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Não sei se vc irá ler essa minha msg, mas não poderia deixar dormir sem antes te
escrever. Assim como Paulo tenho um espinho na minha fé, tive 3 relacionamentos
homossexuais e todos altamente destrutivos, hoje com um pouco mais de um
mês que terminei com a minha ex me vejo perdida e desamparada, sou cristã
a quase 10 anos e já falei do meu homossexualismo para o meu Pastor […] Eu
amo teologia, já pensei em diversas vezes fazer, mas esse meu espinho na carne
me coloca para baixo. Já pensei e ainda penso ás vezes em tirar a minha vida [...]
Cada vez mais me convenço que não estou salva, que não faço parte da geração
eleita e que estou predestinada ao inferno, mas isso é algo que me inquieta e me
machuca muito [...] Pedro será mesmo que estou destinada ao inferno? Como
o calvinismo aborda isso? E o mais importante, será que terei uma vida estável
e feliz com Cristo? Será que terei contentamento NELE? Ou será que sou uma
incrédula com curiosidade no Cristianismo? Preciso de ajuda.2
Existem pessoas sofrendo dessa forma dentro das nossas igrejas. Pessoas sem
esperança e até mesmo com pensamento suicidas. Desde o dia que publiquei minha
carta resposta, tenho recebido várias mensagens parecidas com essa pelas redes
sociais. São pessoas procurando conselhos sobre como lidar com essa tentação. Há
um contexto que sempre se repete. São jovens membros de igrejas que aparentam
não ter coragem ou liberdade para tratar disso em suas comunidades locais. Eles
encontram em figuras públicas na internet alguma esperança para suas lutas. Estão
buscando, muitas vezes, somente alguém que escute (leia) seus dilemas e ore por
eles. Por que não buscar isso em suas próprias igrejas? O que os impede de tratar
isso pessoalmente? Devemos pensar sobre isso.
Percebo dois lados nesses casos. Há o lado da própria pessoa não estar disposta
a confessar seu pecado cara a cara com sua igreja e não desejar passar por um
processo de aconselhamento e, se necessário, disciplina. Sei que isso é verdade
em parte desses casos, mas gostaria de focar no outro lado, o da igreja. Se por um
lado bons livros e ótimos materiais na internet têm ajudado pessoas com tentações
homossexuais a se sentirem mais livres para falar sobre isso, por outro lado, muitas
igrejas, principalmente as mais tradicionais, ainda não lidam com esse assunto de
forma adequada. Há uma grande imaturidade eclesiástica nesse ponto que precisa
ser resolvida. Muitos evangélicos tratam esse pecado como a “blasfêmia contra o
Espírito Santo”. Muitas igrejas não falam sobre isso e geram um ambiente hostil a
qualquer possibilidade de conversa.
Se esse é um problema real, então precisamos enfrentá-lo. A demanda existe
e tem aumentado. Precisamos nos preparar para ela. Precisamos ter respostas
bíblicas para jovens que estão sofrendo pela luta solitária contra a atração por
pessoas do mesmo sexo. Quero oferecer uma contribuição através da carta de
Paulo aos romanos. Creio que esse é o melhor livro bíblico para ser usado em
aconselhamentos nessa situação. É lá que encontramos, no capítulo um, o texto
mais direto e profundo sobre homossexualidade no Novo Testamento. E não só
isso, é no restante de Romanos que encontramos o caminho da graça divina para
lidar com esse pecado e suas tentações. A proposta deste e-book é apresentar uma
estrutura de aconselhamento bíblico para pessoas com tentações homossexuais
2 Ibid.
Um guia de evangelismo e aconselhamento através da grande carta do apóstolo Paulo | 7
“Por causa disso Deus os entregou a paixões vergonhosas. Até suas mulheres
trocaram suas relações sexuais naturais por outras, contrárias à natureza. Da
mesma forma, os homens também abandonaram as relações naturais com as
mulheres e se inflamaram de paixão uns pelos outros. Começaram a cometer atos
indecentes, homens com homens, e receberam em si mesmos o castigo merecido
pela sua perversão.” (Romanos 1:26-27)
criador. Afirmar, como Boswell (1980: 114, 112), que Paulo considera os atos
homossexuais como “extraordinários e peculiares” mas não “moralmente
repreensível” é ignorar o sentido claro do texto, que coloca sua referência explícita
à homossexualidade em paralelo com a “disposição mental e conduta imprópria”
que a lista de vício de 1:29-31 elabora. (HAYS, 1986, p. 195)
“Portanto, a ira de Deus é revelada do céu contra toda impiedade e injustiça dos
homens que suprimem a verdade pela injustiça” (Rm 1:18)
No contexto mais geral de Romanos, sabemos que o apóstolo está falando sobre
a depravação da humanidade. O argumento de Paulo nessa perícope é demonstrar
que toda a humanidade está sob a justa condenação de Deus. No capítulo dois,
ele argumenta que nem mesmo os judeus escapam dessa realidade. O que Paulo
faz nesses primeiros capítulos é uma preparação para sua doutrina da justificação
que será exposta nos capítulos três, quatro e cinco. Sua soteriologia começa com
a realidade do pecado, afinal, por que precisaríamos de salvação se não fôssemos
pecadores? É isso que John Stott (2007, p. 33) comenta sobre o contexto:
Um guia de evangelismo e aconselhamento através da grande carta do apóstolo Paulo | 11
Antes de demonstrar que tanto judeus como gentios podem ter acesso à salvação
(como ele diz em 1.16), Paulo precisa provar que tanto um quanto o outro
precisam dessa salvação. O propósito dessa passagem é, portanto, mostrar que
“todos judeus e não-judeus estão debaixo do poder do pecado” [...] Ele não se
limita a fazer uma acusação; apresenta evidências a fim de provar a nossa culpa e
assegurar a nossa convicção.
É claro, pelo contexto, que tudo aquilo que Paulo mencionará negativamente
nesse texto está incluído nas categorias de impiedade e injustiça. O verso 24 lança
mais luz sobre essa realidade:
Paulo usou três expressões que deixam clara a pecaminosidade dos atos que ele
listará adiante. Ele fala de impureza sexual, desejos pecaminosos e degradação dos
corpos. Não há como imaginar que aquilo que Paulo citará trata-se de algo natural
ou neutro. A linguagem do seu discurso é completamente voltada para deixar claro
que a situação da humanidade é uma grave situação de pecado e condenação. O
verso 26 reforça essa ideia falando em “paixões vergonhosas” e Paulo faz questão
de dizer que os pecados listados são fruto de uma “mente reprovável” no verso 28.
Todo o contexto fala de coisas condenáveis diante de Deus e tenta mostrar que o
homem é indesculpável (Rm 1:20). Negar que a prática homossexual está sendo
citada como pecado é negar uma leitura simples e clara desse texto das Escrituras.
Paulo está afirmando com todas as letras que a homossexualidade é pecado.
E quanto aos argumentos de Boswell? Sua leitura do texto afirma que não há
uma condenação à prática homossexual em si, mas à prática homossexual feita
por heterossexuais. Obviamente, Boswell crê que algumas pessoas nascem gays,
ou seja, são por natureza homossexuais. Esse argumento ganha algum tipo de
espaço quando as pessoas usam a ideia de Paulo da troca de relações naturais por
relações contrárias à natureza (Rm 1:26). Assim, se duas pessoas naturalmente
homossexuais se relacionam, não haveria pecado, pois a relação seria coerente
com a natureza. O pecado estaria quando um heterossexual se envolve em relações
homossexuais, seja por algum fetiche, estupro ou desejo estranho. Para Hays (1986,
p. 199), esse é o argumento de Boswell mais repetido na discussão contemporânea
na igreja. Ouvimos muito esse argumento na forma de “se dois gays se amam e
12 | Romanos e a Homossexualidade
vivem bem um com o outro, que mal tem diante de Deus?”. Ou “se Deus me fez
assim, como pode ser pecado?”. O texto de Romanos fala algo sobre isso?
Em primeiro lugar, devemos começar com a sexualidade planejada por Deus
para o homem. Em Gênesis 1, a Bíblia nos diz que Deus criou homem e mulher
para frutificar e multiplicar (Gn 1:28). Já no capítulo 2, percebemos claramente que
Deus fez a mulher para o homem (Gn 2:18) e que ambos, macho e fêmea, seriam
uma só carne (Gn 2:24). A criação divina aponta para a relação heterossexual como
o único modelo natural e aprovado por Deus. A Lei de Deus confirma essa verdade
e reflete a criação de Deus ao condenar o homem que se deita com outro homem
como se fosse mulher (Lv 18:22). O texto chama essa prática homossexual de
abominação. Ainda devemos lembrar duas listas de pecados no Novo Testamento
que citam a homossexualidade: 1 Coríntios 6:9-10 e 1 Timóteo 1:9-11. Esses
são textos e argumentos suficientes para afirmarmos com segurança que toda e
qualquer prática homossexual é pecaminosa e contrária à natureza criada por
Deus.
Essa primeira resposta já derruba toda a argumentação de Boswell, mas
podemos ir além. O contexto cultural e histórico do discurso de Paulo nega
claramente a possibilidade da referência ser apenas a um grupo específico de
heterossexuais que praticam a homossexualidade. Seu uso da palavra “natureza”
carrega um significado conectado com o judaísmo da época. Douglas Moo (1996,
p. 114) comenta:
O uso de Paulo da palavra “natureza” nesse verso provavelmente deve muito aos
autores judeus, particularmente a Filo, que incluiu a moralidade sexual como
parte da “lei natural” e, portanto, como um mandato divino aplicável a todas as
pessoas. Violações dessa lei, como no caso de Sodoma, são, portanto, consideradas
transgressões da vontade de Deus”.
Paulo é um autor judeu que escreve a partir de uma mente judaica. Seus
pressupostos não partem da visão romana sobre a homossexualidade, mas da
visão judaica dada na lei de Deus e no padrão da criação. Moo (1996, p. 115)
argumenta nessa linha ao afirmar que a expressão paulina “contra a natureza”
(παρα φυσιν) no verso 26 indica um pecado contra Deus e um “apelo a ordem
criada de Deus”. Schreiner (1998, p. 256) lembra que tanto Filo como Josefo
falaram da homossexualidade como παρα φυσιν (contra a natureza). O raciocínio
de Paulo ganha sentido quando focado em seu contexto de idolatria. Os homens
Um guia de evangelismo e aconselhamento através da grande carta do apóstolo Paulo | 13
não glorificaram a Deus como criador e o trocaram por criaturas. Essa troca os
levou a não reconhecer a ordem criada de Deus, ou seja, sua lei natural. Por isso
foram entregues ao seu próprio estilo de vida, um estilo contra a natureza e contra
o Deus criador da natureza. Esse contexto deixa claro que a natureza a que Paulo
se refere não tem a ver com nascer naturalmente homossexual, mas com o fato de
que Deus criou homem e mulher para relações heterossexuais. Nesse sentido, toda
relação homossexual é contra a natureza e contra Deus.
Outra linha de argumentação que visa especificar um tipo de relação
homossexual proibida em Romanos 1:26-27 é a de Robin Scroggs (New Testament
and Homosexuality). Para ele, a condenação de Paulo se refere ao pecado da
pederastia. Sua tese parte de uma análise histórica do mundo greco-romano da
época e acerta ao observar que as relações sexuais abusivas entre um homem
adulto e um garoto realmente aconteciam e eram parte da sociedade. Porém,
não há indício nenhum de que Paulo estaria tratando apenas disso. Todo o
contexto bíblico aponta para a pecaminosidade de toda e qualquer relação sexual
homossexual. Dois argumentos do texto confirmam essa ideia. Em primeiro
lugar, não há menção de um relacionamento homossexual entre um homem e um
garoto, mas entre homem e homem (αρσενες εν αρσεσιν). Há palavras no grego
para falar de um relacionamento de pederastia e Paulo não as usa. Em segundo
lugar, a referência a relações homossexuais femininas no verso 26 também exclui
essa possibilidade, visto que a pederastia se refere a relações masculinas.
A conclusão que chegamos é que não há evidência textual que aponte para
outro argumento que não seja o de que Paulo está condenando toda e qualquer
relação homossexual. Tanto o texto bíblico de Romanos 1:18-32, como o padrão
sexual de toda a Bíblia e a visão judaica da homossexualidade confirmam essa
posição. Em sua dissertação sobre o tema, Gilders (1993, p. 115) concluiu:
Fica clara a relação que Paulo faz entre idolatria e corrupção da mente. Um
coração idólatra é um coração insensato e obscurecido (Rm 1:21) e tal disposição
de coração corrompe os pensamentos. No livro A Mente do Espírito, Keener usa
esse texto de Romanos para demonstrar como a mente humana está corrompida e
precisa de redenção. Seu resumo do argumento de Paulo é muito útil nesse ponto.
mostrar.
Não vejo nesse texto, como alguns afirmam, que a homossexualidade é citada
por ser o pior dos pecados contra Deus. Não há nenhum indício textual de que
há uma argumentação sobre grau de pecados. Se olharmos para a lei de Deus,
veremos, por exemplo, que o assassinato é um pecado mais ofensivo diante de
Deus do que a homossexualidade (Gn 9:6). Além disso, no próprio argumento
do texto, o principal problema da humanidade é a idolatria. Isso não diz que a
homossexualidade não é pecado ou que podemos considerá-la algo normal ou
mais aceitável. De maneira nenhuma. Devemos afirmar a pecaminosidade do ato
enquanto lembramos que ela está nessa passagem para mostrar a corrupção da
mente idólatra. É essa mente corrompida que gera todos os pecados, inclusive esse
que estamos tratando.
diante de Deus. Fazendo isso podemos encontrar dois tipos de pessoas. Um tipo
é aquele em que a vida está baseada na idolatria. São corações não convertidos e
que, portanto, estão com suas mentes corrompidas e contrárias a Deus. A Bíblia é
clara sobre esse tipo de pessoa, eles precisam de um novo coração. O segundo tipo
de pessoa é aquele que já adora a Deus. Eles já receberam um novo coração, mas
ainda lutam contra as tentações da idolatria. Ainda são tentados a abandonar a lei
natural de Deus. Esses precisam alinhar seus pensamentos e comportamento com
o Deus que adoram em seus corações.
“Mas agora se manifestou uma justiça que provém de Deus, independente da lei,
da qual testemunham a Lei e os Profetas, justiça de Deus mediante a fé em Jesus
Cristo para todos os que crêem. Não há distinção, pois todos pecaram e estão
destituídos da glória de Deus, sendo justificados gratuitamente por sua graça,
por meio da redenção que há em Cristo Jesus.” (Rm 3:21-24)
Paulo está dizendo é que morremos para a vida idólatra descrita em 1:18-32 e
ressuscitamos para uma vida de adoração a Deus em todas as coisas. Ele deixa
claro que a antiga natureza idólatra foi crucificada com Cristo e que, por isso,
não servimos mais ao pecado (6:6). Ora, se o coração idólatra foi crucificado e
recebemos um novo coração, aquela vida de mente corrompida já não existe mais.
Ao renovar o coração, Deus também cura nossas mentes. É por isso que Paulo
chega ao verso 11 e diz:
“Da mesma forma, considerem-se mortos para o pecado, mas vivos para Deus
em Cristo Jesus.” (Rm 6:11)
Toda essa realidade que Paulo está apresentando nos dá uma nova identidade e
é exatamente isso que o apóstolo está tentando mostrar aos seus leitores. Não somos
mais identificados como idólatras, mas como pessoas vivificadas “para Deus em
Cristo”. Keener (1998, p. 89) identifica o aspecto intelectual ou cognitivo quando
Paulo diz “considerem-se”. Ele está convocando os crentes a pensarem sobre si
mesmos como possuidores dessa nova identidade. Essa é a mente renovada da sua
corrupção, uma mente que reconhece e aceita a ordem natural da criação de Deus
e que vê a si mesma como uma mente que vive agora para o próprio Deus. Keener
comenta:
“Quem vive segundo a carne tem a mente voltada para o que a carne deseja;
mas quem, de acordo com o Espírito, tem a mente voltada para o que o Espírito
deseja.” (Rm 8:5)
Essa é a esperança que temos para oferecer ao crente em Jesus que possui atração
por pessoas do mesmo sexo. Pessoas nessa situação podem ter confiança de quem
podem viver uma vida norteada não pela homossexualidade, mas pelo Espírito de
Deus. Mesmo com a presença da tentação homossexual, a mente cristã é capaz de
negar as tentações da carne e viver, em vida plena e paz, a vontade de Deus (Rm
8:6). Para entendermos melhor essa esperança, precisamos esclarecer a relação
entre tentações homossexuais e o pecado da homossexualidade. O pastor Lisânias
Moura (2017, p. 105) nos ajuda nesse ponto ao separar a experiência homossexual,
vamos chamar assim, em três níveis. Para ele, há o nível dos sentimentos, o nível
dos desejos e o nível da prática. Moura explica que no nível dos sentimentos não
há pecado.
Nesse nível, estamos falando de sentimentos que muitas vezes nos tomam de
assalto. E claro que ninguém tem um “botão de acionamento sentimental”
implantado no corpo, que pode ser desligado ou ligado quando se deseja [...]
Um guia de evangelismo e aconselhamento através da grande carta do apóstolo Paulo | 23
Assim, mesmo um homem casado e apaixonado pela esposa pode ser despertado
sexualmente ao ver uma mulher bonita vestida de modo sensual. Da mesma
forma, uma pessoa pode sentir atração sexual por alguém do mesmo sexo. Essa
atração pode ocorrer uma vez na vida, de vez em quando ou raramente. Em
termos bíblicos, podemos dizer que se trata daquele sentimento que em si mesmo
não constitui pecado, por não ser fruto de uma escolha que contraria o que Deus
deseja. Ele surge repentinamente. E, ao surgir, o indivíduo precisa resolver o que
fará com ele. (MOURA, Lisânias. 2017, p. 105)
É esse tipo de mente que está descrita em Romanos 8:5-7. Uma mente que
encontra sua identidade em Cristo e que, por isso, é guiada não por qualquer
atração sexual, mas pelo Espírito de Deus. É isso que cada crente deve lembrar.
Sobre esse texto Keener (2018, p. 217) comenta:
“Os crentes devem aceitar não apenas a realidade de sua nova identidade que
decorre de sua união com Cristo, mas também a realidade de que Cristo e o
próprio Espírito de Deus vivem dentro deles. Esses são recursos ainda maiores
para alcançar o bem moral e cívico que as espécies de recursos cognitivos dos
quais a maioria do filósofos lançava mão.”
santa da igreja se faz necessária. É preciso esperança de que a mente guiada pelo
Espírito responderá positivamente ao confronto misericordioso.
O que Tiago fala em sua carta, no capítulo 1, é muito parecido com o que
acabamos de ver sobre os três níveis propostos por Moura. Preste atenção na
seguinte passagem:
“Ao contrário, cada um é tentado pela sua própria cobiça, quando esta o atrai e
seduz. Então a cobiça, depois de haver concebido, dá à luz o pecado; e o pecado,
uma vez consumado, gera a morte.” (Tiago 1:14-15)
Estágio 1
Alguns desejos depravados internos da carne são estimulados pelo pensamento ou
pela experiência: “Ao contrário, cada um é tentado pela sua própria cobiça, quando
esta o atrai e seduz” (Tg 1:14)
Entender esse primeiro estágio é fundamental para todo o processo de
libertação da escravidão do pecado sexual. Onde está o problema? Tiago é claro
ao afirmar que o grande problema não está em Satanás ou no mundo, mas está
em nós, em nossa própria cobiça. A expressão atrair e seduzir é mais literalmente
entendida como arrastar e atrair. Tiago usa uma linguagem da pesca no grego. Sua
analogia é a de um peixe preso ao anzol e arrastado para fora da água pelo pescador.
Nós estamos presos e somos arrastados por nossa própria cobiça. Armamos
a armadilha para nós mesmos! É para o nosso coração, como centro de nossas
vontades, emoções e crenças, que devemos olhar. Lá está o grande problema. É
dele que precisamos tratar!
Estágio 2
A cobiça concebe num coração fértil quando ele ganha o consentimento da
vontade: “Então a cobiça, depois de haver concebido” (Tg 1:15a)
No estágio 1, seus desejos pecaminosos são estimulados, mas você pode
26 | Romanos e a Homossexualidade
decidir o que fazer com esses estímulos. Isso é tentação e a tentação não é pecado.
O que você fará com ela é que pode vir a ser. Neste estágio dois, a cobiça concebe,
ou seja, torna o coração fértil para a tentação e o pecado. A analogia de Tiago é
com a gravidez. Quando o desejo se une à tentação, eles gestam o pecado, que
começará a se desenvolver.
Estágio 3
O coração fecundado com a cobiça, em algum momento, dará à luz aos atos visíveis
de transgressão: “Então a cobiça, depois de haver concebido, dá à luz o pecado;” (Tg
1:15a)
O coração alimentado e que está fértil para o desejo pecaminoso buscará
externalizar isso em algum momento com uma prática pecaminosa visível. O
pecado em gestação dá à luz a um pecado formado e visível. Muitas vezes, não
há nem a necessidade de novos estímulos, pois a cobiça já está trabalhando
deliberadamente no coração.
Estágio 4
O pecado completamente formado resulta em morte: “e o pecado, uma vez
consumado, gera a morte.” (Tg 1:15b)
O que é essa morte gerada pelo pecado? A linguagem e o discurso de Tiago se
parecem muito com Provérbios 5-9 e sua questão sobre o pecado que gera a morte,
o afastamento da lei de Deus e da aliança com Deus, que levará à morte eterna.
Antes, no capítulo 1, Tiago fala da perseverança que produz a vida, coroa da vida.
Sinal da vida eterna que começou com a vida aqui e agora. Creio que morte é essa
separação atual de Deus que se refletirá na morte eterna. Aqui e agora, quando
pecado gera a morte, ele nos afasta de Deus e nos coloca em idolatria e escravização
sexual.
Entender esse processo de nascimento do pecado é fundamental para duas
coisas. Primeiro, não podemos condenar e rotular uma pessoa somente por suas
tentações. É preciso ter cuidado com isso. Há exceções em casos mais graves,
quando as tentações precisam ser tratadas de formas específicas, mas falando de
atração por pessoas do mesmo sexo, devemos entender que o pecado ainda não foi
gerado e que as tentações podem ser vencidas. Esse é o segundo ponto. Devemos
manter a luta no primeiro estágio. Nenhum cristão se alegra e define a si mesmo
Um guia de evangelismo e aconselhamento através da grande carta do apóstolo Paulo | 27
por suas tentações e desejos pecaminosos. Se nesse estágio o pecado ainda não foi
gerado, é possível viver em santidade para a glória de Deus enquanto se convive
com a atração por pessoas do mesmo sexo ou outras tentações.
É interessante olharmos para a promessa do verso 6. “Porque a inclinação da
carne é morte; mas a inclinação do Espírito é vida e paz”. Geralmente o mundo pensa
o contrário quando o assunto é santidade cristã, principalmente em se tratando
de homossexualidade. A opinião geral é que, ao se tentar viver a santidade cristã
negando a atração por pessoas do mesmo sexo e os desejos que surgem a partir
dela, a pessoa entrará num conflito maléfico consigo mesma. Se fala em depressão,
opressão e outros perigos de tal atitude. Mas o que a Bíblia ensina é que uma mente
guiada pelo Espírito, independentemente das tentações com que luta, encontra
vida e paz. É para essas coisas que o Espírito Santo nos inclina. Douglas Moo
(1996, p. 488) comenta:
Vida e paz denotam esse estado de liberdade da lei do pecado e da morte que
começa para o crente nesta vida, embora menor que sua forma final e definitiva.
As palavras não denotam um estado mental subjetivo (e.g., paz de espírito e
coração), mas a realidade objetiva da salvação na qual o crente, que tem a mente
do Espírito, entrou. A paz aqui é aquela paz com Deus dada através da justificação
(ver 5: 1; cf. também 14:17), o estado que está em contraste com a inimizade não-
cristã em relação a Deus (ver v.7).
santo e agradável a Deus. Perceba o grande contraste com o capítulo 1. Lá foi dito
que a realidade sem Cristo era de uma entrega “às concupiscências de seus corações,
à imundícia, para desonrarem seus corpos entre si” (Rm 1:24). Sem Cristo, homens
e mulheres estavam apresentando seus corpos uns aos outros para desonra, mas
agora, com Cristo, ambos apresentam seus corpos a Deus como culto racional.
A diferença é enorme. E a linguagem sacrificial aponta para a dimensão dessa
realidade. Cristãos não precisam mais oferecer sacrifícios na nova aliança, mas
Moo nos lembra que “o sacrifício que oferecemos não é apenas um tipo específico
de louvor ou culto, mas nossos próprios corpos”. Ele continua dizendo que “Deus
não requer apenas o que o doador por dar, ele requer o doador”. Essa é a maravilha
da transformação que Paulo está falando. Antes nos doávamos ao pecado, agora
estamos nos doando a Deus de forma viva, santa e agradável!
“E não sede conformados com este mundo, mas sede transformados pela
renovação do vosso entendimento, para que experimenteis qual seja a boa,
agradável, e perfeita vontade de Deus.” (Rm 12:2)
Essa nova realidade acontece pela renovação que Paulo explica no verso dois.
Ele está focando na renovação da mente. Aqui está outro grande contraste com o
capítulo 1. A “disposição mental reprovável” (Rm 1:28) que liderava todo o corpo
para se entregar ao pecado agora está experimentando a boa, agradável e perfeita
vontade de Deus. Aquela mente direcionada para o pecado está agora em Cristo,
direcionada para Deus. A idolatria foi quebrada e a bússola cognitiva humana
agora aponta para o Criador. E é essa nova mente que lidera o corpo para adorar a
Deus em seus atos de santidade. Essa é a grande transformação mental e corporal
que está ao alcance daqueles que colocam sua identidade em Cristo. O evangelho
tem poder para fazer isso e é essa esperança e alvo que deve ser apresentado
àqueles que estão desacreditados pelas tentações homossexuais. Muitos pensam
que é um beco sem saída. O poder acusador da atração por pessoas do mesmo
sexo é tão grande que pessoas constroem sua identidade ao redor dela e esquecem
do poder do evangelho. É nosso papel como conselheiros lembrá-los de Romanos
12:1-2 e mostrar que não há beco sem saída para Jesus Cristo. Ele tem poder para
transformar mente e corpo ao mesmo tempo em que oferece vida e paz abundantes!
5. DIRETRIZES PARA ACONSELHAMENTO
SEGUINDO PAULO EM ROMANOS
De acordo com nosso estudo, podemos resumir os seguintes princípios a partir
de Romanos: (1) Toda e qualquer prática homossexual é pecado; (2) esse pecado
da homossexualidade é a apenas um sintoma de um problema maior, a idolatria;
(3) o coração idólatra corrompe a mente e essa lidera o corpo ao pecado; (4) a
distinção mais importante, portanto, não é entre heterossexuais e homossexuais,
mas entre idólatras e adoradores de Deus; (5) o problema da idolatria é resolvido
pela salvação em Jesus Cristo, que pela justificação pela fé vivifica a mente para
santidade; (6) a mente vivificada por Cristo é guiada pelo Espírito para viver
segundo o Espírito e encontrar vida e paz; (7) essa mente vivificada pode ainda
ter tentações homossexuais e deve entender que isso não define sua identidade
e nem significa vida em pecado, mas que tais tentações podem ser vencidas; (8)
essa nova realidade de viver em santidade vencendo as tentações é uma grande
transformação de mente e corpo que agora apontam e vivem para Deus e sua
vontade.
A partir desses princípios, podemos dar algumas diretrizes para o
aconselhamento com pessoas que se identificam como homossexuais ou cristãos
que estão lidando com a atração por pessoas do mesmo sexo. Não se trata de um
método ou passo a passo, mas diretrizes para serem usadas para guiar o seu método
formal ou informal de aconselhamento.
Portanto, que você possa encontrar em Romanos um bom material para pregar,
aconselhar e discipular pessoas que estão lidando com a homossexualidade. É um
conteúdo simples e direto, como o evangelho realmente é. Mas é um conteúdo
transformador e cheio de esperança como Romanos 12:1-2 nos mostra. Creia no
poder da Palavra e mãos à obra. Existem pessoas esperando por toda essa sabedoria
demonstrada em amor!
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