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GILBERTO UEHARA

TURMA 2
FICHAMENTOS

MÓDULO 5
TUTELAS DO CDC - ADMINISTRATIVA E
PENAL
S

SEMINÁRIO – SISTEMA NACIONAL DE DEFESA DO CONSUMIDOR

QUESTÕES:

1. O que é o Sistema Nacional de Defesa do Consumidor? Quais os seus objetivos,


segundo o Código de Defesa do Consumidor? Ele tem cumprido seus objetivos?

“A Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon), criada pelo Decreto nº 7.738, de 28

de maio de 2012, integra o Ministério da Justiça e tem suas atribuições estabelecidas no

art. 106 do Código de Defesa do Consumidor e no art. 3º do Decreto n° 2.181/97. 

A atuação da Senacon concentra-se no planejamento, elaboração, coordenação e

execução da Política Nacional das Relações de Consumo, com os objetivos de: (i)

garantir a proteção e exercício dos direitos dos consumidores; (ii) promover a

harmonização nas relações de consumo; (iii) incentivar a integração e a atuação

conjunta dos membros do SNDC; e (iv) participar de organismos, fóruns, comissões ou

comitês nacionais e internacionais que tratem da proteção e defesa do consumidor ou de

assuntos de interesse dos consumidores, dentre outros. 

A Senacon também atua na análise de questões que tenham repercussão nacional e

interesse geral, na promoção e coordenação de diálogos setoriais com fornecedores, na

cooperação técnica com órgãos e agências reguladoras, na advocacia normativa de

impacto para os consumidores, na prevenção e repressão de práticas infrativas aos


direitos dos consumidores. 

No âmbito internacional, a Secretaria representa os interesses dos consumidores

brasileiros e do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor (SNDC) junto a

organizações internacionais como MERCOSUL, Organização dos Estados Americanos

(OEA), entre outras. 

Dentre as principais ações da Senacon, destacam-se, a integração dos órgãos de defesa

do consumidor ao Sistema Nacional de Informações de Defesa do Consumidor

(Sindec), as atividades da Escola Nacional de Defesa do Consumidor, as ações voltadas

à proteção da Saúde e Segurança do Consumidor, a proteção ao consumidor no âmbito

da regulação, do pós-venda de produtos e serviços, da sociedade da informação, do

consumo sustentável e na implementação do Plano Nacional de Consumo e Cidadania

(Plandec). [https://www.gov.br/mj/pt-br/acesso-a-informacao/perguntas-frequentes/consumidor/sistema-nacional-de-defesa-do-
consumidor] acesso em 26/10/2022]

Demandas relacionadas ao Direito do Consumidor são as mais representativas entre os


novos casos que chegam à primeira instância dos tribunais estaduais, que seguem
atolados de processos. Há anos os meios alternativos de resolução de conflitos se
apresentam como uma forma de desafogar o Judiciário, mas a cultura litigante brasileira
permanece forte, de forma que não houve uma queda substancial no volume de
processos.

Discutido há dois anos na Câmara dos Deputados, um projeto prevê a possibilidade de


que um processo só seja admitido pelo Judiciário com provas de que as tentativas
de acordo entre consumidor e companhia foram esgotadas sem sucesso. A ideia consta
no Projeto de Lei 533/2019, que recebeu parecer favorável do relator na Comissão de
Defesa do Consumidor, mas ainda não avançou

Dentre os principais interessados na mudança estão setores que concentram a maior


parte das reclamações, como bancos, empresas de telecomunicações e linhas aéreas. Ao
mesmo tempo, a eventual alteração é alvo de críticas pelo entendimento de que
cercearia o livre acesso à Justiça e que causaria, como efeito colateral, uma falta de
proatividade nas empresas na busca pela solução das questões trazidas pelos
consumidores.

Os dois lados concordam que as alternativas de resolução de conflitos – desde as


ferramentas organizadas pelos sistemas de Justiça, passando pelas empresas
independentes que fazem a intermediação até o atendimento dos próprios fornecedores
– devem ser fortalecidas para se firmarem como concentrador das disputas. O que
diferencia as abordagens é como isso deveria ser feito, se por obrigação ou por meio de
incentivos aos consumidores.

Alternativas limitadas Quando se trata de resolução de conflitos de consumo, o Brasil


tem uma ferramenta nacional que coloca empresas e pessoas para chegar a um acordo: a
plataforma consumidor.gov.br, coordenada pela Secretaria Nacional do Consumidor
(Senacon), do Ministério da Justiça. Criada em 2014, inicialmente com 133 empresas,
ela almeja concentrar e resolver disputas antes que elas escalem para o Judiciário.
Em linhas gerais, o usuário pode se comunicar diretamente com as empresas
participantes, que se comprometem a receber, analisar e responder as reclamações em
até dez dias (na pandemia, o prazo aumentou para 15 dias). Passado esse período,
correm 20 dias para o consumidor comentar e avaliar a resposta da empresa, informando
se a reclamação foi resolvida ou não, indicando também seu nível de satisfação com o
atendimento do negócio.

Para reduzir litígios judicializados, a plataforma firmou parcerias com 24 Tribunais de


Justiça, além do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1). Também foi feito
acordo de cooperação técnica com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para
integração do Processo Judicial Eletrônico (PJe), sistema usado por diferentes tribunais
judiciais, ao consumidor.gov.br.

Com isso, espera-se que o consumidor que ajuizou uma ação seja apresentado a uma
alternativa mais célere. Após a distribuição do processo, seria possível negociar
diretamente com a empresa e o acordo seria homologado judicialmente. Lançada em
2019, a integração é testada em projeto piloto no Tribunal de Justiça do Distrito Federal
e no TRF1.

Uma das críticas que a plataforma recebe e que a afasta como opção ao Judiciário é que
há dificuldade em ter acompanhamento de um advogado, o que alguns consumidores
podem considerar essencial para a tomada de decisão. “O regulamento possibilita a
representação por um advogado, mas a ferramenta não conta com esse campo ou acesso.
Mesmo em questões mais complexas não é possível que o advogado participe
diretamente”, afirma Laís Bergstein, membro da Comissão Especial de Defesa dos
Consumidores do Conselho Federal da OAB, que demandou mudanças à Senacon.

Atualmente, há 1,1 mil empresas e 3,1 milhões de usuários cadastrados, com cerca de 4
milhões de reclamações dadas com resolvidas. Um dos primeiros sinais das limitações
do alcance do sistema em resolver as situações nacionalmente aparece já nesses
indicadores: quase a metade (48%) do total de queixas estão concentradas no Sudeste,
ante uma minoria (3,8%) em estados do Norte.

Em grande medida, isso reflete a distribuição populacional, mas não simetricamente. E,


considerando que a ferramenta só pode ser acessada via internet, há a preocupação de
que ela não esteja disponível à população com acesso mais precário à rede – por efeitos
de conectividade ou mesmo dispositivos que tem a mão. Desse modo, consumidores da
zona rural, com acesso intermitente ou idosos seriam os mais prejudicados.

Inclusive, não restringir a busca por solução ao ambiente digital é uma das
recomendações da União Europeia para a aplicação de alternativas extrajudiciais, que
predominam na região. Analisando um caso de consumo, em 2010, a Corte de Justiça da
União Europeia sistematizou as condições que as plataformas deveriam garantir. Além
de pontos como gratuidade e celeridade, ela traz recomendações que poderiam servir
para o nosso Online Dispute Resolution (ODR) local, o consumidor.gov.br.
Entre os principais problemas apresentados pelos consumidores na plataforma no ano
passado, lideraram demandas referentes a cobranças ou contestações por pagamentos –
42% das questões tinham esse perfil. Em segundo lugar, aparecem questões
relacionadas a contratos e ofertas, com 18% dos casos. Na terceira posição, com 15% do
total, estão as queixas sobre atendimento e Serviço de Atendimento ao Consumidor
(SAC). Esse dado acende um alerta sobre a atenção dada pelas empresas a este serviço.

A ferramenta do governo vem como uma opção adicional à disponibilização pelas


próprias empresas – independentemente do porte delas – de canais diretos no SAC, em
diferentes formatos. Porém, como os dados do consumidor.gov.br apontam, usuários
não têm saído plenamente satisfeitos dos SACs.

Outros levantamentos ajudam a entender a opinião geral sobre os canais. Entre 8 mil
consumidores consultados, menos de um terço se disse satisfeito com as experiências
com SACs, segundo constatou o Instituto Ibero-Brasileiro de Relacionamento com o
Cliente (IBRC) e o Instituto de Pesquisas e Estudos da Sociedade e Consumo (IPS
Consumo) em levantamento de abril.

O descrédito é corroborado por avaliações da Senacon, que, em 2019, contratou uma


consultoria para mapear o funcionamento dos SACs das empresas reguladas no Brasil.
De acordo com o professor de Direito Econômico da Fundação Getúlio Vargas (FGV)
em São Paulo Luciano Timm, que à época era secretário da Senacon, a percepção
generalizada de que SACs não funcionam corresponde à realidade, mas empresas não
concordam com essa visão. A ineficiência, em vez de evitar, provocaria a judicialização
de conflitos.

“Quando deixamos consumidores falarem, sem intermediação, o que pedem são


diversidade de produtos, melhor qualidade, menor preço e com transparência e
informação. Querem ainda que eventuais dissabores no processo de consumo, sejam
resolvidos rapidamente pelas empresas sem necessidade de recorrer ao Poder Judiciário
para tanto”, afirma Timm.

Também seria preciso que os SACs evoluíssem adotando ferramentas multicanais para
se relacionar com consumidores, fazendo uso de tecnologia para resolver problemas.
Por fim, caberia a avaliação e vigilância sobre a efetividade dos serviços. Com base no
estudo, a Senacon pediu sugestões de mudança da regulamentação do SAC ao Conselho
Nacional de Defesa do Consumidor (CNDC), entidade que congrega organizações civis
de defesa do consumidor, associações empresariais, representantes de governo e
agências reguladoras.
Em abril deste ano, o CNDC aprovou texto provisório para substituir o Decreto
6.523/2008, que regulamenta o SAC das empresas reguladas (como telecomunicações,
sistema financeiro e saúde suplementar). Nessa versão, algumas das propostas seriam
fomentar o uso de diferentes canais de atendimento ao consumidor; criar ferramenta
para avaliar a efetividade do SAC; exigir que um contato estivesse disponível sem
interrupções.

O texto foi encaminhado à Senacon, que já teria finalizado a proposta, hoje discutida
interministerialmente. Atualmente, o órgão é liderado por Juliana Domingues. Uma das
alterações em potencial é a obrigatoriedade de ser oferecido atendimento telefônico
conduzido por uma pessoa. Considerando o comportamento do consumidor, há razão de
ser na proposta.

A maioria entra em contato com o SAC para reclamar e, quando o faz, prefere usar o
telefone como meio de contato, segundo o levantamento do IBRC e IPS Consumo. Isso
também é percebido entre os mais jovens: na faixa de 30 anos, 66% dá prioridade a esse
canal. Assim, atendimentos feitos apenas online tenderiam a ser vistos com
desconfiança.

“É preciso que se esteja disponível para ter escuta ativa, ainda que não seja possível
entrar em acordo. Muitas vezes, o consumidor está frustrado e o atendimento amplia a
insatisfação, em vez de prevenir processos”, aponta Fernanda Guerra, advogada
especializada em acordos integrativos e soluções extrajudiciais.

Falta de personalização e empatia são algumas das principais queixas em relação a


SACs fracos. [LETÍCIA PAIVA  https://www.jota.info/coberturas-especiais/relacoes-de-consumo/por-
que-as-alternativas-a-justica-nao-tem-sido-suficientes-para-consumidores-19082021 acesso em
26/10/2022

2. Como é composto o Sistema Nacional de Defesa do Consumidor e como são


distribuídas as atribuições de cada órgão?

[artigo] “O Sistema Nacional de Defesa do Consumidor tem previsão no Código de


Defesa do Consumidor e no Decreto Lei 2181 de 1997, no qual dispõem sobre a
Organização do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor .

Assim dispões os artigos 105 e 106 ambos do Código de Defesa do Consumidor:

Art. 105. Integram o Sistema Nacional de Defesa do Consumidor (SNDC), os órgãos


federais, estaduais, do Distrito Federal e municipais e as entidades privadas de defesa do
consumidor.
Art. 106. O Departamento Nacional de Defesa do Consumidor, da Secretaria Nacional
de Direito Econômico (MJ), ou órgão federal que venha substituí-lo, é organismo de
coordenação da política do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor, cabendo-lhe:I -
planejar, elaborar, propor, coordenar e executar a política nacional de proteção ao
consumidor; II - receber, analisar, avaliar e encaminhar consultas, denúncias ou
sugestões apresentadas por entidades representativas ou pessoas jurídicas de direito
público ou privado; III - prestar aos consumidores orientação permanente sobre seus
direitos e garantias; IV - informar, conscientizar e motivar o consumidor através dos
diferentes meios de comunicação; V - solicitar à polícia judiciária a instauração de
inquérito policial para a apreciação de delito contra os consumidores, nos termos da
legislação vigente; VI - representar ao Ministério Público competente para fins de
adoção de medidas processuais no âmbito de suas atribuições; VII - levar ao
conhecimento dos órgãos competentes as infrações de ordem administrativa que
violarem os interesses difusos, coletivos, ou individuais dos consumidores; VIII -
solicitar o concurso de órgãos e entidades da União, Estados, do Distrito Federal e
Municípios, bem como auxiliar a fiscalização de preços, abastecimento, quantidade e
segurança de bens e serviços; IX - incentivar, inclusive com recursos financeiros e
outros programas especiais, a formação de entidades de defesa do consumidor pela
população e pelos órgãos públicos estaduais e municipais; X - (Vetado); XI -
(Vetado); XII - (Vetado); XIII - desenvolver outras atividades compatíveis com suas
finalidades;Parágrafo único.

Para a consecução de seus objetivos, o Departamento Nacional de Defesa do


Consumidor poderá solicitar o concurso de órgãos e entidades de notória especialização
técnico-científica.[1]
O Sistema Nacional de Defesa do Consumidor é composto por órgãos públicos dentre
eles federais, estaduais, municipais e instituições privadas. Os órgãos e entidades que
compõem o SNDC visam à efetivação da política de consumo, a proteção e garantia dos
direitos do consumidor e a garantia da aplicabilidade do princípio constitucional da
dignidade da pessoa humana.

O Sistema é composto pelos seguintes órgãos: (i) Órgão de Proteção do Consumidor-


PROCON; (ii) Ministério Público; (iii) Defensoria Pública; (iv) Delegacias de Defesa
do Consumidor; (v) Juizados Especiais Cíveis; (vi) Organizações Civis de Defesa do
Consumidor; e (vii) Agências Reguladoras.”
Os órgãos além de fiscalizarem, garantem aos consumidores; partes vulneráveis da
relação consumerista, o efetivo cumprimento da legislação consumerista e
constitucional as quais preveem direitos e garantias aos consumidores.

Todos os órgãos na medida de suas competências, foram criados dentre outras


atribuições, para garantir a correta execução da Política Nacional das Relações de
Consumo, que visando o atendimento das necessidades dos consumidores, à respeito da
dignidade, saúde, segurança, a proteção de seus interesses econômicos, melhoria de
qualidade de vida, transparência e, harmonia nas relações de consumo.

Ainda tratando-se dos órgãos constituem o SNDC os mesmos garantem a não exclusão
pelo Código de Defesa do Consumidor de outros direitos decorrentes de tratados ou
convenções internacionais de que o Brasil seja signatário, como ventilado pelo
artigo 7º do CDC.

O Decreto 2.181 de 1997 que trata sobre o Sistema Nacional de Defesa do Consumidor,


estabelece todas as normas gerais de aplicação de sanções administrativas nos termos
do Código de Defesa do Consumidor.

O SNDC é coordenado pela Secretária Nacional do Consumidor do Ministério da


Justiça, sendo a mesma competente para elaboração, planejamento e execução da
política nacional de proteção e defesa do consumidor, conforme dispõe o artigo 3º do
Decreto Presidencial.

A Secretária Nacional de Consumidor (SENACON) tem suas atribuições no


artigo 106 do Código de Defesa do Consumidor, bem como no artigo 3º do Decreto
nº 2.181/97. [2]

Além do planejamento, elaboração e coordenação da Política Nacional de Defesa do


Consumidor, o SENACON analisa questões de repercussão nacional e interesse geral.
Além do âmbito nacional, representa os interesses dos consumidores diante
organizações internacionais.” Fonte: migalhas - consulta em 26/10/2022]

3. Analisar o papel desses órgãos na pandemia (ver artigo professor Ricardo


Morishita)

“Desde o segundo bimestre de 2020, a propagação da Covid-19 impactou diversas


relações jurídicas. Entre elas, há de se destacar o forte impacto às relações de consumo
dos mais diversos setores: varejo, aviação e turismo, entre outros.

Nesse período de calamidade pública, a Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon),


órgão vinculado ao Ministério da Justiça e Segurança Pública, passou a exercer
assertivamente um papel fundamental no direcionamento das relações de consumo,
editando notas técnicas e portarias, bem como efetuando acordos com os fornecedores,
não só com o intuito de assegurar e preservar os direitos dos consumidores, mas
também para garantir a viabilidade e continuidade das atividades econômicas — tão
afetadas pela crise — por parte dos fornecedores.

Esse papel adotado pela Senacon acabou por reforçar a importância diretiva do órgão
para uniformização de entendimentos sobre direito do consumidor.

É comum verificarmos diferentes órgãos pertencentes ao Sistema Nacional de Defesa


do Consumidor (SNDC) proferirem entendimentos e interpretações divergentes sobre
normas e princípios do Código de Defesa do Consumidor. A ausência de harmonização
quanto às normas consumeristas dificulta uma padronização de condutas pelos
fornecedores que atuam em âmbito nacional, o que, por sua vez, gera insegurança
jurídica e pode acarretar multas administrativas exorbitantes aos fornecedores.

Essa dificuldade de uniformização e harmonização dos entendimentos se dá


especialmente em razão da complexidade da composição do SNDC que, segundo o
Decreto nº 2.181/97, é um sistema integrado de proteção ao consumidor, cujo objetivo
final é a implementação de políticas de proteção do consumidor, assim como a
operacionalização da fiscalização e a autuação de infrações a regras consumeristas.
Dentro dessa lógica, o SNDC autoriza que sejam criados órgãos federais, estaduais e
municipais de defesa do consumidor (os Procons), o que faz com que cada território
possua órgãos próprios capazes de fiscalizar o cumprimento da legislação consumerista
— órgãos esses que acabam, muitas vezes, por definir seus próprios entendimentos
sobre temas e normas de direito do consumidor.

Apesar de tais órgãos descentralizados atuarem em cooperação de forma horizontal, o


Decreto nº 2.181/97 instituiu ainda que a Senacon é o órgão responsável exclusivo pela
coordenação do SNDC, podendo, inclusive, expedir atos normativos com objetivo de
direcionar a fiel observância das normas de proteção ao consumidor.

Dessa forma, tem-se que a Senacon possui atribuições específicas, como a competência
para elaborar notas técnicas para subsidiar o SNDC em temas de sua competência e para
direcionar os entendimentos a serem adotados por todos os órgãos que compõem
SNDC.

Nessa esteira, há de se observar que a possibilidade de criação de diversos órgãos


subsidiários de defesa do consumidor não pode ser sinônimo de salvo-conduto para
entendimentos antagônicos entre os órgãos, que ao fim e ao cabo pertencem ao mesmo
sistema de proteção e, portanto, devem adotar entendimentos uniformes.

Nesse aspecto, é fato que, durante a pandemia, a Senacon assumiu efetivamente o


exercício que lhe é legalmente atribuído, trazendo diversas diretrizes ao sistema de
proteção, por meio de atos normativos que englobam diversos ramos da atividade
econômica. Por meio desses atos, a Senacon buscou assegurar e garantir direitos dos
consumidores e dos fornecedores, em paralelo à padronização de medidas e regras a
serem seguidas pelos fornecedores.

Não é demais lembrar que a pandemia ocasionou um cenário jamais visto, em que se fez
necessário o fechamento de estabelecimentos físicos de serviços considerados não
essenciais e a implantação do distanciamento social em todo o país, a fim de evitar a
propagação do coronavírus. Isso, por sua vez, fez com que fornecedores fossem
obrigados a readequar totalmente seus métodos de prestação de serviços e de
comercialização de produtos.
Por óbvio, essas medidas afetaram os consumidores e os fornecedores em proporções
também jamais vistas, razão pela qual a Senacon executou papel fundamental, ao
expedir orientações e recomendações aos diversos órgãos de proteção às normas
consumeristas, com o objetivo de uniformizar as condutas permitidas pelos
fornecedores e as normas que deveriam ser flexibilizadas em tempo de pandemia —
evitando-se, assim, ainda mais discussões, inclusive em âmbito judicial, quanto à
atuação dos órgãos de defesa do consumidor espalhados pelo país.

Observado esse cenário, e à luz das determinações expedidas, vê-se que não foram
poucos os temas debatidos pela Senacon [1] ao longo do período de pandemia — e até o
momento da publicação deste artigo —, em diferentes setores econômicos, que exercem
papel significativo no direcionamento das relações de consumo.

A Nota Técnica nº 8/2020 foi apresentada como um “guia orientativo para exame de
abusividade na elevação dos preços dos diversos produtos e serviços que podem ser
afetados em virtude da pandemia do coronavírus”, sugerindo a análise de determinados
critérios que alteram o equilíbrio do mercado.

A Senacon destacou, em tal nota técnica, que momentos de crise podem ocasionar o
aumento da demanda, considerado o temor pela ausência de abastecimento, bem como a
diminuição da oferta de produtos, o que justificaria o aumento de preços. A nota técnica
destacou, ainda, que o mercado brasileiro é regido pela Lei da Liberdade Econômica
(Lei nº 13.874/2019), mas que o Estado deve intervir para manter o equilíbrio com as
normas consumeristas. Apenas depois de efetuada a análise do caso específico, caso
reste comprovado que houve o aumento do preço sem “justa causa”, a empresa infratora
estaria sujeita ao pagamento de multa administrativa.

A nota técnica em questão teve considerações significativas e indispensáveis para a


harmonização das decisões proferidas pelos órgãos do SNDC em decorrência do
aumento de preços no momento de pandemia, demonstrando a responsabilidade de
referidos órgãos em agir de forma ativa para evitar os aumentos abusivos e propositais,
com as respectivas penalidades — mas também ressaltando critérios que devem ser
considerados na análise de tais situações, na medida em que o mero aumento de preço
não significa, por si só, prática abusiva, devendo ser respeitadas as dificuldades
impostas pela pandemia para a prestação dos serviços e produtos, como eventuais faltas
de matérias-primas e o aumento da busca por determinados produtos.

Ainda, a Nota Técnica nº 14/2020 abordou os contratos com instituições de ensino que
tiveram aulas presenciais suspensas em razão da pandemia. A Senacon concluiu que,
diante da discussão sobre a concessão de descontos ou suspensão de contratos em
decorrência da ausência de aulas presenciais, a melhor alternativa seria a prestação
alternativa do serviço com qualidade equivalente ou semelhante à contratada: I)
postergando aulas presenciais, com a modificação do calendário letivo e de férias; e II)
oferecendo-se aulas à distância, respeitadas as cargas horárias mínimas e cumprimento
do conteúdo estabelecido pelo Ministério da Educação. Nessas hipóteses, a orientação
da Senacon foi no sentido de não haver justificativa para a redução de mensalidades,
postergação do pagamento ou cancelamento do negócio jurídico.

A Nota Técnica nº 26/2020, por sua vez, trouxe atualizações sobre o tema, considerando
imprescindível que os órgãos de proteção ao consumidor realizem articulações para
definição de padrões mínimos de qualidade de ensino conforme a legislação vigente,
bem como orientando que as instituições de ensino estabeleçam um canal de
comunicação permanente e direto com pais, responsáveis e alunos. Em contrapartida, a
nota técnica expressou o entendimento de que não há obrigatoriedade de concessão de
descontos, e que eventuais concessões devem ser analisadas de acordo com o caso
concreto.

Apesar da orientação da Senacon a respeito da ausência de justificativa para


obrigatoriedade de redução de mensalidades, o Procon/SP adotou entendimento
contrário, no sentido de que “deve ser oferecido um percentual de desconto na
mensalidade escolar, cujo valor pode ser proposto pela própria instituição, de acordo
com sua situação econômico-financeira” [2]. Esse exemplo demonstra claramente a
complexidade do SNDC e a insegurança jurídica gerada a partir da ausência de
entendimentos uniformes pelos órgãos que integram o sistema.

No que tange ao setor aéreo, um dos segmentos mais atingidos pela pandemia, a
Senacon celebrou termo de ajustamento de conduta (TAC) com o Ministério Público
Federal, o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios, a Associação Brasileira
das Empresas Aéreas e com as companhias aéreas atuantes em território brasileiro,
visando a equilibrar os direitos dos consumidores com as dificuldades da manutenção da
atividade econômica das companhias aéreas neste período.

Referido TAC se tornou o principal instrumento regulador do setor aéreo no período de


crise, pois normatizou os direitos dos consumidores e os deveres das companhias aéreas
durante a pandemia, flexibilizando as regras de cancelamento e remarcação previstas na
Resolução nº 400/2016 da Agência Nacional de Aviação Civil, bem como de assistência
material em caso de fechamento de fronteiras, instituindo ainda, a plataforma
Consumidor.gov como principal meio de solução consensual de conflitos. É
fundamental, de todo modo, que todo o SNDC observe as obrigações previstas no TAC,
para que não haja entendimentos sem uniformidade envolvendo o tema.

Por fim, cabe destacar que, no dia 8 do mês passado, foi publicado o Decreto nº
10.417/2020, por meio do qual foi criado o Conselho Nacional do Consumidor, que tem
como finalidade assessorar o Ministério da Justiça e Segurança Pública no
gerenciamento de políticas nacionais de defesa do consumidor, bem como propor aos
órgãos do SNDC recomendações e interpretações da legislação consumerista que
garantam segurança jurídica e previsibilidade.

Ainda que tais recomendações e interpretações possuam apenas caráter recomendatório,


a observância de tais orientações é de fundamental importância para que não haja
entendimentos divergentes entre órgãos de defesa do consumidor.

Fato é que, diante da relevância dos temas tratados pelo SNDC, é evidente a relevância
do papel de coordenação da Senacon, em especial por meio da edição de recomendações
sobre a legislação consumerista em decorrência da pandemia do Covid-19. A partir da
observância de tais orientações, é possível cogitar-se de alguma segurança jurídica aos
fornecedores e evitar, assim, processos sancionatórios originados de entendimentos
contraditórios entre os órgãos do SNDC”.[:] [https://www.soutocorrea.com.br/artigos/senacon-
ajuda-a-unificar-entendimentos-sobre-direito-do-consumidor-na-covid-19-2/ acesso em 26/06/22]
4. O Decreto nº 10.051, de 09/10/2019, que está em vigor desde a sua publicação
no DOU de 10/10/2019, instituiu o Colégio de Ouvidores do Sistema Nacional
de Defesa do Consumidor com competências normativas para propor diretrizes
para o “controle social das atividades desempenhadas pelos órgãos e pelas
entidades que compõem o Sistema Nacional de Defesa do Consumidor”.
Conferir o texto do decreto e as críticas da OAB (nota técnica), cabendo ao
aluno descrever sua posição sobre o assunto.

[artigo]“O Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) foi uma das entidades
que assinaram um ofício enviado ao ao ministro da Justiça e da Segurança Pública,
Sérgio Moro, solicitando a revogação ou revisão do decreto que criou o Colégio de
Ouvidores do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor (SNDC), que é composto por
órgãos municipais, estaduais, federais e entidades civis de defesa do consumidor.

Além do Idec, assinam o documento a Associação Nacional do Ministério Público do


Consumidor (MPCon), o Programa Estadual de Proteção e Defesa do Consumidor de
Minas Gerais (Procon-MG), a Associação Nacional dos Procons Brasil (ProconsBrasil)
e a Comissão de Defesa dos Direitos do Consumidor do Conselho Nacional das
Defensorias-Gerais dos Estados e Distrito Federal (Condege).

Para as entidades, o Decreto nº 10.051, de 09 de outubro, que criou o Colégio de


Ouvidores do SNDC, não propõe políticas públicas de promoção ao consumidor e
limita, inconstitucionalmente, os deveres fundamentais dos órgãos que integram o
sistema. Além de inconstitucional, as instituições afirmam que o decreto possui
incompatibilidade com o ordenamento jurídico brasileiro, sendo necessária a sua
revogação ou, pelo menos, a sua revisão.

O documento explica que “os inúmeros órgãos públicos componentes do SNDC, com
origem nas diversas unidades federativas, já possuem, não apenas ouvidorias próprias,
senão sistemas complexos de controle interno e externo”, especialmente com relação às
multas aplicadas aos fornecedores, por exemplo.

Os dirigentes das instituições nacionais de defesa do consumidor esclarecem, no texto,


que são favoráveis à transparência dos atos públicos e que órgãos de controle são
essenciais para a preservação do Estado Democrático de Direito. Porém, eles
consideram que o decreto “representa sério enfraquecimento” da atuação dos órgãos de
proteção e defesa do consumidor, e que o excesso de controle traz “proteção deficiente
de vulnerável”.

A decisão de requerer a revogação do decreto foi tomada durante o 2º Encontro Técnico


do Sistema Estadual de Defesa do Consumidor (SEDC/MG), realizado em Belo
Horizonte, de 23 a 25 de outubro” [https://idec.org.br/noticia/idec-assina-oficio-contra-decreto-
que-cria-colegio-de-ouvidores-do-sndc ] acesso em 26/10/2022

[artigo] “A Comissão Permanente de Defesa do Consumidor da Ordem dos Advogados


do Brasil, Secional de São Paulo, vê com extrema preocupação a edição do Decreto n°
10.051, de 9 de outubro de 2019, que institui o “Colégio de Ouvidores do Sistema
Nacional de Defesa do Consumidor”, que passará a promover o “controle social das
atividades desempenhadas pelos órgãos” de defesa do consumidor.

A defesa do consumidor é direito fundamental, previsto no art. 5º, LV da Constituição


Federal, que depende, para sua efetividade, de órgãos de defesa do consumidor fortes,
articulados e independentes.

Existem sérios indicativos da inconstitucionalidade formal e material do Decreto, na


medida em que cria órgão e fixa suas competências, matérias que só podiam ser tratadas
por lei, e também prevê ingerência de um órgão federal nas esferas privativas de
atuação dos Estados, Distrito Federal e Municípios, a quem cabe, com exclusividade, a
correição dos atos de seus respectivos órgãos de defesa do consumidor.

O Decreto, no seu art. 5º, VIII, atribui a competência ao Colégio de Ouvidores para
“propor a criação de instrumentos para aprimorar a fiscalização e o acompanhamento de
práticas de atos ilegais ou arbitrários cometidos por operadores de proteção e defesa do
consumidor”. Além dos órgãos integrantes do Sistema Nacional do Consumidor
(Procons, Ordem dos Advogados do Brasil, Associações Civis, Ministério Público e
Defensorias Públicas) serem um modelo de atuação em todo o Brasil, possíveis desvios
e abusos já são hoje objeto de controle judicial, político e administrativo.

O fomento da atividade empresarial não ocorrerá com a mitigação dos direitos dos
consumidores, porque são estes, na verdade, aqueles que fomentam a economia
nacional. Enfraquecer o Sistema Nacional do Consumidor só contribuirá para prejudicar
a economia nacional. [https://www.oabsp.org.br/noticias/2019/10/nota-publica-2013-
decreto-ndeg-10-051-que-institui-o-colegio-de-ouvidores-do-sistema-nacional-de-
defesa-do-consumidor.13255 - OAB] acesso em 26/10/2022]

5. O INMETRO e as Agências Reguladoras podem aplicar sanções previstas no


CDC (art. 56 CDC)? Como deve ser a articulação entre esses órgãos e o Sistema
Nacional de Defesa do Consumidor? (vejam acórdãos)

[artigo] “O Conmetro (Conselho Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade


Industrial) e o Inmetro podem aplicar multas fundamentadas em dispositivos legais e
também baseadas em seus atos normativos. O entendimento foi consolidado pela 1ª
Turma do Superior Tribunal de Justiça. O julgamento do tema seguiu rito da Lei dos
Recursos Repetitivos e será aplicado a todos os casos semelhantes.
Com base em várias legislações e precedentes, a relatora do processo, ministra Eliana
Calmon, ressaltou que a imposição de multas por atos normativos baixados pelos dois
órgãos está expressamente prevista em lei, bem como as resoluções, portarias e demais
normas que estabelecem critérios e procedimentos para aplicação das penalidades, o que
afasta a ofensa ao principio constitucional da reserva legal.
O Inmetro recorreu ao STJ contra decisão que anulou ato de infração por entender que a
ação ou omissão da conduta proibida não estava claramente descrita em lei. Para a
Justiça de Minas Gerais, somente lei em sentido formal pode tipificar sanções
administrativas, sob pena de ofensa ao princípio da legalidade.
Segundo a ministra, seria contraproducente exigir lei formal para discriminar todos os
pormenores técnicos exigidos na busca do aprimoramento e da fiscalização da qualidade
dos produtos e serviços colocados no mercado, quando a lei já prevê a obediência aos
atos normativos e delimita as sanções possíveis.
Para Eliana Calmon, essa sistemática normativa tem como objetivo maior o respeito a
dignidade humana e a harmonia dos interesses envolvidos nas relações de consumo,
dando aplicabilidade ao Código de Defesa do Consumidor e efetividade à chamada
Teoria da Qualidade (dever legal do fornecedor de garantir padrões de qualidade e
desempenho dos produtos e serviços que coloca no mercado).
“Estão revestidas de legalidade as normas e respectivas infrações expedidas pelo
Conmetro e Inmetro, com o objetivo de regulamentar a qualidade industrial e a
conformidade de produtos colocados no mercado de consumo, seja porque esses órgãos
estão dotados da competência legal atribuída pelas leis que instituíram os órgãos: Leis
5.966/1973 e 9.933/1999 , seja porque seus atos tratam de interesse público e agregam
proteção aos consumidores finais”, concluiu a relatora. Seu voto foi acompanhado por
unanimidade”. Com informações da Assessoria de Imprensa do Superior Tribunal de
Justiça. [sobre o REsp 110.257-8 acesso em 26/10/2022]

7º CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” – ESPECIALIZAÇÃO


EM DIREITO DO CONSUMIDOR

Módulo V – Tutelas no CDC – Administrativa e Penal

Tema 02 – O PROCESSO ADMINISTRATIVO E O DIREITO DO


CONSUMIDOR. A instauração do procedimento administrativo. A
Defesa do Fornecedor no âmbito administrativo. As Sanções
Administrativas. Interpretação do artigo 56 do CDC. A discussão em
Juízo das penalidades administrativas. A atuação do PROCON.

Palestrante – Des. Tasso Duarte de Melo

Palestra: 11/10/2022
Seminário: 13/10/2022
QUESTÕES:

6. Como deve ser a graduação da multa (art. 57 CDC) (fundamentar). A autoridade


administrativa pode determinar a substituição do produto ou a devolução do valor
pago, corrigido monetariamente?

[ artigo.. ] “De acordo com as características do evento infracional, pode a


autoridade competente
aplicar apenas uma única sanção administrativa, ou outras que conceber
cabíveis. A razoabilidade e racionalidade são fatores que servirão como bússola
para a escolha da sanção que incidirá no caso concreto. A finalidade principal das
sanções administrativas não é gerar benefício direto para o consumidor lesado
com a ação ou a omissão do fornecedor, caracterizando a violação das normas
vigentes, mas sim, com base na tábua axiológica vigente, proteger os valores
essenciais que imperam na sociedade35. Como bem pondera Zelmo Denari, “Esse
microssistema normativo é que introduz no ordenamento jurídico pátrio os “deveres
administrativos” dos fornecedores e que, “violados, ensejam a aplicação
das correspondentes sanções administrativas”.36

Classificam-se as sanções administrativas em pecuniárias, materiais ou


procedimentais, sendo que determinados doutrinadores preferem conceituar estas
duas últimas como objetivas ou subjetivas37. As sanções pecuniárias tem por objeto
o pagamento de uma multa por parte do fornecedor que tenha desrespeitado as
normas protetivas da categoria consumerista. Denominam-se sanções materiais
aquelas que estão diretamente vinculadas ao bem de consumo e, dada a
impropriedade
detectada, atingem o produto em si, tendo a matéria e a essência deste
contribuído para a incidência da pena. As sanções procedimentais estão ligadas
ao desenvolvimento da atividade pelos fornecedores e os efeitos ecoam, não
diretamente nos bens disponibilizados, mas sim na possibilidade de as empresas
continuarem ou não funcionando no setor econômico.

O Código de Proteção e Defesa do Consumidor, no art. 56, elenca as seguintes


sanções materiais: a) apreensão do produto; b) inutilização do bem; c)
cassação do seu registro junto ao órgão competente; d) proibição de fabricação
do mesmo; d) suspensão de fornecimento de produtos ou serviços. Quanto às
penalidades procedimentais, encontram-se previstas: a) suspensão temporária de
atividade; b) revogação de concessão ou permissão de uso; c) cassação de licença do
estabelecimento ou de atividade; d) interdição, total ou parcial, de
estabelecimento,
de obra ou de atividade; e) intervenção administrativa; e f) imposição de
contrapropaganda

Para a gradação da pena de multa, o art. 57 do CDC enumera três fatores,


que servirão de guia na determinação do quantum da sanção: a) a gravidade da
infração38, b) a vantagem auferida e c) a condição econômica do fornecedor. Estes
três elementos não solucionam a precisa aplicação da multa, elucidando Bruno
Miragem que “Na prática, contudo, os órgãos de defesa do consumidor enfrentam
dificuldades na aplicação segura dos critérios indicados na lei, devidamente
embasados em dados técnicos”39. Por outro lado, o multicitado Decreto, no art.
28, não acrescenta orientações para auxiliar os órgãos fiscalizadoras na definição
do montante correspondente a multa, apenas trazendo a extensão do dano como
mais um dado a ser observado.

Existem limites mínimo e máximo fixados no parágrafo único do art. 57 do


CDC, não podendo ser um montante nunca inferior a duzentas e não superior a
três milhões de vezes o valor da Unidade Fiscal de Referência – UFIR, ou índice
equivalente que venha substituí-lo. Tal Unidade foi extinta pelo art. 29, parágrafo
3º, da Medida Provisória 1.973-67, de 26.10.2000, atualmente, convertida na Lei
10.522/02 e, assim sendo, os órgãos competentes devem utilizar a moeda vigente
como parâmetro40. A delimitação de pontos monetários extremos (mínimo e
máximo),
que serão transpostos para o Real, não soluciona os percalços que dificultam
a atuação dos órgãos públicos.

Permeando a discricionariedade da autoridade administrativa, estão aqueles


critérios e que precisam ser interpretados com esteio em uma hermenêutica crítica
e responsável – a contrario sensu, dificilmente o fornecedor manter-se-á silente e
levará a questão para o Poder Judiciário. Reitera-se a observação de que as
penalidades
administrativas devem ser empregadas para a efetiva implementação dasmetas
políticas protetivas dos consumidores e não de modo meramente simbólico.
Aplicando multas exíguas, os órgãos não estarão colaborando com o caráter
pedagógico do instituto, valendo-se de valores exorbitantes, a problemática cairá
nas malhas judiciárias. Como, então, equacionar e avaliar os fatores orientadores?

A infração cometida pelo fornecedor precisa ser analisada sob todos os


enfoques possíveis, não ficando o exame adstrito tão-somente à sua gravidade,
destacando-se a natureza, o bem jurídico atingido, e a extensão do dano. Cada
prática abusiva apresenta nuances diferenciadas e que devem ser sopesadas pela
autoridade administrativa. Quando, v.g., um fornecedor coloca no mercado um
medicamento ou um gênero alimentício, fora dos padrões técnicos ou sanitários
vigentes, são constatados elementos objetivos que caracterizam a imediata gravidade
da infração. Quanto à natureza do ato, além de ser infração administrativa,
respinga na esfera penal – o que exigirá uma apenação mais forte. Há uma violação
ao bem jurídico maior – a vida, envolvendo a saúde e a segurança do consumidor.
O tipo de medicamento e a sua finalidade permitirão uma noção da amplitude das
lesões materiais e morais causadas em prejuízo dos consumidores.

É possível auferir, ao menos em média, a vantagem obtida pelo fornecedor


de produtos e serviços. No caso, acima exemplificado, a autoridade administrativa
poderá verificar, através dados contábeis, quantos medicamentos foram vendidos,
o preço médio do mercado, etc. É lógico que a busca por tais informações exigirá
perspicácia, esforços e tempo por parte dos agentes públicos, porém, a fim de se
fazer um bom trabalho, as dificuldades não podem servir de entraves absolutos para
que os lucros e dividendos conseguidos pelo fornecedor venham à tona. Dados do
registro da Empresa junto aos órgãos públicos e às autarquias reguladoras podem
ser objeto de solicitação pela autoridade administrativa.

Quanto ao porte econômico do fornecedor, vários elementos informativos


podem ser levantados no procedimento administrativo. Os atos constitutivos da
empresa, a declaração de rendimentos em face do Fisco, o seu registro junto à Junta
Comercial, etc. A própria presença do fornecedor no mercado de consumo é, em
geral, de conhecimento público, a participação no setor econômico, comercial e/ou
industrial revelam indícios da sua capacidade financeira. É possível que, mesmo
sem documentos específicos, o órgão competente já tenha uma prévia noção sobre
a estrutura econômico-financeira do fornecedor através dos meios de comunicação
de massa e de como reinam no próprio mercado de consumo”.[migalhas -abril 2021]

7. Como o princípio da proporcionalidade deve atuar na escolha da sanção


administrativa a ser aplicada ao infrator do CDC? (vejam precedentes enviados).

(artigo) “Aplicação de multa abusiva e desproporcional a empresa privada 11 de


dezembro de 2020
Vale destacar, inicialmente, a necessidade de que as multas na esfera consumeristas
sejam exem-plares, de modo a coibir a atuação nociva de empresas perante a
coletividade vulnerável. No entanto, a multa não deve ser tão baixa, a ponto de não
servir como punição e nem inibição da empresa infratora, nem tão alta de modo a não
mais se distinguir entre gradações de gravidade da conduta.
           Em pese as alegações de proporcionalidade e razoabilidade, o Procon: órgão
fiscalizador, que realiza a defesa e proteção do consumidor no Brasil, vem chamando a
atenção do Poder Judiciário diante as inúmeras atuações arbitrárias, com imposições de
penalidades e multas estratosféricas, desarrazoada ao particular (leia-se empresas
privadas), o que não por outro motivo, está sendo passível de controle pela Justiça.
           Nesse sentido, se faz necessário observar que o artigo 57 do Código de Defesa do
Consumidor dispõe 03 (três) parâmetros que devem ser observados para que a multa
administrativa possa ser imposta aos jurisdicionados: a) a gravidade da infração; b) a
vantagem auferida; E c) a condição econômica do infrator. Evidentemente, os critérios
previstos são CUMULATIVOS, de modo de que a não verificação de qualquer um
deles afasta a própria aplicação da penalidade.
           Na grande maioria dos casos analisados, para justificar a imposição de
penalidades exorbitantes, o Procon, em vez de demonstrar concretamente sua
adequação, alega de maneira simplória, no âmbito do processo administrativo, que a
aplicação da multa consistiria em ato discricionário que incidiria, a seu favor, a
presunção de legitimidade de veracidade dos atos administrativos.
           Oportuno dizer, a administração, dentre as possíveis medidas a serem tomadas
para salvaguardar o interesse público, não deve adotar aquela que se mostra mais
gravosa ao particular, quando, por exemplo, existe uma outra solução, menos
onerosa, que de igual forma preserva o interesse público.Isso porque, em agindo
dessa forma, não estaria agindo de maneira razoável e proporcional, o que não deve
acontecer.
           Para se ter noção do tamanho impacto, à título de exemplo, em 2019, o
Procon/SP aplicou R$ 330 milhões de reais em multas. No corrente ano de 2020, os
valores ultrapassam vultosos R$ 500 milhões de reais. Vale dizer, as multas devem ser
aplicadas, porém, jamais devem ser arbitrárias, como sustentado neste artigo. Se
arbitrárias, caberá ao Poder Judiciário realizar o controle de legalidade.
           Nesse sentido, como já decidido pelo Tribunal de Justiça doEstado de São
Paulo, os atos administrativos punitivosnão consistem em atos
discricionários.Ademais, ainda que assim não fosse, discricionariedade, como se
sabe, não se confunde com arbitrariedade:
“            Apelação ação anulatória de auto de infração exarado pelo PROCON e de
cancelamento da multa solução de reclamações por vício em produtos após o prazo de
30(trinta) dias aplicação da penalidade fundada no §1º do art. 18 do
CDC inobservância, contudo, do princípio da PROPORCIONALIDADE na
mensuração do valor da multa, baseada apenas na condição econômica do infrator,
quando deveriam prevalecer os critérios de gravidade da infração e de vantagem
auferida, igualmente relacionados no art. 57 do CDC mantida, no entanto, a aplicação
da multa, limitada a 10% do valor original, RAZOABILIDADE que atende ao padrão
legal sentença reformada em parte. Recurso parcialmente provido.”
(Ap.1015531-62.2014.8.26.0053, Rel. Venício Salles; 12ª Câmara de Direito Público
TJSP; j. 15.06.2016).
           Quanto ao importe das penalidades aplicadas, a jurisprudência do Tribunal de
Justiça de São Paulo é uníssona no sentido de afastar multas confiscatórias que
afrontam os princípios administrativos da razoabilidade e da proporcionalidade
“            Ementa:
             I       Anulatória de auto de infração e da multa PROCON – Sanção decorrente
de valor cobrado por instituição financeira a título de emissão de boleto bancário –
Possibilidade Infração foi verificada.
             (…)
             IV Gradação da multa – O Judiciário pode controlar os atos administrativos
punitivos e reduzir o valor das multas aplicadas, mesmo considerando os conceitos
usados na dicção legal que se referem à gravidade da infração, à vantagem auferida,
à condição econômica do fornecedor do dano causado aos consumidores. Não se
cuida de discricionariedade outorgada ao Órgão Administrativo para que aplique, a
seu talante, a punição desejada dentro das balizas da Lei. O Judiciário pode verificar
e analisar a aplicação da sanção, reconsiderá-la, revê-la e reduzi-la, por não se
cuidar na espécie de discricionariedade, mas aplicação de pena de acordo com os
conceitos indeterminados existentes na norma administrativa, que tem conteúdo
mínimo de discrição, pois os núcleos dos conceitos podem ser aferidos pelo Órgão
Julgador por não se cuidar de ampla liberdade outorgada pela norma ao
administrador público.
             V Sentença de procedência. Recurso parcialmente provido para julgar
procedente em parte a demanda, reduzindo a pena para R$ 80.000,00, atualizados
desde a citação e invertidos o ônus da sucumbência.”(Ap. 0016234-49.2010.8.26.0053,
7ª Dir. Pbl. TJSP., Rel. Des. Guerrieri Rezende, j. 10.10.2011).
           E mais, quando a extensão do dano social é irrelevante e quando há ausência de
prejuízo/impacto econômico aos consumidores e a sociedade, que inclusive, tiveram as
reclamações sanadas pela executada, há decisões proferidas pelos Tribunais Superiores
que determinam a redução da aplicação da multa excessiva, quando desproporcional à
gravidade da infração.
           Portanto, quando lavrados os autos de infração e instaurados os processos
administrativos, necessário se faz uma análise perfunctória da infração e por ventura do
título executivo judicial, a fim de que seja sanada eventual nulidade ou excesso na
cobrança, evitando assim, prejuízos e maiores dispêndios do particular. Não é demais
lembrar que as medidas de compliance tornou-se uma obrigação nos assuntos
consumeristas, eis que as empresas devem se adequar às normas dos órgãos de
regulamentação para evitar que a fiscalização administrativa tenha livro aberto para
realizar atuação contra a empresa.
Lucas Nasser de Mello [https://www.otonnasser.adv.br/aplicacao-de-multa-abusiva-e-desproporcional-a-
empresa-privada/] acesso em 26/10/2022]

8. É possível a aplicação no processo administrativo das seguintes figuras: a)


inversão do ônus da prova, b) antecipação de tutela, c) responsabilidade solidária
dos fornecedores, d) desconsideração da personalidade jurídica? [prova]

9. O PROCON pode interpretar cláusulas contratuais para aferir abusividade e


aplicar multa administrativa? Analisar precedentes enviados. [prova]

7º CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” –


ESPECIALIZAÇÃO EM DIREITO DO CONSUMIDOR

Módulo V – Tutelas no CDC – Administrativa e Penal


Tema 03 – CRIMES CONTRA AS RELAÇÕES DE CONSUMO I.
Tipificação. O processo penal para apuração dos crimes
previstos no CDC. A jurisprudência sobre o tema. Parte Geral.

Palestrante – Juíza Márcia Helena Bosch

Palestra: 18/10/2022
Seminário: 20/10/2022

QUESTÕES:

10. Sobre a classificação jurídica dos crimes contra as relações de consumo,


responda: a) qual o bem jurídico tutelado b) quem é sujeito ativo e
passivo e c) qual a natureza jurídica destes crimes.
[artigo] Responsabilidades e efeitos Penais dos Crimes nas Relações de Consumo -
ResumoO presente artigo tem como objetivo apresentar as responsabilidades e efeitos
penais dos crimes nas relações de consumo na Constituição brasileira, nas leis
infraconstitucionais, nas atuações do Poder Judiciário, os direitos dos consumidores e
as relações de consumo. A proteção do consumidor nos direitos fundamentais e a
punibilidade do agente transgressor. Introdução>O estudo busca aprofundar-se e
discutir as principais tipicidades manifestadas na legislação brasileira que protege o
consumidor e pune o responsável infringente. A proteção do bem tutelado
“consumidor” pelo Poder Judiciário, disciplinando deveres e obrigações nas relações
de consumo junto a produtores e fornecedores. A evolução do consumismo se faz
necessárias normas protecionistas para preservação de um mercado em crescimento
expansionista.1 - Proteção da Relação de Consumo no Ordenamento
JurídicoA Constituição da República de 1988, desde a sua promulgação previa a
defesa do consumidor como uma de suas cláusulas pétreas, em decorrência dos
direitos e garantias fundamentais de todo cidadão. Dando assim relevância a proteção
ao consumidor, ensejando a relação de consumo protegida diretamente.
Indaga-se se a tutela na relação de consumo pela lei fundamental inclui ou não a
necessidade da intervenção do Direito Penal, pois no que respeita ao consumidor o
constituinte brasileiro não o fez constar no texto magno cláusula expressa de
criminalização.[1]

Isto porque, a defesa do consumidor foi elevada a categoria de direito fundamental e,


como tal, não há de se lhe negar tutela penal.[2] Desta forma, a defesa do consumidor
elencada no artigo 5º, inc. XXXII, da Lei Fundamental, há de se incluir sim a tutela
penal. Pedro Ivo Andrade apresenta que:

Mister se faz, então que o Estado, concedido como Estado de Direito Democrático e
Social, passe a tutelar penalmente o consumidor - protegendo o bem jurídico em apreço
– a fim de assegurar-lhe, enquanto pessoa, existência digna, segundo os ditames da
justiça social, em cumprimento ao mandamento constitucional.[3]

Deve-se entender que o bem jurídico protegido não é o consumidor, mas a relação de
consumo. Essas relações dar-se-ão por meio do liame estabelecido entre fornecedor e
consumidor, trazendo-lhe garantias fundamentais e segurança no que tange a relação de
consumo, para isso a penalidade deve existir ser aplicada e reconhecida como forma de
responsabilizar o fornecedor para manter a ordem econômica.

Estes bens jurídicos expressam certa relevância social, na medida em que não atinge o
individuo de forma isolada, mas a universalidade deste. Portanto, em razão desta
proteção difusa ou meta individual que se exige a proteção integral do consumidor.
No ordenamento jurídico pátrio, não apenas o Código de Defesa do Consumidor, como
também em legislação esparsa é possível verificar a proteção do consumidor no que diz
respeito à infração. O Código de Defesa do Consumidor, por exemplo, significou um
indiscutível avanço, colocando o Brasil num lugar de destaque entre os países que
legislaram sobre a matéria, sendo o primeiro país no mundo a aprovar o Código de
Defesa do Consumidor, [4] estabelecendo maior proteção ao cidadão, vítima de abusos
decorrentes da relação do consumo.

Os crimes capitulados no artigo 63 a 74 do Código de Defesa do


Consumidor caracterizam-se um instrumento de proteção ao consumidor contra estes
abusos do poder econômico. Tais crimes garantem a obrigação do fornecedor a
desenvolver as melhores formas de viabilizações destes produtos e mercadorias, visando
a satisfação do bem comum.

2 - Dos Crimes da Lei nº 8.137/1990

A Lei 8.137 de 27 de dezembro de 1990 passou a vigorar em 28 de dezembro deste


mesmo ano, na data de sua publicação. Esta Lei teve origem de um Projeto de Lei nº
4.788-A de 1990, que tramitava na Câmara Federal.

A legislação em apreço dividiu os crimes nela tratados em II capítulos, o I- tratando dos


crimes contra a ordem tributária; no II- os crimes econômicos e contra a relação de
consumo, este último definido no artigo 7º, que é o objeto a ser apresentado.

O legislador ao aprovar esta Lei colaborou significativamente para a legislação penal


em matéria de crimes que estão relacionados ao consumidor, pois o Código de Defesa
do Consumidor, a Lei 1.521/51 e o Código Penal, era ainda insuficiente para efetiva
aplicação da proteção da relação de consumo.
Deste modo, o artigo 7º da Lei deve ser entendido como um acréscimo aos crimes
elencados no Código de Defesa do Consumidor.

Os crimes definidos no artigo 7º, inciso II, o seu objeto material é a mercadoria; no
inciso III trata os gêneros e mercadorias; o inciso IV, b e c, tratam o bem ou o serviço; o
inciso VII trata o usuário; os incisos VIII e IX estabelecem a matéria prima ou
mercadoria.

Nota-se que o objeto material posto lesado é o que está à disposição, direta ou
indiretamente, ao consumidor. Sendo o sujeito ativo do crime o fornecedor,
comerciante, revendedor, distribuidor e fabricante. Todos de alguma forma serão
responsabilizados na medida de sua culpabilidade. Já o sujeito passivo é a coletividade
de consumidores.

As sanções penais para os crimes contra as relações de consumo definidos em seus nove
incisos, prevê alternativamente pena de detenção de 2 a 5 anos, ou multa. Para a forma
culposa prevê apenas para os crimes de que tratam os incisos II, III e IX, tendo a pena
reduzida de um terço ou a de metade a quinta parte.

A análise da pena privativa de liberdade cominada no artigo 7º (detenção de 2 a 5 anos)


demonstra que é inadequada a cominação de pena de detenção em patamares tão
elevados, o que normalmente é reservado para a pena de reclusão, está sendo na maior
gravidade, e a detenção reservada para as infrações de menor gravidade.[5]

Pois, comparando-se aos delitos tutelados no Código Penal há poucos crimes que tem
penas de detenção superior a um ano. E os crimes definidos no Código de Defesa do
Consumidor, possuem penas máximas iguais ou inferiores a dois anos de detenção.
Verificando-se assim uma desproporcionalidade no que tange a penalidade aplicada na
relação de consumo na Lei 8.137/90.
Existem circunstâncias praticadas nos crimes titulados nos incisos do artigo 7º que
podem agravar de 1/3 até a metade as penas. Isto posta quando ocasionar grave dano à
coletividade; ser o crime cometido por servidor público no exercício de suas funções;
ser o crime praticado em relação à prestação de serviços ou ao comércio de bens à vida
ou à saúde.

3 - Normas Penais no Código de Defesa do Consumidor

No início da década de noventa, houve um forte crescimento do mercado, motivado pela


abertura ao comércio internacional – o do governo Collor – e por consequente de uma
legislação individualizada que previa condutas criminais envolvendo as relações de
consumo.

A Lei nº 8.078/1990 abre as portas para o Poder Judiciário punir as arbitrariedades


praticadas por produtores e fornecedores viciados por uma ditadura de administração
passadas. Antes da edição da referida lei, as normas penais que protegiam o consumidor
como destinatário final estavam previstas no Código Penal e algumas leis como a Lei de
Economia Popular (Lei nº 1.521/1951), com isso, a promulgação do Código de Defesa
do Consumidor (Lei nº 8.078/1990) trouxe segurança nas relações de fornecimento e
consumo.

A maioria dos crimes previstos no Código de Defesa do Consumidor possui como


sujeito ativo o fornecedor, podendo ser o fabricante, o comerciante, o publicitário e o
prestador de serviços. Como passivo exclusivamente o consumidor final ou na forma
ampla a coletividade de consumidores na situação difusa.
As infrações previstas no Código de Defesa do Consumidor não esgotam os crimes nas
relações de consumo, existindo normas conexas no Código Penal (arts. 171, IV; 172;
173; 175; 177; 267 a 284). Trata-se de um conflito de normas, que se resolve com a
aplicação do princípio da especialidade, sendo, por respeito ao princípio bis in idem,
aplicando somente um dos tipos penais previstos.

Diante das responsabilidades impostas pelo Código de Defesa do Consumidor, os


produtores e fornecedores adquiriram uma nova conduta de relação com o consumidor,
ficando penalmente comprometidos com a competência dos seus serviços e a qualidades
dos produtos ora fabricados, ora comercializados.

Evidente que as normas incriminadoras concederam uma maior qualidade aos produtos
e serviços hoje oferecidos no mercado. A gravidade do erro ocasionado pela ausência de
requisitos exigidos em lei coloca o fabricante-fornecedor em um patamar de risco,
ficando visivelmente comprometido com seus resultados atingidos, tanto civis, como
penais.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Em um curto lapso temporal, podemos observar que os direitos fundamentais


relacionados com o consumo obtiveram uma evolução surpreendente. Há pouco tempo
atrás, os consumidores ficavam obrigados a aceitar o que o mercado oferecia. Gerações
passadas e que presenciam hoje o consumo, podem comparar o enorme contraste que
existia antes das atuais legislações.

É evidente que a realidade presencia, é o consumismo frenético, e diante dos direitos


fundamentais é inevitável uma norma que seja rígida e esteja no elo mais fraco da
corrente, o consumidor, que ao mesmo tempo é o mais disputado na relação de
consumo.
Diante de atos que sempre existiram na ralação humana, fica uma responsabilidade de
expressiva punibilidade. Por mais simples e comum que seja a relação de consumo, em
determinados momentos não se leva em conta a gravidade que tal procedimento pode
gerir. Realmente o negócio empresarial é aquele que assume o risco, e neste caso, é o
risco é penal.

[1] PRADO, Luiz Regis. Crimes contra o ambiente. 2º ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2001, p. 27.

[2] ANDRADE, Pedro Ivo. Crimes contra as Relações de Consumo. Curitiba: Juruá,


2007, p. 89.

[3] Idem; p. 90.

[4] MONTEIRO, Antonio Pinto. O Direito do consumidor em Portugal. Revista


Brasileira de Direito Comparado, nº 17. Rio de Janeiro, 1999, p. 128.

[5] ANDRADE, Pedro Ivo. Crimes contra as Relações de Consumo. Curitiba: Juruá,


2007, p. 127.

Referências

· MACHADO, Marlon Wander: Crimes nas Relações de Consumo; São Paulo – SP;


Editora Madras Ltda.; 2001.

· ANDRADE, Pedro Ivo: Crime Contra as Relacoes de Consumo; Curitiba – PR;


Editora Juruá; 2007.
· CASTELO, Dora Busab / DA MATA, Natália Fernandes Aliende; Manual Dos Crimes
Contra as Relações de Consumo; São Paulo – SP; Imprensa Oficial;1999.

· SOUZA, Rubens Lima de; Código de Defesa do Consumidor Comentado; 2ª Ed.; São


Paulo – SP; Editora Áudio Ltda.; 2011.

· CUNHA, Rogério Sanches; Direito Penal Parte Especial; 3ª Edição; São Paulo – SP;
Editora Revista dos Tribunais Ltda.; 2011.
[ https://mauriciopiresadvogado.jusbrasil.com.br/artigos/167710287/responsabilidades-e-efeitos-penais-
dos-crimes-nas-relacoes-de-consumo#:~:text=A%20maioria%20dos%20crimes%20previstos,de
%20consumidores%20na%20situa%C3%A7%C3%A3o%20difusa.] acesso em 26/10/2022]

11. Pode-se afirmar que com a entrada em vigor do Código de Defesa do


Consumidor (Lei 8.078/90) e da Lei 8.137/90 (crimes contra a ordem
econômica e as relações de consumo), algumas disposições do Código
Penal (crimes de estelionato, fraude no comércio, adulteração de
substância alimentícia ou medicinal, substância avariada etc) e da
legislação penal extravagante (crimes contra a economia popular)
passaram a enfrentar conflito de normas, tornando-se, por fim, superadas
ou desnecessárias?

[artigo] Análise dos dispositivos do Código de Defesa do Consumidor que prevêem

condutas tipificadas no que pertine às relações de consumo.

A atualidade de um tema está diretamente relacionada com o lugar que a coletividade


lhe reserva nas suas relações sociais. O Direito do Consumidor nasce, desenvolve-se e
justifica-se na sociedade de consumo. Regra a produção e a comercialização de
produtos e serviços pelo prisma do consumo. Seu surgimento, com alterações profundas
no Direito tradicional, decorre diretamente da revolução industrial (com produção,
comercialização, consumo, crédito e comunicação em massa), já que esta mudou, por
inteiro, o dia-a-dia dos homens – agora chamados consumidores. A afirmação da
atualidade do Direito do Consumidor não implica dizer que antes de sua formulação não
existissem consumidores ou que estavam eles absolutamente desamparados.

Consumidores sempre existiram. Apenas o Direito, ou melhor, o legislador, não tinha


uma percepção clara de sua moldura, como sujeito diferenciado de categorias
tradicionais (como o comprador e o locatário, por exemplo). Mas mesmo sem lhe dar
certidão de batismo, o ordenamento jurídico clássico possuía certos mecanismos de
tutela do consumidor.

O direito privado clássico – e também o direito público – como se sabe, por não estar
preparado para regrar relações de produção e consumo de massa, dava ao consumidor
um mero esboço de proteção contra os abusos praticados no mercado. Em decorrência
dessa inadequação, particularmente do direito civil, ao consumidor que desejasse se
proteger das condutas dos fornecedores restava, freqüentemente, apenas o recurso ao
direito penal tradicional, igualmente moldado para reger relações pessoais e não
relações de massa.

O Código de Defesa do Consumidor, instituído pela Lei nº 8.078/90, para a


implementação dos direitos e deveres que estabelece, criou um sistema de
responsabilidade de natureza civil, administrativa e penal. Nos seus artigos 63 a 74
criminaliza doze condutas, catalogando-as como infrações penais contra o consumidor.

Cuidaremos, neste trabalho, do capítulo do Código de Defesa do Consumidor (CDC)


que versa sobre as infrações penais contra o consumidor. Estas se encontram não só no
presente capítulo; outras há descritas no CP e em leis especiais. E.g.: no CP, os delitos
dos arts. 171, IV, 172, 173, 175, 177; contra a saúde pública – arts. 267 "usque" 284
(excetuado o 279, expressamente revogado). Leis especiais: Lei 1.521, de 26.12.1951 –
Lei de Economia Popular; Lei 7.492, de 16.7.1986 – Crimes contra o sistema financeiro
nacional; Lei 8.137, de 27.12.1990, etc. Concorrendo o CP e a lei especial, regrando o
mesmo fato (pluralidade de normas) o conflito aparente é dirimido segundo o princípio
da especialidade: A lei especial derroga a lei geral. Observado outro princípio – ne bis in
idem – somente uma das normas prevalece. Destarte, as normas do CPC prevalecerão
sobre as do CP, consoante a regra por este contemplada no art. 12. Tratemos agora dos
arts. Do CDC (lei 8.078/90) referentes às infrações penais.

Art. 61. Constituem crimes contra as relações de consumo previstas neste Código, sem
prejuízo do disposto no Código Penal e leis especiais, as condutas tipificadas nos artigos
seguintes.

Relações de consumo são as que se estabelecem entre "fornecedor" e o "consumidor",


tendo por objeto os "produtos" e "serviços". Entende-se por "consumidores" todos que
compram ou utilizam produtos e serviços para uso próprio; "fornecedores" são empresas
ou pessoas que produzem, montam, criam constroem, transformam, importam,
exportam, distribuem ou vendem produtos ou serviços; "produto" é qualquer bem móvel
(carro, sofá, etc.) ou imóvel (casa, terreno, etc.) e "serviço" é qualquer trabalho prestado
mediante pagamento, inclusive serviços públicos, bancários, financeiros, de crédito e de
seguros.

Esses delitos têm as relações de consumo como objeto principal (imediato). O direito à
vida, à saúde, ao patrimônio, etc., compõe o a sua objetividade jurídica secundária
(mediata), isto é, são tutelados por eles de forma indireta ou reflexa. Têm, ainda, como
elemento subjetivo o dolo de perigo (vontade livremente dirigida no sentido de expor o
objeto jurídico a perigo de dano). É admitido o direto e o eventual.
Quase todos os crimes do CDC são de perigo abstrato – 63, §1º, 64, 65, 73 – nos quais
se presume iure et de iure o perigo para o bem jurídico, que emerge da simples
realização da conduta. Com esse entendimento se afina o abalizado Antonio Herman V.
Benjamin, um dos autores do CDC: "As infrações de perigo abstrato – a regra absoluta
nos crimes de consumo próprios – só mediatamente visam resguardar bens jurídicos
individuais e materiais como a vida, o patrimônio e a liberdade, pois, não há dúvida,
protegendo o supra-individual tutelam o individual. A abstração justifica-se, em tais
casos, porque a exigência sistemática de um dano efetivo, ou mesmo de um perigo
concreto, corresponderia, na prática, à impunidade generalizada e à perda da eficácia
preventiva. Ressalte-se, por derradeiro, que o que é abstrato à vista dos bens jurídicos
pessoais é concreto em relação a bens jurídicos coletivos. No direito penal econômico, o
que, dirigido ao patrimônio individual, é perigo abstrato, pode atingir, efetivamente, o
funcionamento do sistema social. Essa maneira de ver as coisas, ampliando o sentido do
bem jurídico protegido, permite classificar os delitos contra as relações de consumo
como de perigo concreto ou de dano, relativamente à própria integridade da relação de
consumo. Dissertando sobre "crime de perigo", registra o renomado prof. Walter
Coelho: "O Direito Penal moderno é avesso a presunções absolutas, que implicariam em
abusivas criminalizações, a juízo arbitrário do legislador, em prejuízo da seriedade do
direito repressivo. Em verdade, ou o perigo é efetivo e concreto, e, como tal, precisa ser
demonstrado, ou é em abstrato, decorrendo sempre de uma presunção relativa, mas
nunca absoluta. A questão vincula-se com a essência do próprio crime, ou seja, sua
ilicitude substancialmente material e não meramente formal. Assim sendo, o dano
potencial, ainda que decorrente de perigo abstrato ou presumido, ensejará sempre o
eventual questionamento, no caso concreto, de sua efetiva ocorrência, pois a presunção,
em tal matéria, só é justa e aceitável como juris tantum."

Por isso, nos crimes contra o consumidor, o perigo parece abstrato somente se é referido
a interesses patrimoniais individuais, enquanto que, se se tomam em consideração os
aspectos supra-individuais do bem jurídico, estes são lesionados (e não simplesmente
postos em perigo) pelo delito.

Art. 62. VETADO

Art. 63. Omitir dizeres ou sinais ou sinais ostensivos sobre a nocividade ou


periculosidade de produtos, nas embalagens, nos invólucros, recipientes ou publicidade:

Pena – Detenção de seis meses a dois anos e multa.

§ 1º - Incorrerá nas mesmas penas quem deixar de alertar, mediante recomendações


escritas ostensivas, sobre a periculosidade do serviço a ser prestado.

§ 2º - Se o crime é culposo:

Pena – Detenção de um a seis meses ou multa.

O fornecedor de produtos e serviços perigosos ou nocivos à saúde ou segurança, a teor


do art. 9º, está obrigado a informar (antes do ingresso no mercado – v. art. 10), de
maneira ostensiva e adequada (v. art. 31), a respeito de
sua nocividade ou periculosidade. Estes são elementos normativos do tipo, que hão de
ser verificados pelo juiz cognitivamente. Nocivo é o que prejudica, faz mal, causa dano
(efetivo). Nocividade é qualidade do que é nocivo. Periculosidade – conjunto de
circunstâncias que indicam um mal, dano, para alguém ou alguma coisa (provável). O
crime somente se caracterizará quando a omissão puder repercutir na esfera de bens
jurídicos fundamentais do consumidor: vida, saúde, integridade corporal, liberdade,
segurança e patrimônio. Fora de tais situações, nas quais haja probabilidade e não mera
possibilidade de dano, não há de se falar em adequação típica.

Tem como elementos subjetivos o dolo e a culpa, nos tipos previstos no "caput" do
artigo e no § 1º.

Cuidando-se de crime omissivo puro, a forma tentada é inadmissível.

Art. 64. Deixar de comunicar à autoridade competente e aos consumidores a nocividade


ou periculosidade de produtos cujo conhecimento seja posterior à sua colocação no
mercado:

Pena – Detenção de seis meses a dois anos e multa.

Parágrafo único – Incorrerá nas mesmas penas quem deixar de retirar do mercado,
imediatamente quando determinado pela autoridade competente, os produtos nocivos ou
perigosos, na forma deste artigo.

É o denominado "crime de omissão de informações sobre riscos conhecidos


posteriormente à introdução no mercado."

A exigência é no sentido da dúplice comunicação: à autoridade e aos consumidores.


Alguns juristas, dentre eles Antonio Herman V. Benjamin, são da opinião de que, na
falta de uma delas, o crime se consuma. Outros esposam de entendimento diverso, como
ensina o prof. Paulo José da Costa Jr.: "Se o agente, embora não comunicando o fato à
autoridade, venha fazê-lo aos consumidores, não se perfaz o crime."

A forma culposa não foi contemplada neste dispositivo.

Trata-se de crime omissivo puro, uma vez que a conduta é o "não fazer", desatendendo
ao comando da previsão normativa.

A tentativa é inadmissível.

A determinação de retirada do produto ("recall"), prevista no parágrafo único, é a que


emana de autoridade competente. Esse dever tem que ser cumprido com urgência.

Art. 65. Executar serviço de alto grau de periculosidade, contrariando determinação de


autoridade competente:
Pena – Detenção de seis meses a dois anos e multa.

Parágrafo único – As penas deste artigo são aplicáveis sem prejuízo das correspondentes
à lesão corporal e à morte.

Trata-se de norma penal em branco, a exigir complementação por lei ou regulamento.


Em razão da imprecisão do termo "alto grau de periculosidade" recebeu severas críticas,
por contrastar com o mandamento com o mandamento constitucional inscrito no art. 5º,
XXXIX-CF/88.

A lição do prof. Paulo José da Costa Jr.: "A única maneira de não atentar contra o
preceito constitucional da certeza do direito é entender como dotado de "alto grau de
periculosidade", "aquele serviço cuja execução contrarie ordem expressa de autoridade
competente." O prof. Alberto Zacharias Toron, a seu turno, aponta a ambigüidade: "Pelo
teor do preceito não se sabe se o referido "alto grau de periculosidade" está ligado à
proteção da pessoa que executa o serviço, à do transeunte que passa pela via, ou à do
futuro adquirente do serviço ou produto entregue." E acrescenta: "Mais grave, porém, é
que pela sua redação cria-se a possibilidade de se desrespeitar a determinação legal. É
que se reprova unicamente a contrariedade à determinação da autoridade competente.
Paradoxalmente, pode-se o mais (desrespeitar a determinação legal) e não o menos
(desrespeitar o comando da autoridade).

O elemento subjetivo é o dolo, não tendo sido a forma culposa prevista pelo legislador

O crime é de perigo presumido, consumando-se pela simples execução do serviço,


prescindindo da efetivação de perigo ou dano.

A interrupção da execução possibilita, apesar de difícil caracterização.

Não obstante as restrições ("falta de técnica legislativa a partir da própria redação") e à


afronta ao princípio da absorção e da previsão do art. 70 do CP, sinalizada pelo prof.
Toron, o parágrafo único insere a regra do concurso material (art. 69 do CP) com
aplicação cumulativa das penas (às cominadas pela morte ou lesão corporal somam-se
as previstas no artigo sob exame).

Art. 66. Fazer afirmação falsa ou enganosa, ou omitir informação relevante sobre a
natureza, característica, qualidade, quantidade, segurança, desempenho, durabilidade,
preço ou garantia de produtos ou serviços:

Pena – Detenção de três meses a um ano de multa.

§ 1º - Incorrerá nas mesmas penas quem patrocinar a oferta.

§ 2º - Se o crime é culposo:

Pena – Detenção de um a seis meses ou multa.

A informação adequada é um direito básico do consumidor. Segundo Luc Bihl, grande


penalista francês, "só um consumidor completamente informado pode contratar, em
pleno conhecimento de causa, com os fornecedores e desempenhar o papel que deve ser
o seu, o de parceiro econômico."

A redação do art. desatende à técnica legislativa, no sentir de Manoel Pedro Pimentel,


vez que, inexistindo a ressalva, não se pode exercitar a interpretação extensiva, sob pena
de ferir-se o princípio da reserva legal. À censura adere Eduardo Arruda Alvim. É
repelida, contudo por Antonio Herman V. Benjamin, para quem não se trata de dicção
taxativa, mas de elementos normativos do tipo, amplos e flexíveis, suficientes para a
adequação típica.

Em confronto com os artigos subseqüentes (69 "usque" 69), o artigo de que se trata é
residual, na afirmação do prof. Benjamin "tudo que não for
considerado marketing publicitário encaixa-se no art. 66". No que respeita ao crime
comissivo (fazer afirmação falsa ou enganosa), registre-se o reparo do prof. Manoel
Pedro: é de caráter formal, exigindo para a adequação o dolo. Conseqüentemente, a essa
modalidade de conduta inaplicável o § 2º (forma culposa). Essa posição está em
desacordo com a doutrina dominante no direito comparado, segundo A. H. V. Benjamin,
e também o magistério de Eduardo Arruda Alvim não vislumbra incoveniência na
aceitação do binômio dolo-culpa.

Vale salientar, por oportuno, que a responsabilidade criminal "in casu", atinge também o
dono do jornal, da rádio ou da emissora de televisão, posto que o CDC, no seu art. 75,
dispõe que, quem, de qualquer forma, concorrer para os crimes nele referidos, incide
nas penas a esses cominadas na medida de sua culpabilidade, bem como o diretor,
administrador ou gerente da pessoa jurídica que promover, permitir ou por qualquer
modo aprovar o fornecimento, oferta, exposição à venda ou manutenção em depósito de
produtos ou oferta e prestação de serviços nas condições legalmente proibidas.

Tem-se, aí, o princípio da solidariedade na persecução da responsabilidade criminal dos


infratores da lei de proteção ao consumidor.

Devem os órgãos de imprensa em geral buscar soluções internas para impedir, na


medida do possível, a prática de crimes contra os consumidores, a eles assegurando boa
informação e inibindo a ação criminosa dos delinqüentes organizados em empresas de
fachada.

É um crime de ação múltipla.

A espécie comissiva está caracterizada (na oferta) de afirmação falsa ou enganosa; a


omissiva (na oferta) de informações relevantes sobre a natureza, característica,
qualidade, quantidade, segurança, desempenho, durabilidade, preço ou garantia de
produtos ou serviços. A forma comissiva admite tentativa; a omissiva não comporta a
tentativa.

Art. 67. Fazer ou promover publicidade que sabe ou deveria saber ser enganosa ou
abusiva:
Pena – Detenção de três meses a um ano e multa.

Parágrafo único - (VETADO)

Segundo A. V. H. Benjamin, "a garantia de informação plena do consumidor, tanto no


seu aspecto sanitário quanto no econômico, funciona em duas vias. Primeiro, o direito
do consumidor busca assegurar que certas informações negativas (a "má informação",
porque inexata – digo algo que não é – como na publicidade enganosa) não sejam
utilizadas. Em segundo lugar, procura garantir que certas informações positivas (deixo
de dizer algo que é, como, por exemplo, alertar sobre os riscos do produto ou serviço)
sejam efetivamente passadas ao consumidor".

A CF, em vários dispositivos, fez engajar os meios de comunicação nas políticas


públicas de defesa dos direitos difusos e coletivos da sociedade (art. 5º, XIV; 221, I e IV,
dentre outros).

É inegável, portanto, a responsabilidade dos órgãos de imprensa em geral com a


informação clara, precisa, legítima e lícita a respeito desses direitos, dentre os quais
ressalta o direito do consumidor.

Trata-se de norma penal em branco, completando-se com o que dispõem os §§ 1º e 2º,


do art. 37, transcritos a seguir:

Art. 37. É proibida toda publicidade enganosa ou abusiva.

§ 1º. É enganosa qualquer modalidade de informação ou comunicação de caráter


publicitário, inteira ou parcialmente falsa, ou, por qualquer outro modo, mesmo por
omissão, capaz de induzir em erro o consumidor a respeito da natureza, características,
qualidade, quantidade, propriedades, origem, preço e quaisquer outros dados sobre
produtos e serviços.

§ 2º. É abusiva, dentre outras, a publicidade discriminatória de qualquer natureza, a


que incite à violência, explore o medo ou a superstição, se aproveite da deficiência de
julgamento e experiência da criança, desrespeita valores ambientais, ou que seja capaz
de induzir o consumidor a se comportar de forma prejudicial ou perigosa à sua saúde
ou segurança.

Cuida-se, na figura em destaque, de criminalização de conduta de marketing, de acordo


com a lição ministrada por A. H. V. Benjamin: "Marketing equiparando-se à oferta ou à
informação" (acepção ampla). Didaticamente, explana o autorizado mestre: "Marketing,
então, seria qualquer modalidade de informação ou oferta associada à circulação de
bensde consumo, ou seja, produtos ou serviços". Assim, distinge: marketing não
publicitário (v. art. 66) e marketing publicitário (arts. 67, 68 e 69).

Dentre os elementos subjetivos, encontram-se o dolo direto, extraído da expressão


"sabe", e o eventual, da expressão "deveria saber (ser enganosa ou abusiva)", segundo
entendimento de Damásio E. de Jesus, Eduardo Arruda Alvim, Marco Antônio Zanellato
e José Geraldo Brito Filomeno.
Na locução "deveria saber" não se inclui, segundo referidos autores, a modalidade
culposa. O legislador não a tornou expressa; o crime culposo é sempre previsto em tipo
autônomo; se aceita, a pena abstrata seria a mesma para a espécie dolosa e culposa; não
caberia a quantificação pelo juiz, pois dolo e culpa estão incorporados no tipo, não na
culpabilidade. Em sentido contrário, autores de tomo admitem a composição mista:
"compreende tanto o dolo como a culpa chamada inconsciente ou sem previsão. A culpa
é extraída da expressão "que deveria saber ser enganosa ou abusiva". Neste caso, o
agente não tinha o conhecimento prévio do caráter fraudulento ou irregular da
publicidade. Porém, o seu desconhecimento decorre da violação do dever de cuidado
objetivo exigível diante das circunstâncias ou do caso concreto. O sujeito comporta-se,
então, de forma imprudente, negligente ou imperita, causando o resultado (perigo de
dano)" é o ensinamento de René Ariel Dotti.

Aceitando a forma culposa, assinala o prof. A. H. V. Benjamin que o legislador valeu-se


de critérios de política criminal no que respeita à apenação idêntica e sendo esse seu
desígnio (nivelamento do dolo e da culpa), "desnecessário prever, em parágrafo
autônomo a figura culposa, para, em seguida, dar-lhe o mesmo sancionamento."

É crime formal, que se consuma com a mera conduta típica, prescindindo de resultado –
é suficiente a "efetiva exposição dos consumidores á mensagem publicitária" (A. H. V.
Benjamin). A publicidade enganosa constitui crime de perigo abstrato, tem-se em vista
uma universalidade indeterminada de consumidores exposta a práticas desleais de
anúncio de produtos e serviços, donde ser despiciendo indagar-se se houve ou não
prejuízo concreto para algum ou alguns deles.

Embora autorizada corrente doutrinária argumente que, no crime do art. 67 do Código


de Defesa do Consumidor, o sujeito ativo é o profissional que faz a publicidade
enganosa ou abusiva, ou o que a promove, ou seja, o responsável pelo veículo de
comunicação, outros autores afirmam, com razão, que o anunciante também pode ser o
agente do mesmo delito.

A respeito da matéria em exame, assim se posicionam Antonio Herman V. Benjamin e


Edney G. Narchi:

"O ato de publicidade tem três sujeitos: o anunciante, a agência e o veículo, este último
também chamado de meio de suporte. O responsável principal, embora não exclusivo, é
o anunciante, já que a aprovação final do anúncio é sua. O direito cria, em relação ao
anunciante, uma obrigação de vigilância, cabendo-lhe controlar, ‘antes de sua difusão,
todo o conteúdo da publicidade, na medida em que é ele o melhor posicionado para
fazê-lo." (A. H. V. Benjamin);

"O agente do crime é o fornecedor, logicamente, pois é quem detém a faculdade de


saber se o seu produto possui as características alegadas publicitariamente. Discute-se se
e quando os publicitários e os veiculadores possam saber ou deveriam saber ser
enganosa a mensagem. Já vimos que a agência de propaganda trabalha por ordem e
conta de seu cliente anunciante; é este que contrata o publicitário, passa-lhe as
informações para que se desenvolva a campanha ou se crie o anúncio e aprova a forma
final apresentada. Nenhum anúncio é veiculado sem esta decisão derradeira do cliente,
sobre a forma, o texto, os veículos escolhidos, tudo enfim." (Edney G. Marchi)
Para caracterização da propaganda enganosa, a publicidade deve ser de tal maneira
maliciosa que induz em erro, ou se aproveite do erro alheio para o fim de injusta
locupletação do agente, sendo o erro aquele sem o qual inexistiria o ato de consumo,
pois relativo às qualidades essenciais do produto ou serviço.

A tentativa é admissível.

Art. 68. Fazer ou promover publicidade que sabe ou deveria saber ser capaz de induzir o
consumidor a se comportar de forma prejudicial ou perigosa à sua saúde ou segurança:

Pena – Detenção de seis meses a dois anos e multa.

Parágrafo único – (VETADO)

Trata-se de tipo especial – crime de publicidade abusiva, atado ao preceito do art. 37, §
2º, tendo em vista a tutela da saúde e segurança do consumidor, que resulta em
cominação de pena mais severa. O agente faz (executa) ou promove (faz por outrem). O
art. 68 ocupa-se da publicidade apta a induzir o consumidor a um comportamento de
forma prejudicial ou perigosa à sua saúde ou segurança. O art. 67, já examinado,
concerne a toda publicidade abusiva, excluída, naturalmente, a de que cuida o tipo
especial (o presente art. 68).

Tem como elemento subjetivo o dolo. A tentativa é admissível.

Cuidando-se de crime de mera conduta ou de perigo presumido, à consumação basta a


publicidade (anúncio) apta a induzir o consumidor a se comportar de forma prejudicial
ou perigosa para a sua saúde ou segurança. Em sentido contrário, a abalizada opinião do
prof. René Ariel Dotti, afirmando que o delito é de perigo concreto e exige efetiva
comprovação.

Art. 69. Deixar de organizar dados fáticos, técnicos e científicos que dão base à
publicidade:

Pena – Detenção de um a seis meses ou multa.

É crime próprio. É só o fornecedor-anunciante, posto que é a ele que se impõe o dever


de arquivar os dados, ou seja, é ele a figura do garante. O publicitário não é agente do
delito, a não ser quando o anúncio seja criado por home agency, isto é, agência de
publicidade do próprio anunciante. (A. H. V. Benjamin)

O elemento subjetivo é o dolo. Não admite tentativa.

É crime instantâneo, omissivo puro. Tratando-se de dever jurídico, na sistemática do


CDC, o crime se consuma com o simples fato das omissão (consistente em não
organizar os dados que irão embasar o anúncio (publicidade).
Art. 70. Empregar, na reparação de produtos, peças ou componentes de reposição
usados, sem autorização do consumidor:

Pena – Detenção de três meses a um ano e multa.

Com a incriminação amplia-se a garantia de informação assegurada ao consumidor


sobre prestação de serviços. Na composição normativa, em boa parte, vê-se incorporado
o art. 21 do CDC. É crime comissivo. "O núcleo da proteção reside no dever de
informar previamente e não na garantia de utilização de peças novas; tanto assim, que
empregada a peça recondicionada com autorização (decorrência da informação) do
consumidor, não há que se falar em crime.", é o que elucida o respeitado A. H. V.
Benjamin. A falta de consentimento (escrito, oral ou implícito) é condictio sine qua
non na composição do tipo: O emprego de peças ou de componentes de reposição
usados, à revelia do consumidor que contratou a prestação do serviço, configura o
delito.

Trata-se de crime de perigo presumido, a prescindir, para sua consumação de prejuízo


ou dano, na abalizada opinião de A. H. V. Benjamin. Na doutrina, a posição é
contestada: René Ariel Dotti e Paulo José da Costa Jr. entendem indispensável o dano
ou prejuízo efetivo.

O elemento subjetivo é o dolo. A tentativa é admissível, na linha de quem aceita o crime


de natureza material. Eduardo Arruda Alvim, embora assinalando que se trata de crime
formal, igualmente, admite a tentativa.

Art. 71. Utilizar, na cobrança de dívidas, de ameaça, coação, constrangimento físico ou


moral, afirmações falsas, incorretas ou enganosas ou de qualquer outro procedimento
que exponha o consumidor, injustificadamente, a ridículo ou interfira com seu trabalho,
descanso ou lazer:

Pena – Detenção de três meses a um ano e multa.

Incorre nas penas do art. 71 o agente que utiliza, em cobrança de dívida,


constrangimento moral, expondo o consumidor, injustificadamente, a ridículo,
ofendendo-o e o ameaçando, sendo irrelevante o fato de a vítima ser inadimplente, vez
que o réu pode recorrer ao judiciário para receber seu crédito, sem proceder a tal
conduta.

De acordo com Antonio H. V. Benjamin, "o dispositivo não protege a liberdade psíquica
e física da pessoa na sua conotação de liberdade de autodeterminação (crime de
constrangimento ilegal, a liberdade individual (crime de ameaça) ou a tranqüilidade das
pessoas (contravenção de perturbação da tranqüilidade0. A tutela é conferida em relação
a um bem jurídico outro, abstrato e autônomo, que é a relação de consumo."

O elemento subjetivo é o dolo.

A tentativa é admissível, exceto no caso de conduta que não pode ser fracionada
(unissubsistente), como na ameaça não escrita.

Art. 72. Impedir ou dificultar o acesso do consumidor às informações que sobre ele
constem em cadastros, banco de dados, fichas e registros:

Pena – Detenção de seis meses a um ano ou multa.

O sujeito ativo, neste crime, diferentemente dos crimes anteriormente examinados, não
é o fornecedor, mas qualquer pessoa que exerça o controle das informações (arquivos).

É o denominado crime de perturbação do acesso aos arquivos de consumo. A


incriminação deriva da previsão constante do art. 43, caput, visando a efetiva satisfação
de direito de acesso às informações que tenham importância, especialmente sob o
aspecto econômico, para o consumidor. A ninguém é lícito desconhecer, na atualidade, a
relevância do crédito, no mercado consumidor, mormente porque as compras a prazo
correspondem a elevado percentual e, de regra, na faixa do consumidor de renda mais
limitada. Fácil, assim, entender que a obstrução ou embaraços que se oponham ao
consumidor, mantendo-o afastado das informações negativas constantes dos cadastros
ou arquivadas nas chamadas entidades protetivas de crédito, muitas vezes falhas,
incompletas ou inverídicas (casos de homônimos etc.), veda-lhe o direito ao crédito.

O tipo é de ação múltipla ou de conteúdo variado.

O elemento subjetivo é o dolo.

A tentativa é inadmissível.

Cuidando-se de crime de mera conduta, o agente impedindo ou dificultando o acesso do


consumidor às informações já integra o tipo, prescindindo de resultado de dano.
Entendendo que o crime é de perigo concreto, "cuja possibilidade de lesão deve ser
demonstrada, caso a caso", anota-se a valiosa opinião do prof. René Ariel Dotti.

Art. 73. Deixar de corrigir imediatamente informação sobre o consumidor constante de


cadastro, banco de dados, fichas ou registros que sabe ou deveria saber inexata:

Pena – Detenção de um a seis meses ou multa.

Aqui, o sujeito ativo é a pessoa a quem incumbe (dever jurídico) realizar a correção –
usualmente, o arquivista.

No artigo precedente (72), o agente impede ou dificulta o acesso do consumidor às


informações. Agora, no dispositivo que se examina, é incriminada a conduta omissiva –
deixar de fazer – a correção das informações, de modo imediato. Ou mesmo venha a
cumprir esse dever, mas fazendo-o tardiamente.
O crime é omissivo puro.

Admitem-se o dolo direto (caracterizado na conduta enunciada pela expressão "sabe") e


o eventual (deduzida a partir da expressão "deveria saber"). Não é contemplada a
modalidade culposa, sendo esta admitida, contudo, nas doutas opiniões dos profs. Paulo
José da Costa Jr. e Luiz Luisi.

A tentativa é inadmissível.

Para a consumação deste crime, basta a não correção das informações, de acordo com a
previsão legal.

Art. 74. Deixar de entregar ao consumidor o termo de garantia adequadamente


preenchido e com especificação clara de seu conteúdo:

Pena – Detenção de um a seis meses ou multa.

A entrega do termo de garantia regularmente preenchido é dever imposto ao fornecedor.


Há de ser cumprido na ocasião do fornecimento. A "não entrega do termo de garantia
adequadamente preenchido" é aqui criminalizada. Manoel Pedro Pimentel, em estudo a
que nos reportamos nestas notas, propõe a inclusão da ressalva "quando devido",
ponderando que "nem todas as mercadorias vendidas no varejo, ou o serviço prestado,
são de natureza a permitir a emissão de certificado ou á lavratura de termo de garantia."
Já o prof. René Ariel Dotti vai além, por entender dispensável a incriminação.
"Bastavam as medidas de caráter civil e administrativo para responder à situação de
perigo de dano ao patrimônio do consumidor."

O elemento subjetivo é o dolo.

A tentativa é inadmissível.

Basta a conduta prevista no tipo para que o crime seja consumado.

O art. 76 prevê as circunstâncias agravantes dos crimes do CDC, conforme verifica-se a


seguir:

Art. 76. São circunstâncias agravantes dos crimes tipificados neste Código:

serem cometidos em época de grave crise econômica ou por ocasião de calamidade;

ocasionarem grave dano individual ou coletivo;

III. dissimular-se a natureza ilícita do procedimento;

IV. quando cometidos;

por servidor público, ou por pessoa cuja condição econômico-social seja


manifestamente superior à da vítima;

em detrimento de operário ou rurícola; de menor de dezoito anos ou maior de sessenta


anos ou de pessoas portadoras de deficiência mental, interditadas ou não;

V. serem praticados em operações que envolvam alimentos, medicamentos ou quaisquer


outros produtos ou serviços essenciais.

[Renata Cardoso https://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/1531/Crimes-contra-o-consumidor [acesso


em 26/10/2022]

12. Se houver a falsificação de selo ou sinal público (art. 296, § 1.º, inciso II,
do Código Penal) de titularidade de órgão da União, sendo ela usada
para dar a produtos falsificados aparência de regularidade e enganar o
consumidor, a competência para processar a ação penal será da Justiça
Estadual ou da Justiça Federal? (justificar).

[jurisprudência} AGRAVO REGIMENTAL NO CONFLITO NEGATIVO DE


COMPETÊNCIA. PROCESSUAL PENAL. CRIMES CONTRA AS RELAÇÕES
DE CONSUMO E DE FALSIFICAÇÃO DE SELO DE SERVIÇO DE INSPEÇÃO
FEDERAL (S.I.F.), EMITIDO PELO MINISTÉRIO DA AGRICULTURA, PARA
DAR APARÊNCIA DE LEGITIMIDADE A PRODUTOS DE ORIGEM ANIMAL
VENCIDOS. INEXISTÊNCIA DE PREJUÍZO A INTERESSES, SERVIÇOS OU
BENS DA UNIÃO. CONFLITO CONHECIDO PARA DECLARAR A
COMPETÊNCIA DO JUÍZO SUSCITADO. AGRAVO REGIMENTAL
DESPROVIDO.
1. Competente a Justiça Comum Estadual quando a falsificação de selo ou sinal
público (art. 296, § 1.º, inciso II, do Código Penal) é usada para dar a produtos
falsificados aparência de regularidade, em prejuízo das relações de consumo, sem
ofensa a interesses, bens ou serviços da União. Precedentes.
2. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça não contraria os precedentes da
Suprema Corte juntados com o presente agravo regimental, os quais tratam de
hipótese diversa da dos autos, na qual a falsidade foi cometida em detrimento de
empresa pública federal.
3. Agravo regimental desprovido.
(AgRg no CC n. 181.690/PB, relatora Ministra Laurita Vaz, Terceira Seção, julgado
em 9/2/2022, DJe de 15/2/2022.)

A Constituição Federal, em seu artigo 109, inciso IV, delimita a competência da Justiça
federal, afirmando que compete a esta processar e julgar infrações penais que afete
bens, serviços ou interesses da União, de suas entidades autárquicas ou empresas
públicas.
O artigo 4 da lei 5966/73 afirma que o INMETRO é uma autarquia federal. Em razão
dessa definição, quando há uma infração penal que lese bens, serviços ou interesses do
INMETRO, a competência será da Justiça Federal.

A falsificação de selo ou sinal público, previsto no artigo 296 do CP, tem por finalidade
tutelar o bem jurídico fé pública, existente nos selos e sinais de autenticação.
No artigo 296, inciso I do CP, temos a descrição da falsificação de selo ou sinal público
destinado a autenticar atos oficiais da União, de Estado ou de Município, que é o caso
do selo do Inmetro, que têm por finalidade a identificação dos produtos, dos processos e
dos serviços avaliados e atestados no que concerne à fiel observância de requisitos e
especificações contidas em normas e em regulamentos técnicos, de acordo com artigo 6º
da Portaria 274, de 13 de junho de 2014.
Em caso de falsificação, fabricação ou alteração do selo do Inmetro, o agente estará
sujeito as penas do artigo 296 do CP. Poderá também incorrer o agente que fizer uso do
selo.

Caso o agente que fez uso seja o mesmo que falsificou, incorrerá somente neste delito,
pois o uso constitui post factum impunível, e por essa razão resta absorvido,
solucionando-se o conflito aparente de normas com o princípio da consunção[1].
A princípio, vemos que compete a Justiça Federal a falsificação de selo do Inmetro, pois
temos uma falsificação de um selo público destinado a autenticar atos da União,
representada pela autarquia federal. Sendo uma autarquia federal, caberia, a priori, a
Justiça Federal processar e julgar.
Mas realmente há lesão a interesses da Autarquia Federal?

Primeiramente é necessário que seja verificada a destinação da falsificação. Deve-se


perguntar qual o objetivo da falsificação do selo. Caso a falsificação venha a atingir o
interesse da União em ver resguardada a credibilidade de seus atos, emanados do órgão
responsável pela certificação da qualidade ou conformidade dos produtos nacionais, a
competência será da Justiça Federal.
Contudo, caso o interesse atingido seja a de ludibriar os consumidores em adquirir
mercadorias fora das especificações de conformidade ou qualidade exigidas por lei, a
competência será da Justiça Estadual.

É o entendimento do STJ sobre o assunto:


PROCESSUAL PENAL. CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA.
COMERCIALIZAÇÃO DE EXTINTORES DE INCÊNDIO COM SELO DO
INMETRO FALSIFICADO. EVENTUAL PREJUÍZO DO CONSUMIDOR.
AUSÊNCIA DE LESÃO À AUTARQUIA FEDERAL. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA
ESTADUAL. 1. A comercialização de extintores de incêndio com o selo do INMETRO
falsificado implica prejuízo para o consumidor e não causa qualquer lesão a bens ou
interesse da aludida autarquia federal.
2.Competência do Juízo Estadual, o suscitado.
(CC 36.248/PR, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, TERCEIRA SEÇÃO,
julgado em 27/10/2004, DJ 29/11/2004, p. 222)

Estamos tratando, portanto, de interesse dos consumidores em geral, que em nada tem
relação com os interesses da União ou de suas autarquias. Não obstante a falsificação
ocorrer com selos de uma autarquia federal, o interesse atingido não é da autarquia e
sim do consumidor, que acreditou estar adquirindo mercadoria com aparência legal, mas
que, na verdade, em virtude da falsificação, não está nos padrões exigidos por lei. Caso
o objetivo fosse enganar o Inmetro, falsificando com o fim de mostrar ao Inmetro que a
mercadoria já foi verificada, a competência será da Justiça Federal.
Assim, quando se tratar de uma falsificação de selo pertencente a administração pública,
com fim de dar aparência de legalidade, cujo o objetivo é de enganar particular, não
chegando a lesionar interesses, bens ou serviços da União ou de suas autarquias, a
competência será da Justiça Estadual[2].
[1] MASSON, Cleber. (02/2014). Código Penal Comentado, 2ª edição [VitalSource
Bookshelf version].
[2] AGRAVO REGIMENTAL EM CONFLITO DE COMPETÊNCIA. PENAL.
INQUÉRITO POLICIAL. CRIMES DE ESTELIONATO, FORMAÇÃO DE
QUADRILHA, FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO PÚBLICO E USO DE
DOCUMENTO FALSO. FRAUDE CONTRA PARTICULARES. AUSÊNCIA DE
OFENSA A BENS, SERVIÇOS E INTERESSES DA UNIÃO OU DA AUTARQUIA
PREVIDENCIÁRIA (INSS). COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL.
1 A competência da Justiça Federal estabelecida no artigo 109, IV, da Constituição
Federal pressupõe a existência de prejuízo a bens, serviços ou interesses da
União, de suas entidades autárquicas ou empresas públicas. Precedentes da
Terceira Seção.
2 Hipótese em que foi instaurado inquérito policial para apurar a suposta prática
dos crimes de estelionato, formação de quadrilha, falsificação de documento
público e uso de documento falso, todos relacionados à obtenção de empréstimos
fraudulentos em instituições financeiras privadas.
3 Considerando-se que os eventuais delitos não foram cometidos em detrimento de
bens, serviços e interesses da União ou sua entidade autárquica, mas apenas
contra particulares (aposentados e instituições financeiras privadas), não há falar
em competência da Justiça Federal para conhecer do feito.
4 Agravo regimental improvido.
(AgRg no CC 119.079/PE, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, TERCEIRA
SEÇÃO, julgado em 23/05/2012, DJe 01/06/2012) [
David Metzker [https://www.metzkeradvocacia.com/direito-penal/compete-a-justica-estadual-processar-e-
julgar-crime-de-falsificacao-de-selo-do-inmetro-quando-implicar-prejuizo-ao-consumidor/] acesso em
26/10/2022

13. Narrativa do caso a ser examinado: “Do exame dos autos, constata-se
que o réu Ivan foi denunciado pela suposta prática do delito tipificado nos
arts. 7º, VII, da Lei n. 8.137/1990 (por cinco vezes, em continuidade
delitiva) e 288 do Código Penal (em concurso material) por ter, nos
meses de fevereiro a março de 2007, se associado a Carlos e outras
pessoas não identificadas para, mediante afirmações e publicidade
enganosa, induzir a erro consumidores interessados em financiamento
de moradia própria e prometer empréstimo que nunca tencionou efetivar,
tendo recebido de 5 vítimas valores a título de depósito prévio de suposto
contrato de financiamento para a casa própria. O réu Ivan não foi
encontrado, motivo pelo qual foi citado por edital, mas não compareceu
nem constituiu defesa, tendo o processo e a prescrição sido suspensos
nos termos do art. 366 do CPP. Diante da condenação do corréu, o
Ministério Público requereu a decretação da prisão preventiva daquele
réu Ivan.” Esse pedido deve ser deferido? (justificar).

[artigo] “A partir da lei 12.403/11, passou a enxergar com mais clareza a utilização
como ultima ratio da prisão preventiva. A modalidade mais gravosa que o Estado possui
com intuito de garantir a efetividade processual é a prisão preventiva. Em razão de ser
mais gravosa, deve ser utilizada com muita cautela.

A sua utilização demanda extrema necessidade, demonstrada através de provas


existentes nos autos, que, caso não seja decretada, o processo chegará, se chegar, ao seu
fim sem lograr êxito, aumentando as estatísticas de processo sem resolução do mérito,
em razão de atos praticados pelo réu, com fim de obstruir a tramitação processual.

O presente artigo tem o objetivo de trazer a discussão se a prisão preventiva é realmente


necessária e legal quando estamos diante de um caso em que o réu possui localização
não sabida e incerta, sem ter comparecido, pelo menos, uma vez ao processo.

Quando estamos diante de um situação em que o investigado compareceu à delegacia,


está ciente que se encontra na situação de investigado e, após tomar ciência, evade-se do
local que se encontra ou, diante de uma situação em que o réu, após devidamente citado,
evade-se e, doravante, encontra-se em localização incerta e não sabida, temos, nessas
circunstâncias, o fundamento da segurança da aplicação da lei penal, caso venha ser
decretada prisão preventiva.

Importante registrar que os casos acima se tratam de situações em que o réu evadiu-se,
ou seja, ciente de uma situação ameaçadora, escapou furtivamente, tentando evitar um
novo chamamento ao inquérito ou processo. Há uma intenção de não ser localizado, de
evadir-se de uma investigação ou processo. O único intuito da pessoa é fugir e não ser
encontrada, evitando ser processada ou investigada.

Todavia, estamos a tratar da pessoa que não é localizada sem esse objetivo, ou seja,
simplesmente não foi localizado, não havendo provas nos autos que o objetivo em não
ser localizado era, ou é, fugir da persecução penal. 

São duas situações distintas. Em uma temos a intenção em escapar das iras que um
processo penal poderá trazer, e, em outra, uma situação sem a finalidade de fugir da
investigação ou processo.

Havendo a demonstração com provas nos autos que o investigado, ou réu, utilizou da
situação de se encontrar em localização incerta e não sabida para atrapalhar a
efetividade processual, poderá ser utilizada a prisão preventiva, se realmente a medida
for necessária, não sendo, portanto, as medidas alternativas do artigo 319 e 320 do CPP
suficientes para garantir que o processo penal chegará ao seu fim imaculado.
Não havendo provas dessa intenção do agente, não há que se falar em prisão preventiva.
O fato do agente estar em local incerto e não sabido e, com isso, a sua citação ter que
ser realizada por edital, não tem o condão de demonstrar que o agente se furta a
comparecer ao processo ou inquérito.

Vislumbra-se, portanto, que temos o fato do agente ter tomado ciência da persecução
penal e saído do seu local indicado e o fato dele não ter aparecido em nenhum ato da
fase em que se encontra, investigatória ou processual.

No último caso, por óbvio, não tem a demonstração que o objetivo do agente é fugir de
uma aplicação penal. Se a pessoa sequer apareceu no inquérito ou processo, não há que
se falar em intenção de atrapalhar a efetividade processual.

No primeiro caso, necessário se faz avaliar se a mudança de endereço tem a finalidade


de causar um risco a persecução criminal.

De qualquer modo, não se pode confundir evasão com local incerto e não sabido1.

Quando há tentativa de citação e não encontrando o réu, expede-se a citação por edital.
O não comparecimento não deve presumir a fuga do réu.

O ponto crucial está nessa presunção2. Não se deve decretar prisão preventiva
simplesmente por presumir fuga em razão da não localização do agente, sem
demonstrar, através de elementos probatórios, que o fato de não ter sido localizado foi
em razão de querer se evadir.

Cumpre salientar que, caso seja comprovado risco concreto de evasão do agente, o
fundamento a ser utilizado para decretar a prisão preventiva é a segurança da aplicação
da lei penal e não conveniência da instrução criminal.

A conveniência da instrução criminal, como muito bem ensina o Professor Aury Lopes
Junior3, é conceituada dessa forma:

"Aqui, o estado de liberdade do imputado coloca em risco a coleta da prova ou o normal


desenvolvimento do processo, seja porque ele está destruindo documentos ou alterando
o local do crime, seja porque está ameaçando, constrangendo ou subornando
testemunhas, vítimas ou peritos."

Já o insigne Professor Norberto Avena4, nos diz:

"A prisão preventiva decretada para conveniência da instrução criminal é aquela que
visa a impedir que o agente, em liberdade, alicie testemunhas, forje provas, destrua ou
oculte elementos que possam servir de base à futura condenação."

Vejamos que a utilização desse fundamento não presta para o tema em voga, pois não se
admite tal fundamento com objetivo de trazer o agente para o processo, para que seja
produzido prova.

Por outro lado, o fundamento da segurança da aplicação penal, como muito bem
explicitado pelo já citado Professor Norberto Avena (Avena 2014), é definido assim:

"É motivo da prisão preventiva que se fundamenta no receio justificado de que o agente
se afaste do distrito da culpa, impedindo a execução da pena imposta em eventual
sentença condenatória.

Veja-se que a prisão preventiva é medida excepcional e deve ser decretada apenas
quando devidamente amparada pelos requisitos legais, em observância ao princípio
constitucional da presunção de inocência ou da não culpabilidade, sob pena de antecipar
a reprimenda a ser cumprida quando da condenação. Neste contexto, se motivada na
garantia de aplicação da lei penal, não pode ser resultado de ilações abstratas no sentido
de uma possível fuga do imputado, sendo necessária a demonstração da sua real
intenção de se furtar à persecução criminal do Estado, obstaculizando, assim, a
aplicação da lei penal."

Portanto, caso a prisão preventiva venha a ser aplicada por entender que é a medida
necessária em caso de risco de fuga, deve ser utilizado o fundamento da segurança da
aplicação da lei penal.

Não obstante, a simples não localização ou revelia do agente sem a efetiva


demonstração que venha simbolizar evasão, não conduz a decretação da prisão
preventiva5.

__________________________________

1 HABEAS CORPUS. ESTUPRO DE VULNERÁVEL. CITAÇÃO POR EDITAL.


SUSPENSÃO DO PROCESSO E DO PRAZO PRESCRICIONAL. PRESUNÇÃO DE
FUGA. PRISÃO PREVENTIVA. IMPOSSIBILIDADE. FUNDAMENTAÇÃO
INIDÔNEA. ORDEM PARCIALMENTE CONCEDIDA. 1) A prisão preventiva do
paciente teve como fundamento a aplicação da lei penal, conclusão tirada a partir do
fato de que não fora encontrado no endereço constante do mandado de citação. 2) A
constatação de que o réu se encontra em lugar incerto e não sabido não conduz
automaticamente à decretação da prisão preventiva. 3) O perigo para a aplicação da lei
penal não deflui do simples fato de se encontrar o réu em lugar incerto e não sabido.
Não há confundir evasão com não localização. Precedentes do STJ. 4) No caso
concreto, não foram colacionados fundamentos suficientes para dizer que o paciente
tinha conhecimento da existência do processo criminal em seu desfavor e que
deliberadamente deixou de atender ao chamado judicial ou, ainda, que, por conta disso,
empreendeu fuga na tentativa de frustrar a persecução penal. 5) Além disso,
subjetivamente, o sujeito é primário, de bons antecedentes, tendo somente este processo
na sua certidão criminal, demonstrando, a rigor, que as medidas cautelares podem ser
aplicadas em substituição à prisão. 6) Ordem parcialmente concedida.

(TJ-AP - HC: 00022805620188030000 AP, Relator: Desembargador JOAO LAGES,


Data de Julgamento: 27/09/2018, Tribunal)

2 PROCESSUAL PENAL. RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. ART.


168, § 1º, III, DO CÓDIGO PENAL. PRISÃO PREVENTIVA. AUSÊNCIA DE
FUNDAMENTAÇÃO CONCRETA. REVOGAÇÃO. RECURSO PROVIDO. I - A
prisão cautelar deve ser considerada exceção, já que, por meio desta medida, priva-se o
réu de seu jus libertatis antes do pronunciamento condenatório definitivo,
consubstanciado na sentença transitada em julgado. É por isso que tal medida
constritiva só se justifica caso demonstrada sua real indispensabilidade para assegurar a
ordem pública, a instrução criminal ou a aplicação da lei penal, ex vi do artigo 312 do
Código de Processo Penal. Nesse sentido: AgRg no RHC n. 47.220/MG, Quinta Turma,
Rel. Ministra Regina Helena Costa, DJe de 29/8/2014; RHC n. 36.642/RJ, Sexta Turma,
Rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, DJe de 29/8/2014; HC n. 296.276/MG,
Quinta Turma, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizzee, DJe de 27/8/2014; RHC n.
48.014/MG, Sexta Turma, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, DJe de 26/8/2014. II - In
casu, constata-se que a mera citação por edital e a revelia do recorrente ocasionaram,
por si só, a presunção de sua fuga do distrito da culpa. De fato, não foram expostos os
indícios de que o recorrente tinha conhecimento da existência de processo em
andamento em seu desfavor e, dessa, forma, deliberadamente estivesse obstaculizando
seu trâmite. Por conseguinte, a prisão cautelar decretada com base nessa presunção, por
si só, não se justifica para a conveniência da instrução criminal ou garantir a aplicação
da lei penal. E, com efeito, como já assentou o Pretório Excelso a mera citação por
edital não autoriza a presunção de fuga. (HC n. 95674, Segunda Turma, Rel. Min. Eros
Grau, DJe de 18/12/2008). Recurso Provido. (RHC 44.594/SP, Rel. Ministro FELIX
FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 02/10/2014, DJe 03/11/2014)

3 LOPES JUNIOR, Aury. Direito processual penal. 12ª ed. São Paulo: Saraiva, 2015.

4 AVENA, Pâncaro, N. C.  (02/2014). Processo Penal Esquematizado, 6ª edição


[VitalSource Bookshelf version]. 

5 RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. PENAL E PROCESSUAL


PENAL. HOMICÍDIO QUALIFICADO (ART. 121, § 2º, II E IV, C/C O ART. 29 DO
CP). CERTIDÃO DO OFICIAL DE JUSTIÇA ATESTANDO QUE O RÉU NÃO FOI
ENCONTRADO. CITAÇÃO POR EDITAL. AUSÊNCIA DE DEFESA E DE
CONSTITUIÇÃO DE ADVOGADO. SUSPENSÃO DO PROCESSO E DA
PRESCRIÇÃO. PRISÃO PREVENTIVA. IMPOSSIBILIDADE. FUNDAMENTAÇÃO
INIDÔNEA. PARECER ACOLHIDO. 1. A prisão preventiva do recorrente teve como
fundamento a aplicação da lei penal, conclusão tirada a partir do fato de que não fora
encontrado no endereço constante do mandado de citação. 2. A constatação de que o réu
se encontra em lugar incerto e não sabido não conduz automaticamente à decretação da
prisão preventiva (precedentes do STJ e STF). 3. Diz a nossa jurisprudência que toda
prisão imposta ou mantida antes do trânsito em julgado de sentença penal condenatória,
por ser medida de índole excepcional, deve vir sempre baseada em fundamentação
concreta, isto é, em elementos vinculados à realidade. Nem a gravidade abstrata do
delito nem meras conjecturas servem de motivação em casos que tais (precedentes). 4.
Recurso provido para que o recorrente responda ao processo em liberdade, mediante o
compromisso de comparecimento a todos os atos do processo. (RHC 29.603/MS, Rel.
Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em 12/03/2013, DJe
01/07/2014) David Metzker
[https://www.migalhas.com.br/depeso/313885/nao-cabe-prisao-preventiva-apenas-em-virtude-da-revelia-
ou-da-nao-localizacao-do-reu] acesso em 26/10/2022
3) Como se caracteriza a infração prevista no artigo 67 do CDC e
no artigo 7 , inciso VII da Lei n. 8.137/90? O dolo na “esfera civil”
poderá ser o mesmo da “esfera penal” na análise da publicidade
enganosa? Se houver uma decisão judicial transitada em julgado na
esfera civil que qualifique a conduta do fornecedor como
publicidade enganosa, ela vinculará o juiz na “esfera penal”? E o
contrário, vinculará?

[artigo] O CDC possui como regra geral a responsabilidade civil objetiva, que
obriga o
anunciante a cumprir o que prometeu e indenizar todos os danos que o consumidor
tenha
sofrido, sendo desnecessária a culpabilidade do mesmo. Além de descrever também
a
responsabilidade administrativa em seus arts. 56, XII, e 57 C.C. o art. 60, caput e
§1º e a penal
em seus arts. 66 a 69, e inciso VII do art. 7º da Lei 8.137/90.

Por seu poder de alcance massificado e por seu potencial nefasto para a coletividade
nos deteremos na responsabilidade penal que a publicidade suscita. Sobre a
publicidade ilícita
traduzidas como enganosa e abusiva o legislador declarou ser crime punível:
Art. 67. Fazer ou promover publicidade que sabe ou deveria saber ser enganosa ou
abusiva: Pena - Detenção de 3 (três) meses a 1 (um) ano e multa.
Art. 68. Fazer ou promover publicidade que sabe ou deveria saber ser capaz de
induzir o consumidor a se comportar de forma prejudicial ou perigosa a sua saúde
ou
segurança: Pena - Detenção de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos e multa.

Através desses dois artigos o legislador “prevê pena criminal para quem faz ou
promove a publicidade que sabe ou deveria saber ser capaz de induzir o consumidor
a se
comportar de forma prejudicial ou perigosa a sua saúde ou segurança87”.
Já o Art.19 do Dec-lei 2.181/97 penaliza com multa a publicidade enganosa e
abusiva,
e também aquela veiculada de forma que o consumidor seja induzido ao erro, por
não
identificá-la como publicidade, prevalecendo sempre o princípio da identificação da
publicidade.

Sobre a publicidade subliminar o Código Brasileiro de Autorregulamentação


Publicitária (CBAP) condena qualquer uso de técnicas que busquem efeitos
subliminares,
determinando também, com relação à publicidade oculta, que artigo, reportagem,
nota, textolegenda
sejam sempre identificados.

Anderson Donizete dos Santos


[http://www.publicadireito.com.br/artigos/?cod=3a74197713008020] acesso em 26/10/2022

4)  Quais os critérios para distinguir uma conduta de pirâmide


financeira (típica) de uma conduta de marketing multinível (atípica,
em princípio)? Vejam -  STJ, RHC n. 111.187, 5ª T., Min. Rel.
Reynaldo Soares da Fonseca, j. 18.02.2020

[artigo] Superior Tribunal de Justiça – STJ – Recurso Ordinário em Habeas Corpus nº


111187 SP 2019/0103389-3.

(…) Já o esquema de pirâmide, diferencia-se do marketing multinível porque a principal


fonte de lucros é o recrutamento de outros integrantes, atraídos pela promessa de lucro
fácil e rápido. Os participantes, frequentemente, pagam uma taxa para ingressarem na
rede e o valor não se reverte em produtos ou serviços a serem comercializados.
Normalmente, os produtos envolvidos no esquema de pirâmide não possuem valor
comercial ou sequer existem. A remuneração dos participantes advém da indicação de
outras pessoas, sem precisar vender o produto. Os lucros costumam ser altos, mas
apenas para aqueles que primeiro ingressaram no esquema. (…)

Em relação ao funcionamento, as pirâmides financeiras são negócios que consistem na


promessa de ganhos elevados em curto prazo, especialmente para aqueles no começo da
cadeia. O esquema é organizado por meio de vendas, nas quais a pessoa no topo (con
artist ou idealizador) é a primeira a vender bem ou serviço para um número limitado de
participantes que se obrigam a introduzir outras pessoas na pirâmide formando, assim, o
próximo nível.

As estruturas mais simples se concentram apenas na busca por novas adesões sem
vincular a venda de um produto ou serviço para mascarar a pirâmide. Nesses casos, os
investidores são atraídos pela simples promessa de que, ao pagar uma determinada
quantia e aderir ao esquema, poderão recrutar novos membros e receber porcentagens
dos recursos investidos por estas. (…)

Marketing Multinível (MMN) se trata de sistema de distribuição que movimenta bens


e⁄ou serviços do fabricante para o consumidor por meio de rede de
contratados⁄contratantes independentes. Isto é, transforma-se as estruturas hierárquicas
rígidas, típicas de grandes e antigas empresas, em grande rede democrática de contatos
comerciais entre (i) empresa, (ii) distribuidor e (iii) consumidor. (…)

O lucro do MMN reside na atribuição de valores além do preço pelo cliente, com a
informação direta sobre a qualidade e a utilização do produto, por intermédio do
fornecedor, também chamado de distribuidor independente. (…)

Em resumo, a diferença entre o marketing multinível e a pirâmide financeira, ou


esquema Ponzi, encontra-se na existência ou não de produtos com valor comercial. No
marketing multinível, o empreendedor obtém lucro com a revenda dos produtos e com a
formação de uma equipe de vendas, seu faturamento é proporcional à receita gerada
pelas vendas dos seus revendedores (…). Já na pirâmide financeira, a fonte de lucros é o
recrutamento de integrantes. Estes pagam taxas de ingresso, as quais não se revertem
em produtos ou serviços a serem comercializados. Portanto, a remuneração advém da
indicação de pessoas.

O Superior Tribunal de Justiça – STJ tem destacado, em diversos julgamentos, que o


marketing multinível é uma modalidade totalmente legítima de distribuição de produtos
e serviços, e as diferenças entre o MMN e as pirâmides financeiras são muito claras e
gritantes.

O objetivo primordial dos empreendimentos é vender produtos e serviços. Para que isto
ocorra, as empresas se valem de diversos canais de vendas: lojas físicas, sites, redes
sociais, vendas diretas com ou sem o uso de marketing multinível, entre outros.

A venda dos produtos e serviços é a principal fonte de renda de um negócio legítimo, ao


passo que, num esquema de pirâmide financeira, não existe um produto ou serviço que
possua valor comercial efetivo ou minimamente justo, razão pela qual os recursos
advêm majoritariamente do recrutamento de novos entrantes na rede.

Num esquema de pirâmide financeira, o maior esforço dos integrantes da rede não é na
entrega de produtos ou serviços, mas na captação de novas pessoas que adquiram
licenças, paguem taxas de adesão, valores diversos, prestações e investimentos sem que
isto corresponda a nenhuma aquisição de um bem real.

É comum que o valor comercial de um produto ou serviço, no esquema de pirâmide


financeira, não encontre nenhum sentido ou paralelo sequer distante na concorrência.

Sérgio Carlos de Souza [https://www.folhavitoria.com.br/geral/blogs/direito-ao-direito/2022/08/23/


diferencas-entre-multinivel-e-piramide-financeira/] acesso em 26/10/2022
5) quais os critérios para diferenciar a mera irregularidade
administrativa de exposição à venda de produtos com validade
vencida do crime de exposição de produtos impróprios ao
consumo? Analisar- STJ, AgRg no Agravo de Instrumento n.
1.418.565, 6ª T., Min. Rel. Sebastião Reis Júnior, j. 16.05.2013

[artigo]Os crimes contra as relações de consumo estão previstos no art. 7º da


Lei 8.137/90. Entre eles, no inciso IX, encontra-se o crime de vender produtos em
condições impróprias:

Art. 7º Constitui crime contra as relacoes de consumo:

(...) IX - vender, ter em depósito para vender ou expor à venda ou, de qualquer forma,
entregar matéria-prima ou mercadoria, em condições impróprias ao consumo;

Pena - detenção, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, ou multa.

Mas, o que seriam condições impróprias para consumo?

Como se vê, trata-se de uma norma penal em branco, ou seja: para verificar quando o
crime de fato está configurado é preciso procurar a complementação em outro diploma,
e no caso em tela, devemos consultar o Código de Defesa do Consumidor (art. 18, § 6º,
inciso I):

Art. 18. Os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem


solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios
ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, assim como
por aqueles decorrentes da disparidade, com a indicações constantes do recipiente, da
embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária, respeitadas as variações decorrentes
de sua natureza, podendo o consumidor exigir a substituição das partes viciadas.
(...)

§ 6º São impróprios ao uso e consumo:

I - os produtos cujos prazos de validade estejam vencidos.

Seguindo as diretrizes do Código de Defesa do Consumidor, uma das hipóteses de


produtos impróprios ao consumo está relacionada com a questão temporal, isto é,
quando o produto está vencido. No entanto, ainda nos cabe outro questionamento - o
qual é o foco deste artigo: o simples fato do produto estar vencido possui o condão de
ensejar o crime contra as relações de consumo? A resposta só pode ser negativa, em
razão de 2 (dois) grandes motivos:

O primeiro deles é por conta do caráter subsidiário do Direito Penal, pois este só pode e
deve ser acionado quando outros ramos do Direito, que também exercem a função de
controle social (ex.: Direito Civil, Direito Administrativo, etc), falham.

Conforme acima mencionado, o Código de Defesa do Consumidor possui mecanismos


capazes de controlar a exposição de produtos vencidos à venda. Assim, não se justifica o
acionamento do ramo mais invasivo do Direito apenas pela questão relacionada ao
prazo de vencimento.

Roxin discorre de forma pontual sobre essa característica:

A proteção de bens jurídicos não se realiza só mediante o Direito Penal, senão que nessa
missão cooperam todo o instrumental do ordenamento jurídico. O Direito penal é,
inclusive, a última dentre todas as medidas protetoras que devem ser consideradas,
quer dizer que somente se pode intervir quando falhem outros meios de solução
social do problema – como a ação civil, os regulamentos de polícia, as sanções não
penais etc. Por isso se denomina a pena como a ‘ultima ratio da política social’ e se
define sua missão como proteção subsidiária de bens jurídicos. (ROXIN, Claus.
Derecho penal, t. I, p. 65. - g.n.).

O segundo motivo é que para a configuração do crime previsto no art. 7º, inciso IX, da


Lei 8.137/90, não basta que a mercadoria exposta à venda esteja com o prazo de
validade expirado. É de suma importância a realização de laudo pericial a fim de
constatar se o produto está adequado ao consumo ou não, pois como o crime em apreço
deixa vestígios, a perícia é imprescindível (art. 158 do Código de Processo Penal).

Esse é o entendimento dos Tribunais Superiores, sobretudo do Superior Tribunal de


Justiça, conforme se vê abaixo:

14. Decisão proferida pelo ministro Joel Ilan Paciornik nos autos do RHC n.º
91.502/SP:
Com efeito, esta relatoria não ignora que a jurisprudência do STJ oscilou acerca do
tema, todavia tem se firmado no sentido de que o delito de expor à venda produtos
impróprios para o consumo deixa vestígios, razão pela qual a perícia é indispensável
para a demonstração da materialidade delitiva, nos termos do art. 158 do CPP. Assim,
a ausência de perícia autoriza o trancamento da ação penal por falta de justa
causa. (...) Como se vê, o Superior Tribunal de Justiça firmou jurisprudência no sentido
de que para a configuração do delito descrito no art.7ºº, IX, da Lei n.8.1377/1990 é
indispensável a realização de perícia que demonstre a impropriedade dos alimentos
para consumo, sob pena de configuração de responsabilidade objetiva. Nessa esteira,
carece de justa causa a ação penal proposta pelo Ministério Público sem exame
pericial, circunstância que autoriza o trancamento da ação penal. (...) Ante o exposto,
voto pelo provimento do recurso ordinário em habeas corpus para determinar o
trancamento da Ação Penal. (RHC n.º 91.502/SP, STJ, rel. min. Joel Ilan Paciornik,
DJe 01/02/2018).
5 Decisão proferida pelo ministro Rogério Schietti Cruz nos autos do RHC n.º
69.692/SC:
Na espécie, o laudo pericial que serviria à aferição da possibilidade de lesão (ou risco
de lesão) à saúde humana, dos gêneros alimentícios apreendidos no estabelecimento
comercial administrado pelo recorrente nem sequer foi produzido. Inexistente, portanto,
prova direta, necessária, in casu, à conformação dos fatos ao elemento objetivo do tipo
– produto "impróprio para o consumo" –, reserva-se apenas ao Direito Administrativo
ou Civil eventual responsabilização e punição pelo descumprimento de normas
relativas à conservação e exposição, para venda, de gêneros alimentícios. Afinal, o
violador da proteção devida ao consumidor poderá não sair ileso nessas esferas,
porque ali pode ser responsabilizado objetivamente por eventuais danos ao consumidor
e, ainda, multado administrativamente, o que se mostra eficaz e, o mais importante,
mais consentâneo com o sistema jurídico pátrio. (...) Portanto, in casu, concluo pela
existência de constrangimento ilegal, consubstanciado na ausência de prova da
materialidade delitiva, uma vez que sequer produzido laudo pericial para atestar a
impropriedade dos alimentos. É insuficiente a ilação de que os produtos apreendidos
são impróprios para o consumo humano com esteio em características sensoriais
comuns ou, exclusivamente, em virtude da ausência de informações obrigatórias de
rotulagem (como denominação do produto, prazo de validade, data de
fabricação/fracionamento), e não, como exigido, por aferição técnica, direta, acerca
da impropriedade da mercadoria para o consumo.” (RHC n.º 69.692/SC, STJ, rel. min.
Rogerio Schietti Cruz, DJe 13/06/2017).

Portanto, ainda que o crime em debate seja formal - não depende da ocorrência de
efetivo prejuízo ao consumidor -, é necessário averiguar, por meio de laudo pericial, a
impropriedade da mercadoria, pois só assim será possível verificar a materialidade do
delito. Ações penais iniciadas em desacordo com o entendimento citado estão
enraizadas na famigerada responsabilidade objetiva, ou seja, são ilegais! Gustavo dos
Santos Gasparoto [https://canalcienciascriminais.jusbrasil.com.br/artigos/620844324/produtos-
vencidos-expostos-a-venda-por-si-so-configuram-crime-contra-as-relacoes-de-consumo] 26/10/2022

[artigo] O ministro Sebastião Reis Junior, do STJ, entendeu que a ausência de laudo
pericial implica a inexistência de materialidade delitiva, em ação penal em que o
paciente foi denunciado por vender, ter em depósito ou expor à venda mercadoria
imprópria para o consumo.
A defesa sustentou que o exame pericial "não foi capaz de comprovar que a mercadoria
apreendida era efetivamente imprópria para consumo, uma vez que se limitou a fornecer
uma resposta padrão, que poderia ter servido a qualquer apreensão de alimentos
supostamente impróprios para consumo."

O TJ/RJ trancou a ação diante da ausência de laudo que comprovasse a materialidade do


delito. O MP recorreu e teve o REsp inadmitido e, agora, o STJ negou provimento ao
agravo do MP contra o seguimento do REsp.

AGRAVO DE INSTRUMENTO N 1.418.565 - RJ (2011/0097972-0)

RELATOR : MINISTRO SEBASTIAO REIS JUNIOR

AGRAVANTE : MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

AGRAVADO : EDMAR PINTO DE OLIVEIRA

ADVOGADO : GUSTAVO ALVES PINTO TEIXEIRA E OUTRO(S)

EMENTA
AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO PENAL. LEI N. 8.137/1990. CRIMES
CONTRA A RELACAO DE CONSUMO. MERCADORIA IMPROPRIA PARA
CONSUMO. EXAME PERICIAL. NECESSIDADE. ACORDAO A QUO
EM ::DESTAQUE::PAGINA:: CONSONANCIA COM A JURISPRUDENCIA
DESTE TRIBUNAL. INCIDENCIA DA SUMULA 83/STJ. Agravo de instrumento nao
provido.

DECISÃO
Trata-se de agravo de instrumento interposto contra denegacao de seguimento do
recurso especial interposto pelo Ministerio Publico do Rio de Janeiro, com fundamento
no art. 105, III, a e c, da Constituicao Federal, contra acordao do Tribunal de origem
que, ao considerar a pericia cientifica - a qual afastou o risco concreto a saude -,
extinguiu a acao penal proposta contra o ora agravado, nos seguintes termos (fl. 209):
[...] A analise cientifica (direta e indireta) dos produtos apreendidos nao demonstrou o
risco concreto a saude, e, portanto, nao esta comprovada a materialidade do crime
previsto no art. 7, IX, da Lei n. 8.137/1990. O simples fato de estar o prazo de validade
vencido e a inexistencia de identificacao de procedencia ou validade dos produtos
caracteriza tao apenas infracao administrativa. [...]

O recorrente alega que o acordao estadual, alem da divergencia jurisprudencial, violou


os arts. 7, XI, da Lei n. 8.137/1990 e 18, Paragrafo 6, do Codigo de Defesa do
Consumidor, porque a pericia que foi realizada seria ate mesmo dispensavel, se
constatado, como o foi, se tratar de materia-prima ou mercadorias fora do prazo de
validade (fl. 233).
Na insurgencia, o recorrente almeja, em necessaria sintese, que seja reconhecida a
possibilidade de prosseguimento da acao penal trancada por decisao do Tribunal de
Justica do Rio de Janeiro [...] (fl. 240).

Contrarrazoes ofertadas, por meio das quais se sustenta a manutencao do acordao


recorrido (fls. 262/285).

A douta Procuradoria-Geral da Republica manifestou-se pelo provimento da insurgencia


recursal (fls. 290/293). E o relatorio.

O agravo merece ser conhecido, pois preenchidos os seus pressupostos de


admissibilidade. ::DESTAQUE::PAGINA:: Cinge-se a controversia a necessidade de
realizacao de pericia, cujo laudo ateste condicoes improprias ao consumo, para
configuracao do crime previsto no art. 7, IX, da Lei n. 8.137/1990.

A norma controvertida - art. 7, IX, da Lei n. 8.137/1990 - assim dispoe:

Art. 7 - Constitui crime contra as relacoes de consumo: [...] IX - vender, ter em deposito
para vender ou expor a venda ou, de qualquer forma, entregar materia-prima ou
mercadoria, em condicoes improprias ao consumo; Pena - detencao, de 2 (dois) a 5
(cinco) anos, ou multa. Paragrafo unico. Nas hipoteses dos incisos II, III e IX pune-se a
modalidade culposa, reduzindo-se a pena e a detencao de 1/3 (um terco) ou a de multa a
quinta parte. Fixada essa premissa, o Superior Tribunal de Justica entende que, para
caracterizar o crime previsto no artigo acima, e imprescindivel a realizacao de pericia a
fim de atestar se as mercadorias apreendidas estavam em condicoes improprias para o
consumo.

No mesmo sentido:

PENAL. CRIME CONTRA AS RELACOES DE CONSUMO. ART. 7, INCISO IX,


DA LEI N 8.137/1990. PRODUTO IMPROPRIO PARA CONSUMO. PERICIA.
NECESSIDADE PARA CONSTATACAO DA NOCIVIDADE DO PRODUTO
APREENDIDO. RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO. 1. Esta Corte Superior de
Justica pacificou o entendimento no sentido de que, para caracterizar o crime previsto
no artigo 7, inciso IX, da Lei n. 8.137/1990, e imprescindivel a realizacao de pericia a
fim de atestar se as mercadorias apreendidas estavam em condicoes improprias para o
consumo. 2. Recurso especial desprovido. (REsp 1184240/TO, Rel. Ministro Haroldo
Rodrigues (Desembargador convocado do TJ/CE), Sexta Turma, DJe 20/6/2011 - grifo
nosso)

Logo, repita-se, para a jurisprudencia deste Tribunal, a configuracao do delito,


tipificado no art. 7, IX, da Lei n. 8.137/90, esta condicionada a dois aspectos: a)
existencia de pericia e b) atestado acerca da impropriedade para o consumo.

Por conseguinte, a ausencia de uma das condicoes aludidas - no caso, o laudo pericial
afastou a impropriedade para o consumo - implica a inexistencia de materialidade
delitiva, consoante o acordao de origem adequadamente concluiu (fls. 207/215).
Excerto de julgado, da Sexta Turma, que corrobora o presente entendimento:
e ::DESTAQUE::PAGINA:: imprescindivel a demonstracao da impropriedade da
mercadoria para consumo, por meio de pericia que ateste essa condicao (AgRg no REsp
1101147/RS, Rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, DJe
17/11/2011 - nossos grifos).

Com efeito, depreende-se dos autos que o acordao recorrido se encontra em


consonancia com a jurisprudencia assente do Superior Tribunal de Justica, assim sendo,
aplica-se ao caso vertente a Sumula 83/STJ.

Diante disso, nao merece reforma o acordao a quo.

Sendo repetidamente decidida a materia debatida, conforme os precedentes citados, o


presente recurso comporta pronta solucao, nos moldes do art. 557, Paragrafo 1-A, do
Codigo de Processo Civil, c/c o art. 3 do Codigo de Processo Penal, com o fim de se
agilizar a prestacao jurisdicional.

Pelo exposto, com fundamento no art. 34, XVIII, do RISTJ, nego provimento ao agravo
de instrumento.

Ministro Sebastiao Reis Junior Relator


[https://www.migalhas.com.br/quentes/155484/stj-entende-que-ausencia-de-laudo-pericial-implica-a-
inexistencia-de-materialidade-delitiva] acesso em 26/10/2022

6) Como deve ser interpretada a autonomia do consumidor frente a


uma conduta arriscada à sua saúde? Analisar - - STJ, RHC n.
24516, 5ª T., Min. Rel. Arnaldo Esteves Lima, j. 06.04.2010

juridrudência
RHC 24516 / RO
RECURSO ORDINARIO EM HABEAS CORPUS
2008/0206810-2
RELATOR
Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA (1128)
ÓRGÃO JULGADOR
T5 - QUINTA TURMA
DATA DO JULGAMENTO
06/04/2010
DATA DA PUBLICAÇÃO/FONTE
DJe 03/05/2010
EMENTA
PROCESSUAL PENAL. RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS.
ARTS. 7º, IX, DA LEI 8.137/90 E 68 DA LEI 8.078/90. AUSÊNCIA DE
JUSTA CAUSA. AUTORIA. SÓCIOS-PROPRIETÁRIOS. MATERIALIDADE
DELITIVA. PERÍCIA TÉCNICA. CRIME MATERIAL. TRANCAMENTO DA
AÇÃO PENAL. EXCEPCIONALIDADE. INEXISTÊNCIA DE ELEMENTOS
IDÔNEOS DA MATERIALIDADE DELITIVA QUE AUTORIZAM A
PERSECUÇÃO PENAL. AUSÊNCIA DE PERÍCIA TÉCNICA. RECURSO
PROVIDO.
1. Nos denominados crimes de autoria coletiva ou societários,
admite-se o recebimento da denúncia sem que haja uma descrição
pormenorizada da conduta de cada agente, desde que esteja
demonstrado vínculo entre o denunciado e a conduta a ele imputada.
2. A mera constatação de que os produtos se mostram impróprios
para o consumo não é suficiente para a configuração do delito
previsto no art. 7º, IX, da Lei 8.137/80, sendo necessário laudo
pericial para sua comprovação.
3. Recurso provido para trancar a Ação Penal 00220060128630, em
curso na 2ª Vara Criminal de Ariquemes/RO.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima
indicadas, acordam os Ministros da QUINTA TURMA do Superior
Tribunal de Justiça, por unanimidade, dar provimento ao recurso, nos
termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Napoleão
Nunes Maia Filho, Jorge Mussi e Laurita Vaz votaram com o Sr.
Ministro Relator.
Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Felix Fischer.

[artigo] “As necessidades do consumidor podem ter origem estranha, frívola e até
imoral, e, no entanto, pode-se defender otimamente uma sociedade que procura
satisfazê-las. Mas a defesa perde todo o sentido se é o processo de satisfazer
necessidades que as cria”.

John Kenneth Galbraith (in ‘A sociedade afluente’)

Consumimos aquilo que realmente desejamos consumir? Nossas escolhas são


autônomas, resultado do exercício do livre arbítrio e dirigidas para a satisfação de
nossas necessidades e nossos desejos? Se sim, podemos, como sugere Galbraith,
defender o sistema social que procura atender às demandas individuais. Todavia,
vivemos no tempo do marketing, da psicologia comportamental e da neurociência e é
notório que, combinados, o conhecimento e as ferramentas desenvolvidas nesses
campos, evidenciam que é possível criar ou manipular desejos pelo emprego de
técnicas, como enquadramento, priming, âncoras, capazes de induzir o consumidor a
determinadas escolhas ou a pagar (muito) mais pelo que consome. Como sugere Alexis
Carrel  (in ‘O Homem esse Desconhecido’), “… a avidez dos indivíduos
suficientemente hábeis para orientar o gosto das massas populares para os produtos à
venda desempenha um papel capital na nossa civilização.” Assim, há muito se liquefez
o mito do consumo como exercício autônomo de um indivíduo racional que opera de
forma independente o lado da demanda no mercado de bens e serviços.

Além da autonomia do consumidor, falsamente exercitada no âmbito da escolha, há


ainda outra dimensão do ato de consumo que é oportuno avaliar em razão de seus
impactos sobre o conjunto da sociedade. As críticas filosóficas ao estilo de vida
consumista qualificam o consumo como quimera, promessa de felicidade e gerador de
fugaz e inexpressiva satisfação, cuja renovação, como um alvo mutante (porém
inalcançável), depende da repetição indefinida do ato em que se persegue a “felicidade”
pela permanente mutação dos objetos do desejo. Para além dos estados de ansiedade e
frustração que resultam do exercício hedonista do consumo, o ouro de tolo dos tempos
modernos, incensado como fonte de bem-estar individual e instrumento de distinção
social, é preciso, na dimensão do coletivo humano, considerar também os impactos da
disseminação do consumo de massa sobre a sustentabilidade da vida no planeta. A
difusão de um padrão de consumo típico do mundo ocidental desenvolvido para o
conjunto da população mundial coloca a sociedade contemporânea diante do risco de
depleção dos recursos naturais e das consequências potencialmente catastróficas geradas
pela deterioração do meio ambiente e pela mudança climática global.

O consumidor reflexivo – condição a qual estamos longe de exercitar em sua plenitude


– agirá como indivíduo despojado das amarras do consumismo e tornar-se-á cidadão do
mundo na medida em que perceber que o exercício do consumo, além de afetar a vida
em escala planetária, em razão dos impactos que ele produz sobre a economia, a
sociedade e o meio ambiente, não constitui fonte de realização pessoal. O tempo em que
vivemos, triste lapso da história, esse que faz da divinização do consumo um modelo de
vida, fragiliza a condição humana, degrada o planeta e, portanto, coloca em xeque a
vida de nossos descendentes. A sedução do consumo – e daqueles que ganham com ela
– constitui o principal obstáculo à necessária reinvenção do homem e da frágil
sociedade que ele concebeu: o ápice do antropoceno,  período da história que coloca o
Homo sapiens no centro do espetáculo, falseamento do protoganismo de uma figura que
é apenas um nódulo  – deveras destrutivo, é verdade! – de uma complexa teia de seres e
sistemas interdependentes.João Bosco Machado
[https://consumidorcidadao.wordpress.com/2016/10/26/a-autonomia-do-consumidor-e-as-consequencias-
do-consumismo/] acesso em 26/10/2022

7) A atribuição da responsabilidade penal e a qualificação da


conduta como ativa ou omissiva? Analisar -  TJ-SP, RESE n.
9000008-21.2010.8.26.0405

A análise de cada um dos tipos apresentados será realizada de modo individual


naquilo em que se distinguem. Preliminarmente, no entanto, serão expostos os
elementos
nos quais coincidem: justificativa, objetividade jurídica e sujeito passivo.
a) Justificativa: busca-se com os tipos propostos garantir o direito básico do
consumidor
à proteção à vida, saúde e integridade física, bem como, à segurança contra os riscos
provocados produtos considerados perigosos ou nocivos (CDC, art. 6º, I). Busca-se,
também, reforçar a obrigação do fornecedor de limitar a colocação de produtos no
mercado àqueles que não acarretem riscos à saúde ou segurança dos
consumidores,exceto os considerados normais e previsíveis em decorrência de
sua natureza e fruição
(CDC, art. 8º).
b) Objetividade jurídica: intenta-se por meio dos dispositivos em análise, tutelar a
saúde,
a vida e a integridade física dos consumidores contra produtos defeituosos
oferecidos
ao mercado de consumo.
c) Sujeito passivo: o sujeito passivo nos três tipos penais apresentados é o
consumidor do
produto defeituoso, este entendido em sentido amplo, ou seja, toda e qualquer
pessoa
física colocada em risco pelo contato com o produto que ofereça perigo à vida, à
saúde
ou à integridade física, além daquele que legitimamente se poderia esperar.
A seguir, será realizada a análise individual de cada um dos elementos restantes dos
três tipos acima propostos:
• Art. 63-A. Abonar, no desempenho de função para a qual seja, ou deveria ser,
profissionalmente qualificado, produto destinado a consumo, que sabe ou deveria
saber, em razão
de seu conhecimento técnico ou científico, expor a perigo a vida, a saúde ou a
integridade física do
consumidor.
Pena –
§ 1º. Se a conduta é culposa:
Pena –
a) Conceito: o tipo em análise visa à proteção do consumidor diante de defeitos que
venham a surgir no momento em que ocorre a gênese do produto. Desde sua
idealização, passando por todas as etapas de desenvolvimento, daí incluída a fase de
testes, até sua efetiva produção. Procura-se frisar a necessidade de serem
observados,
além das normas legais, os regulamentos administrativos, os critérios gerais e
específicos de segurança (as chamadas “regras de boa prática”), os limites do risco
permitido, bem como, os deveres objetivos de cuidado na fabricação de um bem de
consumo, em especial, daqueles que, por serem oriundos de empresas de grande
porte,
possuem a capacidade de atingir uma imensa gama de consumidores.

b) Classificação doutrinária: trata-se de crime próprio quanto ao sujeito ativo e


comum
quanto ao sujeito passivo; de perigo concreto; doloso; formal; comissivo;
instantâneo;
unissubjetivo; unissubsistente.

c) Sujeito ativo: há, ao longo da linha de produção de uma organização complexa,


além
de funcionários que apenas obedecem a ordens de seus superiores hierárquicos, um
profissional responsável, por cada uma das etapas da fabricação do produto:
planejamento, desenvolvimento, testes, produção propriamente dita e controle de
qualidade. É da responsabilidade desses profissionais, ao exercer sua função,
verificar
se estão sendo observadas uma série de regras349, que vão da higiene pessoal ao
transporte do produto acabado, passando pelo armazenamento das matérias-primas e
as etapas de fabricação350. Esse profissional pode ser um engenheiro civil
responsável
pelo cálculo estrutural de um edifício351 ou por acompanhar sua obra; um
engenheiro
químico, responsável por adicionar um composto químico a um brinquedo352; um
designer de automóveis, cuja função é projetar um mecanismo de rebatimento para
o
banco traseiro de um veículo353 ou controlar a fidelidade ao projeto em sua
fabricação;
um farmacêutico, que deve elaborar um medicamento354 ou atestar sua qualidade
final.
Enfim, há uma infinidade de profissionais peritos em suas áreas de expertises que
podem atestar para a direção de uma empresa a segurança de um produto, nas mais
diversas etapas de sua produção. Pode haver uma série de profissionais trabalhando
de
forma associada na mesma área, mas há aquele, específico, que deve chancelar
legalmente o produto. Nos exemplos dados, um cálculo estrutural deve sempre ser
assinado por um engenheiro regularmente inscrito no Conselho Regional de
Engenharia, Arquitetura e Agronomia (CREA), bem como, o Engenheiro
Químico355 e
o designer de automóveis. O farmacêutico deve ter registro no Conselho Regional
de
Farmácia, sem o qual não pode ser o farmacêutico responsável por nenhum
medicamento. Todos esses profissionais especializados devem pautar seu trabalho
na
segurança do consumidor a que se destina o produto, e é a eles que se dirige este
mandamento, sendo, portanto, os sujeitos ativos do tipo, ora em análise.

d) Conduta: a conduta expressa no tipo é abonar, ou seja, declarar ou considerar


bom ou
verdadeiro, ratificar, sancionar, autorizar, dar como aprovado, apto, afiançar,
garantir.
Trata-se, portanto, de crime comissivo, que demanda a ação do funcionário no
sentido
de dar sua chancela ao produto. No que diz respeito ao sujeito ativo, o crime é
próprio
do funcionário profissionalmente qualificado, capaz de perceber o eventual caráter
defeituoso do produto que está sendo planejado ou fabricado. Quanto ao sujeito
passivo, é comum, uma vez que qualquer pessoa pode acabar tendo contato com o
produto defeituoso.
e) Consumação: o crime é formal, independendo, portanto, de qualquer resultado.
Aperfeiçoa-se o referido crime no momento em que o sujeito ativo entrega sua
aprovação à empresa, remetendo o produto à etapa seguinte de produção. É
instantâneo, inadmitindo, por isso, a tentativa.
f) Elemento subjetivo: o elemento subjetivo presente no caput é o dolo, ou seja, a
vontade livre e consciente de abonar o produto que sabe ou deveria saber expor a
perigo a vida, a saúde ou a integridade física do consumidor. A modalidade culposa
é
admitida no § 1º.
• Art. 63-B. Decidir, no desempenho de função, ainda que por voto proferido em
órgão
colegiado, pela colocação ou manutenção no mercado de consumo, de produto que
saiba ou
deveria saber, em decorrência do exercício de sua função, expor a perigo a vida, a
saúde ou a
integridade física do consumidor.
Pena –
§ 1º. Se a conduta é culposa:
Pena –
a) Conceito: o tipo em exame pretende proteger o consumidor diante de produtos
que
embora tragam defeitos que sejam ou deveriam ser de conhecimento dos dirigentes
da
empresa, eles, por qualquer razão, em geral, de natureza econômica, acabem
decidindo
por sua colocação no mercado de consumo. Os dirigentes das empresas, ao
decidirem
pela comercialização de qualquer produto, já impõem ao consumidor riscos a ele
inerentes. Não se pode, contudo, permitir que eles tenham um campo de decisão tão
amplo que os faça capaz de optar pela disponibilização ao mercado de consumo de
produtos cuja legitima expectativa de segurança esteja aquém dos riscos
efetivamente
impostos pelo produto. Os consumidores, de um modo geral, estão dispostos a
correrriscos como o preço que devem pagar pela evolução tecnológica. No
entanto, não
pretendem correr riscos que sequer sabem existir. Ainda que se possa argumentar
que
a demanda do mercado seja por preço e facilidade de pagamento e não
especificamente por segurança, cabe àqueles que têm a efetiva capacidade de decidir
a
respeito da colocação de produtos no mercado, que o façam de acordo com a
segurança que deles se espera. Ainda com mais razão deve-se punir aquele dirigente
que decidir por deixar de retirar do mercado de consumo, produto cujos indícios
indiquem ser perigoso ao consumidor.

b) Classificação doutrinária: trata-se de crime próprio quanto ao sujeito ativo e


comum
quanto ao sujeito passivo; de perigo concreto; doloso; formal; comissivo;
instantâneo;
unissubjetivo; unissubsistente.

c) Sujeito ativo: é aquele que tenha, dentro da cadeia empresarial, o efetivo poder de
proferir a decisão final a respeito da colocação de um produto no mercado de
consumo. Pode ser a pessoa que ocupa o cargo de diretor da empresa, de presidente,
de
gerente de produto, ou qualquer outro, independente da denominação, mas que
possua
a capacidade de tomada de decisão em última instância. Há de se observar que esta
função pode ser exercida apenas por uma pessoa, por mais de uma ou, ainda, por um
órgão colegiado.

d) Conduta: a conduta expressa no tipo é decidir, ou seja, tomar decisão, deliberar,


resolver, optar. Trata-se, deste modo, crime comissivo, próprio do dirigente da
empresa que dele exige ação deliberativa, isto é, a declaração de sua posição que
deverá se reverter em ordem no sentido de se colocar no mercado de consumo
produto que ele saiba ou deveria saber, em decorrência do exercício de sua função,
expor a perigo a vida, a saúde ou a integridade física do consumidor, além do
legitimamente por ele esperado. A pessoa que decide na cadeia empresarial é, ou, ao
menos, deveria ser informada pelos técnicos ou peritos a respeito das características
de
produto que virá a ser colocado no mercado de consumo. Se, eventualmente, ela
souber de antemão que o produto contém um defeito que o torna perigoso além do
legitimamente esperado pelo consumidor, deverá decidir contra a sua
comercialização,
ainda que isso represente alto prejuízo à empresa. O mesmo deve ocorrer quando se
decidir pela manutenção no mercado de consumo de produtos nas condições
anteriormente descritas.

e) Consumação: o crime é consumado com a oferta, como quer que ela ocorra.
Admite-se tentativa.

f) Elemento subjetivo: o elemento subjetivo presente no caput é o dolo, ou seja, a


vontade livre e consciente de oferecer a consumo o produto que sabe ou deveria
saber
expor a perigo a vida, a saúde ou a integridade física do consumidor. A modalidade
culposa é admitida no § 1º.

[RESPONSABILIDADE PENAL PELO PRODUTO JULIANA BIERRENBACH BONETTI Dissertação


de Mestrado]

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