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21 ANOS DE REGIME MILITAR Balangos e perspectivas Gléucio Ary Dillon Soares Maria Celina D’ Araujo (organizadores) Almir Pazzianotto Pinto David Fleischer Dulce Chaves Pandolfi Eli Diniz Hélgio Trindade Maria D’ Alva Gil Kinzo Rubens Penha Cysne Sénia Miriam Draibe = ERR WNT arm eeu ‘SBD-FFLCH-USP gO EDITORADAFUNDACAO GETULIO VARGAS. Rio de Janeiro — RJ, 1994 isso fo acontce devdo ao aranjo police gue snsauoue man aso ‘ coneebidas¢ implenestads. Em su itcionaas, foo aveso do milagre qu iedade brasileira de trilhar caminhos de justica, desenvolvi- ade. ‘io poderia ser feito sem 0 apoio de visas instituigSes de fornen- to que trai ate tém prestigiado 0s trabalhos do CPDOC ¢ as atividades i. Queremos, portanto, registrar aqui nostos agradecimentos 40 CNP, & Finep ¢ 0 North South Center, que vem colsborando com os organi- _zatdores em seus estudos sobre o regime militar brasileiro O Golpe de 64 Glducio Ary Dillon Soares* ‘A situagSo comegou a mudar na década de 70, Stepan (1971) uso, intl gentemente, dados publicados e algumas entrevistas com alta patents do grupo * Dowtor em sociclgin, professor da Universidade dt Flérida © pesqusedoe essocado. do ‘cPDOCFGY. * No sentido de que, se wna explicaso stb determine glpe «uma congo que mune ext, tem um veo de oigem ¢ doves descends * Inia poe Glico Ary Dion Soares, pesqulsndorresponsivel, endo hae como passes as- sociados Maria Celia D’ Anuj, Deke andl Ceo Caso. O prjeo rstbenaunio do CNG, da Universidade da Pid, do Not South Center do CPDOC, onde a ealzoy «mao pate 0° Jota de dado. » Sem mension o fo Je que, drt a ses mas fechas do rep, esque temas niaces podia pert problemas police de vegan pr os pesasadores. ’ A hostilidade dos militares a Goulart er, portant, antiga, dalando pelo menes sda €poca da rensincia de Hnio. Em verdade, a hostilidade de alguns militares a Jango 6 sinda mais niga, dtando das suas atvidades como ministo do Trabalho. A caracterizagto do golpe Que foi o golpe? Tantos autores descreveram o golpe como deflagrado pela bur- ‘guesia, pelas multinacionais, pelo poder econ6mico etc., que convinha averiguar que pensam os militares, H pouca divida, na meate dos que conspiraram e de- amo golpe, sobre o que ele representow. Tinhamos cinco respostasallerativas, Saidas da leitura dos préprios textos, das primeiras entrevistas com militares e da literatura sobre-o tema: 1. Conspiragio dos grupos econdimicos brasileiros; 2. Conspiragao dos grupos econémicos brasileiros com apoio do governo norte- americano; 3. Conspiragdo dos militares com apoio dos grupos econdmicos brasileros; a“ 4, Conspiracio dos grupos econdmicos brasileiros com apoio dos militares e das rmultinacionais; '5. Conspiragao dos grupos econdmicos brasileiros com apoio das yma sé vez em qualquer dos texios. Assim, duas opg6es, encontré- ‘eis na literatura, nfo mereceram uma s6 mengZo dos militares consultados, de- que hi um divéreio entre a caractrizagko do golpe pela literatura poltico-socolégicae a percepeso do que foi o golpe por parte dos proprios mili tares. As razbes dadas pelos militares para o golpe ‘Considerando os cinco grupos de explicagbes, as ts mais frequentes nos textos ‘escritos por militares a respeito do golpe (cao, perigo comunista ¢raz6es milit res) eas duas dominantes na literatura profissional ¢ jomalistica (razdes econd- micas e razSes extemas), computamos primeiramente 0 némero de péginas em ‘que cada autor mencionou cada um dos fatores. Iso nos permit aquilatar, para ia de cada grupo de ftore. Entretanto, nfo ‘autores porque a extenso dos documentos textos ao motivo central de mais de um livro, os fatores externos, identificados como miiares de utes piss ou como o pro govero dos EUA. Somente Cone de aris, qu bmi er beset ese apoio, Ine Pore acl {nam ofatopenom dos outtos 0 menciona. 0s fatores econdmicos, am uma presenga marginal nos: " ‘sequer se aproximaram dos ators mais mencionados. A estagnaso, a inflago ¢ Quadro 3 Freqiigncia absoluta dos blocos de justiicativas, por autor Astres® ‘Moar Fhe Coser de Frias Herman Aguiar Aston Caros Marc Jaime Portela de Melo Exécito treo [Nelson de Malo ‘Mout Fo Coe de Farias edn’ D’Aguiar Antonio Carlos Musici ‘Kime Podla de Melo 9. 117-44 Tal 132 pias Exc (colts de 25 wien, ve ho de Meo de etevisos i, I-68 Blocos de jastifiaias Comurismo Mittaes Econdmicas Exernas © fim da etapa fécil da substituigdo de importagbes talvez fossem 08 fatores que ‘mais contaram para a populago, mas nio tiveram saliéacia no pensamento mili- tar, Embora sua existéncia fosse mencionada em todos os textes, exceto no de Nelson de Melo, em todos ocuparam posigdes muito discretas, sem significagio ‘quantitative ou qualitativa, 36 a em dois. Outro f 2 apatia do alto comando militar, foi mencionada por Cordeiro de Farias, Mourio Filho e Portela, assim como em virias entrevis- 1s, As razbes para o golpe nas entrevisias com militares Ocaos Cordeiro de Farias, um dos principais conspiradores, enfoca 0 caos desde 0 in gulo politica. Afirmou perceber, por um lado, um plano janguista de sabotar € desestabilizar 0 parlamentarismo e, por outro, a paralsia decis6ria, a ingoverna- bilidade da administraggo Goulart: ‘Mas Jango ¢ seus assessorescomeparam a sabotar 0 parlamentarismo. cabricaram se crises no Congresto¢ todo 0 sista rv, O Gabinete de ‘Tancredo Neves durou pouco tempo. O que o seguiu, menos ainda. E assim { por dante. A medida que esses governos se sucediam, mais fracos eles nt estavadeterminado a enfraquecer pariamentarisa a , cedendo a pressdes ora de uns, ora de outros, sem saber 0 fo influenciado pelo cunhado...” (Camargo & Gées, p. 541). general Portela percebeu 0 caos como intencional ¢ dentro de uma pers- iva faseol6gica, por etapas: “[64]...clodiu exatamente para evitar 0 aos, ero passo para a implantago do governo da agitagdo comunista” (1979, (0 perigo comunista Evidentemente, as vr ‘que: elas se relacionay ificativas nfo foram apresentadas de mancira esten- Aguiar, que participou ativamente da cons- tropa”, e exerceu fungSes na érea de relagdes pablicas durante o govemo de Cos- tae Silva, focaliza o crescimento do comunismo, mas vé no caos provocado pela inflago uma importante condigo que faclitava aquele erescimento: “0 comunismo foi crescendo. Acenando com utopias, levantando a bandei- ra de algumas boas causas, falando em nome de reformas de base e prome- fendo sempre, 0 PC continuou sua penetracdo facilitada pela fragitidade de nossa estrutura social e explorando 0 caos econdmico que 0 governo infla- ie Juscelino Kubitschek promovera’ 1976, p. 19). Mais adiante, D'Aguiar volta a insistir na tecla da comunizagio, citando 0 apoio de professores.” “Mais de 400 professores univesitries, tendo a frente Sobral Pinto e Hélio | Toaghi, fancam manifesto @ nagdo acusando 0 governo federal pela atta. \ de complacente diante do processo de conuunizagdo do Brasil” (D' Aguiar, 1976, p. 109). ‘A leitura dos textos de Hemani D’Aguiar nfo deina divide quanto & impor- tincia central da comunizacio; 0s demas fatores adquiriram relevncia porque contribufram para, ot de algums taram, 0 erescimento do comunis- mo, visto como o grande perig. de aliangas com alguns dos prin “Antes de partite, decididamente, para o terrorismo, os comunistas brasi- leiros tentaram participar do poder aliando-se a grandes partidos como iar 0s candidatos desses partides, Juscelino Kubits- ‘chek emarechal Teixeira Lot” (D' Aguiar, 1976, p. 79). A preocupagao com 0 comunismo esté presente também de maneira vincula- a interference assis militares, Herman D Aguiar pecben a sus go do general Maurel] Filho como um ato polftico, decorrente do scu anticomu- ism} “No inicio de novembro de 1962, 0 general Emilio Maurell Fitho, Cmte. da 24RM, que extova ness inpotante comando é apenas quatro mess, fo de, removido apenas por ter mandado intensificar, jurisdigdo, a instrugdo contraria & Guerra Revol pperigo de sua infitiragdo nos quartéis” (D Aguiar, ° Aguiar parece ter esquecio, convenietemente, qué um dos cadosnainaimente, Sobral Pit, foi um dos brasteros qu mas aura em defesa dos toradn perepudos poles. ividade eminentemente pottical Ura de esquerda era definido como apol- ‘Alguns militares, como o general Antonio Carlos Murici, vincularam os pro- blemas de disciplina ¢ de hierarquia nas forcas armadas a uma tentativa intencio- nal de penettar as forgas armadas, de dividi-las: “é preciso ressaltar que os comunistas sentiram a importancia do problema ¢ procuraram penetrar nas nossas forpas armadas de maneira a destrair suas bases: di ¢ hierarquia, Tentaram quebrar a unio, jogando ir- ‘dos contra-irmaos” (Muri, 1964, . 12). Mais uma vez, aparecem juntos dois problemas: o da quebra da hierarquia © a percepgio de que havia unta tentativa comunista de tomar 0 podes i penetrando e dividindo as forgas armadas. coronel Cyro Etchegoyen, que participou ativamente do desenvolvimento do Centro de Investigacées do Exército (CIE) e do que os militares chamaram de “gluta conira a subversio”, a repressio & luta armada, colocou as razées de or- {dem politico-ideol6gica no primero plano: 1nés tinhamos no Brasil uma Repiblica sindicalista, Um presidente ta, todo mundo estava na Repsblica sindicalista. Um movimento comu- nista muito forte no Brasil. Vindo de fora e aqui de dentro. Muito forte. Para o general Murici, a centralidade da ameaca comunista era tal que, na sua opinifo, se Goulart a combatesse, nfo teria sido derubado: “Mas... podem acreditar na palavra sincera de um soldado: se o sr Joao Goulart houvesse permanecido no centro e ficado contra as comunistas, ele ‘ainda seria presidente da Repiblica” (Murii, 1964, p. 15). ‘Outro testemunho importante foi o do general Octévio Medeiros, que duran- te ‘anos chefiou o SNI. O general Medeiros, entio um tenente-coronel 3 © coyonel Eichegoyen roate una dimensio geopoiea ners, ma media em que sublisbou. em cura pte du entrevista, nflotcia de Sto Pa, prcularmente das eles pauls, noma igo ‘dm cli favorve ao golpe quanto, nal ecentemere 20 impedinesio de Cole. » (0 general Portela acusou o governo Goulart de permitir uma campanha dou- trindria comunista: “Cartithas, seguindo ox modelos marxistas, eram publicadas com slogans inadas d alfabetizagao de Para o general Reinaldo Almeida, que conspirou ativamente e que se enqua- ay detino como quase totais aqulsinsinigses qu diet, mas nfo impede, 0 ont de seus membros com outor membros da secede loa Esse olen pce se vluntisio. Os mil tures tm um ato gras de solamente svi. A inepiro para en conceuliaso,evdentement, vem de Goffin (1961). “ 1) comparar 0 padrdo das hierarquias enc ‘autares scadémicos, o que nos permitiu constatar um di- NT Houve mudangas, para [Seeeei -se As demais conspirapSes, 0 apoio militar a Joto ulart foi deposto quase sem resistencia, ¢ 0 Brasil itar que duraria 21 anos. Referéncias bibliogeificas Inequality, poverty, and development. Journal of Develop- 107-42, Dec. 1976, ‘Bocha, Edmar. Ms alld de la curva de Kuznets. In: Mufioz.G., Oscar ed. La disribu- ‘itn del ingreso en América Latina, Buenos Aires, El Cid, 1979. p. 29-6. Buescu, Mircea, 300 anos de inflagdo. Rio de Janeiro, Apec, 1973. Camargo, Aspésia & Gées, Walder de. Meio século de combate: didlogo com Conteiro de Farias. Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1981. ‘Campos Coetho, Edmundo. Em busca de identidade, O Exército e a politica na -sociedade brasileira. Rio de Janeiro, Forense, 1976. Cardoso, Femando Henrique. 0 modelo politico brasileiro, Sio Paulo, Dite!, 1972. 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Anexo 1 1 — Apatia do alto comando militar 2— Apoio popular 20 golpe; 3—Cuos, desondem ¢ instabilidade politica; 4 — Conspiragéo dos grupos econdmicos brasileiros; 5 — Conspiragao dos grupos econdmicos brasileiros com apoio do govern norte-americano; 6 Conpirao ds mae om apoio dx apo xoniins rs 7 — Conspiragio dos grupos econdmicos brasileiros com apoio dos milita- res e das multinacionais; 8—Conspira¢do dos grupos econdmicos brasileiros com apoio das multi- nacionais; 9 —Corrupgao,roubo de verba pablica, 10 —Crescimento do PTB, em particular; 11 — Crescimento dos partidos de esquerda, em geral 12.— Case hierérquice militar; 13 —Denrota dos partidos conservadores; 14. — Descontentamento da classe operdsia; 15 — Estagnagio econdmica; 17 —Forma de govero presidencialist; 18—Greves; 19 —Iegitimidade da poli 20— Iegitimidade dos politicos; 21 — Incompeténcia politico-administrativa de Joio Goulart; 22 —Ineficiéncia administrativa do governo Goulart; 23 —Inflagio; 24 —Influéncia comunista no governo; 25 — Influéncia comunista no meio militar; 26 — infludncia militar norte-americana; 27 — Insatisfagio dos militares com salétios; 30 — Perigo comunista e subversio; 31 —Projeto fascista, 32 — Redugio do orgamento militar; £33 —Significatvo apoio do govern nore-americano; 34—Sindicalsmo,

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