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A PERICULOSIDADE POR RADIAÇÕES IONIZANTES

Preliminarmente, é necessário que se faça distinção entre as radiações ionizantes produzidas por fontes naturais e
por fontes artificiais. As radiações geradas por fontes naturais são largamente utilizadas em radiodiagnósticos e
tratamento, por meio de equipamentos que no seu interior possuem efetivamente uma fonte de radioisótopo. Ao
contrário, as radiações produzidas por fontes artificiais são os equipamentos que produzem raios X por meio de
eletricidade, e que podem ser controlados para emitir maior ou menor quantidade de radiação, podendo ser ativados
ou desativados a qualquer momento.
Desta forma, é preciso que fique bem nítida a diferença entre um e outro; o equipamento com fonte natural dispõe de
um radioisótopo em seu interior, que apesar de controlado, pode oferecer perigo de vida se este equipamento for
devassado e a fonte exposta ao exterior, caso idêntico ao ocorrido em Goiânia com o Césio-137; o mesmo não
acontece com o equipamento de raio X, que não possui qualquer fonte, pois sua radiação é induzida por eletricidade,
e uma vez desconectado da energia, está extinta a possibilidade de existência de radiação, mesmo que o
equipamento for devassado.
Naturalmente existem exceções, como alguns hospitais que utilizam equipamentos de raio X com mais de 50 anos,
totalmente obsoletos e defasados em relação à tecnologia, que apresentam vazamento de radiações, expondo a risco
tanto o paciente quanto o operador.
Compartilhamos da corrente que preconiza a não utilização do tempo de exposição como parâmetro para a
caracterização da periculosidade, mas diferentemente do que acontece com os agentes eletricidade, explosivos e
inflamáveis - cujos acidentes via de regra são fatais - o mesmo não ocorre com a radiação, uma vez que seu
mecanismo de exposição segue basicamente o princípio da dose; além do que, exceto em casos de exposição aguda,
o tempo de latência pode ser da ordem de dezenas de anos, e os seus efeitos vão se revelando lenta e paulatinamente
no organismo.
Desta forma, por que se considerar todos os casos de exposição à radiação como periculosos, se nem todas as
situações apresentam risco imediato à vida? Inclusive, em alguns casos, os efeitos são reversíveis, comportando-se
mais como um agente insalubre do que propriamente periculoso.
De acordo com o magistério dos Professores Samuel Glasstone e Alexander Sesonske 1:
Se entende por exposição crônica a exposição freqüente - diária, por exemplo - a intensidades de
radiação relativamente baixas, tais como as que podem encontrar-se em operações relacionadas
com os reatores nucleares. Em geral, para a mesma dose total de radiação, a exposição crônica
tem conseqüências menos graves que a exposição aguda. Quer dizer, certa dose de radiação
recebida por um indivíduo em alguns segundos pode causar dano, ainda que a mesma dose
repartida por vários anos pode ser de efeitos inapreciáveis. Dito de outro modo, no que diz
respeito à extensão da lesão biológica, é tão importante a dose total de radiação como a dose por
unidade de tempo, isto é, a dose recebida em um intervalo de tempo determinado. Quanto menor
a dose total e a dose por unidade de tempo, menor será a lesão. Para alguns tipos de lesões por
irradiação, o organismo parece ter certa capacidade de recuperação, o que significa que os
efeitos não são cumulativos ao longo do tempo. Há, todavia, exceções muito importantes, entre as
quais se encontram os efeitos genéticos, que são provavelmente de tipo cumulativo.
De acordo com anexo da Portaria n 3.393, de 17-12-87, atividades e operações perigosas com radiações ionizantes
ou substâncias radioativas - atividades/área de risco, envolvem as seguintes tarefas:
1. Produção, utilização, processamento, transporte, guarda, estocagem e manuseio de materiais radioativos,
selados e não selados, de estado físico e forma química quaisquer, naturais ou artificiais;
2. Atividades de operação e manutenção de reatores nucleares;
3. Atividades de operação e manutenção de aceleradores de partículas;
4. Atividades de operação com aparelhos de raios X, com irradiadores de radiação gama, radiação beta ou
radiação de nêutrons;
1
Ingenieria de Reactores Nucleares, Editorial Reverté S.A., Barcelona, 1975.
5. Atividades de medicina nuclear;
6. Descomissionamento de instalações nucleares e radioativas;
7. Descomissionamento de minas, moinhos e usinas de tratamento de minerais radioativos.
Via de regra, são atividades em que especificamente se manuseiam fontes e amostras radioativas, amostras e corpos
irradiados, ou mesmo seus rejeitos e manutenção dos equipamentos, tais como calibração, ensaios, testes e
inspeções.
Os acidentes nucleares com vítimas fatais reportados na história, sem exceção, são acidentes envolvendo usinas
nucleares com fontes naturais de radioisótopo. Atualmente, existem mais de 400 usinas nucleares em operação no
planeta, a maioria nos Estados Unidos, França, Inglaterra e países do Leste europeu.
Alguns dos acidentes catalogados:
 Em 1957, escape de radioatividade de uma usina inglesa situada na cidade de Liverpool.
 Em setembro de 1957, um vazamento de radioatividade na usina russa de Tcheliabinski contamina 270 mil
pessoas.
 Em dezembro de 1957, o escape de resíduos da extração de plutônio em Kyshtym, na Rússia. Mais de 30
pequenas comunidades, num raio de 1.200 km², foram apagadas do mapa na antiga União Soviética desde
1958, e 17.200 pessoas foram evacuadas.
 Em outubro de 1966, o mau funcionamento do sistema de refrigeração de uma usina de Detroit causa o
derretimento parcial do núcleo do reator.
 Em janeiro de 1969, o mau funcionamento do refrigerante utilizado num reator experimental na Suíça
inunda de radioatividade a caverna subterrânea em que este se encontrava.
 Em março de 1975, um incêndio atinge uma usina nuclear americana do Alabama, queimando os controles
elétricos e fazendo baixar o nível da água de resfriamento do reator a níveis perigosos.
 Em março de 1979, a usina americana de Three Mile Island, na Pensilvânia, é palco do pior acidente
nuclear registrado até então, quando a perda de refrigerante fez parte do núcleo do reator derreter.
 Em abril de 1986, ocorre o maior acidente nuclear da história, quando um dos quatro reatores da usina
nuclear soviética de Chernobyl explodiu, lançando uma nuvem radioativa que cobriu todo o centro-sul da
Europa. A estimativa de mortes chega a 300 mil; o número total de pessoas contaminadas seria de cinco
milhões, e a área inutilizada pela radiação foi de cerca de 140 mil km², equivalente à área de um Portugal e
meio.
 Em setembro de 1987, a violação de uma cápsula de césio-137 por sucateiros da cidade de Goiânia, no
Brasil, mata quatro pessoas e contamina outras 249. Três pessoas morreriam mais tarde, vítimas de doenças
degenerativas relacionadas à radiação.
 Em junho de 1996, acontece um vazamento de material radioativo de uma central nuclear de Córdoba,
Argentina, que contamina o sistema de água potável da usina.
 Em dezembro de 1996, o jornal San Francisco Examiner informou que uma quantidade não especificada de
plutônio havia vazado de ogivas nucleares a bordo de um submarino russo, acidentado no Oceano Atlântico
em 1986. O submarino estava carregado com 32 ogivas quando afundou.
 Em março de 1997, uma explosão numa usina de processamento de combustível nuclear na cidade de
Tokai, Japão, contamina 35 empregados com radioatividade.
As lesões variam desde pequenas queimaduras na pele até sarcoma ósseo e morte prematura. Não existem sensações
corpóreas que indiquem a presença de radiações, exceto quando se trata de intensidades muito altas, em cujo caso se
experimenta a sensação de queimadura ou sintomas como queda de cabelo, avermelhamento da pele, mal estar etc.,
denominados também como efeitos somáticos, que só acontecem se a dose absorvida for extremamente alta, sempre
acima de 200 ou 300 rad, num pequeno espaço de tempo (por exemplo, um dia).
Os efeitos genéticos são aqueles que ocorrem nas células germinativas, não provocando sintomas no indivíduo;
entretanto, envolvem os genes que transmitem a hereditariedade, podendo provocar alterações ou mutações,
descontroladas e indesejáveis nos descendentes, e seu efeito pode se estender por várias gerações. Pesquisas
mostram que alguns danos somáticos são reversíveis; entretanto os danos genéticos parecem ser cumulativos e
irreversíveis.
Os efeitos biológicos das radiações possuem algumas características:
 Especificidade: podem ser provocados por outras causas que não as radiações, isto é, não são características
(específicas) das mesmas. Outros agentes físicos, químicos ou bioquímicos podem causar os mesmos
efeitos;
 Transmissibilidade: a maior parte das alterações causadas pelas radiações que afetam uma célula ou um
organismo não se transmitem. Devemos, porém, citar os efeitos hereditários que podem ser transmitidos a
outros organismos através da reprodução.
 Limiar: certos efeitos biológicos exigem, para se manifestar, que a dose de radiação seja superior a um
valor mínimo chamado dose limiar. Temos, também, os efeitos que não necessitam de uma dose mínima
para se manifestar. A existência de um limiar não significa que não houve nenhuma ação abaixo dele;
mesmo para doses baixas, ocorrem fenômenos físicos, químicos e bioquímicos, mas os efeitos biológicos
não aparecem, ou por restauração da célula ou porque as células foram trocadas por células jovens.
Trabalhos americanos têm demonstrado que as radiações podem potencializar os efeitos do fumo no organismo
humano, por exemplo:
Estudos2 têm mostrado a relação cumulativa entre exposição a radiações e o risco de câncer
brônquico. Fumaça de cigarro substancialmente amplia a taxa de câncer de pulmão,
particularmente a altos níveis de radiação.
Urânio e outros minérios de metais, decaem para outros isótopos, dois dos quais são alfa
emissores radioativos. A radiação por raios alfa, quando presente em estreita proximidade de
células bronquiais, causa danos locais e ultimamente formação neoplásmica 3. Gases radioativos
podem adsorver partículas que são então inaladas e depositadas nos pulmões. A fumaça de
cigarro pode ser uma importante fonte de partículas para transferir radiação aos pulmões. O
próprio tabaco é também uma fonte de polônio-210. Conseqüentemente, fumantes podem ter um
risco aditivo de radiações em acréscimo ao risco de outras fontes de radiação. É esperado que o
efeito da carcinogenicidade da radiação seja promovido por materiais tóxicos na fumaça de
tabaco, que poderia explicar o pequeno ataque e o tempo de latência do desenvolvimento de
câncer em mineiros de urânio que são fumantes.

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