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Flávio Desgranges
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14065 125 Ac. 131729
III I I HUCITE(
PERGAMUM
© Dire itos autorais, 2006. BC H/UFC
de Beatriz Cabral.
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Ao conduzir e articular um processo o professor, como diretor e dra- ~ntretanto, o desenvolvimento do processo - leituras e construções
maturgista, estabelece um contexto de ficção a partir do pré-texto que de Imagens - depende em grande parte da quantidade e a qualidade
definiu previamente. Como professor-personagem ele poderá intervir na do material introduzido ao grupo. Caracterizado também como "um
construção da narrativa dramática como participante do mesmo contex- processo de investigação", o impacto que o drama terá sobre o grupo vai
to de ficção - nesta condição ele fará uso das convenções teatrais que corresponder ao material usado para envolver os participantes com o
facilitem a expressão das ações e atitudes pretendidas, selecionará o mate- processo: o pré-texto, e o material introduzido de forma gradual pelo
rial a ser investigado pelos participantes dentro do contexto da ficção, e professor, tal como pistas, documentos, fotografias, objetos, etc . Tanto
planejará a delimitação do espaço e a ambientação cênica. o pré-texto quanto o material de manutenção do processo permane-
Para seqüenciar e aprofundar os episódios e fragmentos de um proces- cem estreitamente vinculados ao papel do professor, como personagem
so dramático foram criados, no decorrer da história do drama e do teatro ou não.
na educação, uma série de convenções, que subsidiam a construção da
A PAR C ERIA PROFE SSOR-ALU NO
narrativa em grupo.
As convenções teatrais, esclarece Ionothan Neelands (1990), são indi- A parceria entre professor e aluno ou adulto e criança, em um processo
cadores da maneira pela qual tempo, espaço e presença interagem e são dramático, implica equivalência ou troca de status. O professor (ou esta-
moldados para criar difer entes tipos de significados em teatro. Diferentes giário) não está lá para definir a cena e tomar decisões, mas para entrar no
convenções irão, portanto, enfatizar diferentes po ssibilidades teatrais de jogo proposto pelas crianças. O objetivo de sua presença é sutilmente
manter o jogo e o foco, fazendo perguntas, quando necessárias. Sua sim-
tempo, espaço e presença humana.
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ples presença leva o grupo a evitar conversas paralelas e se ater à tarefa 7. Pesquisador- "Eu procuro descobrir as razões ou detalhes de uma
proposta. Outros objetivos incluem facilitar as interações e as manifesta- determinada situação". O aluno é envolvido na análise de do cumentos ou
ções individuais, também por meio de que stionamentos, simplesmente materiais, crianças assumem papéis de detetives ou cienti stas envolvidos
dirigindo a atenção para quem estiver sendo excluído ou com pouco espa- em descobertas.
ço para se posicionar. A presença do parceiro adulto é útil especialmente 8. Crítico- "Eu julgo uma determinada situação, aç ão ou trabalho".
nos encontros iniciais ou atividades de curta duração. Função de determinar o valor de algo.
Estaparceria será mais produtiva se a possibilidadede mudança de status 9. Arti sta - "Eu transformo o evento". O aluno usa a situação/tema
e linguagem for direcionada para possibilitar e ampliar o repertório do alu- como texto básico para sua criação; como estímulo ou ponto de partida;
no e sua apropriação de conceitos e formas de discurso. O pressuposto é deverá "assinar" sua interpretação.
que o aluno/ator se relaciona e se envolve com uma situação de acordo com
o papel e a função que assume. Sua linguagem e atitude vão depender da Cada função pode gerar inúmeros pap éis; o objetivo da categorização
maneira como se enquadra na situação sendo explorada por meio do dra - é facilitar ao professor detectar que funções de raciocínio e linguagem
ma. A partir dessa constatação, Dorothy Heathcote propõe aos professores estão subjacentes ao papel definido. Na concepç ão de Vigotski, é por meio
de teatro nove formas diferentes de enquadramento de uma situação, as de uma apreensão e internalização da linguagem que a criança se desen -
quais irão requerer pap éis e funçõe s distintas. Alternando entre estas for- volve. Segundo ele, é possível identificar três níveis de desenvolvimento: a
mas, professor e alunos exploram posturas, atitudes e linguagem diversas. zona de desenvolvimento real ou efetivo, composta pelo conjunto de in-
formações que a criança tem em seu poder; a zona de desenvolvimento
1. Participante - "Eu participo desta situação aqui e agora", o aluno potencial, o desenvolvimento que a criança pode vir a ter; e entre estas
(sem assumir papel) participa das negociações e decisões referentes à si- duas, a zona de desenvolvimento proximal, que se constitui por funções
tuação explor ada. ainda não maduras, mas em processo de maturação.
2. Guia - "Eu relato ou conto como foi o evento, eu estava lá". Profes- A "zona de desenvolvimento proximal': segundo Vigotski, "define a
sor ou alunos assume(m) papel que lhe(s) permitirá dar informações distância entre o que as crianças podem realizar sozinhas e o que elas são
sobre um evento anterior (imaginário ou não). capazes de fazer sob a orientação ou em colaboração com parceiros mais
3. Agente- "Eu re-apresento o evento para que este possa ser com pre- capa zes': De acordo com este conceito, o desenvolvimento cognitivo e
endido", Difere do anterior pela liberdade de criar algo que seja mais social da criança procede como um desdobramento de potenciais, me-
convincente para que outros possam compreender os fatos. diante uma atuação em parceria com pares mais capazes , o que a leva a
4. Autoridade - "Eu devo prov ar/ evidenciar a verdade do s fatos, seu alcançar níveis de desenvolvimento bem além de seu nível individual de
real significado". A autoridade (professor ou aluno) exige dos demai s desempenho (in: Light, Sheldon & Woodhead, 1991, pp. 42-61).
participante s que atitudes ou pro vidências sejam tomadas. Na perspectiva da parceria professor-aluno, um processo desen volvi-
5. Relator- "Eu relato/clarifico os acontecimentos à medida que ocor- do por meio de episódios cent rados em questionamentos e problemas a
rem , para qu e sejam mais bem compreendidos". Função do narrador. serem resolvidos, a per gunta-chave para deslanchar o processo (ou a
6. Imprensa - "Eu comento os fatos, de acordo com meu ponto de problematização) torna-se uma peça fundamental. Cecily O'Neill & Alan
vista, eu interpreto ações ou atitudes de terceiro s". Função de interpreta- Lambert (1982) lembram que uma vez um dramaturgo respondeu a al-
ção de situações da qual não participou. guém que lhe perguntava sobre a mensagem de sua peça, que se ele quises-
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se en viar mensagens ele o faria por telegrama. Segundo O'Neill & Lam- 5. perguntas que encorajam o pensamento dedutivo: "que evidências te-
bert, "é muito mais fácil pensar sobre peças em termos das perguntas que mos que o andarilho não é perigoso?", "o que os faz imaginar que o
elas nos fazem, do que sobre o que elas nos contam (. . .] Macbeth, por seqüestrador não foi capturado?"
exemplo, nos faz perguntas sob re relação de poder e sexualidade, concor-
d ância em face do m al, e vista grossa pa ra as coisas de que ach amos Interação teórico-pedagógica
me lhor não tomar conhecimento':
O conceito de pergunta-chave é útil para planejar uma montagem e Será que nos perguntamos seriam en te por que a internet consegue
para desenvolver um processo com crianças. Ao perguntar "com o pode- m anter o envolvimento da criança horas consecutivas, com textos de
mos convencer o tirano a nos deix ar pa rtir?'; ou "como poderemos lidar Shakespeare e Dante, ao passo que nós, professores, com as vantagens de
com a provo cação sem usar violência?", o professor esta rá oferecendo interações, materiais e sons, ao vivo, achamos difícil manter sua atenção
m aio res po ssibilidades de desenvolver a narrativa em grupo do qu e o faria durante cinqüenta minutos? Para responder a esta pergunta não pode-
ao perguntar "o que fazer agora?". Se pe rguntar o que fazer, ele ter á de m os deixar de refletir sobre a quantidade e a qualidade das informações
aceitar lida r com um possível "mate-o" ou "fuja", e acabou- se a história . que são oferecidas aos alunos. É possív el introduzir tema, material e estra-
A distinção entre pergu ntas abertas e fech ada s é fundamental para o tégias que engajem organicamente os alunos, sem recursos especiais?
professor qu e vai liderar um processo nar rati vo com um grupo grande de A realid ade virtual tem sido usualmente transformada em bode expia-
alunos. Algu ns autores se referem a este p rofessor com o "p rofes sor-dra- tó rio para todas as "ma zelas" decorrentes do envolvimento da criança
. ma turgista"; en treta n to , é necessário considera r aqui que esta fun ção com o computador e seu desinteresse pela escola. Entretanto, uma narra-
de dramaturgista, no caso d e um processo de drama, adquire caract e- tiva comovente, diz Janet Murray, pode ser experienciada como uma rea-
rísticas próprias, uma vez que o text o sendo criado é de au toria dos alu - lidade virtual porque nossos cérebros estão preparados para sintonizar
no s, e os limites imposto s à criação do p rofessor são maiores. É neste com hi stórias com uma intensidade capaz de apagar o mundo em volta.
sent ido que os tipos de pergunta a serem feitas ao grupo adquirem impor- Este poder da narrativa levou Platão a considerar os poetas como ameaça
tância. à república, contemporâneos de Cervantes a temer a "leitura silenciosa",
Alguns exem plos : escritores do início do século XX a investirem contra o cinema.
Este velho desejo de viver uma fantasia despertada pelo mundo da
1. perguntasqueesclarecema situaçãoou enfatizam asopções tomadas: "é ficção é at ualmente intensificado pelo meio eletrônico, im ersivo e partici-
verdade que...","Vê se eu en tend i bem .. :'. patório, cujos detalhes enciclopédicos e espaços de navegação permitem
2. perguntas que simultaneamente informam e exigem resposta: "sem que viajemos por loca ções que há muito desejamos visitar. A experiên-
arm as, com o no s de fenderem os?'; "o nde pod erem os achar um m apa das cia de ser transportado a um local simulado, com tamanha precisão, é
cavernas?" prazerosa em si, independentemente do conteúdo de sua fan tasia . A esta
3. perguntas quesugerem implicações: "nós realm ente queremos saber experiência chamamos "imersão", uma metáfora derivada da experiência
quem deu esta ordem?': "será q ue isto porá um fim em suas exigências?" física de submergir na água e ficar envolvido po r uma realidade completa-
4. perguntasqueconstroem tensão:"p osso confiar qu e vocês todos ma n- mente diferente (Murray, 1997, pp . 97-9 ).
terão este segred o?","esta ponte ainda é fort e o suficiente para agüentar Quanto mais elaborado o ambiente de imersão, mais ativa é a partici-
nós todos?" pação. Quando aquilo que se faz dentro dele apresenta resultados tangi -
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veis, o participante vivencia a segunda carac teríst ica do prazer nos am - tem associar suas imagens descontínuas a um padrão mais amp lo de
bientes eletrônicos - a sensação de ser agente. Ser agente correspo nde à continuidade. Fazemos isto porque sabemos como ler as convenções des-
satisfação de realizar ações significantes e poder observar os resultados de tes meios.
nossas decisões e escolhas. Dificilmente podemos esperar ser agentes ou O computador apresenta o mosaico espacial da primeira página de um
sermos convidados a participar em um ambiente de narração. Quando jornal, o mosaico temporal do filme, e o mosaico participativo de um
isto acontece em alguma manifestação artística da atualidade (teatro, per- controle remoto. Mas, o mais im portante é que ele nos oferece novas
formances, murais, insta lações), nossa participação está circunscrita formas de dominar esta fragmentação - ferramentas para buscar e rotu-
de forma que lim ite nosso pote ncial como agentes - o diálogo com a lar os fragmentos a fim de relacioná-los e preservar a sua história, de
audiência é mantido por um roteiro que garanta um nível m ínimo maneira que possa reconstituí-los (Murray, pp. 154-7).
de participação e padrões de relacionamento apropriados a respostas de Os princípios de "ser agente" e "transformar" são centrais às lingua-
uma multidão distanciada (inco rporação de cantos, danças e festas po- gens artísticas. Em Teatro Educação o aluno é criador e ator, ele faz e
pulares). apresenta. Mais ainda, ele o faz e/ou transforma através do próprio corpo .
No meio eletrônico, ao contrário, a possib ilidade de escolha é pratica- Esta seria uma condição privilegiada para a imersão.
mente ilimitada , surge a possibilidade de uma participação enciclopédica. O que torna este envolvimento tão excepcional no ensino das artes? Eu
A atual cultura construtivistados jogos participativos eletrôn icosfoi cons- diria que são a quantidade e a qualidade das informações à disposição do
truída por uma comunidade acadêmica que se deliciou com vinte anos de aluno, ou seja, a matéria-prima para nutrir a imaginação da criança. Para
acesso consistente a computadores. Este fato é em si uma previsão das que o fazer seja consistente e significativo, o lere o apreciartambém pre-
tendências futuras de uma ampla camada da população que está inician- cisam ser.
do on-line aos sete anos de idade. Segundo a concepção construtivista dos processos cognitivo, social e
O terce iro prazer dos amb ientes digitais, segundo a autora, é o prazer afetivo, a percepção po de ser estimulada e desenvolvida com a ampliação
da transformação. O computador oferece inúmeras maneiras de alterar a do repertório do indivíduo, contribuindo assim para a construção de no-
forma e sugerir processos, mesmo quando está apenas expondo informa- vos modos de olhar (Carretero, 1997, p. 11).
ção. Essa força transformadora torna-se particularme nte sedutora nos O desafio, para aquele professor com dificuldades de manter o interes-
ambientes narrativos.Pode-se entender esta nova forma narrativa por meio se de suas diversas tur mas (geralmente formadas por crianças com dife-
da metáfora do calidoscópio. Como salientou Marshall McLuhan, os rentes faixas etárias), pode estar em repensar sua prática de modo que
meios de com un icação no século :xx apresentam uma estrut ura mosaica identifique e incorpore material adequado à ampliação do repertório do
em vez de linear. Jornais são compostos por muitas histórias chamando aluno, tan to no que se refere à área temática a ser trabalhada quanto aos
nossa atenção em uma mesma página, filmes são compostos por um mo- elementos da forma artística explorada. Se a quantidade e a qualidade do
saico de tomadas individuais, televisão é um mosaico por meio do contro- material introduzido ao aluno for adequada, o papel do professor poderá
le remoto. Informações com esta forma de mosa ico acabaram por criar ser o de mediador na investigação e interações dos alunos.
padrões de pensamento em forma de mosaico - estamos acostumados Em face deste novo perfil do aluno que alternativas metodológicas tem
a observar um jornal sem nos surpreender com este fato , por que apre n- o professor?
demos a receber informações múltiplas com uma simp les tomada ins- Sabemos não poder competir com o computador; não o que remos e
tantânea. Similarmente, anos como espectadores de cinema nos permi- não seria esta uma solução para compensá-lo das horas sentado na frente
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do teclado. Não podemos, entretan to evitar qu e isso aconteça nem negar seus próprios interesses, apropriam-se das novas infor mações e as inte-
o potencial da aprendizagem adqui rida com os meios eletrô nicos. gram aos seus próprios sistemas de conhecimento e cre nça.
Nu ma das experiências mais gratificantes que tivemos com Drama
Educação recentemente, as crianças (oito a nove anos de idade) represen- Ao sintetizar o que a "teoria" nos diz sobre o " bom ens ino" Caroline
taram o papel de pesquisadores das antigas práticas de cura ndeiras aço- Gipps define quatro po ntos pri ncipais (Gipps, 1992, pp. 19-20):
rianas e do poder curativo e m ístico das plantas locais. Foram envolvidas 1. As crianças são capazes de ma is do que tendemos a dar- lhes crédito,
em cerimo niais de celebração das plantas, percorreram tr ilhas e realiza- desde que ente ndam a tarefa que se requer delas.
ram rituais com danças, lenços coloridos, ramos de plan tas, velas, senhas 2. A interação com outros é de cruc ial importância, tal como a lingua-
de acesso ao local do cerimo nial, e, p rincipalment e, farto material com gem.
antigas receitas sobre o uso e os costumes referentes a um a grande var ie- 3.Por meio da linguagem as crianças pequenas aprendem, entre outras
dade de plantas . Este material estava contido em um "velho baú" com coisas, a pensar.
doc umentos antigos, fotos amareladas pelo tempo, e objetos significati - 4. Mediante a interação com outros, as crian ças podem explorar seu
vos ao contexto da ficção. O cerimonial das plantas foi marcan te para pró prio conhecimento e compreender como o conhecimento que estão
tod os os participantes. Naquele moment o e naquele contexto mostrou ser adquirindo se acomoda ao seu conhecime nto anterior.
uma possibilidade a ser contraposta aos me ios eletrônicos. É necessário
salientar, porém, que segundo a avaliação das crianças, a melhor parte da As características do "bom ensino", mencionadas por Gipps, corres -
atividade foi o velho baú, entreg ue por uma "velha curandeira" , seus pondem em linhas gerais, a uma descrição ou caracterização do que ocor-
pergaminh os, fragmentos de receitas , de um diár io de uma feiticeira do re na prá tica do drama, tanto como atividade curric ular como extracurri-
século passado, receitas e cur iosidades sobre as plantas que puderam cular,onde as mu danças frequentes na inte ração ator-espectador permitem
recon hecer em seu cotidiano. Ou seja, a qualidade e a quantidade do mate- não só que o aluno revele seus interesses e habilidades, mas também os
rial introduzido pelos professor es. novos conhecimentos adquiridos com a experiência.
A construção do conhecimento em grupo, med iante a concomitante
Peter Brookvê o teatro como meio para atingir o que nenhum outro meio aquisição da linguagem, ambos decorrentes das situações criadas e me -
é capaz:"Aqui está a responsabilidade do teatro : o que um livro não pode diadas pelo professor, fica evidente a cad a etapa do processo. Neste, o
transmitir, o que nenhum filósofo pode verdadeiramente explicar,pode ser sucesso ou fracasso do drama como método de ensino ou de aprendiza-
alcançado através do teatro. Traduzir o intraduzível é um de seus pap éis" gem reflete a habi lidade do professor para coordenar as interações dos
Ambientação cênica e teatra lidade referem -se à possibilidade de levar alunos em diferentes níveis a fim de equilibrar fazere apreciare de introdu-
os participantes a participar de um a realidade virtual; de se envolver na zir situações , informações e/ou desafios na hora certa de acordo com os
fantasia despertada pelo contexto da ficção intensificado pela participação diferentes pap éis e a ções,
ativa num evento teatral. A experiência de ser par te de uma realidade Contudo, o conhecimento adq uirido dura nte o envolvimento com o
simulada já é prazerosa em si, independ entemente de seu con teúdo - esta processo do dramavai além da possibilidade de nomear aprendizagens em
experi ência pode ser chamada de "imersão",e está longe de ser passiva; os áreas previamente determinadas- objetivos específicos (relacionados com
participantes constroem as próprias narrativas, imaginam pessoas co- o conhecimento de conceitos , hab ilidades, conteúdos e form as artí sticas)
nhecidas na pele de seus personagens, ajustam a história para satisfazer interagem com objetivo s não específicos (relacionados com o desenvol-
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vimento de atitudes e valores), fazendo que a experiência viva do fazer tea -
tral, do agir e do observar concomitantes, transforme a compreensão ou
o entendimento dos participantes em nível estético e artístico.
A singularidade do drama como processo é que é possível considerá-lo
tanto como métododeensino, permitindo abordar e desenvolver qualquer
tema ou situação dentro ou fora do currículo; quanto como eixo curricu-
lar, podendo ser caracterizado como uma atividade independente das de- DRAMA COMO EIXO CURRICULAR
mais disciplinas, mas capaz de gerar interesse ou pontos de ligação com
qualquer outra das áreas curriculares.
NO ENSINO FUNDAMENTAL
Como método de ensino, o foco da presente análise, tem sido o apare-
cimento de convenções e expressões para facilitar a compreensão do pro- Os primeiros anos do primeiro grau vão definir o engajamen-
fessor quanto ao potencial do drama para ativar objetivos educacionais e to emocional da criança com o processo de aprendizagem, engajamento
expressivos. Torna-se aqui evidente que a eficácia do drama na educação e este que vai repercutir na sua alfabetização e na sua atitude para com a
formação do aluno reside na sua eficácia como forma de arte. escola . A atividade dramática está centrada na interação com contexto e
Como a arte se encontra no limiar entre o individual e o universal, sua circunstâncias diversas, em que os participantes assumem papéis e vivem
forma, métodos e estratégias artísticas são atualizados em função do con- personagens comose fizessem parte daquele contexto naquelas circuns-
texto de sua criação ou recepção. Assim, o referencial metodológico desta - tâncias. Para o participante isto significa "assumir o controle da situa-
cado nas experiências relatadas nesta publicação foi enfatizado, acrescen- ção", ser o responsável pelos fatos ocorridos. Envolvimento emocional e
tado ou transformado de acordo com as necessidades do contexto escolar responsabilidade pelo desenvolvimento da atividade são características
local (escola pública, Florianópolis, 1995-1997), e em decorrência, o foco essenciais do drama - o aluno é o autor da sua criação.
da investigação referente à especificidade da linguagem teatral apresentou O uso do drama, como tema gerador dentro do currículo de primei-
alguns procedimentos comuns ao desenvolvimento das diversas expe- ro grau, refere -se assim a uma investigação ativa das circunstâncias e
riências que subsidiaram esta pesquisa. contexto definidos pelo professor ou professor e alunos, a partir do pro-
grama e/ou assuntos de interesse comum, os quais possam apresentar
pontos de contato com as demais disciplinas.
A particularidade desta investigação ativa por meio da atividade dra-
mática é que ela envolve os alunos com áreas complexas da experiência
humana, a fim de descobrir as questões e assuntos relevantes às suas
necessidades. Trata-se de um processo de investigação cíclico e contínuo
porque a natureza do drama tem a ver com o descobrir e redescobrir
novas dimensões na material sendo investigado.
Como o drama está essencialmente voltado à diversidade da expe-
riência humana, ele tende a provocar novos níveis de questionamento
em vez de promover respostas. Os níveis de questionamento abertos fa-
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rão a ponte com as demais áreas do currículo; o aluno ao investigar as -. Instru mentos de trabalho indispensáveis ao início das atividades
respostas o fará de acordo com suas necessidades e interesse, caracteri- na nova terra.
zand o-se assim como produtor dos conhecimentos adquiridos em vez -. Objetos que permitam manter a identid ade e seu reconhecimento
de mero reprodutor do que lhe é passado pelo pro fessor. pelos novos pares.
A utilização de um tema gerador revela-se como uma tentativa de • Objetos que preservem a memória daqueles que ficaram para trás
integrar uma variedade de áreas de ensino a partir de um mesmo tema . c que tenham algum significado especial na sua história de vida.
Geralmente os pontos de ca ntata entre as diferentes áreas são tênues e
percebidos somente pelo professor, não pelos aluno s. A Prá tica como Pesqui sa
O contexto dramático cria elos de forma significante para o cruza-
mento temático. As atividades das diferentes áreas de aprendizagem po- A prática como pesquisa distingue-se da pesquisa sobre a prática,
dem ser geradas de maneira tal que ganham coerência, porque surgem caracterizando-se como uma investigação centrada no relacionamento
do contexto explorado e dos papéis desemp enhados. professor-aluno na busca do conhecimento formal em teatro. O aspec-
Para tanto, após selecionar os temas, é importante estabelecer os fo- to que melhor a identifica seria então o grau de visibilidade que ela man-
cos dramáticos e suas possíveis analogias com o contexto sociocultural tém do foco de pesquisa , tornando evidente durante o proces so as ques-
em que se vai trabalhar. Dessa forma será garantida a ressonância entre tões sendo investigadas e as distintas formas de resposta. A natureza
o contexto da ficção e as preocupações e interesses locais. essencialmente social dessa atividade na área do teatro acentua sua di-
A busca de analogias implica examinar o subte xto ou as intenções mensão ética, ideológica e política tanto quanto epistemológica. Ética,
por trás das a ções e situações propostas, para detectar o que pode ser ao questionar os valores embutidos na prática sob investigação; ideoló-
comum a outros seres humanos que vivem em contextos similares. No gica, na medida em que a pesquisa realizada de forma coletiva prioriza,
caso dos imigrantes açorianos, por exemplo, o professor pode estabele- em si, a democratização do acesso e do conhecimento; política, em de-
cer uma das questões para subsidiar sua abordagem inicial ao tema: corrência dos princípios de autonomia e cidadania subjacentes a estes
processos.
• Imigrantes são todos aqueles que escolhem o desconh ecido, por Essa forma de pesquisa é particularmente apropriada para o estudo
exemplo, exploradores, pion eiros, pesquisadore s. do teatro no cont exto educacional, uma vez que articula teoria e prática
• Imigrant es são todos aqueles qu e carregam consigo seus bens, por a partir da interação entre alunos e professor. Quando essas articulação
exemplo, tribo s nôm ades, campi stas, sem-teto, vítimas de catástrofes. e interação acontecem dentro dos parâmetros da prática de ensino, isto
• Imigrantes são todo s aqueles que deixaram família e bens para trás, é, durante os estágios, tornam-se um processo de investigação aind a mais
fugindo de perseguição, e não podem retornar. produtivo, ao confrontar as percepções dos aluno s (crianças e/ou ado-
lescentes), com as dos estagiários (professores-alunos), e as do coorde-
A opção por uma destas alternativas iria ajud ar a identificar o foco nador da pesquisa (professor orientador). Compartilhar histórias de pes-
dra mático da prim eira atividade, por exemplo, no caso da tarefa usual- quisa, suas implicações, problemas e possibilidades, é acima de tudo uma
me nte usada para estabelecer o vínculo do aluno com o cont exto da imi- forma de desenvolvimento do campo de trabalho e de rompimento com
gração: "selecionar que objeto(s) levaria consigo", seriam priorizados, res- o isolamento no início da vida profissional, além de um important e veí-
pectivamente: culo para criar uma comunidade de pesquisa.Tornar este processo trans-
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parente no decorrer de seu desenvolvimento é abrir possibilidades para histó ria associada aos ob jetos era suficiente para convencer aos vivos
experimentar, confrontar e registrar alternativas. que o morto iria reiniciar um a nova vida .
Os artefatos contidos no pacote de estímulo (o qual pode ser uma
o Contexto Dramático valise, um envelope grande, uma caixa, uma trouxa, etc.) funcionam como
uma alavanca para iniciar e impulsionar o processo dramático, e vão
o desenvolvimento do professo a partir de, e delimitado por, um con- to rn ando -se menos importantes à medida que a imaginação do grupo
texto dramático torna-se fundamental para abordar o drama como eixo se fortalece. No decorrer do processo dramático poderão funcionar como
curricular. É este contexto que vai permitir que os participantes sintam- um a referência contínua aos fatos que lhe deram origem.
se livres para expor imagens e expectativas pessoais, focalizar emoções Experiências com o drama como eixo curricular, no contexto brasi-
e resolver conflitos. A mediação do professor, na esfera da ficção, des- leiro , revelam o potencial do estímulo composto para articular o con-
caracteriza a situação ensino e adquire conotação de parceria. Isto acon - texto sociocultural com o da ficção. Nos processos sobre imigração aço-
tece principalmente se o professor participar do processo como perso- riana , por exemplo, o pacote de estímulo continha: mapa do Arquipélago
l1agem. dos Açores, fotos de uma das ilhas, réplica de um pequeno objeto ou
Um recurso pedagógico eficaz para envolver os participantes com o peça de figurino, fragmento de texto referente ao anúncio de imigração
contexto dramático e, ao mesmo tempo, estimular investigações parale- (conteúdo his tórico e cultural); bilhete da avó que fora impedida de par-
las e independentes nas demais áreas curriculares, é o pacote de estímulo tir, página de um diário, medalha do santo de devoção, anel acompa-
composto. O estímulo composto reúne um conjunto de artefatos - ob- nhad o de cartão de noivado, fragmento de uma lista de bagagem (con-
jetos, fotografias, cartas e documentos, por exemplo, em uma embala- teúdo de ficção).
gem apropriada. A história que se desenvolve a partir dele ganha signifi - A característica mais importante do pacote de estímulo, entretanto,
cância através do cruzamento de seu conteúdo - o relacionamento entre parece ser o envolvimento emocional do grupo com o tema. Se o cruza-
os artefatos nele contidos - e como os detalhes de cada um sugerem mento dos artefatos, a história da origem do pacote e seu foco dramático
ações e motivações humanas. forem convincentes e esteticamente bem reso lvidos, a atenção ficará con-
A teoria do estímulo composto foi desenvolvida por John Somers centrada nos conflitos subjacentes à trama, e será afastada a possibilidade
(1994), e parte do princípio de que o impacto do drama está baseado na de a ação se transformar em mera ilustração das situações sugeridas.
possibilidade de trabalhar em dois níveis que estão interconectados e afe- O envolvimento emocional com um universo de ficção convincente é
tam um ao outro - o do contexto social dos participantes e o do con- precondição para focalizar o drama como eixo curricular. O maior risco
texto simbólico promovido pela linguagem do drama. Por exemplo, uma a ser enfrentado é a associação do processo dramático com uma ilustra-
ferramenta pode sugerir um tipo de trabalho e o trabalhador que o exe- ção dos fatos investigados nas demais disciplinas. O caminho deve ser o
cuta; uma peça de roupa pode sugerir o indivíduo que a usa e seu com- inverso - o drama permite imaginar e expressar situações imaginárias
portamento; uma carta indica o motivo pelo qual foi escrita e o relacio- sem contornos históricos, geográficos e científicos precisos. É esta im-
namento entre o remetente e o destinatário. Como lembra o autor, as precisão que irá estimular o aluno a investigar suas referências nas de -
pessoas que enterravam seus mortos com os objetos que lhes foram sig- mais áreas. Daí a importância de identificar e mencionar com freqüência
nificativos em vida, esperavam que estes garantissem ao morto a possi- o espaço do palco ou da cena, fazendo uma distinção entre os contextos
bilidade de conduzir uma nova vida e uma nova história. O poder da social e ficcional.
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BC'HIUFC
Outro aspecto a ser cons iderado é que na abordagem curricular cen - com/na cena será viabilizad a pelo antes (o qu e provocou aquela ação) e
trada em tópicos ou projetas (já tradicional), a relação entre as diferen- o depois (suas conseqüê ncias).
tes atividades ou disciplinas é t ênue , e em geral visível só para o(s)
professor( es) e não para os alunos. O drama cria diversas pontes, gera- Quadro 1
das de maneira coerente, um a vez que surgem de necessidades que emer- CAVERNAS
gem dos papéis e circunstâncias vivenciadas. Por exemplo , diferentes for-
mas de discurso, provenientes de papéis com status diversos, construção
de mapas, jornais, pinturas, cálculo de peso e medidas, etc., são exigidos
pelo processo dramático e necessidade de vero ssimilhança das cena s.
Quadros de Referên cia para o Drama como Eixo Curricular Criação e narração de
histó rias ;
Diários e t est emunhos ;
Relatórios e apresentaçã o
Os processos dram áticos apresent ados no próximo capítulo investi- de pesqui sa Lfnlua
Terceiro Encontro: Intervenç ão na Narrativa Os grupos preparam a ambientação cénica, em diferentes espaços
da escola, ensaiam. Não há texto, só roteiro. As apresentaçõe s são im-
. Para provocar a reflexão das crianças sobre as história s que estavam provisadas, mas as situações foram exploradas no decorrer do proces-
cnando, ou para levanta r suas implicações, um recurso foi utilizado du- so, e para cada retomada houve estímulos distintos. Alguns pais e outras
ran te os ensaios: um novo personagem, estranho aos grupos, interferiu classes da escola assistem às apresentações, em seqüência, e participam do
nas narrativas. Um professor-personagem apareceu nas "cavernas", o qu e debate.
requereu atitudes e provocou ações:
.. Gru po 1: Em um prim eiro mom ento, o grup o representava ho- P O NTO S D E R EFLEX ÃO
mens prim itivos caçand o e em seguida fazendo inscrições nas paredes .. O jogo teatral possibilitou coletar imagens despertadas pelo pré-
da caverna . No segundo momen to eram tur istas observando as mes- texto e por experiências anteriores relacionad as ao tema cavernas. Fez
58 59
assim um resgate cultura l sobre o assunto, ao mesmo tem po levando os
participantes a explora r fo rm as diversas de expressão . Conchas e Caramujos
.. A liberdade do jogo e a delim itação do espaço da ficção levar am as
crianças a in iciar a construção da narrativa com ma ior espo ntaneidade. Conchas e Caramujos estão presentes no dia-a-dia das cr ianças parti-
Foi visível a pronti dã o para assum ir papéis tais como hom ens das ca- cipantes deste proj eto . Algumas as encontram no fundo do quintal, ou -
vernas e tat us, com disponibilidade física e naturalidade. tras no caminho que leva à praia. A maioria tem pescadores na família,
.. A estratégia do congelam en to, usada nas im pro visações em gru - que possuem ou trabalham em restaurantes de frut os do mar. A própria
pos , permitiu fixar um determinado momento ou expressão, tanto para escola está situada entre dois desses restaurantes. O cotidiano e a rotina
destacá-lo quanto para provocar a reflexão. O congelamento tem sido tornaram as conchas e caramujos objetos despe rcebidos ou desvaloriza-
usado de duas formas distintas em drama: como po nto de partida dos pelas crianças - um levantamento inicial da quantidade e variedade
ou fechamento do trabalho - neste caso uma imagem fixa que repre - das conc has locais mostrou desconhecimento surpreendente do assunto.
senta a síntese ou o conflito central do tra balho daq uele grupo q ue a Perguntas tais como "podemos encontrar o mesmo tipo de conchas em
está apresentando; ou como forma de, a um sinal do pro fessor, ser in- diferen tes praias da redondeza? ", "existe uma época do ano ou estação em
terrompido e fixado um momento da apresentação para sua observa- que aparecem mais conchas?': "as conchas das praias de mar gro sso são
ção ou aná lise. iguais às conchas de mar calmo?': etc., surpreenderam as crianças e não
.. O obje tivo principal de se usar objetos com o foco da aç ão no jo - obtiveram respostas. A cur iosidade despertada foi partilhada em diferen-
go é estabe lecer o sentido de parceria. A estratégia requer que os partici- tes áreas curriculares e histórias sobre conchas, receitas com moluscos, e
pantes se relacionem com os objetos em vez de exibi- los. Após certa fa- superstições relacionadas com o assunto começaram a emergir.
miliarização do grupo com esse procedimento, é possível solicitar que a Enquanto pesquisa, esta etapa do projeto Leituras e Imag em do M eio
interação entre os participantes se dê a partir do objeto e não o con- A m biente através do Drama, concentrou-se no "professor-perso nagem"
trário.
(teacher-in-role) e na "parceria" criança-adulto (crianças e alunos de
teatro) - ambas as estratégias objetivando atuar sobre a "zona de de-
POSSí VEI S D ESDOBRAM ENT O S
senvolvimento proximal" dos participantes.
A continuidade deste processo seguiria a corrente do imaginário, para A "zona de desenvolvimento proximal", segundo Vigotski, "define a
investigar, explorar e questionar as im agens dos participa ntes sobre o distância entre o que as crianças podem realizar sozinhas e o que elas
tema. A atracão que ele exerce relaciona-se com mis tério, esconderijo, são capazes de fazer sob a orientação ou em colaboração com parceiros
prisão, seres estranhos e fantásticos. Pacotes de estímulo o u fragmentos ma is capazes". De acordo com este conceito o desenvolvimento cogniti-
de textos mitológicos, desenhos ou reproduções sobre esconderijos de vo e social da criança procede como um desdobramento de potenciais
contrabandistas, de fugit ivos dos quilombos, de forag idos políticos, tem através de influ ências recíprocas da criança e do meio ambiente. Da inte-
o potencial de trazer à tona registros históricos, contos e poemas que ração resultante, as crianças, mediante uma atuação em parceria com
poderão alimentar o processo. pares mais capazes, alcançam níveis de desenvolvimento bem além de
seu nível individual de desempenho.
A parceria criança-adulto permitiu tanto preparar os futuros profes-
sores quanto pesquisar o drama como método de ensino por meio de
60 61
uma exper iência de curto prazo com crianças de sete a oito anos de ida- Matr iz 1- CONCHAS E PRAIAS
de, de uma escola púb lica de Florianópolis, Santa Catarina.
PRAIA DIA HOR A MAR É VE N TO LUA C ONC H A
Indicativo de texto para D. Milica (ao receber as senhas na porteira As crianças, que foram escolhidas por Marina para receber o baú e
e entregar as plantas): ter esta experiência são agora convidadas para mostrar, por meio do
teatro de sombras, o qual será registrado em vídeo, seu conhecimento a
1. Eu estudo as plantas e ensino as pessoas a usá-las para a cura, respeito do poder das plantas. O vídeo divulgará este conhecimento para
para recuperar energia, para trazer bons fluidos para o lugar onde a outras crianças, promovendo assim o renascer dos cuidados com as plan -
gente vive. As plantas são seres vivos, têm energia, trazem saúde. tas locais com poderes curativos.
2. Nós precisamos recuperar o conhecimento e a força dos chás, Para realizar esta tarefa os participantes são divididos em pequenos
dos xaropes e tinturas, dos emplastros, assim como nossos antepassa- grupos. Cada grupo recebe uma tela de 1,00 m x 1,20 m e um refletorde
dos. mão . O grupo 1 explora formas de mostrar uma situação cujo foco é
3. Eu vou agora participar de uma cerimônia, junto com outras fazer uma pomada para ser usada como emplastro; o foco do grupo 2 é
pessoas que estudam as plantas, nós vamos falar delas e de seus pode- a preparação de uma tintura e o grupo 3 pesquisa os procedimentos
res. Vocês podem vir comigo... para ampliar os efeitos curativos do chá tranqüilizante. Todos os grupos
D. Milica dá a cada participante uma planta, etiquetada com seu partem do princípio, da cultura popular local, de que a eficácia das po-
nome e seus efeitos curativos. ções de ervas está relacionada com sua coleta em número ímpar (cinco
ou sete espécies de preferência) antes do nascer do sol, ou após o pôr-
do -sol. A introdução desse princípio objetivou permitir que cada grupo
pesquisasse um número maior de ervas.
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Quanto ao segundo aspecto, o engajamento das crianças aumentou
PONTO S D E R EFL EXÃO com a ocasião de individualmente falarem e se expressarem fisicamente
Os participantes adultos ficaram impressionados, prim eiramente, com em público mediante rituais e manuseio de recursos visuais introduzidos.
os efeitos dos recurso s convincentes (isto é, realistas) produzidos por Tamb ém foi observado como a cerimônia possibilitou a simbiose dos
suas diferente s habilidades (atrizes, farmacêutica, engenheiro, etc.) para contextos reais e da ficção - tanto para interpretar o conteúdo do baú
o engajamento das crianças. Este chegou a um ponto no qual se tornou quanto para adquirir conhecimento sobre as plantas.
difícil separa r o cont exto da ficção do contexto real. Por exemplo, as Finalmente, houve um consenso sobre a eficácia das pequenas telas
criança s sabiam que a velha senhora era uma personagem; quando ela para a exploração seletiva de movimentos, símbolos e a ções, através do
saiu da sala, foram questionados sobre sua atuação e, mesmo assim, teatro de sombras.
relacionaram-se com o conteúdo do baú como se este fosse realmente
muito antigo, e tivesse pertencido à Marina . PO SSIVEI S D ESDOBRAM ENTO S
Quando os documentos foram retirados do baú algumas crianças A avaliação deste proc esso trouxe algumas sugestões para continui-
disseram : "você os fez", ao que eu respondi: "uma vez qu e estamos fa- dade da experiência com plantas:
zendo teatro vamos fazer de conta que estes documentos são realmente • Organizar as crianças em grupos de pesquisa, com função de entre-
antigos ". Cinco minutos após, as mesmas crianças tentaram estabelecer vistar pessoas da comunidade sobre uma planta incluída no trabalho.
ligações entre a velha senhora e seus possíveis parentes na vida real ("ah, • Propor uma coletânea de receitas e um espetáculo teatral na qual as
já sei, ela é tia do fulano. . ."). Procuraram também descobrir pistas onde personagens dialogariam sobre os poderes das ervas enquanto preparas-
havíamo s dito não haver nenhuma, insistindo que estávamos errados e sem o chá ou o alimento, que seria em seguida oferecido aos espectadores.
não havíamos percebido alguns detalhe s (foi o caso de "descobrirem"
que um mapa havia sido apagado com o tempo de um velho papel de T EMA GERADOR PAR A OUTRAS DI SCIPLINAS
embrulho em branco). Português: livro de receitas; entrevistas; crônicas cotidianas (no caso
Em segundo lugar, os adultos observaram o im pacto da ambienta- de adolescentes), poesias, etc.
ção (a velha casa, a cruz, a trilha - todo s remanescentes do primeiro Matemática: investigaçãode compra e venda das plantas utilizadasnesta
período da colonização açoriana na ilha) sobr e o interesse das crianças experiência, em feiras, estabelecimentos de plantas ornamentais e lojas de
pelas plantas . A adequação da ambientação ao conteúdo do baú contri- produtos de umbanda e similares; dimensões das áreas de cada assenta-
buiu para que algumas crian ças superassem (ou esquecessem) suas difi- mento incluído na história; distâncias entre eles, terrestre e via Lagoa.
culdades de leitura e se envolvessem com esta atividade. Ciências: investigação dos componentes medicinais e nutricionais das
Os professores tamb ém salientaram o impacto das formas teatrais e planta s; investigação de formas de plantio e cuidados necessários; investi-
dramáticas, em geral, sobre o comportamento e as respostas das criança s: gação do uso destas plantas na alopatia, homeopatia, medicina popular.
Quanto ao primeiro aspecto, o "espetacular" das caracterizações , ri- História: assentamentos açorianos na Lagoa da Concei ção, Barra da
tuais , tochas ao redor da velha casa, velas, lenços coloridos e plantas no Lagoa, Costa da Lagoa e Ribeirão da Ilha;
interior da casa, etc., criaram uma atmosfera que permitiu resolver den - Geografia:
tro do contexto da ficção, problemas de comportamento e limita ções de Dança:
respostas os quais seriam difíceis de contornar no contexto real. Artes Visuais:
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Imigração açoriana - expectativas e mudanças S ESSÃO 2
a) leitura do edital de convocação para imigração; discussão "em fa-
o roteiro abaixo foi criado para um curso oferecido a professores de mília" sobre as vantagens e desvantagens de partir.
teatro, com o objetivo de subsidiar a preparação, em grupos, de estru- Objetivo: contextualizar as condições da viagem e dos grupos fami -
turas dramáticas a serem utilizadas em processos de drama baseados liares.
em questões referentes a imigraç ões, b) Imagem congelada de cada família, revelando o estado de espírito
Por outro lado, o tema da imigração daria prosseguimento ao proje- de cada um em relação à viagem. Leitura das imagens (um grupo lê o
to Leiturase Imagens do Meio Ambiente, pois os açorianos, nossos pri- outro), ao mesmo tempo que são reproduzidas através do desenho.
meiros imigrantes, colocaram em cena questões da posse e fixaç ão à Objetivo: visualização e formalização das "famílias"; identidade do
terra (os guaranis, população indígena local, eram n ômades), histó- grupo e apropriação da história.
rias sobre plantas e bruxas (Açores foi colonizado em grande parte por c) Registro de manifestações individuais sobre a viagem imi nente nas
pessoas condenadas por bruxaria, na época da Inquisição do Reino Por- "malas" de cada um. Leitura delas.
tuguês) . Objetivo: diferenciar as posturas dentro de cada família e entre elas;
visualizar cada personagem.
SESSÃO 1
d) Reunião com o representante do capitão maior das ilhas, a fim de
a) Leitura de texto sobre a condição-imigrante do brasileiro. questionar o edital e condições da viagem.
Ob jetivo : focar a imigração açoriana como uma das muitas imigra- Objetivo: permitir maior reflexão sobre os problemas e implicações da
ções que formaram nossa sociedade; salientar o sentimento comum às mudança; o professor, no papel do representante do capitão , poderá in-
diversas migrações; as esperanças e expectativas do imigrante. troduzir aspectos do contexto e desafiar posturas assumidas pelos alunos.
b) Leitura de uma foto de umas das ilhas açorianas, mostrando uma
cidade portuária. SESSÃO 3
Objetivo: identificar as características fisicas,econ ómicas, sociais, reli- a) aquecimento: exercício de modelagem - aos pares, espalhados pelo
giosas e ecológicas reveladas pela foto. espaço, um é o modelador e o outro é o modelado; tema da modela-
c) Formação de grupos, constituindo-se as famílias dos imigrantes; gem: o que estamos deixando para trás ? (deixar Açores) . Numa segun -
consulta a listas dos nomes das famílias que para cá vieram entre 1748 e da etapa, os pares são invertidos e o tema é: o que pretendemos conse-
1752; levantamento das prováveis razões que os levaram a vir; constru- guir com a mudança.
ção da hist ória familiar de cada grupo. Objetivo: recuperar o clima da imigração, do que havia sido pesqui-
Objetivo: contextualizar e tomar posse da "história" (a nossa jor- sado e apresentado nas aulas anteriores, ao mesmo tempo que o grupo
nada). se concentra e reflete sobre as informações acumuladas, dando forma
d) Formação de duplas: um entusiasmado com a decisão de partir, ao corpo do colega.
outro temeroso, resistindo à idéia. b) no grupo familiar, fazer os planos da mudança, discutindo prová-
Objetivo: levantar as contradições inere ntes à tomada de decisão. veis obstáculos para sua concretização. Fazer uma imagem congelada, a
qual revele o obstáculo que mais preocupa a família.
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Objetivo: refletir sobre as possíveis contradições envolvendo a partida; Obje tivo: aquecim ento e recuperaç ão das estó rias desenvolvida s até
tornar visíveis as vantagens e desvantagens; evitar qu e o processo vire uma então.
festa (a aventura da viagem ) ou uma tragédia (as mazelas do imigrante). b) criar a lista d e ba gagen s, um caixote por família e uma saca de
c) Vários objetos são espalh ados no centro do círculo; os participan- trinta quilos por pessoa, além do s colchões e cob ertas.
tes, em seqüência, escolhem um objeto como o que levariam consigo e Objetivo: criar subsídios para situaçõ es futuras (necessidade de usar
criam a história deste objeto em sua vida. o u ceder parte dos bens) ; criar envolvimento com obje tos e identificação
Objetos: castiçal, pedrá, lenço português, caixa de jóias, relógio de al- com alguns objetos em particular; desenvolver sua imagem e identidade
gibeira, manta, toalha de crivo, porta-retrato, etc. pera nte o grupo.
Objetivo: desenvolver a história de vida do personagem; criar ima- c) vários objetos ao centro, cada pessoa escolhe um obj eto, associan-
gem referencial deste personagem; criar pontos de referência entre os per- do -o a outro participante e lhe oferece o obj eto explicando por quê.
sonagens. Objetivo: aumentar as interações entre as família s e permitir que es-
tas se identifiquem (u ns ao s outros); ampliar a "me mória" do grupo no
SESS ÃO 4 papel de "viajantes" .
a) os participantes caminham pelo espaço enquanto ouvem trechos d) ob servar fotos e descrições d e tipos vari ados de carroças açoria-
da história da imigração açoriana. De tempos em tempos congelam e nas, selecionando vocabulário específico para ser integrado nas estórias
prestam atenção em sua po stura. dos grupos.
Objetivo: introduzir informações históricas e ao mesmo tempo con- Objetivo: ampliar o vocabulário e as referências culturais sobre Açores .
centrar no contexto sendo explorado.
b) cena do alistamento na casa do capitão-maior Manuel da Câm ara S E SSÃO 6
Coutinho Carreiro. Os participantes alternam- se nos papéis do policial a) caminhar pelo espaço , perceber seus pontos de tensão e equilíbrio,
organizador da fila para alistamento e do próprio capitão. Os demais congelar e prestar atenção na sua postura, lembrar as situações vividas
são questionados quanto ao estad o civil, ofício e idade. na sessão anterior.
Objetivo: vivenciar a condição de imigrante, vivenciar papéis diversos Objetivo: aq ueci me n to físico e mental; re-situar o grupo qu anto ao
e exer citar a argumentação em torno do assunto. Até que ponto nossos processo dram áti co .
argu m en tos são claros e convincentes? b) cena no ca is - esperando pelo embarque. Cada usa uma cadeira
c) listar tipos de superstições associadas à colonização açoriana; con- como quiser para compor o espaço cênico (como banco, encosto, baga-
tar causos relacionados com estas superstições. gem, cadeira, cerca, etc.). A esp era no cais é longa, os imigrantes come-
Objetivo: am pliar histórias de vida dos personagens; relaxar após as ce- çam a lembrar fatos passados, a contar estórias, a sonhar com o futuro.
nas anteriores; alternar bons e maus momentos na condição do imigrante. Com o a cena não fluiu, foi sugerido que criassem estórias a respeito do
ob jeto seleciona do na Sessão 3 e as narrassem para os membros da fa-
S ESSÃO 5 mília m ais próxima.
a) caminhar pelo espaço ou vindo tr echos da história açoriana; con- Obj etivo : cri ar o clima da partid a, lembrar o qu e está ficando para trás.
gelar refletir na su a postura e na condição de seu personagem: idade, Obse rvação: faltou material histórico relevante para que o processo
sexo, ocupação. fosse m ais signi ficativo; as estó r ias criadas foram rep etitivas; com m ais
82 83
dad os sobre o COntexto real de Açores no sécu lo XVIII as estórias pode- d) formam -se grupos, cada gru po escolhe um ob jeto ou atividade
riam ser mais bem desenvolvidas. como foco para cr iar uma situação em que este objeto possa ser usado
c) uma fam ília comenta sobre outra, como se estivessem a sós e não para solucionar um problema comum.
pudessem ser ouvidos. A fam ília comen tada deverá assumir po stura e Objetivo: passar do trabalho individual ao grupal, selecio nando o uso
atitude que correspondam ao que está sendo contado. Não fluiu, a nar- do objeto que pareceu mais significante; introduzir um foco e problema
ração se co ncentro u em fatos passad os (inve ntad os no momento) e não que possam conferir à a ção coletiva um significado veross ím il à situação
nas características e postura das personagens . O exercício é refeito, desta da viagem por mar.
vez uma fam ília congela, e a outra lê seus gestos e po stura. e) cada grupo imagina uma situação em que um objeto de um outro
Objetivo: leI1lbrar o papel de cada personagem, visualizar as fam ílias gru po poss a ser requisitado para solucionar um problema coletivo.
(integrando novos participantes) a fim de possibilitar cenas de perda du - Objetivo: de senvolver o contexto coletivo, isto é, do grande grupo,
rante a travessia (pessoas qu e m orrem, ou poderão ser desembarcadas, criando um a situação que po ssa envolver a todos em torno do mesmo
caso os viajantes aceitem, devido a doenças contagiosas). problema.
[) ao cair da tarde, no convés, as pessoas lembram a terra que ficou
S ESSÃO 7 para trá s. As narrativas são intercaladas com cantos.
a) caminhar pelo "convés do navio", concentrar-se no seu papel, ida- Objetivo: finalizar a sessão compartilhando canções açorianas e me -
de, sexo, ocu pação ; congelar, observar sua po stura, indicativos de atitu- mórias.
de; caminhar, COncentrar-se nas condições da viagem, problemas enfren-
tados, expectativas; congelar, visualizar o convés do navio; escolher objeto s S ESSÃO 8
ao redor e, silenciosamente e indi vidualment e, compor o espaço cênico. a) participantes sentados no chão, espalhados pela sala, cabeça entre
Objetivo: criar a atm osfera para vivenciar a situação-viagem, reto- os joelhos, olhos fechados; são guiadas na reconstituição da memória
mar o clima da aula anterior qu anto à situação dos personagens. da última sessão, procuram retomar a posição em que estavam durante
b) mulheres e ho mens agrupado s em espaços diver sos no navio; cada o compartilhar das canções e voltam a cantar a última delas.
qual seleciona uma atividade (o qu e poderiam estar fazend o num na- Objetivo: reconstituir o clima alegre e ao mesm o tempo melancólico
vio ), e m ant ém a atividad e ( tableaux); um participante, no papel de da última sessão.
capitão, percorre o espaço questionando os imigrantes quanto às sua s b) durante a canção entra um participante (de acordo com combina-
ativid ades. ção prévia com o professor), com pintas vermelhas espalhadas pelo cor-
Objetivo: de senvolver a verossim ilhança e autenticidade da ação ao ter po (rosto, mãos e braços); o professor no papel de oficial do navio cha -
de mostrá-la ao capitão e responder ao seu questionamento em público. ma a atenção de todos para os sintomas do "imigrante", sai para consultar
c) cada parti cipante recebe um peda ço de tecido (um m etro m ais ou o capit ão, deixando o grupo a comentar sob re o episódio, e volta sugerin-
menos), e procura realizar uma atividade por m eio do uso dest e tecido; do que o mais certo seria desembarcar o doente para evitar contágios.
di ferentes part icipantes se revezam no papel de capitão, cuja atua ção é Objetivo: criar um a forma de tensão; discutir as possíveis atitudes
d iscutida e planejad a no grande gru po (teatro fórum ). diante de uma situaç ão- lim ite - abandonar um amigo e condená-lo à
Objetivo: ampliar e aumentar as possibilidades do trabalho anterior morte? Ou co rrer o risco de contaminar as crianças já fracas com a ali-
med iante o uso de um objeto con creto. mentação deficiente?
84 85
c) Outras alternativas de situações-limite são colocadas; o capitão avisa
PO N TO S D E R EFL EXÃ O
qu e o atraso durante a viagem (calmarias, etc.) diminuiu drasticamente
as provis ões e que haverá um corte no fornecim ento de alimentos; da A execução e avaliação deste rot eiro , com professores de ensino fun-
mesma maneira as medicações chegaram ao fim e há necessidade que as dam ental, levou a três quest ões para serem priorizadas na pró xima eta-
famílias que trouxeram estoques de ervas e outros medicamentos os ce- pa da pesquisa:
dam para o uso comum. . 1. Realizar este proc esso com crianç as das séries iniciais, como forma
Objetivo: observar, analisar e discutir atitudes em relação aos bens de criar prontidão para as disciplinas de história, geografia e português.
pessoais e solidariedade de grupo; levar os participantes a discutir as al- 2. Enfatizar o contexto dramático - dar continuidade ao proc esso
ternativas de comportamento e propor soluções; observar a autonomia na esfera da ficção.
do grupo em relação ao professor. 3. Planejar a int ervenção do professor através da estratégia professor-
personagem.
S ESSÃ O 9
a) pesquisa em dicionário de expressões açorianas ainda presentes na Açorianos - os imigrantes
linguagem corrente da Ilha de Santa Catarina e em dicionário açoriano
" [. ..) Somos 150 milhões de descendentes de imi-
de termos referentes ao vestuário. gra ntes e de escravos africanos, com álbuns de fa-
Objetivo : ampliar o vocabulário e gerar novas situações; introduzir o m ília muit o pa rec idos . Na história d e cad a uma ,
pitoresco após as cenas dramáticas da sessão anterior. há ~e mp re um navio saindo de um porto dist ante
- África, Gênova, Nápoles, Lisboa , Palermo , Mála-
b) construção de uma imagem icônica do centro de Desterro, em ga, Hamburgo, Turqu ia, Kobe, Gibr altar - comum
1748, usando pano s marrons e verdes, jornais velhos para preenchê-lo s ocea no de in cert ezas a atravessa r. Na baga gem há
(criando as elevações do terreno) e pap elão para construir as fachada s sem entes , reméd ios, docum ent os, ferramentas, um
frasco de conserva, um a raiz exótica, pequenos ob-
das casas. jetos úteis no dia-a-dia, fotos do s parentes e da terra
Objetivo: criação de uma forma visual concreta das imagens do gru- qu erida qu e ficou para t rás. H á m ágoas, mas há,
po referentes às descrições lidas e ouvidas sobre o local de desembarque so b retudo, esp era nça : mesm o ca rrega dos à força
(os negro s), ou expulsos pela miséri a (os imi gran-
dos açorianos; criar o cont exto do desembarque. t es), os qu e chegara m n este p aís ver de, cálido e
c) usando a pesquisa do item a, criar cenas de grupos de recém -che - ensolarado , com vasto s vazios a serem ocupados e
gado s, alojados no hospital de Desterro a fim de serem curados dos "in- um árduo trabalho po r en frent ar, conserv ara m in-
tacta sua capa cida de de son ha r."
c ómodos" da travessia, com foco em algum elemento da bagagem (tor-
nando a questão saúde e luto um fator secundário na cena). As cenas foram Revista Cláudia, dezemb ro de 1994
96 97
6. Os participant es caminham pelo espaço cênico enquanto ou vem dos, caso os responsáveis pelo alistam ent o venham a desconfiar de algo,
trechos de histórias de travessia do Atlânt ico. De tempo s em tempos con- e procura justificar a vident e como tendo passado por uma crise de ner-
gelam e prestam atenção em sua postura. O objetivo é associar um mo- vos que deverá ser contornada e disfarçada. Os participantes passam a
mento de concentração coletiva com uma sínte se de imagens de traves - esconder a "tia" e falar por ela na hora do alistamento.
sia, acentuando e enfatizando suas implicações. Dessa maneira é possível
ampliar o significado daimigraç ão e criar algum impacto para manter o Quarto Encontro: A Travessia
interesse até o pró ximo encontro. Quando usado par a iniciar uma ses-
são, este exercício será útil para introduzir informações históric as e ao 1. O quarto encontro iniciou com um levantam ento de superstições
mesmo tempo favorecer a concentração no contexto sendo explo rado. associadas à cultura açoriana. Para ativar a memória sobre o assunto
foram introduzidas fotos de obje tos e instrumentos domésticos, carro-
Terceiro Encontro: Obstáculose Desafios ças, lavour a e pesca. Para lelamente foi destacado o vocabulário específi-
co destes objetos e tarefas cotidianas. A intenção foi introduzir material
1. Cena do alistamento na casa do cap itão-maior Manuel da Câ ma- que ampliasse as alternativas para o drama.
ra Coutinho Carreiro. Dois participantes adultos fazem os papéi s do po- 2. Juntam-se famílias, duas a dua s, e estas conversam sobre sua si-
liciaI organizador da fila para o alistamento e do próprio capitão . Os tuação em relação à viagem: disposição para partir, interação com ir-
demais são question ado s quanto ao estado civil, ofício e idade. Os pro- mãos , amizades, etc. A atividade os faz relembrar ou criar o papel de
fessores-personagem enfat izam aqui a condição de im igrante, e as tro - cada personagem no grupo, bem como formar imagens e conexões com
cas de pap el subseqüentes permitem vivenciar e explorar os argumentos a outra fam ília, o que poderá ser usado durante a travessia caso aconte-
mais uti lizados em torno do assunto. Até que ponto são claros e con - çam situações de perda, que exijam solidariedade, tais como morte, de-
vincentes? sembarque por doenças, etc. Após qui nze m inutos nesta atividade, os
2. Cena no cais: esperando pelo embarque. Cada um usa uma cadei- participantes são convidados a "cam inhar pelo convés do navio",ouvin-
ra, como quiser, para compor o espaço cênico (como banco, encosto, do a narração do professor sobre este contexto imag inário: concentrar-
bagagem , cadeira, cerca, etc.). A espera no cais é lon ga, os imigrantes se no seu papel, idade, sexo, ocupação; congelar, observar sua postura,
começam a lembrar fatos passados, a con tar histórias, a sonhar com o voltar a cam inhar, concentrar-se nas condições da viagem , nos proble-
futuro. Como alternativa, podem criar histór ias a respeito do objeto se- mas enfrentados, nas expectativas; congelar, visualizar o convés do na-
lecionado anteriormente e narrá-Ias aos membros da família mais pró- vio; escolher objetos ao redor e compor o espaço c ênico, silenciosa e in-
_xima. Esta tarefa possibilita criar o clima da partida, lembrar o que está dividualmente.
ficando par a trás. 3.Mulheres e homens agrupados em espaços diversos no navio; cada
3. Uma professora, no papel de "tia distante", que veio da Ilha de São qu al seleciona uma atividade (o que poderiam estar fazendo num na-
Jorge para fazer a travessia com os parentes da Ilha Terceira, revela-se vio), e mantém a atividade (tableaux); o profe ssor-personagem, no pa-
como "vidente" e começa a prever tempestades, privações e mortes. O pel de capitão, percorre o espaço questionando os imigrantes quanto às
tema bruxaria entra em pauta e as fam ílias se dividem entre os que acre- suas habi lidades para cumprir com as atividades escolhidas. O questio-
ditam e não . Outro participante adulto, de outra família, chama a aten- namento auxilia a desenvolver a verossimilhança e autenticidade da ação
ção do s gru pos qu anto aos problema s que este fato pod erá tra zer a to- ao ter de mostrá-Ia ao capit ão e responder ao seu question am ent o em
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público. Na seqüência, cada participante recebe um pedaço de tecido (um dos "inc ómodos" da travessia. Cada grupo cria uma imagem congelada
metro mais ou menos), e procura realizar uma atividade por meio do que reveleo estado de espírito de cada membro da família ao término da
uso deste tecido (individualmente ou em grupo); diferentes participantes jornada. O foco das cenas pod erá ser algum elemento da bagagem - pos-
se revezam no papel de capitão, cuja atuaç ão é discutida e planejada no sibilidade de rever a lista da bagagem e verificar o que sobrou, pois tudo o
grande grupo (teatro-fórum) . que foi consumido ou cedido durante a travessia foi eliminado.
3. Fim de tarde de um dia tranq üílo de travessia, no início da viagem:
as famílias se reúnem no convés para compartilhar memórias e cantar PONTOS DE REFL EXÃO
canções açorianas. Durante uma canção entra um participante (de acor- Esta versão "Açorianos" procurou explorar o significado e as dificul-
do com combinação prévia com o professor), com pintas vermelhadas dades enfrentadas pelos imigrantes, associando a opção de partir a so-
espalhadas pelo corpo (rosto, mãos e braços); o professor-personagem, nhos com uma vida melhor. Através dos episódios da travessia os parti-
no papel de um membro da tripulação, chama a atenção de todos para cipantes foram envolvidos em questões de solidariedade, respeito mútuo,
os sintomas do "imigrante" e sai para consultar o capitão, deixando o diálogo e justiça - conceitos inclu ídos no tema transversal "Ética", dos
grupo a comentar sobre o episódio . O capitão vem investigar e sugere Parâmetros Curriculares Nacionais.
que o mais certo seria desembarcar o doente em uma ilha deserta a um A avaliação deste processo levou ao desafio de se encontrar um texto
dia de viagem, para evitar contágios. A situação permite criar uma for- que pudesse ser usado como pré -texto para questionar poeticamente o
ma de tensão, discutir as possíveis atitudes diante de uma situação -limi- tema "imigração", ampliando as possibilidades de linguagem e introdu-
te. Abandonar o parente ou amigo e condená-lo à morte? Ou correr o zindo imagens com maior potencial cênico.
risco de contaminar as crianças já fracas com a alimentação deficiente?
4. Um recurso adicional de tensão é introduzido com a anunciada O DESDOBRAMENTO desta experiência foi a apropriação (descons -
tempestade, prevista pela vidente/bruxa. O capitão a anuncia e pede a trução e reconstrução) de um conto de origem açoriana (ver abaixo, item
todos que se mantenham calmos e agarrados em algo seguro. Uma cor- "Açorianos - confrontos na ilha"), e como eixo curricular este proces-
da é passada por todo o convés, onde todos devem se agarrar. Som de so pode gerar atividades semelhantes às indicadas no item anterior ("Aço-
percussão, feito fora da nau e não à vista dos viajantes, aumenta a at- rianos - os imigrantes").
mosfera de perigo, e a movimentação da corda, provocada pelos adul-
tos-imigrantes, adiciona a sensação de desequilíbrio. Açorianos - confrontos na ilha
5. Outra alternativa de situação-limite pode ser introduzida: o capi-
tão avisa que o atraso durante a viagem (calmarias, etc.) diminuiu Este trabalho com o roteiro "açorianos" focalizou a função do ritual
drasticamente as provisões e que haverá um corte no fornecimento de como um recurso para ampliar e estruturar a participação individual e
alimentos. Pelo mesmo motivo, as medicações chegaram ao fim e há ne- coletiva de forma teatral. A área temática escolhida foi ética por ser ela
cessidade que as famílias que trouxeram estoques de ervas e outros me- um dos maiores desafios dos Parâmetros Curriculares Nacionais -
dicamentos os cedam para o uso comum. "como levar crianças a refletir sobre atitudes e moral sem determinar o
6. Em Desterro: chegando à Ilha de Santa Catarina: que está certo ou errado?" - esta parece ser a preocupação central dos
Grupos de recém-chegados (formados à vontade, sem necessário vín- professores com quem tenho trabalhado em oficinas sobre Teatro & Te-
culo familiar) estão alojados no hospital de Desterro para serem curados mas Transversais.
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o processo dramático teve como pré-texto o conto "As Três Bruxas De um lado, o ritual representa o comportamento comum transfor-
qu e se Transformaram em Três Galinhas Brancas",de Franklin Cascaes; mado por condensação, exagero, repetição e ritmo. De outro lado, en-
envolveu vinte e quatro criança s (de nove a dez anos de idad e), dez adul - qu anto ação simbó lica, o ritual é ambivalente, aponta para ações reais, e
tos (cinco professores e cinco estudantes de teatro); e teve a duração de ainda permite qu e os participantes evitem uma confrontação direta com
tr ês horas, as quais fizeram parte de um processo teatral de quinze ho- os eventos. Como tal, o ritual pode ser um espaço privilegiado para abor-
ras/ aula , realizados no decorrer de uma semana. dar questões de ética em atividades de ensino.
O processo relatado e anali sado abaixo se refere ao quinto encontro
de sta etapa do projeto; os qu atro enco ntros anteriores seguiram o mes- É TI CA
mo roteiro do item "Açoriano s - a tr avessia", sobre a tr avessia, com as Mores (mo ral) e ethos (ética) têm a mesm a origem etimológica, cos-
variaçõ es provenientes das características do grupo e circunstâncias de tume. O desenvolvimento hist óri co, entreta nto, diferenciou seus signifi -
suas int erações. cados, e hoj e a filosofia define moral co mo princípios, crenças e regr as,
que juntas dirigem o comportamento do s indivíduos em cada socieda-
RI T UAL
de; e ética como o pensamento reflexivo sobre a moral.
Os rituais podem tomar várias formas, mas são geralmente descritos Os Parâmetros Curriculares Nacionais incluem ética como tem a trans-
como manifestações coletivas, com movimentos padronizados em se- versal, e acentuam que escolhas individuais não significam uma moral
qü ências que são caracterizadas pelo seu alto teor teatral, usualmente individual, uma vez que os seres humanos tomam decisões em face de
incluindo gestos, canções ou sons, cores ou luzes, e vozes, tudo coorde- outros seres humanos com os quais eles partilham valores no contexto de
nado e orquestrado em torno de um único tema. seus relacionamentos. A liberdade depende da habilidade de fazer escolhas
Tal coordenação é um mecanismo para criar uma experiência de iden- e da possibilidade de fazê-Ias.Se as pessoas não podem escolher entre ob e-
tidade ou identificação grupal. O impacto que os rituais geralmente acar- diência e transgressão, não são responsáveis por suas ações. O cotidiano
ret am está relacionado com sua ressonância com a vida e necessidade s requer que critérios e valores sejam discutidos: É correto roubar um re-
de seus participantes. A hipótese aqui é que, além da orquestração e res- médio se este é o único meio de salvar um a vida? Exemplos não tão extre-
son ância, que podem ampliar e int en sificar oportunidades de aprendi- mo s como este justificam a inclusão de ética no currículo. Esta não po ssui
zagem, a eficácia ped agógica do ritual, para o Teatro Educação, também caráter normativo , poi s ao se fazer um a reflexão ética se está perguntando
está relacionada com o espaço que ele abre para respo stas individuais sobre a consistência e a coerência do s valores subjacentes às ações; tenta-
em trabalhos de grupo, para a expressão de valores antagônicos e dife- se esclarecer e qu estionar os prin cípio s que regeram tais a ções, de maneira
rentes leituras das circunstâncias sendo focalizada s. que alcance seu significado real no contexto no qu al elas ocorreram.
Este potencial do ritual teatral deriva de seus elementos con stitutivos A moral já está presente na pr ática ed ucacio nal - o cot idiano nas es-
(Schechner, 1993, pp . 12-3; Pavis, 1996, pp. 1-21; e Counsell, 1996, pp. colas está invadido de valo res, traduzido s em princípios, regras, orden s,
143-78): e /ou proibiç ões.
• caracteriza-se como uma experiência , Ao privilegiar a ética no currículo pretende-se refletir sobre os princí-
• incorpora um status sim bólico, pios (seus fundamentos), regra s (seus objetivo s), orden s (os int eresses
• refere- se a um processo ou a um grupo de a ções perform áticas, aos quai s elas atendem ), e proibições (a qu e result ado s elas levam ), a
• contém estruturas com qu alidades formais e relações definidas. fim de atingir uma democracia eficaz.
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A associação entre ética e rituais, em processos dramáticos, permite quisa constatamos que não é possível registrar e discutir tudo o que ocorre
destacar e refletir, sobre as respostas individu ais a dilemas morais, uma nos trabalhos em pequenos grupos. Cada professor passou então a fazer
vez que o teatro focaliza conflitos e limitações, engajamento emocional e suas observações e anotações para subsidiar a construção da narrativa.
escolha individual, em trabalhos em grupo .
o CON T EX T O DR AM ÁTI CO
PR ESSUPO STO S T EÓRI COS E M ET ODO LÓ GI CO S
A opção pelo ritual como foco desta investigação decorreu de sua di- "A melhor maneira de ent end er, animar, investi-
gar, entrar em contato com, passar a perna em, lidar
mensão simbólica, performática e educacional. Os rituais foram plane - com , defend er-se de, amar [. . .] outros, outras cul-
jados de forma sincrônica - de acordo com sua estrutura (potencial tur as, o evasivo e íntim o «Eu Você», o outro em nós
dramático e teatral); diacrõnica- de acordo com seu processo e possí- mesmo s, o outro op osto a nós, o temido, o diado,
invejado, diferen te.. . é representar e estuda r as re-
veis bifurcações; ideológica - de acordo com os julgamento s de valor pr esent aç ões e os com portame ntos repre sentativos
qu e possam emergir durante o processo; cultural - de acordo com o em tod os os vários gêneros, contextos, express ôes e
sentido de identidade ou identificação que podem promover. processos histó ricos [. . . 1 A representação teatral é
amo ra l, tão útil aos ti ra nos quanto as pr át icas de
Examinar os rituais de forma sincrônica e diacrônica significa obser- teatro -guerrilha. Esta amoralidade decorre da maté-
vá-los vertical e horizontalmente e ao fazer isto é possível ampliar seu ria da repr esentação teatr al, a tr an sform ação: a ha-
entendimento como instrumento pedagógico. Investigá-los ideológica e bilid ade fantástica dos seres huma nos para criarem
a si próprios, mudarem, tornarem- se - para o pior
culturalmente permite antecipar e articular os dilemas morais embuti- ou melhor - o que eles ordina riamente não são."
i. dos na experiência.
! A abord agem etnográfica foi definida como a mais apropriada por
- R I C H A RD S CHE CH N E R
permitir que professores e estudantes trabalhem como observadores dis- Um conto de tradição açor iana, "As Três Bruxas que se Tran sforma -
tanciados (o conceito antropológico de outsider) e como participantes ram em três Galinhas Brancas", foi a base do Drama. O conto serviu
dos evento s dramáticos (insider). Como outsider cada um foi capaz de como pré-texto para envolver os participantes com o ambiente da nar-
observar a performance dos demais: ações, atitudes , escolhas, habilidade rativa, cujo conflito central , baseado em dilema moral familiar à comu-
para ouvir e aceitar as contribuições das crianças; como insider, cada nidade local, foi estru turado de forma que requeresse uma série de ri-
um foi uma peça do ritual, e, ao mesmo tempo, o único a ter conheci - tuais a fim de ser solucionado. Os recursos utilizados para salientar a
mento das interações e sugestões que aconteceram em seu grupo nos atmosfera teatral e nutrir os rituais incluíram narraçãode histórias, como
momentos em que foram preparados os enfrentamentos. ponto de partida para as improvisações e interpretações; um grupo de
A opção pela etnog rafia implica considerar as vozes de todos os par - personagens, por estudantes de teatro, os quais apareceram através do
ticipantes - crianças, professores/ estudantes de teatro, e professores de processo, introduzindo informaç ões, criando novos fatos ou desafiando
classe (terceiro e quarto anos do ensino fundamental). Em Drama, par - o ponto de vista das crianças; uma ambientação cênica em espaço histó-
ticularmente, também implica a autonomia do aluno para decidir so- rico cujo passado e presente possuem forte significação em relação aos
bre os rumo s do trabalho, isto é, requer uma parceria na construção do eventos sob investigação.
texto teatral. Entretanto, todo s sabemos como é difícil conseguir um
equilíbrio na autoria de textos coletivos. Nas etapas anteriores desta pes-
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rior, foram incorporadas com a mesma função, nome e figurino, acen-
A N ARRA ÇÃO D E HI ST ÓRIA S tuando nas atuais circunstâncias novos aspecto s de seu caráter. Em con-
Histórias ou narrativas, segundo Barthes (1988, p. 79), são metáfo- traste, os atores que repre sentaram os antagonistas, não haviam encon -
ras de nosso modo de vida, qu er sejam criadas por nós, ou externas a trado as crianças anteriormente. Estas representaram, em parceria com
nós. As histórias falam da cultura e da comunidade, explicam e confir- outros aluno s de teatro, o grupo de cidadãos que enfrentaram os anta -
mam nossa identid ade ou identificação. Mesmo dentro dos limites de gonistas, prin cipalmente a partir de rituais.
uma comunidade pode- se observar qu e os contatos e interações reve-
lam backgrounds culturais complexos e múltiplos. Eles não só represen- EST RUTURA NA R RATIVA
tam várias culturas, local e regionalment e, mas também a cultura glo- A professora de teatro está sentada aos pés de um marco histórico
bal que o indivíduo absorve ao passar várias horas por dia na frente (uma cruz sobre um pedestal ), em frente à igreja - o local em volta é
da televisão. Nesse contexto as form as tradicionai s torn am-se embaça- preservado pelo patrimônio histórico , e mant ém as caracterí sticas e at-
das, causando uma desvalori zação do s aspectos cultural, históri co e mosfera da época em que supostamente ocorreram os evento s a serem
ambiental, e conseqüentemente, da dimensão pessoal. Ao introduzir re- encenados. Chega o ônibus escolar e as crianças cercam a professora,
ferên cias culturais, as histórias pod em representar uma maneira de pre - curiosas com o que virá a seguir. Elas são convidadas a sentarem-se em
encher este espaço. Nestas circunstâncias, há um grande potenci al edu- volta, na grama , e ouvir uma história.
cacional e estético para histór ias que focalizam as especificidades e as "A história que eu vou contar não está comp leta, está acontecendo
diferenças culturais. aqui e agora, e sua conclusão depende de vocês. Os im igrantes açorianos
chegaram a este local duzentos e cinqüenta anos atrás; vocês representa-
AMBI ENTA ÇÃO CÉNI CA ram o pap el destes imigrantes nas últimas semanas , e na realidade, vo-
Uma ambientação cênica que tamb ém se caracterize como ambi enta - cês são seus descendentes. Além de serem crianças . Por isso foram cha-
ção histórica pode ampliar sua significação para os participantes. A ve- mados aqui. Somente crianças com sangue açoriano podem nos ajudar.
lha casa que foi o palco desta experiência é parte do patrimônio aço- "Agora escutem: Lá (a professora aponta uma velha casa abandona-
rian o e esteve fechada nos últimos anos, à espera de apoio para sua da) vive um agricultor e sua mu lher. Este agricultor nasceu e viveu aqui,
restauração. As crianças da localidad e costumam dizer que é assombra- com sua mãe e irm ãs até se casar. Sua mãe e irmãs são bem conhecidas
da ou embruxada. O cenário criado, dentro e fora da casa, para este na redondeza, como bruxas. Muitos evento s misterio sos e coisas estra-
evento (tochas, véus, ervas, garrafas com líquidos coloridos, etc.) con- nhas ocorreram naquela casa. Mas. .. o agricultor casou; e ele casou
tribuiu para intensificar a atmosfera de mistério e criar verossimilhança. com um a mulher católica. E, uma vez que ele era o filho mais velho e o
único hom em, ele herdou a casa. Agora ele está com um problema: sua
PR O F ESSOR- P ER SO N AG EM mulh er não admite nenhum tipo de bruxaria, nem sequer que se fale
Professores e alunos de teatro assumiram personagens de forma na- sobre isso em casa. O agricultor precisou pedir à sua mãe e irmãs que
turali sta para liderar, intervir e orquestrar a narr ativa. Este foi o quarto procur assem outro local para mor ar. Desde então sua mulher começou
proc esso dram ático com estas crianças, e elas estavam bem à vontade a enfraquecer e acabou ficand o muito doente. Muito s médicos foram
com o "professor-personagem': Portanto, para incluir algum imp acto chamados e nenhum conseguiu resolver o problema . Finalmente ele cha-
e/ou algo inesperado , duas personagens-chave de uma experiência ante - mou uma cura ndeira, destas que usam ervas locais para cura. Bem, ela é
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um tipo de bruxa também. O diagnóstico foi claro: sua mulher está em- lidera o grupo, caminhando com o apoio de algumas crianças, os de-
bruxada e somente crianças, às quais pertence o futuro e aquelas que mais a seguem.
descendem dos açorianos podem salvá-Ia. Os visitantes chamam o dono da casa em coro, o "agricultor" abre a
"Assim, esta será a tarefa de vocês hoje . A curandeira é uma velha porta, e eles se deparam com uma sala escura, uma mulher com aspecto
amiga de vocês e prometeu aju.dar. Ela está na igreja". A professora pede doente em uma cama ao fundo, velas e ramos de arruda pendurados no
a três rapazes, os mais inquietos, para irem buscá-Ia. Os três correm teto. D. Mariana convida o grupo a rodear a cama e iniciar uma reza de
para a igreja e voltam com a "velha" D. Mariana, ajudando-a cuidado - proteção contra bruxas, em coro, liderados por ela.
samente a se locomover. Em seguida, D. Mariana abre as três grandes janelas da sala (situadas
D. Mariana diz: "Então vocês vieram. Agora sei que poderemos sal- lado a lado, característica açoriana), e os participantes postam-se de costas
var a filha de D. Milica. Vou lhes dar três poderes; se vocês fizerem para as janelas, observando e protegendo a mulher doente contra possí-
bom uso deles, serão capazes de desfazer a bruxaria. Mas, prestem aten- veis males de fora. Continuam com o coro e desenvolvem movimentos
ção: vocês não podem ferir ou destruir ninguém, nem mesmo as bruxas; incluindo as plantas .
vocês precisam convencê-Ias a desfazer a bruxaria. Se vocês as espanta- Subitamente um barulho chama a atenção do grupo, e surgem as
rem, a filha de D. Milica está perdida, pois só quem fez tem o poder de galinhas, uma em cada janela - três atrizes caracterizadas como gali-
desfazer': nhas. Um ritual tem início: as galinhas falam suas palavras de ordem,
D. Mariana abre um saco de linhagem e vai retiran do lenços verme- individualmente e em coro; as crianças respondem e as desafiam da mes-
lhos, roxos e pretos, as cores que representam a magia da bruxas . Ela ma forma. D. Mariana faz a orquestração do ritual.
divide os participantes em três grupos; cada grupo recebe lenços de uma O desafio, através do coro, dura vinte minutos, e inclu i movimentos
cor (para a cabeça ou ombro): "Agora vocês são vinte e sete pessoas, das crianças, segurando as ervas, sons e movimentos típicos de galinhas.
protegidos pelas cores dos lenços, que juntas impedirão que qualquer O ritual termina com o recuo das galinhas. As crianças então colocam
mal vos atinja. Também lhes entrego uma planta protetora: arruda, es- as ervas no chão, ao lado da mulher doente, e esta começa a se recupe-
pada-de-são-jorge e comigo-ninguém -pode, uma espécie para cada grupo. rar. O casal reúne-se com as crianças para decidir o que fazer com as
Elas serão seu segundo poder. O terceiro, os ajudará a convencer as bru- bruxas. O grupo opta por perdoar e compartilhar o espaço no futuro.
xas a mudar de atitude: o Dom da Palavra . A cada grupo eu confiro
uma palavra, que deverá ser usada de formas diversas quando vocês PONTOS DE REFLEXÃO
enfrentarem as bruxas, as quais aparecerão sob a forma de galinhas. A Este conto foi escolhido por focalizar dois aspectos particulares aos
palavra para o grupo com lenços vermelhos é solidariedade; para o gru- padrões de papel social presentes na comunidade e na vida destas crian-
po em preto, respeito mútuo; para o grupo em roxo, diálogo. Juntos, os ças: o do racionalismo da cultura moderna ocidental, representado pela
três grupos reivindicarão justiça". religião oficial, o catolicismo; e o das crenças e práticas que representam
Após receberem seus três poderes, cada grupo (seis crianças e um es- o mundo mítico e mágico dos antigos habitantes da localidade: africa-
tudante) reúne-se para criar suas palavras de ordem, slogans, movimen- nos, indígenas e açorianos. Ambos estão impregnados em nossas for-
tos e gestos correspondentes. D. Mariana e a professora de teatro pas- mas de pensar, caracterizando aquilo que é conhecido como o sincretis-
sam de grupo em grupo com estímulos ou desafios. Após algum tempo mo religioso do brasileiro, e requerem especial atenção dos professores,
de preparação, D. Mariana os convida a irem à casa do agricultor. Ela ao lidar com dilemas morais .
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De um lado, o sincretismo pode ser considerado como uma tentativa A análise deste processo levou em consideração as opiniões dos pro -
de conci liar diferentes escolas de pensamento; de outro, ele representa fessores e alunos de teatro, dos professores da escola das crianças, e das
uma tendência não apenas das classes mais baixas, mas também das ca- crianças. Estas avaliaram a experiência, individualmente, mediante o pre-
madas ilustradas. O importante aqui, não é se isto significa apenas uma enchimento de um caderno com fotos e questões sobre o contexto e os
crença ou folclore, mas sim o fato de que tanto as crianças quanto os eventos encenados. Esta avaliação foi realizada um mês após a experiên-
adultos recebem e respeitam ambas as influências. Duas das crianças desta cia, a fim de podermos identificar que aspectos da atividade foram lem-
experiência têm tias que são curandeiras bem conhecidas na localidade . brados com mais detalhes e causaram maior impacto nos participantes.
Daí o potencial do ritual para a prática do teatro na escola - a pos- Quatro distintos focos de investigação foram considerados:
sibilidade de ouvir as vozes individuais em trabalhos de grupo, que fa- • As interações entre as estruturas teatral e pedagógica (análise sin-
çam emergir questões fundamentais aos hábitos e costumes da comuni- cr ónica). Até que ponto cada uma delas foi realçada e fortalecida pela
dade. "Asociedade moderna carece um sistema compartilhado de crenças. outra? De maneira geral, foi possível constatar que figurino e objetos
Porém, tal dimensão metafís ica ainda pode ser encontrada na arte _ provocaram envolvimento significativo com as situações dramatizadas e
onde nós nos engajamos com padrões os quais nós só podemos reco- foram responsáveis pela decisão final sobre o destino das bruxas. A am-
nhecer quando eles se manifestam como ritmos ou formas . .." (Brook, bientação e objetos de cena sinalizaram, para as crianças, uma possível
1996, p. 153). A problemática referida acima trata não apenas da falta de simpatia, dos professores e monitores, em relação às bruxas. Esta não
uma crença compartilhada, mas principalmente da presença de um sis- era a intenção original; o objetivo de se incluir xales coloridos, plantas,
tema de crenças formal (catolicismo), paralelo a um sistema subliminar, rituais e rezas era ampliar e intensificar a atmosfera teatral, além de faci-
mantido em segredo ou abertamente enquanto folclore (as práticas reli- litar e/ou proteger as crianças quanto às suas opiniões e posturas. O
giosas africanas). Neste contexto, os rituais podem representar uma ex- resultado também revelou que a dimensão teatral teve efeitos pedagógi-
periência única, a qual dá voz às questões silenciosas, às formas não rea- cos quanto ao exercício de habilidadesorais (argumentos para enfrentar
lizadas, às idéias que não estão claras. as bruxas, debates em grupos), à aquisição de conhecimentos sobreo con-
Ao usar este conto em um drama ritualizado e interativo, foi possível teúdo e o contexto (questionamentos e leituras sobre o poder das plan-
desvendar significados atuais e contraditórios, a partir das falas dos parti- tas, a história da casa e a imigração), ao pensamento reflexivo (sobre re-
cipantes (palavras de ordem e slogans criados ou escolhidos pelas crian- ligiões e ética) . Por outro lado, a dimensão educacional, caracterizada
ças) e formas emergentes (gestos). Peter Brook vê no teatro um meio de pela parceria entre adultos e crianças, o uso de um conto tradicional, a
transmitir o que nenhum outro meio é capaz, "Aqui está a responsabilida- incorporação de personagens de experiências anteriores, palavras-chave
de do teatro: o que um livro não pode comunicar, o que um filósofo não e idéias pinçadas dos parâmetros curriculares para a área de ética, etc.,
pode explicar convincentemente, pode ser compreendido através do tea- certamente foram fatores fundamentais para a eficácia teatral, o que fi-
tro. Traduzir o intraduzível é um de seus papéis" (Brook, 1987,p. 164). cou evidente através de: disponibilidade física (para envolvimento nos ri-
Segundo os professores das crianças envolvidas neste trabalho, eles tuais e para enfrentar as bruxas), falas convincentes (textos memoriza-
aprenderam muito sobre seus alunos durante a experiência e logo após, dos por decisão própria),focoe trabalho contextualizado (sem necessidade
por meio de seus comentários sobre os eventos anteriores. As situações de refocar a atenção) .
ritualizadas foram um meio de unir adultos e crianças no ato de com - '. O desenvolvimento do processo (análise diacrônica). Este foi pla-
preender e responder a uma vivência socioculturaI. nejado com atividades incluindo todos os participantes, alternadas com
110 111
outras em pequenos grupos O d
de forma que tornasse todo' s ?r,an. e grupo reuniu-se quer em círculo, mum dos eventos ou não. O ponto principal seria evitar uma aborda-
visrveis por todos e .
central aberto a manifestações ' dividua í mantIvesse o espaço gem normativa, ou seja, a postura de uma "a ção correta". A justiça deve -
procissão Em e m IVI uais, quer em linha, em forma de ria ser decidida pelo grupo todo, por meio do voto se necessário, caso
finiramp~lavr~s~~:~~:~~Pa~~;~~:sarticipan~es t o:naram decisões, de - princípios contraditórios ainda prevalecessem. O pressuposto era de que
quenos grupos funcionaram co an~e as sItuaçoes expostas. O s pe - ao considerar pontos de vista diversos dentro da família do agricultor,
, mo ensaIO para os eve t '"
garantIram as participações indi id . O nos pnnCIpals e as razões e as implicações das posturas dos diversos personagens, as
IYI uars processo d , .
tou assim múltiplas narrativas fi' rarnaticn apresen- crianças teriam oportunidade de desenvolver suas próprias opiniões so-
desenvolvimento abrindo ' que oram sendo cruzadas durante o seu bre o assunto. Os professores, então, poderiam contra-argumentar. Tal
sem dar a última p'a lavra a nesePnahço parda vlozes diversas, e até antagônicas, entendimento é expresso com clareza por Vetlesen, para quem "a habili-
uma e as Em dec ' , c'
o b servar emoções conflitantes A ,: orrencra, 101 possível dade moral é criada, alimentada e exp ressa dentro de ambientes de esca -
. . coerencla da forma d ' ,
CIrcunstâncias foi possível por t id .d ramane, nestas la reduzida, onde haja proximidade de integração social e laços pessoais"
er SI o cna o um pad - de " I
e descoberta" o qual deu fo . rao e exp oração (Aliem, 1997).
, i' rma as resp osta t "
as crianças, divididas em três ~ an agomcas. Por exemplo, '. Investigação do papel da ficção no processo dramático (análise cul-
relacionadas com o conceI'to d g:t~pos, sebl~clOnaram palavras de ordem tural) - A estrutura de ritual desta experiência permitiu aos participantes
. e e ica rece Ido pel
agncultor cada grupo formo ' , o seu grupo; na casa do investigar e representar sim bolicamente os padrões que dão significado à
las, para enfrentar as galinhas,u umaum semIClrculo diant d
dela
das i
. e e uma as Jane- sua vida cotidiana. Janet Murray afirma sobre o virtual: "as experiências
ordem, ditas individualme t s em cada Janela , As palavras de dramaticamente mais satisfatórias são aquelas que encorajam o inter-
, n e ou em coro respond d
galinhas, as quais tambe'm 'C • eram aos esafios das nauta a aplicar raciocínios do mundo real ao mundo vi rtual" (Murray,
se mallliestaram I di id I
A orquestração deste ritual or D ' n .IVI ua mente e em coro, 1997, p. 139). Em síntese, a opinião dos professores e estudantes que
das galinhas, foi o fator pri'~ipal'd~:~a:~, salIentada pe!a performance integraram esta pesquisa foi que os rituais ofereceram um exercício se-
cussões subseqüentes sobre os dil g Ja~ento das cnanças nas dis- guro sobre questões que têm valor prático e comunitário - nesse senti-
. I ernas morais em pauta
.. InvestIgação e questiona d . do, pôde ser compreendido como um "ensaio para a vida real". Sob este
lise ideológica) A discussa mdento, os valores subjacentes ao texto (an ã- ponto de vista , dois aspectos foram d iscutidos: o do teatroparticipativo
. o os sIstemas de I ' 1"
ocorreu previamente à experiência _ d va orol,mp ICltOS no texto e o da autoria, O teatro participativo usualmente toma a forma de uma
conto, das formas de focalizá-lo e rela ~ra~t~ a an álise ~o,~onteúdo do disputa entre oponentes - é a oposição a um determinado contexto,
na comunidade; e posteriormente _ a~lOna- ~ com as id éias correntes circunstância, ou personagem, que une as ações de um grupo heterog ê-
gens e questionamentos onde ' ser cnado o caderno com irna- neo. Nesta experiência a oposição "esposa católica versus família bruxó -
._ as cnanças pudera' .
ruoes sobre os conflitos represen t d A m regrstrar suas 0pI- lica" foi salientada pela sua atualidade no contexto atual dos participan-
de vista coletivo pelos processo a lOS. tentativa de definir um ponto tes, "A oposição", diz Murray, "é um dos mais difundidos e penetrantes
, ' ii res, evou o grupo di
diferentes perspectivas de se a issecar o conto e as princípios organizadores da inteligência e linguagem humana. Assim
cações e estarem preparados;/ersonagens, a fim de ?rever suas impli- como nós automaticamente organizamos o mundo temporal e espacial
alguma postura definitiva ou ra argu~entar sem carr na armadilha de em características opostas (noite/dia, alto!baixo, direito/esquerdo), tam-
dade, diálogo e respeito mút preco~ceIt~osa..Os conceitos de solidarie- bém o fazemos com as coisas que acontecem no mundo: Deus/Diab o,
112 uo, po em ImplIcar um entendimento co-
macho/fêmea, Caim/Abel. . :' (Murray, 1997, p. 145).
113
Se o contexto real intensificou a estru tura dramática do conto "As
Três Bru xas", os rituais ampliaram a lib erdade da s crianças terem "voz"
no processo. Entretanto a autoria do texto, indiretamente, foi does)
professor(es), uma vez que foi a narração da história, os personagens
representados pelos adultos e a estrutura das atividades que em última
instânci a definiram a atmosfera' e o texto teatral. Adaptando uma das
afirmações de Murray sobre a autoria na mídia eIetrônica para a área CONSIDERAÇÕES FINAIS:
do Drama, é possível dizer que "autoria é aqui entendida como procedi-
O DRAMA E O TEATRO CONTEMPORÂNEO
mento. Autoria procedimental sign ifica escrever as regras p elas quais os
textos aparecem tanto quanto escr ever os próprios textos. Sign ifica es-
crever as regras para o envolvimento interativo dos participantes. O au- A evolução do drama reflete os desenvolvimentos ocorridos
to r procedimental cria um mundo de pos sibilidad es narrativas. O inte- no teatro contemporâneo nas últimas d écadas. O teatro experim en tal
rator faz uso deste repertório de possibilidades para improvisar uma dos anos 1960 já vinha enfatizand o as noções de processo e transformação,
situação particular entre muitas outras que o autor pôs à sua disposição baseadas no aqui e agora do confronto de papéis. Práticas pós-modernas
(Murray, 1997, pp. 152-3). Nos rituais descritos acima, os professore s, também estão refletidas no drama: fragmentação e redistribuição de pa-
tal como o autor procedimental do texto eIetrônico, atuaram como co - péis, abordagem não linear e d escontínua, retomada de temas e textos
reógrafos e supriram os ritmos, o contexto, e a série de situações que clássicos, diluição da distinção entre atores e espectadores, mudanças de
foram representadas. Anteriormente a cada evento ou confronto, os pro- perspectiva - investigação do tema de pontos de vista distintos.
fessores no papel de pa rceiros das crianças, através de pista s, questiona- Específico ao drama no contexto escolar, ou em contextos periféricos
mentos, suge stões, introduziram as info rmações com as quais foi pos sí- com não-atares, é a mediação constante do coordenador, que nos pro-
vel desenvolver os rituais. O importante aqui é que quando os rituais cessos analisados nesta publicação, assumiu o papel de dramaturg jun-
aconteceram, a excitação de exercer o poder durante as confronta ções e tamente com um a equipe de professores, alu nos estagiários e bolsistas,
fazer as galinhas reverter a m agia , levou as cri an ças a deIetar a m emória que alt ernaram em várias ocasiõ es a função de professores -personagem.
da ajuda anterior e a se sentir como verdadeiros autores do texto teatral. Esta mediação, através da ação e não apenas verbal, na qual professor(es)
Ética esteve no centro de todo o processo uma vez que os participan - e alunos interagem dentro de um contexto de ficção, apresenta resul-
tes estiveram envo lvid os com reflexão e resposta aos dilemas m orais e tados imediatos. Na carênc ia ou insuficiên cia de resposta, o professor-
padrões que circu nscreveram os contextos da ficção e o atual. O foco . per sonagem estende a situa ção ou muda o estilo até perceber alguma
em ética em vez de moral acentuou o papel das crianças como donos mudança na recepção. Os papéis ou funções adotados pelo professor-
dos critérios que definiram quais as atitudes que seriam corretas sob tal personagem são avaliados em termos de:
contexto e circunstâncias. • Informação passada aos alu nos - sobre o contexto, a situação
dramática e os papéis que o grupo está sendo desafiado a adotar.
.• Atmosfera gerada pelo papel does) professor(es) - m ediante o
uso seIetivo do vocabulário, do registro d e detalh es, da ação, figurino,
relações com obj etos e espaço.
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.• Desafios introduzidos com sua atuação: pistas ou problemas a se- ras conduziu o processo, que incluiu investigação de fatos históricos,
rem interpretados, interações e enfrentamentos. memórias da comunidade e construção de im agens pelas crianças. As
A tarefa posta ao professor se aproxima da do diretor contemporâ- várias edições deste projeto aprofundaram a compreensão, pelos pro-
neo que visa romper os limites do espaço cênico e ampliar a interação fessores, da importância e implicações de associar ficção e realidade, his -
ator-espectador. As estratégias que facilitam a interação de grupos gran- tória e h istórias para se obter verossimilhança e validar a experiência.
des e heterogêneos também apresentam similaridades com as do RPG O po nto de partida para "Plantas da Ilha" foi o encontro de um baú
(denominação generalizada e internacional do "role play game"), quer contendo fragmentos de cartas, documentos e objetos envelhecidos, e o
de mesa, CDs ou internet - neste caso a atuaç ão de quem está mes- desafio para decifrar suas pistas. Essa etapa da pesquisa teve vários aspec-
trando o jogo assemelha-se à do professor-personagem - o contexto e tos em comum com os RPGs de mesa (onde espaços, lugares e acidentes
as regras do jogo equivalem ao pré-texto utilizado pelo professor para geográficos são introduzidos por meio de tabuleiros ou cartões), a narra-
delimitar o processo. tiva está centrada em problemas ou obstáculos, e a ação é determinada
O pré-texto das "Cavern as" foi um vídeo sobre a exploração da ca- por cartas ou pela proposição de quem está mestrando o jogo . Neste pro-
verna de São Mateus, em M inas Gerais, mostrando o grupo de espeleó- cesso o conteúdo do baú funcionou como um quebra-cabeça, persona-
logos preparando a expedição e sua realização. O vídeo forneceu ao pro- gens inesperadas (professores-personagem) surgiram no percurso de uma
fessor parâmetros para introduzir situações de risco e perigo, tensões, trilha, contaram fragmentos de histórias para deslanchar a narrativa, e
mistérios, tarefas relacionadas com a função do espeleólogo. Da mesma rituais foram realizados para solucionar coletivamente os problemas.
forma, indicou o potencial interdisciplinar do tema: constituição e con- O material introduzido no decorrer destes processos dependeu do
dições climáticas dos d iferentes tipos de cavernas, formas de vida, histó- questionamento e interesse do grupo e das tarefas estabelecidas pelo pro-
rias de descobertas e explorações. Como recurso para introduzir con- fessor em função das necessidades cênicas e de aprendizagem. Na segun-
texto e as informações sobre o assunto, o vídeo é usado na forma de da experiência realizada com o tema Cavernas, por exemplo, foram in-
projeções no teatro contemporâneo. troduzidos um bastão e uma peça larga de pano como foco para os
Em "Conchas e Caramujos", a campanha Conhecer para Apreciar; jogos teatrais. O objetivo inicial foi exercitar e enfatizar "as regras" do
Apreciarpara Preservar, introduzida por uma representante da Associa- jogo teatral, a fim de acompanhar a evolução das crianças quanto à aqui-
ção de Preservação do Meio Ambiente, foi o contexto para o papel dos sição da linguagem cênica - a interação através de um objeto, a manu-
cientistas: as crianças receberam vidros contendo diferentes espécies de tenção do espaço c ênico, a postura em relação ao espectador, o foco no
conchas e caramujos para classificar com a ajuda de enciclopédias sobre problema a ser resolvido, etc. Paralelamente, os objetos escolhidos para o
o assunto. O processo intercalou entrevistas com jornalistas e repórteres jogo possibilitaram que situações relacionadas com o tema caverna vies-
(professores-personagem) e construção de narrativas espetaculares em sem à tona - o tecido foi transformado em barraca; o bastão foi utiliza-
grupos. Tecer um intertexto, que inclua ciência, tecnologia e ficção é tam- do por um andarilho que com ele acabou descobrindo um sambaqui.
bém uma abordagem contemporânea. A qualidade do material estimulou a investigação pelos alunos, e pode
Com o projeto "Açorianos': os participantes assist iram a uma cena dar sentido à pesquisa em grupo. Assim, no processo "Conchas e Cara-
teatral montada por dois bolsistas, mostrando um casal nas Ilhas de mujos", a introdução deste material, em vidros rotulados segundo sua
Açores, discutindo as vantagens de desvantagens de partir, cada qual com classificação em espécies e tipos, acarretou um envolvimento imediato
uma postura diferente. O confronto das diferenças e das múltiplas leitu- na atividade. Como conseqüência, familiares se envolveram na coleta de
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livros, discos, quadros) e institucionalizadas (escolaridade e outros cur-
amostras nos finais de semana o que veio alimentar tanto o processo
sos realizados) . É a partir da contribuição dos alunos - recepção e pro-
dramático (com histórias da comunidade) quanto a pesquisa em sala
dução - que a construção da narrativa acontece. O professor propõe
de aula pelo professor da classe e as crianças.
as tarefas que irão definir o próximo episódio do processo dramático com
Como os processos dramáticos tiveram como referência questões pre-
base no material que veio à tona no episódio anterior. Ele pode, e deve,
sentes na comunidade, porém tratadas de forma não usual, eles funcio-
desafiar as posturas assumidas pelo aluno, mas fará isso ao criar pro-
naram como um desafio e garantiram um elo constante de troca de in-
blemas para serem solucionados por meio de diálogos ou ações físicas.
formações escola-comunidade. Esta troca foi também facilitada pelo livre
Se o professor utiliza um texto como pré-texto para delimitar o pro-
acesso aos objetos de estudo, os quais, presentes no ambiente familiar,
cesso, a história não é disponibilizada aos alunos, evitando-se assim que
adquiriram entre as crianças um status tanto "científico como artístico".
eles a reproduzam em vez de se apropriarem dela. Situação e tensão dra-
Essa reflexão levanta a questão: até onde ou quanto pode o professor
mática são introduzidas pelo professor para serem enfrentadas e solu-
participar do processo dramático? Se o professor participa sutilmente,
cionadas pela ação do aluno. Quando o processo narrativo resulta de
quão longe ele poderá ir? Pode o professor participar e ainda assim con-
uma seqüência de episódios, a narrativa decorre da leitura ou interpre-
trolar a turma?
tação que o grupo faz das ações e tarefas em que se basearam os episó-
Para Bourdieu (2001), "As relações de comunicação são, de modo in -
dios. Em vez de uma seqüência de atividades centradas em uma história
separável, sempre, relações de poder que dependem, na forma e no con-
preestabelecida, temos uma seqüência de atividades baseadas em ações.
teúdo, do poder material ou simbólico acumulado pelos agentes (ou pelas
Cada episódio está centrado em uma ação dramática que requer uma
instituições) envolvidos nessas relações". A reflexão sobre alguns conceitos
tarefa para ser efetuada. Esse procedimento está embasado na idéia de
básicos utilizados por Bourdieu em seus escritos sobre o campo da educa-
que a participação do aluno revela o conhecimento, habilidades e atitu-
ção tem nos levado a observar o potencial do drama como método de ensi-
des que correspondem ao seu capital cultural.
no para ajudar o professor a mudar posturas e atitudes tão entranhadas
O conceito de habitus, tal como util izado por Bourdieu, tem auxilia-
nesta área e na do fazer teatral em escolas, que passam despercebidas ou,
do e motivado a análise das experiências com drama como método de
em casos contrários, são aceitas como naturais e inquestionáveis.
ensino. Segundo o autor, habitus é a estrutura internalizada, são os va-
Diz o autor, que "o poder simbólico é, com efeito, esse poder invisível,
lores, as formas de percepção dominantes incorporadas pelo indivíduo,
o qual só pode ser exercido com a cumplicidade daqueles que não que-
e por meio das quais ele percebe o mundo social, percepção que, por sua
rem saber que lhe são sujeitos ou mesmo que o exercem" (2001, pp. 7-
vez regula nossa prática social (1996, p. 20) . A percepção da diferença na
8) . Tal exercício, caracterizado pelo autor como "violência simbólica" é
expressão de valores e visões de mundo - por professores e alunos - é ·
assim difícil de ser percebido; na escola pode estar associado à falta de
fundamental tanto para a construção da identidade, quanto para pro-
oportunidades para desenvolver a criatividade e à imposição de conteú-
mover mudanças na esfera artística e comportamental, ou para a tessi-
dos sem interesse e sign ificado para os alunos.
tura de um texto contemporâneo.
O drama, neste sentido, é um método de ensino cujos aspectos estru-
A contemporaneidade no campo educacional inclui uma dimensão
turais e estratégias garantem ao professor o exercício de ouvir o aluno e
interd isciplinar. A complexidade de um projeto com esta perspectiva, no
abrir oportunidades para que ele investigue as situações dramáticas a
Brasil, passa pela questão de espaço e tempo para professores de áreas
partir de seu capita l cultural - segundo Bourdieu, os conhecimentos e
distintas articularem seus conteúdos específicos. Tal articulação requer
experiências incorporadas (viagens, leituras, etc.), objetivadas (posse de
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mais que uma ou duas semanas de planejamento no início do semestre resultado. Pensar que criatividade é prerrogati va das áreas artísticas tam -
- ela exige um processo contínuo de investigação. O drama como eixo bém é equívoco. Ademais, na perspectiva do aluno, é importante que dife-
curricular é posto aqui como um a altern ativa que ao prover um proces- rentes metodologi as, estilo de ensino e atmosfera de trabalho co-existam .
so artístico e uma reflexão estética que trazem à tona questões pertinen - Elas são fundam entais para um ensino que propõe incluir diferenças.
tes às demais áreas cur riculares, não requer planejamento conjunto. Ao O problema "bicicleta" mostra ainda a importância de se estabelecer
contrário, con sidera-se aqui fund amental a autonom ia dos pro fessores a diferença entre ficção e realidade - compr eender que a ação dramáti-
das demais áreas cur riculares para focalizar as que stões que eventual- ca é intencional dentro de um contexto de ficção. A postura e o questi o-
ment e lhes sejam trazidas pelos alunos. Essaautonomia justifica-se pela namento do professor, além de estim ular a busca de respostas originais,
perspectiva tanto do fazer teatral com o no das demais disciplinas . irão sustentar e dar continuidade ao processo dr amático.
No primeiro caso, é importante que o contexto da ficção e os focos Este episódio leva a outra questão, presente no debate sobre contem-
de tens ão dramática sejam preservados durante todo o processo - os poraneidade, com repercussões significativas na área do ensino - o das
episódios pod em incluir atividades de expressão oral, escrita, gráfica, pic- múltipl as leituras e o que estas envolvem: pro cessos de negociação e ava-
tórica, corpo ral, além de investigação científica e histórica. Entretanto essas liação.
atividades não são avaliadas quanto à sua exatid ão e relação com as res- As interpretações individuais variam apesar da delimitação do con-
pectivas áreas de origem, e sim pela sua coerência com o foco dramático texto, circunstâncias e convenções estabelecidas pelo texto e pelos parti-
e como evidência do engajamento emocional do aluno com a situação cipantes. Elas dependam não apen as do conhecimento e domínio que os
sendo explorada. Por exemplo, no drama Açorianos - a Travessia, um a particip antes possuem sobre a forma artística a que se refere o texto (dra-
das crianças , ao listar os itens da bagagem que levaria consigo , incluiu mático e teatral) , mas tamb ém do gosto e experiência pessoais.
um a bicicleta. Um observador, professor-visitan te, sugeriu à estagiária Assim sendo, um proce sso coletivo estará baseado na "negociação de
que participava de seu grupo, que interrompesse a atividade e fizesse um a significados" (Bolton, 1986, p. 248), uma vez qu e para pro sseguir com a
linha do tempo, mostrando às crianças que a travessia acontecera quan- narrativa os atores precisam levar em consideração a pluralidade de lei-
do o bisavô da bisavó (mais ou meno s isso) tinha a idade dela e que a turas do episódio anterior, o que passa a ser precondição da negociação
bicicleta só fora invent ada séculos após. A estagiária me perguntou o dos significados em dois aspectos:
que fazer, e a orientei a responder a essa sit uação como se o personagem 1. para assegurar qu e o texto coletivo considere as opções individuais
da criança possuísse um objeto estranho com rodas parecidas com as - o que é basicamente uma estratégia democrática além de assegurar o
de um carro de bois, porém feitas com material desconhecido e brilhan- desvendamento dos julgamento s de valor dos leitores;
te; um objeto eno rm e que o homem movia com os pés, o qual parecia 2. para evitar a imposição de interp retação tanto do grupo quanto do
coisa do diabo , etc. O objetivo era dar pistas para que as crianças perc e- diretor - ao con siderar diferentes leituras é improvável que seja tomada
bessem o problema, sem sair do contexto dr amático. qualquer decisão final sem serem ouvidos os demais participantes.
A linha do tempo poderia ser trabalhada na aula de históri a, caso as Con siderar a função do "leitor" impl ica assim um a relação dialógica
crianças quisessem levar o problema adiante, e se o professor de história entre diretor e aluno, onde ambos trabalham juntos na bu sca pela me-
considerasse isso oportuno no momento. É importante lembrar que pro- lhor forma de expressão . A avaliação nesse sentido não é uma tarefa
fessores de áreas distint as adotam diferentes abordagens e metodologi as, individual, mas uma oportunidade para o ator tentar ações e atitudes
com que se sentem mais à vontade e, em decorrência, alcançam melhor alternativas. O grupo como um todo figura como co-participant e no
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processo de avaliação e poderá auxiliar a remover os "pontos cegos"
que podem limitar a percepção do processo e do produto.
Nesse sentido é possível dizer que a relação dialógica conduz a um
modelo pedagógico que previne três problemas básicos da construção
da narrativa teatral em grupo, e incidem diretamente sobre o processo
de identificação com o terna, o engajamento com a atividade, e a manei- REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Daniela Cristina de Medeiros Andréa Beron
Daniela Gatt i Antô nio Vargas
Gabriela Ferreira Gustavo Cabral Vaz
Gerson Luiz Muller José Henriq ue Nunes Pires
Giselle Ventura Flávio Vidigal
Heloise Baurich Vidor Marcelo Cabral Vaz
Ivan de Toledo Santos (bolsista de
extens ão ) As experiências aqui relatadas acon -
Juliana França teceram na Escola Desdobrada Mu-
Kát ia Kruger nicipal João Francisco Garcez .
Lígia Vargas Marilde [uçara da Fonseca (dlr eto-
Manoela Paula de Sousa ra de 1995 a meados de 1997)
[anu ária Silvestre Querino (diretora
Margareth Klein
MelissaFerreira (bolsista de extensão) do segundo semestre de 1997a 1998)
Muri lo Magalhães
127
126