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M a n ua l D igital do Profes s or

Texto s : A na Paula Mathias de Paiva

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Texto Agnès de Lestrade • Ilustrações Valeria Docampo • Tradução Carlos Aurélio e Isabelle Gamin
Manual do professor
O professor-mediador é uma figura fundamental no âm-
bito escolar porque multiplica as chances de letramento literá-
rio, amplia a capacidade de compreensão dos textos e compar-
tilha com seus alunos a paixão pelas leituras. A boa mediação
abre espaço para a autonomia dos estudantes, seu protagonis-
mo e sua compreensão de si, do outro e do mundo. Recursos de
apoio são bem-vindos quando se pautam na expansão de co-
nhecimentos, motivação interpessoal e elaboração de rotinas
pedagógicas adequadas às diversidades nacionais.

O Manual do Professor correlaciona tais argumentos às obras li-


terárias, destaca gêneros e temáticas, organiza propostas, ativida-
des e orientações capazes de potencializar habilidades e compe-
tências, assim como de suprir dificuldades detectadas.
Sumário
6 Síntese da obra

9 Sobre as autoras

11 Adequação e desenvolvimento de competências

12 Gênero literário

13 Como utilizar em sala de aula o livro

A grande fábrica de palavras

15 Construíndo conhecimento ambiental

21 Atividades propostas #1

25 Desdobramento da proposta #1

28 Atividades propostas #2

31 Atividades propostas #3

35 Depois da leitura

39 Interlocuções

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Síntese da obra
A grande fábrica de palavras trata de temas essenciais,
atemporais e simultaneamente contemporâneos. Afinal, sem-
pre foi essencial ao homem ter acesso a formas expressivas de
comunicação para assim manifestar sentimentos e transmitir
ideias aos outros. Conforme a história escrita por Agnès de Les-
trade, existe um país onde as pessoas não falam. Quer dizer,
por lá somente às vezes é possível trocar emoções e ideias por
meio das palavras. Paradoxalmente, nesse país está instalada
uma grande fábrica de palavras. Mas o acesso às mesmas é

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caro e escasso. Palavras não são para todos, infelizmente. Só os
bem ricos têm acesso ao consumo de palavras, ou então os que
as recolhem parcamente no lixo, esquecidas, ou ao vento, em
momentos de sorte ímpar. Nesse cenário, um menino chama-
do Philéas sente a delicadeza de um sentimento novo. Ele ama
Cybelle. Mas o que fazer se lhe faltam as palavras?! Este é um
livro que, com muita originalidade, aborda a pureza do amor,
a magia contida nas palavras e o valor da liberdade. Uma obra
literária para superar forças restritivas com a beleza da lingua-
gem poética, a força da intenção amorosa e as verdades dos
genuínos sentimentos de afeto.

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Sobre as autoras
Agnès de Lestrade nasceu em 1964 e vive no sudoeste da
França, em Gironde. Como autora e ilustradora já foi premiada
por seus livros juvenis e infantis – por exemplo com o Prémio
Papillotes 2010 e o Prix littéraire de la Citoyenneté. Tem mais de
50 títulos publicados e vem sendo traduzida em outros idiomas,
porém no Brasil temos mais acesso às obras A árvore da chuva
e A grande fábrica de palavras. Agnès é uma artista multifa-
cetada que escreve contos e romances infantis, conta histórias,
ministra oficinas de escrita e animação infantil, ilustra livros,
compõe canções infantis e colabora com o jornal Créamania. A
autora diz gostar de escrever na cama ou em trens.

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Valeria Docampo é natural da Argentina mas reside em
Lyon (França). A ilustradora de A grande fábrica de palavras –
obra traduzida em mais de dez idiomas – é formada em Design
Gráfico e Comunicação Visual pela Universidade de Buenos Ai-
res, onde atuou como professora. Para dar os primeiros passos
em sua arte, Valeria se sentiu motivada por um forte desejo: o de
capturar a poesia das coisas cotidianas. Foi assim que começou
a desenhar. E nunca mais parou. Desde 2006 a artista vem se de-
dicando à ilustração infantojuvenil, mesclando técnicas manuais
às digitais. Para conhecer mais sobre a ilustradora e seus livros
de trabalho, acesse: https://valeriadocampo.com/books

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Adequação e desenvolvimento Tema: envolve a descoberta de sentimentos (auto-
de competências conhecimento), destaca o aprendizado que advém das
observações e trata, ficcionalmente, do mundo social. Por
meio da fantasia, o livro coloca o leitor em contato com o
Competências gerais associadas à obra A grande fábrica poder das significações, transmitindo o valor das comuni-
de palavras: cações interpessoais.

▶ Coordenar habilidades sensíveis para usar palavras esco- ▶ Temas principais: expressão comunicativa; embota-
lhidas em contextos específicos; mento social; contenção; sensibilização para o amor; emo-
▶ Compreender a importância do conhecimento e do aces- ções puras; apropriação criativa (dos sentimentos e das pa-
so às palavras para a expressão de sentimentos pessoais e sociais; lavras); desigualdade de acesso.
▶ Ampliar repertório sensível de comunicação interpessoal;
▶ Desenvolver o desejo e a atitude de construir sentido por ▶ Temas transversais: rrestrições sociais e econômicas;
meio das palavras; escassez (de palavras) versus fartura (existência da fábrica de
▶ Ansiar por melhores e amplas comunicações, superando palavras); dependência do consumo (compra de palavras);
restrições de uso e validando a meta de expressão comunicati- vontade reprimida; uso inteligente das palavras; o significa-
va com o outro. do das palavras no contexto de uso; a resolução do conflito.

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Gênero Literário:
Prosa de ficção

Os personagens estão inseridos num contexto ficcional lógico,


desenvolvendo suas ações. Há um narrador. A história é fantasiosa
mas faz sentido no contexto, há coerência nas ações dos personagens
apresentados ao público leitor e percebe-se no interior do texto uma
progressão temporal entre os acontecimentos relatados.

Enquanto conto, A grande fábrica de palavras apresenta texto narrativo


sucinto, centrado em um relato e em um fato memorável. Percebe-se
a presença de um narrador, há um conflito principal, existem poucos
personagens em cena e na estrutura há “começo, meio e fim”.

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Como utilizar em sala de aula o livro
A grande fábrica de palavras
Antes da leitura

Na história que vamos ler, era uma vez um país onde fabrica-
vam-se palavras. Mas, por incrível que pareça, nesse lugar estranho
pouca gente tinha acesso às palavras, isto é, as possibilidades de
comunicação entre as pessoas que ali viviam eram parcas. Palavras
de saudação e de despedida, termos sazonais, palavras suaves e
discursos: tudo estava em falta para quem não pudesse pagar um
alto preço, comprar palavras, engoli-las e, assim, falar. Deste modo,
quem tinha acesso às palavras, tão raras, as poupava. Somente os
muito abastados utilizavam e manipulavam as palavras a esmo,
sem tratá-las como muito especiais, preciosas como de fato são!

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Texto literário

Cybelle mora na rua ao lado. Philéas bate em sua por- 1. Quando tudo é ou fica escasso, valorizamos cada oportu-
ta. Ele não diz – Bom dia, como vai você?, pois não tem nidade de acesso.
essas palavras guardadas. [...] Minhas palavras são muito
pequenas!, pensa Philéas. Ele inspira profundamente e, so- 2. Quando há muita abundância, nem sempre valorizamos
bretudo, pensa em todo o amor que tem no seu coração. Em os acessos como oportunidade.
seguida, fala as palavras que pegou na sua rede. As palavras
voam para Cybelle: elas são como pedras preciosas. 3. Para alguns, pouco significa muito.
[Fonte: A grande fábrica de palavras]
4. Para outros, muito significa pouco.
A partir desta visão prévia de A grande fábrica de palavras,
pensemos juntos – mediador e interlocutores – algumas situa-
ções reais e mentais que promovem bases argumentativas para
a construção de um rico diálogo social, cultural e ambiental.

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Construindo conhecimento
ambiental

De repente, o essencial ficou escasso.

Diante desta frase, o que poderíamos construir de en-


tendimento? Aos leitores de A grande fábrica de palavras ha-
verá espaço para refletir questões referentes ao contraste: afinal,
na narrativa nos deparamos com a fábrica e a abundância de
palavras produzidas dia e noite e, em contrapartida, existe uma
tremenda escassez de acessos que atinge os sujeitos.

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1. possua as maiores reservas de água por unidade territorial
do planeta, é preciso destacar que elas estão desigualmente
distribuídas no espaço geográfico brasileiro. A região Norte,
notadamente a Bacia do Rio Amazonas, é aquela que possui
Refletir desdobramentos do uso a maior concentração de água no país, tanto pelo rio em ques-
consciente da água tão quanto pela presença do Aquífero Alter do Chão, o maior
em volume d'água. Mas também é preciso entender a ques-
tão demográfica. A maior parte da população brasileira não
TEXTO INFORMATIVO, JORNALÍSTICO. reside nos pontos onde a água encontra-se disponível de for-
ma mais abundante, pois há uma concentração populacional
O Brasil passou a viver, a partir de 2014, os primeiros gran- muito elevada nas regiões Sudeste e Nordeste, respectivamen-
des focos daquilo que pode ser a maior crise hídrica de sua his- te. [...] e são essas as regiões cujos Estados possuem os maio-
tória. Com um problema grave de seca e também de gestão res históricos de secas e escassez de água ao longo do tempo.
dos recursos naturais, o país vem apresentando níveis baixos Além disso, existem também as questões referentes à utiliza-
em seus reservatórios em épocas do ano em que eles costu- ção [pessoal e coletiva] e gestão dos recursos hídricos no país.
mam estar bem mais cheios. Essa ocorrência, de certa forma, [Fonte: Brasil Escola. Acesso em out. 2018. Colchete nosso. Disponível em: ht-

representa uma grande contradição, pois o Brasil é conside- tps://brasilescola.uol.com.br/geografia/escassez-agua-no-brasil.htm]

rado a maior potência hídrica do planeta. [...] Embora o Brasil

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A escassez de água é um dos maiores desafios a serem en-
frentados ao longo do século XXI. Atualmente, cerca de um bi- 2.
lhão e setecentos milhões de pessoas, quase um quarto da po-
pulação da Terra, vivem em áreas onde não existe fornecimento
adequado, seja pela falta ou pela inexistência de infraestrutura
Lixo abundante versus
para levar a água até as moradias. Embora alguns países dis- matéria-prima escassa
ponham de grandes reservas, nos rios, lagos e aquíferos, é im-
portante pensar no futuro. Daí a importância da iniciativa das
organizações ambientais mundiais que defendem o uso racio- COMPREENDER E DIALOGAR SOBRE O LUGAR DA RECICLA-
nal e das empresas que adotam novos procedimentos em suas GEM NO MUNDO MODERNO..
indústrias, a fim de reduzir o consumo. [Fonte: TV Cultura. Matéria:
“Água, escassez e soluções”. Acesso em set. 2018. Disponível em: http://tvcul- A separação do lixo não traz benefícios apenas ao meio
tura.com.br/videos/44217_materia-de-capa-agua-escassez-e-solucoes.html] ambiente: a gestão dos resíduos passou a ser importante fonte
de matéria-prima para a indústria [e produz empregos]. [...]“Preci-
samos entender que os recursos naturais são esgotáveis”, lembra
Jörg Lacher, da Confederação Alemã de Matérias-Primas Secun-
dárias e Eliminação de Resíduos. [...] Nesse contexto, o reaprovei-
tamento da matéria-prima torna-se uma tarefa cada vez mais

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interessante. “Quando queimamos levianamente matérias-pri-
mas, principalmente onde elas ainda poderiam ser usadas, ou 3.
seja, recicladas, estamos sendo imediatistas, sem conduzirmos
uma economia sustentável”. [...] No caso da Alemanha, país po-
bre em recursos naturais e grande exportador mundial de produ-
O que é essencial ao poeta
tos industrializados, o reaproveitamento é imprescindível. Diante
da oferta de recursos naturais cada vez mais escassa, fica claro GANHAR ACESSO A UMA VISÃO POÉTICA, SENSÍVEL.
não só para a Alemanha, mas para o mundo todo, que o lixo [tão
abundante] será o recurso mais importante no futuro. Aliás, nas A leitura de poesias, contos e matérias jornalísticas, bem
residências alemãs a separação do lixo é feita cuidadosamente como o contato com documentários e entrevistas também po-
já há algumas décadas. [...] os contêineres de cores azul, amarelo, dem incrementar o entendimento comparativo – no caso entre
preto e verde ganharam espaço na Europa e no resto do mundo. abundância versus escassez. A seguir, apresentamos um texto
O jornal velho, por exemplo, pode se transformar em papel novo; de Ricardo Gondim, que trata do essencial (íntimo, pessoal). A
o lixo orgânico gera gás. Os detritos eletrônicos transformam-se partir desta leitura, uma interlocução pode ser criada acerca do
em tesouro [...], porque o lixo eletrônico é uma verdadeira mina que nos é essencial e por que motivo.
de materiais. [Fonte: Portal EcoDebate. Acesso em out. 2018. Colchete nosso.
Disponível em: https://www.ecodebate.com.br/2010/09/01/com-escassez-de-ma-

terias-primas-o-lixo-ganha-importancia-economica-como-fonte-secundaria/]

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TEMPO QUE FOGE ‘As pessoas não debatem conteúdos, apenas os rótulos’.
Meu tempo tornou-se escasso para debater rótulos, que-
Contei meus anos e descobri que terei menos tempo ro a essência, minha alma tem pressa…
para viver daqui para a frente do que já vivi até agora. Sem muitas cerejas na bacia, quero viver ao lado de gen-
Tenho muito mais passado do que futuro. te humana, muito humana; que sabe rir de seus tropeços,
Sinto-me como aquele menino que recebeu uma bacia não se encanta com triunfos, não se considera eleita antes da
de cerejas. As primeiras, ele chupou displicente, mas perce- hora, não foge de sua mortalidade.
bendo que faltam poucas, rói o caroço. Quero caminhar perto de coisas e pessoas de verdade.
Já não tenho tempo para lidar com mediocridades. O essencial faz a vida valer a pena.
Não quero estar em reuniões onde desfilam egos inflados. E, para mim, basta o essencial!
Inquieto-me com invejosos tentando destruir quem eles
admiram, cobiçando seus lugares, talentos e sorte. OBJETIVOS: criar pontes de conhecimento e saber entre
Já não tenho tempo para conversas intermináveis, para discutir a realidade e a literatura; ganhar consciência crítica a respei-
assuntos inúteis sobre vidas alheias que nem fazem parte da minha. to dos assuntos comentados (abundância versus escassez);
Já não tenho tempo para administrar melindres de pes- protagonizar situações de formação de opinião; fomentar a
soas, que apesar da idade cronológica, são imaturas. participação dos alunos em um diálogo argumentativo oral;
Detesto fazer acareação de desafetos que brigaram pelo compreender o sentido de palavras empregadas em gêneros
majestoso cargo de secretário geral do coral. distintos (poesia, matéria jornalística, texto literário etc.).

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Atividades propostas #1

Como nasce a curiosidade intelectual


no contato com a literatura: a magia
das palavras
Na primavera, podemos comprar palavras em promoção e le-
var pra casa um monte de palavras baratas. Mas quase sem-
pre essas palavras não servem para grande coisa: o que fazer
com ventríloquo e filodentro? [Fonte: A grande fábrica de palavras]

Em uma das páginas de A grande fábrica de palavras en-


contramos o trecho supracitado e as palavras “ventríloquo” e
“filodentro” anunciadas em destaque. Ambas estão em promo-
ção, o que no contexto retrata o destino das palavras pouco de-
sejadas pelos falantes. Quer dizer, conforme o sentido dado à

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história, há um país onde poucas são as pessoas que mantêm Retomando a leitura – A grande fábrica de palavras –, percebe-se
intimidade com a linguagem, e, em meio à escassez de dizeres que “ventríloquo” e “filodentro” fazem parte de um ramo de palavras
livres, apenas algumas palavras estão ao alcance comum (dos mais baratas e acessíveis, sobre as quais pesa algum tipo de falta de
falantes) por um valor razoável. graça ou falta de encantamento. Ou seja, também no país de Philéas
há palavras consideradas especiais, valiosas, bem como outras que são
desmerecidas, isto é, pelas quais não se dá o mesmo valor.
A saber:
A primeira palavra mencionada no texto se refere
à prática da ventriloquia, ou seja, à arte de proje-
Refletir com base na lógica da
tar a voz, falar, sem que se abra a boca ou mova-se
o lábio, de maneira que o som pareça vir doutra
história e formar opinião
fonte diferente – um boneco, por exemplo – e não
do falante. Quanto ao vocábulo “filodentro”, refe- 1. Será que a falta de graça associada a algumas palavras
re-se a uma planta de clima tropical, de cores vivas – no livro – vem do fato de os sujeitos deste país não mais
e contrastantes, cujo nome popular é filodendro saberem como usá-las? E isso poderia acontecer no nosso
Brasil, justamente pelo jogo de cores das suas fo- cotidiano também?
lhas, que chegam a ficar com um tom verde-ama- Exemplo: Um homem realmente multíscio. [forma anti-
relado, lembrando as cores da bandeira brasileira. quada de dizer multisciente, palavra que na contemporaneida-

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de diz respeito àquele que sabe muitas coisas, erudito, ou, sim- Um perfume vermelho me pensou.
plesmente, muito culto.] (Eu contamino a luz do anoitecer?)
Esses vazios me restritam mais.
2. Será que as palavras mais valorizadas pelos falantes ain- Alguns pedaços de mim já são desterro.
da são aquelas que remetem a sentidos amplamente rela- [Trecho de “Os deslimites da palavra”, Manoel de Barros.]

cionais ou mais imediatamente reconhecidos?


Exemplo: Bom dia! Seja bem-vindo! 4. Será que a desvalorização de uma palavra – ou sua quase
desaparição no cotidiano falante – pode significar que, com
3. Ou as palavras mais expressivas, expandidas em senti- o tempo, ela saiu de moda? Ou terá sido o seu uso (original,
mentos e ideias, é que seriam as mais preciosas? erudito) tão somente sobreposto por outras escritas expres-
Exemplo: Amo-te tanto, meu amor... não cante sivas mais contemporâneas?
O humano coração com mais verdade... [...] Ex.: Todos os que têm computador devem fazer backups.
Amo-te afim, de um calmo amor prestante [Backups = O mesmo que cópias de segurança.]
E te amo além, presente na saudade.
[Trecho do “Soneto do Amor Total”, Vinícius de Moraes.] Pode inserir o seu login para atestar a identificação.
[Login = identificação de um usuário em sites ou serviços
A lua faz silêncio para os pássaros, que necessitam de autenticação.]
- eu escuto esse escândalo!

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Vosmecê me disse que iria também.
[No português arcaico era comum o uso do tratamento
“vossa mercê”, que evoluiu para “você”.]

Considerando que a língua, por ser uma estrutura viva,


está em constante processo de transformação, ainda que não
tenhamos as respostas definitivas sobre os questionamentos
anteriores, um interessante diálogo pode ser promovido sobre
usos da linguagem, perpassando a apropriação cultural, usos
contextualizados, bem como utilizações arcaicas, contemporâ-
neas, denotativas e conotativas das palavras.

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Desdobramento da proposta #1 entanto, no caso de “ventríloquo” e “filodendro” – mencionados
no livro – temos um pouco mais de dificuldade para associar
ideias e criar mentalmente frases que signifiquem apropriada-

Meu amigo dicionário mente estes vocábulos. Isso ocorre, em geral, quando as pala-
vras não nos povoam com ideias, quando não fazem parte, ain-
da, do nosso fluxo de pensamentos e emoções. Ou seja, quando
Palavras mais baratas são vistas como não especiais no algumas palavras não nos habitam mentalmente.
país de Philéas. Mas e se passarmos pela experiência de pegar e consultar
Seus preços foram rebaixados. E podem ser levadas para o dicionário? Isso muda a nossa compreensão acerca das pala-
casa em promoção. vras? O que vamos encontrar como explicação para as palavras?
Segundo a lógica do texto, realmente não é comum sair Os dicionários em geral nos oferecem a(s) definição(ções)
dizendo por aí “filodendro”. Entretanto, que tal pensar a ques- da palavra, sua classe gramatical, origem histórica e usos apli-
tão por outro viés? Pode-se aqui levar ao conhecimento dos cados. Pesquisá-los é um exercício muito rico para o aprendiza-
leitores que as palavras “boneco” e “planta” são bem comuns e do de ganho vocabular, à curiosidade intelectual e ao entendi-
amplamente utilizadas pelos falantes, e possivelmente seriam mento de significados aplicados ao contexto.
valorizadas no país de Philéas e Cybelle porque aplicáveis a si-
tuações diversas. Mas isso acontece simplesmente porque co- MÃOS À OBRA!
nhecemos os sentidos destas palavras – “boneco” e “planta”. No

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NA CONSULTA AO DICIONÁRIO CONSIDERAR: nificar: (a) o elemento básico do alfabeto, (b) o texto de uma
canção, (c) ou a caligrafia de um determinado indivíduo.
PALAVRAS, ORIGEM E SENTIDOS: Toda essa conversa perpassa a magia das palavras. Afinal,
1. A etimologia é o estudo da origem e da evolução das palavras. para cada termo conhecido, percebe-se, há uma origem (etimo-
2. O sentido literal, ou denotativo, é o significado genuíno logia da palavra), um uso aplicado literal, às vezes usos figurados,
das palavras, expressões e enunciados. sinônimos, antônimos e expressões que significam as palavras
3. Nos textos poéticos, humorísticos, publicitários ou mesmo conforme um contexto. Algo bem incrível de se aprender.
naqueles em que existe uma preocupação maior com a esté-
tica, é comum o uso do sentido figurado, ou conotativo. ATIVIDADE SUGERIDA: cada criança pode iniciar a com-
posição de um dicionário pessoal, que inclusive pode ser te-
APRENDENDO SENTIDOS APLICADOS: Assim, é possível mático. Por exemplo, um dicionário de animais, de cidades,
mostrar aos leitores que as palavras também podem ser usadas de oxítonas, de folclore etc.
em sentido figurado e que há, inclusive, palavras polissêmicas –
que reúnem vários significados. OBJETIVOS: Compreender o que é acepção; tomar gosto
▶ A palavra "vela" pode significar: (a) a vela de um barco, (b) pelo conhecimento exploratório (pesquisa); penetrar na magia
a vela feita de cera que serve para iluminar, (c) ou ainda pode das palavras; descobrir sentidos, ganhar repertório e noção de
ser a conjugação do verbo velar, que significa estar vigilante. contextualização de uso – das palavras; pensar na possibilidade
▶ "Letra" é uma palavra polissêmica, porque ela pode sig- de fazer um dicionário customizado, ou seja, personalizado.

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Atividades propostas #2

Atividade cultural provocativa

Sobre a importância da liberdade


Imagine não poder escutar as músicas que mais gosta ou ler os
livros que aprecia. Imagine ter de ficar calado quando as ideias
chegam à sua imaginação. Já pensou como seria ter de ficar em
silêncio quando o que mais quer é falar a um(a) amigo(a) queri-
do(a)? E calar na hora que gostaria de opinar? Já imaginou!?

Incitar uma conversação ou debate a partir da abordagem:


Como é não ter liberdade?
▶ Não poder agir conforme seu livre arbítrio;
▶ Não poder agir de acordo com a própria vontade;
▶ É não ser livre para opinar e escolher;

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▶ É não ter independência;
▶ É não poder exercer sua autonomia e espontaneidade.

Lançar na roda a pergunta:


Se cada manifestação, diálogo, vontade de transmitir e receber comu-
nicações, tudo, enfim, tivesse seu uso restrito à compra e venda no
mundo das expressões comunicativas – palavras (usos diversos), me-
lodias (musicais), traços (pinturas), gestos etc. –, como o mundo seria?
▶ Permitir que os interlocutores se expressem por meio da
fala, de desenhos ou da encenação.
▶ Mas, uma vez que escolham naturalmente sua forma de
expressar opinião, mostrar como seria se lhes fosse retirada a
chance de expressão e registro pelo confisco do direito da fala,
dos gestos, confisco de papéis, lápis, tintas etc., e limitação do
discurso a algumas poucas palavras distribuídas – impressas.
▶ Após esta experiência de restrição passageira – de du-
ração de alguns minutos –, permitir a criação em valorização à
manifestação livre.

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Atividades propostas #3

As palavras proibidas já existem no


mundo moderno

A frase acima pode suscitar em nós, leitores, falantes e ci-


dadãos, uma forte apreensão: Como assim palavras proibidas?
De fato, existiria um país que restringe o acesso às palavras,
como na obra A grande fábrica de palavras? Os textos propos-
tos a seguir podem apresentar aos interlocutores questões não
puramente locais, mas sim mundiais e que mexem com a ques-
tão da livre expressão das ideias.

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DOIS CASOS DE PALAVRAS PROIBIDAS NA
CONTEMPORANEIDADE:

diu que as demais empresas se abstivessem de utilizar a deno-


minação em seus rótulos. A alegação apresentada foi a de que

1. “champagne” indica com exclusividade a origem de vinho espu-


mante da região francesa com o mesmo nome (Champagne),
Há um tema que cria surpresa, polêmica e até indignação no se- sendo privilégio dos autores o uso do termo, e não de empre-
tor vinícola. Uma determinada palavra não poderia mais ser uti- sas de outros país. A ser considerado, culturalmente as pessoas
lizada por todos. Mas como então adequar e designar a bebida passaram a associar “champagne” a espumantes. Ademais, o
produzida como espumante se o termo “champagne” poderia termo “champagne” está associado a um método de fabricação
sofrer processos caso a palavra aparecesse em rótulos não fran- da bebida, segundo os produtores vinícolas. E o emprego do
ceses, especificamente da região de Champagne? Algumas vi- termo como referência ao processo de fabricação (champanhi-
nícolas brasileiras tiveram de recorrer ao Supremo Tribunal Fe- zação) não pode, portanto, ser qualificado como falsa indicação
deral (STF) para ter garantido o direito de usar a denominação de procedência ou delito, porque a denominação vem seguida
“champagne” – a exemplo, ver o Recurso Extraordinário de nú- do nome do produtor e da indústria que o produziu – constan-
mero 78.835. O direito de uso da palavra em questão entrou em do país de origem. [Para saber mais, consultar STF: https://stf.jusbrasil.
polêmica desde que a região produtora no norte da França pe- com.br/jurisprudencia/709936/recurso-extraordinario-re-78835-gb]

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2.
O Jornal Le Monde Diplomatique também releva que “vale assim, palavras também entraram num território de embate.
tudo para quem quer se apropriar de uma palavra”. A empresa [Para saber mais, ler: Le Monde Diplomatique, jan. 2000. Matéria “Palavras

japonesa House Food está tentando, por exemplo, patentear o proibidas”, de Philippe Rivière. Acesso em: out. 2018. Fonte: https://diplomati-

nome curry, o famoso tempero preparado todo dia por milhões que.org.br/palavras-proibidas/]

de indianos. A House Foods reclama a paternidade da receita


do curry e, se o Instituto Japonês de Patentes deferir seu pedi- ATIVIDADE LIVRE: Criar uma conversação que perpasse
do (nº 06090838), um prato preparado todo dia por milhões de o assunto a seguir: “Como ficam os falantes se algumas pa-
indianos será propriedade de seus “inventores” declarados: Hi- lavras se tornaram propriedade de uns e restrita aos outros,
rayama Makoto e Ohashi Sachiyo. Tudo isso acende uma dúvida mesmo quando a denominação faz parte do conhecimento
pertinente. Será possível ter direito de exclusividade sobre uma do senso comum?”. Os alunos podem ilustrar o que sentem.
frase corrente, ou sobre um vocábulo culturalmente mundiali-
zado, uma palavra corriqueira? O fato é polêmico e abre discus-
sões amplas. Segundo o Jornal Le Monde, “[...] os negócios não
param aí: alguns advogados fizeram da ampliação e do fortale-
cimento da propriedade intelectual sua “nova fronteira”, explo-
rando, contra o senso comum, todas as suas possibilidades”. E

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Depois da leitura
Observar usos melódicos e
contextualizados das palavras

Na obra A grande fábrica de palavras, o menino Philéas pro- ▶ Explicar sentidos da canção de acordo com a demanda
nucia as palavras que traz guardadas “como pedras preciosas”: dos alunos (interlocutores).
cereja, poeira, cadeira... Estas, melodicamente, flutuam no ar e ▶ Associar as frases a costumes e assim demonstrar as sig-
alcançam os ouvidos e o coração de Cybelle. nificações embutidas na construção criativa da letra da música.
Considerando que o termo “palavra” define “a unidade lin- Por exemplo, ao tomar uma colher de óleo de rícino, abrimos a
guística com significado, que pode ser escrita ou falada”, apro- boca e portanto, nesta situação, não podemos falar.
veitar o momento de aprendizado para saborear coletivamente ▶ Perceber que há estrangeirismos na menção de vocábu-
a beleza da composição “Diariamente”, interpretada do Marisa los, mas também que estes termos não nos são estranhos porque
Monte. [Fonte: MARISAMONTE VEVO. Disponível em: https://www.youtube. já foram absorvidos pela cultura brasileira – ou seja, tornaram-se
com/watch?v=mEA4N8t8Nac]. compreensíveis no uso, na linguagem costumeira, popular.

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DIARIAMENTE Para embaixo da sombra: guarda-sol
Nando Reis/Marisa Monte Para todas as coisas: dicionário
Para que fiquem prontas: paciência
Para calar a boca: rícino Para dormir a fronha: madrigal
Pra lavar a roupa: Omo Para brincar na gangorra: dois
Para viagem longa: jato Para fazer uma touca: bobs
Para difíceis contas: calculadora Para beber uma coca: drops
Para o pneu na lona: jacaré Para ferver uma sopa: graus
Para a pantalona: nesga Para a luz lá na roça: duzentos e vinte volts
Para pular a onda: litoral Para vigias em ronda: café
Para lápis ter ponta: apontador Para limpar a lousa: apagador
Para o Pará e o Amazonas: látex Para o beijo da moça: paladar
Para parar na Pamplona: Assis Para uma voz muito rouca: hortelã
Para trazer à tona: homem-rã Para a cor roxa: ataúde
Para a melhor azeitona: Ibéria Para a galocha: Verlon
Para o presente da noiva: marzipã Para ser mother: melancia
Para Adidas: o Conga nacional Para abrir a rosa: temporada
Para o outono, a folha: exclusão Para aumentar a vitrola: sábado

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Para a cama de mola: hóspede Para a comida das orcas: krill
Para trancar bem a porta: cadeado Para o telefone que toca
Para que serve a calota: Volkswagen Para a água lá na poça
Para quem não acorda: balde Para a mesa que vai ser posta
Para a letra torta: pauta Para você, o que você gosta
Para parecer mais nova: Avon Diariamente
Para os dias de prova: amnésia
Para estourar pipoca: barulho
Para quem se afoga: isopor
Para levar na escola: condução
Para os dias de folga: namorado
Para o automóvel que capota: guincho
Para fechar uma aposta: paraninfo
Para quem se comporta: brinde
Para a mulher que aborta: repouso
Para saber a resposta: vide-o-verso
Para escolher a compota: Jundiaí
Para a menina que engorda: Hipofagin

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Interlocuções

O LADRÃO DE PALAVRAS O MENINO QUE VENDIA PALAVRAS


Nesta obra de Francisco Duarte Mangas com ilustrações de De Ignácio de Loyola Brandão, o livro tem por protagonista um
Alain Corbel, narra-se que há muitos anos existia um homem menino cujo pai era um homem muito culto, que conhecia as
que roubava palavras. As melhores palavras. Metia-as cuidado- palavras muito bem. Se os amigos do menino queriam saber o
samente num saco de linho e desaparecia. Pela manhã, as pes- significado de alguma palavra, era ao pai dele que sempre recor-
soas acordavam pobres. Pobres, sempre mais pobres e tristes. riam. Observando a curiosidade pelo saber dos amigos, o meni-
Sim, porque nesse tempo as palavras eram de ouro. Tal ladrão no pensa então em negociar o significado das palavras. E assim
aprisionava as palavras alegres, as mais luminosas, e os habitan- ele vai descobrindo também o valor das palavras e começa a uti-
tes sobreviviam no meio de palavras sem sabor, impedidos de lizá-las como moeda de troca no meio de seus amigos. O livro
ter acesso às palavras luminosas, consideradas as mais doces. recebeu o 2º lugar no Prêmio Jabuti na categoria “Infantil” e ga-
Os habitantes dessa aldeia desejaram superar essa nuvem de nhou o 1º lugar na categoria “Melhor livro do de Ficção”, ambos
melancolia que cobria parte do povoado. Mas precisavam antes em 2008. Tem projeto gráfico apurado e incentiva a pesquisa e a
descobrir: “Quem era o ladrão das palavras luminosas, da ale- busca dos conhecimentos e novos saberes.
gria?” Afinal, mantidos afastados das palavras luminosas, ema-
greciam na imaginação.

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