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2avoanaat ‘Alton krenak compartiha sabedoria dos pois da loresta para ‘star o fim do mundo - Jornal © Globo Ailton Krenak compartilha sabedoria dos povos da floresta para ‘adiar o fim do mundo' Livro recém-langado enaltece cultura indigena e prega humanidade mais diversa como antidoto para o planeta; autor participard de debates na Bienal e no IMS William Helal Filho 27/08/2019 - 11:11 Atualizado em 28/08/2019 - 11:27 (© lider indlgena Aiton Krenak Foto: Ana Branco / Agéncia O Globo YD (©) | wovetoters hitpiiaglabo globa.comsociedadelatontenak-compartIna-sabecora- dos pows-da-Noreste-pars-acar-fi-do-muundo- 73869645 18 zavarzaet ‘Alton Krenak compari sabodoria dos poses da leresta para ‘adaro fm do rund - Jornal © Globo RIO - "Estamos alertando ha 30 anos, ninguém fez nada... Agora nao da mais tempo de salvar o planeta. S6 nos resta beber". O desabafo da ativista Edith Lions durante um jantar de familia em "Years and Years" define a distopia sugerida como pano de fundo na série da HBO, ambientada em meados dos anos 2020. O mundo esta submerso no caos das mudangas climaticas. A disputa comercial entre Estados Unidos e China levou a detonacao de uma bomba nuclear, matando milhares e causando e estragos no capitalismo. Enquanto isso, direitos civis est’io sendo atropelados por um nacionalismo populista que usa medo para ganhar eleigGes, agucando a crise da democracia liberal. Tudo isso gera brigas, faléncia, agonia e morte entre os protagonistas. Em outras palavras, a producdo projeta um futuro em que se concretizam as piores previsdes do autor israelense Yuval Harari ("Sapiens" e "21 ligdes para o século 21") e usa uma familia ficticia de Manchester, no Reino Unido, para ilustrar os impactos na vida da classe média, enquanto a edi¢ao e a trilha sonora frenéticas reforgam um contexto de fim do mundo. Assisti aos seis episédios de "Years and Years" ao longo de uma semana, o que encurtou minhas noites de sono. Os neur6nios precisavam de mais ou menos uma hora pra se acalmar depois de cada capitulo. Por sorte, caiu nas minhas maos um livro do tamanho de um estojo de primeiros socorros: "Ideias para adiar o fim do mundo", do jornalista e lider indigena Ailton Krenak. SAIBA MAIS BRASIL Corrida do ouro na maior reserva indigena do pais cria tensio e destruigao hitpiiaglabo globa.comsociedadelatontenak-compartIna-sabecora- dos pows-da-Noreste-pars-acar-fi-do-muundo- 73869645 28 zavarzaet ‘Alton Krenak compara sabodoria dos poses da leresta para ‘adaro fm do rund - Jornal © Globo BRASIL Governo quer regulamentar trabalho indigena em areas de garimpo BRASIL 'Se aumentar muito o garimpo na nossa terra, vai dar morte’ BRASIL Quase 90% da populagao rejeita mineracio em terras indigenas Adaptaciio de duas palestras e uma entrevista realizadas em Portugal entre 2017 e 2019, a publicagado recém-langada pela Companhia das Letras tem 72 paginas preenchidas com a lucidez do ambientalista descendente do povo Krenak, que vive no Vale do Rio Doce, em Minas Gerais. O autor tem lugar de fala para se referir ao fim do mundo. Ha décadas luta contra a pressio econémica sobre reservas indigenas no pais. Em 1987, foi o representante dos povos nativos do Brasil para falar 4 Assembleia Constituinte, no renascimento da Republica. Dirigiu-se aos deputados com o rosto pintado de tinta preta de hitpiiaglabo globa.comsociedadelatontenak-compartIna-sabecora- dos pows-da-Noreste-pars-acar-fi-do-muundo- 73869645 a8 zona Aten kreraconprtha saber os pc let prt arf rnd - Jel © Globo jenipapo. Em 2015, sua etnia viu o mundo como conhecia acabar quando se rompeu a barragem de rejeitos da Samarco, em Mariana, matando o Rio Doce. ‘A propria existéncia dos krenaks dependia do Rio Doce, que eles chamam de Watu (“avé"). Hoje, os ribeirinhos do vale sobrevivem as custas de verba de assisténcia, camihées-pipa e entrega de alimentos. "Tem quinhentos anos que os indios estio resistindo, eu estou preocupado é com os brancos, como que vao fazer para escapar dessa", escreve Krenak, que estard no Rio este fim de semana para dois eventos, no sdbado. As 1gh, ele participa de um debate sobre a agdo nociva do homem na natureza com as jornalistas Ana Liicia Azevedo e Cristina Serra durante a Bienal do Livro, no Riocentro. E As 17h, 0 autor conversa com a jornalista Renata Tupinambé no Instituto Moreira Salles, na Gavea, onde esta em cartaz uma exposigao da fotografa Claudia Andujar sobre o povo ianomami. "© que aprendi ao longo dessas décadas é que todos precisam despertar, porque, se durante um tempo éramos nés, os povos indigenas, que estavamos ameacados de ruptura ou da extincdo dos sentidos das nossas vidas, hoje estamos todos diante da iminéncia de a Terra n4o suportar nossa demanda". Ao longo de seu discurso, o autor usa tom didatico para expor nacos do saber indigena, construindo pontes entre as nossas culturas, mas sem jamais igualar uma 4 outra. A ideia de humanidade, escreve ele, deveria dizer respeito 4 coexisténcia das diversas narrativas. "Precisamos ser criticos a essa ideia plasmada de humanidade homogénea na qual ha muito tempo o consumo tomou o lugar daquilo que antes era cidadania". O autor reprova 0 conceito convencional de humanidade, "forjado pelo europeu", que segundo ele nao engloba caicaras, indios, quilombolas e outros povos que, por viverem "agarrados" a terra, siio relegados a uma "sub- hitpiiaglabo globa.comsociedadelatontenak-compartIna-sabecora- dos pows-da-Noreste-pars-acar-fi-do-muundo- 73869645 48 zanwza21 ‘Ailton Kren comparitha sabedoria dos ons ca oesta para aa o im do mundo Jornal © Globo humanidade". Essa nogdo limitada de homo sapiens nao permitiria compreender, por exemplo, diversas comunidades indigenas que conferem caracteristicas humanas a elementos como pedras, rios e montanhas. Os krenaks, descreve o ativista, conversam com uma montanha que fica perto de sua aldeia. f ela que diz se um dia vai ser bom, prospero, "ou se é melhor ficar quieto”. Entretanto, quando um morador da aldeia afirma que aquele rio é sagrado ou que aquela montanha fala, as pessoas desdenham dizendo que "isso é folclore deles". "Quando despersonalizamos o rio, a montanha, quando tiramos deles os seus sentidos, considerando que isso é atributo exclusivo dos humanos, liberamos esses lugares para que se tornem residuos da atividade industrial e extrativista". Em entrevista a0 GLOBO, o lider ianomami Davi Kopenawa esclareceu que os membros da sua etnia nao querem explorar minério em suas terras, como ver sendo proposto pelo governo. Da mesma forma, Krenak rejeita a nogao de que os povos da floresta desejam se integrar ao resto da sociedade ocidental. "A ideia de nés, humanos, nos descolarmos da terra, vivendo uma abstragao civilizat6ria, é absurda. Suprime a diversidade, nega a pluralidade de existéncia e de hdbitos. Oferece o mesmo cardApio, o mesmo figurino, se possivel a mesma lingua para todo mundo”. E, também como Kopenawa, o autor denuncia a invasao de terras ianomamis, no Norte do pais. "Esse territério esta assolado pelo garimpo, ameagado pela mineragao, pelas corporagées que nao toleram esse tipo de cosmos, o tipo de capacidade imaginativa e de existéncia que um povo origindrio como os Yanomami é capaz de produzir". De acordo com Krenak, familias indigenas de diferentes regides do Brasil esto vivendo uma escalada de tensiio nas relagdes com o Estado. Uma tensio que nao é de agora, mas que "se agravou com as recentes mudangas politicas introduzidas na vida do povo brasileiro”. hitpiiaglabo globa.comsociedadelatontenak-compartIna-sabecora- dos pows-da-Noreste-pars-acar-fi-do-muundo- 73869645 58 zanwza21 ‘Ailton Kren comparitha sabedoria dos ons ca oesta para aa o im do mundo Jornal © Globo Conheci Krenak em dezembro de 2017, quando o encontrei para uma entrevista, no Rio. Foi uma tortura editar aquela conversa para encaixd-la no espago delimitado no jornal. Enquanto lia "Ideias para adiar o fim do mundo", comecei a fazer um indice remissivo para, depois, reproduzir trechos interessantes e que ajudam a gente a refletir sobre para onde estamos indo como humanidade. Quando me dei conta, estava assinalando pedagos de todas as paginas. Teria que transcrever o livro quase todo. A obra se vale da oralidade com que os povos da floresta passam suas tradigées de geragdo em geracao para transmitir, em bom portugués, o que Krenak descreve como uma provocagio: "Adiar o fim do mundo é sempre poder contar mais uma histéria’ CONTINUA DEPOIS DA PUBLICIOADE Em "Years and Years", a matriarca dos Lions, Muriel Deacon, diante de catastrofes como milhares de britdnicos desabrigados por 80 dias de chuvas torrenciais e da descoberta de campos de concentracio para imigrantes ilegais, faz uma critica ao consumismo e reconhece que "a culpa é de todos nés". Em. seu livro, Krenak cita pensadores como José Mujica e Boaventura de Sousa Santos para refletir sobre o papel de cada um de nés nesse drama que vivemos. Ele leva em conta que o mundo atual é resultado de um processo de trezentos anos, mas, ao mesmo tempo, questiona: "Qual é o mundo que vocés esto agora empacotando para deixar As geragées futuras? Ha algo de insano quando nos reunimos para repudiar esse mundo que recebemos agorinha, no pacote encomendado pelos nossos antecessores; hé algo de pirraga nossa sugerindo que, se fosse a gente, teriamos feito muito melhor". O Globo, um jornal nacional: Fique por dentro da evolugao do jornal mais lido do Brasil hitpiiaglabo globa.comsociedadelatontenak-compartIna-sabecora- dos pows-da-Noreste-pars-acar-fi-do-muundo- 73869645 68 zavarza2t ‘Alton Krenak compari sabodoria dos poses da leresta para ‘star o fm do rund - Jornal © Globo ais Lioas No GL.08o J, Caso Henry: 'Nao nos abandone’, pediu Monique apés depoimento de empregada em que nio citou agressdes Paolla Serra 2... 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