O dia de Pentecostes chegou de modo estrondoso. Em manifestações que
lembravam os raios, terremoto e trovões da teofania no Sinai, Pentecostes foi acompanhado de “um vento impetuoso”, línguas de fogo e a capacidade dada pelo Espírito de os discípulos falarem em línguas que nunca aprenderam. Para explicar os acontecimentos extraordinários, Pedro, o porta-voz dos apóstolos, citou o profeta Joel e usou linguagem apocalíptica que lembrava os acontecimentos aterradores de Êxodo 19. Apesar de Pentecostes/Semanas sempre ter sido uma festa de colheita, só agora a natureza da colheita fica evidente. Deus não tinha em mente e no coração uma colheita de trigo e cevada, mas uma celebração da colheita da redenção que havia se iniciado com o próprio Cristo. Abriu a sepultura nas Primícias como “primícias dos que dormem”, não apenas de corpos mortos, mas daquilo que esses corpos evidenciavam, a saber, o mundo morto em pecado (Ap 1.5). E, se Cristo era o primeiro feixe, a colheita mais plena faria os cestos transbordarem e teria dimensões cósmicas. Ao citar Joel, Pedro sugere uma redenção tão grandiosa que incluiria jovens e velhos, homens e mulheres e todas as nações. “Todo aquele que invocar o nome do Senhor será salvo” (At 2.21). Os apóstolos haviam recebido a instrução de esperar pela dádiva da promessa, mas a dádiva era mais do que sonharam. “Mas recebereis poder, ao descer sobre vós o Espírito Santo, e sereis minhas testemunhas tanto em Jerusalém como em toda a Judeia e Samaria e até aos confins da terra” (At 1.8). E difícil ignorar o ponto central da declaração: o Espírito Santo foi derramado para lhes dar a capacitação e o poder necessários para a etapa seguinte da obra redentora de Deus, isto é, a missão dos discípulos. Somente pelo poder do Espírito derramado o reino de Deus se expandiria da presença física de Jesus na Palestina do século Io. para os confins da terra; somente por meio da ousadia concedida pelo Espírito para homens comuns pregarem, o alcance pleno de sua redenção se tomaria conhecido. Em Pentecostes, os discípulos finalmente entenderam o que Jesus havia dito; a dádiva pela qual deviam esperar era um poder que transformaria a vida deles e o mundo. A primeira surpresa que os apóstolos incultos tiveram foi a capacidade de pregar o evangelho nas línguas das várias nações reunidas em Jerusalém para a festa. Por meio do dom de línguas em Pentecostes, o Messias Jesus começou a remir um mundo dividido pelas línguas desde a torre de Babel. Nessa narrativa, registrada em Gênesis 11, a humanidade se uniu numa conspiração. Formou uma aliança rebelde contra o Rei Criador e procurou usurpar seu lugar e tomar para si a sua glória ao construir um zigurate escalonado que chegaria até o céu. Deus frustrou a conspiração e rompeu a unidade do povo ao confundir sua linguagem. Dispersou-os por toda a terra onde as nações e, por fim, seis mil línguas, permaneceram fragmentadas, por anos a fio. A dádiva do Espírito, contudo, mudaria tudo isso. A bênção de Pentecostes subverteu a maldição de Babel e as línguas passaram a contribuir para o avanço do reino de Deus. A conspiração contra o Rei da criação foi ultrapassada pela estratégia de Jesus de trazer a redenção que reconciliaria em vez de dividir e reuniria “toda tribo, língua, povo e nação” num só povo para aprazer a Deus (Ap 5.9-10). O milagre das línguas em Pentecostes deve ser entendido à luz dessa ligação dramática entre a história do Antigo Testamento e do Novo. O dom de “línguas” foi muito mais do que uma língua pessoal de oração ou uma experiência pessoal que confirma uma segunda bênção além do dom da fé. Antes, as línguas em Pentecostes tiveram relevância cósmica e estratégica. Não foram apenas um sinal, mas um método por meio do qual o mundo gentio poderia se abrir para o governo da graça de Cristo. O milagre das línguas em Pentecostes não foi o fato de pescadores incultos falarem uma língua espiritual que nem mesmo eles entendiam, ou de a multidão entender essa língua. Antes, foi o fato de Pedro e os outros falarem línguas reais e terrenas da época, que nenhum deles aprendera e, desse modo, reivindicarem todo o universo para o Senhor Jesus, o Messias! Texto adaptado do livro: Encontrei Jesus numa festa de Israel, de John Sittema.