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Esta é uma edição especial promovida pelo Instituto

Schaeffer. Somos gratos a Deus pela colaboração ímpar


do pastor Pedro Pamplona conosco.

Conheça outros e-books gratuitos acessando


www.institutoschaeffer.com.
SOBRE O INSTITUTO SCHAEFFER
DE TEOLOGIA E CULTURA

O Instituto Schaeffer é formado por servos de Cristo,


de variadas denominações genuinamente cristãs,
alcançados por Sua Graça, que foram chamados para
dedicar seus dons e talentos para a expressão da Glória
de Deus em todas as suas atividades, dentro e fora da
igreja. São homens e mulheres com longa trajetória
de serviço em suas igrejas locais e em ministérios
paraeclesiásticos, que se esforçam para demonstrar o
Amor, a Verdade e a Justiça de Deus em seus ambientes
de estudo e trabalho.
SOBRE O AUTOR

Pedro Pamplona é casado com Laryssa e pai de Davi e


Ester. Formado em Administração e Mestre em Teologia
Sistemática, é pastor da Igreja Batista Filadélfia, em
Fortaleza, e faz parte do time de servos do Instituto
Schaeffer.
INTRODUÇÃO
As tentações homossexuais fazem parte da realidade da igreja. Por muito tempo, a
cultura geral e eclesiástica escondeu esses casos por trás de rótulos, preconceitos,
falta de informação, falta de sabedoria e má teologia. Atualmente, existe uma
liberdade maior para falar sobre isso no meio protestante. Cada vez mais, jovens
têm procurado aconselhamento para lidar com essas tentações, que a literatura
recente tem chamado, mais adequadamente, de atração por pessoas do mesmo
sexo. Este texto tem o objetivo de oferecer um caminho bíblico para pastores e
líderes que aconselharão pessoas com esse tipo de atração ou para as próprias
pessoas que estão sendo tentadas. Confio que a Bíblia tem um bom caminho para
oferecer nesse processo de aprendizado, arrependimento, santificação e esperança
diante das tentações homossexuais.
Em outubro de 2016, publiquei um texto em meu blog pessoal chamado Carta
de um calvinista a uma jovem com tentações homossexuais1. O texto foi motivado
por uma mensagem que recebi em meu Facebook. Coloco aqui um trecho dessa
mensagem para que o leitor tenha noção mais adequada sobre o que estou tratando
aqui.

Não sei se vc irá ler essa minha msg, mas não poderia deixar dormir sem antes te
escrever. Assim como Paulo tenho um espinho na minha fé, tive 3 relacionamentos
homossexuais e todos altamente destrutivos, hoje com um pouco mais de um
mês que terminei com a minha ex me vejo perdida e desamparada, sou cristã
a quase 10 anos e já falei do meu homossexualismo para o meu Pastor […] Eu
amo teologia, já pensei em diversas vezes fazer, mas esse meu espinho na carne
me coloca para baixo. Já pensei e ainda penso ás vezes em tirar a minha vida [...]
Cada vez mais me convenço que não estou salva, que não faço parte da geração
eleita e que estou predestinada ao inferno, mas isso é algo que me inquieta e me
machuca muito [...] Pedro será mesmo que estou destinada ao inferno? Como
o calvinismo aborda isso? E o mais importante, será que terei uma vida estável

1 PAMPLONA Pedro. https://pamplonapedro.wordpress.com/2016/10/04/carta-de-um-


calvinista-a-uma-jovem-com-tentacoes-homossexuais/. Acesso em 10/12/2018
6 | Romanos e a Homossexualidade

e feliz com Cristo? Será que terei contentamento NELE? Ou será que sou uma
incrédula com curiosidade no Cristianismo? Preciso de ajuda.2

Existem pessoas sofrendo dessa forma dentro das nossas igrejas. Pessoas sem
esperança e até mesmo com pensamento suicidas. Desde o dia que publiquei minha
carta resposta, tenho recebido várias mensagens parecidas com essa pelas redes
sociais. São pessoas procurando conselhos sobre como lidar com essa tentação. Há
um contexto que sempre se repete. São jovens membros de igrejas que aparentam
não ter coragem ou liberdade para tratar disso em suas comunidades locais. Eles
encontram em figuras públicas na internet alguma esperança para suas lutas. Estão
buscando, muitas vezes, somente alguém que escute (leia) seus dilemas e ore por
eles. Por que não buscar isso em suas próprias igrejas? O que os impede de tratar
isso pessoalmente? Devemos pensar sobre isso.
Percebo dois lados nesses casos. Há o lado da própria pessoa não estar disposta
a confessar seu pecado cara a cara com sua igreja e não desejar passar por um
processo de aconselhamento e, se necessário, disciplina. Sei que isso é verdade
em parte desses casos, mas gostaria de focar no outro lado, o da igreja. Se por um
lado bons livros e ótimos materiais na internet têm ajudado pessoas com tentações
homossexuais a se sentirem mais livres para falar sobre isso, por outro lado, muitas
igrejas, principalmente as mais tradicionais, ainda não lidam com esse assunto de
forma adequada. Há uma grande imaturidade eclesiástica nesse ponto que precisa
ser resolvida. Muitos evangélicos tratam esse pecado como a “blasfêmia contra o
Espírito Santo”. Muitas igrejas não falam sobre isso e geram um ambiente hostil a
qualquer possibilidade de conversa.
Se esse é um problema real, então precisamos enfrentá-lo. A demanda existe
e tem aumentado. Precisamos nos preparar para ela. Precisamos ter respostas
bíblicas para jovens que estão sofrendo pela luta solitária contra a atração por
pessoas do mesmo sexo. Quero oferecer uma contribuição através da carta de
Paulo aos romanos. Creio que esse é o melhor livro bíblico para ser usado em
aconselhamentos nessa situação. É lá que encontramos, no capítulo um, o texto
mais direto e profundo sobre homossexualidade no Novo Testamento. E não só
isso, é no restante de Romanos que encontramos o caminho da graça divina para
lidar com esse pecado e suas tentações. A proposta deste e-book é apresentar uma
estrutura de aconselhamento bíblico para pessoas com tentações homossexuais

2 Ibid.
Um guia de evangelismo e aconselhamento através da grande carta do apóstolo Paulo | 7

a partir da soteriologia de Paulo em Romanos. Olharemos para o problema da


homossexualidade e depois para sua solução graciosa.
1. O PROBLEMA DA HOMOSSEXUALIDADE
EM ROMANOS 1:26-27
Esse é o principal texto do Novo Testamento sobre o pecado homossexual:

“Por causa disso Deus os entregou a paixões vergonhosas. Até suas mulheres
trocaram suas relações sexuais naturais por outras, contrárias à natureza. Da
mesma forma, os homens também abandonaram as relações naturais com as
mulheres e se inflamaram de paixão uns pelos outros. Começaram a cometer atos
indecentes, homens com homens, e receberam em si mesmos o castigo merecido
pela sua perversão.” (Romanos 1:26-27)

Entender esse texto é o primeiro passo para lidarmos com as tentações


homossexuais. Precisamos interpretá-lo no seu contexto e responder a duas
perguntas: (1) Homossexualidade é pecado?; (2) Qual é o grande problema com
a homossexualidade? Perceba que a segunda pergunta pressupõe que a reposta
da primeira é afirmativa. Esse é o caminho que vamos seguir. Demonstrarei que
sim, Romanos 1:26-27 está afirmando a pecaminosidade da homossexualidade.
Com isso estabelecido, procuraremos pelo grande problema com esse pecado.
Descobrir o que está por trás da homossexualidade nos guiará corretamente para
o caminho adequado de aconselhamento.
Quero responder a primeira pergunta com dois objetivos em mente: ajudar os
conselheiros a responder melhor essa questão e afirmar com convicção o pecado
da homossexualidade para jovens que tem lidado com ele. Não podemos deixar
dúvidas quanto a isso. O primeiro passo para a restauração é o reconhecimento
do pecado e não a tentativa de justificá-lo. O fato de ser ou não pecado tem sido
debatido no meio acadêmico e eclesiástico, causando certa confusão. Alguns livros
foram escritos sobre o assunto, entre eles o de John Boswell, chamado Christianity,
Social Tolerance, and Homosexuality, publicado em 1980. Boswell, um historiador
especializado no período medieval, argumentou que a intolerância contra a
homossexualidade que o cristianismo de hoje apresenta se originou na Europa
medieval, (Hays, 1986) a partir de uma questão sociológica e não teológica. Em
Um guia de evangelismo e aconselhamento através da grande carta do apóstolo Paulo | 9

sua tese de mestrado, William Gilders (1993, p. 1) explica a proposta de Boswell:

Como parte do argumento em apoio desta tese, Boswell tenta demonstrar


que os primeiros cristãos não tinham as atitudes negativas em relação ao
comportamento homossexual que geralmente são atribuídas a eles. Não se
pode sustentar, segundo Boswell, que a Bíblia é a base para a oposição cristã
ao comportamento homossexual. No contexto desse argumento, Boswell oferece
uma interpretação de Rom. 1:26-27 em que ele avança duas novas afirmações
sobre o significado do texto. Primeiro, de acordo com Boswell, o fato de Paulo
falar de pessoas “trocando” e “abandonando” comportamento heterossexuais
por homossexuais, indica que Paulo entendeu que aqueles que engajaram-se em
comportamentos homossexuais possuíam uma orientação heterossexual, mas se
voltaram para práticas homossexuais. Segundo, Boswell afirma que a passagem
não contém nenhuma condenação do comportamento homossexual em si [...]
O comportamento homossexual, de acordo com Paulo, é “contrário a natureza”
para pessoas de natureza heterossexual, mas é normal para pessoas que são
naturalmente gays.

A tese de Boswell se tornou bastante influente e ganhou muito espaço entre


aqueles que queriam uma explicação do texto que tratasse como natural e aceitável
a prática homossexual. Até hoje esse argumento de que a homossexualidade é
biblicamente aceitável para quem é naturalmente homossexual é muito defendida
por igrejas inclusivas e homossexuais que se dizem cristãos. Será que essa tese
tem alguma base bíblica? Essa dúvida precisava de resposta. Em 1986, Richard
Hays, um acadêmico na área de Novo Testamento, publicou uma resposta
exegética a Boswell em seu artigo chamado Relations Natural and Unnatural: A
Response to John Boswell’s. Exegesis of Romans l. Sua crítica a Boswell foi em cima
de sua desconstrução do texto e contexto de Romanos 1 e de sua análise histórica
deficiente. Sobre a leitura de Boswell ele disse:

Qualquer um que tenha seguido a discussão de Rom 1:26-27 neste ensaio


perceberá imediatamente que Boswell só é capaz de defender a última afirmação
desconsiderando completamente o contexto argumentativo de Rom 1:26-27. No
contexto da exposição de Paulo, a referência ao comportamento homossexual
funciona como evidência prima facie da confusão moral e da cegueira que veio
sobre a raça humana como resultado de sua recusa em reconhecer a Deus, o
10 | Romanos e a Homossexualidade

criador. Afirmar, como Boswell (1980: 114, 112), que Paulo considera os atos
homossexuais como “extraordinários e peculiares” mas não “moralmente
repreensível” é ignorar o sentido claro do texto, que coloca sua referência explícita
à homossexualidade em paralelo com a “disposição mental e conduta imprópria”
que a lista de vício de 1:29-31 elabora. (HAYS, 1986, p. 195)

O ambiente de debate que Boswell e Hays iniciaram tem continuado até


nossos dias e seus argumentos foram trabalhados por vários autores. Aqui nos
posicionaremos ao lado de Hays e de seu trabalho exegético. Fica claro, em sua
proposta, que a leitura que Boswell faz do texto bíblico é uma leitura comprometida
com sua agenda e visão equivocada da história da igreja. Analisaremos o texto
bíblico com o compromisso de afirmar aquilo que o autor quis dizer em seu
contexto original. Nossa hermenêutica precisa estar baseada na intenção autoral e
não nos pressupostos do leitor. Boswell impôs categorias sobre o texto, enquanto
Hays fez uma exegese. Essa é a grande diferença entre os dois e entre os dois lados
do debate. Minha afirmação é que a exegese ou estudo simples desse texto mostrará
que Paulo trata a homossexualidade como pecado.

1.1. O argumento específico de Paulo sobre a prática homossexual


O contexto mais específico do texto de Romanos 1:26-27 começa no verso 18. Ali
lemos que Paulo está falando sobre a ira de Deus revelada contra toda impiedade
e injustiça dos homens:

“Portanto, a ira de Deus é revelada do céu contra toda impiedade e injustiça dos
homens que suprimem a verdade pela injustiça” (Rm 1:18)

No contexto mais geral de Romanos, sabemos que o apóstolo está falando sobre
a depravação da humanidade. O argumento de Paulo nessa perícope é demonstrar
que toda a humanidade está sob a justa condenação de Deus. No capítulo dois,
ele argumenta que nem mesmo os judeus escapam dessa realidade. O que Paulo
faz nesses primeiros capítulos é uma preparação para sua doutrina da justificação
que será exposta nos capítulos três, quatro e cinco. Sua soteriologia começa com
a realidade do pecado, afinal, por que precisaríamos de salvação se não fôssemos
pecadores? É isso que John Stott (2007, p. 33) comenta sobre o contexto:
Um guia de evangelismo e aconselhamento através da grande carta do apóstolo Paulo | 11

Antes de demonstrar que tanto judeus como gentios podem ter acesso à salvação
(como ele diz em 1.16), Paulo precisa provar que tanto um quanto o outro
precisam dessa salvação. O propósito dessa passagem é, portanto, mostrar que
“todos judeus e não-judeus estão debaixo do poder do pecado” [...] Ele não se
limita a fazer uma acusação; apresenta evidências a fim de provar a nossa culpa e
assegurar a nossa convicção.

É claro, pelo contexto, que tudo aquilo que Paulo mencionará negativamente
nesse texto está incluído nas categorias de impiedade e injustiça. O verso 24 lança
mais luz sobre essa realidade:

“Por isso Deus os entregou à impureza sexual, segundo os desejos pecaminosos


dos seus corações, para a degradação dos seus corpos entre si.” (Romanos 1:24)

Paulo usou três expressões que deixam clara a pecaminosidade dos atos que ele
listará adiante. Ele fala de impureza sexual, desejos pecaminosos e degradação dos
corpos. Não há como imaginar que aquilo que Paulo citará trata-se de algo natural
ou neutro. A linguagem do seu discurso é completamente voltada para deixar claro
que a situação da humanidade é uma grave situação de pecado e condenação. O
verso 26 reforça essa ideia falando em “paixões vergonhosas” e Paulo faz questão
de dizer que os pecados listados são fruto de uma “mente reprovável” no verso 28.
Todo o contexto fala de coisas condenáveis diante de Deus e tenta mostrar que o
homem é indesculpável (Rm 1:20). Negar que a prática homossexual está sendo
citada como pecado é negar uma leitura simples e clara desse texto das Escrituras.
Paulo está afirmando com todas as letras que a homossexualidade é pecado.
E quanto aos argumentos de Boswell? Sua leitura do texto afirma que não há
uma condenação à prática homossexual em si, mas à prática homossexual feita
por heterossexuais. Obviamente, Boswell crê que algumas pessoas nascem gays,
ou seja, são por natureza homossexuais. Esse argumento ganha algum tipo de
espaço quando as pessoas usam a ideia de Paulo da troca de relações naturais por
relações contrárias à natureza (Rm 1:26). Assim, se duas pessoas naturalmente
homossexuais se relacionam, não haveria pecado, pois a relação seria coerente
com a natureza. O pecado estaria quando um heterossexual se envolve em relações
homossexuais, seja por algum fetiche, estupro ou desejo estranho. Para Hays (1986,
p. 199), esse é o argumento de Boswell mais repetido na discussão contemporânea
na igreja. Ouvimos muito esse argumento na forma de “se dois gays se amam e
12 | Romanos e a Homossexualidade

vivem bem um com o outro, que mal tem diante de Deus?”. Ou “se Deus me fez
assim, como pode ser pecado?”. O texto de Romanos fala algo sobre isso?
Em primeiro lugar, devemos começar com a sexualidade planejada por Deus
para o homem. Em Gênesis 1, a Bíblia nos diz que Deus criou homem e mulher
para frutificar e multiplicar (Gn 1:28). Já no capítulo 2, percebemos claramente que
Deus fez a mulher para o homem (Gn 2:18) e que ambos, macho e fêmea, seriam
uma só carne (Gn 2:24). A criação divina aponta para a relação heterossexual como
o único modelo natural e aprovado por Deus. A Lei de Deus confirma essa verdade
e reflete a criação de Deus ao condenar o homem que se deita com outro homem
como se fosse mulher (Lv 18:22). O texto chama essa prática homossexual de
abominação. Ainda devemos lembrar duas listas de pecados no Novo Testamento
que citam a homossexualidade: 1 Coríntios 6:9-10 e 1 Timóteo 1:9-11. Esses
são textos e argumentos suficientes para afirmarmos com segurança que toda e
qualquer prática homossexual é pecaminosa e contrária à natureza criada por
Deus.
Essa primeira resposta já derruba toda a argumentação de Boswell, mas
podemos ir além. O contexto cultural e histórico do discurso de Paulo nega
claramente a possibilidade da referência ser apenas a um grupo específico de
heterossexuais que praticam a homossexualidade. Seu uso da palavra “natureza”
carrega um significado conectado com o judaísmo da época. Douglas Moo (1996,
p. 114) comenta:

O uso de Paulo da palavra “natureza” nesse verso provavelmente deve muito aos
autores judeus, particularmente a Filo, que incluiu a moralidade sexual como
parte da “lei natural” e, portanto, como um mandato divino aplicável a todas as
pessoas. Violações dessa lei, como no caso de Sodoma, são, portanto, consideradas
transgressões da vontade de Deus”.

Paulo é um autor judeu que escreve a partir de uma mente judaica. Seus
pressupostos não partem da visão romana sobre a homossexualidade, mas da
visão judaica dada na lei de Deus e no padrão da criação. Moo (1996, p. 115)
argumenta nessa linha ao afirmar que a expressão paulina “contra a natureza”
(παρα φυσιν) no verso 26 indica um pecado contra Deus e um “apelo a ordem
criada de Deus”. Schreiner (1998, p. 256) lembra que tanto Filo como Josefo
falaram da homossexualidade como παρα φυσιν (contra a natureza). O raciocínio
de Paulo ganha sentido quando focado em seu contexto de idolatria. Os homens
Um guia de evangelismo e aconselhamento através da grande carta do apóstolo Paulo | 13

não glorificaram a Deus como criador e o trocaram por criaturas. Essa troca os
levou a não reconhecer a ordem criada de Deus, ou seja, sua lei natural. Por isso
foram entregues ao seu próprio estilo de vida, um estilo contra a natureza e contra
o Deus criador da natureza. Esse contexto deixa claro que a natureza a que Paulo
se refere não tem a ver com nascer naturalmente homossexual, mas com o fato de
que Deus criou homem e mulher para relações heterossexuais. Nesse sentido, toda
relação homossexual é contra a natureza e contra Deus.
Outra linha de argumentação que visa especificar um tipo de relação
homossexual proibida em Romanos 1:26-27 é a de Robin Scroggs (New Testament
and Homosexuality). Para ele, a condenação de Paulo se refere ao pecado da
pederastia. Sua tese parte de uma análise histórica do mundo greco-romano da
época e acerta ao observar que as relações sexuais abusivas entre um homem
adulto e um garoto realmente aconteciam e eram parte da sociedade. Porém,
não há indício nenhum de que Paulo estaria tratando apenas disso. Todo o
contexto bíblico aponta para a pecaminosidade de toda e qualquer relação sexual
homossexual. Dois argumentos do texto confirmam essa ideia. Em primeiro
lugar, não há menção de um relacionamento homossexual entre um homem e um
garoto, mas entre homem e homem (αρσενες εν αρσεσιν). Há palavras no grego
para falar de um relacionamento de pederastia e Paulo não as usa. Em segundo
lugar, a referência a relações homossexuais femininas no verso 26 também exclui
essa possibilidade, visto que a pederastia se refere a relações masculinas.
A conclusão que chegamos é que não há evidência textual que aponte para
outro argumento que não seja o de que Paulo está condenando toda e qualquer
relação homossexual. Tanto o texto bíblico de Romanos 1:18-32, como o padrão
sexual de toda a Bíblia e a visão judaica da homossexualidade confirmam essa
posição. Em sua dissertação sobre o tema, Gilders (1993, p. 115) concluiu:

Paulo condenou o comportamento homossexual em si; suas palavras em Rom.


1:26-27 refletem uma avaliação negativa de todas as atividades homossexuais,
independentemente da idade dos participantes, se a relação era mútua ou não,
ou se era permanente e baseada no amor ou baseada somente na paixão sexual;
ele acreditava, como muitos de seus contemporâneos, que os atos homossexuais
eram “contra a natureza”, isto é, contrários a ordem racional do universo, uma
ordem que Paulo, como judeu, acreditava ter sido estabelecida por Deus.

Se Romanos 1:26-27 é o principal e mais direto texto do Novo Testamento


14 | Romanos e a Homossexualidade

sobre homossexualidade, então precisamos estabelecer como grande verdade e


princípio cristão que a homossexualidade, em todas as suas relações e variações,
é pecado. Esse é o primeiro passo para o cristão lidar de maneira bíblica com a
homossexualidade. Qualquer maneira de tratar essa questão que não trate a prática
física e mental homossexual como pecado está errada desde sua raiz. Pastores,
líderes, pais e todos os cristãos precisam estar convictos disso. Estamos lidando
com um pecado e a boa notícia é que Jesus Cristo tem a solução para isso.

1.2. O grande problema em Romanos 1:18-32


Paulo trata toda forma de homossexualidade como pecado nesse texto? Vimos que
sim. Agora precisamos responder a uma segunda pergunta: É a homossexualidade o
principal problema ao qual Paulo se dirige nesse texto? Veremos que não. Romanos
1:18-32 não é um texto centrado nas práticas homossexuais. O argumento de Paulo
está em algo anterior à homossexualidade, está na causa que leva a humanidade a
viver de forma contrária à vontade e ordem criada de Deus. Encontramos o ponto
central de Paulo na primeira parte da passagem.

“Portanto, a ira de Deus é revelada do céu contra toda impiedade e injustiça


dos homens que suprimem a verdade pela injustiça, pois o que de Deus se pode
conhecer é manifesto entre eles, porque Deus lhes manifestou. Pois desde a
criação do mundo os atributos invisíveis de Deus, seu eterno poder e sua natureza
divina, têm sido vistos claramente, sendo compreendidos por meio das coisas
criadas, de forma que tais homens são indesculpáveis; porque, tendo conhecido
a Deus, não o glorificaram como Deus, nem lhe renderam graças, mas os seus
pensamentos tornaram-se fúteis e os seus corações insensatos se obscureceram.
Dizendo-se sábios, tornaram-se loucos e trocaram a glória do Deus imortal por
imagens feitas segundo a semelhança do homem mortal, bem como de pássaros,
quadrúpedes e répteis.” (Rm 1:18-23, destaques meus)

Preste atenção nos trechos destacados em negrito. O primeiro deles inicia


com a conjunção διότι (porque) e justifica a afirmação de Paulo de que os homens
suprimem a verdade pela injustiça. O argumento é o de que Deus se manifesta
entre nós e se faz conhecido, mas a humanidade ignora esse conhecimento de
Deus e prefere viver à parte dele, agindo contra ele. É contra esse comportamento
ignorante e rebelde que a ira de Deus é revelada. O segundo trecho inicia com a
Um guia de evangelismo e aconselhamento através da grande carta do apóstolo Paulo | 15

mesma conjunção διότι (porque) e justifica a afirmação paulina de que os homens


são indesculpáveis do comportamento que acabamos de tratar. Isso acontece
justamente pela revelação de Deus na natureza estar disponível aos homens.
Mesmo a humanidade tendo acesso a essa revelação, ela preferiu não glorificar a
Deus, ou seja, não atribuir a Deus todas essas manifestações de poder. Mais uma
vez o homem ignorou a Deus. No terceiro trecho, Paulo é mais claro e direto sobre
a situação. Os homens, em nome de certa sabedoria, trocaram a adoração a Deus
pela adoração a coisas criadas. Esse é o ponto central da passagem: idolatria. Toda
a humanidade está sendo acusada de ter ignorado o conhecimento acessível de
Deus e ter adorado a criação no lugar dele.
Keener (2018, p. 59) concorda e diz que “o pecado culminante nesse parágrafo
é a idolatria”. Para ele, a tentativa de Paulo é demonstrar ao seu público que a
idolatria é insensata. Ainda segundo Keener (2018, p. 71), “a tradição judaica
considerava a idolatria o pior pecado de todos e enfatizava que ele provocava juízo”.
Nesse parágrafo, encontramos Paulo tratando da idolatria como seu ponto central,
demonstrando diretamente que os gentios são idólatras e indiretamente que todos
são, inclusive os judeus. Portanto, não devemos pensar que a homossexualidade
é o ponto principal dessa passagem e nem mesmo o pecado mais grave que está
sendo descrito nela. Trata-se, em primeiro lugar, da idolatria. Ela é o pecado que
origina todos os outros pecados. Ou como Beale colocou, “Paulo vê a idolatria
como a essência do pecado” (2008, p. 203). Portanto, devemos entender a partir
desse texto que o maior problema da homossexualidade não está no ato sexual em
si, mas no coração idólatra que ignora a Deus e não o adora.

1.3. Como a idolatria leva à homossexualidade?


Diante dessa realidade, precisamos fazer a conexão entre a idolatria e o pecado
homossexual. Como Paulo conecta essas duas coisas? Sabemos que nem todo
coração rebelde contra Deus parte para a homossexualidade, mas precisamos saber
como isso acontece nos casos em que essa conexão existe. Para isso devemos olhar
para o destaque que Paulo dá para o intelecto humano. O apóstolo, nessa passagem,
foca numa mente corrompida pela idolatria. Os versos a seguir mostram isso:

“mas os seus pensamentos tornaram-se fúteis” (Rm 1:21)

“Dizendo-se sábios, tornaram-se loucos” (Rm 1:22)


16 | Romanos e a Homossexualidade

“Além do mais, visto que desprezaram o conhecimento de Deus, ele os entregou


a uma disposição mental reprovável, para praticarem o que não deviam.” (Rm
1:28)

Fica clara a relação que Paulo faz entre idolatria e corrupção da mente. Um
coração idólatra é um coração insensato e obscurecido (Rm 1:21) e tal disposição
de coração corrompe os pensamentos. No livro A Mente do Espírito, Keener usa
esse texto de Romanos para demonstrar como a mente humana está corrompida e
precisa de redenção. Seu resumo do argumento de Paulo é muito útil nesse ponto.

De modo resumido, o argumento de Paulo em Romanos 1.18-32 parece ser o


seguinte: Deus julga a humanidade por sua ação perversa de suprimir e perverter
a verdade a respeito dele por meio da idolatria (1.18,23). A humanidade é
culpável por suas falsas imagens de Deus, pois, na criação – especialmente nos
seres humanos criados à imagem de Deus – Deus revelou seu caráter (1.19,20).
Portanto, Deus julga a humanidade ao entregá-la a seu próprio modo de pensar
corrompido (1.24,26,28). Esse modo de pensar equivocado provavelmente
abrange a distorção da imagem de Deus nos próprios seres humanos (1.24-
27). Uma vez que desonraram a Deus (1.21), ele permitiu que desonrassem
uns aos outros (1.24) com aquilo que Paulo chama de paixões “desonrosas” e
“vergonhosas” (1.26,27). (KEENER, 2018, p. 56)

O processo de “formação” do pecado homossexual, portanto, poderia ser


descrito assim: a idolatria corrompe a mente. A mente corrompida rejeita a ordem
criada de Deus. Essa rejeição gera pensamento e vontades contrárias à vontade de
Deus. Uma das áreas em que esses pensamentos e vontades se materializam é na
sexualidade, tendo na relação homossexual um claro exemplo de como a mente
corrompida que troca a glória de Deus também troca a ordem criada de Deus
para o sexo. É por isso que Paulo cita esse pecado nesse trecho tão importante. A
homossexualidade, muito presente no ambiente gentílico e romano, foi a melhor
forma que Paulo encontrou para ilustrar aos seus leitores como o homem age
exatamente de forma contrária à vontade de Deus. O relacionamento homossexual
é oposto do relacionamento heterossexual estipulado por Deus como natural ao
criar homem e mulher para a missão de união e multiplicação. O sexo heterossexual
fora do casamento ou outros pecados sexuais de orientação heterossexual não
ilustrariam tão bem a idolatria e a corrupção da mente que Paulo estava tentando
Um guia de evangelismo e aconselhamento através da grande carta do apóstolo Paulo | 17

mostrar.
Não vejo nesse texto, como alguns afirmam, que a homossexualidade é citada
por ser o pior dos pecados contra Deus. Não há nenhum indício textual de que
há uma argumentação sobre grau de pecados. Se olharmos para a lei de Deus,
veremos, por exemplo, que o assassinato é um pecado mais ofensivo diante de
Deus do que a homossexualidade (Gn 9:6). Além disso, no próprio argumento
do texto, o principal problema da humanidade é a idolatria. Isso não diz que a
homossexualidade não é pecado ou que podemos considerá-la algo normal ou
mais aceitável. De maneira nenhuma. Devemos afirmar a pecaminosidade do ato
enquanto lembramos que ela está nessa passagem para mostrar a corrupção da
mente idólatra. É essa mente corrompida que gera todos os pecados, inclusive esse
que estamos tratando.

1.4. Conclusão sobre homossexualidade em Romanos 1:26-27


A conclusão que chegamos ao analisar a homossexualidade em Romanos 1:26-27
pode ser descrita em dois níveis. No primeiro nível, devemos afirmar que Paulo
entende qualquer relação homossexual como pecaminosa. Essa passagem está
em acordo com toda a Escritura ao afirmar que a homossexualidade é pecado.
No segundo nível, mais abrangente, devemos entender que a homossexualidade é
apenas um dos sintomas de um problema maior e principal, a idolatria. O coração
humano idólatra corrompe a mente e a leva a rejeitar e inverter a ordem criada por
Deus. A idolatria rejeita a Deus como criador e, portanto, rejeita sua lei natural da
criação. Podemos concluir, então, que a homossexualidade é fruto de uma mente
corrompida por um coração idólatra. A homossexualidade é, em última instância,
não um problema apenas de relacionamento com um parceiro do mesmo sexo, mas
um problema de relacionamento com Deus.
Agora, conhecendo esse diagnóstico biblicamente correto, podemos escolher
a melhor maneira de lidar com pessoas com tentações e/ou práticas homossexuais.
O primeiro ponto prático é que não devemos dividir a humanidade entre héteros
e homos. Devemos dividi-la entre idólatras e adoradores de Deus. Foi assim
que Paulo dividiu a humanidade em Romanos 1:18-32. No gabinete pastoral, ao
encontrarmos pessoas que estão lidando com a homossexualidade, nosso olhar
deve ser o mesmo. Estamos diante de um idólatra ou de um adorador de Deus?
Devemos olhar para além da sexualidade, para o coração e seu posicionamento
18 | Romanos e a Homossexualidade

diante de Deus. Fazendo isso podemos encontrar dois tipos de pessoas. Um tipo
é aquele em que a vida está baseada na idolatria. São corações não convertidos e
que, portanto, estão com suas mentes corrompidas e contrárias a Deus. A Bíblia é
clara sobre esse tipo de pessoa, eles precisam de um novo coração. O segundo tipo
de pessoa é aquele que já adora a Deus. Eles já receberam um novo coração, mas
ainda lutam contra as tentações da idolatria. Ainda são tentados a abandonar a lei
natural de Deus. Esses precisam alinhar seus pensamentos e comportamento com
o Deus que adoram em seus corações.

A homossexualidade pode estar presente na mente desses dois tipos de pessoas,


não cristãos ou cristãos. A boa notícia é que Romanos apresenta a solução divina
para esse problema de mentes corrompidas pela idolatria.
2. MENTE VIVIFICADA EM ROMANOS 6:1-11
Após sua argumentação em Romanos 1:18-32, Paulo segue falando da culpa
universal de toda a humanidade diante de Deus. O resumo do seu argumento está
em Romanos 3:9, “pois já demonstramos que tanto judeus como gregos estão todos
debaixo do pecado”. Até 3:20, esse é o tom do seu discurso. Até esse ponto, vimos
que a idolatria humana e sua mente corrompida são incapazes de produzir justiça
diante de Deus. Todos são culpados. A reviravolta, então, acontece a partir de 3:21.
Ali vemos Paulo falando sobre a manifestação da justiça de Deus:

“Mas agora se manifestou uma justiça que provém de Deus, independente da lei,
da qual testemunham a Lei e os Profetas, justiça de Deus mediante a fé em Jesus
Cristo para todos os que crêem. Não há distinção, pois todos pecaram e estão
destituídos da glória de Deus, sendo justificados gratuitamente por sua graça,
por meio da redenção que há em Cristo Jesus.” (Rm 3:21-24)

A partir desse ponto em Romanos, Paulo passa a apresentar sua doutrina


da justificação pela fé. Ele entra em mais detalhes no capítulo 4, quando fala
do exemplo de Abraão, e fala dos benefícios dessa justificação no capítulo 5. O
principal dos benefícios, o qual gera todos os outros, é a paz com Deus (Rm 5:1).
Dessa relação, agora amigável, com Deus por meio de Cristo, é que fluem todas
as outras bênçãos. Assim como a idolatria, que é a rejeição de Deus, é a fonte de
todos os pecados, a paz com Deus, ou seja, o relacionamento verdadeiro com ele
em adoração, é a fonte de todas as bênçãos. Falando em termos soteriológicos, o
que possibilita essa mudança de relacionamento entre Deus e o homem é o novo
nascimento e a justificação. Deus nos concede um novo coração para crer nele e
mediante essa fé somos justificados para nos apresentarmos diante dele sem culpa.
Romanos 6:1-11 carrega todo esse conteúdo do evangelho da justiça de Deus.
Seu ponto principal está em 6:2, “Nós, que morremos para o pecado, como ainda
viveremos nele?” A argumentação de Paulo nessa passagem explica essa realidade.
Para ele, o crente em Jesus morreu para o pecado juntamente com Cristo e foi
ressuscitado com Cristo para uma nova vida (6:3-4). Em outras palavras, o que
20 | Romanos e a Homossexualidade

Paulo está dizendo é que morremos para a vida idólatra descrita em 1:18-32 e
ressuscitamos para uma vida de adoração a Deus em todas as coisas. Ele deixa
claro que a antiga natureza idólatra foi crucificada com Cristo e que, por isso,
não servimos mais ao pecado (6:6). Ora, se o coração idólatra foi crucificado e
recebemos um novo coração, aquela vida de mente corrompida já não existe mais.
Ao renovar o coração, Deus também cura nossas mentes. É por isso que Paulo
chega ao verso 11 e diz:

“Da mesma forma, considerem-se mortos para o pecado, mas vivos para Deus
em Cristo Jesus.” (Rm 6:11)

Toda essa realidade que Paulo está apresentando nos dá uma nova identidade e
é exatamente isso que o apóstolo está tentando mostrar aos seus leitores. Não somos
mais identificados como idólatras, mas como pessoas vivificadas “para Deus em
Cristo”. Keener (1998, p. 89) identifica o aspecto intelectual ou cognitivo quando
Paulo diz “considerem-se”. Ele está convocando os crentes a pensarem sobre si
mesmos como possuidores dessa nova identidade. Essa é a mente renovada da sua
corrupção, uma mente que reconhece e aceita a ordem natural da criação de Deus
e que vê a si mesma como uma mente que vive agora para o próprio Deus. Keener
comenta:

Paulo incentiva os crentes a se “considerarem” como Deus os têm considerado


(6.11). Ou seja, uma vez que foram justificados ao crerem em Deus, eles agora
devem acreditar na realidade daquilo que Deus realizou, a saber, que Deus os
justificou em Cristo. Isso abrange a realidade de que têm uma nova identidade
em Cristo como indivíduos que morreram para o pecado. (KEENER, 2018, p.
105)

Romanos 6:1-11 chama os cristãos a encontrarem suas identidades somente


em Deus e no seu evangelho. Esse é o melhor lugar para saber quem nós somos.

Nós, seres humanos, temos a tendência de nos identificarmos de acordo com


(naturalmente) nosso passado pessoal, nossos modelos familiares ou nossa
inserção social dentro da cultura externa; modelos fornecidos por nossos pais
e opiniões de outros sobre nós fazem parte das influências exercidas sobre a
formação de nossa identidade. No entanto, Paulo argumenta que nosso nível
mais forte de identificação deve ser nossa identidade como seguidores de Cristo:
Um guia de evangelismo e aconselhamento através da grande carta do apóstolo Paulo | 21

inseridos em uma nova comunidade e em um novo relacionamento com Deus,


pensando da forma como Cristo pensaria e sendo conformado à sua imagem (cf.
Rm 6.5; 8.29). Para Paulo, essa nova identidade não é somente uma estratégia
cognitiva, mas a asserção de uma nova realidade. (KEENER, 2018, p. 91)

A conclusão prática nesse ponto é que a regeneração e a justificação corrigem


a mente corrompida de Romanos 1. Se isso é verdade, então o evangelho de Cristo
apresentado por Paulo é a solução para mentes corrompidas pela idolatria e para
todos os pecados que se originam dela, inclusive a homossexualidade. Quando
Deus muda o coração idólatra para um coração que tem paz com Deus, a corrupção
mental que rejeita a lei natural de Deus é transformada numa nova mente que
aceita a Deus e sua ordem criada. Essa é a resposta para ambos os tipos de pessoas,
não cristãos ou cristãos que lidam com a homossexualidade.
Nesse ponto, devemos tratar sobre o primeiro tipo de pessoas, os descrentes.
O que fazer quando homossexuais passam a frequentar nossas igrejas? Minha
resposta curta seria: nada! Nada de diferente do que fazemos quando qualquer
outro pecador passa a frequentar nossas igrejas. O que essas pessoas precisam é da
pregação do evangelho. Não adianta confrontar o pecado da homossexualidade se
estamos lidando com mentes corrompidas pela idolatria. Como dizer que a ordem
natural da criação de Deus é heterossexual para pessoas que não reconhecem tal
ordem? Descrentes que lidam com a homossexualidade não precisam de doses de
heterossexualidade, mas de um novo coração que só Deus pode dar por meio do
evangelho da justificação em Cristo.
3. A MENTE GUIADA PELO ESPÍRITO
EM ROMANOS 8:5-7
Agora vamos tratar com o segundo tipo de pessoas, o crente. Imagine que o
descrente homossexual que frequenta sua igreja se converteu ou que um dos
membros crentes de sua igreja está lidando com tentações homossexuais. Como
lidar com essas pessoas? Romanos 8:5-7 nos apresenta a nova realidade cognitiva
daquele que se converteu ao Senhor Jesus. Aqueles que pertencem a Cristo são
habitados pelo Espírito Santo e, portanto, estão sob o domínio do Espírito (Rm
8:9). Paulo aplica essa verdade teológica à vida do crente ao dizer que esse domínio
se manifesta na mente, pois ela passa a ser orientada pela vontade do próprio
Espírito.

“Quem vive segundo a carne tem a mente voltada para o que a carne deseja;
mas quem, de acordo com o Espírito, tem a mente voltada para o que o Espírito
deseja.” (Rm 8:5)

Essa é a esperança que temos para oferecer ao crente em Jesus que possui atração
por pessoas do mesmo sexo. Pessoas nessa situação podem ter confiança de quem
podem viver uma vida norteada não pela homossexualidade, mas pelo Espírito de
Deus. Mesmo com a presença da tentação homossexual, a mente cristã é capaz de
negar as tentações da carne e viver, em vida plena e paz, a vontade de Deus (Rm
8:6). Para entendermos melhor essa esperança, precisamos esclarecer a relação
entre tentações homossexuais e o pecado da homossexualidade. O pastor Lisânias
Moura (2017, p. 105) nos ajuda nesse ponto ao separar a experiência homossexual,
vamos chamar assim, em três níveis. Para ele, há o nível dos sentimentos, o nível
dos desejos e o nível da prática. Moura explica que no nível dos sentimentos não
há pecado.

Nesse nível, estamos falando de sentimentos que muitas vezes nos tomam de
assalto. E claro que ninguém tem um “botão de acionamento sentimental”
implantado no corpo, que pode ser desligado ou ligado quando se deseja [...]
Um guia de evangelismo e aconselhamento através da grande carta do apóstolo Paulo | 23

Assim, mesmo um homem casado e apaixonado pela esposa pode ser despertado
sexualmente ao ver uma mulher bonita vestida de modo sensual. Da mesma
forma, uma pessoa pode sentir atração sexual por alguém do mesmo sexo. Essa
atração pode ocorrer uma vez na vida, de vez em quando ou raramente. Em
termos bíblicos, podemos dizer que se trata daquele sentimento que em si mesmo
não constitui pecado, por não ser fruto de uma escolha que contraria o que Deus
deseja. Ele surge repentinamente. E, ao surgir, o indivíduo precisa resolver o que
fará com ele. (MOURA, Lisânias. 2017, p. 105)

Moura afirma, e estou de acordo, que esse sentimento ou atração não


define ninguém como homossexual. Aqui precisamos entender a diferença
entre sentir atração por pessoas do mesmo sexo e ser homossexual. São
coisas distintas. Se identificar como homossexual é assumir desejos e práticas
homossexuais como seu estilo de vida. Nesse sentido há pecado. Mas sentir
atrações por pessoas do mesmo sexo é uma tentação que pode ser vencida
sem originar o pecado. Nesse sentido, é possível estar atraído por alguém do
mesmo sexo e ainda assim se manter em santidade. Uma mente guiada pelo
Espírito pode escolher sempre o caminho da vontade de Deus mesmo quando
os sentimentos apontam o contrário.
No segundo nível, Moura alerta para o fato de que o sentimento de atração
pode evoluir para desejos intensos. Ele compara esse desejo sexual por pessoas do
mesmo sexo com a cobiça pecaminosa da mulher do próximo que Jesus se refere
em Mateus 5:28. Aqui já estamos no nível do pecado. O desejo é o sentimento
alimentado que encontra prazer no pecado. Nesse nível estão as fantasias sexuais, o
planejamento do pecado e o deleite mental nele. Mesmo assim, Moura nos lembra
acertadamente que tais desejos não definem obrigatoriamente uma pessoa como
homossexual, a ponto de abandonar a identidade cristã. É possível lutar contra
eles. É possível confessar os pecados e encontrar ajuda no aconselhamento cristão.
Ed Shaw, um pastor que luta com a atração por pessoas do mesmo sexo, escreveu
um excelente livro sobre o assunto. No primeiro capítulo, Shaw afirma que “o que
mais me define na vida não é minha sexualidade, mas minha posição, em Cristo,
como um filho de Deus” (2018, pos. 488, Kindle). O que ele está querendo dizer
não é que seu pecado homossexual se torna aceitável para Deus se ele estiver em
Cristo, mas que em Cristo ele recebeu uma nova identidade que não se deixa
definir ou enganar pela homossexualidade ou qualquer outro pecado sexual. Um
24 | Romanos e a Homossexualidade

de seus testemunhos é interessante:

Ontem procurei o trailer de um filme no qual um homem de quem gosto muito


aparece seminu algumas vezes. Quando mais tarde me arrependia aos pés de
Deus Pai, o que o Diabo me dizia? “Você é esse tipo de pessoa! Um tipo de homem
que passa seu tempo desejando vislumbres do tórax de outro homem. Você ainda
se considera cristão? Não é possível ser cristão e gostar de fazer essas coisas!”
Para onde o Maligno sempre leva a batalha? Direto para minha identidade! É ali
que a batalha é mais ferrenha, e é por isso que preciso tanto me apegar à minha
identidade em Cristo. Ontem, eu precisei ficar repetindo para mim mesmo: “Esse
não é o você real! Você é filho de Deus. Deus o transformou permanentemente
por meio da morte de Jesus. Você não devia ter feito o que acabou de fazer,
mas isso não muda nada em você!”. Todos os dias da minha vida, preciso ficar
repetindo isso. E, é claro, o mesmo vale para você. (SHAW, Ed. 2018, Locais do
Kindle 520-526)

É esse tipo de mente que está descrita em Romanos 8:5-7. Uma mente que
encontra sua identidade em Cristo e que, por isso, é guiada não por qualquer
atração sexual, mas pelo Espírito de Deus. É isso que cada crente deve lembrar.
Sobre esse texto Keener (2018, p. 217) comenta:

“Os crentes devem aceitar não apenas a realidade de sua nova identidade que
decorre de sua união com Cristo, mas também a realidade de que Cristo e o
próprio Espírito de Deus vivem dentro deles. Esses são recursos ainda maiores
para alcançar o bem moral e cívico que as espécies de recursos cognitivos dos
quais a maioria do filósofos lançava mão.”

Quando os desejos não conseguem ser evitados ou controlados, o crente pode


cair em pecado ocasionalmente. Esse é o terceiro nível de Moura. Quando a prática
é vivida de forma constante e sem nenhum arrependimento ou problema moral,
devemos admitir que não há uma identidade cristã em tal pessoa. Nenhuma mente
guiada pelo Espírito vive em paz com o pecado em qualquer nível. Mas aqui estamos
falando do crente que vier a cair. Esse precisa de misericórdia e graça de sua igreja.
Precisa ser confrontado em amor. Precisa de aconselhamento restaurador. Não
podemos rotulá-lo como um descrente homossexual pelo simples fato da queda.
É nesse nível que a culpa mais afasta as pessoas de Deus e da igreja, gerando uma
situação perfeita para o pecado crescer. Nesse momento, a presença graciosa e
Um guia de evangelismo e aconselhamento através da grande carta do apóstolo Paulo | 25

santa da igreja se faz necessária. É preciso esperança de que a mente guiada pelo
Espírito responderá positivamente ao confronto misericordioso.
O que Tiago fala em sua carta, no capítulo 1, é muito parecido com o que
acabamos de ver sobre os três níveis propostos por Moura. Preste atenção na
seguinte passagem:

“Ao contrário, cada um é tentado pela sua própria cobiça, quando esta o atrai e
seduz. Então a cobiça, depois de haver concebido, dá à luz o pecado; e o pecado,
uma vez consumado, gera a morte.” (Tiago 1:14-15)

Perceba esse processo de formação do pecado no coração humano. Tiago está


descrevendo um passo a passo que vai da tentação ao pecado consumado e morte
espiritual. John Street, autor do livro Purificando o coração da idolatria sexual,
usou esse texto para falar sobre os 4 estágios da escravização sexual. Vamos passar
por esses estágios agora:

Estágio 1
Alguns desejos depravados internos da carne são estimulados pelo pensamento ou
pela experiência: “Ao contrário, cada um é tentado pela sua própria cobiça, quando
esta o atrai e seduz” (Tg 1:14)
Entender esse primeiro estágio é fundamental para todo o processo de
libertação da escravidão do pecado sexual. Onde está o problema? Tiago é claro
ao afirmar que o grande problema não está em Satanás ou no mundo, mas está
em nós, em nossa própria cobiça. A expressão atrair e seduzir é mais literalmente
entendida como arrastar e atrair. Tiago usa uma linguagem da pesca no grego. Sua
analogia é a de um peixe preso ao anzol e arrastado para fora da água pelo pescador.
Nós estamos presos e somos arrastados por nossa própria cobiça. Armamos
a armadilha para nós mesmos! É para o nosso coração, como centro de nossas
vontades, emoções e crenças, que devemos olhar. Lá está o grande problema. É
dele que precisamos tratar!

Estágio 2
A cobiça concebe num coração fértil quando ele ganha o consentimento da
vontade: “Então a cobiça, depois de haver concebido” (Tg 1:15a)
No estágio 1, seus desejos pecaminosos são estimulados, mas você pode
26 | Romanos e a Homossexualidade

decidir o que fazer com esses estímulos. Isso é tentação e a tentação não é pecado.
O que você fará com ela é que pode vir a ser. Neste estágio dois, a cobiça concebe,
ou seja, torna o coração fértil para a tentação e o pecado. A analogia de Tiago é
com a gravidez. Quando o desejo se une à tentação, eles gestam o pecado, que
começará a se desenvolver.

Estágio 3
O coração fecundado com a cobiça, em algum momento, dará à luz aos atos visíveis
de transgressão: “Então a cobiça, depois de haver concebido, dá à luz o pecado;” (Tg
1:15a)
O coração alimentado e que está fértil para o desejo pecaminoso buscará
externalizar isso em algum momento com uma prática pecaminosa visível. O
pecado em gestação dá à luz a um pecado formado e visível. Muitas vezes, não
há nem a necessidade de novos estímulos, pois a cobiça já está trabalhando
deliberadamente no coração.

Estágio 4
O pecado completamente formado resulta em morte: “e o pecado, uma vez
consumado, gera a morte.” (Tg 1:15b)
O que é essa morte gerada pelo pecado? A linguagem e o discurso de Tiago se
parecem muito com Provérbios 5-9 e sua questão sobre o pecado que gera a morte,
o afastamento da lei de Deus e da aliança com Deus, que levará à morte eterna.
Antes, no capítulo 1, Tiago fala da perseverança que produz a vida, coroa da vida.
Sinal da vida eterna que começou com a vida aqui e agora. Creio que morte é essa
separação atual de Deus que se refletirá na morte eterna. Aqui e agora, quando
pecado gera a morte, ele nos afasta de Deus e nos coloca em idolatria e escravização
sexual.
Entender esse processo de nascimento do pecado é fundamental para duas
coisas. Primeiro, não podemos condenar e rotular uma pessoa somente por suas
tentações. É preciso ter cuidado com isso. Há exceções em casos mais graves,
quando as tentações precisam ser tratadas de formas específicas, mas falando de
atração por pessoas do mesmo sexo, devemos entender que o pecado ainda não foi
gerado e que as tentações podem ser vencidas. Esse é o segundo ponto. Devemos
manter a luta no primeiro estágio. Nenhum cristão se alegra e define a si mesmo
Um guia de evangelismo e aconselhamento através da grande carta do apóstolo Paulo | 27

por suas tentações e desejos pecaminosos. Se nesse estágio o pecado ainda não foi
gerado, é possível viver em santidade para a glória de Deus enquanto se convive
com a atração por pessoas do mesmo sexo ou outras tentações.
É interessante olharmos para a promessa do verso 6. “Porque a inclinação da
carne é morte; mas a inclinação do Espírito é vida e paz”. Geralmente o mundo pensa
o contrário quando o assunto é santidade cristã, principalmente em se tratando
de homossexualidade. A opinião geral é que, ao se tentar viver a santidade cristã
negando a atração por pessoas do mesmo sexo e os desejos que surgem a partir
dela, a pessoa entrará num conflito maléfico consigo mesma. Se fala em depressão,
opressão e outros perigos de tal atitude. Mas o que a Bíblia ensina é que uma mente
guiada pelo Espírito, independentemente das tentações com que luta, encontra
vida e paz. É para essas coisas que o Espírito Santo nos inclina. Douglas Moo
(1996, p. 488) comenta:

Vida e paz denotam esse estado de liberdade da lei do pecado e da morte que
começa para o crente nesta vida, embora menor que sua forma final e definitiva.
As palavras não denotam um estado mental subjetivo (e.g., paz de espírito e
coração), mas a realidade objetiva da salvação na qual o crente, que tem a mente
do Espírito, entrou. A paz aqui é aquela paz com Deus dada através da justificação
(ver 5: 1; cf. também 14:17), o estado que está em contraste com a inimizade não-
cristã em relação a Deus (ver v.7).

Portanto, a vida com Cristo, guiada pelo Espírito e debaixo da vontade do


Pai é a paz que todo ser humano busca. Esse é o modo de vida mais equilibrado
justamente por ser o modo de vida para o qual fomos criados. Essa é a esperança
que temos para oferecer aos que estão lidando com a atração por pessoas do
mesmo sexo. Há um peso na mente dessas pessoas e um conflito interno que
pode ser apaziguado pelo Espírito de Deus. Isso não significa que as tentações
obrigatoriamente cessarão, mas haverá segurança e paz com Deus em meio a
elas. Quando o indivíduo entender que é justificado em Cristo e que essa é a sua
nova identidade, aquela voz gritando uma identidade homossexual é silenciada.
Deus, no silêncio da cruz, falou mais alto do que qualquer acusação contra o seu
verdadeiro povo.
4. A MENTE RENOVADA EM ROMANOS 12:1-2
Nós começamos esse caminho em Romanos com Paulo nos falando sobre a idolatria
humana. Essa idolatria levou Deus a nos entregar à nossa própria “disposição mental
reprovável” (Rm 1:28). Essa disposição mental leva o homem a praticar coisas que
não deviam, entre elas a degradação dos seus corpos. A homossexualidade é citada
como consequência dessa mentalidade e Paulo deixa claro que se trata de pecado
contra Deus, violando a natureza da sua criação (Rm 1:26-27). Portanto, segundo
a Palavra de Deus, o coração idólatra corrompe a mente e essa lidera o corpo
para ações corrompidas, como a relação homossexual. O principal problema da
humanidade e de quem lida com desejos homossexuais é a idolatria. Um coração
que não aponta para Deus. Recalibrar o coração para o criador recalibrará a mente
e, por consequência, o corpo. Vimos que a salvação em Cristo com a justificação
pela fé é esse grande instrumento de calibragem. Por meio dela, Deus dá ao homem
uma mente vivificada com poder para ser santa e guiada pelo Espírito. Assim, tal
mente e indivíduo podem encontrar vida e paz.
Agora perceba o que Paulo faz no início dessa nova seção da sua carta.
Depois de escrever sobre sua teologia, dos capítulos 1 a 11, Paulo agora parte para
exortações para a vida diária de seus leitores. Nesta segunda seção, ele conecta suas
aplicações com todo o conteúdo anterior. Essa conexão está centrada exatamente
nos dois primeiros versículos do capítulo 12. Schreiner (1998, p 1.612) afirma que
Romanos 12:1-2 serve como paradigma para toda a seção de exortação até 15:13.
E é por isso que o apóstolo faz uma grande conexão com Romanos 1. Ele está
fornecendo a base para a vida cristã e essa base é aquela realidade de Romanos 1
totalmente transformada. Está na hora de vermos o que Deus faz com aqueles que
o buscam e creem em Cristo. Há uma renovação completa para eles!

“Rogo-vos, pois, irmãos, pela compaixão de Deus, que apresenteis os vossos


corpos em sacrifício vivo, santo e agradável a Deus, que é o vosso culto racional.”
(Rm 12:1)

No verso 1, Paulo fala em apresentarmos nossos corpos como sacrifício vivo,


Um guia de evangelismo e aconselhamento através da grande carta do apóstolo Paulo | 29

santo e agradável a Deus. Perceba o grande contraste com o capítulo 1. Lá foi dito
que a realidade sem Cristo era de uma entrega “às concupiscências de seus corações,
à imundícia, para desonrarem seus corpos entre si” (Rm 1:24). Sem Cristo, homens
e mulheres estavam apresentando seus corpos uns aos outros para desonra, mas
agora, com Cristo, ambos apresentam seus corpos a Deus como culto racional.
A diferença é enorme. E a linguagem sacrificial aponta para a dimensão dessa
realidade. Cristãos não precisam mais oferecer sacrifícios na nova aliança, mas
Moo nos lembra que “o sacrifício que oferecemos não é apenas um tipo específico
de louvor ou culto, mas nossos próprios corpos”. Ele continua dizendo que “Deus
não requer apenas o que o doador por dar, ele requer o doador”. Essa é a maravilha
da transformação que Paulo está falando. Antes nos doávamos ao pecado, agora
estamos nos doando a Deus de forma viva, santa e agradável!

“E não sede conformados com este mundo, mas sede transformados pela
renovação do vosso entendimento, para que experimenteis qual seja a boa,
agradável, e perfeita vontade de Deus.” (Rm 12:2)

Essa nova realidade acontece pela renovação que Paulo explica no verso dois.
Ele está focando na renovação da mente. Aqui está outro grande contraste com o
capítulo 1. A “disposição mental reprovável” (Rm 1:28) que liderava todo o corpo
para se entregar ao pecado agora está experimentando a boa, agradável e perfeita
vontade de Deus. Aquela mente direcionada para o pecado está agora em Cristo,
direcionada para Deus. A idolatria foi quebrada e a bússola cognitiva humana
agora aponta para o Criador. E é essa nova mente que lidera o corpo para adorar a
Deus em seus atos de santidade. Essa é a grande transformação mental e corporal
que está ao alcance daqueles que colocam sua identidade em Cristo. O evangelho
tem poder para fazer isso e é essa esperança e alvo que deve ser apresentado
àqueles que estão desacreditados pelas tentações homossexuais. Muitos pensam
que é um beco sem saída. O poder acusador da atração por pessoas do mesmo
sexo é tão grande que pessoas constroem sua identidade ao redor dela e esquecem
do poder do evangelho. É nosso papel como conselheiros lembrá-los de Romanos
12:1-2 e mostrar que não há beco sem saída para Jesus Cristo. Ele tem poder para
transformar mente e corpo ao mesmo tempo em que oferece vida e paz abundantes!
5. DIRETRIZES PARA ACONSELHAMENTO
SEGUINDO PAULO EM ROMANOS
De acordo com nosso estudo, podemos resumir os seguintes princípios a partir
de Romanos: (1) Toda e qualquer prática homossexual é pecado; (2) esse pecado
da homossexualidade é a apenas um sintoma de um problema maior, a idolatria;
(3) o coração idólatra corrompe a mente e essa lidera o corpo ao pecado; (4) a
distinção mais importante, portanto, não é entre heterossexuais e homossexuais,
mas entre idólatras e adoradores de Deus; (5) o problema da idolatria é resolvido
pela salvação em Jesus Cristo, que pela justificação pela fé vivifica a mente para
santidade; (6) a mente vivificada por Cristo é guiada pelo Espírito para viver
segundo o Espírito e encontrar vida e paz; (7) essa mente vivificada pode ainda
ter tentações homossexuais e deve entender que isso não define sua identidade
e nem significa vida em pecado, mas que tais tentações podem ser vencidas; (8)
essa nova realidade de viver em santidade vencendo as tentações é uma grande
transformação de mente e corpo que agora apontam e vivem para Deus e sua
vontade.
A partir desses princípios, podemos dar algumas diretrizes para o
aconselhamento com pessoas que se identificam como homossexuais ou cristãos
que estão lidando com a atração por pessoas do mesmo sexo. Não se trata de um
método ou passo a passo, mas diretrizes para serem usadas para guiar o seu método
formal ou informal de aconselhamento.

1. Nunca negocie a verdade de que o comportamento homossexual é


pecaminoso. Não tratar como pecado significa não oferecer a única resposta
ao pecado. Essa verdade deve ser dita em amor e sabedoria, mas jamais
escondida, adulterada ou deturpada. O evangelho só transforma quando
há noção do pecado.
2. Não trate o homossexual como um beco sem saída. Muitos possuem o
pensamento de que não existe ex-gay. Isso não passa de dito popular. Eu
conheço vários. A grande transformação de Romanos 12:1-2 contrasta
Um guia de evangelismo e aconselhamento através da grande carta do apóstolo Paulo | 31

justamente com o pecado da homossexualidade em Romanos 1. O


evangelho tem poder para transformar qualquer pessoa.
3. Não tente pregar a heterossexualidade. Não force a barra para empurrar a
heterossexualidade como solução para os conflitos internos de alguém que
está lidando com a homossexualidade. Isso vai piorar as coisas. Lembre que
o problema é a idolatria e que a solução para ela não é heterossexualidade,
mas o evangelho que recalibra nossos corações para Deus. Pregue o
evangelho antes de tudo.
4. Aqueles que se dizem cristãos e estão lidando com a atração por pessoas
do mesmo sexo não devem ser identificados como homossexuais. Lembre
que suas identidades estão em Cristo e na obra de justificação. É possível
ser tentado homossexualmente e ser um cristão genuíno. Lembre de Tiago
1. Isso não deve desclassificar ninguém, mas requer cuidados pastorais. O
trabalho de aconselhamento sempre deve estar voltado para o coração e a
mente.
5. Esse aconselhamento deve se basear na realidade da mente morta para
o pecado e viva para Cristo e santidade de Romanos 6, na força da
habitação e da mente guiada pelo Espírito de Romanos 8 e na esperança da
transformação da mente e do corpo de Romanos 12.
6. Se homossexuais podem ser transformados pelo evangelho, então é papel
da igreja recebê-los, acolhê-los e aconselhá-los com base no evangelho e
nesses princípios de Romanos. Somente depois desse investimento na vida
é que podemos tomar uma decisão com base num julgamento bíblico sobre
começar ou não o discipulado cristão.
7. Se cristãos que lidam com a atração por pessoas do mesmo sexo estão
vivos para Deus e são guiados pelo Espírito, então temos tudo o que
precisamos para caminhar junto com eles nessa jornada do discipulado e
aconselhamento. E se Deus nos deu as ferramentas necessárias, isso implica
que não devemos rejeitar ou marginalizar essas pessoas.
8. Lidar com atração por pessoas do mesmo sexo não significa obrigatoriamente
que você foi chamado para o celibato. Muitos fazem essa conexão direta,
mas a Bíblia não ensina isso em lugar algum. Celibato tem a ver com
ausência de forte desejo sexual e não com desejo sexual pelo mesmo sexo.
Sim, o celibato pode ser uma boa opção, mas o crente pode ser restaurado,
vencer a tentação e buscar um casamento bíblico. Conheço pessoas que
32 | Romanos e a Homossexualidade

vivem para a glória de Deus em ambas as situações.

Portanto, que você possa encontrar em Romanos um bom material para pregar,
aconselhar e discipular pessoas que estão lidando com a homossexualidade. É um
conteúdo simples e direto, como o evangelho realmente é. Mas é um conteúdo
transformador e cheio de esperança como Romanos 12:1-2 nos mostra. Creia no
poder da Palavra e mãos à obra. Existem pessoas esperando por toda essa sabedoria
demonstrada em amor!
BIBLIOGRAFIA
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