“(…) Estamos numa fase de equilíbrio, de qualitativo, de desenvolvimento
da pessoa, de preservação dos patrimónios naturais e culturais. Mas não nos enganemos: o regionalismo, a ecologia, o “retorno do sagrado”, todos esses movimentos, longe de se encontrarem em ruptura com ela, limitam- se a rematar a lógica da indiferença. Primeiro porque os grandes valores do modernismo se encontram esgotados;(…) A modernidade, o futuro, já não entusiasmam ninguém. Será em proveito de novos valores?(…) O momento pós-moderno é muito mais do que uma moda, revela o processo da indiferença pura na medida em que todos os gostos, todos os comportamentos, podem coabitar sem se excluírem, tudo pode ser escolhido conforme o gosto, tanto o mais operatório como o mais esotérico, tanto o novo como o antigo, a vida simples e ecológica e a vida hiper- sofisticada, num tempo desvitalizado sem referências estáveis, sem coordenadas principais. (…) o retorno do sagrado é ele próprio arrastado pela celeridade e pela precaridade das existências individuais entregues apenas a si próprias. A indiferença pura designa a apoteose do temporário e do sincretismo individualista.”
Gilles Lipovetsky, A Era do Vazio , p. 39
“O nihilismo europeu, tal como o analisou Nietzsche, enquanto depreciação
mórbida de todos os valores superiores e deserto de sentido, já não corresponde a esta desmobilização de massa, que não é acompanhada por um sentimento de absurdo nem de desespero (...) Deus morreu, as grandes finalidades extinguem-se, mas toda a gente se está a lixar para isso, eis a jubilosa nova, eis o limite do diagnóstico de Nietzsche a respeito da queda europeia. O vazio de sentido, a derrocada dos ideais não levaram, como se poderia esperar, a mais angústia, a mais absurdo, a mais pessimismo. Esta maneira de ver ainda religiosa e trágica é desmentida pelo surto da apatia da massa (...).
(...) a nossa bulimia de sensações, de sexo, de prazer, nada esconde, nada
compensa e, sobretudo, não esconde nem compensa o abismo de sentido aberto pela morte de Deus.”