII, difundiu-se o
regime democrático. Assim, cumpre perquirir acerca da democracia, o
seu conceito e as suas espécies, bem como refletir sobre as suas reais
possibilidades de concretização no Estado contemporâneo.
Neste capítulo, você vai ler a respeito da democracia em suas múltiplas
facetas, passando pela dimensão conceituai e histórica. Vai também
diferenciar democracia direta, semidireta e representativa, bem como
analisar a crise na democracia atual.

A democracia do passado
E n q u a n t o o r g a n i z a ç ã o p o l í t i c a , o E s t a d o s e a p r e s e n t a p o r m e io d e v a r i a d o s

r e g i m e s d e g o v e r n o d i f e r e n t e s . C o m e f e it o , o t e m a d a s f o r m a s d e g o v e r n o

s u s c i t a p o lê m ic a d e s d e a A n t i g u i d a d e . C o m o a d v e n t o d o E s t a d o m o d e r n o ,

e n t r e t a n t o , a i d e ia d c d e m o c r a c i a s e s e d i m e n t a e p e r m i t e a a f i r m a ç ã o d e

a l g u n s v a lo r e s f u n d a m e n t a i s , c o m o a n o ç à o d e g o v e r n o d o p o v o , q u e j a z n a

e s s ê n c ia d e s s a e x p r e s s ã o . A p re s e n ç a d e u m E s t a d o d e m o c r á t ic o n a a c e p ç à o

a t u a l , p o r e m , p o s s u i a s s u a s r a í z e s n o s é c u lo X V I I I e n ã o d e s c o n s id e r a a s

in flu ê n c ia s d o p a s s a d o ( D A L L A R I , 2 0 1 3 ).

N a A n t ig u i d a d e , o E s t a d o g r e g o v iv e n c i o u a d e m o c r a c ia e m t e r m o s p r á t ic o s

e t e ó r i c o s . N o p la n o t e ó r i c o , A r i s t ó t e l e s d e s t a c o u , n a s u a in s u p e r á v e l r e f l e x ã o

s o b r e a s e s p é c ie s d e g o v e r n o , q u e p o d e r ia c a b e r a u m s ó in d i v í d u o , a u m g r u p o
Estado e democracia
-

d e s u je it o s o u a t o d a u m a c o l e t i v i d a d e . O r g a n i z o u - s e , e n t à o , a d i s t i n ç ã o e n t r e

m o n a r q u ia , a r i s t o c r a c i a e d e m o c r a c ia .

P a ra o p e n s a m e n to g re g o , e n tre ta n to , a n o ç à o d e c id a d a n ia e ra r e s t r it a , de

m o d o q u e , m e s m o e m u m a d e m o c r a c ia , o g o v e rn o n à o s e r ia e n tre g u e a to d a a

p o p u la ç ã o . N a c o n c e p ç ã o d e A r i s t ó t e l e s , “ a v i r t u d e p o l í t i c a , q u e é a s a b e d o r ia

p a r a m a n d a r e o b e d e c e r , s ó p e r t e n c e à q u e le s q u e n ã o tê m n e c e s s id a d e d e

t r a b a l h a r p a r a v i v e r , n ã o s e n d o p o s s í v e l p r a t ic a r - s e a v i r t u d e q u a n d o s e le v a a

v id a d e a r t e s ã o o u d e m e r c e n á r io ” ( D A L L A R I , 2 0 1 3 , p . 1 4 6 ). A c r í t i c a m o d e r n a

a o m o d e lo d e m o c r á t ic o g r e g o d e c o r r e u ju s t a m e n t e d a p r e s e n ç a d a e s c r a v i d ã o ,

j á q u e p r e s s u p u n h a u m g r a n d e g r u p o d e s u je i t o s q u e n à o p a r t i c i p a r i a m d a

v id a p o lít ic a ( B O N A V I D E S , 2 0 0 9 ).

O m a is c é le b r e e x e m p lo d e d e m o c r a c ia e x e r c id a n a A n t ig u i d a d e f i c a c o m a

A t e n a s d e P é r i c l e s e h i s t o r ia d a p o r T u c í d id e s , n o L i v r o I I d a H i s t ó r i a d a G u e r r a

d o P e lo p o n e s o . A p a r t i r d e s s e r e l a t o , é p o s s í v e l i d e n t i f i c a r a p r e s e n ç a d e u m

g o v e r n o e m q u e a d e m o c r a c i a é lo u v a d a ( M O R E I R A , 1 9 9 7 ) . E s s e c e n á r i o

h i s t ó r i c o r e v e l a a l g u m a s c a r a c t e r í s t i c a s d a d e m o c r a c i a a n t ig a : a lib e r d a d e

d e o p in i ã o o u e x p r e s s ã o ( i s a g o r i a ) , a ig u a l d a d e d e t o d o s p e r a n t e a l e i , s e m

d if e r e n ç a d e g r a u , c l a s s e o u r iq u e z a ( i s o n o m i a ) , e o l i v r e a c e s s o d e t o d o s a o

e x e r c í c i o d a s f u n ç õ e s p ú b l ic a s ( i s o t i m i a ) ( B O N A V I D E S , 2 0 0 9 ) .

C o m e f e it o , “ a r e f e r ê n c i a à p r a t i c a d a d e m o c r a c i a e m a l g u m a s c i d a d e s

g r e g a s , e m b r e v e s p e r ío d o s , s e r i a i n s u f i c i e n t e p a r a d e t e r m i n a r a p r e f e r ê n c ia

p e la d e m o c r a c ia , q u e s e a f i r m o u a p a r t i r d o s é c u lo X V I I I e m t o d o o h e m is f é r io

o c i d e n t a l , a t in g in d o d e p o is o r e s t a n t e d o m u n d o ” ( D A L L A R I , 2 0 1 3 , p . 1 4 6 ).

Fique atento

Foi necessário, assim, um intenso debate de contestação ao poder concentrado nas


mãos de poucos para que o discurso sobre a democracia ganhasse fôlego, o que, de
fato, ocorreu. Novamente, contribuições teóricas e situações concretas permitiram o
advento do Estado democrático.

A s s i m , n o p la n o t e ó r ic o , o p e n s a m e n t o d e R o u s s e a u , v a lo r iz a n d o a v o n t a d e

g e r a l, a in d a q u e c é t ic o q u a n to à p o s s ib ilid a d e d e u m g o v e r n o d e m o c r á t ic o ,

s ó n ã o f o i m a i s im p o r t a n t e d o q u e o i d e á r i o d e L o c k e . C o m e le , a f i r m a r a m -

- s e d i r e i t o s n a t u r a i s e a i m p o r t â n c i a d e u m p o d e r l e g i s l a t i v o s e m p r e s u je i t o

a o p o v o . N e s s a o rd e m d e p e n s a m e n t o , a c o m u n id a d e m a n té m o p o d e r d e
Estado e democracia

s e s a lv a g u a r d a r d o s g o v e r n a n t e s e a té m e s m o d o le g is la d o r . A lé m d is s o ,

“ q u e m d e t iv e r o p o d e r le g is la t iv o o u o p o d e r s u p re m o d e q u a lq u e r c o m u ­

n i d a d e , o b r i g a - s e a g o v e r n á - la m e d ia n t e l e i s e s t a b e l e c i d a s , p r o m u lg a d a s e

c o n h e c i d a s d o p o v o , e n ã o p o r m e io d c d e c r e t o s q u e s u r p r e e n d a m o p o v o ”

( D A L L A R I , 2 0 1 3 , p . 1 4 8 ).

N ã o f a lt a r a m ta m b é m s it u a ç õ e s c o n c r e t a s q u e c o la b o r a r a m , d e f o r m a

d e t e r m in a n t e , p a r a a v a l o r i z a ç ã o d a d e m o c r a c i a . A s s i m , a R e v o l u ç ã o I n g l e s a

t e s t e m u n h o u a a s c e n s ã o d a s c a r t a s d e d i r e i t o s , c o m o , p o r e x e m p lo , o B ill o f
Rights ( 1 6 8 9 ) e a D e c l a r a ç ã o d c I n d e p e n d ê n c ia d a s 13 c o l ô n i a s a m e r i c a n a s ,

q u e v ir ia m a s e t o r n a r o s E s t a d o s U n id o s d a A m é r ic a (1 7 7 6 ), o q u e im p lic o u

a a f ir m a ç ã o d o p o d e r p o lít ic o e d a s u p r e m a c ia d o p o v o . A lé m d is s o , a R e ­

v o lu ç ã o F r a n c e s a f o i p r o p íc ia p a r a r e c o n h e c e r q u e n e n h u m a l i m i t a ç ã o p o d e

s e r im p o s t a a o i n d i v í d u o , s a l v o p e la l e i , q u e é e x p r e s s ã o d a v o n t a d e g e r a l d a

n a ç à o ( 1 7 8 9 ) . A p r o t e ç ã o d e d ir e i t o s u n i v e r s a i s e d a p a r t i c i p a ç ã o p o l í t i c a é o

s u s t e n t á c u lo d a r e v o lu ç ã o .

E s s a s o m a d e fa to r e s p e r m it iu a D a lm o d e A b r e u D a lla r i id e n t if ic a r

a s c a r a c t e r ís t ic a s e s s e n c ia is d o E s t a d o d e m o c r á t ic o d o s é c u lo X V I I I

( D A L L A R I , 2 0 1 3 ):

■ a s u p r e m a c i a d a v o n t a d e p o p u la r , c o m a p o s s i b i l i d a d e d e p a r t i c i p a ç ã o

d o p o v o n a t o m a d a d e d e c is õ e s d o g o v e r n o ;

■ a p r e s e r v a ç ã o d a l i b e r d a d e , c o m o r e c o n h e c im e n t o d e d ir e i t o s e a n à o

in t e r fe r ê n c ia d o E s t a d o n a e s fe ra p a r t ic u la r ;

■ a ig u a ld a d e d c d i r e i t o s , c o m a p r o ib iç ã o d c t r a t a m e n t o d if e r e n c i a d o c m

r a z ã o d e c l a s s e s o u m o t i v o s e c o n ô m ic o s .

Fique atento

Apesar da importância da experiência democrática grega, a afirmação da democracia


somente tem início com o pensamento do século XVIII.

A democracia do presente

A f o r ç a d o p e n s a m e n t o d e m o c r á t i c o i m p l i c o u a u t i l i z a ç ã o d e s s e r e g im e d e

g o v e r n o n a m a i o r i a d o s E s t a d o s d o s é c u lo X X I . N a a t u a l i d a d e , s ã o r a r o s o s

g o v e r n o s q u e n ã o s e p r o c la m e m d e m o c r á t i c o s ( B O N A V I D E S , 2 0 0 9 ) . A i n d a
Estado e democracia
-

e x i s t e , p o r é m , g r a n d e d i f i c u l d a d e t e ó r i c a e p r á t i c a n a s u a i d e n t if ic a ç ã o . D c

f a t o , n ã o é in c o m u m a m e r a e x a l t a ç ã o d c u m g o v e r n o c o m o d e m o c r á t i c o s e m

q u e , n a r e a lid a d e , e x i s t a m in s t r u m e n t o s d e p a r t ic i p a ç ã o p o lí t i c a d o p o v o . A l é m

d i s s o , c o n t r o v e r t e - s e s o b r e a e s s ê n c i a d a d e m o c r a c ia .

O q u e é a d e m o c r a c i a ? A t o r m e n t o s a in d a g a ç ã o n à o t e m r e s p o s t a f i x a

p e r a n t e a c i ê n c i a p o l í t i c a d ia n t e d e t a n t a s c o n t r o v é r s i a s , h a v e n d o , i n c l u s i v e ,

c é le b r e c r í t i c a n o p e n s a m e n t o d c R o u s s e a u ( 2 0 1 7 , p . 7 5 ) : “ S e h o u v e s s e u m

p o v o d e d e u s e s , e s s e p o v o s e g o v e r n a r i a d e m o c r a t ic a m e n t e ” .

S o b o a s p e c t o f o r m a l , d e s t a c a m o s t r ê s e s p é c ie s d e d e m o c r a c ia p r e s e n t e s

a o lo n g o d a h i s t ó r i a . S ã o a s s e g u in t e s :

D e m o c r a c ia d ir e t a — n e l a , o p o d e r p o l í t i c o é e x e r c i d o d i r e t a m e n t e p e lo

p o v o , s e m q u a lq u e r i n t e r m e d i a ç ã o o u r e p r e s e n t a ç ã o . O e x e m p lo e v id e n t e d e

d e m o c r a c ia d ir e t a e s t a r i a n a A n t i g u i d a d e , c o m o s g r e g o s . D e f a t o , o c id a d ã o

g r e g o v i a n a o r g a n iz a ç ã o d o lis t a d o n ã o a p e n a s o p r o lo n g a m e n t o d e s u a s a ç õ e s ,

m a s o e le m e n t o c o n d ic io n a n t e d e s u a p r ó p r ia e x i s t ê n c i a . N a G r é c i a a n t ig a , o

in t e r e s s e p e la v i d a p ú b l ic a e r a in e r e n t e à c o n d iç ã o d e c i d a d ã o ( B O N A V I D E S ,

2 0 0 9 ) . A lg u n s d e s t a c a m , e n t r e ta n t o , q u e n e m m e s m o a d e m o c r a c ia g re g a

p o d e r ia s e r c o n s id e r a d a d ir e t a , n a m e d id a e m q u e im p u n h a s e v e r a r e s t r i ç ã o

a o c o n c e it o d e c i d a d a n i a . A s s i m , o g o v e r n o p o d e r ia s e r c o n s id e r a d o d o p o v o ,

m a s p o u q u ís s i m o s i n d i v í d u o s e r a m c o n s id e r a d o s “ o p o v o ” . O u t r o e x e m p lo d e

d e m o c r a c ia d ir e t a e s t a r i a p r e s e n t e e m a lg u n s C a n t õ e s d a S u í ç a , p o r m e io d o

Landsgemeinde. N e s s e s lu g a r e s , h á a s s e m b le ia s a b e r t a s a t o d o s o s c id a d ã o s

d o C a n t ã o p a r a q u e , q u e r e n d o , e x e r ç a m s e u d ir e i t o d c v o t o c m d e t e r m in a d a s

q u e s tõ e s p o lít ic a s . D e to d o m o d o , m e s m o n e s s e s c a s o s , a c o n v o c a ç ã o d a

a s s e m b le ia d e p e n d e d e u m a p r é v i a a p r o v a ç ã o d e r e p r e s e n t a n t e s e le it o s p a r a

t a n t o ( D A L L A R I , 2 0 1 3 ) . R a z õ e s d e o r d e m p r á t ic a c o n f i r m a m a d if ic u ld a d e d e

u m a d e m o c r a c ia d ir e t a n a e r a m o d e r n a : “ A t é m e s m o a im a g i n a ç ã o s e p e r t u r b a

e m s u p o r o t u m u l t o q u e s e r i a c o n g r e g a r e m p r a ç a p ú b l ic a t o d a a m a s s a d o

e le it o r a d o , t o d o o c o r p o d e c i d a d ã o s , p a r a f a z e r a s l e i s , p a r a a d m i n i s t r a r ”

( B O N A V I D E S , 2 0 0 9 , p . 2 9 3 ).

D e m o c r a c i a i n d i r e t a — n e la , o p o d e r p o l í t i c o é e x e r c i d o p e lo p o v o p o r m e io

d e r e p r e s e n t a n t e s e le it o s , r a z ã o p e la q u a l t a m b é m é d e n o m in a d a d e m o c r a c i a

r e p r e s e n t a t i v a . N e s s e c a s o , o p o v o c o n f e r e u m m a n d a t o a a lg u n s c id a d ã o s

p a r a q u e e le s e x e r ç a m o p o d e r p o l í t i c o . É e s s e r e g im e d e m o c r á t i c o q u e p r o ­

m o v e o s u r g im e n t o d e u m a c l a s s e e s p e c í f i c a d e s u je i t o s c u jo s p r o p ó s it o s s ã o
t

a e la b o r a ç ã o e d i s c u s s ã o d e n o v a s l e i s e a a d m i n i s t r a ç ã o d o p o d e r p ú b lic o . E

a c l a s s e p o l í t i c a . A p a r t i r d o s é c u lo X I X , a e s p e c i a l i z a ç ã o d á m a i s u m p a s s o
Estado e democracia

c o m o s u r g i m e n t o d o s p a r t id o s p o l í t i c o s . O m o d e lo s e d i f u n d i u n o s E s t a d o s

D e m o c r á t ic o s , m a s n à o s e m c r ít ic a s ( D A L L A R I , 2 0 1 3 ). A s s im , é p o s s ív e l

d e s t a c a r q u e a r e p r e s e n t a ç ã o s o m e n t e é e f i c a z q u a n d o o p o v o t e m p le n a s c o n ­

d iç õ e s d e c o m p r e e n d e r o d e b a t e e a s o p ç õ e s a p r e s e n t a d a s , o q u e d i f i c i l m e n t e

o c o r r e . A lé m d is s o , m u it a s v e z e s , a a t u a ç à o d o r e p re s e n ta n te n à o c o n d iz c o m

a s id e ia s d o p r o g r a m a p a r t i d á r i o , r e v e la n d o m a i o r in t e r e s s e p e la c o n q u is t a o u

m a n u t e n ç ã o d o p o d e r d o q u e p e lo s in t e r e s s e s d o m a n d a t á r io ( D A L L A R I , 2 0 1 3 ).

D e m o c r a c i a s e m i d i r e t a — n e la , o p o d e r p o lít ic o é e x e r c id o p e lo p o v o p o r m e io

d e r e p r e s e n t a n t e s e le it o s , m a s q u e t a m b é m c o n t a c o m in s t i t u t o s q u e p e r m it e m

a d i s c u s s ã o d e d e t e r m i n a d o s t e m a s d ir e t a m e n t e p e lo p o v o . A d e m o c r a c i a

s e m id ir e t a é u m a a p r o x im a ç ã o d a d e m o c r a c ia r e p r e s e n t a t iv a e d a d e m o c r a c ia

d i r e t a , c o m a c r i a ç ã o d e in s t r u m e n t o s q u e “ [ ...] f a z e m e f e t iv a a in t e r v e n ç ã o d o

p o v o ” ( B O N A V I D E S , 2 0 0 9 ). N e s s a fo rm a , p o rta n to , a a tu a ç à o do p o v o n à o

s e l i m i t a à e le iç ã o d e g o v e r n a n t e s e l e g is l a d o r e s , m a s c o m p r e e n d e t a m b é m a

e f e t i v a t o m a d a d e d e c is ã o .

N a d e m o c r a c ia s e m i d i r e t a , a v u l t a a p a r t i c i p a ç ã o j u r í d i c a d o p o v o , j á q u e ,

e m c a s o s e s p e c í f i c o s , t o r n a - s e d ir e t a m e n t e c o m p e t e n t e p e la o r d e m n o r m a t iv a

a e s t a b e l e c e r a t o m a d a d e d e c is ã o s o b r e c e r t o s a s s u n t o s . C a b e r á , e n t r e t a n t o ,

a c a d a E s t a d o d e f i n i r a e x t e n s ã o d a p a r t i c i p a ç ã o d i r e t a d o p o v o . N o p la n o

t e ó r ic o , a lg u n s a u to re s a p r e s e n ta m o s s e g u in t e s in s t it u t o s d e a t u a ç ã o d o

p o v o n a d e m o c r a c ia s e m id ir e t a :

R e fe re n d o — c o n s is t e n a c o n s u lt a a o p o v o p a r a q u e d e l ib e r e s o b r e m a t é r ia

r e le v a n t e , a d q u ir in d o o p o d e r d e s a n c io n a r le is o u e m e n d a s c o n s t it u c io n a is .

A c a r a c t e r í s t i c a e s s e n c i a l d o r e f e r e n d o c o n s is t e e m c o n s u lt a a p ó s a t o m a d a

d c u m a d e c is ã o p a r a q u e s e ja c o n f i r m a d a o u n ã o . E m s ín t e s e , “ o o b je t iv o é

p e r g u n t a r a o p o v o s e e le c o n f i r m a o u n à o u m a d e c is ã o j á t o m a d a ” ( D A L L A R I ,

2 0 1 3 , p . 1 5 4 ).

P le b is c it o — c o n s is t e n a c o n s u lt a a o p o v o p a r a q u e d e l ib e r e s o b r e m a t é r ia

r e le v a n t e a n t e s d a e la b o r a ç ã o d o a t o n o r m a t iv o o u a d m i n i s t r a t i v o . A s s i m , a

c a r a c t e r ís t ic a e s s e n c ia l d o p le b is c it o é r e p r e s e n t a r u m a c o n s u lt a p r é v ia a o

p o v o s o b r e d e t e r m in a d o t e m a . E s o m e n t e c o m o r e s u lt a d o d a o p in i ã o d o p o v o

q u e s e r ã o a d o t a d a s a s m e d id a s l e g i s l a t i v a s o u a d m i n i s t r a t i v a s p e r t in e n t e s .

I n ic ia t iv a p o p u la r — é a p o s s i b i l i d a d e d e u m n ú m e r o p r e v ia m e n t e d e t e r ­

m i n a d o d e e le it o r e s d a r i n í c i o a o p r o c e s s o le g i s l a t i v o , c o m a p r o p o s it u r a d e

n o v a s le is o u e m e n d a s à C o n s t it u iç ã o .
Estado e democracia
-

V e to p o p u la r — é a f a c u ld a d e c o n f e r id a a o p o v o p a r a q u e s e m a n ife s t e

c o n t r á r i o a u m a m e d id a o u le i j á d e v i d a m e n t e e la b o r a d a e e m v i a s d e s e r

c o lo c a d a e m e x e c u ç ã o ( B O N A V I D E S , 2 0 0 9 ) . A q u i , u m n ú m e r o p r e v ia m e n t e

d e t e r m in a d o d e e le it o r e s , e m p r a z o d e t e r m in a d o , p o d e r á r e q u e r e r q u e u m a

le i j á p u b l ic a d a s e ja s u b m e t id a à a p r o v a ç ã o o u r e j e i ç ã o d o e le it o r a d o . V a l e

r e g i s t a r q u e a lg u n s a u t o r e s c o n s id e r a m o v e t o e s p é c ie d e r e f e r e n d o .

R evog ação — é a f a c u ld a d e c o n f e r i d a a o p o v o p a r a q u e p r o m o v a o t é r m in o

a n t e c ip a d o d e u m m a n d a t o e le t iv o , is t o é , a n t e s d o d e c u r s o d o p r a z o le g a lm e n t e

p r e v is t o . A r e v o g a ç ã o é , p o r t a n t o , u m m e c a n is m o q u e p e r m it e a o p o v o o c o n t r o le

im e d ia t o d o m a n d a t o d a c la s s e p o lí t i c a . A m a is c o n h e c id a e s p é c ie d e r e v o g a ç ã o

é o ch am ad o recall p r e v is t o n o s E s t a d o s U n id o s d a A m é r i c a . P o r m e io d o recall,
o e le it o r a d o p o d e r á “ d e s t it u i r f u n c i o n á r i o s , c u jo c o m p o r t a m e n t o , p o r q u a lq u e r

m o t i v o , n à o lh e e s t e ja a g r a d a n d o ” ( B O N A V I D E S , 2 0 0 9 , p . 3 1 3 ) , d e s d e q u e

o b s e r v a d a s , e v id e n t e m e n t e , a s r e g r a s q u e r e g u la m e n t a m o in s t it u t o .

N a e x p e r i ê n c i a d e m o c r á t i c a b r a s i l e i r a , e x i s t e m d i v e r s o s in s t r u m e n t o s

q u e q u a l i f i c a m a d e m o c r a c ia r e p r e s e n t a t iv a , r a z ã o p e la q u a l a C o n s t i t u i ç ã o

F e d e r a l p r e s t i g i a a f o r m a s e m i d i r e t a d e d e m o c r a c i a . A s s i m , p o r e x e m p lo ,

e x i s t e a p o s s i b ili d a d e c o n s t i t u c i o n a l d e p le b i s c it o e r e f e r e n d o ( a r t . 1 4 , 1 e I I ,

d a C o n s t i t u i ç ã o F e d e r a l d e 1 9 8 8 ) . A m b o s e s t ã o d e t a lh a d o s n a L e i n ° 9 .7 0 9 ,

d e 18 d e n o v e m b r o d e 1 9 9 8 . C o n f i r a :

A rt. 2o Plebiscito e referendo são co n su ltas form uladas ao povo para que
delibere sobre m atéria de acentuada relevância, de natureza constitucional,
legislativa ou adm inistrativa.
§ Io O plebiscito é convocado com anterioridade a ato legislativo ou adm i­
nistrativo, cabendo ao povo, pelo voto, aprovar ou denegar o que lhe tenha
sido submetido.
§ 2° O referendo é convocado com posterioridade a ato legislativo ou adm i­
nistrativo, cum prindo ao povo a respectiva ratificação ou rejeição.
Art. 3o Nas questões de relevância nacional, de competência do Poder Legislati­
vo ou do Poder Executivo, e no caso do § 3o do art. 18 da C onstituição Federal,
o plebiscito e o referendo são convocados m ediante decreto legislativo, por
proposta de um terço, no m inim o, dos m em bros que com põem qualquer das
Casas do Congresso Nacional, de conform idade com esta Lei (BRASIL, 1998).

A i n i c i a t i v a p o p u la r t a m b é m é u m i n s t i t u t o e x p r e s s a m e n t e p r e v i s t o n a

C o n s t i t u i ç ã o F e d e r a l . E m â m b it o n a c i o n a l , is t o é , p a r a a p r o p o s iç ã o d e le is

o r d i n á r i a s , e la p o d e s e r e x e r c id a p e la a p r e s e n t a ç ã o à C â m a r a d o s D e p u t a d o s d e

p r o je t o d e le i s u b s c r i t o p o r , n o m í n i m o , 1 % d o e le it o r a d o n a c i o n a l , d is t r i b u í d o

p o r , p e lo m e n o s , c i n c o E s t a d o s , c o m n ã o m e n o s d e 0 , 3 % d o s e le it o r e s d e c a d a
Estado e democracia

u m d e s s e s E s t a d o s , n o s t e r m o s d o a r t . 6 1 , § 2 o, d a C o n s t i t u i ç ã o F e d e r a l d e

1 9 8 8 . J á n o â m b it o m u n i c i p a l , is t o é , p a r a a p r o p o s iç ã o d e l e i s m u n i c i p a i s , é

n e c e s s á r i a a m a n i f e s t a ç ã o d e , p e lo m e n o s , 5 % d o e le it o r a d o , n o s t e r m o s d o

a r t . 2 9 , X I I I , d a C o n s t it u iç ã o F e d e r a l d e 1 9 88 .

A p a r t i r d a e x i s t ê n c i a d e in s t r u m e n t o s f o r m a i s d e p a r t ic i p a ç ã o , N o r b e r t o

B o b b io ( 1 9 9 7 , p . 3 0 ) a p r e s e n t a a s e g u in t e d e f in iç ã o : “ O ú n ic o m o d o d e s e c h e g a r

a u m a c o r d o q u a n d o s e f a la d e d e m o c r a c ia , e n t e n d id a c o m o c o n t r a p o s t a a t o d a s

a s f o r m a s d e g o v e r n o a u t o c r á t i c o , é o d e c o n s id e r á - la c a r a c t e r i z a d a p o r u m

c o n ju n t o d e r e g r a s q u e e s t a b e le c e m q u e m e s t á a u t o r iz a d o a t o m a r a s d e c is õ e s

c o le t i v a s e c o m q u a is p r o c e d im e n t o s ” . N e s s e s e n t id o , a d e m o c r a c ia d i z r e s p e it o

a o t i t u l a r d o p o d e r e a o m o d o p e lo q u a l o p o d e r é le g it im a m e n t e e x e r c id o .

A democracia do futuro

A a d o ç ã o g e n e r a l i z a d a d e f o r m a s d e m o c r á t i c a s s e m i d i r e t a s r e v e lo u a s d e f i c i ­

ê n c i a s d o m o d e lo e a s c r i s e s a e le in e r e n t e s . A s s i m , P a u lo B o n a v i d e s d e s t a c a

a c r i s e n a le g i t i m i d a d e d o s p a r t id o s p o l í t i c o s e a f r a g i l i d a d e d o s in s t i t u t o s d e

m a n ife s t a ç ã o d ir e t a d o p o v o .

Q u a n t o a o s p a r t i d o s p o lí t i c o s , “ a liç ã o d e n o s s a é p o c a d e m o n s t r a q u e n à o r a r o

o s p a r t id o s , c o n s id e r a d o s in s t r u m e n t o s f u n d a m e n t a is d a d e m o c r a c ia , s e c o r r o m ­

pem ” ( B O N A V ID E S , 2 0 0 9 , p. 2 9 9 ) , o u s e ja , d e s v ia m - s e d e s e u s in t e r e s s e s e n à o

m a is e s p e lh a m o s id e a is p o lít ic o s q u e d e f e n d ia m , v it im a n d o o p o v o d o lo g r o . D e

fa to , n o s d ia s a t u a is , e x is t e u m a in t e n s a c r is e d e le g it im id a d e d o s p a r t id o s p o lít ic o s .

Q u a n to a o s in s t it u t o s d e p a r t ic ip a ç ã o d ir e t a t r a d ic io n a lm e n t e re c o n h e ­

c i d o s , v i m o s a s u a in e f i c i ê n c i a ( B O N A V I D E S , 2 0 0 9 ) . M e c a n is m o s id e a liz a d o s

c o m o a u t ê n t ic o s m e io s d e t r a n s f o r m a ç ã o s o c i a l s u c u m b i r a m a u m a r e a li d a d e

in d i f e r e n t e e c o n s e r v a d o r a , s e n d o p o u c o e m p r e g a d o s e , q u a n d o u t i l i z a d o s ,

t r a z e n d o r e s u lt a d o s c o n s e r v a d o r e s e s e m s i g n i f i c a t i v o im p a c t o ( B O N A V I D E S ,

2 0 0 9 ) . A s s i m , a p r e s e n ç a d e in s t r u m e n t o s d e p a r t i c i p a ç ã o n ã o t e v e o c o n d ã o

d e a t r a i r o p o v o p a r a o c e n á r i o p o lí t i c o .

N e s s a m e s m a l i n h a , N o r b e r t o B o b b io f a z u m a in t e n s a c r í t i c a a o m o d e lo

d e m o c r á t i c o r e p r e s e n t a t iv o e d e s t a c a q u e e s s a d e m o c r a c ia s e t o r n o u u m a m ­

b ie n t e d e p r o m e s s a s n ã o c u m p r i d a s .

P a r a e le , a s s e i s p r o m e s s a s n ã o c u m p r i d a s p e l a d e m o c r a c i a r e p r e s e n ­

t a t i v a s ã o ( B O B B I O , 1 9 9 7 ):

■ a v o n t a d e g e r a l c o m o c e n t r o d e p o d e r — a r e a li d a d e s o c i a l d e m o n s t r o u

q u e n ã o e x i s t e a p e n a s u m f o c o d e f o r ç a p o l í t i c a , c o m o p r e t e n d ia m o s

id e a liz a d o r e s d a d e m o c r a c ia , d e s o r t e s e r im p o s s í v e l a lc a n ç a r u m a ú n ic a
Estado e democracia
-

v o n t a d e g e r a l , j á q u e e f e t iv a m e n t e e x i s t e m , d e f a t o , d i v e r s o s n ú c le o s

d c p o d e r q u e c o e x is t e m ;

■ a c o n t e n d a d e in t e r e s s e s — o re p re s e n ta n te d e v e r ia a p e n a s b u s c a r o s

in t e r e s s e s d e to d a a c o le t iv id a d e , m a s , d c f a t o , b u s c a o s in t e r e s s e s

d a q u e le s q u e o c o lo c a r a m n o p o d e r ;

■ a m a n u te n ç ã o d a s o lig a r q u ia s ;

■ o e s p a ç o li m i t a d o — a p e s a r d e s e r a g o r a a m p la a q u a n t id a d e d c v o t a n t e s ,

s e u e s p a ç o d e i n s e r ç ã o n o d i s c u r s o p o l í t i c o a in d a é í n f i m o , d a í a c r i s e

e s t a r e m “ o n d e se v o t a ? ” , o u s e ja , e m d e f in ir o s m o m e n to s e m q u e o

p o v o é e f e t iv a m e n t e c h a m a d o a s e m a n i f e s t a r s o b r e d e t e r m in a d o t e m a ;

■ a p e r s is t ê n c ia d e u m p o d e r i n v i s í v e l — a n o ç ã o d e q u e e x i s t e m , a i n d a ,

in s t it u iç õ e s e ó rg ã o s q u e a g e m n a s s o m b r a s , s e m p u b lic iz a r o s s e u s

a t o s , a t u a n d o c o m in t e n ç õ e s d u v i d o s a s ;,

■ o p r o b le m a d a c i d a d a n i a — o c i d a d ã o , a p a r t i r d a p o s s i b ili d a d e d e a t u a r

p o r m e io d a d e m o c r a c i a , a p r e n d e r ia e s e t r a n s f o r m a r i a e m u m c id a d ã o

a t iv o e p a r t i c i p a n t e , q u e s e e n g a ja s s e n a p r á t ic a p o l í t i c a — o q ue não

a p e n a s n ã o a c o n t e c e u c o m o s e p r o c e d e u a o in v e r s o ; a s d e m o c r a c ia s m a is

c o n s o li d a d a s t ê m p o r c a r a c t e r í s t i c a u m p o v o a p á t ic o e d e s in t e r e s s a d o .

D i a n t e d e t a n t a s c r i s e s , a d e f i n i ç ã o d e d e m o c r a c ia e x i g i r á u m a n o v a c o m ­

p re e n s ã o . N e s s e p o n to , te m g a n h a d o fo rç a o d is c u r s o n a d e fe s a d e u m a n o v a

e s p é c ie d e d e m o c r a c ia . E a d e m o c r a c i a p a r t i c i p a t i v a ( B O B B I O , 1 9 9 7 ) . C o m

e f e it o , o a d je t i v o p a r t i c i p a ç ã o :

[...] passa a scr o novo referencial em term os dem ocráticos, inserção da (rc)
qualificação do povo, para além de mero ícone, catapultando-o. assim , para o
cenário dem ocrático com o ator principal e nâo m ais com o mero coadjuvante»
com o aquele que está apto de fato a reivindicar sua posição proem inente em
uma sociedade livre, solidária c justa (RIBHIRO; SCALABRIN, 2009, p. 160).

A d e m o c r a c ia p a r t ic i p a t iv a im p l i c a u m a a m p lia ç ã o d o d iá lo g o e d a p a r t i ­

c ip a ç ã o c o n c r e t a , d is p e n s a n d o t é c n ic a s m e r a m e n t e f o r m a i s . N e s s e e s t á g io , a

in c lu s ã o d o c id a d ã o d e v e a t i n g i r t o d o s o s p la n o s , d e s o r t e q u e n e m a f u n ç ã o

j u r i s d i c i o n a l , n e m o p r ó p r io p r o c e s s o le g is la t iv o e s c a p a m d e s s e fe n ô m e n o . S e n d o

a d e m o c r a c ia , t a m b é m e n ã o s ó , u m c o n ju n t o d c v a lo r e s e id e a is , c u ja le g it im id a d e

( p o l í t i c a e j u r í d i c a ) n ã o s e e x t r a i a p e n a s d o v o t o — q u e s e a p r e s e n t a m a is c o m o

u m c o n t e ú d o m í n im o n e c e s s á r io ( L U C A S , 1 9 8 5 ). — , n o v o s m e c a n is m o s d e v e m

s e r p o s t o s à d is p o s iç ã o d o s in d i v íd u o s p a r a d a r v id a a o p o s t u la d o d e m o c r á t ic o ,

e n q u a n t o v e lh o s e le m e n t o s d o m u n d o j u r í d i c o d e v e m s e r r e p e n s a d o s .
Estado e democracia

------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- >*
Link

Confira, no link a seguir, um texto sobre democracia par­


ticipativa para aprofundar os estudos:

https://goo.gl/jeEtNf
V_________________________________________________________________________________ J

D i v e r s o s e x e m p lo s p r e s e n t e s n o s is t e m a d e m o c r á t ic o b r a s i l e i r o p e r m it e m

c o n c l u i r q u e a c h e g a d a d a d e m o c r a c ia p a r t i c i p a t i v a é in e v i t á v e l e j á p e r m e ia

t o d a s a s f u n ç õ e s d o E s t a d o . D e f a t o , t o d o s o s p o d e r e s c o n s t i t u íd o s j á c o n t a m

c o m m e c a n i s m o s a m p lo s d e p a r t i c i p a ç ã o d ir e t a d o p o v o :

P o d e r L e g is la t iv o — h á a le g it im id a d e d e q u a lq u e r p e s s o a p a r a d e n u n c ia r ir ­

r e g u la r id a d e s f i n a n c e i r a s ju n t o a o T r i b u n a l d e C o n t a s , b e m c o m o p o d e m s e r

r e a liz a d a s a u d iê n c ia s p ú b lic a s n o â m b it o d o p r o c e s s o le g is la t iv o ( F I G U E I R E D O ,

2 0 0 3 ) . A l i á s , a s a u d iê n c ia s p ú b lic a s s u r g e m c o m o c a n a l d e c o m u n ic a ç ã o e n t re

p a r la m e n t a r e s , c id a d ã o s e e s p e c ia lis t a s p a r a a c r ia ç ã o d e le is m a is a d e q u a d a s a o s

d e s e jo s s o c i a is . E a in d a n o â m b it o le g is la t iv o , v a le le m b r a r m o s d o s in s t r u m e n t o s

t r a d ic io n a is d a d e m o c r a c ia s e m id ir e t a : in i c i a t i v a p o p u la r , r e fe r e n d o e p le b is c it o .

P o d e r E x e c u t iv o — n o p a lc o d a A d m in is t r a ç ã o P ú b lic a , a s c o n s u lt a s p ú ­

b l i c a s d e s p o n t a m c o m o m e c a n i s m o s d e i n c lu s ã o d o s in t e r e s s a d o s e m g e r i r

d ir e t a m e n t e p a r c e l a d o o r ç a m e n t o e s t a d u a l e e s t a r e m p r e s e n t e s n a a t u a ç à o

p o lí t i c a . E o c h a m a d o o r ç a m e n t o p a r t i c i p a t i v o . A l e m d i s s o , g a n h a f ô le g o a

p ro p o s ta d e c r ia ç ã o d e c o n s e lh o s , “ e s p e c ia liz a d o s p a ra a t u a r e m c e r t o s e to r

d a s a t i v i d a d e s s o c i a i s ” ( D A L L A R I , 2 0 1 3 , p . 1 5 6 ) , n o s q u a i s h a v e r á m a io r

p r o x im id a d e e n tre c id a d ã o e A d m in is t r a ç ã o P ú b lic a .

P o d e r J u d ic iá r io — a m á q u in a d a J u s t i ç a t a m b é m g e r a u m a f o r m a d c p a r ­

t i c i p a ç ã o , j á q u e o p o r t u n i z a o d iá lo g o e n t r e o s e n v o lv i d o s — a s p a rte s e o

E s t a d o - j u i z ( L U C A S , 1 9 8 5 ). A l é m d is s o , m u i t a s v e z e s , o P o d e r J u d i c i á r i o s e

c o n v e r t e n o ú lt im o s u s p ir o d c e s p e r a n ç a d o c id a d ã o , q u e v ê o s e u d ir e it o s e n d o

v io l a d o p e lo p r ó p r io E s t a d o . A le g it im a ç ã o d o P o d e r J u d i c i á r i o , p o r s u a v e z :

[...] decorre não do sufrágio universal com o nas o utras esferas de poder,
mas de uma legitim ação procedim ental que encontra no irrestrito acesso ao
Estado e democracia
-

judiciário, no contraditório, na publicidade e na fundam entação os m ais altos


desígnios da legitim idade dem ocrática, pois é através do processo (RIBEIRO;
SC A LA B R IN , 2009, p. 165).

T o d o s e s s e s e le m e n t o s p e r m it e m c o n c l u i r q u e a d e m o c r a c ia p a r t i c i p a t i v a

é a q u e la q u e m e lh o r p e r m it e c o n f r o n t a r a s c r i s e s d o m o d e lo a n t e r io r . A d e ­

m o c r a c i a , e n q u a n t o e le m e n t o p o l í t i c o (e v a l o r a t i v o ) , d e f l a g r a u m a n e c e s s á r ia

r e v i s ã o d o p a d r ã o l i b e r a l d e m e r a r e p r e s e n t a t iv id a d e , e a p a r t i c i p a ç ã o s u r g e

c o m o n o v o e x p o e n te . Pari passu , a c i d a d a n i a é a la r g a d a p o r m e io d e n o v o s

m o d o s d e in c l u s ã o d o i n d i v í d u o n a t o m a d a d e d e c is ã o e n o s e u c o n t r o le .

BOBBIO, N. O futuro da democracia: uma defesa das regras do jogo. 6. ed. Rio de
Janeiro: Paz e Terra, 1997.

BONAVIDES, P. Ciência política. 16. ed. São Paulo: Malheiros, 2009.BRASIL. Lei n° 9.709,
de 18 de novembro de 1998. Regulamenta a execução do disposto nos incisos I, II e III
do art. 14 da Constituição Federal. 1998. Disponível em: <http://www.planalto.gov.
br/ccivil_03/leis/l9709.htm>. Acesso em: 27 set. 2017.

DALLARI, D. de A. Elementos de teoria geral do Estado. 32. ed. São Paulo: Saraiva, 2013.

FIGUEIREDO, L. V. Instrumentos da administração consensual: a audiência pública e


sua finalidade. Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, v. 5, n. 18, marVabr. 2003.

LUCAS, J. R. Democraciaeparticipação. Brasília: Universidade de Brasília, 1985. RIBEIRO,


D. G., SCALABRIN, F. O papel do processo na construção da democracia: para uma
nova definição da democracia participativa. Scientia luris, Londrina, v. 13, nov. 2009.

ROUSSEAU, J.-J. Do contrato social. Petrópolis: Vozes, 2017.

Leituras recomendadas

AZAMBUJA, D. Teoria geral do Estado. 4. ed. São Paulo: Globo, 2008.

BOBBIO, N. Estado, governo, sociedade, para uma teoria geral da política. 14. ed. São
Paulo: Paz e Terra S/A, 2007.

JELLINEK, G. Teoria general dei Estado. Buenos Aires: Albatros, 1954.

MORAIS, J. L. B. de; STRECK, L. L. Ciência política e teoria do Estado. 7. ed. Porto Alegre:
Livraria do Advogado 2010.
V ____________________________________________________________________________________________ J
A

-------------------------------------- U N I D A D E

O sufrágio e sistemas
eleitorais
/------------------ Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

■ Conceituar o que é e quem pode exercer o sufrágio.


■ Estabelecer a distinção estre os sistemas eleitorais majoritário, de
representação e distrital.
■ Demonstrar a importância da existência dos partidos políticos na
democracia.

Introdução-------------------------------------- s
Neste capítulo, você reconhecerá a importância do exercício democrático
do sufrágio e a sua peculiaridade em relação às espécies do sistema
eleitoral brasileiro e dos partidos políticos. Ao final, questionará a reali­
dade atual brasileira, podendo, inclusive, traçar um paralelo com outras
realidades políticas mundiais.

Sufrágio
P a r a q u e v o c e e n t e n d a e r e c o n h e ç a a im p o r t â n c i a d o s u f r á g io p a r a a s o c ie d a d e ,

é n e c e s s á r io v o lt a r m o s a o p r i n c í p i o d a a n t ig u i d a d e , p o is , n o s p r i m o r d i o s d a

c i v i l i z a ç ã o , a s t r i b o s e r a m lid e r a d a s p o r c h e f e s , e a m a io r i a d e le s e r a e s c o lh id a

p o r h o m e n s e li d e r a d a p o r h o m e n s .

C o m o p a s s a r d o s a n o s , a e v o lu ç ã o h u m a n a s e v iu n a p e r s o n if ic a ç ã o

d o s o b e ra n o , c o m a f ig u r a d o E s ta d o e d o re i c o m o u m ú n ic o s e r — ou

s e ja , n ã o h a v ia s e p a r a ç ã o e n t r e E s t a d o e r e i. A s a ç õ e s e r a m d e c id id a s p o r

p o u c o s , n à o s e n d o p o s s ib ilit a d o a to d a p o p u la ç ã o o d ir e it o d e e s c o lh e r
O sufrágio e sistemas eleitorais

o ( s ) s e u ( s ) r e p r e s e n t a n t e ( s ) , o p i n a r p e la a p r o v a ç ã o o u n ã o d e a l g u m a l e i ,

e n t r e o u t r o s t e m a s r e la c io n a d o s a o E s t a d o . A n o a p ó s a n o , o c la m o r s o ­

c i a l , a s r e v o lu ç õ e s e a s d iv e r s a s t e o r ia s f ilo s ó f ic a s lib e r a is d e s e n v o lv id a s

p o r g r a n d e s p e n s a d o r e s , c o m o J o h n L o c q u e , M o n t e s q u ie u e T o c q u e v ille ,

f o r a m c r u c i a i s p a r a a e v o lu ç ã o d a d e m o c r a c ia e lib e r d a d e e m e x e r c e r o

s u f r á g io . S e g u n d o B o b b io (1 9 9 7 , p . 8 ) “ [ ...] a d e m o c r a c ia n ã o é t a n to u m a

s o c ie d a d e d e li v r e s e ig u a is , m a s u m a s o c ie d a d e r e g u la d a d e t a l m o d o q u e

o s in d iv íd u o s q u e a c o m p õ e m s à o m a is li v r e s d o q u e e m q u a lq u e r o u tra

fo rm a d e c o n v iv ê n c ia ” .

A f i n a l , te n d o e m v is t a o e x e r c íc io d e m o c r á t ic o , o q u e é s u f r á g io ? P a ra

o p r o f e s s o r P a u lo B o n a v i d e s ( 2 0 0 7 , p . 2 9 3 ) “ [.„1 o s u f r á g i o é o p o d e r q u e s e

r e c o n h e c e a c e r t o n ú m e r o d e p e s s o a s (o c o r p o d e c id a d ã o s ) d e p a r t i c i p a r d ir e t a

o u in d ir e t a m e n t e n a s o b e r a n ia , is t o é , n a g e r ê n c ia d a v i d a p ú b l ic a ” .

Fique atento

Importante destacar que a palavra sufrágio vem do latim suffagari, cujo significado é
"escolha', ou seja, ao indivíduo é dado o poder de decidir, opinar e escolher, de modo
direto {votação participativa do povo sobre temas específicos) ou indireto (o povo
elege o seu futuro representante político).

O s u f r á g io c o n c e d e a o in d iv íd u o o e x e r c íc io d e m o c r á t ic o d e p a r t ic ip a r

d a p o lít ic a , c o m o , p o r e x e m p lo , v o t a r , s e r v o t a d o e e x i g i r a d e m o c r a c ia

p a r t ic ip a t iv a .

A p a r t ir d a s u a d e f in iç ã o , é p o s s ív e l d e s t a c a r q u e o s u f r á g io :

■ é u m e x e r c íc io d e m o c r á t ic o ;

■ é u m a g a r a n t ia p ú b l ic a c o n c e d id a a d e t e r m in a d a s p e s s o a s ;

■ n ã o é a t o e x c l u s i v o e ú n i c o d o E s t a d o , m a s p a r t i c i p a t i v o p o p u la r ;

■ é u m e x e r c íc io d e m o c r á t ic o n o E s t a d o d e D ir e it o .

A f i n a l , q u e c c r t o n ú m e ro d e p e s s o a s , n a c o n c e p ç ã o d e B o n a v id e s ( 2 0 0 7 ),

p o d e e x e r c e r o s u f r á g i o ? A l é m d i s s o , o v o t o é u m s u f r á g i o o u u m a e s p é c ie

d e s u f r á g i o ? A n t e s d e r e s p o n d e r a t a i s p e r g u n t a s , é p r e c i s o e n t e n d e r e d if e -
0 sufrágio e sistemas eleitorais

r e n c i a r o s u f r á g i o r e s t r i t o d o s u f r á g i o u n i v e r s a l e a n a l i s a r a s p r e v is õ e s le g a is

a r e s p e it o d o s t e m a s .

O s u f r á g io r e s t r it o a p re s e n ta c e r t a s p a r t ic u la r id a d e s , s o b re tu d o , d e c u n h o

p r e c o n c e it u o s o , r e s t r in g in d o o p o d e r d e p a r t ic ip a ç ã o c id a d ã d o in d iv íd u o

a o c u m p r im e n t o d e d e t e r m in a d o s p a d r õ e s , c o m o p o d e r a q u is it iv o , r a ç a

e o u t r o s . D e a c o r d o c o m a d o u t r in a , s ã o c o n s id e r a d a s m o d a lid a d e s d e

s u f r á g io r e s t r it o :

■ s u f r á g i o c e n s i t á r i o — p o d e r d e lim it a d o a d e t e r m in a d a s c l a s s e s , a q u e la s

q u e p o s s u ís s e m r iq u e z a .

■ s u f r á g i o c a p a c i t a r l o — c o n s id e r a v a o g r a u d e in s t r u ç ã o d o i n d i v íd u o .

■ s u f r á g io s o c ia l — a n a l i s a v a a r a ç a e o g ê n e r o d o in d i v í d u o .

J á o s u f r á g i o u n i v e r s a l v i s a a l c a n ç a r t o d a u m a c o l e t i v i d a d e d e c id a d ã o s

q u e , a o s e r e m c o n s id e r a d o s h a b i l i t a d o s , t e r ã o o s e u d ir e i t o g a r a n t id o p o r le i

p a r a v o t a r , s e r v o t a d o , p a r t i c i p a r d e r e f e r e n d o s , i n i c i a t i v a p o p u la r o u p le b i s ­

c i t o , s e m q u e , p a r a i s s o , s e ja m c o n s id e r a d o s r a ç a , s e x o , i n s t r u ç ã o , r i q u e z a o u

p o s iç ã o s o c i a l d o i n d i v í d u o .

\
Fique atento

O sufrágio não deve ser confundido com o voto, pois o voto é uma forma de exercer o
sufrágio. De acordo com o Código Eleitoral (BRASIL, 1965), art. 82, “o sufrágio é universal
e direto e o voto é obrigatório e secreto". E, de acordo com a Constituição Federal de
1998, art. 14, caput e incisos I a III: "A soberania popular será exercida pelo sufrágio
universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei,
mediante: plebiscito, referendo e iniciativa popular" (BRASIL, 1988).
V_______________________________________________ _______________________________________________'

Dos legitimados no sufrágio universal

N o B r a s i l , n à o é m a is a d m it id o o v o t o a o d e s c o b e r t o , q u e e r a a q u e le t ip o d e

v o t a ç ã o n a q u a l o in d iv íd u o n ã o t in h a a lt e r n a t iv a s e n à o d e c la r a r o se u v o to ,

v u l g o v o t o d c c a b r e s t o . T a l s it u a ç ã o g e r a v a t e m o r n o c i d a d ã o . C o n s i d e r a n d o

o s d ia s a t u a i s , o s is t e m a d i g i t a l e le it o r a l b r a s i l e i r o e o s n í v e i s d e c o r r u p ç ã o ,

v o c ê a c r e d i t a q u e o v o t o a o d e s c o b e r t o é u m f a t o in e x is t e n t e o u a in d a s e g u e

c e r c e a n d o o e x e r c íc io d e m o c r á t ic o d e c id a d ã o s b r a s ile ir o s ?
O sufrágio e sistemas eleitorais

N o q u e d i z r e s p e it o à s p e s s o a s q u e p o d e m e x e r c e r o s u f r á g i o , v e j a o q u e

d e t e r m in a m o C ó d ig o E l e i t o r a l e a C o n s t i t u i ç ã o F e d e r a l b r a s i l e i r a . D e a c o r d o

c o m o C ó d ig o E l e i t o r a l :

A rt. 2° Todo poder em ana do povo e será exercido em seu nom e, por m an­
datários escolhidos, direta e secretam ente, dentre candidatos indicados por
partidos políticos nacionais, ressalvada a eleição indireta nos casos previstos
na C onstituição e leis especificas.
A rt. 3° Q u a lq u er c id ad ã o pode p re te n d e r in v e stid u ra em carg o eletivo,
respeitadas as condições constitucionais e legais de elegibilidade e incom ­
patibilidade.
A rt. 4° São eleitores os brasileiros m aiores de 18 anos que se alistarem na
forma da lei.
A rt. 5* Nào podem alistar-se eleitores:
I — os analfabetos:
II — os que não saibam exprim ir-se na língua nacional;
III— os que estejam privados, temporária ou definitivamente dos direitos políticos.
P arágrafo único. O s m ilitares são alistáveis, desde que oficiais, a sp iran ­
tes a oficiais, g u a rd a s-m arin h a, subtenentes ou suboficiais, sargentos ou
alunos das escolas m ilitares de ensino superior para form ação de oficiais
(B R A S IL , 1965).

A p a r t i r d a le it u r a d o s a r t s . 2 o a 5 o d o C ó d ig o E l e i t o r a l b r a s i l e i r o , é p o s s í v e l

d e t e r m i n a r q u e o s c a n d id a t o s e le it o s e x e r c e m o p o d e r r e p r e s e n t a t iv o c o n f e ­

r id o p e lo p o v o , n ã o p o d e n d o s e r e le it o s o s a n a l f a b e t o s , o s q u e n ã o s a ib a m

e x p r im ir - s e n a lín g u a n a c io n a l e o s q u e e s t e ja m p r iv a d o s , t e m p o r á r ia o u

d e f i n i t i v a m e n t e , d o s d ir e i t o s p o l í t i c o s .

P a ra a C o n s t it u iç ã o F e d e ra l b r a s ile ir a d e 1 9 8 8 :

A rt. 14° O alistam ento eleitoral e o voto são:


I — obrigatórios para os m aiores de dezoito anos;
II — facultativos para:
a) os analfabetos;
b) os m aiores de setenta anos;
c) os m aiores de dezesseis e m enores de dezoito anos.
[...]
§ 2° Não podem alistar-se com o eleitores os estrangeiros e, durante o período
do serviço m ilitar obrigatório, os conscritos (B R A SIL , 1988).

A C o n s t i t u i ç ã o F e d e r a l , a o c o n t r á r i o d o C ó d ig o E l e i t o r a l , é m a is a b r a n ­

g e n t e a o p r e v e r q u e o s a n a lf a b e t o s , o s m a io r e s d e 7 0 a n o s e o s m a io r e s d e 16

e m e n o r e s d e 18 a n o s p o s s u e m a f a c u ld a d e p a r a e x e r c e r o v o t o .
0 sufrágio e sistemas eleitorais

Exemplo

No período eleitoral do ano de 2016, as jovens amigas Susana, de 17 anos, e Marcela,


de recém-completados 16 anos, discutem a possibilidade de participar da escolha
do prefeito para a sua cidade, mesmo pressionadas por seus amigos a somente votar
quando tivessem 18 anos e a obrigatoriedade de votar. As amigas não desistiram:
tiraram o título de eleitor e, no tempo devido, votaram no candidato escolhido. Esse
exemplo demonstra que, ainda que a Constituição Federal preveja a facultatividade
do voto no caso de maiores de 16 e menores de 18 anos, caso jovens dessas idades
desejem exercer o seu papel eleitoral, poderão, por lei, exercê-lo.

Fique atento

Nenhum indivíduo deve ser intimidado, constrangido a fazer ou deixar de exercer


o direito a votar, ser votado ou outros por ameaças ou intervenções de terceiros,
mas deve ser respeitado em seus direitos e suas obrigações. Em tais casos, cabe ao
indivíduo denunciar.

Dos sistemas eleitorais


P a r a o d o u t r i n a d o r J o s é J a i r o ( G O M E S , 2 0 1 6 , p . 1 4 3 ), o s is t e m a e le it o r a l é o

“ C o m p le x o d e t é c n ic a s e p r o c e d im e n t o s e m p r e g a d o s n a r e a li z a ç ã o d a s e le iç õ e s ,

e n s e ja n d o a c o n v e r s ã o d e v o t o s e m m a n d a t o , e , c o n s e q u e n t e m e n t e , a le g ít im a

r e p r e s e n t a ç ã o d o p o v o n o p o d e r e s t a t a l” . N e s s e s e n t id o , c o n v é m d e t a lh a r a s

e s p é c ie s d o s is t e m a e le it o r a l :

S is t e m a e le it o r a l d is t r i t a l o u m is to — c o n s is t e e m d i v i d i r a c i r c u n s c r i ç ã o

e le it o r a l e m d i s t r i t o s , c o n f o r m e o n ú m e r o d e v a g a s a s e r e m p r e e n c h id a s n a

C a s a L e g i s l a t i v a . D e s s a f o r m a , n o p e r ío d o e le it o r a l , c a d a d is t r i t o s o m e n t e t e r ia

u m c a n d id a t o c o m o r e p r e s e n t a n t e p o l í t i c o , q u e s e r i a e le it o c a s o o b t iv e s s e o

m a io r n ú m e r o d e v o t o s v á l i d o s .
O sufrágio e sistemas eleitorais

Para facilitar o entendimento, veja o seguinte exemplo fictício: ocorrerão eleições


para deputado federal e, em atenção ao sistema distrital, o Estado do Sol Dourado
será repartido em cinco distritos, logo, somente poderão ser eleitos cinco deputados,
que representariam cada um dos distritos. Assim, o candidato X, inscrito no distrito de
Solzinho, somente poderia receber votos desse distrito.
\ __________________________________________________________________________________________________________ *

D e s s a f o r m a , c o n s id e r a n d o a r e a lid a d e a t u a l e o e x c e s s i v o n ú m e r o d e p a r t id o s

p o lít ic o s , o s is t e m a e le it o r a l d i s t r i t a l , q u e h á a n o s fo i a b o lid o d o s is t e m a e le it o r a l

b r a s i l e i r o , t e m s id o e v o c a d o p o r d o u t r i n a d o r e s c o m o J a i r o M a r c o n i N ic o la u

( 1 9 9 6 ) , c o m o u m a a l t e r n a t i v a p a r a p r o d u ç ã o d a g o v e r n a b i li d a d e .

S is t e m a e le it o r a l m a jo r it á r io — n e s s e s is t e m a , s e r ã o c o n s id e r a d o s e le it o s

a q u e le s c a n d i d a t o s q u e t iv e r e m m a io r n ú m e r o d e v o t o s v á l i d o s , o u s e j a , n a

c o n t a g e m d o s v o t o s , n ã o s e r ã o c o n s id e r a d o s o s v o t o s n u lo s e o s b r a n c o s .

A s s im , c a s o u m c a n d id a t o o b te n h a u m n ú m e ro d e v o to s q u e s u p e re o d o s e u

c o n c o r r e n t e , s e r á c o n s id e r a d o e le it o ( m a i o r i a s im p l e s ) . C o n t u d o , n o c a s o d e

e le iç õ e s p r e s id e n c ia i s , p a r a g o v e r n a d o r e s e p r e f e it o s , s e r á a d m it id a a p o s s i b i l i ­

d a d e d o s e g u n d o t u r n o , q u e o c o r r e r á c a s o , n a c o n ta g e m d o s v o to s d o p r im e ir o

t u r n o , o c a n d id a t o m a i s v o t a d o n ã o a lc a n c e a p o r c e n t a g e m s u p e r io r d e 5 0 +

1 ( m a i o r i a a b s o lu t a ) d o s v o t o s v á l i d o s , i m p o s s i b i li t a n d o - o d e s e r c o n s id e r a d o

e le it o . C o n s t i t u í d o o s e g u n d o t u r n o , o s d o is c a n d id a t o s m a is v o t a d o s t e r ã o a

o p o r t u n id a d e d e s e g u i r c o m a c a m p a n h a e l e i t o r a l , a f i m d e a l c a n ç a r o m a io r

n ú m e r o d e v o t o s e , a s s i m , s e r e m e le it o s .

N e s s e s e n t id o , v e j a o Q u a d r o 1, s o b r e a p r e v i s ã o d a C o n s t i t u i ç ã o F e d e r a l

b r a s ile ir a .

S is t e m a e le it o r a l d e r e p r e s e n t a ç ã o o u p r o p o r c io n a l — n e s s e s is t e m a ,

a c o n t a g e m d e v o t o s v á lid o s s e d á p e lo c á lc u lo d o n ú m e r o d e v o t o s r e ­

c e b i d o s p e l o s p a r t i d o s p o l í t i c o s p o r m e io d o q u o c i e n t e e l e i t o r a l ( n ú m e r o

c o n t a b i l i z a d o d e v o t o s v á l i d o s d i v i d i d o p e lo n ú m e r o d e v a g a s n o P o d e r ) ;

a s s im , q u a n to m a is v o t o s r e c e b e r u m p a r t id o p o lít ic o , m a io r p o s s ib ilid a d e

t e r á d e s e r r e p r e s e n t a d o p e l a s u a le g e n d a p a r t i d á r i a . T a l s i s t e m a é a d o t a d o

n a s e le iç õ e s p a r a a s C â m a r a s d e V e r e a d o r e s , A s s e m b le ia s L e g is la t iv a s
0 sufrágio e sistemas eleitorais
-

f \
Quadro 1. Contagem de votos da Constituição Federal brasileira de 1998.

Contagem de votos — sistema majoritário da


Constituição Federal brasileira de 1998.

União Estados Municípios

Art. 77 A eleição Art. 28, § 2o A eleição Art. 29,1 — eleição


do Presidente e do do Governador e do do Prefeito, do
Vice-Presidente da Vice-Governador, Vice-Prefeito e dos
República realizar-se-á, observadas as regras do Vereadores, para
simultaneamente, no art. 11, e dos Deputados mandato de quatro
primeiro domingo de Distritais coincidirá com anos, mediante
outubro, em primeiro a dos Governadores e pleito direto e
turno, e no último Deputados Estaduais, para simultâneo realizado
domingo de outubro, mandato de igual duração. em todo o País;
em segundo turno, se § 3o Se nenhum candidato II — eleição do Prefeito
houver, do ano anterior alcançar maioria absoluta e do Vice-Prefeito
ao do término do na primeira votação, realizada no primeiro
mandato presidencial far-se-á nova eleição domingo de outubro
vigente. [...] 2o Será em até vinte dias após a do ano anterior ao
considerado eleito proclamação do resultado, término do mandato
Presidente o candidato concorrendo os dois dos que devam
que, registrado por candidatos mais votados suceder, aplicadas as
partido político, e considerando-se eleito regras do art. 11, no
obtiver a maioria aquele que obtiver a caso de Municípios
absoluta de votos, não maioria dos votos válidos. com mais de duzentos
computados os em mil eleitores;
branco e os nulos.

Fonte: Brasil (1988).


V J

E s t a d u a is , C â m a r a L e g is la t iv a d o D is t r it o F e d e ra l e C â m a r a d o s D e p u ta ­

d o s . C o n v é m d e s t a c a r q u e , d u r a n t e o p e r ío d o e le it o r a l, m u it o s b r a s ile ir o s ,

c o m o v o to d e “ r e v o lt a ” , o p ta m p o r a n u la r o v o to , d e ix á - lo e m b ra n c o o u

s i m p l e s m e n t e v o t a r n a le g e n d a . O f a t o é q u e , n o s i s t e m a p r o p o r c i o n a l , a o

v o t a r n a le g e n d a , a t é m e s m o a q u e l e ( a ) c a n d i d a t o ( a ) r e j e i t a d o ( a ) p e lo e l e i t o r

r e c e b e r á o v o t o , p o i s , a o v o t a r n a le g e n d a , o s c a n d i d a t o s d a q u e l a le g e n d a

re c e b e rã o o v o to v á lid o .
O sufrágio e sistemas eleitorais

Saiba mais

De acordo com a doutrina, sào modalidades do sistema proporcional o sistema de voto


limitado, o sistema de voto cumulativo, o sistema preferencial, o sistema de concorrência
de listas e o sistema automático. Para saber mais sobre essas modalidades, veja o livro
Sistema político brasileiro: uma introdução (AVELAR; CINTRA, 2015).

Da importância dos partidos políticos


C o m o f i m d o E s t a d o e m 1 9 4 5 , s u r g i r a m o s p r i m e i r o s p a r t id o s p o l í t i c o s n o

B r a s i l . N o a n o s e g u in t e , a p r o m u lg a ç ã o d a C o n s t it u iç ã o F e d e r a l d e 1 9 4 6

(m a r c o n a h is t ó r ia d a d e m o c r a c ia , p r in c ip a lm e n t e p a r a o v o to f e m in in o )

p o s s i b i l i t o u c e r t a li b e r d a d e a o p o v o , q u e , a n o s d e p o i s , c o m a d i t a d u r a , f o i

s u p r im id a e c e r c e a d a . A a t u a l C o n s t it u iç ã o F e d e r a l c o n s a g r o u o s d ir e it o s

p o lít ic o s e s o c ia is a o p o v o .

N o s ú lt im o s a n o s , a c o r r u p ç ã o p o lít ic a se to rn o u te m a r e c o rr e n te n o s

n o t ic iá r io s m u n d ia is e , n o c a s o b r a s ile ir o , c o m o e s c â n d a lo d a c o r r u p ç ã o d a

P e t r o b r a s , d iv e r s o s p a r t id o s p o lí t i c o s t iv e r a m o s s e u s n o m e s e n v o lt o s e m a ç õ e s

p e n a i s p e lo r e c e b im e n t o d ir e t o e in d i r e t o d e v u l t o s a s q u a n t ia s d e d i n h e i r o ,

f r u t o d e m e io s c o r r u p t o s . P o r c o n s e q u ê n c ia d o s e s c â n d a l o s , d iv e r s a s e m p r e s a s

p r e s t a d o r a s d e s e r v i ç o s p a r a a P e t r o b r a s n à o v i r a m a lt e r n a t iv a a n à o s e r d e m it ir

o s s e u s f u n c io n á r io s , in c lu s iv e fe c h a r a s p o rt a s , c a u s a n d o u m g ra v e a u m e n to

n a t a x a d e d e s e m p r e g o n o P a í s , e s p e c ia l m e n t e n a s c i d a d e s e n o s E s t a d o s e m

q u e s e e n c o n t r a m a s b a s e s d e e x t r a ç ã o d e p e t r ó le o d a P e t r o b r a s .

A c o r r u p ç ã o g e n e r a liz a d a te m d e s m o t iv a d o a p o p u la ç ã o a c r e r e c o n f i a r n o s

p a r t id o s e n a p o lí t i c a e m g e r a l. O q u e s e t e m v i s t o , n a p r á t ic a , s ã o c a n d id a t u r a s

v o lt a d a s p a r a p r o je t o s p e s s o a is d e e n r i q u e c im e n t o , e m d e s p r e z o d o in t e r e s s e

c o l e t i v o , r e c o r d a n d o a q u i o s t e m p o s d e i m p e r i a l i s m o e d o v o t o r e s t r it o .

P a r a q u e u m s is t e m a d e g o v e r n o c o m o o p r e s i d e n c i a l i s m o a d o t a d o p e lo

B r a s i l s ig a o s e u p e r f e it o f u n c io n a m e n t o , é im p o r t a n t e q u e o s p a r t id o s p o lít ic o s

d e s e n v o lv a m a ç õ e s e m r e s p e it o à C o n s t it u i ç ã o F e d e r a l, e m b e n e f íc i o d o p o v o e

d o E s t a d o , p o is é p o r m e io d o s p a r t id o s q u e o s in d i v íd u o s c o n s id e r a d o s p o r le i

c o m o a li s t á v e i s p o d e m s e r e le it o s e g e r i r o s a s s u n t o s in t e r n o s e e x t e r n o s d o P a ís .

É c r u c i a l q u e o s p a r t id o s p o l í t i c o s s o f r a m u m a r e e s t r u t u r a ç ã o n o s e n t id o

d e q u e r e a f i r m e m a id e n t id a d e p a r a a q u a l f o r a m c r i a d o s , i n c e n t i v a n d o a

p o p u la ç ã o a c o n h e c e r e s a b e r c o m o f u n c i o n a e p a r a q u e s e r v e c a d a p a r t id o .
0 sufrágio e sistemas eleitorais
-

S e g u n d o o n o b r e d o u t r i n a d o r S a r t o r i ( 1 9 8 7 ) r e f e r e n c ia n o e s t u d o d a d e ­

m o c r a c i a , o v o t o é o c r i t e r i o m a is u t i l i z a d o p a r a m e d i r a f r e q u ê n c ia d o p o d e r

d o s p a r t id o s p o lít ic o s ; c o n t u d o , a in d a s e g u n d o o d o u t r in a d o r , o v o to é u m

c r i t e r i o d e f e it u o s o , p o is c a p t a u m ú n i c o a s p e c t o d o f e n ó m e n o p a r t it o c r á t i c o .

O q u e v o c ê p e n s a s o b r e a r e a li d a d e d o s u f r á g i o , d o s is t e m a e le it o r a l e d o s

p a r t id o s p o lí t i c o s p a r a o s is t e m a d e m o c r á t i c o n o B r a s i l ?

Saiba mais

Atualmente, 35 partidos políticos estão registrados no


Tribunal Superior Eleitoral: Partido do Movimento De­
mocrático Brasileiro (PMDB), Partido Trabalhista Brasileiro
(PTB), Partido Democrático Trabalhista (PDT), Partido dos
Trabalhadores (PT), Democratas (DEM), Partido Comu­
nista do Brasil (PCdoB), Partido Socialista Brasileiro (PSB),
Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), Partido
Trabalhista Cristão (PTC), Partido da Mobilização Nacional
(PMN), Partido Social Cristão (PSC), Partido Republicano
Progressista (PRP), Partido Popular Socialista (PPS), Partido
Verde (PV), Partido Trabalhista do Brasil (PTdoB), Partido
Progressista (PP), Partido Socialista dos Trabalhadores Uni­
ficado (PSTU), Partido Comunista Brasileiro (PCB), Partido
RenovadorTrabalhista Brasileiro (PRTB), Partido Humanista
da Solidariedade (PHS), Partido Social Democrata Cristão
(PSDC), Partido da Causa Operária (PCO), Podemos (PODE),
Partido Social Liberal (PSL), Partido Republicano Brasileiro
(PRB), Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), Partido da
República (PR), Partido Social Democrático (PSD), Partido
Pátria Livre (PPL), Partido Ecológico Nacional (PEN), Partido
Republicano da Ordem Social (PROS), Solidariedade (SD),
Partido Novo (NOVO), Rede Sustentabilidade (REDE) e
Partido da Mulher Brasileira (PMB).
Ainda, 61 partidos se encontram em formação. Para co­
nhecer os partidos em formação, acesse o link abaixo ou
o código ao lado:

https://goo.gl/jnds1j
O sufrágio e sistemas eleitorais

Referências '

BOBBIO, N. Igualdade e liberdade. 3. ed. Rio de Janeiro: Ediouro, 1997.

BONAVIDES, P. Ciência política. São Paulo: Malheiros, 2007.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília:


Senado Federal, 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/cons-
tituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 6 set. 2017.

BRASIL. Lei n° 4.737, de 15 de julho de 1965. Institui o Código Eleitoral. 1965. Disponível
em: <http://www.planalto.gov.br/cdvil_03/leis/L4737htm:>. Acesso em: 6 set. 2017.

GOMES, J. J. Direito eleitoral. 12. ed. São Paulo: Atlas, 2016.

NICOLAU, J. M. Multipartidarismoe democracia: um estudo sobre o sistema partidário


B. Rio de Janeiro: FGV, 1996.

SARTORI, G. Partidosy sistemas departidos: marco para un análisis. Madrid: Alianza, 1987.

Leituras recomendadas

ACQUAVIVA, M. C. Teoria geral do Estado. 3. ed. Barueri: Manóle, 2010.

AVELAR, L.; CINTRA, A. O. Sistema político brasileiro: uma introdução. 3. ed. São Paulo;
UNESP, 2015.

MORAES, A. de. Direito constitucional. 32. ed. rev. e atual. São Paulo: Atlas, 2016.

BITTAR, E. C. B. Teoria do Estado: filosofia política e teoria da democracia. 5. ed. rev.


atual, e modificada. São Paulo: Atlas, 2016.

PEREIRA, E. W. Direito eleitoral: interpretação e aplicação das normas constitucionais-


-eleitorais. São Paulo: Saraiva, 2010.

TAVARES, J. A. G. Sistemas eleitorais nas democracias contemporâneas. Rio de Janeiro:


Relume-Dumará, 1994.
\ ____________________________________________________________________________________________ J
Formas de governo
/------------------ Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

■ Definir as formas de governo.


■ Contrastar as formas de governo com a separação de poderes.
■ Explicar a crise da separação dos poderes e os reflexos na democracia.

Introdução-------------------------------------- n
Neste capítulo, você estudará as formas de governo. Com base em uma
análise histórica, analisará a evolução da classificação das formas de go­
verno, a forma como ocorreu a separação de poderes e como tal divisão
reflete no progresso de uma sociedade democrática.
Cada tema deste capítulo é fundamental para que você entenda o
funcionamento político do Brasil e de outros povos.

Formas de governo
P a r a c o m p r e e n d e r a s a t u a i s f o r m a s d e g o v e r n o , é im p o r t a n t e a n a l i s a r c o m o o

t e m a f o i d is c u t id o p o r p e n s a d o r e s c o m o P la t ã o , A r is t ó t e l e s , P o l íb io , M a q u i a v e l,

B o d i n , H o b b e s , V i c o , M o n t e s q u ie u , H e g e l, M a r x e B o b b io . P a r a t a n t o , o e s t u d o

d a c o n c e p ç ã o f i l o s ó f i c a e p o l í t i c a d e g o v e r n o d e s e n v o lv i d a p o r e s s e s t e ó r i c o s

p e r m i t i r á a n a l i s a r a s a t u a i s f o r m a s e s is t e m a s d e g o v e r n o , b e m c o m o a c r i s e

n a s e p a ra ç ã o d e p o d e re s.

P a r a o p ro fe s s o r Jo s é G e r a ld o B r it o F ilo m e n o , o governo “ é u m c o n ju n t o
d o s ó r g ã o s d o E s t a d o q u e c o lo c a m e m p r á t ic a a s d e lib e r a ç õ e s d o s ó r g ã o s

le g i s l a t i v o s ” ( F I L O M E N O , 2 0 1 6 , p . 9 7 ) . P a r a o s f i l ó s o f o s g r e g o s a n t e r io r e s a

C r i s t o , P la t ã o e A r i s t ó t e l e s , o g o v e r n o d e v e r i a s e r a n a l i s a d o a p a r t i r d c d u a s

v e r t e n t e s : a p u r a ( i d e a l ) e a im p u r a o u d e g e n e r a d a . P a r a P l a t à o , a s f o r m a s

d e g o v e r n o id e a is s e r i a m a m o n a r q u ia e a a r i s t o c r a c i a , c o n s id e r a d a s f o r m a s

ú n ic a s . J á a s fo r m a s c o r r u p t a s d e g o v e rn o s e r ia m a o lig a r q u ia , a t im o c r a c ia , a

d e m o c r a c ia e a t i r a n i a . A o l ig a r q u i a s e r i a a f o r m a c o r r o m p id a d a a r i s t o c r a c i a ,
Formas de governo

e n q u a n t o a t i r a n i a é a f o r m a c o r r o m p id a d a m o n a r q u ia . P a r a P la t ã o , a t im o c r a c ia

s e r i a a t r a n s i ç ã o e n t r e a c o n s t i t u i ç ã o id e a l e a s f o r m a s c o r r u p t a s d c g o v e r n o .

S e g u n d o B o b b io ( 1 9 9 7 ) , p a r a A r i s t ó t e l e s , n à o h a v ia d is t in ç ã o d e s ig n i f i c a d o

e n t r e g o v e r n o e c o n s t it u iç ã o . E m r a z ã o d is s o , p a r a A r i s t ó t e l e s (a p u d B O B B I O ,

1 9 9 7 , p . 5 5 ) , o g o v e r n o é o “ p o d e r e x e r c id o p o r u m s ó , p o r p o u c o s o u p o r m u it o s ” .

A s s i m , a p o lit e ia ( c o n s t it u i ç ã o — e s t r u t u r a q u e d á o r d e m à c i d a d e , d e t e r m i­

n a n d o o f u n c io n a m e n t o d e t o d o s o s c a r g o s p ú b lic o s e , s o b r e t u d o , d a a u t o r id a d e

s o b e r a n a ) , p a r a A r i s t ó t e l e s , s e r ia r e s p o n s á v e l p o r d a r f o r m a a o s is t e m a .

A r is t ó t e le s c l a s s i f i c o u a s f o r m a s d e g o v e r n o c o m o p u r a s e im p u r a s . A s f o r m a s

p u r a s d c g o v e r n o s e r ia m o r e in o (m o n a r q u ia ), a a r is t o c r a c ia e a politia (t im o c r a c ia ) ;

e a s f o r m a s i m p u r a s s e r ia m a t ir a n ia , a o lig a r q u ia e a d e m a g o g ia . P a r a A r is t ó t e le s ,

a s f o r m a s im p u r a s s e r ia m a s d e g e n e r a ç õ e s d a s f o r m a s p u r a s d e g o v e r n o , o u s e ja ,

a t ir a n ia e m c o n t r a p o s iç ã o a o r e in o ( m o n a r q u ia ) , a o lig a r q u ia e m c o n t r a p o s iç ã o à

a r i s t o c r a c ia e a d e m a g o g ia e m c o n t r a p o s iç ã o à politia ( t im o c r a c ia ) .

Fique atento

Para o doutrinador José Geraldo Brito Filomeno, a classificação aristotélica tem um


'caráter quantitativo, de acordo com o número dos que exercitam o poder político, e
qualitativo ou valorativo, de acordo com o posicionamento dos que exercem o mesmo
poder, em face do bem comum’ (FILOMENO, 2006, p. 101).

S e g u n d o o p r o f e s s o r C e l s o B a s t o s ( 2 0 0 4 ) , A r i s t ó t e l e s s o f is t ic o u o e s q u e m a

d a s f o r m a s d c g o v e r n o e la b o r a d o p o r P la t ã o — a s s i m , p a r a c a d a f o r m a p u r a

o u i d e a l, a g r e g o u u m a f o r m a d e g o v e r n o c o n s id e r a d a d e g e n e r a d a .

P a r a o h is t o r ia d o r P o lib io ( 2 0 0 a . C - 1 1 8 a .C .) , a s fo r m a s d c g o v e r n o se

c l a s s i f i c a v a m e m m o n a r q u ia , t i r a n i a , a r i s t o c r a c i a , o l i g a r q u i a , d e m o c r a c ia e

o c lo c r a c ia (ocios la t im — m u lt id ã o , g o v e rn o d a s m a s s a s ). A in d a d e a c o rd o

c o m P o l i b i o , e s s a s f o r m a s f o r m a v a m u m m o v im e n t o c í c l i c o , o u s e j a , a p r o ­

b le m á t i c a d e u m a f o r m a d e g o v e r n o d e s e n c a d e a r ia o u t r a f o r m a d e g o v e r n o e

a s s i m s u c e s s iv a m e n t e . N e s s e s e n t id o , v e j a a s p a l a v r a s d e P o l i b i o , c i t a d a s p o r

B o b b io ( 1 9 9 7 , p . 6 7 ) n o l i v r o a Teoria das formas de governo:

Em prim eiro lugar se estabelece sem artificio e naturalm ente o governo de


um só, ao qual segue (e do qual é gerado por sucessivas elaborações e co rre­
ções) o reino. Transform ando-se este no regim e mau correspondente, isto é.
Formas de governo
-

na tiranía, pela queda desta últim a se gera o governo dos m elhores. Q uando
a aristocracia por sua vez degenera em oligarquia, pela força da natureza, o
povo se insurge violentam ente contra os abusos dos governantes, nascendo
assim o governo popular. Com o tem po, a arrogância e a ilegalidade dessa
form a de governo levam à oclocracia.

A n o s m a is t a r d e , o f iló s o f o N ic o la u M a q u i a v e l ( 1 4 6 9 - 1 5 2 7 ) , a u t o r d o l i v r o

O principe, in o v o u c o m u m a c l a s s i f i c a ç ã o b ip a r t id a d e g o v e r n o , s e p a r a n d o - o

e m r e p ú b lic a (s o m a d a a r i s t o c r a c i a e d e m o c r a c ia ) e p r in c ip a d o ( m o n a r q u ia ) . D e

a c o r d o c o m M a q u i a v e l ( 2 0 0 3 , p . l ) , “ T o d o s o s E s t a d o s , t o d o s o s d o m ín io s q u e

t iv e r a m e tê m a u t o r id a d e s o b re o s h o m e n s fo r a m e s ã o r e p ú b lic a s o u p r in c ip a d o s ” .

C o m r e la ç ã o à r e p ú b l i c a , é a t u a lm e n t e c l a s s i f i c a d a e m r e p ú b lic a p a r la m e n t a r e

r e p ú b lic a p r e s id e n c ia lis t a ; j á a m o n a r q u i a s e c l a s s i f i c a e m m o n a r q u ia a b s o lu t is t a ,

m o n a r q u ia c o n s t it u c io n a l e m o n a r q u ia p a r la m e n t a r o u d u a li s t a .

P a r a M a q u i a v e l, a r e p ú b lic a p o s s u i c a r a c t e r ís t ic a s p r ó p r ia s , c o m o a t e m p o r a ­

lid a d e d o g o v e r n a n t e n a p o s iç ã o d e lí d e r d o E s t a d o , a o p a s s o q u e , n a m o n a r q u ia ,

e m r a z à o d a h e r e d it a r ie d a d e , e le iç ã o e c o o p t a ç à o ( d e c la r a ç ã o d e s u c e s s ã o d o

t r o n o ), o r e i o u m o n a r c a o c u p a r á a p o s iç ã o d e r e g e n te p o r t e m p o in d e t e r m in a d o .

P a r a o f iló s o f o in g lê s T h o m a s H o b b e s ( 1 5 8 8 - 1 6 7 9 ) , a u t o r d o l i v r o Leviatã , o
g o v e r n o c o n s i s t i r i a n a e x i s t ê n c ia d e u m p o d e r s o b e r a n o i n d i v i s í v e l r e s p o n s á v e l

p o r d e t e r m in a r a c o n d u ç ã o d o E s t a d o . P o r c o n s e q u ê n c ia , n ã o h a v e r ia r a z à o

e m d i f e r e n c i a r a s f o r m a s d e g o v e r n o c o m o f o r m a s p u r a s , im p u r a s o u m i s t a s .

P a r a o ju r i s t a Je a n B o d in (1 5 3 0 - 1 5 9 6 ) e p a r a o f iló s o f o G ia m b a t t is t a V ic o

( 1 6 6 8 - 1 7 7 4 ) , a s f o r m a s d e g o v e r n o s e c l a s s i f i c a v a m e m m o n a r q u ia , a r i s t o c r a c ia

e d e m o c r a c i a ( r e p ú b l i c a p o p u la r ) . C o n v é m r e s s a l t a r q u e V i c o , a s s i m c o m o

P o lib io , a n a lis o u a s fo r m a s d e g o v e rn o a p a r t ir d e u m a v e r t e n t e c íc lic a .

P a r a o j u r i s t a M o n t e s q u ie u ( 1 6 8 9 - 1 7 5 5 ) , s e r i a m c o n s id e r a d a s f o r m a s d e

g o v e r n o a r e p ú b lic a (o p o v o o u p a r t e d e le p o s s u i o p o d e r s o b e r a n o d e g o v e r n a r ) ,

a m o n a r q u ia o u p r i n c i p a d o (o p o d e r é g o v e r n a d o p o r u m i n d i v í d u o m e d ia n t e

n o r m a s p r e e s t a b e le c id a s ) e o d e s p o t is m o (o p o d e r é g o v e r n a d o a o p r a z e r d e

u m in d iv íd u o s e m a o b s e r v â n c ia d e n o r m a s ).

J á p a r a o f iló s o f o a le m ã o F r i e d r i c h H e g e l ( 1 7 7 0 - 1 8 3 1 ) , s e r ia m c o n s id e r a d a s

f o r m a s d c g o v e r n o a m o n a r q u ia , a a r i s t o c r a c i a , a d e m o c r a c ia , a o l ig a r q u i a , a

o c l o c r a c i a e o d e s p o t is m o . C o n t u d o , K a r l M a r x ( 1 8 1 8 - 1 8 8 3 ) in o v o u a o n à o

c l a s s i f i c a r o g o v e r n o e m f o r m a s , p o is , p a r a o a u t o r , n à o h a v i a i m p o r t â n c i a e

s e n tid o n a c l a s s i f i c a ç ã o d o g o v e r n o , m a s o e s t a b e le c im e n t o d e u m g o v e r n o ú n ic o ,

n o q u a l n à o h a v e r ia a d i v i s ã o d e c l a s s e s s o c i a is ( c o n c e p ç ã o p o lí t i c a s o c i a li s t a ) .

P a r a N o r b e r t o B o b b io ( 1 9 0 9 - 2 0 0 4 ) , e m c o n s e q u ê n c i a d a t e m p o r a lid a d e

d a d it a d u r a e d i f e r e n c i a ç ã o d o d e s p o t is m o e d a t i r a n i a , a d it a d u r a s e r i a u m a

fo r m a p o s it iv a d e g o v e rn o .
Formas de governo

Fique atento

As classificações filosóficas políticas de governo desenvolvidas por esses pensadores


foram vitais para a compreensão da realidade funcional de um povo. Reflita quais
seriam as formas de governo adotadas pelos diversos países na atualidade.

Governo e separação de poderes


P a r a o f iló s o f o in g l ê s J o h n L o c k e ( 1 6 3 2 - 1 7 0 4 ) , o p o d e r d e r i v a v a d e u m p a c t o

e d e u m c o n t r a t o s o c i a l , e m c o n s e q u ê n c i a d o e s t a d o d e n a t u r e z a e d a r e la ç ã o

e n tre g o v e r n a n te e g o v e rn a d o . P a ra L o c k e , o s p o d e re s d e v e r ia m e s t a r e m

e q u ilíb r io e se d iv id ir ia m e m E x e c u t i v o ( z e l a r p e lo c u m p r im e n t o d a s l e i s ) ,

L e g i s l a t i v o ( p o d e r s u p r e m o e f id u c i á r i o d o E s t a d o ) , F e d e r a t iv o e d e p r e r r o g a t iv a

( p o d e r d e t r a b a l h a r s e g u n d o d i s c r i ç ã o p a r a o b e m p ú b l ic o s e m p r e s c i n d i r d a

le i e a in d a à s v e z e s c o n t r a e la ) .

O P o d e r E x e c u t i v o a p r e s e n t a r ia a t iv id a d e c o n t ín u a c o m a f i n a l i d a d e d e

c o n d u z i r o s a s s u n t o s in t e r n o s e e x t e r n o s d o s E s t a d o s e d e j u l g a r e a p l i c a r p e n a s

à q u e le s q u e d e s c u m p r is s e m a s le is . O L e g i s l a t i v o d e v e r ia t r a b a lh a r n a b u s c a p o r

le g i s l a r e m o b s e r v â n c ia a o p r i n c í p i o d a le g a lid a d e . O P o d e r F e d e r a t i v o s e r ia o

p o d e r c o n f e r id o a o E s t a d o d e r e la c io n a r - s e c o m o u t r a s p e s s o a s e c o m u n id a d e s

a lh e ia s à r e p ú b lic a . J á a p r e r r o g a t i v a s e r ia a p e r m is s ã o c o n c e d id a p e lo p o v o a o s

s e u s g o v e r n a n t e s , p a r a q u e , n o c a o s d o s ilê n c io d a le i s o b re d e t e r m in a d o s t e m a s ,

r e a li z a s s e m a ç õ e s d e l i v r e e le iç ã o , m e s m o q u e f o s s e m c o n t r á r io s a o t e x t o le g a l.

É p o s s ív e l p e r c e b e r q u e o a t u a l P o d e r J u d ic iá r io , n a d iv is ã o d e p o d e re s

e s t a b e le c id a p o r L o c k e , e r a e x e r c id o p e lo P o d e r E x e c u t i v o . M a s , p a r a M o n t e s ­

q u ie u ( 1 6 8 9 - 1 7 5 5 ) , o s p o d e r e s e s t a t a is s e d i v i d i a m e m E x e c u t i v o , L e g i s l a t i v o

e J u d ic iá r io . N o liv r o O espirito das leis , p u b l ic a d o e m 1 7 4 8 , M o n t e s q u ie u

( 1 9 7 3 , p . 2 1 ) d e c la r o u q u e “ e m c a d a e s t a d o e x i s t e m t r ê s c l a s s e s d e p o d e r , o

L e g is la t iv o , o e x e c u t iv o d a s c o is a s p e r te n c e n t e s a o d ir e it o d a s p e s s o a s e o

E x e c u t iv o d o s q u e p e rte n c e m a o c i v i l ” . Q u a n to a e s t e s , o f iló s o fo o b s e rv o u

q u e o ú lt im o s e c h a m a r ia P o d e r J u d ic ia l e , o o u tro , P o d e r E x e c u t iv o d o E s t a d o .

D e s s a f o r m a , M o n t e s q u ie u in o v o u a o e s t a b e l e c e r t r ê s f o r m a s in d e p e n d e n t e s

d c p o d e r , a t é h o je a d o t a d a s p e lo s g o v e r n o s a t u a i s .

P a r a M o n t e s q u ie u , a d iv is ã o j u r í d i c a d a s d is t in t a s f u n ç õ e s d e p o d e r e s s o m e n te

p o d e r ia lim it a r - s e a o u s o ile g a l d o p o d e r e g a r a n t ir a lib e r d a d e e o s d ir e it o s d a s

p e s s o a s . O L e g is la t iv o s e r ia u m ó rg ã o r e p re s e n t a t iv o d a v o n ta d e d o p o v o d e s t in a d o

à c r ia ç ã o d e le is . A l é m d is s o , t a m b é m p o d e r ia a p r e c ia r , n o s t e r m o s d a le i, a s a ç õ e s
100 Formas de governo
-

d o E x e c u t iv o e d o s s e u s m e m b r o s . J á o E x e c u t iv o s e r ia u m ó r g ã o c o m a f u n ç ã o d e

c u m p r i r a s n o r m a s e la b o r a d a s p e lo L e g is la t iv o e t e r ia o p o d e r d e v e t a r le is e la b o ­

r a d a s p e lo L e g is la t iv o . E m c o n t r a p o s iç ã o , o P o d e r J u d i c i á r io s e r ia u m ó r g ã o c u ja

f u n ç ã o s e r ia j u l g a r c r i m e s e c o n f l it o s e n t r e p e s s o a s ; p o r is s o , d e v e r ia s e r t e m id o ,

j á q u e t e r ia a le g it im id a d e d e p r i v a r a lib e r d a d e d a q u e le q u e d e s c u m p r is s e a le i.

P a r a o f i l ó s o f o s u í ç o J e a n - J a c q u e s R o u s s e a u ( 1 7 1 2 - 1 7 7 8 ) , a u t o r d o c é le b r e

liv r o Contrato social, o P o d e r L e g is la t iv o p e rte n c e so m e n te a o p o v o , v is t o q u e

o P o d e r E x e c u t i v o c o n s i s t i r i a e m a t o s p a r t ic u la r e s . D e s s a f o r m a , p a r a R o u s s e a u ,

n ã o s e r i a c e r t o q u e o ó r g ã o r e s p o n s á v e l p o r e la b o r a r a le i f o s s e r e s p o n s á v e l

p e la s u a e x e c u ç ã o — p o r i s s o , e r a n e c e s s á r io u m g o v e r n o s o b e r a n o , p o is a

m o n a r q u ia n à o e r a a ú n i c a f o r m a d e g o v e r n o , m a i s b e m a s o b e r a n ia p o p u la r .

P a ra T o c q u e v ille (1 8 0 5 - 1 8 5 9 ), o P o d e r L e g is la t iv o d iv id ia - s e e m d u a s

a s s e m b le ia s ( S e n a d o e C â m a r a d o s D e p u t a d o s ) , c o m p o s t a s p o r r e p r e s e n t a n t e s

e le it o s p o r c i d a d ã o s . O P o d e r E x e c u t i v o s e r i a c o n d u z i d o p o r u m g o v e r n a n t e

e le it o p e lo p o v o , c o m a f u n ç ã o d e s e r c h e f e d o E s t a d o c o m m a n d a t o t e m p o r a l e

c o m p o d e r r e g u la d o p e lo S e n a d o . J á o P o d e r J u d i c i á r i o , a s s i m c o m o e n t e n d e u

M o n t e s q u ie u , s e r i a u m ó r g ã o d e g r a n d e p o d e r , p o is t e r ia a f i n a l i d a d e d e j u l g a r

c a s o s p a r t ic u la r e s . A lé m d is s o , s e g u n d o T o c q u e v ille , o J u d ic iá r io a t u a r ia

q u a n d o in v o c a d o e , p o r r e c o r r e r à C o n s t i t u i ç ã o p a r a j u s t i f i c a r a m a io r p a r t e

d e s u a s d e c is õ e s , d e t i n h a s i g n i f i c a t i v o p o d e r p o l í t i c o .

O q u e é p o s s ív e l p e n s a r s o b re a a t u a l fo rç a d o s P o d e re s E x e c u t iv o , L e g is ­

la t iv o e J u d i c i á r i o ?

Saiba mais

Para saber mais sobre o processo, leia A constituição reinventado pela jurisdição cons­
titucional 2002).

Separação de poderes e democracia atual

P a r a o d o u t r i n a d o r J o s é S a m p a io ( 2 0 0 2 , p . 4 3 0 ) :

N os d ias atu ais p ode-se falar dc m últiplas in terp retaçõ es do principio da


divisão dos poderes de acordo com a organização do sistem a de governo sem
que se possa indicar um m odelo paradigm ático desse principio, que venha a
servir de referência necessária a m odelos concretos adotados pelos sistem as
Formas de governo

constitucionais. A ntes, há um a ideia — de separação de poderes, guiadas


por um fim — de ev itar tiranias e g aran tir o funcionam ento equilibrado do
governo, que assum e diversas form as em diferentes contextos sociopolíticos.
Vale dizer que não há modelo de divisão de poderes senão um a variedade de
conform ações que vem a assum ir na prática.

O s f iló s o f o s , a o p e n s a r e m n a s e p a r a ç ã o d o s p o d e r e s , n ã o p o d e r ia m im a g in a r

q u e , e m c o n s e q u ê n c ia d o a u m e n t o d a c o r r u p ç ã o e d o s in t e r e s s e s p e s s o a is , a

a u t o n o m ia d o s p o d e r e s L e g i s l a t i v o , E x e c u t i v o e J u d i c i á r i o s e r i a a m e a ç a d a

e d e ix a r ia d e e x i s t i r , p o is , n a r e a lid a d e a t u a l, é c a d a v e z m a is fr e q u e n t e a

in t e r v e n ç ã o p o lít ic a d o P o d e r L e g is la t iv o e m d e s p re z o d o P o d e r J u d ic iá r io .

P a ís e s c o m o B r a s i l e E s p a n h a , p o r e x e m p lo , s ã o t e s t e m u n h a s d a p e r s e g u iç ã o

a o P o d e r J u d i c i á r i o , q u e , e m r a z à o d e l e i s c h a m a d a s p o p u la r m e n t e d e le is

d a m o r d a ç a , v i r a m o t r a b a l h o e a a u t o n o m ia d o J u d i c i á r i o s e r e m c e r c e a d o s .

O s d iv e r s o s e s c â n d a lo s e n v o lv e n d o e m p r e s a s p r i v a d a s , p r in c ip a lm e n t e c o m

m e m b r o s d o s P o d e r e s L e g i s l a t i v o e E x e c u t i v o , d e m o n s t r a m a f r a g ilid a d e d e s s e s

p o d e r e s e m c u m p r i r a s o b r ig a ç õ e s p a r a a s q u a is f o r a m p e n s a d o s e c r i a d o s .

A t u a lm e n t e , é c a d a v e z m a is fr e q u e n t e h a v e r d e n ú n c ia s d e fa v o r e c im e n t o

e n tre m e m b ro s d o s p o d e re s , c o m a f in a lid a d e ú n ic a d e m a n te r o s s e u s c a rg o s

e o s e u p o d e r p o lí t i c o .

No caso brasileiro, a Operação Lava-Jato, por exemplo, revelou a participação de


membros dos três poderes em ações criminais de corrupção, ou seja, aqueles que
deveriam legislar em benefício do povo e da nação passaram a legislar em benefí­
cio próprio e de interesses privados, aqueles que deveriam cumprir as funções de
administrar os interesses públicos passaram a administrar em benefício próprio e de
terceiros e aqueles que deveriam sancionar e penalizar passaram a perdoar corruptos
e a penalizar os mais desfavorecidos.
\ ____________________________________________________________________________________________ J

O r a , v o c ê c o n s e g u e p e r c e b e r a lg u m a s e m e lh a n ç a c o m a s f o r m a s d e g e n e ­

r a d a s d c g o v e r n o ? P a r a o d o u t r in a d o r L u ig i F e r r a jo li (2 0 1 4 , p . 4 0 ):

A crise do “alto” da dem ocracia e de dissolução da representação, nesses úl­


tim os anos, foi a crescente integração dos partidos no Fstado e o consequente
desaparecim ento de uma ulterior separação entre partidos e instituições com
Formas de governo
-

a sociedade. É cada vez m ais estreita a relação entre dinheiro, inform ação
e política: dinheiro para fazer política e inform ação, inform ação para fazer
dinheiro e política, política para fazer dinheiro e inform ação, segundo um
ciclo vicioso que se traduz no crescente condicionam ento anti ou extra re­
presentativo da ação do governo.

D e f a t o , a v i s ã o d e F e r r a j o l i ( 2 0 1 4 ) r e f le t e o a t u a l c e n á r i o m u n d i a l , p o is é

c a d a v e z m a is f r e q ü e n t e a v i o l a ç ã o d a d e m o c r a c ia , q u e t e m s id o u t i l i z a d a p a r a

in t e r e s s e s p r ó p r i o s e d e c e r t a m i n o r i a . C o m o u m a T o r r e d e B a b e l , p e r c e b e -

- s e q u e é u t o p ia p e n s a r e m p o d e r e s a u t ô n o m o s e h a r m ô n i c o s e n t r e s i , v i s t o a

f r e q u e n t e r e la ç ã o e n t r e o s p o d e r e s p ú b l ic o s e o s p r i v a d o s .

Exemplo ^

No caso da Operação Lava-Jato, fica visível o fato de não ser mais possível separar
corruptor e corrompido. Dada a força de grandes empresas, os poderes e os seus
dirigentes, eleitos ou não pelo povo, tornaram-se reféns de empresas privadas e,
como medidas extremistas, passaram a criar barreiras para se autodefenderem, em
total desprezo às normas legais.
V____________________________________________________________________________________ '

A i n d a s e g u n d o F e r r a j o l i ( 2 0 1 4 ) , t a l s it u a ç ã o é u m a a b e r r a ç ã o i n s t i t u c i o n a l

q u e c o m p o r t a u m a d e f o r m a ç ã o d o s is t e m a p o l í t i c o e d a d e m o c r a c ia in c o m p a ­

r a v e lm e n t e m a i s g r a v e d o q u e a s f o r m a s t r a d i c i o n a i s , a in d a q u e p a t o ló g ic a s

e d e lin q u e n c ia is d a c o r r u p ç ã o .

C o n v é m d e s t a c a r q u e , n o p a s s a d o , o j u r i s t a T o c q u e v il le ( 1 8 0 5 - 1 8 5 9 ) j á s i n a l i ­

z a v a a c r is e d a s e p a r a ç ã o d o s p o d e r e s n a d e m o c r a c ia , p o is , s e g u n d o o p r e s t ig ia d o

j u r i s t a , to d o e q u a lq u e r p r o je t o d e le i q u e f e r is s e a C o n s t it u iç ã o d e u m p a ís n ã o

d e v e r ia s e q u e r s e r a p r e c ia d o — c a s o f o s s e , s e r ia r e t id o p e lo P o d e r J u d i c i á r i o .

C o n t u d o , n a a t u a lid a d e , c o m u m p o d e r c a d a v e z m a is lim it a d o e s e m r e c u r s o s , o

J u d i c i á r io s e t o r n o u r e f é m d o s d e m a is p o d e r e s ; c m e s p e c ia l, d o E x e c u t iv o .

A id e o lo g i a d e N o r b e r t o B o b b i o ( 1 9 0 9 - 2 0 0 4 ) d e q u e o p r i n c i p a l p o n t o

c a r a c t e r í s t i c o d a d e m o c r a c ia s e r i a o r e s p e it o à e le iç ã o e a o d e s e jo d o p o v o e

d a s in s t i t u i ç õ e s , n ã o à s a ç õ e s p o lí t i c a s e m s i , n ã o r e f le t e a r e a li d a d e , p r i n c i p a l ­

m e n te n o c a s o b r a s ile ir o , c o m o m a n d o e d e s m a n d o d e d e p u ta d o s , s e n a d o re s ,

s u p e r j u í z e s e p r e s id e n t e s , q u e in s i s t e m e m a t u a r c o m o s e f o s s e m r e i s e s o b e ­

r a n o s . E s t a r í a m o s d ia n t e d o f i m d a d e m o c r a c ia e d o f o r t a le c i m e n t o d e f o r m a s

d e g e n e r a d a s d e g o v e r n o — o u , n a r e a lid a d e , h á s o m e n t e u m a c r i s e d e p o d e r e s ?
Formas de governo

Referências >

BASTOS, C. R. Curso de teoria do Estadoeciênciapolítica. 6. ed. Sâo Paulo: Saraiva, 2004.

BOBBIO, N. A teoria das formas de governo. 9. ed. Brasília: Universidade de Brasília,1997.

BONAVIDES, P. Ciência política. São Paulo: Malheiros, 2007.

FERRAJOLI, L. Poderes selvagens: a crise da democracia italiana. São Paulo: Saraiva, 2014.

FILOMENO, J. G. B. Teoria geral do Estado e da constituição. 10. ed. rev., atual, e ampl.
Rio de Janeiro: Forense, 2016.

FILOMENO, J. G. B. Manual de teoria geral do Estado e ciência política. 6 ed. Rio de


Janeiro: Forense Universitária, 2006.

MAQUIAVEL. O príncipe. São Paulo: Martin Claret, 2003.1 .1.

MONTESQUIEU. Do espírito das ieis. São Paulo: Abril Cultural, 1973.

SAMPAIO, J. A. L. A constituição reinventada pela jurisdição constitucional. Belo Hori­


zonte: Del Rey, 2002.

Leituras recomendadas

ACQUAVIVA, M. C. Teoria geral do Estado. 3. ed. Barueri: Manóle, 2010.

MORAES, A. de. Direito constitucional. 32. ed. rev. e atual. São Paulo: Atlas, 2016.

BITTAR, E. C. B. Teoria do Estado: filosofia política e teoria da democracia. 5. ed. rev.


atual, e modificada. São Paulo: Atlas, 2016.
\ ____________________________________________________________________________________________ J
Sistemas de governo
/------------------ Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

■ Apresentar os sistemas de governo.


■ Explicar o sistema presidencialista.
■ Explicar o sistema parlamentarista.

Introdução-------------------------------------- s
Neste capítulo, você vai ler a respeito do nascimento de importantes
sistemas governamentais responsáveis pelo funcionamento de cada país.
Primeiro, serão analisados e nomeados cada um dos sistemas, ou seja, o
presidencialismo, o semipresidencialismo e o parlamentarismo. Na sequ­
ência, será aprofundado o estudo dos sistemas de governo presidencial
e parlamentar, relacionando-os e diferenciando-os entre si.
Aproveite a análise dos sistemas de governo e comprove a sua im­
portância para o Estado.

Dos sistemas de governo


S e g u n d o o p r o f e s s o r J o s é G e r a l d o B r i t o F il o m e n o ( 2 0 1 6 , p . 1 9 1 ), o s s i s t e m a s

d e g o v e r n o s e r i a m “ o s t ip o s d e e x e r c í c i o d a s f u n ç õ e s d o p o d e r p o l í t i c o , d e

a c o r d o c o m o r e la c io n a m e n t o q u e m a n t e n h a m e n t r e s i o s ó r g ã o s d a s f u n ç õ e s

l e g i s l a t i v a s , d e u m la d o , e e x e c u t i v a , d e o u t r o ”

N e s s e s e n t id o , v o c ê p o d e e n t e n d e r q u e , in d e p e n d e n t e m e n t e d o s is t e m a d e

g o v e r n o a d o t a d o ( p r e s id e n c i a l is m o , s e m ip r e s id e n c ia lis m o o u p a r la m e n t a r is m o )

e d e t e r s id o c r i a d o o u s e r d e c o r r e n t e d e u m p r o c e s s o e v o l u t i v o p o l í t i c o , c a d a

u m p o s s u i p a r t i c u l a r i d a d e s im p o r t a n t e s p a r a o f u n c i o n a m e n t o d e u m p a ís .

A l é m d i s s o , o s is t e m a d e g o v e r n o n à o d e v e s e r c o n f u n d i d o c o m a s f o r m a s

d e g o v e r n o n e m c o m a s f o r m a s d e E s t a d o ( u n i t á r i o , r e g io n a l o u f e d e r a t iv o ) ;

a s s i m , o s is t e m a d e g o v e r n o s e r e l a c i o n a e n t r e o s P o d e r e s E x e c u t i v o e L e g i s ­

la t iv o , e a fo r m a d e g o v e r n o , e n tre o s g o v e r n a n te s e g o v e r n a d o s .

U3 011 Ciencias Poiiticas.indd 104 -HÉh 20/06/2018


Sistemas de governo 10

T r a t a n d o - s e d a r e la ç ã o p o lí t i c a e n t r e E x e c u t i v o e L e g i s l a t i v o , a t u a lm e n t e é

p e r c e p t ív e l u m g r a n d e e m b a t e e n t r e e s s e s p o d e r e s , a g r a v a d o p r i n c i p a lm e n t e

p o r c r i s e s p o l í t i c a s q u e t ê m a s s o la d o d iv e r s o s p a í s e s , b e m c o m o e s c â n d a lo s d e

c o r r u p ç ã o e n v o lv e n d o lí d e r e s p o l í t i c o s . O B r a s i l e a V e n e z u e l a , p o r e x e m p lo ,

p r in c ip a lm e n t e d e s d e 2 0 1 6 , s o f r e m c o m a d e s e s t a b iliz a ç à o d o p o d e r , d o s is t e m a

p o lít ic o e d a s fo r m a s d e g o v e rn o a d o ta d a s . C o m o r e s u lta d o , o s e s p e c ia lis t a s

p o l í t i c o s e o s p a r la m e n t a r e s p a s s a r a m a d e s t a c a r a n e c e s s id a d e d e u m a u r ­

g e n t e r e f o r m u la ç ã o d a s c o n c e p ç õ e s d e g o v e r n o a d o t a d a s n a a t u a l i d a d e , s e ja

e m r e l a ç ã o à f o r m a d e g o v e r n o o u a o s is t e m a a d o t a d o , p o is , d o c o n t r á r i o , a

s o c ie d a d e s e g u i r i a s o f r e n d o a s m a z e l a s d e u m d e s g o v e r n o p r e s i d e n c i a l i s t a ,

p a r la m e n t a r i s t a o u s e m i p r e s i d e n c i a l i s t a .

Presidencialismo
O p r e s i d e n c i a l i s m o é o s is t e m a d e g o v e r n o a d o t a d o p e lo B r a s i l e p e la m a i o r i a

d o s p a ís e s a m e r ic a n o s . E s s e fa to d e c o r r e p r in c ip a lm e n t e e m r a z à o d o s e u

s u r g im e n t o , v is t o q u e , a o c o n t r á r io d o s is t e m a p a r la m e n t a r is t a , o s is t e m a

p r e s id e n c ia l n ã o e v o lu i u c o m o t e m p o , c o m o o c o r r e u c o m o p a r la m e n t a r i s m o .

O s is t e m a p r e s id e n c ia l n a s c e u n o s E s t a d o s U n id o s d a A m é r ic a ( E U A )

e m c o n s e q u ê n c ia d a r e v o lu ç ã o lib e r a l n o r t e - a m e r ic a n a e d a C o n s t it u iç ã o d e

1 7 8 7 ( F i l a d é l f i a ) , a q u a l p r e v ia a m o n a r q u ia c o n s t i t u c i o n a l e l e t i v a , o u m e lh o r ,

a r e p ú b lic a c o m o fo r m a d e g o v e r n o e a a d o ç ã o d o p r e s id e n c ia lis m o c o m o

s i s t e m a . N e s s e n o v o s i s t e m a , u m i n d i v í d u o s e r i a e le it o p e lo p o v o e t e r i a a

r e s p o n s a b ilid a d e d e e x e r c e r a f u n ç ã o d e c h e f e d e E s t a d o e c h e f e d e g o v e r n o . N o

c a s o d o s E U A , o p r i m e i r o p r e s id e n t e e le it o f o i G e o r g e W a s h in g t o n ( 1 7 8 9 - 1 7 9 7 ) .

N o p r e s i d e n c i a l i s m o , o p r e s id e n t e é e le it o p o r m e io d e s u f r á g i o u n i v e r s a l

( v o t o ) p a r a a d m i n i s t r a r e g o v e r n a r o E s t a d o p o r u m c e r t o p e r ío d o d e t e m p o , q u e

d e p e n d e d a le g is l a ç ã o d e c a d a P a í s . N o B r a s i l , p o r e x e m p lo , é p o r u m p e r ío d o

d c 4 a n o s , a d m i t i d a u m a r e e le iç ã o . R e s s a lt a - s e q u e , j u n t o c o m o p r e s id e n t e ,

t a m b é m é e le it o o v ic e - p r e s id e n t e . O p r e s id e n t e , d iv e r s a m e n t e d o p r i m e i r o -

- m i n i s t r o ( s i s t e m a p a r la m e n t a r ) , e x e r c e a f u n ç ã o d e c h e f e d e E s t a d o e c h e f e

d e g o v e r n o ; p o r i s s o , d e t é m m a i o r p o d e r h i e r á r q u i c o , c o m o , p o r e x e m p lo , o

d e r e j e i t a r le i p r o p o s t a s p e lo C o n g r e s s o .

N o C o n g r e s s o ( P o d e r L e g i s l a t i v o ) , o s m e m b r o s q u e o c o m p õ e m ( b ic a m e r a l

— d u a s c â m a r a s ) s ã o e le it o s p o r m e io d e s u f r á g i o u n i v e r s a l , c o m o , p o r e x e m ­

p lo , o s d e p u t a d o s e s e n a d o r e s ; j á o s m i n i s t r o s s à o in d i c a d o s p e lo p r e s id e n t e .

A s s i m , é p o s s í v e l p e r c e b e r a s e p a r a ç ã o d e p o d e r e s id e a l i z a d a p o r A r i s t ó t e l e s e

a p r o f u n d a d a p o r J o h n L o c k e e M o n t e s q u ie u , s o b r e t u d o n o q u e d i z r e s p e it o a o

U3.C11.Ciencias. Poiiticas.indd 105 20/06/2018


106 I Sistemas de governo
-* y

E x e c u t i v o n a p e s s o a d o p r e s id e n t e e a o L e g i s l a t i v o e m r e l a ç ã o a o C o n g r e s s o .

N e s s e s e n t id o , a o f i n a l , h á d o is c e n t r o s d e p o d e r in s t i t u c i o n a l i z a d o s , n o s q u a is

n ã o h á u m ó rg ã o g o v e rn a m e n ta l q u e , e m c a s o d e c o n flit o e n tre o s P o d e re s

E x e c u t i v o e L e g i s l a t i v o , in t e r p o n h a - s e c o m o m e d ia d o r .

N o s i s t e m a p r e s i d e n c i a l i s t a b r a s i l e i r o , c a s o o p r e s id e n t e , d u r a n t e o s e u

g o v e r n o , c o m e t a a lg u m c r i m e d e r e s p o n s a b i lid a d e p r e v is t o n a L e i n °. 1 .0 7 9 ,

d e 10 d e a b r i l d e 1 9 5 0 , e s t a r á s u je i t o a o p r o c e s s o d e impeachment, c u ja a u to ­

r i z a ç ã o c o m p e t e à C â m a r a d o s D e p u t a d o s ( a r t . 5 1 , 1, d a C o n s t i t u i ç ã o F e d e r a l

d e 1 9 8 8 ) , m a s c u j o s p r o c e s s o e j u l g a m e n t o s ã o d e c o m p e t ê n c ia d o S e n a d o

F e d e r a l ( a r t . 5 2 , 1 , d a C o n s t i t u i ç ã o F e d e r a l d e 1 9 8 8 ).

Link

No caso do Brasil, a ex-presidente Dilma Rousseff foi


destituída do cargo presidencial e substituída pelo vice-
-presidente, atual presidente Michel Temer, em 2016, em
consequência de um processo de impeachment Para saber
mais, veja o link da cronologia do processo instalado contra
a ex-presidente:

https://goo.gl/l6Ra5J

S e g u n d o S a r t o r i ( 1 9 9 3 ) , p a r a q u e u m s is t e m a p r e s i d e n c i a l i s t a s e ja c o n s i ­

d e r a d o p u r o , c o m o é o d o s E U A , d e v e r e u n i r o s s e g u in t e s c r i t é r i o s :

1. a e s c o lh a d o c h e f e d e E s t a d o ( p r e s id e n t e ) r e s u l t a d e e le iç õ e s p o p u la r e s ;

2. d u r a n t e o m a n d a t o p r e e s t a b e le c i d o , o c h e f e d e E s t a d o n ã o p o d e s e r

d e m it id o p e lo v o t o p a r la m e n t a r ;

3. o c h e f e d e E s t a d o c h e f ia o g o v e r n o o u g o v e r n o s p o r e le p r ó p r io n o m e a d o s .

U m a d a s p r i n c i p a i s c r í t i c a s a o s is t e m a p r e s id e n c ia l is t a é q u e , e m r a z ã o d a

a l i a n ç a e n t r e o p r e s id e n t e e o s p a r t id o s a l i a d o s , o c o r r e u m d e s e q u i l í b r i o d e

p o d e r e o f a v o r e c im e n t o , e m d e s p r e z o d a s o b r ig a ç õ e s g o v e r n a m e n t a is e d o p o v o .

U3.C11.Ciencias Poiiticas.indd 106 -Ä h 20/06/2018


Sistemas de governo 10

----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------\
Fique atento

No caso do Brasil, a Constituição Federal de 1988 prevê, nos arts. 84 a 86, as atribuições e
responsabilidades do presidente da República; já os arts. 44 a 75 abordam a organização
do Poder Legislativo brasileiro. Leia e estude os artigos constitucionais.
\______________________________________________________________________ )
E v o c ê , o q u e p e n s a s o b r e o s is t e m a p r e s id e n c i a l is t a ?

Semipresidencialismo

O s e m i p r e s id e n c i a l is m o é u m a m e s c la d o p a r la m e n t a r i s m o e d o p r e s id e n c ia ­

li s m o . T a l s is t e m a s e o r ig in o u n a F r a n ç a ( R e v o l u ç ã o F r a n c e s a ) , c o m a c u l m i ­

n a ç ã o d a C o n s t i t u i ç ã o d c 1791 e a i n s t i t u i ç ã o d a m o n a r q u ia c o n s t i t u c i o n a l.

P o s t e r io r m e n t e , c o m a C o n s t i t u i ç ã o d e 1 7 9 3 , s u r g i u n a F r a n ç a o g o v e r n o d a

a s s e m b le ia — p a r la m e n t o .

N o s e m i p r e s i d e n c i a l i s m o , a in d a q u e o p r e s id e n t e p o s s u a a u t o n o m ia d e

p o d e r , c o m p a r t ilh a - a c o m o p r i m e ir o - m in is t r o . L o g o , d if e r e n t e m e n t e d o s is t e m a

{$ ) p r e s i d e n c i a l i s t a e d o p a r la m e n t a r i s m o , o p r e s id e n t e e x e r c e a f u n ç ã o d c c h e f e

d e F s t a d o , e o p r im e ir o - m in is t r o , a fu n ç à o d e c h e fe d e g o v e rn o . A o p o v o , p o r

m e io d o s u f r á g i o u n i v e r s a l , é c o n c e d id o o p o d e r d e e le g e r o p r e s id e n t e e o s

m e m b r o s q u e c o m p õ e m a s c â m a r a s p a r la m e n t a r e s .

C o n v é m d e s t a c a r q u e , n o s is t e m a s e m i p r e s i d e n c i a l , o p r e s id e n t e t e m o

p o d e r d e p r im e ir o - m in is t r o , m a s c a b e a o P a r la m e n t o , e m c a s o d e n e c e s s i­

d a d e , d e s t i t u i r o p r i m e i r o - m i n i s t r o . E s s a r e g r a , p o r é m , n ã o é a b s o l u t a , p o is o

p r e s id e n t e t e m o p o d e r d i s c r i c i o n á r i o d e d i s s o l v e r a o P a r la m e n t o ; lo g o , c o m

i s s o , d e s t it u i- s e o p r i m e i r o - m i n i s t r o .

\
Fique atento

Considerando o maior equilíbrio entre os Poderes Executivo e Legislativo (estrutura


bicameral), o sistema de governo semipresidencialista tem sido cogitado por especialis­
tas políticos como a melhor alternativa de sistema de governo para gerenciar um país.
\ ____________________________________________________________________________________________ J
V o c ê a c h a q u e o s is t e m a s e m i p r e s id e n c i a l is t a p o d e r ia s e r u m a a l t e r n a t iv a

p a r a o B r a s i l ? O p in e e d is c u t a c o m o s s e u s c o le g a s a r e s p e it o .

U3.C11.Ciencias. Poiiticas.indd 107 20/06/2018


108 y Sistemas de governo

Parlamentarismo
O p a r la m e n t a r is m o é u m s is t e m a d e g o v e r n o r e p r e s e n t a t iv o q u e , d if e r e n t e m e n t e

d o p r e s i d e n c i a l i s m o , o r ig in o u - s e p o r m e io d e lo n g o e c o n t r a d it ó r io p r o c e s s o

e v o lu t iv o p o l í t i c o m o n á r q u ic o , d e c o r r e n t e d e e m b a t e s d e p o d e r e n t r e o s c o n ­

s e lh e ir o s (G r a n d e C o n s e lh o ) e o m o n a r c a re g e n te d o R e in o U n id o , o q u e d e u

o r ig e m a r e v o l u ç õ e s e c o n f l it o s .

O s c o n s e lh e ir o s r e a is , c o m p o s to s p o r re p re s e n ta n te s d o c le r o e d a n o b re z a ,

t in h a m a in c u m b ê n c i a d e a u x i l i a r e o r i e n t a r o r e i n a a d m i n i s t r a ç ã o d o r e i n o ,

fa t o m a r c a d o d u r a n t e o s é c u lo X I I . C o n t u d o , n o r e i n a d o d e H e n r i q u e I I I , o

G r a n d e C o n s e l h o , q u e v i r i a a s e r c h a m a d o p o s t e r io r m e n t e d e P a r l a m e n t o ,

e r a d e s p r e s t ig ia d o p e lo r e i e , e m c o n s e q u ê n c i a d a n e c e s s id a d e d e a p o io f i ­

n a n c e i r o , d e r e s p e it o à M a g n a C a r t a d e 1 2 1 5 e d a p r e s s ã o d o s m e m b r o s d o

G r a n d e C o n s e l h o , H e n r i q u e I I I t e v e q u e c e d e r e c o n f e r i r a o G r a n d e C o n s e lh o

o status d e P a r la m e n t o .

O p a r la m e n t a r i s m o a f l o r o u e m r a z à o d a f a m o s a r e v o l u ç ã o i n g l e s a , A Glo­
riosa , q u e n a d a m a is fo i d o q u e a d e p o s iç ã o d o r e i J a i m e I I p e la s u a f i l h a M a r i a

e p e lo s e u g e n r o h o la n d ê s G u i l h e r m e d e O r a n g e . S o m a d a à D e c l a r a ç ã o d e

D ir e it o s (Bill o f Rights) , a r e v o l u ç ã o f in d o u o a b s o lu t is m o m o n á r q u ic o , p o is ,

a p a r t i r d e e n t ã o , o r e i n ã o g o v e r n a r i a s e m o a p o io d o P a r l a m e n t o , s u r g i n d o ,

d e s s a f o r m a , o g a b in e t e m i n i s t e r i a l p a r la m e n t a r (cabinet), o q u a l s e r ia p r e s id id o

p o r u m p r im e ir o - m in is t r o .

D i v e r s a m e n t e d o p r e s i d e n c i a l i s m o , n o s u r g im e n t o d o s is t e m a p a r la m e n t a r

in g lê s , o r e i e x e r c e u a fu n ç à o d e c h e fe d e E s t a d o e , a o p r im e ir o - m in is t r o ,

c o m p e t ia a f u n ç ã o d c c h e f e d e g o v e r n o .

S e g u n d o d a d o s h i s t ó r i c o s , e m 1 7 2 1 , S i r R o b e r t W a lp o le f o i n o m e a d o c o m o

p r i m e i r o - m i n i s t r o in g l ê s , c o m p e t in d o - l h e l i d e r a r e c o n d u z i r a s d e c is õ e s d o

p a r la m e n t o , in f o r m a n d o - a s a o s o b e r a n o .

P a r a S a r t o r i ( 1 9 9 3 , p . 1 9 2 ):

Desde o ponto dc vista Legislativo é atribuído o direito e dever de legislar


sobre grande quan tid ad e de procedim entos de n atu reza p articu lar, ad m i­
nistrativa e m eram ente regulam entar. K desde o ponto de vista executivo
significa que o governo sente-se obrigado a governar — legislando, ou seja,
to rn ar executivas as decisões políticas (nào necessariam ente todas), segundo
a form a das norm as jurídicas.

U3 011 Ciencias Poiiticas.indd 108 -HÉh 20/06/2018


Sistemas de governo 10

O p a r la m e n t o in g l ê s , p o r e x e m p lo , é b ic a m e r a l (o u s e j a , c o m p o s t o p o r d u a s

c â m a r a s ) : a c o m u m o u a l t a , c u jo s m e m b r o s s ã o e le it o s p o r v o t o , e a d o s lo r d e s

o u b a i x a , c u jo s m e m b r o s s ã o n o m e a d o s p e lo r e i . C o n v é m d e s t a c a r q u e a lg u n s

p a ís e s q u e a d o t a m o s is t e m a p a r la m e n t a r u t i l i z a m o s is t e m a u n i c a m e r a l ( ú n ic a

c â m a ra ), c o m o é o c a s o d a G r é c ia .

N o p a r la m e n t a r i s m o , p a r a q u e o p a r la m e n t o s e ja d i s s o l v i d o , é n e c e s s á r ia

a r e a l i z a ç ã o d e e l e i ç õ e s , f a t o d i s t i n t o d o s is t e m a s e m i p r e s i d e n c i a l . E s s a p o s ­

s i b i l i d a d e , n o s is t e m a p a r la m e n t a r , d e c o r r e d o f a t o d e n à o h a v e r p r a z o f i x o

p a ra q u e o p r im e ir o - m in is t r o o c u p e o c a r g o , u m a v e z q u e a s u a a d o ç à o e o

s e u f u n c i o n a m e n t o d o g o v e r n o d e p e n d e m d a c o n f i a n ç a c o m o P a r la m e n t o .

V o c ê s a b e d i z e r q u a i s e q u a n t o s p a í s e s a d o t a m o r e g im e p a r l a m e n t a r ?

A p r o v e i t e o e s t u d o d o t e m a e in v e s t ig u e .

Parlamentarismo dualista e parlamentarismo monista

P a r a f r a s e a n d o o p r o f e s s o r P a u lo B o n a v i d e s ( 2 0 0 7 ) , o p a r la m e n t a r i s m o d u a ­

lis t a s e r ia o p ro c e s s o e v o lu t iv o e h is t ó r ic o c o m o e n c o n tro d a s p r e r r o g a t iv a s

m o n á r q u ic a s e m d e c l í n i o , c o m a a u t o r id a d e p o l í t i c a d o p o v o e m a s c e n s ã o ,

c o m a ig u a ld a d e e a c o la b o r a ç ã o e n t r e o e x e c u t i v o e o l e g i s l a t i v o , e m e io s d e

a ç ã o r e c íp r o c a n o fu n c io n a m e n t o d o E x e c u t iv o e d o L e g is la t iv o .

J á o p a r l a m e n t a r i s m o m o n i s t a t e r i a c o m o b a s e a s o b e r a n ia p o p u la r , d e

g o v e r n o p a r la m e n t a r , c o m p r e d o m ín io d a a s s e m b le ia c m r e la ç ã o à c o m p e t ê n c ia

d o p r e s id e n t e d a R e p ú b lic a . P a r a B o n a v id e s ( 2 0 0 7 ) , o p r e s id e n t e c u ja a u t o r id a d e

p ro c e d e o e x e c u t iv o s e r ia d im in u íd a p a r a o e x e r c íc io d e u m a m a g is t r a t u r a

m o r a l im p líc it a n a s f u n ç õ e s d e c h e f ia d c E s t a d o .

I m p o r t a n t e d e s t a c a r q u e a m a i o r i a d o s p a í s e s e u r o p e u s a d o t a o s is t e m a

p a r la m e n t a r i s t a .

Saiba mais

Para saber mais sobre o tema e analisar as vantagens e desvantagens de cada sistema
de governo, consulte o livro Ciência política (BONAVIDES, 2007).

U3.C11.Ciencias. Poiiticas.indd 109 20/06/2018


110 ySistemas de governo

Referências

BONAVIDES, P. Ciência política. São Paulo: Malheiros, 2007.

FILOMENO, J. G. B. Teoría gem! do Estado e da constituição. 10. ed. rev., atual. e ampl.
Rio de Janeiro: Forense, 2016.

MEGACURIOSO. 4 coisas em que o parlamentarismo ¿diferente do presidencialismo. 2016.


Disponível em: <https://www.megacurioso.com.br/politica/98325-4-coisas-em-que-
*o*parlamentarismo-e-diferente-do-presidencialismo.htm>. Acesso em: 23 ago. 2017.

SARTORI, G. Nem presidencialismo, nemparlamentarismo. Revista Novos Estudos, v. 35,


mar. 1993.

RIBEIRO, R. Presidencialismo de coalizão: hora de rever algumas convicções? 2014. Dis­


ponível em: <economistax.blogspot.com.br/2014/08/presidencialismo-de-coalizao-
-hora-de.html>. Acesso em: 23 ago. 2017.

Leituras recomendadas

BASTOS, C. R. Curso de teoria do Estado e ciência política. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2004.

BOBBIO, N. A teoria das formas de governo. 9. ed. Brasília: Editora Universidade de


Brasília,1997.

FERRAJOLI, L. Poderes selvagens: a crise da democracia italiana. São Paulo: Saraiva, 2014.

SARTORI, G. Elementos de teoría política. Madrid: Alianza Editorial, 2002.

STRECK, L. L.; MORAIS, J. L. B. de. Ciência política e teoria geral do Estado. 7. ed. Porto
Alegre: Livraria do Advogado, 2010.
\ ____________________________________________________________________________________________ J

U3 C11 Ciencias Poiiticas.indd 110 +Ä* 20/06/2


“ “ 'T / '
O Estado constitucional
/------------------ Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

■ Definir a criação dos Estados modernos (constitucionais).


■ Apontar a influência das declarações de direitos nas constituições.
■ Diferenciar federação, confederação e Estado unitário.

Introdução--------------------------------------^
Neste capítulo, você aprofundará os seus conhecimentos sobre a história
geral. Serão abordadas as ideias filosóficas e revoluções que marcaram a
transição do feudalismo para o absolutismo, liberalismo e Estado social
de direito.
Assim, abordaremos a criação dos Estados modernos para então
entender a influência da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão
de 1789 nas constituições, principalmente a brasileira, e diferenciar as
formas de Estado (federação, confederação e Estado unitário). Aproveite
o capítulo e vamos à história!

Dos Estados modernos


S e g u n d o o p ro fe s s o r R e in a ld o D ia s (2 0 1 3 , p . 2 2 6 ) , o E s t a d o c o n s t it u c io n a l:

É aquele que oferece garantias do império da lei e de vários direitos e liberdades


civis e políticas e é governado por autoridades, que devem necessariam ente
incluir assem bleias representativas, eleitas por sufrágio universal e por m aio­
rias num éricas entre todos os cidadãos, em eleições realizadas a intervalos
regulares entre candidatos e/ou organizações que com petem entre si.

P a r a e n te n d e r c o m o s u r g ir a m o s E s t a d o s m o d e rn o s , é fu n d a m e n t a l v o lt a r

à Id a d e M é d i a , p o is e s s e p e r ío d o p e r m it e i d e n t i f i c a r o s p r i n c i p a i s e le m e n t o s

r e s p o n s á v e is p e lo s u r g im e n t o d a b u r g u e s ia , a p e r d a d e p o d e r d o c l e r o ( I g r e j a ) ,
112 0 Estado constitucional

a c r i s e d o f e u d a l i s m o , o s u r g im e n t o d o a b s o l u t is m o , a e x p a n s ã o c o m e r c i a l e

a s o b e r a n ia t e r r i t o r i a l .

A I g r e j a , p o r lo n g o s a n o s , e x e r c e u u m p a p e l m u it o im p o r t a n t e n a t o m a d a

d e d e c i s õ e s d o r e i n o ( m o n a r q u i a ) , p r i n c i p a l m e n t e d e v i d o à id e ia d e q u e o

re i s e r ia u m e n v ia d o d iv in o , o u s e ja , o p o d e r n ã o s o m e n te e r a p a s s a d o d e

g e r a ç ã o e m g e r a ç ã o , m a s ta m b é m s e r ia u m p o d e r d iv in o . P o r c o n s e q u ê n c ia ,

e r a c o m u m , n a Id a d e M é d i a , a a u t o r i z a ç ã o p a p a l e a i n t e r v e n ç ã o d o c l e r o e m

d i v e r s o s a s s u n t o s r e l a c io n a d o s à c o n d u ç ã o d a m o n a r q u ia , p o r is s o a lg u n s r e i s

f i c a r a m c o n h e c id o s n a h i s t ó r i a c o m o c a t ó l i c o s .

P a r a m a n t e r o l u x o d a m o n a r q u i a e d o c l e r o , a l t o s im p o s t o s e r a m c o b r a ­

d o s d o s p o b r e s , q u e , d e u m a m a n e ir a g e r a l, v i v i a m e m p é s s im a s c o n d iç õ e s

d e s o b r e v iv ê n c ia e s u b o r d in a ç ã o . C o m a c r is e d o f e u d a lis m o e a f a lt a d e

u m p o d e r c e n t r a liz a d o ( p e r ío d o d a b a ix a Id a d e M é d ia ) , a g r a v a d a s p e la s

r e v o lt a s d o s c a m p o n e s e s c o m o s s e u s s e n h o r e s f e u d a is , o s r e is p a s s a ra m

a se f o r t a le c e r .

A i n d a d u r a n t e e s s e p e r ío d o , h o u v e u m s i g n i f i c a t i v o p r o g r e s s o e c o n ô m ic o

c o m o c o n s e q u ê n c i a d o s u r g i m e n t o d e in o v a ç õ e s t e c n o l ó g ic a s p a r a a é p o c a ,

c o m o o s m o in h o s .

A b u r g u e s ia , a t é e n t ã o d e s p r e s t ig ia d a p e lo s n o b r e s , c r e s c i a e s e f o r t a l e c i a .

A s s i m , a o t e n t a r e x p a n d i r o s s e u s n e g ó c io s p a r a a lé m d a s f r o n t e i r a s , b u s c o u

e s t r e i t a r la ç o s c o m a m o n a r q u ia . O o b je t iv o e r a e v i t a r q u e o s a lt o s im p o s t o s e

a s d if e r e n t e s m o e d a s n à o c o n t in u a s s e m s e n d o o b s t á c u lo s c o m e r c i a i s — d e s s a

f o r m a , p a s s a r a m a a p o ia r a c e n t r a l i z a ç ã o d o p o d e r d a m o n a r q u ia .

A c r i s e n o s is t e m a f e u d a l, a s g u e r r a s , a e x p a n s ã o t e r r i t o r i a l e o e m p o b r e c i­

m e n t o d a m o n a r q u ia e d o c l e r o s e g u ia m a v a n ç a n d o . C o n s e q u e n t e m e n t e , s u r g ia

o E s t a d o m o d e r n o , ta m b é m c h a m a d o d e E s t a d o n a c io n a l. N a s c ia o E s t a d o

a b s o l u t is t a , c o m p o d e r a b s o lu t o d a m o n a r q u ia . N o a b s o l u t is m o , o s s e n h o r e s

f e u d a is j á n ã o g o z a v a m d o p o d e r d e l e g i s l a r , t e r e x é r c it o s e a d m i n i s t r a r t u d o

r e la c io n a d o a o s e u f e u d o , p o is , a p a r t i r d a q u e le m o m e n t o , o r e i e r a o s e n h o r .

C o m o s u r g i m e n t o d o E s t a d o m o d e r n o e o f o r t a le c i m e n t o d o s r e i s , o c l e r o

d e ix o u d e o c u p a r o e s p a ç o d e a u t o r id a d e , o q u e fo i d e g ra n d e t r a n s fo r m a ç ã o

p a ra a é p o c a .

A p a r t i r d is s o , o s f e u d o s f o r a m r e u n i d o s e h o u v e u m a l i m i t a ç ã o t e r r i t o r i a l

e u n if ic a ç ã o d a s m o e d a s , o q u e f a c ilit o u a v e n d a d o s p ro d u to s c o m e r c ia liz a ­

d o s p e lo s b u r g u e s e s . A l é m d i s s o , a s t r o p a s m i l i t a r e s p a s s a r a m a z e l a r p e la

s e g u r a n ç a d o r e i, d o s n o b r e s , d o s b u r g u e s e s q u e s a ía m p a r a v e n d e r p e la s

f r o n t e ir a s , d o c le r o e d o p o v o . S u r g ia a b u r o c r a c ia — c o m o c o n s e q u ê n c ia ,

h o u v e a n e c e s s id a d e d e n o m e a r p e s s o a s p a r a c r i a ç ã o d e l e i s , c o b r a n ç a d o s

im p o s t o s e o u t r a s a t i v i d a d e s . E s s a s p e s s o a s e r a m c h a m a d a s d e f u n c i o n á r i o s
0 Estado constitucional

e , e m r e g r a , e r a m n o b r e s ; p o r é m , c a b e le m b r a r q u e a c o m p r a d e t ít u lo d a

n o b re z a p o r p a rte d o s b u rg u e s e s e ra c o m u m n a é p o c a , a f im d c o c u p a re m

c a rg o s d e fu n c io n á r io s .

N o E s t a d o a b s o lu t is t a , im p e r a v a a v o n t a d e d o g o v e r n a n t e , o u m e lh o r , d o r e i ,

e m d e s p re z o a o p o v o , q u e n ã o t in h a o d ir e it o d e e x p r e s s a r a s s u a s v o n ta d e s .

P o r t a n t o , a q u il o q u e o g o v e r n a n t e d e t e r m i n a v a d e v e r i a s e r c u m p r id o .

S e r á q u e v o c ê c o n s e g u e p e r c e b e r a lg u m a s e m e lh a n ç a e n t r e a r e l a ç ã o d e

in t e r e s s e s e n t r e b u r g u e s ia e r e i s e e n t r e r e i s e b u r g u e s ia c o m o s d ia s a t u a i s ?

C o m o p a s s a r d o s a n o s , n o s é c u lo X V I I I , s u r g i a o l i b e r a l i s m o , c o r r e n t e

d e f e n d id a p o r p e n s a d o r e s c o m o L o c k e , q u e p r e g a v a a lib e r d a d e i n d i v i d u a l d a

p r o p r ie d a d e p r i v a d a d o i n d i v í d u o , a li b e r d a d e e m m a n i f e s t a r p e n s a m e n t o s e

o p in i õ e s s o b r e o E s t a d o , b e m c o m o a v i d a s o c i a l e p r i v a d a .

O l i b e r a l i s m o f e z n a s c e r o K s t a d o l i b e r a l , q u e , d iv e r s a m e n t e d o a b s o lu ­

t is m o , v is a v a a f i r m a r a s e p a ra ç ã o d o s p o d e r e s , a s e p a ra ç ã o d o E s t a d o e d a

I g r e j a , o r e c o n h e c im e n t o d o s d i r e i t o s , a s g a r a n t ia s i n d i v i d u a i s , e n t r e o u t r o s .

Fique atento

A Revolução Americana de 1776 e a Revolução Francesa de 1789 (esta marcada pela


máxima igualdade, fraternidade e liberdade) representaram marcos históricos da
expressão do pensamento liberalista e da luta pelo fim da opressão que vivia o povo.

O E s t a d o lib e r a l p o s s ib ilit o u a c r ia ç ã o d e c o n s t it u iç õ e s , a lib e r d a d e

in d iv id u a l d a p r o p r ie d a d e , a in t e r n a c io n a liz a ç ã o e c o n ô m ic a d a b u r g u e s ia ,

a s e p a r a ç ã o d e p o d e r e s , a e s c o lh a d a fo r m a e d o s is t e m a d e g o v e r n o s ,

a lim it a ç ã o d o s p o d e re s d o s E s t a d o s , a g a r a n t ia a o s u f r á g io , a in d a q u e

lim it a d o a d e t e r m in a d a s p e s s o a s e c la s s e s s o c ia is , e , c o n s e q u e n te m e n te ,

o E s t a d o d e D ir e it o .

O c o n f l i t o e n t r e a s id e i a s l i b e r a l i s t a s e s o c i a l i s t a s d a é p o c a , o e m p o ­

b r e c im e n t o d a s c la s s e s s o c ia is e a in s t a la ç ã o d a P r im e ir a G u e r r a M u n d ia l

c o n t r ib u ír a m p a r a o s u r g im e n t o d o K s t a d o s o c ia l. A s c la s s e s t r a b a lh a d o r a s ,

i n c o n f o r m a d a s c o m o d e s n i v e l a m e n t o s o c i a l c a u s a d o p e lo E s t a d o l i b e r a l ,

r e c o r r i a m à s lu t a s s o c i a i s c o m o e s t r a t é g ia p a r a q u e lh e s f o s s e m a s s e g u r a d o s

o s d ir e it o s b á s ic o s , s u r g in d o , a s s im , a c la s s if ic a ç ã o d o s d ir e it o s d a p r im e ir a ,

s e g u n d a e t e r c e i r a g e r a ç õ e s , b e m c o m o a in s e r ç ã o d e p r e c e it o s i g u a l i t á r i o s e

s o c i a i s n a s c o n s t i t u i ç õ e s f e d e r a is d a é p o c a .
O Estado constitucional
-

A s g a r a n t ia s s o c i a i s ( c o m o , p o r e x e m p lo , e d u c a ç ã o , s a ú d e , p r e v i d e n c i a e

o u t r o s d e u m E s t a d o s o c i a l ) f o r a m p r im e ir a m e n t e m a t e r i a l i z a d a s n a C o n s t i t u i ­

ç ã o m e x i c a n a d e 1 9 1 7 e p o s t e r io r m e n t e n a C o n s t i t u i ç ã o a le m ã d e W e i m a r d e

1 9 19 . N o t r a n s c o r r e r d o s a n o s e d a s lu t a s s o c i a i s , e m 1 9 4 8 s u r g i u a D e c l a r a ç ã o

U n iv e r s a l d o s D ir e it o s d o H o m e m , p a s s a n d o a se a d a p ta r e se r e c o n s t r u ir ,

i n f l u e n c i a n d o a s c o n s t i t u iç õ e s d e d i v e r s o s p a í s e s , c o m o o B r a s i l . O E s t a d o

s o c i a l lo g o d a r i a lu g a r a o E s t a d o D e m o c r á t i c o d e D i r e i t o , q u e a p e r f e i ç o a r i a

a c o n c e p ç ã o d o E s t a d o s o c i a l , o f o r t a le c i m e n t o d a c o n s t i t u iç ã o , a p a r t ic i p a ç ã o

p o p u la r e o c u m p r im e n t o d a s le is .

Influência da Declaração de Direitos do Homem


e do Cidadão de 1789
I n s p ir a d a n a s id e ia s i l u m i n i s t a s ( l ib e r d a d e , ig u a ld a d e e f r a t e r n id a d e ) e n a t u r a ­

l i s t a s ( i g u a ld a d e e lib e r d a d e d o i n d i v í d u o a o n a s c e r ) d a é p o c a , n a D e c l a r a ç ã o

d e I n d e p e n d ê n c ia N o r t e - a m e r i c a n a d e 1 7 7 6 e n a B ill o f Rights (D e c la r a ç ã o

d e D i r e i t o s ) in g l e s a d e 1 6 8 9 , f o i p r o m u lg a d a e m 2 6 d e a g o s t o d e 1 7 8 9 , p e la

A s s e m b l e i a N a c io n a l F r a n c e s a , lo g o a p ó s a R e v o l u ç ã o F r a n c e s a , a D e c l a r a ç ã o

d o s D i r e i t o s d o H o m e m e d o C i d a d ã o , r a t i f i c a d a p e lo r e i f r a n c ê s L u í s X V I e m

o u tu b ro d o m e sm o a n o .

\
Fique atento

A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789 é considerada um dos


pilares dos direitos humanos, visto que representou um divisor de águas para o Direito
mundial.
V ____________________________________________________________________________________________ J

O s s e u s p r e â m b u lo s , s o m a d o s a o s 17 a r t i g o s , e s t a b e le c e r a m a g a r a n t ia a o s

d ir e i t o s n a t u r a i s , i n a l i e n á v e i s e s a g r a d o s d o h o m e m , a lé m d a s o b e r a n ia n a c i o ­

n a l , a lib e r d a d e , a p r o p r ie d a d e , a s e g u r a n ç a , a ig u a ld a d e , a p r o p o r c io n a lid a d e

e a s e p a ra ç ã o e n tre o s p o d e re s . T a l D e c la r a ç ã o in flu e n c io u s ig n ific a t iv a m e n t e

a c o n s t r u ç ã o e r e c o n s t r u ç ã o d a s c o n s t it u iç õ e s d a é p o c a e d o s a n o s s e g u in ­

t e s , c o m o , p o r e x e m p lo , a p o r t u g u e s a , a c h i l e n a , a a n g o la n a , a b e lg a e a t u a l

C o n s t it u iç ã o F e d e ra l b r a s ile ir a .
0 Estado constitucional

P a ra q u e v o c ê v e ja o q u a n to a D e c la r a ç ã o d o s D ir e it o s d o H o m e m e d o

C id a d ã o d e 1789 ( A D E C L A R A Ç Ã O . . . , 2 0 1 7 ) in f lu e n c io u a C o n s t it u iç ã o

F e d e r a l b r a s ile ir a ( B R A S I L , 1 9 8 8 ), a lg u n s a r t ig o s d e a m b a s s e r ã o a p r e s e n ­

ta d o s a s e g u ir .

CF, art. Io — Parágrafo único. Todo o poder em ana do povo, que o exerce por
meio de representantes eleitos ou diretam ente, nos term os desta Constituição.
DDIIC, art. 6o — A lei é a expressão da vontade geral. Todos os cidadãos têm o
direito de concorrer, pessoalmente ou através de mandatários, para a sua formação.
CF, art. 5o, M V — N inguém será privado da liberdade ou de seus bens sem
o devido processo legal.
DDI IC, art. 7o — Ninguém pode ser acusado, preso ou detido senão nos casos
determ inados pela lei e de acordo com as form as por esta prescritas.
CF, art. 5o, LVII — N inguém será considerado cu lp ad o até o trânsito em
julgado de sentença penal condenatoria.
DDHC, art. 9o — Todo acusado é considerado inocente até ser declarado
culpado e, caso seja considerado indispensável prendê-lo, todo o rigor des­
necessário à guarda da sua pessoa deverá ser severam ente reprim ido pela lei.
CF, art. 5o, X X V — No caso de im inente perigo público, a autoridade com ­
petente poderá usar de propriedade particular, asseg u rad a ao proprietário
indenização ulterior, se houver dano.
DDHC, art. 17 — C om o a propriedade é um d ireito inviolável e sagrado,
ninguém dela pode ser privado, a não ser quando a necessidade pública le­
galm ente com provada o exigir e sob condição de ju sta e prévia indenização.

\
Saiba mais

Para saber mais sobre a Declaração dos Direitos do Ho­


mem e do Cidadão, acesse o link abaixo ou o código ao
lado e confira o infográfico:

https://goo.gl/3QpsZg
V_____________________________________________________________

Formas de Estado
A t u a lm e n t e , e m c o n s e q u ê n c ia d a c r is e q u e a s s o la o m u n d o , o s g o v e r n o s c o g it a m

a p o s s i b ili d a d e d e r e f o r m u la r a s s u a s f o r m a s , o s s e u s s is t e m a s d e g o v e r n o e

t a m b é m a s f o r m a s d e E s t a d o . D e a c o r d o c o m o p r e â m b u lo d a C o n s t it u i ç ã o
116 0 Estado constitucional

F e d e r a l b r a s ile ir a d e 1 9 8 8 , o B r a s il a d o to u a fe d e r a ç ã o c o m o fo r m a d e E s t a d o ,

a lé m d c s e r c o n s id e r a d o u m E s t a d o D e m o c r á t ic o . V e ja o r e c o r t e d o p r e â m b u lo

d a C o n s t it u iç ã o F e d e r a l d e 1 9 8 8 :

N ós, representantes do povo brasileiro, reunidos em A ssem bleia Nacional


C onstituinte para in stitu ir um Kstado D em ocrático, destinado a asseg u rar
o exercício dos d ireito s sociais e in d iv id u ais, a liberdade, a seg u ran ça, o
bem -estar, o desenvolvim ento, a igualdade e a justiça com o valores supre­
mos de um a sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na
harm onia social e com prom etida, na ordem interna e internacional, com a
solução pacifica das controvérsias, prom ulgam os, sob a proteção de Deus, a
seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL
(B R A SIL , 1988).

C o m o o p r e â m b u lo d a C o n s t i t u i ç ã o F e d e r a l r e a f i r m a , n o s s e u s d i v e r s o s

a r t i g o s , a f e d e r a ç ã o c o m o f o r m a d e E s t a d o , é im p o r t a n t e r e s s a l t a r q u e e x i s t e m

o u t r a s f o r m a s d e E s t a d o , c o m o , p o r e x e m p lo , E s t a d o u n i t á r io e a c o n f e d e r a ç ã o .

V e j a a d if e r e n ç a e n t r e e le s .

F e d e r a ç ã o — é u m a f o r m a d e E s t a d o q u e , s e g u n d o o p r o f e s s o r P a u lo R o b e r t o

F. D a n ta s, é u m :

M odelo de E stado form ado pela un ião p erm an en te de dois ou m ais entes
estatais que, abrindo M ao da soberania em favor de um ente central, que cor­
porifica e responde pela Federação, conservam , porém parcela considerável de
autonomia, que lhes perm ite graus variáveis de auto-organização, autogoverno,
autoadm inistração e de arrecadação de receitas próprias, levando em conta
as peculiaridades de cada país, expressas em suas respectivas constituições
federais (DANTAS, 2015, p. 546).

C o m r e la ç ã o à fe d e r a ç ã o , c a b e d e s t a c a r q u e a C o n s t it u iç ã o F e d e r a l é o

p r i n c i p a l in s t r u m e n t o le g a l d o E s t a d o , q u e a p r e s e n t a , e n t r e a s s u a s r e s p o n ­

s a b i l i d a d e s , f i x a r a s c o m p e t ê n c ia s e a a u t o n o m ia d o s E s t a d o s f e d e r a t i v o s ,

q u e , p o r in t e r m é d i o d o s s e u s d e p u t a d o s , i n t e r v ê m n a s d e c is õ e s d a R e p ú b l i c a .

O B r a s i l , p o r e x e m p lo , a d o t a a f e d e r a ç ã o c o m o f o r m a d e E s t a d o — a s s i m ,

a s 2 7 u n id a d e s f e d e r a t iv a s d o P a í s e s t ã o s u b m e t id a s à C o n s t i t u i ç ã o F e d e r a l

( B R A S I L , 1 9 8 8 ), q u e p r e v ê , n o a r t . I o, q u e “ A R e p ú b l i c a F e d e r a t iv a d o B r a s i l ,

f o r m a d a p e la u n iã o in d is s o lú v e l d o s E s t a d o s e M u n ic íp io s e d o D i s t r i t o F e d e r a l,

c o n s t i t u i- s e e m E s t a d o D e m o c r á t i c o d e D i r e i t o ” .

A i n d a c o m r e la ç ã o à f e d e r a ç ã o , é v e d a d o a o E s t a d o - m e m b r o o d ir e i t o d e

s e c e s s ã o , o u s e ja , d e r e t ir a r - s e d a f e d e r a ç ã o . N e s s e s e n t id o , n e n h u m E s t a d o -

- m e m b r o b r a s il e i r o p o d e s e p a r a r - s e d o B r a s i l , d e v id o à f o r m a d e E s t a d o a d o ta d a .
0 Estado constitucional

E s t a d o s i m p l e s o u u n i t á r i o — n e s s a f o r m a d e E s t a d o , o p o d e r é c e n t r a l iz a d o

e m u m a ú n i c a u n id a d e d e p o d e r p o lí t i c o in t e r n o o u ú n i c a o r d e m j u r í d i c a , c o m o

e s t a b e le c im e n t o d e u m a c o n s t i t u iç ã o p a r a t o d a a n a ç à o , c o m o , p o r e x e m p lo ,

R e i n o U n id o , E s p a n h a , F r a n ç a , P o r t u g a l, A f r i c a d o S u l , C h i l e e d iv e r s o s o u t r o s

p a ís e s ( N O V E L I N O , 2 0 1 4 ) . A E s p a n h a , p o r e x e m p lo , é u m p a ís d i v i d i d o e m 17

c o m u n id a d e s a u t ô n o m a s , s e n d o q u e d u a s d e la s h á a n o s lu t a m p o r in d e p e n d ê n c ia

d o p o d e r c e n t r a l d o p a ís : o P a ís B a s c o e a C a t a l u n h a . A C a t a l u n h a , p o r e x e m p lo ,

e m 2 0 1 7 , r e a li z o u u m r e f e r e n d o p a r a s e t o r n a r in d e p e n d e n t e d a E s p a n h a .

C o n fe d e ra ç ã o — t r a t a - s e d e u m a a s s o c ia ç ã o d e e s t a d o s s o b e r a n o s q u e , e m

r a z ã o d a s e m e lh a n ç a d e s e u s o b je t iv o s e p la n o s p o lí t i c o s e m e d ia n t e u m t r a t a d o

i n t e r n a c i o n a l , u n e m - s e . D if e r e n t e m e n t e d a f e d e r a ç ã o , n a c o n f e d e r a ç ã o , é p e r ­

m i t i d a a o e s t a d o c o n f e d e r a d o a s e c e s s ã o , o u s e j a , r e t ir a r - s e d a c o n f e d e r a ç ã o .

N a c o n f e d e r a ç ã o , a s o b e r a n ia , a n a c io n a lid a d e e a a u t o n o m ia t e r r i t o r i a l d e c a d a

E s t a d o s à o m a n t id a s , a s s i m c o m o o J u d i c i á r i o e E x e c u t i v o , s e n d o o C o n g r e s s o

C o n f e d e r a i e s t a b e le c id o c o m o ó r g ã o ú n i c o e n t r e o s E s t a d o s c o n f e d e r a d o s .

S e g u n d o A l e x a n d r e d e M o r a e s ( 2 0 1 7 ) , a c o n f e d e r a ç ã o c o n s is t e n a u n iã o

d e E s t a d o s s o b e r a n o s p o r m e io d e u m t r a t a d o in t e r n a c i o n a l d i s s o l ú v e l .

\
Referências

A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão. 2017. Disponível em: <https7/


br.ambafrance.org/A-Declaracao-dos-Direitos-do-Horriem-e-do-Cidadao>. Acesso
em: 27 ago. 2017.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília,


DF: Senado Federal, 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/cdvil_03/
constituicao/constituicaocompilado.htmx Acesso em: 27 ago. 2017.

DANTAS, P. R. de F. Curso de Direito constitucional. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2015.

DIAS, R. Ciência política. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2013.

MORAES, A. de. Direito constitucional. 33. ed. rev. e atual. São Paulo: Atlas, 2017.

NOVELINO, M. Manual de Direito constitucional. 9. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro:


Forense; São Paulo: Método, 2014.

Leituras recomendadas

BASTOS, C. R. Curso de teoria do Estado e ciência política. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2004.

BONAVIDES, P. Ciência política. São Paulo: Malheiros, 2007.


\ ____________________________________________________________________________________________ J
A

-------------------------------------- U N I D A D E

O Estado de Direito
/------------------ Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

■ Identificar os elementos caracterizadores do Estado de Direito.


■ Analisar as fases do Estado de Direito.
■ Demonstrar a importância da democracia no Estado de Direito.

Introdução--------------------------------------v
Neste capítulo, você identificará os elementos caracterizadores do Estado
de Direito, analisando as suas fases e traçando um paralelo com os direitos
fundamentais, em específico as gerações de direitos fundamentais, além
de avaliar a visão contemporânea da democracia no Estado de Direito.

Dos elementos do Estado de Direito


N o s e u c a m in h o h is t ó r ic o , a s ig n i f i c a ç ã o d e E s t a d o d e D i r e it o é t e m a d e g r a n d e

q u e s t io n a m e n t o d o u t r in á r io , p r in c ip a lm e n t e e m r e la ç ã o a o s e u n a s c im e n t o . D e

m a n e ir a g e r a l, s a b e - s e q u e s u r g iu n o E s t a d o lib e r a l, e m m e a d o s d o s s é c u lo s X V I I I

e X I X , t r a z e n d o o f im d o a b s o lu t is m o e a e x p a n s ã o d o lib e r a lis m o ( E s t a d o lib e r a l) .

A d e f i n i ç ã o d e E s t a d o d e D i r e i t o q u e f o i g l o b a l i z a d a t e v e c o m o o r ig e m

p r i n c i p a l o D i r e i t o a le m ã o , c o m a e x p l i c a ç ã o d e Rechtsstaat p a ra E s ta d o d e

D i r e i t o , d e f e n d id a e m 1 8 3 2 p e lo p r o f e s s o r R o b e r t V o n M o h l , n o l i v r o Die
Polizei-Wissenschaft nach den Grundsätzen des Rechtsstaates, p e la g a r a n t ia

d c lib e r d a d e d o i n d i v í d u o e m r e la ç ã o a o E s t a d o a b s o l u t is t a . D a m e s m a f o r m a ,

o c o r r e u a d e f e s a d o s u r g i m e n t o p r e t é r it o d o E s t a d o d e D i r e i t o , e m e s p e c í f i c o

n a C o n s t it u iç ã o d e W e im a r d e 1919, n o Rule o f Law d o D i r e i t o in g l e s ( d i f u s ã o


d o p r i n c í p i o d a ig u a ld a d e j u r í d i c a ) , n o Rule o f Law' n o r t e - a m e r i c a n o e n o Etat
de Droit ( E s t a d o d e D ir e it o ) f r a n c ê s .
O Estado de Direito

Saiba mais

Para saber mais sobre o tema, veja o livro O Estado de direito (CHEVALLIER, 2015).

D c m a n c i r a a m p ia , o E s t a d o d c D i r e i t o c o n s i s t i a n o p o d e r p o lí t i c o s u b m e ­

t id o a u m s is t e m a j u r í d i c o , c u ja f i n a l i d a d e b á s i c a e r a a s s e g u r a r o s in t e r e s s e s

i n d i v i d u a i s , p r o t e g e n d o - o s d a s p o s s í v e i s a r b it r a r ie d a d e s d o E s t a d o , s o b r e t u d o

e m a t e n ç ã o à s id e ia s l i b e r a l i s t a s j á c o n s a g r a d a s à é p o c a .

P a r a J a c q u e s C h e v a l l i e r ( 2 0 1 5 , p . 1 5 ):

O surgim ento do Bstado Totalitário e A utoritário durante o Século XX m os­


tra por outro lado que o Kstado de Direito é um a fachada que recobre uma
concepção puram ente instrum ental de Direito. O Estado de D ireito é um a
realidade intangível por essência evolutiva e pode ficar reduzido a sua negação
pelo processo de desnaturalização da form a estatal.

A v i s ã o c r í t i c a d e C h e v a l l i e r ( 2 0 1 5 ) e s t á v i n c u l a d a à s g r a n d e s c o n t r o v é r s ia s

d o g m á t ic a s d a d o u t r i n a s o b r e o E s t a d o d e D i r e i t o , q u e c o s t u m a m v i n c u l á - l o

e , m u it a s v e z e s , c o n fu n d i- lo c o m o E s t a d o lib e r a l, o E s t a d o D e m o c r á t ic o e

o E s t a d o C o n s t i t u c i o n a l . O B r a s i l , p o r e x e m p lo , a d o t o u a e x p r e s s ã o E s t a d o

D e m o c r á t i c o d e D i r e i t o , d e f i n i d a n a d é c a d a 1 9 6 0 p e lo e s p a n h o l E l i a s D i a z ,

d e f e n s o r d o E s t a d o D e m o c r á t ic o d e D i r e i t o c o m o u m E s t a d o d e e s t r u t u r a e c o ­

n ô m ic a s o c i a l i s t a , c o n d iç ã o n e c e s s á r ia p a r a a c o n s t i t u i ç ã o d e u m a v e r d a d e ir a

d e m o c r a c ia n a a t u a l id a d e .

U m a v e z q u e a v i s ã o d e E s t a d o d e D i r e i t o e r a g a r a n t ir a lib e r d a d e d o d ir e it o

d o i n d i v íd u o , r e c o n h e c e n d o - lh e o d ir e i t o d e c id a d ã o e e x e r c í c i o d e m o c r á t ic o ,

a lg u n s e le m e n t o s f ic a r a m m a r c a d o s n a h is t ó r ia c o m o b a s e s d o E s t a d o d c D ir e it o .

A f i n a l , q u a is s e r ia m e s s e s e le m e n t o s ? E l e s s e r ã o v is t o s , a s e g u ir , e m

d e sta q u e :

C o n t r o l e c o n s t i t u c i o n a l — a C o n s t it u iç ã o , s e m s o m b r a s d e d ú v id a s , r e p re s e n t o u

o p r i n c i p a l e le m e n t o d o E s t a d o d e D i r e i t o , p o is , p a r a d o u t r in a d o r e s e j u r i s t a s d a

é p o c a , a C o n s t it u i ç ã o s e r ia u m c o n ju n t o d c n o r m a s r e s p o n s á v e is p o r g a r a n t ir

o s d ir e it o s e d e v e r e s d o in d iv íd u o e a d iv is ã o d o s p o d e r e s e m L e g is la t iv o ,

E x e c u t i v o e J u d i c i á r i o , a s s e g u r a n d o a p r e s e r v a ç ã o d o in t e r e s s e p ú b l ic o e m

s u a s c o m p e t ê n c ia s e li m i t a ç õ e s j u r í d i c a s e p o lí t i c a s . O J u d i c i á r i o , p o r f i m , n ã o

s e r ia m a is u m a p e ç a s o lt a e s e m im p o r t â n c i a , m a s , c o m o p a s s a r d o s a n o s a té
120 O Estado de Direito

a a t u a lid a d e , d e s e m p e n h a r ia p a p e l- c h a v e n a r e s o lu ç ã o d e c r i m e s d e in t e r e s s e

p ú b lic o . N o c a s o d a A l e m a n h a , p o r e x e m p lo , a C o n s t it u i ç ã o é e s c r i t a e f l e x í v e l ,

a o c o n t r á r io d a C o n s t it u i ç ã o in g le s a , q u e n ã o é e s c r i t a e c o n t é m u m c o n ju n t o d e

n o r m a s t r a d ic io n a i s j u r í d i c a s — D i r e it o c o s t u m e ir o . J á a C o n s t it u i ç ã o b r a s il e i r a

d e 1 9 9 8 é e s c r i t a c o m o a a le m ã , m a s , c o m r e la ç ã o à r i g i d e z , t r a t a - s e d e u m a

C o n s t it u i ç ã o r íg id a . V o c ê r e c o r d a c o m o s e c l a s s i f i c a m a s C o n s t it u i ç õ e s ?

D iv is ã o d e p o d e re s — q u a n to à d iv is ã o d e p o d e re s , re c o rd e a c lá s s ic a d iv i­

s ã o c r i a d a p o r M o n t e s q u ie u ( 1 9 8 5 ) , p u l v e r i z a d a n o l i b e r a l i s m o e m P o d e r e s

L e g is la t iv o , E x e c u t iv o e J u d ic iá r io . N o E s t a d o d e D ir e it o , a s e p a ra ç ã o c r ia d a

p o r M o n t e s q u ie u d e v e r i a s e r f i x a d a n a s c o n s t i t u iç õ e s , p a r a q u e a s s i m f ic a s s e m

c la r a s a d if e r e n c ia ç ã o e a lim it a ç ã o d e c a d a ó rg ã o e fo s s e p o s s ív e l a s s e g u r a r

e q u i l í b r i o e p r o t e ç ã o d o s d i r e i t o s s u b je t i v o s .

N o B r a s i l , a C o n s t it u iç ã o F e d e r a l b r a s il e i r a d e 1 9 8 8 p r e v ê , n o a r t . 2 o, q u e “ S ã o

P o d e re s d a U n ià o , in d e p e n d e n t e s e h a r m ô n ic o s e n t re s i , o L e g is la t iv o , o E x e c u t iv o

e o J u d i c i á r io ” , t r a t a n d o - o s e s p e c if ic a m e n t e n o T í t u l o I V — D a O r g a n iz a ç ã o d o s

P o d e r e s . E m r e s u m o , o P o d e r L e g i s l a t i v o b r a s il e i r o é c o m p o s t o p o r d e p u t a d o s

f e d e r a is , d e p u t a d o s e s t a d u a is , s e n a d o r e s e v e r e a d o r e s ; o P o d e r E x e c u t i v o , p e lo

p r e s id e n t e , p o r g o v e r n a d o r e s e p r e f e it o s ; j á o J u d i c i á r i o , p o r j u i z e s , t r i b u n a i s

e s t a d u a is e p e lo S u p r e m o T r i b u n a l F e d e r a l ( S T F ) ( B R A S I L , 1 9 8 8 ).

A d iv is ã o d e p o d e re s c o n t r ib u i n à o s o m e n te p a r a e s t a b e le c e r o s lim it e s

d e a t u a ç à o d e c a d a ó r g ã o , m a s f a c i l i t a a o c i d a d ã o v a le r - s e d a n o r m a l e g a l,

p r i n c i p a l m e n t e d a C o n s t i t u i ç ã o , p a r a c o b r a r d e s e u s r e p r e s e n t a n t e s p o lí t i c o s

0 c u m p r im e n t o d o s d ir e i t o s f u n d a m e n t a i s , o s q u a i s , n o c a s o b r a s i l e i r o , e s t ã o

p r e v is t o s n o T í t u l o I I — D o s D i r e i t o s e G a r a n t i a s F u n d a m e n t a i s , n o C a p í t u l o

1 — D o s D ir e it o s e D e v e r e s In d iv id u a is e C o le t iv o s : “ A r t . 5 o T o d o s s à o ig u a is

p e r a n t e a l e i , s e m d is t in ç ã o d e q u a lq u e r n a t u r e z a , g a r a n t in d o - s e a o s b r a s il e i r o s

e a o s e s t r a n g e i r o s r e s id e n t e s n o P a í s a i n v i o l a b i l i d a d e d o d i r e i t o à v i d a , à

l i b e r d a d e , à ig u a l d a d e , à s e g u r a n ç a e à p r o p r ie d a d e [ . . . ] ” ( B R A S I L , 1 9 8 8 ).

N o C a p ít u lo I I — D o s D i r e i t o s S o c i a i s , a r t . 6 o, a C o n s t i t u i ç ã o F e d e r a l p r e v ê

q u e “ S ã o d ir e it o s s o c ia is a e d u c a ç ã o , a s a ú d e , a a lim e n t a ç ã o , o t r a b a lh o , a

m o r a d ia , o t r a n s p o r t e , o l a z e r , a s e g u r a n ç a , a p r e v id ê n c ia s o c i a l , a p r o t e ç ã o

à m a t e r n id a d e e à i n f â n c i a , a a s s i s t ê n c i a a o s d e s a m p a r a d o s , n a f o r m a d e s t a

C o n s t i t u i ç ã o ” ( B R A S I L , 1 9 8 8 ).

N e s s e s e n tid o , a p r o v e it e e le ia a C o n s t it u iç ã o F e d e r a l d e 1 9 8 8 ( B R A S I L , 1 9 8 8 ).

L e g a lid a d e — le g a lid a d e a d v é m d a e x p r e s s ã o le g a l; lo g o , n o E s t a d o d e D i ­

r e it o , p r e s s u p õ e - s e a id e ia d e q u e o s a t o s p o l í t i c o s o u p a r t i c u l a r e s d e v a m s e r

r e a l i z a d o s n o s t e r m o s d a l e i , p o is , d o c o n t r á r i o , s e r i a u m E s t a d o t o t a l i t á r i o
O Estado de Direito

o u a u t o r i t á r io e n à o d e d ir e i t o . C o m r e l a ç à o a o P o d e r P ú b l i c o , o p r i n c í p i o d a

l e g a lid a d e é f u n d a m e n t a l p a r a a d e m o c r a c i a , p o is , q u a n d o o r e p r e s e n t a n t e d o

p o v o d e i x a d e o b s e r v a r a s n o r m a s le g a is p a r a a g i r e m b e n e f í c i o p r ó p r io o u

p o r v o n t a d e p r ó p r i a , a t u a f o r a d o in t e r e s s e p ú b lic o . N e s s e s e n t id o , s e r á q u e

a t u a lm e n t e o s g o v e r n a n t e s t ê m o b s e r v a d o o p r i n c í p i o d a le g a lid a d e o u e s t à o

a t u a n d o c o m v o n t a d e p r ó p r i a o u b e n e f í c i o p r ó p r io ?

L ib e r d a d e in d iv id u a l — p re s s u p õ e a m á x im a p r e v is t a n a D e c la r a ç ã o d o s

D i r e i t o s d o H o m e m e d o C id a d ã o d e 1 7 8 9 : “ A r t . 4 o A lib e r d a d e c o n s is t e e m

p o d e r f a z e r t u d o o q u e n ã o p r e ju d iq u e o p r ó x i m o [ . ..] ” ( D e c l a r a ç ã o . . . , 2 0 1 7 ) .

\
Fique atento

As garantias fundamentais e a igualdade jurídica também podem ser considera­


das elementos do Estado de Direito, pois o estabelecimento de limites do poder
do Estado na preservação dos direitos e das garantias dos indivíduos, os direitos
fundamentais e a afirmação de que todos são iguais perante a lei constituem
peças fundamentais do Estado de Direito, nos termos dos princípios do Direito e
das normas gerais.
\____________________________________________________________________________________________________________________ *

Fases do Estado de Direito em paralelo aos


direitos fundamentais
A d e f in iç ã o d e E s t a d o d e D i r e i t o p a s s a p o r d i v e r s a s f a s e s t e ó r i c a s d o s a d e p t o s

d o ju s p o s it iv is m o e d o s a d e p to s a o ju s n a t u r a li s m o . O s ju s p o s it iv is t a s a d o ta m

u m c o n c e it o f o r m a l d e E s t a d o d e D i r e i t o , c o m a a u t o l i m i t a ç ã o d o E s t a d o ,

q u e c o n f e r e lib e r d a d e a o s in d iv íd u o s . J á o s d e f e n s o r e s d o ju s n a t u r a lis m o

e m o r a lis m o a d o ta m u m c o n c e it o s u b s t a n c ia l d e E s t a d o d e D ir e it o c o m o

e n t e n d im e n t o d e u m a l e i t u r a m o r a l d o D i r e i t o .

\
Saiba mais

Para saber mais sobre o tema, veja o livro Aulas de introdução ao Direito (COELHO, 2004).
\ ____________________________________________________________________________________________ J
122 O Estado de Direito

N o E s t a d o d e D i r e i t o , a d e f e s a d a lib e r d a d e e o s d ir e it o s i n d i v i d u a i s , c i v i s e

p o lít ic o s f o r a m c a t a lo g a d o s c o m o d ir e it o d e p r i m e i r a g e r a ç ã o . O p r o f e s s o r K a r e l

V a s a k , e m 1 9 7 9 , f ic o u c o n h e c id o p o r d e f e n d e r , n a s u a t e s e , u m a c l a s s i f i c a ç ã o

d o s d ir e i t o s f u n d a m e n t a is e m t r ê s g e r a ç õ e s . A n o s m a is t a r d e , B o b b io , P a u lo

B o n a v id e s e o u t r o s t e ó r ic o s s o m a r a m à t e o r ia d e s e n v o lv id a p o r V a s a k o s d ir e it o s

d e q u a r t a g e r a ç ã o . J á a c o n t in u a ç ã o o d o u t r in a d o r P a u lo B o n a v id e s d e f e n d e u a

e x i s t e n c ia d o d ir e i t o d e q u in t a g e r a ç ã o c o m o a m p lia ç ã o d o d ir e i t o d e t e r c e ir a

g e r a ç ã o d e s e n v o lv id a p o r V a s a k (a p u d L I N H A R E S ; S E G U N D O , 2 0 1 6 ) .

C o n v é m r e s s a l t a r q u e a e x p r e s s ã o “ g e r a ç õ e s ” a t é h o je é c r i t i c a d a p e l a

d o u t r i n a , q u e e n t e n d e c o m o id e a l a t e r m i n o l o g i a “ d im e n s õ e s ” .

Saiba mais

Para saber mais sobre a adoção da terminologia 'dimensões' veja a obra A efkàcia dos direitos
fundamentais (SARLET, 2015), cujo autor é precursor na adoção da expressão dimensões.

P a r a f a c i l i t a r o s e u e n t e n d im e n t o , v e j a o q u e c a d a g e r a ç ã o o u d im e n s ã o

d o s d ir e it o s f u n d a m e n ta is p r e v iu :

P r i m e i r a g e r a ç ã o — e m a t e n ç ã o à s c o n c e p ç õ e s l i b e r a i s , c o n s a g r o u o s d ir e it o s

d a lib e r d a d e , d ir e it o s c i v i s e p o lít ic o s c o m t it u la r id a d e a o in d iv íd u o , a s s im

c o m o d ir e i t o d e r e s i s t i r o u o p o r - s e a o E s t a d o (status negativus).

S e g u n d a g e r a ç ã o — d if e r e n t e m e n t e d a p r i m e i r a , e s t a s u r g i u n o E s t a d o s o c i a l ,

p e r ío d o m a r c a d o p e la t e o r i a m a r x i s t a e s o c i a l i s t a , n o s m o v i m e n t o s s o c i a i s

t r a b a lh is t a s , e m c o n s e q u ê n c ia , c o n f e r iu t it u la r id a d e à c o le t iv id a d e e a o s

g r u p o s s o c i a i s , c o n s a g r a n d o o s d i r e i t o s s o c i a i s , c u l t u r a i s e e c o n ô m ic o s e a s

p re s ta ç õ e s p o s it iv a s (status positivus).

T e r c e i r a g e r a ç ã o — c o n s a g r o u a t u t e la d o s in t e r e s s e s d i f u s o s e t r a n s i n d i v i -

d u a is , s e m e s p e c if ic a ç ã o d e t it u la r id a d e .

D c a c o r d o c o m a c o n c e p ç ã o d e f e n d id a p o r B o n a v i d e s ( 2 0 0 7 ) , o d i r e i t o

d a q u a r t a g e r a ç ã o s e r i a r e s p o n s á v e l p o r c o n s a g r a r o d ir e i t o à d e m o c r a c i a , o

d ir e i t o à in f o r m a ç ã o e o d ir e i t o a o p lu r a l is m o . C o n t u d o , n o d e c o r r e r d a g lo b a ­

l i z a ç ã o e d a p e r c e p ç ã o j u r í d i c o - s o c i a l , o p r o f e s s o r B o n a v id e s ( 2 0 0 7 ) d e f e n d e u

a e x i s t ê n c i a d e u m d ir e it o d e q u in t a g e r a ç ã o q u e t r a t a r i a d a p a z . S e g u n d o A l i s -
O Estado de Direito

s o n J o s é M a i a M e lo (a p u d L I N H A R E S ; S E G U N D O , 2 0 1 6 , p . 2 0 3 ) , “ A t e o r ia d a s

g e r a ç õ e s d o s d ir e it o s f u n d a m e n t a is d e P a u lo B o n a v id e s p o s s u i d e c id id a m e n t e

u m v i é s h is t ó r ic o - e v o lu t iv o , b u s c a n d o u m a t e o r ia q u e d ê c o n t a d e , n u m p r im e ir o

m o m e n t o , e x p l i c a r o s f a t o s o c o r r id o s n a h i s t ó r ic a c o n s t it u c io n a l o c id e n t a l” .

Saiba mais

Para saber mais sobre tema, consulte o livro Democracia edireitos fundamentais: uma
homenagem aos 90 anos do professor Paulo Bonavides (LINHARES; SEGUNDO, 2016).

Estado de Direito e democracia


A C o n s t i t u i ç ã o F e d e r a l b r a s i l e i r a d e 1 9 8 8 e x p r e s s a , n o a r t . I o, q u e a R e p ú b lic a

F e d e r a t iv a d o B r a s i l c o n s t i t u i u m E s t a d o D e m o c r á t ic o d e D i r e i t o . A d e f in iç ã o

a d o t a d a p e la C o n s t it u i ç ã o b r a s i l e i r a e n g lo b a a v i s ã o d e d e m o c r a c ia e d e E s t a d o

d e D i r e it o c o m o ú n ic a . C o n t u d o , a m b o s s à o d is t in t o s , o u s e ja , E s t a d o d e D i r e it o

n à o s e c o n f u n d e c o m E s t a d o D e m o c r á t ic o . P a r a d i f e r e n c i a r a m b o s o s t e r m o s ,

v e r e m o s a s p o n d e r a ç õ e s d e c o n s a g r a d o s d o u t r in a d o r e s .

P a r a S a r t o r i, n a a t u a lid a d e , d e m o c r a c ia s ig n if ic a “ lib e r a l- d e m o c r a c ia ,

s e n d o u m p r i n c í p i o d e l e g i t i m i d a d e , u m s is t e m a p o l í t i c o d e s t in a d o a s o l u c i o ­

n a r p r o b le m a s d o e x e r c í c i o d o p o d e r , e é u m id e a l” ( S A R T O I , 2 0 0 7 , p . 4 5 ) .

S e g u n d o S . H o lm e s , p a r a P a in e e J e f f e r s o n , a d e m o c r a c ia s e r i a u m s is t e m a

o r ie n t a d o à m u d a n ç a e à in o v a ç ã o , o q u a l r e q u e r m i n u c i o s a e s t r u t u r a ç ã o d a s

c o n d iç õ e s a v a l i a t i v a s e a n a l í t i c a s d a r e f o r m a p o l í t i c a .

S e g u n d o K e l s e n ( 1 9 9 3 , p . 1 7 4 ):

Se o antagonism o entre dem ocracia e autocracia pode ser reduzido a um a


diferença no habitus in terio r d o s hom ens, o an tag o n ism o en tre a atitu d e
científica voltada para o valor do conhecim ento e uma atitude política vol­
tada para outro valor, o social, tam bém pode ser associado ao antagonism o
entre relativism o político e absolutism o político. Ficará, entào, m ais fácil de
com preender o m otivo pelo qual um a genuína ciência política pode prosperar
m ais em um a dem ocracia, onde sua liberdade, sua independência do governo
estâo asseguradas, do que em uma autocracia, onde suas ideologias políticas
podem desenvolver-se e tam bém por qual razào aquele que prefere a dem o­
cracia à autocracia inclina-se m ais fortem ente a um conhecim ento científico
da sociedade em geral, e do Kstado e do D ireito em particular, do aquele cuja
natureza o em purra para autocracia e, desse modo para uma atitude ideológica.
124 O Estado de Direito

K e l s e n f a z u m p a r a le lo d o a b s o lu t is m o c o m a d e m o c r a c ia e a lib e r d a d e n o

E s t a d o d c D i r e i t o . C o n s i d e r a n d o o E s t a d o a t u a l , a d e m o c r a c ia r e p r e s e n t a r ia a

lib e r d a d e d o i n d i v i d u o e m e x p o r a s s u a s id e ia s p o l í t i c a s , m a s p a r a le la m e n t e

s e r e a v i v a m c o n c e p ç õ e s a b s o l u t is t a s n a f o r m a d e g o v e r n a n t e s .

J á n a c o n c e p ç ã o d e B o b b io ( 2 0 0 0 , p . 2 0 - 2 1 ), d e f e n s o r d a p r o t e ç ã o d o s

d ir e i t o s s u b je t i v o s c o m o c o n d iç ã o d o r e g im e d e m o c r á t ic o :

O E stado liberal é o pressuposto não só histórico m ais ju ríd ico do Estado


dem ocrático. Estado liberal e estado dem ocrático são independentes em dois
modos: na direção que vai do liberalism o a dem ocracia, no sentido de que são
necessárias certas liberdades para o exercício correto do poder dem ocrático e
na direção oposta que vai da dem ocracia ao liberalism o, no sentido de que é
necessário o poder dem ocrático para garantir a existência e a persistência das
liberdades fundam entais. Em outras palavras: é pouco provável que um estado
não liberal possa assegurar o correto funcionamento da dem ocracia, e de outra
parte é pouco provável que o estado não dem ocrático seja capaz de garantir
as liberdades fundam entais. A prova histórica dessa interdependência está no
fato de que o estado liberal e estado dem ocrático, quando caem , caem juntos.

A v i s ã o d e B o b b io ( 2 0 0 0 ) p o d e r ia s e r c o n s id e r a d a a n t a g ô n ic a à s id e ia s

c lá s s ic a s d o E s t a d o d e D ir e it o .

A n a l i s a n d o a r e a li d a d e m u n d ia l a t u a l , e m p a r a le lo a o s d ir e i t o s d e p r i m e i r a

g e r a ç ã o f i r m a d o s n o E s t a d o d e D i r e i t o e à d e m o c r a c ia n a lib e r d a d e d o c id a d ã o

d e e s c o lh e r o s s e u s g o v e r n a n t e s , c o n s t it u e m o p r o c e s s o e le it o r a l o n a s c im e n t o

e a c o n s e r v a ç ã o d a s d e m o c r a c ia s r e p r e s e n t a t iv a s . A s s i m , a in d a q u e a t u a lm e n t e

o p r o c e s s o e l e i t o r a l s e ja r e j e i t a d o p o r g r a n d e p a r t e d a p o p u la ç ã o m u n d i a l ,

d e s a c r e d it a d a d a s f a la s d e m a g ó g ic a s d e p o lí t i c o s , o p r o c e s s o é im p o r t a n t e p a r a

a d e m o c r a c i a , p o is a r u p t u r a d o s is t e m a e le it o r a l e d a p o l í t i c a r e p r e s e n t a r ia a

m o r t e d a d e m o c r a c ia r e p r e s e n t a t iv a .

D e s s e m o d o , o E s t a d o d e D i r e i t o n e c e s s it a s e r r e c o n s t r u í d o p a r a r e o r d e ­

n a r a s r e l a ç õ e s e n t r e o E s t a d o , a s o c ie d a d e e o d i r e i t o c o m o u m t o d o e , a o

f i n a l , s e j a m , d e f a t o , g a r a n t id o s e i n s t a la d o s n o v o s m e c a n i s m o s s o c i a i s e d e

e s t r u t u r a s p o lít ic a s .
O Estado de Direito

Referências >

BOBBIO, N. Teoria geral da política: a filosofia política e as lições dos clássicos. Rio de
Janeiro: Campos, 2000.

BONAVIDES, P. Ciência política. São Paulo: Malheiros, 2007.

BRASIL. Constituição (1988/ Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília,


DF: Senado Federal, 1988. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/
constituicao/constituicaocompilado.htmx Acesso em: 31 ago. 2017.

CHEVALLIER, J. O Estado de Direita Belo Horizonte: Fórum, 2015.

DECLARAÇÃO de direitos do homem e do cidadão. 2017. Disponível em: chttps://


br.ambafrance.org/A-Declaracao-dos-DÍreitos-do-Homem-e-do-Cidadao>. Acesso
em: 31 ago. 2017.

HOLMES, S. Elprecompromisoyla paradoja de la democracia. In: ELSTER, J.; SLAGSTAD R.


Constitucionalimsoy democracia. Ciudad de Mexico: Fondo Cultura Economica, 1999.

KELSEN, H. A democracia. São Paulo: Martins Fontes,1993.

LINHARES, E. A.; SEGUNDO, H. de B. M. (Org.). Democracia e direitos fundamentais:


uma homenagem aos 90 anos do professor Paulo Bonavides. São Paulo: Atlas, 2016.

SARTOI, G. ¿Quees la democracia? Barcelona: TAURUS, 2007.

Leituras recomendadas

BASTOS, C. R. Curso de teoria do Estado e ciência política. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2004.

COELHO, L. f. Aulas de introdução ao Direito. Barueri: Manole, 2004.

DALLARI, D. de A. Elementos de teoria geral do Estado. São Paulo: Saraiva, 2010.

GALVÃO, J. O. L. O neoconstitucionalismo e o fim do Estado de Direito. São Paulo: Saraiva,


2014.

RAMOS, F. C.; MELO, R.; FRATESCHI, Y. Manual de filosofiapolítica: para os cursos de teoria
do estado e ciência política, filosofia e ciências sociais. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2015.

SARLET, I. W. A eficácia dos direitos fundamentais. 12. ed. Porto Alegre: Livraria do
Advogado. 2015.
V____________________________________________________________________________________________ J
A relação entre
Estado e economia
/------------------ Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

■ Explicar a relação do capitalismo com o Estado moderno.


■ Diferenciar Estado social e Estado socialista.
■ Demonstrar a intervenção do Estado na economia e vice-versa.

Introdução--------------------------------------^
Neste capítulo, você verificará a relação entre Estado e economia. Também
analisará a evolução do capitalismo, a sua interferência no surgimento
do Estado social e das ideias socialistas e a sua intervenção no domínio
econômico, além de diferenciar Estado social e socialismo.

Do capitalismo ao Estado moderno


O c o n s u m i s m o , o e x a g e r o , a o s t e n t a ç ã o d e p o d e r e a g a n â n c ia s e t o r n a r a m ,

c o m o t e m p o , o s p r i n c i p a i s d o g m a s d a s o c ie d a d e a t u a l , q u e , c a d a v e z m a is

im p r e g n a d a d e t e c n o l o g ia , lu t a p o r r e c o n h e c im e n t o s o c i a l e a s c e n s ã o e c o n ô ­

m ic a . A r e a li d a d e é , e m s i , u m r e f le x o e x a c e r b a d o d o c a p i t a l i s m o m o d e r n o

e d a c r i s e d o H s t a d o S o c i a l D e m o c r á t i c o d e D i r e i t o . O d ia d o o u a m a d o p o r

d o u t r i n a d o r e s , o c a p i t a l i s m o f o i e é r e s p o n s á v e l p e la in t e r - r e la ç ã o e c o n ô m ic a

m u n d ia l d o s E s t a d o s .

M a s , p a r a q u e s e ja p o s s í v e l c o m p r e e n d e r o s u r g i m e n t o d o c a p i t a l i s m o e

a s u a r e l a ç ã o c o m o E s t a d o m o d e r n o , é im p e r i o s o v o l t a r m o s n o t e m p o ; e m

e s p e c í f i c o , n a c r i s e d o s is t e m a f e u d a l.

N o d e c o r r e r d o s é c u lo X V I , o f e u d a li s m o j á n ã o p o s s u ía a f o r ç a d o m in a n t e

d e o u t r o r a , e m c o n s e q u ê n c ia d a s o m a d e f a t o r e s q u e c o n t r i b u í r a m p a r a o s e u

e n f r a q u e c im e n t o , c o m o a s c i d a d e s , o s u r g im e n t o e a v a l o r i z a ç ã o d a b u r g u e s ia ,
A relaçáo entre Estado e economia

a f a lt a d c m ã o d e o b ra p a ra p ro d u ç ã o d e p ro d u to s a r t e s a n a is e m d e c o r r ê n c ia

d c p e s t e s q u e a s s o la v a m a é p o c a , b e m c o m o o f o r t a le c i m e n t o d a m o n a r q u ia .

C o m a d e c a d ê n c ia d o f e u d a li s m o e o s u r g i m e n t o d o p r i m e i r o E s t a d o m o ­

d e r n o , o u s e j a , d o a b s o lu t is m o , a s o c ie d a d e m e d ie v a l p a s s o u a c o n h e c e r n o v o s

r e c u r s o s d e m ã o d e o b ra d e g ra n d e im p o r t â n c ia p a r a a p ro d u ç ã o e c o m e r ­

c i a l i z a ç ã o d o s p r o d u t o s d a é p o c a , a lé m d a e x p a n s ã o m a r í t i m a c o m e r c i a l n a

r e l a ç ã o d c t r o c a d c p r o d u t o s e d a a c u m u l a ç ã o d e r iq u e z a s - m e t a is e s s e n c i a i s

p a r a o E s t a d o ( m e r c a n t ilis m o ) . E s s e s fa t o s d e r a m o r ig e m a o c a p it a li s m o

c o m e r c i a l e , c o m e le , à e s c r a v i d ã o e a o d e s e n v o lv i m e n t o d a f i s i o c r a c i a , q u e

s e o p u n h a a o m e r c a n t i l i s m o , n a d e f e s a d a a c u m u l a ç ã o d e r iq u e z a d e r e c u r s o s

n a t u r a i s p r ó p r io s .

O c a p i t a l i s m o t i n h a c o m o p r e m is s a s o lu c r o e o a c ú m u lo d e c a p i t a l , e x i ­

g i n d o , a s s i m , p r e d o m ín io s o b r e a p r o p r ie d a d e p r i v a d a , d e f e s a d a lib e r d a d e

e c o n ô m ic a e l i v r e c o n c o r r ê n c ia . C o n t u d o , o c a p i t a l i s m o p r o m o v e u u m a n í t i d a

d i v i s ã o d e c l a s s e s s o c i a i s : d e u m la d o , o s n o b r e s ; d e o u t r o , o s b u r g u e s e s ; e ,

n o e x t r e m o o p o s to , o s t r a b a lh a d o r e s a s s a la r ia d o s .

J á n o t r a n s c u r s o d o s é c u lo X V I I I , c o m a d e r r o c a d a d o E s t a d o a b s o lu t is t a e o

s u r g im e n t o d o E s t a d o l i b e r a l , n a s e q u ê n c ia d o E s t a d o d e D i r e i t o , o c a p it a li s m o

s e g u iu o s e u c i c l o e v o l u t i v o : d o c o m e r c i a l m e r c a n t i l i s t a p a r a o c a p i t a l i s m o

in d u s t r ia l, fru t o d a R e v o lu ç ã o In d u s t r ia l.

N e s s e p e r ío d o , A d a m S m it h (a p u d M A T I A S - P E R E I R A , 2 0 1 5 , p . 1 4 ) d e f e n ­

d e u o l i v r e m e r c a d o , e n t e n d e n d o q u e a f u n ç ã o “ p r e c ip u a d o E s t a d o n ã o s e r i a a

d e p r o m o v e r o p r o g r e s s o e c o n ô m ic o , m a s d e g a r a n t ir a s r e g r a s n e c e s s á r ia s p a r a

o b o m f u n c i o n a m e n t o d o s is t e m a e c o n ô m ic o d e m e r c a d o ” . P o d e - s e e n t e n d e r

q u e , p a r a S m i t h , n ã o c a b e r ia a o E s t a d o i n t e r v i r n a e c o n o m ia , e n t e n d im e n t o

q u e lo g o s e r i a s u p e r a d o p e lo s n e o l i b e r a l i s t a s .

F o i n o s é c u lo X I X q u e s e c o n s o li d o u o c a p i t a l i s m o f i n a n c e i r o e , c o m e le ,

a in t e r v e n ç ã o d o E s t a d o n a e c o n o m ia ( k e y n e s i a n i s m o ) , o q u a l p o s t e r io r m e n t e

d a r i a lu g a r à n o v a f a s e d o c a p it a li s m o : o c a p i t a l i s m o i n f o r m a c i o n a l , f a s e q u e

m a r c o u o d e s e n v o lv i m e n t o d o s E s t a d o s m o d e r n o s .

D e s s a f o r m a , f i c a c la r o q u e a e v o lu ç ã o d o s E s t a d o s m o d e r n o s e s t á i n t r i n s e ­

c a m e n t e r e la c io n a d a a o p r o g r e s s o d o c a p i t a l i s m o , s o b r e t u d o c m c o n s e q u ê n c ia

d a s c a r a c t e r í s t i c a s d o c a p i t a l i s m o . N e s s e s e n t id o , c o n v é m p o n t u a r a a n á l i s e

r e a l i z a d a p e lo p r o f e s s o r G i l b e r t o B e r c o v i c i , n a s u a t e s e d o u t o r a l s o b r e o

E s t a d o t o t a l e o E s t a d o s o c i a l , n o q u e d i z r e s p e it o à r e l a ç ã o e n t r e o E s t a d o

m o d e r n o e o c a p it a li s m o :

Na visão de C ari Schm itt, a evolução do Hstado m oderno passa necessaria­


m ente pelas etapas de Hstado A bsoluto, Kstado N eutro e Kstado Total, que
128 A relação entre Estado e economia

significam , respectivam ente, a unificação religiosa, a unificação nacional e


a coesão econôm ica. O Estado Total vai substituir o Estado N eutro do século
X IX , trazendo um a série de novos desafios com a transform ação de todos
os problem as econôm icos e sociais em questões potencialm ente políticas.
Para Schm itt, o Estado Total promove a politização (Politisierung ) de tudo o
que fosse econôm ico, social, cultural e religioso (BERCOVICI, 2003, p. 77).

Estado social e socialismo


P a r a e n te n d e r o s u r g im e n t o d o E s t a d o s o c ia l, o u E s t a d o d o b e m - e s ta r s o c ia l

ou Welfare State , é n e c e s s á r io r e c o r r e r à h i s t ó r i a d a c r i s e d o l i b e r a l i s m o .

D u r a n t e a e f e r v e s c ê n c i a d a s id e ia s f i l o s ó f i c a s d o s é c u lo X I X , a c r i s e d o

E s t a d o lib e r a l e m s o lu c io n a r q u e s t õ e s p ú b lic a s d a é p o c a fo m e n t o u a in q u ie t a ç ã o

p o p u la r p o r g a r a n t ia d e d i r e i t o s s o c i a i s e a c r i a ç ã o d e p a r t id o s p o l í t i c o s e d e

s i n d i c a t o s , e le m e n t o s e s s e n c i a i s p a r a o s u r g i m e n t o d o E s t a d o s o c i a l , p o is , a

p a r t i r d o n o v o m o d e lo d e E s t a d o m o d e r n o , c a b e r ia a o E s t a d o g a r a n t ir u m b e m -

- e s t a r m í n i m o a o in d i v íd u o . O u s e j a , o E s t a d o n ã o s o m e n t e t e r ia a p r e m is s a d e

a s s e g u r a r a lib e r d a d e d e m o c r á t ic a , m a s s e r ia r e s p o n s á v e l p o r c o n s t i t u c i o n a li z a r

o s d ir e i t o s d e s e g u n d a d im e n s ã o o u d ir e i t o s s o c i a i s , v i n c u l a d o s à e s f e r a s o c i a l

d o b e m - e s t a r d a p e s s o a . S e g u n d o V i l l a r B o r d a ( 2 0 0 7 , p . 1 1, t r a d u ç ã o n o s s a ) :

A revolução industrial deu surgim ento às classes trabalhadoras, aos sindicatos


e partidos políticos e em consequência deles a necessidade de constitucionali­
zarem-se os direitos sociais superando a ideia de liberdade que fundamentava o
Estado de Direito. O desenvolvimento do capitalismo fruto da industrialização,
revolução científica c técnica, as ideias de ilustração e antes delas o im pulso
da reform a protestante foram os cenários para com eço do esboço da ideia.

A s p a la v r a s d e V i l l a r B o r d a ( 2 0 0 7 ) s in t e t iz a m a c o n s tr u ç ã o d o E s t a d o

s o c i a l , c u jo o b je t iv o p r i m o r d i a l e r a g a r a n t i r a o s i n d i v í d u o s o s d ir e i t o s s o c i a i s ,

v i s t o q u e , a p ó s a S e g u n d a G u e r r a M u n d i a l , a in d a e r a la t e n t e a d e s ig u a ld a d e

e c o n ô m ic a s o c i a l e d e p e s s o a s , c o m o o d ir e i t o a o s u f r á g i o .

C o n t u d o , a C o n s t it u iç ã o m e x ic a n a d e 1917 e a C o n s t it u iç ã o a le m ã d e

W e i m a r d e 1 9 1 9 s ã o c o n s id e r a d o s o s p r i n c i p a i s d o c u m e n t o s h i s t ó r i c o s q u e

v i s a m a s s e g u r a r o s d ir e i t o s s o c i a i s , c a b e n d o a o E s t a d o a r e s p o n s a b i lid a d e d e

g a r a n t i r o e q u i l í b r i o s o c i a l . N e s s e s e n t id o , o Q u a d r o 1 a p r e s e n t a o s d ir e i t o s

s o c i a i s p r e v is t o s e m t a is c o n s t i t u iç õ e s .

A C o n s t i t u i ç ã o m e x i c a n a d e 1 9 1 7 e a C o n s t i t u i ç ã o a le m ã d e W e i m a r d e

1919 r e p re s e n ta r a m u m m a r c o n a h is t ó r ia d o c o n s t it u c io n a lis m o s o c ia l, v is t o

q u e d e s t in a r a m a r t i g o s e s p e c í f i c o s p a r a o s d i r e i t o s s o c i a i s .
A relação entre Estado e economia

/■------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- \
T abela 1. Comparação de direitos sociais entre as constituições mexicana e alemã.

CONSTITUIÇÃO CONSTITUIÇÃO A LE M Ã
M E X IC A N A DE 1917 DE W EIM A R DE 1919
A sse gurou direitos A sse gu rou direitos
sociais referentes a: sociais referentes a:

Meio ambiente adequado para o Igualdade jurídica entre


desenvolvimento e bem-estar homens e mulheres

Família Casamento

Moradia Moradia

Crianças e jovens Crianças e jovens

Bases para a reforma agrária Acesso à justiça

Acesso à justiça Vida econômica

Proteção aos povos indígenas Constituição de corporações


e associações

Educação Educação

Trabalho Equiparação entre filhos


(legítimos e ilegítimos)

Saúde Saúde

Liberdade de sufrágio

Trabalho

V__________________________________________________________________________ J

Fique atento

Convém destacar que a Organização Internacional do Trabalho (OIT) foi criada em


1919, dando voz aos clamores de trabalhadores, que buscavam o resguardo de direitos
sociais como a saúde.

A C o n s t it u iç ã o F e d e r a l b r a s ile ir a d e 1 9 3 4 , c o n h e c id a c o m o g e t u lia n a ,

fo i a p r im e ir a C o n s t it u iç ã o b r a s ile ir a a d e s t in a r a r t ig o p a r a o s d ir e it o s
130 A relação entre Estado e economia

s o c ia is , m a s f o i s o m e n te n a C o n s t it u iç ã o F e d e r a l d e 1 9 8 8 q u e o s d ir e it o s

s o c ia is fo ra m in c lu íd o s c o m o d ir e it o s in d iv id u a is — d ir e it o e g a r a n t ia s

fu n d a m e n t a is .

M a s s e rá q u e E s t a d o s o c ia l e s o c ia lis m o p o s s u e m o m e s m o s ig n ific a d o ?

O s o c i a l i s m o n ã o s e c o n f u n d e c o m E s t a d o s o c i a l , m a s a s id e ia s s o c i a l i s t a s

d e p e n s a d o re s c o m o H e g e l e K a r l M a r x c o n t r ib u ír a m p a ra a r e iv in d ic a ç ã o

d o s d ir e it o s s o c ia is d o s t r a b a lh a d o r e s d o E s t a d o s o c ia l.

N a E u r o p a p ó s - R e v o lu ç ã o I n d u s t r i a l , o f i l ó s o f o H e g e l d e f e n d e u a n e c e s ­

s id a d e d e u m E s t a d o r e p u b l ic a n o e d e m o c r á t i c o c o m o id e a l d e lib e r d a d e e

s o lu ç ã o p o l í t i c a , id e ia e s t a q u e s e r i a c o n t r a p o s t a p o r M a r x , d e f e n s o r d e u m a

r e v o lu ç ã o s o c i a l o p e r á r i a c o m o m e c a n i s m o d e r e f o r m u la ç ã o s o c i a l e lib e r d a d e

d a s c l a s s e s . D o o u t r o la d o , R o b e r t O w e n ( 1 7 7 1 - 1 8 5 8 ) d e f e n d e u a r e g u l a ç ã o

d o m e r c a d o d e t r a b a lh o e a r e a l i z a ç ã o d o s d ir e i t o s s o c i a i s e t r a b a l h i s t a s (a p u d

R A M O S ; M E L O ; F R A T E S C H I , 2 0 1 5 ).

P a r a H e r m a n n H e lle r (a p u d B E R C O V I C I , 2 0 0 3 ) , o s o c ia lis m o n ã o é s u ­

p e r a ç ã o , m a s r e f in a m e n t o d o E s t a d o : t ã o m a is p r ó x i m o e s t a r á o t r a b a l h a d o r

d o s o c i a l i s m o q u a n t o m a i s p o s it iv a m e n t e c o n s i d e r a r o f e n ô m e n o d o E s t a d o .

S e g u n d o É m i l e D u r k h e i m ( 2 0 1 6 , p . 1 1 ), o s o c i a l i s m o e s t a r i a o r ie n t a d o

p a ra o fu tu ro .

É, antes de tudo, um planejamento de reconstrução das sociedades atuais, um


programa de vida coletiva que nào existe ainda, ou que não existe tal como
foi sonhada, e que é proposta ao homem como digna de suas preferências.

O s o c i a l i s m o d i f e r e n c i a - s e , a s s i m , d o E s t a d o s o c i a l , p o is , p a r a R e i n a l d o

D ia s (2 0 1 3 , p . 2 4 1 ), o E s t a d o s o c ia l:

Representa um a tentação de ad ap ta r o estado liberal às novas condições


sociais criadas pela expansão industrial, especialm ente o aum ento de uma
m assa de trab alh ado res explorados que, para m a n te r sua produtividade,
precisavam de apoio estatal em vários aspectos de suas vidas (habitação,
saúde, educação, etc.). O estado social tam bém pode ser considerado uma
resposta do capitalism o ao avanço do com unism o na prim eira m etade do
século XX, pois, para atender às demandas dos trabalhadores, muitos partidos
socialistas foram retirados dos partidos socialistas que poderiam ajudar a
a um entar suas fileiras.

D e s s a f o r m a , f i c a c l a r o q u e o s o c i a l i s m o e r a u m a id e o lo g ia o r g a n i z a c i o n a l

q u e s e c o n t r a p u n h a à s i d e ia s c a p i t a l i s t a s d e l u c r o , m a s , n a i d e a l i z a ç ã o d e

ig u a ld a d e s o c i a l , d e c e r t o m o d o , d i f e r e d o m a r x i s m o ( K a r l M a r x ) .
A relaçáo entre Estado e economia

Saiba mais

Para saber mais, consulte o livro Manual de filosofia política: para os cursos de teoria do
estado e ciência política, filosofia e ciências sociais (RAMOS; MELO; FRATESCHI, 2015).

Intervenção do Estado na economia

C o m a c r i s e d o m o d e lo l i b e r a l , s o m a d a à d e p r e s s ã o e c o n ô m ic a in g l e s a e à

q u e b r a d a B o l s a d e V a l o r e s d e N o v a Y o r k , e m 1 9 2 9 , o e c o n o m is t a J o h n M a y ­

n a r d K e y n e s d e f e n d e u a in t e r v e n ç ã o d o E s t a d o n a e c o n o m ia c o m o m e c a n is m o

e s t r a t é g ic o p a r a s o c o r r e r a e c o n o m ia c a p i t a l i s t a .

C o n v é m d e s t a c a r q u e a s t e o r i a s n e o c l á s s i c a s ( d e s e n v o l v id a s n o s é c u lo X I X

p o r t e ó r ic o s c o m o A lf r e d M a r s h a ll, C a r l M e n g u e r e L e o n H a ir a s ) c o n t r ib u í­

r a m p a r a q u e , n a d é c a d a d e 1 9 3 0 , o E s t a d o a s s u m i s s e o d o m í n i o e c o n ô m ic o

n a i m p l e m e n t a ç ã o e n o f i n a n c i a m e n t o d e p r o g r a m a s d e s t in a d o s a e l e v a r o

d e s e n v o lv i m e n t o d o b e m - e s t a r s o c i a l e d a s s o c ie d a d e s e m p r e s a r i a i s , o u s e j a ,

f u n ç à o d e c o n t r o la d o r e r e g u l a d o r d a e c o n o m ia .

J o h n M a y n a r d K e y n e s , r e s p o n s á v e l p e la a n á l i s e d a G r a n d e D e p r e s s ã o

a m e r i c a n a d e 1 9 2 9 e f i e l d e f e n s o r d a i n t e r v e n ç ã o e s t a t a l n a e c o n ô m ic a , d e u

o r ig e m à t e o r i a q u e r e c e b e u o s e u n o m e : a t e o r i a k e y n e s i a n a , s e g u n d o a q u a l

s e j u s t i f i c a a in t e r v e n ç ã o d o E s t a d o n a e c o n o m ia p o r m e io d e p o l í t i c a s p ú b l i ­

c a s , v i s t o a f a l t a d e f o r ç a s d e a u t o a ju s t a m c n t o d a e c o n o m ia e o d e s e m p r e g o

( M A T I A S - P E R E I R A , 2 0 1 5 ).

S e g u n d o Jo s é M a t ia s (2 0 1 5 , p . 3 4 ), p a r a o k e y n e s ia n is m o , ju s t if ic a v a - s e a

i n t e r v e n ç ã o d o E s t a d o n a e c o n o m ia p a r a :

[...] atenuar as flutuações econôm icas e as situações de insuficiência de de­


m anda efetiva. Caberia ao Hstado tom ar certas decisões de controle da moeda,
e do crédito e do nível de investim entos, com o objetivo de superar os mates
intrínsecos do capitalism o e que são agravados nos m om entos de depressão
econôm ica — desigualdade de riqueza, desem prego [...]. Para K eynes isso
se transform aria em aperfeiçoam ento do capitalism o m oderno e estes nâo
seriam incom patíveis com a essência do capitalism o.

O k e y n e s i a n is m o lo g o s o f r e r i a c r í t i c a s , c o m o d o e c o n o m is t a F r i e d r i c h V o n

H a y e k , d e f e n s o r d o r e t o r n o d e id e ia s l i b e r a i s q u e d e r a m s u r g i m e n t o a o n e o li-

b e r a l is m o , q u e lo g o s e r ia c r i t i c a d o p o r F r i e d m a n , e à t e o r ia d o n e o li b e r a l is m o .
A relação entre Estado e economia
-

A s s i m c o m o a in t e r v e n ç ã o d o E s t a d o n a e c o n o m ia g e r a e f e it o s p o s it iv o s o u

n e g a t i v o s , a o c o r r ê n c i a d c f a t o r e s e x t e r n o s c o m o , p o r e x e m p lo , c o r r u p ç ã o d e

e m p r e s a s q u e t e n h a m v i n c u l a ç à o c o m o E s t a d o , im p a c t a m s ig n i f i c a n t e m e n t e

n a e c o n o m ia d o p a í s , i n c l u s i v e a f e t a n d o a s s u a s r e l a ç õ e s e x t e r i o r e s . A s a ç õ e s

d e g r u p o s t e r r o r i s t a s , o a u m e n t o n o f l u x o d e r e f u g ia d o s e o d e c r é s c i m o n a

c o m p r a e v e n d a d e p r o d u t o s s à o o u t r o s f a t o r e s q u e c o n t r ib u e m p a r a a r e o r g a ­

n i z a ç ã o e c o n ô m ic a m u n d i a l.

Exemplo

Um exemplo do efeito da economia no Estado foi o Brasil, no ano de 2016, ter caído
sete posições no ranking sobre a percepção da corrupção, fato resultante da corrupção
averiguada pela Operação Lava-Jato.

E a s s i m s e g u e a h u m a n id a d e , a c o m p a n h a n d o a e v o lu ç ã o e c o n ô m ic a e o

v i c e - v e r s a e c o n ô m ic o .

Referências

BERCOVICI, G. Entre o Estado totale o Estado social: atualidade do debate sobre Direito, es­
tado e economia na República de Weimar. 172 f. 2003. Tese de livre-docência. Universidade
de São Paulo. Faculdade de Direito. 2003. Disponível em: <http://www.teses.usp.br/teses/
disponiveis/livredocencia/2/tde-22092009-150501/pt-br.php>. Acesso em: 4 set. 2017.

DIAS, R. Ciência política. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2013.

DURKHEIM, E.OSoc/a//smo. São Paulo: Edipro, 2016.

MATIAS-PEREIRA, J. Curso de economia política: foco na política macroeconômica e


nas estruturas de governança. São Paulo: Atlas, 2015.

RAMOS, F. C.; MELO, R.; FRATESCHI, Y. Manual de filosofia política: para os cursos de teoria
do Estado e ciência política, filosofia e ciências sociais. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2015.

VILLAR BORDA, L. Estado de Derecho y Estado social de Derecho. Revista Estado de


Derecho, n. 20,2007.

Leituras recomendadas

DALLARI, D. de A. Elementos de teoria geral do Estado. São Paulo: Saraiva, 2010.


Estados e grupos sociais
/------------------ Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

■ Destacar a importância da opinião pública na democracia e no Estado.


■ Relacionar a opinião pública com a sociedade de massa.
■ Analisar a influência da mídia na opinião pública.

Introdução--------------------------------------^
Neste capítulo, você vai ler a respeito da formação e das implicações
da opinião pública. Para isso, primeiramente analisaremos as definições
de Estado e democracia, pois, a partir desses conceitos, discutiremos
opinião pública e a sua importância para o exercício da democracia e
o Estado. Além disso, veremos a definição de sociedade de massa e a
influência da mídia na opinião pública atual. O estudo de tais elementos
é imprescindível para o desenvolvimento acadêmico e a formação de
opinião sobre a relação do Estado e dos grupos sociais.

Da importância da opinião pública para


o Estado democrático de Direito atual
A o p in i ã o p ú b l ic a in t e r f e r e s i g n i f i c a t i v a m e n t e n a c o n s t r u ç ã o d e u m a s o c i e ­

d a d e d e m o c r á t i c a d e D i r e i t o , v i s t o q u e é c o n s id e r a d a e le m e n t o c o n s t i t u t i v o

d e d e m o c r a c ia . A o lo n g o d o s a n o s , a o p in i ã o p ú b l ic a s e r v i u d e s u s t e n t o p a r a

a e s t r u t u r a ç ã o s o c i a l e d e m o c r á t i c a d o E s t a d o , o q u a l , i n s e r i d o n o m e io d e

d i v e r s a s c o n c e p ç õ e s f ilo s ó f i c a s , b u s c o u r e m o d e la r - s e , m a s , e m f a c e d o c e n á r i o

a t u a l , a t r a v e s s a u m a r e a li d a d e d r a m á t ic a d e p o d e r e c r i s e s o b e r a n a .

P o r c o n s e q u ê n c i a d a s u a a m b ig u id a d e d i v e r s a , t e ó r i c o s d e s e n v o lv e r a m

d e f i n i ç õ e s p r ó p r i a s p a r a d e s c r e v e r a o p in i ã o p ú b l i c a , a t r a v e s s a n d o , a s s i m , o

q u e s t io n a m e n t o d o s e le m e n t o s q u e a c o m p u n h a m , c o m o a h i s t ó r i a f i l o s ó f i c a

e s o c i o ló g i c a m u n d i a l. C o n t u d o , p o r s e t r a t a r d e u m f e n ô m e n o d e p e n d e n t e d e

u m c o n te x to h is t ó r ic o e s o c io c u lt u r a l d e m o d o s in t é t ic o , a o p in iã o p ú b lic a
134 Estados e grupos sociais

p o d e s e r d e f i n i d a c o m o a m a n e ir a d e o p in a r d o p o v o s o b r e a lg o q u e a f e t e o

p ú b lic o e m g e r a l.

S e g u n d o o p ro fe s s o r e s p a n h o l J o s é M a r ía R u b io F e r r e r e s (2 0 0 9 , p . 12 ,

t ra d u ç ã o n o s s a ):

[...] a definição da opinião pública depende do tipo de sociedade e dos interesses


politicos do m om ento, ao mesm o tem po em que é produto de vários fatores
como a personalidade dos individuos, dos estratos sociais, da forma de governo,
do sistem a educacional dom inante, da ação dos meios de com unicação e etc.

P a r a o p ro fe s s o r ta m b é m e s p a n h o l J u a n J o s é S o lo z a b a l E c h a v a r r ia (1 9 9 6 ,

p . 4 0 0 , t ra d u ç ã o n o s s a ):

[...] a opinião pública pode ser entendida com o atitude generalizada na cole­
tividade sobre a conveniência de certa política ou ação dc governo. De modo
que a opinião pública seria determ inada pelo acesso geral ou indiscrim inado
à sua form ação e pelo objeto particular ou privado qual faz referência.

Em a te n ç ã o à s d e f in iç õ e s d o s d o u t r in a d o r e s e s p a n h ó is , ju s t if ic a - s e a

im p o r t â n c i a d o e s t u d o d a o p i n i ã o p ú b l i c a p a r a u m E s t a d o d e m o c r á t i c o d e

D i r e i t o , v i s t o q u e , d e m a n e ir a g e r a l , a s o c ie d a d e b u s c a q u e o g o v e r n o p o r e la

e le g id o s e ja u m g o v e r n o d e m o c r á t i c o e c u m p r a a s s u a s o b r i g a ç õ e s d e v i d a s

e a s c o n s t it u c io n a is .

S e g u n d o S a r t o r i (1 9 9 7 , p. X , tra d u ç ã o n o s s a ):

[...] opinião pública e dem ocracia cam inham ju n tas, pois a liberdade de opi­
nião é um valor irrenunciável das sociedades dem ocráticas, um a herança do
pensam ento do século XVII (principio da liberdade de pensam ento, princípio
da liberdade de expressão e princípio de liberdade de organização e associa­
ção). Uma opinião pública que pode ser dita com o autônom a em quanto seja
suficiente para fundam entar a dem ocracia com o um governo de opinião.

P a r t i n d o d a p o n d e r a ç ã o d e S a r t o r i ( 1 9 9 7 , p . 6 4 ) , a o p in i ã o p ú b l ic a é a r e s ­

p o s t a d e u m c o n ju n t o q u e , t r a z e n d o à r e a li d a d e a t u a l , “ é f o r m a d o , o u m e lh o r ,

d i t o m o d i f i c a d o e m a n i p u l a d o p e l o s m e io s d e c o m u n i c a ç ã o , d e c l a r a ç õ e s

p ú b lic a s d c g o v e r n a n t e s o u o u t r a s p e s s o a s d e g ra n d e in f lu ê n c ia / im p a c t o

p ú b l ic o , a s s i m c o m o c a m p a n h a s d e marketing ”
Estados e grupos sociais 135

Fique atento

Dessa forma, fica claro que a opinião pública não se reduz à opinião política sobre o
Estado, sendo ela divisível.

E m u m E s t a d o d e m o c r á t i c o , a o p in i ã o p ú b l ic a s e c o n s t i t u i c o m o r e s u lt a d o

d e u m p ro c e s s o d e d is c u s s ã o li v r e , a b e rto d e m o d o ig u a lit á r io a to d o s , n a

e x p e c t a t i v a d e u m a p r o p o s t a r a z o á v e l q u e s a t i s f a ç a a s n e c e s s id a d e s d o c o le t iv o .

O s u f r á g i o , p o r e x e m p lo , c o n f i g u r a - s e u m a f o r m a d ir e t a d e o p in i ã o p ú b l ic a .

A c e n s u r a , a in d a q u e m a s c a r a d a , m o s t r a r e s q u íc io s d e u m E s t a d o a u ­

t o r i t á r i o e n ã o l i b e r a l , e t e m s id o c o n t i n u a m e n t e u t i l i z a d a p o r p a í s e s , e m

t e o r i a d e m o c r á t i c o s , p a r a b lo q u e a r e l i m i t a r a o p i n i ã o p ú b l i c a , f a t o q u e s e

c o n t r a p õ e à i d e ia d e q u e a o p i n i ã o p ú b l i c a é c o n s i d e r a d a e le m e n t o c o n s t i ­

t u t iv o d e d e m o c r a c ia .

P a r a o p ro fe s s o r m e x ic a n o M a n u e l F r a g a , q u e n o se u liv r o c it a o p ro fe s s o r

fra n c ê s S a u v y :

[...] nâo há dúvidas dc que a opinião pública é um árbitro, uma consciência, um


tribunal temível, ainda que desprovido de um poder jurídico total. A opinião
pública é o tribunal interno de uma nação, e uma força anônima, de vez em
quando uma força política nào prevista em nenhuma constituição (SAU VY
apud FRAGA IR IB A R N E, 1972, p. 263).

D e s s a f o r m a , f ic a e v id e n t e a v in c u la ç ã o d a o p in iã o p ú b lic a c o m a d e ­

m o c r a c i a e o E s t a d o , p o is n ã o h á q u e s e f a l a r e m E s t a d o D e m o c r á t i c o s e m a

li b e r d a d e d e o p i n i ã o , v i s t o q u e , h a v e n d o u m a s o c ie d a d e s i l e n c i a d a , d e i x a d e

e x i s t i r a d e m o c r a c ia e p a s s a a e x i s t i r u m E s t a d o a u t o r i t á r io .

Vincularão da sociedade de massa


e a opinião pública
P a r a e n t e n d e r a v i n c u l a ç ã o d e s o c ie d a d e d e m a s s a s e o p in i ã o p ú b l i c a , c a b e

r e c o r d a r q u e , a p ó s o f in d a r d a P r i m e i r a G u e r r a , d iv e r s a s f a m í l i a s m ig r a r a m p a r a

a s c i d a d e s n a e x p e c t a t i v a d e m e lh o r a r a q u a li d a d e d e v i d a e s a ír e m d a z o n a d e
136 Estados e grupos sociais
-

p o b r e z a n a q u a l v i v i a m . C o n t u d o , c o m o a u m e n t o p o p u la c i o n a l d a s c i d a d e s ,

a f a lt a d e e m p r e g o c o n t r ib u i u p a r a o c r e s c im e n t o d a v i o l ê n c i a e p r o s t it u i ç ã o .

N e s s e í n t e r i m , h o u v e u m a c e le r a m e n t o n a p r o d u ç ã o i n d u s t r i a l , q u e d e ­

s e n c a d e o u a m o d e r n iz a ç ã o e a u r b a n iz a ç ã o g lo b a l, fa to s q u e c o n t r ib u ír a m

p a r a a f a s t a r o i n d i v í d u o d a r e a li d a d e f á t i c a d a v i d a . O h o m e m , s o m a d o a o

m e io , p a s s a v a a s e r in s e r i d o e m u m a v i d a d e c o n s u m o e d e o p in i õ e s r e p e t id a s

e m a n ip u la d a s .

A in d u s t r ia liz a ç ã o e o s n o v o s m e c a n is m o s e s t r a t é g ic o s d e c o m u n ic a ç ã o d e r a m

s u r g im e n t o à c r ia ç ã o d e u m a s o c ie d a d e d e m a s s a d if u n d id a p o r d iv e r s a s t e o r ia s

j u r i s f i l o s ó f i c a s q u e e n t e n d ia m s e r a m a s s a u m c o n ju n t o d e in d i v íd u o s is o la d o s

d o c o n t e x t o s o c i a l , t e n d o c o m o ú n i c a r e f e r ê n c ia a s m e n s a g e n s d o s m e io s d e

c o m u n ic a ç ã o . P a r a W r ig h t M i l l (a p u d F R A N Ç A ; S I M Õ E S , 2 0 1 5 ) , a m a s s a s e r ia

u m p e q u e n o n ú m e r o d e p e s s o a s q u e e x p r e s s a o p in iã o — e s t í m u l o e r e s p o s t a .

P a ra o s p o s it iv is t a s d e fe n s o re s d o m a r x is m o e d a E s c o la d e F r a n k f u r t

(H o r k h e im e r , A d o r n o , B e n ja m in , M a r c u s e , F r o m m , H a b e r m a s , N e u m a n n , K ir -

c h h e im e r , e n t r e o u t r o s ), a m a s s a e r a v i s t a c o m o u m a f o r m a s o c i a l , d e lu t a e id e a l.

P a r a o s p o s it iv i s t a s , a m a s s a s o c ia l e r a c o m p o s t a p o r in d i v íd u o s a n t ie li t i s t a s ,

i n s t i n t i v o s , i m p r e v i s í v e i s , a s s o c ia d o s à c u l t u r a p o p u la r , c r i a t i v o s , e n t r e o u t r a s

c a r a c t e r ís t ic a s .

Saiba mais

Para saber mais sobre a Escola de Frankfurt, leia o livro de Rolf Wiggershaus (WIG­
GERSHAUS, 2012).

J á p a ra o s n e g a t iv is t a s , a m a s s a s o c ia l e ra c o m p o s ta p o r in d iv íd u o s a lie ­

n a d o s , m a n i p u l á v e i s , d e s p r o v id o s d e c o n s c i ê n c i a h i s t ó r i c a , i n f a n t i s , i r r e s p o n ­

s á v e is , e n tre o u tr a s c a r a c t e r ís t ic a s .

O r t e g a y G a s s e t , p o r e x e m p lo , d e f e n s o r d a c o r r e n t e n e g a t iv is t a d a s o c ie d a d e

d e m a s s a s , d e f in iu , e m A rebelião das massas, q u e o h o m e m - m a s s a s e r ia a q u e le :

[...] homem previam ente vazio de sua própria história, desprovido das lem ­
branças do seu passado e que por isso é facilm ente subm etido às disciplinas
cham adas de internacionais. M as do que um homem é um a casca de homem
constituído de ideias com uns (meres idola fo r t ) (ORTEGA Y GASSET, 1999,
p. 9, tradução nossa).
Estados e grupos sociais 137

A d e f i n i ç ã o d e h o m e m - m a s s a e la b o r a d a p o r O r t e g a y G a s s e t ( 1 9 9 9 ) e x ­

p re s s a c o m o o h o m e m a tu a l e s t á , c a d a v e z m a is , to rn a n d o - s e h o m e m - m a s s a ,

o u m e lh o r , a s o c ie d a d e e m g e r a l e s t á s e t o r n a n d o u m a s o c ie d a d e d e m a s s a ,

le v a d a a e x p r e s s a r o p in i õ e s d e t e r c e ir o s s e m q u e d e d iq u e t e m p o p a r a p e n s a r

o u m a n i f e s t a r o p in i õ e s p r ó p r ia s c a p a z e s d e a l t e r a r a r e a lid a d e s o c i a l . S e g u n d o

G e o rg e O r w e ll ( F R A S E S . .., 2 0 1 7 ) “ a m a s s a m a n té m a m a rc a , a m a rc a m a n té m

a m í d i a e a m í d i a c o n t r o la a m a s s a , lo g o a o p in i ã o p ú b l ic a t o r n a - s e o b je t o d e

m a n ip u la ç ã o m id iá t ic a ”

Fique atento

Importante destacar que massa não se confunde com multidão, visto que a última é
quantitativa, visual e composta por individuos que compartilham coisas em comum,
como, por exemplo, multidão de pessoas que comparecem ao estádio de futebol
para assistir ao jogo de sua equipe favorita.

N a v is ã o d o s n e g a t iv is t a s , a m a s s a é q u a lit a t iv a e m e n t a l, o u s e ja , e s tá

lig a d a p o r u m e s ta d o m e n t a l, lo c a liz a d a e m q u a lq u e r c la s s e s o c ia l, c o m o ,

p o r e x e m p lo , f o t o s t i r a d a s p o r p e s s o a s s e m v í n c u l o s e n t r e s i , p u b l ic a d a s e m

r e d e s s o c i a i s c o m o s ím b o l o d e V , s e m q u e s a i b a m , e m r e a li d a d e , a o r ig e m e o

s i g n i f i c a d o d o s ím b o l o , m a s , d a d a a p r o f u s ã o m i d i á t i c a p a s s a d a , a s o c ie d a d e

d c m a s s a a b s o r v e u c o m o s ím b o lo d e p a z o u a l e g r i a .

Influência midiática na opinião pública


C o n s i d e r a n d o a e v o lu ç ã o m u n d i a l , a m í d i a r e p r e s e n t a s i g n i f i c a t i v o im p a c t o

n a c o n s tr u ç ã o d o p e n s a m e n to s o c ia l. A s s im c o m o te m c o n t r ib u íd o p a r a o

p r o g r e s s o d a h u m a n id a d e , a t e c n o l o g ia t e m , a o m e s m o t e m p o , c r i a d o u m a

m a s s a c a d a v e z m a is d e p e n d e n t e d c r e c u r s o s t e c n o ló g ic o s .

O r á d i o e a t e l e v i s ã o , p o r lo n g a s d é c a d a s , f o r a m c o n s id e r a d o s o s p r i n c i p a i s

m e c a n is m o s d e d if u s ã o d e in f o r m a ç õ e s e , p o r m e io d e s s e s r e c u r s o s m i d i á t i c o s ,

s o c ie d a d e s f o r a m i n f l u e n c i a d a s a s e g u i r t e n d ê n c ia s p o l í t i c a s , m o d a , e s p o r t e s

e c o n s u m o e m g e r a l. M a s , c o m a c r i a ç ã o d a s r e d e s s o c i a i s e a e v o lu ç ã o d a

in t e r n e t , a i n d a q u e o r á d i o e a t e l e v i s ã o t e n h a m p e r d id o e s p a ç o p o p u la r , c o n ­

t in u a m a i n f l u e n c i a r a o p in i ã o p ú b l ic a , p r i n c i p a lm e n t e s o b r e t e m a s p o lê m ic o s .
138 Estados e grupos sociais

S e g u n d o o p r o f e s s o r D e n i s M c q u a i l , a m í d i a , o u m e lh o r , a c o m u n i c a ç ã o d e

m a s s a , é t e o r i z a d a p o r d i s t i n t a s v e r t e n t e s , e n t r e a s q u a i s s e d e s t a c a m a t e o r ia

f u n c i o n a li s t a e a t e o r ia c r í t i c a d a c o m u n ic a ç ã o d e m a s s a , q u e s e d i f e r e n c i a r i a m

p r i n c i p a lm e n t e n a in t e r p r e t a ç ã o d o p r o c e s s o f u n d a m e n t a l . A s s i m , p a r a D e n i s

M c q u a il (2 0 1 2 , p . 2 4 5 ):

As teorias funeionalistas e criticas sobre a com unicação de m assa têm asso-


ciado o trabalho da m idia de m assa à ordem social. O prim eiro item atribui à
midia de massa a “ funçào'’ (ou finalidade implícita) de assegurar a continuidade
de um a determ inada ordem social, preservando o controle, consolidando um
am plo consenso de valores, integrando atividades e estabelecendo pessoas
e grupos na sociedade (W right, I960). A teoria critica geralm ente envolve
uma visão da m ídia de m assa com o entidade controlada por elites poderosas
que im pòem seus significados dom inantes e usam a m idia para m arginalizar
e contestar a oposição (H all, 1977).

O s o c i ó lo g o f r a n c ê s P i e r r e B o u r d i e u , a u t o r d a o b r a Sobre a televisão ,
r e a l i z o u u m a a b o r d a g e m p r o f u n d a e c r í t i c a d o im p a c t o d a t e l e v i s ã o n a o p in iã o

p ú b lic a e n o in d iv íd u o . N a s u a o b r a , B o u r d ie u o b s e r v o u q u e a s p e s s o a s s e

t o r n a r a m d e v o ta s d a t e le v is ã o e m d e s p re z o à le it u r a d e jo r n a is ; d e s s a fo r m a ,

c a d a i n d i v í d u o s e d e i x a v a i n f l u e n c i a r p e lo q u e o u v i a n o s c a n a i s t e l e v i s i v o s ,

e s p e c ia l m e n t e p e n s a d o s p a r a o s e u p ú b l ic o ( B O U R D I E U , 2 0 0 1 ) .

C a d a p e s s o a , s e m p e r c e b e r , e r a i m e r s a e m u m a c e n s u r a i n v i s í v e l , v io l e n t a

e j o r n a l í s t i c a d e s t in a d a , e m g r a n d e p a r t e , a a l c a n ç a r a a u d i ê n c i a , a d o t a n d o ,

a s s i m , p o s t u r a s s e n s a c i o n a l i s t a s n a d i f u s ã o d e m a t é r ia s .

N e s s e s e n t id o , c o n v é m d e s t a c a r q u e u m a t e o r ia d e s e n v o lv i d a p e lo s a m e ­

r ic a n o s M c C o m b s e S h a w , q u e , a te n to s a o im p a c t o d a m íd ia n a fo r m a ç ã o

d a o p in iã o p ú b lic a , d u r a n t e a c a m p a n h a p r e s id e n c ia l a m e r ic a n a d e 1 9 6 8 ,

r e a l i z a r a m u m c o m p a r a t i v o d o s p o n t o s d it a d o s p e la s c a m p a n h a s e l e i t o r a i s

m a is a b s o r v id a s p e la p o p u la ç ã o e c o m p r o v a r a m q u e e r a m a q u e le s e n f a t iz a d o s
Estados e grupos sociais 139

p e lo s m e io s d e c o m u n i c a ç ã o . N a s c i a , a s s i m , a t e o r i a d o a g e n d a m e n t o , m a is

c o n h e c id a a g e n d a setting re s p o n s á v e l p o r e s tu d a r o p o d e r m id iá tic o so b re

d e t e r m in a d o s a s s u n t o s , c e n s u r a e im p a r c i a l i d a d e s o b r e o u t r o s .

\
Fique atento

De acordo com a teoria do agendamento, a imprensa seleciona os fatos, os recorta e


os vende conforme os preceitos ditados pela empresa, e até mesmo por governantes
políticos, afetando, assim, significativamente a opinião pública.
V______________________________________________________ )

A i n d ú s t r i a m i d i á t i c a , n o s ú l t i m o s a n o s , t e m i n v e s t id o , d e m a n e ir a a g r e s ­

s iv a , e m c a m p a n h a s in v e s t ig a t iv a s e d e marketing, a f im d e c o m e r c ia liz a r

e in c e n t iv a r o c o n s u m o d o s s e u s p ro d u to s . D a m e s m a f o r m a , o s p a r t id o s

p o l í t i c o s q u e , in d e p e n d e n t e m e n t e d e p e s q u is a s p o p u la r e s , r e a l i z a m p e s q u is a s

p a r t i d á r i a s a f i m d e p r o j e t a r o s s e u s g o v e r n a n t e s o u p o t e n c ia is g o v e r n a n t e s ,

b e m c o m o c r i a r u m a c o n s c i ê n c i a p o l í t i c a s o c i a l . A a b u n d â n c ia d e p a r t id o s

p o l í t i c o s e x i s t e n t e s n o B r a s i l , p o r e x e m p lo , o d e s e q u i l í b r i o d a s c l a s s e s e c o ­

n ô m ic a s s o c i a i s , a e d u c a ç ã o e o u t r o s f a t o r e s s o m a d o s à i n f l u ê n c i a m i d i á t i c a

c o n t r ib u e m a in d a m a i s p a r a a p a r t i d a r i z a ç à o p o p u la r d e p a r t id o s .

O F a c e b o o k , o T w i t t e r e o Y o u T u b e , r e s p o n s á v e is p o r m o v i m e n t a r m i lh õ e s

d e d ó l a r e s , t a m b é m s ã o c o n s id e r a d o s , n a a t u a l i d a d e , g r a n d e s c a t a l i s a d o r e s

e in f lu e n c ia d o r e s d e m a s s a s . M a s s a s q u e , c a d a v e z m a is , d e ix a m d e v iv e r a

r e a li d a d e p a r a v i v e r o v i r t u a l .
Estados e grupos sociais

Referências

BOURDIEU, P. Sobre a televisão. Rio de Janeiro: Zahar, 2001.

FRAGA IRIBARNE, M. El desarrollo político. 2. ed. Barcelona: Grijalbo, 1972.

FRANÇA, V. V.; SIMÖES, P. G. Carso básico de teorias da comunicação. São Paulo: Au­
têntica, 2015.

FRASES de George Orwell. 2017. Disponível em: <https://www.pensador.com/fra-


ses_de_george_orwell/>. Acesso em: 28 set. 2017.

MCQUAIL, D. Atuação da mídia comunicação de massa e interesse público. Porto Alegre:


Penso, 2012.

ORTEGA Y GASSET, J. La rebelión delas masas. Barcelona: Espasa Lobros, 1999.

RUBIO FERRERES, J. M. Opinión pública y medios de comunicación: teoría de la agenda


setting. Gazeta de Antropología, v. 5, n. 1,2009. Disponível em: <http://digibug.ugr.
es/html/10481/6843/G25_01 JoseMaria_Rubio_Ferreres.html>. Acesso em: 18 set. 2017.

SARTORI, G. ¿Que es la democracia? [s.l.]: Taurus, 1997.

SOLOZÁBAL ECHAVARRÍA, J. J. Opinión publica y Estado constitucional. Revista Derecho


Privado y Constitución, v. 10, septydic. 1996. Disponível em: <http://www.cepc.gob.
es/eu/argitalpenak/aldizkariak/aldizkarielektronikoak?IDR=7&IDN=384&IDA=10036>.
Acesso em: 18 set. 2017.

Leituras recomendadas

BASTOS, C. R. Curso de teoria do Estado e ciencia política. 6. ed. São Paulo, 2004.

BONAVIDES, P. Ciencia política. São Paulo: Malheiros, 2007.

PINTO, K. C. Curso de teoria geral do Estado, fundamento do Direito constitucionalpositivo.


Porto Alegre: Atlas, 2013.

WIGGERSHAUS, R.A Escola de Frankfurt: historia, desenvolvimento teórico, significação


política. Rio de Janeiro: DIFEL, 2002.
V_____________________________________________________________________________________________ '
O futuro do Estado
/------------------ Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

■ Reconhecer as crises enfrentadas pelos Estados.


■ Apontar as formas de superação das crises estatais.
■ Apresentar uma nova conformação estatal.

Introdução--------------------------------------^
Com o surgimento e a evolução dos Estados modernos, surgiram as crises,
que, de distintas ordens, movimentam o sistema global, seja no intuito de
superá-las ou de recriar-se como Estado, provocando questionamentos
sobre o futuro do Estado e, consequentemente, da humanidade. Neste
capítulo, você vai ler a respeito do futuro do Estado.

Crise: o mundo em colapso


C r i s e é u m a d a s e x p r e s s õ e s m a is u t i l i z a d a s c o t i d ia n a m e n t e p a r a d e s c r e v e r a

r e a li d a d e n a q u a l s e e n c o n t r a a s o c ie d a d e a t u a l . E m m e io à c r i s e , r e a v i v a m - s e

c o r r e n t e s f ilo s ó f ic a s q u e d e fe n d e m o f im d o E s t a d o , m a s é c e r to q u e u m p o v o

s e m u m E s t a d o , s e m u m a a d m i n i s t r a ç ã o p ú b l ic a c e n t r a l i z a d a , d e s e n c a d e a r ia

u m a d e s o r d e m p ú b l i c a , v i s t o q u e c a d a i n d i v í d u o b u s c a r i a s e r o s e u p r ó p r io

g e sto r.

C o n s i d e r a n d o a s c r i s e s e s t a t a is n a s p a l a v r a s d e Z y g m u n t B a u m a n e C a r i o

B o r d o n i ( 2 0 1 6 , p . 1 1 ,1 5 ):

[...] a crise é o fator que predispõe à m udança, que prepara para futuros ajustes
sobre novas bases. As crises — tão vagas e generalizadas por envolverem uma
parte tão grande do planeta — levam para reverter a direção. Elas progridem
m uito lentam ente, em contraste com a velocidade na qual todas as dem ais
atividades hum anas na realidade contem porânea de fato se movem. Todo e
qualquer prognóstico de solução é continuam ente atualizado e, em seguida,
adiado para outra data. Parece que nunca vai acabar.
142 0 futuro do Estado

A n a lis a n d o a s c r is e s e s t a t a is , o p r o f e s s o r J o s é L u i s B o lz a n d e M o r a is

d e fe n d e q u e a s c r is e s d o E s t a d o s à o d e t ip o :

C o n c e it u a i — a p o n t a q u e s t i o n a m e n t o s s o f r i d o s p e lo E s t a d o n o q u e t a n g e

à s s u a s c a r a c t e r í s t i c a s f u n d a m e n t a i s , p a r t i c u l a r m e n t e a id e ia d e s o b e r a n ia , e

a o s d ir e i t o s h u m a n o s . P a r a M o r a i s , a s c o m u n i d a d e s s u p r a n a c i o n a is ( c o m o a

U n i ã o E u r o p e i a , a N a f t a , o M e r c o s u l ) im p u s e r a m u m a n o v a ló g ic a d e r e la ç õ e s

i n t e r n a c i o n a i s , d e s t a c a n d o q u e a U n i ã o E u r o p e i a e x e m p l i f i c a t e r a t in g in d o

p r o f u n d a m e n t e a s p r e t e n s õ e s d e u m a s o b e r a n ia d e s c o la d a d e q u a lq u e r l i m i t a ­

ç ã o o u c o m p r o m e t im e n t o r e c íp r o c o . D e s t a c a o a u t o r q u e a s o r g a n i z a ç õ e s n ã o

g o v e r n a m e n t a is ( O N G s ) t a m b é m s ã o c o n s id e r a d a s a g e n t e s t r a n s f o r m a d o r e s d o

E s t a d o , v i s t o q u e a id e ia c o n c e it u a i d e E s t a d o n à o m a i s s e a d a p t a à r e a li d a d e

a t u a l, p r in c ip a lm e n t e e m c o n s e q u ê n c ia d a s (d e s )e s t r u t u r a s in s t it u c io n a is

( M O R A I S , 2 0 1 1 ).

E s t r u t u r a l — a o a n a l i s a r a e v o lu ç ã o d o E s t a d o d o b e m - e s t a r s o c i a l , B o l z a n

e n t e n d e u q u e a d e m o c r a t i z a ç ã o d a s r e l a ç õ e s s o c i a i s , a lé m d e t e r f a c i l i t a d o a

r e g u l a ç ã o d a s r e l a ç õ e s d e t r a b a l h o , s e g u r id a d e s o c i a l , s a ú d e e o u t r o s , a b r iu

c a m i n h o p a r a a b u r o c r a c ia c o m o in s t r u m e n t o p a r a c o n c r e t iz a ç ã o d o s s e r v i ç o s

( M O R A I S , 2 0 1 1 ).

C o n s t it u c io n a l o u c r is e in s t it u c io n a l — re fe re - s e à f r a g iliz a ç ã o d a c o n s t it u i­

ç ã o , q u e , s e g u n d o B o lz a n , c o m o d o c u m e n to ju r í d i c o p o lít ic o , e s tá s u b m e r s a

e m u m jo g o d e in t e n ç õ e s e p o d e r e s ( M O R A I S , 2 0 1 1 ) , o u s e j a , m a n i p u l a d a

p a r a p r o g r a m a d e g o v e r n o n o lu g a r d e p r i m a z i a d o c o n t e ú d o c o n s t i t u c i o n a l

p a r a o q u a l f o i e la b o r a d a .

F u n c io n a l — r e fe r e - s e à p e rd a d e c e n t r a lid a d e e e x c lu s iv id a d e d o E s t a d o ,

q u e p o d e s e r s e n t id a p e lo E x e c u t i v o , L e g i s l a t i v o e J u d i c i á r i o , ó r g ã o s p e n s a d o s

c o m o e s t r a t é g ia d e d e s c o n c e n t r a ç à o d o p o d e r ( M O R A I S , 2 0 1 1 ), m a s q u e , n o s

d ia s a t u a i s , c o n f l i t a m n a m a s s i f i c a ç ã o d e s u p e r p o d e r e s .

P o l í t i c a — c o m o p a s s a r d o s a n o s , a d e m o c r a c ia r e p r e s e n t a t iv a , n o lu g a r d e

s e r u t i l i z a d a c o m v i é s d e r e p r e s e n t a ç ã o p o v o - E s t a d o , t e m s id o u t i l i z a d a c o m

v ié s d e in t e r e s s e s , t o r n a n d o - s e , a s s im , in c a p a z d c c u m p r ir o s d it a m e s d a

p o lít ic a e d a r e p re s e n ta ç ã o p o lít ic a , d e s e n c a d e a n d o p ro fu n d a c r is e p o lít ic a .

P a r a B o l z a n , a d e m o c r a c ia p a r t i c i p a t i v a s e r i a u m a e s p é c ie d e a l t e r n a t i v a d e

r e a r t i c u l a ç ã o d o s e s p a ç o s p ú b l ic o s ( M O R A I S , 2 0 1 1 ).
0 futuro do Estado

F i s c a l / f i n a n c e i r a — s e g u n d o B o l z a n , a c r i s e f i s c a l f in a n c e i r a d o E s t a d o e s t a r ia

p o r t r á s d c t o d a s o u d c , p e lo m e n o s , a m a i o r i a d a s c r i s e s ( M O R A I S , 2 0 1 1 ). A

p e rc e p ç ã o d o a u to r a o r e a liz a r o e stu d o d o E s t a d o d o b e m - e s ta r s o c ia l q u a n to

a o a l c a n c e d a c r i s e f i n a n c e i r a p a r e c e l ó g i c a , v i s t o q u e o s a b a lo s e c o n ô m ic o s

in t e r f e r e m s i g n i f i c a t i v a m e n t e n a s d i s t i n t a s e s f e r a s d o E s t a d o .

Id e o ló g ic a — s u r g e d o q u e s t io n a m e n t o d a s f o r m a s d e o r g a n i z a ç ã o e g e s t ã o

a d o t a d a s p e lo E s t a d o d e b e m - e s t a r s o c i a l , v i s t o q u e s e c o n f r o n t a r i a o s u c e s s o

d o E s t a d o s o c i a l c o m o m o d e lo d e g e s t ã o q u e s e e s t r u t u r a , o q u a l c o l o c a r i a e m

c o n t r a d iç ã o a d e m o c r a c i a , c o m o f o r m a p o l í t i c a , e a b u r o c r a c i a , c o m o a r r a n jo

f u n c i o n a l ( M O R A I S , 2 0 1 1 ).

F ilo s ó f ic a — d e c o rre d a d e s a g re g a ç ã o d a b a s e d o E s t a d o d e b e m - e s ta r s o c ia l,

o u s e j a , s e g u n d o B o l z a n , h a v i a u m a i n c a p a c i d a d e d e c o n s o l i d a r o p r o je t o

a n t r o p o ló g ic o q u e c o m p õ e o s e n t id o d a c o n s t i t u i ç ã o d o E s t a d o s o c i a l ( M O ­

R A I S , 2 0 1 1 ).

N e s s e s e n t id o , in d e p e n d e n t e m e n t e d o t ip o d e c r i s e q u e s o f r a o E s t a d o —

s e ja e la d e o r d e m c o n c e i t u a i , e s t r u t u r a l , c o n s t i t u c i o n a l , f u n c i o n a l o u p o l í t i c a

— , é c a d a v e z m a i s la t e n t e o f a t o d e q u e o s E s t a d o s c a m i n h a m p a r a a s u a

d e s e s t r u t u r a ç à o q u a s e p o r c o m p le t o .

Saiba mais

Para saber mais sobre o tema, consulte Morais (2011).

Estratégias de superação das crises


financeiras estatais
D e s d e a q u e d a d o a b s o lu t is m o e a r e m o d e la ç ã o e s t a t a l , o s E s t a d o s , e m g e r a l,

a s s u m i r a m a p o s iç ã o d e c r e d o r e s e d e v e d o r e s i n t e r n a c i o n a i s , e x p o n d o o g o ­

v e r n o à s o s c i l a ç õ e s d o m e r c a d o . N a t e n t a t iv a d e c r i a r u m g o v e r n o s ó li d o n o

q u a l s e ja a s s e g u r a d a a e s t a b ili d a d e g o v e r n a m e n t a l , o s E s t a d o s , c o m o p a s s a r

d o s a n o s , a d o ta ra m m e d id a s e s t r a t é g ic a s d e s u p e r a ç ã o d e c r is e f in a n c e ir a .

C o n s i d e r a n d o a s c r i s e s f i n a n c e i r a s e n f r e n t a d a s a o lo n g o d o s a n o s p e lo s

E s t a d o s , v e j a , a s e g u i r , c a s o s d e c r i s e e s u p e r a ç ã o a d o t a d a p e lo s E s t a d o s .
144 O futuro do Estado

L o g o n a s e q u ê n c ia , v e j a a o p in i ã o d e u m e c o n o m is t a c o m r e s p e it o à s f o r m a s

d e s u p e r a ç ã o c o m u m e n t e a d o t a d a s p e lo s E s t a d o s e o s s e u s e f e it o s p r á t ic o s .

C r i s e e s u p e r a ç ã o m e x i c a n a ( 1 9 9 4 - 1 9 9 5 ) — p o r v o lt a d e 1 9 9 4 , e m c o n s e q u ê n c ia

d e u m a t a x a d e c â m b io f i x a , a m o e d a m e x ic a n a , o p e s o , f a c il it a v a o in v e s t im e n t o

c o m e r c i a l, o q u e a t r a iu in v e s t id o r e s d e to d o o m u n d o . C o n t u d o , o g o v e r n o a m e ­

r ic a n o d a é p o c a , f a c e im in e n t e in f l a ç ã o , r e s o lv e u a u m e n t a r a t a x a d e ju r o s d o s

E s t a d o s U n id o s ( E U A ) . P o r c o n s e q u ê n c ia , in v e s t id o r e s , in c lu s iv e o s q u e in v e s t ia m

n o M é x ic o , s e n t ir a m - s e a t r a íd o s a in v e s t ir n o m e rc a d o a m e r ic a n o . D e v id o à f a lt a de

in v e s t id o r e s , o M é x ic o e n t r o u e m d e p r e s s ã o e c o n ô m ic a — n o in t u it o d e c o n t r o la r

a c r is e e o d e s e m p r e g o e m m a s s a , o g o v e r n o m e x ic a n o o p to u p o r d e s v a lo r iz a r a

s u a m o e d a (p e s o ). C o n t u d o , p a r a e v i t a r u m c o la p s o f in a n c e ir o q u e c o n t a m in a s s e

o u t r o s m e r c a d o s , o g o v e r n o d o s E U A , o F u n d o M o n e t á r io In t e r n a c io n a l ( F M I ) e

o u t r o s o r g a n is m o s in t e r n a c io n a is s o c o r r e r a m f in a n c e ir a m e n t e o E s t a d o m e x ic a n o ,

o q u e p o s s ib ilit o u o r e f in a n c ia m e n t o d a s d í v i d a s e a s e g u r a n ç a e c o n ô m ic a d o

P a ís . S e g u n d o o e c o n o m is t a M a n k i w ( 2 0 1 5 ) , o g o v e r n o n o r t e - a m e r ic a n o a ju d o u

o g o v e r n o m e x ic a n o a s u p e r a r a c r is e p e lo s s e g u in t e s m o t iv o s ( M A N K I W , 2 0 1 5 ):

■ a ju d a r o v i z i n h o d o S u l ;

■ e v i t a r a m a c i ç a i m i g r a ç ã o i l e g a l q u e p o d e r ia s e s e g u i r à in a d i m p l ê n c i a

d o g o v e r n o e a o c o la p s o e c o n ô m ic o ;

■ e v i t a r q u e o p e s s im is m o d o i n v e s t id o r e m r e l a ç ã o a o M é x i c o s e e s p a ­

lh a s s e p a r a o u t r o s p a í s e s e m d e s e n v o lv i m e n t o .

( 'r i s e e s u p e r a ç ã o a s iá t ic a (1 9 9 7 - 1 9 9 8 ) — d e f o r m a s e m e lh a n t e à c r i s e f i ­

n a n c e i r a v i v i d a a n o s a n t e s p e lo g o v e r n o m e x ic a n o , o s p a ís e s a s iá t ic o s ( p r i n c i ­

p a lm e n t e T a i l â n d i a , In d o n é s ia e C o r e i a d o S u l , e m c o n s e q u ê n c ia d a a lt a t a x a

d e j u r o s in t e r n a , d a f a lt a d e c o n f i a n ç a p a r a in v e r s ã o e c o n ô m ic a , d a q u e d a d o

p r o d u t o in t e r n o b r u t o [ P I B ] e d o in a d im p le m e n t o d e e m p r é s t im o s b a n c á r io s

n o P a ís ) e n t r a r a m e m c r i s e . A c r i s e d o s t ig r e s a s iá t ic o s , c o m o f ic o u c o n h e c id a ,

f o i r e v e r t id a p o r e m p r é s t im o s f in a n c e i r o s c o n c e d id o s p e lo s E U A e p e lo F M I ,

q u e , a lé m d is s o , f o r a m r e s p o n s á v e is p e la e la b o r a ç ã o d e u m a s é r ie d c m e d id a s

e c o n ô m ic a s q u e t iv e r a m c o m o o b je t iv o r e e s t r u t u r a r a c o n f i a n ç a e c o n ô m ic a d o s

p a ís e s a s iá t ic o s e m c r i s e , o b r ig a n d o a c o n t r a p a r t e a r e f o r m a r o s s e u s s is t e m a s

b a n c á r io s . C o m o s o c o r r o f in a n c e i r o in t e r n a c io n a l e a a d o ç ã o d e p r o p o s t a s d e

r e f o r m a s , o s p a ís e s e m c r i s e r e e r g u e r a m - s e e c o n o m ic a m e n t e ( M A N K I W , 2 0 1 5 ).

C r is e e s u p e ra ç ã o b r a s ile ir a (1 9 9 8 ) — e m c o n s e q u ê n c ia d a in s t a b ilid a d e

e c o n ô m ic a m u n d ia l d e 1 9 9 8 , o g o v e r n o b r a s i l e i r o , a f i m d e m a n t e r o e q u i l í b r i o
0 futuro do Estado

g o v e r n a m e n t a l e c o n ô m ic o e p o l í t i c o d o P a í s , r e a l i z o u a ju s t e s f i s c a i s , r e d u z iu

g a s t o s p ú b l ic o s , a u m e n t o u a s r e c e it a s t r i b u t á r i a s e e le v o u a t a x a b á s ic a d c j u r o s

d e 2 9 ,7 5 % p a r a 4 9 ,7 5 % . C o n t u d o , a s a l t e r n a t i v a s e m e r g e n c ia i s a d o t a d a s p e lo

P a í s à é p o c a n ã o s u r t i r a m e f e it o a c u r t o p r a z o , m a s , n o a n o s e g u i n t e , a p ó s

o a c o rd o d e e m p r é s t im o f in a n c e ir o r e a liz a d o c o m o F M I e c o m a a d o ç ã o d e

m e d id a s m a i s a g r e s s i v a s , o P a í s e x p e r i m e n t o u u m a li g e i r a s u p e r a ç ã o d a c r i s e

e s ta ta l ( M A R Q U E S ; F E R R E I R A , 2 0 1 0 ).

C o m r e l a ç ã o à s f o r m a s d e s u p e r a ç ã o a d o t a d a s p e lo E s t a d o , o e c o n o m is t a

C a i o K o c h - W e s e r ( 2 0 1 0 ) o p in a s o b r e o e n d iv id a m e n t o d o s g o v e r n o s , a f i r m a n d o

q u e q u a s e t o d o s o s e c o n o m is t a s c o n c o r d a m c o m o f a t o d e q u e o e n d i v i d a ­

m e n t o d o g o v e r n o d e v e s e r m e d id o e m t e r m o s r e a i s , n à o e m t e r m o s n o m in a is .

S e g u n d o o a u t o r , o d é f i c i t m e n s u r a d o d e v e s e r ig u a l à v a r i a ç ã o d a d í v i d a r e a l

d o g o v e r n o , n ã o à v a r i a ç ã o d a d í v i d a n o m in a l.

E v o c ê , o q u e p e n s a s o b r e a s m e d id a s a d o t a d a s p e lo s p a í s e s o r a e s t u d a d o s

p a ra s u p e r a r a s c r is e s ?

Poder paralelo

A s d is p u t a s p o r p o d e r , a m i s é r i a , a v i o l ê n c i a e o s c o n f l i t o s r e l i g i o s o s a o lo n g o

d e d é c a d a s c o n t r i b u í r a m p a r a d a r m a io r v i s i b i l i d a d e a o u t r o s f a t o r e s q u e , n o s

ú l t i m o s a n o s , t ê m r e s u lt a d o n a c o n f o r m a ç ã o d o s E s t a d o s , c o m o , p o r e x e m p lo ,

o a v a n ç o d a t e c n o lo g ia e o c r e s c im e n t o d o s g r u p o s t e r r o r i s t a s .

C o n s i d e r a d o s u m p o d e r p a r a le lo a o s E s t a d o s d e m o c r á t i c o s d e D i r e i t o , o s

g r u p o s t e r r o r i s t a s ( c u ja m a io r i a o b je t iv a e s t a b e le c e r u m r e g im e ú n ic o d e p o d e r

b a s e a d o p r i n c i p a l m e n t e e m p r e c e it o s r e l i g i o s o s ) t ê m r e m o d e la d o a m a n e ir a

c o m o o s E s t a d o s c o m b a te m a c r im in a lid a d e in t e r n a c io n a l. P o r c o n s e q u ê n c ia ,

a s n o r m a s i n t e r n a c i o n a i s e in t e r n a s p a s s a r a m a s e r c o n s t a n t e m e n t e r e f o r m u ­

la d a s n o s e n t id o d e c o m b a t e r o t e r r o r i s m o d i n a m i z a d o p o r g r u p o s t e r r o r i s t a s .

O g r u p o t e r r o r i s t a E s t a d o i s l â m i c o , t a m b é m c o n h e c id o m u n d i a lm e n t e c o m o

I S I S , e o g r u p o t e r r o r i s t a B o k o H a r a m s à o c o n h e c id o s p o r f a z e r e m u s o d e

a ç õ e s b á r b a r a s d e s t in a d a s a i n t i m i d a r , l i q u i d a r e a t e r r o r i z a r o s s e u s o p o s it o r e s ,

c o n s id e r a d o s p e lo s g r u p o s c m q u e s t ã o c o m o i n i m i g o s . C u r i o s a m e n t e a m b o s

o s g r u p o s t e r r o r i s t a s a t u a m p a r a i n s t a l a r à f o r ç a u m E s t a d o p a r a le lo d e n t r o

d e E s t a d o s le g ít im o s e r e c o n h e c id o s m u n d i a lm e n t e ( I r a q u e , S í r i a e N i g é r i a )

( L O W E , 2 0 1 1 ), m e d ia n t e a c r i a ç ã o d c u m c a l i f a d o , o u s e j a , d e u m n o v o E s t a d o

b a s e a d o n a r a d i c a l i z a ç ã o d a le i i s l â m i c a ( S h a r i a ) .

D e f a t o , p o r m a i s q u e u m g r u p o p a r a le lo a o E s t a d o im p o n h a a s s u a s le is

e c o n t r o l e o p o d e r , n ã o s e r á r e c o n h e c id o in t e r n a c i o n a l m e n t e c o m o E s t a d o

( C A L I X T O , 2 0 1 5 ) . P o r c o n s e q u ê n c i a , o R e i n o U n i d o , p o r e x e m p lo , p a s s o u a
146 O futuro do Estado

n o m e a r o E s t a d o is lá m ic o c o m o Daeshyc u jo s i g n i f i c a d o é d is c o r d ia . A a d o ç à o

d a e x p re ssã o Daesh d e v e - s e a o f a t o d c q u e s e r i a in c o r r e t o n o m e a r u m g r u p o

t e r r o r is t a c o m o E s t a d o .

N o e x t r e m o o p o s to a o t e r r o r is m o , c o n v é m d e s t a c a r o u tro fa to q u e ta m b é m

d e v e s e r o b s e r v a d o q u a n t o a o s u r g i m e n t o / r e c r ia ç ã o d e n o v o s E s t a d o s , v i s t o

q u e a t u a lm e n t e u m a e x p r e s s i v a p a r c e la d a s o c ie d a d e v i v e c o m o s e e s t i v e s s e

e m d o is m u n d o s , u m r e a l e o u t r o v i r t u a l , c o n v e r t e n d o - s e , a s s i m , e m s e r e s

c i b e r n é t i c o s ( i n d i v i d u o q u e f a z u s o c o n s t a n t e n a in t e r n e t ) q u e c o n v i v e m e m

c ib e r s o c ie d a d e ( s o c ie d a d e v i r t u a l s im u la d a ) n o s c ib e r e s p a ç o s ( r e a lid a d e v i r t u a l

s i m u la d a — E s t a d o s p a r a le lo - v ir t u a is ).

S e g u n d o o p r o fe s s o r N ic o la s C a b e z u d o R o d r ig u e z (2 0 1 1 , p . 7 2 , t ra d u ç ã o n o s s a ):

Seguindo as suposições básicas da dem ocracia, que procura garantir a ideia


de liberdade e da vontade coletiva, o ciberespaço apresenta-se com o um a
im portante ferram enta que busca garantir o espaço dem ocrático de liberdade
de expressão. Essa conjugação de interesses entre dem ocracia e ciberespaço
pode possibilitar o surgim ento de novos espaços de autocriação para todas
as áreas do conhecim ento.

O s g o v e r n o s , a t e n t o s a o fa t o d e q u e o h o m e m m o d e r n o é u m s e r v i r t u a l , tê m

b u s c a d o c r i a r r e d e s d e a c e s s o d e m o c r á t i c o v i r t u a i s , a f i m d e q u e a s o c ie d a d e

p o s s a , a s s i m , i n t e r a g i r c o m m a io r r a p id e z e m c o n ju n t o c o m o s g o v e r n a n t e s ,

d a n d o p a s s o à d e m o c r a c ia v i r t u a l , c ib e r d e m o c r a c ia o u e-democracy.
M a s o q u e s ig n if ic a c ib e r d e m o c r a c ia ? P a r a o p ro fe s s o r t u n is in o P ie r r e

L é v y ( 2 0 0 4 , p . 3 1 , tra d u ç ã o n o s s a ), c r ia d o r d a e x p re s s ã o c ib e r d e m o c r a c ia ,

e s ta s e r ia u m a “ E s p é c ie d e a p r o fu n d a m e n to e g e n e r a liz a ç ã o d o m e rc a d o , d o

t e r r e n o d e m o c r á t i c o e d a c o m u n i d a d e c i e n t í f i c a , s o b r e u m a l i v r e d iv e r s id a d e

n o e s p a ç o a b e rto d e c o m u n ic a ç ã o e d e c o o p e ra ç ã o ”

P a r a o p r o f e s s o r e s p a n h o l V ic t o r F . S a m p e d r o B la n c o (2 0 1 1 , p . 1 5 ), a

c ib e r d e m o c r a c ia é u m :

M odelo que respeitando a autonom ia relativa de quem exerce cargos rem u­


nerados de representação política, jo rn alística e de gerência adm inistrativa,
confere aos eleitores públicos e governados canais de participação e delibe­
ração. De modo que os cidadãos através da TIC podem tom ar um papel ativo
na proposta, debate, decisão, e im plem entação das políticas públicas, e da
com unicação política.

E m d e c o r r ê n c i a d o a v a n ç o t e c n o l ó g ic o e p r i n c i p a l m e n t e d a d e m o c r a c ia

v i r t u a l , p e r c e b e - s e q u e , p o r m e io d a t e c n o lo g ia d a i n f o r m a ç ã o e c o m u n i c a ç ã o

( T I C ) , a s o c ie d a d e , e m f u t u r o n ã o d is t a n t e , v a i s e t o r n a r u m c ib e r c id a d ã o
0 futuro do Estado

( a q u e le q u e e x e r c e o s d i r e i t o s d e c i d a d a n i a v i r t u a l m e n t e ) . C o n t u d o , o t e m a

s u s c i t a g r a n d e s d e b a t e s , p r i n c i p a l m e n t e p e lo f a t o d a lib e r d a d e v i g i a d a q u e

s e e s c o n d e a t r á s d a in t e r n e t .

N e s s e s e n t id o , p e n s e e r e f l i t a c o n s id e r a n d o a a t u a lid a d e : é p o s s í v e l e e x i s t e

u m a d e m o c r a c ia v i r t u a l n ã o v i g i a d a ? U t o p ia o u r e a lid a d e ?

Referências

BAUMAN, Z.; BORDONI, C. Estado de crise. Rio de Janeiro: Zahar, 2016.

CALIXTO, B. Por que alguns políticos passaram a chamar o Estado Islâmico de 'Da-
esh": Reino Unido diz que Estado Islâmico não é "nem um Estado, nem Islâmico',
e que passará a chamar o grupo de 'Daesh'. Mas o que é “Daesh'? Revista Época,
2015. Disponível em: <http://epoca.globo.com/tempo/noticia/2015/12/por-que-
-alguns-politicos-passaram-chamar-o-estado-islamico-de-daesh.html>. Acesso
em: 28 set. 2017.

MORAIS, J. L. B. de. As crises do Estado e da Constituição e a transformação espaço-


temporaldos direitos humanos. 2. ed. rev. ampl. Porto Alegre: Livraria do Advogado
Editora, 2011.

LÉVY, P. Ciberdemocracia: ensayo sobre filosofía política. Barcelona: Editorial UOC 2004.

LOWE, N. História do mundo contemporâneo. 4. ed. Porto Alegre: Penso, 2011.

MANKIW, N. G. Macroeconomia. 8. ed. Rio de Janeiro: LTC, 2015.

MARQUES, R. M.; FERREIRA, M. R. J. O Brasil sob a nova ordem: a economia brasileira


contemporânea. São Paulo: Saraiva, 2010.

RODRÍGUEZ CABEZUDO, N. Inclusión digital: perspectivas y experiências. Zaragoza:


Prensa Universitarias de Zaragoza, 2011.

SAMPEDRO BLANCO, V. F. Cibercampaña: cauces y diques para la participación. Madrid:


Editorial Complutense, 2011.

Leituras recomendadas

BACHA, E. (Org.). et al. Estado da economia mundial: desafios e respostas: seminário


em homenagem a PedroS. Malan. Rio de Janeiro: LTC, 2015.

CASSESE, S. Acrisedoestado. Campinas: Saberes, 2010.

CHEVALLIER, J . O estado pós-moderno. Belo Horizonte: Fórum, 2009.

GARCÍA-PELAYO, M. As transformações do estado contemporáneo. São Paulo: Forense, 2009.


148 O futuro do Estado

LA UNIÓN Europea, ante la mayor crisis de su historia. Clárin.com. 2016. Disponível em:
<https://www.clarin.com/mundo/Union-Europea-mayor-crisis-historia_0_HkKwt6qr.
htm lx Acesso em: 28 set. 2017.

MENEZES, A. Teoria geral do Estado. Rio de Janeiro: Forense, 1999.

SILVA, A. M. A aventura da moeda única europeia: enredos e dilemas, progressos e


desafios ensaio de historia e de política. Coimbra: Imprensa da Universidade de
Coimbra, 2017.

STRECK, L. L.; MORAIS, J. L. B. de. Ciência política e teoria do Estado. 5. ed. Porto Alegre:
Livraria do Advogado, 2006.
' ---------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- --

Você também pode gostar