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O perfil da pessoa estrangeira encarcerada no Rio Grande do Sul (2020 - 2021)

RELATÓRIO DE PESQUISA

Camila Vencato Neumann


Fabian Domingues
Pâmela Marques

Introdução

O Projeto Cárceres - Experiências de encarceramento em processos de deslocamento


humano -, no âmbito do Grupo de Pesquisa sobre Refugiados, Imigrantes e Geopolítica
(GRIGs), que integra o Núcleo de Ensino Pesquisa e Extensão em Migrações
(NEPEMIGRA) na Universidade Federal do Rio Grande do Sul, apresentou a 2ª edição do
relatório “O perfil da pessoa estrangeira encarcerada no Rio Grande do Sul”, trazendo os
dados relacionados aos anos de 2020 e 2021. Também foram trazidos alguns contrapontos em
relação à edição anterior que contou com informações dos anos de 2017 até 2019. Os
objetivos que seguiram pautando a pesquisa foram: I) traçar o perfil das pessoas estrangeiras
encarceradas no sistema penitenciário gaúcho; II) verificar os enquadramentos penais que as
conduziram ao cárcere; III) explorar com mais minúcia a situação das mulheres encarceradas.
A base primária de dados com que contamos para a realização desses objetivos foi
novamente disponibilizada pela Superintendência dos Serviços Penitenciários (SUSEPE) do
Estado do Rio Grande do Sul, mantida através do sistema INFOPEN (Informações
Penitenciárias). Os resultados da pesquisa foram organizados em três seções, correspondentes
aos objetivos acima mencionados.

1. O perfil das pessoas estrangeiras encarceradas no sistema prisional gaúcho

A partir dos dados recebidos foi feita a perfilação geral das pessoas estrangeiras
encarceradas no Rio Grande do Sul, para isso foi necessário realizar duas ações: I)
estabelecer os anos de 2020 e 2021 como referência; II) excluir da base de dados os nacionais
do Brasil. Após a primeira operação, o número de pessoas estrangeiras encarceradas foi de
360. Em seguida foi realizada uma filtragem nos microdados e o total final chegou a 308. A
tabela abaixo apresenta os totais por ano:
Ano Número de pessoas estrangeiras encarceradas no Rio Grande do Sul

2020 140

2021 168

Total 308
Tabela 1: Nº de pessoas estrangeiras encarceradas no Rio Grande do Sul
Fonte: Elaboração própria a partir da base de dados da SUSEPE

Em seguida passamos à aferição por sexo, do total de pessoas estrangeiras


encarceradas verificamos que apenas 59 são do sexo feminino, representando 10,38% do
total, conforme demonstra a tabela abaixo. Cabe ressaltar que houve uma diminuição de cerca
de 3% no número de indivíduos encarcerados do sexo feminino.

Sexo Quantitativo

Feminino 32 (10.38)

Masculino 276 (89.61)


Tabela 2: Divisão por sexo das pessoas estrangeiras encarceradas no Rio Grande do Sul
Fonte: Elaboração própria a partir da base de dados da SUSEPE

Em relação à aferição por nacionalidade, a tabela abaixo apresenta os resultados


encontrados:

Nacionalidade Quantidade %

1 Uruguai 177 57,46

2 Argentina 50 16,23

3 Haiti 22 7,14

4 Paraguai 13 4,22

5 Colômbia 9 2,92

6 Venezuela 7 2,27

7 Cuba 4 1,29
8 Jordânia 4 1,29

9 Chile 3 0,97

10 Portugal 3 0,97

11 Senegal 3 0,97

12 Bolívia 2 0,64

13 China 2 0,64

14 Peru 2 0,64

15 Angola 1 0,32

16 Egito 1 0,32

17 Itália 1 0,32

18 Líbano 1 0,32

19 Paquistão 1 0,32

20 República Dominicana 1 0,32

21 Rússia 1 0,32
Tabela 3: Nacionalidade das pessoas estrangeiras encarceradas no Rio Grande do Sul
Fonte: Elaboração própria a partir da base de dados da SUSEPE.

É possível verificar, com base nessa tabela, que novamente as nacionalidades que com
mais frequência aparecem são as provenientes do Uruguai e da Argentina. Contudo, no
relatório anterior, a nacionalidade paraguaia estava em terceiro lugar, posição que sofreu uma
alteração e foi ocupada pela haitiana, anteriormente na quinta posição, tendo passado de 12
para 22 nacionais presos. Outro fato importante que merece destaque é que entre 2017 e 2019
a nacionalidade senegalesa estava em 4º lugar, passados 2 anos ela ocupa a 8ª posição junto
com Chile e Portugal, com o número caindo de 17 para 3 senegaleses recolhidos no sistema
prisional gaúcho.
A aferição dos perfis a partir do parâmetro da escolaridade resultou na seguinte
tabela:

Escolaridade Quantidade %

Ens. Fund. Inc. 110 35,71


Ens. Méd. Inc. 65 21,1

Ens. Médio 63 20,45

Ens. Fundamental 26 8,44

Superior completo 14 4,54

Alfabetizado 14 4,54

Não informado 7 2,27

Superior inc. 7 2,27

Analfabeto 2 0,64
Tabela 4: Escolaridade das pessoas estrangeiras encarceradas no Rio Grande do Sul
Fonte: Elaboração própria a partir da base de dados da SUSEPE

No que diz respeito à escolaridade novamente a maioria das pessoas estrangeiras


encarceradas possuem o ensino fundamental, assim como os analfabetos são 100% homens
uruguaios. No que diz respeito àquelas com nível superior completo, em relação aos homens
temos 28.57% de uruguaios e 14.28% de cubanos, enquanto que somente uma mulher do
Paraguai possui ensino superior completo.
Quanto aos dados etários, a maioria das pessoas estrangeiras encarceradas possui
entre 35 e 45, conforme a seguinte distribuição:

Faixa etária[1] Mulheres Homens Quantidade%

35 a 45 9 (11,25) 71 (87,5) 80 (25,97)

25 a 29 7 (10,76) 48 (73,84) 65 (21,10)

30 a 34 6 (11,11) 48 (88,88) 54 (17,53)

18 a 24 6 (11,32) 47 (88,67) 53 (17,20)

46 a 60 4 (7,84) 47 (92,15) 51 (16,55)

61 a 70 0 3 (100) 3 (0,97)

Mais de 70 0 2 (100) 2 (0,64)


Tabela 5: Faixa etária das pessoas estrangeiras encarceradas no Rio Grande do Sul
Fonte: Elaboração própria a partir da base de dados da SUSEPE

No que diz respeito aos marcadores de raça, a distribuição se deu da seguinte forma:
Raça[2] Quantidade %

Branca 206 66,88

Preta 45 14,61

Mista 45 14,61

Indiatica 9 2,92

Amarela 3 0,97
Tabela 6: Identificação racial das pessoas estrangeiras encarceradas no Rio Grande do Sul
Fonte: Elaboração própria a partir da base de dados da SUSEPE

Assim como nos dados divulgados no relatório anterior, nos anos de 2020 e 2021 a
maioria das pessoas estrangeiras presas no Rio Grande do Sul são brancas.
Buscando indicadores socioeconômicos, diante da inexistência de informações sobre
renda aferida, procuramos conhecer as atividades desenvolvidas por cada pessoa estrangeira
no momento da prisão. Aquelas com maior incidência foram:

Profissão Quantidade

Serviços gerais 37

Pedreiro 27

Autônomo 19

Auxiliar de serviços 15

Comerciante 14

Motorista 11

Mecânico 10

Do lar 9

Vendedor 7

Carpinteiro 6

Empresário 6

Padeiro 6
Pintor 6

Cozinheiro 5
Tabela 7: Atividades das pessoas estrangeiras no momento da prisão
Fonte: Elaboração própria a partir da base de dados da SUSEPE

No que diz respeito ao número de filhos no momento da prisão, a maioria que


informou possui 1 ou 2 filhos, no entanto, o número de não informado é grande e pode
representar até mesmo uma alteração nos dados.

Nº de filhos Quantidade

1 77

2 61

3 38

4 10

5 10

6 8

7 2

Não informado 75
Tabela 8: Número de filhos das pessoas estrangeiras no momento da prisão
Fonte: Elaboração própria a partir da base de dados da SUSEPE

Assim, inicialmente podemos afirmar que o perfil majoritário das pessoas estrangeiras
encarceradas no Rio Grande do Sul entre os anos de 2020 e 2021 é de homens uruguaios
brancos, na faixa etária de 35 a 45 anos, com ensino fundamental incompleto, que exerciam a
atividade de serviços gerais e possuíam um filho no momento da prisão.

2. Identificando os enquadramentos

Nessa seção serão apresentados os crimes em espécie responsáveis pelo


encarceramento de pessoas estrangeiras no sistema carcerário do Rio Grande do Sul no
período entre 2020 e 2021. Os dados abaixo representam os índices encontrados após a
verificação de consistência nos microdados.
Crimes Quantidade %

Tráfico 83 20

Furto 52 12,53

Sistema nacional de armas[3] 35 8,43

Roubo 22 5,3

Homicídio 18 4,33

Lesão corporal 18 4,33

Receptação 15 3,61

Associação ao tráfico 14 3,37

Descumprimento de medida protetiva 12 2,89

Ameaça 11 2,65

Condenação 11 2,65

Descaminho 10 2,4

Crimes no trânsito 8 1,92

Dano 8 1,92

Fals./adult./ doc. Ou papel público 7 1,68

Viol sex. Med.fraude/estup./estup. Vulner./porno.inf. 7 1,68

Assoc. Ou organ. Criminosa 6 1,44

Evasão de divisa 6 1,44

Aguardando deportação 5 1,2

Adulteração veículo 5 1,2

Corrup. Ativa/pas./ocult. Bens de infr. Penal 5 1,2

Pensão alimentícia 5 1,2

Resistência 5 1,2

Desacato 3 0,72

Maus tratos de animais 3 0,72


Fraude de lei sobre estrangeiro 3 0,72

Exercício ilegal da medicina 2 0,48

Vias de fato 2 0,48

Corrupção de menor 2 0,48

Crime contra relação de consumo 2 0,48

Desobediência 2 0,48

Falsa identidade 2 0,48

Fals. Prod. Terapêutico 2 0,48

Injúria 2 0,48

Moeda falsa 2 0,48

Peculato mediante erro de outrem 2 0,48

Peculato 2 0,48

Sequestro e Cárcere privado 2 0,48

Simulação de casamento 1 0,24

Coação no curso do processo 1 0,24

Contra o Sistema Financeiro Nacional 1 0,24

Extorsão 1 0,24

Evasão de preso militar 1 0,24

Recusa de identificação 1 0,24

Violação de domicílio 1 0,24

Crime hediondo 1 0,24

Estelionato 1 0,24

Fals./adult./ selo ou peça filatélica 1 0,24

Incêndio 1 0,24

Portar arma fora de casa sem autorização 1 0,24

Radiodifusão 1 0,24

Não informado 1 0,24


TOTAL 415[4]
Tabela 09: Crimes que mais encarceraram pessoas estrangeiras no Rio Grande do Sul
Fonte: Elaboração própria a partir da base de dados da SUSEPE

Diferente da edição anterior na qual as nacionalidades foram divididas em grupos para


apresentar os crimes em espécie que mais encarceraram, nessa edição se optou por apresentar
individualmente as 5 nacionalidades com o maior número de pessoas encarceradas no período
entre 2020 e 2021.
Assim, a tabela abaixo apresenta os crimes cometidos por nacionais do Uruguai:

URUGUAI

Tráfico 55

Furto 41

Sistema Nacional de Armas 26

Roubo 14

Vias de fato 11

Receptação 10

Associação para o tráfico 8

Descaminho 6

Descumprimento de medida protetiva 6

Homicídio 6

Condenação 5

Fals./adult./ doc. Ou papel público 5

Adulteração veículo 4

Assoc. Ou organ. Criminosa 4

Corrup. Ativa/pas./ocult. Bens de infr. Penal 4

Crimes no trânsito 4

Evasão de divisa 4

Aguardando deportação 3
Fraude de lei sobre estrangeiro 3

Exercício ilegal da medicina 2

Dano 2

Desacato 2

Fals. Prod. Terapêutico 2

Falsa identidade 2

Maus tratos de animais 2

Moeda falsa 2

Peculato 2

Peculato mediante erro de outrem 2

Pensão alimentícia 2

Viol sex. Med.fraude/estup./estup. Vulner./porno.inf. 2

Coação no curso do processo 1

Ameaça 1

Contra o Sistema Financeiro Nacional 1

Corrupção de menor 1

Crime contra relação de consumo 1

Crime hediondo 1

Fals./adult./ selo ou peça filatélica 1

Lesão corporal 1

Não informado 1

Recusa de identificação 1

Sequestro e Cárcere privado 1

Simulação de casamento 1
Tabela 10: Crimes que mais encarceraram uruguaios no Rio Grande do Sul
Fonte: Elaboração própria a partir da base de dados da SUSEPE
Novamente o tráfico de drogas foi o crime mais cometido por uruguaios. Porém cabe
ressaltar que houve um aumento[5] em relação ao crime de furto e aqueles que envolvem o
Sistema Nacional de Armas.
Em segundo lugar em número de prisões estão os nacionais da Argentina:

ARGENTINA

Tráfico 10

Furto 7

Sistema Nacional de Armas 4

Ameaça 4

Associação para o tráfico 4

Descaminho 3

Condenação 3

Homicídio 3

Crimes no trânsito 2

Dano 2

Descumprimento de medida protetiva 2

Fals./adult./ doc. Ou papel público 2

Lesão corporal 2

Receptação 2

Roubo 2

Viol sex. Med.fraude/estup./estup. Vulner./porno.inf. 2

Extorsão 1

Evasão de divisa 1

Maus tratos de animais 1

Resistência 1

Corrupção de menor 1

Aguardando deportação 1
Tabela 11: Crimes que mais encarceraram argentinos no Rio Grande do Sul
Fonte: Elaboração própria a partir da base de dados da SUSEPE

Os dados demonstraram que o crime de tráfico foi aquele que mais encarcerou
argentinos, assim como havia ocorrido nos anos anteriores. Em relação aos demais crimes
não houve nenhuma alteração significativa.
A próxima tabela apresenta a terceira nacionalidade com o maior número de
encarceramento, a haitiana:

HAITI

Lesão corporal 8

Ameaça 4

Homicídio 4

Roubo 3

Dano 2

Descumprimento de medida protetiva 2

Injúria 1

Receptação 1

Resistência 1

Sequestro e Cárcere privado 1

Vias de fato 1
Tabela 12: Crimes que mais encarceraram haitianos no Rio Grande do Sul
Fonte: Elaboração própria a partir da base de dados da SUSEPE

Em relação ao encarceramento de haitianos é importante trazer o aumento[6] dos


crimes cometidos no âmbito doméstico. Mesmo que cada um possua o seu próprio
enquadramento, quando analisados de uma maneira mais profunda, percebe-se que dos 28
crimes, 21 (75%) foram relacionados a violência doméstica.
De acordo com os dados apresentados abaixo a quarta nacionalidade que mais foi
encarcerada é a paraguaia.
PARAGUAI

Tráfico 6

Assoc. Ou organ. Criminosa 2

Sistema Nacional de Armas 2

Adulteração veículo 1

Descaminho 1

Crime contra relação de consumo 1

Evasão de preso militar 1

Furto 1

Roubo 1

Viol sex. Med.fraude/estup./estup. Vulner./porno.inf. 1

Associação para o tráfico 1

Condenação 1
Tabela 13: Crimes que mais encarceraram paraguaios no Rio Grande do Sul
Fonte: Elaboração própria a partir da base de dados da SUSEPE

Assim como no caso da nacionalidade argentina, na paraguaia não houve mudanças


significativas no tipo de crime cometido, porém, houve uma grande alteração na quantidade
de paraguaios encarcerados. O número caiu de 87 para 19, uma grande diminuição no número
de prisões.
Por fim, a última nacionalidade apresentada é a colombiana.

COLÔMBIA

Tráfico 4

Roubo 2

Sistema Nacional de Armas 2

Descumprimento de medida protetiva 1

Viol sex. Med.fraude/estup./estup. Vulner./porno.inf. 1

Resistência 1
Receptação 1
Tabela 14: Crimes que mais encarceraram colombianos no Rio Grande do Sul
Fonte: Elaboração própria a partir da base de dados da SUSEPE

Em relação aos crimes que mais levaram ao cárcere nacionais da Colômbia, o tráfico
de drogas segue em primeiro lugar. No mais, não houve alterações em relação ao número de
prisões ou tipo de crime.
A próxima tabela apresenta informações em relação ao local de residência no
momento da prisão.

Residência Quantidade %

No Brasil 241 78,24

Fora do Brasil 67 21,75


Tabela 15: Local de residência no momento da prisão
Fonte: Elaboração própria a partir da base de dados da SUSEPE

Esse item de análise também sofreu uma grande mudança. No relatório anterior cerca
de 51,21% das pessoas estrangeiras encarceradas que tiveram seus endereços localizados
viviam no Brasil no momento em que foram presos, agora esse número subiu para 78,24%.
Como estamos analisando dados de um momento pandêmico, talvez seja possível atribuir o
número maior de residentes no país ao fechamento das fronteiras. No entanto, se somente
aqueles que estão no Brasil fossem presos o percentual de prisões deveria ter diminuído, o
que não aconteceu. Assim fica o questionamento do que pode ter ocorrido nesses dois anos
analisados que manteve o número total de prisões, mas aumentou consideravelmente o
número de pessoas estrangeiras residentes no Brasil encarceradas aqui no Rio Grande do Sul.
Por fim, o último dado a ser analisado nesta seção diz respeito ao recebimento de
visitas durante o período de reclusão.

Dados a respeito do recebimento de visita

Quantidade NÃO RECEBE RECEBE

283 (91,88) 25 (8,11%)


Tabela 16: Recebimento de visita durante o encarceramento
Fonte: Elaboração própria a partir da base de dados da SUSEPE
A grande maioria das pessoas estrangeiras não recebeu visita durante o período de
encarceramento, em que pese a pandemia tenha impedido a visitação física, os presos aqui no
Rio Grande do Sul foram beneficiados com a possibilidade de visitas por videochamada [7].
No entanto, para poder fazer essa modalidade de visita, o familiar precisava possuir a carteira
de visitante. O que continuou sendo um empecilho para as pessoas estrangeiras, tendo em
vista que uma grande parte das famílias segue residindo fora do país e não possui meios de se
deslocar ao estado exclusivamente para fazer uma carteira de visitante e posteriormente
realizar as visitas. Assim, a vídeo chamada auxiliou o recebimento de visitas dos presos
brasileiros durante a pandemia.
Para finalizar essa seção, é possível concluir que o tráfico de drogas continua sendo o
crime que mais encarcera pessoas estrangeiras no Rio Grande do Sul. Que em relação as
cinco nacionalidades com o maior número de encarcerados, também é o tráfico que mais
encarcera quatro delas: uruguaia, argentina, paraguaia e colombiana. No que diz respeito aos
haitianos, o crime de violência doméstica é o crime que mais os levou para prisão. Ainda,
apontou-se que a maioria das pessoas estrangeiras residia no Brasil no momento da prisão e
que durante o período de reclusão não receberam visita física ou virtual.

3. O perfil da mulher estrangeira encarcerada

A última seção do relatório aborda o perfil das mulheres estrangeiras encarceradas.


Direcionar uma parte do trabalho para as mulheres segue sendo um ato necessário, tendo em
vista que a invisibilização da mulher no sistema prisional não mudou.
A tabela abaixo apresenta a quantidade de mulheres estrangeiras encarceradas no Rio
Grande do Sul entre 2020 e 2021.

Ano Mulheres estrangeiras encarceradas no Rio Grande do Sul (2020-2021)

2020 14

2021 18

Total 32
Tabela 17: Quantitativo das mulheres estrangeiras encarceradas no Rio Grande do Sul
Fonte: Elaboração própria a partir da base de dados da SUSEPE
A partir deste total acima, a seguinte tabela apresenta a distribuição das
nacionalidades em termos percentuais:

Nacionalidade Quantidade

1 Uruguai 23

2 Argentina 3

3 Paraguai 3

4 Bolívia 1

5 Peru 1

6 Haiti 1
Tabela 18: Nacionalidade das mulheres estrangeiras encarceradas no Rio Grande do Sul
Fonte: Elaboração própria a partir da base de dados da SUSEPE

A partir da tabela acima é possível verificar que, assim como no caso dos homens, a
maioria das mulheres possuem nacionalidade uruguaia.
Já em relação ao marcador racial, pela primeira vez verificamos a presença de
mulheres estrangeiras pretas recolhidas no sistema prisional gaúcho.

Raça Quantidade %

Branca 22 68,75

Mista 7 21,87

Preta 2 6,25

Indiática 1 3,12
Tabela 19: Identificação racial das mulheres estrangeiras encarceradas no Rio Grande do Sul
Fonte: Elaboração própria a partir da base de dados da SUSEPE

No que diz respeito ao nível escolar, os dados apresentados são os seguintes:

Escolaridade Quantidade

Ens Fund Incomp 10

Ens Médio Incomp 10

Ens Médio 8
Alfabetizado 1

Ens Fundamental 1

Ens Superior 1

Ens Superior Incomp 1


Tabela 20: Escolaridade das mulheres estrangeiras encarceradas no Rio Grande do Sul
Fonte: Elaboração própria a partir da base de dados da SUSEPE

O principal destaque em relação à escolaridade é o fato de, novamente, não termos


mulheres analfabetas recolhidas no período analisado.
Em relação a condição socioeconômica, elencamos as profissões das 32 mulheres
recolhidas no período. Conforme se verifica abaixo, a maioria realizava trabalho vinculado à
economia de cuidado.

Do lar 9

Autônoma 4

Aux. Serv. gerais 3

Emp. doméstica 3

Outros 3

Serviços gerais 2

Moto boy 2

Vendedora 1

Cabeleireira 1

Empresaria 1

Comerciante 1

Costureira 1

Não informado 1
Tabela 21: Atividades laborais das mulheres estrangeiras no momento da prisão
Fonte: Elaboração própria a partir da base de dados da SUSEPE

A seguir, é traçado o perfil etário dessas mulheres encarceradas:


Faixa etária Quantidade

35 a 45 anos 9

25 a 29 anos 7

18 a 24 anos 6

30 a 34 anos 6

46 a 60 anos 4
Tabela 22: Faixa etária das mulheres estrangeiras encarceradas no Rio Grande do Sul
Fonte: Elaboração própria a partir da base de dados da SUSEPE

Percebe-se uma alteração em relação aos dados etários. No relatório anterior, a


maioria das mulheres estavam na faixa etária classificada entre 46 e 60 anos, agora, o maior
número está entre 35 e 45 anos, ou seja, houve uma redução na faixa etária das mulheres
estrangeiras presas.
Junto com o conhecimento a respeito da redução da faixa etária, nos questionamos se
essas mulheres possuem filhos e mais uma vez foi possível constatar que a maioria possui,
cerca de 81,25% daquelas que informaram, conforme tabela abaixo.

Nº de filhos Quantidade

1 7

2 5

3 9

4 2

5 1

6 2

Não informado 6
Tabela 23: Número de filhos por mulher estrangeira encarcerada no Rio Grande do Sul
Fonte: Elaboração própria a partir da base de dados da SUSEPE

Em relação aos tipos penais que levaram essas mulheres ao cárcere, temos a seguinte
distribuição.

Crime Quantidade
Tráfico 16

Furto 5

Homicídio 3

Sistema Nacional de Armas 3

Contra o Sistema Financeiro Nacional 1

Descaminho 1

Simulação de casamento 1

Condenação 1

Assoc. Ou organ. Criminosa 1

Associação para o tráfico 1

Fals./adult./ doc. Ou papel público 1

Receptação 1

Roubo 1
Tabela 24: Principais crimes cometidos por mulheres estrangeiras encarceradas no Rio Grande do Sul
Fonte: Elaboração própria a partir da base de dados da SUSEPE

Assim como no caso dos homens, o tráfico de drogas é o crime que encarcera a
maioria das mulheres.
No que diz respeito ao local da residência, o padrão se repete demonstrando que o
maior número de mulheres estava residindo no Brasil quando foram presas.

Residência Quantidade

No Brasil 25

Fora do Brasil 7

TOTAL 32
Tabela 25: Local de residência no momento da prisão
Fonte: Elaboração própria a partir da base de dados da SUSEPE

Para finalizar, a tabela apresentada abaixo informa se as mulheres contavam ou não


com visitas registradas durante seu período de encarceramento.
Dados a respeito do recebimento de visita

Quantidade NÃO RECEBE RECEBE

28 4
Tabela 26: Recebimento de visita durante o encarceramento
Fonte: Elaboração própria a partir da base de dados da SUSEPE

Tendo esses dados em vista, constata-se que quase a totalidade dessas mulheres
(87,5%) não contava com registro de visitas em seu período de encarceramento, evidenciando
a premissa da solidão da mulher no cárcere.

Considerações finais

O presente relatório buscou traçar o perfil da pessoa estrangeira recolhida ao sistema


carcerário do Rio Grande do Sul entre os anos de 2020 e 2021, os enquadramentos penais que
as conduziram ao cárcere e entender com mais densidade a condição específica das mulheres
que compõem esse público.
Na primeira seção a conclusão é de que temos o seguinte perfil da pessoa estrangeira
encarcerada no Rio Grande do Sul: (a) a maioria corresponde a indivíduos do sexo
masculino; (b) 28 diferentes nacionalidades foram encarceradas no período analisado, sendo a
nacionalidade uruguaia aquela com o maior número de encarcerados; (c) a escolaridade da
maioria é o Ensino Fundamental Incompleto; (d) a faixa etária que predomina está localizada
entre 35 e 45; (e) a designação racial branca é a mais indicada dentre os marcadores raciais
utilizados; (f) em termos laborais, a atividade de serviços gerais foi aquela que apareceu mais
vezes como sendo a exercida no momento da prisão; (g) a maioria possuía ao menos um filho
no momento da prisão.
Em relação à seção 2, em que identificamos os tipos penais que levaram essas pessoas
ao cárcere, as conclusões foram as seguintes: (a) o enquadramento de maior incidência é o
tráfico de drogas; (b) as cinco nacionalidades que mais foram encarceradas são provenientes
do Uruguai, Argentina, Haiti, Paraguai e Colômbia; (c) em relação aos uruguaios, argentinos,
paraguaios e colombianos o crime que mais encarcerou foi o tráfico; (d) no que diz respeito
ao cárcere de haitianos, a violência doméstica foi a principal causa de prisão; (e) há uma
prevalência de pessoas residentes no Brasil quando da prisão; (f) e por último, verificou-se
que a maioria não teve nenhuma visita cadastrada durante o tempo de prisão.
A respeito da análise dos dados apresentados na seção 3, conclui-se que o perfil da
mulher encarcerada é: (a) mulheres provenientes do Uruguai; (b) a designação racial branca é
a mais encontrada e pela primeira vez duas mulheres pretas foram presas; (c) os graus de
escolaridade predominantes neste grupo consistem em Ensino Fundamental Incompleto e
Ensino Médio Incompleto; (d) a profissão prevalecente é aquela relacionada à economia
doméstica; (e) a maioria está na faixa etária compreendida entre 35 e 45 nos; (f) no momento
da prisão a maior parte possuía ao menos 3 filhos; (g) demonstrando um padrão, o crime de
tráfico é aquele que mais encera; (h) quase a totalidade residia no Brasil no momento da
prisão; (i) cerca de 87,5% não teve cadastro de visitas durante o período de encarceramento.
Por fim, reforçamos a expectativa de que esse relatório de pesquisa possa servir de
base ao desenvolvimento de novos estudos a respeito do encarceramento de pessoas
estrangeiras, bem como possa ser objeto da atenção de órgãos governamentais especializados,
assim como da sociedade civil organizada, visando à elaboração de políticas públicas
específicas.

Referências

BRASIL. Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias. Departamento


Penitenciário Nacional. Disponível em: <https://www.gov.br/depen/pt-br/sisdepen>. Acesso
em: 16 dez. 2020.

BRASIL. Política nacional de atenção integral à saúde da mulher: princípios e diretrizes.


Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. –
Brasília: Ministério da Saúde, 2004.

DINIZ, Débora. Cadeia: relatos sobre mulheres. Rio de Janeiro: Civilização


Brasileira, 2015.

[1]
A faixa etária está sendo considerada de acordo com o padrão adotado pelo IBGE.
[2]
Os termos utilizados como marcadores raciais são os fornecidos pela SUSEPE.
[3]
Nesse enquadramento optamos por englobar todos os crimes que envolvam armas, quais sejam: posse por
porte de armamento de calibre permitido ou proibido e tráfico nacional ou internacional de armas de e calibre
permitido ou proibido.
[4]
O total de crimes apurado foi de 415, sendo em número maior do que o número de pessoas presas, visto que
uma única pessoa pode ser enquadrada e responder por mais de um crime.
[5]
Nos 3 anos analisados no relatório anterior, os nacionais do Uruguai foram presos por 33 crimes de furto e 26
crimes relacionados ao Sistema Nacional de Armas. Nos 2 anos analisados nesse relatório, a quantidade de
prisões por esses crimes foi 41 e 26, respectivamente, ou seja, nos dois casos houve um aumento no número de
prisões.
[6]
No relatório anterior foram 15 o número de crimes que encarceraram haitianos, desses 11 (73,33) estavam
relacionados a violência doméstica. Assim, percebe-se que não apenas o número de encarceramento aumentou,
também houve um aumento no número de mulheres vítimas de violência.
[7]
Falar a respeito das alterações que estão sendo propostas.

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