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ss Economia Urbana Otilia Beatriz Kroeff Carrion! 15.1 INTRODUCAO ° Neste capitulo, sera abordada a dimensao espacial, territorial, da anélise econémica, naquilo que concerne ao meio urbano, Serdo examinadas as principais questdcs relacionadas a organizagao econdmica das cidades, em termos de sua implicacio territorial. Isto exige considerar tanto as restrigées impostas pelo espaco ao funcionamento da economia de uma cidade, quanto 6s efeitos causados pela estrutura econdmica sobre a configuracao espacial urbana. 15.1.1 Andlise espacial urbana na Economia * Enquanto disciplina autonoma, ou seja, 4rea do conhecimento com ob- eto de analise € corpo te6rico préprios, a Economia Urbana s6 veio a organi: zar-se no século 20, sobretudo a partir do final dos anos 50. Mas, muito antes disso, a preocupa¢4o com o espaco fazia-se presente na Giéncia Economica, 4 medida que anspor distancias ocasiona custos, em termos de tempo despen- dido ¢ de gastos efetuados com deslocamentos, seja para 0 transporte de pes THRE ear? hin abrogate cl' Une bde Peal ao Geahel dl Bel At taoeafugrecce ace Prefered niSktS/PulhS AISNE Marea Patten nl te connec def ina tema read proinlzar en Capinde era to ome sac ea yor ENO ts szmiicee Sobre a interrelaglo Expago-Economia 0 peso dado A dimensio eapacal na andlie ceonbmica, wer Smolka (1988), 3. Aydalot (1986 fetua uma Feviio bastante completa e abrangente desea questo. apre ECONOMIA URBANA 395 as, seja para o de mercadorias. E sob essa Gtica, portanto, que o espaco foi jicialmente introduzido na andlise econémica, significa dizer, enquanto es- £0 geografico (meio fisico), que impde limites (pelo Gnus com transporte acarreta) A perfeita mobilidade de agentes, fatores de produgdo e merca- as. Com a preocupacio de apontar solugdes que permitissem minimizar os sitos, em termos de custo, causados pela distancia existente entre diferentes ntos do espaco (basicamente, entre local de producio, fontes de matérias- as e mercado consumidor), formularam-se, ainda no século 19, algumas do das atividades agricola ¢ industria. do territério, a cidade € considerada enquanto mercado consumidor dos dlutos de origem rural e, por vezes, enquanto centro fornecedor de alguns mos industriais. De modo andlogo, as indiistrias podem ter orientacao ur- , em termos de localizacao, ou estar relativamente dispersas no territé- dependendo de suas fontes de abastecimento, em termos de matérias-pri- € insumos utilizados, inclusive fontes energéticas, mesmo quando forne- produtos para um mercado centralmente situado. Yon Thimnen foi pioneiro no tratamento dessa questio, com sua teoria jcalizacdo agricola, apresentada em 1826. Ao longo do século 19, algu- outras contribuicées 4 teoria de localizacio foram feitas por autores que iveram, sobretudo, na andlise dos fatores determinantes da localizacao trial. Foi no século 20, no entanto, que surgiram estudos mais aprofun- a respeito da localizacdo industrial, destacando-se, por seu carater pio- 0 ¢ pela abrangéncia da andlise, os trabalhos de Alfred Weber ¢ de Au- sch, divulgados, respectivamente, em 1909 ¢ em 1940." contribui¢ao das teorias clissicas de localizacao, entendidas estas 9 as que estabeleceram os fundamentos ¢ os principios gerais da discus- o tema, foi fundamental para o desenvolvimento posterior das teorias de lizacao regional ¢ urbana (ou intra-urbana, como é mais comumente re- , também, das teorias do crescimento regional e urbano. O debate referente a localizacdo, qualquer que seja a natureza da ativi envolvida, produtiva ou nao, sempre se fez acompanhar de uma outra propésito das teorias de localizacio agricola e industrial, consultar Ferreira (In: Haddad, |, Cap. 2) © 0 Capitulo 14 ~ Economia Regional ~ deste livro, que faz uma presentacdo das mesmas. 396 INTRODUGAO A ECONOMIA, discusséo importante, que diz respeito ao Gusto da terra\(rural ou urbana) em dada localizagdo, noutros termos, 4 renda da terra. Significa dizer que abor- dar ofespaco enquanto distancia supde considerar, de um Jado, os gastodcom transporte, ocasionados pelos deslocamentos que se fazem necessérios para atingir determinados locais e, de outro, 0 custo associado a obtencao do di- reito de uso de uma localizacao ou lugar, que vem a ser, em dltima andlise, © preco pago pela terra. Por essa razio, a teoria da renda da terra sempre fot uma referéncia importante para a andlise espacial, sobretudo em meio urba- no, em face dos mecanismos peculiares ali existentes, em termos de valoriz cdo e de especulagio com 0 solo. De qualquer modo, a teoria de localizacao constituiu 0 eixo bisico de desenvolvimento da Economia Espacial, tanto Regional quanto Urbana, até pelo menos meados do século 20, quando se definiu mais claramente a sepa- racao entre a andlise Regional e a Urbana, Isso ocorreu, em parte, devido a0 aprofundamento do corpo tedrico basico, de origem comum, que passou, progressivamente, a deter-se nas especificidades de cada ambito, apontando, portanto, para uma possivel, sendo necessdria, separacao disciplinar. B, em parte, devido a crescente complexidade da propria realidade, em suas dife- rentes dimensdes espaciais ~ regional e urbana, que evidenciou a necessidade do desenvolvimento auténomo de cada uma dessas areas do conhecimento, que mantém, nao obstante, muitos pontos em comum. ‘A expansio acelerada das cidades, apés a Segunda Guerra Mundial, co- locou no centro das preocupagées a problematica do crescimento urbano, que envolve, entre outras, questées como tamanho urbano externalidades Na América Latina, foi intenso 0 debate relativo a migracdes (destacando-se as de natureza rural-urbana), marginalidade, subemprego, “inchaco” do setor tercidrio ¢ planejamento. Mais recentemente, por volta de 1970, a importan- cia das politicas ptiblicas e as formas de intervencao do Estado na questo ur bana tornaram-se questdes centrais ¢ até recorrentes; houve, nesse perfodo, producao significativa de estudos sobre os mercados fundiario ¢ imobilidtio urbanos. ‘A crise econédmica que se esbocou a partir de meados dos anos 70 ¢ 0 amplo processo de reestruturacao do capitalismo, em nivel mundial, incorpo- raram outras questdes ao debate, em face das condiées criadas pelo desen- volvimento de novas tecnologias ¢ pela globalizacéo da economia, impondo- se novos padrdes de uso do espaco, em escala nao apenas mundial mas tam- bém regional e local. Outra linha temética que também adquiriu relevancia, nesta tiltima fase, diz respeito ao poder local (municipal), assunto cujo inte esse esta vinculado a possibilidade, baseada em algumas experiéncias bem sucedidas, de descentralizacao do processo decisério e das politicas puiblicas, ECONOMIA URBANA 397 Cabe, ainda, referir 0 caréter eminentemente interdisciptinar da oat espacial, qualquer que seja o Ambito territorial enfocado (mundial, oa regional ou local) ou a énfase disciplinar dada (geografia, arquitetura, w nismo, direito, economia etc.). 15.1.2 Acidade e o urbano Nem sempre se verifica diferenciacdo entre o que é cidade e 0 que é ur- bano, termos que sao, por vezes, utilizados como sinénimos, nao obstante exista distingao. O aparecimento ¢, portanto, a idéia de cidade estio histérica ¢ economi- camente relacionados a certa etapa da divisio social (que também é uma di sao espacial) do trabalho, que provocou a separacao entre campo e cidade, entre rural e urbano, significa dizer, entre modos distintos de produzir, de _organizar a vida em sociedade e de utilizar 0 espaco. Do ponto de vista fisico-espacial e comparativamente ao campo, a cidade veio a constituir um espaco diferenciado,mais aglomerado,ou seja, mais de so em termos de ocupacao e uso do solo, em que a contigiidade (proximida- de) é uma caracteristica bisica. Mas essa espacialidade nao é fortuita: ela esta associada a natureza essencialmente urbana das atividades que se concentram na cidade e que nela encontram um ambiente propicio para se desenvolve- rem, possibilitando, desse modo, que a cidade desempenhe adequadamente suas funcées,” em relacao ao conjunto do territério, Lefebvre (1978 : 67), faz ina distincién entre la ciudad, realidad pre- sente, inmediata, dato practico sensible, arquitecténico, y, por otra parte, lo urbano, realidad social compuesta por relaciones a concebir, a construir 0 re- construir por el pensamiento.(...) La vida urbana, la sociedad urbana, en una palabra, ‘lo urbano’ no pueden prescindir de una base practico-sensible, de una morfologia". Noutros termos, a cidade € 0 elemento empirico, a base ter- titorial, o ambiente construfdo; o urbano € 0 processo, a cidade em sua dini mica de funcionamento._ 4. Em sua origem, a cidade desempenhava basicamente funcdes administrativas (sede do governo, do judiciirio ¢ das milicias), comerciais, culturais e religiosas, afora a existéncia de oficios especializados. Com o advento do capitalismo, a cidade adquiriu a funcio industria, assumindo diretamente © controle do procesto produtivo, a medida que 2 industria se tornow o eixo dinémico da acumulacao, 398 INTRODUGAG AECONOMIA 15.2. CRESCIMENTO URBANO ‘A preocupacdo com o crescimento urbano resulta, em grande parte, da constatagao de que o ritmo, por vezes acelerado, de crescimento das cidades nao € necessariamente acompanhado da expansio correspondente da infra estrutura de sevicos urbanos, que sio imprescindiveis a seu adequado funcio- namento, tanto no sentido de assegurar a continuidade da atividade produti- va quanto no de garantir boa qualidade de vida a populacio. Estaria, desse modo, caracterizada uma situagio de desequilibrio entre oferta e demanda por servicos tipicamente urbanos. Essa forma de colocar a questio est4 associada a uma interpretacao da problematica urbana: a de que, a partir de certo tamanho, as cidades deixa riam de ser funcionais, a medida que comecariam a apresentar mais desvanta- gens do que vantagens para as atividades, produtivas ou no, que nelas se lo- calizam e que dependem de meio urbano para se desenvolverem. Dessa ética, seria importante identificar a8 causas do crescimento urbano para controli- Jo, para evitar um expansdo excessiva das cidades e, também, para combater alguns efeitos inevitaveis, através de politicas corretivas implementadas pelo Estado.° Examinando as condigées das cidades brasileiras, mais especificamente 0 caso de Sio Paulo, Singer (1978) analisa essa critica, que ele denomina de "antiurbana’ Para ele, a dificuldade maior nao est na velocidade de cresci- mento nem no tamanho das cidades, tampouco no descompasso entre oferta ¢ demanda por servicos urbanos. O problema esta na-éxclusio econdmica ¢ social, que se manifesta nas cidades através da incapacidade de amplos seg- mentos da populacdo de terem acesso a um conjunto de bens e servicos es- senciais a sua sobrevivéncia imediata, por nao representarem demanda "solvé vel", significa dizer, por nao disporem de renda suficiente para isso. Outra linha de preocupagao orienta-se no sentido de identificar a natu- lista ¢ do crescimento urbano, com vistas a definir acoes ¢ politicas que promovam 0 desenvolvimento urbano. Desse modo, a aco do |. Estado nao seria apenas corretiva, no sentido de contornar dificuldades cria- das pela expansao das cidades: o Estado atuaria como agente dinamico da u banizacao, criando as condicées gerais necessarias ao funcionamento da ati dade produtiva e assegurando a existéncia de um padrao de vida minima- mente adequado para a populacao.” 6. Essa abordagem € caracteristica do enfoque neoclissico de andlise do urbano, que foi hegeménico até por volta de 1970, quando a Economia Urbana passou a receber forte influencia da chamada "Sociologia Urbana Francesa’, de inspiracao marxista 7. © papel ativo do Estado no urbano, através de suas politicas, € um aspecto sobejamente analisado pelos autores ligados & tradigio da "Sociologia Urbana Francesa’, entre outros, ‘6 para citar alguns, Manuel CASTELLS, Jean LOJKINE e Christian TOPALOV. te ECONOMIA URBANA — 399 15.2.1 Critérios para avaliar 0 crescimento urbano para se avaliar ofcrescimento urbano, costumam ser adotados.trés.crit€ ios Fasiees, que nio sio excludentes mas complementares:o demogréfico) °

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